Os Ingarikó (Kapon)
Os Ingarikó (Kapon)
Os Ingarikó (Kapon)
Os Ingarikó (Kapon) na
Terra Indígena Raposa
Serra do Sol
O presente ensaio etnográfico
mostra formas cotidianas dos Ingari-
kó (Kapon) que habitam a região do
Circum-Roraima (Brasil). A mediação
entre a literatura e o depoimento dos
Ingarikó, ocorrida durante a experi-
ência de campo (1999-2002), permite
visualizar situações de contato des-
ses índios com diferentes povos e
suas estratégias de organização po-
lítica ante a sociedade nacional. Dessa
relação dinâmica são colhidos ele-
mentos da cultura tradicional por eles
preservados e novos elementos por The present ethnographic essay re-
eles absorvidos. Os Ingarikó colo- veals the quotidian forms of the In-
cam-se como atores juntamente com garikó (Kapon) that inhabit the Cir-
os Makuxi, os Taurepang e os Pata- cum-Roraima region (Brazil). The
mona no enfrentamento das relações mediation between the literature and
socioespaciais que configuram a Ter- the statements of the Ingarikó during
ra Indígena Raposa Serra do Sol. fieldwork (1999-2002) allows the ob-
servation of situations of contact be-
tween this indigenous people and
other peoples as well as their politi-
cal strategies regarding the national
society. From this dynamic relati-
onship, the Ingarikó have preserved
elements of their traditional culture
Odileiz Cruz: Professora
while absorbing new elements. The
de Lingüística da Univer-
sidade Federal de Rorai- Ingarikó are social actors, together
ma e doutora em Letras with the Macushi, Taurepang and
pela Vrije Universiteit
Patamona, in the socio-spatial rela-
Amsterdam. Concluiu o
pós-doutorado em Leiden tions that make up the indigenous
Universiteit . land known as Raposa Serra do Sol.
2 LOCALIDADE E POPULAÇÃO
*Duas outras aldeias ou malocas estão localizadas na áreas Ingarikó: Kanawapai com
aproximadamente 64 pessoas e Sarawó com mais ou menos 45 pessoas.
4 A CULTURA EM MOVIMENTO
4.2 Casamentos
Entre os Kapon um status marital era consagrado através
de alianças, às vezes interétnicas, mediadas pelos interesses
das famílias. A poligamia era socialmente aceita e um líder
podia ter até cinco esposas, conforme Fr. Cary-Elwes (1921)
apud Butt Colson (1998:51). A prática da poligamia sororal,
ou seja, um homem casar com várias irmãs, era comum entre
os índios. Ainda hoje, existem casos de bigamia entre os Inga-
rikó. O tuxaua do Manalai, João Sales, tem duas esposas, Au-
lida (Ingarikó) e Celestina (Patamona).39 O pré-requisito para
que um indivíduo possa ter mais de uma esposa está vincula-
do ao seu potencial de trabalho. Se o índio é um homem forte e
tem condições de trabalhar para manter mais de uma família,
os compromissos matrimoniais podem ser realizados.
Todavia a prática de poligamia ou bigamia tem dividido
4.5 Educação
A política nacional para educação escolar indígena foi defi-
nida pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), em 1993, no
documento Diretrizes para a Política Nacional de Educação
Escolar Indígena, e teve como princípio o reconhecimento dos
direitos indígenas, entre eles o de falar e manter a língua nati-
va e o seu ensino.
O MEC adotou o conceito de interculturalidade, abalizado
pela diversidade cultural do país, e redefiniu a escola como um
espaço de diálogo, de descoberta e não mais como um apare-
lho de “civilização” e “integração à sociedade nacional”. Essa
instituição também se valeu do conceito de especificidade por
reconhecer a diferenciação, marcada pela existência de 220
povos indígenas e suas 180 línguas/dialetos (Rodrigues, 1986),
pois todos esses povos têm tradições culturais específicas e
vivem processos históricos distintos no Brasil.
Concebida a escola indígena a partir desses princípios, pas-
sou-se a observar qual era a realidade da educação escolar na
área Ingarikó. Em meados dos anos 1990, a Secretaria de Edu-
cação do Estado de Roraima tentou introduzir o ensino bilín-
REFERÊNCIAS
2
Termo usado por Cesário Armellada ao referir-se às terras altas e baixas que circundam
o Monte Roraima (Butt Colson, 1985, p. 104). Múltiplas culturas e mitos vinculados aos
povos Karíb floresceram tradicionalmente no Roroimë ‘grande monte verde’ em Ingarikó
(ver 3.2 e 5). Reis (2006) faz descrições detalhadas sobre esse ponto indicando traços
geológicos e coordenadas.
3
O nome Kapon foi registrado pela primeira vez por W. Hilhouse (1832, p. 232, 236), um
funcionário da Coroa Britânica que trabalhava na Guiana, atual República Cooperativista
da Guiana. Descritivamente o nome Kapon pode ser glosado como ka’+po-n>ka+po-
n=céu+Locativo-origem ‘gente (que veio) do céu’.
4
Afora os outros nomes, uma etimologia possível para o Ingarikó dá-se pela segmenta-
ção de suas partes: inga-rï-komo>inga-rï-ko=serra, mata espessa-elemento de coesão-
coletivo: origem ‘habitantes das serras’; outra possibilidade seria inga-rï-koto>inga-rï-
kok>inga-rï-ko’=mata alta-elemento de coesão-grupo de pessoas ‘povo da mata espessa,
da montanha’, sendo essa última segmentação a mais plausível para esse estudo. O
registro de Butt Colson (1983-4, p. 96) se aproxima da descrição que se propõe inga
“mountain top” ‘topo da montanha’ -rï “belonging to” ‘pertencendo’ e -kok “people”
‘povo’, contudo a autora amplia sua interpretação quando vincula um sentido possivel-
mente análogo ao termo Kapon, por isso, o significado de “the above people” ‘povo em
cima’, “people dwelling in the sky” ‘habitantes do céu’.
5
A propósito, bem mais cedo, J. Williams (1906) apud Butt-Colson (1998, p. 49, 142-147)
identificou as tribos Akawaio (Sericon ou Serengong), Makuxi (Makou), Arekuna (Sere-
cuna) e por último Ingarikó ou Patamona (Incaco), sem, contudo, ter feito distinção
entre os grupos.
6
Lavrado é uma região de savana, mata rasteira, que compreende a parte nordeste do
Estado de Roraima. A área é habitada majoritariamente pelos Makuxi, depois pelos Wapi-
xana e em menor número pelos Taurepang.
7
Butt Colson (1998, p. 6), com base nos registros do Fr. Cary-Elwes (ver 3.1), passa a
considerar que os povos do Circum-Roraima sejam apenas dois: os Kapong composto
por Akawaio e Patamona e os Pemong incluindo Makuxi, Taurepang e Arekuna. Acredi-
ta-se que as formas de agrupar as diversas etnias classificando-as conforme os traços
culturais, uma delas, fortemente conjugada pela religião Aleluia, seja um processo
ainda em construção, pois ambos os grupos em um passado recente compartilharam
essa mesma religião. Ademais, historicamente esses grupos têm um domínio comum
sobre a vasta mitologia e contos da região que sob um olhar comparativo poderiam ser
mais explorados.
8
Entre as teorias de etnicidade Weber apud Barth (1969), aponta que “língua” e “religião”
têm um papel importante na formação de um grupo étnico se os seus membros compar-
tilham um código lingüístico comum ou um mesmo sistema ritual de vida. Weber obser-
va ainda que grandes diferenças dialetais ou religiosas podem ocorrer entre pessoas que,
contudo, percebam-se, subjetivamente, como membros de um mesmo grupo.
9
A propósito, Im Thurn (1883, p. 109) refere-se aos Ingarikó pela primeira vez como sendo
índios “híbridos”: formados por Makuxi e Arekuna.
10
Ressalte-se que o autor faz sua análise com base nos dados do Akawaio. Com os
trabalhos de Fox (2003) sobre Akawaio e de Cruz (2005a) sobre Ingarikó é possível se
perceber que, no mínimo, há diferenças dialetais e lexicais entre os dois registros. Essa
discussão, assim como a classificação lingüística Kapon-Pemon, merece ser aprofunda-
da tão logo se disponha de mais pesquisas sobre os três subgrupos falantes. Para o
momento, enquanto novas percepções não surgem, acompanha-se a tendência política
dos Ingarikó que é o legitimar sua fala como língua. Vale apontar aqui as palavras de
Koch-Grünberg ([1917] 2006, p. 127) sobre o Ingarikó: “... consigo anotar algumas cente-
nas de palavras da língua com o velho careca do riacho Muréi, que é um Ingarikó. Essa
língua é parente próxima do Makuxi, mas diverge dele em algumas expressões. O timbre
é totalmente diverso... ”.
11
Por exemplo, o Mandarim se tornou a língua nacional da China em detrimento de vários
outros dialetos, inclusive do Cantonês que era e é falado por uma parte expressiva da
população. O pluralismo lingüístico chinês é decorrente das mesclas étnicas, culturais e
religiosas (Blum, 2000).
12
Em 1998 uma expedição envolvendo pesquisadores da Universidade Federal de Roraima
(UFRR), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do Museu Integrado de
Roraima (MIR), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA),
da Escola Técnica Federal de Roraima, da FUNAI e da Coordenadoria de Turismo do Estado
documentou novos paradigmas geodésicos, reconhecendo que a área de fronteira do
extremo norte do país não era mais o Oiapoque (Amapá), mas sim a região onde está
localizada o Monte Caburaí (Roraima). Precisamente, o Monte Caburaí tem 1.465m de
altitude e faz fronteira entre o Brasil e Guiana (Arantes, 2008). Internamente este ponto
geográfico está localizado na TIRSS, circunscrito, mais particularmente, na área Ingarikó.
No Monte Caburaí existem vários pontos geográficos carregados de semanticidade, por
exemplo, da pedra principal que recebe o nome composto: wopawarai wopa-warai=círculo
(cesto, balaio)-ASP semelhante a, Lit: ‘a pedra que se parece com um balaio’. Além disso,
é nesse Monte que nasce o rio Waiyan waiya-n=anta-origem, significando ‘local de
origem das antas (nascimento/reprodução)’, Uailã em português.
13
Segundo os moradores do Manalai, nas cabeceiras do rio Panari e Monte Caburaí ainda
moram índios arredios, os quais não querem contato com outros grupos, nem com os
próprios Ingarikó. Embora uns digam que esses índios são os próprios Ingarikó, outros
desconhecem quem são exatamente esses índios (Cruz, 2000, nota de campo).
14
Santina Domente Ingarikó, Martins Domente Ingarikó, Bento Brasil, Luciano Soares,
João Sales, Aulida, Celestina e Inácio, todos moradores do Manalai, são os informantes
mais velhos que participaram das entrevistas abertas e, por conseguinte, deram seus
depoimentos. O fato de nenhum deles falar inglês é algo curioso, pois teriam eles se
isolado na mata, no Brasil ou na Guiana, fugindo do contato (ver 2.1). O domínio do inglês
por eles era esperado uma vez que os Akawaio e os Patamona falam essa língua.
15
Nesse contexto, mensurar faixa etária para um indígena é quase sempre uma questão
arbitrária. Durante uma visita à aldeia de Sauparú, encontrou-se uma pessoa que os
Ingarikó apontam como sendo a mais velha da comunidade. Ela chama-se Rosa Sousa,
com aproximadamente 93 anos. Para surpresa dos professores presentes, no decorrer da
conversa, descobriu-se que ela é uma índia Makuxi que casou com um índio Akawaio. À
parte de sua origem, tanto ela quanto os filhos adotam a postura de que são Ingarikó. Em
16
A opção por manter o registro com os números da época é para que se disponha de
paradigmas junto aos atuais números, que somam em torno de quase 1.180 pessoas
(COPING, 2007, comunicação pessoal).
17
Awentëi I está inserido dentro da área do Manalai, portanto não se constitui em uma
aldeia à parte como Awentëi II.
18
Faz parte do perímetro dessa aldeia um lugar chamado de Karamanpatai que foi repor-
tado por C.W.Anderson (1906, p. 21-22. F.C.0. n 10943: novembro) como Karamangbak-toi.
Recentemente Butt Colson (1998, p. 150, nota 54) confirma que naquele local habitavam os
Akawaio.
19
A divisão maloca Serra do Sol I e II ocorria por questões internas de ordem política e
religiosa. Em 2002, a partir do último consenso entre os Ingarikó, a Serra do Sol fundiu-
se, passando a ser uma só maloca.
20
A planta/árvore mana ‘arumã’ tem um valor muito importante para os Ingarikó, pois é
dela que os índios subtraem a matéria-prima para a confecção do artesanato em palha.
21
Aldeia onde se desenvolveu a pesquisa de campo entre os anos de 1999 até 2002. O
levantamento preliminar sobre a formação social (etnográfica) do Ingarikó foi vencido em
2000, e o tempo restante foi dedicado à pesquisa lingüística. No total foram 11 meses de
convivência junto aos Ingarikó. Além desses dados, também são inseridas no presente
artigo novas informações que se fizeram pertinentes à discussão.
22
Sales foi um Patamona que casou com uma índia Taurepang e deles nasceram João,
Manoel e Gelita Sales. A despeito da origem dos pais, os filhos nomeiam suas famílias
como de origem Ingarikó, embora seja curioso que eles apontem a família Moisés
como Patamona.
23
O principal informante dessa pesquisa, Martins Domente Ingarikó, assim conhecido e
chamado até pouco tempo, mudou o nome ao retirar sua cédula de identidade, passando
a chamar-se Martins Jan Edman. Com efeito, todos na aldeia têm um nome tradicional que
só é revelado se houver intimidade e confiança entre as partes.
24
Butt Colson (1998, p. 162, nota 119) disse que a antiga Serenamu era uma aldeia habitada
pelos Akawaio.
25
Além dos Karíb, os Wapixana, da família Aruák, também estão incluídos neste contexto
histórico, todavia não fazem parte do presente estudo.
26
O conceito histórico atribuído à “guerra justa” era de cunho teológico e jurídico, além
de fundamentar-se no direito de guerra medieval (ver maiores detalhes em G. Thomas,
1982, p. 49 e Cunha, 1985a, p. 63).
27
A missão dos Moravianos que se destinava aos povos das Guianas iniciou seu processo
de negociações primeiramente para o Suriname e depois para Berbice, entre 1736 e 1739.
Depois de 1740 eles fundaram no rio Essequibo – Guiana, a missão de Pilgerhut, a qual foi
fechada em 1763. O nome da missão em holandês era Evangelische Broedergemeente,
28
A palavra Hallelujah foi registrada inicialmente na literatura inglesa pelo bispo Coleridge
apud Brett (s/d, p. 241) às margens do rio Corentyne (fronteira da Guiana com o Surina-
me). Já se dispõe de uma literatura razoável que trata da temática religiosa, por exemplo,
entre os Kapon e Pemon Koch-Grünberg ([1917] 2006), Butt Colson (1985, 1998), Fox (2003),
e Abreu (1995) que particularmente estudou a religião entre os Ingarikó na aldeia Serra do
Sol. Portanto, como não é alvo desse artigo estudar a religião, os depoimentos dos
Ingarikó servem como registro da memória vigente sobre o assunto como se vê a seguir:
Martins Domente apresenta duas versões para a chegada da religião ao Brasil, na primeira,
ele afirma que o Aleluia foi trazido para suas aldeias através do pastor Johns da maloca do
Limão (aldeia Makuxi) e, na segunda, diz que o Aleluia teria nascido na maloca da Raposa
(aldeia Makuxi), seguindo de lá para a Guiana e depois voltado para o Brasil, isto é, o
controle da religião alternou-se periodicamente entre os grupos e em diferentes épocas.
Essa última versão foi confirmada, em conversa aberta, pelos Makuxi e Taurepang (Cruz,
2001, nota de campo). Na subjacência dos depoimentos parece haver um julgamento de
valor, ou mesmo de status, para definir quem trouxe a religião para suas comunidades.Vale
notar que Koch-Grünberg (op. cit.) já dizia que o movimento religioso Aleluia tornou-se
mais forte entre os Ingarikó, no início do século XX, quando os Makuxi o abandonaram.
O termo Aleluia pode ser referido indistintamente como religião ou ritual.
29
Farage (1991, p. 101-110) aponta o ‘canibalismo’ em fontes do período contato e coloni-
al, assunto esse fortemente vinculado aos povos Karíb.
30
Partindo desse depoimento, especula-se sobre o nome genérico warawo’ ‘homem’ que
sustenta a seguinte morfologia: wara-wo’=parecido com, semelhante-caça, ‘homem que
parece caça’.
31
Koch-Grünberg (1916) também registrou Makunaíma como um personagem mitológico
dos grupos Karíb da região, enfatizando-o no contexto Taurepáng e Arekuná. A propósito,
bebendo dessa fonte, o escritor Mário de Andrade projetou Makunaíma na literatura
brasileira. Esse nome e outros aparecem grafados diferentemente visto as fontes se
respaldarem em informantes, provavelmente, de distintas línguas ou dialetos.
32
Atualmente, a maioria das doenças é tratada com medicamentos dos brancos em
substituição aos rituais de cura e pajelança. Vale notar que essa mudança de postura se
deve, entre outros fatores, à falta de pajés. No início da pesquisa de campo em 1999 havia
três pajés em toda área Ingarikó, porém em 2002 apenas um pajé, visto os outros dois
terem sido mortos pelo canaimé. Segundo o depoimento de algumas pessoas mais velhas
do Manalai, hoje, ninguém quer se preparar para ser pajé, porque é um sacrifício muito
árduo para o pretendente (Cruz, 2002, notas de campo).
33
Martins Domente não soube precisar, mas disse que acompanhou Rondon quando esse
visitou a região para colocar os marcos que definiam os limites territoriais entre Brasil-
Guiana-Venezuela. O exame desses relatórios de viagem à região é uma questão que não
foi vencida nesse artigo.
34
Os rituais de iniciação são diferentes para meninos e meninas: aos meninos costuma-
lhes ser aplicada uma surra de formiga vermelha, por ocasião da primeira caçada formal,
cujo objetivo é o de encorajá-los àquela atividade; enquanto para as meninas, os rituais
mais usados incluem a reclusão durante o período da primeira menarca e a inserção das
35
Em 1999, por ocasião da II Assembléia Geral do Povo Ingarikó, foi criado um novo cargo
denominado de Coordenador Geral do Povo Ingarikó. A criação desse cargo deu-se em
função de uma demanda por parte do povo Makuxi e Ingarikó, respectivamente. O Coorde-
nador Geral passou então a representar politicamente os Ingarikó perante os Makuxi,
demais etnias e junto à sociedade nacional. Essa nova posição ainda não foi incluída na
estrutura do campo político, visto ser um cargo que está em processo de estabilização e
assimilação por parte dos Ingarikó.
36
Antes de 1999 o Projeto de Gado entrou na área Ingarikó por iniciativa do Conselho
Indígena de Roraima. Ao serem consultados alguns dos relatórios desse projeto, após
12 anos de execução, observou-se que as tentativas de inserção da cultura agropecuária
nessas comunidades, ainda que para consumo, não têm sido bem-sucedidas ao longo
dos tempos. Fatores como o despreparo do vaqueiro para o manuseio diário com o
gado, o fato de a região ser inóspita para o animal e das doenças não têm contribuído
para o êxito desse projeto. Este tipo de atividade, claramente, não é de domínio da
cultura dos Ingarikó.
37
Os Ingarikó adotam uma postura de “tolerância religiosa”, pois, além de respeitarem os
Makuxi que são hoje católicos e os Taurepang que são adventistas, podem participar de
qualquer ato ou cerimônia religiosa independente da instituição.
38
Caxiri é uma bebida feita à base de mandioca misturada com batata. Essa bebida junta-
mente com o beiju e a damorida (caldo de pimenta quente) faz parte da dieta básica de todas
as comunidades.
39
Antigamente as esposas compartilhavam a mesma moradia, hoje, no entanto, elas
moram em casas separadas, mas convivem tanto elas quanto seus filhos socialmente em
harmonia.
40
Uma canoa nova podia ser vendida por uma quantia de até R$ 500,00 (quinhentos reais,
aproximadamente US$ 180,00) em meados de 1999.
41
Mediante a inquietação por parte dos alunos e professores quanto ao ensino bilíngüe
Português e Makuxi sem a inclusão do Ingarikó, ao final da primeira pesquisa de campo
(1999), foi montado um curso de iniciação ao estudo da gramática Ingarikó (60 horas),
com o intuito de auxiliar os professores. Participaram do curso 11 professores (makuxi e
ingarikó), vários alunos e a comunidade de Sauparú. O evento contou com o apoio do
Departamento de Língua Vernácula da Universidade Federal de Roraima e do Departamen-
to de Assuntos Indígenas do Governo de Roraima. Naquela ocasião, os professores e os
alunos requisitaram a adoção de uma cartilha na língua materna como instrumento que
poderia auxiliar no ensino do Ingarikó.
42
O projeto de implantação das escolas indígenas de 1º. Grau na área foi elaborado pela
autora desse artigo juntamente com uma equipe de professores e alunos.