Análise Tafonômica de Ossos de Mamíferos Marinhos Provenientes de Encalhes No Litoral Sententrional Do Estado Do Rio Grande Do Norte No Semi-Árido Nordestino, Brasil.
Análise Tafonômica de Ossos de Mamíferos Marinhos Provenientes de Encalhes No Litoral Sententrional Do Estado Do Rio Grande Do Norte No Semi-Árido Nordestino, Brasil.
Análise Tafonômica de Ossos de Mamíferos Marinhos Provenientes de Encalhes No Litoral Sententrional Do Estado Do Rio Grande Do Norte No Semi-Árido Nordestino, Brasil.
MOSSORÓ
2017
CAMILO CHAGAS DANTAS
MOSSORÓ
2017
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Cursos de Graduação e Programas de Pós-Graduação da Universidade.
CAMILO CHAGAS DANTAS
Agradeço primeiramente a meus pais, Chagas Silva e Liana Couto, que dotados
de sabedoria e amor souberam me guiar por todos os caminhos até aqui. Que meus
caminhos continuem sendo orientados por estes maravilhosos guias.
Agradeço à minha família por todo o apoio em momentos difíceis e por estarem
ao meu lado em todos os momentos, em especial às minhas irmãs Luana e Ilana que me
aturam nos momentos mais estressantes, mas também me fazem sorrir e relaxar quando
preciso.
Aos meus professores, são as pedras fundamentais do conhecimento, sem eles
nenhuma linha desse trabalho teria acontecido. Mesmo nos momentos “puxões de
orelha” foram importantes para me lembrar que o estudo é importante, mas acima de
tudo é prazeroso e o conhecimento é viciante.
Agradeço enormemente ao meu orientado Kleberson Porpino que aceitou
orientar um estudante que sabia apenas o básico da paleontologia e agora consegue
enxergar ao longe. Ao professor Hermínio Araújo, com toda a paciência e disposição
me ajudou muito a compreender este trabalho.
À professora Ana Bernadete que além de aceitar ser minha co-orientadora
gentilmente abriu as portas do Laboratório de Monitoramento de Biota Marinha para
que pudéssemos realizar este trabalho.
Aos colegas e amigos do Laboratório de Sistemática e Ecologia Animal, em
especial Shaline Araújo e Fábio Lima, que iniciaram a caminhada da pós-graduação
junto comigo e me ajudaram a entender o universo da paleontologia.
Agradeço à minha companheira, Dayane Paiva, por todo o amor, incentivo e
paciência que teve comigo. É por ter você ao meu lado que me sinto seguro para
enfrentar os desafios que nos reservam o futuro.
Agradeço ao programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação da
Universidade Federal Rural do Semi-Árido pela oportunidade de realização deste
trabalho e a CAPES pelo apoio na forma de bolsa.
Agradeço a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a realização
deste trabalho.
“Na travessia da vida, uma pessoa
certamente terá de superar
correntes críticas em muitos
lugares. (...) Disposição para
transpor os obstáculos é
necessária – o que exige espírito
preparado para superar quaisquer
acontecimentos críticos”.
Miyamoto Musashi
Resumo
Taphonomic studies reveals important information about how the environment affects
the remains of organisms during the process of decaying. This approach can be used for
the study of both ancient and recent organisms. The use of taphonomic techniques to
study recent marine mammals were underused, despite its potential. This work aims to
study bone material of marine mammals in search of marks left by post-mortem
processes related to biotic and abiotic environmental factors in the northern cost of Rio
Grande do Norte State, Brasil. According to the taphonomic signatures found in the
bone material it was identified weathering processes, abrasion, necrophagy, breaks,
taphonomic feedback and human actions. For the northern coast of Rio Grande do Norte
skulls have better representation in strandings of marine mammals, but vertebrae have
greater reliability for faunal survey. The dynamic tidal influences directly on the
samples, acting as a carrier and modifying factor. Also according to the taphomonic
signatures found the study area has great heterogeneity regarding the environmental
dynamics that produce the signatures studied, adjacent areas can produce different
signatures and distant areas can produce similar signatures.
Figura 1 – Pontos de coleta dos Materiais: Ponto A - Icapuí; Ponto B - Tibau; Ponto C -
Areia Branca; Ponto D - São Cristóvão; Ponto E - Ponta do Mel; Ponto F -
Diogo Lopes.........................................................................................................22
Figura 2 – Quantitativo de encalhes por área no período de 2005 à 2015............................26
Figura 3 Frequência dos registros de encalhes de acordo com o material coletado e identificado
de um n total de 19 registros....................................................................................27
Figura 4 – Exemplos de fragmentos de crânios analisados; A. peça AC-PCCB 001,
fragmento de occipital de Balaenopteridae; B. peça AC-PCCB 028 caixa
craniana de Sotalia guianensis.............................................................................28
Figura 5 – Classes de ossos pós-cranianos encontradas; A. vértebras caudais de Tursiops
truncatus do registro AC-PCCB 006; B. arcos hemais de T. truncatus do registro
AC-PCCB 006; C., costelas de S. guianensis do registro AC-PCCB
037........................................................................................................................29
Figura 6 – Tipos de quebras encontrados no material de estudo; A. Quebra tipo colunar em
rostro de Sotalia guianensis do registro AC-PCCB 015; B. Quebra tipo dente de
serra em escápula de Sotalia guianensis do registro AC-PCCB 031; C. Quebra
tipo irregular perpendicular em processo espinhoso de Sotalia guianensis do
registro AC-PCCB 037; D. Quebra tipo perpendicular lisa em rostro de S.
guianensis do registro AC-PCCB 005.................................................................30
Figura 7 – Marcas de intemperismo; A. Descamação óssea em costela do registro AC-
PCCB 045 em estágio tipo três de intemperismo; B. Flaqueamento em costela de
baleia do registro AC-PCCB 003; C. Craqueamento em costela de baleia do
registro AC-PCCB 003........................................................................................31
Figura 8 – Marcas de abrasão e corrosão. A. marcas de abrasão no osso esquamosal e
frontal em crânio de Sotalia guianensis no registro AC-PCCB 038; B. vértebra
de baleia com alto grau de corrosão do registro AC-PCCB 032; C. vértebra
torácica de Sotalia guianensis com marcas de abrasão do registro AC-PCCB
026; D. côndilos occipitais de balaenopetídeo com marcas de abrasão do registro
AC-PCCB 001; E. marcas de corrosão na cabeça de vértebra de baleia do
registro AC-PCCB 003; F. vértebras caudais de Tursiops truncatus com marcas
de abrasão no corpo vertebral do registro AC-PCCB 006...................................33
Figura 9 – Marcas de dentes em costela de baleia do registro AC-PCCB 003.....................34
Figura 10 – Marcas por aves de rapina (setas pretas). A. marca em osso supraoccipital de
Sotalia guianensis no registro AC-PCCB 005. B. marca em mandíbula de
Sotalia guianensis no registro AC-PCCB 025.....................................................35
Figura 11 – Marcas de ações antrópicas. A. marcas de cortes em costela de baleia AC-PCCB
003; B. Marcas de cortes em occipital de Sotalia guianensis AC-PCCB 005; C.
marcas de cortes em processo transverso de vertebra de Sotalia guianensis AC-
PCCB 37; D. marcas de cortes em osso pariental de Sotalia guianensis AC-
PCCB 005; E. marca de corte profundo em escápula de Sotalia guianensis AC-
PCCB 031; F. marca de cortes em porção distal do corpo de uma costela de
Sotalia guianensis AC-PCCB 031.......................................................................36
Figura 12 – Marcas de retroalimentação tafonômica na peça AC-PCCB 038. A. presença de
cracas na região ventral de crânio de Sotalia guianensis. B. presença de cracas
na região occipital de crânio de Sotalia guianensis.............................................38
Figura 13 – Exemplo de retroalimentação tafonômica relacionado à presença de cracas na
região ventral esquerda de vértebra de Cetacea, AC-PCCB 032.........................38
Figura 14 – Dendograma resultante de análise de cluster mostrando as semelhanças das
localidades por assinatura tafonômica.................................................................39
Figura 15 – Dendograma resultante da análise de cluster mostrando as semelhanças dos taxa
identificados com base nas assinaturas tafonômicas...........................................40
Figura 16 – Processo de preenchimento dos poros da cavidade óssea responsável pela
permineralização no registro AC-PCCB 001.......................................................45
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Registro dos encalhes ocorridos na área de estudo durante o período de 2005 a
2015......................................................................................................................22
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
I INTRODUÇÃO 15
I.1 TAFONOMIA E PALEOECOLOGIA 15
I.2 USO DA TAFONOMIA EM ESTUDOS COM MAMÍFEROS
MARINHOS 16
I.3 ESTUDOS COM OSSOS DE MAMÍFEROS MARINHOS NO
BRASIL 18
II OBJETIVOS 20
II.1 OBJETIVO GERAL 20
II.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 20
III MATERIAIS E MÉTODOS 21
III.1 MATERIAL OSTEOLÓGICO 21
III.2 ÁREA DE ESTUDO 21
III.3 ASSINATURAS TAFONÔMICAS 23
III.4 ANÁLISE DE CLUSTER 24
IV RESULTADOS 26
IV.1 CARACTERIZAÇÃO DAS MARCAS TAFONÔMICAS 30
IV.1.1 QUEBRAS 30
IV.1.2 INTEMPERISMO 31
IV.1.3 ABRASÃO E CORROSÃO 32
IV.1.4 NECROFAGIA/PREDAÇÃO 34
IV.1.5 AÇÃO ANTRÓPICA 35
IV.1.6 RETROALIMENTAÇÃO TAFONÔMICA 37
IV.1.7 ANÁLISE DE CLUSTER 39
V DISCUSSÃO 41
V.1 REPRESENTAÇÃO ÓSSEA 42
V.2 FEIÇÕES TAFONÔMICAS 43
V.3 ANÁLISE DE CLUSTER 46
VI CONCLUSÕES 48
VII REFERÊNCIAS 49
15
Introdução
II. Objetivos
Figura 1. Locais de ocorrência dos encalhes e coleta das amostras: Ponto A - Tibau;
Ponto B – Gado Bravo; Ponto C – São Cristóvão; Ponto D - Ponta do Mel; Ponto E –
Areia Branca; Ponto F - Diogo Lopes; Ponto G – Tremembé.
Tabela 1.
Registro dos encalhes ocorridos na área de estudo durante o período de 2005 a 2015.
Ano da
Acervo PCCB Táxon coleta Local de origem Material
Praia do Rosado -
AC-PCCB 001 Balaenopteridae 2005 Areia Branca/RN Fragmento de Crânio
Diogo Lopes –
AC-PCCB 003 Cetacea 2005 Macau/RN 1 Costela
Praia de São
Sotalia Cristovão - Areia
AC-PCCB 005 guianensis 2005 Branca/RN Crânio
24
16 Vértebras, 10 arcos
Tursiops hemais, 4 costelas e 4 ossos
AC-PCCB 006 truncatus. 2006 Praia de Tibau/RN indeterminados
Sotalia Praia de Porto do
AC-PCCB 008 guianensis 2006 MangueMangue/RN Crânio
Trichechus
AC-PCCB 010 manatus 2006 Praia de Macau/RN Esqueleto incompleto
Sotalia
AC-PCCB 015 guianensis 2007 Sem procedência Crânio
Praia de Ponta do
Mel- Areia
AC-PCCB 032 Cetacea 2009 Branca/RN 1 Vértebra
grupos (Hammer & Harper, 2006). Esta análise foi realizada por meio do software
PAST (Paleontological Statistics) versão 2.17c utilizando o algoritmo de agrupamento
UPGMA (average linkage clustering) e a distância euclidiana calculada a partir de duas
matrizes, uma relacionando as localidades dos encalhes pelas assinaturas tafonômicas
encontradas e a segunda relacionando os taxa encontrados também pelas assinaturas
tafonômicas. No algoritmo UPGMA, a distância entre duas unidades amostrais ou
variáveis é gerada através da média das distâncias entre os elementos de ambos os
grupos (Araújo-JR. et al., 2011). A distância euclidiana é a distância linear entre os
pontos x e y em um espaço multidimensional (Hammer & Harper, 2006).
26
IV. Resultados
18cm
6cm
IV.1.1 Quebras
Shipman (1981) descreve sete tipos gerais de fraturas que podem ser encontradas
em ossos. No material analisado foram encontrados 4 tipos de quebras: quebra em
coluna, em dente de serra, perpendicular irregular e perpendicular lisa (fig. 6).
A B
C D
IV.1.2 Intemperismo
A B
A B C
D E F
33
A 2,5 cm B
9 cm
C D
15 cm
E 4 cm F
IV.1.4 Necrofagia/Predação
1,3cm
29cm
Figura 9. Marcas de dentes em costela de baleia do registro AC-PCCB 003.
Outros dois registros possuíam marcas condizentes com necrofagia por aves de
rapinas. Comparando as marcas com as descritas nos trabalhos de Reeves (2009) e
Ballejo et al. (2016) foi possível identificá-las como sendo causadas por comportamento
de necrofagia de urubus. A peça AC-PCCB 005 possuía duas marcas no osso
supraoccipital esquerdo. Tais marcas são retilíneas dispostas em posição perpendicular
uma a outra com leve sobreposição em uma das extremidades, (Figura 10A). A peça
AC-PCCB 025 possui, na região medial-proximal de sua maxila esquerda uma marca
isolada retilínea, indo da porção dorsal até próximo ao alvéolo dentário (Figura 10B).
35
A A
3 cm
2 cm
Figura 10. Marcas por aves de rapina (setas pretas). A. marca em osso supraoccipital de S.
guianensis no registro AC-PCCB 005. B. marca em mandíbula de S. guianensis no registro
AC-PCCB 025.
Foram registradas em pelo menos quatro amostras marcas compatíveis com ação
antrópica. As marcas foram feitas por objetos cortantes, provavelmente facas, que
resultaram em cortes de padrão aleatório com canais profundos, finos e com
36
8 cm 3 cm
C D
2 cm
3 cm
E F
2 cm
Figura 11. Marcas de ações antrópicas. A. marcas de cortes em costela de baleia AC-PCCB
003; B. Marcas de cortes em occipital de S. guianensis AC-PCCB 005; C. marcas de cortes
em processo transverso de vertebra de S. guianensis AC-PCCB 37; D. marcas de cortes em
osso pariental de S. guianensis AC-PCCB 005; E. marca de corte profundo em escápula de S.
guianensis AC-PCCB 031; F. marca de cortes em porção distal do corpo de uma costela de
S. guianensis AC-PCCB 031.
37
B
A
2cm
38
2cm
2 cm
4cm
N
e/R N N
gu o/R N N l/R
n E ã /R a /R e
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P o Tib Sã Dio Ar Po
10
20
30
40
Distance
50
60
70
80
90
100
Também foi feita uma análise de cluster comparando a semelhança entre os taxa
em relação às assinaturas tafonômicas encontradas (fig. 15). No dendograma resultante
40
atu
s tus eph si s
c ana croc ade nen
trun s_m ma teri d ia
ps_ hu er_ op eae _gu
sio he c se t aen tac ali a
Tur Tri c Phy Bal Ce Sot
16
32
48
64
Distance
80
96
112
128
Figura 15. Dendograma resultante da análise de cluster mostrando as semelhanças dos taxa
identificados com base nas assinaturas tafonômicas.
41
V. Discussão
Embora o isolamento das praias possa ser um fator que dificulta o registro e
coleta de material biológico, ele também é importante para o entendimento da dinâmica
ecológica do litoral. As carcaças de animais encalhados passam pouco tempo nas áreas
onde há maior presença humana. Neste estudo, dois dos registros não possuíam
nenhuma marca de assinatura tafonômica, muito provavelmente devido à rápida
recuperação da carcaça. Segundo o IBGE (IBGE, 2010) o município de Areia Branca,
onde ficam as praias de Ponta do Mel e São Cristóvão, teve um crescimento
populacional de 12% entre os anos de 2005 e 2010, coincidindo também com o resgate
de duas das três carcaças incompletas.
42
Nos mamíferos marinhos, como todos os mamíferos, vértebras são os ossos mais
comuns (Liebig et al., 2003). Neste estudo foram encontradas 138 vértebras, um
número bem abaixo do esperado pelo número de crânios encontrados. Ao total foram
encontrados 12 crânios, sendo 10 deles da espécie S. guianensis. Para esta espécie o
número de vértebras pode variar entre 52 e 56 ossos (Fettuccia, 2004). Tendo sido
encontrados 10 crânios, o número esperado de vértebras deveria variar entre 520 e 560.
O mesmo ocorre com as costelas, apresentando número muito abaixo do esperado, de
pelo menos 240. Tanto as vértebras quanto as costelas analisadas incluem espécies além
daquelas representadas pelos crânios, sendo que em um registro é o único material para
a espécie T. truncatus. A maior representatividade de crânios em relação aos outros
ossos pode indicar uma intensa ação das marés no processo de retrabalhamento das
carcaças. Nesse contexto, ossos mais leves seriam mais facilmente transportados pelas
marés em relação aos crânios, que são bem mais pesados. Outro fator para o número
maior de crânios é a interação com a pesca artesanal ao longo da área de estudo.
Attademo (2005 e 2007) constatou a utilização de pequenos cetáceos como isca de
espinhel para pesca de cações. Nessas situações os animais são descarnados e
descartados das embarcações ainda em mar para evitar vestígios de captura. Esta prática
pode deixar marcas de cortes principalmente próximo ao forame magno ou nos côndilos
occipitais, (fig. 11B). As cabeças não são utilizadas nessa prática e são descartadas no
mar, sendo carreadas pelas marés até encalharem nas praias. Porém, neste trabalho
apenas um dos crânios encontrados possuíam marcas de cortes na região occipital,
condizentes com os achados de Attademo (2005 e 2007). Neste caso a pesca pode não
ser um fator determinante para o alto número de crânios. Por outro lado, não podemos
descartar hipótese da influência da pesca nestes registros, pois alguns mamíferos
marinhos podem vir a óbito emalhados nas redes de pesca e não terem as carcaças
usadas pelos pescadores.
Podemos então destacar que para o litoral setentrional do Rio Grande do Norte
os crânios de mamíferos marinhos são os ossos melhor representados, tendo em vista
sua baixa transportabilidade ou interferência antropogênica, como anteriormente citado.
Porém vértebras representam melhor a fauna da região, tendo vista que foram
encontradas vertebras para todas as espécies em que ocorreram encalhes no intervalo de
tempo considerado neste estudo.
43
carcaças de baleias (Fallows et al., 2013). Desta forma é mais provável que esse osso
tenha sido transportado do alto-mar, onde a baleia deve ter morrido, para praia. Não
foram identificadas marcas de mamíferos terrestres carniceiros, como por exemplo
raposas, em nenhuma das peças analisadas. Uma possível explicação é que no material
analisado já não havia mais material biológico que pudesse ser aproveitado pela fauna
local quando o encalhe aconteceu.
Por se tratar de uma zona litorânea com forte influência das marés e correntes
marinhas, algumas peças analisadas apresentaram marcas de abrasão e corrosão,
provocadas pelo atrito da água no osso. Como dito anteriormente, a área de estudo é o
litoral mais seco do Brasil, o que faz com que a incidência solar seja mais significativa
para as marcas de intemperismo. A peça com maior corrosão é uma vértebra de baleia
com erosões principalmente nos processos transversos e espinho neural. Marcas de
abrasão são geralmente associadas a transporte do osso do ponto de óbito ao ponto de
coleta. Porém, alguns autores (i.e. Araújo-Júnior, 2013; Araújo-Júnior, 2015; Shipman,
1981; Argast et al., 1987; Lopes, 2009; Simões et al., 2010a; Lopes e Buchmann, 2011),
afirmam que a abrasão pode ocorrer através do retrabalhamento do osso sem que este
seja transportado por longas distâncias.
45
Figura 16. Processo de preenchimento dos poros da cavidade óssea responsável pela
2 cm
permineralização no registro AC-PCCB 001, foto realizada com máquina usando função macro
e zoom digital de 4x.
VI. Conclusões
VII. Referências
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