Rafael Andrade Pereira
Rafael Andrade Pereira
Rafael Andrade Pereira
São Paulo
2010
2
Universidade de São Paulo
Instituto de Física
Instituto de Química
Instituto de Biociências
Faculdade de Educação
Dissertação de mestrado
apresentada ao Instituto de Física,
ao Instituto de Química, ao Instituto
de Biociências e a Faculdade de
Educação da Universidade de São
Paulo, para a obtenção do título
de Mestre em Ensino de Ciências.
São Paulo
2010
3
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho aos meus pais José Pereira e Telma Andrade Pereira, aos meus irmãos
Augusto e Patrícia, à minha esposa Mariana de Oliveira Faria e ao meu primo Rodrigo
Andrade Zampieri que infelizmente não está mais entre nós.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço a meu orientador Oscar João Abdounur por me orientar e colaborar com meu
desenvolvimento acadêmico, profissional e pessoal.
À meus pais José Pereira e Telma Andrade Pereira, meus irmãos Augusto Andrade Pereira
e Patrícia Cristina Andrade Pereira, e minha esposa Mariana de Oliveira Faria pelo apoio,
amor, dedicação e cooperação que sempre me deram.
Ao meu amigo e companheiro de trabalho Alex de Lima Barros e sua esposa Flávia L. por
todo apoio que me deram ao longo do mestrado, sobretudo na finalização da dissertação.
À minha família, em particular tia Ceça, tio Tadeu, Digo, Tato e Renata e meus amigos
Vlademir, Renato, Marcelão, Marcelo Naudi, Luizinho, Marcelinho, André, Henrique,
Gustavo, Talita, Ricardo (Cabelo), Felipe, Kátia, Paulinho, Sônia, Sil, João e Aninha que
sempre me apoiaram.
Ao meu grupo de pesquisa Luís, Eliezer, Yumi, Luana, Delma e Diana, e a todos que
contribuíram e estiveram de algum modo presentes durante este percurso, muito obrigado!
6
RESUMO
7
ABSTRACT
This project aims to research under a historic-epistemological perspective the
development of musical acoustic in the Renaissance. This research will be especially
focused in the search for indicators of the importance of experimental verification in the
production of acoustic knowledge of that time. Therefore, it becomes essential that the
historiografical search provide theoretical subsidies for reasoning of the transition from a
science musical centered on a dogmatism arithmetic to a science musical, which has a
verification test as a relevant criterion of distorted from their theories. In order to extract the
indicators mentioned, the aim is to analyze well-treated theoretical music of this period
under the prospect of relations between the physics, mathematics and music. From an
educational overview, this project intends, through a didactic exhibition at the museum
“Estação Ciência”, to reproduce structurally clarifying experiments of acustical concepts
emerged in the Scientific Revolution, making use of modern resources. As a result of such
bibliographic thoughts, it is intended to discuss various teaching strategies on the
development of the relationship between physics, mathematics and music, on a perspective
historic-epistemological.
Then this project aims to describe the process of the development of a didactic
exposition about the relation between mathematics, physics and music under a historic-
epistemological perspective. Such exposition intends to reconstruct the main experiments
of the acoustics musical history, which are responsible for the consolidation of the theory
that is currently known, evidencing the points of the importance on the experimental
verification in the production of the acoustic knowledge, in the history of science. In this
direction, it is extremely important that this research provides theoretical subsidies to the
implementation of a transition between a centered musical science and an arithmetical
dogmatism for a musical science which has the experimental verification as a relevant
criteria of falsifiability of its theories. In doing so, this project intends to present the didatic
exposition that will be carried out in the museum “Estação Ciência”, reproducing, in
writing, its structure, experiments and panels that aim to clarify emergent acoustic concepts
in Old Greece and its transformations throughout the Scientific Revolution.
Keywords: Exposition / Scientific Divulgation / Musical Acoustic / Historical
Epistemology / Empiricism.
8
SUMÁRIO
PREFÁCIO.........................................................................12
CAPÍTULO 1 .....................................................................14
INTRODUÇÃO..................................................................14
1.1 Delimitando o problema de pesquisa.......................................................................... 14
1.2 Objetivos do trabalho................................................................................................... 15
1.3 Pressupostos básicos e a metodologia de pesquisa .................................................... 15
1.4 O ensino da relação entre a física e a música............................................................. 16
1.5 Física e cultura.............................................................................................................. 16
1.6 Conceitos introdutórios de música.............................................................................. 17
1.6.1 Intervalos Musicais.................................................................................................... 17
1.6.2 Notas e Acordes: Um estudo de harmonia .............................................................. 19
1.6.3 Consonâncias e dissonâncias .................................................................................... 21
CAPÍTULO 2 .....................................................................23
A FÍSICA DA MÚSICA: DOS GREGOS À MÚSICA
CONTEMPORÂNEA........................................................23
2.1 O Monocórdio e suas consequências........................................................................... 23
2.2 A crítica ao pensamento pitagórico e o nascimento de uma nova ciência............... 27
2.3 O temperamento igual e outros temperamentos ....................................................... 29
2.4 As cordas vibrantes, seus modos de vibração, o princípio de Superposição e a
Série Harmônica ................................................................................................................. 32
2.5 O timbre visto a partir da relação entre a Série Harmônica e a Série de Fourier . 34
2.6 Análises sobre o conceito de consonância................................................................... 35
2.7 O tratado de Jean Philipe Rameau ............................................................................. 37
2.8 A música ocidental e o surgimento de um novo paradigma ..................................... 39
9
CAPÍTULO 3 .....................................................................41
A ACÚSTICA MUSICAL SOB UMA ÓTICA
HISTÓRICO-EPISTEMOLÓGICA................................41
3.1 A epistemologia de Thomas Kuhn .............................................................................. 41
3.2 As escolhas epistemológicas para a releitura da Acústica Musical.......................... 44
3.3 O nascimento da Acústica como uma ciência experimental..................................... 45
3.4 A natureza da ciência e o ensino de Acústica............................................................. 47
3.5 A epistemologia de Kuhn, o ensino de Acústica e a natureza da ciência................. 48
3.6 O Renascimento: Uma Revolução Científica generalizada? .................................... 49
3.7 Uma discussão sobre o currículo de física do Ensino Médio.................................... 50
CAPÍTULO 4 .....................................................................52
A ELABORAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DIDÁTICA ........52
4.1 Sala 1: Motivações e questões relevantes para a compreensão da Série Harmônica
.............................................................................................................................................. 55
4.2 Sala 2: O experimento do Monocórdio: razões x intervalos musicais e a
sistematização matemática da escala................................................................................ 56
4.3 Sala 3: Renascimento: o nascimento da música como ciência experimental .......... 59
4.4 Sala 4: Escalas e Temperamento................................................................................. 61
4.5 Sala 5: Série Harmônica/Série de Fourier ................................................................. 63
4.6 Sala 6: Consonância e Dissonância: do simbolismo aritmético a uma concepção
física ..................................................................................................................................... 65
4.7 Sala 7: O som dos planetas .......................................................................................... 66
4.8 Sala 8: Da matemática-especulativa à matemática-empírica: uma revolução
científica na música ............................................................................................................ 67
4.9 Considerações gerais sobre a realização da exposição.............................................. 68
10
CAPÍTULO 5 .....................................................................71
IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS: ...............................71
DIVERSIFICANDO AS ESTRATÉGIAS DE ENSINO71
5.1 A física dos instrumentos musicais ............................................................................. 71
5.2 Da sensibilização musical à sistematização dos conceitos físicos da ondulatória ... 72
5.3 Diversificando as estratégias de ensino ...................................................................... 73
5.3.1 O uso de softwares e a relação entre as qualidades do som e os elementos de uma
onda...................................................................................................................................... 73
5.3.2 A construção de instrumentos musicais como uma estratégia de ensino de
acústica ................................................................................................................................ 78
5.3.3 A entrevista com músicos e a reflexão sobre a física da música............................ 79
5.3.4 A leitura de textos históricos e a construção de diálogos fictícios......................... 79
5.3.5 O uso de vídeos, imagens e sons ............................................................................... 93
5.3.6 A experimentação e a construção de conceitos ....................................................... 94
5.4 A profundidade e a generalidade desta discussão ..................................................... 97
7. GLOSSÁRIO FÍSICO-MUSICAL.............................100
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................104
11
PREFÁCIO
epistemologia de Thomas Kuhn. Como produto deste trabalho, organizou-se uma proposta
de exposição que será realizada na Estação Ciência1. Tal exposição tem previsão de
acontecer em fevereiro de 2011 e está sendo financiada pelo CNPq e pela FAPESP.
visando ampliar o repertório e estratégias de trabalho dos professores de física acerca deste
tema.
pesquisa, e uma breve introdução aos conceitos musicais que serão explorados ao longo do
trabalho.—
12
histórico apresentado no capítulo anterior será realizada uma análise sobre a Revolução
buscando levar a discussão apresentada para a sala de aula. Assim, este capítulo tem a
mestrado.—
1
A Estação Ciência é um museu de divulgação científica localizado na cidade de São Paulo.
13
CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO
1.1 Delimitando o problema de pesquisa
musical e seu ensino. Neste sentido, este material apresentará uma maneira de se entender
como o ensino da relação entre a física e a música pode colaborar com a formação dos
musical é um assunto ou praticamente ausente na maior parte dos cursos ou, quando
14
1.2 Objetivos do trabalho
orientador e com o grupo de pesquisa que visavam estabelecer uma bibliografia básica, que
de Thomas Kuhn, assim a obra “A estrutura das Revoluções Científicas” será uma das
referências amplamente exploradas neste texto, de tal forma que deve-se atribuir um
15
É pressuposto que o leitor deste material não é um músico proficiente. Assim,
sempre que a teoria musical for abordada a dissertação buscará fornecer subsídios para que
relações entre a física e a música. Entretanto, esta dissertação tem a pretensão de evidenciar
que o trabalho com este conteúdo propicia não só um aprofundamento na análise de um dos
elementos mais importantes de nossa cultura, bem como possibilita aprofundar habilidades,
olhar cuidadoso para o desenvolvimento histórico desta estrutura conceitual permite que os
história.
Neste sentido, o tratamento deste conteúdo permite que muitos dos principais
objetivos de um curso de física sejam abordados. Além disso, o conteúdo por si só pode
instrumentos musicais do cotidiano dos alunos e propiciando assim uma ampla discussão
necessidade de uma integração maior entre o ensino de física e elementos de nossa cultura.
16
É indiscutível que a música integra parte fundamental de nossa cultura, e neste sentido, este
olhar para a história da acústica revelam-se como estratégias importantes para o tratamento
deste assunto. Sabe-se que ao ensinar física opera-se com um conjunto de “caixas pretas”,
entretanto lidar com este conteúdo pode propiciar condições para abrir uma série destas
“caixas”, contribuindo assim para a construção de uma concepção de ciência mais ampla e
Visto que este material tem a pretensão de discutir o ensino de física, sua estrutura
explicitamente discutidos. Para isto, esta seção do texto trará uma discussão sobre conceitos
básicos da teoria musical que de alguma maneira serão abordados neste ou nos próximos
capítulos. Além disso, foi elaborado um glossário físico-musical (no final desta dissertação)
Naturalmente, como em qualquer medida de “distância”, é preciso tomar uma nota como
17
pelos músicos. Segue abaixo uma tabela que representa a nomenclatura específica e dois
2 Segunda Maior RÉ SI
4 Quarta Justa FÁ RÉ
Aumentada
5 Quinta SOL MI
8 Oitava DÓ LÁ
18
conhecemos aumentando de meio em meio tom2. Vale ressaltar que a escala cromática é
composta pelas sete notas naturais ( dó, ré, mi, fá, sol, lá e si ) acrescida de seus acidentes
(dó#, ré#, fá#, sol# e lá# - não há nem si, nem mi sustenidos) compondo assim uma escala
de doze notas. É possível iniciar a tabela por qualquer nota, assim pode-se dizer que a terça
maior de dó é sol, ou que a sexta maior de dó é lá, mas também pode-se afirmar que a terça
notas tocadas serialmente, isto é, uma nota por vez, enquanto que na harmonia toca-se um
quanto mais agudo é um som maior é sua freqüência. Entretanto cada vez que se dobra uma
2
Note que na tabela o avanço de cada linha representa o aumento de meio tom (ou de um
semitom).
19
freqüência escuta-se a mesma nota oitavada. Segue abaixo um conjunto de notas associadas
Lá – 440 Hz
Si - 493,88 Hz
Dó – 523,25 Hz
Ré – 587,33 Hz
Mi – 659,25 Hz
Fá – 698,46 Hz
Sol – 783,99 Hz
Os acordes são conjuntos de notas. Assim sempre que um músico fala em acorde
maior ou menor ele se refere à terça ser maior ou menor. Desta forma a formação de
acordes respeita uma nomenclatura que permite a qualquer músico de posse do nome de um
Um acorde maior é composto por tônica + terça maior + quinta. Assim quando um
(terça maior de dó) + sol (quinta de dó). É comum que se represente as notas com letras
A – Lá
B – Si
C- Dó
D – Ré
E – Mi
F – Fá
20
G – Sol
século XX.
idéia de conforto e assim sugere uma tendência de repouso, ao passo que o conceito de
Uma importante questão a ser discutida neste trabalho diz respeito à relação entre a
psicofísicas que levam um som a ser mais ou menos consonante serão amplamente
Para isso faz-se necessária uma breve reflexão sobre o que é consonância. Neste
21
“ Na harmonia tradicional, uma consonância (do latim consonare, significando soar junto)
pode ser um conjunto de vibrações sonoras concordantes e portanto aceitas como mais
criam forte tensão e se tornam instáveis ao ouvido, que por natureza busca a resolução em
Galileu Galilei, Helmholtz, entre outros... No próximo capítulo discutiremos alguns dos
22
CAPÍTULO 2
A FÍSICA DA MÚSICA: DOS GREGOS À MÚSICA
CONTEMPORÂNEA
2.1 O Monocórdio e suas consequências
corda.
1:2, 2:3 e 3:4 fossem associadas aos intervalos musicais de oitava, quinta e quarta
Figura 2: O Monocórdio
Robert Fludd (1574-1637) fez a imagem apresentada abaixo, onde Deus toca um grande
monocórdio no qual o mundo está inserido. Alguns séculos depois Kepler vai sistematizar o
23
Figura 3: O Divino Monocórdio, de Robert Fludd.
com base num simbolismo numérico. Um exemplo interessante de tal força do dogmatismo
razões 1:2, 2:3 e 3:4 e os intervalos musicais de oitava, quinta e quarta respectivamente -- ,
agora generalizada para outras fontes sonoras tais como copos, sinos, flautas etc.
24
Figura 4: Imagem concebida por Franchino Gaffurio que mostra a generalidade da tradição
pitagórica.
qualquer outro sistema físico que emitisse som (copos com água, sinos,
25
Tal experimento informa não somente que às consonâncias perfeitas 8a, 5a e 4a
subjazem razões simples 1:2, 2:3 e 3:4, mas ainda que à composição de intervalos musicais
compor ou decompor o comprimento da corda produtor da nota mais grave ou mais aguda
uma nota inicial dó é produzida por 1, sua quinta será produzida por 2:3, equivalente à nota
sol. A quinta do sol, por sua vez, por (2:3)(2:3) = (4:9), que reduzido à oitava original
resulta em 8:9, equivalente à nota ré. A quinta de ré será produzida por (8:9) (2:3) = 16:27,
que equivale à nota lá, e assim por diante, resultando na seguinte escala diatônica:
2 2
.
8
Segunda = 1 Quinta + 1 quinta – 1 oitava = 3 3 =
1 9
2
16 2
.
Terça = 1 Sexta + 1 Quinta – 1 Oitava = 27 3 = 64
1 31
2
3
Quarta = (Monocórdio)
4
2
Quinta = ( Monocórdio)
3
26
8 2 16
Sexta = 1 Segunda + 1 Quinta = . =
9 3 27
16 8 128
Sétima = 1 Sexta + 1 Segunda = . =
27 9 243
dó ré mi fá sol lá si dó
em que consideravam o número quatro como a origem de todo o universo, todo o mundo
material, representando a matéria em seus quatro elementos: o fogo, o ar, a terra e a água.
através do tratado De Institutione musica, escrito no início do século VI d.C. por Boécio
27
criticasse mostrando que tais relações variavam não somente segundo o parâmetro medido
na corda -- tensão, densidade linear, etc. --, mas de maneira geral, segundo o parâmetro
medido em qualquer fonte sonora. Intensificada no decorrer do século XVII, tal perspectiva
qual o dogmatismo aritmético presente na tradição pitagórica é substituído por uma prática
desenvolvimento científico é um dos aspectos que esta pesquisa visa evidenciar, a partir da
na ciência musical, tal como a crítica de Vincenzo Galilei à generalização dos resultados do
além das diversas transformações no âmbito das artes, da filosofia e da relação do homem
com o conhecimento, neste período foi concebida uma nova maneira de fazer ciência,
Desta forma, a acústica musical nasce como uma ciência experimental, e desta
que a visão da ciência mudou sua perspectiva, deixando mais de lado os dogmas
28
2.3 O temperamento igual e outros temperamentos
problemas entre teoria e prática, cujas pretensões exigiam uma fundamentação teórica
eram geradas por razões entre os números 1, 2, 3 e 4 e intervalos musicais somente por
intervalos de quinta e oitava estão relacionados respectivamente com razões 2:3 e 1:2, já
a partir de seus resultados, constata-se que não existem m e n, inteiros positivos tais que
(2/3)m seja igual a (1/2)n, o que implica na impossibilidade de encaixar um número inteiro
ajuste preciso entre ciclos naturais da Lua e da Terra em torno do Sol na astronomia. Ou
seja, podemos dizer que os doze semitons não “cabem” exatamente em uma oitava, assim
como 12 meses de trinta dias não “cabem” exatamente no ano de 365 dias. Desse modo,
tanto no calendário quanto na teoria musical, simetria e pureza são impossíveis, de tal
29
todos os intervalos musicais impuros, ou criamos um intervalo assimétrico, com semitons
criamos onze meses de trinta dias (portanto, puros) e um mês de trinta e cinco dias
Temperamento, uma vez que a coma pitagórica e as outras geradas a partir das tentativas de
Uma possível solução para este problema é o Temperamento Igual, que tem como
mesmo intervalo ser sempre igual, ou seja, a razões entre as frequências de duas notas
distantes uma da outra de um semitom é sempre a mesma, não importando quais duas notas
sejam (ex: dó e dó# e ou dó e dó bemol ou sol e sol#) -- o que implica que fá# e sol bemol
Figura 7: Imagem produzida pelo prof. Dr. Oscar João Abdounur para representar o
temperamento igual.
30
Em outras palavras o Temperamento Igual consiste em dividir a oitava em 12 partes
iguais, o que resulta no encontro entre 12 ciclos de quinta e 7 ciclos de oitava. Neste caso,
aproximadamente 1,4983, e não 1,5 correspondente à razão 3:2 como propunha Pitágoras.
pesquisa tal conceito mostra-se fundamental a medida que aproxima a música teórica da
música prática, denotando desta forma a necessidade de validar o experimento como parte
Vale ainda ressaltar que o temperamento igual foi uma das diversas soluções para
31
2.4 As cordas vibrantes, seus modos de vibração, o princípio de Superposição e a
Série Harmônica
No século XVII físicos e matemáticos começaram a dar mais atenção ao tema, tais
como Marin Mersenne (1588-1648), John Wallis (1616-1703), Johannes Kepler (1571-
entre outros.
empírica, inicialmente com Mersenne que além de estabelecer, juntamente com Galileu, a
relacionar diretamente a altura de uma nota emitida por uma fonte com sua frequência de
vibração. Isso dava início a uma resposta ao problema proposto por Vincenzo Galilei, que
seu comprimento, T a tensão que esta está submetida e µ sua densidade linear.
paradoxo só pôde ser resolvido no final desse século quando Joseph Saveur propôs o
32
Princípio da Superposição. Ao mesmo tempo, esse problema motivou a busca de
explicações para o conceito de Série Harmônica. Mais tarde o conceito de Série Harmônica
que esta vibração seja transmitida ao ar. A frequência ou altura do som produzido vai
depender das características do meio vibratório (uma corda, coluna de ar, etc); os sistemas
físicos não vão vibrar de uma única forma, mas sim emitindo diversas frequências, todas
interesse por harmônicos. Ele estimou frequências absolutas e estabeleceu a relação entre
No início do século XVIII, Joseph Saveur propôs o início de uma nova ciência que
se poderia chamar acústica. Ele mostrou que um mesmo objeto pode produzir diferentes
comportamento das cordas vibrantes, assim pôde-se estabelecer que uma corda vibrante
tem diversos modos de vibração e que cada modo de vibração produz um som diferente.
33
Desta forma pode-se concluir que ao vibrar uma corda não produz apenas uma
frequência, mas sim todos os múltiplos inteiros da frequência de seu primeiro modo de
2.5 O timbre visto a partir da relação entre a Série Harmônica e a Série de Fourier
Assim, do ponto de vista físico é possível afirmar que, ao oscilar, uma corda produz
diversos sons, cada um desses sons são chamados de harmônicos e o conjunto deles é a
Série Harmônica. Vale ressaltar que outros tipos de fontes sonoras também podem
Do ponto de vista matemático pode-se afirmar que a Série de Fourier é uma maneira
de obter as componentes de uma onda complexa separando seus harmônicos. Sendo assim,
há uma estreita relação entre a Série Harmônica e a Série de Fourier. Tal relação mostra-se
Fourier
34
Neste sentido para que seja construída de maneira clara a relação entre os
como o instrumento vibra, ou seja, quais são os modos de vibração que geram harmônicos
com maior amplitude ( e portanto qual será seu timbre) e como este instrumento é afinado
dissonante mostrou-se de grande relevância para o fazer musical. Para isso, é fundamental
Vale ressaltar que uma discussão pertinente sobre tal conceito deve ser considerada:
considera-se que os três aspectos devem ser levados em consideração, e neste sentido
história da acústica.
− Emissão de duas ou mais notas que soam como uma por Arquitas (Fallas, 1992);
35
− Coincidência das pulsações geradoras das notas em questão por Galileu (Cohen, 1984,
p.90);
ou seja, ao tocarmos duas notas simultâneas todos seus harmônicos soam simultaneamente,
podendo coincidir alguns harmônicos, este trabalho analisou o número de harmônicos que
coincidem em cada intervalo musical, podendo desta forma apresentar uma interpretação
para a consonância. Para facilitar tal análise segue uma tabela que contém a série
Série Harmônica 1 2 3 4 5 6 7 8
Tônica Dó Dó Sol Dó Mi Sol Sib Dó
Segunda menor Dó# Dó# Sol# Dó# Fá Sol# Si Dó#
Segunda Ré Ré Lá Ré Fá# Lá Dó Ré
Terça Menor Ré# Ré# Lá# Ré# Sol Lá# Dó# Ré#
Terça Mi Mi Si Mi Sol# Si Ré Mi
Quarta Justa Fá Fá Dó Fá Lá Dó Ré# Fá
Quarta Aumentada Fá# Fá# Dó# Fá# Lá# Dó# Mi Fá#
Quinta Sol Sol Ré Sol Si Ré Fá Sol
Sexta Menor Sol# Sol# Ré# Sol# Dó Ré# Fá# Sol#
Sexta Lá Lá Mi Lá Dó# Mi Sol Lá
Sétima Menor Lá# Lá# Fá Lá# Ré Fá Sol# Lá#
Sétima Si Si Fá# Si Ré# Fá# Lá Si
Oitava Dó Dó Sol Dó Mi Sol Sib Dó
b=Bemol
#=Sustenido
Tabela 2: Intervalos com cada harmônico da nota
Como foi dito anteriormente, a tabela acima foi utilizada para analisar os conceitos
uma explicação de tais conceitos. A consonância é definida hoje como sendo um som que
causa uma sensação de repouso, em função de uma fusão entre as notas. Existem três tipos
36
de consonância: a consonância perfeita (quinta e oitava), consonância mista (quarta justa) e
consonância imperfeita (terças (maior e menor) e sextas (maior e menor)). O restante dos
intervalos musicais são considerados dissonantes (movimento das notas não se fundem).
ou mais sons soando simultaneamente, todavia a música tonal indica que o sistema auditivo
humano possui um senso para certos intervalos especiais de freqüência – a oitava, a quinta,
a quarta etc. O mais significativo é que estes intervalos são avaliados quase na mesma
outra, o que pode ser uma explicação para a oitava ser uma consonância perfeita. Quanto a
quinta podemos constatar que todos os harmônicos ímpares da têm frequências situadas
perfeitamente afinado. Dando continuidade a análise da tabela, podemos verificar que para
outros intervalos como quartas, terças e sextas, a proporção de harmônicos que coincidem
aumenta rapidamente e vai descendo na ordem dos harmônicos. Esta pode ser uma possível
37
teoria harmônica de seu tempo. O primeiro capítulo dessa obra trata dos fundamentos
de acordes e tudo aquilo que é necessário para fazer música perfeita, princípios de
composição e de acompanhamento.
quarta e quinta todos os intervalos da escala diatônica, já que compondo razões com tais
intervalos fundamentais, o mesmo pode produzir qualquer outra nota presente em tal escala.
Por exemplo, a segunda pode ser escrita como uma quinta mais uma quinta menos uma
oitava: 2ª= 5ª+5ª-8ª , ou seja [(2/3)x (2/3)]/1/2=8/9, que é justamente a relação de um tom,
desta forma subindo um tom a partir da segunda temos uma terça maior, ou 3ª= 2ª+2ª logo
intervalos musicais Rameau passou a fazer uma análise de cada um dos intervalos, tal
tratamento seguiu com a oitava, quinta, quarta, segunda, terça, sexta e sétima. No entanto,
dos pontos mais brilhantes de seu trabalho tenha sido sua análise sobre a oitava, já que
ressonância para tratar a oitava como uma replicação, desta forma harmonizar um intervalo
x ou um intervalo 2.x passa a ser o mesmo problema, ou seja, cada vez que dobramos uma
determinada frequência esta nova frequência representa a mesma intervalo musical. Tal
constatação traz um novo tratamento para a teoria musical, pois a partir deste momento os
acordes dó-mi-sol, mi-dó-sol e sol-dó-mi passam a ser tratados como inversões do mesmo
acorde.
38
Rameau estava ciente do movimento transformador da acústica musical no século
XVII e isso se traduz em seu tratado que além de possuir um tratamento matemático do
instrucionais que tornem tais conceitos acessíveis aos estudantes do ensino médio compõe
tal forma que este conceito deixa de ser parte do paradigma estruturante do fazer musical.
Além disso, a harmonia musical faz uso de outra concepção teórica, de tal forma que a
Vale ainda salientar que apesar do interesse específico na descrição física dos
tratamento científico, pois uma forma de arte nunca será objetiva e precisa a ponto de ser
uma unanimidade, mas as simetrias e belezas observadas nas leis que governam a
combinação das estruturas matemáticas usadas na descrição dos sons em geral, e que
39
permitem analisar o espectro sonoro de cada instrumento musical guardam estreita relação
40
CAPÍTULO 3
A ACÚSTICA MUSICAL SOB UMA ÓTICA
HISTÓRICO-EPISTEMOLÓGICA
3.1 A epistemologia de Thomas Kuhn
leituras de autores, tais como Thomas Kuhn, Gaston Bachelard e Karl Popper, visando
falseamento (Karl Popper) são transferíveis ao quadro teórico a luz do qual foi analisada a
história da acústica.
do conhecimento científico.
Thomas Kuhn faz uso dos conceitos de "paradigma", "ciência normal", e "revolução
posterior.
paradigma estabelecido.
41
Revolução Científica: Episódios de desenvolvimento não cumulativo, nos quais
motivos para a construção de novas teorias, mas, quando isso acontece, elas dificilmente
são aceitas;
B) fenômenos cuja natureza é indicada pelo paradigma existente, mas cujos detalhes
somente podem ser entendidos após uma maior articulação da teoria. São os mais
C) fracassada a tentativa de articulação, surge o terceiro tipo: as anomalias, que tem por
traço característico a recusa do paradigma vigente. Neste caso, geram-se novas teorias.
Os momentos de crise nos paradigmas têm três soluções terminativas possíveis, com
A) a ciência normal mostra-se capaz de tratar do problema que provocou a crise e não surge
C) emerge um candidato a paradigma que lutará para suplantar o vigente. Neste caso, esta
42
“Consideramos Revoluções Científicas aqueles episódios de desenvolvimento não-
cumulativo, nos quais um paradigma mais antigo é total ou parcialmente substituído por
(1991) propõe uma estratégia de ensino em que alunos de disciplinas científicas sejam
são:
modelo de Kuhn.
43
3) Apresentação da nova teoria: nesta etapa, os alunos recebem um novo conjunto de idéias
que irão acomodar as anomalias. O professor faz, então, o papel de um cientista tentando
ciência normal. Neste estágio, esforços são dirigidos para a interpretação de situações
histórica a partir de uma análise epistemológica, para isso faz-se necessário a escolha de um
referencial epistemológico. Neste sentido foram estudados alguns autores, dentre eles
análise à ser feita neste texto o autor utilizado como referencial teórico será Thomas Kuhn,
já que um dos objetivos deste trabalho é mostrar que na Acústica, assim como na
Astronomia e na Mecânica, os séculos XVI e XVII foram marcados por uma importante
evidenciem que neste período o conhecimento científico sobre a música passou pode ser
tratado como uma Revolução Científica foi uma importante etapa deste trabalho.
de que a ciência é uma construção sócio-histórica, e que seu desenvolvimento histórico não
44
sociedade. Sendo assim, os trabalhos de Gaston Bachelard e de Karl Popper serão
esticar uma corda e com um cavalete alterar seu comprimento, permitindo relacionar
intervalos musicais com razões da corda determinadas pela posição do cavalete. Assim
pôde-se associar razões do comprimento da corda a intervalos musicais. Vale ressaltar que
o resultado obtido foi generalizado a outros contextos, de tal forma que acreditava-se que,
assim como na corda, qualquer entidade física na proporção 1:2 gerava uma oitava por
exemplo.
razões como uma maneira de conceber a escala pitagórica. Assim pôde-se a partir disto
concluir o que atualmente os músicos intitulam de escala diatônica ( dó, ré, mi, fá, sol, lá, si
e dó).
através do tratado De Institutione musica, escrito no início do século VI d.C. por Boécio
45
conseqüência uma abordagem matemático-especulativa como base teórica para resolução
monocórdio, Vincenzo Galilei mostrou que diversas razões podem estar associadas ao
mesmo intervalo musical. Assim, sua crítica aos modelos teóricos de Pitágoras explicitava a
concepção de que o caminho para construir uma ciência musical deveria contemplar uma
para intensificar sua perspectiva empírica e a partir de então se constituir como uma ciência
essencialmente experimental.
Ludovico Fogliani forneceu fortes subsídios para que Gioseffe Zarlino organizasse em sua
(1513-1590), bem como o padre e matemático francês Marin Mersenne (1588-1648) que,
46
compêndio referidos conceitos estéticos de influência marcante ao Tratado de harmonia,
escrito por Jean Philippe Rameau (1683-1764) cem anos mais tarde. Modificando
comprimento, nem a tensão e nem a densidade linear de cordas apresentava-se como razão
direta e imediata subjacente a intervalos musicais, mas razões dos números de vibrações e
impactos de ondas sonoras que atingiam o tímpano. Considerando o som que alcançava o
ouvido invés do objeto vibrante que o produzia, Galileu verificou que a altura musical
placa metálica provenientes de uma haste vibrante solidária a uma membrana que recebia
vibrações sonoras.
Tão importante quanto discutir conceitos da física é discutir como estes conceitos se
constroem. Esta é uma das concepções que permeiam este trabalho, ou seja, discutir a
tecnológico.
cursos e nos livros didáticos como o único momento em que a maneira de se construir
conceituais e um dos objetivos deste trabalho é mostrar, a partir de uma releitura histórica
da acústica, que também neste contexto conceitual o paradigma científico mudou. Assim a
47
abordagem histórica da acústica pode se configurar como uma estratégia consistente de um
ensino de física que busca evidenciar que o fazer científico é mutável em função do tempo,
Para isso, este texto buscará apresentar um material que evidencia um recorte da
para se fazer ciência variam de acordo com o cenário sócio-histórico do mundo. Neste
sentido, Kuhn explicita a idéia de que não há e não pode haver um critério de demarcação
puramente lógico para delimitar o que é ciência. Desta forma, uma importante análise a se
paradigma científico passou por uma grande transformação. É importante ressaltar que as
48
desenvolvimento do curso, o discurso do professor e sem dúvida a concepção de ciência
dos estudantes.
entretanto explorar esta discussão em outros âmbitos conceituais pode ser muito importante
presente trabalho tem como um de seus objetivos evidenciar que esta é uma leitura possível
estabelecidas pela razão, e não pela fé, e permite que seja desenvolvido o espírito de
observação experimental com a mente mais aberta ao livre exame do universo para
49
Para conhecer a realidade, surge, durante o Renascimento, um novo método de
uma das bases das ciências naturais modernas. Conhecer algo a respeito da natureza não
se limita ao exercício da reflexão; ela se faz a partir da realidade observada. Este conjunto
século XVII.”
permita afirmar que neste contexto conceitual isto é verdade. Porém esta análise parece ser
em Minas Gerais, do São Paulo faz Escola, nova proposta curricular no Acre, no Rio
Grande do Sul, entre outros tem evidenciado a preocupação do Estado e dos pesquisadores
Neste sentido, pretende-se neste trabalho discutir a importância da inserção que Acústica
50
Para além de permitir uma compreensão mais ampla dos fenômenos sonoros, o
ensino da acústica pode promover a construção de uma percepção, por parte dos estudantes,
história, assim, a abordagem histórica deve propiciar uma reflexão sobre como a maneira
51
CAPÍTULO 4
A ELABORAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DIDÁTICA
Este capítulo objetiva mostrar o projeto de elaboração de uma exposição didática
aprovado pelo Cnpq (Edital MCT/CNPq n.º 12/2006) e pela direção da Estação Ciência.
Esta exposição deverá ser realizada no início de 2011 e será composta por oito salas
enunciados no capítulo 2 deste trabalho. Desta forma segue abaixo uma explicação dos
tais como som, timbre, escala, intervalo musical, consonância e dissonância, ressonância,
tecnológicos modernos.
52
- Propiciar um espaço a profissionais envolvidos em ensino/aprendizagem para vivenciar
interdisciplinaridade.
científico-tecnológicas.
empírica.
módulos dispostos em salas capazes de transmitir as idéias centrais da relação entre física,
53
-- 2) O experimento do Monocórdio: razões x intervalos musicais e a sistematização
matemática da escala
-- 4) Escalas e Temperamento
música
por parte dos visitantes, dos conceitos matemático/musicais subjacentes ao tema central do
Cabe aqui ressaltar que a ordem com que se apresentam os módulos não se refletirá
54
que viabilizem, na busca desse objetivo, maior diversidade de possibilidades para atingir a
Vale ressaltar que neste capítulo a proposta é relatar o projeto inicial da exposição e
que apenas mais adiante pretende-se discutir sua execução, os problemas encontrados e os
resultados obtidos.
Harmônica, não são em geral muito intuitivos, este módulo terá por objetivo principal
científicas para conceitos acústico-musicais. Nesse sentido, são estabelecidas uma série de
Qual é a diferença física que permite reconhecer as vozes das pessoas, ou o timbre de
O que é som?
Quantas vozes diferentes você é capaz de reconhecer? Por que isso acontece?
O que é timbre?
Por que existem sons que consoam e outros que dissoam? Concordam ou discordam?
55
Por que um móvel próximo a um aparelho de som ligado pode vibrar?
Porque quando se sopra muito forte uma flauta escuta-se ao invés da nota desejada uma
Qual a relação entre calendários e escalas musicais? Por que não utilizamos o mês lunar
Além das perguntas que serão apresentadas em painéis este módulo contará com
uma série de de painéis, softwares e experimentos que devem motivar o visitante a elaborar
questões sobre o assunto. Entre eles estarão um painel histórico que trate de conceitos
Newton sobre a decomposição da luz branca em um prisma trazendo assim uma analogia
entre o som e a luz,ou seja, mostrando que assim como a luz branca pode ser decomposta
em outras ondas um som complexo pode ser decomposto em seus respectivos harmônicos;
que o visitante poderá tocar e portanto ouvir seus timbres e um software no qual o visitante
sala permite sua reprodução bem como a exploração e experimentação de suas principais
56
3:4 -- culminando com a construção da escala diatônica pelos pitagóricos. Sob uma ótica
multiplicar ou dividir o comprimento de corda que produz a nota mais grave ou mais aguda
pelo fator correspondente ao intervalo referido, respectivamente. Este resultado poderá ser
Seja um comprimento L correspondente a uma nota dada. Como podemos obter sua
intervalos de 4a e 8a? b) Partindo da nota do, como podemos atingir o ré, superpondo
sol, superpondo somente consonâncias pitagóricas? c) Seja ré a nota emitida pela corda
multiplicarmos L por 2:3, 2:3, 2:3, e 2? Verifique a nota no monocórdio, conferindo seu
som no piano. d) Seja L o comprimento correspondente a uma nota dada. Que intervalos
são obtidos entre a nota dada e aquelas produzidas por: 4L:9, 9L:16, 8L:9. e) Seja L o
produzir a nota obtida ao subir uma oitava e uma quinta e, em seguida, descer duas
57
pentatônica, diatônica e cromática com suas respectivas razões conformadoras
subjacentes. Tais situações conduzem ainda à problemática do não ajuste entre o ciclos
observações estabelecem um „link“ com a sala Escalas e Temperamento, uma vez que
que é intervalo musical, vale ressaltar que este conceito é fundamental para que o visitante
amplie sua compreensão da exposição, desta forma esta sala trará os intervalos musicais de
múltiplas formas ( o visitante escutará os intervalos, lerá como estes são concebidos e
Além disso, nesta sala haverá um segundo painel histórico salientando o que foi e qual é a
a composição de razões matemáticas com a formação da escala. Este processo poderá ser
construção da escala.
58
Além disso, a sala terá a reprodução da imagem de Franchinno Gaffurius já
Baseando-se nas leis das cordas vibrantes, Mersenne (1588-1648), no seu livro
harmonia.
que determinam as frequências das vibrações das cordas. Mersenne era ao mesmo tempo
1ª Para uma determinada corda com determinada tensão, o período de vibração da corda
2ª Dado o comprimento de uma corda, o período varia como o inverso da raiz quadrada da
tensão. Em particular, quanto mais se estica a corda, mais os sons se tornam agudos.
3ª Dados o comprimento e a tensão de uma corda, o período varia como a raiz quadrada
da densidade linear do seu material; o que explica produzirem as cordas mais grossas do
1972) -- que consiste em esticar uma corda e colocá-la para vibrar, mostrando assim seus
59
harmônico, já que a freqüência emitida pela corda depende do número de nós. Por outro
corda, relacionados às várias freqüências, por sua vez associadas aos harmônicos.
que retrata os modos de vibração de uma corda vibrante, mostrando assim que ao gerar um
som, têm-se simultaneamente vários modos de vibração. Em particular ao gerar uma nota,
junto com esta tem-se cada múltiplo de sua freqüência fundamental, denominado
60
Para isto esta sala apresentaria o experimento de cordas vibrantes de Wallis
de ressonância que entram ou não em simpatia. Além disso, a sala terá uma animação com
das trajetórias não somente da matemática e da música como da interface em questão, por
61
subjacentes às diversas afinações para a escala diatônica presentes na trajetória da
XVII e XVIII, com o temperamento igual. Estabelecendo aqui um „link“ com a sala
conduz à construção de tal idéia possui estreita relação com conceito de logaritmo,
referência com a qual comparar cada uma das referidas afinações; a sala permite ao
acompanhadas das respectivas razões subjacentes, bem como comparar tais notas com
aquelas produzidas pelas razões da Série de Fourier. Para fins de facilitar a percepção
nesta sala permite ainda uma audição „em paralelo“ - por exemplo, ouvir a nota do
para todas as afinações, a nota ré para todas as afinações, a nota mi para todas as
afinações etc -, o que aclararia, por exemplo, a percepção da „quinta do lobo“ - uma
62
Temperamento e sua relação com os logaritmos acompanhado de um software que
em explicitar a relação íntima entre a Série Harmônica de uma nota musical e a Série de
experimento de Galileo (Cohen, 1984), que associa um som musical a uma forma de onda
mesmo som por meio de diferentes dispositivos: um osciloscópio que traduz no tempo a
que concerne às cordas vibrantes em duas metades, três terços, quatro quartos etc, que
aos termos parciais da Série Harmônica do som produzido pela vibração da corda inteira;
63
do usuário, por algum dispositivo sintetizador – ou ainda através de exemplos previamente
tempo, que se abre, como um arco-íris, em diferentes ondas senoidais – termos da Série de
Wallis, em que amplitudes das cordas vibram respectivamente de modo inteiro, em duas
som emitido tais como altura, intensidade e timbre, observando a repercussão em cada
relação entre freqüência emitida por uma corda tensa e comprimento, tensão e densidade
à luz das Séries de Fourier, de diferentes conceitos e situações a princípio musicais, tais
64
exclusivamente musical.
Nesta sala haverá um painel sobre a história da Série Harmônica, um painel sobre o
som e suas propriedades, mais dois painel sobre a representação sonora de Galileo e a
relação entre a Série Harmônica e a Série de Fourier acompanhada de uma bancada com
espectros. Com tal dispositivo espera-se que o visitante possa ouvir o som de um
analisador de espectros, além disso a sala terá um software no qual o visitante pode, a partir
física
por Pitágoras; emissão de duas ou mais notas que soam como uma por Arquitas (Fallas,
diretamente ao MMC entre suas freqüências (Abdunur, 1999, p.211); coincidência das
pulsações geradoras das notas em questão por Galileo (Cohen, 1984, p.90); proximidade da
etc. A fim de aclarar tais concepções, a presente sala oferece a audição simultânea de duas
65
com a sala Série Harmônica/Série de Fourier.
sideral, a sala Sons dos Planetas de Kepler apresenta a analogia entre movimento planetário
velocidade dos planetas e a freqüência de emissão de uma nota musical - segundo duas
formas:
astronômicos atuais.
audição dos sons dos planetas. Com o intuito de explorar a experiência imaginativa de
66
4.8 Sala 8: Da matemática-especulativa à matemática-empírica: uma revolução
científica na música
movimento que se opõe à tradição pitagórica segundo a qual somente números naturais por
especulativa.
a reestruturação da música teórica nesse período, que passa de uma visão matemático-
O módulo contará com dois painéis que evidenciarão aspectos relativos à tal
de estabelecer uma visão geral. O outro projetor irá expor frases e figuras dinâmicas
67
relacionadas à obra dos filósofos da ciência considerados.
âmbitos educacional e cultural. Dentre as possíveis razões para tal quadro, cabe ressaltar a
por exemplo, por professores e alunos de física e matemática, e de maneira geral, no âmbito
Uma opção para contornar tal situação é o uso de atividades relacionadas com os
música, física e matemática pode ser uma importante aliada para atingir tal público, na
Para sanar tal problema, a elaboração de uma exposição, que faz uso de tecnologias
geral faz-se pertinente, na medida em que tais relações são consideradas obscuras mesmo
para pessoas envolvidas diretamente nas áreas de matemática, física e música, que muitas
68
proporciona ao usuário a possibilidade de interagir com diversos dispositivos eletro-
relação matemática-música.
também oferecer ao público uma reflexão sobre o tema à luz de conceitos epistemológicos
museu de divulgação científica, no caso a Estação Ciência, em uma área carente de fontes,
Espera-se que esta exposição tenha como resultados a produção dos seguintes
materiais e objetivos :
material elaborado neste projeto, permitindo um alcance significativo de tal material nesse
museu mesmo posteriormente à exposição, dado que a Estação Ciência recebe regularmente
- Aprofundamento por parte da equipe deste projeto na área de divulgação cientifica das
69
relações entre matemática e música, contribuindo assim para a formação de novos
- Elaboração de paradidáticos que possam ser aplicados em escolas especialmente nas áreas
com a equipe técnica que vem desenvolvendo os materiais tem se mostrado de grande
relevância para o aprimoramento de meu trabalho de pesquisa, bem como para meu
do tema.
70
CAPÍTULO 5
IMPLICAÇÕES EDUCACIONAIS:
DIVERSIFICANDO AS ESTRATÉGIAS DE ENSINO
5.1 A física dos instrumentos musicais
pode explorar uma perspectiva relacionada ao cotidiano dos estudantes. Tal abordagem
apresentação de seminários que explorem a relação entre a física e o som produzido por
eles.
professor poderá possibilitar que os seus alunos construam uma percepção mais ampla
sobre:
corda vibrante, os modos de vibração de uma corda vibrante e sua relação com os
relação entre os comprimentos e geometria dos tubos e as frequências emitidas por eles,
71
- Os instrumentos de percussão: Por não se tratar de instrumentos melódicos os
instrumentos.
Uma possível abordagem, a ser defendida neste texto, considera que a construção
conceitual nas ciências naturais deve ser feita partindo da fenomenologia para alcançar a
ondulatória para explicar os fenômenos observados. Ou seja, modelar só faz sentido quando
se conhece o fenômeno que estamos buscando explicar. Tal discussão aparentemente óbvia
faz-se necessária a medida que grande parte dos materiais didáticos de física optaram por
estudante vivencie, antes de tomar contato com o modelo ondulatório, diversos fenômenos
72
5.3 Diversificando as estratégias de ensino
estratégias que podem colaborar com o desenvolvimento de um curso sobre este tema. Vale
ressaltar que apesar de abordar algumas estratégias de ensino o presente texto não tem a
pretensão de prescrever como deve-se ensinar acústica, mas sim colaborar com os
professores para que estes possam explorar outras estratégias e abordagens do assunto.
onda
onda (amplitude, frequência, comprimento de onda, forma de onda, entre outros). Uma
estratégia que pode ser explorada na busca deste objetivo é a utilização de um software que
agudos, com volumes maiores e menores, além de explorar uma grande diversidade de
73
a. Altura Musical
Som Agudo
Som Grave
onda. A partir dele é possível calcular a frequência do som emitido fazendo f = 1/T.
74
b. Intensidade Sonora
75
Note que entre as diferenças das ondas apresentadas acima destaca-se a amplitude
c. Timbre
Diapasão
Voz humana
76
Note que entre as diferenças das ondas apresentadas destaca-se a forma das mesmas.
relação com os modos de vibração da fonte geradora deste som. Assim pode-se conduzir os
musical produz diversos harmônicos que quando somados resultam em ondas com formas
diferentes. A diferença nas formas de onda são geradas pela amplitude de cada harmônico e
77
5.3.2 A construção de instrumentos musicais como uma estratégia de ensino de
acústica
musicais que ao serem construídos propiciam boas e simples discussões sobre ondulatória e
possível construir e explorar flautas. A discussão sobre a furação das flautas pode
esticar cordas de diferentes densidades lineares variar seus comprimentos e a tensão que a
corda está submetida. Assim pode-se explorar os conhecimentos musicais dos estudantes e
pizzas com feijões dentro, entre outros...Estes são exemplos de como pode ser simples
78
musicais e as características do som por eles emitidos. Assim explorar esta estratégia pode
Uma outra estratégia para discutir este tema envolve a realização de uma entrevista
com um músico. Uma atividade como esta pode trazer uma série de fenômenos ou
curiosidades do próprio músico sobre a natureza do som e desta forma pode ser uma boa
(fontes primárias traduzidas e/ou editadas) e/ou outros textos que remetem as concepções
por físicos matemáticos e filósofos que foram importantes para o desenvolvimento do tema.
coletivas, mas uma atividade que vale a pena aprofundar a discussão é a construção de
foram construídos pelo grupo de pesquisa “Matemática e música”do professor Oscar João
Abdounur. Segue abaixo dois exemplos de diálogos fictícios entre importantes personagens
da relação físico-matemático-musical:
Personagens:
79
1. Vincenzo Galilei (nasceu c. 1520 em Santa Maria a Monte, Toscana e morreu em 1591,
em Florença)
Zarlino: Salve Vincenzo, sto bene grazie! Faz muito tempo que não nos vemos.
Vincenzo: É verdade! Me recordo com nostalgia as aulas de teoria musical que tive com o
senhor em Veneza.
Zarlino: Eu me lembro bem dos seus questionamentos. Aliás, como vão os seus estudos
sobre a música?
Vincenzo: Têm ido bem, tenho feito experimentos com cordas, tubos e sinos para analisar
universalmente.
Vincenzo: Veja esse monocórdio.Tocando a corda solta e em seguida a mesma corda com
metade de seu comprimento, produzimos o intervalo de oitava. Mas será que a razão 1 para
80
2 também produz a oitava em tubos, copos, sinos, flautas, martelos, ou seja, em qualquer
Zarlino: Eu sou um eterno estudante das relações entre a matemática e a música e como
músico, espero um dia conhecer uma boa interpretação matemática para conceitos como
Vincenzo: Eu considero muito obscuro o tratamento pitagórico desses conceitos. Hoje, meu
pitagóricos.
Zarlino: Meu sábio colega, por que deveríamos alterar um tratamento que funciona
efetivamente há séculos?
Vincenzo: Pode ser, mas isso não implica necessariamente que a música deva se limitar a
especulações matemáticas. Por que não estudá-la sob um aspecto experimental? Que mal
faria?
81
Zarlino: Acredito que nossas observações estão de acordo com a tradição Pitagórica. O fato
de a Terra ser esférica, o mundo ter sido feito em 6 dias, e as constatações do experimento
esteja devidamente estabelecida. O que há para contestar? Por exemplo, por meio do
Vincenzo: Como?
Zarlino: Os intervalos consonantes são a oitava (1:2), a quarta (3:4), quinta (2:3) e a sexta
(4:5 / 5:6). Neste sentido com os números 1,2,3,4,5 e 6 podemos entender o conceito de
consonância.
Vincenzo: Mas se eu não estou enganado Pitágoras imaginava que seria possível explicar o
mundo somente com os números? Desta forma aos poucos tal tradição acabará incluindo os
82
Zarlino: Acredito que não... Afinal o número 6 está muito bem fundamentado: Deus fez o
mundo em 6 dias, o cubo (Poliedro Perfeito) tem 6 faces, são 6 os planetas: Saturno,
Júpiter, Marte, Vênus, Mercúrio e a Lua. Logo a consonância pode muito bem ser explicada
Vincenzo: Aparentemente seu argumento é bom, mas não passa de especulação, pois não é
apoiado em fatos experimentais. Quem garante que essa interpretação não vá mudar? Para
mim o único intervalo indiscutivelmente consonante é a oitava. Tenho dito que ela é a
rainha das consonâncias. Quanto aos outros é necessário realizar experimentos que nos
ajudem a encontrar uma maneira de classificar quais intervalos são de fato consonantes ou
dissonantes.
musicais assim como todos os fenômenos musicais. Para mim, a música é uma ciência
puramente matemática. Ela é perfeita, como o círculo, como o universo, e logo devemos
Vincenzo: Mamma mia Gioseffo! Que mal há testar nossas afirmações experimentalmente?
Zarlino: Caro Vincenzo, per me la música pode ser dividida em especulativa e prática,
sendo que a especulativa é a mais nobre. Da mesma maneira, a alma que contém o saber
supera em nobreza a praticidade do corpo, que é apenas um meio para o saber se consumar.
83
Vincenzo: Honestamente, a sua visão numerológica a meu ver é excessiva. Não acredito
que tudo possa ser explicado através dos números inteiros. Os números não são sonoros,
eles são entidades abstratas. A propriedade de reproduzir um som só pode ser atribuída a
um corpo.
Vincenzo: Me parece por seus argumentos, que inclusive já se manifestavam desde sua
obra Le istitutioni harmoniche publicada em 1558, que o senhor entendeu mal importantes
grande obra já foi publicada em 1562 em uma tradução latina feita por Gogova.
Zarlino: Como?
Vincenzo: Comecei a escrever sobre o Le Istitutioni a partir do início dos anos 70, mas a
medida em que lia as obras de Aristoxenus e de Ptolomeu traduzidas para o latim e italiano,
Tais leituras associadas a meus contatos com o grande humanista fiorentino Girolamo Mei,
desencadearam meu interesse por enveredar em um programa que visa corrigir a teoria e
Zarlino: E como isso está ocorrendo? Você escreveu mais sobre suas idéias?
84
Vincenzo: Além do Compendium, recentemente, escrevi a obra Dialogo della musica antica
et della moderna, em que exponho novas teorias sobre afinação e modos. Nessa obra eu
demonstro, por exemplo, que a afinação usada pela música vocal não é a que o senhor
defende, mas deve ser um meio termo entre a diatônica ditoniaion, com suas quintas puras e
a diatônica syntonon, com suas terças consonantes. Além disso, demonstro que os modos
Zarlino: Aguarde, pois responderei a seus argumentos em uma nova obra que escreverei em
breve. Pretendo chamá-la Sopplimenti musicali, e nela, considerarei grande parte dos
Aristoxenus e Ptolomeu.
Vincenzo: Esses meus últimos anos aprofundando sobre importantes fontes da Antigüidade,
bem como de contato com grandes humanistas tais como Girolamo me diz que, se o senhor
continuar arraigado às doutrinas pitagóricas, não conseguirá dar cabo dessa tarefa. De
qualquer forma, aguardo ansiosamente por esta obra para poder respondê-la em algo como
Zarlino: Quando não te faltar mais argumentos e você tiver respostas menos vazias para
explicar fenômenos sonoros, podemos discutir novamente sobre musica da maneira correta.
Capisci?
85
Vincenzo: Ma como? Zarlino? Quando o senhor (enfático) deixar de lado tanta especulação
mais promissores
Zarlino: De qualquer forma foi um prazer conversar com você. Espero que possamos
Vincenzo: Esperamos...
Personagens:
1. Pitágoras viveu por volta da segunda metade século VI a.C. (nasceu em Samos)
2. Aristoxenus viveu por volta do século IV a.C. (nasceu entre 375 e 360 a.C. em Tarento e
morreu em Atenas)
Aristoxenus está assistindo uma apresentação de lira, divagando ao som da música. até que
Senhor: Como é primorosa a técnica da lira! Alia com perfeição o espírito matemático com
86
Aristoxenus: Deveras. Por certo, passou anos aprimorando seus ouvidos.
Senhor: Haha, acaso insinuas que seu talento deriva pura e simplesmente do espírito
aperfeiçoamento musical. É como uma flauta tocada por débeis lábios. A música não está lá
Senhor: Estais a dizer disparates homem. Acaso nunca ouviste falar de meu nome, e de
Aristoxenus: Ah, claro, meu pai era seguidor de tuas idéias. Pobre homem. Do que adianta
saber a influência do comprimento de onda de uma corda, se você não possui o sentimento
87
Aristoxenus: Sou Aristoxenus.
Pitágoras: Ouve-se falar muito de você nesses novos tempos. Sabe-se até que eras um
Aristoxenus: Quiz conhecer outras doutrinas, como as de Aristóteles, que chegou a indicar-
me para ser seu sucessor no Liceum, fato esse que me fez ser conhecido como seu seguidor.
Tais estudos despertaram em mim outros interesses, tais como harmonia e ritmo; quis
disso, eles me levaram a escrever a obra „Sobre harmonia“, que me deu uma grande fama
para a música? Por acaso não sabes que somente as razões numéricas formadas pelos
Aristoxenus: Não nego uma certa associação da matemática com o cálculo de intervalos
musicais, mas não com a sensação auditiva. Portanto, não se pode julgar o grau de
matemáticas, mas sim pelo ouvido. Lamento, meu senhor, mas não posso concordar com
88
produzido pela razão entre a diagonal e o lado do quadrado. O meu ouvido o reconhece
como um intervalo musical. E na sua visão, o som assim produzido é um intervalo musical?
Pitágoras: Por certo que não! Uma vez que tal razão não pode ser expressa por números
inteiros, seguramente não se trata de um intervalo musical, mas apenas de um som. Isto que
dizes, por acaso, tem relação com a „suposta descoberta“ (irônico..) de um de meus
exemplo esse mesmo que me dás no momento, a razão entre o lado e a diagonal do
quadrado?
Aristoxenus: Certamente!
Pitágoras: Heresia!!!. De acordo com nossa tradição, qualquer razão sempre pode ser
expressa como razão de números inteiros. Não foi a toa que não restou outra alternativa a
incomensurávies, ou seja, que não são passíveis de ser expressas como razões de números
inteiros. E esse é o caso da razão entre o lado e a diagonal do quadrado, que pelo que me
consta, já era conhecida entre seus próprios discípulos. Não há o menor sentido em associar
intervalo musical a somente (enfático) razão de números inteiros e portanto, com natureza
discreta. Intervalo musical é uma grandeza unidimensional contínua e como tal, qualquer
89
ser julgada única e exclusivamente pelo ouvido e não pela razão matemática a ele
subjacente. Além disso, por ser contínuo, qualquer intervalo pode ser dividido em quantas
partes for necessário, diferentemente daquilo que seus discíplos pregram por aí quando
dizem que o tom não pode ser dividido em dois semitons iguais. Não somente o divido
como considero inclusive o semitom exato como unidade de medida para todos os
intervalos musicais.
Pitágoras: Heresia!! Já havia ouvido falar que teves a ousadia de ser o primeiro a desafiar
Arquitas assim como e nos platonistas, na medida em que não consideras a música como
Aristoxenus: Meu caro Pitágoras, música não se trata em absoluto de cálculos de intervalos
expressos pela razão de dois números inteiros. Admiro os seus feitos no campo da filosofia
e da matemática, mas tu deverias saber que música não pode ser reduzida a definições
matemáticas, pois é também som. Realmente, todo o conhecimento que vim a ter sobre seus
Pitágoras: Restrito? É só matemática. E para chegar a tal conclusão, não me baseei apenas
na relação entre intervalos musicais e razões matemáticas. Também descobri que para
compor um intervalo musical com outro intervalo, basta compor ou decompor a razão da
90
Pitágoras: A composição da razão a:b com b:c é a:c, o que se traduz no monocórdio em
Terceiro elemento: Deixe-me ver se bem o compreendi. Isso significa então que o
experimento realizado pelos pitagóricos com o monocórdio nos diz que não somente que às
Pitágoras: Sim!!
monocórdio dos pitagóricos consiste na ideia de que subir ou descer um intervalo musical
91
Pitágoras: Exatamente!
Aristoxenus: Vejo apenas matemática em suas teorias! Pode haver relação entre as coisas
que o senhor me coloca, mas no julgamento do som musical, não há o menor sentido em
pensar assim. A música deve ser uma disciplina autônoma, completamente separada da
aritmética e da astronomia. Não é possível mais nos tempos de hoje a música reduzir-se ao
cálculo de intervalos expressos pela razão de números inteiros, pois seu fundamento é o
som e não entidades matemáticas. Ainda que possa estar associada ao cálculo de intervalos
expressos por razões de números inteiros e que utilize como ferramenta o pensamento
de ser demonstrados; a música no que concerne à sensação auditiva não é uma entidade
matemática mas som, som musical diferentemente de ruído e de sons das linguagem falada.
para se ouvir mais precisamente e no controle a ser exercitado sobre o pensamento racional.
Intervalos são entidades puramente musicais e não razões numéricas, que quando
consonantes são dados por razões de números 1,2,3 e 4. A música consiste de sons
música deve ser construída a partir de doutrinas aristoléticas. Portanto a música não poderia
ser só matemática.
92
Pitágoras: Só matemática? Serias tu incapaz de vislumbrar a beleza divina do mundo,
expressa pelos números? Por exemplo, a distância da Terra aos planetas visíveis e ao Sol,
assim como as velocidades que os corpos celestes circundam a Terra seguem a mesma
Aristoxenus: Achei meio vago o que me diz... Não ouço esta música dos planetas. Talvez
eles estejam um pouco distantes para que meus ouvidos perceba a música deles
Pitágoras: Quer usar seus ouvidos? Ou melhor treiná-los? Pois os abra bem agora.
(gritando) TOLO!!!
áurea idêntica a que Pitágoras lhe jogou em sonho cai do seu colo.
musicais ocupam um papel tão central que se apresente aos estudante vídeos e imagens com
93
instrumentos musicais exóticos e sons que possibilitam aos estudantes entender com mais
possibilidade de solicitar aos alunos que busquem materiais para apresentar para a sala e
instrumentos musicais, pode-se explorar os vídeos e/ou os livros para analisar como
importante para abordar este conteúdo. Neste sentido segue abaixo uma lista de
explicação dos objetivos e conteúdos que podem ser abordados com a sua realização:
som. A partir de uma analogia entre a propagação de energia ao longo da mola pode-se
ondulatória do som.
94
Figura 15: Mola simulando uma oscilação longitudinal
construam e vivenciem o som produzido por um monocórdio pode ser uma boa
95
- Cordas Vibrantes: Evidenciar experimentalmente que uma corda pode ter vários modos de
vibração pode ser fundamental para a compreensão dos estudantes sobre o que é timbre.
uma cuba de ondas pode ser uma ferramenta importante. Note que com este experimento
pode-se apresentar uma série de fenômenos que ocorrem com as ondas (reflexão, refração,
Obs.: É possível construir uma cuba de ondas fazendo uso de uma vasilha transparente, um
96
5.4 A profundidade e a generalidade desta discussão
planejamento mais amplo a ser realizado pelo professor, pelo número de estudantes que tem
interesse por música e pela formação musical dos alunos e do professor. Entretanto, a idéia
central que defende-se neste trabalho é que o ensino da acústica musical permite não apenas
tratar de um dos mais importantes elementos da relação entre a cultura popular e a ciência,
deste conteúdo permitirá aos estudantes construir um amplo e rico repertório de habilidades
97
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essencialmente este trabalho buscou discutir três importantes perspectivas da
em sala de aula.
colaborar com os professores de física para que seus cursos sobre este assunto contemplem
conteúdo no Ensino Médio, já que há uma escassa produção de materiais sobre o assunto,
uma fragilidade na formação por parte dos professores e alunos, sobretudo no que diz
respeito à formação musical, uma tradição no ensino de física e nos livros didáticos de se
abordar este conteúdo superficialmente e uma grande resistência dos profissionais da área
98
Entretanto apesar das dificuldades de se discutir um tema intrinsecamente
interdisciplinar como este, vale ressaltar que esta dissertação buscou explicitar diversas
razões para se investir nisso. Dentre estas razões destacam-se a riqueza de se contemplar a
Finalmente, vale ressaltar que este texto buscou apresentar, ainda que de maneira
principal objetivo divulgar este conteúdo. Naturalmente esta discussão poderá ser
aprofundada a medida que a exposição (prevista para acontecer no início de 2011) venha a
99
7. GLOSSÁRIO FÍSICO-MUSICAL
Acorde: Em música, acorde é a escrita ou execução de dois ou mais notas simultaneamente.
Para alguns teóricos, o acorde só se forma a partir de três ou mais notas, reservando a
palavra intervalo para a execução de duas notas simultâneas. Os acordes são formados a
partir da nota mais grave, onde são acrescentadas as outras notas constituíntes.
Altura musical: Apesar do nome sugerir que a altura é uma qualidade do som relacionada
onda Sonora pelo gráfico de pressão em função do tempo ou do espaço. Assim, a amplitude
de uma onda é definida como a metade da distância de uma crista a um vale como
(português europeu) é o conjunto de acordes formado a partir das notas de uma determinada
escala. Esses acordes são extraídos de uma das quatro escalas estruturais: a maior, a menor,
a menor harmônica e a menor melódica. Também pode ser chamado de estrutura tonal visto
100
desenvolvimento do conceito de tonalidade.
consonância (do latim consonare, significando soar junto) é uma harmonia, um acorde ou
Em uma definição mais restritiva a consonância pode ser um conjunto de vibrações sonoras
dissonâncias (grupo de duas ou mais notas que criam forte tensão e se tornam instáveis ao
Frequência: Número de oscilações completas de uma onda por unidade de tempo. Uma
unidade de medida amplamente na Acústica é o “Hz” que significa ciclos/s, assim quando
se diz que um lá tem frequência de 440Hz significa que a onda sonora oscila 440 vezes por
segundo.
século XX.
101
Harmônicos: são sons individuais e puros que normalmente estão presentes nas notas em
que escutamos. Os harmônicos podem ser escutados porque uma coluna de ar ou uma
corda podem vibrar, não só como um todo, mas como duas metades, três terços, quatro
misturam com a fundamental dando impressão de ser uma única nota, porém o harmônico
Intervalos Musicais: “distância” entre duas Alturas musicais. Os intervalos podem ser
Nota: Som cuja a altura musical ( frequência da onda) é definida e pode ser identificada.
presentes nas notas musicais que escutamos. Por exemplo, a nota lá 440 Hz contém sua
oitava, 880 Hz, sua quinta composta, 1320 Hz, sua oitava dupla, 1760 Hz, sua terça
algum elemento em vibração para que esta vibração seja transmitida ao ar. A freqüência ou
altura do som produzido vai depender das características do meio vibratório (uma corda,
coluna de ar, etc); os sistemas físicos não vão vibrar de uma única forma, mas sim
timbre do instrumento.
102
Série de Fourier: Qualquer (ou quase) função periódica de freqüência f pode ser
representada como uma série de Fourier, ou seja, ser representada como a soma de funções
harmônicas de freqüência múltipla inteira de f. Uma nota musical tocada num instrumento
padrão de 440 Hz), e seus harmônicos, em proporções que lhes são características e lhes
dão a qualidade de timbre. A mesma nota tocada em instrumentos diferentes soará com
timbres diferentes pelo fato do som gerado por cada instrumento conter os harmônicos do
exemplar de instrumento. Assim, por exemplo, o som produzido por uma clarineta contém
quase que somente harmônicos ímpares, enquanto numa flauta praticamente apenas o
O som que ouvimos depende apenas da intensidade relativa de cada componente, e não
depende das fases de cada componente. Assim, formas de onda muito diferentes, geradas
Timbre: Característica do som que permite que se diferencie o som emitido por diferentes
por sua vez é consequência de cada instrumento apresentar modos de vibração com
amplitudes distintas.
103
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABDOUNUR, OSCAR J.; ADDONO JR, A.A.; PEREIRA, A.A.; PEREIRA, R.A.;
PRADO, L.A.G., A relação matemática-música no renascimento: uma abordagem
histórico-epistemológica. Trabalho apresentado no X Seminário de História da Ciência.
Belo Horizonte, 2005.
COHEN, H. F. Quantifying music. The science of music at the first stage of the
Scientific Revolution, 1580-1650. Dordrecht: D. Reidel Publishing Company, 1984.
104
DOSTROVSKY, S. Early Vibration Theory: Physics and Music in the Seventeenth
Century. Archive for history of Exact Sciences, XIV,1975,169-218 pág.
DOURADO, A.H. Dicionário de termos e expressões da música. São Paulo: Ed. 34,
2004.
JEANS, J. Science & Music. Cambridge, England: Cambridge University 1937; reprinted,
Dover, New York, 1968.
105
KEPLER, JOHANNES. Ioannis Keppleri Harmonices Mundi libri V. Frankfurt A.M. et
Erlangæ Heyder & Zimmer, 1619, Vol. V.
KUHN, THOMAS S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Editora Perspectiva,
1978.
MENEZES. L. C. Rever o quê, mudar por quê. Revista Acesso, Revista Acesso: revista
de educação e informática, n.14, São Paulo: FDE, dez. 2000, pág. 29-34.
MILLER,D.C. Anedoctal History of the science of sound to the Beginning of the 20th
Century. New York: Ed. Macmillan, 1935, 114 pág.
OLSON, H.F. Musical Engineering. New York : McGraw-Hill, 1952, 369 pág.
106
RIBEIRO, A. A. UAKTI: um estudo sobre a construção de novos instrumentos
musicais acústicos. Belo Horizonte: Editora. C/Arte, 2004.
STANLEY, S. Dicionário Grove de Música: edição concisa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 1994, 1048 pág.
TAYLOR C.A. The Physics of Musical Sounds. Londres: English Universities Press,
1973.
WISNIK, J.M. Som e o sentido: uma outra história das músicas. São Paulo: Círculo do
Livro, 1989.
ZARLINO,G. Sopplimenti musicali del R.M. Venetia: Mastro di cappella della sereníssima
signoria di Venetia,1588.
107