Guerrilha Do Araguaia
Guerrilha Do Araguaia
Guerrilha Do Araguaia
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7325-2768
Orcid: https://orcid.org/0000-0002-3482-2622
RESUMO:
Na primeira metade da década de 1970, as operações militares para exterminar os focos de
guerrilha na região do Araguaia tiveram como consequência mais que o desaparecimento de
cerca de 70 integrantes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Entre as ações relatadas
pelos camponeses do Araguaia, encontra-se a expulsão de centenas de famílias de suas posses.
As terras foram tomadas pelas Forças Armadas e distribuídas para terceiros em prejuízo aos
camponeses. Assim, esse trabalho possui como objetivo principal (i) examinar a extensão da
área em que os militares e a repressão atuaram no episódio histórico conhecido como
Guerrilha do Araguaia, (ii) bem como a área de terras retirada dos camponeses durante a
ditadura civil militar brasileira. Para efeitos metodológicos, tratar-se-á de uma pesquisa
qualitativa, a partir de entrevistas, revisão bibliográfica e reconstituição histórica. No que
1
Jornalista, mestre em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo. Atuou em jornais em
São Paulo e interior como diretor de redação, editor executivo, colunista, editor e repórter ; assessor de
imprensa em sindicatos, empresas e autarquias. Autor dos livros Cativeiro sem fim (2019), Depois da Rua
Tutoia (2016), No Gravador (2003). Integrante dos livros O Conto Brasileiro Hoje, Vol.5, (2007) e Contos e
Casos Populares (introdução de Paulo Freire), 1984. E-mail: [email protected] -
Ark:/80372/2596/v9/015
2
Advogada, pesquisadora, especialista em Direito Público (Damásio Educacional). Mestranda em Prestação
Jurisdicional e Direitos Humanos (ESMAT/UFT). E-mail: [email protected] -
Ark:/80372/2596/v9/015
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ABSTRACT:
In the first half of the 1970s, military operations to exterminate guerrilla centers in the
Araguaia region resulted in more than the disappearance of around 70 members of the
Communist Party of Brazil (PCdoB). Among the actions reported by Araguaia peasants is the
expulsion of hundreds of families from their possessions. The lands were taken by the Armed
Forces and distributed to third parties to the detriment of the peasants. Thus, this work has as
main objective (i) to examine the extent of the area in which the military and repression acted
in the historical episode known as Guerrilha do Araguaia, (ii) as well as the area of land taken
from peasants during the civil military dictatorship Brazilian. For methodological purposes, it
will be a qualitative research, based on interviews, literature review and historical
reconstitution. Regarding the results, we found that the process of deterritorialization of the
peasant population is an ignored step within the reparatory axis of the so-called Brazilian
transitional Justice.
KEY WORDS: Araguaia Guerrilla. Peasants. Expulsion from Land. Military Operations and
Memory.
1. INTRODUÇÃO
As ações militares para exterminar os focos de guerrilha estabelecidos em
diferentes pontos da região às margens dos rios Araguaia, Tocantins e Xingu, dentro do
perímetro abarcado por Marabá/PA e Araguaína/TO, são amplamente conhecidas por
significarem o maior conjunto de operações ocorrido no país e o segundo maior agrupamento
militar, ficando atrás somente do contingente que atuou na segunda guerra mundial. Estas
ações foram implementadas entre os anos de 1972 a 1975. Durante a denominada Guerrilha
do Araguaia, cerca de 70 integrantes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) foram
perseguidos, presos, torturados e mortos. Apesar das tratativas administrativas e judiciais por
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parte dos familiares, com o objetivo da localização e identificação dos corpos, para que
possam praticar as devidas homenagens fúnebres, até o momento, o intento não obteve êxito.
No âmbito da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), quatro
conselheiros foram substituídos pelo governo federal liderado por Jair Messias Bolsonaro, que
entendeu haver a necessidade de integrar membros militares e alinhados a partidos de direita à
CEMDP. Essa medida corrobora a frustração dos familiares.3
Mediante pesquisas bibliográficas e documentais, sobretudo entrevistas com
camponeses que viviam na região e foram atingidos pelos atos praticados durante a guerrilha,
foi revelado que as ações persecutórias atingiram centenas de famílias campesinas. Houve
muitas perseguições, monitoramento de indivíduos, prisões, torturas, desaparecimentos e
mortes tratadas oficialmente como suicídio, a exemplo do ocorrido com Lourival de Souza
Paulino4. Dentre as diversas ações suportadas, uma, em particular, chama a atenção em
virtude do significado na vida campesina e da importância identificada durante as oitivas: a
expulsão de suas terras.
A partir dessas oitivas foi identificado que as operações militares na região
expulsaram centenas de famílias de agricultores de suas terras, tomaram as glebas e entregou-
as para empresas, garimpeiros e pessoas afetas aos militares que atuaram nesta região. Essas
ações foram amparadas pelo invólucro da legalidade e da reforma agrária. Nesse sentido
possuímos como objetivos principais (i) identificação e exposição das tratativas praticadas
pelas Forças Armadas (FFAA), locais de atuação, datas e objetivos traçados pelo estado a
partir dos conteúdos extraídos dos documentos militares tornados oficiais a via recepção,
análise e inclusão no Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV) e, (ii)
3
BRASIL. Lei nº 9.140, de 4 de dezembro, 1995. Reconhece como mortas desaparecidas em razão de
participação, ou acusação de participação, em atividades políticas no período de 2 de setembro de 1961 a 15 de
agosto de 1979 e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/>. Acessado em 30 de
maio de 2013.
Bolsonaro muda Comissão de Mortos e Desaparecidos em meio a ataques sobre o tema. Questionado sobre os
motivos que conduziram a substituição de Conselheiros da CEMDP, o presidente Bolsonaro respondeu “o
motivo é que mudou o presidente, agora é Jair Bolsonaro, de direita. Ponto final. Quando eles (governos
anteriores) botavam terrorista lá, ninguém falava nada. Agora mudou o presidente. Igual mudou a questão
ambiental também. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/08/bolsonaro-muda-comissao-de-
mortos-e-desaparecidos-em-meio-a-ataques-sobre-o-tema.shtml. Acessado em 24 de fevereiro de 2022.
4
MPF denuncia médico do Exército suspeito de fraudar laudo de morte no Araguaia.
<https://oglobo.globo.com/politica/mpf-denuncia-medico-do-exercito-suspeito-de-fraudar-laudo-de-morte-no-
araguaia-22756249>. Acessado em 24 de fevereiro de 2022.
Irmãs recebem sobrenome do pai após 40 anos depois de sua morte no Araguaia.
<https://vladimirherzog.org/irmas-recebem-sobrenome-do-pai-40-anos-depois-de-sua-morte-no-araguaia/>.
Acessado em 24 de fevereiro de 2022.
Caso Gomes Lund e outros (“Guerrilha do Araguaia”) x Brasil. <https://reubrasil.jor.br/julia-gomes-lund-e-
outros-guerrilha-do-araguaia/>. Acessado em 24 de fevereiro de 2022.
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identificação e quantificação de parte das áreas tomadas dos camponeses do Araguaia a partir
da oitiva de 100 pessoas.
A partir desse ponto, o trabalho percorre ações suportadas por camponeses
locais, em especial, a expulsão de suas posses e a dimensão territorial suprimida do
campesinato em benefício do Estado e/ou dos agentes por ele determinados em detrimento do
trabalho na terra e sustento campesino local. Torna-se pertinente enfatizar, antecedendo os
itens propostos, que havia um grande fluxo migratório na região do Araguaia, justamente em
face das dinâmicas econômicas do período.
Para efeitos metodológicos, tratar-se de uma pesquisa qualitativa, a partir de
entrevistas, revisão bibliográfica e reconstituição histórica. Nesse sentido, além da pesquisa
bibliográfica e documental, serão apresentadas narrativas decorrentes de pesquisa local como
produto dos contatos realizados. As entrevistas com os moradores locais foram coletadas entre
os anos de 2012 a 2015, com o objetivo principal de servirem, inicialmente, como
embasamentos e elementos probatórios em processos de reparação judicial.
Cumpre sublinhar que as pesquisas integram trabalho em andamento cujos
objetivos envolvem o resgate da memória e verdade, precisamente visando o lastro probatório
quanto aos prejuízos suportados por esse grupo, entre demais temas afins à luz das vivências e
realidades campesinas.5
5
As oitivas dos camponeses do Araguaia foram feitas na região, diretamente por Irene Gomes e equipe, na
condição de advogada de inúmeros camponeses e ex-combatentes. Inicialmente, tinham objetivo de instruir
requerimentos de anistia que tramitam/tramitavam em seus nomes na Comissão de Anistia quando ainda no
Ministério da Justiça.
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Sete anos depois, em 1904, foi descoberta zona de borracha e a área começou a
receber homens em busca do caucho (Figueira, 1986, p.16). O fluxo migratório aumentou e
em 1911 a população dessa região chegava a 11 mil pessoas. Em 3 de novembro de 1908,
Conceição do Araguaia foi elevada a vila. Os problemas e disputas sempre marcaram a
região. No ano de 1909, a vila fora invadida pelo coronel maranhense Leão Lêda, que junto
com seus homens, dominaram o local. Antes, Lêda já subjugara as cidades de Boa Vista e
Pedro Afonso, ambas em Goiás.
A crise do mercado de borracha fez a população declinar a partir de 1940. Em
todo município, o censo do governo federal registrava 4.715 pessoas. Ao mesmo tempo,
demandas originadas na Segunda Guerra Mundial tornaram a borracha produto altamente
rentável, o que fez crescer novamente o fluxo migratório à região. O censo mostra que em
1950, a população na cidade saltara para 6.322 pessoas.
De acordo com o professor Ricardo Rezende Figueira, no livro “A justiça do
lobo – posseiros e padres do Araguaia” (1986), para que se possa compreender a
complexidade do caos fundiário da região, os conflitos pela posse e uso da terra, as violências
e as mortes, é necessário recordar uma doação feita para a Fundação Brasil Central (FBC),
realizada pelo governo estadual do Pará.
Era o ano de 1945, quando o interventor federal no Pará, coronel Magalhães
Barata, cedeu para a FBC cerca de 50 milhões de hectares, situados na margem esquerda do
Araguaia para dentro dez quilômetros, equivalente a área com 500 mil quilômetros quadrados,
o que significa o território da Espanha ou duas vezes o do Reino Unido.
A Fundação não demarcou ou realizou qualquer benfeitoria nas terras
gigantescas. Em 1961, o governador Moura Carvalho anulou a doação, através da lei nº 3.196.
Mas não considerou anulados judicialmente registros imobiliários de 35 glebas, que
totalizavam 152.000 hectares. Estavam no nome de Yasohati Tokuda. Para piorar a situação, o
próprio governo paraense expediu títulos provisórios e de aforamento, o que se sobrepôs às
determinações anteriores. Isso provocou muitos e ininterruptos problemas, uma vez que
famílias já estavam assentadas nas glebas como posseiros antigos (Figueira, 1986, p.20).
De todo modo, os conflitos ficavam isolados e perdidos no interior paraense,
que só veio se conectar, via rodovia, com o restante do Estado em 1960, com a conclusão da
BR-153, rodovia Belém-Brasília. Para se ter ideia dos problemas do isolamento local, uma
viagem entre Belém e Conceição do Araguaia, por meio fluvial, demorava em média quatro
meses.
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ocupação de terras no meio da floresta amazônica, de fundo religioso. História oral que corria
e corre ainda na região é que Padre Cícero havia previsto que para o homem se salvar seria
necessário atravessar o Rio Araguaia em busca da Bandeira Verde, terra da promissão e
esperança. Os migrantes teriam de enfrentar a era do Capa-Verde, príncipe maligno. Seria
travada uma disputa, uma grande guerra, e as forças do bem iriam prevalecer (Carvalho,
2014).
Eram famílias inteiras nordestinas, que buscavam escapar da seca e da fome,
em busca de terras e prosperidade nas matas do sudeste do Pará. Todos nascidos maranhenses,
piauienses, baianos, cearenses e até capixabas e mineiros. Boa parte dessas famílias já havia
passado pelo Estado de Goiás, onde trabalhava como assalariada em fazendas.
Durante o período da guerrilha do Araguaia, pelo menos até 1972, a presença
federal nesta região tinha o objetivo de recolher impostos ou para promover a repressão na
região. Contudo, o caos diário, violência e injustiça já atingiam níveis enormes, fora de
controle. O controle militar se ampliara em 1971, através do decreto-lei 1.164, de abril, que
transferiu para a União terras numa faixa de cem quilômetros de cada lado das rodovias
federais que cortavam a região do Araguaia. Esse procedimento possibilitou ao governo
militar maior intervenção nessas terras.
As vias de acesso terrestre eram a Transamazônica – atual BR-230 –, a Belém-
Brasília – BR-010, a PA-70 – atual BR-222, que faz a ligação entre Belém, Brasília e Marabá;
além de três estradas operacionais (OP1, OP2 e OP3) abertas pelo Exército durante o período
da guerrilha.
O processo de ocupação do baixo Araguaia pode ser assim resumido: Até
1960, era uma área praticamente inabitada, com a presença de índios. Nesse ano foi criada a
vila de Itaipavas, às margens do Araguaia. No início da década de 1970, a vila se transformou
no ponto mais importante no norte do município de Conceição do Araguaia. Nessa localidade
havia uma serraria que beneficiava madeira para exportação, principalmente o mogno.
Mais abaixo, descendo o rio, ainda nos anos 60, surgiu a vila de São Geraldo,
com base na exploração de castanha e dos garimpos de cristal. O governo estadual não
implantou projeto de colonização. A situação ficou tão difícil que as pessoas acabaram sendo
retiradas à força da região, expulsas com a ajuda dos militares. Conforme Figueira:
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o aniquilamento total do inimigo e todo seu entorno. Cujo objetivo é reprimir definitivamente
a mobilização de qualquer setor da sociedade que esteve em contato e cooperou com o
chamado “inimigo” ou “subversivo”.
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6
A Operação Limpeza aconteceu no decorrer de 1975 e estendeu-se por vários anos. No primeiro e mais intenso
momento (1975), cumpriu o papel de retirar de toda a área de atuação, corpos, objetos ou qualquer elemento que
pudesse chamar a atenção para o acontecido. Na sequência, houve visitas e monitoramentos constantes
direcionados aos camponeses locais com o objetivo de colher informações sobre a existência de grupos ou
pessoas interessadas naquele evento histórico e a continuidade das ameaças a si e aos familiares em caso de
contarem sobre o que viram e ouviram (Ministério Público Federal do Pará identificou tais ações até 2001).
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Quadro II – Suma dos municípios, vilas, lugarejos e demais localidades onde as FFAA atuaram
Qt Locais Qt Locais Qt Locais
1 8 Barracas 39 Duas Passagens 76 Pau Preto-Mutum
2 Abóbora 40 Entroncamento 77 Pernambuco
3 Albertino 41 Esperancinha 78 Ponte Sena
4 Alvo (Chega com Jeito), 42 Estrada da Serraria 79 Região da Cigana,
5 Apinajés, Marcelinense 80 Regiões do Vale do
6 Araguaína 43 Estreito Saranzal
7 Araguanã 44 Faveiro 81 Remanso dos Botos
8 Araguatins 45 Fazenda 82 Rio Saranzal
9 Área limítrofe do estado do 46 Fazenda Pernambuco 83 Rio Xambioá
Pará 47 Formiga 84 Santa Cruz
10 Axixá 48 Fortaleza 85 Santa Tereza
11 Bacaba 49 Gameleira I 86 São Domingos do
12 Boca do Caiano 50 Gameleira II Araguaia
13 Bom Jesus 51 Gameleira 87 São Domingos do
14 Brejo Grande 52 Gameleirinha (Alto da Capim,
15 Cachimbeiro Gameleira) 88 São Geraldo do
16 Cafezeira 53 Goiás e Maranhão ao Araguaia
17 Caiano norte do Pará 89 São João do Araguaia
18 Castanhal da Viúva 54 Grota Vermelha 90 São João
19 Calixto (Mutum) 91 São José I
20 Casa de Alandrine 55 Igarapé dos Perdidos 92 Serra das Andorinhas
21 Casa do Manoel de Freitas 56 Imperatriz 93 Serra Rica
22 Castanhal da Viúva 57 Indústria Madeireira 94 Seruco
23 Castanhal do Alexandre e 58 Paraense Ltda 95 Sítio da Viúva
24 Zé Ferreira 9 Itamirim 96 Sítio do Pedrão
25 Castanhal do Getubino 60 Jabotiara 97 Sítio Paulista
26 Castanhal do João de 61 José Novato, 98 Sobra de Terra
Aquino 62 Km 72 da 99 Some Home
27 Castanhal do Noleto Transamazônica 100 Sul da Serra das
28 Castanhal do Oswaldinho 63 Limpeza Andorinhas (Pau Preto)
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Fonte: “Operação Araguaia – os arquivos secretos da guerrilha” (2005) e Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV).
7
O município de Conceição do Araguaia abarcava área geográfica posteriormente dividida em 5 municípios.
Xinguara foi criada em 1982.
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exceção de Xambioá que foi tomada quase por completo em virtude de comportar base
Militar ali instalada e permanente durante todo o período de combate (1972 a 1975).
O mapa abaixo permite a identificação do perímetro da guerrilha do Araguaia
considerando as conclusões geradas pelas pesquisas, à saber:
Importa esclarecer que a demarcação do perímetro acima descrito não carrega
precisão matemática. Os levantamentos, conforme já exposto, tomaram como base
documentos militares, depoimentos de camponeses que vivenciaram a guerrilha e informações
prestadas por José Genoíno Neto, além de informações contidas na bibliografia lida e
analisada neste trabalho. O conjunto dessas informações conduziu ao resultado apresentado
com base nas seguintes considerações:
Dessa forma, a área total atingida pelas atividades das Forças Armadas durante
a Guerrilha do Araguaia, seja no sentido de controle, vigília e/ou combate abarca o total de 13
municípios expostos no quadro abaixo.
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milho, mandioca. Fazia farinha numa casinha”, explica Moraes. A terra que ele e família
composta por 11 pessoas trabalhavam tinha cerca de 50 alqueires.
Um dos filhos de Euclides, com seu mesmo nome, relata que o pai foi preso
pelos militares no dia 1º de novembro de 1973:
O camponês conta ainda que o pai passou por várias sessões de tortura, entre
elas o telefone, quando a vítima recebe fortes tapas simultâneos nos ouvidos. “Aquilo tinha
vez que espancava que o sangue descia”, complementa outro filho de Euclides, Ladiel Martins
de Moraes. Euclides pai ficou preso sem nenhum contato com a família por 30 dias. Esteve
confinado num barraco onde não tinha acesso ao sol. Num determinado dia foi transferido
para uma base do Exército em Araguaína, onde permaneceu preso mais 29 dias.
Recebeu tanta tortura, reclamam os filhos, que não conseguiu mais trabalhar.
“A lembrança que nóis tinha é porque ele era saudável, quando ele foi preso. Depois de preso
ele ficou sem poder trabalhar e foi indo até a morte. Ele morreu dia 20 de setembro de 2002”,
relata Ladiel. Os filhos dizem que Euclides era uma pessoa alegre, divertida. Depois ficou
triste, totalmente diferente. Além da prisão do pai, foram expulsos de suas terras.
Outro camponês que teve as terras expropriadas pelo Exército no Araguaia é
Vicente Pedro da Silva. Ele foi preso em 1972. Passou pelas bases militares de Bacaba e
Araguaína. Sofreu muita tortura. Diz que ficavam muitos dias sem comer, presos nus dentro
de um buraco no chão. Quando deixaram os presos sair do buraco na base de Bacaba,
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apelidado de Vietnã, “teve gente que saiu procurando dentro dos tambor de lixo, procurando o
que comer”, conta em meio a lágrimas. Toda vez que recorda sobre o que passou na prisão
nos anos 70, diz a esposa Creuza Ribeira Alves Rocha, Vicente se emociona e chora muito.
Durante a entrevista, a mulher tenta acalmá-lo para prosseguir a história.
O agricultor morava com a família em Brejo Grande, numa casinha coberta por
palha, numa gleba com 20 alqueires. Hoje, continua na mesma região. Ele conta que os
soldados do Exército invadiram a moradia durante a madrugada, enquanto ele estava
dormindo. “Tava dentro dois soldado, aí armado, aí me chamaram pra ir com eles até a
Bacaba. Aí eu pedi pra mim vestir uma roupa, que eu tava só de short. Aí eles disse ‘pode
vestir’. Eu vesti uma roupa e calcei um chinelo e fui com eles”, relembra.
Aponta que ao chegar na base de Bacaba foi jogado dentro do buraco-prisão, o
Vietnã. Mas não falaram a razão da prisão. “(Na base de Bacaba) Era tudo molhado de urina
dentro do coisa. Não tinha banheiro. Era homem demais dentro do coisa, era tudo nu. Era
demais, era gente demais, homem demais. E sem comer!”
Mesma violência é relatada por Angelo Lopes de Souza, que morava com a
esposa Ione Gomes Tavares, que trabalhavam em 22 alqueires de terra. Lá plantavam
mandioca, milho, arroz, feijão, abóbora e laranja. “Era uma vida tranquila mesmo! Graças a
Deus”, diz Angelo. Mas, “aí, de repente chegou... Surgiu essa conclusão de me pegar e de me
carregar eu”, reclama. Entre as torturas que sofreu, diz que levou muitos socos, pontapés. “O
cabo dava era de botina nas costela da gente! Eu me queixo ainda que, eu fiquei com uma dor
nesse quarto”, apontando para as costas.
Adão Rodrigues Lima, camponês que vivenciou a Guerrilha do Araguaia
afirma, conforme seu requerimento de anistia e o voto de Frederico Lopes na Comissão de
Anistia, no Ministério da Justiça:8
“[...] Perdi tudo, fiquei sem nada e até hoje vivo doente
sem poder trabalhar. Nunca mais arrumei o que tinha na
época que era saúde e terra para trabalhar. Então eu
peço que tenham compaixão dos torturados da Guerrilha
8
A Comissão de Anistia foi criada por força da lei 10.559/02 que regulamentou o art. 8º dos Atos das
Disposições Constitucionais Transitórias da CF/88. Até o dia 1 de janeiro de 2019 funcionou dentro do
Ministério da Justiça (MJ) e vinculada, diretamente, ao Gabinete da Presidência da República, posteriormente foi
inserida no criado Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos (MDH). Cumpre o papel de assessorar o
Ministro da pasta onde está localizada, com a análise e manifestação de voto quanto a declaração da condição de
anistiado político e as reparações decorrentes.
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A Batalha dos Perdidos ocorreu em outubro de 1976, na sequência da Guerrilha do Araguaia, situada dentro do
perímetro da guerrilha, ás margens do Rio Araguaia pelo lado do Pará. Tratou-se de um confronto entre
camponeses locais, INCRA e policiais locais. Após o confronto houve a atuação das FFAA que temiam tratar-se
de um novo levante dos mesmos atores da Guerrilha do Araguaia. No entanto, o confronto tinha como foco a
briga pelas posses de terra.
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localização das terras não interfere na apuração aqui proposta, uma vez que inseridas na área
de atuação das FFAA.
Quanto à dimensão das terras, para efeito desse trabalho, com base na área
mencionada com maior frequência, foi arbitrado 20 alqueires para cada camponês, conforme
quadro abaixo.
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Quadro VI
Cidade/País Área em km2 Equivalência
Paris 105,40 km2 1 vez
Cuba 109,80 km2 1 vez
República Dominicana 48,40 km2 Quase 2 vezes
São Caetano do Sul (SP) 15,30 km2 6 vezes
Osasco (SP) 64,09 km2 1 vez e meia
Aracaju (SE) 181,90 km² Metade da área
Olinda (PE) 41,68 km² Mais de 2 vezes
Suíça 41,20 km² Mais de 2 vezes
Lisboa (Portugal) 100 km² 1 vez
Florença (Itália) 102 km² 1 vez
Montevideo (Uruguai) 200,70 km² Metade
Fonte: IBGE/Prefeituras locais/ONU
7. CONCLUSÃO
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8. BIBLIOGRAFIA
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“bandeiras verdes” na romaria do Senhor do Bonfim em Araguacema (TO).
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POLIFONIA REVISTA INTERNACIONAL DA ACADEMIA PAULISTA DE DIREITO N. 9 NOVA SÉRIE 2022 OUTONO/INVERNO
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