Género, Carreiras e A Relação Entre o Trabalho e A Família: Uma Perspectiva de Gestão
Género, Carreiras e A Relação Entre o Trabalho e A Família: Uma Perspectiva de Gestão
Género, Carreiras e A Relação Entre o Trabalho e A Família: Uma Perspectiva de Gestão
1. INTRODUÇÃO
As teorias de estádios de carreira assumem que o desenvolvimento de carreira é
paralelo ao desenvolvimento do indivíduo, ou seja, a carreira é um processo evolutivo
que deve ser analisado ao longo da vida (Levinson et al., 1978; Super, 1957). Cada
estádio de carreira caracteriza-se pela existência de um conjunto de temas ou tarefas
particulares que correspondem, normalmente, a um período etário específico do ciclo de
vida.
Genericamente, estas teorias são alvo de crítica pelo facto de basearem as suas
conceptualizações em experiências de trabalho exclusivamente masculinas e por não
considerarem as experiências familiares dos sujeitos (Sonnenfeld e Kotter, 1982). Nesta
matéria, sublinha-se a inadequação da estrutura de idades destas teorias quando
adaptada às mulheres, e o facto de esquecerem que o género influencia de forma muito
mais proeminente o comportamento dos indivíduos do que a idade. Efectivamente, as
determinantes do comportamento ocupacional das mulheres são diferentes das dos
homens, sendo o seu percurso de vida profissional menos previsível do que o dos
homens.
Este estudo apresenta, deste modo, uma noção de carreira que abandona a imagem
do actor social isolado que prossegue um percurso profissional, substituindo-a por uma
outra que o mostra imerso na família e na comunidade e, frequentemente, numa relação
com outro actor social que, por sua vez, também está inserido numa organização ou
1
Como citar este artigo: Gaio Santos, Gina (2008), “Género, carreiras e a relação entre o trabalho e a
família: uma perspectiva de gestão”, e-cadernos ces, 1, 92-114. Acedido em [data], http://www.ces.uc.pt/e-
cadernos
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ocupação profissional (Eaton e Baylin, 2000). Ao adoptar esta noção de carreira abarca-
se não só as experiências concretas de trabalho mas, também, as experiências extra-
laborais relacionadas com o espaço de vida individual.
As secções seguintes debatem a relevância da relação entre o trabalho e a família
para o desenvolvimento das carreiras, sendo conferida particular ênfase ao género.
2
Não se encontrou em português um vocábulo que traduzisse, com precisão, a expressão spillover. Optou-
se, assim, por utilizar a expressão original sendo que, todavia, o significado mais aproximado de spillover
parece ser efeito de transferência e que também é utilizado ao longo do texto.
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dadas as suas diferentes exigências, responsabilidades, expectativas e normas. Esta é a
perspectiva que tem conhecido desenvolvimentos empíricos mais significativos, a par do
modelo de spillover.
Por contraposição à hipótese do conflito, existe uma corrente teórica que salienta os
benefícios que os indivíduos podem derivar da ocupação de múltiplos papéis (Sieber,
1974). A hipótese da expansão ou aumento de recursos defende que o envolvimento em
múltiplos papéis pode proporcionar ao indivíduo recursos (por exemplo, novas
competências e maior apoio social) que ele não obteria se estivesse confinado ao
desempenho de apenas um papel.
Algumas investigações (Barnett e Hyde, 2001; Greenhaus e Powell, 2006) têm-se
debruçado sobre os efeitos mutuamente benéficos que o trabalho e a família podem
exercer um sobre o outro, e sobre a necessidade de adoptar estratégias adaptativas
(Voydanoff, 2002) que melhorem a relação de ajustamento entre o trabalho e a família, e,
que, simultaneamente, aumentem as potencialidades dos benefícios inerentes ao
desempenho de múltiplos papéis.
Nesta matéria, Jeffrey Greenhaus e Gary Powell (2006) destacam como principal
benefício o alargamento de competências e de perspectivas associadas ao desempenho
de vários papéis. Por exemplo, o “efeito-tampão”, e a capacidade de relativizar os
fracassos em determinada dimensão da vida, é um aspecto positivo importante. Além
disso, os autores salientam os recursos psicológicos e físicos que se ganham através do
desempenho de múltiplos papéis: sentimentos acrescidos de auto-eficácia e auto-estima,
emoções positivas sobre o futuro (tais como, optimismo e esperança) e saúde física
melhorada.
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definição da sua identidade de género e, como tal, possuem latitude de escolha para se
conformarem ou, pelo contrário, contestarem aquilo que representa ser homem ou ser
mulher (dado que participam diariamente na construção do género).
O impacte das experiências familiares no trabalho reflecte-se sobretudo ao nível da
conjugalidade e parentalidade. A investigação neste domínio apoia parcialmente a noção
de que o casamento e a maternidade colocam constrangimentos significativos ao
desenvolvimento de carreira das mulheres (de Singly, 1987; Hull e Nelson, 2000). No
entanto, sempre que se comparou a satisfação no trabalho dos indivíduos solteiros e
casados, verificou-se que os indivíduos casados apresentavam níveis mais elevados de
satisfação com o trabalho, e com a vida em geral (Crosby, 1984). Os processos de
spillover de emoções e sentimentos positivos gerados pela vida familiar para o contexto
de trabalho parecem ser os principais responsáveis pelo facto de os casados estarem
mais satisfeitos com as suas vidas (Crouter, 1984).
A ideologia de género sustentada pelo casal também pode ter consequências –
positivas ou negativas – no que diz respeito à forma como os indivíduos procuram
conciliar família e carreira. William Philliber e Dana Hiller (1983) consideram que a
identidade de género é uma variável fundamental na determinação da forma como o
marido lida com o facto de a respectiva mulher ser mais bem-sucedida em termos de
carreira do que ele. Assim, nos casais com uma ideologia de género tradicional (em que
ambos os membros abraçam a ideologia do homem como o principal “ganha-pão” da
família) a mulher experimentará pressões, internas e externas, no sentido de diminuir as
suas realizações profissionais. Neste caso, ela pode não só procurar a aprovação do
marido relativamente à opção por determinada carreira, mas o seu envolvimento nesta
pode ser reduzido devido às necessidades de carreira do próprio marido.
Do mesmo modo, a crença na primazia da maternidade para as mulheres, e as
expectativas sociais de que estas confiram prioridade aos filhos em detrimento da
carreira, colocam sérias pressões nas suas vidas (Hock et al., 1984; Winslow, 2005). Em
contexto académico, os estudos realizados sobre o impacte das crianças na
produtividade científica têm revelado a existência de resultados contraditórios, ora
apontando para uma influência positiva das crianças na produtividade científica, ora
demonstrando exactamente o oposto.
Algumas evidências empíricas (Fox, 2005; Stack, 2004) apontam, por exemplo, para
uma produtividade igual ou mesmo superior das mulheres casadas, e com filhos,
relativamente às mulheres solteiras. Este facto contraria, de alguma forma, a hipótese
intuitiva de que as mulheres casadas seriam menos produtivas devido às
responsabilidades familiares. Paralelamente, outros estudos apontam claramente as
limitações colocadas pela parentalidade ao nível das promoções e da obtenção de
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efectividade de emprego (O’Laughlin e Bischoff, 2005; Perna, 2005). Estas investigações
comprovam que a parentalidade é uma variável estatisticamente significativa na previsão
da efectividade de emprego para os homens, mas não para as mulheres.
Por último, os estudos empíricos realizados sobre a divisão sexual do trabalho
familiar chegaram invariavelmente a duas conclusões centrais: (a) a de que as mulheres
realizam, por comparação com os homens, mais do dobro do trabalho doméstico e
familiar; (b) a de que as mulheres realizam tarefas qualitativamente diferentes das dos
homens e estão em desvantagem relativamente à natureza do trabalho doméstico que
realizam. O tempo das mulheres é despendido nas tarefas domésticas menos atractivas
(cozinhar, lavar, limpar, tratar da roupa) e que são, simultaneamente, as mais rotineiras e
consumidoras de tempo e energia, não deixando qualquer margem de discricionariedade
quanto à sua realização (Bianchi et al., 2000; Hochschild e Machung, 1989). Mais uma
vez, a título ilustrativo, os estudos realizados na academia corroboram as evidências
empíricas anteriores: as mulheres realizam mais trabalho relativo ao “segundo turno” do
que os homens (O’Laughlin e Bischoff, 2005).
As secções seguintes centram-se no enquadramento do tema e na caracterização
dos participantes do estudo empírico. A análise dos resultados retrata, assim, as
vivências específicas de um grupo profissional particular: os/as académicos/as.
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determinado pela interacção entre as experiências de trabalho e as experiências de vida
familiar?
O instrumento de recolha de dados incidiu na entrevista semidirectiva (Kvale, 1996).
Assim, foi utilizado um guião de entrevista com um conjunto de questões que se
procuraram formular, com algum grau de uniformidade, a todos os participantes do
estudo. Foram entrevistados homens e mulheres pertencentes a cinco universidades
públicas portuguesas, distribuídos, uniformemente, entre doutorados e não doutorados.
A interpretação dos resultados foi feita através de uma análise de conteúdo que se
focalizou nas narrativas realizadas pelos sujeitos, e pela identificação dos temas
principais e da frequência da sua ocorrência (Spencer et al., 2003).
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A maior parte dos/as académicos/as caracteriza-se pelo discurso da
complementaridade: a carreira profissional e a família ocupam lugares distintos na vida,
ambos muito importantes para a identidade do indivíduo, e que dificilmente podem ser
hierarquizados, dada a importância diferenciada mas complementar que possuem. Há
uma forte identificação com o trabalho e com a família e que tem sido mais ou menos
consistente ao longo do tempo.
A complementaridade entre ambas as dimensões requer, porém, que existam
momentos ao longo da vida em que sejam realizadas acomodações da esfera
profissional à esfera familiar e pessoal, e da esfera familiar e pessoal à esfera
profissional. As acomodações do trabalho à vida familiar podem passar pelo declinar de
determinadas oportunidades profissionais que impliquem o afastamento geográfico da
família, e por uma limitação no número de horas de trabalho ou das viagens de trabalho.
As acomodações da família ao trabalho implicam quase sempre o inverso: uma
quantidade elevada de horas de trabalho com a consequente indisponibilidade para uma
maior participação na vida familiar, saídas mais ou menos prolongadas e frequentes
devido a afazeres profissionais e, em muitos casos, o adiar da parentalidade. Estas
trocas ou acomodações que são realizadas entre a vida familiar e o trabalho
assemelham-se bastante àquelas identificadas em outros estudos (Becker e Moen,
1999).
Neste estudo, a forma como a complementaridade entre trabalho e vida familiar e
pessoal é vivida por homens e mulheres varia muito em função da fase do ciclo de vida e
do estádio de carreira em que se encontram. Daqui decorre que dentro do discurso de
complementaridade é possível distinguir entre os/as académicos/as que apresentam
uma maior orientação para o trabalho ou aqueles/as que apresentam uma maior
orientação para a família.
Há, ainda, uma minoria de homens e mulheres que se caracteriza pelo discurso da
subalternização, que implica a subordinação de um domínio da vida ao outro. As
secções seguintes exploram cada um destes discursos.
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No que diz respeito aos/às académicos/as mais jovens, e nos estádios iniciais de
carreira, aqueles/as que se inserem neste grupo caracterizam-se fundamentalmente por
não terem filhos, e estarem numa fase da vida em que é considerável o investimento
realizado em termos profissionais. Esse elevado investimento reflecte-se no facto de
estarem num momento das suas carreiras em que há uma elevada necessidade de
provarem as suas competências. Um número considerável encontra-se a realizar o seu
doutoramento ou completou-o há pouco tempo, e as preocupações de carreira são muito
frequentes. Por tudo isto, o tempo que colocam no trabalho é muito elevado. Este grupo
é constituído por 20 indivíduos: 10 mulheres e 10 homens. No que se refere ao tipo de
estrutura familiar, no caso das mulheres, existem uma mulher casada e com filhos,
quatro mulheres casadas e uma a viver em união de facto sem filhos, duas mulheres
solteiras e duas mulheres divorciadas, também sem filhos. No caso dos homens,
observam-se um homem casado e com filhos, cinco homens casados e um a viver em
união de facto sem filhos, dois homens solteiros e um homem divorciado, todos eles sem
filhos.
Para os indivíduos mais velhos, e nos estádios mais avançados da carreira, a maior
orientação para o trabalho não pode ser dissociada do facto de se encontrarem numa
fase da vida em que os filhos adquiriram já uma maior autonomia. Este grupo de
académicos/as mais velhos/as é composto por 22 indivíduos. Em termos de distribuição
por estrutura familiar, no caso dos homens, existem sete homens casados, com filhos, e
dois homens divorciados também com filhos. No caso das mulheres, observam-se sete
mulheres casadas, com filhos, e quatro mulheres divorciadas, também com filhos. Neste
grupo, incluem-se, ainda, uma mulher a viver em união de facto e uma mulher solteira,
ambas sem filhos.
O excerto de entrevista seguinte é bastante ilustrativo dos/as académicos/as que
apresentam um discurso onde se nota uma maior orientação para o trabalho:
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imenso para esse exame. A mudança de local de residência, de cidade, que
também foi um tempo tenso e absorvente. Os miúdos tiveram que vir para cá
inserir-se. Um deles estava a meio da escola primária, e a miúda é que ia começar
a escola primária. Houve mais polarização para a família aí. Outras vezes foi a
profissão, quando estava virado para o doutoramento, também estive bastante
polarizado para aí. Mas, portanto, se calhar é um defeito meu, mas tenho
dificuldade em separar em cortes tão fortes.
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Em termos da relação conjugal, os/as académicos/as com uma maior orientação
para o trabalho caracterizam-se predominantemente pela reciprocidade da relação. Uma
característica central da reciprocidade prende-se com o facto de existir apoio mútuo no
casal relativamente aos projectos profissionais de cada um. Trata-se de homens e
mulheres casados com outras pessoas que prosseguem carreiras muito similares às
suas (ou mesmo iguais), não se utilizando o argumento da prossecução de uma carreira
mais exigente do que a do parceiro/a.
Um outro aspecto que caracteriza a reciprocidade da relação é a diversidade dos
tipos de apoio mútuo facultados. O apoio emocional, por exemplo, sob a forma de
partilha de preocupações, e troca de opiniões sobre os respectivos trabalhos, ou pela
criação de espaços e tempos para o outro investir profissionalmente, é muito frequente.
Além disso, a divisão do trabalho doméstico e familiar é uma questão que não gera
conflito no casal, embora possa existir alguma negociação em termos das tarefas
domésticas que devem ser desempenhadas por cada um (sobretudo por parte dos/as
académicos/os mais jovens). O recurso à empregada doméstica é muito frequente e a
estratégia de conciliação privilegiada pela generalidade dos/as entrevistados/as.
Há, no entanto, algumas diferenças subtis entre homens e mulheres. Se a maior
parte destes/as académicos/as tende a assumir um discurso marcado pela igualdade em
termos da importância conferida a ambas as carreiras, e pela reciprocidade nas formas
de apoio, nota-se, igualmente, sobretudo por parte das mulheres mais velhas, que
existiram, ao longo do tempo, algumas acomodações no sentido de nunca tornar o seu
sucesso profissional demasiado visível. Esse facto estava relacionado com a percepção,
por parte destas, de que seria prejudicial para o equilíbrio da relação se a respectiva
carreira adquirisse maior proeminência no casal. O que transparece no discurso de
algumas académicas mais velhas, é de que o apoio à sua carreira resulta de um esforço
de conquista e entendimento progressivo com o companheiro. A afirmação da identidade
profissional foi um processo gradual, conquistado na relação com o outro, e marcado por
concessões que se foram realizando. Em alguns casos, os conflitos gerados pela maior
proeminência da carreira feminina, no casal, foram resolvidos pela manutenção da
tradicional divisão sexual de trabalho. Essa foi a forma que algumas académicas
encontraram para garantir o investimento de carreira –, nunca questionar a distribuição
desigual de poder e trabalho na relação conjugal. A narrativa da académica seguinte é
ilustrativa deste aspecto:
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termos de carreira, em termos de ocupação fora de casa, provavelmente, às
tantas, eu teria sido mais exigente no sentido de: “vamos dividir tarefas, tu fazes
isto, e eu faço aquilo, e tem que haver uma equidade também nesse sentido”.
Como havia um desequilíbrio e, realmente, a ausência era bastante mais a meu
favor, eu interiorizei que quando eu estava, fazia as coisas e aceitei. Acabei por
aceitar isso: “quando eu estou em casa, eu faço” (Professora Associada, 50 anos,
casada com filhos).
Não me vejo a ser, de forma nenhuma, a pessoa que mais cuida da criança que,
portanto, tenha o papel de protagonista no acompanhamento da criança. Não
penso que isto seja sexismo ou machismo, mas eu acho que esse papel compete à
mãe. […] Penso que é uma questão de natureza. Se calhar, numa idade mais
avançada da criança, quando as crianças já são mais velhas, sei lá, a partir dos
cinco ou seis anos, talvez a partir daí, sim, não haja problema nenhum. Mas
quando as crianças são muito pequenas, eu parece-me, sinceramente, que uma
presença mais constante da mãe é mais necessária (Professor Auxiliar, 31 anos,
casado, sem filhos)
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académicos/as mais velhos/as e nos estádios mais avançados da carreira: duas
mulheres e dois homens, e que eram pais de crianças ainda relativamente pequenas.
Trata-se de académicos/as que tinham optado por ter filhos só depois de completado o
doutoramento. Porém, a sua elevada orientação para o trabalho havia-se modificado
com o nascimento dos filhos.
Uma diferença significativa deste grupo de académicos/as relativamente ao grupo
anterior é que mais rapidamente atribuem uma hierarquia de importância entre trabalho e
família – com os filhos a aparecerem, invariavelmente, em primeiro lugar nas suas vidas.
Eis como um assistente, pai de uma criança ainda pequena, descreve a sua relação
entre o trabalho e a família:
Acho que atingi agora um equilíbrio saudável que é [pausa] o seguinte: à carreira
dou a atenção necessária, mas não dou mais do que o necessário. Não dou mais
do que a atenção necessária. Hamm. Porque também tenho um filho, quer dizer, e
isso muda tudo. E acho que há coisas mais importantes e, portanto, deixei de
pensar que era importante fazer mais este trabalho, e fazer mais aquele trabalho,
e o outro trabalho. Não. Eu faço, e tento planear, as coisas de maneira a
conseguir fazê-las. Mas o meu conseguir fazê-las já encaixa numa estrutura mais
apertada, não é? Pela família, pelas restrições da família. E, portanto, acho que
tenho um equilíbrio mais interessante, mais saudável do que tinha.
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o meu filho. Com o crescimento do meu filho. Isso não imagino! Poderá haver
homens que imaginam, e que se sentem bem com isso, mas eu não. (Assistente,
sexo masculino, 36 anos, casado com 1 filho)
Nós temos muito poucas tarefas domésticas para fazer porque temos uma
senhora que vai lá a casa [risos]. Não é uma empregada interna, mas é uma
senhora que vem todos os dias: todas as manhãs. Ao princípio isso era por causa
do bebé, mas agora já não é. Mas ela limpa a casa, trata da roupa e faz o jantar.
E, portanto, já sobram muito poucas tarefas para fazer lá em casa. Hamm.
Sobram as tarefas que a minha mulher nunca fez e que são as de manutenção e
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que são os arranjos. Por exemplo, das torneiras, isso ela nunca fez… Mas isso,
pronto, é o meu departamento. Sobram as compras, e as compras sou eu e ela
que fazemos (Assistente, sexo masculino, 36 anos, casado com 1 filho).
Em muitos casos, nota-se que existe uma “luta” no casal por uma parcela maior de
tempo e de disponibilidade mental para a profissão. Como tal, a utilização de estratégias
reactivas para evitar realizar uma porção maior do trabalho doméstico é muito
frequentemente utilizada pelos homens. Estas estratégias passam por colocar a ênfase
na “falta de jeito” ou na “incapacidade de fazer melhor” certo tipo de tarefas domésticas
evidenciando, por contraste, a “maior aptidão” e o “gosto natural” da companheira por
esse tipo de trabalhos. Há também o argumento da “maior disponibilidade” da
companheira, e da “ajuda” ou “colaboração” que é facultada sempre que solicitada. Este
conjunto de mecanismos leva a que, na prática, exista uma atitude deliberadamente
passiva quanto à gestão e realização do trabalho familiar e doméstico por parte dos
homens. O recurso à empregada doméstica surge, assim, como a estratégia principal
para a resolução das disputas que surgem no casal.
Mas é sobretudo a falta de apoio emocional por parte do outro que é mais notada por
estes/as académicos/as, especialmente pelas mulheres. Nesta matéria, o que sobressai
das entrevistas são as atitudes menos compreensivas do companheiro relativamente à
carreira académica:
Como a minha actividade profissional é mais flexível do que a dele, ele pensa: “Tu
não vais fazer isso agora mas podes fazer depois, enquanto que se eu não fizer
agora isto depois já não posso fazer”. E, por vezes, quando eu digo: “Ai, eu hoje
não posso fazer isso porque tenho um trabalho na universidade”. Ele diz: “Mas
então tu demoras tanto tempo a fazer esse trabalho?” E eu fico assim um
bocadinho triste com isso porque, por vezes, penso que ele não compreende a cem
por cento o que faço… […] E é assim, eu até podia ter aqui uma reunião na
universidade, mas como ele tem que estar no trabalho às duas, eu tenho que tentar
adiar as minhas funções, e tentar fazer o que é necessário antes em casa: levar os
filhos ou ir ao banco. Os horários de trabalho dele são sagrados, enquanto que,
para mim, ele diz sempre: “Tu tens flexibilidade, portanto, podes fazer as coisas
mais facilmente (Assistente, sexo feminino, 33 anos, casada com filhos).
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que a flexibilidade de horários é entendida, pelos respectivos companheiros, como uma
característica do trabalho que lhes permite estarem mais disponíveis para a vida familiar.
Como tal, eles consideram que é mais fácil para elas responsabilizarem-se pelos filhos e
pela gestão doméstica. Já no caso dos académicos do sexo masculino, são quase
sempre as companheiras que assumem a principal responsabilidade pela gestão da vida
doméstica, e não é relevante o facto de até serem eles que gozam de maior liberdade de
horários. De facto, por parte dos homens, a autonomia proporcionada pela flexibilidade
parece ser mais utilizada em benefício do próprio trabalho ou do tempo estritamente
pessoal. Já no caso das mulheres, a flexibilidade de horários resulta quase sempre numa
maior carga de trabalho doméstico e familiar que tem que ser realizado.
É importante sublinhar que alguns dos indivíduos que hoje apresentam uma maior
orientação para o trabalho, sobretudo os mais jovens e sem filhos, se podem transformar
em indivíduos com uma maior orientação para a família. Do mesmo modo, à medida que
os filhos forem crescendo, e adquirindo uma maior autonomia, é provável que alguns
homens e mulheres, agora mais orientados para a família comecem a investir muito mais
no trabalho. Muitos/as académicos/as mais jovens, e no estádio inicial de carreira, são
assaltados por sentimentos de frustração que derivam das pressões que sentem existir
quer na profissão, quer na relação com os filhos, e com a constatação de que não
conseguem responder como gostariam a todas as solicitações.
A influência exclusivamente positiva da parentalidade nas experiências profissionais
é mais notória no caso dos/as académicos/as mais velhos e com filhos já crescidos. São
eles/as que mais referências fazem à estabilidade emocional derivada da parentalidade.
Os/as académicos/as mais jovens, e com filhos pequenos, vivem a parentalidade de
forma conflitual: se há aspectos positivos associados à parentalidade, há todo um
conjunto de constrangimentos que podem afectar negativamente a profissão. Como é
referido por uma jovem assistente, mãe de crianças pequenas: “Neste momento, são
mais as interferências da vida familiar no trabalho do que propriamente o trabalho na
família. É essencialmente a questão dos filhos, dos problemas com a alimentação deles
e, por vezes, quando eles estão doentes”. Esta constatação não deve fazer esquecer
que os benefícios associados ao desempenho de múltiplos papéis são reconhecidos pela
generalidade dos/as entrevistados/as, e daí predominarem os discursos de
complementaridade e não de subalternização de um domínio da vida ao outro.
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caracteriza apenas uma minoria muito restrita de académicos/as: 11 sujeitos. No caso
dos indivíduos cuja prioridade é dada ao trabalho existe, desde sempre, uma
subalternização da vida familiar e pessoal à profissão. Neste grupo, incluem-se quatro
homens casados e com filhos e 1 a viver em união de facto, sem filhos, todos eles mais
velhos, e nos estádios mais avançados da carreira. Apenas um homem mais jovem, nos
estádios iniciais de carreira, se inclui neste grupo. Existem, igualmente, três mulheres
mais velhas e também situadas nos estádios mais avançados da carreira: duas mulheres
solteiras, sem filhos, e uma mulher divorciada com filhos. Quando existem filhos, esse
facto não interfere minimamente com o percurso profissional porque as
responsabilidades parentais são delegadas em outras pessoas.
A ocupação do tempo por estes indivíduos é completamente determinada pelas
actividades profissionais. Mais do que no caso dos/as outros/as académicos/as, o
trabalho surge muito associado à imagem de prazer e realização pessoal. Trabalho e
lazer confundem-se e assumem o mesmo significado. Para estes homens e mulheres, os
motivos de maior satisfação na vida estão relacionados unicamente com os aspectos
profissionais, e a sua identidade está fundamentalmente ancorada na profissão – o
indivíduo “é” aquilo que faz:
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A maior parte dos homens que conferem prioridade ao trabalho caracteriza-se por
uma relação conjugal marcada pela solidariedade, mas que é unívoca, uma vez que é
somente concedida ao elemento masculino do casal. É claramente dada precedência à
sua carreira no casal, e esse facto é aceite pela outra parte pacificamente e não é
motivador de qualquer tipo de conflito. Esta é inclusivamente uma estratégia utilizada
para conciliar o trabalho com a família, e que passa por, no casal, a mulher ter uma
ocupação que é entendida mais como um simples “emprego” do que como uma carreira
profissional (Becker e Moen, 1999). Neste caso, a actividade da mulher é descrita como
menos exigente ou mais flexível em termos de horários de trabalho. Adicionalmente,
também não se verifica qualquer tipo de negociação ou discussão significativa em
relação à divisão do trabalho doméstico e familiar.
No caso das mulheres, neste grupo, apenas uma havia sido casada. De notar que,
para esta académica, a prioridade conferida à carreira profissional é, todavia, vivida com
alguns sentimentos de culpa por nem sempre ter estado presente na vida dos filhos. Tal
como sucede com o académico anterior, também esta mulher não modificaria em nada
no seu percurso de vida. O trabalho é encarado com igual “sentido de missão” e de
marcar a diferença através da actividade profissional que desenvolve. Mas se, no caso
dos homens, as respectivas carreiras profissionais são construídas à custa da
transferência para as respectivas companheiras das responsabilidades e dos cuidados
pelo domínio familiar, no caso desta mulher esse papel é assumido pelos seus pais.
Já no discurso de subalternização, mas com uma clara prioridade conferida à família,
é a focalização na dimensão familiar que ocorre desde muito cedo. O trabalho ocupa
sempre uma posição marginal em termos identitários. Neste grupo incluem-se apenas
duas mulheres, mais velhas, que dado o seu percurso familiar se situavam ainda nos
estádios iniciais de carreira (uma era assistente e a outra professora auxiliar há
relativamente pouco tempo). Ambas as mulheres exerceram durante muito tempo uma
outra actividade profissional e só mais tarde enveredaram pela carreira académica. Em
ambos os casos, a anterior ocupação profissional tinha sido no sector do ensino, porque
isso lhes permitiu obter a flexibilidade de horários necessária para a conciliação. Uma
destas académicas tinha mesmo interrompido a actividade profissional quando os filhos
eram mais pequenos.
5. CONCLUSÕES
Este estudo coloca em destaque a relevância da perspectiva de género para
compreender as diferenças que persistem em termos da parentalidade e da
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conjugalidade, e o reconhecimento de que essas desigualdades afectam diversamente o
percurso de carreira realizado por homens e mulheres. Apesar da mudança significativa
que se nota existir na forma como a paternidade é vivida pelos homens da geração mais
jovem, há algo que não se alterou: as mulheres assumem o cuidar dos filhos como algo
normativo e que decorre da sua condição feminina. Já os homens sentem que têm
alguma escolha a esse respeito: podem optar por se envolver ou não no papel parental,
com diferentes graus de intensidade, e mais facilmente dividem esse papel, e as
exigências daí derivadas, com as suas companheiras. Neste sentido, alguns deles
declaram que a responsabilidade principal pelo cuidar dos filhos é das companheiras –
pelo menos ao nível da gestão de toda a engrenagem familiar e que eles contribuem o
melhor que podem ou quando podem. Isto é particularmente evidente, por exemplo, na
partilha que existe (ou não) no que se refere à realização de todo um conjunto de tarefas
domésticas e familiares. Este continua, aliás, a ser um factor de diferenciação e
desigualdade de género.
Adicionalmente, não deixa de ser surpreendente o facto de as diferenças geracionais
não serem tão importantes como inicialmente se esperaria no que diz respeito a
mudanças na divisão sexual do trabalho familiar. Comparativamente aos homens da
geração mais velha, os mais jovens reconhecem, porém, que poderá existir algum tipo
de injustiça na divisão do trabalho doméstico em prejuízo da companheira, e
demonstram algum mal-estar com isso. Todavia, a defesa de uma ideologia de género
tradicional, no âmbito da divisão sexual do trabalho, é, ainda, muito partilhada por
homens e mulheres.
Esta situação é, aliás, referida por Virgínia Ferreira (1999) como um (entre vários)
dos paradoxos que continua a condicionar negativamente a vida das mulheres
portuguesas. Se elas são, em termos europeus, daquelas que mais participam no
mercado de trabalho, são também as que contam com menos ajuda por parte dos
homens na realização do trabalho doméstico e familiar. A realização deste trabalho é
garantida por um terceiro elemento, exterior ao casal: a empregada doméstica.
Efectivamente, neste estudo, a utilização disseminada da empregada doméstica,
sobretudo junto da geração mais velha de académicos/as, constitui a estratégia mais
adoptada, por homens e mulheres, na conciliação do trabalho com a família.
De acordo com algumas autoras (Ferree, 1990; Thompson, 1993), o trabalho familiar
e doméstico é mais do que o trabalho invisível e não assalariado, que torna possível a
existência do trabalho assalariado. É também trabalho que assume um significado de
género, isto é, um conjunto específico de tarefas culturalmente e socialmente específicas
que transmitem significados sociais acerca da masculinidade e da feminilidade e, como
tal, sobre a distribuição de poder na família. A perspectiva de género enfatiza os
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aspectos materiais, mas também ideológicos, que estão associados ao trabalho
doméstico – o trabalho doméstico, como uma forma distinta de ocupação apenas surge
com o advento da industrialização e reflecte a ideia antiga de divisão sexual do trabalho,
e consolida-se como o oposto cultural do trabalho assalariado.
A perspectiva de género é útil porque permite perceber por que o aumento
exponencial da participação das mulheres no trabalho assalariado, nas últimas décadas,
não tem produzido uma mudança significativa em termos do trabalho doméstico
realizado pelos homens na esfera privada e familiar. Não há decisões baseadas em
critérios económicos ou de justiça quando se analisa a forma como se processa a divisão
sexual do trabalho na família. Na verdade, não existe uma troca paritária em termos das
horas de trabalho assalariado e das horas de trabalho familiar entre homens e mulheres,
nem os indivíduos o distribuem baseando-se para tal na disponibilidade de tempo de
cada um deles. Pelo menos para certas unidades familiares parece ser mais aceitável
passar sem a realização de determinada quantidade de trabalho doméstico do que vê-lo
realizado pela pessoa do sexo “errado”. Surge, assim, uma luta considerável entre
marido e mulher sobre os significados simbólicos do trabalho doméstico, especialmente
quando as mulheres exercem uma ocupação assalariada igual ou similar à do
companheiro.
Dada a relevância do género para a compreensão das dinâmicas familiares, devem
ser feitas algumas considerações quanto ao modelo de carreira prevalecente. A primeira
delas, refere-se ao facto de qualquer modelo de carreira dever tomar em linha de
consideração a existência de múltiplas noções de tempo e de espaço na vida dos
indivíduos (Eaton e Bailyn, 2000; Moen e Han, 2001). Deve ser feito um esforço no
sentido de terminar com o carácter “taylorista” das carreiras actuais –, não há um “one
best way” de carreira, que possa ser aplicado indistintamente e de forma uniforme a
todos. Os modelos de carreira têm que ser pensados numa lógica individualista e
personalizada às circunstâncias de vida cada um. Há um desfasamento entre o modelo
de carreira culturalmente predominante e a realidade da vida dos indivíduos –, e este
modelo é penalizador da vida de mulheres e de homens. Porém, dadas as
desigualdades de género na divisão sexual do trabalho familiar, o modelo da carreira
linear e ininterrupta, continua a colocar mais dificuldades às mulheres, que continuam a
assumir o papel principal de “cuidadoras” da família, e que ficam, assim, com menos
tempo e disponibilidade mental para a prossecução da carreira académica.
Neste âmbito, algumas autoras (Gallos, 1989; Marshall, 1989; Moen e Han, 2001)
defendem que o conceito clássico de carreira precisa de ser reformulado para incluir
aqueles que são considerados os padrões invulgares de carreira, os quais normalmente
dizem respeito à carreira das mulheres. Efectivamente, enquanto os padrões de carreira
110
masculinos constituírem o modelo de carreira cultural e socialmente aceite, as mulheres,
e um número crescente de homens, estarão sempre em desvantagem. As definições de
carreira continuam a basear-se fortemente nas experiências de trabalho masculinas, e
nos pressupostos acerca da primazia do trabalho para a identidade dos indivíduos.
Todavia, actualmente, cada vez mais mulheres e homens procuram conciliar carreira,
casamento e parentalidade como aspectos complementares e indispensáveis para a
construção das suas identidades.
Uma segunda consideração trazida pelo estudo refere-se, precisamente, à
complementaridade entre os papéis profissional e familiar para a maior parte dos/as
entrevistados/as. Este dado corrobora a perspectiva que existe na literatura de que o
desempenho de múltiplos papéis é mais benéfico do que prejudicial para os indivíduos
(Barnett e Hyde, 2001; Greenhaus e Powell, 2006). A relação entre o trabalho e a família
pode assumir uma multiplicidade de formas, e estas variam em função do ciclo de vida e
do momento na carreira em que o/a académico/a se encontra, ao longo de um contínuo
que vai da segmentação à integração de papéis. O factor parentalidade é determinante
nesta matéria. As fronteiras familiares parecem ser particularmente permeáveis às
incursões do trabalho quando os indivíduos não têm filhos ou quando estes já são
autónomos. Já quando as crianças têm uma idade dependente são muito maiores as
acomodações que se fazem na dimensão profissional em função da família.
Adicionalmente, os estádios de carreira já não assumem a rigidez dos modelos
outrora propostos por Donald Super (1957) ou Daniel Levinson (1978), uma vez que não
há uma correspondência estrita e absoluta entre estádio de carreira e idade, tal como era
idealizado por estes autores. Nesta medida, fará mais sentido pensar os estádios de
carreira como ciclos de aprendizagem que não se restringem a um período etário
específico, como de resto é sugerido por Douglas Hall (2002).
Como argumentam, Phyllis Moen e Shin-Kap Han (2001) a integração da carreira e
da família é um dilema para um número crescente de indivíduos que se dividem por uma
multiplicidade de papéis na família e no trabalho. Efectivamente, à medida que os casais
de “dupla carreira” se assumem como o tipo de estrutura familiar mais usual, os padrões
de carreira de homens e mulheres devem ser perspectivados em ligação, influenciando-
se mutuamente, e à luz de circunstâncias familiares em mudança. Todavia, as
organizações continuam a implementar políticas e práticas que apoiam um modelo de
carreira que se caracteriza pelo emprego contínuo, que se inicia após o completar da
formação escolar e só termina com a reforma. Desta forma, acredita-se que o lugar
central que é conferido à carreira e ao trabalho, em prol do qual todos os sacrifícios são
justificáveis, tem que ser repensado.
111
Por último, os resultados também mostram que a noção de equilíbrio entre o trabalho
e a família é subjectiva e pode representar coisas muito diferentes consoante o indivíduo.
Pode existir equilíbrio quando se atribui importância e peso iguais às actividades
familiares e às actividades profissionais. Porém, o equilíbrio também pode existir quando
é a vida familiar e pessoal ou o trabalho que assumem prioridade por escolha pessoal. O
paradoxo existe quando o modelo de carreira culturalmente dominante prevê e acomoda
apenas a perspectiva da subalternização de papéis (com uma clara prioridade conferida
ao trabalho), em detrimento de modelos de carreira inclusivos da complementaridade de
papéis. Conclui-se, deste modo, que existe uma assincronia entre a realidade da vida
dos indivíduos e o modelo dominante de carreira.
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