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Organização Comitê Científico

Double Blind Review pelo SEER/OJS

Recebido em: 26.11.2017

Aprovado em: 30.12.2017


Revista de Direitos Sociais, Seguridade e Previdência Social

EMPODERAMENTO DO PODER JUDICIÁRIO NAS QUESTÕES AFETAS A


SEGURIDADE SOCIAL: INCREMENTALISMO OU INTERPRETAÇÃO
CONSTITUCIONAL EVOLUTIVA EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA

Viviane Freitas Perdigao Lima


Renata Caroline Pereira Reis Mendes**

RESUMO: O estudo parte do empoderamento do juiz nas inúmeras possibilidades


interpretativas da Constituição, analisa política pública e precedentes do judiciário no direito à
aposentadoria. O referencial teórico pauta-se em um Judiciário ao substituir políticas públicas
do Poder Executivo e Legislativo (BAUM, 1987) na proteção dos riscos sociais o faz numa
análise cautelosa da Constituição sem causar grandes rupturas (BARAK, 2002; ARAÚJO,
2017). Metodologicamente foca-se na dinâmica de proteção social, interpretação
constitucional, Projeto Expedição da Cidadania, Resp n.º. 1.352.721-SP e Resp n.º
1649636/MT. Verifica-se postura judicial incrementando a constituição ao primar a
solidariedade social.

Palavras-chave: Empoderamento. Poder Judiciário. Estado Constitucional. Direito


Previdenciário. Interpretação Constitucional.

EMPOWERING THE JUDICIARY POWER IN THE ISSUES AFFECTED SOCIAL


SECURITY: INCREMENTALISM OR CONSTITUTIONAL INTERPRETATION IN
PREVIOUS MATTERS

ABSTRACT: The study starts from the empowerment of the judge in the innumerable
interpretative possibilities of the Constitution, analyzes public politics and precedents of the
judiciary in the right to retirement. The theoretical framework is based on a Judiciary, replacing
the public policies of the Executive and Legislative Power (BAUM, 1987) in the protection of
social risks, which is done in a cautious analysis of the Constitution without causing major
disruptions (BARAK, 2002; ARAÚJO, 2017). Methodologically focuses on the dynamics of
social protection, constitutional interpretation, Citizenship Expedition Project, Resp. 1. 352.721
and Resp n.º. 1.649.636/MT. Judicial posture is increased by increasing the constitution by
giving priority to social solidarity.

Keywords: Empowerment. Judicial power. Constitutional State. Social Security Right.


Constitutional interpretation.


Viviane Freitas Perdigão Lima. Mestra em Direito pelo programa Direito e Instituições do Sistema de Justiça
da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Professora da Universidade Estadual do Maranhão. Advogada.
http://lattes.cnpq.br/7955567083507463.
** Renata Caroline Pereira Reis Mendes. Mestra em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal do
Maranhão. Professora do Instituto Florence de Ensino Superior (IFES). Advogada.
http://lattes.cnpq.br/4649996800991390.

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1 INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira na contextura presente conta com um Legislativo e Executivo


que representa muito pouco da vontade popular aliada a uma pirâmide social demasiadamente
injusta e uma Constituição com uma feixe aberto clamando para ser implementada. Assim,
busca como cajado da sociedade o Poder Judiciário. Juízes são chamados a afirmar direitos que
nem sempre são efetivados pelos poderes majoritários.
A coerência sobre o poder dos juízes não passa ilesa pelo exame de temas como
legitimidade democrática, controle de constitucionalidade das leis, exercício da jurisdição
constitucional contramajoritárias e teorias interpretativas para conceder maior objetividade as
decisões judiciais. Entretanto, a experiência brasileira elevou o juiz como ator do processo
democrático.
A partir da Constituição de 1988 o ofício do Poder Judiciário passou e continua
passando por profunda transformação. Aliado as transformações desta instituição a sociedade
brasileira busca, ainda que tardiamente, a concretização da democracia. Este é o perfil que os
juízes encontram em sua atividade interpretativa: uma Constituição apta a concretizar direitos
fundamentais, ferramentas jurídicas (controle difuso de constitucionalidade) e grupos
minoritários débeis de direitos.
Sobre a necessidade de proteção social, um em cada quatro brasileiros que vive no
campo está em situação de extrema pobreza. Segundo dado extraído do Censo Demográfico de
2010 a incidência da extrema pobreza no meio rural é de 25,5%. E os índices não refrescam no
que tange a agenda rural. Mais da metade da população rural tem até quatro anos de estudo e a
taxa analfabetismo é de 20% enquanto 7,7% no meio urbano. (BRASIL, 2013).
A proposta da Constituição de 1988 é garantir igualdade de acesso a direitos entre
urbanos e rurais quanto à proteção aos riscos sociais. A contribuição dos benefícios
previdenciários é, de fato, de grande valia na manutenção de renda da população idosa e tem
contribuído para parcela da população se situe acima da linha da pobreza.
Assim, a expansão da política previdenciária, a partir de 1991, contribuiu para que uma
grande massa de trabalhadores, sobretudo os rurais pudessem se aposentar com um benefício
equivalente ao valor do salário mínimo. Os benefícios do setor representam um autêntico
programa de renda mínima para os idosos residentes na área rural.

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Nesta agenda, nem sempre tais direitos são garantidos admnistrativamente. Assim,
converge em maior litigiosidade gerando um empoderamento do Judiciário, também, em
matéria previdenciária.
O presente estudo tem por objetivo salientar o empoderamento do Poder Judiciário nas
questões afetas a Seguridade Social e se tal situação representa uma evolução da interpretação
constitucional. Para tal, tem-se como escopo a àrea previdenciária que não passa incólume ao
mesmo tempo ao discurso deficitário e ferramenta de implantação de efetiva democratização
social no Brasil.
A relevância científica do estudo paira na hipótese de que as posturas do Judiciário
(em políticas públicas ou atividade julgadora) em fins de seguridade social podem ser
avisinhadas às discussões das teorias interpetativas constitucionais. No que tange ao enlevo
social, o Poder Judiciário ao garantir direito à aposentação efetiva direito social agregando a
grupos minoritários (segurados especiais) a ideia de progresso social ou seja, o alcance do
desenvolvimento como um processo em que não haja mais lugar para limitação de capacidades
individuais que impeçam o bem-estar dos seres humanos.
Como hipótese estuda-se atuação em políticas públicas do Judiciário, no chamado
projeto Expedição da Cidadania e precedentes do Superior Tribunal de Justiça referente à
proteção de direito social à aposentadoria do segurado especial nos Resp nº. 1.352.721-SP
(comprovação da atividade rural) e Resp n.º 1649636/MT (tamanho da propriedade rural).
O trabalho inova ao trazer para o campo dos precedentes e ações políticas do Poder
Judiciário em matéria previdenciária a discussão dos limites da atividade julgadora do juiz.
Assim, o estudo reflete que o direito previdenciário também está dentro de um contexto de uma
Constituição como resultado de um processo aberto, onde diversos intérpretes podem atuar na
construção plural do texto podendo funcionar tanto como limite quanto incentivo ao poder
criativo do juiz.
O referencial teórico pauta-se em um Judiciário que ao substituir políticas públicas do
Poder Executivo e Legislativo (BAUM, 1987) na proteção dos riscos sociais o faz numa análise
cautelosa da Constituição sem causar grandes rupturas (BARAK, 2002; ARAÚJO, 2017).
Como linha metodológica apresenta-se a weberiana, afastando-se das categorias
sociológicas macroestruturais e utilizando-se o recurso do tipo ideal, para o compromisso
explícito com a análise empírica do real. É de relevância ímpar que a realidade não possui um
sentido intrínseco ou único, visto que são os indivíduos que lhe conferem significados. Assim,

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sítios eletrônicos do STJ, Associação dos Juízes Federais, Conselho Nacional de Justiça e
revisão bibliográfica fazem parte do arcabouço metodológico.
O texto está dividido em três seções: a primeira traz reflexões sobre a dinâmica da
proteção social em tempos de mundança no Brasil, sobretudo, uma breve análise da evolução
da ideia protetiva alcançando os debates doutrinários da PEC n.º 287/16. Na segunda, focará no
empoderamento do Poder Judiciário no que tange à sua atividade julgadora e seus reflexos .
Observa-se que projeto social e precedentes do Poder Judiciário mesmo que representem uma
intensa atividade judicial substituindo políticas públicas de outros poderes apresenta um
incrementalismo/evolucionismo constitucional em matéria previdenciária primando pela
solidariedade social.

2 A DINÂMICA DA PROTEÇÃO SOCIAL EM TEMPOS DE MUDANÇAS

A inquietação com os infortúnios da vida é uma constante na humanidade. O homem


tem se adaptado, desde os tempos antigos, no eixo de reduzir os feitos das adversidades da vida
como doença, velhice. Ibrahim (2011) afirma que a verdadeira proteção social nasceu na
família. Acontece que nem todas as pessoas eram dotadas de tal proteção familiar e mesmo
quando existia era precária. Daí nasce a necessidade de auxílio externo, com natureza
voluntária de terceiros, encabeçada pela igreja e mais tardiamente, o Estado, no século XVII,
por meio da Lei dos Pobres.
Reduzida a mera caridade, naquele início, os infortúnios da vida aparece como algo
desvinculado da ideia de justiça. A ajuda a pobres e necessitados era entendida após uma
concepção de que a pobreza era vista como algo necessário, ou até mesmo um benefício para
pessoas carentes, como efetiva garantia de inscrição no Reino de Deus. Ibrahim (2011, p. 01)
fala que haveria uma honra inerente à pobreza. “[...] A indigência, não raramente, era
apresentada como forma de punição divina, cabendo ao pobre arcar com todas as sequelas de
sua condição, pois teria sido uma realidade gerada por sua própria culpa.”
Ao decorrer da evolução da proteção social, o Estado passa a assumir, ainda que de
forma tímida, parcela de responsabilidade pela assistência dos desprovidos de renda, até a
criação de um sistema estatal coletivo, compulsório e securitário. Para Ibrahim (2011) os
mecanismos de segurança social tem evoluído na medida que o próprio conceito de Estado

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modifica. Por exemplo, o conceito de Estado liberal tinha o discurso de intervenção mínima em
áreas fundamentais, tais como segurança e atividade judicial. Nele, o governo era um mal
necessário devendo dedicar-se ao estritamente necessário.
Daí o resultado de tal modelo foi o aumento das desigualdades existentes, onde aos
mais carentes diminuíam as chances de atingir um nível de renda, sendo hostilizados pela tão
sonhada iguadade de direitos. Assim, a necessidade de participação estatal, sobretudo, por meio
de mecanismos legais, almejando uma correção ou minimização das desigualdades sociais.
Pereira, Maravall e Przeworski (1993) chama atenção para a importância do Estado de aporte
certo. Nele, deve-se adotar tendências mais intervencionaistas, ou seja, que atenda a outras
demandas da sociedade, além das básicas, gerando igualdade de oportunidades como o ser
humano no centro do desenvolvimento.
Tais embriões conceituais foram fomentadores da construção do chamado Welfare
State, Estado de Bem-Estar Social, o qual visa atender outras demandas da sociedade, como o
previdência. Contudo, Arretche (1995) faz uma análise da emergência e desenvolvimento do
Welfare State por meio das diversas teorias explicativas. . O certo é qua a autora afirma que o
fenômeno experimentou incontestável avolumamento inclusive institucionalização no período
pós-guerra.
Arretche (1995) traça argumentos sobre os condicionantes de emergência e
desenvolvimento do Welfare State como predominantemente de ordem econômica ou de ordem
política. Para a autora, as produções teóricas acerca do tema no quesito econômico orbitam: a)
como um desdobramento necessário as mudanças postas em marcha pela industrialização das
sociedades; b) como uma resposta às necessidades de acumulação e legitimação do sistema
capitalista. No quesito ordem política, o assunto se explica por meio de: a) um resultado de uma
ampliação progressiva de direitos civis aos políticos, dos políticos aos sociais; b) resultado de
um acordo entre capital e trabalho organizado, dentro do capitalismo; c) resultado de
configurações históricas particulares de estruturas estatais e instituições políticas.
Após a intensa produção teórica detalhada por Arretche (1995, p. 35), conclui que
ambos argumentos são campos de escolhas, de solução, de conflitos no interior de sociedades
(capitalistas avançadas). Ajunta que são “[...]conflitos nos quais se decide a redistribuição dos
frutos do trabalho social e o acesso da população à proteção contra riscos sociais inerentes à
vida social, proteção concebida como direito de cidadania.”

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No que tange ao Brasil, um esforço diria que as teorias aplicadas, quer seja no meio
econômico ou político, ambas de uma forma mais ou menos intensa ocorreu no Welfare State
brasileiro. Por exmplo, a Constituição de 1988 ampliou o rol dos direitos civis, políticos e
sociais. Houve uma substituição do direito civil e o princípio da responsabilidade pelo direito
social e o princípio da solidariedade como elementos reguladores da vida social.
Assim, o Brasil seguiu a mesma lógica ao prever um Estado de Bem-Estar Social em
seu território. Cabe, ao Estado, prioritariamente, a obrigação de proteção social por pretações
por meio de contribuições obrigatórias ou por mera necessidade. Logo, a Seguridade no Brasil
rege-se pelo princípio da solidariedade, “[...] novo diagrama de regulação que estabelece que a
responsabilidade (anteriormente individual) passa a ser social, dado que o fator de viver em
sociedade representa um risco.” (ARRETCHE, 1995, p. 22).
Acontece que o debate demonstrando que o Estado sozinho não seria capaz de efetivar
tal solidariedade social demora a chegar no Brasil. Precisava de uma nova instituição para
efetivá-los, o Poder Judiciário. O debate já era acalourado no retrato europeu e norte-americano,
mas em terras brasileiras ocorreu no final dos anos 90, em que Leis como a 8.212/91 e 8.213/91
e o Regulamento n.º 3.048/99. Tais instrumentos garantiam um início para a implementação de
um direito principiológico e de uma constituição aberta, interpretada por todos os juízes e por
toda comunidade jurídica, muito em voga em paragens brasileiras fruto da influência norte-
americana.
A citada visão será ademais estudada e visualiza no modelo neoconstitucional.
Entretanto, um intenso discurso deficitário tenta se encaixar na proposta de se interpretar a
constituição como densificador de normas que pelo contexto aberto, comportariam inumeras
possibilidades interpretativas. Ocorre que o Governo, fiel defensor do conceito de Bem-Estar
Social já pulou do barco da solidariedade social por meio da PEC 287/16 (BRASIL, 2016a),
agora, cabe refletir a visão das instituições do sistema de justiça sobre o tema.
Serau Jr. (2017, p. 92) não afirma para quem destina seu discurso, se aos juízes, Estado
ou toda sociedade, mas convoca a necessidade de um movimento contrário de “[...]
‘reconstitucionalização’ das normas de Direito Previdenciário, quer dizer: certas matérias de
Direito Previdenciário até então afetas a legislação ordinária passam a ser introduzidas no
próprio Texto Constitucional”.

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Vista como um real descompasso com a realidade brasileira, Sarau Jr. (2017, p. 98)
descreve que diversos pontos da PEC 287/2017 merecem acirradas críticas. Isto porque o autor
focaliza os direitos sociais no campo de intensa interpretação constitucional em acordo com a
expansão dos direitos fundamentais. Para o estudioso, seria a ocorrência de um
“neoconstitucinalismo as avessas do Direito Previdenciário” e sua realização merece atenção
no campo do Direito Internacional, visto que o Brasil estaria indo de encontro com
compromissos asumido nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos.
Já Galleti (2017, p. 99) sai do campo essencialmente da explicação na teoria do direito
para conter a PEC n. 287/16. Para a autora, discursos de economia não pode sobrepor-se ao
direito. A Constituição é soberana e como tal deverá ser cumprida. Mas quem será o gestor de
tal caminhada em matéria previdenciária? Juízes ou Legisladores. O fato é que a pesquisadora
não responde, mas afirma a importância da Previdência Social pois “[...] cumpre o papel central
de proteger os cidadãos nas situações de vulnerabilidade. Negar-lhes esse papel e cuvar-se à
lógica do dinheiro, é renegar a população à miséria e, mais, é lançar o país num círculo vicioso
de assitencialismo.”
Sobre a postura de Instituições de Justiça sobre o tema, a Associação dos Juízes
Federais (AJUFE) colocou a PEC n.º 287/16 dentro de sua agenda política institucional. Alertou
que a referida proposta gerará intensas ações judiciais, sobretudo, nas regras de transição.
Ademais, informou ao legislativo que os grandes causadores do déficit são os devedores e
sonegadores, necessitando assim de um real aperfeiçoamento no sistema de arrecadação da
Previdência. (AJUFE, 2017b). Seria o judiciário um braço político ou já adiantaria que não vai
se isolar e que não vai deixar que poderes façam aquilo que lhes aprouver?
Não temos a tentativa de responder a pergunta, mas suscitar reflexões sobre o tema. O
certo é que em artigo para a Revista de Previdência Social de outubro de 1991, Wagner Balera
já falava em crise do sistema previdenciário brasileiro. A proposta à época era que um ouvidor
para a Seguridade Social resolveria o problema de “[...] desmandos, escândalos, rombos e
golpes, praticados a danos da seguridade social demonstram que, a máquina administrativa,
torna-se cada vez mais lenta, cada vez mais ineficiente...”. (BALERA, 1991).
Parece que o artigo foi escrito hoje, mas não o foi. O que se coaduna com a atualidade
é “[...] o apelo pela permanente valorização dos direitos do cidadão, mediante a
institucionalização de vias confiáveis de comunicação entre povo e agentes políticos.”
(BALERA, 1991, p. 05). Desde modo, quem poderia resolver o problema hoje? Os juízes estão

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aptos para assumirem tal papel? Assim, o próximo tópico esforça-se para refletir sobre o
crescimento do poder judicial e quais as ligações com as teorias interpretativas sobre os limites
da atividade exegeta do juiz.

3 O EMPODERAMENTO DO PODER JUDICIÁRIO E SEUS REFLEXOS

Adjetivos como um mera “boca da lei” (bouche de la loi) ou legicentrista


(légicentrisme) já não são mais aplicados aos juízes, dentro de um contexto de um sistema
jurídico centralizado na lei ou no parlamento, em face da Constituição e do judiciário. Agora,
não é mais o aplicador autômato da lei, mas, sobretudo, da Constituição vista de maneira aberta
dentro de um arcabouço principiológico, possibilitando ao hermeneuta diversas possibilidades
interpretativas.
O termo empoderamento (empowerment) no dicionário significa uma proposta
coletiva desempenhada por alguns indivíduos que pertencem a grupos privilegiados de
decisões. Tais grupos acrescem o desenvolvimento social, política ou econômica de indivíduos
carentes das comunidades, a fim de alcançar mudanças positivas nas situações em que vivem.
(MICHAELIS, 2017).
Um grupo privilegiado é o Poder Judiciário o qual tornou-se proeminente em matéria
de julgar visto pelos doutrinadores americanos como um “ramo do governo” (branches of
government) ou os juízes se transformam em verdadeiros legisladores. Ao imiscuirem-se em
um contexto de desenvolvimento de indivíduos carentes funcionam como agente acriar do
direito. Trata-se de um carater moderno do poder judicial que alcança um lugar de destaque na
organização dos poderes estatais ao decidir sobre questões de alta complexidade política.
(ARAÚJO, 2017).
Assim, tal empoderamento do Poder Judiciário tornou-se possível diante de um quadro
construído a par de mudanças: do Estado de Direito para o Estado Constituional, do Positivismo
para o Pós-Positivismo e a concretização do neoconstitucionalismo. Como consequência deste
fazer política do judiciário surge a tona implicações, possivelmente a judicialização da política,
o ativismo judicial e o conflito contramajoritário.
Na acepção de Zagrebelsky (1992), a forma de concepção histórica do Estado de
Direito começou a se desenvolver na Inglaterra em fins do século XVII, na França e nos Estados

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Unidos, no final do século XVIII e na Alemanha e outros países europeus no século XIX. A
proposta era conter o arbítrio estatal passando o poder a ser subordinado ao direito.
Acontece que a concentração da produção do direito era concentrada em apenas uma
instância constitucional: a legislativa e não a judiciária. Logo, tudo o que está no direito seria o
construído estritamente pela lei. Caberia ao jurista a simples exteriorização da vontade do
legislador.
Ressalva Araújo (2017) que o referido Estado de Direito tornou-se perigoso ao
possibilitar a legitimidade a qualquer Estado, sobretudo, autocráticos, mormente os que
surgiram no século XX. Ademias, a II Guerra Mundial acabou por firmar tal preocupação
emergindo a visão de um novo estado atento a criação de uma situação que permitisse ao ser
humano o desenvolvimento de suas capacidades ocasionando modificações no entendimento
dos direitos fundamentais e das técnicas jurídicas para a proteção de tal intento.
Nesse contexto cabe se falar em Estado Constitucional focado na oposição da visão
positivista. Agora, o Direito se pauta na Constituição consusbtanciada numa análise
essencialmente valorativa. A par desta compreensão, o Poder Judiciário passa a ser o garantidor
da aplicação da Constituição.
Assim, no Estado Constitucional, a força normativa que a constituição passa a ter
surgiu da necessidade de um instituição de poder para aplicá-la. “[...] o Poder Judiciário assume
proeminência. Essa proeminência é o embrião da judicialização da política e pode ou não
conduzir ao ativismo judicial, que daquela é dependente.” (ARAÚJO, 2017, p. 09).
Relembra Oliveira (2014) que o Positivismo Jurídico não coloca o aspecto humano
como de grande importância na interpretação do direito, mas mantem elevada ênfase na lógica
abstrativista e formalista. Com o fito de atribuir caráter científico ao direito, o positivismo
concebe o direito como um feixe de regras válidas, as quais por si só exaurem seu conteúdo.
Logo situações complexas que não estiverem expressamente percebidas na lei não poderiam
ser resolvidas pelo direito.
Deste modo, como resolver situações sociais que buscam direitos que precedem a
legislação? Como legitimar que minorias ou gurpos podem ter direitos em razão do julgamento
do caso, mesmo que não sejam explicitamente reconhecidos por regras jurídicas? Situações que
o Postitivismo Jurídico não pode resolver, mas um conceito de direito sobre os moldes
argumentativos.

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Surgindo como uma ferramenta epsitemológica para o acolhimento de questões


jurídico e constitucionais na contemporaneidade, o Pós-Positivismo se realiza como um
fenômeno jurídico, um tanto complexo, pois cede lugar à decisão judicial em detrimento da lei.
Agora o ordenamento jurídico como um todo é orientado “[...] por uma constituição forte e
dotada de valores e princípios a serem efetivados na prática dos julgamentos e do exercício
interpretativo cotidiano.” (ARAÚJO, 2017, p. 18).
Não se trata de uma visão transcendental do direito, nem posto por uma extrema
cientificidade, mas um direito formulado dentro de um dever argumentativo com a valorização
dos princípios constitucionais. Deste modo, frutifica as ideias neoconstitucionalistas almejando
um hermeneuta voltado para a realidade unindo-se os vínculos entre Direito e Política, pois
conceitos tão comuns em decisões judiciais (razoabilidade, senso comum e interesse público)
são orientados por relações de poder. (ARAÚJO, 2017).
Diluição entre fronterias entre Legislativo e Executivo; maior independência,
relevância do Poder Judiciário no que tange ao controle da administração e de algumas questões
políticas em confronto com a constituição; desenvolvimento de novos meios de limitação
efetiva do poder são indicados como consequências clássicas do neoconstitucionalismo
(ARAÚJO, 2017; BARROSO, 2005, CAMBI, 2007). Mas o que se chama atenção é que este
fenômeno tem fomentado uma expansão da jurisdição constitucional.
O Estado Constitucional, sobretudo, no Brasil, está em voga pela ocorrência do
fenômeno da expansão da litigiosidade, em face da ampliação do acesso à Justiça. Como
exemplo, tem-se para a agenda de análise de leis federais o chamado “Tribunal da Cidadania”,
o Superior Tribunal de Justiça, criado pela CF/88. Para tal Corte interesses de grupos
minoritários (por exemplo, o trabalhador rural) deve ter soluções pautadas em princípios, não
mais em reduzida nomartividade, mas com força de influir decisivamente em como analisar
regras.
Na concepção neoconstitucionalista pode ser visto como intenso oleiro de direitos, por
meio de uma acentuada excursão pela constituição. Atenta Araújo (2017) que o
desenvolvimento da dogmática de interpretação judicial paira diante da compreensão e
concretização de uma norma, as quais só serão realizadas diante de uma situação fática. Para
ele, atribuir conteúdo à norma e sua aplicação ao caso concreto são um único processo.

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Mas como resolver o conflito contramajoritário como possível judicialização da


política e ativismo judicial quando o juiz cria e modifica direito? O certo é que os indivíduos,
assim como o próprio parlamento acabam acionando os juízes para resolver situações inóspitas
que eles não podem ou não querem assumir o desgate de ressolver.
Espécie de Supremocracia (VIEIRA, 2008) ou Juristocracias (ARAÚJO, 2017)? O
certo é que os defensores da expansão das cortes se abrigam em dois argumentos: a) a
argumentação jurídica como ferramenta prática, mantendo uma argumentação racional e
sobretudo, coerente; b) o isolamento político do poder judiciário, por meio de sua a
partidarismo. (LANGFORD, 2015).
Neste contexto, o Poder Judiciário estaria na concatenação do espaco público e político
criando uma nova relação constitucional entre estes dois meios, “[...] uma nova relação
constitucional entre as duas ‘sociedades’ impondo o respeito aos direitos dos governados por
parte dos órgãos do Estado”. (ARAÚJO, 2017, p. 30).
Embora o ativismo judicial seja tratado como uma expressão degastada e polissêmica
ou como decisão incorreta (ARAÚJO, 2017), o certo é que no Brasil ainda é vista como uma
das análise de KMIEC (2014) como atividade legislativa da Corte (legislative from the bench).
Contudo, importante é a análise do professor Shapiro (2013) que a própria atividade
de controle de constitucionalidade, mesmo que vise tão somente a invalidação de uma lei acaba
por legislar ou editar uma norma. Igualmente, o controle de constitucionalidade é um processo
político, pois os juízes realizaram escolhas após as escolhas dos legisladores em um processo
contínuo.
E a idéia do benefício da dúvida? Aquele em que os demais poderes devem reforçar as
ações de outros poderes, exceto se houver violação clara à constituição? A referida concepção
paira na hipótese de que não querem que o Poder Judiciário se interfira, mas ao contrário, que
permita que os eleitos dentro de um processo democrático atuem como queiram. A abordagem
majoritarista induz ao conflito majoritário das decisões judiciais.
Aponta Araújo (2017) que o Poder Legislativo no que tange à sua eleição e
funcionamento pouco detém a pureza de ânsia popular. Nem todas as decisões que se baseiam
numa análise constituicional-argumentativa dissoam da opinião pública. É verdade, o Poder
Judiciário pode ser muito democrático, no enfoque de que sua decisão pode estar em submissão
à opnião pública. Ademais, apresenta-se grande poder de aceitação que o Executivo é capaz de
exercer sobre o Parlamento desnaturalizando a representatividade.

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Assim, é ínsito citar a teoria do grupos de interesses, ou seja, grupos representados


pelo Poder Judiciário que não apresentam representação política eficaz no Parlamento
(SHAPIRO, 2013). Dentro de tal grupo poderia elencar aqueles abarcados pelos riscos sociais
na política previdenciária brasileira: o trabalhador rural. Populações que vivem em extrema
pobreza no campo.
Ademais, em próximo tópico além da análise de precedente do STJ em possível
política de enfrentamento à pobreza, numa postura pós-positivista e neoconstitucionalista se
apresentará o Poder Judiciário em atividade política em uma análise constitucional antes da
atividade decisória. Trata-se da crescente importância da atividade judicial em políticas
públicas por meio do projeto "Expedição de Cidadania" o qual visa levar direitos e serviços
essenciais a populações em situação de isolamento e pobreza em matéria previdenciária.

4 A IMPORTÂNCIA DO JUDICIÁRIO EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA: um


incrementalismo à brasileira

Segundo dados de 2015 da Justiça em Números produzido pelo CNJ, o Direito


Previdenciário alcança as colocações de demandas na Justiça Federal de primeiro grau em 1º,
3º, 5º, 6º, 10º, 11º, 12º, 17º, 19º, 20º colocações e em quase todas as posições no segundo grau
e nas turmas recursais. (BRASIL, 2016). No mínimo os números demonstram uma intensa
atuação dos juízes em matéria de proteção de riscos sociais.
Para alguns juristas, essa intensa atividade judicial pela incorporação de mecanismos
juridicionais com o objetivo de promover a possibilidade de judicialização aos direitos
fundamentais constitucionais atua como instância de apoio que facilita o acesso de grupos
crescentes de cidadãos aos Tribunais (ARAÚJO, 2017). Para outros, os juízes, inclusive
Tribunais de Segunda Instância, tentam maximizar seus poderes e, por isso, o poder de revisão
(judicial review) pode, ao invés de dar garantias acabada atentando à democracia. (TUSHNET,
2013).
Parece que a atuação da Justiça Federal, como instituição do sistema de justiça, foi
concebida para resolver disputas de forma que os litigantes não busquem as soluções privadas,
inclusive a violência, com o fito de reivindicar seus direitos.
A atuação de Juízes Federais na sociedade brasileira vai muito além das suas atuações
nos tribunais. “(...) Significa romper limites físicos dos Tribunais, foros, subseções para cumprir

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o seu ofício em localidades onde o acesso à justiça apresenta maiores dificuldades”. Tal acertiva
foi retirada da revista que trata da Política Institucional da Associação de Juízes Federais
(AJUFE, 2017b, p. 106) e demonstra uma possível expansão do Poder Judiciário no domínio
de políticas públicas outrora pertencentes exclusivamente para os poderes Executivo e
Legislativo.
Assim, o projeto promovido pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe),
intitulado de "Expedição de Cidadania", vem influenciando desde 2009 conjugando atuação em
políticas públicas (atendimento jurídico, expedição de documentos, atendimentos médicos e
odontológicos) com decisões judiciais em matéria previdenciária (benefícios e serviços).
(AJUFE, 2017a).
Em verdade, trata-se de um projeto social do Poder Judiciário com parcerias (o
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o Conselho Nacional de Justiça
(CNJ), os Tribunais Regionais Federais da 1ª e da 5ª Regiões, o governo federal, o Ministério
das Comunicações, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Exército e a Marinha do
Brasil) visando levar direitos e serviços essenciais a populações em situação de isolamento e
pobreza. O projeto já alcançou populações ribeirinhas do Rio São Francisco e Paraguai, interior
dos Estados da Bahia, Pernambuco, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e ocorrerá em trinta e
um municípios do Maranhão.
A proposta da associação é institucionalizar o projeto tornando-o uma agenda nacional
como parte do Judiciário Brasileiro e possa ter orçamento próprio para atender às ditas
populações tradicionais do Brasil, como um braço político. Embora o projeto cite como diretriz
a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais
(BRASIL, 2007) atende-se para o risco de politização do discurso no quesito jurisdição, pois a
arena jurídica pode se transformar em um prolongamento do campo de duelo político, sem
simbolizar vantagens para as discussões na seara política. (TAVARES, 2010).
Segundo o coordenador da Expedição, ocorrido em Paulo Afonso/BA, o judiciário
seria uma mão visível fundamental que está atento ao contexto aberto da Constituição e que
atua de acordo com a vontade do povo. Para o juiz federal João Paulo Pirôpo de Abreu, caso
não ocorresse a expedição, muitas pessoas continuariam sem emitir seus documentos. “[...]
Nós nos sentimos orgulhosos em facilitar a vida da população carente, ao mesmo tempo em que
levamos dignidade e cidadania para cidadãos que necessitam de serviços sociais básicos".
(AJUFE, 2017b).

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Percebe-se que o projeto em comento detalha um emponderamento do Poder


Judiciário, em matéria previdenciária que nomalmente vai de mãos unidas com a proposta de
interpretação argumentativa da constituição difusora de novos direitos fundamentais para um
grupo excluído pelos demais poderes. (SHAPIRO, 2013). Ademais, reflete-se que tal postura
judicial pode se fundar exatamente por ser um poder politicamente mais isolado e sem algum
compromisso eleitoral e com as maiorias, assim, agi eficazmente na defesa da minoria.
Concebe-se que a atividade judicial nunca desempenhou um papel tão importante na
política como hoje. Além do projeto citado, o STJ, vem enunciando um novo regime de normas
previdenciárias, as quais repousam sobre uma concorrência permanente entre interpretações
diferentes das regras constitucionais. Conclui que a escolha de um sentido não é jamais
definitivo e que a interpretação deve evoluir, logo, novos direitos devem ser reconhecidos.
Nesta vertente, expõe-se os precedentes do STJ para a agenda rural no que tange a
comprovação da atividade rural e extensão da propriedade rural para fins de configuração de
segurado especial. Em ambos, a Corte federal posiciona a Seguridade Social dentro de um
sistema de valores que se encontram nas leis e, sobretudo, na Constituição. Conjuntamente às
regras estão os princípios dotados de alta normatividade.
No que tange à comprovação da atividade rural para fins de enquadramento como
segurado especial, por exemplo, o artigo 39, I da Lei n. 8.213/91 exige como deferimento de
benefícios o requisito comprovação laboral e idade (sessenta anos para homem e cinquenta e
cinco anos para mulher). O problema enfrentado é como se comprovar essa atividade rural quer
seja a nível administrativo, junto ao órgão gestor da Previdência ou, em caso de indeferimento
administrativo, por meio de provimento judicial. Isto porque a informalidade e a pobreza no
campo ainda são fatores que impede um planejamento destes trabalhadores em ter farta
documentação em todo o período de labor rural.
Assim, no Resp nº. 1.352.721-SP (BRASIL, 2016b) se decidiu que não há limitação
de tempo da prova, muito menos um rol taxativo de documentos a ser demonstrados. Significa
que o autor da ação previdenciária poderá posteriormente propor novo pedido de aposentação,
caso reuna os documentos que comprovem sua atividade rurícula.
No referido julgado, o voto vencedor está recheiado de uma intensa interpretação
argumentativa da correlação entre Constituição Federal e Lei Federal. Nele é ressaltado que
devido as peculiaridades das demandas previdenciárias, é possível a flexibilização da rígida

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metodologia civilista. Ademais, “os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que
tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os
benefícios previdenciários”. (BRASIL, 2016b).
Ainda, demostrou-se que o próprio espírito da Seguridade Social é reparar distorções
mediante situações sociais adiversas. Reafirmando que o caso de comprovação de atividade no
campo, devido a informalidade da atividade e simplicidade do trabalhador, realiza-se num
verdadeiro contexto de não paridade caso comparado com o aparato no qual o urbano detém.
No julgado, chama-se atenção para o espírito da Constituição Federal na defesa dos
riscos sociais e o princípio da solidariedade social. Alerta à necessidade de proteção do
trabalhador por meio da primazia da função social do RGPS, erguendo-se como direito
fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral. A par dessa lógica
constitucional do seus valores morais, os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido
de amparar a parte hipossuficiente culminando na flexibilização dos rígidos institutos
processuais. (BRASIL, 2015).
Nesta mesma linha de atividade interpretativa ao pálio de argumentos constitucionais,
no Resp n.º 1649636/MT, o STJ também foi além do texto de Lei Federal e elencou um extenso
rol de documentos segundo os quais o segurado especial pode atestar que de fato laborou no
campo. Assim, os ditames do art. 106 da Lei 8.213/91 é exemplificativo, possibilitando outros
documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade. (BRASIL, 2017a).
Logo, certidões de casamento, de óbito, de nascimento dos filhos, Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS), certificado de reservista, carteiras de beneficiário
do extinto INAMPS, entre outros registros públicos contemplam a extensa interpretação
judicial. (BRASIL, 2017a). Verifica-se uma interpretação jurídica da norma federal voltada
para uma evolução da argumentação constitucional de efetividade de direitos fundamentais.
No que se refere a extensão da propriedade rural para fins de comprovação de segurado
especial, no Agravo Interno no Recurso Especial n°1369260 / SC o STJ não se ateve
extritamente frieza da legislação federal, mas decidiu a par de uma arrazoada aplicação de fatos
considerados (regime de economia familiar escoltado no art. 195, § 8º, CF/88). (BRASIL,
2017b).
Assim, decidiu que o tamanho da propriedade não descaracteriza, por si só, o regime
de economia familiar, desde que comprovados os demais requisitos para a concessão da
aposentadoria por idade rural como ausência de empregados, mútua dependência e

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colaboração da família no campo. Percebe-se que o requisito “regime de economia familiar”


não é uma regra constitucional, mas um princípio com alto teor valorativo. Logo, também se
torna vetor de garantia de direitos fundamentais.
A par das decisões expostas o STJ não estaria acrescentando ou criando? Ou apenas
aplica uma norma cujo significado é imposto e na verdade é tão somente porta-voz?
Interpretações a parte ressalta-se que não se pode desconsiderar o inconveniente da concepção
de que ao fazer o trabalho jurisdicional, aplicando uma norma constitucional, o Poder Judiciário
deve, de alguma forma construir seu significado.
Na seara de grupos minoritários, como os segurados especiais ou populações em
situação de vulnerabilidade contemplada pelo projeto Expedição da Cidadania o juiz se depara
com a consagração judicial dos fugidios e difusos valores sociais. Informalidade, fome,
pobreza, acesso à direitos básicos (saúde, educação, aposentadoria) entram em cena na
concepção prévia do intérprete. O certo é que fizeram escolhas entre aplicações plausíveis ou
entendimentos diferentes.
Observa-se no exposto que o judiciário, na proteção dos riscos sociais não optou por
mudanças radicais de entendimento. Atuou de forma cautelosa em precedente que garante
direitos sociais. A tal entendimento, Barak (2002) e Araújo (2017) chama de
incrementalismo/interpretação evolutiva segundo a qual o juiz hermenêuta durante seu processo
interpretativo constitucional não deve fazer rupturas, mas ao contrário, conduzir uma
jurisprudência que deverá caminhar cautelosamente em uma dada direção.
O percurso seguido pela Corte Federal é a aposentadoria rural como direito social de
segunda geração que deve ser efetivado, mesmo em um país de redemocratização tardia. São
decisões prudentes, pois partem de uma lógica interpretativa da própria norma
infraconstitucional, a qual deságua no contexto otimizador da Constituição Federal.
Ademais, a necessidade de mudar requer também a preocupação com a estabilidade.
Na proposta do incrementalismo constitucional, a mudança deve ser por evolução e não por
revolução. (BARAK, 2002). Percebe-se que o próprio texto constitucional espelhou a ideia de
evolução por meio do princípio da solidariedade social, no artigo 195 da CF/88 demosntrando
que além da conjuntura em que a norma foi editada deve se levar em consideração o fundamento
racional que acompanha em sua vigência e o julgamento e interpretação que se fazem dela.

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Portanto, o incrementalismo e os precedentes citados estão juntos para garantir que o


direito seguirá um caminho pausado de mudança, sobretudo, por um curso progressivo e
revisões tênues do que por alterações de entendimentos bruscos e fundamentais. Não simboliza
que a interpretação constitucional, em caso algum, poderá promover mudanças severas.
Em geral, reflete-se num papel salutar do constitucionalismo quando o judiciário tem
a maestria de desenvolver princípios sobre uma gama de casos sem causar quebras. Entretanto,
quando é apenas porta-voz de legislador indicando uma sucessão de regras vinculantes em um
só tempo, perde a capacidade de ser um instrumento profícuo ao Estado Constitucional.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O esforço notado no estudo não teve o condão de propor uma intensa reflexão sobre
hermenêutica constitucional, tão pouco criar uma metodologia em matéria de interpretação
constitucional. A discussão até passou sobre a atividade criadora do juiz se legítima.
A proposta foi refletir sobre o empoderamento do poder judiciário em situações afetas
à Seguridade Social, em sua área previdenciária e se suas atividades (políticas e jurídicas) estão
alinhadas a um incrementalismo constitucional. As causas poderão se encontrar num contexto
neoconstitucional ou até mesmo num neoconstitucionalismo às avessas. O certo é que, nos
casos citados (projeto social e precedentes judiciais) existem uma proposta judicial de
efetividade de direitos fundamentais na proteção de riscos sociais.
Agora, o judiciário tem consciência jurídica de como faz e o que faz em tempos de
possível discurso deficitário? Os juízes estariam concentrando poderes demais? É possível um
julgamento orientado pelo resultado em nome do progresso social e redução de pobreza no
campo? Desde já se decidindo pela justiciabilidade, deve-se buscar a medida menos intrusiva
possível em relação aos demais poderes, mas ainda consistente com a solução do problema.
Discutir o termo ativismo judicial, judicialização e autocontenção judicial para
julgamentos do Supremo Tribunal Federal em casos de interrupção de gravidez dos afetos
anencéfalos e uniões homoafetivas, por exemplo, ainda geram serevos debates sobre a
polissemia e repercussões dos termos. Quiça alavancá-los para a seara das decisões
previdenciárias. Apesar dos riscos, situações de extrema pobreza e a proposta de

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desenvolvimento social tão alinhados à Seguridade Social podem fazer com que juízes que
atuem em varas, turmas previdenciária tenha uma interpretação criativa ao julgar.
Sabe-se que os grupos minoritários citados no estudo (agenda rural e populações em
situação de vulnerabilidade) vivem em situação de extrema pobreza pulverizando a ideia de
dignidade e desenvolvimento proposta pela Constituição. Ocorre que se deixarmos a cargo do
Poder Judiciário como guardião dos Estado Constitucional, então o cumprimento de ambos os
casos citados serão legítimos.
Deve-se debruçar perante a questão motivacional para revisão judicial em matéria
previdenciária em vista das consequências sociais que as mesmas representam. Milhões de
trabalhadores rurais serão alcançados pelos resultados das decisões. As referidas no estudo
simbolizam uma evolução constitucional na vertente de reforço de direitos. Mas se a Corte se
queda por uma interpretação restirtiva ou gramatical da Lei Federal Previdenciária?
A maior discussão na atualidade, em relação a atividade interpretativa do juíz é saber
quais os limites dentro dos quais a atividade criadora do juiz é legítima. Dentre os limites
colocados diante da exegese é atentar-se ao texto normativo e as regras de interpretação
causando evolução e não revolução.
Talvez tal fórmula será importante para fins previdenciários, com a ideia de sistema
protetivo. Contudo, poderá não ser para outras demandas. Assim, coadunou-se com a ideia de
incrementalismo/evolucionismo constitucional como ferramenta de balizamento de decisão
judicial. Segundo tal proposta, as posturas do Judiciário requerem também uma procupação
com a estabilidade. Desta forma, o juiz mesmo autor de mudanças (políticas e jurídicas) deverá
fazê-lo cautelosamente por meio de uma evolução constitucional.
O citado projeto social “Expedição da Cidadania” embora represente atuação jurídica
em políticas públicas, não representa um conflito contramajoritário. Ao contrário, para seu
desenvolvimento, encontra apoio dos demais poderes. Ademais ao resolver problemas sociais
prementes o judiciário não exclui a esfera de atuação do Executivo ou Legislativo, mas sim
agrega, incrementa. Não só os juízes farão políticas públicas no interior da Bahia ou Maranhão.
Qualquer gestor público comprometido com a constituição poderá fazer.
A argumentação jurídica nos Resp nº. 1.352.721-SP (comprovação da atividade rural)
e Resp n.º 1649636/MT (tamanho da propriedade rural) não propuseram mudanças radiciais
de entendimento para o campo previdenciário. A jurisprudência do STJ já vinha caminhado

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cautelosamente em uma mesma direção: constitucionalização da Seguridade Social, que tem


como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os
benefícios previdenciários.
Observa-se que o projeto social Expedição da Cidadania e precedentes do Superior
Tribunal de Justiça para o segurado especial são propostas de incremento da Constituição
Federal. Mesmo que representem uma intensa atividade judicial substituinado políticas públicas
de outros poderes apresenta uma evolucionismo constitucional em matéria previdenciária
primando pela solidariedade social.
Ademais, representa aperfeiçoamento, pois alerta à necessidade de proteção do
trabalhador por meio da primazia à função social do RGPS, erguendo-se como direito
fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral. Portanto, o juíz
interprete não causou revolução, mas evolução constitucional.
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