Franciele Letícia Kühl

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UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL - UNISC

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – MESTRADO


ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DEMANDAS SOCIAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS
LINHA DE PESQUISA POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO SOCIAL

Franciele Letícia Kühl

POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENDIMENTO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES


VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UMA ANÁLISE NO MUNICÍPIO
DE SANTA CRUZ DO SUL NO PERÍODO DE 2014 A 2018

Santa Cruz do Sul


2018
Franciele Letícia Kühl

POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENDIMENTO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES


VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UMA ANÁLISE NO MUNICÍPIO
DE SANTA CRUZ DO SUL NO PERÍODO DE 2014 A 2018

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado
em Direito. Área de Concentração em Políticas
Públicas. Linha de pesquisa em Políticas
Públicas de Inclusão Social, Universidade de
Santa Cruz do Sul – UNISC, como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre em
Direito.

Orientador: Prof. Dr. André Viana Custódio

Santa Cruz do Sul


2018
Franciele Letícia Kühl

POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENDIMENTO ÀS CRIANÇAS E ADOLESCENTES


VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR: UMA ANÁLISE NO MUNICÍPIO
DE SANTA CRUZ DO SUL NO PERÍODO DE 2014 A 2018

Esta dissertação foi submetida ao Programa de


Pós-Graduação em Direito – Mestrado e
Doutorado em Direito. Área de Concentração
em Políticas Públicas. Linha de pesquisa em
Políticas Públicas de Inclusão Social,
Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC,
como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Direito.

________________________________
Dr. André Viana Custódio
Professor Orientador – UNISC

________________________________
Dra. Marili M. M. da Costa
Professora examinador – UNISC

________________________________
Dr. Ismael Francisco de Souza
Professor examinador -Membro Externo

Santa Cruz do Sul


2018
AGRADECIMENTOS

O mestrado é um desafio, nos deixa vulneráveis, coloca em evidência nossas


fraquezas e limitações. Mas é também libertador, entre alegrias e angustias, se
constrói uma dissertação, entre leituras e resenhas, se constrói um acadêmico. A
construção dessa pesquisa não se deu sozinha, muitas pessoas contribuíram para
que eu pudesse escrevê-la, desde as orientações, as aulas do mestrado, muitos
cafés acompanhados, muitas conversas cheias de ensinamento, conselhos, frases
de apoio e abraços silenciosos que me ajudavam a ter calma e faziam as nuvens
cinzas saírem e as ideais surgirem.
Ao Fernando Senna da Silva, ao qual compartilho a vida há quase 10 anos,
agradeço por cada madrugada que me ajudou a me manter acordada para ler e
escrever, por cada manhã que pacientemente me acordou, preparou meu café e me
ajudou a vencer o sono e o cansaço. Obrigada pela paciência nos dias difíceis, por
comemorar as pequenas conquistas e pela dedicação ao longo desse caminho.
Aos meus pais, Valdir Kühl e Vitória Kühl. Meu querido pai, que do seu jeito
me inspirou a ter coragem e a minha mãe que me incentiva com sua dedicação
diária e seus gestos de carinho. Às minhas irmãs, agradeço a compreensão pela
minha ausência, busco um futuro melhor para minhas sobrinhas.
Ao meu orientador, prof. André Viana Custódio, que sempre foi uma fonte de
inspiração, pela história, pelo conhecimento e pelo amor que coloca em seu
trabalho, essa pesquisa só foi possível com suas contribuições e ensinamentos.
Ao professor Nidal Ahmad e a professora Candisse Schirmer que me
auxiliaram e apoiaram a minha escolha, muito mais do que ser mestre, mas a de ser
professora.
Aos professores do PPGD da UNISC e as secretarias do programa.
Agradecimento especial a equipe de técnicos do Centro de Referência
Especializado de Assistência Social que gentilmente aceitaram participar da
pesquisa de campo e colaboraram com a elaboração desta pesquisa.
Aos colegas professores da Faculdade Dom Alberto. Em especial ao
coordenador prof. Diogo Durigon, por acreditar em mim.
Por fim, um agradecimento especial aos amigos que torceram e vibraram por
mim.
O DIREITO DAS CRIANÇAS

Toda criança no mundo


Deve ser bem protegida
Contra os rigores do tempo
Contra os rigores da vida.

Criança tem que ter nome


Criança tem que ter lar
Ter saúde e não ter fome
Ter segurança e estudar.

Não é questão de querer


Nem questão de concordar
Os diretos das crianças
Todos têm de respeitar.

Tem direito à atenção


Direito de não ter medos
Direito a livros e a pão
Direito de ter brinquedos.

Mas criança também tem


O direito de sorrir.
Correr na beira do mar,
Ter lápis de colorir…

Ver uma estrela cadente,


Filme que tenha robô,
Ganhar um lindo presente,
Ouvir histórias do avô.

Descer do escorregador,
Fazer bolha de sabão,
Sorvete, se faz calor,
Brincar de adivinhação.

Morango com chantilly,


Ver mágico de cartola,
O canto do bem-te-vi,
Bola, bola, bola, bola!

Lamber fundo da panela


Ser tratada com afeição
Ser alegre e tagarela
Poder também dizer não!

Carrinho, jogos, bonecas,


Montar um jogo de armar,
Amarelinha, petecas,
E uma corda de pular.

(Ruth Rocha)
RESUMO

Esta dissertação tem como objeto o estudo das políticas públicas de atendimento às
crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar no município de Santa
Cruz do Sul. O problema norteador da pesquisa consiste em: as políticas públicas de
atendimento de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar no
município de Santa Cruz do Sul atendem os requisitos normativos básicos previstos
nas diretrizes nacionais e os fundamentos da teoria da proteção integral para o
enfrentamento à violência sexual? Como hipótese ao problema, aponta-se que
apesar do município desenvolver políticas de atendimento às crianças e
adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar de acordo com as diretrizes
nacionais, há dificuldades para o enfrentamento à violência, devido a grande
demanda do município e a falta de recursos financeiros e humanos. Desta forma,
para responder o problema de pesquisa, definiu-se como objetivo geral, estudar as
políticas de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual
intrafamiliar no município de Santa Cruz do Sul tendo como referência as diretrizes
nacionais do Sistema Único de Assistência Social. Nos objetivos específicos, que
correspondem cada um dos capítulos, buscou-se descrever a proteção jurídica
contra violência sexual intrafamiliar de crianças e adolescentes no marco da teoria
da proteção integral. Verificar o contexto da violência sexual intrafamiliar no Brasil e
as responsabilidades intersetoriais de atendimento à criança e ao adolescente. E,
analisar a adequação das políticas públicas municipais de atendimento de crianças e
adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar de Santa Cruz do Sul às
diretrizes nacionais da política de enfrentamento à violência sexual. O método de
abordagem da pesquisa adotado é o dedutivo, caracterizando-se por ser um estudo
exploratório, possibilitando conhecer a realidade do município quanto às políticas de
atendimento, e também é um estudo explicativo, produzindo conhecimento e
contribuindo na elaboração ou adaptação de políticas públicas de atendimento de
crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar. O método de
procedimento será o monográfico com técnicas de pesquisa bibliográfica,
documental e de campo. A pesquisa de campo foi realizada no município de Santa
Cruz do Sul/RS, utilizando a entrevista semiestruturada.

Palavras-chave: Abuso sexual. Adolescente. Criança. Políticas Públicas. Teoria da


Proteção Integral.
ABSTRACT

This dissertation has as it main objective the study of public policies for the care of
childreen and teenagers victims of intrafamily sexual abuse in the county of Santa
Cruz do Sul. The guiding problem of the research consists of: Are the Public policies
for the care of children and teenagers victims of intrafamily sexual abuse in the
county Santa Cruz do Sul meeting the basic normative requirements set forth in the
national guidelines and the foundations of the theory of integral protection to
confront the sexual violente? As a hypothesis to the problem, it is pointed out that
althought the county develops policies of care for children and teenagers victims of
intrafamily sexual abuse according to national guidelines, there are difficulties to
confront violence, due to the great demand of the county and the lack of financial and
human resources. Thus, in order to answer the research problem, it was defined as
general objective to study the policies of policies of care for children and adolescents
victims of intrafamily sexual abuse in the municipality of Santa Cruz do Sul, having as
reference the national guidelines of the Single System of Social Assistance - SUAS.
In the specific objects, which corresponds to each of the chapters, it seeks to
describe the legal protection against intrafamily sexual violence of childre and
teenagers within the scope of integral protection theory. To verify the context of
intrafamily violence in Brazil and the intersectoral responsabilities of children and
teenagers care. And, to analyze the adequacy of the municipal public policies for the
care of children and teenagers victims of intrafamiliary sexual abuse in Santa Cruz
do Sul to the guidelines of the national policy to combat sexual violence. The
approach method of the reasearch is the deductive one, characterized as being an
extraploratory study, making possible to know the reality of the county as to the
attendance policies, and also is an explanatory study, producing knowledge and
contribuing in the elaboration or adaptation of the public policies to care for children
and teenagers victims of intrafamily sexual abuse. The method procedure will be the
monographic with bibliographic, documental and field techniques of research. The
field research was carried ou in the county of Santa Cruz do Sul/RS, using the semi-
structured interview.
Keywords: Sexual abuse. Teenager. Children. Policies. Theory of Integral
Protection.
LISTA DE TABELAS E GRÁFICOS

Tabela 01 – Registros de violência sexual – abuso, no período de janeiro de 2014


até outubro de 2018: ............................................................................ 87
Tabela 02 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências por região, segundo
a faixa etária de 0 até 19 anos de idade, entre 2009 até 2016: ........... 89
Tabela 03 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências por local de
ocorrência, segundo a faixa etária de 0 até 19 anos de idade, entre
2009 até 2016: ..................................................................................... 90
Tabela 04 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências na residência,
registradas como violência sexual, segundo a faixa etária de 0 até 19
anos de idade, entre 2009 até 2016: .................................................... 91
Tabela 05 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências na residência,
registradas como violência sexual, segundo a faixa etária de 0 até 19
anos de idade e autor da violência, entre 2009 até 2016: .................... 92
Tabela 06 – Composição do Centro de Referência da Assistência Social (CREAS):
........................................................................................................... 110
Tabela 07 – População residente por sexo: ............................................................ 120
Tabela 08 – População de negra de acordo com o bairro do município: ................ 120
Tabela 09 – População de acordo com sexo e faixa etária: .................................... 121
Gráfico 01: Grupo e faixa etária – 2010 .................................................................. 122
Tabela 10 – Pessoas cadastradas no Cadastro Único até agosto de 2018: ........... 123
Tabela 11 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violência, local de ocorrência,
no município de Santa Cruz do Sul, segundo a faixa etária de 0 até 19
anos de idade, notificações de 2014 até 2016: .................................. 124
Tabela 12 – Violência sexual, no município de Santa Cruz do Sul, segundo a faixa
etária de 0 até 19 anos de idade, autor, notificações de 2014 até 2016:
........................................................................................................... 125
Tabela 13 – Perfil dos entrevistados: ...................................................................... 137
Tabela 14 – Levantamento de obstáculos para execução do trabalho diagnosticados
através da entrevista: ......................................................................... 138
LISTA DE ABREVIATURAS

CAPS II – Centro de Atenção Psicossocial


CAPS AD III – Centro de Atendimento Psicossocial para Álcool e Drogas
CAPSIA – Centro de Atendimento Psicossocial da Infância e Adolescência
CECRIA – Centro de Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes
CEMAS – Centro Municipal de Atendimento à Sorologia
CEMAI – Centro Materno Infantil
CTA – Centro de Testagem e Aconselhamento
CEREST/VALES – Centro Regional de Referência em Saúde do Trabalhador da
Região dos Vales
CNE – Conselho Nacional da Educação
CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social
CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
COPAME – Associação Comunitária Pró Amparo do Menor
CRAS – Centro de Referência da Assistência Social
CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social
DATASUS – Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde
DPPA – Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento
DML – Departamento de Medicina Legal
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
ECPAT – End Child Prostitution and Trafficking
ESFs – Estratégia de Saúde da Família
FEBEM – Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor
FEE – Fundação de Economia e Estatística
FIA – Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente
FII – Ficha Individual de Investigação
FIN – Ficha Individual de Notificação
FUNABEM – Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
IBGE – Instituto brasileiro de Geografia e Estatística
Idep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LGBT – Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros
LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social
MDS – Ministério do Desenvolvimento Social
MEC – Ministério da Educação
NASF – Núcleo de Apoio à Saúde da Família
NOB/SUAS – Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social
NOB-RH/SUAS – Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema
Único de Assistência Social
OMS – Organização Mundial da Saúde
ONU – Organização das Nações Unidas
PAEFI – Serviço de Proteção e Atendimento Especializado à Família e Indivíduos
PAIF – Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família
PBF – Programa Bolsa Família
PETI – Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
PIB – Produto Interno Bruto
PIM – Programa Primeira Infância Melhor
PNAS – Política Nacional de Assistência Social
PNE – Plano Nacional de Educação
PNS – Plano Nacional de Saúde
PSC – Prestação de Serviço à Comunidade
PSE – Programa de Saúde na Escola
PSF – Programa de Saúde da Família
SAE – Serviço de Atenção Especializada
SDH – Secretaria de Direitos Humanos
SAMU – Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
SINAN – Sistema de Informação de Agravos de Notificação
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
SIPIA – Sistema de Informação para Infância e Adolescência
SIS – Serviço Integrado de Saúde
SNPDCA – Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do
Adolescente
SUAS – Sistema Único da Assistência Social
SUS – Sistema Único de Saúde
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
UAI – Unidade de Acolhimento Infanto Juvenil
UBSs – Unidades Básicas de Saúde
UPAs – Unidades de Pronto Atendimento
USP – Unidade de Saúde Prisional
Viva – Sistema de Vigilância de Violência e Acidentes
LISTA DE ANEXOS

ANEXO I – CARTA DE ACEITE ............................................................................... 173


ANEXO II – T ERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) ..... 174
ANEXO III – TERMO DE APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA – UNISC .............. 175
ANEXO IV – ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA ................................................. 177
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14
2. A PROTEÇÃO JURÍDICA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES CONTRA A
VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR. ................................................................. 21
2.1 A teoria da proteção integral e a responsabilidade compartilhada da família, da
sociedade e do estado na garantia dos direitos fundamentais da criança e do
adolescente. .............................................................................................................. 22
2.2 A proteção jurídica especial à criança e ao adolescente contra a violência sexual
intrafamiliar. ............................................................................................................... 31
2.3 O sistema de garantias de direitos e as responsabilidades intersetoriais no
enfrentamento à violência sexual intrafamiliar contra a criança e o adolescente ...... 43
2.4 As diretrizes nacionais de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de
violência sexual ......................................................................................................... 63
3. O CONTEXTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS
E ADOLESCENTES NO BRASIL. ............................................................................ 75
3.1 Modalidades de violência sexual contra crianças e adolescentes. ...................... 76
3.2 Dados oficiais disponíveis sobre violência sexual intrafamiliar............................ 85
3.3 Causas e consequências do abuso sexual intrafamiliar. ..................................... 94
3.4 As responsabilidades na política de atendimento à criança e ao adolescente
vítimas de abuso sexual intrafamiliar ...................................................................... 102
4. AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENDIMENTO PARA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR NO
MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL. ................................................................ 116
4.1 O contexto do município de Santa Cruz do Sul. ................................................ 116
4.2 As políticas públicas municipais de enfrentamento à violência sexual contra
crianças e adolescentes. ......................................................................................... 125
4.3 A atuação das equipes técnicas no atendimento à crianças e adolescentes
vítimas de abuso sexual intrafamiliar. ..................................................................... 136
4.4 A avaliação da política municipal de atendimento à crianças e adolescentes
vítimas de abuso sexual intrafamiliar de acordo com as diretrizes nacionais. ........ 145
CONCLUSÕES ....................................................................................................... 154
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 161
14

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa versa sobre o violência sexual intrafamiliar infantil, mais


especificamente sobre as Políticas Públicas de atendimento às crianças e
adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar: uma análise no município de
Santa Cruz do Sul no período de 2014 e 2018.
O desenvolvimento do estudo requer a compreensão de que crianças e
adolescente são pessoas em situação peculiar de desenvolvimento, devendo ser
garantidas oportunidades ao desenvolvimento integral, promovendo políticas
públicas pautadas sobre a égide do princípio da prioridade absoluta e do melhor
interesse da criança. A pesquisa é realizada com base no Sistema de Garantia de
Direitos da Criança e do Adolescente, tendo como marco teórico a Teoria da
Proteção Integral, que reconheceu os direitos de crianças e adolescentes.
Essa construção é realizada a partir da seguinte problematização: as políticas
públicas de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual
intrafamiliar no município de Santa Cruz do Sul atendem os requisitos normativos
básicos previstos nas diretrizes nacionais e os fundamentos da teoria da proteção
integral para o enfrentamento à violência sexual?
A hipótese que se apresenta é que apesar do município de Santa Cruz do Sul
desenvolver políticas de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual intrafamiliar de acordo com as diretrizes nacionais, há dificuldades para o
enfrentamento à violência, devido à grande demanda do município e a falta de
recursos financeiros e humanos.
A violência sexual intrafamiliar é uma das piores formas de violação dos
direitos humanos da criança e do adolescente, apesar da consolidação da proteção
jurídica sobre o tema, ainda há inúmeros casos de violação à dignidade sexual da
criança e do adolescente. Só em 2014, foram registrados 63.402 notificações de
violência sexual entre crianças e adolescentes de 0 até 19 anos de idade, segundo
dados do SINAN.
Crianças e adolescentes são sujeitos de direito em condição peculiar de
desenvolvimento, portanto, devem ter prioridade absoluta no encaminhamento de
suas demandas, principalmente quando se tratar de crianças e adolescentes vítimas
15

de abuso sexual intrafamiliar. Nesse contexto, as políticas de atendimento da


criança e do adolescente devem contribuir para garantia de seus direitos
fundamentais, mas para que isso ocorra é preciso que sejam atendidos os requisitos
normativos básicos previstos nas diretrizes estabelecidas pelo Sistema Único de
Assistência Social.
Em razão dos casos de violência sexual infantil intrafamiliar que ocorrem no
município de Santa Cruz do Sul, faz-se necessário investigar as causas e
consequências e verificar a adequação das políticas públicas municipais de
atendimento de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual às diretrizes
nacionais da política de enfrentamento à violência sexual.
Pretende-se demonstrar o importante e necessário aprimoramento nas
políticas públicas de atendimento aos casos de abuso sexual, as quais devem
atender requisitos normativos básicos previstos nas diretrizes estabelecidas pelo
Sistema Único de Assistência Social.
O sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente foi consolidado
no Brasil a partir da instituição do Direito da Criança e do Adolescente, como ramo
jurídico autônomo, constituído por princípios e regras constitucionais e pela
legislação regulamentadora. A teoria da proteção integral é a base teórica que
permite articular e compreender os limites e capacidades de efetivação dos direitos
fundamentais. Meninos e meninas precisam se desenvolver em um ambiente que
permita o seu pleno desenvolvimento sexual, físico, mental, emocional, espiritual e
social, essa proteção além de formalmente estabelecida, precisa ser materialmente
alcançada.
Este estudo justifica-se especialmente na busca pelo correto atendimento às
crianças e adolescentes que têm seus direitos fundamentais violados e necessitam
de um correto acompanhamento para que possam recuperar sua dignidade, violada
no próprio âmbito familiar. O estudo, mesmo a nível municipal, possibilita a
aproximação da realidade local a qual pode ser usada para estudos em outros
municípios ou até mesmo a nível estadual e nacional, a fim de contribuir com a
alteração ou aperfeiçoamento gradual das políticas públicas de atendimento às
crianças e adolescentes vítimas de violência. Assim, a pesquisa de campo fornece
16

subsídios importantes para a compreensão dos avanços e obstáculos na execução


de políticas públicas de prevenção e erradicação do abuso sexual infantil.
Este estudo foi orientado pelo professor Dr. André Viana Custódio e está
diretamente ligado as pesquisas desenvolvidas na linha de políticas públicas de
inclusão social do Programa de Pós Graduação em Direito da Universidade de
Santa Cruz do Sul, bem como, às pesquisas desenvolvidas no Grupo de Estudos em
Direito Humanos de Crianças, Adolescentes e Jovens do PPGD/UNISC, vinculado
ao grupo de pesquisa Políticas Públicas de Inclusão Social, por buscar o
aprimoramento das políticas públicas de atendimento à criança e ao adolescente
vítima de abuso sexual intrafamiliar no município de Santa Cruz do Sul-RS, de
acordo as diretrizes nacionais para o enfrentamento à violência sexual.
Esta pesquisa tem, portanto, como objetivo geral estudar as políticas de
atendimento às crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar no
município de Santa Cruz do Sul tendo como referência as diretrizes nacionais do
Sistema Único de Assistência Social.
E de forma especifica objetiva-se: a) Descrever a proteção jurídica contra
violência sexual intrafamiliar de crianças e adolescentes no marco da teoria da
proteção integral; b) Verificar o contexto da violência sexual intrafamiliar no Brasil e
as responsabilidades intersetoriais de atendimento à criança e ao adolescente; c)
Analisar a adequação das políticas públicas municipais de atendimento de crianças
e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar de Santa Cruz do Sul às
diretrizes nacionais da política de enfrentamento à violência sexual.
O método de abordagem da pesquisa adotado é o dedutivo, caracterizando-
se por ser um estudo exploratório, possibilitando conhecer a realidade do município
de Santa Cruz do Sul quanto às políticas de atendimento, e também é um estudo
explicativo, produzindo conhecimento e contribuindo na elaboração ou adaptação de
políticas públicas de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual intrafamiliar.
O método de procedimento foi monográfico com técnicas de pesquisa
bibliográfica, documental e de campo.
A pesquisa bibliográfica foi realizada junto a biblioteca da Universidade de
Santa Cruz do Sul, biblioteca da Universidade Federal de Santa Catarina,
17

Associação dos Pesquisadores de Núcleos de Estudos e Pesquisas sobre Criança e


Adolescente (NECA), Banco de Teses de Dissertações da CAPES, do Instituto
Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), base de dados do Scielo,
do Portal Periódicos da CAPES e do CONPEDI, bem como as publicações sobre o
tema de abuso sexual intrafamiliar contra crianças e adolescentes nas revistas
brasileiras qualificadas no Qualis.
A pesquisa documental foi realizada junto às bases de dados Ministério do
Desenvolvimento Social (MDS), Ministério dos Direitos Humanos (MDH), Ministério
da Saúde (MS), no Instituto Brasileiro de Geográfica e Estatística (IBGE), no
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), no
Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), na Fundação Abrinq
pelos Direitos da Criança e do Adolescente, Programa Nacional de Enfrentamento
da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes (PNEVSCA), Fundo das
Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Conselho Nacional de Assistência Social
(CNAS), no Sistema de Informação para Infância e Adolescência (SIPIA) e nas
diversas normas regulamentadoras, tendo como principal a Constituição Federal e o
Estatuto da Criança e do Adolescente.
O instrumento utilizado para a realização da pesquisa de campo envolveu: a
entrevista semiestruturadas com vistas a compreender as ações e procedimentos
existentes para o atendimento das crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual
intrafamiliar no município de Santa Cruz do Sul. Para a realização da entrevista
utilizou-se a técnica de entrevista em profundidade, onde o pesquisador deve ter um
rico conhecimento no tema para compreender e explorar outras categorias de
análise que possam surgir durante a entrevista, com objetivo de reunir informações
que possam proporcionar a compreensão de como ocorrem os atendimentos, se
todas etapas estão de acordo com as diretrizes nacionais e quais os problemas
enfrentados pela equipe de atendimento para a realização do atendimento. A
pesquisa foi realizada no Centro de Referência Especializado de Assistência Social
(CREAS) do município de Santa Cruz do Sul/RS, no qual foram entrevistados o
coordenador, duas psicólogas, uma assistente social e a auxiliar administrativo.
Por fim, ressalta-se que o projeto foi encaminhado para apreciação do Comitê
de Ética e Pesquisa da Universidade de Santa Cruz (UNISC), sob n. CAAE
18

01733016.3.0000.5343, para que fosse avaliado e somente após a autorização


deste é que foi realizada a pesquisa de campo. O parecer de aprovação é de n.
2.993.734.
No primeiro capítulo descreve-se a proteção jurídica a partir do marco teórico
da proteção integral. Inicialmente é realizada a análise da trajetória histórica, jurídica
e social dos direitos das crianças e adolescentes. A partir da promulgação da
Constituição Federal, o processo de valorização dos direitos humanos contou com o
reconhecimento de crianças e como sujeitos de direito, principalmente após a
entrada em vigor do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde, uma nova visão foi
adotada sobre os direitos da criança e do adolescente, passou-se a adotar a teoria
da proteção integral no direito nacional.
A violência sexual contra crianças e adolescente é um tema complexo, viola a
dignidade da pessoa, seu direito de crescer e se desenvolver adequadamente, por
isso a Constituição Federal trouxe em seu artigo 227 o direito das crianças e
adolescentes de estarem a salvo de toda forma de negligência, discriminação,
exploração, violência, crueldade e opressão. Não obstante a isso, o Estatuto da
Criança e do Adolescente e outras legislações infraconstitucionais também
abarcaram a proteção especial, buscando coibir os casos de violência sexual infantil.
Contudo, só a legislação não é suficiente para o enfrentamento à violência, e,
portanto, importantes atores no Sistema de Garantia de Direitos estão estruturados
para garantir a concretização dos direitos consagrados.
O Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, o Conselho Tutelar,
Poder Judiciário e a rede de atendimento às crianças e adolescente tem papel
fundamental na prevenção e manutenção de direitos e na superação de direitos
violados. Ao Conselho de Direitos incumbe a responsabilidade de estruturar os
planos de políticas públicas, fazendo diagnóstico, elaborando diretrizes, objetivos,
metas e ações em conjunto com a sociedade e articulado com todos os integrantes
do Sistema de Garantia de Direitos, também, de realizar o controle e monitoramento
das políticas públicas de atendimento às crianças e adolescentes. Estas, devem
seguir as diretrizes nacionais, normativas e organizacionais, como os Planos
Nacionais, Estaduais e Municipais, que além de serem instrumento de democracia
participativa, tem sua finalidade para a construção de estratégias de articulação
19

intersetorial e diretrizes e ações a curto, médio e longo prazo voltadas às políticas


públicas.
No segundo capítulo, verifica-se o contexto da violência sexual. Quais as
modalidades, pois a violência sexual pode ocorrer de diversas formas, os atos
podem ou não envolver contato físico, em todos os casos tornam a criança ou
adolescente um objeto. Através da coação, agressões ou dominação, a criança ou
adolescente é utilizado para satisfazer o desejo do agressor. Os dados oficiais
levantados na pesquisa demonstram que a cada uma hora em média uma criança
tem seus direitos violados e esse quadro pode ser ainda pior considerado o número
de subnotificações ou de casos de violência que nem chegam ao conhecimento da
rede de atendimento ou sistema de proteção e justiça.
As consequências da violência sexual intrafamiliar contra crianças e
adolescente podem ser devastadoras, dependendo do grau de exposição à violência
e a ausência de acompanhamento adequado até a superação da violação de
direitos, pode levar a criança ou adolescente a estágio profundo de depressão e até
o suicídio. Os motivos que levam ao agressor a cometer violência sexual contra uma
criança ou adolescente da sua própria família, são inúmeros, mas sem dúvida a
dimensão cultural tem grande peso, crenças adultocêntricas e machistas, que
coisificam a criança como objetivo pertencente aos pais, como uma propriedade e
não como um ser humanos, sujeito em desenvolvimento e de igual direito, o espaço
privado como local sagrado, intocável, onde as regras externas não são abrangidas,
colaboram com o número de casos de violência sexual infantil. Neste viés, quando
identificado um caso de violência sexual, dentro da família, a rede de atendimento,
abrangida pela educação, saúde, esporte, lazer, cultura e assistência social, que
geralmente são os primeiros a terem conhecimento, possuem grande
responsabilidade, de auxiliar na superação da violência, de restituir os direitos
violados daquela criança e adolescente e de evitar a revitimização. Para isso é
necessário um trabalho articulado em rede, intersetorial, onde os fluxos de
notificação e encaminhamento são pactuados e seguidos, ainda, a políticas de
atendimento, é claro, precisa estar bem estruturada para poder enfrentar a violência
contra criança e adolescente.
20

Neste sentindo, o terceiro capítulo, analisa o contexto do município de Santa


Cruz do Sul, descrevendo suas características e peculiaridades e quais as políticas
públicas do município, a partir da análise da lei orgânica, outras leis municipais, mas,
principalmente, dos planos municipais existentes no município. Durante o
levantamento dos planos municipais, pode-se verificar que a cidade não possui o
Plano Municipal de Direitos Humanos da Criança e do Adolescente, Plano Municipal
de Erradicação à Violência contra Criança e Adolescente nem o Plano Municipal da
Assistência Social, o que por si só já demonstra alguns obstáculos na política de
atendimento às crianças e adolescente, visto que, é através dos planos que se tem
as diretrizes para melhoramento e ampliação dos serviços.
Para verificar se a política de atendimento atende as diretrizes nacionais de
enfrentamento à violência sexual, realizou-se pesquisa de campo, através da
entrevista semiestruturada, com a técnica da entrevista em profundidade, a qual
aconteceu no único Centro de Referência Especializado da Assistência Social do
município, o CREAS-Acolher, na qual a pesquisadora entrevistou o coordenador,
duas psicólogas, uma assistente social e a agente administrativa. Durante a
pesquisa de campo fora diagnosticado diversas barreiras que a equipe de
atendimento enfrenta no dia-a-dia, empecilhos que não deveriam existir, se as
políticas públicas seguissem as diretrizes nacionais. Por fim, foram abordados os
obstáculos e aperfeiçoamentos necessários para efetivo enfrentamento à violência
sexual infantil, como a falta de recursos humanos suficiente para o atendimento de
famílias e vítimas de violação de direitos, espaço físico inadequado para o
oferecimento de serviço de proteção, insuficiência de proteção social básica que
reflete na demanda de casos da proteção social especial e falta de clareza no fluxo
de notificação e encaminhamento de criança e adolescentes vítimas de violência.
21

2. A PROTEÇÃO JURÍDICA DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES CONTRA A


VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR.

A violência contra crianças e adolescentes é um fenômeno complexo


presente na sociedade contemporânea e que deve ser enfrentado através de
políticas públicas. Entre um dos principais tipos de violência contra criança e
adolescente está a violência sexual, que se constitui em uma situação recorrente de
violação dos direitos fundamentais.
Discutir o fenômeno da violência requer a abordagem interdisciplinar para
compreensão de sua complexidade, considerando as normas internacionais e
infraconstitucionais – como a Declaração de Genebra (1924), a Declaração
Universal dos Direitos do Homem (1948), a Declaração Universal dos Direitos da
Criança (1959), a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como
Pacto de São José da Costa Rica (1969), a Convenção das Nações Unidas sobre os
direitos das crianças (1989).
No sistema jurídico brasileiro há também pluralidade de normas jurídicas que
envolvem o tema, tais como a Constituição da República Federativa do Brasil,
promulgada em 05 de outubro de 1988, a Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, o
Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como, ampla legislação sobre a atuação
de órgãos governamentais e não-governamentais, os serviços de atendimento às
crianças e adolescentes, que sofrem graves violações, atos de extrema barbárie
que, em muitos casos, são praticados pelas pessoas que deveriam ter a missão de
zelar pela vida e pela integridade física e psíquica de crianças e adolescentes.
Para o enfrentamento de violências como o abuso sexual intrafamiliar, que
viola diversos direitos humanos das crianças e dos adolescentes, de suma
importância tratar dos dispositivos nacionais e dos compromissos internacionais que
influenciam o Brasil a buscarem estratégias públicas para proteger as crianças e
adolescentes contra a violência sexual intrafamiliar, assim como, os planos e
diretrizes que visam garantir os direitos das crianças e adolescentes em situação de
violência intrafamiliar.
22

2.1 A teoria da proteção integral e a responsabilidade compartilhada da família,


da sociedade e do Estado na garantia dos direitos fundamentais da criança e
do adolescente.

A trajetória histórica, jurídica e social dos direitos das crianças e adolescentes


é marcada por violações e desproteção, podendo ser dividida por três preposições: a
primeira marcada pela ideia de incapacidade da criança e do adolescente, que os
coloca como expectadores de direitos, coisificando a infância; a segunda, a criança
e o adolescente como objeto de controle do adulto, em que os pais, responsáveis e
instituições exercem controle disciplinar; e por último, a terceira, a desigualdade no
reconhecimento de crianças e adolescentes, especialmente daquelas oriundas de
famílias pobres, marginalizadas pelos discurso do menorismo, proveniente das
marcas violentas na infância que permearam todo o século XX, durante a vigência
da teoria da situação irregular (SOUZA, 2016, p. 66).
Cada momento histórico é marcado por paradigmas que explicam diferentes
fenômenos sociais e suas mudanças no tempo e no espaço. Numa primeira
dimensão está a doutrina menorista, na segunda, o paradigma da teoria da proteção
integral, a qual condicionou a ruptura de velhos dogmas menoristas, advindos da
doutrina da situação irregular. Segundo Custódio, a teoria da proteção integral é o
marco teórico fundamental do Direito da Criança e do Adolescente:

Sem dúvida, a teoria da proteção integral consolidou-se como verdadeiro


paradigma na compreensão da infância e adolescência no Brasil. Daí
decorre tentativa em regra sem sucesso, de relacionar o velho modelo por
meio de mudanças pontuais na legislação infanto-juvenil, mas que não
subsistem por muito tempo, pois o que sustenta o Direito da Criança e do
Adolescente é estruturalmente complexo para ceder às mudanças pontuais
incompatíveis com a lógica sistemática desse novo campo do conhecimento
jurídico da infância (CUSTÓDIO, 2008, p. 23).

As concepções do Direito do Menor, à luz da doutrina da situação irregular,


eram marcadas pela representação da infância estigmatizada pela sua condição de
pobreza, delinquência, mendicância e perigo. As crianças e adolescentes,
denominadas como menores, eram considerados como objetos de controle jurídico
quando se encontravam em situação denominada como irregular, que se
caracterizava com qualquer situação de delinquência, vitimização e pobreza,
23

hipóteses vagas, genéricas, que permitiam a atuação discricionária dos


denominados Juízes de Menores (autoridades competentes para investigar os fatos
irregulares, denunciar, acusar, defender, sentenciar e fiscalizar suas próprias
decisões).
Havia uma discriminação legal quanto a situação do “menor”, o qual era
objeto de interesse Estatal somente após o cometimento de alguma infração ou em
decorrência de sua própria condição de exclusão social, ou quando se encontravam
em situação qualquer em que se considerasse necessária a intervenção jurídica.

A Doutrina da Situação Irregular conseguiu alcançar um parâmetro jurídico


e institucional representativo do caldo histórico da cultura paternalista,
autoritária, que olhava para a pobreza como uma patologia social,
promovendo uma resposta assistencialista, vigilante, controladora,
repressiva e autoritária, com uma burocracia estatal que se relacionava com
um universo desprovido, segregado, onde a criança era vista como
problema social, um risco à estabilidade, às vezes até uma ameaça à ordem
social; para a afirmação da concepção burguesa de sociedade afirmava a
ideia de cidadão de bem, do bom menino domesticado e institucionalizado;
servil aos interesses capitalistas de mercado. A infância era mero objeto de
intervenção do estado regulador da propriedade, que tinha sua inserção
social realizadas às avessas, numa incorporação controlada pelo dever de
gratidão da criança em relação ao Estado (CUSTÓDIO, 2006, p. 76).

Significa dizer que a irregularidade era sempre da criança ou do adolescente,


e não das instituições ou órgãos públicos, seja pela prática de infrações ou pela sua
condição de exclusão social, onde havia distinção entre criança (filho de família
economicamente privilegiada) e o menor (filho de família pobre). No antigo Código,
nem sequer havia distinção entre delinquente e abandonado, tratando todas as
situações como irregulares apenas, considerando ambas as situações iguais, com
aplicação das mesmas medidas, incluindo o cumprimento na mesma unidade de
atendimento. A institucionalização era, portanto, apresentada como condição para
afastar o “criminoso” da sociedade.

Os poderes legislativo, executivo e judiciário mantinham-se regularmente


omissos manifestando-se apenas quando as crianças assumiam a condição
de objeto de interesse ‘jurídico’, seja pela prática de infrações, seja pela
própria condição de exclusão social que as colocava em evidência. Aí, era o
momento de configurar a irregularidade, que nunca era das instituições,
mas sempre recaía sobre a criança, pela própria previsão ordenada no
sistema jurídico ou pela condição de fragilidade que a submetia as
imposições adultas produzindo o paradoxo da reprodução da exclusão
integral pela via da inclusão na condição de objeto de repressão
(CUSTÓDIO, 2008, p. 4).
24

O primeiro Código de Menores entrou em vigor a partir do Decreto n. 17.943,


de 12 de outubro de 1927, e assim como todas medidas jurídicas e legislativas com
relação às crianças e adolescente, não focavam no direito desta população, mas sim
no controle e na coerção. Com o golpe de 1964, o Governo Militar estabeleceu a
Política Nacional do Bem-Estar do Menor, através da Lei n. 4.513, de 1º de
dezembro de 1964, que criou a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor
(FEBEM), formulada a partir da ideologia da Escola Superior de Guerra, que possuía
a atribuição de coordenar as entidades responsáveis por crianças e adolescentes,
com caráter repressor e controlador da infância brasileira. Em 1979, foi instituído
outro Código de Menores, a partir da Lei n. 6.697, de 10 de outubro de 1979, que
adotou explicitamente a doutrina da situação irregular.
A partir da década de 1980 surgiram fortes discussões acerca da necessidade
de redemocratização do país, a partir da pressão dos movimentos sociais, que
“assumiam o papel de protagonistas na produção de alternativas ao modelo
imposto” (CUSTÓDIO, 2008, p. 05), buscavam pelo direito à infância. Diante das
diversas denúncias apontando injustiças contra o tratamento de crianças e
adolescentes nas fundações estaduais (FEBENS), como também da necessidade de
buscar alternativas de atendimento a crianças em situação de rua, surgem debates
sobre a importância dos direitos das crianças e adolescentes, pugnando-se pelo
reconhecimento destes, enquanto sujeitos de direitos (LEITE, 2005, p. 15).
Em um ambiente que almejava a democratização, a igualdade jurídica e
material, a participação popular no lugar de formas autoritárias, não-participativa, de
controle centralizado e repressivo. A forte pressão de movimentos sociais oferecia
espaço para reflexão das práticas históricas instituídas sobre a infância,
desconstituindo a obra de juristas especializados, incorporando a contribuição da
sociedade à uma nova teoria de direitos, a teoria da proteção integral. (CUSTÓDIO,
2008).
A teoria da proteção integral incorporou-se ao ordenamento jurídico brasileiro
antes mesmo na própria edição da Convenção Internacional dos Direitos da Criança.

Em que pese o fato de se ter politicamente adotado na Constituição da


República de 1988 a doutrina da proteção integral antes mesmo da
oficialização do conjunto de instrumentos legislativos internacionais – e
25

dentre eles, em particular, a Convenção Internacional dos Direitos Humanos


da Criança que é do ano de 1989 – percebe-se que intenso movimento
popular brasileiro já havia ensejado (re)alinhamento democrático interno
com as diversas dimensões humanitárias dos direitos mais comezinhos
àquelas pessoas que se encontrassem na condição peculiar de
desenvolvimento da personalidade (RAMIDOFF, 2008, p. 21).

Pode-se reconhecer então o Direito da Criança e do Adolescente como um


novo modelo do ordenamento jurídico positivo e, também, de uma nova prática
social, tanto pela sociedade civil, como pelas instituições públicas, que impõe desde
a criação legislativa até a interpretação e aplicação às situações concretas, o
compromisso ético, jurídico e político com a concretização da cidadania infanto-
juvenil (LIMA, 2001, p.80).
A teoria da proteção integral se instituiu como novo paradigma para a ruptura
da corrente menorista, ela deriva, no plano internacional, da adoção da Declaração
dos Direitos da Criança de 1959, reforçada posteriormente por outras convenções,
que tratam sobre a proteção dos direitos humanos e direitos das crianças e
adolescentes, dentre elas, está a principal, a Convenção sobre Direitos da Criança,
da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1989, promulgada pelo Brasil,
através do Decreto n. 99.710, de 21 de novembro de 1990, a qual foi um marco
internacional na busca pela efetivação de direitos, com o objetivo de possibilitar a
proteção absoluta de direitos, afim de garantir o desenvolvimento integral de
crianças e adolescentes que se encontram em condição peculiar de pessoa em
processo de desenvolvimento físico, psicológico, social, intelectual e cultural
(CUSTÓDIO; VERONESE, 2013). Constitui-se em um tratado que produziu uma
nova compreensão sobre a dinâmica da infância e sua família, articulada com as
políticas públicas sociais. Trata-se de um tratado que reconhece os direitos
humanos da criança e do adolescente, tendo o maior número de ratificações com
193 Estados-partes ratificantes.

A Convenção sobre os Direitos da Criança, em seu preâmbulo, lembra os


princípios básicos, tais como a liberdade, a justiça e a paz, os quais
reconhecem que toda criatura humana é possuidora de dignidade e de
direitos humanos iguais e inalienáveis, de modo que os povos das Nações
Unidas, consoante esse entendimento, decidiram priorizar o progresso
social, o que implica elevação do nível de vida dos mesmos (VERONESE,
2013, p. 46).
26

Tal documento, ratifica o que as Nações Unidas acordaram na Declaração


Universal dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais de Direitos Humanos
(VERONESE, 2013, p. 46). “Os Estados Partes que aderiram e ratificaram a citada
Convenção possuem obrigações, não podendo violar os seus preceitos, como
também deverão tomar as medidas positivas visando à promoção dos direitos
infanto-juvenis” (COSTA; VERONESE, 2006, p. 21). Segundo, Pereira, existe um
consenso universalmente aceito que são essenciais para o desenvolvimento de
crianças e adolescentes, trata-se do “instrumento jurídico internacional mais
transcendente para a promoção e o exercício dos Direitos da Crianças” (1992, p.
67).
Embora represente um avanço a sua adoção, a Declaração Universal dos
Direitos da Criança (de 1959) sugere princípios de natureza moral, contudo, sem
nenhuma obrigação, são basicamente compromissos que os Estados podem ou não
utilizar. Já a Convenção (de 1989), diferentemente da Declaração, tem natureza
coercitiva, exige o compromisso de cada Estado membro que a ratifica, inclusive
com a emissão de relatórios de acompanhamento sobre a incorporação das normas
no seu sistema jurídico interno e metas de cumprimento. É como um conjunto de
deveres e obrigações aos que aderirem, a Convenção tem, portanto, força de lei
internacional, não podendo seus Estados membros violarem seus preceitos, como,
também, deverão tomar todas as medidas cabíveis para promover os direitos
pactuados. Importante frisar que a Convenção possui mecanismos de controle, os
quais possibilitam a verificação no que tange ao cumprimento de suas disposições e
obrigações sobre cada Estado que a subscreve e a ratifica (VERONESE, 2013, p.
47).
A Convenção sobre Direitos da Criança determina que toda pessoa, sem
qualquer distinção de raça, cor, sexo, idioma, crença, posição política, origem
nacional ou social, posição econômica, possui os direitos afirmados na Convenção
(VERONESE, 2013, p. 46-47).
Estabeleceu-se que os Estados Partes devem reconhecer o direito de todas
as crianças a um nível de vida adequado ao seu desenvolvimento físico, mental,
espiritual, moral e social, acentuando o fato de que “as crianças, tendo em vista sua
vulnerabilidade, necessitam de cuidados e proteção especiais e enfatiza a
27

importância da família, para que a criança desenvolva sua personalidade, num


ambiente de felicidade, amor e compreensão” (VERONESE, 2013, p. 47). Prevê que
os direitos nela dispostos deverão ser assegurados a todas crianças e adolescentes
de forma igualitária, conforme disposto itens 1 e 2 do artigo 2º, da Convenção:

1. Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente


Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita à sua
jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor, sexo,
idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica
ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer
outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais.

2. Os Estados Partes tomarão todas as medidas apropriadas para


assegurar a proteção da criança contra toda forma de discriminação ou
castigo por causa da condição, das atividades, das opiniões manifestadas
ou das crenças de seus pais, representantes legais ou familiares (BRASIL,
1990).

Refere que a criança deve ser “preparada para poder interagir na sociedade
e, para tanto, deve ser educada de acordo com os ideais proclamados na Carta das
Nações Unidas e, em especial, com dignidade, tolerância, liberdade, igualdade,
solidariedade e espírito de paz” (VERONESE, 2013, p. 47).
No artigo 19, a Convenção refere sobre a responsabilidade do Estado de
adotar medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais apropriadas para
proteger as crianças de todas formas de violência, dentre elas, o abuso sexual,
enquanto a criança ou o adolescente estiver sob a custódia dos pais, do
representante legal ou qualquer pessoa responsável pela sua proteção. Essas
medidas devem incluir procedimentos apropriados e procedimentos eficazes para
elaboração de programas sociais que proporcionem uma assistência adequada às
crianças e, também, às pessoas responsáveis pelo seu cuidado.
Neste viés, importante frisar que a Convenção sobre os Direitos da Criança
utiliza o conceito de “criança”, não porque exclui os adolescentes de terem direitos e
proteção, mas porque, de acordo com o artigo 1º, da respectiva Convenção,
entende-se que “para efeitos da presente Convenção considera-se como criança
todo ser humano com menos de dezoito anos de idade, a não ser que, em
conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes”
(BRASIL, 1990).
28

Dentre as medidas de proteção previstas na Convenção, deve-se incluir a


elaboração de políticas públicas capazes de proporcionar uma assistência adequada
à criança e ao adolescente e, também, às pessoas encarregadas de seu cuidado,
para identificação, notificação, encaminhamento, atendimento, investigação,
tratamento e acompanhamento posterior aos casos violência, ainda, sendo o caso,
de intervenção judiciária, para assegurar os direitos das crianças e adolescentes
contra a todas formas de violência sexual.
Fundamental na moderna convivência, a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, assinada na
Conferência da Organização dos Estados Americanas, ocorrida em 22 de novembro
de 1969, da qual o Brasil teve adesão, por intermédio do Decreto n. 678, de
novembro de 1992, dentre seus principais artigos, assegura, no seu artigo 3º, o
direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, também garante, em seu artigo 4º,
que “toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser
protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser
privado da vida arbitrariamente” (BRASIL, 1992).
Ainda, em seu artigo 5º, tratou sobre o direito à integridade física: “toda
pessoa tem direito a que se respeite sua integridade física, psíquica e moral”, bem
como, garantiu proteção a família, referindo que a mesma deve ser protegida pela
sociedade e pelo Estado, de acordo com o artigo 17 (BRASIL, 1992).
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, foi
extremamente importante para o Brasil, sendo considerada um marco na história
brasileira, uma vez que, trouxe para Constituição Federal a teoria da proteção
integral, a qual modificou totalmente a doutrina adotada anteriormente, a doutrina da
situação irregular, dando uma nova visão à infância (SABINO; DUARTE, 2016, p.
14).

[…] a citada Convenção trouxe para o universo jurídico a Doutrina da


Proteção Integral. Situa a criança dentro de um quadro de garantia integral,
evidencia que cada país deverá dirigir suas políticas e diretrizes tendo por
objetivo priorizar os interesses das novas gerações; pois a infância passa a
ser concebida não mais como um objeto de ‘medidas tuteladoras’, o que
implica reconhecer criança sob a perspectiva de sujeito de direitos
(VERONESE, 1997, p. 13).
29

Assim, no Brasil, em 1988, é promulgada a Constituição Federal, que


incorporou os princípios básicos das Convenções Internacionais de Direitos da
Criança e do Adolescente, introduzindo a garantia de proteção integral.
Os desafios enfrentados no processo de redemocratização do Brasil, nos
quais resultaram na Constituição Federal, só foram possíveis, segundo Santos e
Nunes (2003, p. 34), pelo “reconhecimento da diferença”, associado a “criação de
políticas sociais voltadas para a redução das desigualdades de recursos e a
inclusão”.
Nesta oportunidade traçava-se uma visão dos direitos humanos,
reconhecimento dos direitos fundamentais para as crianças e adolescentes na nova
Constituição Federal. A doutrina da Proteção Integral surge para romper paradigmas
da situação irregular, do assistencialismo, da estabilidade e da centralização das
ações e funções do Poder Judiciário (LEITE, 2005, p. 15).
A Constituição Federal representa o marco jurídico da redemocratização do
país, seu texto trouxe o ser humano e a preservação da sua dignidade como pontos
centrais da nova organização política e jurídica do Brasil. Tanto é, que a dignidade
da pessoa humana (art. 1º, III, CF) e a promoção do bem de todos sem qualquer
distinção ou discriminação (art. 3º, IV, CF) estão descritas nos fundamentos e
objetivos da Constituição.
A teoria da proteção integral encontra amparo jurídico na Constituição
Federal, principalmente em seu artigo 227, o qual traz a responsabilidade
compartilhada, referindo o dever assegurar direitos fundamentais por parte da
família, do Estado e da Sociedade, de forma que todos os atos relacionados a
garantia dos direitos da criança e do adolescente devem atender o seu melhor
interesse. Assim, o Estado, principalmente, em suas decisões e procedimentos
cotidianos, deve tomar uma série de precauções e cuidados com a finalidade de
proteger a criança e ao adolescente, levando em conta sua condição de pessoa em
desenvolvimento, assegurando às crianças e adolescentes “o direito à vida, à saúde,
à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária [...]” (BRASIL, 1988).
Visa um sistema de qualidade, substituindo as práticas repressivas e de
controle social que existia na teoria da situação irregular, pois está amplamente
30

ligada aos princípios da dignidade da pessoa, à vida, à saúde, ao respeito, à


educação, à cultura, ao esporte e lazer, à proteção contra a exploração no trabalho,
à liberdade e dos direitos humanos visando o bem-estar da criança e do
adolescente. Vai muito além da “tentativa de superação das práticas
assistencialistas, meramente emergenciais e segmentadas” (CUSTÓDIO, 2008, p.
13).

Inaugura-se aí uma fase enriquecedora, na qual a vitória estava anunciada,


pois o enfrentamento entre a doutrina jurídica da situação irregular perdia
adeptos na mesma proporção em que os valores da proteção integral
ganhavam novos aliados. Finalmente, essa década conviveria uma utopia
mobilizadora para a construção de uma sociedade, onde todos poderiam
gozar de direitos humanos reconhecidos como fundamentais na nova
Constituição que se elaborava. Estava traçada a oportunidade histórica para
sepultar o menorismo no Brasil. (CUSTÓDIO, 2009, p. 25).

Os direitos sociais estão assegurados no artigo 227, que também nomeia os


responsáveis por garantir os direitos fundamentais das crianças e adolescentes, o
estado, a família e a sociedade (COSTA, VERONESE, 2006, p. 50-51).
A teoria da proteção integral tem por fundamentos os princípios e regras
fundamentais previstos na Constituição Federal, nas normas incorporadas no
sistema brasileiro das convenções internacionais relativas aos direitos humanos de
crianças e adolescentes e os princípios e regras regulamentadores, em especial os
previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente.
A história social da infância nos mostra que nem sempre as crianças e
adolescentes foram considerados sujeitos de direitos e apesar de despossuídos de
direitos fundamentais por um longo período ainda se estabelece a cultura do
conformismo e exclusão político-social que reforça a violência contra crianças e
adolescentes e aproxima de uma crise de proteção de direitos humanos de crianças
e adolescentes, restando medidas meramente reparatórias, consolidando “una
cultura simplista, deficiente, puntual, insuficiente y estrecha de derechos humanos”
(RUBIO, 2017, p. 14).

No se trata solo de incrementar una conciencia y una cultura jurídica de


protección, sino, además, potenciar una cultura de derechos humanos en
general, integral y que acentúe la dimensión pre-violadora desde donde más
se construyendestruyen y articulan-desarticulan porque, en realidad, somos
todos los seres humanos ahí donde nos movemos, quienes, utilizando o no
utilizando la vía jurídica, participamos en los procesos de construcción o
31

destrucción de derechos humanos, seamos o no seamos juristas, teóricos


y/o operadores jurídicos. (RUBIO, 2017, p. 34)

Implica dizer que só se pode falar de proteção aos direitos humanos de


crianças e adolescentes, quando reconhecidos os direitos e esses direitos forem
efetivamente garantidos por políticas públicas que possibilitam sua aplicabilidade
imediata e plena satisfação assegurada pelo Estado (SOUZA, 2016, p. 39).
E desta natureza obrigacional dos direitos sociais, surgem as dificuldades
relativas à sua efetivação, pois para sua materialidade e continuidade, são
necessárias ações articuladas dos poderes estatais, por meio de recursos
financeiros e através de políticas públicas que sigam as diretrizes estabelecidas para
seu funcionamento.

2.2 A proteção jurídica especial à criança e ao adolescente contra a violência


sexual intrafamiliar.

A vida social é composta por permanente tensões, conflitos e formas de


violência entre a dinâmica das relações sociais. A violência não se limita apenas ao
uso da força física, uma vez que há a possibilidade de ser a ameaça, a agressão
psicológica, a utilização de palavras ou ações que prejudicam, machucam ou
causam sofrimento, tristeza, tortura ou morte, a rigor é “o modo mais agudo de
revelar o total desrespeito e desconsideração pelo outro” (VELHO, 1996, p.236).

Numa visão multidimensional da violência, considera-se que este fenômeno


resulta de uma complexa interação de fatores individuais e coletivos,
pessoais, interpessoais, organizacionais, de relacionamento e fatores
sociais, culturais e ambientais. A origem etimológica da palavra violência
vem do latim violentia, numa alusão ao que é violento e mesmo ao ato
violento, fúria, etc. Ainda, com relação aos aspectos entomológicos, agrega
ideias de força e poder físico ou moral, praticados de forma abusiva e
ilegítima contra outros, podendo causar-lhes danos físicos, emocionais ou
até mesmo morte. (ANDRADE, 2011, p. 26-27).

A sociedade contemporânea apresenta-se cada vez mais permissiva em


relação a violência, “ao mesmo tempo em que as relações humanas se coisificam,
tornando-se cada vez menos humanas” (JAERGER, 2004, p. 291), acostuma-se a
crescentes práticas de brutalidade e desrespeito a dignidade de crianças,
adolescentes, adultos, jovens ou idosos. A violência “é cumulativa e excludente,
32

representa a expressão das desigualdades econômicas, sociais, sendo


historicamente classista, racista, adultocêntrica e machista, tendo o Brasil se tornado
um caso bem específico desta forma de violência” (ANDRADE, 2011, p. 29).
Ao que tange crianças e adolescentes, a violência se configura em cenário
mundial e a níveis complexos. O próprio lar tem sido local de formas de violação de
direitos, violência praticada por aqueles quem tem o dever, muito mais que
constitucional, mas moral de respeitar a integridade e pleno desenvolvimento dessas
pessoas em situação peculiar de desenvolvimento.
A violência doméstica é um fenômeno universal, acontece em todas as
classes sociais, econômicas e culturais, pois não se trata de um fenômeno da
pobreza, podem estar relacionadas a fatores sociais como desemprego, alcoolismo,
drogas, mas fatores econômicos não são determinantes da violência, podem até ser
“condicionantes do processo de fragilização social, nas sociedades fundadas na
desigualdade econômica e opressão cultural e política” (BRAUN, 2002). Envolve de
maneira cíclica várias gerações e é um processo de difícil revelação.
Trata-se de uma violência interpessoal, um abuso do poder disciplinador,
coercitivo dos pais ou responsáveis pela criança ou adolescente, que pode durar por
vários meses ou até vários anos. É uma forma de violação dos direitos essenciais, a
negação de valores humanos como à vida, à liberdade, à segurança das crianças e
adolescentes. E como ela ocorre na esfera privada, dentro do âmbito familiar, acaba
sendo silenciada pelo sigilo das famílias.

Além de marcas físicas, a violência pode deixar sequelas emocionais que


podem comprometer todo o desenvolvimento psicossocial de crianças e
adolescente e ainda contribuir para a construção de um círculo de produção
e reprodução de práticas violentas. Assim, buscar soluções e intensificar
esforços no sentido de prevenção e solução desse problema é
responsabilidade de todos nós, tendo em vista que a violência evidencia-se
como uma violação aos direitos humanos e atinge crianças e adolescentes
independentemente de classe social, raça, etnia, credo, sexo e até mesmo
idade (ANDRADE, 2011, p. 30).

Vários podem ser os fatores que podem desencadear, facilitar ou mesmo


perpetuar a violência, a relação de abuso de poder do adulto sobre a criança e
adolescente que fica submetida aos desígnios e desejos do outro. Esse poder é
violento, caracteriza-se como uma forma de relação de força de alguém sobre outra
pessoa, visando alcançar objetivos e obter vantagens, como a dominação, prazer
33

sexual, lucro, previamente definidos. A relação violenta de poder, por ser desigual,
estrutura-se num processo de violação, através do qual o dominador utiliza-se de
coação e agressões e faz do dominado um objeto para seus ganhos e vontades
(FALEIROS; FALEIROS, 2007, p. 29).
Na literatura corrente, violência doméstica, ou intrafamiliar, é usado para
nomear a violência ocorrida dentro do espaço doméstico e familiar, atingindo
crianças, adolescentes ou mulheres (AZEVEDO; GUERRA, 1993, p. 195-208).
Violência doméstica é entendida como toda agressão “que ocorre dentro de casa,
nas relações entre as pessoas da família, entre homens e mulheres, pai/mãe e
filhos, entre jovens e pessoas idosas” (TELES; MELO, 2002, p. 19).

Todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra


crianças e/ou adolescentes que sendo capaz de causar dano físico, sexual
e/ou psicológico à vítima implica de um lado numa transgressão do
poder/dever de proteção do adulto e, de outro, numa coisificação da
infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes têm
de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de
desenvolvimento (AZEVEDO; GUERRA, 1995, p. 36).

A violência contra crianças e adolescentes é um fenômeno complexo, suas


causas são multifatoriais e suas formas de concretização se dão por diversas
maneiras que devem ser estudadas. A violência intrafamiliar é um processo que
pode se prolongar por meses ou até anos, até que seja identificada, até que haja
uma ação para cessar a violência.
O artigo 227, da Constituição Federal e o artigo 5º, do Estatuto da Criança e
do Adolescente, ao trazer os direitos fundamentais das crianças e adolescentes,
também referem que todas crianças e adolescentes devem estar a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,
trata-se da proteção especial. Nestes casos, deve ser punido na forma da lei
qualquer atentado aos direitos fundamentais, seja por ação ou omissão, respeitando
o melhor interesse.
A negligência é caracterizada pelo ato de omissão do responsável pela
criança ou do adolescente, em promover suas necessidades básicas para um
desenvolvimento adequado. Essa omissão pode ser em relação aos cuidados
diários básicos como a alimentação, cuidados médicos, vacinas, roupas adequadas,
higienização, educação, a falta de apoio psicológico e emocional ou a falta de
34

carinho à criança ou ao adolescente, que a leva crer não tem importância para os
pais ou responsáveis ou que eles não gostam dela. Pode ser também pelo descaso
em retirar a criança ou adolescente de uma situação de violação de direitos como a
violência sexual (MACHADO, 2014, p. 50-51).
A negligência é causada por um conjunto de fatores econômicos, culturais,
sociais e psicológicos. Os profissionais da rede de atendimento devem estar atentos
a sinais de negligência, como os profissionais das áreas da saúde e da educação,
que devem observar se uma criança ou adolescente apresenta sintomas como
desnutrição, lesões na pele decorrentes de má-higiene, vacinas em atraso, doenças
crônicas não tratadas, ausência escolar, entre outras.
A discriminação é uma forma de violência social e envolve “todas as formas
de ações ou omissões realizadas por indivíduos, grupos, classes sociais, nações
que ocasionam danos físicos, emocionais, morais e espirituais e a si próprio ou aos
outros” (SOUZA; MELLO, 2006, p. 24). Esse tipo de violência social é caracterizado
pela discriminação e preconceito em relação a determinados grupos sociais,
referente a raça, etnia, gênero ou situações que colocam as pessoas em posições
diferentes, como a situação de vítima, expondo crianças e adolescentes a situações
de mais violência ainda.
A exploração decorre da atividade que pressupõe vantagens econômicas
mediante como o uso do trabalho infantil de crianças e adolescentes. O trabalho
infantil muitas vezes sequer é percebido pela sociedade como uma violação de
direitos, isso porque é visto como algo produtivo e não prejudicial, atribuindo muitas
vezes ao trabalho um caráter lúdico ou pedagógico. Todavia, vedado
constitucionalmente, é prática que viola aos direitos fundamentais, particularmente
ao princípio da dignidade humana. O trabalho infantil pode ocorrer de variadas
formas, em regra, sua existência está associada alguma forma de exploração,
abuso, negligência ou violência, perante a qual incidirá a responsabilidade da própria
família, de terceiros beneficiários do labor desenvolvido e do Poder Público.
A exploração sexual compreende-se no abuso sexual praticado por adultos
combinado com a oferta de contrapartida como remuneração, presentes, promessas
ou até ameaças. Nestes casos, a criança ou adolescente é tratado como objeto
sexual, uma mercadoria. A exploração sexual comercial constitui-se como forma de
35

coerção e violência, implica na caracterização de uma das piores formas de trabalho


infantil e que fere os direitos humanos como o respeito, à dignidade, à liberdade, à
convivência familiar e comunitária e ao desenvolvimento saudável de sua
sexualidade, pois expõem as crianças e adolescente a estímulos psicoemocionais
não compatíveis com sua maturidade.
A crueldade está intimamente ligada as ações que causam dor ou sofrimento
no outro. São atos de inumanidade, calculados, de uma frieza de espírito, que
causam ao agressor o prazer através do sofrimento dos outros.
A opressão é a forma de impor a vontade de adultos sobre crianças e
adolescentes de forma a desrespeitar direitos fundamentais, ela geralmente está
ligada a atos de violência e coloca a vítima numa posição de submissão, significa a
sujeição de alguém a outrem através da utilização da força ou violência psíquica ou
emocional.
A violência pode ser classificada de diversas formas, a violência física,
psicológica e sexual, e pode ser cometida por diversas ações como o abuso,
agressão, castigo com tratamento cruel e degradante, maus-tratos e outros. Dentre
as violências domésticas, está a violência sexual, considerada como todo ato ou
jogo sexual entre um ou mais adultos e uma criança ou adolescente, tendo por
finalidade “estimular sexualmente esta criança ou utilizá-la para obter estimulação,
sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa” (AZEVEDO; GUERRA, 1989, p. 42).
A Lei n. 13.431, de 4 de abril de 2017, que trata de questões relativas à
articulação dos serviços de atendimento à criança e do adolescente testemunha ou
vítima de violência, forma mecanismos de prevenção e determina medidas de
assistência às vítimas, em seu artigo 4º define as formas de violência física,
psicológica sexual e institucional contra criança e adolescente:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipificação das condutas
criminosas, são formas de violência:
I - violência física, entendida como a ação infligida à criança ou ao
adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe cause
sofrimento físico;
II - violência psicológica:
a) qualquer conduta de discriminação, depreciação ou desrespeito em
relação à criança ou ao adolescente mediante ameaça, constrangimento,
humilhação, manipulação, isolamento, agressão verbal e xingamento,
ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática (bullying)
que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou emocional;
36

b) o ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na


formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida
por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade,
guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que cause prejuízo
ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este;
c) qualquer conduta que exponha a criança ou o adolescente, direta ou
indiretamente, a crime violento contra membro de sua família ou de sua
rede de apoio, independentemente do ambiente em que cometido,
particularmente quando isto a torna testemunha;
III - violência sexual, entendida como qualquer conduta que constranja a
criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou
qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo
por meio eletrônico ou não, que compreenda:
a) abuso sexual, entendido como toda ação que se utiliza da criança ou do
adolescente para fins sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso,
realizado de modo presencial ou por meio eletrônico, para estimulação
sexual do agente ou de terceiro;
b) exploração sexual comercial, entendida como o uso da criança ou do
adolescente em atividade sexual em troca de remuneração ou qualquer
outra forma de compensação, de forma independente ou sob patrocínio,
apoio ou incentivo de terceiro, seja de modo presencial ou por meio
eletrônico;
c) tráfico de pessoas, entendido como o recrutamento, o transporte, a
transferência, o alojamento ou o acolhimento da criança ou do adolescente,
dentro do território nacional ou para o estrangeiro, com o fim de exploração
sexual, mediante ameaça, uso de força ou outra forma de coação, rapto,
fraude, engano, abuso de autoridade, aproveitamento de situação de
vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento, entre os casos
previstos na legislação;
IV - violência institucional, entendida como a praticada por instituição
pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, a criança e o adolescente serão ouvidos
sobre a situação de violência por meio de escuta especializada e
depoimento especial.
§ 2º Os órgãos de saúde, assistência social, educação, segurança pública e
justiça adotarão os procedimentos necessários por ocasião da revelação
espontânea da violência.
§ 3º Na hipótese de revelação espontânea da violência, a criança e o
adolescente serão chamados a confirmar os fatos na forma especificada no
§ 1º deste artigo, salvo em caso de intervenções de saúde.
§ 4º O não cumprimento do disposto nesta Lei implicará a aplicação das
sanções previstas na Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da
Criança e do Adolescente).

A violência física refere-se ao uso da força com o objetivo de “ferir, lesar ou


destruir a criança ou adolescente, deixando ou não marcas evidentes em seus
corpos, em situações mais extremas, provocando a morte” (SOUZA; MELLO
JORGE, 2006, p. 25). Esse tipo de violência pode provocar dano material ao corpo
ou às condições psicológicas. Geralmente, a violência física é identificada pelas
marcas que ficam no corpo, como lesões, fraturas, equimoses, mutilações ou até
mesmo a morte, ou então a violência física poderá se perpetrar de outras maneiras,
37

como: tapas, surras, agressões, tortura, privação de necessidades básicas como


comer e beber, confinamento, trabalho forçado e inadequado para a idade da vítima,
assassinato e violência sexual (ANDRADE, 2011, p. 35).

Ela apresenta-se em diferentes graus, cuja severidade e gravidade podem


ser medidas pela intensidade da força física utilizada pelo agressor, pelo
grau de sofrimento causado à vítima, pela gravidade dos ferimentos
ocasionados, pela frequência com que é aplicada e pelas sequelas físicas e
psicológicas que provoca (FALEIROS; FALEIROS, 2007, p. 35).

“A violência física vem acompanhada pelo medo, terror, submissão como


também pelo sofrimento psíquico, o que pode constituir uma violência psicológica,
muitas vezes acobertada pelo silencia e suas marcas justificadas como acidentes”
(ANDRADE, 2011, p. 35). A violência psicológica é mais difícil de se identificar, pois
diferente da violência física que deixa marcas, a violência psicológica pode não ser
percebida. Ela provoca traumas que influenciam na atitude e nas emoções da
pessoa, “podendo a criança ou adolescente se tornar agressiva ou passiva, com
baixa autoestima, depressão e com dificuldades de interagir socialmente, dentro das
ações consideradas especificas para sua idade (ANDRADE, 2011, p.36).
A violência psicológica pode se manifestar de maneira isolada, como uma
forma de crueldade mental, ou estar associada ou combinada a outras formas de
violência. É ação ou omissão capaz de prejudicar ou controlar ações,
comportamentos, decisões ou crenças, ocorre por meio de intimidação, rejeição,
depreciação, ameaça direta ou indireta, discriminação, manipulação, humilhação,
isolamento, desrespeito, punições exageradas ou qualquer outra conduta que
implique a danos na saúde psíquica, ao desenvolvimento físico, sexual e social da
criança ou adolescente (PASSARINHO, 2005, p. 24).
Ainda, com relação a violência, a violência sexual, que é tema central do
estudo, configura-se como forma de violação direta a integridade física e psicológica
das crianças e dos adolescentes.

Abrange todo ato, exploração, jogo, relação [sexual] ou vitimização de


crianças e adolescentes por um adulto, por um adolescente, ou por uma
criança mais velha que, pelo uso do poder, da diferença de idade,
conhecimento sobre o comportamento sexual, age visando o prazer e a
gratificação própria (CORDEIRO, 2006, p. 75).
38

No que diz a violência sexual intrafamiliar, ela envolve relações familiares, os


o abusador é um parente ou pessoas próximas à vítima, expressa a “situação de uso
excessivo, de ultrapassagem de limites: dos direitos humanos, legais, de poder, de
papéis, de regras sociais e familiares e de tabus, do nível de desenvolvimento da
vítima, do que esta sabe, compreende, pode consentir e fazer” (FALEIROS, 2000,
p10). Ela pode acontecer a partir de toque físicos, como beijo, carícias, penetração,
sexo oral, anal, vaginal, ou sem qualquer tipo de contato físico, como o assédio,
cantadas obscenas, exibicionismo, voyeurismo, participação em fotos pornográficas
(CORDEIRO, 2006, p. 3).
Esse tipo de violência decorre da relação de poder, nela ocorre a inversão do
papel de proteção para opressão autoritária, vem da vontade de impor ao outro seus
desejos de mando e força, desconsiderando as capacidades de compreensão,
limites e as necessidades de desenvolvimento da criança e adolescente. Forja-se
uma relação de domínio e submissão que viola as condições básicas e essenciais
de desenvolvimento de crianças e adolescentes.
A violência sexual contra crianças e adolescentes é um fenômeno que passou
a ter mais atenção nos anos de 1990, época em que se assegurou juridicamente a
proteção integral dos direitos e às crianças e adolescentes passaram a ser sujeitos
de direitos perante o Estado, a família e a sociedade. A Constituição Federal e o
Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceram bases éticas e políticas que
derem início ao sentimento de intolerância em relação às violações sexuais.
Na história dos direitos das crianças e adolescentes um conjunto de medidas
legislativas foram sendo elaboradas. Além do Estatuto da Criança e do Adolescente,
o Código Penal Brasileiro, publicado pelo Decreto-Lei n. 2.848, em 7 de dezembro
de 1940, mecanismo jurídico que também poderia ser uma ferramenta ao
enfrentamento da violência sexual, principalmente ao que se refere aos crimes de
abuso sexual e exploração sexual comercial, todavia, o sistema penal brasileiro da
forma como está estabelecido não enfrenta as causas e consequências da violência
sexual, apenas cria uma ilusão de que alguma coisa está sendo realizada. No
Código Penal são tratados os crimes e as penas postas aos sujeitos que
transgredirem a lei.
39

Essas leis pertencem a dois momentos distintos da história do País – antes


e depois de ser inaugurada a era dos direitos de cidadania, após o fim da
ditadura militar. No caso das normas relativas à infância e à adolescência, o
divisor de águas foi o ECA. Portanto, faz sentido falar em leis contra a
violência sexual antes e depois dele. Contudo, a legislação originária de
uma CPMI para apurar os crimes de exploração sexual de crianças e
adolescentes alterou substancialmente o Código Penal [...] e o ECA [...],
tornando-os instrumentos mais poderosos de enfrentamento da violência
sexual contra jovens. O mesmo ocorreu com as normas internacionais
estabelecidas no âmbito da ONU (SANTOS; IPPOLITO, 2011, p. 174).

O artigo 213, do Código Penal, traz a penalidade para quem “constranger


alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou
permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso” (BRASIL, 1940). O artigo 215,
refere-se sobre a penalidade de “ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso
com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre
manifestação de vontade da vítima” (BRASIL, 1940). Também é um ato criminoso
aquele que “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento
sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou
ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função” (BRASIL, 1940),
segundo o artigo 216-A, do Código Penal. Estes tipos penais são aplicados às
vítimas que possuírem no mínimo catorze anos completos, pois o capítulo II, do
Código Penal, irá abarcar os tipos penais específicos para os crimes sexuais contra
crianças e adolescentes de zero à catorze anos incompletos.
O segundo capítulo do código, traz em seu artigo 217-A, que “ter conjunção
carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos” ou com
quem, independentemente da idade, “por enfermidade ou deficiência mental, não
tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra
causa, não pode oferecer resistência” (BRASIL, 1940) é crime, independente do
consentimento da vítima, ainda que o agressor e a vítima mantenham relação
amorosa, ter relação com adolescente ou criança que não tenha atingido catorze
anos de idade constitui-se crime. Praticar conjunção carnal ou outro ato libidinoso na
presença de criança ou adolescente até catorze anos de idade, afim de satisfazer
lascívia própria ou de outrem, também se constitui crime, de acordo com o artigo
218-A, do Código Penal.
O Superior Tribunal de Justiça, em 10 de abril de 2018, no Agravo Regimental
no Recurso Especial n. 1721889/MS, julgou que para a caracterização do crime de
40

estupro de vulnerável previsto no artigo 217-A do Código Penal, basta que o agente
tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa que tenha
menos de 14 anos de idade, o consentimento da vítima, sua experiência sexual
anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não
afasta a ocorrência do crime, afastando-se a relativização da vulnerabilidade da
vítima, tendo em vista a argumentação de consensualidade da vítima (BRASIL, STJ,
2018), dá mesma forma que o entendimento da Súmula 593 do Superior Tribunal de
Justiça.
Ao que pese os crimes de exploração sexual, os artigos 218-B, 227, 228, 229
e 230, do Código Penal, trazem a previsão de penas para os crimes de exploração
sexual comercial, para quem submete, atrai, induz, facilita ou até mesmo impede ou
dificulta o abandono, de criança, adolescente ou pessoa que por enfermidade ou
deficiência mental não tenha o discernimento necessário para compreender a prática
que lhe está sendo sujeitada, às atividades de exploração sexual, assim como, a
penalidade atinge a quem pratica conjunção carnal ou outro ato libidinoso nestas
condições e o proprietário, o gerente ou responsável do estabelecimento onde estas
práticas estejam ocorrente, tendo ou não intuito ou participação de lucro, configura-
se o crime o simples fato de manter local onde ocorrem explorações sexuais infantis.
Inclusive, a Lei n. 8.072, de 25 de julho de 1990, lei que dispõe sobre os
crimes hediondos, traz em seu artigo 1º, incisos V, VI e VIII, que estupro, estupro de
vulnerável e favorecimento à exploração sexual comercial de criança, adolescente
ou vulnerável é crime hediondo, desta forma, são insuscetíveis de anistia, graça,
indulto, fiança, a pena de ser inicialmente cumprida em regime fechado, a
progressão de regime só se dá após o cumprimento de dois quintos da pena, se o
réu for primário, ou então somente após três quintos de cumprimento da pena, se for
reincidente (BRASIL, 1990-a).
A partir do artigo 233, o Código Penal trata sobre os crimes de ato obsceno,
isto é, “praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público” ou,
então, “fazer, importar, exportar, adquirir ou ter sob sua guarda, para fim de
comércio, de distribuição ou de exposição pública, escrito, desenho, pintura,
estampa ou qualquer objeto obsceno” (BRASIL, 1940).
41

Importante destacar a previsão que traz o artigo 111, do referido código, após
a promulgação da Lei n. 12.650, de 17 de maio de 2012, Lei Joanna Maranhão, que
deu redação ao inciso V do artigo 111, as prescrições antes do transito em julgado
da sentença começam a correr da data em que a vítima, de crimes contra a
dignidade sexual, completa dezoito anos de idade, salvo se já tenha sido proposta a
ação penal, contribuindo para diminuição da impunidade dos agressores dessa
natureza.
Das disposições preliminares do Estatuto da Criança e do Adolescente, o
artigo 5º, expõe que “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão,
punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos
fundamentais” (BRASIL, 1990), pois são sujeitos de direito, devendo o Estado, a
família e a sociedade resguardar seu direito à vida e à saúde, para que tenha um
desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência. Assim, os
casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou
degradante ou de maus-tratos devem ser obrigatoriamente comunicados ao
Conselho Tutelar, órgão que tem competência para aplicação imediata de medidas
de proteção.
O artigo 15 ao 17, dizem a respeito sobre o direito da criança e adolescente,
pessoas em situação peculiar de desenvolvimento, de terem direito à liberdade, ao
respeito a sua dignidade, como sujeitos de direitos civil, humanos e sociais,
garantidos não só pelo Estatuto, mas sobretudo, pela Constituição Federal. O direito
ao respeito, consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral,
abrangendo a sua imagem, identidade, autonomia, valores, ideias, crenças, espaço
e objetos pessoais. É dever de todos pôr as crianças e adolescente a salvo de
qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor,
prevenindo a ameaça ou violação de seus direitos.
E quando verificada uma hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual,
praticado pelos pais ou responsáveis, caberá ao Poder Judiciário determinar medida
cautelar de afastamento do agressor da moradia em comum, segundo o artigo 130
do Estatuto da Criança e do Adolescente.
42

Ao que tange a violência sexual intrafamiliar, o Estatuto da Criança e do


Adolescente, assim como o Código Penal, previu tipificações e penalidades para os
crimes de atentem a dignidade sexual de crianças e adolescentes, em seu capítulo I,
a partir do artigo 240, tratando sobre os crimes de produção, reprodução, direção,
fotografia, filmagem ou registro, por qualquer meio de cenas de sexo explícito ou
pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, incorrendo na mesma pena quem
agencia, facilita, recruta, coage ou participa de qualquer modo nas cenas, sendo que
a pena é aumentada em um terço se for no âmbito das relações domésticas ou se
prevalece relações de parentesco consanguíneo ou afim até terceiro grau, por
adoção, tutor, curador, ou que tenha autoridade sobre a vítima. Vender ou expor à
venda, oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por
qualquer meio, adquirir, possuir, armazenar, fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfico que envolva criança ou adolescente
(BRASIL, 1990).
Simular a participação de criança ou adolescente em cena sexo explícito ou
pornográfica, ainda que por meio de adulteração, montagem ou modificação da
fotográfica, do vídeo ou qualquer forma de representação visual é crime. Incorre na
mesma pena quem vende, distribui, publica ou divulga esse tipo de material
(BRASIL, 1990).
Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação,
criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso, também é crime estabelecido
no Estatuto da Criança e do Adolescente, da mesma forma para quem facilita ou
induz a criança acessar material que contenha cenas de sexo explícito ou
pornográfico, com o fim de com ela praticar atos libidinosos ou, então, de induzi-la a
se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita (BRASIL, 1990).
Por fim, o artigo 244-A, do Estatuto da Criança e do Adolescente, refere-se à
prática de submeter criança ou adolescente à prostituição ou à exploração sexual,
reforçando que incorre no mesmo crime o proprietário, gerente ou o responsável
pelo local onde ocorrem essas práticas, devendo ser aplicada a penalidade de
reclusão, multa e a cassação da licença de localização e funcionamento do
estabelecimento (BRASIL, 1990).
43

Importante mencionar a Lei n. 9.455, de 7 de abril de 1997, que define os


crimes de tortura, em seu artigo 1º, inciso II, dispõe que “ submeter alguém, sob sua
guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso
sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de
caráter preventivo” é considerado crime de tortura (BRASIL, 1997).
A Constituição Federal, o Código Penal, o próprio Estatuto da Criança e do
Adolescente e demais leis infraconstitucionais definem quais são os tipos de
violência contra criança e adolescente e as suas penalidades, nos casos de
transgressão. Contudo, não basta a prevenção legislativa, através da ameaça de
imposição de penas para aqueles que descumprem as regras sociais, é necessário
também a previsão de um sistema articulado que vise o enfrentamento à violência
sexual, assim como, a restituição de direitos quando violados. Neste Sistema de
Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, políticas públicas, diversos atores
e instituições tem papel fundamentar para garantir a proteção integral.

2.3 O Sistema de Garantias de Direitos e as responsabilidades intersetoriais no


enfrentamento à violência sexual intrafamiliar contra a criança e o adolescente

Para garantir a concretização de direitos consagrados na Constituição Federal


e no Estatuto da Criança e do Adolescente, estruturou-se um sistema de garantia de
direitos, formulado a partir da articulação intersetorial entre as responsabilidades dos
órgãos públicos responsáveis pela garantia, com prioridade absoluta, do
atendimento, da proteção e a efetivação de direitos fundamentais às crianças e
adolescentes.
O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente é um
conjunto ordenado e sistemático de compartilhamento de competências
institucionais para controle de efetivação dos direitos fundamentais. Guardam entre
si, atribuições, competências e responsabilidades, de necessidade mútua e
recíproca, onde, tais vínculos se operam pelo sentido, orientação e conteúdo, nas
palavras de Ramidoff (2008, p. 44-45) “agregados, analiticamente aos
desdobramentos possíveis de serem reconhecidos como protetivos e
44

emancipatórios destas novas subjetividades precisamente pela pertinência que


guardam com a Doutrina da Proteção Integral”.
A concepção de Sistema de Garantia de Direitos da Criança e Adolescente
tem origem no artigo 227 da Constituição Federal, se propagou no Estatuto da
Criança e do Adolescente, de 1990, prevendo um sistema de compartilhamento de
responsabilidades e disciplinando os direitos fundamentais. Trata-se da
concretização de políticas públicas articuladas entre governo e sociedade civil
organizada, que visam diretamente a proteção de direitos das crianças e
adolescentes. Diante da complexidade do tema, viu-se a necessidade de um
sistema capaz de assegurar a garantia dos direitos fundamentais mediante a
estruturação de políticas de atendimento, proteção e justiça.

Os sistemas de garantias estabelecidos no Estatuto da Criança e do


Adolescente muito mais do que harmonia, certamente, guardam entre si
implicações funcionais (atribuições, competências e responsabilidades) de
necessariedade mútua e recíproca, vale dizer, apenas se pode devidamente
reconhecer um sentido normativo das regras pertinentes e contidas em
cada um daqueles subsistemas, quanto, e, tão-somente referenciarem-se
mutuamente, segundo a própria sistematicidade estabelecida, haja vista que
tais vínculos se operam pelo sentido, orientação e conteúdo (substância)
agregados, analiticamente aos desdobramentos possíveis de serem
reconhecidos como protetivos e emancipatórios destas novas subjetividades
precisamente pela pertinência que guardam com a Doutrina da Proteção
Integral (RAMIDOFF, 2008, p. 44-45).

Este sistema visa organizar, através de um conjunto de ações articuladas


entre instituições públicas e privadas, que possuem como objetivo efetivar os direitos
de crianças e adolescentes, pois apesar da Constituição Federal e o Estatuto da
Criança e do Adolescente trazerem uma dimensão sobre o sistema de garantias, a
organização dele se constitui através de construções doutrinárias, que estabelecem
parâmetros para institucionalização e fortalecimento de um sistema de garantia de
direitos da criança e do adolescente (SOUZA, 2016, p. 81).
O Sistema de Garantia de Direitos está articulado mediante a integração
operacional do sistema das políticas públicas de atendimento, proteção e justiça. As
políticas públicas de atendimento são constituídas pelo conjunto articulado de ações
governamentais e não-governamentais, que tem como linha de ação desde as
políticas básicas até os serviços especiais de prevenção, identificação,
encaminhamento e proteção dos direitos e garantias de crianças e adolescentes.
45

Aos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, cabe o


planejamento, deliberação e controle intersetorial das políticas públicas de
atendimento aos direitos das crianças e adolescentes (CUSTÓDIO; MOREIRA,
2015, p.43). O Conselho Tutelar atua mediante a aplicação de medidas
administrativas para promover e assegurar direitos, dando os encaminhamentos
sempre que necessário, em casos de ameaça ou violação de direitos. A Justiça tem
papel fundamental para o respeito e cumprimento dos direitos assegurados
constitucionalmente e para atuar nos casos de responsabilização daqueles que
violaram ou ameaçaram os direitos fundamentais.
Os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente estão instituídos em
âmbito nacional, estadual e municipal como instâncias de controle e deliberação das
políticas públicas apontando diretrizes, objetivos, metas e ações para as políticas
públicas de atendimento de crianças e adolescentes. Tem caráter deliberativo e
possuí a atribuição de controlar as ações em todos os níveis para a garantia de
direitos. Os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente tem papel
fundamental na promoção a articulação de esforços para a criação, aprimoramento e
reordenamento de serviços destinados às crianças e adolescentes.
A participação da população através dos Conselhos de Direitos propicia a
continuidade das ações, dos planos e das políticas estabelecidas, a participação de
diferentes segmentos da sociedade civil, como organizações não-governamentais
favorece o processo de integração de diferentes setores, em vista de um objetivo em
comum: a proteção integral de crianças e adolescentes. “É isso que também
caracteriza a necessidade de desenvolvimento de estratégias interdisciplinares e a
intersetorialidade das políticas públicas” (HAMMES, 2017, p. 66).
O espaço público é o espaço da sociedade, simboliza a democracia em ação,
portanto, também é um espaço político, pois aproxima os cidadãos propiciando o
sentimento de participação efetiva da política, que é construída a partir de valores
comuns (ARENDT, 1972).
Há o reconhecimento dos conselhos de políticas públicas como órgãos
colegiados, deliberativos e consultivos, responsáveis por promover um diálogo entre
sociedade civil e governo nos processos decisórios, “tratam-se de canais de
participação que articulam representante da população e membros do poder público
46

estatal em práticas que dizem respeito à gestão de bens públicos” (GOHN, 2007, p.
7). Nestes termos, tem-se a constituição de novas formas de participação
democrática, “cuja participação não é medida pelo processo eleitoral e que permitiria
aos cidadãos um controle sobre a ação do Estado” (GONZALES, 2000, p. 90), mas
uma democracia participativa, através de atores incumbidos da responsabilidade de
fiscalizar as ações governamentais e também de decidir, de forma deliberativa,
atuações do Poder Executivo.
Dentre as diretrizes traçadas a pelo Estatuto da Criança e do Adolescente,
como o artigo 86, inciso II, está a determinação da criação de conselhos de direitos,
como “órgão deliberativo e controlador das ações em todos os níveis, assegurada a
participação popular paritária por meio de organizações representativas” (BRASIL,
1990). Assim, é possível verificar que os Conselhos de Direitos da Criança e do
Adolescente caracterizam-se por ser um espaço público que abrange a possibilidade
de participação popular paritária, isto é, composta por representantes de entidades
públicas e de entidades privadas, em igual número, e que envolve diferentes área
das políticas públicas. Os representantes governamentais são escolhidos pelo chefe
do Poder Executivo, do respectivo nível, e a outra metade é escolhida pela
sociedade civil, através das suas organizações representativas.
Os Conselhos de Direitos estão organizados nas três esferas administrativas
do país, a nível nacional há o Conselho Nacional da Criança e do Adolescente
(CONANDA), no nível estadual, há os Conselhos Estaduais da Criança e do
Adolescente e, por fim, no âmbito municipal há os Conselhos Municipais da Criança
e do Adolescente. Consta no artigo 88, inciso II a previsão da instituição dos
conselhos, assegurando a participação popular, por meio de organização
representativas, segundo as leis federais, estaduais e municipais.

A ação dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente deve estar


estruturada a partir dos Planos Decenais de Direitos Humanos da Criança e
do Adolescente constituído por diagnóstico, diretrizes, objetivos, metas,
ações necessárias à efetivação dos direitos fundamentais da criança e do
adolescente. Também são indispensáveis mecanismos de controle,
monitoramento e avaliação das políticas públicas com medidas de correção
dos rumos apontados nos respectivos planos, buscando maior efetividade e
resultado (CUSTÓDIO; MOREIRA, 2015, p.44).
47

Como órgão descentralizador não está submetido a uma hierarquia, tendo


competência para deliberar as políticas públicas no seu respectivo nível vinculando a
administração pública em todas suas deliberações, sem a necessidade de submeter
as suas decisões à homologação do Poder Executivo, o que é extremamente
positivo, pois dá autonomia para o conselho desenvolver seu trabalho. A partir do
momento que uma questão é posta para deliberação, após a votação, não existirá
mais a possibilidade de proposta da sociedade civil ou do governo, pois a decisão
tomada a partir da vontade do órgão, que é representado pelo governo e a
sociedade civil, não será mais rediscutida, nem pelo Poder Executivo, que terá o
dever de executar a decisão nos termos da deliberação. (LIBERATI; CYRINO, 1993,
p. 78).

Os Conselhos superiores (Nacional e Estaduais) quando deliberam também


vinculam seu respectivo nível de atuação e, estas deliberações, quando
aplicáveis tem caráter de recomendação aos níveis inferiores, garantindo
assim, a plena autonomia na atuação do Conselho, que de todo modo,
estão todos vinculados e condicionados aos princípios e regras do Direito
da Criança e do Adolescente. Além da descentralização, o Estatuto da
Criança e do Adolescente impõe a diretriz da municipalização do
atendimento (CUSTÓDIO, 2015, p. 6).

As decisões dos Conselhos de Direitos têm força jurídica vinculante, isto


porque vinculam a administração pública, são “como atos normativos, portanto,
obrigatórios, vinculativos de toda a Administração Pública, sem embargo de estarem
sujeitos à correção e controle por meio das ações judiciais pertinentes” (ROSSATO;
LÉPORE; SANCHES, 2012, p. 280).
Na ação de deliberar, em relação as políticas públicas para crianças e
adolescentes, o Conselho de Direitos tem papel normativo disciplinador, uma vez
que suas decisões podem estabelecer regras administrativas que visam o
melhoramento e aperfeiçoamento da política de atendimento, ou seja, não é
meramente consultivo, trata-se da efetiva participação, em decidir em determinadas
situações, após discussão entre seus pares. Essa deliberação “será conteúdo de
resoluções dos Conselhos e terá como destinatários todas as pessoas e órgãos
responsáveis pela execução de políticas de atendimento” (CYRINO, 2000, p. 258).
Deve ser derivada de um estudo real e profundo sobre a situação municipal,
verificando problemas existentes na sociedade, com vista a apresentar ao executivo
48

planos e estratégias de intervenção de acordo com as necessidades de cada


município.
Em razão da sua característica de órgão deliberativo, o Conselho de Direitos
possuí autonomia, pois tem caráter de órgão autônomo, com independência
administrativa, faculdade de se governar. Criado por lei, tem regimento interno
próprio e suas tarefas estão vinculadas a lei que os criou, não a tarefas
subordinadas à administração pública, logo, não se admite ingerência política em
suas decisões, nem controle administrativo de seus atos, ressalvado o controle de
legalidade ou finalístico. Suas decisões só podem ser revistas por decisão judicial,
jamais por outras autoridades administrativas (CYRINO, 2000, p. 259).
Dentre as suas atribuições está o papel de controle social e fiscalização das
políticas públicas e das entidades de atendimento no campo de sua competência,
podendo, inclusive, estabelecer critérios de funcionamento, indicadores de controle
para avaliação, gerenciamento e fiscalização do Fundo dos Direitos da Criança e do
Adolescente, a inscrição de programas e registro de entidades. “Dessa forma poderá
apresentar e deliberar propostas retificadoras dos desvios em todos os níveis –
inclusive e principalmente político - porventura detectados” (CYRINO, 2000, p. 259).
As atribuições específicas dos Conselhos de Direitos da Criança e dos
Adolescentes está no desenvolvimento de atividades de planejamento, promoção,
mobilização, articulação, controle e fiscalização (CUSTÓDIO, 2015, p. 6).
Cabe ao Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, acompanhar e
deliberar políticas para crianças e adolescentes mediante a articulação das diversas
áreas, como da saúde, educação e assistência social, atuando na articulação
institucional e intersetorial, para tanto é necessária uma estrutura administrativa
básica, com disponibilidade de pessoal administrativo capacitado, que vão atender
às entidades que queiram se cadastrar, elaborar resoluções a partir das
deliberações do colegiado, acompanhar as movimentações financeiras do Fundo de
Direitos da Criança e do Adolescente, desenvolver todas atividades técnicas e de
gestão que sejam necessárias para o bom funcionamento do Conselho, uma vez
que o Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente não consegue resolver
todas as questões apenas em reuniões ordinárias. Cabe ao Poder Executivo arcar
49

com essa estrutura física e de pessoal para o pleno funcionamento (SOUZA;


BONFANTE, 2008, p .38-39).
Para a política de atendimento é necessário planejamento e deliberação, que
é uma das atribuições do Conselho de Direitos, sob a condição de garantir a
dignidade da pessoa humana, promover o bem-estar coletivo e atender as
demandas específicas. “Assim, construir uma política de atendimento para crianças
e adolescentes requer a organização de planos, programas, projetos, ações e
benefícios articulados de modo a atender os direitos fundamentais consagrados no
Direito da Criança e do Adolescente” (CUSTÓDIO, 2015, p. 7). Cabe ao Conselho
de Direitos garantir a construção das políticas públicas de atendimento com base
nas linhas de ação estabelecidas no artigo 87, do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que dispõe:

Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:


I - políticas sociais básicas;
II - serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social de
garantia de proteção social e de prevenção;
III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial
às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e
opressão;
IV - serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e
adolescentes desaparecidos;
V - proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e
do adolescente.
VI - políticas e programas destinados a prevenir ou abreviar o período de
afastamento do convívio familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à
convivência familiar de crianças e adolescentes;
VII - campanhas de estímulo ao acolhimento sob forma de guarda de
crianças e adolescentes afastados do convívio familiar e à adoção,
especificamente inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com
necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de
irmãos (BRASIL, 1990).

Cabe ao Conselho de Direitos manter construir, a articulação intersetorial


entre diversos conselhos para a construção e manutenção de políticas públicas, bem
como, construir diagnósticos atualizados sobre a situação de crianças e adolescente
no âmbito de seu território, mediante a sistematização e coleta de dados. Esses
diagnósticos são fundamentais para que o Conselho de Direitos possa elaborar,
executar e avaliar os Planos Decenais de Direitos Humanos de Crianças e
Adolescentes “que devem conter diretrizes, objetivos, metas, estratégias, prazos e
50

recursos capazes de garantir o atendimento integral à crianças e adolescentes”


(CUSTÓDIO, 2015, p. 8-9).
Os Planos Decenais de Direitos da Crianças e Adolescentes devem ser
discutidos nas Conferências de Direito da Criança e do Adolescente, que ocorrem
periodicamente e constituem-se a partir de debates públicos sobre a capacidade de
atendimento das políticas públicas e de construção estratégica para garantir a
efetivação integral dos direitos fundamentais. A atribuição do Conselho de Direitos
da Criança e do Adolescente nas conferências é de organizá-las e convocar a
comunidade, famílias, crianças e adolescentes para avaliar as ações realizadas e
discutir as estratégias e metas para o ciclo seguinte (CUSTÓDIO, 2015, p. 9).
As estratégias são intersetoriais, isto é, envolvem políticas públicas de saúde,
educação, assistência social, cultura, lazer, esporte, como planos específicos para o
atendimento e prevenção, por exemplo, pelo fim da violência e exploração sexual,
erradicação do trabalho infantil, convivência familiar, entre outros. O artigo 5º da
Resolução n. 171, de 04 de dezembro de 2014, do CONANDA, estabelece que:

Art. 5º Compete ao Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente:


I – aprovar e deliberar o respectivo plano decenal dos direitos humanos de
crianças e adolescentes;
II – apoiar e articular a implementação das ações do plano decenal dos
direitos humanos de crianças e adolescentes;
III – articular com os órgãos dos Poder Executivo e Legislativo visando à
inserção de ações constantes do plano decenal dos direitos da criança e do
adolescente no plano plurianual e na lei orçamentária;
IV – definir instrumentos de avaliação e monitoramento da implementação
do plano decenal dos direitos humanos de crianças e adolescentes; e
V – encaminhar o respectivo plano decenal dos direitos humanos de
crianças e adolescentes ao Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente.
Parágrafo único. Compete aos Conselhos Estaduais dos Direitos da Criança
e do Adolescente estimular e apoiar os Conselhos municipais para o
cumprimento desta Resolução (CONANDA, 2014).

O Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente também é responsável


por administrar os recursos do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente
(FIA), elaborando o Plano de Aplicação em consonância com as “diretrizes
estabelecidas no Plano Decenal dos Direitos Humanos da Criança e do
Adolescente. Além disso, deve fiscalizar a aplicação dos recursos do FIA e verificar
seu uso de acordo com as normas específicas para o uso e aplicação de recursos
públicos” (CUSTÓDIO, 2015, p. 10).
51

De acordo com o artigo 2º da Resolução n. 137, de 2010, do CONANDA, o


Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente deve ser vinculado ao Conselho
dos Direitos da Criança e do Adolescente do respectivo ente federado, responsável
por gerir, fixar critérios de utilização e plano de aplicação dos seus recursos,
conforme o disposto no §2º, do artigo 260, do Estatuto da Criança e do Adolescente
(BRASIL, 2010).
Os recursos do Fundo podem ser destinados ao financiamento de ações
governamentais e não governamentais, sendo mecanismos de descentralização do
orçamento da administração pública. O fundo deve ter como objetivo prioritário a
estruturação e o fortalecimento do Sistema de Garantias de Direitos mediante ações
de elaboração de pesquisas e diagnósticos, capacitação dos profissionais da rede
de atendimento e do Sistema de Garantias de Direitos, projetos relativos às políticas
de promoção, proteção, defesa e atendimento dos direitos, organização das
Conferências de Direitos e atividades de sensibilização da comunidade e promoção
dos direitos de crianças e adolescentes. Todavia, não podem ser utilizados para
financiamento de serviços de caráter continuado. São recursos aplicados
exclusivamente na área da criança e do adolescente, obedecendo ao princípio da
prioridade absoluta, preconizado pelo caput do artigo 227 da Constituição Federal.
Com deliberação e controle do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente,
cuja contas devem ser prestadas ao Tribunal de Contas, conforme disposições dos
artigos 71 e 74, da Lei n. 4.320, de 17 de março de 1964.
Aos Conselhos de Direitos compete conduzir o processo de escolha dos
membros do Conselho Tutelar, instituir corregedorias ou comissões com caráter
administrativo para apurar violação dos deveres dos Conselheiros Tutelares.
Também é responsável por manter os registros das entidades de atendimento,
assim como, por reavaliar, a cada dois anos, os programas em execução,
constituindo critérios para renovação da autorização de funcionamento. De acordo
com o artigo 91 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 91. As entidades não-governamentais somente poderão funcionar


depois de registradas no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente, o qual comunicará o registro ao Conselho Tutelar e à
autoridade judiciária da respectiva localidade.
§ 1o Será negado o registro à entidade que:
52

a) não ofereça instalações físicas em condições adequadas de


habitabilidade, higiene, salubridade e segurança;
b) não apresente plano de trabalho compatível com os princípios desta Lei;
c) esteja irregularmente constituída;
d) tenha em seus quadros pessoas inidôneas.
e) não se adequar ou deixar de cumprir as resoluções e deliberações
relativas à modalidade de atendimento prestado expedidas pelos Conselhos
de Direitos da Criança e do Adolescente, em todos os níveis.
§ 2o O registro terá validade máxima de 4 (quatro) anos, cabendo ao
Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente,
periodicamente, reavaliar o cabimento de sua renovação, observado o
disposto no § 1o deste artigo (BRASIL, 1990).

As entidades não-governamentais são fiscalizadas pelo Poder Judiciário,


Ministério Público e pelos Conselhos Tutelares. Em caso de descumprimentos das
obrigações, as entidades podem sofrer medidas administrativas, tais como
advertência, afastamento provisório ou definitivo de seus dirigentes, fechamento da
unidade ou interdição do programa. Se for entidade não-governamental, poderá
haver, além da advertência, a suspensão total ou parcial do repasse de verbas
públicas, interdição ou suspensão do programa e cassação do registro, segundos os
artigos 96 e 97, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Quando direitos de crianças e adolescentes são violados, ou o Estado,
sociedade e a família são omissos, ameaçam ou violam tais direitos previstos no
ordenamento constitucional e estatutário, antes da atuação jurisdicional, tais
conflitos passam pelo âmbito administrativo, tendo em vista o princípio
desjurisdicionalização. Para Lima (2001, p. 282), desjuridicionalizar é um elemento
essencial, pois “implica em trocar o sinal dessa atitude concentradora, reduzindo ao
máximo o envolvimento do sistema de justiça com questões que demandam
tratamento político-administrativo”.

Existem, também algumas premissas básicas relativas à participação da


sociedade civil das quais se destaca a participação da sociedade civil na
esfera pública - via conselhos e outras formas institucionalizadas - não é
para substituir o Estado, mas para lutar para que este cumpra seu dever:
propiciar educação, saúde e demais serviços sociais com qualidade, e para
todos. Essa participação deve ser ativa e considerar a experiência de cada
cidadão que nela se insere e não os tratar como corpos amorfos a serem
enquadrados em estruturas prévias, num modelo pragmatista (GOHN, 2004,
b, p. 24).

A participação da sociedade civil na elaboração, execução e fiscalização das


políticas públicas representou um avanço significativo na ampliação da democracia e
53

da cidadania, fundamentos do Estado Democrático de Direito. A construção de


espaços que possibilitem a participação social foi um dos elementos centrais nos
avanços da promoção de direitos à criança e ao adolescente. Para tanto, é
necessário estabelecer “um novo padrão de relação entre Estado e sociedade,
criando novas formas de contrato social, por meio da ampliação da esfera social
pública” (GOHN, 2004, a, p. 66).
Além do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, o Estatuto da
Criança e do Adolescente prevê um órgão específico de proteção no Sistema de
Garantias de Direitos, para possibilitar a efetivação de direitos fundamentais, como
instância administrativa, denominado de Conselho Tutelar, de acordo com o artigo
131 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Conselho Tutelar é órgão
permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar
pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei”
(BRASIL, 1990).

[...] reflete uma sociedade democrática moderna, por além de ser


representativa, apresenta características de ser social, participativa e
pluralista. Social, porque visa à correção de graves injustiças e
desigualdades sociais. Participativa, porque exige que, cada vez mais,
setores mais amplos da sociedade civil passem da posição de espectadores
passivos para a de agentes responsáveis pelas soluções e medidas que
atendam às necessidades da sociedade, isto é, passem da posição de
súditos para a de cidadãos. Pluralista, porque o pluralismo é uma
decorrência da liberdade, onde, de um lado, está o respeito às opiniões e
pensamentos divergentes e, de outro o reconhecimento da multiplicidade de
organizações, interesses e forças da sociedade, com grupos e movimentos
sociais (PEREIRA, 2008, p. 572).

O Conselho Tutelar tem como objetivo proteger os direitos fundamentais de


crianças e adolescentes no âmbito municipal, é vinculado ao Poder Público
municipal, mas dotado de autonomia institucional, tem “interesse e caráter de
relevância para a sociedade” (SOUZA; SOUZA, 2010, p. 83).
A instituição do Conselho Tutelar amplia o fortalecimento da participação
social, caracteriza-se por zelar direitos difusos, coletivos e transindividuais
homogêneos, sua atuação não se restringe aos direitos individuais, uma vez que
sempre deverá atuar quando houver violação ou ameaça de violação de direitos,
inclusive para exigir do Poder Público a adoção de medidas pertinentes para
garantia e efetivação desses direitos.
54

A Resolução n. 170, de 10 de dezembro de 2014, do CONANDA é que dispõe


sobre os parâmetros para criação e funcionamento dos Conselhos Tutelares:

Como órgão autônomo não existe subordinação funcional do Conselho


Tutelar a qualquer órgão ou instância. Entretanto, a atividade do Conselho
Tutelar está vinculada a uma estrutura orgânica do Poder Executivo
Municipal. Para maior dinamismo do trabalho a ser efetuado pelo Conselho
Tutelar, o CONANDA recomenda que ele esteja institucionalmente (para
fins meramente administrativo-burocráticos) vinculado a estrutura geral do
Poder Executivo, a exemplo dos demais órgãos do município (CONANDA,
p. 20, 2001).

O Conselho Tutelar possuí autonomia, pois não está subordinado


hierarquicamente a nenhum outro órgão, isto assegura uma atuação sem
interferências externas, viabilizando uma ação mais eficaz. Todavia, apesar da
autonomia que lhe foi atribuída, o Conselho Tutelar está vinculado à administração
pública municipal, a qual deve destinar verbas e a estrutura necessária para o
funcionamento e atuação do órgão (REIS, 2014, p. 148).
Nenhum órgão pode exercer controle sobre as deliberações do Conselho
Tutelar, em razão de sua autonomia, mas está sujeito à fiscalização do cumprimento
de suas atribuições legais e institucionais, sendo a sociedade civil, o Poder
Judiciário, o Ministério Público. O Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente
terá responsabilidade de apuração e responsabilização administrativa nos casos de
violação de deveres funcionais pelos Conselheiros Tutelares.
Importante destacar que o Conselho Tutelar é órgão público não jurisdicional,
isto é, apesar de desempenhar funções administrativas direcionas ao cumprimento
de dos direitos, não se integra ao Poder Judiciário, nem substitui o papel jurisdicional
do Juizado da Infância e da Juventude, uma vez que não pode atuar como julgador
ou na aplicação de sanções. Suas atribuições se limitam a representar junto a
autoridade judiciária quando houver o descumprimento injustificado de suas
deliberações. Essa diferenciação é fundamento para a compreensão das atribuições
do Conselho Tutelar.
Outra característica do Conselho Tutelar, é de ser um órgão permanente, isso
implica dizer que uma vez constituído por lei municipal, em razão da sua natureza
pública e de interesse local, não poderá ser extinto, dando-o estabilidade. É
composto por cinco membros constituindo um órgão colegiado que possui o dever
55

de aplicar a melhor medida administrativa ao caso concreto. Não existem decisões


individuais, por se tratar de órgão colegiado, todas suas medidas são deliberadas
em conjunto.

Os Conselhos Tutelares são formados por uma coletividade de pessoas


físicas ordenadas horizontalmente, ou seja, com base em uma relação de
coligação ou coordenação, e não uma relação de hierarquia; são pessoas
situadas no mesmo plano que devem atuar coletivamente em vez de
individualmente, concorrendo a vontade de todas elas ou da maioria para a
formação da vontade do órgão (DI PIETRO, 2005, p. 441).

Essa característica de órgão colegiado e horizontal, sem hierarquias


verticalizadas, é fundamental para atuação dos membros do Conselho, porque
“todos os membros são responsáveis pela consecução e efetivação das políticas
públicas de atendimento às crianças e adolescentes, inclusive exigindo a sua
observância e cumprimento por parte do Poder Público” (REIS, 2014, p. 149).
Os Conselheiros Tutelares são escolhidos pela população local, pelo sufrágio
universal, não obrigatório, para um mandato de 4 anos, permitida reeleição, a idade
mínima para concorrer será de 21 anos, além da idade mínima, deverá ter
reconhecida idoneidade moral e residir no mesmo município. Cabe a Lei municipal
ou distrital definir local, dia, horário de funcionamento do Conselho Tutelar, inclusive
sobre a remuneração (BRASIL, 1990).
Segundo o artigo 24, da Resolução n. 170, de 10 de dezembro de 2014, os
Conselheiros Tutelares são investidos na função de autoridade pública, pois cabe ao
Conselho Tutelar tomar as providências necessárias e aplicar as medidas de
proteção necessárias para cessar a violação ou ameaça de direitos às crianças e
adolescentes. Neste viés, importante destacar que “as decisões do Conselho Tutelar
proferidas no âmbito das suas atribuições e obedecidas as formalidades legais, têm
eficácia plena e são passíveis de execução imediata” (CONANDA, 2014).
O Conselho Tutelar não é órgão estático, que apenas aguarda o
encaminhamento de denúncias, sua atuação deve incluir o monitoramento e a
prevenção, com a aplicação de medidas e a realização de encaminhamentos diante
da simples identificação de ameaça de violação de direitos de crianças e
adolescentes (CONANDA, 2014, p. 20-21).
56

As principais competências do Conselho Tutelar estão descritas no rol do


artigo 136, Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:


I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e
105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII;
II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas
previstas no art. 129, I a VII;
III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto:
a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social,
previdência, trabalho e segurança;
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento
injustificado de suas deliberações.
IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração
administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente;
V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência;
VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as
previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional;
VII - expedir notificações;
VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou
adolescente quando necessário;
IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta
orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da
criança e do adolescente;
X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos
direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal;
XI - representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou
suspensão do poder familiar, após esgotadas as possibilidades de
manutenção da criança ou do adolescente junto à família natural.
XII - promover e incentivar, na comunidade e nos grupos profissionais,
ações de divulgação e treinamento para o reconhecimento de sintomas de
maus-tratos em crianças e adolescentes.
Parágrafo único. Se, no exercício de suas atribuições, o Conselho Tutelar
entender necessário o afastamento do convívio familiar, comunicará
incontinenti o fato ao Ministério Público, prestando-lhe informações sobre os
motivos de tal entendimento e as providências tomadas para a orientação, o
apoio e a promoção social da família (BRASIL, 1990).

É a partir desses atributos, indicativos mais genéricos feitos pelo legislador,


que o Conselho Tutelar, como órgão autônomo e não jurisdicional poderá se
aproximar da sociedade, inclusive representando-a, conseguirá efetivar às suas
competência e objetivos de assegurar a proteção integral às crianças e
adolescentes. Sempre que o Conselho Tutelar identificar uma ameaça ou violação
de direitos, deverá aplicar medida de proteção. Tais medidas de proteção estão
dispostas nos incisos I a VI, do artigo 101, do Estatuto:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a


autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes
medidas:
57

I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de


responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino
fundamental;
IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção,
apoio e promoção da família, da criança e do adolescente;
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime
hospitalar ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a alcoólatras e toxicômanos; (BRASIL, 1990).

Sempre que aplicar uma medida de proteção o Conselho Tutelar deve


observar o caráter pedagógico e protetivo da medida aplicada à criança, ao
adolescente, pais ou responsáveis, devendo sempre que possível privilegiar
medidas que reforcem os laços familiares e comunitários. As medidas determinadas
pelo Conselho Tutelar são remetidas para a rede de serviços do município,
responsável por executá-las. Também é possível o Conselho Tutelar expedir
notificações para garantir a aplicação de medida de proteção. A falta ou a
irregularidade no cumprimento das medidas administrativas aplicadas impede a
restituição do direito violado. Portanto, o trabalho do Conselho Tutelar não se
satisfaz com o mero encaminhamento, ficará responsável por verificar se o mesmo
foi atendido e tomar providências para sua efetiva execução, ainda que tenha que
representar junto ao Judiciário por descumprimento injustificado de suas
deliberações.
O Conselho Tutelar pode aplicar medidas aos pais e responsáveis, quando
estes descumprem com seu dever de garantir direitos às crianças e adolescentes,
as medidas estão dispostas no artigo 129, I a VII, do Estatuto da Criança e do
Adolescente:

Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável:


I - encaminhamento a serviços e programas oficiais ou comunitários de
proteção, apoio e promoção da família;
II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;
IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;
VII – Advertência (BRASIL, 1990).

Essas medidas possuem caráter administrativo e seu descumprimento implica


na infração prevista no artigo 249 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que
58

prevê: “Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em


caso de reincidência” (BRASIL, 1990).
O Conselho Tutelar tem o poder de agir sempre que os direitos das crianças
ou adolescentes forem ameaçados ou violados, de acordo com o artigo 98, do
Estatuto da Criança e do Adolescente, o Conselho Tutelar possui atribuições
específicas para a garantia da proteção integral, conforme estabeleceu o artigo 136.
Quando o Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe em seu artigo 136 a
palavra atender, é no significado de receber queixas, informações, reinvindicações e
solicitações de crianças, adolescentes, de sua família ou sua comunidade, que tem
direitos ameaçado ou sob a iminência de serem ameaçados e violados, conforme
prevê o artigo 95. Caso receba denúncias, ou informação sobre ameaça ou violação
de direitos, cabe a ele averiguar as informações, orientar os pais ou responsáveis e
aplicar as medidas administrativas pertinentes. Desta forma, não se pode confundir
a atuação do Conselho Tutelar com as responsabilidades dos serviços oferecidos na
política de atendimento, de prestação de serviço básico ou especial. Essa confusão
é feita muitas vezes pelo Ministério Público “quando determina ao Conselho Tutelar
a realização de acompanhamento em visita domiciliar semanal durante um
semestre, enviando relatório àquele órgão, fundado equivocadamente no disposto
do artigo 136, I” (SOUZA, 2016, p. 97). Essa competência não é do Conselho
Tutelar, nem da equipe de atendimento da rede de atendimento, mas sim, da equipe
técnica do órgão Ministerial, ou de acordo com a política de atendimento do
município, pois ao Conselho Tutelar caberia apenas o encaminhamento, o
acompanhamento das ações promovidas pelo órgão ministerial e quando entende
necessário requisitar serviços na área da saúde, educação, serviço social,
previdência, trabalho e segurança.

Requisição é o ato de determinar uma medida, praticado por quem tem


autoridade para isso. Existe um princípio constitucional (art. 5º II, C.F.) que
diz: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão
em virtude de lei. Assim sendo, o Conselho só pode compelir alguém a
fazer ou deixar de fazer alguma coisa se houver uma lei que o autorize. Pois
o Estatuto (art. 136 - III “a”) dá poderes ao Conselho para requisitar serviços
públicos. Que serviços? Aqueles que, pela Constituição, por outras leis e
pelo Estatuto, são devidos à criança, ao adolescente e à sua família. [...] o
Estatuto veio para introduzir novos usos, hábitos e costumes no âmbito da
sociedade política e juridicamente organizada. E tudo começa quando,
tendo repartições públicas praticado o velho uso, hábito, costume da não
oferta ou da oferta irregular do serviço devido, o cidadão ofendido passa a
59

praticar o novo hábito de defender o seu direito. Para a defesa de direitos


do cidadão, no âmbito administrativo (não no jurisdicional) ou para
simplesmente promover a execução de suas decisões (MORAES, 1992).

No que tange aos limites territoriais de atuação do Conselho Tutelar, as


disposições encontram-se no artigo 147 do Estatuto da Criança e do Adolescente,
que traz que a competência será definida pelo domicílio dos pais e responsável ou
pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, na falta de pais e
responsável. Portanto, o Conselho Tutelar tem sua competência restringida pelos
limites geográficos municipais, devendo verificar suas competências territoriais antes
de agir. Caso a criança seja de outro município, deverá de “imediato aplicar medidas
de proteção para sanar a violação de direitos e comunicar ao Conselho Tutelar da
localidade onde reside a criança ou o adolescente, a fim de que se façam os
encaminhamentos necessários de atuação daquele município” (SOUZA, 2016, p. 99-
100).
O Sistema de Garantia de Direitos está estruturado em três níveis, as políticas
de atendimento, políticas de proteção e, em um terceiro nível, está a política de
justiça, o qual será garantido a todas crianças e adolescente o acesso à Defensoria
Pública, ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, ou por qualquer de seus órgãos,
sempre que houver ameaça ou violação dos direitos fundamentais da criança e do
adolescente. “A ação articulada entre Defensoria Pública, Ministério Público e Poder
Judiciário constitui o centro da política de justiça que se configura na última instância
de concretização dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes” (SOUZA,
2016, p. 107).

A política de justiça constitui-se do compartilhamento de responsabilidades


entre os órgãos do sistema de justiça, em especial a Defensoria Pública, o
Ministério Público e o Poder Judiciário, para defesa e garantia dos direitos
humanos da criança e do adolescente, materializado na garantia do acesso
à justiça e ao reconhecimento da condição de sujeitos de direitos (SOUZA,
2016, p. 100).

Quando forem ameaçados e violados os direitos de crianças e adolescentes,


não providos pela esfera administrativa pelo Conselho Tutelar, neste caso haverá a
prestação da tutela jurisdicional. Desta forma, a atuação conjunta do Ministério
Público e do Poder Judiciário é fundamental para efetivação dos direitos das
60

crianças e adolescente, pois são indispensáveis para a observância das diretrizes e


normativas que asseguram a proteção integral.
A garantia de acesso à justiça está prevista no artigo 141 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, devendo ser garantido a assistência judiciária gratuita
para todos que dela necessitarem, principalmente quando não forem atendidos pela
Defensoria Pública. Salienta-se que o Sistema de Justiça somente atua nos casos
de crianças e adolescentes quando a solução do conflito e a efetivação de direitos,
violados pelos seus pais, responsáveis, pela família, Estado ou sociedade, por meio
de ações ou omissões, ou quando o sistema de promoção e proteção de direitos
falhar, somente nesses casos caberá ao Poder Judiciário atuar (PEREIRA, 2000).
Pode-se dizer que o sistema de justiça possui caráter subsidiário no Sistema de
Garantais de Direitos da Criança e do Adolescente (CUSTÓDIO, 2009).
O artigo 145 do Estatuto da Criança e do Adolescente determina os
parâmetros de competência para a criação da Justiça da Infância e Juventude,
segundo o artigo, os Estados e Distrito Federal deverão criar “varas especializadas e
exclusivas da infância e da juventude, cabendo ao Poder Judiciário estabelecer sua
proporcionalidade por número de habitantes, dotá-las de infraestrutura e dispor
sobre o atendimento, inclusive em plantões” (BRASIL, 1990).
A Constituição Federal, trouxe em seu artigo 127, o Ministério Público como
instituição permanente, essencial para a jurisdição Estatal, tendo com incumbência
defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais
indisponíveis (BRASIL, 1988), nesse sentido, o Ministério Público é guardião não
apenas da justiça legal, mas também da ordem jurídica ampla, ele é o garantidor da
justiça política.

De igual forma, os interesses individuais indisponíveis, enquanto direitos


não disponíveis e resistidos aos seus titulares, geralmente representados
por aqueles sem capacidade de exercício de direitos, total ou parcial, ou por
aqueles grupos sociais vinculados pela origem ou causa jurídica (interesses
individuais homogêneos), encontram no órgão ministerial garantia dos seus
direitos fundamentais. Estes interesses individuais indisponíveis vinculam-
se, igualmente, como espécie, aos interesses sociais, estando, portanto,
relacionado à relevante atividade social que é missão do Ministério Público
(SOUZA, 2016, p. 103).

Nesse sentido, por ter essa atribuição de elevado fins, de atuar na guarda e
efetivação de valores importantes da ordem Constitucional, a Constituição Federal
61

concedeu ao Ministério Público tratamento diferenciado, assegurando autonomia


aos seus membros e independência em relação aos demais Poderes instituídos,
pois localiza-se fora da seara dos poderes estatais. Suas funções estão elencadas
no artigo 129, da Constituição Federal:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:


I - Promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
II - Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição,
promovendo as medidas necessárias à sua garantia;
III - Promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do
patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos
e coletivos;
IV - Promover a ação de inconstitucionalidade ou representação para fins de
intervenção da União e dos Estados, nos casos previstos nesta
Constituição;
V – Defender judicialmente os direitos e interesses das populações
indígenas;
VI - Expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua
competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na
forma da lei complementar respectiva;
VII - Exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei
complementar mencionada no artigo anterior;
VIII - Requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito
policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações
processuais;
IX - Exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que
compatíveis com sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial
e a consultoria jurídica de entidades públicas (BRASIL, 1988).

Destaca-se nesse rol, os incisos II e III, que representam o papel ministerial


na adequação do regime político e democrático ao lhe determinar guardião do
respeito dos poderes públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos
constitucionalmente previstos, utilizando para tanto os meios necessários de como a
promoção do inquérito civil e da ação civil pública para proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos. Estas
funções caracterizam o Ministério Público como custos societatis, por ser órgão
defensor dos direitos e interesses de populações cujos direitos foram violados,
especialmente de crianças e adolescentes (SANTA CATARINA, MP, 2013).
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabeleceu competências ao
Ministério Público, afim de que o mesmo tenha a responsabilidade de zelar pela
concretização dos direitos de crianças e adolescentes, devendo atuar de maneira a
62

efetivar as atribuições dispostas no artigo 201, em cujo rol se encontram relevantes


competências e instrumentos para atuação:

Art. 201. Compete ao Ministério Público:


[...]
V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos
interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à
adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º inciso II, da
Constituição Federal;
VI - instaurar procedimentos administrativos e, para instruí-los:
a) expedir notificações para colher depoimentos ou esclarecimentos e, em
caso de não comparecimento injustificado, requisitar condução coercitiva,
inclusive pela polícia civil ou militar;
b) requisitar informações, exames, perícias e documentos de autoridades
municipais, estaduais e federais, da administração direta ou indireta, bem
como promover inspeções e diligências investigatórias;
c) requisitar informações e documentos a particulares e instituições
privadas;
VII - instaurar sindicâncias, requisitar diligências investigatórias e determinar
a instauração de inquérito policial, para apuração de ilícitos ou infrações às
normas de proteção à infância e à juventude;
VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados
às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e
extrajudiciais cabíveis;
[...]
X - representar ao juízo visando à aplicação de penalidade por infrações
cometidas contra as normas de proteção à infância e à juventude, sem
prejuízo da promoção da responsabilidade civil e penal do infrator, quando
cabível;
XI - inspecionar as entidades públicas e particulares de atendimento e os
programas de que trata esta Lei, adotando de pronto as medidas
administrativas ou judiciais necessárias à remoção de irregularidades
porventura verificadas;
XII - requisitar força policial, bem como a colaboração dos serviços médicos,
hospitalares, educacionais e de assistência social, públicos ou privados,
para o desempenho de suas atribuições. [...] (BRASIL, 1990)

A atuação do Ministério Público merece destaque no tocante a violação de


direitos de crianças e adolescentes, pois é de sua competência apurar a denúncia
de casos por meio de Inquérito Civil Público, firmar Termos de Ajustamento de
Conduta (TAC), regularizar situações de ameaça ou violação de direitos e impetrar
Ação Civil Pública, instrumento eficiente na garantia integral de atendimento de
crianças e adolescentes. O Ministério Público integra a seara da proteção, controle e
fiscalização de todas as situações que envolvam direitos fundamentais de crianças e
adolescentes.
A Constituição Federal também previu a Defensoria Pública, órgão que passa
a integrar o Sistema de Justiça com a função essencial de facilitar o acesso à
63

Justiça para crianças e adolescentes. A Defensoria Pública é responsável pela


assistência judiciária integral e totalmente gratuita à população, especialmente aos
economicamente vulneráveis, sem condições de arcar com as despesas do
processo e da atuação de um defensor, de acordo com o artigo 5º, inciso LXXIV e
artigo 134, ambos da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
A inclusão da Defensoria Pública na Constituição Federal de 1988 e sua
previsão no Estatuto da Criança e do Adolescente representa um significativo
avanço para o direito, tendo em vista o histórico de leis que desconsideravam as
crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, dispensando assim a presença de
advogados nos casos envolvendo crianças e adolescentes.

2.4 As diretrizes nacionais de atendimento às crianças e adolescentes vítimas


de violência sexual

De acordo com o artigo 32, da Resolução n. 113, de 20 de abril de 2006, do


CONANDA, caberá ao Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente,
juntamente com o Conselho Nacional de Assistência Social e os conselhos
congêneres, aprovar planos que visem planejar estrategicamente as ações de
instâncias públicas e os mecanismos de direitos do Sistema de Garantia dos Direitos
de Criança e Adolescentes. A construção e deliberação dos Planos de Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes é uma das atribuições primordiais dos
Conselhos de Direitos e devem ser formulados com a participação da sociedade civil
representada nas Conferências de Direitos da Criança e do Adolescente que
ocorrem regularmente nos três níveis da federação. Sendo eles previamente
analisados e aprovados pelos respectivos Conselhos.
Consideram-se planos, aqueles documentos de caráter geral e abrangente,
composto por estudos, análise ou diagnósticos, no qual contem programas, projetos,
objetivos, meta se estratégias que devem ser alcançadas na execução das políticas
de atendimento a crianças e adolescentes.
A elaboração do documento Construindo a Política Nacional dos Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes e o Plano Decenal dos Direitos Humanos de
Crianças e Adolescentes 2011-2020, foi realizado pelo Conselho Nacional dos
64

Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), Secretaria de Direitos Humanos


(SDH), Presidência da República e pela Secretaria Nacional de Promoção dos
Direitos da Criança e do Adolescente (SNPDCA), os quais norteiam a construção de
matrizes programáticas para os planos plurianuais. A materialização das diretrizes
do plano se deu através do Grupo de Trabalho Interministerial, composto por
representantes dos ministérios da Saúde, Educação, Desenvolvimento Social e
Combate à Fome, Justiça do Trabalho e Emprego, Fazenda, Planejamento,
Orçamento e Gestão, com a coordenação da Secretaria de Direitos Humanos e do
CONANDA (CONANDA, 2010, p. 03). O grupo também contou com o auxílio da
UNICEF e do Instituto Pólis. Seu objetivo maior era de constituir um plano articulador
entre várias políticas setoriais, fortalecendo as atuações e a efetivação de melhorias,
tais como:

 a incorporação das diretrizes e dos compromissos internacionais dos quais


o Brasil é signatário no âmbito das Nações Unidas, notadamente a
Convenção sobre os Direitos da Criança, os Protocolos Opcionais, os
Objetivos e Metas do Milênio e sua tradução no documento ‘Um Mundo
para as Crianças’;
 a ampliação do foco da “proteção especial” para uma política de Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes, com a reiteração de seu caráter
transversal;
 a passagem de uma experiência de elaboração de planos temáticos
(Erradicação do trabalho infantil, Enfrentamento da Violência Sexual,
Sistema Socioeducativo, e Convivência Familiar e Comunitária,) para
elaboração de uma Política Nacional e de um Plano Decenal voltados para
todo o segmento infância e adolescência e não para os chamados “grupos
vulneráveis”;
 a superação de planos governamentais com duração temporal circunscrita
a, no máximo, uma gestão, em favor de um planejamento de médio prazo,
ou seja, de uma política de governo para uma política de Estado;
 o fortalecimento dos conselhos de direitos, ao fomentar a formulação de
planos para as respectivas unidades federadas de sua abrangência e,
assim, concretizar seu papel formulador de políticas, atribuição que poucos
conselhos vêm de fato assumindo (CONANDA, 2010, p. 4-5).

A Resolução n. 171, de 04 de dezembro de 2014, do CONANDA, estabeleceu


como diretrizes o dever de construção e deliberação de um Plano Decenal de
Direitos Humanos de Criança e Adolescente, que incorpore, no prazo de dez anos, a
construção de uma política pública, não uma política de governo, em conformidade
com a Política Nacional de Direitos Humanos de Criança e Adolescentes. O Plano
Decenal Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes congrega ações
intersetoriais, considerando diversidades e as desigualdades sociais, no intuito de
65

trazer elementos para seu enfrentamento. Nele deverá conter as condições tidas
como essenciais e as garantias de direitos básicos de qualquer cidadão,
assegurando a universalidade dos direitos sociais. O plano possuí detalhados os
objetivos, metas e ações previstas, para um determinado período para sua
execução.
O Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, traz em
suas diretrizes, no eixo 2, a “Proteção especial a crianças e adolescentes com seus
direitos ameaçados ou violados” (BRASIL, PLANO DECENAL DOS DIREITOS
HUMANOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2010, p. 02). Tendo como objetivo
estratégico 3.9 a ampliação e articulação “políticas, programas, ações e serviços
para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, com base
no Plano Nacional temático” (BRASIL, PLANO DECENAL DOS DIREITOS
HUMANOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2010, p. 02). A formulação de
diretrizes e parâmetros para estruturação de redes integradas de atendimento a
crianças e adolescentes em situação de violências, também é um dos seus
objetivos.
O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, publicado em maio de 2013, válido até 2020, contou com a
colaboração de alguns órgãos institucionais responsáveis pela articulação,
mobilização e realização do plano, que compreendeu a Campanha Faça Bonito, do
Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, a rede End Child Prostitution and Trafficking (ECPAT Brasil), o
CONANDA, a Secretaria de Direitos Humanos, Comissão Intersetorial de
Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes/Secretaria
Especial de Direitos Humanos – Paraná, Ministério do Turismo, UNICEF e Centro de
Referência, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes (CECRIA).
O primeiro plano foi publicado no ano de 2000, dez anos após a promulgação
do Estatuto da Criança e do Adolescente, chamado Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual Infanto-Juvenil, que começou a ser atualizado a
partir de 2003 e foi substituído pelo segundo plano em 2013, o Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, o qual inovou
66

no sentindo introduzir indicadores de monitoramento e avaliar seu impacto na


formulação e atuação de políticas públicas.
O CONANDA responsável tanto do desenvolvimento do Plano Decenal de
Direitos Humanos de Criança e Adolescentes, quanto do Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, pois ambos
visaram à defesa dos direitos da criança e do adolescente. O Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes atende
diretamente as diretrizes do Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e
Adolescentes, e tem como um de seus objetivos:

Garantir o atendimento especializado, e em rede, às crianças e aos


adolescentes em situação de abuso e/ou exploração sexual e às suas
famílias, realizado por profissionais especializados e capacitados, assim
como assegurar atendimento à pessoa que comete violência sexual,
respeitando as diversidades de condição étnico-racial, gênero, religião
cultura, orientação sexual, etc. (BRASIL, PLANO NACIONAL DE
ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES, 2013, p. 31).

O plano apresenta inicialmente que as crianças e adolescentes tornaram-se


sujeitos de direitos com o Estatuto da Criança e do Adolescente e isso implicou
numa grande progressão aos direitos humanos. Descreve, o objetivo geral é
estabelecer um conjunto de ações articuladas que permitam o intervenção técnico-
política e financeira para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e
adolescentes. O plano é orgânico e integrado, isto porque sua operacionalização
implica, obrigatoriamente ações articulares dos diferentes eixos que integram:

Análise da Situação – conhecer o fenômeno da violência sexual contra


crianças e adolescentes por meio de diagnósticos, levantamento de dados,
pesquisas.
Mobilização e Articulação – fortalecer as articulações nacionais, regionais
e locais de combate e pela eliminação da violência sexual; envolve redes,
fóruns, comissões, conselhos e etc.
Defesa e Responsabilização – atualizar a legislação sobre crimes sexuais,
combater a impunidade, disponibilizar serviços de notificação e
responsabilização qualificados.
Atendimento - garantir o atendimento especializado, e em rede, às crianças
e aos adolescentes em situação de violência sexual e às suas famílias,
realizado por profissionais especializados e capacitados.
Prevenção - assegurar ações preventivas contra a violência sexual. Ações
de educação, sensibilização e de autodefesa.
Protagonismo Infanto-juvenil – promover a participação ativa de crianças
e adolescentes pela defesa de seus direitos e na execução de políticas de
proteção de seus direitos (BRASIL, PLANO NACIONAL DE
67

ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E


ADOLESCENTES, 2013, p. 09).

O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e


Adolescentes traz em quadro operativo constituído por 5 eixos estratégicos, sendo
que cada um possuí suas diretrizes, objetivos, metas, ações, responsáveis e
parcerias, no que tange ao eixo 01 e 05 e suas diretrizes, trata sobre a promoção
dos direitos de crianças e adolescentes e da gestão de política nacional dos direitos
humanos de crianças e adolescentes:

EIXO 1 – PROMOÇÃO DOS DIREITOS DE CRIANÇAS E


ADOLESCENTES
Diretriz 02 – Universalização do acesso a políticas públicas de qualidade
que garantam os direitos humanos de crianças, adolescentes e suas
famílias e contemplem a superação das desigualdades, afirmação da
diversidade com promoção da equidade e inclusão social.
Diretriz 03 – Proteção especial a crianças e adolescentes com seus direitos
ameaçados ou violados, consideradas as condições de pessoas com
deficiência e as diversidades de gênero, orientação sexual, cultural, étnico-
racial, religiosa, geracional, territorial, de nacionalidade e de opção política.
Diretriz 04 – Universalização e fortalecimento dos Conselhos Tutelares,
objetivando a sua atuação qualificada.
EIXO 5 – GESTÃO DA POLÍTICA NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS
DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Diretriz 08 – Fomento e aprimoramento de estratégias de gestão da Política
Nacional dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes fundamentadas
nos princípios da indivisibilidade dos direitos, descentralização,
intersetorialidade, participação, continuidade e corresponsabilidade dos três
níveis de governo (BRASIL, PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO
DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES,
2013, p. 31) (grifos do autor).

O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, em seu artigo 70, que “é dever


de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do
adolescente” (BRASIL, 1990), assim, reconhecendo a importância da prevenção, o
Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes considerou o “envolvimento das diferentes mídias em campanhas de
mobilização e prevenção da violência sexual; a qualificação das campanhas de
prevenção; o fortalecimento da rede familiar e comunitária e a inserção das escolas
em ações de prevenção” (BRASIL, PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA
VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2013, p. 23).
68

Ao que tange o artigo 86, do Estatuto da Criança e do Adolescente: “A política


de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um
conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” (BRASIL, 1990), o Plano reconhece
que a “garantia do atendimento integral com base no respeito aos direitos humanos
pressupõe o desenvolvimento de ações articuladas” (BRASIL, PLANO NACIONAL
DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES, 2013, p. 24), assim, menciona sobre a necessidade da
qualificação da rede de atendimento em casos de violência sexual, a capacitação da
rede, disponibilização de assessoria técnica, avaliação e compreensão da evolução
e das fragilidades verificadas, também prioriza a padronização e formalização de
procedimentos, a eficiência, efetividade e eficácia dos fluxos de procedimento
constituídos (BRASIL, PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA
SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2013, p. 24).
Das ações elencadas para garantir o atendimento especializado às crianças
em situação de abuso sexual e às suas famílias elenca:

1) a universalização do acesso à política pública de atendimento a crianças


e adolescentes em situação de abuso e/ou exploração sexual; 2) Garantia
de acolhimento institucional; 3) Garantia de atendimento psicossocial; 4)
Oferta de atenção especializada; 5) Garantia de acesso e ampliação da
oferta de formação profissional por meio de política específica, que
assegure a inserção socio produtiva de adolescentes em situação de abuso
ou exploração sexual; 6) Implementação de programas e serviços
destinados ao fortalecimento e acompanhamento das famílias; 7)
Implantação e fortalecimento de programas intersetoriais e serviços
destinados ao atendimento e acompanhamento da pessoa que comete a
violência; 8) Pactuação de fluxos e/ou protocolos de procedimento entre
diversas instâncias encarregadas do atendimento; 9) Disseminação e
adaptação de metodologias territoriais e étnicas, principalmente com
crianças e adolescentes oriundos de comunidades indígenas e quilombolas;
10) Oferta de atendimento especializado respeitando questões territoriais e
étnicas, principalmente com crianças e adolescentes oriundos de
comunidades indígenas e quilombolas; 11) Garantia de atendimento às
crianças e adolescentes vítimas de abuso ou exploração sexual e que são
usuários de álcool ou outras drogas; 12) Articulação dos serviços
intersetoriais que realizam atendimento com os órgãos de investigação e
responsabilização (BRASIL, PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO
DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2013,
p. 32-34).

O monitoramento e avaliação do plano é realizado pelo CONANDA e os


Conselhos de Direitos Estaduais e Municipais. Desde sua introdução significativas
69

mudanças ocorreram no âmbito nacional, com o fortalecimento das redes locais e


estaduais; a realização de campanhas de sensibilização permanentes e periódicas;
adesão crescente de organizações públicas e privadas preocupadas com o
enfrentamento à violência sexual; vista do relator especial das Nações Unidas para
analisar a questão de venda, exploração sexual comercial infantil e utilização de
crianças para a pornografia; adoção de código de conduta contra a exploração
sexual comercial infantil em diferentes segmentos econômicos, como turismo,
transporte, etc.; criação e instalação de delegacias e varas criminais especializadas
em crimes contra criança e adolescentes (MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ,
2011).
O Plano Nacional de Saúde (PNS), constitui-se como planejamento para o
período de 2016 a 2019, cabe a ele orientar a implementação de todas as iniciativas
de gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), explicando os compromissos setoriais
e refletindo as necessidades da saúde da população e a capacidade de oferta
pública de ações e serviços para seu atendimento.
A elaboração do PNS está prevista na Lei n. 8.080/1990, a sua elaboração
deve estar em consonância com o Plano Plurianual. O PNS deve ser elaborado a
cada quatro anos, observando as diretrizes definidas pelos Conselhos e
Conferências de Saúde, sendo submetido à apreciação e aprovação do Conselho de
Saúde (BRASIL, PLANO NACIONAL DE SAÚDE, 2016, p. 04).
A Constituição Federal considerou a saúde como um direito social da
população e estabeleceu a competência da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios para legislar sobre a proteção e defesa da saúde.

Para operacionalizar essas determinações, instituiu o Sistema Único de


Saúde (SUS) como forma de organização da prestação das ações e
serviços públicos, abrangendo a prevenção, promoção, proteção e
recuperação da saúde, com responsabilidade de financiamento
compartilhada pelas três esferas administrativas e gestão central como
competência do Ministério da Saúde (MS), com a execução das ações de
forma descentralizada, com vetor municipalizante e direção única em cada
esfera de governo. Facultou, ainda, a livre participação, de forma
complementar, da iniciativa privada na prestação da assistência à saúde
(BRASIL, PLANO NACIONAL DE SAÚDE, 2016, p. 07).
70

As linhas de atuação visam a execução das ações e serviços públicos da


saúde, por meio da oferta de serviços dos níveis de atenção básica ao
especializado, sendo a participação privada em caráter complementar somente.
Dentre os objetivos e metas do PNS, observa-se o objetivo 03 que traz em
sua redação:

Promover o cuidado integral às pessoas nos ciclos de vida (criança,


adolescente, jovem, adulto e idoso), considerando as questões de gênero,
orientação sexual, raça/etnia, situações de vulnerabilidade, as
especificidades e a diversidade na atenção básica, nas redes temáticas e
nas redes de atenção à saúde (BRASIL, PLANO NACIONAL DE SAÚDE,
2016, p. 59).

O PNS tem como objetivo promover o desenvolvimento integral da criança e


adolescentes, a partir de investimentos em ações que melhorem o cuidado na
atenção básica, na perspectiva de melhorar o desenvolvimento. Dentre as metas
para atingir tal objetivo está o de “Implantar 80 serviços de referência para atenção
integral às pessoas em situação de violência sexual em hospitais de referência do
SUS, para a realização do registro de informações e da coleta de vestígios”
(BRASIL, PLANO NACIONAL DA SAÚDE, 2016, p. 60).
Outro objetivo de suma importância, estabelecido pelo PNS, é o de número
11, que refere sobre o fortalecimento das “instâncias do controle social e os canais
de interação com o usuário, com garantia de transparência e participação cidadã”
(BRASIL, PLANO NACIONAL DA SAÚDE, 2016, p. 79). Uma vez que tem finalidade
fortalecer a gestão participativa e o controle social no processo de formulação,
controle e avaliação das políticas de saúde, e para a concretização do objetivo
descreve algumas iniciativas previstas para 2016:

 Promover a capacitação de lideranças dos movimentos sociais de


promoção de políticas de equidade, conselheiros de saúde, integrantes dos
comitês de promoção de equidade, gestores e trabalhadores da saúde em
gestão participativa e controle social no SUS.
 Fortalecer instâncias de controle social em especial os conselhos de
saúde.
 Apoiar a implementação e fortalecer a articulação entre os espaços de
participação social em todas as políticas públicas, com vistas ao
desenvolvimento de ações intersetoriais, em especial para as populações
do campo, floresta e águas; população negra e quilombola; LGBT; e
população em situação de rua (BRASIL, PLANO NACIONAL Da SAÚDE,
2016, p. 79) .
71

O Plano Nacional de Educação (PNE) tem vigência de 2014 até 2024 para
cumprimento das metas e objetivos estabelecidos em todos os níveis de ensino, do
infantil, básico e superior, a serem executados nos próximos anos. Trata-se de um
instrumento de planejamento que orienta a execução e o aprimoramento de políticas
públicas do setor. O plano foi aprovado pela Lei n. 13.005, em 25 de junho de 2014,
seu cumprimento é objeto de monitoramento contínuo e avaliações periódicas
realizadas pelo Ministério da Educação (MEC), pelas comissões de educação da
Câmara e do Senado, pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e pelo Fórum
Nacional de Educação. São diretrizes do PNE:

Art. 2º São diretrizes do PNE:


I - erradicação do analfabetismo;
II - universalização do atendimento escolar;
III - superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção
da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação;
IV - melhoria da qualidade da educação;
V - formação para o trabalho e para a cidadania, com ênfase nos valores
morais e éticos em que se fundamenta a sociedade;
VI - promoção do princípio da gestão democrática da educação pública;
VII - promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do País;
VIII - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em
educação como proporção do Produto Interno Bruto - PIB, que assegure
atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e
equidade;
IX - valorização dos (as) profissionais da educação;
X - promoção dos princípios do respeito aos direitos humanos, à diversidade
e à sustentabilidade socioambiental (BRASIL, 2014).

Compete ao Ministério da Educação, a Comissão de Educação da Câmara


dos Deputados, Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal, ao
Conselho Nacional de Educação e ao Fórum Nacional de Educação divulgar os
resultados do monitoramento e das avaliações nos respectivos sítios institucionais
da internet, analisar e propor políticas públicas para assegurar a implementação das
estratégias e o cumprimento das metas, analisar e propor a revisão do percentual de
investimento público em educação (BRASIL, 2014).
O PNE estipula uma meta de ampliação de investimentos públicos em
educação pública de forma a atingir o patamar mínimo de 7% do Produto Interno
Bruto (PIB), até o 5 ano de vigência da Lei, portanto, em 2020, e o mínimo de 10%
até o final do decênio, 2024. Estabelece estratégias para garantir fontes de
financiamento permanentes e sustentáveis para todos os níveis, etapas e
72

modalidades da educação básica, observando as políticas de colaboração entre os


entes federados (BRASIL, 2014).
Cabe aos gestores federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal a
adoção das medidas governamentais necessárias ao alcance das metas previstas
no PNE. Segundo o §1º do artigo 8º da Lei que institui o PNE, os entes federados
estabelecerão nos respectivos planos e estratégias que:

I - assegurem a articulação das políticas educacionais com as demais


políticas sociais, particularmente as culturais;
II - considerem as necessidades específicas das populações do campo e
das comunidades indígenas e quilombolas, asseguradas a equidade
educacional e a diversidade cultural;
III - garantam o atendimento das necessidades específicas na educação
especial, assegurado o sistema educacional inclusivo em todos os níveis,
etapas e modalidades;
IV - promovam a articulação interfederativa na implementação das políticas
educacionais (BRASIL, 2014).

Esses processos de elaboração e adequação dos planos de educação dos


Estados, Distrito Federal e dos Municípios devem ser realizados com ampla
participação de representantes da comunidade educacional e da sociedade civil.
Cabe a esses entes, a elaboração do plano plurianual, formulação que deva
assegurar a consignação de dotações orçamentárias compatíveis a atingir as
diretrizes, metas estratégias do PNE, afim de viabilizar a sua execução.
O PNE traz 20 metas e suas estratégias para atingir tais metas. Dentre elas
importante destacar que dentre as estratégias para garantir a meta número 7 que diz
“fomentar a qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades, com
melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem” (BRASIL, 2014) para garantir o índice
de desenvolvimento da educação básica (Ideb), criado em 2007 pelo Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), para
monitorar a qualidade do aprendizado nacional e estabelecer metas para melhorar o
ensino no país, está a estratégia número 7.23:

7.23) garantir políticas de combate à violência na escola, inclusive pelo


desenvolvimento de ações destinadas à capacitação de educadores para
detecção dos sinais de suas causas, como a violência doméstica e sexual,
favorecendo a adoção das providências adequadas para promover a
construção da cultura de paz e um ambiente escolar dotado de segurança
para a comunidade (BRASIL, 2014).
73

O PNE estabelece que os profissionais da educação devem ser capacitados


para detecção das causas de violência na escola, como verificação de violência
doméstica e sexual, favorecendo a adoção das medidas adequadas.
No Plano Decenal da Assistência Social, que apresenta o planejamento do
serviço social de 2016 até 2026, destacam-se nas diretrizes e objetivos estratégicos,
a plena universalização do SUAS, tornando-o completamente acessível, ampliando
a cobertura da política de assistência social, considerando a adversidade territorial,
qualificar e integrar a rede de serviços, ampliar as unidades socioassistenciais, tanto
da proteção básica, quanto da especial, “adequar a capacidade de atendimento às
demandas dos usuários, em função das situações de vulnerabilidade e risco pessoal
e social, e assegurar serviços continuados e equipes de referência adequadas às
demandas dos territórios” (BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL,
2016, p. 27), de acordo com a diretriz número 1 e seus respectivos objetivos.
Da mesma forma, o Plano Nacional da Assistência Social, trouxe nas suas
metas, “universalizar os serviços e unidades de proteção social básica do SUAS,
garantindo a manutenção e expansão com qualidade” (BRASIL, PLANO DECENAL
DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2016, p. 32), que tem como objetivo ampliar os
investimentos para oferecimento de serviços da Proteção Social Básica e Especial,
quanto a Proteção Social Especial, ampliar as “estratégias de superação das
situações de violação de direitos, assim como, o atendimento integral e qualificado
às situações de abandono, violência, medidas socioeducativas em meio aberto e
população em situação de rua” (BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL, 2016, p. 33). Outro objetivo estratégico importante está o de:

Ampliar as equipes volantes e de abordagem social, básicas e


especializadas, nos territórios com alto índice de violência, pobreza e de
desproteção social, incluindo áreas rurais, regiões metropolitanas, grandes
centros, áreas de fronteira e territórios de povos e comunidades tradicionais
(BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2016, p. 34).

Instituir fluxos e protocolos de referenciamento e delimitação de competências


entre o SUAS e o Sistema de Justiça e o Sistema de Garantia de Direitos da Criança
e do Adolescente, para a articulação interinstitucional mais eficiente e estratégica ao
cumprir suas funções e atribuições constitucionalmente dadas (BRASIL, PLANO
DECENAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2016, p. 45).
74

A diretriz número 2 do Plano Decenal, visa o contínuo aperfeiçoamento


institucional do SUAS, para tanto, traz em seus objetivos que é necessário “garantir
e ampliar o cofinanciamento para pagamento das equipes de referência nas
diferentes esferas de governo” (BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL, 2016, p. 29).
A teoria da proteção integral visa um sistema de qualidade, de garantir a
dignidade da pessoa, o direito à vida, à saúde, ao respeito, à educação, à cultura, ao
esporte e lazer, assim como, a proteção contra violações de direitos na forma do
trabalho infantil, violência sexual e qualquer ato que venha ferir os direitos humanos
da criança e adolescente. O Sistema de Garantia de Direitos é o caminho para
atingir a proteção integral. Os três níveis de políticas: atendimento, proteção e
justiça, têm papel fundamental para garantir direitos fundamentais ou para serem
restabelecidos, quando violados.
Os conselhos de direitos da criança e adolescente possuem papel
fundamental no âmbito administrativo, na ação de deliberar e fiscalizar às políticas
públicas de atendimento e planejar estrategicamente as ações e mecanismos de
direitos do Sistema de Garantia de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes.
Entre suas atribuições está a de formular os planos nacionais, estaduais e
municipais, de acordo com o nível administrativo do conselho, o qual apresenta
análise ou diagnóstico, contém programas, projeto, objetivos, metas e estratégias
que devem ser alcançadas de acordo com o tempo de validade do plano elaborado.
São documentos elaborados de forma participativa e que buscam a promoção e
recuperação de direitos em todos os níveis.
75

3. O CONTEXTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR CONTRA CRIANÇAS


E ADOLESCENTES NO BRASIL.

A violência sexual intrafamiliar é um fenômeno complexo, pode ser


compreendido nas dinâmicas das relações familiares. Para medir-se os impactos da
violência diferentes dados são necessários, como a descrição da magnitude e o
impacto da violência; a compreensão de quais são os fatores que aumentam o risco
de vitimização e perpetuação da violência; o conhecimento dos programas de
prevenção contra a violência. Além dos dados de mortalidade, outros tipos de dados
são importantes, uma vez que os resultados não fatais, ou seja, aqueles que não
causam a morte, são muito mais comuns. As informações são importantes para que
se tenha a compreensão das circunstâncias, os impactos, quais as ações que
podem ser tomadas para prevenir e erradicar a violência. As pesquisas, podem
ajudar a diagnosticar o perfil das vítimas ou do agressor, seus antecedentes,
atitudes, comportamentos, a revelar violências não relatadas à polícia, por exemplo,
quando há um número alto de tratamento médico para lesões ocasionadas por
violência e este número difere no número de denúncias chegaram até à polícia.
Dentre os tipos de dados citados pela Organização Mundial da Saúde estão
os dados sobre doenças, lesões e outros problemas de saúde; dados auto-relatos
pelas pessoas sobre: atitudes, crenças, comportamentos, práticas culturais,
vitimização e exposição à violência; dados comunitários relativos a características da
população e níveis de renda, educação e desemprego; dados criminais relativos a
características e circunstancias de eventos violentos e de criminosos violentos;
dados econômicos relativos a custos de tratamentos e serviços sociais; dados que
descrevem a carga econômica sobre os sistemas de assistência à saúde e as
possíveis economias resultantes de programas de prevenção; dados sobre política e
legislação. Já as fontes, estas podem ser as pessoas; registros das agências ou
instituições; programas locais; registros comunitários e governamentais; pesquisas
populacionais e outras de estudos especiais (KRUG, et al, 2002, p. 07-08).
Não há dados que confirmem a ocorrência do fenômeno no Brasil de forma
completa, os dados geralmente são fornecidos pela polícia, pela rede de
atendimento à saúde e à assistência social, organizações não governamentais e por
76

pesquisas, inclusive aquelas realizadas na fase de diagnóstico, dos Conselhos de


Direitos, quando planejam os planos de ação do Poder Executivo e realizam estudo
aprofundado do município, identificando os problemas existentes, as áreas mais
afetadas, diagnóstico realizada por visitas ao serviços, para conhecer a realidade
atendimento e assim, sistematizar dados oficiais e dados qualitativos, cujos os
resultados servem para subsidiar as políticas públicas, garantindo metodologias
rápidas, eficazes e participativas das ações municipais.
Todavia os dados ainda são insuficientes e fragmentados, pois geralmente
são incompletos ou limitados. Ademais, muitos casos não são comunicados, por
medo, por vergonha, por medo das vítimas de não acreditarem na sua palavra, de
serem mais maltratadas pelos agressores ou por não compreenderem a dimensão
dos danos que a violência pode causar.

3.1 Modalidades de violência sexual contra crianças e adolescentes.

Violência é um fenômeno complexo, de difícil caracterização, pode ser


encontrada de diferentes formas, não havendo rotulações estáticas. A violência deve
ser compreendida através de um conceito dinâmico, o qual remete a distintas
definições, tipologias, trata-se de um fenômeno multifacetado, que pode assumir
diferentes formas, de acordo com o contexto histórico e social onde ocorre.
A violência contra criança e o adolescente, apesar de um fenômeno antigo, só
passou a ser considerada um problema social a partir do século XX, ao ser inserida
no contexto dos direitos humanos, passando a ser alvo de crescentes pesquisas
científicas. A violência sexual é descrita desde a antiguidade, segundo as obras
romanas, o imperador Tibério tinha inclinações sexuais que incluíam crianças como
objeto de prazer. Somente no século XIX iniciaram-se os estudos relacionados ao
assunto, uma das primeiras obras sobre o tema foi a publicação de Ambroise
Tardieu, em 1860, o qual descreveu a Sindrome da Criança Espancada, em sua
monografia, analisando quase todas as formas de maus-tratos conhecidas hoje, ele
só não conseguiu demonstrar através de suas pesquisas que a violência não estava
apenas nos ambientes das fábricas, minas e estabelecimentos escolares, mas
também na família. As obras de Tardieu serviram de inspiração para outros estudos
77

posteriores, como o realizado por Sigmund Freud, entre 1896 e 1897, o qual
abordou de forma específica os abusos sexuais sofridos por crianças e adolescentes
(ADED, et al, 2006, p. 205).
Para o psico-historiador DeMause (1998), quanto mais se estuda a história,
mais evidenciam-se situações de negligência e crueldade contra crianças, tendo
sido maiores as predisposições à morte, rejeição, agressão e ao abuso sexual. O
autor aborda a violência sexual como uma prática cultural desde o período da
Antiguidade, onde crianças eram levadas para os chamados bordéis infantis, refere
também que na Índia, em algumas regiões, se mantém até o século XXI as práticas
familiares de desvirginarem as meninas e no Oriente Médio, onde a prática cultural e
religiosa de mutilação genital feminina ainda é utilizada para garantir que quando
adultas as mulheres assumam papel subservientes em relação aos homens com as
quais casarão.
No Brasil, há evidências de violência sexual contra crianças e adolescentes
desde o período da colonização, sendo essas vítimas de abandono, vendidas como
escravas e exploradas sexualmente ou pelo trabalho. A violência iniciava desde as
embarcações, nas quais as crianças eram trazidas ao Brasil como grumetes e
pajens, ou órfãs, destinadas a casar aqui no país. Essas crianças sofriam abuso
sexual pelos tripulantes, eram utilizadas como objetos sexuais, ou quando os piratas
atacavam as embarcações, eram escravizadas e/ou colocadas à prostituição
(RAMOS, 2006).
Apenas por volta dos anos de 1950 que a violência sexual contra crianças e
adolescentes passou a ser objeto de estudos e pesquisas no país, tendo maior
visibilidade a partir mesmo da década de 1990, “ao ser incluído na agenda da
sociedade civil e da luta pelos direitos humanos” (TRAVASSOS, 2013, p. 30), que
inclusive ocasionou significativo avanços na legislação brasileira e
consequentemente nas pesquisas sobre o tema em diversas áreas. Percebe-se que
o abuso, maus-tratos e outras práticas não eram consideradas violência, pois
tratavam-se de práticas culturais, religiosas e aceitas, apesar de algumas práticas
violentas perpetuarem até os dias de hoje como práticas culturais e religiosas, ações
que violem os direitos humanos de crianças e adolescentes são consideradas
violências.
78

De acordo com o Relatório Mundial sobre Violência e Saúde, da Organização


Mundial da Saúde a violência é o “uso intencional da força ou poder em uma forma
de ameaça ou efetivamente, contra si mesmo, outra pessoa ou grupo ou
comunidade, que ocasiona ou tem grandes possibilidades de ocasionar lesão,
morte, dano psíquico, alterações no desenvolvimento ou privações” (KRUG, et al,
2002, p. 02). Esse conceito reflete que o reconhecimento da violência não se reduz
apenas às ações ou omissões que produzem sofrimento ou morte à vítima, mas que
também impõe consequência substanciais, independente da modalidade, no
indivíduo, na família, comunidades e em todo o sistema público.
Etimologicamente a palavra violência deriva do latim e significa aquele que
possui caráter violento, veemência, ferocidade, assim como, significa ter vontade de
querer bem ou mal (FARIA, 1962). É, portanto, a transgressão de acordos tácitos
estabelecidos culturalmente e historicamente.
A inclusão do termo poder, na definição de violência da Organização Mundial
da Saúde, expande o significado de violência para os atos que resultam de ameaça
e intimidações, esse uso do poder também pode incluir negligência ou atos de
omissão. A violência, portanto, é ato que não necessariamente resulte lesão ou
morte, essas consequências até podem ser latentes ou perdurar por anos após o
abuso, mas para figurar violência basta que oprime as pessoas, famílias ou
comunidades e que provoquem resultados físicos, psicológicos e sociais.

Outros aspectos da violência, apesar de não estarem explicitamente


colocados, também se encaixam na definição. Por exemplo, a definição
implicitamente inclui todos os atos de violência, sejam públicos ou privados,
sejam reativos (em resposta a eventos anteriores, como provocações) ou
proativos (instrumental para resultados em benefício próprio, ou com
intenção de tal benefício), sejam atos criminosos ou não criminosos. Cada
um desses aspectos é importante para se compreender as causas da
violência e elaborar programas de prevenção (KRUG, et al, 2002, p. 05).

Segundo a Organização Mundial da Saúde a violência se divide em três


grandes categorias: violência auto-infligida, violência interpessoal e a violência
coletiva. A violência auto-infligida é aquela dirigida a si próprio. A violência coletiva
pode ser: social, política e econômica, são cometidas pelos grandes grupos de
pessoas ou pelo Estado. A violência interpessoal é dividida em duas subcategorias:
a violência da família ou do parceiro – isto é, violência que ocorre entre os membros
79

da família ou do convívio íntimo, dentro de casa – a violência comunitária – aquela


que ocorre entre as pessoas sem laço de parentesco (consanguíneo ou não),
conhecido ou estranho, dentro de casa ou não. Já a natureza dos atos, estes podem
ser físicos, sexuais, psicológicos, evolvendo privação ou negligência (KRUG, et al,
2002, p. 06).
Violência sexual intrafamiliar é, portanto, subcategoria de violência, da qual
várias espécies estão enquadradas. Em regra, o ponto em comum está na relação
entre agressor adulto e a criança ou adolescente, a qual está sendo utilizada como
objeto para satisfação de desejos sexuais do adulto e essa violência ocorre dentro
do âmbito familiar.

Geralmente se utiliza os termos violência sexual intrafamiliar e violência


doméstica como sinônimos, contudo, o segundo distingue-se do primeiro
por incluir pessoas sem função parental, mas que convivem no mesmo
espaço doméstico, como empregados, ou como pessoas que convivem
esporadicamente, ou ainda agregados. Assim, é uma violência que ocorre
dentro de casa, mas não necessariamente por um membro da família
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).

A violência sexual é qualquer ação ou tentativa de obter um ato sexual,


comentários, investidas sexuais indesejadas, atos direcionados ao tráfico sexual, ou
voltados, de alguma forma contra a sexualidade de uma pessoa, usando a coação.
A coação pode abranger diversos graus de força, ela pode se dar através da força
física, da intimidação psicológica, chantagens ou outras ameaças. A coação também
pode ocorrer quando a outra pessoa é incapaz de compreender e dar seu
consentimento, por exemplo, se a vítimas estiver embriagada, drogada, adormecida,
ou mentalmente não é capaz de entender a situação, como, por exemplo, uma
criança (KRUG, et al, 2002, p. 147).
Para compreender a definição de violência sexual contra criança e
adolescente, é preciso observar os seguintes elementos: diferença de idade entre
autor da violência e a vítima, a presença de uma desigualdade de poderes entre a
relação de ambos, seja por força, hierarquia, refletindo os padrões sociais, a criança
ou adolescente como objeto do adulto, impossibilidade de oferecer consentimento
em razão da desigualdade de poder ou até mesmo de aparato cognitivo, emocional
ou social que permitam a vítima ter consciência dos efeitos da interação sexualizada
provocada pelo adulto (SANDERSON, 2005).
80

A teoria do poder tem sido adotada no Brasil, ao que tange a conceituação de


violência contra criança e adolescente. O poder violento está ligado a relação de
força exercida para que se tenha vantagens, seja de dominação sobre a outra
pessoa, de prazer sexual ou de lucros, há, portanto uma relação violenta e desigual,
estruturada a partir de um processo de dominação, no qual o dominador faz uso da
coação e ou agressões, tornando o dominado um objeto, retirando-lhe sua
identidade (FALEIROS; FALEIROS, 2007).
Os atos podem envolver contato físico, como podem não envolver contato
físico, como as discussões abertas sobre atos sexuais que se destinam a despertar
interesses na criança ou adolescente ou então que possuem como objetivo chocá-
las; pode ser através de telefonemas obscenos; convites explícitos ou implícitos para
a prática de atos sexuais; exibicionismo – a exposição proposital – do corpo nu de
um adulto ou parte deles à uma criança ou adolescente; aliciamento pelos meios
digitais ou pessoalmente; estimulo à nudez; observar a criança ou adolescente
enquanto se despir, se vestir ou usar o banheiro; fotografia e filmagens de crianças e
adolescentes para gratificação pessoal ou para exposição na internet (SANTOS,
2010, p. 38).

Entre os atos físicos estão: passar a mão no corpo da criança; coito (ou
tentativa de); manipulação de genitais; contato oral genital e uso sexual do
ânus; beijar a criança na boca; sexo oral (felação ou cunilíngua no abusador
ou na criança); ejacular na criança; colocar objetos na vagina ou anus da
criança; penetrar o anus com o dedo; penetrar o anus a vagina com o dedo;
colocar o pênis entre as coxas de uma criança e simular o coito; forçar a
criança a praticar atividade sexual com animais. Entre os atos com violência
estão inclusos: ocorrências de estupro, brutalizado ou mesmo assassinato
de crianças e adolescentes com formas progressivamente mais violentas de
ataque sexual (SANTOS, 2010, p. 38).

Apesar do termo violência sexual, a natureza da relação de abuso sexual não


está sempre relacionada à violência física, pelo contrário, quando perpetrada no
contexto do âmbito familiar, a violência sexual ocorre geralmente sem agressão
física, mas por meio da dominação do adulto sobre a criança ou adolescente, de
forma perversa, por meio da sedução ou coerção a partir da figura da autoridade,
somado a ameaças ou chantagens, o segredo por ameaças explícitas ou implícitas.
81

Uma interessante definição é dada por Berliner e Elliott (2002), que referem
que o abuso sexual independe se a criança ou adolescente entende a natureza da
situação:

El abuso sexual incluye cualquier actividad con un niño o niña en la cual no


hay consentimiento o este no puede ser otorgado. Esto incluye el contacto
sexual que se consigue por la fuerza o por amenaza de uso de fuerza —
independientemente de la edad de los participantes— y todos los contactos
sexuales entre un adulto y un niño o niña —independientemente de si el
niño o niña ha sido engañado o de si entiende la naturaleza sexual de la
actividad—. El contacto sexual entre un niño más grande y uno más
pequeño también puede ser abusivo si existe una disparidad significativa de
edad, desarrollo o tamaño corporal, haciendo que el niño menor sea
incapaz de dar un consentimiento informado (BERLINER; ELLIOTT, 2002,
p. 55).

O consentimento implica em acordar, autorizar, aprovar, dar permissão,


todavia, o consentimento também implica na necessidade de que a pessoa possuí
todas informações necessárias para compreender plenamente a situação, isto é,
estar consciente sobre o propósito de sua participação e as consequências delas.
Desta forma, o consentimento não se enquadra com violência sexual infantil, pois a
criança e o adolescente estão submetidos à vontade de quem o abusa, o qual utiliza
sua autoridade sobre a criança ou adolescente, através das diversas formas de
coerção e também utiliza-se da impossibilidade da vítima de ter consciência plena
sobre a violência.
A violência sexual causa dano contra criança ou adolescente, seja pela
participação forcada em práticas ou atos eróticos, mediante a coerção física e ou
psicológica de um adulto, visando a sua satisfação sexual. Os efeitos serão sempre
danosos, sendo considerado, inclusive, a “uma forma de erosão da infância”
(AZEVEDO, 1993, p. 13), além de uma violência contra o corpo e o espirito.

Esse tipo de violência caracteriza-se como uma violação dos direitos


humanos universais e dos direitos peculiares à pessoa em
desenvolvimento: direito à integridade física e psicológica, ao respeito, à
dignidade, ao processo de desenvolvimento físico, psicológico, moral e
sexual sadio e à proteção integral (FALEIROS; FALEIROS, 2007, p. 38).

Segundo a UNICEF, nem todos agressores chegam ao coito, isso se dá por


diversas razões, preferência em condutas específicas que os satisfazem, por medo
de engravidar a vítima e isso pode interromper a continuidade das violências, por
82

não saber ao certo até onde pode progredir com o abuso sem ser descoberto, por
estar testando a vítima até chegar ao ponto do estupro, por ter sido interrompido por
terceiros, pela vítima ou fatores externos (BAITA; MORENO, 2015, p. 29-30). São
condutas que constituem violência sexual infantil:

– La utilización del niño y/o su cuerpo desnudo para la obtención de material


pornográfico aunque no haya contacto directo del adulto con su víctima.
– Tocar al niño en sus genitales, zona anal y/o pechos, por encima de la
ropa o por debajo de ella.
– Hacer que el niño toque al adulto en sus genitales, zona anal y/o pechos
(en el caso de mujeres ofensoras), por encima de la ropa o por debajo de
ella. – Contacto oral-genital del adulto al niño.
– Contacto oral-genital del niño al adulto.
– Contacto genital del adulto sin penetración (frotamientos contra el cuerpo
del niño o alguna parte de este, con el objetivo de lograr excitación sexual y
eventualmente un orgasmo).
– Penetración vaginal y/o anal con dedo/s y/u objetos.
– Coito (BAITA; MORENO, 2015, p. 29).

A violência sexual ela possui como característica a progressividade. Segundo


depoimentos de vítimas de violência sexual, “hay una serie de conductas previas
incluso al primer tocamiento, que preparan el terreno para un acceso más intrusivo
al cuerpo de la víctima” (BAITA; MORENO, 2015, p. 30).
A Childhood, estabelece dentro da violência sexual duas classificações, entre
o abuso sexual a exploração sexual comercial, a grande diferença é que a primeira
está relacionada a satisfação sexual própria do agressor, já a terceiro é mediada por
dinheiro ou por troca de favores (SAYÃO, 2006, p. 30-31).
O abuso sexual pode ocorrer com ou sem contato físico, se for sem contato
físico poderá ser através do assédio sexual, o abuso sexual verbal, telefonemas
obscenos, exibicionismo e voyeurismo. Já a violência sexual com contato físico,
caracteriza-se pelo atentado violento ao pudor, estupro, corrupção e sedução. E o
abuso pode ser intrafamiliar – se existe laço familiar ou uma relação de
responsabilidade entre o agressor e a vítima, também conhecida como incesto –
pode ser extrafamiliar – quando não há laço familiares, nem de responsabilidade,
apesar de que nem sempre será um desconhecido, muitas vezes é um conhecido
que a criança ou adolescente possui confiança – ou poderá ser institucional –
quando ocorre em instituições governamentais ou não-governamentais que são
responsáveis pelo acolhimento de crianças e adolescentes que estão em situação
83

de cuidados substitutos ao da família biológica ou de extensa ou instituições


responsáveis pela aplicação de medidas socioeducativas privativas de liberdade
(SAYÃO, 2006, p. 28-30).
O assédio sexual caracteriza-se por propostas a relações sexuais, é a
indução do agressor à vítima através de chantagem, ameaças, o agressor utiliza o
seu poder sobre a vítima para obter favores sexuais. “Para sua perfeita
caracterização, o constrangimento deve ser causado por alguém que se prevaleça
de sua condição de superior hierárquico ou da ascendência” (MEURER, 2017, p.
186). São “propostas de contato sexual numa posição de poder em relação a vítima,
chantageando-a e usando de ameaças, tentativas de relações sexuais, caricias nos
órgãos genitais, masturbação, sexo oral e anal” (PIETRO, 2013, p. 188). O agressor
utiliza de um pode de hierarquia, reduzindo a capacidade de resistência do outro.
O abuso sexual verbal está presente em conversas abertas sobre atividades
sexuais, com o objetivo de despertar interesse sexual ou constranger a criança ou
adolescente (ABRAPIA, 2002). Os telefonemas obscenos também podem ser uma
forma de abuso sexual verbal, ocorre “quando um adulto gera ansiedade em
crianças ou adolescentes com discursos obscenos através de comunicação por
telefone” (PIETRO, 2013, p. 188).
O exibicionismo caracteriza-se pelo ato intencional de mostrar os órgãos
genitais ou se masturbar na frente de uma criança ou adolescente ou no campo de
visão deles, o exibicionista é motivado pela reação de choque à vítima (PIETRO,
2013, p. 187). Já o voyeurismo, versa na observação de atos ou órgãos sexuais de
outra pessoa quando elas não desejam serem vistas, isto é, “consiste em observar
fixamente criança e adolescentes e obter satisfação nessa prática” (TRAVASSOS,
2013, p.35).

Com o uso de contato físico, o abuso sexual está presente tanto em atos
físicos genitais, que compreendem carícias nos órgãos genitais, tentativa de
relação sexual, sexo oral, masturbação, penetração vaginal e anal, como
também se encontra em contatos forçados, a partir de beijos e toques em
zonas erógenas. Ele pode ser legalmente tipificado em: atentado violento ao
pudor, corrupção de menores, sedução e estupro (SANTOS; IPPOLITO,
2009).

Na violência sexual com contato físico, caracterizada pelo atentado violento


ao pudor, que outrora já foi tipificado de estupro, mas após a Lei 12.015, de 07 de
84

agosto de 2009, ambos os atos de violência passaram a estar no mesmo artigo e


consequentemente a ter um único significado na lei. Atentado violento ao pudor
consiste em violência física sexual sem penetração vaginal, no qual a criança ou
adolescente é ameaçado ou constrangida à praticar sexo oral, anal ou outros atos
libidinosos.
O estupro é o constrangimento da vítima, mediante violência ou grave
ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com se ele pratique
algum ato libidinoso, ou que utilize de fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a
livre manifestação da vontade da vítima. Ainda que a prática de conjunção carnal ou
ato libidinoso não seja realizada por violência ou grave ameaça, quando realizado
com criança e adolescente menor de catorze anos de idade, configura-se estupro de
vulnerável, mesmo que haja o consentimento da vítima (BRASIL, 1940).
Outra modificação ocorrida no Código Penal, através da lei 12.015, 07 de
agosto de 2009, refere-se à revogação dos crimes de sedução e da corrupção de
menores, passando a ser denominados crimes sexuais contra vulneráveis. A
corrupção de menores é o ato de induzir uma criança ou adolescente até catorze
anos a satisfazer a lascívia de outrem, ou então, de induzi-la a presenciar,
conjunção carnal ou outro ato libidinoso, afim de satisfazer sua própria vontade ou a
de outrem (BRASIL, 1940).
A sedução caracteriza-se pela oferta de presentes, indução através das
palavras, afim de obter vantagens sexuais com a vítima, o que dificulta a criança ou
adolescente a compreender a situação de violência sexual pelo fato de que ela fica
mascarada com cenas de carinho, palavras amorosas, presentes, é uma prática que
não utiliza a força e nem deixa marcas visíveis.
Outras definições importantes para serem estudadas é o abuso incestuoso, o
qual consiste no abuso sexual envolvendo pais ou outros parentes próximos, como
irmãos, avós, e estes se encontram em uma posição de maior poder em relação à
vítima. Costumam ser mantido em sigilo entre a família pelo alto grau de reprovação
social, ocorrem entre diferentes grupos socioeconômicos, raciais e religiosos.
“Condenado entre os tabus primordiais de nossa sociedade, recai sobre a vítima
uma forte carga de culpabilização” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002, p. 19).
85

A pedofilia, que não é um crime em si, mas o desvio no desenvolvimento da


sexualidade da pessoa, caracterizado pelo desejo sexual de forma compulsiva e
obsessiva por crianças e adolescentes. A pornografia, essa é sim uma forma de
violência sexual, pode ser caracterizada através da exploração sexual comercial, a
produção, reprodução, venda, exposição, distribuição, aquisição, posse, publicação
ou divulgação de materiais (fotografias, vídeos, desenhos, filmes) envolvendo
crianças e adolescente em situações eróticas.
A exploração sexual comercial de crianças e adolescentes é caracterizada por
diversas formas, não está relacionada somente a troca por dinheiro, mas também à
favores, como comida, drogas, moradia. Ela se compreende através da pornografia,
troca sexual, submissão à exploração comercial, tráfico para fins de exploração
sexual e turismo sexual (SAYÃO, 2006, p. 32).
Na exploração sexual comercial infantil, às vítimas são exploradas para
produzir lucros para seus aliciadores, crianças e adolescentes são utilizados como
mão-de-obra em diversas espécies de atividades sexuais, como a exploração sexual
em estabelecimentos de prostituição, no turismo sexual, shows eróticos, call girls,
participação em fotos, vídeos, filmes pornográficos, produção e comércio de objetos
sexuais.
Os contextos onde a violência sexual ocorrem podem se dar de diferentes
formas, podem ser entre duas pessoas, quando envolve somente o agressor e a
crianças ou adolescente vítima, em grupo, quando a violência sexual ocorre na
forma de sexo grupal, geralmente está relacionado a grupo de pessoas que
compartilham a vítima de forma individual ou coletiva, pode ocorrer durante rituais,
quando a interação sexual com a criança ou adolescente ocorre durante um ritual
(INTEBI, 2008).

3.2 Dados oficiais disponíveis sobre violência sexual intrafamiliar.

O Mapa da Violência, estudo realizado por Waiselsz, no Brasil, trouxe que nos
últimos 30 anos houve uma diminuição de 77,1% de mortes por causas naturais de
crianças e adolescentes, caracterizadas por deteriorações biológicas do organismo
ou causadas por doenças, todavia, houve um crescimento de 14,3% de mortes
86

causadas por fatores externos, que independe do organismo humano, isto é, que
são causadas por lesões ou agravos à saúde e que resultam na morte (WAISELSZ,
2012, p. 12).
Segundo os dados do Ministério dos Direitos Humanos, no Balanço das
Denúncias de Violações de Direitos Humanos, apresentado em sessão pública, no
dia 11 de abril de 2017, na sede da Secretaria Especial de Direitos Humanos, as
estatísticas apontam que, só no ano de 2016, 144.580 denúncias foram registradas,
são casos de negligência, violência psicológica, violência física, violência sexual e
outras violações contra crianças e adolescentes. Dentre as denúncias de violência
sexual, foram registradas 15.707, equivale, em média, 43 casos de violência sexual
por dia, em um cálculo simples, significa dizer que, a cada uma hora, em média, uma
criança tem seus direitos violados (BRASIL, 2016, <http://www.sdh.gov.br/disque100
/balancos-e-denuncias/balanco-disque-100-2016-apresentacao-completa/>).
Esse quadro pode ser ainda mais grave, levando em consideração que esses
dados representam somente uma parte das violências cotidianas que acontecem,
pois por baixo desse quantitativo visível, há um enorme número de violência que não
chega ao conhecimento através dos sistemas de notificação, ficam no silêncio da
dor, do sofrimento da vítima ou em razão dos casos de subnotificação.
Segundo o levantamento de dados do Ministério dos Direitos Humanos, a
partir do Disque Denúncia 100, a casa da vítima é o local onde concentra a maior
porcentagem de violações, representando 53% das denúncias (BRASIL, 2016,
<http://www.sdh.gov.br/disque100/balancos-e-denuncias/balanco-disque-100-2016-
apresentacao-completa/>).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece a violência como
problema de saúde pública, que resulta em sofrimento, incapacidades, ou até
mesmo, na perda da vida, além do envolvimento de outras pessoas nessa situação
de violação de direitos fundamentais, a violência contra crianças e adolescentes
repercute em toda a sociedade (KRUG, et al, 2002). A violência intrafamiliar possui
uma relação muito próxima com antigas concepções baseadas no pensamento
autoritário, nas assimetrias do poder, na coisificação da condição de crianças ou
adolescente, na inferiorização dessas pessoas em situação peculiar de
desenvolvimento. A violência sexual no ambiente familiar provoca sequelas que
87

afetam o processo de desenvolvimento e comprometem tanto o desenvolvimento


físico, como social e psíquico, que se refletem por toda a vida.
No Relatório Mundial da Saúde (KRUG, et al, 2002) a Organização Mundial
da Saúde (OMS) revelou que “quase um terço das adolescentes relatam que sua
primeira experiência sexual foi forçada” (KRUG, et al, 2002). Nos registros
encontrados no Sistema de Informações para Infância e Adolescência (SIPIA),
sistema nacional de registro e tratamento de informações sobre a garantia e defesa
dos direitos das crianças e adolescentes, verifica-se que, entre o período de 2014
até 2018, dos casos de violação ao direito fundamental à liberdade, respeito e
dignidade, o maior número de casos de violência sexual aconteceram por pessoas
da família, percebe-se a partir dos dados apresentados na tabele a baixo que 11.679
casos de abuso sexual por pessoas da família foram registrados, desses, 9.742 são
contra vítimas do sexo feminino e 1.927 contra vítima do sexo masculino, ainda
havendo registro de 3 casos contra transmasculinos e 5 contra transfemininos.

Tabela 01 – Registros de violência sexual – abuso, no período de janeiro de


2014 até outubro de 2018:
Direito Violado Violações Masculino Feminino Trans Trans Não
Masculino Feminino Informado
Abuso sexual por 11679 1927 9742 3 5 2
pessoas da família
Abuso sexual por 6419 1591 4821 2 4 1
membros do círculo de
relações sociais e de
amizade
Estupro 2811 318 2488 1 0 4
Assédio sexual 2493 410 2080 0 3 0
Outros 1343 423 918 1 0 1
Exibicionismo 455 152 302 1 0 0
Abuso sexual por 439 113 325 0 0 1
cuidadores
Corrupção para abuso 381 61 320 0 0 0
sexual
Abuso 157 30 127 0 0 0
verbal/Telefonemas
obscenos
Voyeurismo 86 19 66 0 0 1
Abuso sexual por 18 5 13 0 0 0
detentores de custódia
legal
Total 26281 5049 21202 8 12 10
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informações para
Infância e Adolescência (SIPIA, 2018).
88

O SIPIA é um instrumento utilizado de apoio à gestão, organizado a partir de


módulos temáticos, coletam, processam e disseminam informações locais sobre
situações de criança e adolescentes. Atualmente o SIPIA contém um módulo para
Conselheiros Tutelares (SIPIA CT) e outro para Unidades/Programas de
Atendimento Socioeducativo (SIPIA SINASE). O sistema oferece um conjunto de
dados consolidados em relatórios locais, regionais, estaduais e nacionais e servem
para a construção, desenvolvimento, monitoramento e melhorias de planos,
estratégias e ações que visam promoção, proteção e defesa de direitos humanos de
crianças e adolescentes (MACHADO, 2014, p. 114).

O Sipia tem por objetivo subsidiar a articulação de agendas


descentralizadas com base na gestão de relacionamento em redes de
conhecimento multisetoriais (diferentes segmentos do poder público,
sociedade civil organizada, universidades, crianças e adolescentes, mídia,
dentre outros atores). Seu interesse é fortalecer os processos elaboração,
gestão e monitoramento de políticas, planos, programas, projetos e outras
iniciativas, fomentando a produção de conhecimento e disseminando
informações de interesse público relacionadas à garantia de direitos da
infância e adolescência brasileira (MACHADO, 2014, p. 114).

Outra base oficial de dados é o Sistema de Informação de Agravos de


Notificação (SINAN), que foi implementado entre 1990 e 1993, com o objetivo de
coletar e processar dados sobre agravos de notificação em todo território nacional,
fornecendo informações e contribuindo para a tomada de decisões preventivas,
planejamento de saúde e ações do Poder Executivo para prevenir e erradicar
violações de direitos. O sistema permite a avaliação dos impactos à nível nacional,
estadual e municipal. As informações são coletadas a partir da Ficha Individual de
Notificação (FIN) preenchida pela rede de atendimento, ou pela Ficha Individual de
Investigação (FII), que é um roteiro de investigação, que pertencem ao Sistema de
Vigilância de Violências e Acidentes (Viva), o qual foi implementado em 2006, com o
objetivo de coletar dados e gerar informações para subsidiar políticas públicas na
área da saúde, direcionadas a prevenção de violências e acidentes.
O Viva possuí dois componentes: a Vigilância Contínua (Viva/Sinan), formado
pela vigilância da violência doméstica, sexual e outras violências interpessoais ou
autoprovocadas, e o Viva Inquérito, notificação sobre atendimentos de casos de
violência e acidentes em unidades de urgência e emergência (MINISTÉRIO DA
SAÚDE, 2016, p. 06).
89

Este sistema que foi implantado inicialmente nas maternidades e nos


serviços de atendimentos às doenças sexualmente transmissíveis e
especializados para vítimas de violências, a partir 2009 estendeu-se para
todos os serviços de saúde, integrando o Sistema de Informação de
Agravos de Notificação (SINAN). A publicação da Portaria n. 104, que torna
compulsória todas as violências interpessoais e autoprovocadas trouxeram
também potência para esse movimento de ampliação. Importante conhecer
essas ocorrências e sua distribuição no território brasileiro para a
identificação de regiões e áreas do território com maior vulnerabilidade
social e assim, nortear a implementação de ações de saúde capazes de
impactar na melhoria da qualidade de vida (RATES; MELO;
MASCARENHAS; MALTA, 2015, p. 656-657).

As informações obtidas a partir dos registros da Ficha de Notificação


Individual de Violência Doméstica, Sexual e/ou Outras Violências, documento
padronizado pelo setor da Saúde, torna-se elemento fundamental para a construção
do perfil da pessoa que sofreu a violência, do provável autor e do local onde ocorreu,
dados importantes para subsidiar a proposição de ações eficazes ao enfretamento
deste importante problema de saúde pública. Eles são encontrados no
Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), tecnologia
da informação a serviço do SUS, local onde é possível buscar de forma sistemática,
as informações de agravos de notificação do SINAN. Todavia, os períodos que estão
disponíveis até o momento, são dados de 2009 até 2016.
Através da coleta de dados do SINAN, pelo sistema DATASUS, baseado nas
variáveis: 1) Violência doméstica, sexual e/ou outras violências; 2) Faixa etária; 3)
Registro de violência por região; pode-se verificar na tabela 02, que entre o período
de 2014 até 2018 houveram 272.532 agravos de notificação de violência doméstica,
sexual e/ou outras violências no Brasil, sendo que a região Sul está em segundo
lugar com o maior número de agravos, com 65.614 registros.

Tabela 02 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências por região,


segundo a faixa etária de 0 até 19 anos de idade, entre 2009 até 2016:
Faixa 1 Região 2 Região 3 Região 4 Região 5 Região Total
Etária Norte Nordeste Sudeste Sul Centro -
Oste
<1 Ano 937 3.971 6.207 7.496 1.944 20.555
1-4 3.180 6.836 14.783 11.849 4.290 40.938
5-9 4.039 5.176 14.485 10.695 3.493 37.888
10-14 9.006 11.110 26.768 15.473 5.427 67.784
90

15-19 7.578 20.834 48.754 20.101 8.100 105.367


Total 24.740 47.927 110.997 65.614 23.254 272.532
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net (2018).

Destaca-se que a violência intrafamiliar é a mais difícil de chegar ao


conhecimento das autoridades públicas, o medo das crianças e adolescentes
impede as mesmas de buscar por ajuda, isto é, os números registrados não
correspondem ao verdadeiro total de violência intrafamiliar praticada contra crianças
e adolescentes no país, havendo uma quantia oculta de crianças e adolescentes
vítimas de violência intrafamiliar que não foram atendidas pelas políticas públicas. A
subnotificação da violência é uma questão que precisa de contínuo aprimoramento,
em especial aos profissionais das redes de atendimento de educação, saúde e
assistência social que precisam estar preparados tecnicamente para identificar os
casos junto às crianças e adolescentes atendidos.

Tem que ser considerado que os quantitativos registrados pelo SINAN


representam só a ponta do iceberg das violências cotidianas que
efetivamente acontecem: as que demandam atendimento do SUS e que,
paralelamente, são declaradas como violência. Por baixo desse quantitativo
visível, um enorme número de violências cotidianas nunca chega à luz
pública (WAISELFISZ, 2012, p. 62).

Dentre o total de 272.532 agravos de notificação de violência doméstica,


sexual e/ou outras violências no Brasil, a partir da tabela 03 é possível verificar que
152.994 dos registros ocorreram no ambiente familiar, isto é, dentro da residência da
vítima, o que evidencia que a violência intrafamiliar é uma das principais formas de
violência contra crianças e adolescente no país.

Tabela 03 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências por local de


ocorrência, segundo a faixa etária de 0 até 19 anos de idade, entre 2009 até
2016:
Faixa Residência Habitação Escola Local de Bar ou Via Comércio/ Indústria/ Outros Ignorado Em Total
Etária Coletiva prática Similar Pública Serviços Construção branco
esportiva
<1 12.768 69 116 29 92 958 1.342 14 2.876 2.035 256 20.555
Ano
1-4 28.175 188 1.108 56 80 1.807 754 15 4.138 4.365 252 40.938
5-9 25.878 241 1.958 133 117 2.822 400 54 2.936 3.145 204 37.888
91

10-14 39.032 483 4.533 408 496 9.746 685 133 4.672 7.188 408 67.784
15-19 47.141 815 2.670 648 2.674 28.448 1.369 223 5.824 14.667 888 105.367
Total 152.994 1.796 10.385 1.274 3.459 43.781 4.550 439 20.446 31.400 2.008 272.532

Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net (2018).

Logo o domicílio, local em que deveria ser o seu lugar de proteção, onde os
pais, que tem a responsabilidade de cuidado e de educação de seus filhos, são
aqueles que, na verdade, os expõem a violência e violam a proteção integral.

A violência doméstica ou intrafamiliar é motivo de indignação não tanto por


um aspecto quantitativo, ou seja, pelo número de casos em que ela ocorre,
mas pelas formas cruéis em que ela se dá e, principalmente, pelo fato
mesmo de ocorrer dentro da família, ou seja, pelo fato de que as pessoas
que atentam, de uma forma ou de outra, contra a criança ou o adolescente
sejam as pessoas de sua convivência mais íntima, aquelas que o colocaram
no mundo, aquelas em que a criança ‘naturalmente’ confia, aquelas de que
ela depende totalmente, aquelas que deveriam amá-la e protege-la, enfim,
aquelas que deveriam antes querer morrer do que ver os seus filhos
sofrendo qualquer forma de violência ou de mal (VERONESE; COSTA,
2006, p. 102).

Dentre os 152.994 agravos de notificação que ocorreram no ambiente


familiar, 65.801 foram registrados como uma espécie de violência sexual cometida
contra à criança ou adolescente, os maiores registros estão nos casos de violência
sexual contra crianças e adolescentes de 10 até 19 anos de idade, segundo a tabela
04. Lembrando que se compreende por violência sexual desde uma simples
conversa com uso de linguagem erotizada até as mais diversas práticas sexuais,
como a perturbação, exploração, agressão, abuso sexual, com ou sem contato
físico. Importa ressaltar que “a violência sexual que acontece dentro das paredes de
um lar importa numa cruel distorção dos valores fundamentais da família”
(VERONESE, 1997, p. 21).

Tabela 04 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências na residência,


registradas como violência sexual, segundo a faixa etária de 0 até 19 anos de
idade, entre 2009 até 2016:
Faixa Etária Sim Não Ignorado Em Branco Total
<1 Ano 882 18.174 818 681 20.555
1-4 10.585 28.165 1.243 945 40.938
5-9 15.212 21.138 860 678 37.888
92

10-14 26.635 38.182 1.648 1.319 67.784


15-19 12.487 85.667 3.580 3.633 105.367
Total 65.801 191.326 8.149 7.256 272.532
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net (2018).

Na tabela 05 é possível verificar que dos casos de violência sexual


registrada no DATASUS, dos quais ocorreram na residência da vítima, entre a faixa
etária de 0 até 19 anos de idade, os agressores são sua maioria é um amigo ou
conhecido, o pai, padrasto, mãe e o irmão.

Tabela 05 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violências na residência,


registradas como violência sexual, segundo a faixa etária de 0 até 19 anos de
idade e autor da violência, entre 2009 até 2016:
Faixa Pai Padrasto Mãe Madrasta Irmão Amigo / Desconhecido
Etária conhecido
<1 Ano 152 61 58 1 17 171 104
1-4 2.271 966 403 39 393 2.079 622
5-9 1.858 2.083 493 29 777 4.824 874
10-14 2.139 3.041 756 26 488 7.890 3.598
15-19 798 804 319 14 149 2.822 4.847
Total 7.218 6.955 2.029 109 1.824 17.786 10.045
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net (2018).

Segundo a nota técnica do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)


de 2014, sugeriu que apenas 10% dos crimes de estupro (de maneira geral, não
somente contra crianças e adolescentes) sejam efetivamente notificados. É
consenso que esta seja uma das violências mais subnotificados, em razão das suas
características, em razão da vergonha medo, as vítimas deixam de registrar a
ocorrência. Outro fator considerado importante pelo Fórum de Segurança Pública, é
o perfil do autor da violência, pois muitas vezes é apontado como um conhecido da
vítima. Dados do IPEA, de 2014, “apontam que mais de 50% dos estupros sofridos
por crianças e adolescentes foram praticados por conhecidos, como pais, padrastos,
namorados ou amigos. Entre adultos esse índice se aproxima dos 40%” (FÓRUM
BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, 2017, p. 44).
Segundo a pesquisa apresentada pela Secretaria de Direitos humanos, em
2016, referente as denúncias do Disque 100, apresentada no Plano Decenal da
93

Assistência Social (2016, p. 121), a violência sexual contra criança e adolescente é a


quarta violência mais recorrente, contabilizando 22.840 denúncias em 2014 e 17.583
denúncias em 2015:

Em 2015, as principais violações relatadas contra crianças e adolescentes


foram negligência (38%), violência psicológica (23,9%), violência física
(22,2%) e violência sexual (11,4%). Segundo dados do relatório Situação
Mundial da infância 2012, cerca de 2,5 milhões de pessoas no mundo são
vítimas de tráfico de seres humanos para trabalhos forçados e exploração
sexual, dentre elas, estima-se que 50% sejam crianças e adolescentes. O
relatório aponta ainda para a tendência global do aumento de crianças e
adolescentes vivendo nas ruas nas grandes cidades (BRASIL, PLANO
DECENAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2016, p. 118).

O plano também apresentou dados dos casos atendidos pelo Serviço de


Proteção e Atendimento Especializado à Família e Indivíduos (PAEFI) em 2015,
trazendo informações de no Sul do Brasil, 11.899 casos tratam-se de violência
intrafamiliar, 5.981 casos são de vítimas de abuso sexual, 509 casos atendidos são
de vítimas de exploração sexual (BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA
SOCIAL, 2016, p. 118).
A mensuração da incidência é um desafio, neste âmbito torna-se
fundamental, ainda, conhecer e sistematizar as informações voltadas à violência
sexual contra crianças e adolescentes, isso porque uma parcela significativa dos
dados de violência e violação de direitos não são notificados corretamente. “Há uma
grande parcela da informação, relatada localmente nos mais diversos serviços
públicos, de unidades de Assistência Social até unidades de Segurança Pública, que
pelos mais diversos motivos não são registrados, coletados e sistematizados”
(BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2016, p. 132).
Os casos de violência sexual contra crianças e adolescentes nem sempre são
devidamente registrados, o que dificulta a análise de dados que demonstram a
realidade, todavia, mesmo com as subnotificações os números são altos e
representam uma grande violação de direitos das crianças e adolescentes.
Só no ano de 2016 foram registradas 144.580 denúncias de violência sexual,
a cada uma hora uma criança ou adolescente tem seus direitos violados. Esse foi o
dado apresentado pelo Ministério de Direitos Humanos, todavia, conforme os
registros do SIPIA, de 2014 a 2018, estão registrados 26.281 casos de direitos
violados, já no SINAN, que tem seu dado mais recente de 2014, tem registrado no
94

mesmo ano, 84.150 casos de violência doméstica, sexual e/ou outras violências no
Brasil. A impossibilidade de obter dados recentes, atualizados e precisos dificulta a
verificação da quantidade de casos de violação de direito e consequentemente
prejudica nos planos de ações e estratégias para melhorias e avanços das políticas
públicas de atendimento e proteção às crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual.
O principal local onde os casos de violência ocorrem é justamente onde a
criança ou adolescente deveria ter sua maior proteção, dentro da residência, cujo
agressores na maior parte dos casos são os pais ou padrastos, o que demonstra
motivo de grande preocupação à sociedade e Estado, pois se a violação ocorre no
âmbito familiar, cabe a sociedade e o Estado auxiliar para garantir a proteção
integral e restabelecer direitos violados da vítima.

3.3 Causas e consequências do abuso sexual intrafamiliar.

O abuso sexual infantil constitui uma parcela significativa do número de


doenças que atingem o mundo. Embora as consequências tenham recebido maior
atenção das pesquisas só recentemente, já existem evidências de que a “maior
parte das doenças encontradas nos adultos – inclusive cardiopatia isquêmica,
câncer, doença pulmonar crônica, síndrome do intestino irritável e fibromialgia –
estão relacionadas a experiências de abuso durante a infância” (KRUG, et al, 2002,
p. 69). Isto porque as vítimas ficam mais propensas a fatores de risco
comportamentais como o ato de fumar, abuso do álcool, dieta alimentar deficiente e
compulsiva, ausência de exercícios físicos, segundo o Relatório Mundial da Saúde.
Algumas crianças não atingem sintomas em níveis clínicos perceptíveis, mas os
danos psicológicos podem vir a longo prazo, já outros demonstram os danos
psicológicos graves de forma mais rápida,

Sintomas psiquiátricos, como depressão, ansiedade, abuso de substâncias,


agressão, sentimento de vergonha ou enfraquecimento cognitivo. Por fim,
algumas crianças preenchem todos os critérios para doenças psiquiátricas
que incluem distúrbios de estresse pós-traumático, forte depressão,
distúrbios de ansiedade e distúrbios de sono (KRUG, et al, 2002, p. 69)
95

As consequências geradas pela violência sexual contra crianças e


adolescentes perpassam diversas problemáticas que podem se manifestar a curto,
médio ou longo prazo, podem ser físicas, psicológicas, diretamente ligadas a
afetividade, psicopatológicas e cognitivas, como também podem ser sociais,
relacionadas ao comportamento e aprendizagem.
Quando os resultados são físicos, variam de pequenos hematomas ou
escoriações, até traumas graves, como grandes rompimentos vulvares, mutilação
genital feminina (circuncisão feminina), que requerem sutura, normalmente realizada
sob anestesia geral, ou lesões acarretam na morte da vítima. A saúde reprodutiva da
vítima pode ser afetada, como também podem ser transmitidas doenças
sexualmente transmissíveis, como AIDS, gonorreia, sífilis, HPV, cancro mole,
mycoplasma genitaliun, clamídia, herpes genital ou oral, hepatite viral e tricomoníase
(DECHERNEY, et al, 2016, p. 597). As consequências físicas são visíveis no corpo
da vítima, por isso são geralmente mais fáceis de serem notadas e tomadas como
indicadores de ocorrência de violência sexual.
Entretanto, as consequências à saúde mental à criança e adolescente tem
efeito principalmente a longo prazo, podem ser múltiplos os danos causados e
também podem ser apresentar em sintomas orgânicos, distúrbios do sono e
alimentares, déficit cognitivo, prejuízos de afetividade e sexuais. Os prejuízos
afetivos podem ser percebidos pelas expressões de sentimento como o medo,
ansiedade, culpa, raiva e tristeza. Os déficits cognitivos se manifestam pela baixa
concentração e atenção, fantasias, baixo rendimento escolar e crenças distorcidas,
como a percepção de ser a culpada da violência sexual, também pelo sentimento de
desconfiança e inferioridade. Quanto aos comportamentos da vítima, nota-se
diferença quando a criança ou adolescente apresentam conduta hipersexualizada,
fuga do lar, uso abusivo de drogas, isolamento social e agressividade.
A violência atribui a pessoa “menos valia”, ou seja, anula sua condição de
humanidade, ela existe por conta das relações que desqualificam o sujeito,
transformando-o em objeto/coisa e essa coisificação do sujeito advém do imaginário
social de “desumanizar”, que foi sofrendo um processo de tolerância e naturalização,
transformando crianças e adolescentes em objetos e propriedades dos adultos.
96

Violência é a falta de ética entre as relações humanas, efeito da fragilidade de


vínculos de proteção, cuidado uns para os com os outros (CABREIRA, 2017).
Autores como Azevedo e Guerra (1988), Faleiros (2000), Furniss (1993) e
Sanderson (2005) ressaltam que o contexto presente na relação de violência sexual
é notadamente marcado pelo padrão patriarcal e adultocêntrico de relações sociais
vigentes na sociedade. Padrão caracterizado pela dominação do homem sobre as
mulheres, considerando que os dados nos mostram que a maioria das violências
sexuais intrafamiliares ocorridas no âmbito familiar são cometidas por homens. Nota-
se a presença de princípios autoritários e das desigualdades de gêneros.
Ideias machistas ainda são sustentadas na sociedade e pouco questionadas,
pois o sistema de gênero é um princípio organizacional naturalizado que se tornou
identidade cultural, a partir da própria construção social, a questão é que, como todo
sistema social que se perpetua, através da manutenção de ideias, condutas e
estruturas. Por esta razão as ideias ou crenças que a violência se torna justificada.
Os prejuízos e o nível da gravidade da violência sexual dependem
fundamentalmente do grau de percepção e conhecimento da vítima, como da
responsabilidade de proteção que agressor tem sobre a vítima, do sentimento que
os unem, da espécie de violência empregada – se estupro, se houve ferimentos,
tortura ou se foram reiteradas vezes – e de suas consequências – se da violência
sexual resultou gravidez, aborto, maternidade incestuosa, doença sexualmente
transmissível, sequelas físicas e psicológicas graves.
Os impactos da violência sexual, relacionam-se a fatores intrínsecos,
extrínsecos e fatores próprios da violência sexual. Os fatores intrínsecos
correspondem aos aspectos inerentes a vulnerabilidade e resiliência pessoal da
criança ou adolescente. Destaca-se no processo de resiliência a capacidade que
esta tem de seguir uma trajetória positiva em sua vida, apesar de vivenciar
adversidades, isto é, de encontrar meios para superação e uma ressignificação do
problema, que mesmo que não o elimina, passa a constituir parte da história do
sujeito e ele é capaz de prosseguir positivamente (SCHWANCK; SILVA, 2006).
Nos fatores extrínsecos, referentes ao risco ou proteção de uma rede de
apoio e afetiva a família, podemos citar a rede de atendimento com papel
importante, pois constitui-se no conjunto de pessoas e sistema os quais possuem
97

caráter de reconstrução e manutenção dos elos de relacionamento, compreende


também a rede de apoio social, família, escola, comunidade, amigos, órgãos de
proteção e profissionais de atendimento à vítima de violência sexual (SCHWANCK;
SILVA, 2006).
Os fatores próprio da violência sexual, está relacionado a duração, o grau de
parentescos, a confiança estabelecida entre vítima e autor, a reação dos
responsáveis ou cuidadores no momento da revelação, a presença de outras formas
de violência, o tempo de duração da violência possuí grande influência, pois ele
quanto mais duradora o tempo de exposição da criança ou adolescente à violência
sexual, os resultados colaterais aumentam na sua autoestima, cria sentimento de
menos valia, falta de confiança, retraimento, pensamento de suicido, pois a vítima
passa a considerar a morte como a única saída para cessar a violência,
principalmente quando o agressor matem violência sob ameaças à criança e outros
familiares.
Quando a violência sexual é intrafamiliar, que deturba de relações
socioafetivas e culturais entre adultos e crianças ou adolescentes, transformando-se
em relações genitalizadas, erotizadas, violentas criminosas (FALEIROS, 2000), os
efeitos que decorrem são tanto interacionais no nível pessoal como social, podendo
refletir em um círculo vicioso que amplia os prejuízos sofridos e “se estende para
outras áreas da vida da vítima, podendo seguir definitivamente o modelo relacional
de dominação e subjugação” (SANTOS, 2010, 40). Além disso, segundo o Relatório
Mundial sobre Violência e Saúde, “o comportamento dos pais e o ambiente familiar
são fatores centrais para o desenvolvimento do comportamento violento nos jovens”
(KRUG, et al, 2002, p. 33), além do processo de produção social.
A violência sexual tem um impacto profundo sobre a saúde física e mental da
criança e do adolescente, além de causar lesões físicas ela está associada ao risco
de outros problemas de saúde sexual e reprodutiva, com consequências que podem
ser imediatas ou a longo prazo. Seu impacto sobre a saúde mental pode ser mais
sério e danoso do que os danos causados fisicamente, que também podem ser a
longo prazo. A morte é, sem dúvidas, o resultado mais danoso da violência sexual e
ela pode se dar não somente pelas lesões e violência causada pelo agressor
diretamente, como o homicídio, mas também pode se manifestar de forma
98

subsequente à violência sexual, pode se manifestar sob forma de suicídio, infecção


por HIV ou outras doenças sexualmente transmissíveis (KRUG, et al, 2002, p. 147).
A violência sexual pode afetar profundamente o bem-estar social das vítimas,
“em consequência dessa violência, as pessoas podem ser estigmatizadas e jogadas
ao ostracismo por suas famílias e outras pessoas” (KRUG, et al, 2002, p. 147).
Várias são as formas de maus-tratos contra criança e adolescente, abuso físico,
sexual, psicológico, negligência, discriminação, entre outras.

Delas não se sabe qual a é a mais danosa, questões relacionadas à reação


da vítima, à situação da família nos casos denúncia e comprovação dos
abusos, bem como o desenrolar dos procedimentos policiais e judiciários,
se impõem. Faz-se necessário também conhecer as repercussões na vida
de crianças e adolescentes, rendimento escolar, adaptação social,
alterações da saúde física e mental e a possibilidade de desenvolverem
distúrbios comportamentais (ADED, et al, 2006, p. 205).

“Alguns estudos apontam os traumas de infância como responsáveis por


cerca de 50% das doenças mentais encontradas nos adultos (ZAVASCHI et al.,
2002). O comprometimento da saúde mental e a adaptação social da criança ou
adolescente vítima de violência sexual varia conforme a capacidade de reação de
cada uma com o estresse vivido.
A exposição de crianças a um acúmulo de riscos estruturais e sociais causam
maior probabilidade de manifestar doenças mentais, como a depressão ou o
desenvolvimento de outras psicopatologias, “quanto mais frequente e persistente,
piores os problemas psíquicos, comportamentais e de relacionamento. As sequelas
levariam as vítimas de abuso a comportamentos criminosos de transgressão dos
costumes” (ADED, et al, 2006, p. 207).
Pode ser observado também em crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual mudanças súbitas de comportamento, tais como distúrbios alimentares,
afetivos, comportamentais agressivos ou de autodestruição e pesadelos,
conhecimentos sexuais inadequados com relação a idade da vítima, visão degrada
quanto a si mesma, medo ou perda do interesse pelo estudo e brincadeiras,
dificuldade de se ajustar em ambientes com outras crianças, isolamento social,
déficit de linguagem e aprendizagem, distúrbios de conduta, baixa autoestima, fugas
de casa, uso de álcool, entorpecentes, ideias suicidas e homicidas, tentativas
repetidas de suicídio ou automutilação (ADED, et al, 2006, p. 207).
99

Tristeza e ansiedade na infância, ocasionados por abusos sexuais, podem


levar a depressão quando adultos. Assim como, dificuldade com relacionamento
sexuais, fobias, ideação paranoide e transtornos obsessivos-compulsivo.
“Transtorno de conversão tem sido relacionado a pacientes com história de abuso
de sexual de longa duração e relações incestuosas” (ADED, et al, 2006, p. 207).
As razões que levam uma pessoa a praticar um ato de violência sexual contra
uma criança ou adolescente perpassa por diversos fatores, como

Problemas de saúde mental, tais como dependência e abuso de álcool e


outras drogas, problemas neurológicos, problemas genéticos e problemas
derivados de uma história familiar pregressa ou presente de violência
doméstica; ocorrência de perturbações psicológicas entre os membros das
famílias; despreparo para a maternidade e/ou paternidade de pais jovens,
inexperientes ou surpreendidos por uma gravidez indesejada; adoção de
práticas educativas muito rígidas e autoritárias; isolamento social das
famílias, que evitam desenvolver intimidade com pessoas externas ao
pequeno círculo familiar; ocorrências de práticas hostis, desprotetoras ou
negligentes em relação às crianças; e, fatores situacionais diversos, que
colocam as famílias frente a circunstâncias não antecipadas e que podem
atuar como estressores ou facilitadores do desencadeamento de abusos
(PEDERSEN; GROSSI, 2011, p. 28).

O crescimento da violência possui diferentes formas, expressões e fatores.


Diversas causas são apontadas como fatores condicionantes para o crescimento da
violência, entre elas está a desigualdade social, economia e cultural, caracterizada
como uma violência estrutural “violência entre classes sociais, inerentes ao modo de
produção das sociedades desiguais” (AZEVEDO; GUERRA; 1998, p. 31). Mas estes
não são os únicos fatores que propiciam a violência intrafamiliar, especialmente
contra crianças e adolescentes.
Esber (2008, p. 31-32) expõe três vertentes explicativas da etiologia da
violência sexual, a vertente individualista, sob uma análise individual, patologizante e
psicologizante, a qual tende a responsabilizar somente os indivíduos envolvidos na
violência, a vítima, como quem de alguma forma seduziu o agressor, como o autor,
que possuí alguma patologia psicológica que levou ele a cometer um ato violento. A
segunda vertente é a ambientalista, voltada para as disfunções familiares, onde a
pobreza e a marginalização resultam em famílias patológicas, isto é, em decorrência
do ambiente em que está inserido o autor, culminaria na ocorrência de violência
sexual. A terceira vertente é a feminista, que afirma que a etiologia da violência
100

sexual é fruto das desigualdades sociais e das relações de poder do homem e do


adulto sobre as mulheres e as crianças, a partir desta vertente, a predominância da
classe social, a relação de gênero e as relações de idade seriam fatores causadores
da violência sexual.
A terceira vertente é a mais discutida nas produções cientificas, contudo,
segundo Esber (2008, p.32), elas não são suficientes para abarcar a complexidade
das violências sexuais, assim, propõe uma quarta vertente da dimensão
intersubjetiva, que possui como premissa a relação indivíduo e sociedade num
processo dialético, isto é, o ser humano é constituinte da cultura e constituído por ela
e a cultura cria formas especiais de condutas, no desenvolvimento histórico, o
homem muda os modos e procedimentos de sua conduta, criando novas formas de
comportamento, a violência é uma forma de relação social, por isso é necessário a
compreensão da subjetividade do agressor.
A violência sexual intrafamiliar está ligada a aspectos multifatoriais, é preciso
estudar diversos fatores e como eles se combinam com determinados indivíduos,
grupos sociais, culturais e o momento históricos.
Nas famílias onde são registrados ocorrência violência sexual, normalmente,
são famílias fechadas, onde seus integrantes possuem pouca convivência social.
Apresentam hierarquia rígida, na qual a obediência à autoridade masculina
referência é incontestável. O padrão de relacionamento é de uma comunicação
fechada e as demonstrações de afeto, quando existem, tendem a ser erotizadas
(AZEVEDO; GUERRA, 1998).
Aspectos da saúde mental podem estar associados a reação da criança e do
adolescente agredidos e submetidos ao desejo do agressor, abuso de substâncias
como álcool, drogas lícitas e ilícitas, essas substancias podem flexibilizar
temporariamente o controle sobre impulsos agressivos e abusivos, facilitando a
perda do controle e cometimento de violência sexual, ou em casos crônicos, podem
afetar o sistema neurológico do indivíduo, afetando o córtex pré-frontal, que é
responsável pelo controle impulsivo, das decisões se algo é certo ou errado, que
diferencia o homem do animal. Doenças mentais também afetam o controle ou
geram a falta de culpa sobre atos violentos do agressor. Todavia, as causas da
violência sexual não podem ser somente reduzidas numa concepção meramente
101

patológica, ocultando reais causas da violência e ignorando as consequências


sociais e políticas que ela causa.
Muitas vezes as situações de violência sexual intrafamiliar não ocorrem com o
emprego de força física ou ameaça, nem atos de crueldade, pois nem sempre
estarão ligados a casos de estupro, todavia, não deixam de ser uma forma de
violência sexual, pois torna a criança ou o adolescente um objeto do desejo sexual
do agressor, utilizando a relação de poder e dominação sob uma pessoa que está
em situação peculiar de desenvolvimento.
A violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes é uma violência de
natureza relacional, segundo Azevedo (2003), que atinge todas as classes sociais,
enquanto violência intersubjetiva consiste também:

[...] numa transgressão do poder disciplinador do adulto, convertendo a


diferença de idade adulto versus criança/adolescente, numa desigualdade
de poder intergeracional; numa negação do valor liberdade: exigindo que a
criança/o adolescente sejam cúmplices do adulto, num pacto de silêncio;
num processo que aprisiona a vontade e o desejo da criança ou do
adolescente, submetendo-os ao poder do adulto, coagindo-os a satisfazer
os interesses, as expectativas e as paixões deste. Em síntese, a VDCA: é
uma violência interpessoal; é um abuso do poder disciplinador e coercitivo
dos pais ou responsáveis; é um processo que pode se prolongar por vários
meses e até anos; é um processo de completa objetalização da vítima,
reduzindo-a à condição de objeto de tratamento abusivo; é uma forma de
violação dos direitos essenciais da criança e do adolescente enquanto
pessoas e, portanto, uma negação de valores humanos fundamentais como
a vida, a liberdade, a segurança; tem na família sua ecologia privilegiada.
Como esta pertence à esfera do privado, a Violência Doméstica acaba se
revestindo da tradicional característica de sigilo (AZEVEDO, 2003, p.32).

A própria família se organiza em duas desigualdades, entre gerações e entre


gêneros, sustenta o lar a partir do exercício da violência, que é a conversão da
desigualdade à opressão, dominação, assim como, a concepção do senso comum
que estabelece o poder familiar como autoridade adulta sobre a criança, pensada na
lógica da transformação da dependência social para a dependência natural, isto é,
embora os adultos sejam socialmente responsáveis e juridicamente autorizados para
exercer o poder familiar sobre crianças e adolescentes, esse poder deve ser
exercido de forma adequada, a partir das símbolos e construções sociais de
representação, não do exercício abusivo do poder sobre outra pessoa. Na violência
intrafamiliar há uma relação de dominação e submissão, de superioridade e
inferioridade.
102

Ainda, a concepção de lar como espaço privado e intocável, o lar remanesce


como um dos últimos locais de afirmação do sujeito e de exercício de sua vontade,
“a concepção de inviolabilidade do locus familiar encontra-se presente nas pessoas”
(LANÇA, 2013, p. 29).

Apesar de a violência sempre ter estado presente, o mundo não tem de


aceitá-la como parte inevitável da condição humana. Desde que a violência
existe, também existem sistemas – religiosos, filosóficos, legais e comunais
– que se desenvolveram para evita o mundo não tem de aceitá-la como
parte inevitável da condição humana. Desde que a violência existe, também
existem sistemas – religiosos, filosóficos, legais e comunais – que se
desenvolveram para evita-la ou restringi-la. Nenhum deles foi totalmente
bem sucedido, mas todos deram sua contribuição para esse marco definidor
da civilização (KRUG, et al, 2002, p. 03).

O termo abuso, corresponde a mau uso ou uso equivocado, excessivo ou


injusto das atribuições ou poderes dos pais/família perante à criança ou adolescente.
Contraria as responsabilidades básicas de proteção ao desenvolvimento de crianças
e adolescentes, que resulta na violação dos direitos humanos. Assim, o adulto
transgride o poder/dever se proteção e passar a efetuar a coisificação daquele que
deveria assegurar os direitos, nega-lhe o direito de ser tratado como sujeito de
direito, com condições especiais de crescimento e desenvolvimento, transformando-
o em objeto de poder.

3.4 As responsabilidades na política de atendimento à criança e ao


adolescente vítimas de abuso sexual intrafamiliar

O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente tem origem


no artigo 227 da Constituição Federal e também se encontra no Estatuto da Criança
e do Adolescente, o qual disciplinou o sistema, prevendo o compartilhamento da
responsabilidade entre Estado, sociedade e família, propondo a concretização dos
direitos através de polícias públicas articuladas ente governo e sociedade civil
organizada. A política, dividida em três níveis, política de atendimento, proteção e
justiça, encontra suas atribuições, competências e responsabilidades descritas no
Estatuto da Criança e do Adolescente.
O sistema de garantias se funda nas bases principiológicas da ação do
Estado, sob a ótica da descentralização e integração entre diversos setores que
103

compõem a estrutura do sistema, com o intuito de repensar toda lógica de


atendimento, para que haja integração operacional entre os três níveis. A política de
atendimento, que compõe os três níveis do Sistema de Garantia de Direitos,
correspondem ao conjunto de serviços, programas e projetos de atendimento de
direitos à criança e ao adolescente, composto pela rede de saúde, educação,
esporte, cultura, lazer e assistência social, “classificado por níveis de proteção,
básica e especial, fundamentado nas garantias previstas no artigo 227 da
Constituição Federal” (SOUZA, 2016, p. 83).

Portanto, a política de atendimento é um componente importante no


processo de assistência integral às crianças e adolescentes, pois deve
promover junto aos conselhos gestores ações articuladas e planejadas para
enfrentar os desafios na municipalidade naquilo que constitui a garantia de
direitos humanos de criança e adolescentes (SOUZA, 2016, p. 93)

A política atendimento é formada pela rede de educação, esporte, lazer,


cultura, saúde, assistência socia e outros serviços disponíveis que o município tenha
implantado. A rede de saúde e a rede de educação possuem importante papel na
garantia de atenção básica às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual,
promovendo ações educativas, identificando e notificando casos, para que as
crianças, adolescentes e suas famílias sejam encaminhadas para outros órgãos de
atendimento, assim como para instituições que compõem o sistema de proteção e
justiça.
A assistência social compreende um dos três pilares da seguridade social,
disciplinada pelo artigo 194 da Constituição Federal, a seguridade social é um
conjunto integrado de ações e iniciativas dos poderes públicos e da sociedade,
destinado a assegurar direitos fundamentais e sociais, relativos à saúde, à
previdência e à assistência social (BRASIL, 1988). Constitui-se política pública de
atendimento gratuito para todos os cidadãos que dela necessitarem. Suas diretrizes
constitucionais estão nos artigos 203 e 204 da Constituição Federal, também está
regulado pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, Lei n. 8.742, de 7 de
dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social.
O Sistema Único de Assistência Social é o responsável por ofertar os
serviços, programas e projetos, por níveis de proteção social, que visa prevenir as
situações de vulnerabilidade por meio de desenvolvimento das capacidades e do
104

fortalecimento dos vínculos no âmbito familiar e com a comunidade. O sistema está


estruturado em níveis de proteção social básica e especial. A proteção social
especial divide-se em média e alta complexidade, a proteção de média
complexidade oferece atendimento socioassistencial às famílias e indivíduos que
tiveram seus direitos ameaçados ou violados, que, apesar de manter vínculos
familiares, precisam de intervenções especializadas, como, por exemplo, o Serviço
de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI). Já a alta
complexidade constitui-se em um conjunto de serviços para aqueles que estão em
situação de ameaça e que necessitam de serviços de acolhimento familiar ou
institucional, como medida protetiva, como, por exemplo, o serviço de acolhimento
institucional, como a Casa-Lar, Abrigo Institucional e a Casa de Passagem (SOUZA,
2016, p. 60).
A primeira proposta de Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), foi
aprovada no legislativo, em 23 de maio de 1990, trazendo princípios e diretrizes de
uma política de assistência social, no entanto, em setembro do mesmo ano, o
presidente à época, Fernando Collor, vetou a lei, argumentando que a proposta
apresentada não promovia uma assistência responsável e tornaria o Brasil um país
ingovernável (SPOSATI, 2004).
Após o episódio do ex-presidente, Fernando Collor, que vetou a primeira
proposta da Lei Orgânica de Assistência Social, em 1990, as transformações no
cenário político do país motivaram o Congresso Nacional, em regime de urgência,
voltar a falar sobre LOAS, sendo finalmente sancionada pelo Presidente Itamar
Franco, sob a égide da Lei n. 8.742/1993, de 8 de dezembro de 1993, regulando
preceitos constitucionais sobre a Assistência Social e reafirmando uma política de
seguridade social.
Em seu primeiro artigo estabeleceu a assistência social como direito de todos
e dever do Estado, como Política de Seguridade Social não contributiva, que prevê
os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de
iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades
básicas de todos os cidadãos (BRASIL, 1993).
Contudo, somente em 2003 é que realmente houve uma reestrutura
governamental às novas diretrizes e aboliu o disciplinamento clientelista,
105

cooperativista e fisiológico. Durante a IV Conferência Nacional de Assistência Social,


ocasião em que foi deliberada a implantação do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) como sistema ordenador de uma efetiva política pública, livre das
concepções práticas patrimonialistas, assistencialistas e meramente normativas.

[…] a convocação extraordinária da IV Conferência Nacional de Assistência


Social, em dezembro de 2003, recolocou, de saída, a legitimidade e
importância da instância máxima de deliberação da política e começou a
particularizar esse novo tempo e a recondicionar as expectativas contidas.
Dentre as muitas deliberações ali consagradas, uma define a trajetória
sobre a qual esse governo deveria começar a reescrever essa história […]:
a decisão coletiva de implantação do SUAS, a partir do paradigma da
universalização do direito à proteção social fundado na cidadania e
abandonando as ideias tutelares e subalternas que (sub)identificam
brasileiros como carentes, necessitados, miseráveis. (LOPES, 2006, p. 80)

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), por


intermédio da Secretaria Nacional de Assistência Social e do Conselho Nacional de
Assistência Social, aprovou em 15 de outubro de 2004, a Resolução n. 145, que
institui a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), demonstrando a intenção
de construir coletivamente o redesenho da política de assistência social e da
materialização das diretrizes da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), na
perspectiva de implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que
ocorreu no ano de 2005.
Esta conquista leva a constatação do anseio de atores sociais em efetivar
uma política pública de Estado, definida em Lei, que afasta a assistência social do
clientelismo, assistencialismo, caridade ou de ações pontuais, que nada tem a ver
com políticas que visa soluções a longo prazo e possuem compromisso entre a
sociedade e o Estado. Trata-se de uma política permanente, que se orienta por
ações conjuntas e com isso busca garantir políticas de proteção social, garantido
normas jurídicas universais.
Em 12 de dezembro de 2012, o Conselho Nacional de Assistência Social -
CNAS institui a Resolução n. 33, que aprovou a Norma Operacional Básica da
Assistência Social (NOB-SUAS), importante passo para a estruturação da política de
assistência social, nos três níveis de governo, representando um modelo de gestão
democrática e participativa na forma de sistema.
106

A NOB-SUAS disciplina a gestão pública da Política de Assistência em todo


território nacional, exercida de forma sistêmica pelos entes federativos e em
consonância com a Constituição Federal, de 1988, a Lei Orgânica da Assistência
Social (LOAS), de 1993. “Com a adoção de um modelo de desenvolvimento
econômico atrelado ao desenvolvimento social, a atenção às populações em
situação de pobreza, vulnerabilidade e risco pessoal e social entrou definitivamente
na agenda pública brasileira” (BRASIL, 2012).
A ampliação da cobertura e os avanços da proteção social resulta na
implantação do SUAS em quase todos os municípios brasileiros, sustentada pelo
pacto federativo, a gestão compartilhada, a qualificação do atendimento à
população, a participação social. Com a instituição do SUAS, a assistência social
passa a ter foco nas famílias que possuem fragilidades e vulnerabilidades, tendo
como caráter preventivo de proteção social, para fortalecer laços e vínculos sociais
entre seus membros e também em caráter protetivo, àqueles que são vítima de
alguma violação de direitos, fornecendo serviços de proteção social básica por meio
dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), os Centros de Referências
Especializados de Assistência Social (CREAS), que oferece serviços de proteção
especial. Estes serviços são responsáveis por fortalecer laços, trabalhar qualidades
e capacidades, concretizando direitos humanos e sociais de forma universalizante,
promovendo a articulação e a integração com as políticas setoriais (SOUZA, 2016,
p. 59).

O Sistema Único de Assistência Social inauguraria a forma de gestão na


oferta de serviços programas e projetos, por níveis de proteção social. A
proteção social básica atua como um conjunto de serviço que objetiva
prevenir as situações de vulnerabilidades por meio do desenvolvimento das
capacidades das potencialidades e do fortalecimento dos vínculos no
âmbito familiar e com a comunidade. A proteção social especial divide-se
em média complexidade e alta complexidade. A proteção de média
complexidade oferece atendimento socioassistencial às famílias e
indivíduos que tiveram seus direitos ameaçados ou violados, e que, apesar
de manterem os vínculos familiares, necessitam de intervenções
especializadas; já a alta complexidade constitui-se em um conjunto de
serviços para aqueles em situação ameaça, que de algum modo foram ou
necessitam ser retirados do grupo familiar como medida protetiva (SOUZA,
2016, p.59).

A Tipificação Nacional de Assistência Social, aprovada pelo Conselho


Nacional de Assistência Social, por meio da Resolução n. 109, de 11 de novembro
107

de 2009, é a normativa responsável por padronizar em todo território Nacional os


serviços de proteção básica e especial, estabelecendo conteúdos essenciais, o
público a ser atendido, o propósito de cada um deles e os resultados esperados para
a garantia de direitos socioassistenciais. Além das provisões, aquisições, condições,
período de funcionamento, abrangência, articulação, impacto e formas de acesso
para seu funcionamento e realização.
A Resolução n. 109, de 11 de novembro de 2009, que aprovou a Tipificação
Nacional de Serviços Socioassistenciais, nela são organizados por níveis de
complexidade do SUAS, a proteção social básica e a proteção social especial de
média e alta complexidade. Os serviços de proteção social básica estão divididos
em: i) serviços de proteção e atendimento integral à família (PAIF); ii) serviço de
convivência e fortalecimento de vínculos; iii) serviço de proteção social básica no
domicílio para pessoas com deficiência e idosas (MINISTÉRIO DO
DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À FOME, 2013, p. 08).
Os serviços de proteção social especial de média complexidade compreende-
se em: i) serviço de proteção e atendimento especializado a famílias e indivíduos
(PAEFI); ii) serviço especializado em abordagem social; iii) serviço de proteção
social a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de liberdade
assistida (LA) e de prestação de serviços à comunidade (PSC); iv) serviço de
proteção social especial para pessoas com deficiência, idosas e suas famílias; v)
serviço especializado para pessoas em situação de rua (MINISTÉRIO DO
DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À FOME, 2013, p. 08).
Os serviços de proteção social especial de alta complexidade oferecem: i) o
serviço de acolhimento institucional, nas seguintes modalidades: abrigo institucional,
casa-lar, cassa de passagem, residência inclusiva; ii) serviço de acolhimento em
república; iii) serviço de acolhimento em família acolhedora; iv) serviço de proteção
em situação de calamidades públicas e de emergências (MINISTÉRIO DO
DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À FOME, 2013, p. 08).
O PAEFI é o serviço de apoio, orientação e acompanhamento a famílias em
que um ou mais de um de seus membros encontram-se em situação de ameaça ou
violação de direitos. Visa a orientação e a promoção de direitos, fortalecimento de
108

vínculos familiares, comunitários e sociais diante do conjunto de situações que


colocaram a vítima em risco pessoal ou social.

O atendimento fundamenta-se no respeito à heterogeneidade,


potencialidades, valores, crenças e identidades das famílias. O serviço
articula-se com as atividades e atenções prestadas às famílias nos demais
serviços socioassistenciais, nas diversas políticas públicas e com os demais
órgãos do Sistema de Garantia de Direitos. Deve garantir atendimento
imediato e providências necessárias para a inclusão da família e seus
membros em serviços socioassistenciais e/ou em programas de
transferência de renda, de forma a qualificar a intervenção e restaurar o
direito (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À
FOME, 2013, p. 29).

Os usuários dos serviços do PAEFI são famílias e pessoas que tiveram


direitos violados por ocorrência de: violência física, psicológica e negligência;
violência sexual, como abuso e/ou exploração sexual; afastamento do convívio
familiar devido à aplicação de medida socioeducativa ou medida de proteção; tráfico
de pessoas; situação de rua e mendicância; abandono; vivência de trabalho infantil;
discriminação em decorrência da orientação sexual e/ou raça/etnia; outras formas de
violação de direitos decorrentes de discriminação/submissão, situações que
provoquem danos e agravos a sua condição de vida e os impedem de usufruir
autonomia e bem estar; ou descumprimento de condicionalidade do Programa Bolsa
Família (PBF) ou Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) (MINISTÉRIO
DO DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À FOME, 2013, p. 29).
O PAEFI funciona dentro da unidade do Centro de Referência Especializado
de Assistência Social (CREAS), para prestação de seu serviço necessita de espaço
físico para que possa receber a comunidade, de forma individualizada ou coletiva e
que possa desenvolver suas atividades administrativas. Materiais básicos para seu
funcionamento são: mobiliário, computadores, linha telefônica, artigos pedagógicos,
culturais e esportivos. Seu trabalho social essencial se resume em:

Acolhida; escuta; estudo social; diagnóstico socioeconômico;


monitoramento e avaliação do serviço; orientação e encaminhamentos para
a rede de serviços locais; construção de plano individual e/ou familiar de
atendimento; orientação sociofamiliar; atendimento psicossocial; orientação
jurídico-social; referência e contrarreferência; informação, comunicação e
defesa de direitos; apoio à família na sua função protetiva; acesso à
documentação pessoal; mobilização, identificação da família extensa ou
ampliada; articulação da rede de serviços socioassistenciais; articulação
com os serviços de outras políticas públicas setoriais; articulação
interinstitucional com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos;
109

mobilização para o exercício da cidadania; trabalho interdisciplinar;


elaboração de relatórios e/ou prontuários; estímulo ao convívio familiar,
grupal e social; mobilização e fortalecimento do convívio e de redes sociais
de apoio (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENO SOCIAL E COMBATE À
FOME, 2013, p. 30).

O acesso ao serviço se dá através da identificação e encaminhamento por


outros serviços socioassistenciais, das demais políticas públicas setoriais, dos
demais órgãos que compõem o sistema de garantia de direitos e do sistema de
segurança pública, assim como demandas espontâneas. Por isso é extremamente
importante a articulação do PAEFI em rede, interligando seu trabalho com os demais
serviços socioassistenciais de proteção social básica e especial, assim como outros
serviços setoriais, da sociedade civil organizada, serviços, programas e projetos de
instituições não governamentais e comunitárias, instituições de ensino e pesquisa e
demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos
Nesse sentido, o SUAS materializa a essência da Constituição Federal,
objetivando a concretização da cidadania, como pode-se ver nos objetivos do PNAS,
que trouxe em seu texto o dever do Estado de promover serviços, programas,
projetos e benefícios, tanto na proteção básica, quanto na especial, para a família,
indivíduo e grupos que necessitarem, também está em seus objetivos contribuir com
a inclusão e a equidade dos usuários, ampliando o acesso aos bens e serviços
socioassistenciais básicos e especiais, em áreas urbanas ou rurais, como, também,
assegurar que essas ações, em âmbito da assistência social tenham a família como
centralidade, garantindo, assim, a convivência familiar e comunitária (BRASIL,
POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL, 2004, p. 26).
A Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social (NOB-
SUAS), traduz uma gestão que deixa de ser o lugar do cuidador e mera entrega de
benefícios, proporcionando novas posturas e novos atores, com equipes técnicas
profissionais específicas para cada função, considerando os seguintes princípios:

Universalidade: todos têm direito à proteção socioassistencial, prestada a


quem dela necessitar, com respeito à dignidade e à autonomia do cidadão,
sem discriminação de qualquer espécie ou comprovação vexatória da sua
condição;
Gratuidade: a assistência social deve ser prestada sem exigência de
contribuição ou contrapartida, observado o que dispõe o art. 35, da Lei nº
10.741, de 1º de outubro de 2003 – Estatuto do Idoso;
110

Integralidade da proteção social: oferta das provisões em sua completude,


por meio de conjunto articulado de serviços, programas, projetos e
benefícios socioassistenciais;
Intersetorialidade: integração e articulação da rede socioassistencial com
as demais políticas e órgãos setoriais;
Equidade: respeito às diversidades regionais, culturais, socioeconômicas,
políticas e territoriais, priorizando aqueles que estiverem em situação de
vulnerabilidade e risco pessoal e social.

De acordo com a NOB-RH-SUAS, a equipe de referência para a prestação de


serviços e execução das ações no âmbito da Proteção Social Especial de Média e
Alta Complexidade, que ocorre no Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS), unidade pública, deve ser composta de acordo com
demanda do município, isto é, gestão inicial e básica ou gestão plena ou com
serviços regionais:

Tabela 06 – Composição do Centro de Referência da Assistência Social


(CREAS):
CENTRO DE REFERÊNCIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL - CREAS
Municípios em Gestão Inicial e Básica Municípios em Gestão Plena e Estados
com Serviços Regionais
Capacidade de atendimento de 50 Capacidade de atendimento de 80
pessoas/indivíduos pessoas/indivíduos
1 coordenador 1 coordenador
1 assistente social 2 assistentes sociais
1 psicólogo 2 psicólogos
1 advogado 1 advogado
2 profissionais de nível superior ou médio 4 profissionais de nível superior ou médio
(abordagem dos usuários) (abordagem dos usuários)
1 auxiliar administrativo 2 auxiliares administrativos
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir de informações da NOB-SUAS – BRASIL, 2006.

Dentro do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, no


âmbito das políticas de atendimento, qualquer um pode receber a notícia,
informação ou suspeita de casos de violência contra criança e adolescente, desta
forma, é muito importante que haja fluxos de notificação e encaminhamento
estabelecimento, assim como, que cada serviço de atendimento saiba o seu papel
fundamental na proteção e reestabelecimento de direitos violados.
A educação é direito para todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno
111

desenvolvimento das crianças e adolescentes, preparando-as para o exercício da


cidadania e sua qualificação no trabalho, é o que traz o artigo 205, da Constituição
Federal (BRASIL, 1988), a educação é fundamental para o desenvolvimento da
pessoa quando membro da sociedade. O ensino preze pela igualdade, liberdade,
pelo pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, tendo a família importante
papel na transmissão de valores e cultura, que dão início a formação dos cidadãos.
A escola é um dos principais ambientes responsáveis pela transmissão da
cultura e a transformação das estruturas sociais, também é um local para enfrentar a
violência sexual intrafamiliar, a escola deve estar atenta às situações de violação de
direitos de crianças e adolescentes. No que tange a violência sexual, a escola deve
buscar alternativas para mudança, pois seu objetivo é de garantir a qualidade de
vida de seus alunos, bem como, promover a cidadania (CAMARGO; LIBÓRIO,
2005).
Embora nas famílias onde ocorrem casos de violência sexual, o pacto do
silêncio estabelecido pelo agressor, através de ameaças ou da utilização do seu
poder hierárquico sobre a criança, ele pode ser rompido na escola, assim como
geralmente é, seja através de sinais indiretos ou pela confiança que o aluno tem nos
seus educadores. Tais situações ensejam uma atuação responsável do educador, “a
escola mostra-se como lugar ideal para detecção e intervenção em casos de abuso
sexual infantil, uma vez que o principal agressor geralmente encontra-se da família”
(BRINO; WILLIANS, 2003, p. 01).
Nestes casos, os educadores possuem papel fundamental, pois além de ser
responsáveis pelos aspectos da aprendizagem dos conteúdos curriculares, “cabe ao
professor observar e procurar conhecer seus alunos, identificar seus problemas e
queixas, e compreender a frequência e a continuidade das manifestações
comportamentais” (CRAIDY; KAERCHER, 2001). De acordo com o Estatuto da
Criança e do Adolescente, as escolas devem propiciar as condições necessárias
para o desenvolvimento de atitudes, hábitos e habilidades à saúde física e mental
dos seus alunos, desta forma, quando identifica ou suspeita que uma criança está
em situação de violência deve notificar o Conselho Tutelar o qual é responsável por
fazer o encaminhamento necessário ao serviço especial, prestado pelo CREAS.
112

As escolas possuem a responsabilidade de notificar as situações de maus


tratos ou outros tipos de violação de direitos. O papel dos educadores é fundamental
no processo de identificação e notificação, cabendo reforçar o dever de proteção
integral à criança e ao adolescente rompendo os silêncios familiares sobre as
violências. Assim, os profissionais da educação ao se deparar com a uma situação
de suspeita de violência, devem notificar o Conselho Tutelar do município.
A escola, neste momento, tem suma importância ao proteger o professor, a
notificação não tem caráter pessoal e deve ser institucional, isto é, anônima quanto a
identidade do professor ou servidor público, para preservar o profissional que
identificou a situação de violência.

As escolas necessitam construir uma política institucional para lidar com


situações caracterizadas como abuso sexual. Mais do que isso, as escolas
são importantes nichos ecológicos de prevenção contra esta forma de
violência. Para tanto, quando se fala em educadores, - incluem-se todos os
trabalhadores da escola, aqueles que convivem na escola e que devem
compreender as leis, os recursos da rede de apoio, os sinais emitidos pelas
crianças, as peculiaridades das famílias e as principais questões do
desenvolvimento humano. Desta forma, pode-se chegar a uma cultura
escolar preparada não apenas para ‘transmitir conteúdos’, mas para
proteger ativamente seus estudantes e familiares. É preciso buscar
metodologias que sensibilizem os professores e os habilitem para intervir
em casos de suspeita ou constatação de abuso sexual (PIETRO, 2013, p.
61).

O educador não deve forçar ou perguntar à criança fazendo com que ela
conte os fatos ocorridos, pois isso gera um processo de revitimização, não cabe ao
professor fazer o levantamento de provas, apenas de notificar o Conselho Tutelar,
caso exista uma suspeita ou confirmação de violência sexual. Esta obrigação de
notificação está prevista do Estatuto da Criança e do Adolescente, no artigo 245,
trazendo responsabilidade administrativa para aqueles que não cumprirem com a
obrigação de comunicar os órgãos competentes nos casos de abuso e maus tratos
às crianças e adolescentes.
A saúde, assim como, a assistência social é um dos pilares da seguridade
social, a saúde pública é destinada a promover o acesso aos serviços básicos de
saúde e saneamento, a redução de riscos de doenças e outras enfermidades, bem
como, o bem-estar físico, mental e social, ainda que na ausência de enfermidades
ou de doenças, é o estado completo de bem estar (KRUG, et al, 2002)
113

As intervenções de saúde pública são normalmente caracterizadas com


níveis de prevenção: Prevenção primária – decorrente de abordagens que visam a
evitar a violência; prevenção secundária – abordagens que tem o foco às respostas
mais imediatas à violência, como a assistência pré-hospitalar, serviços de
emergência ou tratamento de doenças sexualmente transmissíveis após o estupro;
prevenção terciária – com abordagem que visam a assistência em longo prazo, tais
como reabilitação e reintegração, que buscam reduzir os traumas ou invalidez
resultantes da violência (KRUG, et al, 2002, p. 15).

Para se lidar com a violência em diversos níveis é necessário:


 Tratar de fatores de risco individuais e adotar medidas para modificar os
comportamentos individuais de risco;
 Influenciar relacionamentos pessoais próximos e trabalhar para criar
ambientes familiares saudáveis, assim como oferecer ajuda profissional e
apoio às famílias que apresentam disfunções;
 Monitorar locais públicos, como escolas, locais de trabalho e bairros, e
adotar medidas para tratar de problemas que possam levar à violência;
 Lidar com a desigualdade de gênero e com as atitudes e práticas culturais
adversas;
 Lidar com os fatores culturais, sociais e econômicos mais abrangentes,
que contribuem para a violência, e adotar medidas para mudá-los,
inclusive medidas para acabar com o descompasso entre o rico e o pobre
e para garantir um acesso igual a bens, serviços e oportunidades (KRUG,
et al, 2002, p. 16).

No âmbito da política de saúde, o atendimento da criança ou adolescente


vítima de violência sexual ocorrerá de acordo com o grau de complexidade, o
atendimento no Sistema Único de Saúde divide-se em atenção primária, constituída
pelas Unidades Básicas de Saúde, formadas pelos agentes comunitários de saúde,
pela equipe de saúde da família e pelo núcleo de apoio à saúde da família, nesta
etapa são marcadas consultas e exames básicos, além da realização de
procedimentos simples. As Unidades Básicas de Saúde (UBSs) articulam-se para
atuar também nos espaços da comunidade, como centros comunitários, escolas,
além de realizarem visitas domiciliares às famílias (BRASIL, 20--).
A atenção secundária é formada pelos serviços especializados em nível
ambulatorial e hospitalar, quanto aos casos de densidade tecnológicas intermediária,
isto é, entre a atenção primária e terciária, chamada também de procedimentos de
média complexidade. Compreende-se por serviços de médicos especializados, de
apoio diagnóstico e terapêutico e atendimento de urgência e emergência, que
114

acontecem nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), hospitais e outras


unidades de atendimento, conforme a organização municipal ou da microrregião
famílias (BRASIL, 20--).
No nível terciário, ou de alta complexidade, corresponde ao conjunto de
terapias e procedimentos de elevada especialização, que exigem alta tecnologia ou
custo, como cirurgias reparadoras para mutilações, traumas, em casos mais graves
de violência. O atendimento neste nível ocorre nos hospitais de grande porte, que
atendem alta complexidade famílias (BRASIL, 20--).
Quando um profissional da área da saúde suspeita ou possuí a confirmação
de violência sexual, deve notificar o Conselho Tutelar, lembrando que, assim como o
educador, o profissional da saúde também possuí a obrigatoriedade legal de
comunicar para os órgãos competentes, observando as notificações corretamente,
para que não haja imprecisões ou encaminhamentos inadequados, que
comprometem a proteção da criança ou adolescente, provocando a revitimização.
Da mesma forma que na educação, os profissionais da saúde nas unidades
de saúde ou na assistência social, devem estar preparados para lidar com situações
que envolvam a violência sexual. Além de oferecer o atendimento imediato aos
sintomas ou lesões que a vítima apresenta, este também devem romper com o
segredo da violência, promovendo a proteção da criança ou adolescente através da
notificação e encaminhamento para o trabalho conjunto com os demais serviços
oferecidos pela rede de atendimento. (PIETRO, 2013, p. 80).
Quando identificada uma suspeita ou confirmação de violência sexual
envolvendo criança e adolescente, independente de quem na política de
atendimento que identificou, deve notificar o Conselho Tutelar, podendo o próprio
Conselheiro Tutelar realizar o Boletim de Ocorrência, na Delegacia de Polícia de
Pronto Atendimento ou na Delegacia Especializada da Criança e do Adolescente.
Incumbe a equipe de saúde que realizou o atendimento encaminhar a família e a
criança para a proteção social especial, no Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS) e, quando necessário, deverá encaminhar a criança
para atendimento na área da saúde imediatamente, notificar a política de justiça.
Após atender a família e a vítima, o CREAS fará os encaminhamentos intersetoriais
necessários, como o encaminhamento da criança para a educação, se for o caso de
115

evasão escolar, o encaminhamento para a rede de saúde, o encaminhamento da


família para o CRAS e a criança ou adolescente para atividades de contraturno. O
CREAS fará o acompanhamento familiar e da criança ou adolescente por no mínimo
três meses, até que a situação esteja normalizada e os direitos tenham sido
restabelecidos.
A família também deve ser encaminhada ao serviço de proteção e
atendimento especializado a famílias e indivíduos (PAEFI), no CREAS, pois o
serviço articula-se com atividades e atenções prestadas às famílias nos demais
serviços socioassistenciais, nas diversas políticas públicas e nos demais órgãos do
Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, com o objetivo de
contribuir para o fortalecimento dos vínculos familiares e protetivos que ficam
prejudicados com a violação de direitos intrafamiliar.
No caso de identificação da violação de direitos pela Delegacia de Polícia de
Pronto Atendimento (DPPA) ou Delegacia de Política da Criança e do Adolescente,
esta deve imediatamente notificar o Conselho Tutelar e encaminhar a criança e o
adolescente para o atendimento imediato na saúde. Conforme o caso de violação de
direitos, medidas de proteção serão aplicadas pelo Conselho Tutelar ou pelo Poder
Judiciário, mediante requerimento do Ministério Público, do Conselho Tutelar ou de
terceiros interessados.
A remoção da criança ou do adolescente da família e aplicação da medida de
proteção de colocação em instituição de acolhimento deve ser a última medida a ser
aplicada, isto porque, é direito fundamental da criança e adolescente à convivência
familiar e comunitária, logo, cabe ao Poder Judiciário buscar a família extensa antes
de tomar tal decisão. Caso a única alternativa seja de retirada, está pode resultar na
colocação da criança ou adolescente na família extensa, colocação em família
substituta, através da adoção, que somente poderá ocorrer através da ação de
destituição do poder familiar, mediante a observância do devido processo legal, em
última hipótese, a colocação em instituição de acolhimento.
116

4. AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE ATENDIMENTO PARA CRIANÇAS E


ADOLESCENTES VÍTIMAS DE ABUSO SEXUAL INTRAFAMILIAR NO
MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL.

As políticas públicas de atendimento, que compõem o Sistema de Garantia de


Direitos da Criança e do Adolescente são importantes ferramentas de prevenção,
erradicação e reestabelecimento de direitos da criança e do adolescente que foram
violados.
É necessário a estruturação, com recursos físicos e humanos, dessas
políticas públicas, para que possam oferecer seus serviços adequadamente e atingir
as metas e objetivos estipulados pelos planos nacionais. Para tanto, é necessário
que cada município estabeleça, através de diagnósticos e com a participação da
sociedade civil, a principal interessada na oferta de políticas públicas, seus planos
municipais, para que neles sejam estabelecidas os objetivos, metas e ações
necessárias, de acordo com a peculiaridade local.
O estabelecimento de fluxos de atendimento, de acordo com os serviços
oferecidos pelo município também é uma ferramenta que facilita a prestação de
serviços públicos, o reestabelecimento de direitos, evita a revitimização de crianças
e adolescente em situação de violação de direitos e contribui para o fortalecimento
ou recuperação do vínculo familiar.
Todavia, para que isso seja possível, a rede de atendimento precisa estar
estruturada de acordo com as diretrizes nacionais, assim, neste capítulo busca-se
estudar o contexto do município de Santa Cruz do Sul, verificando os planos
municipais e a legislação local que visa a proteção integral. Através de estudo de
campo, verificar como se dá o funcionamento do Centro de Referência
Especializado de Assistência Social do município e se há dificuldade na prestação
de seus serviços às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual intrafamiliar.

4.1 O contexto do Município de Santa Cruz do Sul.

O município de Santa Cruz do Sul, localiza-se na região do Vale do Rio


Pardo, a 150km de Porto Alegre, capital do Estado do Rio Grande do Sul. Segundo
117

a Fundação de Economia e Estatísticas (FEE), a população é de 128.619 habitantes


(FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA, 2017). O município é composto por
oito distritos: a sede municipal, Alto Paredão, Boa Vista, Monte Alverne, São
Martinho, Saraiva, São José da Reserva e Rio Pardinho, os quais são atendidos por
subprefeituras.
Sua origem se dá na antiga colônia de Santa Cruz, criada em 1847, no
município de Rio Pardo, Distrito de Serra do Botucaraí, entre a margem esquerda do
rio Pardo e do arroio Taquari-Mirim. Sua fundação se deu com o propósito da
Câmara Municipal de Rio Pardo de estabelecer comunicação com a zona serrana da
Província, a fim de atrair o comércio da região e transformar em um centro de
comércio (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018,
p. 24).
Abertas as estradas, os primeiros lotes foram destinados a imigrantes
alemães, através de incentivos do governo imperial à imigração estrangeira. Em
1849, quando foi fundado o governo provincial, iniciou-se o povoamento da colônia
de Santa Cruz do Sul por imigrantes alemães, os primeiros habitantes

cultivavam mandioca, milho, feijão, batata e outros produtos da terra, a


subsistência dos primeiros habitantes era através da mão de obra familiar,
todavia, ampliando rapidamente para a variedade de cultivos e cultura,
conforme crescia sua população. A cultura do fumo, iniciada com sementes
cubanas e ainda incipiente, já estão prenunciava o desenvolvimento atual
(BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p.
25),

Tornou-se uma das colônias mais prósperas do Sul do país. A maioria dos
habitantes eram agricultores, mas muitos, também, eram artesãos, em meados dos
anos de 1850, os moradores produziam feijão, milho, batata, cevada e linho. Uma
parte era consumida e a outra exportada através do rio Pardo. O tabaco logo se
revelou o produto de maior produtividade e rentabilidade, o que levou o governo da
província a importar sementes (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA
CRUZ DO SUL, 2018 p. 25).
O governo provincial concedeu lotes urbanos, organizando espacialmente o
povoado, sendo que esses lotes eram demarcados seguindo uma planta urbana
definida pelo governo provincial, o qual possuía rigorosa orientação geométrica e no
seu entorno previa-se um conjunto de grandes chácaras, que serviriam para o
118

abastecimento de alimentos no núcleo urbano que estava sendo construindo


(HERMANN; SILVEIRA, 2001, p. 227).

A colônia cresceu rapidamente. Em 1853 já eram 196 lotes ocupados, nos


quais viviam 692 habitantes. No fim daquela mesma década, no ano de
1859, a população era de 2.409 habitantes. Como esse crescimento só
continuou, em 1877, no dia 31 de marco, a vila foi elevada à categoria de
povoação. Pouco mais de um ano depois, em 28 de setembro de 1878,
Santa Cruz do Sul se emancipou, transformando-se em um município
independente 29 anos depois de seu surgimento (BRASIL, PLANO
MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 28).

Entre o período de 1862 a 1881 se caracterizou pela continua expansão do


crescimento do município e diversificação da cultura, outros produtos começaram a
ser produzidos, como a aguardente, a farinha, a criação de animais junto com a
produção de banha, manteiga, venda de ovos e mel, “no fim deste período, a
agricultura de Santa Cruz já tomara uma orientação nitidamente comercial” (ROCHE,
1969, p. 275). O núcleo urbano que se formava a partir da divisão de lotes e quadras
contribui para o comércio dos produtos agrícolas excedentes, das famílias situadas
na zona rural, que produziam para sua subsistência e comerciavam o restante para
a zona urbana que se formava.
Por volta de 1881, a fumicultura já preponderava na cultura, sem abandonar
outras culturas comerciais, a agricultura de subsistência, neste período, deixa de ser
a agricultura familiar para uma agricultura comercial, sendo que a partir de 1882, os
produtos de origem agrícola começaram a ser vendidos para outros estados, não só
dentro do Rio Grande de Sul (MONTALI, 1979, p. 39). “Sendo o principal deles o
fumo que representava respectivamente 59% (1981), 39% (1895) e 59% (1899) do
valor das “exportações”. Os demais produtos “exportados eram erva-mate, feijão e
banha” (MONTALI, 1979, p. 39).
Após a emancipação, teve início a formação da média burguesia local.
Agricultores que conseguiram saldar seus débitos e garantir a aquisição das terras
no município, ascenderam economicamente, principalmente com a venda do fumo e
passaram a formar pequenos estabelecimentos comerciais e industriais. No ano de
1904, “fundaram o primeiro estabelecimento financeiro local, a Caixa de Crédito
Santa-Cruzense. O banco se expandiu, formando depois o Banco Agrícola Mercantil,
119

que depois se fundiu com o Banco Moreira Salles para formar o Unibanco” (BRASIL,
PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 29).
Em 1905, grande avanço foi dado com a via-férrea, que impulsionou à
integração do município de Santa Cruz do Sul com a cidade de Porto Alegre,
possibilitando a ampliação da circulação de mercadorias e pessoas. Posteriormente
a cidade ganhou acesso à região metropolitana e central do estado, através da
rodovia RSC-287, a rodovia RSC-153 e a BR-386, que são as principais estradas de
exportação do Estado rumo ao Porto de Rio Grande, assim como, a rodovia BR-290
que dá acesso ao Uruguai e à Argentina. Desta forma, geograficamente o município
ficou bem localizado.
Essa boa localização facilitou os rápidos avanços na economia, diversas
indústrias e distribuidoras de cigarro estão no município de Santa Cruz do Sul e
formam o maior complexo de fumo em folha do país (BRASIL, PLANO MUNICIPAL
DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 34). Simultaneamente, desenvolvia-se
no meio urbano o artesanato de produtos agrícolas produzidos pela região, consistia
nas transformações e o acondicionamento deles para serem transportados e
vendidos. A instalação da energia elétrica, em 1906, e da rede hidráulica, em 1908,
promoveu condições para o desenvolvimento dessas atividades e forneceu
condições para a instalação industrial (BREITBACH, 2014, p 46-47).

O município de Santa Cruz do Sul e parte integrante da região do Vale do


Rio Pardo e tem sua economia basicamente na produção do tabaco,
atingindo cerca de 90% das propriedades rurais. Nos últimos anos vem
buscando alternativas viáveis que possam mudar este quadro através da
diversificação com a introdução de outras culturas como a fruticultura,
horticultura, criação de animais, com ênfase na cadeia produtiva do leite,
onde o município se destaca a nível estadual (BRASIL, PLANO MUNICIPAL
DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018, p. 35).

O município de Santa Cruz do Sul vem disparando no ranking de


desenvolvimento do Estado do Rio Grande do Sul, atingindo em 2015 a sétima
colocação com o maior Produto Interno Bruto (PIB), no valor de R$ 7.764.847,95
(FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA, 2017). Sendo que o salário médio
mensal dos trabalhadores formais no município é de 2,8 salários mínimos (IBGE,
2016).
120

Tabela 07 – População residente por sexo:


Sexo Quantidade Porcentagem
Masculino 56.943 48,10%
Feminino 61.431 51,89%
Total 118.374 100%
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – Censo/IBGE/2010.

O município possuí uma população estimada de 129.427 pessoas, já


conforme o último censo, a população é de 118.374, segundo a tabela 07. Desta
população o perfil demográfico, de acordo com o último censo do Instituto de
Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, apontou que 102.228 dos
habitantes são brancos, 9.284 são pardos, 6.487 são negros, 333 de cor amarela e
42 indígenas (IBGE, 2010). No que tange a população negra, a tabela 08 mostra a
relação da população negra de acordo com o bairro de moradia no município:

Tabela 08 – População de negra de acordo com o bairro do município:


Bairro N. de Pessoas
Do Parque 0
Jardim Europa 2
João Alves 5
Country 9
Higienópolis 11
Monte Verde 14
Germânia 25
Santo Antônio 30
Linha Santa Cruz 34
Castelo Branco 44
Várzea 60
Independência 65
Avenida 75
Rauber 82
Renascença 90
Santa Inácio 103
Progresso 106
Belvedere 106
Santuário 107
Centro 112
São João 119
Dona Carlota 132
Universitário 133
Goiás 134
Esmeralda 162
121

Aliança 179
Schulz 221
Ana Nery 230
Bonfim 237
Margarida 262
Arroio Grande 283
Senai 347
Pedreira 481
Santa Vitória 603
Bom Jesus 773
Faxinal Menino Deus 846
Total 6222
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – Censo/IBGE/2010.

A população santa-cruzense possui número maior de adultos, entre 18 e 59


anos de idade, ocupando 63,25%, da população, sendo que o número de crianças e
adolescentes, pessoas de 0 até 17 anos de idade, corresponde à 23,61%, e número
de pessoas com 60 anos ou mais, corresponde a 13,14% dos munícipes. Na tabela
é possível verificar a quantidade populacional de acordo com sexo e a faixa etária:

Tabela 09 – População de acordo com sexo e faixa etária:


Faixa etária Homem Mulher Total
0-4 3.406 3.126 6.532
05-9 3.630 3.610 7.240
10-14 4.431 4.374 8.805
15-17 2.652 2.711 5.363
18-29 12.159 12.310 24.469
30-39 9.021 9.152 18.173
40-49 8.498 9.162 17.660
50-59 6.897 7.676 14.573
60-69 3.754 4.770 8.524
70-79 1.848 2.962 4.810
80+ 647 1.578 2.225
Total 56.943 61.431 11.8374
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – Censo/IBGE/2010.
122

De acordo com os dados obtidos no IBGE, do número total de habitantes do


município, o número de crianças e adolescentes totaliza em 27.940, isto é, pessoas
de zero à dezessete anos de idade, dentre estas, 14119 são do sexo masculino e
13821 são do sexo feminino (IBGE, 2010), conforme pode ser visualizado no gráfico
a seguir:

Gráfico 01: Grupo e faixa etária – 2010

74875
80000
70000
60000

38300
36575
50000
27940

40000

15559
14119

13821

30000

9310
6249
20000
10000
0
Criança e Adolescente Adulto Idoso
Masculino 14119 36575 6249
Feminino 13821 38300 9310
Total 27940 74875 15559

Masculino Feminino Total

Fonte: Gráfico elaborado pela autora a partir das informações do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – Censo/IBGE/2010.

Entre os habitantes, 106.671 são alfabetizados. O município possuí 79


escolas de ensino pré-escolar com o total de 3089 matrículas, 49 com ensino
fundamental, com o total de 14.076 matrículas, e 15 com ensino médio, com o total
de 3612 matrículas. Com relação ao ensino público e privados, na pré-escola,
36,25% das matrículas são em escola particular, no ensino fundamental 17,29% das
matrículas são do ensino privado, já no ensino médio 18,49% são de escolas
privadas (IBGE, 2010).
No âmbito da saúde, Santa Cruz do Sul possuí 32 estabelecimentos
municipais que prestam atendimento à saúde, sendo que todos possuem
atendimento pelo Sistema Único de Saúde. A expectativa de vida ao nascer é de
123

76,10 anos, até o ano de 2010 e a taxa de mortalidade infantil é de 7,97 óbitos a
cada mil nascidos vivos (IBGE, 2010).

Na área social, uma ampla rede de atendimento para pessoas em situação


de vulnerabilidade, vinculada a Secretaria Municipal de Políticas Públicas
(SEPOP), e responsável pelos equipamentos de proteção social básica
(CRAS e Centros de Convivência), proteção especial e média complexidade
(CREAS), alta complexidade (Abrigo, Casa da Mulher, Albergue), segurança
alimentar (Cozinhas Comunitárias) e Programa de Aquisição de Alimentos
do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (BRASIL,
PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 42).

No município, há um total de 7.028 famílias inscritas no Cadastro Único,


sendo que destas, 1.972 possuem renda per capita familiar de até R$85,00; 1.471
famílias possuem renda per capita familiar entre R$85,00 e R$170,00; 1.844 famílias
possuem renda per capita familiar entre R$170,01 e meio salário mínimo e; 1.741
famílias possuem sua renda per capita acima de meio salário mínimo. O programa
de transferência de renda beneficia famílias pobres e de extrema pobreza, as
famílias recebem benefícios no valor médio de R$ 146,69, sendo que no mês de
agosto de 2018, apenas 2.798 famílias, foram beneficiadas (BRASIL, MDS, 2018).
Na tabela 10 é possível visualizar em relação ao total de número de pessoas:

Tabela 10 – Pessoas cadastradas no Cadastro Único até agosto de 2018:


Total de pessoas cadastradas no Cadastro Único do município de 19.122
Santa Cruz do Sul
Pessoas cadastradas em famílias com renda per capita mensal 5.883
de R$ 0,00 até R$ 85,00
Pessoas cadastradas em famílias com renda per capita mensal 4.516
entre R$ 85,01 e 170,00
Pessoas cadastradas em famílias com renda per capita mensal 5.315
entre R$ 170,01 e ½ salário mínimo
Pessoas cadastradas em famílias com renda per capita mensal 3.408
acima de ½ salário mínimo
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Ministério de Desenvolvimento
Social – BRASIL/MDS/2018.

O município possuí nível de habilitação no SUAS como plena, desta forma o


município assume, com autonomia, a gestão da proteção social básica e especial.
124

Oferece dois Centro de Referência de Assistência Social, na proteção social básica,


com capacidade de atendimento de referência para 2.000 pessoas e apenas um
Centro de Referência Especializado de Assistência Social, na proteção social
especial, com capacidade de atendimento referenciada para 80 atendimentos, e 8
unidade de acolhimento institucionais: Unidade de Acolhimento Associação
Comunitária Pró Amparo do Menor; Unidade de Acolhimento Associação de Auxílio
aos Necessitados de Santa Cruz do Sul; Unidade de Acolhimento Centro Social,
Cultural e Educacional Gideões; Unidade de Acolhimento F- Equipamento II;
Unidade de Acolhimento Institucional para Mulheres em Situação de Violência;
Unidade de Acolhimento Institucional para Pessoas em Situação de Rua – Casa de
Passagem; Unidade de Acolhimento M – Equipamento I; e Unidade de Acolhimento
– Residência Inclusive – Casa Irmãos Koch (BRASIL, MDS, 2018).
Quanto aos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes no
município, há notadamente o caso de subnotificação, isto é, os casos de violência
sexual não estão sendo notificados no SINAN, o que é obrigatório a Secretaria
Municipal de Saúde efetuar, de acordo com a Portaria n. 204, de 17 de fevereiro de
2016, do Ministérios da Saúde. De acordo com a Tabela 11, de 2014 até 2016,
dados disponíveis, apenas 22 casos foram notificados.

Tabela 11 – Violência doméstica, sexual e/ou outras violência, local de


ocorrência, no município de Santa Cruz do Sul, segundo a faixa etária de 0 até
19 anos de idade, notificações de 2014 até 2016:
Faixa Residência Habitação Bar ou Via Outros Ignorado Total
etária Coletiva similar pública
<1 Ano 1 * - - - - 1
1-4 2 - - 1 1 - 4
5-9 4 - - - - - 4
10-14 4 1 - - 1 1 7
15-19 1 - 1 4 - - 6
Total 12 1 1 5 2 1 22
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net

Dos 22 casos notificados no município de Santa Cruz do Sul, o total 12


ocorreram na residência da criança ou adolescente, sendo que 50% dos registros o
agressor é o pai, em seguida há 3 casos que a violência partiu do padrasto, 1
registro que o agressor era o irmão, 4 notificações de que o agressor seria um
125

desconhecido e 3 que haveria outro vínculo entre vítima e agressor, de acordo com
a tabela 12:

Tabela 12 – Violência sexual, no município de Santa Cruz do Sul, segundo a


faixa etária de 0 até 19 anos de idade, autor, notificações de 2014 até 2016:
Faixa Pai Mãe Padrasto Madrasta Irmão Amigo / Desconhecido Outro Total
etária conhecido vinculo
<1 - - - - - - - - -
Ano
1-4 3 - - - - 1 - - 4
5-9 2 - - - - - - 3 5
10-14 1 - 2 - 1 2 1 - 7
15-19 - - 1 - - 1 4 - 6
Total 6 0 3 0 1 4 5 3 22
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação – Sinan Net

Na Secretaria de Segurança Pública não há estatísticas específicas de


violência contra criança e adolescente, apenas de violência sexual contra mulheres,
nos termos da Lei Maria da Penha. No SIPIA, apesar de haverem alguns registros
de violência sexual intrafamiliar contra criança e adolescente no Rio Grande do Sul,
totalizando 70 registros, entre o período de 2014 e 2018, nenhum deles é relativo ao
município de Santa Cruz do Sul (SIPIA, 2018).

4.2 As políticas públicas municipais de enfrentamento à violência sexual


contra crianças e adolescentes.

A lei orgânica do município de Santa Cruz do Sul, de 03 de abril de 1990,


prevê em seu artigo 125, apesar das terminologias que remetem à concepções do
menorismo, que o município prestará assistência social a todos que dela
necessitarem, colaborando com as entidades assistenciais que visem à proteção e
educação da criança, manutenção “de casas albergues para idosos, mendigos,
crianças e adolescentes abandonados, portadores ou não de deficiência, sem lar ou
família, aos quais se darão as condições de bem-estar e dignidade humana”
(SANTA CRUZ DO SUL, 1990), dentro das possibilidades do Município, colaboração
com a União, Estado e com outros municípios para solução de casos de crianças e
adolescentes desamparados e “desajustados, através de processos adequados de
126

permanente recuperação” (SANTA CRUZ DO SUL, 1990). Em seu artigo 129, a lei
orgânica prevê o seu dever de garantir atendimento pré-escolar na rede pública,
inclusive em creches, para criança de zero a seis anos de idade.
Dentro do âmbito das políticas públicas de atendimento à criança e
adolescente, cabe referir o projeto Núcleo para Atendimento à Infância e Juventude,
criado a partir da Lei municipal n. 3.711, de 28 de maio de 2001, que aprovou
programas da assistência social, desenvolvidos pela Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Social, para receber demandas encaminhadas pelo Conselho
Tutelar e pelo Ministério Público, que necessitassem de atendimento psicológico,
social, psiquiátrico, na área da infância e juventude, através de serviços técnicos
especializados, contando com orientação à família ou responsáveis. O programa
visa o acompanhamento de crianças, adolescentes e suas famílias, através de
visitas domiciliares (SANTA CRUZ DO SUL, 2001).
Toda criança e adolescente encaminhado para atendimento passava por uma
entrevista com psicóloga e sua família ou responsável era entrevistado pela
assistente social. Após a entrevista a equipe discutia o caso de definia o tratamento
adequado, caso houvesse a necessidade de acompanhamento psiquiátrico, a
criança ou adolescente era encaminhado ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)
(SANTA CRUZ DO SUL, 2001).
Em 21 de agosto de 2013, no município de Santa Cruz do Sul foi publicado a
Lei n. 6.809, que consolidou a legislação pertinente a Política Municipal de Proteção
e Atendimento dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente, do Conselho Tutelar, do Fundo Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente (FIA) e do Fórum Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente e substitui a lei n. 2.333, de 03 de dezembro de 1990, que
originalmente dispôs sobre a política municipal dos direitos das crianças e
adolescentes, criando o Conselho Municipal de Direitos da Criança e Adolescente e
o Conselho Tutelar do município.
No artigo 3º, estabelece que o atendimento das crianças e adolescentes será
realizado no âmbito municipal através das políticas sociais básicas de educação,
saúde, recreação, esportes, cultura, lazer, profissionalização e outros, que possam
assegurar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social de crianças e
127

adolescente. Também estabelece a implementação de políticas e programas de


assistência social em caráter suplementar e serviços especiais (SANTA CRUZ DO
SUL, 2013).
A lei prevê a articulação municipal de atendimento aos direitos da criança e
do adolescente, através de ações governamentais e não-governamentais articuladas
entre si. Estabelece as competências do Conselho Municipal de Direitos da Criança
e do Adolescente (COMDICA) no artigo 7º, nas quais está a elaboração de políticas
de atendimento, definindo prioridades e estabelecendo ações de execução, as quais
devem ser asseguradas pelo referido Conselho de Direitos, o qual também deve
formular as políticas básicas, deliberar sobre a implementação de programas,
projetos e serviços, estabelecer os critérios, formas e meios de fiscalização das
políticas públicas de atendimento executadas no município, aprovar o registro e
fiscalizar as entidades não governamentais que prestam alguma espécie de
atendimento às crianças e adolescentes. Organizar e coordenar as eleições dos
Conselheiros Tutelares, exercer o controle do uso do FIA, definir o plano de
implantação do Sistema de Informação para a Infância e Adolescência (SIPIA)
(SANTA CRUZ DO SUL, 2013).
O COMDICA de Santa Cruz do Sul possui sua composição determinada por
lei municipal, devendo ser composta por 20 membros, sendo 10 representantes do
Poder Público e 10 representantes dos órgãos não-governamentais, os quais
representam a sociedade e são eleitos pelo Fórum de Direitos da Criança e do
Adolescente. Todavia, segundo a Lei n. 6.809, 21 de agosto de 2013, o número
poderá variar, desde que seja mantida a paridade dos representantes
governamentais e não-governamentais (SANTA CRUZ DO SUL, 2013).
A referida lei, estabelece as diretrizes para eleição, condições de trabalho e
as competências do Conselho Tutelar. Assim como, institui o Fundo Municipal da
Criança e do Adolescente, com inscrição e conta bancária própria, e o Fórum
Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente para sugerir políticas ao
COMDICA, auxiliar na implementação e acompanhamento das políticas na área da
infância e adolescência, eleger as entidades não-governamentais para a
composição da paridade do COMDICA, o Fórum é constituído por entidades não-
128

governamentais legalmente constituídas e que comprovarem trabalho direito ou


indireto com crianças e adolescentes (SANTA CRUZ DO SUL, 2013).
A lei municipal n. 7.056, de 24 de junho de 2014, consolida a lei de criação do
Conselho Municipal de Assistência Social e a Lei de Criação do Fundo Municipal de
Assistência Social (FMAS). Determinou em seu artigo 2º, as atribuições do Conselho
Municipal de Assistência Social, entre elas está a de apreciar o Plano de Ação da
Assistência Social Municipal (SANTA CRUZ DO SUL, 2014), que, entretanto, não foi
disponibilizado pelo município.
O município apresenta o Plano Municipal de Saúde, com planejamento
estratégico do ano de 2018 até 2021, nele consta as características do município, a
descrição dos serviços oferecidos pelo município na rede de saúde, diagnóstico da
situação de saúde dos grupos populacionais específicos e aqueles que se
encontram em uma situação de vulnerabilidade, descreve o perfil epidemiológico, a
estrutura da secretaria municipal de saúde, a estrutura do atendimento
especializado, estrutura administrativa e as formas de controle, gestão,
monitoramento e avaliação.
O município oferece atenção básica, distribuída entre Unidades Básicas de
Saúde (UBSs), Estratégia de Saúde da Família (ESFs), Unidade de Saúde Prisional
(USP), Programa Redução de Danos, Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF)
e Saúde Bucal.
As Unidas Básicas de Saúde, que desempenham papel na garantia de
acesso a atenção a saúde à população, constitui-se a principal porta de entrada
junto ao sistema de saúde, atendendo crianças, adolescentes, jovens, adultos e
idosos. É constituída por políticas de ação integradas, baseadas nos princípios de
universalidade, acessibilidade, vínculo, continuidade do cuidado, integridade da
atenção e humanização nos cuidados (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE
SANTA CRUZ DO SUL, 2018, p. 74).
A rede de atenção básica à população, através da Estratégia Saúde da
FamílIa (ESFs), de 60%, com o objetivo de aumentar sua cobertura para 82%
populacional, “os Agentes Comunitários de Saúde estão sempre atentos as
necessidades da comunidade em suas visitas domiciliares e aproximam os usuários
com serviços de saúde fornecendo informações e encaminhamentos necessários”.
129

(BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 75). As


ESFs são responsáveis por realizar o atendimento no domicílio, assim como, em
espaços comunitários, como escolas, creches, salões, praças, entre outros. Também
são responsáveis por realizar ações educativas para estimular a autonomia
individual e coletiva, a prevenção e a busca por qualidade de vida. Tanto as ESFs,
quanto as Unidades Básicas de Saúde, são formadas por enfermeiros, médicos,
técnicos de enfermagem, dentistas, agentes comunitários de saúde e auxiliar de
saúde bucal, a quantidade de cada profissional altera conforme a demanda do local
de sua abrangência.

Atualmente temos 23 equipes de ESF, sendo 16 na Zona Urbana (Bairros


Bom Jesus, Cristal Harmonia, Faxinal, Figueira, Gaspar Bartholomay, Gloria
Imigrante, Linha Santa Cruz, Margarida Aurora, Menino Deus, Pedreira,
Progresso, Esmeralda, Arroio Grande, Rauber, Senai, Cohab Renascença e
Viver Bem) e 05 na Zona Rural (Alto Paredão, Boa Vista, Monte Alverne,
Rio Pardinho e Pinheiral. Destas, 11 unidades possuem Equipe de Saúde
Bucal (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL,
2018 p. 76).

O município conta com 9 unidades básicas de saúde, que se encontram nos


bairros: Arroio Grande, Belvedere, Jacob, Avenida, Schultz, Aliança, Esmeralda,
Verena e Centro. Cada área é responsável por atender até 12 mil pessoas
aproximadamente. Estes atendimentos ocorrem de forma descentralizada, com
sistema de atendimento por demanda espontânea, agendamento de consultas
programadas, as Unidades Básicas de Saúdes realizam também consultas
ginecológicas, pediátricas, odontológicas e de enfermagem, fazem
encaminhamentos para exames, e aqueles de maior complexidade são agendados
com especialistas de acordo com a região de cobertura (BRASIL, PLANO
MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 76).
O plano de saúde tem como metas, quanto aos recursos humanos, melhorar
a qualificação da rede de profissionais da atenção básica em todos os níveis de
atenção, promover a prevenção de agravos, qualificar os atendimentos prestados
através da educação e capacitação permanente, com foco na capacitação sobre
Políticas de Saúde da População Negra e Políticas da População de Lésbicas,
Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais ou Transgêneros (LGBT), possui como
meta também e ações de planejamento familiar, de uso racional de medicamentos,
130

de combate ao mosquito Aedes, implementação de ação de saúde mental,


melhorando a qualidade de atendimentos prestado pela CAPS (BRASIL, PLANO
MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 80-1).
Quanto a estrutura e gestão, tem como principais metas promover a
construção de mais Unidades Básicas de Saúde, implementar fluxos de toda rede de
atendimento para melhorar e qualificar o funcionamento, implementar normas e
rotinas técnicas, adquirir veículos para visitas domiciliares, melhorando a cobertura
territorial, promoção de recursos para financiamento e auxilia das metas propostas
pelo plano (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018
p. 81-82).
O município oferece o Programa de Saúde da Família (PSF), que compõem o
Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), assim, o acolhimento do usuário do
Sistema Único de Saúde é responsabilidade compartilhada entre as equipes de
saúde da família e a equipe do NASF. Sua formação se dá com fonoaudiólogos,
nutricionistas, educados físico, psicólogo, farmacêutico, fisioterapeuta e assistente
social (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p.
90-95).
No que tange a serviços especializados, o município oferece serviços como o
Centro Municipal de Atendimento à Sorologia (CEMAS), Referência para Cirurgia
Bucomaxilofacial, Serviço de Nutrição, Assistência Farmacêutica, Programa
Municipal de Tuberculose e Hanseníase, Controle de Infecção nos Serviços de
Saúde da Secretaria, Programa Melhor em Casa, Centro Regional de Referência em
Saúde do Trabalhador da Região dos Vales (CEREST/Vales), Centro Materno
Infantil (CEMAI), Programa Bem-me-quer, Planejamento Familiar, Programa
Primeira Infância (PIM), Ambulatório do Idoso, Diabético e Hipertenso, Programa de
Saúde na Escola (PSE), Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS II), Centro de
Atendimento Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS AD III), Centro de
Atendimento Psicossocial à Infância e Adolescência (CAPSIA), Unidade de
Acolhimento Infanto Juvenil (UAI) e Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
(SAMU).
Entre os serviços que possuem relação ao atendimento de crianças e
adolescentes vítimas de violência sexual, o Centro Municipal de Atendimento à
131

Sorologia (CEMAS), instituído com o objetivo de atender a população que possuem


infecções sexualmente transmissíveis e HIV/AIDS, é referência em nove municípios,
pelo seu trabalho de acompanhamento dos pacientes, o serviço, localizado de forma
central, está estruturado com dois setores: Serviço de Atenção Especializada (SAE)
e o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA). O SAE é composto por uma
equipe multidisciplinar, contando com uma infectologista, um médico especialista em
infecções sexualmente transmissíveis, um ginecologista, um enfermeiro assistencial,
duas auxiliares de enfermagem, uma técnica em enfermagem, uma psicóloga, dois
dentistas, uma auxiliar de saúde bucal, uma nutricionista, uma farmacêutica, uma
assistente social, uma enfermeira coordenadora, estagiários dos cursos de serviço
social e psicologia, um motorista e duas auxiliares de limpeza (BRASIL, PLANO
MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 133-135).
No ano de 2018, o SAE conta com 1099 pacientes adultos, 37 crianças
expostas ao vírus HIV, destes, 16 crianças já estão fazendo uso de antirretrovirais.
São realizados em torno de 5.000 atendimentos mensais e 900 pacientes retiram
antirretrovirais, que são fornecidos pelo Ministério da Saúde, mensalmente na
farmácia do CEMAS. Dentre as metas de melhoramento do serviço, está a de
realizar ações educativas tanto para profissionais, quanto para a sociedade civil e
melhorar a notificação dos casos de violência sexual (BRASIL, PLANO MUNICIPAL
DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 135).
O CEMAI, é a unidade de pronto atendimento municipal que presta cuidados
integrais e multiprofissional à criança e a mulher. Localiza-se no Centro do
município, possuí atendimento 24horas e tem atendido cerca de 200 atendimentos
diários, distribuídos em urgência e emergência pediátrica, agendamentos de
consultas de puericultura e ambulatório de risco. É composto por 6 enfermeiros, 20
técnicos de enfermagem, 44 médicos, 5 auxiliares administrativos, 4 vigilantes e 5
higienizadoras. (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL,
2018 p. 148)
O Programa Bem-me-quer, atende gestantes, puérperas e crianças até um
ano de vida, com alto risco clínico ou social. Tem como objetivo promover a
qualidade de vida da população, visando a redução da mortalidade infantil e fetal.
Sua demanda é de acompanhamento de gestantes e crianças em situação de risco
132

encaminhadas pela rede básica, especializada, Juizado da Infância e Juventude,


Conselhos Municipais. Serviço em parceria com o Programa Primeira Infância
Melhor (PIM) (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL,
2018 p. 155).
O PIM é responsável por fazer acompanhamento da primeira infância desde a
gestação até seis anos de idade, fortalecendo a família e orientando-os sobre o
desenvolvimento infantil. O grupo é responsável pelo mapeamento das famílias
beneficiadas, fazer a interlocução entre os setores, visando o tratamento completo
de problemas sociais, não só da saúde. O programa possuí 10 visitadoras e
atendem 4 bairros do município, Bom Jesus, Beckenkamp, Santa Vitória e Menino
Deus, com um média de 120 famílias em atendimento por mês (BRASIL, PLANO
MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 162).
O Centro de Atendimento Psicossocial à Infância e Adolescência (CAPSIA),
possui atividade desenvolvidas como o atendimento individuais (psiquiátrico, clínico,
psicoterapêuticos, fonoaudiólogos e terapêuticos ocupacionais), avaliação social,
atendimentos em grupo, com oficinas terapêuticas, atendimento familiar, visitas
domiciliares, atividades de inserção social, atividades externas, atividades de
matriciamento a atenção básica, escolas e instituições. O serviço conta com equipe
técnica multiprofissional, contando com enfermeiro, psicólogo, fonoaudiólogo,
psiquiatra, terapeuta ocupacional, assistente social, técnico de enfermagem,
nutricionista, educador físico, com equipe de apoio comporta por estagiários,
servente, vigilante e motorista. Atende em torno de 500 pacientes, gerando uma
média de 900 atendimento mensais (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE
SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 212-215).
Tem como metas, a capacitação dos profissionais em temáticas específicas
da área de criança e adolescente, como desenvolvimento infantil, substâncias
psicoativas, redução de danos, práticas de acompanhamento no território, atenção à
crise, prevenção, suicídio, além de cursos que promovam a qualificação do
atendimento da equipe. Em metas também está a mudança para uma sede com
condições estruturais adequadas, a aquisição de vídeo-games, jogos, brinquedos,
TC 42 polegadas, ampliação de recursos humanos, como, por exemplo, de
oficineiros e técnicos de enfermagem
133

A Unidade de Acolhimento Infanto Juvenil (UAI), oferece cuidados de saúde,


com atendimento 24 horas e em ambiente residencial. Trata-se de um serviço da
Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que oferece acolhimento transitório às
crianças e adolescentes de 10 até 18 anos de idade incompletos que fazem uso
recorrente de crack, álcool e outras drogas. O UAI acolhe e oferece cuidados
contínuos e protetivos, com capacidade de atender até 10 crianças e adolescentes,
sendo que a permanência no serviço é de caráter voluntário. Os paciente são
encaminhados pelo CAPSIA. (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA
CRUZ DO SUL, 2018 p. 217-218).

A UAI deve garantir os direitos de moradia, educação, convivência familiar e


social aos usuários por até 6 meses, oferecendo a este público e familiares
tempo e oportunidade para construir novos projetos de vida, sedo que o
ingresso, permanência e avaliação de alta, dar-se-á, de acordo com o
Projeto Terapêutico Singular que deve ser desenvolvido e discutido com o
CAPS de referência (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA
CRUZ DO SUL, 2018 p. 218).

O Plano Terapêutico Singular visa a reinserção familiar, social e laboral, o


autocuidado, autoconhecimento, entendimento sobre o seu processo de
adoecimento no contexto que está inserido, busca o desenvolvimento de habilidades
cognitivas e possibilidade de retorno à escola ou outras atividades de interesse da
criança ou adolescente. O serviço conta um enfermeiro, um assistente social, dois
professores, um terapeuta ocupacional, três monitores sociais, dois técnicos em
enfermagem, um servente e quatro vigilantes (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE
SAÚDE SANTA CRUZ DO SUL, 2018 p. 219-220).
As metas do UAI são de capacitar seus profissionais, adquirir mais jogos,
brinquedos, mesa de pebolim, bolas, tabela de basquete, de realizar atividade de
integração com as crianças e adolescentes em pontos turísticos e de lazer no
município de Santa Cruz do Sul, conhecer outra Unidade de Acolhimento Infanto-
Juvenil que esteja em funcionamento e seja referência nesta área, entre outras
metas administrativas (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA CRUZ DO
SUL, 2018 p. 221).
Rede hospitalar o município oferece atendimento no Hospital Beneficente
Monte Alverne, Hospital Ana Nery, Hospital Santa Cruz, Casa de Saúde Ignez Irene
Moraes (conhecido como Hospitalzinho), Unidade de Pronto Atendimento (UPA). E a
134

rede serviços contratados, como Consórcio Intermunicipal de Serviços do Vale do


Rio Pardo (CISVALE), trata-se de uma associação pública que conta com uma rede
de prestadores de serviço em diversas especialidades na área da saúde, tanto de
diagnóstico, quanto terapêutico (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE SANTA
CRUZ DO SUL, 2018).
Plano Municipal da Educação, estabelecendo diretrizes das políticas
educacionais para os próximos dez anos, entre 2015 até 2025, foi formulados com a
participação de diferentes seguimentos governamentais e não-governamentais,
trazendo em seu texto metas e estratégias para universalizar a educação infantil na
pré-escola, ensino fundamental, ensino médio, a universalização para crianças e
adolescentes com deficiência, para que tenham acesso à educação básica e ao
atendimento educacional especializado, preferencialmente, na rede regular de
ensino, meta de alfabetização de crianças até o terceiro ano do ensino fundamental,
oferecimento de educação em tempo integral em no mínimo 50% das escolas
públicas (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, 2018, p. 02-07)..
Na meta de número 07, visa fomentar a qualidade da educação básica, com
melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem afim de atingir até 2021 as médias
para IDEB de 6,3 nos anos iniciais do ensino fundamental, 5,6 nos anos finais do
ensino fundamental e 5,5 no ensino médio (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO, 2018, p. 08).
Em suas metas número 08 e 09, busca elevar a escolaridade média da
população, afim de universalizar a alfabetização e reduzir em 55% a taxa de
analfabetismo funcional. Assim como, contribuir para o aumento de matrícula na
educação superior, de acordo com a meta 12 (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO, 2018, p. 11-16).
Garantir a formação dos profissionais da educação, fomentando em 50% o
nível de pós-graduação de seus professores da educação básica, valorizar os
profissionais da rede pública, assegurar a existência de planos de carreira e
contribuir para o investimento público em educação pública também estão entre
suas metas (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO, 2018, p. 19-22).
No que tange a violência, o Plano Municipal de Educação refere-se na
estratégia 2.3, da meta 02, que busca universalizar o ensino fundamental, de
135

fortalecer o planejamento das mantenedoras e fiscalizar situações de discriminação,


preconceitos e violência na escola, visando condições adequadas para o sucesso
escolar. Na meta número 4, que visa a universalização escolar para pessoas com
deficiência, refere-se na estratégia número 4.9 a necessidade de fortalecer o
combate de situações de discriminação, preconceito e violência. Na meta número 7,
que visa aumentar o IDEB municipal, na estratégia 7.19, está a implementação de
ações de combate a violência na escola, em todas suas dimensões, afim de
fortalecer a proteção à criança e o adolescente, articuladas com a rede de saúde,
assistência social, segurança e Ministério Público (BRASIL, PLANO MUNICIPAL DE
EDUCAÇÃO, 2018).
O município de Santa Cruz do Sul não possui plano municipal de erradicação
à violência contra criança e adolescente, plano municipal de direitos humanos das
crianças e adolescentes e o plano municipal de direitos da criança e do adolescente
terá sua discussão iniciada na Conferência Municipal de Direitos da Criança e do
Adolescente, prevista para novembro de 2018.
O Plano Municipal de Educação não traz nenhuma meta, estratégia ou ação
específica para os casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. Refere-
se apenas ao combate da violência na escola. O Plano Municipal da Saúde traz
apenas como meta o melhoramento das notificações de casos de violência sexual,
mas sem nenhum serviço, meta, programa ou ação específica aos casos de
violência sexual contra crianças e adolescentes.
Cabe ao Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente articular com as
demais políticas públicas de saúde, educação, assistência social, cultura, lazer,
esporte, aprovar e deliberar nas Conferências, junto com a comunidade, famílias,
crianças e adolescentes, discutindo estratégias e metas. As atribuições do Conselho
Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente estão descritas nas Leis
Municipais, mas através da busca, contatos realizados com o Conselho e Secretaria
de Políticas Públicas, pode-se constatar que essas atribuições não estão sendo
incorporadas nas tarefas realizadas pelos conselheiros do município.
Por si só este fator evidência que não monitoramento e avaliação de políticas
públicas de atendimento as crianças e adolescentes no município, pois se não há
planos direcionados aos serviços de proteção às crianças e adolescentes no
136

município de Santa Cruz do Sul, logo, haverão desafios e obstáculos a serem


enfrentados que não possuem plano de ação, estratégias para melhoramentos dos
serviços ou metas a serem alcançadas, prejudicando o enfrentamento à violência
sexual.

4.3 A atuação das equipes técnicas no atendimento à crianças e adolescentes


vítimas de abuso sexual intrafamiliar.

Para verificar como se dá a atuação da equipe técnica no Centro de


Referência Especializado de Assistência Social, do município de Santa Cruz do Sul,
denominado como CREAS Acolher, foi realizada pesquisa de campo, através da
entrevista. Para a realização da entrevista, utilizou-se a técnica da entrevista em
profundidade, nela o pesquisador necessita ter grande conhecimento sobre o tema,
para compreender e explorar outras categorias de análise que sejam relevantes e
surjam durante a entrevista.
A entrevista em profundidade traz vantagens na medida em que permite ao
pesquisador avançar no objeto investigado, sem seguir o padrão determinado, esta
compreensão aprofundada permite que a entrevista se torne um diálogo e, assim, o
pesquisador possa obter respostas mais detalhadas, seguras e honestas (DUARTE,
2005). Segundo, Vasconcelos (2012), na pesquisa qualitativa, a técnica da
entrevista em profundidade “deve ser apreciada e valorizada, considerando a
riqueza de informações que podem ser obtidas e a possibilidade de ampliar o
entendimento dos objetos investigados através da interação entre entrevistado e
entrevistador”.
No município de Santa Cruz do Sul, a entrevista em profundidade aconteceu,
numa primeira etapa, no dia 08 de novembro de 2018, na segunda etapa, no dia 12
de novembro de 2018, na sede do Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS), as entrevistas foram realizadas com o coordenador do
CREAS, que também ocupa a função de advogado, com duas psicólogas, uma
assistente social e uma agente administrativa. Neste sentido, participaram das
entrevistas cinco membros da rede de atendimento. Cada entrevista durou em torno
de quarenta minutos e as discussões permeavam em relação ao trabalho
137

desenvolvido pelo CREAS e a atuação específica de cada um dos profissionais


entrevistados.
Interessante destacar que antes das entrevistas com os técnicos, o projeto foi
submetido para análise do Comitê de Ética da Universidade de Santa Cruz do Sul –
UNISC e aprovado para realização da pesquisa de campo. A aprovação se deu no
dia 02 de novembro de 2018, e as entrevistas foram iniciadas na semana
subsequente à aprovação. O contato com a coordenação do Centro de Referência
Especializado de Assistência Social se deu desde o dia 26 de setembro de 2018 e a
receptividade foi muito grande desde o início do contato com a equipe que seria
entrevistada.
Na sequência, analisa-se o perfil dos entrevistados no Centro de Referência
Especializado de Assistência Social:

Tabela 13 – Perfil dos entrevistados:


Feminino 4
Sexo
Masculino 1
Advogado 1

Profissão Psicóloga 2
Assistente Social 1
Agente Administrativo 1
Graduação 2
Formação Especialização 2
Mestrado 1
Direito 1
Psicologia 2
Área de formação
Serviço Social 1
Gestão Pública 1
Forma de ingresso no
Concurso Público 5
CREAS
Fonte: Tabela organizada pela autora a partir das respostas constantes no questionário
semiestruturado (Anexo I).

Analisando os dados constantes na tabela de número 13, é possível perceber


que o maior número de entrevistados é do sexo feminino. No que tange a formação,
todos possuem titulação mínima de graduação concluída, sendo que dois
entrevistados possuem ainda especialização e um entrevistado possuí mestrado na
sua área de atuação. As áreas de formação correspondem ao curso de direito,
138

psicologia, serviço social e gestão pública. Todos entrevistados atuam, dentro de


suas respectivas profissões, no CREAS, sendo que a forma de ingresso foi através
de concurso público.
As atuações de trabalho de cada entrevistado estão bem definidas dentro do
setor, não foi identificado nos técnicos a divergência ou dúvida em relação ao seu
papel e atuação dentro do local de seu trabalho. Contudo, quando questionados
sobre a quantidade de pessoas que exercem a mesma função que o entrevistado e
se haviam dificuldades encontradas para a execução do mesmo, todos entrevistados
levantaram pontos que deveriam ser melhorados para que o CREAS possa oferecer
com qualidade todos os serviços que lhe é competente.

Tabela 14 – Levantamento de obstáculos para execução do trabalho


diagnosticados através da entrevista:
Dificuldades/necessidades para a Entrevistados que levantaram o
execução do seu trabalho: problema durante a entrevista:
Recursos Humanos 1,4 e 5
Recursos Financeiros 4
Excesso de vinculação dos recursos
1
financeiros
Aumento no número de CREAS 1,2,3,4 e 5
Aumento no número de CRAS 1,2,3,4 e 5
Aumento na área de abrangência de
3e5
CRAS
Quantidade de famílias atendidas
2,3 e 4
superiores às recomendações
Espaço físico inapropriado 2e4
Ausência de vedação acústicas nas
2,4 e 5
salas de atendimento
Localização inapropriada 2,3,4 e 5
Requisições da Política de Justiça que
2,3 e 5
não são de competência do CREAS
Fluxo de encaminhamento não
2e3
observado
Espaço físico compartilhado com setores
2,3 e 5
da Segurança Pública
Demora na ação do Conselho Tutelar 5
Ausência de sala de reuniões 5
Necessidade de uma telefonista 5
Ausência de capacitação para falar
sobre abuso sexual com crianças e 3
adolescentes
139

Melhoramento na comunicação entre


3
Poder Judiciário e CREAS
Necessidade de mais ações de
3
prevenção
Não há um serviço que faça psicoterapia
4
com a vítima de violência sexual
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir das respostas constantes em entrevista semiestruturada
(ANEXO IV).

Ausência de recursos humanos suficientes para a demanda atendida é um


dos pontos destacados pelos entrevistados, a quantidade de pessoas atendidas pelo
CREAS hoje é de 295, segundo o coordenador (ENTREVISTA 01), sendo que, de
acordo com o recomendado pelo Ministério de Desenvolvimento Social, a
capacidade de atendimento do PAEFI seria de 80 pessoas (BRASIL, MDS, 2018).
Significa que o serviço atende no mínimo três vezes mais do que o indicado como
ideal pelo MDS. Ao que tange recursos humanos, a solicitação específica é de um
número maior de assistentes sociais, de psicólogos e uma telefonista, pois
atualmente a pessoa que cuida da recepção dos usuários, abertura e arquivamento
de prontuários, e-mails, levantamento e lançamento de dados no MDS, relatório de
atividades, controle de material, financeiro e telefone, é a mesma pessoa.
Em razão da ausência de recursos humanos suficientes para o atendimento
de toda demanda de trabalho que chega ao CREAS, a entrevistada de número 4
mencionou que outros serviços de responsabilidade do CREAS não estão sendo
oferecidos de forma plena, como o Serviço de Proteção Social Especial para Pessoa
Deficiente, Idosa e suas Famílias, principalmente no que tange a oficinas, assim
como, o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua também está
prejudicado.
Alguns entrevistados apresentaram a necessidade de mais recursos
financeiros para ampliação do CREAS e maior flexibilização na utilização dos
recursos atuais, foi referido pelos técnicos que a determinação de valores para a
compra de cada material nem sempre atende a demanda real, pois muitas vezes
aconteceu dos valores que vinham pré-determinados para a compra de um material
específico não serem utilizados por completo e para adquirir outro material faltava
recursos, em razão da vinculação não é possível utilizar o superávit de um dos
recursos. Nestes casos, mesmo havendo dinheiro em caixa, em razão da
140

vinculação, que não permite seu uso para outras finalidades senão aqueles
predestinadas, o órgão público fica obrigado a solicitar a complementação do valor
faltante ao orçamento livre do município (ENTREVISTA 1).
Quando questionado sobre os problemas a serem enfrentados, se haviam
dificuldades para a execução do seu trabalho ou o que poderia tornar o serviço mais
eficiente, todos entrevistados levantaram dois pontos em comum: a necessidade de
aumento do número de CREAS e, principalmente, aumento do número de CRAS. Os
entrevistados relataram que há demandas que chegam ao CREAS em razão da falta
de cobertura de CRAS em alguns bairros, isto resulta na procura espontânea das
famílias pelo atendimento do CREAS, ou essas famílias são indevidamente
encaminhadas para o CREAS por outros setores da rede, quando não há CRAS na
região de onde vem aquele que necessita de atendimento.
Há dois CRAS no município de Santa Cruz do Sul, os dois são localizados na
zona Sul da cidade, logo, grande parte do município não é atendida pelo serviço de
proteção social básica (ENTREVISTA 2). Os encaminhamentos indevidos aos
CREAS estão sendo repassados para a Secretaria de Políticas Públicas, pois a
demanda do CREAS já é muito grande para que faça atendimento de competência
do CRAS (ENTREVISTA 5). Todos entrevistados manifestaram a necessidade
ampliação dos CRAS, na instalação de no mínimo mais dois CRAS no município.
Além disso, para que a demanda de crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual e as demais famílias atendidas pelo serviço, possam receber um
acompanhamento adequado, seria necessário aumentar o número de técnicos e o
espaço físico do atual e único CREAS de Santa Cruz do Sul ou, então, ter dois no
município (ENTREVISTA 4).
Além desses problemas diagnosticados, de recursos humanos e financeiros,
foram abordados também que o espaço físico é apertado, não há sala de reuniões e
nem vedação acústica eficiente nas salas de atendimento, o que dificulta o
atendimento das crianças e adolescentes e suas famílias, pois não garante a
privacidade. Há relatos que é possível escutar não somente o que ocorre dentro do
CREAS, mas também das salas ao lado, onde está instalado o Conselho Tutelar. Há
uma grande preocupação no sigilo dos casos que são atendidos e da exposição das
famílias e das crianças e adolescentes em razão disto.
141

Quase por unanimidade foram as manifestações de que o local onde está


instalado o CREAS é inadequado por diversas razões, a primeira apontada é da
localização, o CREAS está afastado do centro do município, logo o acesso ao
serviço se torna difícil para famílias de bairros afastados, que necessitam pegar até
dois ônibus para poder chegar ao local. Observado pelos entrevistados que no
prédio onde está instalado há diversos outros serviços, como o Conselho Tutelar,
Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho Municipal da
Assistência Social, além, da Delegacia de Polícia da Criança e do Adolescente,
Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher, o que gera constrangimento nos
usuários do serviço, assim como, desconforto e dificuldade na criação e manutenção
de vínculo dos técnicos com as famílias e as crianças e adolescentes (ENTREVISTA
3), os quais já relataram constrangimento de ter que entrar “num prédio de polícia”
(ENTREVISTA 05).
Sobre as requisições vindas das Políticas de Justiça, especificadamente do
Poder Judiciário e Ministério Público, os técnicos entrevistados referiram que é
considerável o número de requisições que chegam para estudos sociais de famílias
ou criança e adolescente, que não é competência dos profissionais do CREAS,
principalmente a Promotoria de Justiça, tem enviado ofícios com prazo para
resposta solicitando acompanhamento, determinando visita domiciliar em casos de
violência, e apesar de já ter sido esclarecido que não se trata de competência das
assistentes sociais ou psicólogas do CREAS realizarem estudos sociais ou visitas e
acompanhamentos para fins de investigação, as requisições continuam sendo
solicitadas e o procedimento adotado pelos entrevistados é de somente encaminhar
um relatório com as informações contidas nos prontuários de atendimento.
Além disso, foi manifestado a necessidade de melhoramento na comunicação
entre Judiciário e CREAS, pois há casos que chegam ao Juizado da Infância e
Juventude que não são repassados ao serviço de atendimento, os técnicos do
CREAS descobrem e entram em contato com o Poder Judiciário, solicitando
informações sobre o processo para então poder verificar se a família necessita de
um atendimento especializado ou de um encaminhamento (ENTREVISTA 3).
Os entrevistados consideram importante a realização de capacitação para
atender os casos de violência sexual em razão da complexidade do tema,
142

necessitando de uma capacitação específica para compreender a forma e


procedimento correto de ouvir, falar e acompanhar a criança ou adolescente, afim de
não revitimizar a vítima, a preocupação surge em razão da possibilidade de estar em
uma visita domiciliar e surgir a suspeita de violência sexual e o atendimento
acontecer no local, a entrevistada não se sente plenamente preparada para ouvir a
criança ou adolescente nesta situação (ENTREVISTA 3).
Ao que se refere ao fluxo de trabalho, foi identificado pela fala dos
entrevistados que apesar de haver intersetorialidade no serviço prestado, de haver
comunicação permanente com outros setores da rede, como educação, saúde,
serviço de proteção social básica, projetos governamentais e não-governamentais,
contato permanente com o Conselho de Direitos, Conselho Tutelar, com a Delegacia
de Polícia da Criança e do Adolescente, todavia não há uma fluxo de notificação e
encaminhamento claro. Na entrevista 3, até foi mencionado há existência de um
fluxo estabelecido por volta do ano de 2013, todavia na confecção deste fluxo o
Conselho Tutelar não havia participado e ele nem está sendo utilizado. Na entrevista
de número 2 também foi referido que o fluxo não acontece como deveria ser.
Percebe na fala de todos os entrevistados que não há um entendimento comum
entre notificação e encaminhamento.
A diferença entre as duas entrevistas que abordaram a existência de um fluxo
pré-definido, porém não utilizado, estão que na entrevista 2 a entrevistada entende
que o Conselho Tutelar deveria servir de “filtro” e os atendimentos não deveriam vir
diretamente para o CREAS, nas palavras da entrevistada, assim a criança ou
adolescente “fica pipocando”, já na entrevista 3, a manifestação da entrevistada foi
de que o Conselho Tutelar não dá conta da demanda existente, logo, o fluxo deveria
ser de uma forma mais equilibrada entre a rede. Na entrevista 5, a entrevistada
relatou que a demora de retorno do Conselho Tutelar é muito grande e isso provoca
dificuldades principalmente pela rede de atendimento a saúde e à própria
comunidade, que quando notifica o Conselho Tutelar demora para ter retorno pelos
Conselheiros. A entrevistada 5 acredita que o problema surge em razão de falta de
capacitação e a quantidade de demanda do Conselho Tutelar.
Outra questão levantada nas entrevistas, foi a necessidade de mais ações de
prevenção (ENTREVISTA 3). Todos entrevistados responderam que há ações de
143

prevenção sendo realizadas, são anualmente 4 campanhas organizadas pelo


CREAS, uma delas se refere à violência contra criança e adolescente, nela é
envolvida a sociedade civil e outros órgãos da rede de atendimento, a campanha
envolve os meios de comunicação, em cada ano é realizado um tipo de atividade,
panfletagem, atividades lúdicas na escola, mas que a maior parte de campanhas
preventivas são realizadas pelos CRAS, entendendo ser tarefa do mesmo e não do
CREAS, as atividades preventivas (ENTREVISTA 2).
Na entrevista 4, quando questionado como a entrevistada avalia o
atendimento das crianças e adolescente vítimas de violência sexual, referiu que o
trabalho das psicólogas do PAEFI é de acompanhamento psicossocial, isto é, para
trabalhar aspectos sociais, não trabalha questões psíquicas da criança, adolescente
ou família, pois isso é de competência da rede de saúde, todavia, o CREAS
encaminha para o serviço de psicoterapia realizado pelo Serviço Integrado de Saúde
(SIS), o qual não consegue atender todos encaminhamentos do CREAS, assim, a
entrevistada demonstra preocupação pois, apesar de crianças e adolescente serem
acompanhados pelo CREAS até que o sintomas sociais sejam superados ou
diminuídos, os danos psíquicos não estão sendo tratados em alguns casos
(ENTREVISTA 4).
Outros pontos identificados durante as entrevistas é que via de regra não se
atende o agressor ou o suspeito da violência sexual, mas somente a criança ou o
adolescente e sua família, salvo se por alguma razão o agressor continuar no núcleo
familiar, neste caso o atendimento e acompanhamento é realizado com toda a
família, inclusive com o agressor ou suspeito da violação de direitos da criança ou
adolescente.
Durante as entrevistas, foi identificado a ausência de consenso e clareza
sobre a notificação dos casos em algum sistema de dados oficial. Questionado aos
entrevistados se são realizados registros dos atendimentos de violência sexual
contra criança e adolescente, houve indicações de que a tarefa pertence à
Secretaria de Políticas Públicas do município, devendo o CREAS enviar um relatório
mensal para a secretaria, em outras respostas foi indicada a responsável pelo
lançamento de dado e que estes dados seriam lançados no “SAA” do MDS, que
posteriormente foi identificado pela pesquisadora que se trata do Sistema de
144

Autenticação e Autorização, que é na verdade um instrumento de gestão que


organiza a produção, o armazenamento, processamento e disseminação dos dados,
dando suporte a operação, financiamento e controle social do Sistema Único de
Assistência Social (BRASIL, 2010).
Por fim, questionado se há o preenchimento da Ficha Individual de
Notificação (FIN), os entrevistados responderam que não ou “ainda não”, aqueles
que responderam que ainda não há o preenchimento da ficha, referiram que está em
discussão na rede de atendimento a viabilidade dos profissionais da rede de
assistência social também preencherem, pois hoje somente os profissionais da rede
de saúde estariam incumbidos de preencher. Também foi levantado o receio no
preenchimento da ficha, referindo que os profissionais não possuem clareza sobre a
o anonimato no preenchimento, uma vez que possuem medo de perder o vínculo
com a família que está sendo atendida e a mesma não recepcionar mais os técnicos
do CREAS ou, então, para de frequentar os serviços, além do receio de exposição
do profissional (ENTREVISTA 1 e 3).
A partir das entrevistas foi possível identificar algumas dificuldades no
atendimento das normativas básicas e diretrizes nacionais para às políticas públicas
de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual intrafamiliar,
uma vez que o serviço de Proteção Social Especial possuí obstáculos que
necessitam de aperfeiçoamento para garantir proteção integram de crianças e
adolescentes em situação de violação de direitos.
Nas entrevistas também foi possível observar pontos positivos, a equipe do
CREAS do município é bastante preocupada em relação aos atendimentos,
demonstrando bastante interesse em auxiliar as vítimas e as famílias na superação
de direitos violados. A integração em equipe também chamou a atenção da
pesquisadora, todos parecem gostar do seu trabalho e estarem feliz com o trabalho
em equipe.
Em todas entrevistas os entrevistados se mostraram engajados, receptivos,
comentaram sobre outras pesquisas acadêmicas que foram realizadas durante o
ano no CREAS, o demonstra a participação do serviço com a sociedade e vice-
versa, o que é muito importante para o avanço da realização do serviço. Isso fica
visível também na receptividade de cada entrevistado, que receberam a
145

pesquisadora com muita atenção e muita paciência para responder e explicar todos
os pontos em que a pesquisadora ficava em dúvida.
Outro fator que chama a atenção é o fato de que a maior parte dos
entrevistados, além de possuir graduação em ensino superior, também possuí pós-
graduação, ou especialização ou mestrado, o que é muito positivo, pois qualifica
ainda mais o trabalho realizado pela equipe de atendimento.

4.4 A avaliação da política municipal de atendimento à crianças e adolescentes


vítimas de abuso sexual intrafamiliar de acordo com as diretrizes nacionais.

A partir do levantamento de planos municipais, do estudo da legislação local e


a entrevista de campo, através da entrevista em profundidade realizada com
membros da equipe de atendimento do CREAS, foi possível identificar alguns
obstáculos para o aperfeiçoamento das políticas de atendimento e o enfrentamento
à violência sexual contra criança e adolescente. Diferentes fatores estão
relacionados a esses obstáculos, mas principalmente, a ausência de um espaço
adequado para a realização dos serviços oferecidos pelo CREAS, a ausência de
recursos humanos para a quantidade famílias usuárias do serviço, requisições e
encaminhamentos inadequados de atendimento, ausência de uma quantidade
suficiente de CRAS no município, ausência de fluxo de notificação e
encaminhamento claro entre a rede, a subnotificação e a falta de importantes planos
municipais, como o de direitos da criança e do adolescente, erradicação da violência
sexual contra crianças e adolescentes e da assistência social.
A Convenção sobre os Direitos da Criança já havia estabelecido a
responsabilidade do Estado de elaborar políticas públicas sociais apropriadas para
proteger crianças e adolescentes de todas as formas de violência, essas medidas
incluem procedimentos apropriados e eficazes para identificação, notificação,
encaminhamento, atendimento, tratamento e acompanhamento posterior à violência
às crianças e aos responsáveis, ou seja, à família.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, princípios
estabelecidos pela Convenção foram incorporados no texto da Constituição Federal,
trazendo à tona a garantia da proteção integral. No momento em que as políticas
146

municipais não conseguem ou possuem dificuldades de garantir a proteção integral


da criança e adolescente que tiverem seus direitos violados, infringe preceitos
constitucionais, principalmente quanto ao dever do Estado de tomar precauções e
ações com a finalidade de proteger à criança e o adolescente.
O Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente precisa estar
articulado em rede de forma que o sistema de políticas de atendimento, proteção e
justiça tenha integração operacional. Desta forma, é importante cada ator dentro do
sistema, compreender o seu papel. Ao Conselho de Direitos cabe o planejamento e
a deliberação sobre as políticas públicas de atendimento aos direitos de crianças e
adolescentes, ao Conselho Tutelar incumbe aplicação de medidas de proteção e a
Justiça tem o papel de garantir o cumprimento de direitos assegurados,
responsabilizando aqueles que violarem ou ameaçarem direitos das crianças e
adolescentes.
As políticas de atendimento à criança e adolescente devem estar estruturadas
a partir dos Planos Decenais de Direitos Humanos da Criança e do Adolescente,
pois são os mecanismos de controle, monitoramento e avaliação das políticas
públicas, a partir dos planos é que são apontadas medidas de correção, buscando
maior efetividades e resultado das políticas de atendimento (CUSTÓDIO; MOREIRA,
2015, p. 44).
Para tanto o Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente
precisa estar articulado com todos os setores visando a confecção dos planos
municipais, junto com os demais setores, a sociedade civil e as crianças e
adolescente, para que sejam pensadas e formuladas metas e objetivos, e de forma
estratégica seja alcançada o mais perto do ideal de uma política de atendimento,
proteção e justiça.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 87, traz que são linhas
de ação da política de atendimento os serviços especiais de prevenção e
atendimento médico e psicossocial às vítimas de abuso. Assim, seguindo as
diretrizes constitucionais e infraconstitucionais, inquestionável o dever de
implementação de políticas de atendimento às crianças e adolescentes afim de
garantir a proteção integral. Cabendo aos planos nacionais, estaduais e municipais,
traçar as diretrizes e metas para melhoramento e avanços das políticas públicas.
147

Devendo, cada esfera do Poder Executivo, observar a sua responsabilidade em se


adequar e melhorar a políticas públicas, afim de enfrentar à violência sexual.
Nesta perspectiva, há que se falar da política de assistência social, a qual
vem buscando sua efetivação, considerando a família uma das mediadoras das
relações entre sujeitos e coletividade. A assistência social, como um dos atores
dentro da política de atendimento, executa um papel importantíssimo ao que tange a
violação de direitos sexuais de crianças e adolescentes, principalmente se ele
ocorreu dentro da família.
Na política de atendimento socioassistencial, existe uma série de ações que
são executadas de acordo com o nível de proteção, no caso de violência sexual
intrafamiliar contra crianças e adolescentes, a proteção social especial destina-se a
proteção da família, da pessoa que se encontra em situação de risco pessoal e
social, em decorrência do ato da violência cometida e do agressor, pois possuí
vínculo com criança ou adolescente.
A proteção social especial, oferecida pelos Centros de Referência
Especializados da Assistência Social (CREAS), possuem o Serviço de Proteção e
Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI), responsável por ofertar
apoio, orientação e acompanhamento especializado a família, à criança ou
adolescente vítima de violência sexual intrafamiliar e ao agressor, com o objetivo de
restabelecer os direitos. Nos casos de violência sexual intrafamiliar, geralmente o
atendimento pelo CREAS é em articulação com políticas de assistência social da
proteção social básica, com a política de saúde, educação, habitação e acolhimento
institucional, se for o caso.
Antes de acolher uma criança ou adolescente, sempre é estudada a hipótese
de haver um familiar, da família por extensão, que esteja com condições de acolher
por determinado período a criança ou adolescente, todavia, quando não houver
outra opção e for o caso de acolhimento institucional, no município de Santa Cruz do
Sul a criança será acolhida pela Associação Comunitária Pró Amparo do Menor
(COPAME) ou pelo Centro Social, Cultural e Educacional Gideões e, sendo
adolescentes, pelo Abrigo Municipal Feminino ou Abrigo Municipal Masculino
(ENTREVISTA 3).
148

Importante frisar que nos casos de violência sexual intrafamiliar contra criança
e adolescente, mais importante que responsabilização do agressor, é restituir aquela
criança ou adolescente o seu direito violado e verificar todo seu contexto social, pois
a restauração de direitos não se dá com a responsabilização judicial daquele violou
os direitos de outrem, mas sim, por um atendimento e acompanhamento protetivo
realizado por profissionais que estejam capacitados para auxiliar na superação do
fato ocorrido. Contudo, para que isso possa acontecer é necessário que a política de
atendimento esteja bem estruturada e tenha condições físicas e humanas para
ofertar seu serviço.
Ao que tange a falta de recursos humanos e financeiros para a prestação de
um serviço de qualidade no Centro de Referência Especializado de Assistência
Social no município de Santa Cruz do Sul, apontado pela entrevistas com os
técnicos do local, viola a proteção integral prevista constitucionalmente, e está em
desacordo com os Planos Nacionais relacionados ao tema, que visa justamente a
ampliação de recursos para que sejam ofertados os atendimentos às famílias e
vítimas, para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes.
Vale ressaltar que a falta de profissionais e recursos financeiros para
matérias, melhorias no espaço físico, não é de responsabilidade exclusiva do
município, mas de uma lógica perversa de cofinanciamento que não descentraliza
adequadamente os recursos federais de modo que os próprios município ficam sem
capacidade técnica de ação em razão da falta de repasses do orçamento federal.
Na diretriz número 3, do Plano de Direitos Humanos da Criança e do
Adolescente, que dispõe sobre a proteção especial a criança e adolescente com
seus direitos ameaçados e violados, tem no seu objetivo 3.4: fomentar a criação de
programa educativos de orientação e de atendimento a famílias e demais envolvidos
em casos de violência sexual; em seu objetivo 3.9: ampliar e articular políticas,
programas, ações e serviços para o enfrentamento da violência sexual contra
crianças e adolescente (BRASIL, PLANO DECENAL DOS DIREITOS HUMANOS
DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2010, p. 02).
O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, reforça a garantia de atendimento especializado e em rede, tanto para
crianças e adolescentes quanto para família e para aqueles que cometem a
149

violência, respeitando as diversidades e os direitos humanos de todos (BRASIL,


PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA
CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2013, p. 31).
O Plano Nacional de Enfretamento da Violência Sexual, implica na
obrigatoriedade de articulações intersetoriais com o objetivo de conhecer o
fenômeno da violência sexual, por meio de diagnóstico, levantamento de dados e
pesquisas, a mobilização e articulação para fortalecer a eliminação da violência,
garantia de atendimento especializado, em rede, da criança e adolescentes, família
e do agressor, através de profissionais especializados e capacitados, ações
preventivas, educativas, de sensibilização e autodefesa e a promoção participativa e
ativa de crianças e adolescentes pela defesa de seus direitos (BRASIL, PLANO
NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS
E ADOLESCENTES, 2013, p. 09).
No mesmo sentido o Plano Decenal da Assistência Social, que visa a
ampliação de investimento nos serviços e unidades de Proteção Especial para
garantir a proteção socioassistencial integral às famílias e indivíduos com direitos
violados, visando a ampliação e aprimoramento das estratégias de superação da
situação de violência. (BRASIL, PLANO DECENAL DA ASSISTENCIA SOCIAL,
2016, p. 33). Quanto a manifestação dos entrevistados de que há poucos CRAS no
município, o plano decenal da assistência social, prevê a ampliação das

equipes volantes e de abordagem social, básicas e especializada, nos


territórios com alto índice de violência, pobreza e de desproteção social,
incluindo áreas rurais, regiões metropolitanas, grandes centros, áreas de
fronteiras e territórios de povos e comunidade tradicionais. (BRASIL,
PLANO DECENAL DA ASSISTENCIA SOCIAL, 2016, p. 34).

De acordo com NOB-RH-SUAS, a equipe de referência no município de


Gestão Plena, que é o caso do município de Santa Cruz do Sul, deverá ter em sua
equipe, 1 coordenador, 2 assistentes sociais, 2 psicólogos, 1 advogado, 4
profissionais de nível superior ou médio para abordagem de usuários e 2 auxiliares
administrativos, isso para um CREAS com capacidade de atendimento de 80
pessoas (BRASIL, 2006). O CREAS de Santa Cruz do Sul possuí uma pessoa na
função de coordenador e advogado, ao mesmo tempo, 2 assistentes sociais, 3
150

psicólogas e 1 auxiliar administrativa, todavia, está com 295 prontuários ativos, isto
é, bem longe da capacidade de atendimento prevista pela NOB-RH-SUAS.
Quanto ao espaço físico, prevê a Tipificação Nacional de Serviços
Socioassistenciais, que o espaço destinado ao serviço do PAEFI deveria ter uma
recepção, local para atendimento individualizado com privacidade, local para
atividades coletivas e comunitárias, atividades administrativas e espaço de
convivência e acessibilidade (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENO SOCIAL E
COMBATE À FOME, 2013, p. 30). O local, onde está instalada o CREAS no
município, não possuí isolamento acústico, é possível escutar os atendimentos
realizados nas salas, não há espaço para convivência, nem para atividades coletivas
ou comunitárias, oficinas com idosos e pessoas com necessidades especiais não
são oferecidos em razão da falta de recursos humanos e espaço apropriado.
A NOB-SUAS estabelece, em seu artigo 6º, inciso XIII, que o local da oferta
do serviço de proteção socioassistencial deve ser em condições necessárias para a
oferta do serviço, o local deve ser adequado e acessível aos usuários, “com a
preservação do sigilo sobre as informações prestadas no atendimento
socioassistencial, de forma a assegurar o compromisso ético e profissional”
(BRASIL, 2012). Percebe-se que além do espaço físico violar as normas básicas, a
localização dele torna difícil o acesso aos usuários, pois o prédio está localizado em
bairro afastado do centro da cidade.
Ao que tange o excesso na demora de retorno do Conselho Tutelar quando
notificado (ENTREVISTA 5), a diretriz número 04 do Plano Decenal dos Direitos
Humanos de Crianças e Adolescentes, traz a universalização e fortalecimento dos
Conselhos Tutelares, objetivando a atuação qualificada, estabelecendo como
objetivo a ampliação e aprimoramento do seu funcionamento, assim como, na
diretriz número 10, traz o dever de qualificação permanente dos profissionais para
atuarem na rede (BRASIL, PLANO DECENAL DOS DIREITOS HUMANOS DE
CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2010, p. 03-04). Além disso, está determinado pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente, que cada município deverá ter no mínimo um
Conselho Tutelar, assim, sendo necessário ou de conveniência do município,
poderão haver quantos Conselhos Tutelares forem julgados necessários.
151

O Conselho Tutelar é órgão específico do Sistema de Garantia de Direitos da


Criança e do Adolescente, tem como principal objetivo possibilitar a efetivação de
direitos fundamentais. Trata-se de órgão autônomo, não jurisdicional, não está
hierarquicamente subordinado a nenhum outro órgão, nem a administração pública,
dentro de suas atribuições está a de requisitar serviços públicos nas áreas de saúde,
educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança, expedir notificações.
Seu trabalho é de suma importância para o funcionamento do Sistema de Garantia
de Direitos da Criança e do Adolescente, logo, é preciso que se encontrem
alternativas para este obstáculo, o qual pode ser na falta de clareza ou definição do
fluxo de notificação e encaminhamento.
O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e
Adolescentes, trouxe na sua primeira diretriz a promoção da cultura do respeito e
garantia dos direitos humanos de crianças e adolescentes no âmbito familiar, da
sociedade e do Estado, assim, no objetivo estratégico número 1.4, trouxe que para
isso é necessário a promoção de ações educativas de prevenção de violência nas
famílias e nas instituições de atendimento (BRASIL, PLANO NACIONAL DE
ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES, 2013, p. 14).
De acordo com as entrevistas observou-se que há campanhas realizadas pelo
CREAS, uma por ano é direcionada à violência contra criança e adolescente, foi
referido até que em anos anteriores havia sido realizada uma campanha de
conscientização nas escolas, de forma lúdica havia sido trabalhado o assunto com
as crianças, inclusive que em razão da atividade casos de violência sexual vieram à
tona, mas posteriormente as campanhas se deram com panfletos (ENTREVISTA 2 e
3). Promover ações educativas, eficientes, afim de promover a prevenção de
violência é responsabilidade de todos os integrantes do sistema, segundo o Plano
Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Criança e Adolescente. Desta
forma, é importante refletir se as campanhas feitas uma vez ao ano sobre a violência
contra criança, na forma de planfetagem são eficientes e eficazes.
Quanto a ausência de um fluxo de atendimento bem estabelecido, o plano de
enfrentamento à violência sexual, prioriza a padronização e formalização de
procedimentos para que seja atingida a eficiente, efetividade e eficácia dos fluxos de
152

atendimentos (BRASIL, PLANO NACIONAL DE ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA


SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES, 2013, p. 24). Cada ator dentro
do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente tem suas
atribuições definidas, assim, cabe a quem identificar confirmação ou suspeita de
abuso sexual intrafamiliar deve fazer os encaminhamentos necessários e notificar o
Conselho Tutelar, que poderá aplicar as medidas de proteção necessária para
assegurar os direitos da criança ou do adolescente naquele momento, o Conselho
Tutelar deve encaminhar a Criança ou Adolescente para o CREAS este então
tomará as providencias necessárias se for caso de evasão escolar, de ser
encaminhada para atendimento na saúde, para atividades de contraturno e fazer o
acompanhamento da criança ou adolescente e de sua família até que sejam
superados as violações de direitos.
Sem prejuízos dos encaminhamentos, a unidade de atendimento que verificou
a violência deve informar a delegacia para fazer o boletim de ocorrência. O
Conselho Tutelar fará o encaminhamento somente quando a identificação primária
foi realizada por ele.
Este é o fluxo material, de acordo com as competência e atribuições
estabelecidas em lei, todavia, nada impede de cada município, através da
articulação promovida pelo Conselho de Direitos, estabelecer um fluxo material
diferente, de acordo com os serviços que estão disponíveis no município ou
conforme demanda de cada setor, para torna-lo mais eficiente.
Cabe ao Poder Judiciário, nas suas Varas Especializadas, denominados
Juizados da Infância e da Juventude, estrutura suas equipes interprofissionais, com
assistente social, psicólogos e pedagogos, pois segundo o artigo 150 do Estatuto da
Criança e do Adolescente, o Poder Judiciário tem a responsabilidade de elaborar
proposta orçamentaria e prever recursos para a sua manutenção.
Não sendo tarefa para a política de atendimento desempenhar este papel. E,
muito embora o Estatuto da Criança e do Adolescente tenha incumbido ao Poder
Judiciário de elaborar e estruturar a equipe interprofissional, o Ministério Público, por
sua iniciativa, também deve estruturar a sua própria equipe.
Por fim, quanto as notificações dos casos em sistema de dados oficiais, foi
relatado na entrevista de número 5 que os atendimentos do CREAS são
153

mensalmente registrados no SAA do MDS, todavia esses dados são confidenciais,


somente servidores autorizados, com login e senha possuem, não há dados públicos
atualizados que demonstram o verdadeiro número de casos de violação sexual
intrafamiliar no município.
Estas são algumas dificuldades nas políticas de atendimento, dentro do
Sistema de Direitos de Garantia das Crianças e Adolescentes, obstáculos que
podem ser vencidos, a partir de articulações, planejamento, diagnósticos, recurso,
fluxos estabelecidos, o papel de cada ator bem esclarecido, a colaboração entre a
rede e os níveis de política.
Por fim, enfrentar a violência sexual intrafamiliar contra criança e adolescente
exige esforço de todos, da família, da sociedade e do Estado, só assim será
oportunizado às criança e adolescentes do Brasil o reconhecimento de que são
sujeitos de direito e que merecem o respeito e a liberdade de se desenvolver
fisicamente, mentalmente e psicologicamente sem ser um objetivo, uma
propriedade, sem ter que construir a sua história em cima da dor e do sofrimento.
154

CONCLUSÕES

A construção do Sistema de Garantia de Direitos decorre de uma longa


caminhada, que ainda tenta superar estigmas do passado e passa por continuo
aperfeiçoamento, principalmente no que tange ao aspecto prático, já que normativo
há marcos para a consolidação de direitos e planos norteadores de onde queremos
chegar com as políticas públicas.
O artigo 4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, traz que é dever da
família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar a
efetivação de direitos como à vida, saúde, dignidade, respeito e liberdade, com
absoluta prioridade. A legislação apresenta a garantia de uma rede de atendimento
que atenda a proteção integral à criança e ao adolescente. O atendimento deve ser
interdisciplinar e protetor, para minimizar os traumas vivenciados pela violência
sofrida, os direitos fundamentais da criança e do adolescente já são violados no
momento da violência sexual, os resultados traumáticos da ação podem causar
sequelas a longo prazo e irreparáveis, a função do Estado neste momento é de
respeitar as condições traumáticas da vítima e assegurar que seus direitos violados
sejam restaurados.
É necessário a garantia de atendimento eficaz para aqueles que já estão na
condição de vítima, garantido seus direitos fundamentais, principalmente ao que
tange na sua recuperação física e emocional, para que consiga se reestabelecer de
forma digna.
Diante disso, na pesquisa buscou-se no primeiro capítulo demonstrar que a
Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente promoveram
significativas mudanças na política de atendimento à infância e adolescência, ao
propor um novo sistema articulado e integrado de atenção as necessidades,
garantias e direitos de crianças e adolescentes, com efeito, os direitos fundamentais
são soberanos e não podem ser ameaçados ou violados, para garantir a proteção
integral de crianças e adolescentes. Neste viés, as diretrizes nacionais de
atendimento às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual possuí papel de
fornecer as metas e objetivos estratégicos para o melhoramento da rede de
155

atendimento, buscando sempre a garantia da supremacia do interesse da criança e


do adolescente e a garantiria de manutenção ou superação de direitos violados.
No segundo capítulo da pesquisa, para compreender a importância do tema
estudado e a necessidade de garantia de políticas públicas bem estruturadas,
verificou-se quais são as modalidades de violência sexual contra crianças e
adolescentes, assim como, fora realizado levantamento de dados oficiais afim de
demonstrar que apesar da subnotificação, os dados oficiais já nos mostram a
quantidade expressiva de casos de violência sexual intrafamiliar contra crianças e
adolescentes. Assim, importante o estudo sobre as causas e consequências desse
fenômeno, bem como, de como as equipes de atendimento oferecem seus serviços
para garantia ou restituição de direitos à criança, ao adolescente e, inclusive, à
família, pois todo o contexto necessita de atenção e proteção para que a violência
seja superada.
No terceiro capítulo, verificou-se qual o contexto do município de Santa Cruz
do Sul, cidade escolhida para a pesquisa de campo, descreveu-se o contexto da
cidade, a legislação local referente ao Sistema de Garantia de Direitos da Criança e
do Adolescente, da rede de atendimento e seus serviços oferecidos, cabendo
mencionar que o município possuí a rede de atendimento estruturada, todavia com
alguns obstáculos, que foram apontados pelos técnicos do Centro de Referência
Especializado da Assistência Social, através da pesquisa de campo, realizada
através da entrevista em profundidade.
O caminho percorrido, nesta pesquisa, buscou responder se as políticas
públicas de atendimento de crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual
intrafamiliar no município de Santa Cruz do Sul atendem os requisitos normativos
básicos previstos nas diretrizes nacionais para enfrentamento à violência sexual.
Para responder tal questionamento foi necessário estudar o Sistema de Garantia de
Direitos da Criança e do Adolescente, os Planos Nacionais sobre a temática e para
analisar às políticas públicas, foi escolhido o município de Santa Cruz do Sul, local
moradia da pesquisadora, para realização da pesquisa de campo.
A hipótese era de que apesar do município de Santa Cruz do Sul possuir
políticas de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual
intrafamiliar, de acordo com as diretrizes nacionais, há dificuldade para o
156

enfrentamento à violência, devido a grande demanda de atendimentos do município


e falta de recursos financeiros e humanos. Ao final da pesquisa foi possível
confirmar a hipótese, uma vez que os principais obstáculos para o atendimento, que
foram trazidos pelos entrevistados, estão relacionados a falta de recursos humanos
suficientes e também a falta de recursos financeiros para se ter um espaço físico
adequado para o oferecimento do serviço.
As políticas de atendimento possuem várias vertentes, a educação, a saúde,
os serviços e programas de esporte, cultura e lazer e a assistência social. Foi
escolhida para realização da pesquisa de campo, o Centro de Referência
Especializado da Assistência Social, pois nele é prestado o serviço de Proteção e
Atendimento Especializado à Família e Indivíduos, que atende pessoas em situação
de violência, assim, presta atendimento socioassistencial às famílias e crianças ou
adolescentes que estão em situação de violência sexual intrafamiliar, tema desta
pesquisa.
A entrevista em profundidade, possibilitou-se a identificação de alguns dos
problemas que a política de atendimento possui no enfrentamento à violência sexual
intrafamiliar contra crianças e adolescentes. Essa abordagem afirmou a importância
que tem a sociedade de participar ativamente das políticas públicas, para o
aprimoramento das políticas públicas e da garantia da proteção integral de crianças
e adolescentes.
Através dos resultados da pesquisa de campo, percebeu-se as dificuldades
diárias que possui a equipe de atendimento do Centro de Referência Especializado
em Assistência Social. A falta de recursos humanos, demanda mais grave do que a
própria falta de recursos financeiros, está relacionada a inexistência de um número
suficientes de técnicos especialistas para o atendimento da quantidade de casos de
violação de direitos que chega ao CREAS do município de Santa Cruz do Sul.
Para um CREAS que possui 295 atendimentos ativos e uma quantidade de
equipe que a própria Normativa Operacional Básica do Sistema Único de
Assistência Social indica como ideal, de que seja somente 80 atendimentos, por si
só já nos diz muita coisa referente ao serviço prestado, principalmente pelo serviço
de Proteção e Atendimento Especializado à Família e ao Indivíduo, o PAEFI. Ainda
que haja grande esforço e vontade da equipe de profissionais, se a demanda é
157

muito maior do que a equipe consegue abarcar, o atendimento fica comprometido e


consequentemente a superação de violação de direitos também.
Fora que serviços públicos essenciais, como as oficinas com idosos e
pessoas com deficiência e o serviço especializado para pessoas em situação de rua,
estão parados por falta de falta recursos humanos e em razão do espaço físico
inadequado, pequeno, sem salas de reunião, sem espaço de convivência e para as
oficinas, ou mesmo salas de atendimento com isolamento acústico, o que
compromete o trabalho dos profissionais, pois expõe as famílias à outras famílias em
atendimento e aos próprios membros da equipe, fora o sigilo ético profissional dos
técnicos que fica comprometido com paredes que, segundo os engenheiros e
projetistas, teriam vedação acústica, mas que não funcionam.
A localização do CREAS, que a primeira vista parece ser um obstáculo tão
insignificante, mas quando se analisa mais afundo, percebe-se que alguns usuários
do serviço precisam pegar até dois ônibus para chegar ao local, ou ainda, sentem-se
constrangidos de estar ali, pois o prédio é dividido entre vários órgãos públicos, junto
com o CREAS é possível encontrar o Conselho Tutelar, o Conselho Municipal de
Direitos da Criança e do Adolescente, Conselho da Assistência Social, Delegacia
Especializada no Atendimento à Mulher e a Delegacia de Polícia da Criança e do
Adolescente.
A acessibilidade aos profissionais e aos usuários é uma das diretrizes da
NOB-SUAS, essa acessibilidade não se dá através de um elevador no prédio ou um
estacionamento reservado aos usuários, mas a capacidade do local em receber
seus profissionais e seus usuários, sem constrangimento, desconfiança ou violação
do sigilo de suas declarações quando em atendimento. Até mesmo porque os
profissionais que trabalham diariamente com violações de direitos merecem um
lugar adequado para exercer com maestria seu papel, que é tão importante na
superação de violação de direitos.
O número de CRAS no município reflete na quantidade demasiada de
atendimento no CREAS, pois os dois CRAS, vinculados a zona Sul da cidade,
deixam de fora de sua área de atuação uma grande parte do município, como se as
violações de direito fossem apenas de uns e não ocorressem na zona rural, na zona
de classes média ou alta. Concepções antiga de que serviço social é coisa de pobre
158

ou marginalizado, infelizmente ainda estão presentes. O CREAS recebe demandas


de zona que não há CRAS e como o CREAS não consegue atender nem sua própria
demanda, encaminha à Secretaria de Políticas Públicas os casos que são de
Proteção Social Básica.
Se a demanda é muito extensa e a política de atendimento não é ampliada, a
qualidade do trabalho prestado começa a decair naturalmente, as violações de
direitos já não são mais superadas da mesma forma, a atenção dada para cada
caso, de forma individualizada, não acontece como deveria ser.
Importante, também, a compreensão de todos os profissionais da rede de
atendimento, proteção e justiça, envolvidos com a vítima de violência, o dever de
garantir a proteção integral de crianças e adolescentes é de todos e para isso o
trabalho intersetorial precisa estar bem articulado, de forma que não haja a
revitimização e que cada um saiba o seu papel dentro do Sistema de Garantia de
Direitos de Crianças e Adolescentes, colaborando com os demais atores da rede.
É de suma importância, para minimizar os traumas gerados, que o
profissional que atende criança e adolescente vítima de violência sexual intrafamiliar
esteja capacitado, conhecendo o fenômeno e sua forma complexa, os
procedimentos adequados para se proceder mediante uma situação de violência
sexual, desde a revelação da vítima ou a suspeita, até a superação da violação de
direito. A rede de proteção deve ser pensada a partir da articulação e do diálogo
entre diversos profissionais que atuam na rede de atendimento, esses profissionais
também precisam estar preparados, conhecendo o fenômeno da violência contra
criança e adolescente. Portanto, o profissional da rede precisa compreender as
modalidades de violência sexual e a complexidade das causas e consequências que
esse tipo de ação gera na vida da vítima e na sua convivência com a família.
Neste entendimento, não basta apenas comunicar ou notificar os casos de
suspeita ou confirmação de violência sexual, mas em qualquer situação, requer
ações e intervenções interprofissionais, que não dependem apenas de atitudes
isoladas, é necessário haver comunicação e colaboração entre todos os segmentos
que compõe a rede de apoio social. “É preciso ter em mente que tanto a criança
e/ou adolescente vitimizado merecem mais que aplicações de protocolos de
159

atendimento, mas merecem um atendimento acolhedor, digno e protetivo” (PIETRO,


2013, p. 122).
Dentro desta conjuntura, os dados oficiais nacionais sobre a violência sexual
intrafamiliar dão enorme embasamento para a importância do estudo sobre a
temática e importante preparação dos profissionais que atuam neste ramo, pois os
números de violência que chegam até os registros são alarmantes, isto que,
infelizmente ele não representa os dados reais, visto que uma parte não é notificada
e outra nem chega as autoridades, perpetuando a violência através do medo e das
ameaças sofridas pela criança ou adolescente vítimas de violência sexual
intrafamiliar, como se pode ver nos dados do município de Santa Cruz do Sul, que
deixam clara a subnotificação, fator que prejudica o aprimoramento de políticas
públicas.
O enfrentamento a violência sexual contra crianças e adolescentes exige
responsabilidade dos três níveis dos entes federados, incube não só a vontade
política e o investimento para garantir a integralidade do atendimento, mas também
a qualificação dos mecanismos de atuação intersetorial, evidenciando a necessidade
de elaboração e formalização de protocolos e fluxos de atendimento, bem como, de
registro destas violações, para que então possa se ter a dimensão numéricas dos
casos de violação de direitos para melhoramento das políticas públicas, tanto de
atendimento, quanto de proteção e justiça, neste ponto, ressalta-se o melhoramento
em todas as esferas, na política de saúde, assistência social, educação, cultura,
esporte, Judiciário, Ministério Público e atuação do Conselho de Direitos e do
Conselho Tutelar.
Conclui-se que a partir da análise comparativa entre as diretrizes nacionais e
a política de atendimento do município de Santa Cruz do Sul, os serviços estão
estruturados, todavia diante da demanda a capacidade de atendimento ainda é
insuficiente, necessitando de aprimoramento nos instrumentos de gestão, como a
capacitação dos profissionais, definição de protocolo e fluxo de atendimento,
acessibilidade física do serviço, a promoção de ações preventivas e, principalmente,
as condições necessárias para a oferta do serviço. Embora haja o amparo
normativo, internacional, nacional e organizacional, há obstáculos para serem
vencidos no enfrentamento à violência sexual, afim de garantir a proteção integral às
160

crianças e adolescentes vítimas de violência sexual no município de Santa Cruz do


Sul.
Além das respostas ao problema que proporcionou esse estudo, novos
questionamentos permearam a partir dos resultados da pesquisa e da própria
construção teórica, como, por exemplo, qual o fluxo de atendimento ideal para um
município como Santa Cruz do Sul, que possuí todos os serviços da rede de
atendimento estruturados, ou, ainda, como ocorrem as estratégias de articulação
intersetorial nos Conselhos de Direitos da Crianças e do Adolescente ou quais são
as dificuldade a serem enfrentadas, para a construção de Planos Municipais, como o
de Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes, afim de garantir de políticas de
atendimento, para o enfrentamento à violência sexual contra crianças e
adolescentes.
161

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173

ANEXO I – Carta de Aceite


174

ANEXO II – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)


175
176

ANEXO III – Termo de Aprovação do Comitê De Ética – UNISC


177
178
179

ANEXO IV – Entrevista Semiestruturada

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO – MESTRADO


Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC

Esta entrevista é parte da pesquisa para elaboração da dissertação da


mestranda Franciele Letícia Kühl, orientada pelo professor Dr. André Viana
Custódio.

A identidade dos participantes será mantida em sigilo.

1º Eixo de entrevista – Perfil do entrevistado

1 – Sexo:
( ) Masculino
( ) Feminino

2 – Formação:
( ) Ensino Fundamental
( ) Ensino Médio
( ) Graduação em: _________________________
( ) Especialização em: _________________________
( ) Mestrado em: _________________________
( ) Doutorado em: _________________________

3 – Profissão/Função: _________________________

4 – Local de Trabalho: _________________________

5 – Representa:
( ) Poder Público
( ) Organização da Sociedade Civil
180

2º Eixo da entrevista – Atuação do profissional

1 – Qual a forma de ingresso no local de trabalho: designação, concurso público ou


voluntário?
2 – Descreva a sua atuação no seu local de trabalho:
3 – Quando chega para você a informação de que há uma vítima de abuso sexual
intrafamiliar qual o procedimento a ser adotado?
4 – Existe articulação intersetorial? Há interelação com outros setores do município
para o atendimento das crianças vítimas de abuso sexual intrafamiliar? Como
funciona?
5 – Como você avalia o atendimento das crianças e adolescentes vítimas de abuso
sexual? Existem problemas a serem enfrentados? Comente.
6 – Como se dá o processo de identificação da criança ou adolescente vítima de
abuso sexual até a superação da violação do direito? Quais os órgãos envolvidos?
7 – Há ações para erradicação do abuso sexual intrafamiliar?
8 – Quais os desafios encontrados para execução do seu trabalho?
9 – É realizada a notificação dos casos em algum sistema de dados? É realizado o
preenchimento da Ficha Individual de Notificação (FIN)?
10 – Existe algum acompanhamento especializado à vítima, família e até mesmo ao
responsável pelo abuso sexual intrafamiliar?
11 – Quantas pessoas exercem a mesma função que você?
12 – Quais as dificuldades encontradas para a execução do seu trabalho?
13 – O que seria necessário para o serviço ser mais eficiente?

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