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Fundamentos do Colégio Militar de Catalão

Este documento analisa os fundamentos e práticas do Colégio Estadual da Polícia Militar de Catalão. A pesquisa utilizou métodos como observação, questionários e entrevistas para compreender a organização curricular, planejamento, avaliação e relações interpessoais na escola. Os resultados indicam que o projeto educacional é influenciado pelo pensamento liberal e privatização, refletido nos documentos orientadores da escola e presença dos militares, que adicionam disciplina e hierarquia. Isso determina uma redução do papel dos profess
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Fundamentos do Colégio Militar de Catalão

Este documento analisa os fundamentos e práticas do Colégio Estadual da Polícia Militar de Catalão. A pesquisa utilizou métodos como observação, questionários e entrevistas para compreender a organização curricular, planejamento, avaliação e relações interpessoais na escola. Os resultados indicam que o projeto educacional é influenciado pelo pensamento liberal e privatização, refletido nos documentos orientadores da escola e presença dos militares, que adicionam disciplina e hierarquia. Isso determina uma redução do papel dos profess
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FUNDAMENTOS E PRÁTICAS DO COLÉGIO DA POLÍCIA MILITAR DE

CATALÃO: ENTRE FARDAS, MANUAIS E BOLETINS

RENATA LOPES SILVA RIBEIRO

Orientador (a):
Profª. Drª. Juliana P. Araújo

Linha de Pesquisa:
Políticas Educacionais, História da Educação e
Pesquisa (Auto)Biográfica

CATALÃO/GO
2019
RENATA LOPES SILVA RIBEIRO

FUNDAMENTOS E PRÁTICAS DO COLÉGIO DA POLÍCIA MILITAR DE


CATALÃO: ENTRE FARDAS, MANUAIS E BOLETINS

Dissertação apresentada como requisito parcial


para a obtenção do título de Mestre em
Educação, à comissão examinadora do
Programa de Pós-Graduação em Educação da
Universidade Federal de Goiás/Regional
Catalão.

Orientador (a):
Profª. Drª. Juliana P. Araújo

Linha de Pesquisa:
Políticas Educacionais, História da Educação e
Pesquisa (Auto)Biográfica

CATALÃO
2019
Ao meu bem maior... MINHA FAMÍLIA: a
minha base, o meu alicerce. Por todas as
privações e por todo sacrifício. A vocês, Erik,
Octávio, Isadora e Arthur.
AGRADECIMENTOS

A Deus, por ser força e inspiração em minha vida;


Ao meu esposo Erik, pela compreensão, pelas palavras de ânimo, encorajamento e pelo
carinho;
Aos meus pais e irmão, pelo apoio e confiança;
À minha irmã Charlene, por toda dedicação, apoio e incentivo;
À comunidade escolar investigada e aos sujeitos participantes da pesquisa, que me acolheram
tão bem e por dispor seu tempo à minha pesquisa;
Aos amigos e familiares, pela força, apoio e preocupação durante essa longa trajetória;
Às amizades que construí no Programa de Mestrado, Ana Lúcia, Fernanda, Lailton, Lorena e
Michele, pelas longas conversas e pelas trocas proporcionadas;
Aos professores do Programa de Mestrado em Educação da UFG/RC, pela competência;
À minha orientadora, Professora Drª Juliana P. de Araújo, pela dedicação, pelo incentivo à
minha formação enquanto pesquisadora, pelas contribuições e, por todo auxílio nos momentos
de dificuldade;
Aos membros da banca, por se disporem a dividir comigo esse momento e, sobretudo, pelas
contribuições e reflexões compartilhadas;
E, em especial aos meus filhos, Octávio, Isadora e Arthur, pela paciência, por compreender o
motivo de minha ausência e, por sonharem comigo;
VISTA CANSADA

Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua
volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira
vez? Pela primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa ideia de
olhar pela última vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de
quem não crê que a vida continua, não admira que o Hemingway
tenha acabado como acabou.

Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta. Um


poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a
gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira
vez o que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que
nos cerca, o que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo
visual da nossa rotina é como um vazio.

Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe
perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De
tanto ver, você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio
pelo mesmo hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre,
pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe
passava um recado ou uma correspondência. Um dia o porteiro
cometeu a descortesia de falecer.

Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a
mínima ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro
teve que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa,
cumprindo o rito, pode ser também que ninguém desse por sua
ausência. O hábito suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há
sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.

Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos
para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez
o que, de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho.
Marido que nunca viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos
olhos se gastam no dia-a-dia, opacos. É por aí que se instala no
coração o monstro da indiferença.

Otto Lara Resende


LISTA DE ABREVIAÇÕES

ANPED Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação


APMF Associação de Pais, Mestres e Funcionários
BNCC Base Nacional Comum Curricular
CAF Coordenação Administrativo-financeira
CEPI Centros de Ensino em Período Integral
CEPMG Colégio Estadual da Polícia Militar de Goiás
CM Colégio Militar
COM Colégio da Polícia Militar
CPMG Colégio da Polícia Militar de Goiás
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
ICE Instituto de Corresponsabilidade pela Educação
NC Núcleo Comum
ND Núcleo Diversificado
ONG Organização não-governamental
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PDE Plano de Desenvolvimento da Educação
PJ Protagonismo Juvenil
PPP Projeto Político Pedagógico
PROUNI Programa Universidade para Todos
PT Partido dos Trabalhadores
PV Projeto de Vida
SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica
SCMB Sistema Colégio Militares do Brasil
SEDUCE Secretaria de Educação Cultura e Esporte
SEE Secretaria de Estado de Educação
SRE Subsecretaria Regional de Educação
SISU Sistema de Seleção Unificada
SRECE Subsecretaria Regional de Educação, Cultura e Esporte de Catalão
TGE Tecnologia de Gestão Educacional
UFG Universidade Federal de Goiás
LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Lista de eletivas do Colégio Polivalente (2017-2018) .............................................56


Tabela 2: Instrumentos TGE ....................................................................................................68
Tabela 3: Matriz Curricular para o Ensino Médio .................................................................105
LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Equipe escolar descentralizada – Ensino Médio ......................................................64


Figura 2: Modelo Pedagógico Programa Novo Futuro e Escola da Escolha ...........................67
Figura 3: Matriz Curricular ......................................................................................................70
Figura 4: Estrutura Organizacional ..........................................................................................70
Figura 5: Padrão de Uniformes no CEPMG ............................................................................93
Figura 6: Padrão corte de cabelo CEPMG ...............................................................................96
RESUMO

A presente dissertação resulta de uma pesquisa cujo objetivo foi compreender os fundamentos
e as práticas que amparam o processo educativo do Colégio Estadual da Polícia Militar de
Catalão – Colégio Polivalente. O objeto estudado refere-se a um Colégio Estadual em Tempo
Integral, cuja gestão foi transferida à Polícia Militar em meados ano de 2016. O percurso
metodológico utilizado se baseou no estudo de caso e teve como instrumentos para a
produção do corpus a pesquisa documental, a observação, a aplicação de questionários
semiestruturados e a realização de entrevistas-narrativas. As narrativas foram analisadas pela
análise de conteúdo (BARDIN, 2009) e o conjunto de todos os dados submetidos à
triangulação (FLICK, 2009). No primeiro capítulo a compreensão do pedagógico se inicia
pela a análise dos fundamentos e ideias manifestos nos documentos orientadores do Colégio
Polivalente que são o Modelo Pedagógico Escola da Escola, o Programa Novo Futuro, o
Regimento Interno, Projeto Político Pedagógico e o Plano de Ação. No segundo buscamos
compreender o pedagógico enveredando pelo processo educativo em movimento a partir de
narrativas sobre categorias delimitadas pelo campo da didática como a organização curricular,
o planejamento, os métodos e recursos e a avaliação. No terceiro capítulo as narrativas sobre
as relações interpessoais dão a tônica do exercício compreensivo sobre o colégio. Há um
diálogo com autores que discutem desde as políticas educacionais (BALL, 2011, 2013;
LIBÂNEO, 2018; PERONI, 2012); passando pelas reflexões do campo da didática,
(MIZUKAMI, 1987; LIBÂNEO, 2013; PÉRES GOMÉZ E GIMENO SACRISTÁN, 1998;
LIBÂNEO, 2013); da formação de professores (CONTRERAS, 2013) e em menor grau
autores que discutem relações de poder e dominação como (FOUCAULT, 1987; WEBER,
2004). Os resultados indicam que o pedagógico sofre as influências do pensamento liberal
como base para o projeto educacional que encontra lastro no processo político de privatização
da educação. Isso se refletem seus textos norteadores (com ideais e princípios voltados ao
mercado) e da presença dos militares que adicionam a ele o formato marcado pela disciplina e
pela hierarquização (que além aceitos, são valorizados). No bojo dessa sistemática emerge a
redução da atuação de professores e educadores em prol de uma educação para além dos
muros da escola e dos projetos futuros de adequação ao sistema, o que determina a redução da
própria função da educação. Minimiza essa interpretação a observação de que o colégio
estudado é um lugar diferenciado que funciona em tempo integral, é valorizado pela
comunidade, conta com recursos e parcerias, com organização e uma gestão focada em
resultados expoente do pensamento neoliberal de educação. Neste sentido é uma instituição
cujo projeto não coaduna com o que educadores e pesquisadores críticos esperam enquanto
educação pública nacional, ou seja, aquela que promova a transformação social ou pelo menos
a redução das desigualdades.

Palavras-chave: Militarização da educação. Colégio cívico militar. Colégio da Polícia Militar.


Fundamentos da educação. Práticas pedagógicas.
ABSTRACT

The present dissertation results from a research whose objective was to understand the
foundations and practices that support the educational process of the State College of the
Military Police of Catalão - Polyvalent College. The object studied refers to a State College in
Integral Time, whose management was transferred to the Military Police in the middle of
2016. The methodological route used was based on the case study and had as instruments for
the production of the corpus the documentary research, the observation, the application of
semi-structured questionnaires and the accomplishment of narrative-interviews. The
narratives were analyzed by content analysis (BARDIN, 2009) and the set of all data
submitted to triangulation (FLICK, 2009). In the first chapter, the understanding of pedagogy
begins with the analysis of the foundations and manifest ideas in the guiding documents of the
Polyvalent College which are the Pedagogical Model School of the School, the Novo Futuro
Program, the Internal Regiment, the Political Pedagogical Project and the Plan of Action. In
the second, we seek to understand the pedagogical by moving through the educational process
in motion from narratives about categories delimited by the field of didactics such as
curricular organization, planning, methods and resources and evaluation. In the third chapter
the narratives on interpersonal relations give the keynote of the comprehensive exercise on the
college. There is a dialogue with authors who discuss from the educational policies (BALL,
2011, 2013, LIBANNE, 2018, PERONI, 2012); (MIZUKAMI, 1987, LIBANEO, 2013,
PÉRES GOMÉZ AND GIMENO SACRISTÁN, 1998, LIBÁNEO, 2013); of teacher training
(CONTRERAS, 2013) and to a lesser extent authors who discuss power relations and
domination as (Foucault, 1987; Weber, 2004). The results indicate that the pedagogical one
suffers the influences of the liberal thought as base for the educational project that finds
ballast in the political process of privatization of the education. This is reflected in its guiding
texts (with ideals and principles aimed at the market) and the presence of the military that add
to it the format marked by discipline and hierarchy (which, besides being accepted, are
valued). In the bulge of this system emerges the reduction of the performance of teachers and
educators in favor of an education beyond the walls of the school and future projects of
adaptation to the system, which determines the reduction of the very function of education. It
minimizes this interpretation to the observation that the college studied is a differentiated
place that works full time, is valued by the community, has resources and partnerships, with
organization and results-focused management exponent of neoliberal education thinking. In
this sense it is an institution whose project does not fit with what critical educators and
researchers expect as national public education, that is, that promotes social transformation or
at least the reduction of inequalities.

Keywords: Military schools:Militarization of Education. Military Civic College. College of


the Military Police. Fundamentals of Education. Pedagogical practices.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 16

CAPÍTULO I ............................................................................................................................ 40

A GÊNESE DO COLÉGIO da polícia MILITAR em tempo integral NOS TEXTOS


ORIENTADORES ................................................................................................................... 40

1.1. A “Escola da Escolha” e o Programa Novo Futuro: a roupa nova da velha intenção 41

1.1.1. Caderno 1 “Introdução às bases teórico e metodológicas” .......................................... 42


1.1.2. Caderno II e III: Conceitos e Princípios educativos da Escola da Escolha ...................... 49
1.1.3. Cadernos IV: Metodologias de êxito – componentes curriculares ............................... 52
1.1.4. Caderno V: Metodologias de êxito -Práticas educativas: acolhida e tutoria ................ 56
1.1.5. Caderno VI: dos ambientes ........................................................................................... 57
1.1.6. Caderno VIII: Tecnologia de Gestão Educacional .......................................................... 59
1.2. Programa Novo Futuro .............................................................................................. 66

1.3. Diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de Ensino de Goiás .................... 69

1.4. O Regimento Interno dos CEPMG ............................................................................ 71

1.5. O Projeto Político Pedagógico e o Plano de ação 2017 ............................................. 79

1.6. Considerações preliminares sobre o capítulo ............................................................. 81

CAPÍTULO II ........................................................................................................................... 85

O COLÉGIO EM MOVIMENTO: SABERES E FAZERES DO PROCESSO ...................... 85

2.1. Ritos militarizados: formação, hasteamento, arreamento, passagem de comando .... 85

2.2. A didática. .................................................................................................................. 96

2.2.1. O Planejamento ............................................................................................................. 97


2.2.2. A organização curricular .............................................................................................. 101
2.2.3. Métodos de ensino...................................................................................................... 115
2.2.4. Uso dos Recursos ........................................................................................................ 120
2.3. Avaliação ................................................................................................................. 123

2.4. Objetivos .................................................................................................................. 126

2.5. Considerações preliminares sobre o capítulo ........................................................... 128

CAPÍTULO III ....................................................................................................................... 131


O PEDAGÓGICO NO SUTIL UNIVERSO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS ............ 131

3.1. As relações interpessoais ......................................................................................... 131

3.1.1. Militares e Civis ........................................................................................................... 132


3.1.2. Professores X Alunos ................................................................................................... 140
3.1.3. Alunos e alunos ........................................................................................................... 143
3.1.4. Escola X Família ........................................................................................................... 149
3.2. A síntese do Colégio pelas narrativas: o que é? O que forma? Para qual sociedade?
152

3.2.1. Coexistência: duas escolas, dois projetos ................................................................... 153


3.2.2. Hibridismo: o Frankenstein ......................................................................................... 155
3.3. A seletividade: um colégio para poucos. ................................................................. 159

3.4. Duas questões: O que forma? A quem serve? ......................................................... 164

3.5. A síntese dos alunos ................................................................................................. 166

3.6. Considerações parciais ............................................................................................. 168

4.CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 171

5.REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 178

APÊNDICES .......................................................................................................................... 186


INTRODUÇÃO

Escrever uma dissertação é desafio complexo. Sobretudo porque sempre nos imprime
a necessidade de escolhas. Escolha de tema, de objetivos, de métodos, de conceitos e de
posicionamento, o que resulta em muito trabalho, em inúmeras páginas de análises e
conclusões, e em uma nova pessoa, bastante diferente daquela do início da caminhada.
Ao redigir esta introdução, o esforço de síntese que deve conter a reflexão sobre toda
a trajetória de pesquisa para o término de um ciclo e a partilha objetiva dos caminhos e
descaminhos que marcam o antes, o durante e o depois da pesquisa, seus resultados. Em geral,
começamos descrevendo como chegamos ao mestrado, ao nosso objeto, enfim, “começamos
do começo”.
No entanto, hoje, ao avaliarmos sobre nossa condição de pesquisadoras, desejamos
“começar pelo fim”, refletir sobre o que nos tornamos e, sobretudo, compartilhar nossas
angústias e preocupações com os fatos que têm marcado o campo educacional no fim de 2018
e início de 2019.
Em um momento político bastante conturbado que provavelmente entrará para a
história nos termos de uma “polarização” o projeto que ascende ao planalto é o de um político
que, aclamado e ovacionado, por mais de 60 milhões de eleitores, que rechaça o Partido dos
Trabalhadores (PT) representante mor do pensamento considerado de “esquerda” e se sustenta
em ideias do roll do liberalismo e do conservadorismo. Fala-se sobre o risco do fim da
democracia, bem como a perda de direitos das minorias, que por muitos anos vem lutando por
sua posição e espaço na sociedade. Marca ainda, o retorno de uma educação para o mais
importante, o trabalho.
Para além dessa base, assistimos o recrudescimento de um discurso homofóbico,
machista, misógino e elitista propalado pelo presidente eleito que se apresenta à sociedade
brasileira como aquele que tornará o Brasil um país “livre de corrupção” e que deve “retomar
os tempos da moral e dos bons costumes”. Alguns fatos nos trazem à tona os terríveis
acontecimentos da ditadura, em especial quando percebemos que nós, professores estamos, a
todo o momento, sendo atacados, julgados e acusados de incitar manifestações ideológicas ou
político-partidárias, o que resultou na abertura para que uma deputada eleita da base aliada do
17

presidente publicasse em rede social a solicitação aos alunos que filmassem seus professores
caso julgassem que os mesmos estivessem propagando ideologias dentro das salas de aula1.
Portanto, uma sucessão de incoerências, práticas autoritárias e antidemocráticas tem
sido pauta na agenda do presidente, sobretudo no campo educacional. O que está em voga na
política é buscar meios para evitar que os alunos sejam incentivados a pensar criticamente e
que tenham uma visão clara sobre a realidade política e social do nosso país. Enfim, o
presidente eleito Jair Bolsonaro, bem como o Ministro da Educação Ricardo Vélez
Rodrígues2,têm buscado se certificar que a educação no Brasil, mantenha seu caráter liberal e
conservador, além de difundirem a ideia de que o Ensino Superior é destinado a apenas uma
elite intelectual.
Em seu discurso de posse proferido no dia 01/01/2019, o presidente eleito dentre
outras coisas afirmou: “Vamos unir o nosso povo, valorizar a família, respeitar as religiões e
nossa tradição judaico-cristã, combater a ideologia de gênero, conservando os nossos valores.
O Brasil voltará a ser um país livre das amarras ideológicas”3. Por sua vez, o ministro da
Educação reiterou o prélio à ideologia de gênero, deflagrou o afronte ao marxismo cultural e
declarou ainda que "A ideologia globalista passou a destruir um a um os valores culturais que
regem o país, família, igreja, Estado, pátria e escola"4. Fica explícito nas declarações que
ambos desconhecem a realidade do ambiente escolar, e tem construído uma visão distorcida
sobre a atuação dos professores no ambiente escolar. Há o explícito interesse de controle e
retaliação da prática docente.
Uma das propostas mais conhecidas e avalizadas é a da ampliação dos colégios
militares (em plano de governo no mínimo 1 (um) em cada capital) passo dado por meio do
decreto 9.665 de 2 de janeiro de 2019 que em seu Anexo I, Capítulo I, sanciona que o
Ministério da Educação, tem como competência tratar sobre a política nacional de educação, a
educação básica, avaliação, Ensino Superior, dentre outras prerrogativas, o parágrafo único
complementa que o Ministério da Educação pode estabelecer parcerias com instituições civis
e militares que tenham tido êxito em experiências no campo educacional, para o cumprimento
de suas competências (BRASIL, 2019). A Seção II Inciso XVI ainda acrescenta que compete
à Secretaria da Educação Básica, estabelecer parcerias que incentivem os sistemas de ensino
1
https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/eleicoes/2018/noticia/2018/10/29/deputada-estadual-do-psl-eleita-por-sc-
incita-alunos-a-filmar-e-denunciar-professores.ghtml
2
Entre a defesa da dissertação e a entrega desta versão final o ministro já havia sido substítuido.....por ..que
mantem a agenda liberal..
3
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/01/leia-a-integra-do-discurso-de-bolsonaro-na-cerimonia-de-posse-
no-congresso.shtml
4
https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2019/01/02/ministro-da-educacao-cita-deus-e-critica-
marxismo-cultural-nas-escolas.htm?cmpid=
18

municipais, estaduais e federais a aderirem o modelo escolar cívico-militares, com base nos
modelos adotados por colégios militares do Exército, Polícias e Bombeiros Militares (IBID.).
Nesse sentido, vemos crescente o interesse do governo de ampliar o número de instituições
educacionais de modelo militar e estimular a efetivação de parcerias com o setor privado.
Esse ideal político, vai na contramão do que os teóricos educacionais têm debatido
sobre a função social da escola e sobre a responsabilidade do Estado em garantir educação de
qualidade para todos.
E é justamente aqui que se encontra o motivo de ter redigido essa introdução “pelo
fim”, a militarização da educação que em 2017 se apresentava como um tema em ascensão
pelo aumento no número de colégios, hoje é incorporado como um projeto de política
educacional empunhado pela mais alta hierarquia política do país.
Mantém-se hoje com mais vigor a justificativa para a realização dessa pesquisa que
enfoca o Colégio Estadual da Polícia Militar de Catalão-GO apresentada ainda nos tempos de
projeto de pesquisa que é sustentada pela ideia de que é preciso compreender o pedagógico
das instituições educativas militarizadas.Primeiro pelo fato de ser um acontecimento
intrigante na educação local que reflete um fenômeno maior que é o da militarização da
educação, com crescente interesse no campo da pesquisa em educação. Segundo, é amparada
pelos dados que reforçam o potencial e a necessidade de mais pesquisas com esta temática no
campo da história da educação (ao qual buscamos alinhamento) e da sociologia da educação.
E há o crescimento no número de instituições escolares, que tiveram sua gestão transferida à
Polícia Militara partir da década de 2000 em todo o Brasil em cenário no qual Goiás é o
Estado que possui o maior número de Colégio da Polícia Militar (CPM).
Além da expansão, a notoriedade dos Colégios Militares (CM) e CPM nos principais
meios de avaliação do sistema educacional brasileiro, como Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM),
Prova Brasil, dentre outros vem chamando a atenção da sociedade. É comum, encontrar
reportagens de diversos jornais eletrônicos, que abordam e destacam o sucesso obtido pelos
alunos destes colégios. Por isso é imperativo fortalecer no campo científico o tema da
militarização da educação.
Vale destacar que o termo “militarização” pode ser compreendido a partir de várias
vertentes e tem sido alvo de diversos debates sobre o uso desse termo para explicar o cenário
que tem se efetivado no campo educacional. No entanto, ao abordar esse termo, o utilizamos
como sinônimo de transferência da gestão das escolas públicas para os militares e a
introdução de práticas militares no ambiente escolar.
19

Avancemos um pouco mais sobre este tema.


Após a definição do objeto de estudo, tornou-se imperativo conhecer como se deu a
aproximação entre os militares e a educação, bem como conhecer como estas instituições
foram criadas. A história acessada nos textos mostra que as iniciativas educacionais
vinculadas ao exército já existiam mesmo antes da vinda da Família Real para o Brasil e
visavam à oferta de um ensino técnico-profissionalizante, ou seja, o desenvolvimento de
conhecimentos básicos para garantia de uma profissionalização mínima das forças armadas
(MESQUITA, 2011).
Também no texto de Luchetti (2006) encontramos os indícios que comprovam esse
vínculo já no ano de 1699, em que foi inaugurado o primeiro centro de formação do Ensino
Militar, a Escola de Artilharia e Arquitetura Militar, que tinha como objetivo selecionar e
preparar alguns portugueses e seus descendentes para a direção e construção de fortalezas no
litoral brasileiro, o que permitiria garantir a defesa contra ataques estrangeiros. Naquele
momento, os movimentos ligados à educação vinculada às Forças Armadas, tinham como
objetivo proteger as fronteiras da colônia.
Ao longo dos anos, o processo educacional vinculado ao Exército brasileiro, se
desenvolveu, várias academias militares foram criadas, com o objetivo específico de formação
de oficiais militares em diversas áreas. Mas, o marco inicial para a relação profícua entre
educação e militares, pode ser atribuído à chegada da Família Real ao Brasil, com a
inauguração da Real Academia Militar em 1810. Isso porque a vinda da família real implicou
na reestruturação do Exército que a partir daquele momento precisaria formar uma força
militar realmente preparada para a garantia da segurança da realeza e a defesa nacional. A
educação seria a estratégia capaz de instruir os futuros oficiais militares e dar sustentabilidade
e força ao exército (NOGUEIRA, 2014).
Pelo histórico o que se observa é que a questão da educação para os militares ou
efetivamente a criação de instituições voltadas à sua formação se produz inicialmente a partir
tanto da urgência de organização interna do país após a chegada da Família Real, quanto da
preocupação com a defesa do espaço geográfico.
Dentre as tantas instituições criadas pelos militares, os Colégios Militares se
destacam.
Há textos que indicam que sua origem deriva do desejo dos oficiais pela criação de
uma instituição destinada à educação de seus descendentes (NOGUEIRA, 2014; LUCHETTI,
2006; OLIVEIRA, 2017). Por sua vez, Oliveira e Barbosa (2017) avaliam que a criação dos
CMs esteve relacionada às mudanças reformistas no processo de profissionalização do
20

Exército, além do interesse de prover ensino secundário aos alunos que objetivam seguir
carreira militar. E ainda há textos que sustentam a versão de que Luís Alves de Lima e Silva
mais conhecido como Duque de Caxias solicitava que os CMs deveriam acalentar e
tranquilizar os soldados que deixavam seus familiares para defender a Pátria na Guerra do
Paraguai e temiam pelo futuro de suas famílias caso sucumbissem na frente de batalha. O
oferecimento de uma educação oficial aos filhos seria forma de acalentar os mesmos e
aumentar seu poder de combate (DEPA, 2017).
A criação de um primeiro colégio militar se efetivou em 1889 por meio do Decreto
Nº 10.202 pelo qual o Conselheiro Tomás José Coelho de Almeida, aprovou o Regulamento
para a criação do primeiro Colégio Militar no Brasil, o “Imperial Collégio Militar”, situado no
Rio de Janeiro, que se designava a receber de forma gratuita os filhos dos oficiais efetivos,
reformados e honorários do Exército e da Armada e, mediante contribuição pecuniária, alunos
provenientes de outras classes sociais(BRASIL, 1989). Ele foi o primeiro estabelecimento de
ensino secundário de modelo militar, e é hoje o mais antigo em atividade no país (OLIVEIRA
e BARBOSA, 2017). Vale destacar que os CMs são vinculados ao Exército brasileiro,
portanto, são instituições federais. Ao longo das décadas, o Sistema Colégio Militar do
Brasil(SCMB) se expandiu para outros Estados brasileiros, e atualmente conta com 13
unidades implantadas5.
Além dos CMs existem ainda os Colégios da Polícia Militar (CPMs), cuja primeira
instituição foi inaugurada em Belo Horizonte – MG, no ano de 1949. A partir daí esse modelo
de educação se expandiu para diversos Estados do Brasil, alcançando certa evidência no
campo educacional principalmente pela exploração das premissas de disciplina, civilidade e
patriotismo. Vale destacar que a década de 2000 é marcada pela expansão dos CPMs em
diversos estados brasileiros, especialmente em Goiás.
A constituição dos Colégios Estaduais da Polícia Militar de Goiás (CEPMG) é mais
recente, se comparado a história dos Colégios Militares. Autorizada por meio da Lei nº 8.125
de 18 de junho de 1976, que dispõe sobre a organização básica da Polícia Militar do Estado de
Goiás e dá outras providencias. Define o documento que a estrutura da Polícia Militar seja
formada por órgãos de direção, de apoio e de execução, e hoje, é o Estado com o maior
número de instituições vinculadas à Polícia Militar.

5
Colégio Militar do Rio de Janeiro, Colégio Militar de Porto Alegre, Colégio Militar de Fortaleza, Colégio
Militar de Manaus, Colégio Militar de Brasília, Colégio Militar de Recife, Colégio Militar de Salvador, Colégio
Militar de Belo Horizonte, Colégio Militar de Curitiba, Colégio Militar de Juiz de Fora, Colégio Militar de
Campo Grande e Colégio Militar de Santa Maria, realizando, ainda, a supervisão pedagógica da Fundação
Osório (DEPA, 2018).
21

Contudo, seu processo de efetivação só foi iniciado em julho de 1998. O primeiro


Colégio da Polícia Militar foi denominado temporariamente de Colégio da Polícia Militar de
Goiás (CPMG) – CEL PM Cícero Bueno de Brandão com sede nas instalações da Academia
da Polícia Militar (O ANHANGUERA, 1999, p. 215).
O CPMG funcionou na sede da APM apenas durante o processo de organização e
elaboração documental, que perdurou até dezembro de 1998. No ano de 1999, as instalações
do Colégio Estadual - Unidade Vasco dos Reis, localizada no Setor Sul de Goiânia, foi cedida
pelo Governo do Estado, por meio da SEE, o que possibilitou o início das atividades naquela
unidade (BELLE, 2011).
No ano 2000, outra instituição foi cedida para a instalação de mais um CPMG, o
Colégio Hugo de Carvalho Ramos que até então era administrado pela Secretaria de Educação
do Estado (SEE). Segundo Santos (2010, p. 21) havia nele alunos “rebeldes e
indisciplinados”, mas, com o gerenciamento da Polícia Militar, esse quadro geral mudou
tornando-se um colégio “com regras rígidas e alunos obedientes, estudiosos, disciplinados,
úteis e produtivos”. A autora ainda afirma que o público do colégio continuou basicamente o
mesmo, ressaltando que o que diferencia os colégios militares dos colégios civis, é o rigor que
as normas são estabelecidas e respeitadas.
A legislação estadual que dispôs sobre os colégios só foi decretada no ano de 2001.
A Lei nº 14.044, de 21 de dezembro de 2001, que trata da organização geral dos CPMG
estabelece que o atendimento nas unidades do CPMG seja destinado ao ensino fundamental e
médio. Em 2017a Lei nº 19.880altera a legislação anterior, deixa explícito o casamento entre
Estado e Polícia ao dar nova denominação aos CPMG, que passam a ser chamados de Colégio
Estadual da Polícia Militar de Goiás (CEPMG), e dá outras providências.
No ano de 2018 vemos o incremento da parceria devido à promulgação de novas leis
como a Lei nº 19.968 (em vigor), que dispõe sobre a criação, instalação e transferência de
Unidades da CEPMG que contam atualmente 50 (cinquenta) Unidades do CEPMG em
funcionamento6. Temos também a Lei nº 20.046 de 20 de abril de 2018, que autoriza a criação

6
CEPMG Ayrton Senna – Goiânia; CEPMG Vasco dos Reis – Goiânia; CEPMG Hugo de Carvalho Ramos –
Goiânia; CEPMG Dionária Rocha – Itumbiara; CEPMG Carlos Cunha Filho – Rio Verde; CEPMG Dr. Cézar
Toledo – Anápolis; CEPMG Gabriel Issa – Anápolis; CEPMG Manoel Vilaverde – Inhumas; CEPMG José
Carrilho – Goianésia; CEPMG Nader Alves dos Santos – Aparecida de Goiânia; CEPMG Professor João
Augusto Perillo – Goiás; CEPMG Nestório Ribeiro – Jataí; CEPMG Pedro Ludovico – Quirinópolis; CEPMG
Tomaz Martins da Cunha – Porangatu; CEPMG José de Alencar – Novo Gama; CEPMG Fernando Pessoa –
Valparaíso de Goiás; CEPMG Maria Tereza Garcia Neta Bento – Jussara; CEPMG Cabo PM Edmilson de Souza
Lemos – Palmeiras de Goiás; CEPMG Dr. Tharsis Campos – Catalão; CEPMG Arlindo Costa – Anápolis;
CEPMG Dom Prudêncio - Posse; CEPMG Maria Heleny Perillo – Itaberaí; CEPMG Miriam Benchimol Ferreira
– Goiânia; CEPMG Waldemar Mundim – Goiânia; CEPMG Jardim Guanabara – Goiânia; CEPMG Colina Azul
– Aparecida de Goiânia; CEPMG Mansões Paraíso – Aparecida de Goiânia; CEPMG Madre Germana –
22

de mais 6 (seis) colégios: CEPMG Francisco Antônio de Azevedo – Uruaçu; CEPMG Dona
Hormezinda Maria Carneiro – Bela Vista de Goiás; CEPMG Castelo Branco – Trindade;
CEPMG Professor José dos Reis Mendes – Trindade; CEPMG Pedro Ludovico Teixeira –
Trindade; CEPMG Edéia – Edéia.
Após acessar todo o histórico dos CMs e CEPMG, tornou-se necessário, conhecer as
produções acadêmicas realizadas sobre estas instituições, por isso, realizamos um
levantamento exploratório7 para verificar a existência de trabalhos produzidos sobre o assunto
e certificar que haveria minimamente alguns caminhos já trilhados que dessem pistas sobre as
ancoragens para a manutenção da temática, documento que originou um artigo8cujos
resultados obtidos foram socializados e publicados. Todos tendo como tema aquilo que
chamamos “militarização da educação”, mas que também pode ser encontrado em termos
como militarização das escolas ou ainda militarização de colégios. Válido informar que pelos
critérios adotados chegamos a uma amostra daquilo que representa a produção da Região
Centro-Oeste9.
Agrupando as produções conforme objetivos classificamos em três (03) grupos:
a) um primeiro grupo, mais dedicado a questões do campo da História das
instituições no qual predominam análises sobre questões como “cultura escolar” do qual
destacamos as obras “Educação militar: Uma leitura da educação no Sistema dos Colégios
Militares do Brasil (SCMB)” de Nogueira (2014); “A militarização da escola pública em
Goiás”, (SANTOS, 2016); Assistência e profissionalização no exército: elementos para uma
história do Imperial Colégio Militar, (CUNHA, 2006);

Aparecida de Goiânia; CEPMG Pedro Xavier Teixeira – Senador Canedo; CEPMG Silvio de Castro Ribeiro –
Jaraguá; CEPMG Domingos de Oliveira – Formosa; CEPMG Hélio Veloso – Ceres; CEPMG Presidente Costa e
Silva – São Luís de Montes Belos; CEPMG Nivo das Neves – Caldas Novas; CEPMG Major Oscar Alvelos –
Goiânia; CEPMG Americano do Brasil – Vianópolis; CEPMG Benedita Brito de Andrade - Goianápolis;
CEPMG José Silva Oliveira – Goianira; CEPMG Comendador Christóvan de Oliveira – Pirenópolis; CEPMG
Xavier de Almeida – Morrinhos; CEPMG José Pio de Santana – Ipameri; CEPMG Juvenal José Pedroso –
Goiânia; CEPMG Dr. José Feliciano Ferreira – Guapó; CEPMG Santa Terezinha – Petrolina de Goiás; CEPMG
Geralda Andrade Martins – Itapaci; CEPMG Doutor Negreiros – Nerópolis; CEPMG Moisés Pereira Peixoto –
Anicuns; CEPMG Professor Ivan Ferreira – Pires do Rio; CEPMG Guaraciaba Augusta da Silva - Barro Alto;
CEPMG do Setor Palmito – Goiânia;
7
A base para obtenção dos dados foi definida tendo como componentes o site Scielo, o site da Biblioteca Digital
Brasileira de Teses e Dissertações, o site do Banco de Teses e Dissertações da Capes e o Google Acadêmico. Os
seguintes descritores foram utilizados: “Colégio Militar”, “Militarização e educação”, “Colégio da Polícia
Militar”.
8
Realizamos um levantamento da produção acadêmica sobre os CM e CEPMG situados na região Centro Oeste.
Os resultados sinalizaram que o tema tem recebido a atenção da academia, que há certo acúmulo das produções,
mas que ainda há a necessidade de novos estudos. O artigo em questão foi publicado nos Anais do IV Encontro
da História da Educação do Centro Oeste, em 2017.
9
Análise das Produções do Centro Oeste sobre os colégios militares e/ou os Colégios da Polícia Militar. Renata
Lopes Silva Ribeiro e Juliana Pereira de Araújo.
http://eheco.com.br/ARQUIVOS/ANAIS/Renata%20Lopes%20Silva%20RIbeiro.pdf.
23

b) outro grupo, em que sobressaem pesquisas e análises a respeito dos fundamentos


teóricos ou ideais educacionais norteadores dos colégios, dentre os quais a dissertação “Forças
armadas e educação: o Colégio Militar de Campo Grande - MS (1993-2010), (FIGUEIRA,
2011); “A genealogia dos regimentos internos do Colégio da Polícia Militar de Goiânia
(SANTOS, 2010);
c) um grupo de trabalhos dedicados e analisar ou compreender as práticas
pedagógicas com destaque para estudos a respeito dos professores como a dissertação
“Leituras, valores e comportamentos: práticas escolares no Colégio Tiradentes da Polícia
Militar de Uberaba-MG”, (OLIVEIRA, 2017).
Essa categorização permitiu uma aproximação mais rigorosa com a temática ainda
antes de ter em mente a definição quanto ao objeto o que foi positivo para uma visão inicial
mais ampla.
A respeito dos critérios que fundamentaram a escolha de determinados colégios para a
militarização temos essencialmente duas posições sendo uma delas encontrada no texto de
Santos (2010) indicadora de que os colégios militares se efetivam onde há “alunos rebeldes e
indisciplinados”. Para Santos (2016) são o baixo rendimento escolar, a indisciplina, a
violência e o uso de drogas no ambiente escolar os fatores preponderantes na escolha das
escolas a serem militarizadas em Goiás.
Ajuda a consolidar essa perspectiva trabalhos como os de Paiva e Silva (2016) que
avaliam que instituições marcadas pela violência ao serem transferidas à gestão à Polícia
Militar alcançam melhores índices em avaliações nacionais, bem como no rendimento
individual dos alunos.
Outra perspectiva é a de que a instalação se efetiva em locais que já havia um
conjunto de condições favoráveis tanto na estrutura física e localização como no perfil do
alunado e das famílias, na literatura destacamos o texto de Santos (2016) e Melo (2015).
Evidenciamos que os CMs e os CEPMGs possuem melhores condições materiais e
de infraestrutura, além de ter em seu quadro efetivo um maior número de funcionários, o que
é explicado pelo fato de os militares ocuparem cargos que só existem nos colégios militares
(SANTOS 2010; SANTOS, 2016; FERREIRA, 2018; CASTRO, 2017).
Em comum na literatura a avaliação de que os colégios militarizados utilizam a
hierarquia e a disciplina como estratégias para a melhora do desempenho individual dos
alunos. As premiações (alamares, pontuações por comportamento e notas) são dispositivos de
diferenciação pelas quais os melhores alunos ganham notoriedade, o que alimenta a
competição e os ideais meritocráticos. Os trabalhos desenvolvidos Santos (2010) e Figueira
24

(2011) contribuem ao analisar os ideais e práticas que orientam o trabalho pedagógico destas
instituições. Figueira (2011) em sua tese de doutorado (tendo como objeto o Colégio Militar
de Campo Grande) parte da seguinte questão: Como os elementos internos do colégio
expressam a estratégia adotada pelas Forças Armadas nesse novo papel? E quais são os
elementos constitutivos da escola? Conclui que os princípios estabelecidos seguem o
pensamento sobre a moral de Émile Durkheim, baseados na hierarquia e disciplina
produzindo um ideário formativo dos militares que se estende nos colégios desde o setor
administrativo até a seção de ensino.
Santos (2010) ao fazer uma análise dos regimentos internos do Colégio da Polícia
Militar de Goiânia a partir das concepções de poder e disciplina abordada nas obras de
Foucault conclui que o regimento interno do CEPMG age no sentido de controlar o corpo, as
atitudes e o comportamento dos educandos ao produzirem uma rotina normatizada,
padronizada, disciplinada e controlada. A autora conclui que esse disciplinamento, provoca o
ordenamento e poder, assim, é possível manter o controle das ações e manter os padrões
estabelecidos.
Outra categoria de estudos e pesquisas que encontramos pelo levantamento, foi
a que enveredou pelas práticas pedagógicas. Desse grupo destacamos a contribuição de
Oliveira (2017) que trata do conhecimento acerca do cotidiano e das práticas que permeiam as
atividades escolares no Colégio Tiradentes da Polícia Militar de Uberaba-MG buscando a
compreensão da cultura escolar. Constata que a instituição incorpora alguns códigos
comportamentais provenientes das corporações militares, entretanto, em diversas outras
atividades pedagógicas, atribui semelhança às escolas não militares. Também contribui para a
compreensão do desenvolvimento profissional e da construção da identidade profissional dos
professores evidenciando a existência de fortes relações de poder e controle na instituição. Em
contrapartida, os professores encontram mais espaços para a qualificação profissional, apoio e
respaldo no trabalho docente. Indica também, maior sensibilidade da gestão escolar,
possibilitando uma prática reflexiva dos professores.
Ao analisar as produções sobre os colégios militares e-ou sobre a militarização
percebe-se que aparecem variados posicionamentos quanto ao tema. Argumentos se dividem
em favoráveis e contrários. O levantamento também permitiu acessar os argumentos mais
utilizados em prol ou em desfavor da militarização.
Dentre os argumentos em defesa da implantação dos colégios militares está a
disciplina rígida e a hierarquia, tomados como fatores que proporcionam melhores índices de
aproveitamento nas avaliações do sistema educacional brasileiro. Para os que convergem com
25

esse posicionamento a indisciplina é resposta adequada ao aumento da violência nas


instituições educacionais que estão na origem do péssimo rendimento escolar e que em geral
se relacionam ao uso de drogas. Nesta perspectiva ao transferir a gestão das escolas para os
militares, o que se objetiva é garantir a melhoria da qualidade do processo educativo nas
instituições escolares (SANTOS, 2016).
Quanto ao argumento mais utilizado para a rejeição da implantação dos colégios
militares ou de mesmo caráter é o de que a educação não pode ser controlada pela Polícia
Militar ou afins, pois tal política fere os direitos constitucionais dos cidadãos ao desconsiderar
o princípio constitucional que o Estado deve oferecer a todos uma escola pública, gratuita,
democrática, com diversidade de ideias e concepções pedagógicas, e à qual, todos tenham as
mesmas condições de acesso e permanência com sucesso (IBID.).
Na seara dos que rejeitam a militarização está Melo (2015) que alerta para o fato de
que apesar desta proposta obter uma repercussão positiva na sociedade, devidos aos resultados
imediatos apresentados, em longo prazo poderá repercutir negativamente na formação das
gerações futuras devido ao uso intensivo de hierarquia e silenciamento. Alerta também que a
cobrança de taxas de matrículas e mensalidades assim como a reserva de vagas para filhos de
militares fazem com que a diferença e a exclusão sejam instituídas de forma natural.
Há algumas produções que se dedicam a analisar os resultados dos colégios militares
sendo que muitos tomam como ponto basal a questão da estrutura e do financiamento. Em
declaração concedida ao Portal Associação Nacional de Pesquisa em Educação (Anped),
Virginia Maria Pereira de Melo (coordenadora do Fórum Estadual de Educação – Goiás)
afirmou que as escolas militares possuem estrutura física diferenciada, ambientes escolares
organizados, além de contar com suporte para questões de didáticas/materiais, recursos
humanos suficientes para desempenharem funções de “coordenação, fiscalização,
acompanhamento disciplinar, psicopedagógico e psicológico” (ANPED, 2015).
Desse modo, os resultados alcançados por estas escolas, não estariam atrelados
somente a sua militarização, mas também ao fato de possuírem de antemão uma situação
diferenciada das encontradas nas demais escolas da rede pública gratuita, ou seja, possuem
privilégios. Provavelmente, se fossem garantidas as mesmas condições para as demais escolas
elas também seriam capazes de alcançar resultados significativos nas avaliações e na
qualidade de ensino ofertada.
O estudo dos textos para entendimento da temática e composição de um campo
teórico foi basal e produziu sentimentos ambíguos, de medo, de esmorecimento, de força de
vontade, de coragem, enfim, sentimentos difíceis, mas que derivaram em inquietações
26

valiosas porque direcionaram a constituição de uma questão de pesquisa que é: “Como se


constitui o pedagógico do CEPMG de Catalão?”.Tal questão assume como prioridade o
pedagógico do colégio porque entendemos que ele aglutina os fundamentos da instituição
(presentes nos documentos orientadores), os elementos do processo educativo (planejamento,
métodos de ensino, avaliação, organização do currículo) e as relações estabelecidas no
cotidiano10 do CEPMG de Catalão.
Este olhar permitiu compreender como os indivíduos se apoderam dos discursos
preconizados para a instituição, como constroem e interpretam suas trajetórias nesse espaço.
Ao assumir o desafio de responder a esta questão admitimos como objetivo primário da
pesquisa:“Compreender o pedagógico do Colégio Estadual da Polícia Militar de
Catalão”.
(Para chegar a tal propósito elencamos objetivos secundários pelos quais: a) analisar
os fundamentos e ideias constantes nos documentos orientadores do Colégio Polivalente,
portanto no conjunto de textos que orientam sua proposta educativa para o quê realizamos
uma pesquisa documental; b) verificar se e como os fundamentos e ideias são repercutidos no
processo educativo por nós estabelecido nos limites da didática e seus elementos
(Planejamento, organização curricular, avaliação) para o quê realizamos entrevistas-narrativas
e observações durante pesquisa de campo, e c) analisar os sentidos sobre o pedagógico do
colégio na dimensão das relações, para o que utilizamos também as entrevistas-narrativas,
bem como as observações.

Procedimentos metodológicos

Assim que definimos os objetivos da pesquisa e esboçamos o percurso metodológico


realizamos nossa primeira visita ao colégio em 16/11/2017 para conversar com o gestor da
instituição, explicar sobre a pesquisa e solicitar sua autorização para a realização de
observações, coleta de documentos, aplicação de questionários e realização de entrevistas com
equipe gestora, professores e alunos. O Gestor (que é Major) prontamente autorizou a
realização do estudo já explicando de forma breve o funcionamento do colégio sempre
buscando evidenciar sua postura no equilíbrio entre as identidades de gestor e de militar.

10
Pensar no cotidiano a partir de Certeau (2011) é buscar o conhecimento do objeto a partir de diversas
perspectivas e pontos de vista, é estabelecer a relação entre o que é posto como “autoridade” com as formas com
que os indivíduos operam suas “artes de fazer”. Assim, apodero-me das palavras de Duran (2007, p.117) para
explicar o que busco compreender pelo cotidiano do CEPGM, “Refiro-me mais especialmente às invenções dos
professores e dos alunos, as formas como interpretam as políticas educacionais, as suas maneiras de fazer – a
pesquisa das práticas – a lógica do cotidiano”.
27

A partir daquele dia realizamos duas visitas semanais no período da manhã, em dias
alternados. Durante essas visitas, guiada por roteiros de observação buscava interferir o
mínimo possível no cotidiano e nas rotinas. Posicionava-me no corredor do pavilhão das salas
de aula, percebia as movimentações dos alunos, professores e coordenadores. Como o colégio
estava em reforma a coordenação pedagógica foi improvisadamente transferida para uma sala
no mesmo pavilhão onde os alunos tinham aulas e por essa região também perambulava em
busca de indícios do pedagógico. Era no início desse pavilhão que havia uma mesa, reservada
a um militar, cuja função era vigiar e fiscalizar os alunos e prestar apoio aos professores em
caso de necessidade. Então, como forma de acompanhar a rotina, me sentava ali também.
Sempre buscava conversar e tirar algumas dúvidas, como forma de interagir e buscar
compreender um pouco sobre seu pensamento e suas concepções a respeito dos colégios
militares. Essas conversas informais me propiciaram algumas reflexões e conclusões que são
trazidas ao longo do trabalho. Durante as visitas realizava as anotações de minhas impressões
e de tudo que observava e, ao fim da visita, fazia o registro em meu diário de campo.
As atividades pertinentes ao objetivo de analisar os fundamentos e ideias constantes
nos documentos orientadores do Colégio Polivalente, portanto no conjunto de textos que
orientam sua proposta educativa aconteceram com as visitas próprias para esse fim tanto no
Colégio Polivalente como na Secretaria de Educação. Diversos documentos foram
disponibilizados, alguns com maior facilidade, outros que necessitaram uma maior paciência e
insistência como o Projeto Político Pedagógico (PPP) do Colégio.
Ao longo dessas visitas fomos (pesquisadora e orientadora) elaborando estratégias
para compreender o colégio a partir de diversos olhares e percepções. Utilizamos a
observação o questionário e as entrevistas porque desejávamos que nossa análise estivesse
pautada em uma diversidade de olhares e pessoas. Nos resguardamos em Eisenhardt (1989)
que defende que a aplicação de múltiplos métodos facilita a chamada triangulação dos dados,
contribuindo de forma mais efetiva para corroborar hipóteses e constructos. Reconhecemos no
percurso o método do estudo de caso que para Yin (2010, p. 24) refere-se a um método de
pesquisa que contribui para a compreensão e construção de conhecimentos acerca dos
fenômenos da vida social, tanto individuais, como coletivos, globais, institucionais, dentre
outros, que possibilita ainda, aos investigadores reter as “características holísticas e
significativas dos eventos da vida real”.
Todos os instrumentos foram apresentados à coordenadora e posteriormente por ela
ao gestor para autorização de utilização. Ambos nos deram a certeza de que teríamos um
índice alto de devolução dos questionários, por isso, optamos por realizar perguntas abertas
28

para que os alunos levassem para casa e tivessem um tempo maior para responder as questões,
inclusive, elaboramos duas perguntas aos pais que se disponibilizassem a responder.
Encaminhamo-nos às salas do Ensino Médio para a explicação e entrega dos
questionários aos alunos que se disponibilizaram para responder. Nossa receptividade não foi
muito grande, alguns alunos alegaram não ter tempo para responder, outros não demonstraram
interesse, enfim, a aplicação do questionário não ocorreu conforme o esperado. Os
questionários foram entregues no dia 26/03/2018 e recolhidos no dia 02/04/2018. No Ensino
Médio no ano de 2018, eram aproximadamente 150 alunos matriculados, destes, 38 se
disponibilizaram a responder, mas, apenas 5 nos entregaram o questionário respondido. Por
isso, optamos por não utilizá-los ao longo da dissertação sem deixar de afiançar que as
respostas obtidas estavam bem alinhadas àquelas obtidas nas entrevistas narrativas.
As entrevistas narrativas foram os instrumentos para composição do corpus da
pesquisa. As narrativas “são reproduções ou interpretações das experiências cotidianas dos
indivíduos” (REIS et.al., 2014, p. 197). Conforme os autores:
Ao romper com a tradicional forma de entrevistas baseadas em perguntas e
respostas, o método das narrativas revela-se um importante instrumento para se
realizar investigações qualitativas, dispondo para os pesquisadores dados capazes de
produzir conhecimento científico compromissado com a apreensão fidedigna dos
relatos e a originalidade dos dados apresentados, uma vez que permitem no
aprofundamento das investigações, combinarem histórias de vida a contextos sócio–
históricos, tornando possível a compreensão dos sentidos que produzem mudanças
nas crenças e valores que motivam (ou justificam) as ações dos informantes (REIS,
et. al., 2014, p. 197).

As entrevistas narrativas ampliaram nosso olhar sobre o objetivo, e proporcionaram


outras perspectivas, além de permitir a confrontação com os dados produzidos a partir dos
documentos norteadores do colégio.Buscamos também compor um perfil heterogêneo com
alunos que acompanharam a militarização, alunos novatos oriundo de colégios públicos e
particulares, selecionamos ainda, uma das alunas “destaques” (alamares) do colégio. Por meio
das narrativas foi possível conhecer o movimento do pedagógico da instituição, a partir dos
diferentes pontos de vista, por isso, foi de extrema importância para o desenvolvimento da
presente dissertação. Realizamos entrevistas com um total de quinze pessoas (Apêndices 1, 2
e 3). As transcrições ocorreram logo após a realização das entrevistas. Para um melhor
entendimento ou aquilo que chamamos de textualização foram feitas pequenas correções e
adequação às normas da língua portuguesa, como repetições, vícios de linguagem, erros
gramaticais etc. Optamos por manter o sigilo dos nomes dos participantes, como forma de
resguardar os participantes. Inicialmente utilizamos como codinomes as abreviações da
29

função que exercem no colégio, no entanto, essa dinâmica ao longo do trabalho tornou-se
confusa e, por isso, optamos por utilizar nomes fictícios para a apresentação dos sujeitos.
Vale ressaltar que o fato de termos sido muito bem recebido no colégio, trouxe receio
quanto à posição crítica, mas no decorrer do estudo, percebemos que seria necessário e
urgente para pensar na atualidade.
Realizamos entrevistas com sete alunos, das quais, selecionamos 4 (quatro) para
análise, visto que as respostas obtidas pelos três alunos que foram descartados, não
propiciaram elementos consistentes para análise.
“Aluno 1”, dezessete anos, estuda no colégio desde 2016 e estava no Terceiro Ano
do Ensino Médio. Reside com a mãe, que é professora tutora na regional de educação e o
padrasto que é policial militar e atua no colégio. Objetiva cursar medicina, por isso, também
frequenta curso preparatório para o Enem. Estudava antes em colégio conveniado. É Alamar
do colégio (aluno destaque) e, no ano de 2018 participou de momentos de formação para ser a
líder geral do acolhimento dos alunos novatos.
“Aluno 2”, quinze anos, estuda no colégio desde 2018, e estava no 2º ano do Ensino
Médio. Oriundo de escola pública estadual, mora com o pai e com a madrasta, que trabalham
e possuem curso superior. Considera-se um bom aluno e afirma que o desempenho melhorou
após a ida para o Colégio Polivalente. Afirma gostar do regime militar.
“Aluno 3”, dezesseis anos, transferiu-se para o Colégio Polivalente no ano de 2017,
oriunda de um colégio da rede privada, reside com a mãe, que trabalha e não possui curso
superior. Afirma que anteriormente seu rendimento no colégio era péssimo e que não havia
convívio harmonioso com os professores. Quando conseguiu uma vaga no colégio, resolveu
se dedicar mais, pois acredita que se “encaixou” melhor no ambiente. Afirma gostar do
regime integral.
“Aluno 4”, 17 anos, estuda no colégio desde 2016, cursa o terceiro ano. Mora com os
pais e o irmão mais velho. Em sua residência todos trabalham e, não possuem curso superior.
O irmão está cursando física na UFG. Oriunda da rede estadual pública de ensino, afirma que
seu rendimento era mediano no outro colégio e, devido ao tempo integral, considera que o
rendimento melhorou. Assume não gostar do regime militar, contudo, sabe que será bom para
o futuro, pois considera que o ensino no colégio é de ótima qualidade.
As entrevistas com equipe profissional foram realizadas nos meses de fevereiro e
março de 2018. Optamos pela amostragem por conveniência ouvindo professores que
atendessem aos critérios de: terem acompanharam a mudança de tempo parcial para tempo
30

integral; terem acompanhado a militarização; terem ingressado após a militarização.


Apresentamos a seguir a caracterização destes entrevistados.
O “Gestor” cursou como aluno a maior parte da educação básica escolar na rede
privada ou conveniada de ensino. Possui graduação em Direito e foi aprovado em um
concurso público para o Corpo de Bombeiros no ano de 2001 (dois mil e um). Atuou como
soldado até 2005 (dois mil e cinco), momento em que passou em dois outros concursos
públicos, um para a Polícia Civil e um para Polícia Militar. Optou por se tornar oficial da
Polícia Militar. Frequentou o curso de formação de oficiais com duração de dois anos,
considerado um curso superior na academia da polícia. A grade curricular contava com
disciplinas de administração, psicologia, gestão organizacional, direito penal, com
aprofundamento em algumas partes específicas da polícia. Trabalhou em Goiânia por um mês
e foi transferido para Catalão, onde permaneceu até 2011 (dois mil e onze). Novamente foi
transferido para Goiânia, em que teve conhecimento sobre a autorização para instalação de
um CEPMG e iniciou movimentações e levantamento de efetivo para a execução do projeto.
A “Coordenadora” é filha e irmã de professora. Toda trajetória escolar como aluna
foi em escola pública. Cursou magistério e depois graduação e mestrado em geografia pela
Universidade Federal de Goiás (UFG). Trabalhou na rede particular de ensino por seis anos.
Em 2010foi aprovada no concurso do Estado. Trabalhou em diversas escolas estaduais, até
que em 2016 (dois mil e dezesseis) foi convidada pelo Major para fazer parte da equipe
pedagógica do Colégio Polivalente. Iniciou como professora de sociologia, filosofia e
coordenadora de núcleo diversificado. Em 2017 (dois mil e dezessete) foi convidada para
assumir a coordenação pedagógica.
“Professor 1” possui graduação em geografia, pela UFG. Antes de terminar o ensino
superior já tinha contrato no Estado, inclusive atuando no Colégio Polivalente. Aprovada em
concurso público, atuou em diversos colégios. Em 2001, foi convidada a assumir as aulas de
geografia no colégio. Acompanhou a mudança do colégio para CEPI e para Militar. No
momento da entrevista, atuava como coordenadora da área de humanas e professora da
disciplina de geografia.
“Professor 2” cursou toda educação básica em escola pública. É graduado em
Educação Física pela UFG. Atua como professor desde2010, quando foi aprovado em
concurso público do Estado. Em 2013 foi convidado para assumir as aulas de Educação Física
no Colégio Polivalente assumindo-as em 2014. Em 2018 atuava como coordenador do núcleo
diversificado e como professor das disciplinas de projeto de vida, estudo orientado e também
a prática de laboratório.
31

“Professor 3” foi preponderantemente aluna em escola pública (apenas no final da


educação básica cursou dois anos na escola privada, através de uma bolsa de estudos).
Graduada em Letras pela UFG, atua a quase vinte anos na educação. Trabalhou no Núcleo de
Tecnologias aplicadas à Educação. Atuou na gestão e na Subsecretaria de Educação
(Coordenação Regional Estadual de Educação e Cultura). Entrou no Colégio Polivalente no
ano de 2016, como professora de Língua Portuguesa, literatura e redação. Em 2018 atuava
como secretária geral da escola.
“Professor 4” é graduada em Letras pela UFG em 1995. Desde então atuou como
professora concursada na rede pública de ensino do Estado de Goiás, no qual exerceu várias
funções como: professora de Língua Portuguesa e Inglesa no Ensino Fundamental e Médio;
Tutora Pedagógica; Coordenadora Pedagógica Regional (na Subsecretaria de Educação de
Catalão), como professora multiplicadora nos Programas de Ensino da Secretaria; Diretora de
Colégio. Atuou em diversas unidades escolares e Programas do Governo na área de ensino.
Neste ínterim o Colégio Polivalente também esteve presente. Sua reaproximação efetiva com
o Colégio se deu devido à nova proposta de modalidade de ensino em Tempo Integral, no ano
de 2013. Em 2018 atuava como Professora da Sala de Leitura (Projetos de Leitura/biblioteca).
“Professor 5” possui graduação em História pela UFG, concluída em 2015. Em 2016
ingressou no mestrado em história. Participou de programas de extensão na Universidade, e
teve contato com diferentes escolas, sempre atuando principalmente nas áreas de filosofia e
sociologia, disciplinas que lecionava no ano que iniciou no colégio. Seu vínculo com o Estado
é por meio de contrato. Seu contato com o Colégio Polivalente, “foi um contato de
estranhamento”, visto que o colégio já era militar e a convite da coordenadora para assumir as
aulas de filosofia e sociologia. Em 2018 atuava com as disciplinas de filosofia e artes.
“Militar” cursou o Ensino Fundamental em escola pública e o Ensino Médio na rede
privada de ensino. É concursado sob a função de Cabo da Polícia Militar. Graduado em
Geografia pela UFG e possui especialização em neuropsicopedagogia. Atua como Policial
Militar desde 1999, e quando iniciou na carreira, participou do curso de formação, que
abordava dentre outras coisas, os princípios da área do direito, português, ética, cidadania,
direito penal, direito civil, e também a parte médica legista, além de algumas disciplinas
específicas da polícia militar, trabalho operacional, manuseio de ocorrências. Trabalhou
dezoito anos na vida operacional na Polícia Militar. Em 2016 foi transferido para o Colégio
Militar. Sua trajetória na Polícia Militar trabalhou em um programa de prevenção às drogas
nas escolas públicas e particulares da região. Em 2018 atuava na parte disciplinar e ministrava
as aulas de cidadania e civismo.
32

Após a pesquisa de campo chegamos a um corpus cuja análise foi realizada com base
primeiramente pela análise de conteúdo proposta por Bardin (2009). Laville e Dionne (1999)
que explicam que a análise do conteúdo não se refere a um procedimento rígido, com etapas
específicas a serem seguidas para obter conclusões pertinentes. E sim, um conjunto de
possíveis desdobramentos e vias que possibilita reconstruir e ressignificar o sentido dos
conteúdos. Depois confrontamos excertos articulando uma espécie de triangulação
sistemática11 dos dados (documentos, entrevistas profissionais, entrevistas alunos) que nos
permitiu alcançar o objetivo estabelecido, ou seja, a compreensão do pedagógico do colégio.
Falemos sobre o colégio.

O objeto: Colégio Polivalente

Para apresentar a história da instituição a dividimos em fases conforme nomenclatura


e legislação. Exploramos um entendimento baseado nas tendências\abordagens pedagógicas
cultivadas, pois, de algum modo elas ficam sedimentadas na imaterialidade da cultura do
espaço seja pelo imaginário, seja pela tradição.

Fase I: Escola Estadual Polivalente de 1º Grau de Catalão (1978-1986)

Pela leitura do Projeto Político Pedagógico (2017) vemos que a instituição que hoje
abriga o nosso objeto de estudo, surge como Escola Estadual Polivalente de 1º Grau de
Catalão (Lei 8.275/1977) em julho de 1977, como resultado da parceria entre entidades
Federais, Estaduais e Municipais. A construção do prédio e a aquisição dos equipamentos
necessários ao seu funcionamento foram garantidas pela parceria entre a Agência Norte
Americana12 para o desenvolvimento Internacional e o Programa de Expansão e Melhoria do
Ensino13. A inauguração e o início das atividades datam de 02 de maio de 1978 quando a

11
Para Flick(2009) a triangulação sistemática pode ser conseguida a partir da combinação de perspectivas e de
métodos de pesquisa adequados, que sejam apropriados para levar em conta o máximo possível de aspectos
distintos de um mesmo problema.
12
Nos parece importante compreender as escolas Polivalentes na consideração do contexto internacional da
Guerra Fria, no qual a tática norte-americanaera expandir seu poderio político e econômico aos países latino-
americanos. A partir dessa lógica, é durante o regime ditatorial iniciado no Brasil em 1964 que se concretizam
vários acordos de cooperação, dentre os quais, o acordo MEC-USAID, que visavam em texto a melhoria da
educação brasileira, (ARAÚJO, 2009).
13
O Programa de Expansão e Melhoria do Ensino Médio – PREMEM (Decreto nº 63.914/1968 objetivava
“incentivar o desenvolvimento quantitativo, a transformação estrutural e o aperfeiçoamento do ensino médio”
(BRASIL. Decreto n. 63.914, de 1968). Este programa tornou-se o responsável pelo planejamento da reforma de
1971, bem como pela estruturação dos mecanismos de intervenção e o treinamento o pessoal, para replicar os
33

instituição passa a atender turmas de Ensino Fundamental II, denominado no período como 1º
Grau. Em 1979 pela nº Lei 8.669, há a alteração do nome da instituição para “Escola Estadual
Polivalente de 1º Grau “Dr. Tharsis Campos”.

Fase II: Escola Estadual Polivalente de 1º Grau “Dr. Tharsis Campos” (1986- 2012)

A partir de 1980 (Lei nº 8.780 que dispunha sobre o Sistema Estadual de Ensino) a
instituição passa também a oferecer o 2º Grau em paralelo ao ensino Técnico-
profissionalizante. Pelo que consta no PPP (2017), a oferta do ensino técnico
profissionalizante se manteve até o ano de 1986, momento em que se volta especificamente a
ofertar os níveis de ensino Fundamental e Médio, mantendo-se nessa organização até o final
de 2012.

Fase III: Colégio Estadual Polivalente “Dr. Tharsis Campos (2013-2016)

A Lei nº 17.920 de 27 de dezembro de 2012, determinou a transformação de quinze


escolas estaduais em Centros de Ensino em Período Integral (CEPI)14. Essa mudança que
aconteceu em meio aos debates em torno do tema “Escola Pública de Tempo Integral15” que
ganharam notoriedade no Brasil, sobretudo, desde a promulgação da Lei nº 9.394/96, que
aponta a progressiva expansão da jornada escolar no Ensino Fundamental e Médio.
Por meio da Lei nº 17.920/2012, o Colégio Polivalente se torna uma instituição que
atende alunos do Ensino Médio em período integral, e passa a ser denominado Colégio
Estadual Polivalente “Dr. Tharsis Campos”.
A reorganização do Ensino Médio em Goiás se deu a partir da constatação e
identificação de falhas no processo de ensino/aprendizagem dos alunos, por meio de

conhecimentos adquiridos nos EUA. O PREMEM é o responsável pela implantação e organização das Escolas
Polivalentes no Brasil.
14
Colégios de Ensino Médio, que preconizaram a ampliação da jornada escolar, com o objetivo de fornecer
atendimento a estudantes do Ensino Médio, para a formação de indivíduos livres, solidários e qualificados,
atendendo assim, às diretrizes estabelecidas na LDB 9.394/96. (PROGRAMA NOVO FUTURO, 2012).
15
Anísio Teixeira pode ser considerado como o precursor no Brasil dos debates sobre a educação integral e as
escolas de tempo integral. Tinha como fundamento a premissa de que a escola caberia não apenas a formação
intelectual, mas também o cuidado com a saúde e higiene do educando, bem como a preparação para o exercício
da cidadania. No Brasil, a compreensão acerca desta concepção pode ser compreendida a partir da relação com o
pensamento educacional das décadas de 1920 e 1930. Na visão das correntes autoritárias e elitistas, estava
atrelada à expansão do controle social e hierarquizado da sociedade. Em contraponto, as correntes liberais
utilizavam deste conceito objetivando a reconstrução das bases sociais para a democracia, que só se efetivaria,
com a formação de indivíduos para a cooperação e participação no âmbito social. Nesta última visão, Anísio
Teixeira era um dos principais articulares.
34

comparação estatísticas dos resultados obtidos nas avaliações da qualidade da educação


nacional, que revelaram que as taxas de evasão e abandono no Ensino Médio no estado eram
altas, o que evidenciou a necessidade de promover uma educação mais atrativa e de
qualidade, que expandisse as oportunidades de aprendizagem, sucesso e progressão nos
estudos dos alunos (RODRIGUES, 2016).
Assim, em busca da melhoria dos índices avaliativos o governo do Estado
implementa as escolas em tempo integral, o que modificou a estrutura de diversas instituições,
dentre as quais, o Colégio Polivalente.
Pela documentação acessada e também pelas narrativas, podemos afirmar que a
transformação do colégio em CEPI implicou na transferência de mais de 500 (quinhentos)
alunos, que precisaram buscar vagas em outras escolas. Além disso, vários alunos que
frequentavam o Ensino Médio noturno, justamente por já se encontrar no mercado de
trabalho, precisaram também, buscar outra escola, considerando a necessidade de trabalhar.
Também nos permite afirmar que não houve qualquer consulta à comunidade escolar no
tocante a transformação da instituição em CEPI. Uma vez efetivado, o colégio passou a
atender os alunos do Ensino Médio em período integral, reduzindo significativamente o
quantitativo de alunos atendidos16 nos anos subsequentes.
No aspecto da infraestrutura, uma reforma e adequação da instituição para
atendimento em período integral foi iniciada, contudo, poucos meses depois foi abandonada.
Conduzimos algumas pesquisas acerca das notícias em blogs e jornais da cidade sobre esse
período, as obras e reformas na estrutura física da instituição foram paralisadas e depois
abandonadas, o que gerou um caos e trouxe transtornos para alunos e professores, fato este,
também evidenciados nas entrevistas-narrativas. Novamente o colégio padeceu com a
degradação de seus prédios, as instalações inadequadas que acarretavam a queda significativa
do quantitativo de alunos.
Em entrevista a Blog da Cidade, em novembro de 2015 eram destacadas as
condições do colégio naquele momento apontando que o funcionamento limitado se devia à
reforma paralisada. Badiinho Filho (2015) afirma que a instituição se encontrava com pisos
quebrados, banheiros desmanchados e que o telhado do refeitório e do laboratório de
informática havia sido arrancado. Um pavilhão de salas de aula ainda havia sido desmanchado

16
Os dados levantados no Censo Escolar do período, mostra que no ano de 2012 estavam matriculados 585
alunos, destes, 413 estavam matriculados no Ensino Médio (diurno e noturno). Por sua vez, no ano de 2013 esse
número caiu para 129. Em 2014, 88 alunos. 90 alunos em 2015 e no ano de 2016, 76 alunos atendidos.
Observamos assim, uma queda significativa do número de alunos matriculados.
35

para reforma. Com relação ao número de profissionais havia o déficit na equipe pedagógica,
com falta de professores e coordenadores.
Vemos que entre 2013 e meados de 2016, momento em que novamente houve
mudança em sua estrutura, o colégio funcionou em condições adversas e limitadas tanto em
razão da alteração para o Tempo Integral que precisou provocar a diminuição das vagas
quanto pelas condições de infraestrutura inadequadas a proposta, o que impactou o processo
de ensino/aprendizagem e diretamente explica porque ocorre entre os anos de 2013 e 2016
uma queda significativa no quantitativo de matrículas. Até então o programa Novo Futuro não
havia se efetivado e alguns professores desacreditavam em sua concretização. Somados: o
descrédito do programa, a infraestrutura precária ou inexistente, a falta de professores e a falta
de coordenação estavam enfeixadas as condições para a militarização.

IV Fase: CEPI-PMG Polivalente Dr. “Tharsis Campos” (2016)

Diferentemente do que parece ter sido a dinâmica em relação à proposta de Tempo


Integral a proposta da militarização teria sido discutida e apresentada. Ele tinha a defesa dos
profissionais do colégio por ser captado como modelo de qualidade e oportunidades aos
alunos da rede pública. Isso influenciou a aceitação da manutenção do Tempo Integral por
parte do Comando Militar.
Pelas pistas obtidas percebemos que a “transferência” da responsabilidade da gestão
ou a “parceria” junto à outra instituição, também estatal, que, ao contrário do descrédito dos
programas da educação, possui aceitação e status evidente na esfera social transfigurada no
Comando da Polícia Militar foi significada como um tipo de “resgate” ou salvação do
Colégio. Assim concebida, a partir da precariedade, da falta de rumo, de coordenação e ao
mesmo tempo da oportunidade e apoio governamental diferenciado, ou seja, no entremeio de
entraves, jogos políticos e de interesses e as demandas da própria sociedade (por disciplina
para as juventudes como veremos), se compreende a efetivação de uma instituição
educacional vinculada à Polícia Militar.
A criação do Colégio da Polícia Militar em Catalão foi aprovada por meio da Lei nº
18.556 de 25 de junho de 2014. Como mostraram as entrevistas ainda que autorizada desde
2014 ela se efetivou somente no ano de 2016. A partir de 2016 a direção já sob
responsabilidade de um militar apreciador do Programa Novo Futuro até então com
dificuldades de implementação no colégio passa a investir seus esforços para a efetivação da
proposta.
36

Nos anos de 2014, 2015 os profissionais do colégio não tinham envolvimento muito
estreito com a militarização, ao contrário do Estado e o Comando Militar que trabalhavam
pelo projeto. A justificativa da escolha do Polivalente para a militarização se atrelava ao fato
de que ele era um colégio tradicional que estava “acabando” e era detentor de toda uma
estrutura condenada com número de alunos menor que a capacidade do colégio.
A verificação das atas nº 001/2016 e 002/2016 da Subsecretaria Regional de
Educação, Cultura e Esporte de Catalão (SRECE), revela que foram realizadas no mês de
março de 2016 duas reuniões com a comunidade escolar (pais, professores e comunidade). A
primeira reunião, contou com a presença de 68 (sessenta e oito) pessoas, entre pais,
professores, militares e comunidade, por sua vez, a segunda reunião, contou com a
participação de 21 (vinte e uma) pessoas, das quais, tratava-se da equipe de coordenação da
implantação do CPMG e equipe escolar. Essas reuniões tiveram como principal objetivo,
apresentar e discutir a proposta e a forma de funcionamento destas instituições, bem como o
esclarecimento de dúvidas sobre a rotina, uniformes e as mudanças que seriam efetivadas na
instituição. Todas as sugestões apresentadas foram aceitas pela comunidade escolar.
Pelas narrativas, podemos afirmar que a aproximação dos militares com a rotina
escolar, não se deu exclusivamente por meio dessas reuniões. Antes de efetivar a militarização
os militares fizeram visitas esporádicas à instituição, para estabelecer um vínculo com os
professores e alunos.
Por meio das narrativas também foi possível perceber que, além dessas reuniões com
a comunidade, lavradas em atas, houve outras assembléias em que os militares apresentaram a
proposta para os alunos e professores. Após as reuniões, e com aceitação unânime da
comunidade para a implantação do Colégio da Polícia Militar, esta, passou a ser denominada
CEPI-PMG Polivalente Dr. “Tharsis Campos”.
Ainda por meio das narrativas evidenciamos que os indivíduos construíram a
concepção de que a instituição ganhou maior notoriedade e credibilidade a partir dessa
mudança. Outro fato verificado é a importância que o Major atribuiu à parceria com outras
instituições públicas e privadas, que segundo ele, possibilita maiores investimentos e gera
melhores resultados.
A transformação do colégio aconteceu no mês de agosto do ano de 2016 quando ele
passou então a denominar-se “Centro de Ensino em Período Integral da Polícia Militar
Colégio Polivalente “Dr. Tharsis Campos”, resultado da parceria entre a Polícia Militar e a
SEE. Após a militarização, foram realizadas várias reformas e reestruturação dos pavilhões da
escola. A obra paralisada foi retomada e, os pavilhões que haviam sido derrubados foram
37

recuperados, ampliados e melhorados para o atendimento aos alunos. Reformas estas, que no
ano de 2018 durante as observações ainda se encontravam ativas. As vagas foram ampliadas
e, a procura por vaga na instituição aumentou significativamente.
Em junho de 201617, o colégio possuía aproximadamente oitenta alunos
matriculados. Ao ser anunciada a implantação do CPMG, foi realizado um sorteio, para a
ampliação das vagas, e, assim, as matrículas totais no segundo semestre de 2016 atingiram o
quantitativo de cento e cinquenta alunos do Ensino Médio em período integral.
A infraestrutura do colégio, que até o ano de 2016 representava um dos seus grandes
problemas, sofreu melhorias profundas e significativas com a entrada dos militares na gestão.
Os pavilhões foram reformados, o refeitório foi reativado, paredes pintadas. Tudo para a
efetivação de um ambiente limpo e organizado bastante diferente do que se via anteriormente.
Considerando a realidade da maior parte dos colégios, é possível afirmar que o
CEPMG atua com maior número de profissionais. Para o desenvolvimento da proposta, no
ano de 2018, o colégio contava com um total de 39 funcionários, entre civis e militares,
organizados da seguinte forma:
Civis (28 funcionários)sendo: 14 docentes dos quais 4 são docentes e coordenadores
de áreas; 1 coordenador pedagógico; 1 coordenador Administrativo Financeiro; 1 secretário
geral; 3 merendeiras; 4 auxiliares de limpeza; 1 auxiliar de pátio; 2 vigias; 1 laboratorista;
Militares (11 funcionários)sendo: 1 comandante diretor; 1 subcomandante capitão;
1 tenente disciplinar + 1 auxiliar; 1 chefe da divisão de ensino + 1 auxiliar; 1 secretária do
comandante – parte militar; 2 assistentes do subcomandante; 2 disciplinares;

Estrutura e resultados da dissertação

O primeiro capítulo investe na compreensão do pedagógico do Colégio Polivalente a


partir dos fundamentos e ideias que norteiam os documentos orientadores. O que realizamos a
partir de uma análise documental guiadas pelas orientações de Cellard (2012), que a defende
como uma análise que possibilita compreender de forma coerente e adequada os significados
e sentido das mensagens. Os documentos analisados foram: 1) Modelo pedagógico Escola da
Escolha; 2) Programa Novo Futuro; 3) Diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de

17
Em 2018 o atendimento foi estendido de modo que foram abertas turmas para o 8º e 9º anos do Ensino
Fundamental. Já há expectativa para ampliação e atendimento nos anos seguintes a partir do 6º ano do Ensino
Fundamental.
38

Ensino de Goiás 2016/2017; 4) Regimento interno; 5) Projeto Político Pedagógico e; 6) Plano


de Ação.
Como referencial teórico, nos embasamos em autores da educação e das políticas
educacionais como Ball (2011, 2013), Libâneo (2018) e Peroni (2012), dentre outros.
Apontamos que os documentos manifestam evidências do processo político de privatização da
educação e do afastamento do Estado no financiamento do campo educacional, bem como a
valorização de uma educação pró-sistema.
No capítulo II buscamos compreender o pedagógico do colégio a partir da
compreensão dos elementos do processo educativo delimitados pelo campo da didática. A
metodologia para obtenção dos dados elegeu como base as entrevistas-narrativas. O
referencial circundou a leitura de autores do campo de didática como Pérez Goméz e Gimeno
Sacristán (1998), Haydt (2011), Libâneo (2013), da formação de professores como Contreras
(2013) e ainda sobre autores que discutem relações de poder e dominação como Foucault
(1987) e Weber (2004). Os resultados obtidos indicam que o pedagógico do colégio se
constitui marcado por conflitos entre as diferentes perspectivas, ora predominando no
processo educativo os ideais militares vindos do regimento militar, ora os ideais civis-
pedagógicos mais inspirados na Escola da Escolha. Ora pendendo a um lado ora a outro o que
fica evidente é que o pedagógico da instituição se circunscreve ao propósito de uma educação
liberal e conservadora que ainda que enseje a efetivação de novas dinâmicas mantém como
função a formação para adaptação à sociedade, leia-se quase sempre mercado.
No capítulo III a compreensão do pedagógico envereda pela dimensão subjetiva,
produzida pelas narrativas sobre as relações interpessoais em suas múltiplas orientações.
Situando as relações como elementos do processo educativo dialogamos com Mizukami
(1987) e Libâneo (2013) que nos permitem reforçar a ideia do capítulo anterior e perceber no
colégio as relações de conflito e as disputas de poder. Vemos o consenso da equipe
pedagógica (militares e civis) no sentido de atingir os ideais orientadores contidos nos
documentos e que indicam como meta a formação de indivíduos com as seguintes
características: líderes, protagonistas, cívicos. Mas ficam evidenciadas pelas formas
assumidas na sutileza da hierarquização das relações (que refletem a territorialização do
poder) que o poder decisório em panorama macro não está nas mãos dos educadores, mas do
empresariado que dita os conteúdos e a modernização de recursos e terminologias, dos
militares que ditam a forma com a qual se envelopa o processo educativo: disciplinada e
moral.
39

Dos professores evidenciamos a satisfação em atuar em um pedagógico de resultados


que forma futuros líderes, satisfação em atuar em prol de uma “causa” e condições que se
diferenciam profundamente daquela registrada em outros colégios públicos estaduais.
Recursos, tempo para estudo, valorização dos pais, respeito e obediência dos alunos. Ainda
assim nos parece pouco porque partimos de uma ideia de educação crítica, instrumento
político de transformação social. Nos parece pouco e para poucos.
Identificamos ao final a possibilidade de uma dupla leitura compreensiva do
pedagógico do colégio: uma que o valoriza, defende sua replicação na rede pública movidos
pelo entendimento de que nele (neles) os alunos (poucos) terão uma formação ampliada e de
qualidade que, nos moldes de uma educação liberal cuidará de seu desenvolvimento
individual, de seu futuro. A outra, aquela que enxerga na militarização a criação de ilhas
formativas que diferenciam seus jovens e deixam os demais alunos das outras escolas
públicas, mantidos subordinados às péssimas condições e submissos a outras formas de
participação, entrada e saída de uma realidade capitalista e cruel seja lida como mercado seja
lida como vida.
Pensar em uma educação que promove a poucos alunos a possibilidade de uma
educação de qualidade, e aos demais a lógica da exploração-subordinação-desistência, uma
educação que promove plenas condições aos professores de pensar a escola na miopia da
perspectiva intramuros e pró futuro, é abraçar a reprodução das desigualdades em um país
marcado por elas.
40

CAPÍTULO I

A GÊNESE DO COLÉGIO DA POLÍCIA MILITAR EM TEMPO INTEGRAL NOS


TEXTOS ORIENTADORES
“A construção do ser social, feita em boa parte pela
educação, é a assimilação pelo indivíduo de uma série
de normas e princípios — sejam morais, religiosos,
éticos ou de comportamento — que balizam a conduta
do indivíduo num grupo. O homem, mais do que
formador da sociedade, é um produto dela”. Émile
Durkheim

Toda a instituição educativa constituída nos moldes da modernidade, ou seja,


marcadas pelo apreço ao conhecimento e submetida a normas de organização institucional, é
norteada por ideais e-ou concepções de mundo-educação-sociedade-homem que orientamos
discursos produzidos ou replicados e sobremaneira sua dimensão pedagógica. Nas sociedades
ocidentais esse conjunto de pensamentos e ideias costumam originar as leis, documentos e
textos orientadores da vida em sociedade.
Assim, uma das formas para compreensão das instituições educativas é a análise dos
textos que a inspiram, fundamentam e estruturam. É esse expediente que tomamos neste
capítulo para iniciar a compreensão do pedagógico do Colégio Estadual da Polícia Militar de
Goiás “Dr. Tharsis Campos” – Colégio Polivalente. Nos debruçamos sobre as ideias seminais
que orientam suas atividades pedagógicas e indicam os fins e exigências sociais, políticas e
ideológicas, que estão dispostas em um conjunto de documentos pelos quais ela se faz
conhecer e seguir.
Metodologicamente, portanto seguimos o que preconiza a pesquisa documental que
pressupõe Gil (2008, p. 45) a análise de “materiais que não receberam ainda um tratamento
analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa”. Em
nosso caso estes documentos são: 1) Modelo pedagógico Escola da Escolha; 2) Programa
Novo Futuro; 3) Diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de Ensino de Goiás
2016/2017; 4) Regimento interno; 5) Projeto Político Pedagógico e; 6) Plano de Ação.
O referencial teórico utilizado congrega a contribuição de autores e obras que: a)
assumem a concepção de educação como uma atividade pautada na ordem do político e do
social como Brandão (1995) e Freire (1983); b) refletem sobre o processo político de
privatização da escola pública como Ball (2011, 2013), Libâneo (2018), Peroni (2012), Luz
(2011), e c) relacionam os aspectos políticos e ideológicos ao pedagógico pelo viés da
41

Didática para o quê citamos especialmente Mizukami (1986), Libâneo (2003, 2011) e Saviani
(2012).

1.1.A “Escola da Escolha” e o Programa Novo Futuro: a roupa nova da velha intenção

A proposta da Educação em Tempo Integral no Estado de Goiás teve seu marco


inicial legal no ano de 2006, mas só foi ampliada para o Ensino Médio em 2013, com a
criação do Programa Novo Futuro, elaborado pela Secretaria de Educação Cultura e Esporte
(SEDUCE) de Goiás, inspirado em um modelo pedagógico de “sucesso” implantado
anteriormente em um colégio estadual de Pernambuco – Ginásio Pernambuco. Todos os
preceitos estabelecidos neste modelo que é chamado de “Escola da Escolha” foram
incorporados pelo Programa Novo Futuro.
O modelo pedagógico “Escola da Escolha” foi idealizado e produzido pelo Instituto
de Corresponsabilidade pela Educação – ICE18.A origem do modelo está no que foi pensado,
planejado e efetivado para a “transformação do Ginásio Pernambuco”, situado em Recife, em
uma escola com “padrão de excelência na educação” (ICE, 2016a).
Já o Programa Novo Futuro elaborado pela SEDUCE-GO foi preparadopara
estruturar a criação e organização dos Centros de Educação em Período Integral (CEPI’s) em
Goiás, estabelece diretrizes gerais para essas instituições, e reproduz basicamente a Escola da
Escolha, ainda que em um texto mais alinhado ao repertório da educação. Neste ponto
devemos destacar que a linguagem da Escola da Escolha (falaremos disso mais a frente) é
eivada de termos próprios do meio empresarial-produtivo.
Estes dois documentos são basilares para o direcionamento do pedagógico do
Colégio Polivalente, pois estabelecem os princípios educativos e todo o aparato de
metodologias, rotinas e instrumentos para a instituição. Vejamos a Escola da Escolha.
O modelo pedagógico Escola da Escolha é composto por um conjunto de 8 (oito)
cadernos de formação, que definem os princípios educativos, as metodologias, os
instrumentos, as rotinas, os ambientes, bem como o modelo de gestão das instituições que
optam por implantá-lo. Os cadernos temáticos são assim divididos:
 Caderno 1 “Introdução às bases teórico e metodológicas do modelo Escola da
Escolha” que apresenta o cenário educacional brasileiro e os desafios frente ao século
XXI. Neste caderno está a origem do Modelo da Escola da Escolha, a perspectiva de

18
Entidade sem fins lucrativos criada em 2003 por iniciativa do empresário Marcos Magalhães que reúne
diversos representantes do setor privado, dentre os quais, ABN AMRO Bank, CHESF, ODEBRECHT.
42

aluno esperado “adjetivos” e o ideal de escola. Fica explícita a centralidade do


estudante e seu “Projeto de Vida para o processo pedagógico da escola da escolha.
 Cadernos 2, 3, 4, 5, 6 e 7 “Modelo Pedagógico” que apresentam o aparato de
metodologias, rotinas, instrumentos e recursos para a instituição.
 Caderno 8 “Tecnologia de gestão educacional” que apresenta o modelo de gestão, seus
princípios e conceitos, e as orientações sobre seu planejamento e operacionalização.
Todo o documento cativa pelo uso de uma estética visual apurada, cuidadosa com a
diagramação e com a qualidade da impressão. Persuade o leitor pelo uso de imagens, gráficos,
pela função conativa na linguagem que quase convoca e, sobretudo, pela recorrência a citação
de nomes conhecidos nos meios educacional, sociológico e empresarial como Jaques Delors,
Edgard Morin, Zygmunt Bauman, dentre outros, ainda que não se aprofunde em suas ideias.
Analisando mais detidamente o texto avaliamos que se assemelha a um apanhado que
converge para ser um referencial teórico e mais do que isso para incutir ideais e modos de
fazer um projeto maior relacionado ao desenvolvimento de trabalhadores para o mercado
empresarial.
Vejamos melhor estas ideias e modos de fazer. Seguiremos a ordem dos fascículos
do material e grifaremos com negrito as palavras que nos proporcionaram a análise do
mesmo, já demonstrando um pouco do processo que foi a análise do conteúdo (BARDIN,
2007).

1.1.1. Caderno 1 “Introdução às bases teórico e metodológicas”

O texto introdutório explicita que a Escola da Escolha é “uma causa que incorpora as
condições de mobilizar pessoas e/ou instituições em torno de objetivos comuns, ainda que
sejam imponderáveis” (ICE, 2016a, p. 8, grifo nosso).
Explora ainda a legitimidade da Escola da Escolha ao ressaltar que ela “consolidou-
se como política pública disseminada para a Rede Estadual de Ensino em Pernambuco”
devido ao fato de gerar “soluções educacionais de reconhecida qualidade, comprovada pelos
seus resultados”. (ICE, 2016a, p. 9). De antemão visualizamos que a proposta se orienta por
uma concepção de processo-produto ao enfatizar os resultados mensuráveis, além de utilizar
vocabulário oriundo dos setores empresariais.
Com base em Ball (2011, p. 199) vemos nessa atitude traços de um “novo
gerenciamento na educação”, no qual, o destaque é para os “propósitos instrumentais de
escolarização”, ou seja, a busca pelo crescimento dos padrões de desempenhos, que
43

comumente, articula-se ao vocábulo empresarial, “excelência, qualidade e eficiência”. Nesse


contexto, consideramos que o conceito de educação está sendo reduzido a aspectos
instrumentais e gerenciais, educação – avaliação – resultados.
Percebemos que os esforços de toda ordem são guiados para que o modelo seja bem
recebido e reconhecido como uma proposta que congrega todos, mas, é explícito que irradia o
discurso de poucos, na medida em que a ênfase no documento circunda questões de ordem
social e econômica. O discurso se apropria justamente desse vocábulo “empresarial”, para
delinear um cenário mundial atual no qual a sociedade passa por “profundas transformações”
relacionadas, sobretudo à “inovação tecnológica”. O sistema educacional deveria se organizar
para atender as demandas dessa “nova” sociedade e, teria como função primordial “ensinar a
aprender, a pensar com lógica, a formular as perguntas certas, a buscar sozinho as respostas
para problemas novos que surgirão ao longo da vida, mas tendo em vista que a lógica é
apenas uma das múltiplas formas de pensamento” (ICE, 2016a, p. 15).
Outra estratégia persuasiva é a exposição de dados ou “índices” relativos aos
problemas recorrentes na maioria das instituições públicas, dentre os quais os altos índices de
violência cometidos contra e pelos jovens, os baixos índices de aprendizagem e os altos
índices de evasão escolar no Ensino Médio. Deste modo ao mesmo tempo em que apresentam
a adequabilidade de uma educação pautada em pro atividade e resultados evidenciam
antagonicamente a precariedade da escola pública e sobretudo, sua incapacidade de promover
uma educação de qualidade.
O manual cria um mote para defender que é preciso “repensar criticamente o papel
social da educação e as finalidades da escola” (ICE, 2016a, p. 15) e propalar então que a
sociedade do século XXI exige “pessoas criativas, críticas, propositivas, colaborativas e
flexíveis”, capazes de agir e adaptar-se rapidamente às mudanças desta nova sociedade. Nesse
intento, a escola deve promover uma educação integral, que não foque apenas no processo de
ensino-aprendizagem, mas que prepare o aluno para viver na sociedade do conhecimento
provendo-o de competências tais como resiliência, determinação, pensamento crítico, cálculo,
iniciativa e solidariedade.
Sumarizando, a ideia é que o projeto seja opção para promover
A formação humana, a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de
habilidades socioemocionais são pontos estratégicos para o desenvolvimento
econômico e social. Ou seja, há a necessidade de repensar criticamente o papel
social da educação e as finalidades da escola, que precisa estar cada vez mais
conectada às dinâmicas da sociedade contemporânea que se expressam através do
mundo do trabalho, da pesquisa, da criação, das artes, das ciências, da inventividade,
da filosofia, da estética e exigem que as práticas educativas interajam com as
transformações e exigências da atualidade. Os desafios educacionais da pós-
44

modernidade consistem em preparar os indivíduos para a transitoriedadede todos os


aspectos da vida, que determine a necessidade da atualização constante e o
desenvolvimento pleno de todas as potencialidades. (IBID., p. 15-16).

Este preparo reivindica como essenciais: o esforço individual, a busca pela


qualificação, a convivência com o próximo e a capacidade de trabalho em equipe.
Competências que denotam como imagem aquela do homem que assina a apresentação do
manual19, empresário bem-sucedido, de boa aparência, reconhecido e citado como liderança.
É essa a ideia de formação integral proposta e que deverá ser promovida pela escola em
aderência ao universo semântico do meio produtivo buscando eficiência, eficácia e
produtividade. Presumimos que a busca da formação desses indivíduos com as características
descritas acima, está orientada a partir da apropriação dos conceitos oriundos do chamado
“modelo de competências”.
Zaremba e Lopes (2013, p. 287) na esteira de análises como a de Ball (2011)
afirmam que no contexto atual, existe o interesse de adequação do “sistema de ensino às
novas demandas oriundas dos processos de trabalho”. Com isso, a lógica é que ela seja cada
vez mais “instrumental e adaptativa”, isto é, incorpore conceitos oriundos do mercado.
Consequentemente a formação a ser buscada é aquela que permita ao indivíduo se adequar às
demandas do mesmo.
Silva e Cunha (2002)sinalizam como fica a questão do emprego-empregabilidade
neste cenário ao afirmarem que:
O conceito de emprego está sendo substituído pelo de trabalho. A atividade
produtiva passa a depender de conhecimentos, e o trabalhador deverá ser um sujeito
criativo, crítico e pensante, preparado para agir e se adaptar rapidamente às
mudanças dessa nova sociedade. [...] A empregabilidade está relacionada à
qualificação pessoal; as competências técnicas deverão estar associadas à capacidade
de decisão, de adaptação a novas situações, de comunicação oral e escrita, de
trabalho em equipe. O profissional será valorizado na medida da sua habilidade para
estabelecer relações e de assumir liderança. (SILVA E CUNHA, 2002, p. 77).

São ideias como a dos autores supracitados que encontramos no texto introdutório da
Escola da Escolha que sustenta que “a empregabilidade está relacionada à qualificação
pessoal. As competências técnicas deverão estar associadas à capacidade de decisão, de
adaptação a novas situações, de comunicação oral e escrita, de trabalho em
equipe”(ICE,2016a, p. 14).

19
Marcos Magalhães empresário de sucesso que assumiu a presidência da Philips na América Latina em 1996,
após ter presidido a Philips América do Sul e Philips do Brasil. Graduado em engenharia elétrica pela UFPE e
pós-graduado em telecomunicações na Holanda. Responsável pela recuperação do Ginásio Pernambucano, onde
estudou. Atualmente, é presidente do Instituto de Corresponsabilidade pela Educação (ICE). Fonte:
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/vidaurbana/2015/01/19/interna_vidaurbana,555514/entrevist
a-marcos-magalhaes-em-defesa-de-um-curriculo-nacional.shtml
45

A ideia fundante é que o indivíduo se submeta as demandas da atividade produtiva.


Se há liderança há que haver liderados. Algo condizente com a visão de sociedade moderna
de Durkheim (2011), para quem:
Não podemos, nem nos devemos devotar ao mesmo gênero de vida; dependendo das
nossas aptidões, temos funções diferentes a desempenhar, e é preciso estar em
harmonia com aquela que nos incumbe. Nem todos nós fomos feitos para refletir,
são precisos homens de sensação e ação. (DURKHEIM, 2011, p. 44).

Fundamentalmente, o que temos aí é uma visão consonante com uma concepção


liberal de educação, para as quais a escola não deve se envolver com os problemas da
realidade social. Libâneo (2001, p. 21) salienta que na pedagogia liberal, a função da escola
seria “preparar os indivíduos para o desempenho de papéis sociais, de acordo com as aptidões
individuais”. Claro então que a intenção do documento não é nortear a formação do indivíduo
crítico à ordem social e sim, um indivíduo a serviço do Estado ou do mercado, mais
especificamente, formar um novo tipo de líder.
Isso posto, vemos que à escola caberá desenvolver uma série de competências no
educando, de forma que este, esteja adaptado às novas formas de trabalho. Continuemos uma
análise citando novamente Zaremba e Lopes (2013, p. 293) que defendem que em uma
perspectiva neoliberal, a educação é defendida como condição basilar para a garantia do
desenvolvimento econômico, por isso “o conhecimento adquiriu novos papéis, sobretudo, a
partir de sua inclinação aos interesses do mundo produtivo. Nessa perspectiva o modelo das
competências é deslocado do universo produtivo, do âmbito dos negócios e lançado sobre a
educação”.
Também nesse sentindo, Gómez e Sacristán (1998, p. 15)salientam que a preparação
para o trabalho, não se pauta apenas na disposição de conhecimentos e habilidades, mas, na
“formação de disposições, atitudes, interesses e pautas de comportamento”, que por sua vez,
devem estar ajustados às reivindicações e preeminências dos postos de trabalho. Nesses
termos, temos que, a sociedade em transformação, tem exigido novas características dos
trabalhadores, que por sua vez, estão ligadas ao tipo de formação ansiado pela Escola da
Escolha.
Todo esse repertório está no texto introdutório com grande ênfase como vemos
abaixo.
Confirma-se a função da educação como fator de desenvolvimento econômico e
social de um país, onde urge o imperativo dela estar atenta às mudanças no contexto
e às exigências da sociedade do conhecimento, colocando-se lado a lado com o
progresso, acompanhando os avanços científicos e tecnológicos, formando pessoas
dinâmicas, criativas, sensíveis, propositivas, colaborativas e que estejam
46

devidamente habilitadas para enfrentar um mundo em um processo acelerado de


mudanças. (ICE, 2016a, p. 21).

A educação em tempo integral desempenha função essencial na proposta porque essa


extensão de tempo dá maiores garantias de que estes alunos sejam de fato formados dentro
das expectativas das muitas demandas da “sociedade do conhecimento” e do “mundo
globalizado”. O tempo integral promove o extrapolamento do currículo obrigatório e a adoção
da chamada parte diversificada que
Se dá não apenas pela presença de um currículo pleno de habilidades intelectuais,
mas pela presença de um conjunto de outras habilidades essenciais presentes nos
domínios da emoção e da natureza social. O seu desenvolvimento, no conjunto dos
outros pilares, deverá contribuir construtivamente para a formação de competências
que impactam nos diversos domínios da vida humana, seja no âmbito pessoal, social
ou produtivo. (ICE, 2016a, p. 27).

Percebemos então, a extensão da jornada escolar como instrumento que possibilita a


ampliação dos momentos de formação e desenvolvimento de diversas habilidades dos alunos,
sobretudo no que se refere às habilidades para o meio social e produtivo.
Outro fato que chama atenção é que ao assumir o projeto como uma “causa” o texto
evoca a congregação de forças entre o poder público, sociedade civil e iniciativa privada “com
suas respectivas competências e prioridades” para gerar transformação e não apenas para
resolver problemas pontuais. Consideramos que sua leitura potencializa um sentimento de
envolvimento e de motivação no sentido de que todos podem e devem atuar pela melhoria da
qualidade da educação nesse modelo que promove a educação integral dos estudantes (ICE –
2006a, p. 9).
Movidos por esse sentimento é que grande parte da população interpreta a
aproximação do setor empresarial nas políticas sociais, como a educação, como uma
demonstração de engajamento, mas é diferente a leitura de Ball (2011, p. 121), pesquisador
das políticas educacionais, para quem essa atitude, de aproximação, se configura de fato em
novas formas de privatização, vestidas como uma “nova filantropia” que obnubila a relação
direta entre doação em troca de “resultados”. Portanto, há na verdade o desejo desses
filantropos de obter resultados evidentes e mensuráveis que derivarão em retornos positivos
futuros para os seus investimentos de tempo e dinheiro.
Como Ball (2011) enxergamos essa aproximação como algo determinado pelo
interesse das empresas que financiaram a produção do modelo pedagógico, seja na formação e
preparação para o mercado de trabalho, ou mesmo, em busca de soluções para os problemas
sociais (o que acreditamos ser menos provável). Consideramos que ao financiar o projeto
47

social da educação, as empresas buscam por resultados mensuráveis e que futuramente


possam propiciar algum retorno a estas organizações.
Com relação à atuação do setor privado nas políticas educacionais, Ball (2011, p.
155) esclarece que a política neoliberal tem possibilitado e incentivado cada vez mais a
participação desse setor na elaboração dos textos, que representa um processo de privatização
tornado realidade em formas “complexas, multifacetadas e inter-relacionadas”. Esse processo
pode ser observado como um:
[...] conjunto de relações complexas entre: (i) mudanças organizacionais nas
instituições do setor público (recalibração e “melhoria”); (ii) novas formas de Estado
e modalidades (governança, redes e gestão de desempenho); (iii) privatização do
próprio Estado; e (iv) os interesses do capital “inquieto e os processos de
mercantilização (serviços públicos como oportunidade de lucro e de fornecimento de
prestação de serviços públicos “efetivos”). (BALL, 2011, p. 155-156).

Percebemos então, que indicando um processo de privatização o autor amplia e dá


margens a inúmeros tipos de atuações do setor privado no setor público. Seja na forma de
gestão, aquisição, injeção de fundos e financiamentos. No caso específico da Escola da
Escolha percebemos claramente o viés privatizante, tal qual colocado por Ball (2011), na
importação de novas formas de governança, na instituição de uma gestão de desempenho com
base em resultados e na busca por melhorias contínuas alinhadas às demandas de mercado.
Isso justifica a entrada em cena de dispositivos como “terceirização, contratação e parceria
público-privada, que estão emergindo quanto mais o negócio da educação pública é despojado
e “privatizado” ou “compartilhado” com os negócios” (BALL, 2011, p. 156).
O autor ainda alerta para outra forma de privatização da educação, que em sua
concepção, recebe pouca atenção dos pesquisadores, o “varejo de soluções políticas”no qual é
negociado desde a venda de formação continuada, a prestação de serviços como consultoria,
apoio, melhoria e serviços de gestão (IBID., p. 157).
A partir das considerações desse autor acreditamos que a elaboração e a implantação
do Programa Novo Futuro, pautado nas concepções do modelo Escola da Escolha, pode ser
compreendido como uma manifestação da privatização da educação. Vemos isso na aquisição
de materiais que orientam o trabalho pedagógico, também na implantação de um modelo de
gestão para a instituição e ainda notamos (a privatização), sobretudo na valorização da
parceria público/privada como solução para a melhoria do quadro educacional brasileiro. No
texto do manual da Escola da Escolha essa valorização se apresenta na ideia da “congregação
de forças” abrindo a possibilidade de pensarmos em parceria, uma estratégia difundida,
48

sobretudo, após os anos de 1990 em alinhamento ao neoliberalismo defensor da


descentralização.
Nesse mesmo viés, Shiroma, Garcia e Campos (2011, p. 227), após análise do
documento Todos pela Educação: rumo a 2022, também originário de um movimento
empresarial que visa o “Compromisso de Todos pela Educação”salientam que as reformas
educacionais efetivadas no Brasil a partir de 1990 buscavam propor mudanças que
promovessem
[...] a responsabilização de todos os “atores sociais” pela efetivação das mudanças
necessárias. Tal processo demandava, portanto, mais do que insumos e recursos
financeiros; exigia um amplo pacto, envolvendo todos os setores sociais.
Interpelados pela grave crise educacional, os empresários declaram sua vontade em
assumir sua cota de “responsabilidade social”, chamando seus pares à discussão,
articulando seminários, difundindo ideias e proposta, visando construir consensos,
tornando-se, desde então, os interlocutores privilegiados dos ministros e
governantes, tanto na esfera federal, como estadual e municipal.(IBID., 2011, p.
227)

Para eles, as propostas desse movimento serviram como fundamento para a


composição e elaboração do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Asseguram
ainda que o Todos pela Educação é um documento que carrega em seu conteúdo,
A recomposição da agenda empresarial para o campo da educação, bem como
também oferece novas referência discursivas que redefinem a atuação da chamada
“Sociedade civil” no campo educacional. De modo específico, o Movimento Todos
pela Educação e o documento analisado visam criar uma “nova consciência”, e uma
“nova sensibilidade social” com relação ao direito à educação e à responsabilidade
social que o exercício desse direito implica. [...] Pais, sociedade, profissionais da
mídia, intelectuais, empresários, sindicalistas, estudantes, são convocados par a
experimentar uma nova forma de exercer seu protagonismo – cada qual fazendo a
sua parte e juntos, mudando a educação! Almejam assim, “reconverter” os pais,
expectadores de outrora, em cidadãos exigentes movidos pelo compromisso de não
negarem às novas gerações o direito de inserirem-se socialmente, pela vida da
educação. (SHIROMA, GARCIA e CAMPOS, 2011, p. 225).

Nesse sentido, percebemos que a intenção do modelo pedagógico analisado segue o


mesmo expediente iniciado a partir da década de 1990 de propagar princípios educativos
neoliberais pela estratégia do chamamento e do envolvimento da sociedade para a construção
de um projeto educacional. Ou seja, a adoção de toda uma cartilha (Escola da Escolha) para
que o colégio se alinhe à princípios mercadológicos e neoliberais, que trata a educação como
um produto, que deve produzir resultados mensuráveis e priorizar a manutenção da ordem
capitalista e social. No entanto, é valido reforçar que esse “pacto social” resulta na conhecida
“Política do Estado Mínimo”, ou seja, o Estado torna-se cada vez mais fiscalizador e menos
financiador, o que efetiva também a desresponsabilização do Estado em garantir condições e
qualidade educacional.
49

1.1.2. Caderno II e III: Conceitos e Princípios educativos da Escola da Escolha

O caderno de Princípios (que situa o aluno como centro do processo de


ensino/aprendizagem)define alguns princípios educativos que devem ser seguidos, são eles: os
quatro pilares da educação,o protagonismo; a pedagogia da presença e; a educação
interdimensional; (ICE, 2016c).
As definições presentes no documento sobre cada um desses conceitos é a seguinte:
 4 pilares da educação:Os Quatro Pilares são as aprendizagens fundamentais para que
uma pessoa possa se desenvolver plenamente, considerando a progressão das suas
potencialidades, ou seja, a capacidade de cada um de fazer crescer algo que traz
consigo ou mesmo que adquire ao longo da vida.
 Pedagogia da presença: É o fundamento da relação entre quem educa e quem é
educado e traduz a capacidade do educador de se fazer presente na vida do educando,
satisfazendo uma necessidade vital do processo de formação humana.
 Protagonismo: processos, movimentos e dinamismos sociais e educativos, nos quais os
adolescentes e jovens, apoiados ou não pelos seus educadores, assumem o papel
principal das ações que executam.
 Educação interdimensional: Nessa perspectiva, é necessário pensar numa educação
que transcenda o domínio da racionalidade (do logos) e incorpore os domínios da
emoção (pathos), da corporeidade (eros) e da espiritualidade (mytho).
Estes quatro princípios estão na base da formação do indivíduo, que, enquanto ser
humano “nasce com um potencial e tem o direito de desenvolvê-lo”. Para isso “é preciso ter
oportunidades que, efetivamente, desenvolvam potencialidades e estas se encontram nas
práticas educativas” (ICE, 2016c, p. 19).
Essa perspectiva traz uma visão presente na realidade educacional brasileira que é o
apreço pelo desenvolvimento das potencialidades. Para nós esse pensamento alimenta cada
vez mais o discurso da meritocracia que para Ruschel e Valle (2009) é recorrente nas políticas
brasileiras especialmente orientando as propostas para o campo educacional. Para as autoras,
a ideia de meritocracia escolar ganha legitimidade, a partir, principalmente da Constituição de
1998, mas, como resultado, tem alimentado à reprodução das desigualdades.
50

Os 4 pilares, claramente pinçados de J. Delors20 são utilizados para alinhar a proposta


a sociedade do conhecimento para a qual é preciso: Aprender a conhecer; aprender a fazer;
aprender a conviver; aprender a ser. A definição encontrada no manual sobre o assunto é:
 Aprender a conhecer: Vai além do domínio do conhecimento e não se limita à
aquisição de um acervo de saberes propriamente ditos. Ela se estende ao domínio da
forma como se adquire o conhecimento e das diversas maneiras como cada um irá
lidar por meio do acesso ou da sua produção.
 Aprender a conhecer: Vai além do domínio do conhecimento e não se limita à
aquisição de um acervo de saberes propriamente ditos. Ela se estende ao domínio da
forma como se adquire o conhecimento e das diversas maneiras como cada um irá
lidar por meio do acesso ou da sua produção.
 Aprender a conviver: É desenvolver a compreensão e aceitação de si próprio e do
outro e a percepção de interdependência entre os seres humanos, no sentido do
convívio, do trato, da realização de projetos comuns, da preparação para aprender a
gerir conflitos respeitando valores plurais, da compreensão mútua e da convivência
pacífica.
 Aprender a ser: Essa é a aprendizagem que prepara o indivíduo para elaborar
pensamentos autônomos e críticos e formular seus próprios juízos de valor, de modo a
poder decidir por si mesmo perante as diferentes circunstâncias da vida. Ajuda a
desenvolver a competência pessoal, que é a capacidade da pessoa para agir com
autonomia, responsabilidade e compromisso na relação consigo próprio, na
convivência com os outros e com os meios nos quais estão e na construção de um
Projeto de Vida que leve em conta o seu próprio bem-estar e o da comunidade
Quanto ao princípio da “Pedagogia da presença”, este é apresentado como uma
espécie de “postura” que deve ser perceptível em todos os indivíduos envolvidos no ambiente
escolar (técnicos, gestores, professores, bibliotecários, psicólogos, assistentes sociais, e
outros). Não se refere apenas ao trabalho desenvolvido nas salas de aulas ou em reuniões,
porque “cada pessoa presente no ambiente de educação tem também um papel educador,
mesmo informal. É fundamental que cada um conheça e apóie as atividades da comunidade
educativa”. (ICE, 2016c, p. 41).
Por outro lado, subentende-se certo tipo de presença na ordem do exemplo, da
adequação já que pela pedagogia da presença “todos os profissionais envolvidos devem atuar

20
Presentes no documento: Educação: um tesouro a descobrir - Relatório para a UNESCO da Comissão
Internacional sobre Educação para o século XXI.
51

com coesão e cientes de sua corresponsabilidade pelos resultados educacionais na perspectiva


de formação do educando” (IBID., p. 41).
Nessa pedagogia da presença observamos uma espécie de hierarquia na qual os mais
velhos atuam na educação dos mais novos, o que nos remete à definição de Educação de
Durkheim (2011), para quem
A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre aquelas que ainda estão
maturas para a vida social. Ela tem como objetivo suscitar e desenvolver na criança
certo número de estados físicos, intelectuais e morais exigidos tanto pelo conjunto
da sociedade política quanto pelo meio específico ao qual ela está destinada em
particular. (DURKHEIM, 2011, p. 53-54).

Temos que a pedagogia da presença se apresenta na forma de educação direcionada


das gerações adultas para as gerações mais novas. Nesse caso, a equipe escolar torna-se
responsável por promover o desenvolvimento dos alunos.
Por sua vez, o protagonismo é potencializado na escola através do
Exercício de práticas e vivências de situações de aprendizagem por meio das quais
exercitará as condições essenciais para o seu desenvolvimento pessoal e social, que
tem sua base na própria construção da identidade e no desenvolvimento da
autoestima, marcos fundamentais do Projeto de Vida. (ICE, 2016c, p. 20).

A ideia subjacente é a de um preparo para a vida pública que possibilite


“problematizar situações e decidir se envolver na busca de soluções”. Apela para a
“consciência ética e ao compromisso cidadão” o texto defende o preparo para a “extrapolação
do que separa a vida privada da vida pública”. (ICE, 2016c, p. 20).
O último princípio é a Educação Interdimensional que segundo o texto:
Inclui a construção de conhecimentos relevantes, significativos, úteis e duradouros
para os seres humanos. Mas não se reduz a isso. Sem a construção/reconstrução de
sentidos e de sentimentos, valores e avaliações, ela simplesmente se restringe à
instrução, porque deixa de promover aprendizagens indispensáveis à finalidade
máxima da vida, que na Grécia antiga, Aristóteles dizia ser a vida em plenitude, a
felicidade, ou a sua própria busca. Nessa perspectiva, é necessário pensar numa
educação que transcenda o domínio da racionalidade (do logos) e incorpore os
domínios da emoção (phatos), da corporeidade (eros) e da espiritualidade
(mytho)(ICE, 2016c, p. 47).

Não há como desconsiderar a importância de se trabalhar essas questões nas escolas,


no entanto, é importante também frisarmos que poucos foram os momentos no documento em
que as palavras transformação, política e crítica foram encontradas.
A partir da exposição de todos os conceitos e princípios expostos na Escola da
Escolha é que compreendemos o porquê da premência do Tempo Integral para a
operacionalização do modelo pedagógico, isso se dá porque é na parte diversificada do
currículo que eles ganham possibilidade de concretização. Atribuímos assim, o que Durkheim
52

(2011) considera como a função da educação, por um lado, o caráter homogeneizador é


promovido no currículo obrigatório, ou seja, a garantia da formação do ser social, que possui
conhecimento das leis, dos seus direitos e deveres enquanto cidadãos, por sua vez, a parte
diversificada, possui caráter diferenciador, a partir do momento em que são trabalhadas
questões que permitem ao indivíduo conhecer a sua função social enquanto indivíduo de um
determinado grupo social. Sendo assim, a divisão do currículo em obrigatório e diversificado
é utilizado como subsídio para se alcançar aquele sujeito “da capa”, apto para a sociedade do
conhecimento e inovação tecnológica. É aí que entram as “metodologias de êxito”.

1.1.3. Cadernos IV: Metodologias de êxito – componentes curriculares

Os cadernos que tratam sobre a temática “Metodologia de Êxito da Parte


Diversificada do Currículo”, foram divididos em dois cadernos: um que trata sobre os
“Componentes Curriculares” e o outro que trata das “Práticas Educativas”, que são orientados
pelos princípios educativos, são, portanto, direcionadores das ações que devem acontecer no
tempo extra, contraturno do tempo integral e estruturam um modelo pedagógico cujo principal
eixo está no “Projeto de Vida”.São considerados ainda sub-eixos: a) a formação acadêmica de
excelência; b) a formação para a vida e c) a formação para o desenvolvimento das
competências do século XXI (ICE, 2016c, p. 12).
Apesar de indicar que a busca é pela formação para a vida, a ênfase está na aquisição
de competências habilidades e o foco do processo é o estudante.O texto destes cadernos
complementares, inclusive esclarece que o sucesso da proposta do Tempo Integral só será
alcançado caso seja feita a articulação entre a Base Nacional Comum com as Metodologias de
Êxito. Os componentes curriculares que compõem essa parte diversificada são: projeto de
vida; práticas e vivências em protagonismo; disciplinas eletivas e; estudo orientado.

a. Projeto de vida

Se refere a uma atividade considerada como “o caminho traçado entre aquele que “eu
sou” e aquele que “eu quero ser”. Objetiva suscitar nos jovens sua capacidade reflexiva,
auxilia na construção de sua identidade e no sentido de traçar o caminho entre “o que se é” e
“o que se quer ser”. (ICE, 2016d, p. 9).
Entretanto, pontua-se no texto que ele não é um projeto de carreira, e sim, um projeto
maior, que engloba a carreira profissional, mas estimula também a pensar sobre o estilo de
53

vida que o jovem pretende ter, sobre os valores que circundarão os relacionamentos
estabelecidos tanto na vida pessoal como social assim como sobre as tantas outras questões
surgidas ao longo da vida.
Observamos durante a pesquisa de campo que o projeto de vida é um momento de
interação entre os jovens e o professor no qual aqueles projetam o futuro, criando estratégias e
ferramentas para alcance dos objetivos projetados.

b. Práticas de vivência em protagonismo

Pelo texto do caderno em que são apresentadas, as práticas de vivência


São práticas educativas providas pela própria escola e/ou por algumas de suas
instituições parceiras, bem como pelos próprios estudantes que objetivam, por meio
de oportunidades educativas, o desenvolvimento de competências pessoais, sociais e
produtivas, bem como a ampliação do repertório de conhecimento e valores
necessários ao processo de formação do ser autônomo, solidário e competente. (ICE,
2016d, p. 18).

É no encerramento dessas atividades que acontece a “culminância” momento em que


os próprios alunos organizam atividades culturais para apresentar os resultados obtidos ao
longo dessa disciplina. É o momento em que sentem o diferenciamento de si perante o
coletivo. A emulação está presente e o reconhecimento das atividades do grupo em que estão
reforça o sentimento de pertencimento e destaque.
Além dos clubes, alguns alunos são incentivados a participar das reuniões de gestão e
apresentar suas demandas e/ou sugestão de melhorias, seja no aspecto estrutural,
metodológico, pedagógico ou até mesmo no próprio relacionamento entre alunos, professores
e militares.
Pela rotina de observação e pelo contato com alunos, professores e militares que
tivemos ao longo dos meses da pesquisa de campo, podemos afirmar que os alunos
paulatinamente vão assumindo para si e para a sociedade os ideais que fundamentam a
proposta tal qual nos cadernos que são para eles os ideais dos militares principalmente. Não
quer dizer que seja pacífico esse processo, pois tivemos a impressão de que o aluno que entra
no colégio já chega esperando alguma indução, sabe que terá de se adaptar as normas
estabelecidas. E reconhece que caso isso não aconteça será convidado a se retirar. Ou seja,
mesmo nestas atividades tidas como “diversificadas”, como território dos alunos está explícito
um padrão que impõe limites ao protagonismo e a liderança. Sobre o que se refere ao processo
de socialização em certas bases determinadas, podemos apresentar o que disseram Pérez
Gomez e Gimeno Sacristán (1998)
54

O processo de socialização como reprodução da arbitrariedade cultural dominante e


preparação do aluno para o mundo do trabalho e para sua atividade como cidadão
não pode ser concebido como um processo linear, mecânico. Pelo contrário, é um
processo complexo e sutil marcado por profundas contradições e inevitáveis
resistências individuais e grupais. (PÉREZ GÓMEZ e GIMENO SACRISTÁN,
1998, p. 25).

Ao direcionarmos nossos olhares para o colégio, identificamos esse processo de


reprodução da arbitrariedade explicitado pelos autores nas mudanças sutis que estão sendo
introduzidas no ambiente escolar, nas relações e na própria condução das disciplinas que se
propõem a desenvolver o protagonismo e a autonomia. Com a chegada dos militares, todas
estas atividades foram cerceadas pelos olhares vigilantes e punitivos, de militares e dos
próprios alunos.

c. Disciplinas Eletivas

Segundo o caderno de metodologias as disciplinas eletivas são “disciplinas temáticas,


oferecidas semestralmente, propostas pelos professores e/ou pelos estudantes, e objetivam
diversificar, aprofundar e/ou enriquecer os conteúdos e temas trabalhados nas disciplinas da
Base Nacional Comum do Currículo” (ICE, 2016d, p. 22).
Geralmente no Colégio as eletivas são ofertadas pelos professores. Para a escolha
das eletivas, no início de cada semestre, realiza-se um evento, no qual, os professores
apresentam a ementa da disciplina e, os alunos, escolhem aquela que tem interesse.
Algumas priorizam o reforço do conteúdo abordado em sala, outras, buscam
apresentar temáticas tidas como “mais críticas e atuais”. É nelas que se torna possível tratar
de temas considerados importantes para os alunos e para a sociedade e que estão fora do
currículo obrigatório ou tem nele pouco espaço-tempo.Notamos ainda que algumas eletivas
oferecidas se mostravam como oportunidade para articulação entre a teoria e a prática.
Entendemos melhor essa percepção quando descobrimos que a escolha das
disciplinas para os alunos do terceiro ano naquela ocasião foi de certa maneira induzida pela
equipe pedagógica, pois destacavam a necessidade de se preparar para o Exame Nacional do
Ensino Médio (ENEM). A coordenação pedagógica e professores instigavam os alunos a
escolherem as eletivas que ampliavam o NC e abordavam temáticas voltadas para o ENEM.
Contudo, os alunos insatisfeitos reuniram-se com a gestão e coordenação e solicitaram
autorização para participar de outras disciplinas que tinham mais interesse, a partir daí ela
realmente tornou-se de escolha de todos os alunos.
55

A tabela 1 apresenta a lista de disciplinas eletivas oferecidas nos anos de 2017 e


2018, evidencia a diversidade do conjunto.
Tabela 1: Lista eletivas Colégio Polivalente (2017-2018).
1. Aprendendo e se divertindo com as ciências humanas
2. Hábitos alimentares saudáveis, utilizando sobras de alimentos.
3. Robótica Livre Criativa com materiais reutilizáveis
4. Harmonizando com a música
5. Vem fazer drama!!! Teatro e dramatização
6. Feminismo e Arte
7. Bomba Hidráulica por Golpe de Ariet
8. A literatura no banco dos réus: Capitu, culpada ou inocente?
9. Geografia e Música
10. História em Movimento
11. Eletiva de handebol
12. Visão, cor e luz
13. Español em acción: releyendoelespañol por medio de lasexpresionesculturales y
artísticas
14. Redação para o ENEM
15. Criando e reaproveitando com a química.
16. GeoArte
17. Matemática para o ENEM
18. Eletiva militar
19. Produção textual a partir de filmes.
20. Vídeo aulas
21. Sociologia viva
22. Uma viagem pela História
23. O sertão irá ao mar
24. Colorindo com a Química
25. Filosofia e Arte: a busca dos sentidos estéticos na produção didática
26. Master chefe – matemática
27. Festival de teatro: A transformação dos personagens literários através da arte
28. Mensuração – matemática
Fonte: Documentos da Escola – organizada pelas autoras.

É possível afirmar que existe um considerável número de eletivas, que abordam


temas ligados às disciplinas específicas do núcleo comum, questões éticas e sociais, ou a
utilização de tecnologias. A eletiva militar nos chamou a atenção, pois observamos e
identificamos que existem pré-requisitos para a participação da mesma, não sendo permitida a
qualquer aluno, ou seja, sua escolha não é tão livre assim. É necessário que o aluno se
comporte da forma exigida no colégio, ou seja, dentro do normatizado no regimento interno.
Caso o aluno não atenda a esse requisito, ele precisa se adequar, para assim, concorrer a uma
vaga. A nota também é um fator de seleção, caso o aluno não alcance a média ideal, este
também não está apto a participar da eletiva. Vemos nela, a reprodução de uma academia
militar, em que os alunos fazem flexão, correm pelas ruas da cidade, fazem barra, dentre
outras atividades, sobretudo de caráter físico.
Notamos que há certa supremacia do pensamento militar nas decisões pedagógicas
assim como um alto nível de supervisão na persecução de elementos como a hierarquia, a
56

disciplina, o exemplo, e isso por vezes acarreta a distorção ou o afastamento do sentido de


algumas atividades tal e qual propostas no caderno de metodologias desenvolvido pelos
empresários de Pernambuco.

d. Estudo orientado

A partir do caderno de metodologias, ICE (2016d, p. 30) o estudo orientado pretende


“oferecer um tempo qualificado destinado à realização de atividades pertinentes aos diversos
estudos”. De forma enfática há no texto alerta para que “não deve ser confundido com tempo
para realizar as tarefas”tão somente,mas para realizar “quaisquer atividades relativas às
necessidades exigidas pelos estudos, entre elas as próprias tarefas”.
Espera-se que sejam aprendidos métodos, técnicas e procedimentos para organizar,
planejar e executar os processos de estudo visando ao “autodidatismo, à autonomia, à
capacidade de auto-organização e de responsabilidade pessoal” (IBID.).
Assim, o estudo dirigido deve contribuir para o desenvolvimento de uma série de
habilidades tanto cognitivas, como “a capacidade de compreensão, análise e síntese e da
capacidade de trabalho metódico e sistematizado” quanto socioemocionais dentre elas o foco
e o autodidatismo. (IBID.).

1.1.4. Caderno V: Metodologias de êxito -Práticas educativas: acolhida e tutoria

Segundo o caderno de metodologias o acolhimento e a tutoria são práticas educativas


que devem ser inseridas no cotidiano escolar para “dar vida e efetividade ao Modelo
Pedagógico”. O acolhimento “objetiva apresentar as bases do projeto escolar para diferentes
públicos. É a porta de entrada dessa forma inovadora de conceber a educação e de transformar
a escola” (ICE, 2016e, p. 5).
Subdivide-se em quatro situações distintas:
 O acolhimento dos estudantes visa receber os novos estudantes,
proporcionando o acesso aos fundamentos e às premissas do modelo escolar,
bem como, prevê que sejam inseridas as primeiras práticas protagonistas para
a construção do Projeto de Vida;
 O acolhimento diário dos estudantes, refere-se a receber os alunos de forma
organizada intencional e planejada, para que sejam estabelecidas as primeiras
trocas do dia; quanto ao acolhimento da equipe escolar, é o momento
57

destinado à reflexão sobre a postura dos educadores no exercício profissional,


a partir da perspectiva de se portarem como influências construtivas para os
estudantes;
 O acolhimento da equipe escolar: executado pelos próprios estudantes, com o
objetivo de sensibilizá-la frente aos novos desafios de ver, sentir e cuidar do
estudante;
 O acolhimento dos pais/responsáveis, objetiva apresentar e refletir sobre o
projeto escolar, como forma de inculcar a importância de fornecer apoio aos
educandos para a construção do projeto de vida e, promover condições para
isso. Sendo assim, busca permitir aos pais e responsáveis, desenvolver ações
e estratégias que cooperem para formação integral dos estudantes.
Percebemos duas funções para o acolhimento no colégio. Primeira, a de explicar seu
funcionamento complexo: por um lado os princípios, por outro o regimento. A segunda
função, e a reconhecemos a partir do que vislumbramos na pesquisa de campo (porque
assistimos a acolhida em 2018) é colocar em foco o protagonismo dos veteranos para
diferenciar sua imagem criando no ambiente certa “hierarquia” entre veteranos e novatos
assim como destes para os mais novos.
Já a Tutoria é definida como “um método para realizar uma interação pedagógica em
que o educador (tutor) acompanha e se comunica com os estudantes de forma sistemática”,
por meio dela, o tutor acompanha o seu desenvolvimento e avalia “a eficiência de suas
orientações de modo a resolver problemas que possam ocorrer durante o processo educativo”
(ICE, 2016e, p. 14).
O documento sugere que a escolha do tutor esteja a cargo dos alunos, sendo assim,
estes, de maneira geral, escolhem aqueles que mais possuem afinidades. A função dos tutores
envereda por duas leituras já que pode ser encarada como uma ajuda, ou seja, o tutor vai
auxiliar no desenvolvimento do projeto de vida, com relação à organização dos estudos e das
rotinas, ou como supervisão, em que o tutor se porta como um supervisor dos estudos e dos
resultados obtidos por vezes buscando informações sobre a dinâmica familiar.
Podemos afirmar pela análise desses cadernos de metodologias de êxito que houve a
preocupação em conectar princípios e práticas pedagógicas.

1.1.5. Caderno VI: dos ambientes


58

Até mesmo os ambientes da escola são desenhados pela Escola da Escolha, pois há
um caderno próprio intitulado “Modelo Pedagógico: ambientes de aprendizagem” (ICE,
2016g) que sugere ambientes de aprendizagem e esclarece as implicações pedagógicas dessa
escolhas e meios para explorá-los.
Nos parece que a pretensão é ampliar os espaços de aprendizagem expandindo esse
processo para além da sala de aula e do tempo da aula no entendimento de que aquelas não
são espaços exclusivos, nem privilegiados de aprendizagem. Verificamos esse movimento na
medida em que notamos o modo como as paredes são preenchidas por murais e painéis em
profusão. Atuam em nossa consideração para: a) comunicar a respeito de campanhas,
projetos; b) reforçar os ideais e valores da escola, tornando ainda mais presentes os discursos
da instituição; c) expor trabalhos realizados pelos alunos e d) divulgar o desempenho dos
alunos (notas) fomentando a supervisão e a emulação na instituição.
Em diversos trechos do diário de campo refletimos sobre essas paredes cheias de
exposição de murais, painéis, fotos, desafios etc. No entanto, foi à exposição das notas dos
alunos o que nos chamou atenção. Depois atinamos que, ao fazer isso, o colégio promove o
constrangimento para aqueles alunos que não conseguiram boas notas e o sentimento de
superioridade dos alunos destacados.
Há também, uma estratégia orientada pelo documento chamado “salas temáticas” que
devem ser equipadas com recursos tecnológicos e ambientadas de acordo com a disciplina que
abrigarão. Por isso, os professores permanecem na sala nas trocas de aula e os estudantes é
que se encaminham para outra sala conforme cada aula. A caracterização das salas deve ser
realizada pelo professor com a participação dos alunos, o que “possibilita maior integração e
co-responsabilização no desenvolvimento das rotinas” (ICE, 2016g, p. 15)
Durante as visitas a campo no ano de 2017 vimos que nem tudo o que o caderno
propõe pode ser efetivado como seria talvez em uma empresa. Assistindo o momento da troca
de aulas vimos um fluxo, algo um tanto caótico, de alunos se dirigindo até a sala na qual
teriam aula. Para cada uma delas havia dois professores que as organizavam e decoravam
conforme a disciplina que ministravam. Quando retornamos no início de 2018, essa lógica
havia sido alterada de maneira que as salas não mais apresentavam decoração, avisos ou
cartazes e o movimento de deslocamento entre as salas havia voltado ao anterior em que o
trânsito é realizado pelos professores.
Para nós, pesquisadoras, esse retorno retirava algo valioso como mostra o resgate do
diário de campo do dia 08/02/2018, marcado pelo início do ano letivo, que trouxe mudanças
na organização do colégio, dentre as quais, a readaptação das salas ambientadas para as salas
59

tradicionais, em fila. Os corredores já não abrigavam mais alunos eufóricos que se


deslocavam para sua próxima aula, e sim, professores em busca da turma que iriam dar aula.
As paredes, antes cheias de cartazes, cores e formas, agora é marcada por uma única cor,
marrom. Acreditamos que a explicação para essa decisão de fato tinha como justificativa a
posição dos militares. O desejo de evitar “tumultos” e a garantia de um ambiente disciplinado
e ordeiro nos parecem hipóteses plausíveis.
Pelos ambientes compreendemos também a questão do investimento no colégio.
Exemplo é o caso dos Laboratórios de ciências que conforme o caderno da Escola da Escolha,
deve ser ambiente privilegiado “para a experiência prática dos conhecimentos teóricos
aprendidos pelos estudantes em sala de aula e para o desenvolvimento de competências
fundamentais para a sua vida” (ICE, 2016g, p. 17). Em 2018 no colégio, o laboratório
encontrava-se em reforma por isso seu material e equipamentos estavam depositados em uma
sala até que a reforma seja executada.
Pela proposta a Biblioteca possui grande relevância no “processo de formação de
todos os estudantes, sobretudo quando integrada ao conjunto de ações do projeto escolar”e,
portanto, é fundamental na promoção da leitura para além do espaço-aula se afirma como
mediadora da produção do conhecimento, oferecendo respaldo à realização de pesquisas,
estímulo a leitura, a escrita, a arguição, ao desenvolvimento do repertório cultural, dentre
outras competências (IBID., p. 21). No colégio é bem utilizada e possui espaço amplo para a
realização de leituras e trabalhos. Percebemos um movimento grande de incentivo à leitura e
ao acesso dos alunos à literatura. Além de livro, o espaço da Biblioteca é utilizado para expor
atividades relacionadas às artes, em geral quadros, pinturas, telas, dentre outros trabalhos que
são produzidos durante as aulas. É claramente diferente tanto o laboratório (a maioria das
instituições da cidade não o tem) quanto a biblioteca, limpa, arejada e com estantes bem
fornidas.
No ano de 2018, esse ambiente passou por reformas. Uma parte da biblioteca foi
separada para que fosse construído o laboratório de Robótica financiado por uma empresa
parceira. O objetivo da parceria é patrocinar a construção de um braço robótico. Para isso,
alunos selecionados irão, com o auxílio de engenheiros da empresa e professores do colégio,
participar de um concurso nacional sobre o tema.

1.1.6. Caderno VIII: Tecnologia de Gestão Educacional


60

O Modelo de gestão preconizado pela Escola da Escolha é apresentado no caderno


“Tecnologia de Gestão Educacional (TGE)” (ICE, 2016h) que, assim como os anteriores,
oferece algumas estratégias e ferramentas para a implantação e execução deste modelo
pedagógico. A TGE é vista no documento como “a base na qual o Modelo Pedagógico se
alicerça para gerar movimento que transformará a “intenção pedagógica” em efetiva e
concreta “ação” refletida nos resultados verificáveis e sustentáveis a serem entregues à
sociedade” (ICE, 2016h, p. 5, grifo nosso). Destacamos o grifo em algumas palavras, pelo
claro ajustamento à conceitos do setor empresarial. Compreendemos essa TGE como uma
efetivação da visão da educação como um produto, que pode ser mensurado e avaliado
quantitativamente.
É válido destacar que nesse documento há claramente a difusão de ideais e princípios
neoliberais. Além de fortalecer o ideário de efetivação de parcerias com o setor privado.
Segundo Luz (2011), a criação e ampliação de novos mecanismos políticos e administrativos
têm alterado significativamente os modos de regulação da educação pública, a partir da
captação de recursos e dispositivos do mercado, o que legitima a integração de outros atores
no governo da educação pública.
As reformas dos anos de 1990, fortalecidas pelas crises econômicas e acentuadas
pelos problemas sociais e educacionais, favoreceram a descentralização para o
mercado. Os empresários passaram a ver a educação púbica como um espaço onde
se pode intervir de diversas formas, como, por exemplo, na formação para o
trabalho. Simultaneamente, o poder público incentiva a participação das empresas na
educação por meio das parcerias intermediadas com as organizações não
governamentais (ONG), os grupos técnicos, as fundações empresariais, entre outras,
pois é principalmente por meio das parcerias que ocorre a interlocução do poder
público com os grupos empresariais. [...] Isso não significa dizer que o Estado
deixou de se responsabilizar pela educação, mas pressupõe uma estrutura de gestão
educacional em que os setores da iniciativa privada passam também a definir
políticas educacionais, tendo em vista as mudanças na governabilidade da educação
pública. (LUZ, 2011, p. 442).

Nesse sentido, fica cada vez mais evidente o processo privatizante promovido pela
Escola da Escolha, que de antemão, já traz uma tendência educacional produzida pela
iniciativa privada. Essa questão surge no vocabulário constantemente abordado no
documento, que indicam qual deve ser o objetivo da gestão, palavras como resultados,
satisfação, qualidade, desempenho, parceria, delegar, indicadores, eficácia, eficiência,
melhoria contínua, dentre outros termos que complementam atribuem o gerencialismo à
educação.
A TGE se adéqua ao novo gerencialismo da educação, definido por Gewirtz e Ball
(2011) como um discurso em que a finalidade da educação possui caráter instrumental, os
61

padrões de desempenhos são elevados e mensurados por meio de avaliação dos resultados,
frequência e destino dos egressos. Articula-se a vocábulos empresariais de qualidade, eficácia,
eficiência.
O documento ICE, (2016h) ainda esclarece que cabe ao gestor coordenar as diversas
áreas da escola, de forma que os resultados gerados possam ser integrados por todos, além
disso, deve ser exemplo para que a equipe escolar possa inspirar-se em suas atitudes, e buscar
a melhoria contínua do projeto escolar.
Pelo documento, urge o imperativo de que os estudantes estejam presentes,
motivados e conscientes; a equipe escolar, deve permanecer alinhada, preparada,
comprometida e motivada; a comunidade precisa envolver-se e tornar-se corresponsável pelo
processo; os parceiros carecem de ser participativos e; a Secretaria de Educação precisa atuar
fornecendo apoio, mostrar-se presente e atuante no planejamento, execução, avaliação e
revisão dos seus processos e procedimentos (IBID).
Também o novo gerencialismo, é resposta para essa imposição do documento,
conforme elucidam Gewirtz e Ball (2011), o perfil no novo gestor deve se atentar para a
potencialidade de cada indivíduo da organização e prover um ambiente que todos possam
perceber que suas contribuições são apreciadas e necessárias.
Santos e Sales (2012) esclarecem que
No nosso contexto neoliberal capitalista, a discussão da gestão merece cuidados,
pois sua essência tende a ser distorcida, ou seja, a ideia da gestão democrática passa,
muitas vezes, a ser utilizada como mote à convocação e sensibilização dos sujeitos
para o engajamento na realização de tarefas que se distanciam do objetivo central da
gestão democrática, a descentralização de poder, haja vista que na divisão social do
trabalho, a relação é de polarização entre os que planejam e os que executam. Assim,
os sujeitos se sentem envolvidos por uma pseudo-democratização, a fim de alcançar
a qualidade total, passam a ser chamados e se reconhecem como colaboradores,
parceiros, voluntários ou sócios. (SANTOS E SALES, 2012, P. 174).

Os autores ainda acrescentam que a gestão democrática pode ser compreendida a


partir de duas perspectivas. Uma perspectiva é a crítico-progressista, que tem objetivos
promover a participação de toda comunidade escolar na elaboração e no desenvolvimento “do
Projeto Político Pedagógico, da autonomia, inclusive financeira, da escola e da
descentralização de poder e de tarefas relativas à organização e ao funcionamento da escola”,
a finalidade principal é garantir a qualidade educacional e a participação efetiva da
comunidade. Outra perspectiva é a neoliberal, a gestão democrática também conta com a
participação e envolvimento de diversas instâncias da escola e em atividades de planejamento
e decisões relacionadas à instituição, “ou apenas significar representação, quando há órgãos
62

colegiados na escola sem efetivo envolvimento ou poder de intervenção e decisão” (SANTOS


E SALES, 2012, P. 174).
Percebemos então, dois vieses distintos sobre a compreensão da gestão democrática.
Sabemos da grande dificuldade de todas as instituições em garantir e conseguir promover a
participação efetiva de toda comunidade na organização e funcionamento da escola. No
entanto, de forma geral, os CEPMG conseguem promover a participação significativa da
comunidade, porém, podemos afirmar que se trata de uma participação coadjuvante,
propiciada, sobretudo, pela Associação de Pais, Mestres e Funcionário (APMF), sobre a qual,
discutiremos em outro momento.
Ainda sobre a proposta, o manual define os papéis que devem ser assumidos,
elucidando a necessidade de colaboração e envolvimento de todos para que a missão,
objetivos, metas, indicadores, estratégias e ações estejam claros e nitidamente definidos, de
forma que cada um compreenda seu papel e possa contribuir objetivamente para a consecução
dos resultados esperados. Cabe ao gestor coordenar as diversas áreas da escola, de forma que
os resultados gerados possam ser integrados por todos, além disso, deve ser exemplo para que
a equipe escolar possa inspirar-se em suas atitudes, e buscar a melhoria contínua do projeto
escolar. (ICE, 2016h).
Enfim, temos que a TGE (conforme texto) é um instrumento que orienta um
exercício contínuo de planejamento e reflexão acerca da teoria e prática, além de promover a
elaboração de Planos e Programas de Ação, para a preparação de relatórios de
acompanhamentos. Busca-se assim, a melhoria contínua dos processos administrativos e
pedagógicos, envolvendo diferentes atores para a concretização do mesmo, sendo eles, pais
professores, gestores, coordenadores, equipe de apoio, parceiros, diversos setores da secretaria
de educação e estudantes. (IBID.).
Podemos então analisar esse novo modelo de gestão centrado nas pessoas que consta
do manual Escola da Escolha como um modelo que induz e motiva os indivíduos a “produzir
com “qualidade” e pelo esforço em busca da “excelência”. Com essa abordagem, gerentes
tornam-se líderes mais do que controladores, provendo visão e inspiração que geram
compromisso coletivo da corporação em “ser a melhor”. Nesse novo modelo, há ênfase na
questão da qualidade. (BALL, 2011, p. 24).
Nesses termos, a visão de gerenciamento da instituição mostra pautada nos princípios
do novo gerencialismo, pois,observamos com frequência a utilização desses termos
“qualidade”, “Excelência”, “líderes”. As estratégias priorizam resultados mensuráveis, por
meio da efetivação de parcerias público/privado e maior envolvimento da comunidade
63

escolar. Toda a sistematização desse modelo pedagógico resultará em um produto final, o


jovem idealizado
Dotado da capacidade de iniciativa (ação), liberdade (opção) e compromisso
(responsabilidade) para fazer escolhas, atuando de maneira autônoma (baseando-se
nos seus próprios valores, crenças e conhecimentos), solidária (atuando como parte
da solução) e competente (seguindo na capacidade de aprender a aprender) sobre os
contextos e desafios, limites e possibilidades advindas do novo século. (ICE, 2016a,
p. 30).

Para assegurar a consecução dos objetivos da TGE, alguns princípios foram


estabelecidos.
O “Ciclo Virtuoso”, pelo que se admite que a centralidade da escola é o educando e a
garantia de uma educação de qualidade, por isso, a equipe escolar, a comunidade e os
parceiros devem trabalhar em conjunto para garantir que os resultados sejam alcançados, bem
como garantir a satisfação da comunidade, através do desempenho de alunos, educadores e
gestores. Refere-se a um ciclo virtuoso que produz riqueza material e moral, pois todos ao
participar do processo educativo beneficiam a sociedade e também desfrutam dos benefícios,
visto que educandos bem formados impactarão positivamente na sociedade em que estão
inseridos (ICE, 2016h).
A “comunicação”, de acordo com o manual deve ser o foco do gestor (ICE, 2016h).
Quanto a esse princípio, afirmamos que o gestor se pauta pelo princípio do diálogo, inclusive
com os alunos, no que refere-se tanto ao desempenho acadêmico, dificuldades e problemas
pessoais, bem como, com os professores, buscando interagir e promover o diálogo e uma
troca de experiências e ideias.
E por fim, a “educação pelo trabalho”, que admite que a formação dos educandos
deva ocorrer não apenas para o trabalho, mas sobretudo, para a vida, para tanto, adota-se uma
atitude de não indiferença perante o outro, aos problemas da vida e do meio social em que se
insere. Para isso, a visão da TGE é proporcionar o processo educativo que ocorre para, pelo e
no trabalho, em que o educando aprende para trabalhar, trabalha para aprender e se auto
educa. Essa filosofia, centrada no trabalho e na educação, estrutura-se em torno da atividade
produtiva do ser humano, enquanto produtor de conhecimento e gerador de riqueza material e
moral (ICE, 2016h).
Dentre os conceitos caros à TGE está o de “descentralização”, que se refere a
designar e distribuir responsabilidades e decisões de um trabalho entre os protagonistas da
ação. O gestor designa tarefas para a equipe escolar e, sua responsabilidade e principal atitude
é cobrar aquilo que foi definido.
64

Afigura 1 apresenta como a equipe escolar deverá estar organizada de forma


descentralizada.
Figura 1: Equipe escolar descentralizada – Ensino Médio.

Fonte: Tecnologia de Gestão Educacional, 2016, p. 14

Outro conceito caro ao modelo pedagógico é o de “delegação premiada” no qual o


gestor tem plena confiança no trabalho desenvolvido por sua equipe e acredita no potencial do
outro. E o “ciclo de melhoria contínua: o Ciclo PDCA” ao qual já fizemos referência.
O último conceito elementar para a TGA é a “parceria” ou a manifestação de um
compromisso e da responsabilidade com um objetivo comum. A escola pode firmar relação
com a comunidade, através dos Parceiros Locais, que dão apoio ao projeto escolar, por meio
de ações que atendem uma determinada demanda específica. Por meio da Secretaria de
Educação, a escola pode realizar parcerias com Parceiros Institucionais, que promovam o
desenvolvimento de projetos acadêmicos, científicos, culturais, artísticos ou esportivos.
Vale ressaltar que a questão da parceria público/privada permeia todo o manual e
manifesta algo que tem sido efetivado nas políticas brasileiras efetivamente a partir da década
de 1990.
Peroni (2012), Luz (2011), Belo (2014), Libâneo (2017) são autores que discutem
essa questão e, que, consideram que as reformas educacionais têm na verdade subsidiado
mecanismos que promovem a participação do setor privado na esfera pública da educação.
A crise do capitalismo subsidiou o desenvolvimento do neoliberalismo, e estimulou a
transferência das políticas de bem-estar social para a do Estado Mínimo. Assim, o Estado
transfere sua responsabilidade com a garantia de direitos sociais à esfera privada, que a partir
daí, passa a ser regulada pelos princípios mercadológicos. Frigotto e Ciavatta (2003) indicam
como os novos agentes entram no campo da educação explicando que:
65

Do ponto de vista da educação, ocorre uma disputa entre o ajuste dos sistemas
educacionais às demandas da nova ordem do capital e as demandas por uma efetiva
democratização do acesso ao conhecimento em todos os seus níveis. Os anos de
1990 registram a presença dos organismos internacionais que entram em cena em
termos organizacionais e pedagógicos, marcados por grandes eventos, assessorias
técnicas e farta produção documental (FRIGOTTO E CIAVATTA, 2003, p. 97).

Todos esses elementos são constitutivos da gestão proposta pelo manual Escola da
Escolha e, as próprias relações estabelecidas entre o Colégio Polivalente, os parceiros, a
comunidade, efetivadas por meio da APMF, propicia tendências privatizantes e, a
desresponsabilização do estado pela educação pública.
O que podemos apresentar é que a TGE traz um repertório de técnicas de gestão
desenvolvidas e criadas para o gerenciamento de empresas e organizações, no entanto, o
documento se apodera desses conceitos e introduz no cotidiano educacional. Algumas
técnicas de gestão, tal como gerenciamento de qualidade total – total quality management
(HRM E TQM), são introduzidas no contexto escolar, produzindo a redução da escola a
procedimentos mercadológicos, modificando também as relações e os comportamentos dos
indivíduos. Para Ball (2011)
A tarefa e o dever do gerenciamento são “não mais restritos a autorizar e impor
regras e procedimentos”, mas a “determinar como os empregados deveriam pensar e
sentir sobre o que produzem”, (p. 522), e “toda oportunidade concebível é
aproveitada para imprimir os valores nucleares da organização sobre seus
(cuidadosamente selecionados) empregados” (p. 523). Vistos criticamente, TQM,
HRM, entre outros, desenvolvem e instilam autovigilância e mútua vigilância.
Profissionalismo é substituído por responsabilização e coleguismo por competição e
comparação interpessoal de performances. Essas são formas de poder concebidas e
reproduzidas por intermédio da interação social na vida cotidiana das instituições.
Exploram a insegurança do sujeito disciplinado. [...] Não recaem simplesmente
sobre as instituições, mas tomam forma em práticas da própria instituição e
constroem indivíduos e suas relações sociais por meio da interação direta, isto é,
pelo menos em algumas circunstâncias, por um poder mais construtivo do que
coercivo. Não simplesmente constrangem e oprimem; articulam um modo de
existência pessoal inscrito nas “artes minuciosas de auto-escrutínio, autoavaliação e
autorregulação (Rose, 1989, p. 222)" (BALL, 2011, P. 28).

Intuímos que esses instrumentos organizam e delimitam criteriosamente a rotina de


professores e gestores, que precisam cumprir com todos esses instrumentos para garantir que
o programa obtenha os resultados esperados.
Enfim, consideramos que limitar os fins da educação apenas para a preparação de
profissionais qualificados – mesmo que, no caso dessa proposta haja uma formação ampliada,
que contemple diversas áreas do conhecimento – é reduzir uma gama de possibilidades dos
sujeitos serem incentivados a conhecer e lutar por seus direitos, a garantia da transformação
66

da sociedade em que todos tenham condições de se desenvolver, enfim, uma sociedade menos
desigual.
Compreendida dessa forma, a transferência da gestão das Escolas Públicas para a
gerência da Polícia Militar contribui para atestar a suposta incapacidade dos
professores em gerir essas instituições. Ou seja, ao transferir para a PM, sob o
discurso de controle da violência e elevação nos índices de aprovação no Ideb, o
governo colabora para a fomentação do discurso da falta de competência do setor
público de ensino e acaba se ausentando de sua responsabilidade na manutenção das
unidades públicas de ensino. A contribuição mensal cobrada nas instituições geridas
pelos militares é um exemplo emblemático dessa trama privatizante. (FERREIRA,
2018, p. 130)

No capítulo seguinte, iremos perceber com maior evidência que na própria


concepção dos professores civis, os militares possuem diversos diferenciais que os
possibilitam exercer o gerencialismo das instituições educacionais com maior eficiência e
eficácia, corroborando com as conclusões de Ferreira (2018) sobre a suposta incapacidade dos
civis de garantirem a gestão das escolas com a mesma qualidade dos militares.

1.2.Programa Novo Futuro

Outro documento basilar para o pedagógico do Colégio Polivalente é o Programa


Novo Futuro21, formulado pelo governo do Estado de Goiás para auxiliar na efetivação da
Educação em Tempo Integral. Fortemente inspirado no manual da “Escola da Escolha” (uma
caravana de políticos goianos esteve em Pernambuco conhecendo a proposta)ele passou a
guiar os princípios e práticas pedagógicas das Escolas em Tempo Integral, instituídas pela Lei
17.920/2012 que criou os Centros de Ensino em Período Integral- CEPI para o Ensino Médio
no ano de 2012.
Essa inspiração é percebida imediatamente no Art. 1º parágrafo único da Lei goiana
que assinala que é objetivo do ensino médio “[...]a formação de indivíduos autônomos,
solidários e produtivos, com conhecimentos, valores e competências dirigidos ao pleno
desenvolvimento da pessoa e ao seu preparo para o exercício da cidadania” (GOIÁS, 2012a).
Ao longo de todo o texto é possível notar as ressonâncias do Manual da Escola da
Escolha. A diferença que indicamos está basicamente nos termos, no vocabulário que se
distancia um pouco daquele utilizado pelos empresários pernambucanos e que é pleno de
termos afeitos ao meio empresarial como eficiência, produtividade, resultados, flexibilidade,

21
A implementação do programa se deu em 2013, ano em que foram criados 15 CEPIs. A dissertação de
Rodrigues (2016), trata de forma detalhada sobre o programa em busca de compreender a concepção pedagógica
e os processos de ensino-aprendizagem propostas no programa.
67

dentre outras. Encontramos no Programa Novo Futuro um vocabulário mais estreitado àquele
próprio de professores, de seu universo profissional.
Assim como a Escola da Escolha o Programa Novo Futuro busca se apresentar como
algo novo através do slogan “Ensino Médio em Período Integral: Uma nova escola para a
juventude de Goiás” (GOIÁS, 2012c, p. 2). Para isso busca promover uma formação
acadêmica de excelência, a formação para a vida e para o trabalho.
A similaridade está não somente das ideias como também no layout que vimos como
persuasivo em linguagem e imagem. O modelo pedagógico do Manual da Escola da Escolha e
o do Programa Novo Futuro estão confrontados na figura 2.À esquerda o modelo proposto
pelo Programa Novo Futuro; e a direita o modelo orientador da Escola da Escolha.
Figura 2: Modelo Pedagógico Programa Novo Futuro e Escola da Escolha

Os Quatro Educação
Pilares da Interdimensional
Educação

O Protagonismo Pedagogia da
Princípios Presença
Educativos

Fonte: Goiás, 2012c, p. 31; ICE, 2016c (organizado pela autora)

Ao comparar os dois modelos, a única diferença encontrada no que se refere aos


princípios, é o que o Novo Futuro denomina como a Formação Global, o modelo Escola da
Escolha nomeia de Educação Interdimensional. Apesar de utilizar nomenclaturas diferentes,
ambas as propostas objetivam desenvolver habilidades cognitivas, emocionais e sociais.
Quanto à gestão, não surpreende observarmos que o Programa Novo Futuro elaborou
os instrumentos que devem ser utilizados para a efetivação da TGE, como os ambientes
escolares, que replicam o cotidiano da indústria ou do meio empresarial. O vocabulário, o uso
de planilhas e atenção as diretrizes vão dando a tônica para práticas e experiências dos
indivíduos.
Os instrumentos aderidos na TGE instituem a estrutura escolar a partir de parâmetros
empresariais, que organizam tempos, métodos e estratégias para alcançar determinado
objetivo, no caso do programa, a excelência do ensino. Todas as atividades a serem
desenvolvidas são estabelecidas e direcionadas pelo programa, para tanto, professores e
68

coordenadores apenas seguem as orientações, possuindo pouca possibilidade de construir sua


proposta. A tabela 2 apresenta os instrumentos da TGE.
Tabela 2: Instrumentos TGE
Plano de Ação Planejamento estratégico de todas as ações necessárias para atingir um resultado
desejado.
Programa de Ação O programa de ação trata da operacionalidade, dos meios e processos que garantirão a
execução das ações constantes no plano de ação e a aplicação das premissas constantes
no plano de ação, dentre elas, a corresponsabilidade dos diversos atores do CEPI.
Agenda Bimestral É um instrumento que visa o melhor gerenciamento dos processos pedagógicos e de
gestão. Contém as atividades propostas para o bimestre, abrangendo as ações de
natureza interna e externa e deve ser avaliada bimestralmente por meio de PDCA pelo
Secretário.
PDCA Tem como foco principal a melhoria contínua. Seu objetivo principal é tornar os
processos da gestão mais ágeis, claros e objetivos. Constitui a essência do
acompanhamento da qualidade; para qualquer processo, há que se estabelecer metas,
definir os métodos/estratégias necessárias para alcançar as metas Desejadas.
Mapa de Atividades O Mapa de Atividades visa acompanhar e gerenciar os processos de gestão e
pedagógico dos atores envolvidos nos mesmos de maneira a formar uma consciência de
gestão na equipe escolar, alinhando-a a filosofia do Programa.
Reuniões Gerenciais SISTEMATIZAÇÃO DO TRABALHO DAS EQUIPESPEDAGÓGICAS;
 Reunião de Comunicação Semanal do Diretor e Equipe Gestora;
 Reunião de Comunicação Semanal: CP e demais coordenadores;
 Devolutiva dos coordenadores de Área aos professores;
 Reunião Geral de Formação com a equipe gestora e docente;
Reunião da gestão com Deve ser realizada pelo(a) gestor(a) com os líderes de sala de todas as turmas do CEPI
líderes de sala com o objetivo de formar uma consciência de liderança e de protagonistas nos jovens;
Planilhas de controle  Estatística da média por disciplina e por área de conhecimentos;
estatístico e  Planilha do fluxo de avaliação
pedagógico
Fonte: Programa Novo Futuro (organizado pela autora)

Assim como vimos no Modelo Pedagógico Escola da Escolha, a cartilha do


Programa também traz conceitos e propostas que se perfilam aos interesses do setor
empresarial, contudo como alertamos anteriormente, o faz de forma menos explícita, e investe
em uma linguagem mais representativa dos profissionais ligados ao campo educacional. Não
se perde, no entanto,o foco das ideias do manual que é o preparo para a “sociedade do
conhecimento”, o mundo produtivo. O programa goiano incorpora as metodologias de êxito
propostas, bem como os pressupostos da tecnologia de gestão.
A novidade foi observada na proposição de algumas metodologias como o
nivelamento e os agrupamentos bimestrais. O primeiro se caracteriza por contemplar
atividades que tem a finalidade de desenvolver habilidades básicas relativas a séries
anteriores, ainda não adquiridas por determinado grupo. O segundo é “destinado a retomada
dos conteúdos em que os estudantes apresentaram maiores dificuldades durante o bimestre,
oportunizando aos estudantes melhorarem sua aprendizagem” (GOIÁS, 2012C, p. 39-40).
Enfim, de forma mais direcional este documento traduz as intenções das políticas
educacionais de promover uma educação adequada às demandas da sociedade, ou seja, que
69

prepare os indivíduos para o mercado de trabalho e, assim, para o cumprimento de seus papéis
sociais (LIBÂNEO, 2013; BALL, 2011).
Tanto o direcionamento das atividades a serem desenvolvidas pelos professores,
como as estratégias de controle e sistematização da rotina do professor, podem ser analisadas
através de Contreras (2012, p. 41), que ao analisar a questão da autonomia dos professores
afirma que a organização sistemática do ensino, promove o afastamento do professor,
enquanto sujeito participativo da elaboração do processo educativo, para ele, essa tendência
reflete a racionalização tecnológica do ensino, destaca que “a forma em que o Estado
desenvolve seus processos de racionalização está em relação direta com o aumento das formas
burocráticas de controle sobre o trabalhador e suas tarefas”. O autor complementa que essa
racionalização cede lugar a outro fenômeno, a proletarização e com ela, a intensificação do
trabalho docente.
Em nível estadual outro documento importante para a configuração pedagógica do
colégio são as diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de ensino de Goiás. Vejamos
melhor este documento.

1.3.Diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de Ensino de Goiás

O caderno com as Diretrizes Operacionais da Rede Pública Estadual de Ensino de


Goiás 2016/2017, criado com o objetivo de publicar as “diretrizes gerais sobre os
procedimentos a serem adotados na rede estadual”(GOIÁS, 2016, p. 12). Em pormenores
detalha o funcionamento e organização das Escolas em Tempo Integral do Estado regidas pelo
Programa Novo futuro.
É esse o documento que detalha melhor a matriz curricular das escolas de tempo
integral do estado (considerando as especificações estabelecidas pelo Ministério da Educação
e pela Secretaria de Estado da Educação), e articula os eixos: “científico; Ético-político;
Socioambiental; Estético-cultural, que compõem a matriz e as expectativas da comunidade
onde a unidade educacional encontra-se inserida” (IBID). A figura 3 apresenta a matriz
curricular proposta para o Ensino Médio.
70

Figura 3: Matriz Curricular

Fonte: GOIÁS, 2016, p. 43.

É interessante notar que as Metodologias de Êxito contempladas na “Escola da


Escolha” foram encaixadas no Núcleo Diversificado dos currículos dos Colégios em Tempo
Integral, como os Projetos de Vida e o Estudo Orientado.
A estrutura organizacional a ser respeitada é exposta também por meio de figura 4 e
mostra a existência de uma frente relacionada a gestão na dimensão administrativa-
infraestrutural (CAF) e outra ligada a gestão pedagógica e de pessoas (Coord. Pedagógica).
Figura 4: Estrutura Organizacional

Fonte: GOIÁS, 2016, P. 45.

É válido ressaltar que por ser o primeiro Colégio de Tempo Integral do Estado sob
gestão do Comando da Polícia Militar sua estrutura organizacional segue outro padrão até
71

pela ampliação do quadro de funcionários que exercem funções específicas dos colégios da
Polícia Militar, organograma este que não tivemos acesso.
O documento ainda traz um tópico que estabelece as condições relativas ao trabalho
docente das quais, destacamos a permanência dos docentes na unidade escolar em jornada de
40 horas, a adoção de planejamento pedagógico-educacional coletivo e tempo de estudo para
o corpo docente a serem realizados na unidade escolar. Notamos que são condições incomuns
aos demais professores do Estado, que na maioria das vezes fazem jornada tripla em
diferentes instituições.
Dispõe também que os professores: ministrarão 28 aulas em sala; terão suas
atividades gerenciadas pelo Mapa de Atividades que devem ser acompanhados pela equipe
gestora e; devem ministrar componente curricular do Núcleo Comum e do Núcleo
Diversificado.
Este documento, regulamentador e normatizador do Colégio em Tempo Integral do
Estado de Goiás assume aquilo que nasce no modelo “Escola da Escolha”.
Passemos ao Regimento Interno dos CEPMG para analisarmos as orientações vindas
da Polícia Militar.

1.4.O Regimento Interno dos CEPMG

O regimento interno22 é um documento comum a todos os Colégios da Polícia Militar


do Estado de Goiás. Todos os alunos têm acesso a esse material, que se encontra disponível
na agenda escolar, distribuída aos alunos no início do ano letivo e, nos acervos das
instituições. É composto de 276 (duzentos e setenta e seis) artigos dispostos em 55 (cinquenta
e cinco) páginas que apresentam orientações gerais e normas acerca do funcionamento destas
instituições.
Notamos a inspiração positivista,cara aos militares brasileiros na medida em que são
recorrentes as palavras “normas”, “disciplina”, “moral” dentre outras. O Positivismo foi uma
corrente que influenciou fortemente o campo educacional no Brasil, sobretudo após o século
XIX.
Surgiu em um momento marcado por intensas crises sociais e morais no fim da Idade
Média e início da Sociedade Industrial. Nesse contexto, esteve atrelado ao nascimento da
então Sociedade Industrial, visto que os conflitos entre as Classes Sociais, as crises e as

22
A dissertação de Santos (2010) faz a apresentação do Regimento Interno, a partir da análise das relações de
saber e poder nas normas explicitadas no texto.
72

constantes transformações pela qual a sociedade transitou, estabeleceram a desorganização e a


anarquia, o que então, deram origem a uma nova maneira de refletir sobre a sociedade. O
Positivismo, foi uma corrente de pensamento no qual sua preocupação principal, baseava-se
na organização e reestruturação da sociedade, com o objetivo de preservar e manter a nova
ordem capitalista. (BEDONE, 1988).
Comte (apud. BEDONE, 1988)ao tratar sobre o caos que encontrava a sociedade
européia após a Revolução Francesa, declara que era necessário instituir um conjunto de
crenças comuns a todos os homens, para que fosse restabelecida a ordem e a harmonia.
Acreditava, outrossim, que a organização da sociedade seria alcançada pela implantação de
um espírito positivo nos homens. Desta forma, a Ordem e o Progresso caminhariam juntos na
sociedade.
Podemos afirmar então, que o positivismo era uma ciência que buscava o
estabelecimento da ordem na sociedade, de forma, que estimulasse o progresso econômico e
industrial, utilizando-se para tanto, de técnicas de controle social, o que efetivava a
manutenção do poder. No Brasil, o positivismo encontrou um lugar propício para seu
estabelecimento e desenvolvimento, principalmente no final do século XIX, que inúmeras
crises afetavam o país teve uma boa receptividade principalmente entre os militares. O lema
compartilhado era baseado em Comte “a ordem por base, o amor por princípio o progresso
por fim. O positivismo tende, por sua natureza, a consolidar a ordem pública, através do
desenvolvimento de uma sábia resignação” (ISKANDAR e LEAL, 2002, p. 4). Destarte, estes
ideais positivistas tomam como princípios a disciplina e a educação. Veremos que o
regimento interno é um documento que traz resquícios e marca do positivismo, sobretudo pela
garantia da ordem e da disciplina.
Na avaliação que Castro (2016, p. 88) o regimento interno é um documento que “não
deixa de comunicar as contradições inerentes a um modelo de escola que promete conciliar o
“pedagógico” [...] e o “disciplinar” [...]”.
Inicialmente o documento rege sobre os princípios legais dos CEPMG e sobre os
princípios, fins e objetivos da educação. Nesses termos, são alinhados aos documentos e
orientações políticas nacionais e estaduais.
Esclarece no artigo 2º que os CPMG serão administrados pela Polícia Militar do
Estado de Goiás por meio do CEPM, a partir de seus comandantes e diretores, em parceria
com a Secretaria de Estado da Educação, ficando no que couber a parte sob responsabilidade
da SEE por força do Termo de Cooperação Técnico Pedagógico sob a circunscrição das
Subsecretarias Regionais de Educação.
73

Estabelece em seu artigo 4º que o ensino ministrado será baseado: na


Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, dentro das normas
previstas neste Regimento; Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a
cultura, o pensamento, a arte e o saber; Pluralismo de ideias e de concepções
pedagógicas; Respeito à liberdade e apreço à tolerância; Valorização do profissional
da educação escolar; Garantia de padrão de qualidade; Valorização da experiência
extraescolar; Vinculação entre educação escolar, o trabalho e as práticas sociais;
Gestão democrática do ensino público, na forma da lei e da legislação do ensino
deste CPMG (GOIÁS, 2017, p. 1-2, grifo das autoras).

Percebemos que os princípios estabelecidos no Regimento Interno se referem à


direitos já antecipadamente garantidos na Constituição Federal de 1988. No entanto, cabe a
ressalva ao que está em destaque no texto acima, “dentro das normas previstas neste
Regimento” foi utilizado para considerar que nos Colégios Militares existem regras e
regulamentos que se diferem dos demais colégios públicos, sendo assim, eles possuem uma
autonomia específica para escolher o perfil e o comportamento dos alunos que poderão
frequentar essas instituições.
Pela análise do extenso documento, percebemos que ele institui as regras e condições
para o funcionamento de todas as esferas e assuntos dos colégios sobremaneira sinalizando
direitos e deveres. Está no corpo do texto as orientações sobre as condutas, as sanções, as
práticas e afins.
Há um capítulo voltado as normas disciplinares e nele o título VIII apresenta as
disposições gerais-normas disciplinares quanto as transgressões, punições dentre outros
termos que ordenam o comportamento dos educandos. Os artigos 160, 161 nos dão mostras de
um olhar de rigor e disciplinamento da conduta moral e social que nos diz muito sobre o ideal
de formação.Nos mostra também o quão complexo deve ser o equilíbrio entre a visão
apregoada na Escola da Escolha que valoriza o protagonismo juvenil, o empreendedorismo e
a visão dos militares, de adequação.
Art. 160. Com base nos princípios de justiça e equidade, bem como visando a pessoa
humana em desenvolvimento, o Regulamento Disciplinar do Colégio da Polícia
Militar de Goiás - CPMG tem por finalidade especificar e classificar as
transgressões disciplinares praticadas pelos alunos, enumerando as causas e
circunstâncias que influem em seu julgamento, bem como enunciar as punições
disciplinares estabelecendo uniformidade do critério utilizado em sua aplicação.
Art. 161. As normas disciplinares devem ser encaradas como um instrumento a
serviço da formação integral do aluno focando nos objetivos da educação, não sendo
toleráveis nem o rigor excessivo, que desvirtua ou deforma, nem a benevolência
paternalista, que a desfibra e degenera (Regimento Interno, 2017, p. 33)

As transgressões disciplinares são classificadas e organizadas em graus, e, conforme


sancionadas são avaliadas e passam pelo conselho para a efetivação das punições devidas.
Pelo artigo 164 elas se classificam em: leve, média e grave. Em parágrafo único fica
74

estabelecido que determinar o grau da transgressão “compete a quem couber aplicar a sanção,
respeitando as considerações estabelecidas no art. 4º”.
Auxilia nesta tarefa os artigos 165, 166 e 167 da página 34 que definem que
transgressões de natureza leve são as que não chegam a “comprometer os padrões morais,
pedagógicos e escolares”, situando-se exclusivamente no âmbito disciplinar. De natureza
média as que atingem aos padrões de disciplina e/ou comprometem o bom andamento dos
trabalhos escolares e as de natureza grave as que comprometem a disciplina, os padrões
morais e os costumes, bem como o andamento dos trabalhos pedagógicos (GOIÁS, 2017, p.
34).
Expressas as informações sobre transgressões e graus definem-se no título X as
sanções disciplinares entendidas como expresso no Art. 174. “A sanção disciplinar é a
penalidade de caráter educativo que visa a preservação da disciplina escolar, elemento básico
indispensável à formação integral do aluno”.
Em seguida apresentam-se (art. 175) as sanções a que estão sujeitos os alunos em
ordem crescente de gravidade: I - Advertência; II - Repreensão; III – Suspensão da sala de
aula; IV –Encaminhamento à Instância Superior para Transferência Educativa Conforme
Portaria 5238/13 –GAB/SEE23.
Na base das sanções, Foucault (1987) afirma que os sistemas disciplinares, operam
como um mecanismo penal, destaca que
Na oficina, na escola, no exército funciona como repressora toda uma
micropenalidade do tempo (atrasos, ausências, interrupções das tarefas), da atividade
(desatenção, negligência, falta de zelo), da maneira de ser (grosseira, desobediência),
dos discursos (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes «incorretas», gestos não
conformes, sujeira), da sexualidade (imodéstia, indecência). Ao mesmo tempo é
utilizada, a título de punição, toda uma série de processos sutis, que vão do castigo
físico leve a privações ligeiras e a pequenas humilhações. Trata-se ao mesmo tempo
de tornar penalizáveis as frações mais tênues da conduta, e de dar uma função
punitiva aos elementos aparentemente indiferentes do aparelho disciplinar: levando
ao extremo, que tudo possa servir para punir a mínima coisa; que cada indivíduo se
encontre preso numa universalidade punível-punidora. (FOUCAUL, 1987, P. 160).

O regimento pode ser enquadrado como esse instrumento repressor, pois torna
penalizável uma série de comportamentos, atitudes e atividades, que sejam contrárias às
normas estabelecidas. Observamos então, que este estabelece as transgressões conforme a

23
A Advertência consiste numa admoestação feita ao aluno, podendo ser verbal ou escrita, pelo cometimento de
faltas de qualquer natureza visando a sua mudança de comportamento. A Repreensão é a sanção relativa a
transgressão de natureza média ou pela reincidência de faltas de natureza leve. A Suspensão da sala de aula é a
sanção disciplinar aplicada às faltas de natureza média e grave, segundo decisão do Comandante e Diretor do
CPMG, ou pela reincidência das faltas de natureza leve e média, não ultrapassando a quantidade de dois dias
(Regimento Interno, 2017, p. 38)
75

gravidade e institui as sanções normatizadoras que devem ser aplicadas, para que tome o
caráter “corretivo que dela se espera” (IBID., p. 161).
Sugere-se um controle rígido das transgressões e do comportamento dos alunos. O
rigor é observado na escala de pesos prevista no artigo 190 e que define que “o
comportamento dos alunos deve ser classificado por grau numérico, de acordo com os
seguintes critérios”: I- Excepcional - grau 10,0; II- Ótimo - grau 9,0 a 9,99; III- Bom - grau
7,0 a 8,99; IV- Regular - grau 5,0 a 6,99; V- Insuficiente - grau 2,0 a 4,99; VI- incompatível -
grau abaixo de 2,0.
Uma estratégia para que esse controle seja alvo de preocupação para os alunos fica
visível na sequência em que lemos:
§ 1º O grau de comportamento se estenderá por todo o ano letivo em cada série.
§ 2º O aluno, ao matricular-se pela primeira vez no Colégio, será classificado no
Bom Comportamento com o grau numérico 8,0 (oito).
§ 3º No início de cada ano letivo, o aluno pré-matriculado será classificado com o
grau de comportamento que possuía ao final do ano letivo imediatamente anterior.
(GOIÁS, 2017, P. 39)

Não apenas as punições e comportamentos são hierarquicamente organizados como


também os elogios que como percebemos pela leitura do artigo 192“se constituem fatores de
melhoria de comportamento e recebem valores que irão influir no cômputo positivo do grau
de comportamento, conforme discriminado”. Os valores são: I- Elogio Individual + 0,50, II-
Elogio Coletivo + 0,25. Pelo parágrafo único fica estabelecido que “os alunos que obtiverem
média bimestral igual ou superior a 8,0 (oito) terão computado positivamente o valor
numérico de +0,50 no cálculo da classificação do comportamento, por cada bimestre” (IBID.).
E ainda, pelo artigo 193 e 194 passados 02 (dois) meses consecutivos, sem que o
aluno tenha sofrido qualquer sanção ou anotação em sua agenda, serão computados +0,03
pontos por dia, até o Excepcional Comportamento (Grau 10,0) e o aluno que ingressar no
Incompatível Comportamento a qualquer época do ano letivo será levado a Conselho
Disciplinar do CPMG (IBID.).
Assim como a punição, os elogios (reforços positivos) são entendidos por Foucault
(1987, p. 161) como um sistema corretivo, que “se torna operante no processo de treinamento
e de correção”. Para Ch. Lucas (1836, apud, FOUCAULT, 1987), os castigos devem ser
evitados, por sua vez, as gratificações e/ou recompensas devem tornar-se mais frequentes que
as penalidades. Sendo que os indivíduos devem ser moldados a partir da busca por
recompensa e não pelo receio dos castigos
Este mecanismo de dois elementos permite certo número de operações
características de penalidade disciplinar. Em primeiro lugar, a qualificação dos
comportamentos e dos desempenhos a partir de dois valores opostos do bem e do
76

mal; em vez da simples separação do proibido, como é feito pela justiça penal,
temos uma distribuição entre pólo positivo e pólo negativo; todo o comportamento
cai no campo das boas e das más notas, dos bons e dos maus pontos. (FOUCAULT,
1987, p. 161).

Temos então, no Colégio Polivalente, uma série de regulamentações que moldam o


comportamento dos alunos, seja por meio de recompensas ou penalidades. Para Foucault
(1987, p. 163), esse poder disciplinar atua no sentido de diferenciar os indivíduos e possibilita
que funcione a coação, para o autor, esse processo “controla todos os instantes das instituições
disciplinares compara, diferencia, hierarquiza, homogeneíza, exclui. Em uma palavra, ela
normaliza”. Com base no autor, podemos conceber que toda essa vigilância e
regulamentação, como um grande instrumento de poder.
Sobre a quantidade de normas e punições concordamos com Santos (2010) para
quem
[...] a quantidade de normas e de punições, o modo como a indisciplina é descrita
pelo Regimento Interno e a descrição das punições a serem aplicadas funcionam
como uma técnica de sujeição dos sujeitos pertencentes ao CPMG. O documento
pode passar ao aluno a imagem da punição, como se fosse um código penal onde são
descritos os “desvios de conduta” e as punições a serem aplicadas e o modo pelo
qual essa punição será divulgada aos demais membros dessa microssociedade
disciplinar. (SANTOS, 2010, p. 28)

O que observamos com a leitura dos documentos vinculados ao Polícia Militar é que
eles não reproduzem exatamente as ideias perfiladas no Manual da Escola da Escolha e
replicadas no Programa Novo Futuro. São incongruentes ao exporem majoritariamente
elementos de ordem, regras, disciplinas. E vimos que a militarização reside nisso, é
reconhecida por isso, ainda que cause nos jovens certa frustração, é um modus operandi que
institui um jeito de fazer o pedagógico, cheio de ritos e simbologias próprias.
A continência é uma simbologia das mais fortes no colégio militar. Tem um capítulo
próprio no regimento e aciona sentimento de coesão-pertencimento. Representa também o
valor pela hierarquia, a disciplina e o respeito. O Capítulo III discorre sobre a continência,
estabelece a obrigatoriedade de o aluno prestar continência aos militares e funcionários, bem
como a alunos mais graduados, sendo que, quando não executada, é definida como
transgressão.
Art. 196. Todo aluno, em decorrência de sua condição, obrigações, deveres, direitos
e prerrogativas, estabelecidos em todas as legislações internas do CPMG, deve tratar
sempre:
I –Com respeito e consideração todos os militares da PMGO, bem como os
funcionários;
II –Com respeito e disciplina as séries mais antigas;
III – Com afeição e camaradagem seus colegas de série;
IV –Com bondade, dignidade e urbanidade os alunos de curso mais modernos;
77

§ 1º - Todas as formas de saudação militar, os sinais de respeito e a correção de


atitudes caracterizam, em todas as circunstâncias de tempo e lugar, o espírito de
disciplina e de apreço existente entre os integrantes do CPMG;
§ 2º - As demonstrações de respeito, cordialidade e consideração, que são praticadas
pelos alunos do CPMG para com os militares da PMGO, são estendidas também aos
Integrantes das Polícias Militares de outros Estados, Forças Armadas, Corpo de
Bombeiros Militares e as Nações Estrangeiras.
Art. 197. O aluno manifesta respeito e apreço aos militares, funcionários civis e
colegas:
I –Pela continência;
II –Dirigindo-se a eles ou atendo-os, de modo disciplinado;
III – Observando a antiguidade dos cursos;
IV –Por outras demonstrações de deferência.
§ 1º - Os sinais regulamentares de respeito e apreço entre o corpo discente
constituem reflexos adquiridos mediante cuidadosa instrução e contínua exigência.
§ 2º - Os sinais de respeito e apreço são obrigatórios em todas as situações e
atividades inerentes ao CPMG (GOIÁS, 2017, p. 41)

A partir da teoria de Durkheim (2011) analisamos a continência como um


instrumento de homogeneização das condutas. Nela não há espaço para diferenciação e sim a
padronização que encanta principalmente os próprios alunos sendo assumida como um gesto
do grupo já que observamos que as continências no Colégio Polivalente não são obrigatórias,
ou seja, os alunos não são forçados, sob pena de serem pontuados, a prestarem continência
para outros. A continência é quase sempre um cumprimento entre a comunidade escolar,
realizada de maneira espontânea e intencional. Os alunos mais jovens, acham interessante e
sentem satisfação ao prestarem continência aos militares e alunos mais graduados. Em síntese
ela homogeneíza e fomenta pertencimento e coesão para os iguais e diferencia na hierarquia
os diferentes. É, portanto um mecanismo de poder que segundo Santos (2010):
Regula o momento, o tempo e o posicionamento corporal dos alunos. Portanto, é
mais um mecanismo de poder, é mais uma forma de alcançar a disciplina e o
controle dos corpos dos alunos, de moldar seus gestos, de medir suas palavras, de
padronizar suas atitudes e os movimentos do próprio corpo. Em uma sociedade
disciplinar, tal mecanismo de poder, a apropriação do corpo do indivíduo, torna-se
necessária para que seja alcançada a disciplina tão útil e necessária ao bom
funcionamento do poder disciplinar. Além disso, para que haja a
governamentalidade, é necessário que a disciplina, a norma, o controle, a
regulamentação e a padronização atinjam a todos os governados, o que, de acordo
com a citação anterior, leva a uma apropriação do corpo dos indivíduos. (SANTOS,
2010, P. 30)

Podemos então considerar que a continência é mais uma forma de garantir o


ordenamento social, a disciplina e o condicionamento do corpo e da mente às diversas formas
de poder exercido pelos militares. Assim, o aluno nas práticas militares do colégio, é a todo o
momento moldado para se tornar um cidadão adaptado às regras sociais e com seu
comportamento condicionado.
78

Na seara dos signos militares temos além da continência, os uniformes, que devem
estar limpos e muito bem passados, evidenciando a preocupação com um padrão estético
impecável que claramente reproduza a oficialidade dos militares. Essa questão aparece em
muitas produções como na de Carra (2012) e na de Nogueira (2014), para quem “a ostentação
dos uniformes, enfim, tudo nos remete a um ambiente simbólico tipicamente militar”
(NOGUEIRA, 2014, P. 119). Vimos que em grande parte das pesquisas (sobretudo na
sociologia e na antropologia) o uniforme alcança o status de categoria.
Complementa este padrão estético e corporal a marcação de estereótipos de gênero
pelo qual meninos devem manter os cabelos cortados e não deixar a mostra (caso tenham)
tatuagens, piercings ou qualquer adereço. Para as meninas não se permite unhas pintadas com
cores escuras e a maquiagem caso seja utilizada deve ser leve.
São componentes verificados cuidadosamente pelos militares, garantindo a
padronização-homogeneização e constante perfeição na apresentação dos alunos no colégio
ou em eventos externos. A justificativa está nos artigos 235, 236, 237 e 238 que socializamos
abaixo.
Art. 235. O uso dos uniformes é fator primordial para a boa apresentação individual
e coletiva dos alunos do CPMG, bem como do corpo docente e administrativo
permitindo sua rápida identificação perante os demais membros da comunidade.
Art. 236. Constitui obrigação de todo aluno do CPMG zelar por seus uniformes e
sua correta apresentação em público.
Art. 237. O Corpo Discente, Administrativo e Serviços Gerais deverão fazer uso de
Uniforme limpos, alinhados e passados, no Interior do CPMG, bem como nas
atividades externas a que comparecerem quando escalados e/ou representando o
CPMG.
Art. 238. Caberá ao Corpo Pedagógico e Administrativo exercer ação fiscalizadora
junto aos alunos e ao comando e direção, a fiscalização dos demais servidores, de
modo a não permitir o uso inadequado destes uniformes (GOIÁS, 2017, p. 45)

Consideramos que o documento do Comando Militar adiciona ao colégio os


componentes ideológico-pedagógicas dos militares, o traço positivista que acarreta o uso de
uma metodologia calcada na ordem, na disciplina, na impessoalidade, e na homogeneização
das figuras e condutas.
[...] o poder de regulamentação obriga à homogeneidade; mas individualiza,
permitindo medir os desvios, determinar os níveis, fixar as especialidades e tornar
úteis as diferenças, ajustando-as umas às outras. Compreende-se que o poder da
norma funcione facilmente dentro de um sistema de igualdade formal, pois dentro de
uma homogeneidade que é a regra, ela introduz, como um imperativo útil e resultado
de uma medida, toda a gradação das diferenças individuais. (FOUCAULT, 1987, p.
165)
79

Nesses termos temos que é a partir desse poder regulamentador, que se efetiva no
colégio, seu caráter homogeneizador e diferenciador, fato que será abordado com maior
ênfase no capítulo II.
Os últimos documentos analisados são o Projeto Político Pedagógico e o Plano de
ação 2017.

1.5.O Projeto Político Pedagógico e o Plano de ação 2017

Ao contrário do que aconteceu em relação aos demais documentos o acesso ao


Projeto Político Pedagógico não foi fácil de modo que o documento que tivemos acesso foi
elaborado no ano de 201724.De forma geral analisamos que o PPP apresenta resumidamente
traços principais dos documentos que analisamos até aqui.
A partir de Veiga (1998, p. 13) podemos afirmar que o PPP é uma importante
ferramenta de organização e do planejamento escolar. Deve orientar as ações, metas e práticas
educativas das instituições e se pauta na compreensão e verificação da realidade em que estão
inseridas. A autora acrescenta que o PPP deve ser encarado “como um processo permanente
de reflexão e discussão dos problemas da escola, na busca por alternativas viáveis à efetivação
de sua intencionalidade”. Destaca que
O projeto político pedagógico tem a ver com a organização do trabalho pedagógico
em dois níveis: como organização da escola como um todo e como organização da
sala de aula, incluindo sua relação com o contexto social imediato, procurando
preservar a visão de totalidade [...] A principal possibilidade de construção do
projeto político pedagógico passa pela autonomia da escola, de sua capacidade de
delinear sua própria identidade. Isto significa resgatar a escola como espaço público,
lugar de debate, do diálogo, findado na reflexão coletiva. (VEIGA, 1998, p. 14).

Temos então que o PPP é um documento que expressa a autonomia da escola em seu
fazer pedagógico, bem como o exercício da reflexão e deve indicar a sua relação com a
realidade. Apesar de conter no documento que houve o debate com a comunidade escolar para
a elaboração do mesmo, o que mais se destaca é sua relação com os documentos já analisados.
Ao analisar o PPP do Colégio Polivalente, encontramos algumas discrepâncias com
os demais documentos, evidentes, preponderantemente no uso de palavras como educação
libertadora e transformação da sociedade, que na verdade só são abordadas na introdução do
mesmo, que ressalta a importância do PPP para a escola, e esclarece que este torna-se um
instrumento de direção e orientação para as ações da instituição. Salienta que sua produção
deverá ser realizada de forma coletiva e com compromisso coletivo manifestando a concepção

24
o PPP 2018, ainda se encontrava em produção
80

da função social da Educação, a partir da compreensão da importância do papel da educação


para o desenvolvimento dos indivíduos.
O texto socializa que a construção do projeto se deu a partir da análise da realidade
que circunda a escola e as famílias dos alunos, pois, a realidade social interfere na vida
escolar, frisa que os dados coletados auxiliam na orientação do organismo escolar. Pelo PPP
se propõe a formação de educandos críticos, solidários, e capazes de interagir com o meio
através dos conhecimentos adquiridos.
Um dos objetivos priorizados no PPP é promover uma “educação transformadora”,
ressaltamos então, que essa expressão foi encontrada apenas neste documento – o sentido da
transformação social –. Com isso soa destoante do conjunto a frase encontrada na página 08
onde citam Gerhart (2001) para assumir a educação transformadora entendendo-a como:
Aquela que trabalha com a visão de sujeitos potencialmente autônomos, capazes de
praticar a solidariedade, instruindo-se de forma a promover a autorreflexão. Neste
sentido, a educação é entendida como uma prática de libertação, que desperta no
sujeito a sua capacidade de promover a humanização, esforçando-se em uma
perspectiva conjunta para mudar o sistema escolar, social e político (PPP, 2017, p.
8).

As palavras: libertadora, transformadora, libertação e especialmente a expressão


“mudar o sistema escolar, social e político” certamente não coadunam com o que vimos nos
textos do Manual Escola da Escolha tampouco do Programa Novo futuro e menos ainda nas
diretrizes dos colégios militares muito mais manifestos de um pensamento pedagógico liberal.
Somente no PPP (2017) encontramos explicitados o protagonismo e autonomia para
a direção e para a coordenação que deverão empenhar-se em elaborar o Regimento Escolar de
forma participativa, com a presença e ciência dos alunos, professores, funcionários e
comunidade, de forma que estes estejam cônscios das funções que desempenham na prática
educativa. Nele, o papel assumido pela coordenação pedagógica requer uma atuação que
garanta a articulação e integração das atividades pedagógicas e do cotidiano escolar, para que
seja garantida a efetiva aprendizagem do aluno, através do apoio, orientação,
acompanhamento, monitoramento e avaliação do trabalho realizado pelos professores. A
partir daí, é possível garantir o desenvolvimento das atividades e ações constantes na matriz
curricular em desenvolvimento na instituição e dos projetos implantados pela SEDUCE. Não
tivemos documentalmente a informação se de fato isso aconteceu.
Contraditório que logo em seguida, ao tratar do currículo o atrele ao Currículo de
Referência da Secretaria de Estado de Educação (SEE) e da Superintendência dos Centros
de Ensino em Período Integral e, pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), que visam
a unificação dos currículos das escolas e sumariamente ao ENEM. Daí que o currículo
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elaborado pela escola, pressupõe “uma seleção de conteúdo a partir das matrizes de
referência do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e ENEM, com base nas
concepções de educação e de ensino e aprendizagem de cada componente curricular, ou área
de conhecimento, definidas na proposta curricular do Programa Novo Futuro” (PPP, 2017,
p. 20).Ressalta ainda que a escolha da Direção se deu por meio de indicação da
Subsecretaria Regional de Educação (SRE), diferindo das demais escolas estaduais, que
realizam a eleição.
Também estão previstas as abordagens para o atendimento educacional
especializado, a avaliação, a progressão parcial, estabelecidas e construídas na replicação das
orientações e parâmetros nacionais e estaduais.
O “Plano de Ação 2017 – Catalão/GO” foi produzido a partir das orientações do
Programa Novo Futuro e pautam como objetivo do colégio no ano de2017 o atingimento:
1- Dos parâmetros de qualidade – excelência nas ações educativas;
2- A solidariedade – fortalecimento do espírito coletivo;
3- A Ética – responsabilidade, probidade e respeito na gestão da Educação;
4- Democracia – gestão participativa e transparente;
5- Equidade – acesso, permanência e sucesso no processo educacional;
6- Inovação – ações empreendedoras, criativas e flexíveis.
A consecução destes objetivos significa passo decisivo para que o colégio se torne
um sistema de referência nacional de qualidade na Educação de forma a ser modelo para o
Ensino Médio Integral como uma Política Pública de Estado reconhecida em âmbito nacional.
Percebemos que estes dois últimos documentos apontam os ideais da equipe
pedagogia do colégio, ainda que alinhados aos documentos orientadores encaminhados pela
SEDUCE e pelo Comando Militar.

1.6.Considerações preliminares sobre o capítulo

Duas coisas devem ser mantidas em mente após a análise dos documentos: o fluxo e
sequência de sua criação e o conteúdo de seus textos.
Nossa análise da ordem com a qual os documentos se efetivam traduz uma
intencionalidade que não é inconsciente, mas um arranjo pertinente ao atual contexto, iniciado
na década de 1990. O que é preciso considerar sobre esse fluxo, é que não se trata de um
projeto de educação que nasce nas bases da comunidade e chega aos empresários que o
abraçam, pelo contrário, a causa surge em Pernambuco, idealizada por um empresário e se
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efetiva, a partir de um grupo parceiro com condições de diferenciar essa causa por um
discurso captável e abraçável facilmente e viabilizado com o aporte financeiro desses
parceiros.
Depois há a chegada do Estado de Goiás que: também assume a causa, validando-a e
legitimando-a e mais que isso, produzindo um documento base que em nível governamental
replica a ideia em termos mais pedagógicos e menos empresarias, ainda que a ideia original
seja conservada.
Essa associação deriva na base da proposta nas escolas de tempo integral, no entanto,
faltava ainda um executor a altura para dar conta de cumprir com as especificidades de um
projeto amplo e complexo, para isso surge a figura dos militares e seu regimento, pelo qual,
podemos inferir que – tarefa dada, é tarefa cumprida! – ou seja, os militares são ótimos
executores, além de transmitir aos olhos de parte da sociedade, credibilidade e segurança.
O PPP aparece por último. Pouco propalado, dificilmente encontrado e socializado.
Apenas nele encontramos a palavra transformação, que nos remete a pensar à transformação
social. Mas, no fim, se torna a réplica dos documentos acima, com o diferencial de que foi
criado pela equipe pedagógica do colégio.
Temos por fim um plano de ação que reproduz em metas locais aquelas expostas nos
documentos anteriores, sobretudo, na Escola da Escolha e no Programa Novo Futuro.
Novamente entra em cena a busca pela garantia de resultados mensuráveis que pode ser
obtida por meio de efetivação e controle das propostas estabelecidas.
Esse fluxo e o modus operandi percebido, de adequação de terminologias e
detalhamento de ações, significa que a escola tem sido pensada através de um viés
empresarial e de mercado, e não devem ser percebidos como um encadeamento de
coincidências positivas, mas como a manifestação de um processo de privatização da
educação que conforme Ball (2011) é complexo, sutil, multifacetado e pode ser visto dentre
outras ações no varejo, gerenciamento, importação de soluções provenientes do campo
semântico do mercado. Ocorre pela interferência, pela venda de materiais, pela oferta de
programas de melhorias, dentre outras ações, que no caso da Escola da Escolha, tem como
objetivo, não o preparo para a execução de funções no chão de fábrica (produção), mas sim, a
garantia de que esse aluno será formado para atuar em patamares um pouco mais elevados,
como líderes.
Por isso, faz sentido, considerarmos que no colégio, pela via dos documentos,
valores ligados ao mercado são valorizados, em igual proporção que a obrigatoriedade do
estado em oferecer educação de qualidade é esquecida. Isso é visível nos cadernos da Escola
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da Escolha que indicam as parcerias público/privados e a participação da sociedade no campo


educacional como solução para o problema da qualidade da educação em texto que também
coaduna com diversos documentos internacionais que orientam as políticas nacionais.
Quanto ao conteúdo dos textos há uma diversidade semântica pertinente de ser
analisada, pois traduz várias faces de uma mesma moeda.
As palavras e termos mais citados no manual da Escola da Escolha são: sociedade
em transformação, sociedade do conhecimento, produtividade, eficiência, resultados,
competência, educação integral, potencialidades, proatividade e protagonismo.
Entrelaçadas constituem um ideal de indivíduo bem sucedido, figura de liderança,
preparado para a transitoriedade da sociedade e para as transformações e constantes
mudanças no mundo, para o qual promover educação integral teria o papel fundamental para a
garantia de que este aluno estaria adaptado às novas demandas da sociedade do século XXI.
No Programa Novo Futuro estas palavras ou se repetem ou vemos a substituição
delas por termos mais próprios do universo pedagógico. Entram em cena as palavras
autonomia, operacionalização, participação ativa e construtiva e ação pedagógica. A
questão do currículo ganha organização incluindo mais claramente as disciplinas “para o
mercado” como o protagonismo e o projeto de vida. Notamos que este documento possui um
viés operacionalizador, ou seja, de garantia da efetivação e instrumentalizar o projeto.
O regimento militar contribui com palavras que ainda não tinham evidência nos
demais, mas que são incorporadas como orientadores da execução como hierarquia,
disciplina, transgressão, punição, moral e exemplo. Até este ponto uma coerência não tão
profunda, mas que cativa.
E no PPP, depois de tantas definições, sendo o último documento no fluxo de
construção da proposta soam incoerentes frases como, “transformação social”, “mudar o
sistema educacional, social e político”. É o único documento que promove a educação em
uma perspectiva crítica social e prioriza uma educação libertadora. Ou seja, este documento
contrapõe o que apregoa os anteriores. Mas, no fim, vamos percebendo que o caráter
educacional que se assume, é a perspectiva dos demais documentos.
Assim, há predominantemente nos documentos um pensamento liberal e conservador
de educação. Que fundamenta como função basal a adequação, a submissão, e a
diferenciação. Uma perspectiva que coaduna com o pensamento de que não é para todos,
sobretudo, quando organizada por militares, essa formação integral possui um caráter
excludente e seletivo.
84

Esse pensamento é por vezes escamoteado quando se destaca a proposta de uma


formação ampla e de diversas possibilidades de desenvolvimento dos alunos, no entanto,
percebemos com muita evidência à adequação às novas formas de trabalho e aos novos perfis
que esses trabalhadores, preponderantemente, os líderes precisam desenvolver e, assim,
explica-se o investimento para a execução desses documentos.
85

CAPÍTULO II

O COLÉGIO EM MOVIMENTO: SABERES E FAZERES DO PROCESSO


“Seria uma atitude muito ingênua esperar que as
classes dominantes desenvolvessem uma forma de
educação que permitisse às classes dominadas
perceberem as injustiças sociais de forma crítica”.
Paulo Freire.

Neste capítulo avançamos em busca da compreensão pedagógica do colégio e o


faremos a partir de seu movimento, de seu cotidiano lido nos elementos do processo educativo
inscritos no campo da Didática como a organização curricular, o planejamento, o currículo, as
metodologias e a avaliação. Metodologicamente tomamos como base as narrativas obtidas a
partir de entrevistas-narrativas e observação. Dialogamos com autores do campo de didática e
da formação de professores como Pérez Goméz e Gimeno Sacristán (1998), Haydt (2011),
Libâneo (2013), Contreras (2013). Para além do campo da didática, nos debruçamos também
sobre autores que discutem relações de poder e dominação como Foucault (1987) e Weber
(2004).

2.1.Ritos militarizados: formação, hasteamento, arreamento, passagem de comando

A rotina de uma instituição muitas vezes passa despercebida aos olhos menos atentos.
Para o pesquisador, no entanto o olhar mais cauteloso é importante e contributivo, por isso
nos orientamos a partir de Tura (2003, p. 187) e dedicamos um tempo da pesquisa de campo
para a observação participante, marcada “pela presença constante do pesquisador no campo e
a observação direta das atividades de um grupo no local de sua ocorrência”. Durante as
observações nosso olhar se voltou para o movimento dos indivíduos no interior e exterior do
colégio, os ritos militares, para a organização do ambiente, bem como as sutilezas das
relações. Ou seja, buscamos compreender e observar o colégio como um todo.
Ao que pudemos observar e avaliar do cotidiano do colégio trata-se de uma escola,
em uma primeira análise “semelhante” às demais, o principal aspecto diferenciador, seria a
introdução de rotinas e práticas militares, tanto a nível pedagógico como organizacional.
Castro (2016, p. 53) também evidenciou essa semelhança, atribuindo um caráter de
normalidade, para com a rotina de outras escolas, em sua análise afirmou que “não
aparentavam ganhar novas dinâmicas ou características”. Concordamos em partes, mas
antecipamos que a própria vigilância exacerbada nos colégios, já são aspectos de
86

diferenciação, seja no comportamento, de professores e alunos,isto porque, além dos militares


que fazem rondas nos corredores, as câmeras de segurança dispostas nas salas, e em
ambientes externos, já moldam e controlam a conduta da comunidade escolar.
Por se tratar de uma escola em Tempo Integral, o Colégio Polivalente possui uma
rotina diferente de todos outros Colégios Estaduais da Polícia Militar (CEPMG). A jornada
escolar inicia às 7h15mine encerra as 17 h. O lanche da manhã é servido entre 9h15min e
09h30min e o da tarde entre 15h10min e 15h25min. O almoço é servido às 12 h com intervalo
de 1 hora e 30 minutos.
A sirene é o aviso sonoro que alerta os alunos quanto ao horário que é seguido à
risca. Tempos e espaços são detalhadamente organizados pela coordenação pedagógica que os
definem conforme as diversas atividades que compõem o Núcleo Comum (NC) e Núcleo
Diversificado (ND).
Esse detalhamento do tempo e sua organização é, para o Gestor, a primeira
provocação aos alunos novatos, pois,“desafia os meninos na questão do tempo”e exige deles
uma primeira adequação que “emerge o menino em cultura, em organização, em auto-gestão.
Dá para criar uma rotina positiva proativa no menino muito rápido” (GESTOR, 2018, p. 10),
ou seja, já inicia a construção do tipo de indivíduo pretendido pelo colégio.
Quanto a rigidez do horário, segundo ele, não se relaciona a um “padrão militar” e
sim às especificações advindas dos Colégios em Tempo Integral, mas o respeito aos horários
sim, como vemos em sua fala “no militar é muito simples, venha com a roupa limpa, o rosto
lavado, é isso, militar é isso, e respeito aos horários” (IBID).
Mas aos olhos do pesquisador que observa há alguma dificuldade em separar ritos
próprios do ambiente escolar com os de uma academia militar devido ao apreço que ambos
têm pela disciplina e pela organização que homogeneíza pessoas (especialmente a pedagogia
tradicional). Não é difícil ver nos alunos a figura de soldados, sobretudo quando se agrupam
como acontece logo no início do dia às 7h15min,momento em que estes precisam se
apresentar no pátio central para a realização da formação, um rito que marca o início e o fim
das atividades diárias.
Nesse momento todos os alunos se reúnem no pátio e são organizados pelos líderes
de turma,para o hasteamento da bandeira. À tarde esse rito se repete para o arreamento,
porém, conta com a participação apenas de uma sala e há um revezamento da turma
responsável diariamente.
Um dos professores, que é militar nos detalhou a forma como deve ser realizada a
formação dizendo que ela deve ser em fila, alinhado, tudo arrumadinho, bonitinho. “E fazem
87

continência à bandeira”. Notamos pela fala seguinte que é algo de “um sistema militar, que
todas as academias do Brasil fazem”e que é uma prática que objetiva fomentar “o respeito à
soberania nacional, respeito à bandeira” (MILITAR, 2018, p. 6). Também observamos essa
valorização do patriotismo presente no discurso do atual Presidente Jair Bolsonaro.
Ressaltamos a existência de um anseio pela sincronia e padronização dos corpos e
movimentos durante a formação, que são preocupações dos agrupamentos militares sempre
muito valorizados, sobretudo quando realizados em público. Um relato do caderno de campo
realizado em 28/11/2017 detalha o que observamos dessa atividade e explicita que a
disposição das turmas se dá sempre dos mais velhos para os menos velhos. As turmas ficam
separadas em filas paralelas (duas filas por turma), sempre organizadas do maior para o
menor. Cada líder de turma faz a apresentação de sua sala para o líder geral (há uma
rotatividade dos líderes de modo que a cada semana, um aluno assume a liderança e, por sua
vez, a liderança geral sempre é assumida por alunos do terceiro ano). Há a posição “de
forma”, em que os alunos precisam ficar em forma para cumprimentar o oficial militar. Não
são permitidas quaisquer condutas que possam ser lidas como falta ou desleixo durante a
realização da formação o que é observado na corporalidade dos jovens. Nesse momento, há
ainda a verificação dos uniformes, meias, sapatos, dentre outras padronizações, tarefa que
também é de responsabilidade dos alunos do 3º ano do Ensino Médio.
Segundo Foucault (1987, p. 125) já no século XVIII, o corpo foi descoberto como
“objeto e alvo de poder”, algo passível de treinamento, obediência e modelagem. Com isso, o
corpo mais do que domesticado, passou a ser fabricado e, sobretudo, ao analisar a figura do
soldado, o autor afirma que
O soldado tornou-se algo que se fabrica; de uma massa informe, de um corpo inapto,
fez-se a máquina de que se precisa; corrigiram-se aos poucos as posturas; lentamente
uma coação calculada percorre cada parte do corpo, se assenhoreia dele, dobra o
conjunto, torna-o perpetuamente disponível, e se prolonga, em silêncio, no
automatismo dos hábitos; em resumo, foi «expulso o camponês» e lhe foi dada a
«fisionomia de soldado». (FOUCAULT, 1987, p. 125).

Podemos então antever que os alunos estão sendo fabricados com um fim
determinado, ou seja, produzir um aluno dócil, cívico, ordeiro e que prima pela organização e
ordem da sociedade. O autor ainda define que o corpo dócil é “um corpo que pode ser
submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado” (IBID., p. 126).
Ao fazer toda a verificação do uniforme e contagem dos alunos presentes, os líderes
de turma, seguem até a liderança geral, informando a quantidade de alunos presentes no dia.
Após isso, há o hasteamento das bandeiras do Brasil, de Goiás e da cidade de Catalão. Nossa
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presença na condição de pesquisadoras foi suficiente para que um dos militares que
participavam do momento solicitasse ao oficial da divisão disciplinar25 para que os alunos
fizessem o grito de guerra, que é realizado apenas em eventos especiais. Prontamente
atendido, os alunos fizeram o grito de guerra que, da primeira vez foi interrompido porque na
avaliação do sargento “não estava perfeito”. Só depois, na segunda vez, teriam atingido essa
condição e foram então liberados, e seguiram rumo as suas salas. Vimos a partir da liberação
do oficial os traços até então obnubilados de uma juventude em sua desorganização e barulho.
Sobre essa prática um professor (civil) exprime sua leitura ressaltando a
hierarquização e o comando que ela alimenta. Ele diz:
Eles se organizam por sala, cada semana um aluno tem que organizar a sala dele. Ele
é responsável por organizar a sala dele. E quando ele organizar, ele passa o comando
para o aluno da terceira série, essa coisa da hierarquia e a terceira série vai passar
para o diretor, ou para quem estiver lá, ou o vice-diretor. E aí vai ter essa cerimônia
de hastear a bandeira e depois os recados e informes. (PROFESSOR 2, 2018, p. 11).

Avaliamos com base em Weber (2004, p. 526) a valorização de um tipo de liderança


racional-legal, ou seja, aquela pautada na legalidade e na existência de normas estabelecidas,
estatutos legais, que fundamentam regras elaboradas racionalmente. Utilizamos este sociólogo
para dizer que também “É óbvio que, na realidade, a obediência é condicionada por motivos
muito poderosos de medo e esperança” ao relembrarmos da supervisão das posturas na
formação e do capítulo do regimento do colégio dedicado as sanções.
Outra leitura da formação diz respeito ao sentimento que a mesma causa nos alunos.
De integração, coesão e diferenciação assim como de patriotismo que antes não era
vivenciado. Na visão de um dos professores (militar) os alunos
Gostam de entrar em forma, de ter que entrar em fila, fazer continência à bandeira,
cantar o hino nacional. Eles gostam disso, eles acham importante, eles acham
interessante e isso antes não era tocado neles. Eles não tinham essa percepção e
depois que eles passaram a ter essa rotina eles viram que é interessante. (MILITAR,
2018, P. 6)

25
O Art. 20. do Regimento Interno, estabelece como atribuição da Divisão Disciplinar o cumprimento e a
fiscalização do regimento interno; apurar e documentar as transgressões disciplinares do corpo discente; manter
a uniformidade de conduta nos turnos de serviço; colaborar para o bom desenvolvimento de todas as atividades
de ensino; zelar pelo fiel cumprimento do Título VIII Do Regulamento Disciplinar do Corpo Discente;
desenvolver orientações gerais e particulares ao Corpo Discente, concorrendo para a continuidade do processo de
formação e ensino-aprendizagem; acompanhar diariamente o controle de frequência do Corpo Discente,
mantendo a direção informada para as providências devidas; coordenar o hasteamento e arreamento das
bandeiras diariamente e por ocasião das formaturas cívico-militares, motivando e incentivando a participação do
corpo discente; aplicar medidas disciplinares, contidas no Regulamento Disciplinar, ao corpo discente, com fiel
observância às leis, especificamente ao Estatuto da Criança e Adolescente; dentre outras prerrogativas.
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Mais do que isso, faltava-lhes a noção de que são parte de um todo social. E que a
integração a sociedade deve acontecer exatamente como acontece naquele agrupamento,
como um organismo, de modo harmônico e funcional. Nas palavras do militar isso “é
necessário, que é importante para a formação deles como homem na sociedade. Então para
eles isso é diferenciado”. (MILITAR, 2018, p. 6, grifo nosso).
O grifo em algumas palavras narradas pelo militar é justamente para chamar a
atenção e levantar o questionamento para a intencionalidade dessa prática. Formação do
homem na sociedade, ou seja, do cidadão, mas que tipo de cidadão se deseja formar?
Acreditamos que se trata de um cidadão “positivo” que almeja atingir o progresso pela ordem.
Comte (2002) um dos mais importantes teóricos positivistas, percebia a escola como
uma instituição que deveria promover a disciplina e garantir que os conhecimentos científicos
fossem disseminados. Seu pensamento primava pela moralidade dos educandos e pela ordem
“condição fundamental do progresso”. (COMTE, 2002, p. 103).
Na visão de uma aluna a formação cívica, o hasteamento e os ritos “militares” estão
estreitamente ligados ao militarismo porque este “tem muito patriotismo, então, o
hasteamento da bandeira, é todo um processo de reverenciar a bandeira, de trazer o
patriotismo, um pouco do nacionalismo para dentro da escola” (ALUNO 1, 2018, p. 2).
Para esclarecer o conceito de patriotismo, buscamos o significado do termo no
dicionário Michaels online que o define como “Amor à pátria, devoção ao seu solo e às suas
tradições, à sua defesa e integridade”. No site do Exército brasileiro, apresenta a seguinte
definição:
1. O patriotismo pode ser entendido como o amor incondicional à Pátria. Esse amor
impele o militar a estar pronto a defender sua soberania, integridade territorial,
unidade nacional e paz social.
2. Caracteriza-se pela vontade inabalável do cumprimento do dever militar, mesmo
que isto prescinda o sacrifício da sua própria vida.
3. Pode ser resumido pelo lema:
"Servir à Pátria". (EXÉRCITO BRASILEIRO).

Quanto ao civismo, o dicionário Michaels Online define como “Dedicação pelo


interesse público ou pela causa da pátria, civilismo, patriotismo.
1. Civismo é o culto aos símbolos nacionais, aos valores e tradições históricas, à
História-Pátria, em especial a militar, aos heróis nacionais e chefes militares do
passado.
2. Deve ser exteriorizado com a participação em solenidades cívico-militares, nas
comemorações de datas históricas, no culto aos patronos e heróis, na preservação da
memória militar e, sempre que oportuno, na divulgação dos valores cívicos.
3. No culto desse valor, os militares são importantes vetores de disseminação da
cultura nacional no seio da sociedade brasileira. (EXÉRCITO BRASILEIRO).
90

Podemos então salientar, que patriotismo e civismo significam a “proteção” da


pátria. Esse fato, se considerado, pode resultar em uma sociedade conservadora, que busca a
todo custo manter a ordem, a moral e os bons costumes dos cidadãos. Enfim, não podemos
desconsiderar que os momentos de crise e intensas disputas promovidas, sobretudo, pelos
movimentos sociais, tidos como anárquicos e subversivos é que garantiram uma série de
direitos para as minorias sociais. Pensamos então, que inculcar nos alunos sentimentos
patrióticos e cívicos, pode disseminar um ideal político de salvaguarda nacional que se ajuste
a demandas de manutenção.
O momento de formação também é utilizado pelos militares para passar informes ou
orientações para os alunos. Os alunos só podem deixar a fila quando autorizados pelos
militares, ou seja, quando esse comando for passado.
Na literatura sobre os Colégios Militares encontramos na produção de Castro (2016)
a análise do momento da formação, em que afirma ser a manifestação do poder dos militares
na construção do pedagógico, como vemos na consideração que ele faz de que:
A obrigatoriedade de os estudantes das escolas CPMG realizarem essa atividade é
um dos exemplos mais notórios do poder que a polícia militar possui na construção
do “pedagógico” no contexto de sua administração escolar. Os objetivos desse
procedimento visam à construção e fortalecimento de um ethos militar no contexto
da formação policial, sendo transportado para a Educação Básica como mecanismo
de produção das subjetividades, cujo foco é o desenvolvimento do espírito de grupo
e da disciplina corporal. (CASTRO, 2016, p. 61)

Contemporâneas de um o contexto político marcado pela vitória do candidato Jair


Bolsonaro a presidência e sua recente posse, avaliamos que os entendimentos sobre a
formação expressos pelas narrativas comprovam a valorização de um discurso que vai ao
encontro do que anuncia o presidente ao propor a construção de uma sociedade que tenha
como distintivos a civilidade, a moralidade e o conservadorismo subentendidos no slogan que
marcou sua campanha “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos”.
Não é à toa que a ampliação do número de instituições escolares (ao menos uma em
cada capital) geridas por militares tenha sido bandeira das mais populares em sua plataforma
de governo. Sua vitória sinaliza a concordância de muitos com um projeto de educação que
concorra para a forja de cidadãos que se ajustem ao sistema, portanto ao capitalismo,
independentemente de suas decorrências que, no Brasil, tem na desigualdade maior expoente.
Após a formação e já em suas salas os alunos se direcionam para seus respectivos
lugares e é tarefa do líder de turma organizar a sala e soubemos por uma professora que neste
momento se tiver alguém passando dos limites,como por exemplo, com brincadeira há sempre
o líder atuando para manter a sala organizada. Ao adentrar na sala, o professor é recepcionado
91

pelo aluno líder, que tem a incumbência de apresentar a turma para o professor e informar o
número de alunos que estão na sala, quantos faltaram e então dar o comando ao professor.
Ficamos surpreendidas com a figura de poder imanada pelo líder, visto que ainda na
condição de aluno, ele tenha o poder de interferir na ordem da sala para manter sua
organização, mesmo que não tenham nenhum adulto para resguardá-lo. Sinal de que a
hierarquia e vigilância fazem-se presentes mesmo em momentos em que os alunos estão
apenas com seus pares.
É interessante pensar no comando e em sua transmissão como a circulação do poder
no colégio e vimos nisso manifestação daquilo que diz Foucault (1987, p. 14) "o poder não
existe de um lado ou de outro, mas é apreendido por relações e práticas, que se exercem e se
efetuam".
Esse poder é quase tangível durante o ritual que ocorre sempre que o comando é
transmitido e se repete em todo início de aula quando o aluno líder se dirige à frente da sala e
executa alguns comandos para a turma com os dizeres: - Atenção alunos, todos de pé.
Sentido! Eu (nome), aluno (a) do CEPMG, apresento à Vossa Senhoria a turma (ano/série).
“Com (número de alunos) efetivos e (número) presentes”. Após o término desse ritual, os
alunos se assentam e o professor dá início a sua aula. Como na formação, o que nos chamou a
atenção foi a postura e a sincronia dos movimentos dos alunos e a postura do professor ao
receber esse comando. Outro ponto, não há risos de modo algum. Podemos afirmar que tanto
a formação quanto esse momento de apresentação das turmas, funcionam como um
mecanismo de poder, que torna os corpos hábeis e submissos,
O momento histórico das disciplinas e o momento em que nasce uma arte do corpo
humano, que visa não unicamente o aumento de suas habilidades, nem tampouco
aprofundar sua sujeição, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo
o torna tanto mais obediente quanto é mais útil, e inversamente. Forma-se então uma
política das coerções, que são um trabalho sobre o corpo, uma manipulação
calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus comportamentos. O corpo
humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o
recompõe. Uma «anatomia política», que é também igualmente uma «mecânica do
poder», está nascendo; ela define como se pode ter domínio sobre o corpo dos
outros, não simplesmente para que façam o que se quer, mas para que operem como
se quer, com as técnicas, segundo a rapidez e a eficácia que se determina. A
disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos «dóceis». A
disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e
diminui essas mesmas forças (em termos políticos de obediência). Em uma palavra:
ela dissocia o poder do corpo; faz dele por um lado uma «aptidão», uma
«capacidade» que ela procura aumentar; e inverte por outro lado a energia, a
potência que poderia resultar disso, e faz dela uma relação de sujeição estrita.
(FOUCAULT, 1987, p. 127).

Quanto à dinâmica em que o aluno passa o comando ao professor, pode ser realizada
também a partir de uma leitura foucaltiana e foi encontrada na narrativa de um dos
92

professores civis que encara essa apresentação das turmas, como uma “uma transferência de
poder”, que desenvolve nos alunos, dentre outras coisas, “o cuidado”, e indica ao professor
que a partir daquele instante a sala está sob seu domínio (PROFESSOR 5, 2018, p.8).
Para um professor militar a lógica destas atividades não tem relação com poder, mas
com liderança já que em sua visão é preciso aprender a obedecer para depois saber liderar. E é
na sala de aula que os jovens exercitam essa obediência e essa liderança, porque há em cada
sala um “líder de turma e cada líder organiza sua sala” (MILITAR, 2018, p. 6).
Castro (2016, p. 66) atentou a questão dos ritos quando observava o encerramento
das atividades diárias no Colégio Polivalente se diferencia do CEPMG pesquisado por que é
um colégio de tempo parcial, no qual, a formação para arreamento ocorre com toda escola e,
os alunos, ao término das aulas, saem também em forma e cantando seus gritos de guerra. Ele
considera que “O ritual de saída da escola me chamou a atenção pelo seu caráter de reforço
aos símbolos e elementos da identidade militar, destacados nas músicas cantadas enquanto
marchavam”.
Seja qual for a leitura preponderante no coletivo do colégio (ou na perspectiva do
poder, ou na perspectiva da organização) percebemos que todos participam desses ritos
“militarizados”, ainda que em um primeiro momento os tenham estranhado. Eles se
incorporam e constituem a cultura escolar do colégio concebida a partir de Viñao Frago
(2000, p. 100) como “modos de pensar e atuar que proporcionam a seus componentes
estratégias e pautas para desenvolver-se tanto nas aulas como fora delas – no resto do recinto
escolar e no mundo acadêmico”.
Ao assumirem a sala, os professores desenvolvem suas atividades conforme o
planejamento. No fim do dia, novamente acontece a formação. Descobrimos em uma
entrevista com uma aluna que ela inicialmente, era realizada com a participação de toda
escola que na opinião dela “ficava muito pesado fazer a escola inteira”. Em seu depoimento
ela explicita que sempre havia atrasos tanto a formação para hasteamento como para o
arreamento e estes atrasos aconteciam mais no período da tarde “porque todo mundo tinha
que sair da sala, ir para lá, fazer a formação e muitos alunos estavam perdendo o ônibus”. A
mudança, que gerou o rodízio de turma aconteceu após uma conversa entre os alunos e o
gestor (ALUNO 1, 2018, p. 6).No Colégio Polivalente, além do rodízio das turmas, os demais
alunos, saem normalmente após a sirene que demarca a conclusão do dia letivo, ao contrário
do que acontece no colégio pesquisado por Castro (2016).
Percebemos que há um zelo por parte dos militares na construção do patriotismo e
das noções de civismo. Associamos esse fato, à específica intenção de manutenção e
93

ordenamento dos indivíduos. Fato esse também apontado por Oliveira (2017, p. 107), como
um dos preceitos dos colégios militares, para o autor, “o civismo aparece como instrumento
na formação de uma mentalidade patriótica e disciplinada, em consonância com os objetivos
da corporação militar”
Outra forma de se garantir o disciplinamento e a homogeneidade dos corpos e
comportamentos é a grande valorização do uniforme, do fardamento, para o qual, existe todo
um protocolo que determina, segundo um dos professores “até os dias que eles têm que usar
farda, e outro dias que eles podem usar outro uniforme”. O desacato às normas para o
uniforme é classificado como transgressão. Na visão do professor, o fardamento é cobrado por
“Questão de disciplina e formação mesmo. De responsabilidade. Eles têm que ter
responsabilidade no dia a dia”. (PROFESSOR 1, 2018, p.4).
Vemos o grau do controle em relação ao fardamento na definição de que as
segundas, quartas e sextas, os alunos utilizam a farda (que é o 3º Uniforme básico), as terças e
quintas, o agasalho (que é 5º uniforme, sendo o casaco opcional). A figura 5 apresenta os
padrões estabelecidos pelos CEPMG no uniforme de alunos e profissionais.
Figura 5: Padrão de Uniformes no CEPMG

Fonte: https://www.cpmganapolis.net/index.php/2016/01/23/padrao-de-cabelo-e-uniforme/

A padronização define até mesmo as cores de meias e cintos. Quando fardados os


jovens assumem postura diferenciada, de maior seriedade e comedimento, sobretudo em
ambientes exteriores aos muros do colégio. Quando uniformizados, não podem participar de
manifestações, nem mesmo se comportar de maneira indisciplinada,é como se fossem
vigiados constantemente. O primeiro e o segundo uniforme, são utilizados em solenidades,
desfiles ou em ocasiões especiais, conforme normatização.
94

Um dos professores (civil) explicita o rigor no uso do uniforme explicando inclusive


que há “uniforme certo para cada dia”e que há um “jeito de usar o uniforme. Se você está com
farda você usa para dentro da calça. Se você sair em lugares descobertos você coloca a
boina”. Segundo ele, inicialmente essa cobrança tem caráter “educativo”para depois tornar-se
“mais punitivo, já sofre transgressão” (PROFESSOR 2, 2018, p. 13).
A coordenadora afirma que o uniforme nos colégios militares é um rigor que
considera como “Um ponto muito positivo, porque quando a gente olha aqui nesse corredor,
você não sabe quem é mantido por nós, e quem chega de carro importado, porque o uniforme
ele é igual para todo mundo”. Pela sua narrativa percebemos que ela considera o uniforme
como um importante dispositivo homogeneizador, pois “você olha, está todo mundo no
padrão,[...]O corpo não consegue ser padronizado, o que a gente padroniza é esse exterior”.
(COORDENADORA, 2018, p. 9).
O Aluno 3(2018, p. 2), afirma que teve grande dificuldade em se adaptar ao regime,
sempre pesando sobre a necessidade do uso da farda, do cabelo preso, e se questionando qual
a diferença que aquilo teria em sua aprendizagem, entretanto, “aos poucos a gente foi
acostumando, e hoje eu já estou totalmente adaptada”.Salienta que as normas não são
impostas imediatamente, há um cuidado com os alunos, para que haja uma adaptação sem
imposições.
Chamamos atenção para um aspecto que nos instigou a pensar sobre o que é ser
aluno de um CEPMG e o que representa o uso do fardamento. Enquanto pesquisadoras,
acreditamos na confluência de duas condições distintas, uma que homogeneíza e outra que
diferencia e nisso tomamos como base as ideias de Durkheim (2011) sobre a educação
enquanto processo socializador homogeneizante e diferenciador.
Cada sociedade elabora um certo ideal do homem, ou seja, daquilo que ele deve ser
tanto do ponto de vista intelectual quanto físico e moral; que este ideal é, em certa
medida, o mesmo para todos os cidadãos; que a partir de certo ponto ele se
diferencia de acordo com os meios singulares que toda sociedade compreende em
seu seio.(DURKHEIM, 2011, P. 52).

Há no pedagógico também um aspecto próprio da abordagem comportamentalista


(MIZUKAMI, 1987) na qual, a escola seria a responsável por transmitir além de conteúdos,
comportamentos éticos e práticas sociais. Isso é mais relacionado à atuação dos militares,
regimento e pessoal, que define, produz e perpetua um padrão de indivíduo a ser formado, que
vai: a) produzir resultados mensuráveis, sobretudo em avaliações externas, b) fomentar a já
alta credibilidade dos CEPMG, c) produzir o indivíduo disciplinado, ordeiro, cívico talhado
tal qual o homem novo de Carlota Boto para viver em sociedade.
95

O uniforme e podemos pensar correlatamente a educação no colégio é imposta a


todos os alunos considerando que todos estão em patamares semelhantes, ou seja, dentro do
colégio todos são vistos como iguais, o que é marca do pensamento liberal. Por outro lado, o
uso do uniforme e o fato de ter cursado o colégio militar ou de nele trabalhar posicionam
alunos e professores em um lugar diferenciado perante a sociedade, torna-os distintos perante
o coletivo geral. E vimos o registro desse sentimento de “ser diferenciado” na fala da
coordenadora ao ressaltar que “Quando a gente chega em determinados lugares as pessoas -
Ah, você trabalha no colégio militar? Trabalho! Nossa lá é bom” (COORDENADORA, 2018,
p. 15).
Concorre para o fortalecimento dessa interpretação a fala do professor militar, que
assegura “Então para eles isso é diferenciado. É uma coisa que eu observo também na rua é
que eles saem daqui fardados com a farda deles eles gostam de mostrar que são alunos do
colégio militar. Eles se acham autoridades!” (MILITAR, 2018, p.8). Observamos então, que
esse pensamento se alinha à função da educação prevista por Durkheim (2011), ao afirmar
que
A sociedade só pode viver se existir uma homogeneidade suficiente entre seus
membros; a educação perpetua e fortalece esta homogeneidade gravando
previamente na alma da criança as semelhanças essenciais exigidas pela vida
coletiva. No entanto, por outro lado, qualquer cooperação seria impossível sem uma
certa diversidade; a educação assegura a persistência desta necessária diversidade
diversificando-se e especializando-se a si mesma. Se a sociedade tiver alcançado o
nível de desenvolvimento em que as antigas divisões em castas e classes não podem
mais se manter, ela prescreverá uma educação mais uma em sua base. Se, no mesmo
momento, o trabalho estiver mais dividido, ela provocará nas crianças, a partir de
um primeiro depósito de ideias e sentimentos comuns, uma diversidade de aptidões
profissionais mais ricas. (IBID., p. 55).

Percebemos que para o professor militar os alunos do Colégio Polivalente como


superiores, ou seja, há uma supervalorização daquele ambiente, um aspecto diferenciador, que
resulta em suma supremacia daquela instituição e daquelas pessoas que fazem parte do corpo
docente e discente. A homogeneização ocorre entre os próprios alunos, e a diferenciação
também surge nesse ambiente e fora dele, como aspecto de desenvolvimento das
potencialidades. Enfim, ao construir esse ideário de que os alunos são autoridades, corremos o
risco de menosprezar as demais escolas públicas, bem como seus alunos e, promover
discriminação.
Além do fardamento, os alunos precisam se adequar a uma série de normas que
padronizam cortes de cabelo, maquiagem, uso de esmaltes, piercings, acessórios e demais
adornos que podem fragilizar o padrão estético dos alunos. A figura 6, ilustra a forma como o
cabelo deverá ser mantido.
96

Figura 6: Padrão corte de cabelo CEPMG

Fonte: https://www.cpmganapolis.net/index.php/2016/01/23/padrao-de-cabelo-e-uniforme/

Enfim, percebemos pela observação que há nas rotinas do colégio um repertório de


regras e condutas que são constituintes de corporalidades, posturas e pensamentos que atuam
em prol da formação que prima pela ordem, pela disciplina, pela moralidade cívica que
ressaltam bem o tipo de cidadão a que se pretende os CEPMG.
Enveredaremos a seguir pelas narrativas sobre os elementos da dimensão da didática,
coração do pedagógico.

2.2.A didática.

Para enveredarmos pelos caminhos da didática e compreender o pedagógico Colégio


Polivalente partimos do entendimento de que a educação é fenômeno social, tal e qual o faz
Libâneo (2013, p. 17) e, consequentemente avaliamos que toda a prática educativa está
determinada “por fins e exigências sociais, políticas e ideológicas”, ou seja, ajustada por
“valores, normas e particularidades da estrutura social a que está subordinada”.
Nesses termos temos que
O caráter pedagógico da prática educativa se verifica como ação consciente,
intencional e planejada do processo de formação humana, através de objetivos e
meios estabelecidos por critérios socialmente determinados e que indicam o tipo de
homem a formar, para qual sociedade, com que propósitos. Vincula-se, pois, a
opções sociais e políticas referentes ao papel da educação em um determinado
sistema de relações sociais. A partir daí a Pedagogia pode dirigir e orientar a
formulação de objetivos e meios do processo educativo. (LIBANEO, 2013, P. 24)

Um dos campos de estudo da Pedagogia é a Didática, que permite a compreensão


geral do fenômeno educativo, a partir de suas “manifestações no âmbito escolar”. O autor
explica que esta compreensão diz respeito
a aspectos sociopolíticos da escola na dinâmica das relações sociais; dimensões
filosóficas da educação (natureza, significado e finalidade, em conexão com a
97

totalidade da vida humana; relações entre a prática escolar e a sociedade no sentido


de explicar objetivos político pedagógicos em condições históricas e sociais
determinadas e as condições concretas do ensino; o processo de desenvolvimento
humano e o processo da cognição; bases cientificas para seleção e organização dos
conteúdos, dos métodos e formas de organização do ensino; articulação entre a
mediação escolar de objetivos/conteúdos/métodos e os processos internos atinentes
o ensino e à aprendizagem. (IBID., p. 24-25)

No capítulo anterior nos dedicamos a analisar documentos orientadores do colégio


para compreender quais seriam os “fins e exigências sociais, políticas e ideológicas” do
colégio a partir dos documentos orientadores de seu processo educativo, portanto de seu
pedagógico. Intentamos compreender o colégio enquanto proposta, ideal e verificamos neles o
lastro de um pensamento liberal que na educação na perspectiva de Libâneo (2001), tem como
objetivo a preparação do indivíduo para o desempenho de papéis sociais, conforme aptidão
individual, sendo manifestação própria da sociedade capitalista. Todo modo o objetivo da
educação a formação do indivíduo subordinado à sociedade interpretada em um viés
econômico-produtivo. Desse modo o calçamento da proposta social, política e ideológica do
projeto pedagógico é a formação do indivíduo apto a participar da chamada sociedade do
conhecimento.
Também encontramos a massiva influência de um pensamento neoliberal, (BALL,
2011; LIBÂNEO, 2013), sobretudo nas formas sutis de aparelhamento ideológico e de
aproximação de grupos como o empresariado. Para além disso, e coroando tudo, a figura dos
militares como gestores-executores de uma gestão disciplinada, hierarquizada e bem vista aos
olhos da sociedade.
Agora nos dedicaremos a compreender o colégio na dobra do pedagógico em
movimento, quando professores e alunos ganham protagonismo. Utilizaremos como guia ou
categorias os elementos do processo educativo que para Libâneo (2013) são: o planejamento,
a organização curricular, objetivos, metodologias, utilização de recursos e avaliação.

2.2.1. O Planejamento

Vimos no primeiro capítulo o conjunto de documentos que orientam e definem em


níveis profundos quase tudo o que se relaciona ao pedagógico, bem como, ao próprio
funcionamento do colégio. O manual Escola da Escolha direciona um perfil claro de formação
e determina a finalidade, proposta e metodologias da escola, o Programa Novo Futuro
organiza detalhadamente horários, avaliações, tempos, espaços e atividades, o Regimento
98

Militar controla os corpos, estéticas, posturas e promove o disciplinamento e ordenamento dos


alunos.
Esses documentos sistematizam e dão condições para a realização do planejamento
do pedagógico do colégio. Libâneo (2013, p. 246) define o planejamento como um “processo
de racionalização, organização e coordenação da ação docente. [...] é uma atividade de
reflexão acerca das nossas opções e ações”.
Temos ainda que o planejamento escolar é um instrumento que apóia tanto a escola
como os professores a tomarem decisões referentes às situações do processo de ensino e
aprendizagem. Nesse mesmo viés, Haydt (2011) define o ato de planejar como uma atividade
reflexiva e analítica da realidade e das condições existentes, antecipando possibilidades de
superação de problemas e meios para atingir os objetivos estabelecidos. O ato de planejar
resulta no plano, que se refere ao arcabouço das conclusões decorrentes desse procedimento
reflexivo.
No âmbito educacional, Haydt (2011, p. 70) apresenta quatro tipos de planejamento
que direcionam o trabalho pedagógico, são eles: planejamento do sistema educacional;
planejamento geral das atividades de uma escola; planejamento de currículo; planejamento
didático ou de ensino. Este último se subdivide em: planejamento de curso; planejamento de
unidade didática ou de ensino; planejamento de aula.
O planejamento do sistema educacional, refere-se à organização geral do sistema de
ensino, a nível nacional, estadual e municipal. O planejamento geral das atividades da escola,
concebe o programa geral de atividades da escola. O planejamento curricular diz respeito aos
componentes curriculares que devem ser contemplados ao longo do curso, e ainda aos
objetivos gerais e os conteúdos previstos de cada componente, deve ser elaborado por cada
unidade escolar e seguir as diretrizes básicas dos sistemas de ensino a qual pertencem. O
planejamento didático prevê as ações e procedimentos que devem ser realizados por
professores e alunos, contempla a organização das atividades e visa atingir aos objetivos
estabelecidos. O planejamento de curso refere-se aos conhecimentos que devem ser
desenvolvidos bem como as atividades que devem ser realizadas por determinado período,
trata-se de desdobramento do plano curricular. O planejamento de unidade diz respeito à
reunião de diversas aulas para o tratamento de algum tema ou assunto proposto. E, por fim, o
planejamento de aula, em que o professor aponta e desenvolve as metodologias diárias para a
efetivação dos planos de curso e unidade.
Enfim, de maneira geral, podemos afirmar que esses diversos tipos de planejamento
deveriam, a princípio, promover a discussão e reflexão sobre a prática pedagógica. No
99

entanto, marca apenas o acatamento das normativas com pouca possibilidade de construção da
própria organização didática e curricular.
Destarte, o pedagógico do Colégio Polivalente é planejado a partir das orientações
encaminhadas pela SEDUCE e coletivamente discutidas no início do ano pela equipe
pedagógica e dá origem ao documento denominado Plano de Ação, composto por uma série
de metas, estratégias e ações que devem ser realizadas e alcançadas ao longo do ano letivo.
Nesse plano, as atividades que devem ser executadas por cada setor/categoria são expostas e,
por sua vez, devem ser consonantes aos documentos orientadores, ou seja, ao Programa Novo
Futuro, que pode ser definido a partir de Haydt (2011) como planejamento do sistema
educacional.
O Plano de Ação se enquadra no nível de planejamento escolar, que na perspectiva
de Haydt (2011, p. 71), constitui o programa de atividades gerais da escola e refere-se ao
“processo de tomada de decisão quanto aos objetivos a serem atingidos e a previsão das
ações, tanto pedagógicas como administrativas que devem ser executadas por toda a equipe
escolar”. A autora salienta que estes, devem ser produzidos com participação efetiva da
comunidade escolar.
Outro tipo de planejamento que sobressaiu durante algumas das entrevistas foi o
plano de aula. Considerado como um importante instrumento do fazer pedagógico, a
coordenadora assegura que
Nós exigimos planejamento, é inadmissível um professor que vai para a sala de aula
sem fazer um planejamento. Não que o planejamento tenha que ser algo rígido,
aquilo que está ali, pelo contrário, a gente sabe que o planejamento é um elemento
vivo, que ele está sujeito a mudanças constantes, mas ele tem que fazer esse
planejamento bem elaborado. (COORDENADORA, 2018, p. 11).

A importância do plano de aula observada na fala, principalmente, quando o define


como um “elemento vivo”, ou seja, passível de mudanças e reformulações nos remete ao
pensamento de Libâneo (2013), do qual congregamos, que a tarefa de preparar as aulas é
indispensável, com o objetivo não apenas de orientar e direcionar o trabalho do professor, mas
também de permitir reflexões, revisões, e aperfeiçoamentos da ação docente.
As narrativas evidenciaram que há grande cobrança por parte da coordenação e
gestão, no sentido de controle e execução dos planejamentos elaborados. Observamos que a
escola em si, é toda cerceada por planejamentos e planos que orientam todas as atividades.
Nesse sentido, toda a equipe escolar (professores, coordenadores, militares, secretárias) possui
suas rotinas planejadas com objetivos e metas estabelecidas.
100

Para o acompanhamento de tudo que é proposto e definido, para organização de cada


um perante as infinidades de tarefas, há um instrumento pessoal que é o mapa de atividades.
Também é um instrumento de controle da rotina diária. Um dos professores nos mostrando
seu mapa indica nele os dias que tem aula, os dias que não tem. O mesmo indica os horários
das reuniões com gestão, coordenação e o horário para o estudo. Ele ressalta que “tem que ter
pelo menos cinco espaços de estudos meus e de planejamento” (PROFESSOR 2, 2018, p. 12).
Cada professor possui seu mapa de atividades26 afixado no mural da sala de
professores (todos os outros funcionários também possuem esse mapa que é afixado em locais
mais pertinentes à sua função) o que permite ao Gestor acompanhar “efetivamente o
cumprimento de carga horária do professor, mapa de atividade de toda equipe” (GESTOR,
2018, p 6).
Chama atenção que o mapa de atividades é percebido pelo Professor 2 (2018, p. 12)
como um elemento que torna a rotina escolar quase uma empresa, “esse instrumento faz parte
do tempo integral, mas é bem indústria, não tem horário vago, vamos dizer assim, tem que
cumprir todos horários”.
Para nós a ideia do mapa de atividades é a de um certo tipo de controle que, ao que
parece, tem duas interpretações: controle positivo no sentido de organização, de garantir as
condições de tempo, estudo, reflexão e vimos na narrativa do professor e outro de controle
supervisão, ou seja, a vigilância, checagem de que tudo está em ordem, essa visão mais visível
na fala do Gestor (2018, p. 7) quando afirma “acompanhamos efetivamente o cumprimento de
carga horária do professor, mapa de atividade de toda equipe”.
Para Professor 2, o colégio tem alcançado metas e objetivos estabelecidos nos
planos, sucesso que está atrelado ao fato de que o planejamento
Não fica só no papel, plano de ação por exemplo, nosso plano de ação, plano anual,
baseado no PPP, a gente pega lá e não engaveta, a gente tem tal coisa para perseguir,
a gente tem que alcançar essa meta essa e essa, por exemplo, tem que reduzir as
notas vermelhas a cada bimestre, então a gente vai fazer ações em cada disciplina
para reduzir. O que eu vou fazer na minha disciplina para atingir essa ação, então a
gente está junto, vamos dizer assim, no tempo integral nós ficamos muito junto para
atingir as metas, e aí, quem não está dentro, está fora. Por exemplo, o regimento,
eles têm que aplicar, tem que funcionar, as nossas aulas, tem que funcionar, tem que
dar a melhor aula que você pode, porque senão, está fora, isso era, já era no tempo
integral, foi por isso que eu vim para cá, era uma cobrança muito grande nesse
sentido, mas as coisas funcionam de verdade (PROFESSOR 2, 2018, P. 15).

26
Quanto ao mapa dos professores, não tivemos acesso à uma cópia do mesmo, contudo, os dos militares foram
prontamente disponibilizados a nós quando solicitados. No geral, são documentos bem sistematizados e
detalhados com o intuito de ordenamento e controle da rotina da equipe escolar. Prevê as reuniões; momentos
coletivos; momentos disponibilizados para elaborar o plano de aula e provas; momentos de estudos; formações e
demais rotinas previstas no plano anual e no plano de ação do colégio.
101

Por meio dessa narrativa, podemos afirmar que há uma cobrança muito grande por
parte da gestão pela consecução dos objetivos estabelecidos, de certa forma, todas as
atividades desenvolvidas pelos professores são supervisionadas e fiscalizadas. Assim, temos
que a figura dos militares na gestão, pode promover um sentimento de autoridade e
subordinação por parte dos professores.
Outro ponto importante salientado ela coordenadora é a realização das reuniões da
equipe gestora que ocorrem semanalmente,
Nós sentamos toda a equipe gestora e discutimos a escola, em que nível? De recurso
didático, de material didático, de professor que está faltando, quando não tem
professor de determinada disciplina, do lanche, a gente discute toda escola, e
naquela reunião a gente faz os encaminhamentos para a semana, então assim, é uma
semana que começa de modo mais organizada, a gente já começa sabendo o que
precisa organizar nessa escola. Então isso dinamiza demais a escola, você já começa
com uma semana organizada, você fala olha preciso trabalhar nisso, nisso e nesse
ponto, é assim, algo muito interessante. (COORDENADORA, 2018, p. 4).

Notamos o empenho de toda equipe de planejar as suas atividades e rotinas.


Certamente a dinâmica do tempo integral possibilita ao professor a disponibilidade de tempos
e espaços para esse tipo de atividade o que, com certeza, promove a melhoria do processo de
ensino/aprendizagem.
Sumarizando avaliamos que para a equipe pedagógica do Colégio Polivalente, o
planejamento é um elemento de extrema importância no desenvolvimento da atividade
pedagógica e que, este deve ser bem elaborado e executado. Observamos também, que há uma
vigilância constante por parte da gestão pelo cumprimento do que foi estabelecido. Nesses
termos, entendemos que a equipe atribui que o colégio tem obtido bons resultados (numéricos
e mensuráveis), justamente pela eficiência desse instrumento e pela vigilância sobre o
cumprimento dos objetivos e metas estabelecidos.

2.2.2. A organização curricular

Conforme elucidado no capítulo anterior, a construção do currículo do Colégio


Polivalente se dá com base na proposta pedagógica do Programa Novo Futuro. Como
observamos no PPP (2017, p. 19) a organização curricular prioriza os conteúdos que
contemplem “o conhecimento histórico-social acumulado e à melhor compreensão e
integração com a comunidade em que vivemos”. O crivo sobre os conteúdos é estabelecido
pelos documentos orientadores editados pela SEDUCE / Superintendência dos Centros de
Ensino em Período Integral, bem como pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN).
102

Quando indagada a nos falar sobre o currículo uma professora explica tão somente
que ele “Segue aí o programa do novo futuro do CEPI” (PROFESSOR 1, 2018, P. 6). A
objetividade da resposta assim como o distanciamento quanto a ela, nos pareceu um primeiro
sinal de que há pouca participação dos docentes na estruturação da mesma. Mas vimos
posteriormente que os professores parecem aprovar a forma como o currículo está organizado.
E um deles frisa que por possuir uma jornada escolar de dez horas há “um cuidado muito
grande por parte da coordenação pedagógica com o currículo(PROFESSOR 5, 2018, p. 1).
A organização curricular, a distribuição das disciplinas e atividades na dinâmica do
tempo integral se mostra um fator de preocupação para o coletivo profissional que sinalizam a
complexidade de encontrar um “equilíbrio” entre o NC e ND e ainda a preocupação com o
cansaço dos alunos submetidos a uma jornada diária de quase 10 horas.
Um dos professores evidenciou que há debates no interior da escola para avaliar
como tem sido essa organização curricular e se a disposição das aulas está causando cansaço
para os alunos. Ele nos conta que “existe um cuidado, existe um processo autocrítico nosso
constante para perceber esse aluno fica dez horas o tempo todo na escola. Então a gente tenta
bastante humanizar esse cotidiano aqui na escola” (PROFESSOR 5, 2018, p. 15).
A escolha do termo “humanizar” é entendida por nós como a consideração de que a
escola, ao contrário da empresa, produz pessoas e por isso não deveria seguir ipsis literisum
esquema insumo-produto.
A saída encontrada pela coordenação pedagógica e professores é mesclar as aulas do
Núcleo Comum e do Núcleo Diversificado27. A coordenadora explica como isso é realizado
dizendo que
Tenta mesclar momentos puxados, de uma aula mais teórica, com momentos mais
tranquilos, que é uma prática de laboratório, por exemplo, que eles vão para o
laboratório fazer experimentos. Não deixa de ser importante, mas é um momento
mais tranquilo. A gente tenta equilibrar isso para que esse menino não saia daqui
assim, exausto, eles saem muito cansados. Mas não saem exaustos, porque a gente
tenta mesclar, atividades mais teóricas, com atividades mais práticas.
(COORDENADORA, 2018, p. 13).

A dificuldade em concretizar essa lógica é explicitada quando ela conta que levam
Assim, duas semanas para construir, para conseguir construir horário. Porque é um
horário que distribui eletivas, práticas de laboratório, aulas de português, de
matemática... tenta mesclar tudo isso. E a gente trabalha eletivas, trabalha o PJ em
dias alternados para que eles tenham momentos de muito rigor teórico mesmo, mas
momentos que sejam mais relaxantes. (COORDENADORA, 2018, p. 13).

27
No capítulo anterior mostramos que a proposta da Escola da Escolha e do Programa Novo Futuro sugeria uma
organização curricular que cindia estes dois núcleos.
103

Duas análises podemos extrair dessa narrativa, a leitura de que os professores


possuem momentos de autonomia, que permite interferir e melhorar a rotina escolar e, por
outro lado, vemos a predominância de ênfase do NC na abordagem tradicional e, nos
momentos do ND a humanista.
Sobre a autonomia dos professores, foram raros os momentos em que realmente
identificamos práticas autônomas, no entanto, no excerto percebemos que a definição da
organização curricular é encadeada por momentos de reflexão e debates, sobre isso, Contreras
(2012) afirma que
A educação não pode ser determinada a partir de fora. São os próprios profissionais
do ensino que, em última instância, decidem a forma com que planejam suas aulas,
por meio dos quais as tentativas de influência externa são transformadas em práticas
que nem sempre têm muito a ver com a essência das mudanças pretendidas. [...]
somente é possível desenvolver práticas que tenham as qualidades do educativo a
partir da decisão e do julgamento autônomo dos que se responsabilizam realmente
por elas [...]. (CONTRERAS, 2012, p. 144)

Confluímos com as considerações desse autor sobre a importância do papel do


professor na construção e efetivação das práticas. No entanto, percebemos claramente o
afastamento do professor, tanto pela dinâmica do Programa Novo Futuro, bem como pela
rigidez e sistematização do sistema militar.
Quanto a evidência encontrada das abordagens pedagógicas, vemos as influências da
pedagogia tradicional tanto pelo apreço a transmissão de conteúdos, ao rigor como pela
centralidade do professor na condução do processo, predominante no NC e, também estão aí
pistas da presença de uma abordagem humanista e da escola nova na diretividade menos
irradiada dos professores, momentos mais descontraídos referentes, sobretudo, ao ND.
A definição de Mizukami (1986, p. 11), sobre a abordagem tradicional casa bem com
os dados produzidos “[...] é caracterizada pela concepção de educação como um produto, já
que os modelos a serem alcançados estão pré-estabelecidos, daí a ausência de ênfase no
processo. Trata-se, pois, da transmissão de ideias selecionadas e organizadas logicamente”.
Por sua vez, a abordagem humanista está centrada no aluno, que se desenvolve por
meio das relações interpessoais estabelecidas. Centra-se no “desenvolvimento da
personalidade do indivíduo, em seus processos de construção e organização pessoal da
realidade, e em suas capacidades de atuar, como pessoa integrada” (IBID., p. 38).
As narrativas evidenciam ainda que a organização curricular se submete à pressão
pela obtenção de resultados que além de mensurar o processo de ensino/aprendizagem de cada
aluno (a), também ateste a eficiência da escola nos exames nacionais como o ENEM a
eficiência da escola. Por isso, as aulas do NC seguem uma abordagem tradicional, com a
104

organização espacial da sala em filas (diferentemente do que propõe o Programa Novo Futuro
que recomenda a sala em formato “U”), o professor conduzindo as aulas (é ele o detentor do
saber) e os alunos preocupados em captar o maior o número de informações. Traços de uma
pedagogia conservadora cuja finalidade da educação, com base em Libâneo (2013, p. 63) “é a
moralidade, atingida através da instrução educativa. [...] a principal tarefa da instrução é
introduzir ideias corretas na mente dos alunos”. Nessa perspectiva, o ensino é compreendido
como transferência de conceitos do professor para o aluno, que devem compreender e,
posteriormente, reproduzir o conteúdo transmitido.
Essa concepção coaduna com a narrativa de uma aluna que nos esclarece que “o
professor é o mestre” e que com a militarização é mais esperado ainda que os professores
assumam uma postura mais centrada. A diferenciação desse professor também se dá pela
formação, pois busca-se aqueles professores, que possuam “um estudo maior, uma faculdade,
um mestrado, algumas coisas assim, para aumentar o nível de matéria de conteúdo da escola
mesmo”. (ALUNO 1, 2018, p. 4). Fica evidente que o objetivo da escola não é apenas a
formação moral, a formação do indivíduo que seja “exemplo”, mas também a aquisição de
conhecimentos científicos, esse é o foco, principalmente do núcleo comum - a transmissão de
conteúdos.
O contraponto a esse viés tradicional e conservador foi percebido nas narrativas, na
ênfase dada por parte dos professores à riqueza das disciplinas do núcleo diversificado que
são do gosto do alunado. Fazem menção ao modo como elas oferecem a possibilidade do
“protagonismo” e como atuam para atenuar o cansaço. Um dos professores defende esse
expediente alegando que “precisamos de momentos em que o aluno tenha eletiva ou
protagonismo ou projeto de vida que são disciplinas que fogem do convencional do núcleo
comum, porque ficar dez horas já é cansativo” (PROFESSOR 3, 2018, P. 6).
Outro ponto na compreensão dos professores é que as disciplinas do núcleo
diversificado estão mais direcionadas ao preparo dos alunos para o mundo,
preponderantemente, o mundo do trabalho. As disciplinas do núcleo comum seguem os livros
didáticos encaminhado pela SEE às escolas estaduais, e concentra as disciplinas: língua
portuguesa, artes, educação física, língua estrangeira moderna inglês, língua estrangeira
moderna espanhol, matemática, física, química, biologia, história, geografia, filosofia e
sociologia. Por tratar-se de um colégio de tempo integral, a carga horária destas são maiores
do que em escola de jornada parcial.
Por sua vez, o núcleo diversificado, abrange as seguintes disciplinas: práticas de
laboratório, avaliação semanal, preparação pós-médio, estudo orientado, eletivas, projeto de
105

vida e prática curricular I e II (protagonismo juvenil). A tabela 3 apresenta a matriz curricular


para o Ensino Médio dos CEPI’s.
Tabela 3: Matriz Curricular para o Ensino Médio
ÁREA DE CONHECIMENTO COMPONENTES Carga horária total
CURRICULARES para o Ensino Médio

Núcleo Comum Linguagens, códigos e suas Língua Portuguesa 600


tecnologias Arte 120
Educação Física 240
Ling. est. ModInglês 240
Ling. est. mod Espanhol 200
Matemática e suas tecnologias Matemática 600
Ciências da Natureza e suas Física 360
tecnologias Quimica 360
Biologia 360
Ciências humanas e suas História 240
tecnologias Geografia 240
Filosofia 120
Sociologia 120
Núcleo Diversificado Práticas de Laboratório 160
Avaliação semanal 240
Preparação Pós-Médio 280
Estudo Orientado 280
Projeto de Vida 160
Eletiva I 120
Eletiva II 120
Protagonismo Juvenil 240
Fonte: Documento do Colégio (organizado pela autora)

A tabela acima apresenta a matriz curricular do Colégio Polivalente. Vale ressaltar


que a carga horária anual de algumas disciplinas varia conforme a série que o aluno se
encontra. Quanto à disciplina “Preparação Pós-Médio” ela consta no currículo apenas a partir
do 2º ano.
Consideramos que tem se consolidado a leitura dos professores no sentido de que as
aulas do núcleo diversificado são momentos em que os alunos “descansam” das aulas de
conhecimentos científicos. Apesar de considerarem a importância dessas aulas para o
desenvolvimento dos alunos, ainda tendem a supervalorizar o núcleo comum e menosprezar o
núcleo diversificado. Uma leitura que pouco ultrapassa a questão da cisão teoria x prática e
que mantém a ideia da hierarquização dos conteúdos.
Com base nas narrativas, na observação realizada durante a pesquisa de campo e na
análise dos documentos, podemos afirmar que as disciplinas do NC, seguem o padrão de aulas
da pedagogia tradicional onde o professor é o detentor do saber e os alunos são os receptores e
as aulas do núcleo diversificado se inspiram na pedagogia da escola nova, com menor
diretividade do professor e protagonismo dos alunos.
106

Em síntese, à organização curricular do Colégio Polivalente pouco foge do aspecto


pré-determinado imposto pelo Programa Novo Futuro, pela Escola da Escolhae nos padrões
do regimento militar. A subversão está na mescla dos conteúdos dos núcleos (muito mais
justificada pelo cansaço dos alunos que por escolha pedagógica ainda que o cansaço de fato
interfira negativamente na aprendizagem) mas que contempla uma diversificação que atende
às necessidades de um período da vida que a adolescência e que inclusive dialoga e produz
espaços de reflexão.
E mesmo o ND segue as orientações para o desenvolvimento de suas disciplinas, ou
seja, o que trabalhar, como trabalhar, que materiais utilizar, enfim, direciona em detalhes o
trabalho do professor que de posse do “comando” ultrapassa a condição de ser um mero
executor das intencionalidades dos programas em questão.
Com base no que Contreras (2012, p. 41) diz sobre a autonomia dos professores, é
possível afirmar que os docentes do Colégio Polivalente, reproduzem a “racionalização
tecnológica do ensino”, visto que a função docente tem sido “reduzida ao cumprimento de
prescrições externamente determinadas”. Para o autor,
A determinação cada vez mais detalhada do currículo a ser adotado nas escolas, a
extensão de todo tipo de técnicas de diagnóstico e avaliação dos alunos, a
transformação dos processos de ensino em microtécnicas dirigidas à consecução de
aprendizagens concretas perfeitamente estipuladas e definidas de antemão, as
técnicas de modificação de comportamento, dirigidas fundamentalmente ao controle
disciplinar dos alunos, toda a tecnologia de determinação de objetivos operativos ou
finais, projetos curriculares nos quais se estipula perfeitamente tudo o que deve fazer
o professor passo a passo ou, em sua carência, os textos e manuais didáticos que
enumerem o repertorio de atividades que professores e alunos devem fazer.
(CONTRERAS, 2012, p. 41).

Dessa forma avaliamos que os documentos orientadores, mais do que simplesmente


organizar o processo educativo privam do docente a possibilidade de buscar novas técnicas e
novas maneiras do fazer pedagógico. Ao mesmo tempo isso se revela uma estratégia derivada
da preocupação com a grandiosidade do projeto que objetiva a formação integral do
educando.
A cisão entre o NC e o ND soa como se os alunos pudessem ser submetidos a
algumas disciplinas e atividades que contribuíssem ao aprimoramento do “ser racional” e a
outras mais próprias a formação “ser emocional”. Uma cisão alimentada deveras pela
modernidade.
Embora tenhamos escutado de um professor que algumas disciplinas do núcleo
diversificado aprofundem conteúdos do núcleo obrigatório a maioria das narrativas ressalta a
separação. Assim, a organização curricular do colégio pode ser entendida na lógica de haver
107

uma parte que trabalha o intelecto (NC) para as seleções como o ENEM e outra que prepara
para a vida e para a sociedade que segue a ordem do trabalho(ND).
O NC atrelado a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) tem conteúdos
estabelecidos, e percebemos que o professor possui cada vez menos alguma autonomia para
construir e planejar suas aulas. Seria no ND que teriam mais liberdade para a construção de
suas aulas, desenvolver projetos, ou seja, atuar com maior autonomia.Todavia percebemos
que isso não ocorre ao buscarmos a compreensão do funcionamento desse núcleo cujo eixo é
o projeto de vida (PV), uma das disciplinas de maior prestígio dentro do ND.
O PV é compreendido como a disciplina que realiza a projeção para o futuro com
vistas a um rigoroso planejamento de fazeres, estudos e posturas a serem adquiridos. O
auxílio na construção dos projetos futuros, fundamentado em uma espécie de plano de carreira
é a racionalização do que precisa ser realizado, mudado e estruturado para sua efetivação.
Observamos o projeto de vida como um momento de interação entre os jovens e o
professor no qual estão presentes diversas formas de aconselhamento, análise das projeções e
possibilidades e partilhas de experiências. Há assim a visualização do que Velho (1999, p. 28)
chama de campo de possibilidades que “trata do que é dado com as alternativas construídas do
processo sócio histórico e com o potencial interpretativo do mundo simbólico da cultura”.
Através desse campo, torna-se possível a construção de um projeto que em “nível individual
lida com a performance, as explorações, o desempenho e as opções, ancoradas na avaliação e
definição da realidade”.
Por seu caráter de projeção futura é para o Gestor (2018, p. 10), o espaço relacionado
a construção dos “sonhos” que funciona da seguinte forma segundo ele: “No primeiro ano
para entender o quê que eu sou, quem sou eu? Para onde eu vou? Segundo ano, ter essa
construção do para onde que eu vou. E no terceiro ano a execução própria do projeto de vida
dele”.
Fica reforçada a nossa avaliação de que o projeto se delineia amparado
fundamentalmente na perspectiva da profissão como notamos na fala do gestor explicando
que o PV se baseia
Na intenção de vida futura desse aluno, ao ser considerado qual o caminho que o
aluno quer seguir (profissão). Questões como “o preço a se pagar é tal”. O preço,
quando eu falo isso é o tempo, o investimento emocional e cultural para conseguir
aquele projeto ou não. Se ele virar: - Não, não quero nada disso, meu projeto é outro,
é outra vertente...respeitado, tranquilo. Isso aí é um sonho do indivíduo, então, o
sonho é dele”. (IBID).
108

Com o esboço do projeto de vida mais ou menos constituído os educadores se


desdobram para fortalecê-lo incentivando e auxiliando os alunos (as) nas decisões em prol de
sua efetivação. Seguem o “Plano de Ensino” que também já vem pronto, ou seja, são
executores da proposta. É a coordenadora quem nos descreve detalhadamente o cronograma
dessa “disciplina”.
O projeto de vida ele se pauta em que, que esses jovens se descubram. E a sequência
didática desse projeto de vida é: quem sou eu? Ele precisa se conhecer, e é um
trabalho feito no espelho, eu vou desenhar, vou fazer meu autorretrato, quem sou eu
a partir dos meus sentimentos, vou ilustrar isso, então é uma sequência didática
Professor autoconhecimento. Depois que ele se conhece, vem o eu no lugar, ou nos
lugares, eu na escola eu na minha casa, no lugar da religião, se ele participa de uma
religião... nos lugares onde eles estão. E essas aulas...elas são muito boas porque, até
a gente que trabalha com elas se descobre. Porque quando você faz essas perguntas
para eles, nós perguntamos, quem sou eu? Onde é que eu estou? Qual que é meu
papel nisso aqui? (COORDENADORA, 2018, p. 5).

Vimos no excerto acima a preocupação da formação em dois movimentos próprios


da construção moderna do sujeito. Uma primeira, dele consigo mesmo e outra, sobre o lugar
que ele ocupa na sociedade, a preocupação em se fazer aos olhos do outro.
Outro professor explica a sequência do PV (sempre chamado de disciplina)
ressaltando o papel da felicidade nas escolhas dizendo
Na disciplina de projeto de vida, em um ano, primeiro ano ele vai ver quem sou eu?
Trabalhar isso, quem sou eu? Para saber, no segundo ano, onde eu quero chegar? O
que me faz mais feliz, para eu conseguir chegar, atingir a, os meus sonhos, as
minhas metas. E no terceiro ano, para ele aplicar esses, isso que ele traçou como
projeto. (PROFESSOR 2, 2018, p. 4).

Não negamos, a importância de se trabalhar com questões de identidade, de


autoconhecimento, de convívio social, bem como, a própria intencionalidade de se projetar o
futuro. Contudo, acreditamos que o viés assumido pela instituição tem adotado uma noção
ideologicamente conservadora do futuro, ou seja, os processos não são realizados a partir da
concepção que temos, da educação enquanto instância transformadora das relações, mas do
entendimento da educação como uma preparação para a adequação ao que está posto.
Coloca-se como problema a relação entre projetos individuais e os círculos sociais
em que o agente se inclui ou participa. A ideia central é que, primeiramente,
reconhece-se não existir um projeto individual “puro”, sem referência ao outro ou ao
social. Os projetos são elaborados e construídos em função de experiências
socioculturais, de um código, de vivencias e interações interpretadas. [...] O
problema é saber se o resultado obtido corresponde ao que os indivíduos, em pauta,
realmente projetaram. Também é verdade que sempre haverá um gap entre uma
ação que pode ser observada e descrita, registrada, e o que se passou ou passa na
mente dos atores. (VELHO, 2008, p. 28)
109

A análise a partir de Velho (2008) permite afirmar que o Projeto de Vida do Colégio
Polivalente, em certo grau, já tem traçado (a partir do documento) o futuro a ser projetado por
esses alunos, ou seja, já tem estabelecido o que se deseja formar (um indivíduo cívico,
disciplinado e, um líder à serviço do mercado).
Em nossa análise o PV tornou-se um projeto de carreira, pois auxilia os alunos a
escolherem “seu futuro” e esse julgamento é reforçado pela fala da coordenadora que
esclarece:
Nós construímos o projeto de vida junto com eles. “-Ai, eu quero ser médico”,então
a partir disso, você acha que quantas horas de estudo você precisa para conseguir
medicina? Porque medicina o ponto de corte é altíssimo, e as faculdades exigem um
nível altíssimo, então, você vai ter que se dedicar mais que alguém, por exemplo,
que não quer medicina, que quer um outro curso que o ponto de corte é menor.
(COORDENADORA, 2018, p. 5).

O que destacamos de fato é que,a maioria das narrativas apontou o projeto de vida
como um plano de carreira, ou seja, a construção projetiva de uma escolha e das estratégias
para efetivação de uma determinada condição que esse aluno quer assumir ao chegar no
mercado de trabalho. E vemos que não é uma projeção preocupada em arranjar um emprego,
mas de entrar no mercado de trabalho pelo expediente de ter uma profissão. Nem se considera
que esse aluno pode ter outras ambições, outros desejos, que não se relacionam apenas com
relação ao mercado, com relação à sua vida e seus ideais tampouco se considera que ele não
continuará seus estudos em um grau posterior que é o do ensino superior.
Entretanto, essa disciplina também possibilita que professor e aluno estabeleçam um
vínculo mais próximo, devido ao grau de trocas de experiências que ocorrem durante as aulas,
que conforme esclarece um professor “[...] fica muito latente as individualidades”
(PROFESSOR 5, 2018, P. 7). É nesse sentido que o Projeto de Vida atua, já que ao
construírem um relacionamento mais próximo com os alunos é possível diagnosticar e
reconhecer problemas que podem afetar o desempenho acadêmico e social dos educandos o
que comprometeria o bom andamento do PV.
Nenhum individuo, muito menos um grupo, por mais monolítico ou homogêneo que
seja, funciona apenas em um plano e/ou nível de realidade. Sua vida afetiva,
emocional, suas experiências diferenciadas, contatos com atores particulares,
estímulos variados, tudo isso concorrerá para a heterogeneização e ambiguidade de
sua visão de mundo e avaliação da “realizada”, que não é uma, mas são múltiplas a
partir dessa perspectiva. As interpretações e definições de “realidade(s)” e a
expressão de sua experiência se darão através de um repertório simbólico mais ou
menos amplo, diversificado mas com limites e articulações “fazendo sentido” de
maneira mais ou menos evidente em relação a uma cultura específica. (VELHO,
2008, p. 92-93).
110

Todavia, para realmente compreender como essa disciplina é organizada e de fato


quais as contribuições para a formação dos indivíduos, torna-se imperativo a realização de
pesquisas mais detalhada e com maior aprofundamento, o que não é nosso foco. Seguimos no
entendimento de outra disciplina importante na organização curricular, o protagonismo
juvenil que é tema recorrente nas entrevistas e assim como o PV um dos pontos cruciais de
defesa dessa proposta pedagógica.
Para todos os entrevistados, o colégio de tempo integral tem conseguido formar
jovens protagonistas, a partir dos espaços de formação propiciados no ambiente escolar.
Segundo Professor 1, (2018, p. 6), o Protagonismo Juvenil, disciplina oferecida em
duas aulas por semana, em que os alunos desenvolvem habilidades como “[...] liderança,
trabalho em equipe”é percebido como um momento em que os alunos tem de independência,
visto que não há presença de professores, os alunos se organizam e desenvolvem os chamados
clubes, “[...] ali eles montam o projeto do clube, eles tem uma, todo o planejamento do que
vai acontecer, eles passam para o coordenador do núcleo diversificado”,ou seja, os alunos
montam os clubes e desenvolvem um projeto de acordo com a afinidade e interesse dos
alunos.
Na narrativa de um professor percebemos o sentido de que estas práticas ampliam as
aprendizagens, as potencialidades, o protagonismo dos alunos. Os clubes juvenis são as
atividades mais favoráveis a esse desenvolvimento.
Então a gente tem os clubes juvenis, por exemplo, que os alunos tomam conta dos
clubes, ele dá aula para os outros alunos, eu tenho uma habilidade na música, então,
vou montar um clube de música, e quem quiser se inscrever, se inscreve, aí não tem
professor acompanhando, não tem coordenador, não tem diretor, é o aluno no espaço
com os outros alunos. (PROFESSOR 2, 2018, P. 5)

Houve ênfase também, na questão da dicotomia teoria/prática, segundo o professor,


“não é só prática, mas tem que trabalhar também a teoria”,nesse sentido, pode-se inferir que
para a professora, a execução dos clubes, sem a sistematização ou planejamento, não teria
resultado, visto que a teoria também deve ser abordada nesses momentos (IBID). Observamos
que na visão dos professores, o PJ é de extrema importância para o desenvolvimento do aluno,
visto que possibilita ao mesmo se organizar, planejar e produzir seu próprio conhecimento.
Vale ressaltar que essas práticas de vivência estão entrelaçadas com o protagonismo juvenil.
O professor explica que é necessário “fazer um projeto científico desse clube, com
metas, objetivo geral, específico”, ele alerta que em um primeiro momento “parecem espaços
de lazer”, mas, em sua opinião, o aluno “está exercitando justamente esse protagonismo já, ele
sabe fazer um projeto, ele sabe sistematizar as ideias dele”, além disso, desenvolve a
111

capacidade de “liderar os outros”. Enfim, ele avalia que “tem esse aspecto de liderança, e cada
um também tem uma responsabilidade dentro desse clube, quer dizer, a corresponsabilidade e
a participação de todos nesse processo de ensino/aprendizagem” (IBID, p. 4).
Um fator a se destacar é que a partir do momento que a escola passou a ser gerida
pelos militares, os alunos precisam do aval da gestão para desenvolver seus clubes, ou seja, há
claramente vigilância constante do tipo de clube e do tipo de proposta que devem ser
executadas na disciplina de Protagonismo Juvenil, consideramos então, que a liberdade dos
alunos é cerceada pela moral e ideais militares.
Aquela diferença, que antes era um colégio que tinha... ainda tem o protagonismo,
mas era um protagonismo feito pelos alunos, e muito liderado pelos alunos, e
quando implantou o militar, tem que ter todo aquele cuidado, aquela vivencia de não
passar por nenhuma regra, tomar cuidado com alguns clubes, alguns modos de agir.
(ALUNO 1, 2018, p. 2).

Vale lembrar que na perspectiva do programa Novo Futuro, o PJ busca incentivar o


educando a envolver-se em atividades, bem como desenvolver suas habilidades de iniciativa,
liberdade, liderança e trabalho em equipe.
Na visão do gestor, o protagonismo ainda possibilita aos alunos o desenvolvimento
“da autonomia, eles perceberem, terem suas frustrações, positivas ou negativas, e, a partir daí
superarem, resiliência, efetivamente, resiliência, paciência e continuar, para atingir seus
objetivos”.Um fato bastante curioso, foi que o gestor, durante as entrevistas e no decorrer das
observações, sempre buscou “demonstrar” que o modelo tem dado certo, mostrando fotos,
conversas em redes sociais e vídeos que evidenciam e comprovam suas colocações e reflexões
a respeito da proposta do colégio.
Sobre o desenvolvimento de práticas protagonistas no colégio um aluno destaca que
os “alunos protagonistas que são jovens que fazem a diferença dentro da comunidade escolar,
que se reúnem mesmo”, afirma que por parte desses alunos, existe uma “preocupação mesmo
de ir na sala, pelo menos a cada quinze dias, conversar”. ALUNO 1 (2018, P. 6). Além disso,
quando os professores verificam que uma sala “está mais dispersa, [...] está fazendo mais
bagunça”, antes mesmo de solicitarem a presença dos militares a aluna afirma que o professor
“chama um aluno do terceiro ano, que tem uma posição dentro da escola, que seja mais
conhecido, e tenha um conhecimento melhor do que está acontecendo” (IBID.). Então, caberá
a esse aluno protagonista tentar resolver essas questões, junto aos professores, coordenadores
e gestão.
A perspectiva do aluno também se alinha a do professor, para ele, nas práticas de
vivência prevalecem “um espírito de liderança, para aprender a viver em grupo também [...].
112

No caso é lidar com outros alunos. Que a gente lidera os próprios alunos... No caso a gente se
lidera, a gente se une a gente tem o trabalho coletivo”. (ALUNO 2, 2018, p. 7). O aluno
demonstra gostar dessa metodologia, e elucida a importância desse espírito de liderança para
sua formação. O encerramento desses grupos se dá por meio de um evento denominado
“Culminância”, em que os alunos organizam atividades culturais para apresentar os resultados
obtidos.
Além dos clubes, alguns alunos são incentivados a participar das reuniões de gestão e
apresentar suas demandas e/ou sugestão de melhorias, seja no aspecto estrutural,
metodológico, pedagógico ou até mesmo no próprio relacionamento entre alunos, professores
e militares. Nesse sentido, um dos professores destaca que o aluno “tem voz no conselho de
classe, ele tem voz na reunião de gestão”, ele afirma que os próprios alunos detectam falhas
no processo de ensino aprendizagem e, a partir da liderança exercida, eles podem “dar
sugestão de como resolver esses problemas”. (PROFESSOR2, 2018, p. 5)
Um dos alunos destaca sobre a proposta das práticas de vivência em protagonismo,
que em sua concepção “é dar voz aos alunos”, esclarece que os alunos possuem “os nossos
clubes, a gente tem nossas reuniões dentro da própria sala de aula, não precisa aceitar tudo
que o professor fala... A gente pode questionar... a gente pode ter voz”, em sua concepção
essa metodologia os prepara para “ter uma voz dentro da sociedade”, enfim, destaca que o
trabalho em conjunto dos alunos permite que se cheguem a um consenso que possibilita
“trazer melhorias, trabalhando todas as cabeças ao mesmo tempo”. (ALUNO 1, 2018, P. 12).
Ao longo de sua narrativa o Aluno 1, destacou alguns exemplos de intervenção dos
alunos nas decisões do colégio, ou mesmo a abertura que a gestão dá aos alunos para exporem
suas dificuldades, dúvidas e ideias para a resolução de problemas que surgem no ambiente
escolar.
É importante ponderar que a rotina de observação e contato informal com alunos,
professores e militares, nos possibilita afirmar que de forma muito sutil, a partir da
militarização, o comportamento dos alunos tem sido moldado conforme os ideais defendidos
pelos militares, ou seja, é muito perceptível, nos alunos que já estavam no colégio antes dele
se tornar militar, essa postura crítica perante as imposições e mudanças realizadas. Podemos
afirmar porque ouvimos mais de uma vez durante a pesquisa que o aluno que entra no colégio
necessariamente aceita se adaptar as normas estabelecidas e para aqueles que não o
conseguem ou serão convidados a se retirar ou sairão. Ou seja, a própria organização e os
padrões estabelecidos, já impõe limites no protagonismo e nessas práticas de vivências que
eram estabelecidas com maior liberdade antes da militarização.
113

Conforme alerta Gómez e Sacristán (1998)


O processo de socialização como reprodução da arbitrariedade cultural dominante e
preparação do aluno para o mundo do trabalho e para sua atividade como cidadão
não pode ser concebido como um processo linear, mecânico. Pelo contrário, é um
processo complexo e sutil marcado por profundas contradições e inevitáveis
resistências individuais e grupais. (GÓMEZ e SACRISTÁN, 1998, p. 25).

Inclusive, na leitura de um dos alunos que entrou no colégio quando este já era
militar, ela considera estas práticas são substituíveis. Afirma não gostar do protagonismo, que
em sua concepção “é uma coisa que as vezes funciona, as vezes não... depende, muito da
pessoa”,mas reflete e esclarece são boas, mas substituíveis. A percepção de que seriam algo
“dessa escola”, um ponto positivo do colégio.
Agora... o protagonismo juvenil na verdade é uma coisa da escola que eu acho que
podia trocar por estudo orientado. Mas, é uma coisa boa, porque como eu te falei, a
gente fica mais livre da rotina densa... e, ajuda a gente também, porque existem
vários clubes, porque... Por exemplo, o protagonismo juvenil é o PJ, não é? E tem o
clube de dança, que quem gosta de dança vai lá, então elas, uma ajuda a outra....
Tem o clube de estudo, que uma pessoa está ajudando a outra... o de esporte, então é
sempre uma pessoa ajudando a outra, isso faz a gente se unir mais, não ficar numa
competição de quem é melhor, quem não é uma coisa... outra coisa... um ponto
positivo do colégio. (ALUNO 3, 2018, P.7)

Parece que os próprios alunos percebem o Colégio Polivalente como um lugar que
não deve haver espaços para alvedrio, ou seja, entendemos que os alunos internalizam as
normas disciplinarizadoras e, em momentos com maior protagonismo e liberdade, se sintam
deslocados, pois a escola deve promover conhecimentos. Enfim, observamos que para esse
aluno, as aulas de protagonismo na realidade servem como uma válvula de escape, um
momento de descontração e descanso, para fugir da rotina pesada e exigente da escola.
Em um primeiro momento, podemos considerar que práticas de vivência, sobretudo,
àquelas que incentivam os alunos a participarem do processo decisório e de interferência no
ambiente escolar são de extrema importância para a sua formação crítica e para influência de
sua postura enquanto cidadãos que buscam a transformação social. No entanto, como o
pedagógico deste colégio, em si, já vem orientado por estratégias neoliberais e, sobretudo,
com a gestão militar, essa prática foi cerceada por limites estabelecidos pelos regimentos e
pela própria compreensão e percepção sobre o que é estudar em um colégio militar. O aluno
ao se prontificar a estudar nesse colégio, já abre mão de inúmeras subjetividades, sentimentos
e comportamentos para se adequar àquele ambiente. Então, concordamos com a visão
doAluno3, de que esses momentos, são agora, apenas subterfúgios para a rotina cansativa e
conteudista.
114

As disciplinas “práticas de laboratório28”, “preparação pós-médio”, “estudo


orientado” e as “eletivas” foram menos citadas nas narrativas.
A “preparação pós-médio” é originada no Programa Novo Futuro e não consta da
proposta da Escolha da Escolha. O Professor 1 (2018, p. 6) explica que nestas aulas, os
professores fazem orientações aos alunos sobre questões pertinentes ao ensino superior como
o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), o Programa Universidade Para todos
(PROUNI) e o Sistema de Seleção Unificada (SISU). Exemplificando, esclarece que em uma
aula de pós-médio de química, são trabalhados “os conteúdos que mais caem em química no
ENEM”e durante estas aulas, os professores irão “orientar, ensinar a ler a questão, a
interpretação, o conteúdo. Ajudar eles a responder, resolver questões, já direcionadas
Professor Enem ou para vestibulares”.
É o mesmo sentido que encontramos nas narrativas de uma aluna. Para ela os
professores têm uma preocupação em trazer para a aula “questões de vestibulares, de prova de
ENEM, questões que eles resolvem junto com a gente, explicando o conteúdo através das
questões”. (ALUNO 1, 2018, P.4). Fica evidente que a disciplina se alinha completamente à
lógica da Escola da Escolha ainda que tenha surgido no Programa Novo Futuro. O que
confirma o interesse em preparar esses indivíduos para as avaliações nacionais e o ingresso no
Ensino Superior.
Em relação às disciplinas eletivas, descobrimos que elas são propostas pelos
professores que devem elaborar uma ementa e disponibilizá-la aos alunos, para que estes
avaliem e decidam qual delas cursar. Para isso, é realizada uma reunião geral com o corpo
docente e discente para a seleção das eletivas a serem ofertadas. Nesse momento, os alunos
podem escolher e se “cadastrar” naquela de seu interesse.
As narrativas valorizam a diversidade do roll de eletivas como vemos exemplo na
fala do Professor 5 (2018, p. 13) ao narrar sobre uma eletiva de sociologia que havia ofertado
anteriormente.Dentre as atividades realizadas na disciplina o destaque foram as exposições
artísticas nas quais, segundo o professor “os alunos foram as esculturas. Uma escultura
apresentava o feminismo a outra representava o racismo a outra representava os padrões de
beleza e a outra representava o movimento LGBT”.

28
As “Práticas de laboratório” foram introduzidas no currículo pelo Programa Novo Futuro. Durante o período
que desenvolvemos a pesquisa de campo, o laboratório encontrava-se desativado para a realização de uma
reforma no pavilhão que futuramente abrigaria os alunos do Ensino Fundamental. Sendo assim, o material do
laboratório foi acondicionado na sala da coordenação pedagógica, e a utilização desse espaço foi suspensa até o
término da reforma.
115

Outra eletiva por ele destacada foi a de dança contemporânea oferecida


concomitantemente a eletiva militar e vinha
Falando sobre movimentos subversivos da lógica estatal. Porque na verdade são
movimentos que precisavam, por exemplo, historicamente desrespeitar a figura da
polícia para existirem. Então na verdade ao mesmo tempo em que, nós temos esse
momento nós tivemos a eletiva militar, onde alunos que se identificam iam para essa
eletiva e faziam um complexo militar (IBID.).

Sobre a eletiva militar, o professor militar nos oferece sua explicação e demonstra
que em primeiro lugar, ela é altamente valorizada, “Os alunos se inscrevem voluntariamente,
quem quiser participar da eletiva militar, participa... E quase todo mundo quer participar...
Nós não obrigamos” (MILITAR, 2018, p. 13). Segundo: ela também não é “para qualquer
um”.
As vezes temos que tirar alunos que não estão com comportamento da maneira
exigida aqui do colégio. Que está faltando um pouquinho para ele se adequar ao
nosso sistema, e ele quer participar... quer fazer flexão, quer correr... quer fazer
barra! E a gente fala... “Não! Quando você atingir, nota, a nota ideal, aqui do
colégio, o comportamento ideal, você vai participar da eletiva... Da maneira que
você está você não vai participar”. É até interessante? Uma coisa que todo mundo
tinha medo, antes de entrar aqui, eles querem fazer? Que é a eletiva militar. (IBID.)

Terceiro, ela manifesta as marcas da cultura corporal militar e, novamente a ênfase


na valorização
Então ele quer correr, fazer flexão, abdominal.... Porque tem um momentinho desse,
que a gente faz com eles aqui. Faz a corrida aqui na cidade, também com eles... tudo
acompanhado dos militares. E eles adoram! Adoram, e se você for lá hoje, tem trinta
e nove, se não me engano, trinta e nove alunos lá.... Se você perguntar se.... que vai
tirar algum de lá briga.... Eles não querem sair.... Eles gostam, querem. (IBID.)

E quarto (e isso é marca da fala do entrevistado), surpreendentemente ela tem alunos


“tanto homem, quanto mulher... Está meio a meio... eles gostam” (MILITAR, 2018, p. 13), ou
seja, a ênfase de que é aberta a todos, homens e mulheres.
Podemos então presumir que essa eletiva reproduz uma Academia Militar e, pela fala
do militar, os alunos se sentem confortáveis e satisfeitos em praticarem estas atividades. Pela
fala há uma grande procura por ela como se complementasse a formação na “cultura militar”.
Cabe aqui uma interrogação, para que os alunos possam permanecer nessa eletiva, eles
precisam se “adequar ao nosso sistema”, ou seja, precisam ter o comportamento ideal, essa
adequação também é garantida às outras disciplinas? Ou, assim como os Colégios Militares
possuem suas regras específicas que não se estendem as outras escolas públicas, também a
eletiva militar tem suas prerrogativas e “vantagens”?

2.2.3. Métodos de ensino


116

De acordo com Libâneo (2013, p. 165), o método pode ser definido como o
“caminho para atingir um objetivo”. O autor avalia ainda que ao conduzir o processo de
aprendizagem dos alunos, o professor “utiliza intencionalmente um conjunto de ações, passos,
condições externas e procedimentos”, pelo qual, ele denomina métodos de ensino.
Sobre esse assunto, a coordenadora ao tentar definir o método de ensino utilizado
pelos professores reflete:
Eu não consigo te elencar um método, porque nós temos vários, as vezes a gente
trabalha o tradicional, que é sentar e fazer as vezes o menino, isso vai atrapalhar, é
aquele menino que vai sentar e decorar a tabuada, outra hora a gente vai construir
essa tabuada através de um jogo, então a gente tenta transitar por diversos métodos e
metodologias, para que não fique só uma coisa. (COORDENADORA, 2018, p. 6)

Voltando sua narrativa para os métodos no colégio como um todo ela continua
Eu não vou conseguir te falar assim, a gente trabalha com o construtivismo, com o
método tradicional, não, nós trabalhamos com todos, a gente vai adequando aquele
que acha que vai ser mais viável, viemos desse, nesse caminho depois a gente
percebeu que não dá certo, então a gente faz a correção de rota bem rápido e vamos
para outro caminho, não consigo te falar um em específico. Mas assim, a gente tem
que buscar vários, tem hora que, senta e faz tarefa sim, decora tabuada, sim, tem o
professor que acha que é essencial ter a tabuada decorada, ao pé da letra, mas tem
outro professor que fala - Não eu posso pregar ela na parede, posso construir, ele de
uma outra forma. E é isso que a gente vai, vai tentando adequar. [...],mas são as
diversas formas que a gente vai buscando para achar o caminho. (IBID.)

Essa narrativa coaduna com as observações que fizemos durante a pesquisa de


campo, pois vários foram os momentos de observação em que nos deparamos com os
professores promovendo aulas ao ar livre, debates, assistindo e discutindo filmes. Em um dos
relatos do Diário de Campo do dia 06/02/2018, descrevemos uma das aulas que assistimos da
disciplina de Filosofia cujo tema era “Moral e Ética” para uma turma de 3º ano. Nos pareceu
ser uma aula dinâmica e desafiadora. Com apresentação em Data show, o professor refletiu
com os alunos e os provocou a questionarem e compreenderem o sentido de moral e ética. Por
fim, foi passado um episódio da série “Black Mirror”, que representava um conflito moral e
ético dos personagens. O professor incentivava os alunos a realizarem questionamentos e
exporem suas opiniões sobre o assunto. Talvez, nesse dia, não tenha notado a intencionalidade
da coordenadora de nos encaminhar justamente para essa aula, acreditamos que sua intenção
era de demonstrar que os professores possuem autonomia e utilizam diferentes métodos e
procedimentos de ensino.
Mas consideramos que o procedimento expositivo (HAYTD, 2011) é o mais
utilizado pelos professores. Na narrativa de uma das alunas, fica evidente a postura que o
117

professor assume como exposição do conteúdo, no entanto, esse processo não ocorre de forma
passiva, ou seja, o aluno participa do processo de ensino/aprendizagem e possui abertura para
questionamentos, opiniões e debates com o professor sobre o tema proposto, método este que
pode ser denominado como exposição aberta ou dialogada, em que
O aluno desempenha um papel mais ativo, pois participa da exposição do professor,
fazendo comentários, relatando fatos, dando exemplos, argumentando, expondo suas
dúvidas e respondendo perguntas. A aula expositiva, quando dialogada, favorece a
participação dos alunos e estimula sua atividade reflexiva. (HAYTD, 2011, p. 115).

Um dos alunos destaca a iniciativa do professor de redação e filosofia de realizar um


“café filosófico”. Conta que “trouxeram um juiz, trouxeram um escritor, para conversar
dentro da escola. Eles trazem coisas novas, uma coisa para variar a dinâmica da escola para
não ficar tão cansativo” (ALUNO 1, 2018). Ao acompanhar as redes sociais do Colégio,
também tivemos acesso ao acervo de fotos que comprovava a desse aluno, bem como ainda
demonstrava outros inúmeros eventos, passeios e dinâmicas utilizadas pelos professores tanto
no ambiente escolar como em ambientes externos.
A diversificação dos métodos incorre na melhoria da aprendizagem e conforme
Libâneo (2013, p. 168) existe uma multiplicidade de métodos de ensino que para serem
selecionados devem considerar os “conteúdos da disciplina, das situações didáticas
específicas e das características socioculturais e de desenvolvimento mental dos alunos”.
Para além da diversificação dos métodos de ensino, definido por Haydt (2011, p.
112) como o conjunto sistematizado de procedimentos didáticos que conduz a aprendizagem
dos alunos, com o intuito de atender aos objetivos propostos. A autora ainda alerta que os
procedimentos devem ser variados para favorecer a compreensão, assimilação e construção do
conhecimento pelo aluno. Três atividades são bastante utilizadas como metodologias de
ensino inovadoras: o estudo orientado, o acolhimento e a tutoria.
Vimos que o estudo orientado se refere ao momento disponibilizado aos estudantes
para que este desenvolva seu autodidatismo, suas habilidades de leitura, síntese, bem como,
que ele construa técnicas e métodos de estudo, dentre outras habilidades. Embora suas
orientações guiam para o caminho do desenvolvimento de hábitos de estudo, o que ficou
evidente pelas narrativas é que o estudo orientado no Colégio Polivalente, não possui esse
caráter de autodidatismo, na verdade, torna-se um momento para a realização de tarefas de
casa e de estudos complementares das atividades realizadas em sala de aula, um dos alunos
alega que “como a gente fica o dia inteiro, a gente tem o período para a gente fazer as
tarefas”, (Aluno 1, 2018, p. 8). Outro aluno acrescenta que esse tempo é disponibilizado “pra
118

gente fazer tarefa... porque se a gente chegar em casa, e tiver mais muito exercício pra poder
fazer, aí ninguém consegue”. (ALUNO 3, 2018, p. 3).
Por sua vez, o Aluno 1, também salienta o fato de que nessas aulas os professorem
ensinam “a fazer fichamentos, resumos, para você estudar”, no entanto, o que predomina
mesmo nessas aulas é a disponibilidade para realizarem as tarefas. Novamente, um paliativo
para fugir da rotina cansativa do período integral.
A Tutoria é uma prática educativa executada em encontros semanais com a presença
dos professores tutores e seus respectivos alunos. O professor explica que os alunos
“escolhem um professor, um funcionário que eles têm confiança”, a esse tutor, cabe “ajudar
eles, nos problemas acadêmicos que eles têm, dentro da escola, e até mesmo, problemas
pessoais, que eles trazem de casa e que podem vir a atrapalhar a aprendizagem deles aqui”
(PROFESSOR 1, 2018, p. 6).
Essa concepção de tutoria é avaliada por Lourenço (2012, p. 32) como “uma ação de
ajuda ou orientação ao aluno que o professor poderá realizar além da sua ação docente e que
tenderá a promover o desenvolvimento holístico do aluno”. Acrescenta ainda que o papel
desempenhado pelo tutor é determinante para o projeto educativo, isso porque “os seus
objetivos se deverão nortear pela estimulação das capacidades e processos de pensamento,
tomada de decisões e resolução de problemas do tutelado.
No colégio, a tutoria se associa a “projeto de vida” de modo que o professor tutor
“vai trabalhar com esse aluno [...] para que o sonho, o projeto de vida daquele aluno se
construa” (COORDENADORA, 2018, p. 5).
A função dos tutores abre dois leques de possibilidades, de um lado, pode ser
encarada como uma ajuda, ou seja, o tutor vai auxiliar no desenvolvimento do projeto de vida,
com relação à organização dos estudos e das rotinas, por outro, como supervisão, em que o
tutor se porta como um direcionador e supervisor dos estudos e dos resultados obtidos. As
narrativas demonstram esse fato,
Vamos dar um exemplo assim, eu percebo que umas estão com dificuldade na área
de matemática, então eu vou perguntar o que está acontecendo? Não está estudando
em casa? Qual que é a sua dificuldade? É, orientar eles no estudo.... Tem um que
quer fazer engenharia, que eu vou orientar, qual as faculdades que tem? Qual o curso
que você quer? O que você está fazendo em casa? Está estudando para você atingir
seus objetivos? As suas notas, como é que está? - Ah eu estou com problema pessoal
que está me atrapalhando, eu estou com problema em casa -. Não é que eu vou virar
psicólogo, eu vou tentar orientar ele, você está com problema com sua mãe? - Então
você tem que sentar com a sua a mãe e conversar, e resolver, porque esse problema
na sua casa está afetando na escola. (PROFESSOR 1, 2018, p. 6).
119

Podemos observar que de maneira geral, essa tutoria tem sido compreendida como
um momento de interação entre professor e aluno, de forma que este aluno seja incentivado e
direcionado a buscar resultados mensuráveis. Sendo assim, se alinha bastante com o perfil
mercadológico, até mesmo com o vocabulário que o documento utiliza para definir essa
prática, “avaliando a eficiência de suas orientações” e “resolver problemas”.
Acreditamos que essa prática poderia ser utilizada para estabelecer um diálogo aberto
com os alunos, no sentido de orientação para com questões sociais, políticas e emocionais,
não apenas ser utilizado como a delimitação do caminho a ser seguido nos estudos.
Em nossa análise, tanto o projeto de vida como a tutoria trabalham em conjunto para
a formação daqueles chamados “líderes”, indivíduos com visão de futuro, preparados para
atuar no mercado de trabalho, objetivos, estratégicos, que foram treinados para trabalhar em
equipe e liderar suas equipes, que buscam sempre alcançar o objetivo da organização ou da
empresa em que atuam.
Conforme já abordado no capítulo anterior, o acolhimento é uma das metodologias
de êxito apresentada pelo manual “Escola da Escolha”, como uma prática educativa cujo
objetivo é promover a integração entre alunos veteranos e novatos, de forma que sejam
apresentados as premissas e os ideais da escola.
Estivemos no colégio na primeira semana de aula e vimos o acolhimento aos
novatos. De fato, são os veteranos que conduzem essa recepção e soubemos por alguns deles
que haviam antecipado suas férias para preparar materiais e dinâmicas para recepcionar os
novos colegas.
Sob as orientações de uma Líder Geral, cerca de 30 alunos veteranos se organizaram
em equipes e distribuíram aleatoriamente fitas que representavam as cores dos grupos que
deveriam ser formados. No pátio, a formação foi organizada pelos veteranos, sem
interferência dos militares (a não ser em pouquíssimas vezes em que o Gestor passou algumas
instruções para pais e alunos). Os veteranos ensinaram as posições e formação do “Pelotão”
antes, durante e após o hasteamento da bandeira, com a intenção de preparar os recém-
chegados para a participação no ritual que é realizado diariamente.
Depois os alunos foram encaminhados para as salas com seus respectivos líderes, e
lhes foram demonstrados outros ritos como a passagem da liderança de um líder para outro, a
apresentação da turma para os professores, as posições corporais “em forma”, “sentido”,
“descansar’. Rituais típicos do meio militar e que fazem parte da rotina diária desta
instituição. Após a instruções dos rituais militares, diversas atividades foram desenvolvidas
com os alunos, dinâmicas de apresentação, de integração, autoconhecimento e de cooperação,
120

enfim, foram realizadas diversas atividades com o objetivo de recepcionar os novos alunos e
dar início a construção do projeto de vida.
O relato do diário de campo do dia 22/01/2018 aborda as impressões gerais que
tivemos sobre o acolhimento. O momento foi marcado por diversos sentimentos, de medo e
angústia de um lado, e confiança e empolgação de outro. Principalmente nos momentos
iniciais, alguns alunos novatos se mostravam apreensivos, no entanto, com o desenrolar das
atividades, esse sentimento deu espaço ao aconchego. E, em contrapartida, a empolgação
inicial, também cedeu espaço ao tédio e ao desinteresse pelas atividades.
Chamou-nos atenção também a recorrência do uso pelos veteranos de palavras como
protagonismo, pró-atividade e projeto de vida. Estes buscavam sempre evidenciar que aquela
instituição era diferenciada por unir dois projetos importantes (tempo integral e militar).
Enfim, esse momento já propõe ao aluno novato um panorama sobre o funcionamento do
colégio e indica, grosso modo, que em um futuro próximo, também eles, poderão ser os
alunos líderes a organizarem a recepção de outras turmas, o que acreditamos gerar um
sentimento de participação de um todo social e pertencimento àquele ambiente.

2.2.4. Uso dos Recursos

Os recursos materiais disponibilizados aos professores para a condução do processo


de ensino e aprendizagem são importantes e no caso do Colégio Polivalente influem nos
métodos de ensino. Contribuem ou garantem a efetivação das aulas planejadas. Sobre este
ponto as narrativas indicaram que os professores possuem um suporte considerável, e podem
usufruir de uma gama de recursos metodológicos para o desenvolvimento de suas aulas o que
influencia no sentido de uma melhor participação, motivação e
consequentemente,aprendizagem.
Os professores utilizam os livros didáticos adotados pelas escolas públicas. Os
relatos das narrativas indicam que houve debates entre militares, professores e o conselho de
alunos para decidir qual seria o material escolhido. Além disso, a partir da fala de um dos
alunos, evidenciamos o uso frequente de Data show,
Os professores escolheram os livros didáticos, foi escolha dos professores, eles usam
slides para dar aula, então, a escola adquiriu Data show, caixa de som para facilitar
esse processo. Então cada sala tem seu Data show, sua caixinha de som, e tudo isso,
com a do recurso da associação de mestres e pais. Alguns a gente criou, grupos
dentro do WhatsApp, para os professores compartilham slides dentro desses grupos
e a gente compartilha para a escola inteira, o conteúdo, é, cada sala criou o seu e-
mail, então, eles também mandam conteúdo no e-mail. (ALUNO 1, 2018, P. 9)
121

Percebemos então, que professores e alunos buscam formas alternativas de


socialização de conteúdos e meios de ensino, isso tudo, facilitado pelo amplo acesso à meios
tecnológicos e pela gama de recursos didáticos disponibilizados no colégio.
Observamos a unanimidade das entrevistas destacarem que o Colégio Polivalente, no
que se refere à recursos didáticos é privilegiado perante as outras escolas públicas estaduais.
Um professor (civil) afirma que “tem quase tudo que eu preciso, quando não tem eu peço e
chega”. Notamos que esses materiais são disponibilizados aos professores conforme plano de
aula elaborado por cada professor, que define e lista os materiais a serem utilizados. E, com
muita facilidade, estes podem variar na escolha dos materiais, pois não há dificuldade para ser
providenciado.
Esse mesmo professor, ao refletir sobre as demais escolas que já trabalhou, afirma
que
Nenhuma escola tinha recurso, aqui tem, eu tinha lá, na outra escola material às
vezes muito velhos, eu que uso muitos espaços abertos, não tinha espaço com som,
não tinha quadra coberta, não tinha um pátio com uma árvore, uma sala de dança,
não tinha nada, mas aqui tem. Tem as multimídias também, livros, agora tem outros
projetos com a biblioteca, para aquisição de livros, livros infanto-juvenis, não é só
didático, eu acho que a gente tem um bom suporte, é, de material didático, a gente
tem um bom suporte aqui. (PROFESSOR 2, 2018, p. 12).

Pela narrativa, fica evidente que a realidade do Colégio Polivalente destoa da grande
maioria das escolas públicas, que muitas vezes sofrem com a burocracia para a compra de
materiais, bem como a falta de investimentos disponíveis para esses fins. Além disso, há
destaque pela infraestrutura física do colégio, que também permite ao professor, propor
dinâmicas diferenciadas durantes suas aulas, por ter diversos espaços para exercer a prática
pedagógica.
Na análise do Professor 5 (2018, p. 13) o colégio é “se comparado à outras escolas,
um paraíso!”. E a despeito de mencionar que existem ainda problemas como a falta de
laboratório de informática, ou mesmo de um lugar apropriado para que os alunos descansem
no intervalo de almoço, há, por exemplo, multimídia em todas as salas que também são
climatizadas. Percebemos mais sobre os recursos e como o colégio se diferencia neste quesito
quando vemos o excerto
Então na verdade as condições materiais, por exemplo, uma eletiva para ela
funcionar, tiveram que gastar quase seis mil o ano passado. Para garantir que nós
materializássemos as danças, as artes que nós produzimos, porque nós produzimos
muita arte o ano passado nessa escola. Ou seja, são condições materiais que
nenhuma outra escola permite. Então na verdade, as condições materiais se
comparadas com as condições das outras escolas do Estado são excelentes e talvez
seja essa uma das grandes premissas para se tentar defender as escolas militares do
Estado de Goiás. Porque com a existência da associação você acaba possibilitando
122

uma qualidade melhor em relação aos materiais para se trabalhar (PROFESSOR 5,


2018, p. 13).

O professor atrela a riqueza de recursos ao sucesso da própria formação do sujeito. E


aponta essa riqueza como fator que atua em defesa da ampliação do número de colégios
militares em Goiás. Também pontua o papel da Associação de Pais e Mestres. Pela narrativa
da coordenadora, compreendemos melhor o papel da APMF
Na nossa escola nós temos um data show em cada sala, nós temos ares
condicionados em todas as salas, o que não é comum numa escola estadual, mas que
aqui acontece porque os pais contribuem com a associação e esse dinheiro ele é
revertido em melhorias para os alunos, que é a questão do ar condicionado, que é a
questão do data show, que é a questão do material didático, o material pedagógico, o
material de escritório, professores da eletiva solicitam, por exemplo, um papel pardo
pra fazer um trabalho, geralmente nas outras escolas existe uma dificuldade, aqui a
associação contribui. (COORDENADORA, 2018, p. 8)

Percebemos que em geral, as outras escolas possuem grande dificuldade para


conseguir e disponibilizar verbas para os recursos didáticos, o que no Colégio Polivalente, a
APMF possibilita a compra com maior rapidez de tudo o que é solicitado. Um dos professores
afirma que em geral, as escolas militares são bem equipadas, pois “eles conseguem é,
desenrolar verbas, por exemplo, de todos os lados, que o civil não vai conseguir, por exemplo,
empresas privadas e também na gestão da escola” (PROFESSOR 2, 2018, p. 15). Para esse o
professoro gestor do Colégio Polivalente é fundamental na questão dos recursos porque, “ele
sabe fazer um programa bem feito para captar recurso ele sabe o caminho que capta, então ele
é formado em direito, ele sabe, ele conhece os caminhos, ele faz, ele faz”. O professor
conclui:
Acho que a primeira diferença é o espaço estrutural e material didático, que é feito
por causa dessas parcerias. Por causa da associação. Eu tenho material de educação
física para ginástica, para a dança, pra lutas, que eu nunca tive em outros lugares,
tinha só bolas nas outras! Temos espaços amplos, arejados, isso ajuda.
(PROFESSOR 2, 2018, p. 15).

Ressaltamos que em todas as narrativas surgem comparação com as demais escolas


estaduais, como forma de evidenciar que, por ser um ser gerida por militares, o colégio
consegue levantar fundos (seja por meio da APMF ou das parcerias público/privadas), com
mais rapidez, maior eficiência e assim, promover melhores condições a professores e alunos.
Os pontos levantados a respeito dos recursos coadunam com o que percebeu Ferreira
(2018) ao pesquisar sobre a implantação de um CEPMG. A autora afirma que o mesmo
passou por inúmeras transformações após a militarização, a estrutura física foi modificada,
reformada e ampliada, o mobiliário foi renovado, houve ainda a ampliação do número de
profissionais que atuam no colégio, para o qual, diversos departamentos foram criados, como
123

o disciplinar, mecanografia, recepção, dentre outros. Tudo isso, com o intuito de garantir um
padrão militar e propiciar aos alunos melhores condições no processo de ensino e
aprendizagem. A autora conclui que “Os CEPMG contam com uma estrutura física diferenciada
das demais escolas da Rede Estadual, com recursos próprios advindos da contribuição das
famílias ali atendidas” (FERREIRA, 2018, P. 158).
Enquanto professoras, não podemos negar a importância dos recursos materiais e de
infraestrutura no ambiente escolar, com certeza, estes são instrumentos importantes para o
desenvolvimento da prática pedagógica, bem como, propiciam melhores oportunidades aos
alunos para construírem conhecimento.
Vemos que a administração militar é a responsável em grande parte pelas melhores
condições do colégio. Isso fica expresso na fala de Professor 5, (2018, p. 8), a “administração
militar garante os aspectos básicos de condições materiais de trabalho”, o que auxilia os
professores na construção do processo de ensino/aprendizagem e, “naturalmente promove
uma educação de mais qualidade para os meninos”.
A equipe pedagógica da escola vê na gestão militar a solução para os problemas de
investimento no campo educacional, elucidando principalmente, que a partir da militarização
a escola conseguiu captar mais recursos e melhorar significativamente as condições de
trabalho e de infraestrutura. Esse fato é evidenciado por meio da afirmação de Professor 1,
(2018, p. 7), quando questionado sobre as mudanças que ocorreram após a militarização, esta,
de forma enfática afirmou que “Teve. Para melhor. Em questão de apoio, questão da melhoria
da infraestrutura da escola”.
Assim, podemos afirmar que há por parte dos professores um encantamento para essa
nova realidade a eles apresentada, considerando que, por grande parte do exercício na
docência, foi marcada pela precarização do trabalho docente, é justamente essa riqueza que
exerce grande influência e conquista dos professores, que a partir dessa nova realidade
tornam-se defensores da gestão militar. Ou seja, estes, conseguem grande rapidez e agilidade
na aquisição de material pedagógico e na realização de melhorias contínuas, seja a
infraestrutura ou de recursos didáticos, enfim, questões estas que cativam os profissionais das
escolas militarizadas.

2.3.Avaliação

A avaliação é um instrumento didático necessário e constante da prática docente, que


deve acompanhar paulatinamente o processo de ensino/aprendizagem. Nas palavras de
124

Libâneo (2013, p. 216), “é uma tarefa complexa que não se resume à realização de provas e
atribuição de nota. [...] cumpre funções pedagógico-didáticas, de diagnóstico e de controle em
relação às quais se recorre a instrumentos de verificação do rendimento escolar”.
A partir dessa exposição, podemos afirmar que no colégio a avaliação cumpre tanto a
função de mensurar como a de diagnosticar falhas no processo, buscamos as narrativas para
evidenciar essa conclusão.
Haydt (2011) define a avaliação do processo de ensino-aprendizagem, como o
instrumento de verificação da aprendizagem dos alunos, que, por sua vez, possui três
propósitos: diagnóstica, formativa e somativa. A diagnóstica, realizada no início do ano
letivo, objetiva verificar o conhecimento prévio dos alunos, permite que o professor tome
ciência da “bagagem cognitiva” dos alunos, possibilita fazer o diagnóstico das dificuldades
dos alunos,identificar e distinguir as causas possíveis. A formativa tem o intuito de verificar
se os objetivos estabelecidos para a aprendizagem dos alunos foram alcançados, essa
avaliação contribui para o aprimoramento da ação docente e fornece dados para a adequação
de procedimentos às necessidades da classe. Por fim, a avaliação somativa, relaciona-se aos
resultados alcançados pelos alunos na aprendizagem, possibilita que seja verificado o nível de
aprendizagem dos alunos, objetiva ainda, a promoção dos alunos, ou seja, tem função
classificatória, que varia com o nível do rendimento atingido.
Percebemos então, que a avaliação na concepção de Haydt (2011) assume três
funções principais. O que ganhou ênfase no Colégio Polivalente, foi sobretudo, a avaliação
como processo somativo, no sentido de preparação e mensuração dos resultados obtidos.
Inicialmente, cabe destacar que a rotina das avaliações é bem rigorosa. São realizadas
semanalmente, nos dois primeiros horários da segunda-feira avaliações “de bloco”,
“simulado” ou “produção de texto”,(PROFESSOR 1, 2018).
A coordenadora explica melhor as avaliações,
A prova de bloco, tem o bloco um, bloco dois e bloco três, primeiro ciclo e segundo
ciclo. São avaliações no formato de questões objetivas “V” ou “F”. Então nós temos
a prova de bloco, nós temos o simulado, e nós temos as avaliações que a gente
chama de avaliações subjetivas, que aí, é um trabalho, é uma atividade em sala, é
uma atividade para casa, é a prova escrita, é o aluno no seu cotidiano, é o
amadurecimento que ele apresenta, é a participação dele em sala de aula... Então
assim... nós trabalhamos com diversos instrumentos, é do objetivo ao subjetivo. É,
da prova de bloco, ao amadurecimento que esse aluno nos apresenta a cada aula, a
cada participação e aí fica a critério do professor”. (COORDENADORA, 2018, P.
14).

A coordenadora afirma ainda que as avaliações subjetivas podem ser elaboradas em


outros formatos avaliativos, como “um trabalho oral ou uma apresentação” e para demonstrar,
125

ela cita uma atividade avaliativa realizada pela professora de língua inglesa, em que esta
solicitou aos alunos que criassem uma propaganda em inglês. Na visão dela, a realização dos
mesmos tipos de avaliação, pode interferir nos resultados daqueles alunos que tem
dificuldades “porque a gente sabe que isso atrapalha aqueles que têm outras tantas
habilidades, não só escrita, não só a fala, mas a gente procura também trabalhar em todos os
aspectos” (COORDENADORA, 2018, p. 14).
Para o Aluno 1 (2018, p.8), as avaliações semanais são bem vistas, pois servem “para
fazer o aluno estudar não uma semana por bimestre, mas a semana, todas as semanas do
bimestre, porque toda semana tem prova, então, estude toda semana do bimestre”. Ela ainda
acrescenta que a quantidade de provas subjetivas aumentou após a gestão militar, o que se
explica pelo fato da exigência de realizar avaliações também do ND, visto que anteriormente
eram realizadas apenas no NC.
Essa narrativa demonstra o interesse da gestão em gerar resultados mais consistentes.
Há uma cobrança para com os professores pela realização e cumprimento dos planos, há
também a cobrança dos alunos pela melhora do desempenho e garantia de melhores
resultados.
De acordo com um dos alunos as provas servem como um incentivo ao estudo
Eu sinto que a gente aprende mais, pois como tem várias coisas para poder testar a
gente, vamos aprendendo, a gente aprende fazendo. É só estudar mesmo para
conseguir tirar notas boas. É um pouco puxado, pelo fato de ter muito professor e,
muita aula, muitas matérias, o estudo é bem puxado tem que estudar muito se quiser
ser um aluno bom e dedicado. (ALUNO 3, 2018, p. 3).

Por sua vez, um dos alunos afirma que as provas de bloco, realizadas semanalmente,
são “maçantes, com muitas questões”, o que em sua perspectiva, deveria ser revista, para
melhorar e proporcionar melhores resultados (ALUNO 2, 2018, p. 5). Notamos que os alunos
concordam que as avaliações semanais são importantes meios de “incentivá-los” a estudar
diariamente. Apesar de as acharem cansativas e rigorosas, concordam que trará resultados
positivos.
Acreditamos que existem duas perspectivas distintas quanto ao sentido da avaliação,
na concepção dos militares ela possui o que Libâneo (2013) denomina como uma função de
controle, que expressa resultados por notas ou conceitos, pelos quais é possível comprovar “a
quantidade e a qualidade dos conhecimentos adquiridos”. Por isso, o crescimento no número
de avaliações após a militarização.
Em contrapartida, para os professores, além da função acima descrita, possui a
prerrogativa de diagnóstico e correção, percebemos isso através da afirmação de Professor 1
126

(2018, p. 4), conforme esclarece, “eu passo a avaliação, eu percebo que tem alguma falha no
conteúdo que eu dei, que eles erraram mais as questões, eu volto atrás e tento recuperar aquele
conteúdo, então, é muito rápido e é muito dinâmico, a resposta deles”.
Mas, o que salientamos, é que a quantidade excessiva de avaliações coaduna com os
objetivos das instituições neoliberais, bem como com a atuação dos novos filantropos,
destacados inicialmente, ou seja, é um que instrumento que garante o acompanhamento dos
objetivos estabelecidos, bem como promove a mensuração dos resultados.

2.4.Objetivos

É possível afirmar que os objetivos da educação estão relacionados à tendência


pedagógica que direciona o trabalho escolar. Temos objetivos maiores que exprimem a função
da própria educação e objetivos menores que direcionam as leituras e aprendizagens nos
conteúdos curriculares.
Libâneo (2013) divide esses grandes grupos de pensamento sobre a educação em
tendências de cunho liberal e de cunho progressista.
Na tendência liberal, a finalidade da educação é garantir o preparo dos indivíduos
para desempenhar os papéis sociais, baseia-se na perspectiva de que cada indivíduo possui
suas capacidades a serem desenvolvidas, desconsidera assim, as desigualdades sociais.
Por sua vez, as de cunho progressistas, buscam realizar análises da realidade social e
criar formas para promover a transformação da sociedade. Desta maneira os objetivos desta
tendência, “Expressam, portanto, propósitos definidos explícitos quanto ao desenvolvimento
das qualidades humanas que todos os indivíduos precisam adquirir para se capacitarem para
as lutas sociais de transformação da sociedade. (LIBÂNEO, 2013,p. 132).
Isto posto, toda documentação que tivemos acesso como fizemos transparecer no
capítulo anterior evidencia que é a tendência liberal, que guia a proposta pedagógica.
Encontramos nos discursos, elementos que compõem suas manifestações como a pedagogia
tradicional, ora a renovada e ainda a tecnicista.
Nas narrativas isso fica mais complexo e aparecem com mais visibilidade o choque
entre propostas como a dos empresários que reivindica o protagonismo, o empreendedorismo
e a dos militares mais conteudista e disciplinar.
É presente na visão da equipe pedagógica o desejo de uma formação inspirada na
tendência progressista sendo que um dos professores salienta que ali eles “não são formados
127

para obedecer, eles são formados como sujeitos pensantes, mas que tem noção sim, dos seus
limites”, (PROFESSOR 3, 2018, p. 4).
E a presença dos militares alimenta narrativas que para se ajustarem soam em tom de
defesa como vemos na fala da coordenadora que diz “nós não estamos formando soldadinhos
que respondam sim senhor ou não senhor, essa escola nós trabalhamos jovens
autônomos”(COORDENADORA, 2018, p. 5). Algo que também soou como defesa mesmo
quando dito pelo Gestor “eu não estou formando soldado para ir para a guerra, eu estou
formando gente para ir para o mundo” (GESTOR,2018, p. 5).
Além disso, estão presentes as falas que incorrem pela formação para o mercado,
para o vestibular, típico da tendência liberal tradicional. Professor 2 (2018, p. 9), analisa
Os alunos que a gente tem, que estão saindo... na questão que eu falei, do mercado
de trabalho... eles estão se encaminhando bem, para a universidade, eles conseguem
resultado. Eles querem passar no curso tal, eles estão passando, a maioria está
passando, nessa parte sim. (PROFESSOR 2, 2018, p. 9)

Também vemos um “quê” de defesa na continuidade da fala deste professor quando


alega que ali a formação “está ampliada”. Depois emerge o foco novamente quando sustenta
que eles têm alcançado os objetivos da instituição “que é o mercado de trabalho, aprender a
conviver com o outro e ter uma formação de excelência” (PROFESSOR 2, 2018, p. 9).
Novamente uma tendência é colocada em relevo.
Quando observamos o abraço de uma tendência liberal do tipo mais conservadora-
tradicional consideramos o mesmo como um dispositivo teórico e metodológico fundado na
ideia dominante da escola como valioso instrumento social. Dialogamos com Pérez Goméz e
Gimeno Sacristán (1998, p. 17) para quem a partir de uma perspectiva idealista, a escola e
suas funções são descritas como a socialização das gerações futuras, a partir de um “processo
de inculcação e doutrinamento ideológico”. Pela interpretação idealista, a escola deve impor
aos alunos uma ideologia dominante, por meio de um processo de transmissão de ideias e
comunicação de mensagens, seleção e organização de conteúdos de aprendizagem, que ao
final, introduzem nos indivíduos as ideias subjetivas da “aceitação da ordem real como
inevitável, natural e conveniente”. (IBID.).
Enfim, Diante do exposto, salientamos que com base no pensamento de Gómez e
Sacristán (1998, p. 14), o Colégio Polivalente possui uma função reprodutora, visto que
promove a interiorização de ideias, valores, normas, de forma que o processo de socialização
delongado, “possa substituir os mecanismos de controle da conduta por disposições mais ou
menos aceitas de autocontrole”.
128

2.5.Considerações preliminares sobre o capítulo

A análise do processo educacional, o pedagógico revela que o Colégio Polivalente


produz e reproduz padrões que atendem aos documentos orientadores. Vemos no regimento
que a rotina é marcada pela cor marrom, por comportamentos monitorados, via disciplina
rígida, pelo ordenamento na forma de hierarquia e pela homogeneidade, garantida pelas fardas
e perfil dos alunos, que padroniza desde as cores das meias até o corte dos cabelos.
Idealiza-se a construção de sentimentos patrióticos e de civismo, a partir da qual, a
escola torna-se ideologicamente organizada para a manutenção da ordem vigente, sobretudo,
para a garantia do ordenamento e da moralidade social.
Com fins claramente ideológicos, observamos o corpo como objeto de poder, que é
formatado por meio da hierarquia imposta. Ou seja, há sempre alguém exercendo o controle
sobre o outro. Essa hierarquia, dentre os alunos, estabelece aqueles que devem supervisionar
os demais, os alunos das séries mais velhas devem zelar pelos comportamentos das séries
mais novas. Os alunos líderes de turma, devem cuidar pela organização e ordenamento de
suas turmas, se reportando aos superiores (professores e militares) se julgarem necessário.
Sendo assim, os alunos são constantemente vigiados a partir das figuras de autoridade que
exercem liderança e dominação (WEBER, 2004) no ambiente escolar. Essa liderança é
conforme apresentada do tipo racional legal, visto que existem normas legais que devem ser
seguidas e garantem essas prerrogativas a esses alunos.
Além da vigilância, a organização do ambiente se estabelece também pela
homogeneidade dos corpos, alcançada por meio do uso do uniforme – fardamento – que, par
nós, possui tanto o aspecto homogeneizador e diferenciador. A farda homogeneíza no
ambiente interno ao colégio, em que todos os alunos são iguais. Porém, no ambiente externo,
evidenciamos a diferenciação por pertencerem ao colégio militar. Ou seja, aos olhos da
sociedade, aqueles alunos se distinguem dos demais.
Enfim, percebemos pela observação as rotinas do colégio reproduzem um ambiente
de regras e condutas que constituem corporalidades, posturas e pensamentos e visa a ordem,
disciplina e moralidade cívica e, assim, evidencia o tipo de cidadão a que se pretende os
CEPMG.
A produção e reprodução dos padrões atinentes à Escola da Escolha e ao Programa
Novo Futuro, se apresenta na dimensão didática, o que observamos por meio das narrativas.
Como ela tem sido organizada, nos mostra um colégio que abrigou dois projetos distintos e
que vão incorporando a militarização.
129

Como previsto no Programa Novo Futuro, há um rigoroso processo de planejamento


e acompanhamento das atividades do colégio (mapas, reuniões, formações), fato esse,
atrelado, sobretudo à figura da gestão militar, que exige com rigor o cumprimento das metas
estabelecidas e das atividades planejadas.
A organização curricular segue as normas estabelecidas pelo Programa Novo Futuro
e atende às especificações da BNCC. Dividida em dois núcleos, comum e diversificado,
predomina no primeiro, um viés tradicional, cuja ênfase nos conteúdos é observada. Por sua
vez, o núcleo diversificado, que visa preparar o indivíduo para o mundo.
Notamos que os professores possuem poucos momentos de relativa autonomia, seja
na organização curricular (que vem praticamente pronto), seja nas práticas e metodologias
propostas (que também já possui instruções e caminhos a serem seguidos). Mas consideramos
que em momentos que estes podem interferir, buscam a melhoria para os alunos, que se
relaciona com a ideia de se “criar algo novo’. Como exemplo, citamos a própria mescla dos
núcleos, algo que não acontece em outros colégios.
Identificamos ainda as disciplinas eletivas como o momento em que o professor
possui grande autonomia, visto que existe a liberdade para construir sua proposta e organizá-
la considerando seu público alvo, mas que, não deixa de ser cerceada pela aprovação da
gestão militar.
Quanto aos alunos, percebemos que estes também tiveram sua autonomia e seu
protagonismos - eixos da Escola da Escolha e do Programa Novo Futuro -cerceadas pelo
regimento e pela gestão militar, isso fica evidente nas narrativas que indicaram que os
“clubes” precisam do aval da gestão para a sua consolidação. Proeminências da vigilância e
do controle sobre os corpos e comportamentos.
Quanto aos métodos de ensino, a base está na tendência liberal (LIBÂNEO, 2001),
que prevalece o ensino tradicional e conteudistas, visto que os militares anseiam por
resultados mensuráveis, através do aumento do número de avaliações.
O destaque está na disponibilidade de materiais didáticos e pedagógicos,
provenientes da APMF e das parcerias com o setor privado. Demarcando a tendência
neoliberal (Ball, 2011) de privatização e afastamento do Estado de suas responsabilidades de
investimento e garantia da educação de qualidade para todos.
As ótimas condições físicas e estruturais do colégio estão relacionadas às parcerias
que o Colégio tem efetivado, sobretudo com o setor privado. Na visão dos professores, os
militares são ótimos gestores, pois através de sua projeção e autoridade, conseguem captar
verbas com maior facilidade e eficiência do que os gestores civis, e atuam no sentido de
130

conquistar para o colégio maior respeito perante a sociedade. Em segundo plano a formação
acadêmica do gestor (Direito), auxilia no desenrolar das verbas, pois, ele conhece os
caminhos a serem percorridos para garantir maior investimento do setor público e privado.
Enfim, esse capítulo nos apresenta uma escola cerceada por olhares atentos de todos
os lados e à toda a comunidade escolar, que resulta em uma instituição muito bem organizada
e equipada e que, produz um aluno muito bem preparado para os exames e para produzir
resultados mensuráveis, no entanto, não permite o desenvolvimento crítico e participativo
desse aluno, que se mantém alheio aos problemas sociais.
131

CAPÍTULO III

O PEDAGÓGICO NO SUTIL UNIVERSO DAS RELAÇÕES INTERPESSOAIS


A difícil questão para nós é: quanto tempo pode a
perversa normalidade de uma ordem socioeconômica e
política antagônica, com sua irreprimível tendência de
afirmação global de seu domínio, manter sua
dominação sem destruir a própria humanidade? István
Mészarios.

O pedagógico pode ser compreendido a partir de várias dimensões. Vimos no


primeiro capítulo pela via documental-narrativa que o pedagógico do colégio tem como berço
um pensamento liberal que essencialmente se veste da roupagem neoliberal do empresariado e
se adorna e fortalece pelos aspectos militares do ordenamento, da hierarquia e da disciplina.
Pouco do pensamento progressista se faz presente nos documentos cabendo-lhe espaço no
PPP quando do momento de os professores participarem do processo de pensar o colégio. No
segundo capítulo lançamos o olhar sobre a compreensão pedagógica e a leitura dos elementos
do processo educativo.
Agora chegamos à dimensão mais subterrânea que é a das subjetividades produzidas
no eixo das relações interpessoais que rechaçam, aprovam, defendem ou assumem outros
sentidos para o concreto vivido no pedagógico. Neste capítulo compreendemos o pedagógico
pelo prisma das interações entre os indivíduos do colégio (relações interpessoais). A coleta
dos dados aconteceu através de entrevistas-narrativas. Na análise tomamos como referencial
autores como Mizukami (1987) e Libâneo (2013) e Saviani (2012) e também aqueles que
também se dedicaram ao estudo dos colégios militares como Ferreira (2018), Barros (2018) e
Castro (2016)

3.1.As relações interpessoais

Podemos definir os relacionamentos interpessoais como as diversas maneiras de


interação entre os indivíduos em qualquer ambiente. São baseadas em diversas condições de
sentimentos, emoções, dominação, entre outros. Tavares (2007, p. 32) os define como “laços
ou redes que ligam e interligam as ações das pessoas entre si”.
Libâneo (2013) destaca a importância das relações interpessoais no ambiente escolar
admitindo-a como um dos elementos constituintes do fenômeno educacional. Para ele, as
relações estabelecidas na escola se relacionam às formas de comunicação, aos aspectos
132

afetivos e emocionais, a dinâmica das manifestações na sala de aula e variam conforme os


objetivos e as concepções pedagógicas que orientam a proposta da instituição.
Nas narrativas que utilizamos para a construção deste capítulo percebemos que a
constituição do pedagógico do colégio, tão bem amarrada nos documentos, não esteve isenta
de conflitos que se manifestaram e marcaram a dinâmica do processo educativo e as relações
interpessoais. Equilibrar visões distintas (Escola da Escolha, Novo Futuro e o Regimento
Militar) foi sentido de modo diverso nas vivências de gestores, professores (civis e militares)
e alunos.
A “militarização” também se acomoda pela experiência pessoal. Tudo isso imprime
nas relações interpessoais sua marca e posiciona indivíduos em uma rede de relacionamentos
que é o colégio. Esse reposicionamento foi percebido na fala do Aluno 1 (2018, p. 5) na qual,
salienta que após a transferência da gestão para os militares, “teve uma mudança de parte dos
professores, uma mudança dos alunos e uma mudança dos militares”.
Veremos ao longo do capítulo que as relações interpessoais criam pontos,
contrapontos, reflexões e mudanças que influem na efetivação do pedagógico e podem até
afastá-lo (em sentido ou interpretação) daquilo que consta no papel. Seguindo Tavares (2007)
e Libâneo (2013) não assumimos como definição as relações interpessoais na margem daquilo
que apregoa o regimento interno e que estabelece como base das relações, a hierarquia.
Seguimos a sutileza. As subjetividades.

3.1.1. Militares e Civis

A primeira categoria a ser analisada, diz respeito às relações estabelecidas entre civis
(professores e coordenadores) e militares (toda equipe militar).
Conforme já elucidado anteriormente, profissionais de diferentes formações atuam
no ambiente escolar do Colégio Polivalente. A presença de civis e militares é observada em
todos os departamentos, como na gestão, na coordenação, na secretaria e no quadro de
docentes. Todavia, vimos no capítulo anterior que a cisão entre professores civis e militares se
solidifica nas narrativas de modo que os primeiros são reconhecidos como aqueles que
cuidam do conteúdo e os últimos como os que cuidam ou devem cuidar da disciplina. Em
alguns momentos a identidade de militar se sobressai a de professor.
Pela hierarquia das funções (militares na gestão), pelo olhar da comunidade interna e
externa, pelos ritos incorporados em corpos e atividades, se estabelece uma condição de
superioridade aos militares. Lembramos inclusive que não houve consulta para a escolha do
133

gestor, que é Major, e do vice-diretor que é Capitão o que fere o princípio da gestão
democrática, a eleição para escolha dos membros da diretoria.
Em algumas narrativas essa percepção de hierarquização se manifesta quando
ouvimos que os militares “chegaram e já assumiram o controle das atividades”. A leitura é
que isso soou como uma prática autoritária que ocasionou choque e desacordos. Acarretou um
sentimento de insegurança e incertezas para os professores.
Segundo a coordenadora houve por parte dos professores uma recepção com “aquele
olhar torto, porque escola é espaço de professor, é território de professor”. Havia a expectativa
cheia de receio de que os militares assumiriam o “comando” do colégio. Por isso, sobretudo
no início, a convivência não foi muito pacífica. Ela conta que esse estranhamento refletiu o
sentimento de disputa territorial. “O professor olha e fala: - essa escola é espaço meu, de
professor! E os militares falam: - nós estamos na gestão!” (COORDENADORA, 2018, p. 12).
Faz sentido para nós considerarmos este estranhamento inicial como sintoma de um
desconforto relativo ao afastamento dos profissionais da educação da gestão e do processo
decisório no Colégio Polivalente. Vimos como o fluxo de criação e implementação das
propostas menosprezou a contribuição destes profissionais, como a autoria e a criatividade
deles ficou relegada ao núcleo diversificado. Nestes termos percebemos como evidente aquilo
que Arroyo aponta “hoje grupos técnicos desconhecidos impõem a todas as escolas e a seus
profissionais o que decidem como prioritário ou descartável na garantia do direito ao
conhecimento”(ARROYO, 2014, P. 34).
Essa leitura que diz respeito a perda de autonomia profissional, precarização é
encontrada em outros estudos sobre a implantação de CEPMG como no de Ferreira (2018, p.
120) que afirma que a insatisfação dos professores pela gestão militar se refere ao
desenvolvimento do trabalho docente. Uma das narrativas que esta autora apresenta, a de um
professor civil, expõe que a liberdade docente foi limitada, o que resultou na perda de
autonomia e, ainda, que foram impostas diversas práticas militares na rotina. A autora conclui
que “a implementação desse modelo de ensino em Goiás traz imbricado em si uma
particularidade que é o controle ideológico e político por meio da educação”.
Descobrimos que muitos dos conflitos nas relações entre militares e civis de fato
surgem das discordâncias quanto às práticas pedagógicas estabelecidas no ambiente escolar
que espelham ideologias diferentes, bem como, projetos de sociedade diferente. Por um lado,
os militares desejavam inserir nestas, e consequentemente no comportamento dos alunos, a
marca do disciplinamento e da hierarquia que garantem uma sociedade funcionalista e
pseudo-harmoniosa. Por outro lado, os professores que viam no protagonismo da Escola da
134

Escolha possibilidade de potencializar a criação, a crítica, a expressão, que são divergentes


por natureza da repressão e do controle.
Segundo a Coordenadora (2018, p. 12) essas diferenças são superadas a partir de
conversas que acontecem nos momentos de formações quando fazem uma “NGA, que é uma
Norma Geral de Ação”. A permanência de embates e conflitos mesmo no decorrer dos anos
após a militarização é revelada quando ouvimos dessa coordenadora a frase “hoje, nós...
vivemos, existimos, coexistimos e convivemos nessa escola de forma muito tranquila”. Frase
da qual pinçamos particularmente para análise a variedade de terminologias. Observamos
então que a coordenadora busca evidenciar que há um convívio pacífico entre civis e
militares, contudo, conflitos e discordâncias ocorrem, que por sua vez, são resolvidos por
meio dos momentos de formação promovidos pelo Programa Novo Futuro.
Outro professor entrevistado abordou a relação entre civis e militares, o que nos
permitiu perceber que ela se mantém equilibrada e que gestor – militar – e coordenadora
pedagógica – civil – atuam na mediação das discussões.Percebemos (pelo que as palavras
aqui não revelam) que há ainda um receio por parte dos civis em confirmarem a existência de
conflitos no ambiente escolar sinal de que a relação entre militares e civis não é assim tão
pacífica como aparenta. A fala é a seguinte:
Foi difícil, está sendo difícil, por causa de duas formações tão diferentes, tem esse
atrito, sempre dá, mas, está dando certo. Eu acho que é graças à gestão, dele que é
aberto e da coordenadora também que não reduz, sempre que eles querem ganhar
um pouco tem um embate. Sempre tem um embate. Então a gestão, ela, equilibra as
coisas. (PROFESSOR2, 2018, p. 7)

O professor acrescenta também que os embates ocorrem no que diz respeito às


atividades pedagógicas e são motivados pelo fato de que eles (os militares) “tem uma
formação muito diferente da nossa, [...] eles formaram para outra coisa” (IBID.).
Nos instiga pensar pelo trecho acima, assomando-o à necessária demarcação civis-
militares na questão das identidades profissionais que para Dubar (2009, P. 118) estão
agrupadas com base em um “pertencimento comum” e “são maneiras socialmente
reconhecidas, de os indivíduos se identificarem uns aos outros no campo do trabalho e do
emprego”. O que percebemos é que posicionando civis e militares na ordem do “nós” e “eles”
fica clara a noção de que não são da mesma categoria profissional embora atuem como se
fossem.
Os clubes promovidos nas aulas de protagonismo são a circunstância selecionada
para indicar o atrito entre civis e militares porque os militares avaliavam que os jovens não
tinham supervisão nesses momentos e “achavam aquilo terrível! Diziam: - Como que um
135

aluno vai ficar sem um adulto responsável por perto? Vão fazer bagunça!”. Nesses momentos
os civis intervinham “sempre explicando, oh, isso faz parte da premissa da escola”. Neste caso
os consensos se estabeleceram de forma gradual, porque os militares “vão ganhando mais
experiência. E aí a gente vai reduzindo esses atritos” (PROFESSOR 2, 2018, p. 8).
Sobre o assunto, o gestor transfere a interpretação para a questão das relações
humanas.
Toda relação humana tem divergência. Dentro do corpo de professores tem
divergências. Mas a questão da divergência, ela é interessante, porque, quando
surge, nós tratamos ela de frente, uma coisa que eu trabalho muito com a equipe é,
autonomia, sigilo e confiança. (GESTOR, 2018, p. 13).

Na continuidade da fala vemos a necessidade de evidenciar a escola como lugar de


militares e civis.
Eu confio neles, dou autonomia para eles, agora se tiver que tratar um tema, que eles
entendam que seja sensível eu chamo, e vamos conversar sobre, tem que ser
alinhado de equipe, porque não é os militares e os civis, é a escola, então, eu sempre
procuro deixar isso muito claro. (IBID.).

A ideia de que a fala do gestor é a fala do militar acima de tudo.

(...) E aí é uma fala militar muito forte, a gestão é minha, é compartilhada, é, mas as
decisões em alguns momentos são minhas, mas a partir de composição, e aí a gente
encontra o caminho, se tiver errado esse caminho, lá na frente a gente corrige a rota,
e faz com muita tranquilidade. (IBID.).

E ao final o indicativo de pensamentos discordantes para os quais, o diálogo.

(...), mas como qualquer relação humana existe linhas de pensamento discordantes
em qualquer lugar e aí a gente consegue achar o caminho a partir do discurso,
diálogo, vamos entender isso aqui, o porquê, como isso funcionaria melhor, para
poder avançar. (IBID).

Na literatura, encontramos na obra de Ferreira (2018, p. 119) uma análise sobre os


embates entre professores e militares sugerindo que elas ocorrem preponderantemente quando
em tela estão as questões disciplinares e pedagógicas. Ela aponta (e vimos isso na narrativa
acima) que as atividades pedagógicas nas quais havia a movimentação de alunos eram
percebidas pelos militares como indisciplina.
Na tese de Barros (2018) sobre um Colégio da Polícia Militar da Bahia os atritos
entre civis e militares também resultam da discrepância na visão e concepção de militares e
educadores sobre a organização pedagógica. O autor esclarece
Os militares pensam que o militarismo é o segredo do sucesso de tantas aprovações
em vestibulares, Enem e bom desempenho no IDEB. Já os professores civis, apesar
de conceber o colégio como uma instituição organizada, pensam que há excessos
quanto à disciplina, as regras e a rigidez imposta pelo militarismo. E que isso, de
136

certa forma, influencia de forma negativa na formação da consciência crítica dos


alunos. (BARROS, 2018, p. 72).

Identificamos que os atritos nas relações estão baseados em divergências sobre a


função da educação e as práticas pedagógicas e não se estabelecem apenas no colégio
pesquisado, mas se apresentam como um padrão onde há educadores civis e militares.
É interessante apreender que há uma consonância nas narrativas dos professores
quanto aos atritos no sentido de que eles manifestam divergências significativas. Por outro
lado, as narrativas também emergem a leitura de que é justamente a coexistência de
professores de “formações diferenciadas” o que permite a construção de novos conhecimentos
e novas formas de atuar e fazer a educação. A coordenadora esclarece que há um trabalho
conjunto. Porém, ao longo de toda a fala o sentido nós (professores) x eles (militares)
sobressaem.
Têm militares que trabalham na minha sala, comigo, tem militares que trabalham é,
eu tenho civis que trabalham em salas de militares, mas aí vai ficando tranquilo. No
começo, é, sempre mais difícil, até a gente entender o espaço de cada um, e que eu
acho que respeitar o espaço do outro não é um problema nosso, ele é um problema
que existe em diversos lugares, mas hoje, é mais tranquilo assim, já foi mais difícil.
Mas embate tem sim! A gente vai para as formações, uma vez ao mês, nós temos
formação de todo mundo, aí senta militar e professor, e aí tem os embates, porque as
vezes eles têm uma visão nós temos outra, não que a nossa esteja certa, nem a deles,
e a gente vai tentar entrar num senso comum, para tentar ajustar aquilo que é melhor
para os estudantes. (COORDENADORA, 2018, p. 12)

Quando as narrativas avançam pelo que seria positivo nos atritos, a interpretação que
vem à tona é a de que pelo embate as vezes se origina uma tendência ao equilíbrio. A lógica é
a da teoria sobre a curvatura da vara de Saviani (2012) que propõe pela metáfora da vara que
as ideias ora pendem para um lado, ora pendem para o outro e que o equilíbrio síntese é
contributivo ao avanço da educação.
Neste sentido a escola é vista como um “laboratório de aprendizagem”, e que, os
conflitos são essenciais para o desenvolvimento e para a melhoria da qualidade da escola.
Nesses termos, temos que professores e militares acreditam que há uma convivência pacífica
e harmoniosa entre eles.
Essa visão harmônica é discutida por Oliveira (2017, p. 130) que percebeu durante
sua pesquisa “a existência de uma articulação harmônica entre as esferas civil e militar” em
que “ambos reconhecem seus papéis na estrutura hierárquica do colégio e convivem de forma
a aceitar e a respeitar essa hierarquia”.
A fala do PROFESSOR2, (2018, p. 8)evidencia mais o movimento da curvatura da
vara que para nós,na maioria das vezes, pende para o lado dos militares. Ela pende para um
137

lado quando porque “professor tem aprendido muito, principalmente na parte da


administração, questão de conseguir recursos, de aplicar os recursos, que a gente não foi
formado para isso, o professor, a gente sofria muito com isso”. Quando fala do gestor lembra
que o mesmo é formado em Direito, com isso, “ele sabe captar recurso, sabe aplicar”. E pende
para o outro quando o professor lembra que “a gente aprende muito com eles e eles com a
gente”. Neste processo o “atrito ele é primordial, para essa escola funcionar, porque como são
dois modelos diferentes, mas querem se juntar, eu acho que então, eles têm que se juntar pelo
complemento”. (PROFESSOR2, 2018, p. 8).
O excerto abaixo, também ressalta a forma como acontece essa “parceria” a partir da
perspectiva de outra professora (civil).
É uma gestão de parceria. Eu vejo assim, a polícia militar veio com uma sede muito
grande de a escola crescer, então, quem conheceu o Polivalente há um tempo, e vê o
Polivalente hoje, a gente vê que eles lutam, correm atrás mesmo, da questão,
especialmente da questão física, é uma questão, foi também uma questão de
parceria, no sentido de que, nós, enquanto educadores, ajudamos muito os militares
a compreender a educação, porque as vezes, nós recebemos militares, mas que nunca
tinham trabalhado na escola, então aos poucos ele compreendeu a grandiosidade que
é a educação, o cuidado que a gente tem que ter com esses alunos, ou seja, houve
uma mudança muito grande, eu acredito que também, da parte dos militares, eles
compreenderam realmente o sentido da escola. E é lógico, nós também aprendemos
com eles, o sentido da organização, a questão de, dos determinados limites, isso
tudo, eu acho que foi uma parceria onde, nós aprendemos e eles também, nós
sofremos e eles também. Acho que é o normal de uma parceria (PROFESSOR3,
2018, p. 5)

Ressaltamos que o termo “parceria” aparece constantemente nas narrativas quando o


assunto se refere à relação entre civis e militares. Ou seja, os profissionais buscam sempre
frisar que existe um relacionamento de trocas e aprendizados, que tendem a obter
congruências entre os pensamentos e concepções de ambos, para compor o pedagógico da
instituição. Salientamos que os debates surgiram com maior intensidade no início,
relacionamos esse fato à adequação de todos ao sistema militar, ou seja, os conflitos foram
atenuados pelo próprio regimento e construção de uma perspectiva e concepção de educação
própria da instituição.
Observamos ainda a hierarquização nas relações, e vemos que isso se acomoda nas
práticas e nas submissões, quando emerge a visão de que militares resolvem problemas de
professores, sobretudo na questão da disciplina, que devam ser responsáveis por isso.
Momentos como um contado pela coordenadora que diz
Eu tenho professores que as vezes queriam que os militares entrassem em sala de
aula e fizessem intervenções. E eu digo aos professores que não, que a sala de aula é
de domínio do professor, ele que tem que ter autonomia. - Ah, mas então para que
serve eu trabalhar um colégio militar? E eu sempre destaco, - Você não vai trabalhar
aqui para sempre, quando você voltar para uma escola que não for militar, você tem
138

que ter sua autonomia, você tem que ter o seu domínio de sala, o domínio
pedagógico é do professor. E aí tem militares que concordam comigo, e tem
militares que queriam entrar em sala de aula e fazer as intervenções, só que a gente
vai discutindo e chega num senso comum, mas eu acho que é isso que faz essa
escola ser rica, são essas diversidades, assim são esses debates, esses ajustes que a
gente vai fazendo. (COORDENADORA, 2018, p. 13).

Sobre a intervenção dos militares durante as aulas, tanto as narrativas como a


observação, indicaram que essa prática é inexistente no Colégio Polivalente, ou seja, os
militares respeitam o espaço da sala de aula dos professores. Durante as observações, sempre
que necessário, os militares se dirigiam às salas para avisos e, solicitavam a permissão dos
professores para transmitirem algumas informações.
Com isso, inferimos que há uma divisão bem específica das responsabilidades, ou
seja, civis e militares possuem funções particulares, fato que de certa forma, aprofunda a
dicotomia entre a parte militar e pedagógica. Sobre esse assunto, PROFESSOR 2, (2018, p. 7)
destaca que “Olha de educação a gente entende, vocês entendem da parte militar, das leis,
[...]Olha, eu tenho um problema hoje, amanhã está arrumado. Então eles cuidam dessa parte, e
a pedagógica, a gente cuida”. Na fala da coordenadora, também fica evidente essa divisão de
funções, “Quem cuida do pedagógico é que é formado para isso, e eles ficam atuando mais na
gestão” (COORDENADORA, 2018, p. 4).
No trabalho de Castro (2016, p. 62) vemos que essa separação entre atuação de
policiais e militares no ambiente escolar também se apresenta em outros colégios militares em
que são “bem delimitadas as fronteiras entre o “disciplinar” e o “pedagógico”. Fica claro para
este autor e afiançamos essa avaliação de que quando se referia à relação de poder, os civis
sempre se reportavam aos militares.
A complexidade e tensão nas relações entre professores civis e militares na
percepção dos alunos foi notada em uma das entrevistas que fizemos. A princípio o Aluno 1
(2018, p. 8) disse que eles “passam uma amizade mesmo! Que eles conseguiram construir, de
coleguismo no ambiente de trabalho. A gente vê que professores e militares fazem
brincadeiras pelo corredor”. Observa ainda que há preocupação em garantir a harmonia do
grupo, “porque se tivesse muita divergência entre professores e militares, com certeza
refletiria na escola e nas aulas”.
Mas quando a memória orienta as narrativas desse mesmo aluno para a visita a um
passado próximo, rememora que houve embates também entre os próprios docentes e que
quando vieram os professores contratados após a militarização estes “estranharam muito a
questão de ter o protagonismo, de ter eletivas, essas coisas que são as matérias que eram do
139

tempo integral, do Novo Futuro, [...] é todo um processo que os professores não
compreendiam” (ALUNO 1, 2018, p. 4).
Para alguns a predominância de relações conflituosas se justifica pelo fato de não
haver outra instituição nos moldes do Colégio Polivalente, destaque em várias narrativas,
“colégio de tempo integral militar, é o único do Estado de Goiás, não temos outro”
(COORDENADORA, 2018, p.5). Por isso, os professores salientaram também a dificuldade
encontrada inicialmente pela necessidade de “ter que construir um modelo híbrido, que dê
certo, que gire” (PROFESSOR 2, 2018, p. 7.
Na avaliação de um dos professores (civil), o diferencial desse colégio militar, está
justamente nas pessoas que o compõe, “os militares da escola de tempo integral condicionam
o comportamento que possibilite o aluno ser um protagonista com responsabilidade”
(PROFESSOR 5, 2018, p. 6). Observamos então, novamente o fato de que os professores
civis consideram que os professores militares que compõem o quadro de funcionários da
instituição possuem um perfil diferente dos demais, visto que priorizam uma formação
humana e integral, apesar de exigirem uma educação de qualidade e excelência. O professor
faz uma analogia às duas propostas, analisa-a a partir da seguinte reflexão:
Então na verdade eu acho que essa escola, aí agora a analogia ao Hegel, [...] nós
temos uma tese, que é o Novo Futuro e o desenvolvimento dos jovens protagonistas,
alunos para a vida e não necessariamente alunos para a profissão. E nós temos uma
escola militar, que representa todas as tradições, que representa muita produtividade,
no sentido, nós queremos profissionais excelentes. Então na verdade nós temos uma
tese e uma antítese, eu acho que esses dois sistemas ainda estão em um processo
dialético de estar se contradizendo em alguns aspectos. Eu creio que no futuro eles
consigam produzir uma síntese, uma síntese positiva (PROFESSOR 5, 2018, p. 6).

O próprio desenvolvimento de duas propostas contraditórias (tese e antítese)


propiciam conflitos e tensões sobre o tipo de formação e perfil do alunado que se deseja
formar. O que, por meio das formações, reflexões e discussões, os parâmetros são
estabelecidos e as tensões são minimizadas, seja por meio da resolução, da aceitação ou
normatização.
As relações estabelecidas entre civis e militares são marcadas por divergências e
convergências, ora envergando para o pensamento militar, ora envergando para o pensamento
civil, em busca de um equilíbrio que proporcione aos alunos, uma educação com de
excelência. Em nossa análise, o Colégio Polivalente configura-se como um espaço de disputa
entre projetos distintos e nele a situação dos professores está na base da pirâmide.
140

3.1.2. Professores X Alunos

A relação estabelecida entre professores e alunos também foi uma categoria acessada
nas narrativas. É preciso esclarecer que tal categoria poderia ser dividida em duas, pois
persistiu a divisão entre professores civis e professores militares (que segundo os alunos - até
são professores mesmo). Seguindo esta organização que se fez necessária desde a primeira
entrevista, falemos da relação entre os professores civis e os alunos.
A primeira percepção que se manifestou nas entrevistas é que por ser uma escola de
tempo integral, a comunidade escolar acaba criando laços “familiares”. É uma visão que se
manteve na fala dos professores e alunos e, foi colhida quando a Professora 1 (2018, p. 4)
disse que o convívio estabelecido no ambiente escolar promove o envolvimento emocional
entre alunos e professores que “basicamente viram família. Criam um laço de amizade, muito
forte”.
Para exemplificar essa questão, a professora elucida dizendo que por se estabelecer
uma relação muito próxima entre professores e alunos é comum que depois de terminarem o
ensino médio os alunos voltem à escola, para visitar. Ela conta assim: “quando eles terminam
o terceiro ano, que eles saem, eles ficam voltando [...] é como se fosse uma casa para eles, [...]
cria esse elo muito forte”. (IBID.).
De fato, durante a pesquisa de campo, vimos a visita de alguns ex-alunos, que
voltavam na escola, para rever professores tanto civis como militares. Interessante destacar
que em conversas informais eles sempre enfatizavam o quanto gostavam da escola e o quanto
sentiam falta daquele ambiente. O gestor avalia que eles sentem “saudade da escola, saudade
daquela rotina. Então vem ficam aqui e está sentindo saudade. Ou seja, o processo afetivo é
muito forte” (GESTOR, 2018, p.6).
Com base em Mizukami (1987), vinculamos essa proximidade no relacionamento
entre professor/aluno à abordagem humanista, visão exposta nos documentos orientadores, em
que o aluno se torna o centro do processo de ensino e aprendizagem. O professor é
considerado o facilitador do processo para o que deve estabelecer laços afetivos e de
confiança com seus alunos.
Na entrevista com a coordenadora houve inclusive um momento de emoção quando
ela contou um fato ocorrido com alguns alunos, como forma de apresentar o envolvimento
que existe naquele ambiente.
Mas não tem como nessa escola não se envolver com os inúmeros Rafaéis que nós
temos por aí, com as inúmeras Marias que nós temos aí. Com histórias de violência
doméstica, de violência sexual, de uso de droga, de serem colocados como
141

aviõezinhos pelos pais... Não tem como não se envolver com essas histórias. O
envolvimento que nós temos com esses meninos é algo assim, muito diferente do
que eu já vivenciei até hoje. (COORDENADORA, 2018, p. 17).

Esse tipo de relação, muito forte entre professores e alunos, que vai além das paredes
escolares, gera nos professores que entrevistamos um sentimento de satisfação, de realização
como vemos na fala que resume o tom das narrativas “A escola, essa escola é uma das mais...
como é que eu, mediante a minha experiência com todas as escolas... eu nunca trabalhei num
ambiente mais respeitoso que esse de professor e aluno”(PROFESSOR 5, 2018, p. 10).
A percepção dos alunos que entraram posteriormente à implantação do militar vai ao
encontro da dos professores, localizamos essa perspectiva na narrativa de um dos alunos que
afirma,
Aqui nessa escola, a gente vira praticamente uma família. Nossos professores são
nossa família, porque eles chegam, se tem alguma coisa de errado... vê que a gente
não está bem... eles vão e perguntam, como é que nós estamos, então eles se
preocupam realmente com a gente... as aulas se tornaram muito melhores. Agora a
gente está numa família. (ALUNO 2, 2018, p. 2)

Porém, no ponto de vista dos alunos que acompanharam a militarização, as narrativas


sugerem que houve modificação na relação entre alunos e professores, notamos essa leitura
quando outro aluno disse que “o contato com o professor era mais íntimo, assim, a gente tinha
os tutores, ainda continuam, mas era um professor que se preocupava muito, até a gente
brincava que era pai e mãe”. Em sua análise essa proximidade diminuiu após a implantação
da gestão militar quando foi efetivado sutilmente um maior afastamento entre alunos e
professores e acarretou uma mudança a ser destacada, cuja leitura é de que “o professor é o
mestre, e, por ter tirado tanto essa parte de afeto mesmo dentro da escola de uma vez ficou
cansativo, ficou estressante” (ALUNO 1, 2018, p. 2).
Seguindo a narrativa desse mesmo aluno se aprofunda a ideia de que a militarização
“mudou muito perfil dos professores” porque a gestão e a coordenação estão preocupadas na
contratação de “professores que se enquadram não no modelo de escola de tempo integral,
que é o Novo Futuro, mas sim dentro do modelo militar”. Por isso os professores, precisam
ter uma postura diferente dos que eram contratados anteriormente precisam ser “mais
centrados... Professores com um estudo maior, uma faculdade, um mestrado, algumas coisas
assim, para aumentar o nível de matéria de conteúdo da escola mesmo”. Ao sintetizar seu
pensamento ela resume “comparando ao perfil, que era do CEPI, ao perfil agora, com certeza,
mudou muito” (IBID.).
142

Nesse intento, percebemos claramente que apesar de ainda manterem um


relacionamento próximo com os alunos, houve sim, um afastamento após a militarização, que
pode ser explicado pela normatização do Regimento, que estabelece o tipo de vínculo que
deve ser concretizado entre os pares, bem como, exigem que docentes possuam uma postura
de autoridade perante os alunos, tudo isso, com o objetivo de garantir resultados mensuráveis.
O que novamente revela a predominância da tendência liberal tradicional, na qual, segundo
Mizukami (1986), a relação estabelecida é vertical e as relações estabelecidas de forma
longitudinal.
Como apontamos anteriormente, quando as narrativas citam os professores militares
fortalecem a ideia da cisão de papéis e práticas entre civis e militares, a nossa incursão nas
narrativas sobre as relações interpessoais evidenciou essas questões.
Um dos alunos entrevistadas cita que houve divergências entre professores militares
e alunos devido ao tipo de relacionamento estabelecido que era sentido pelos jovens em um
padrão de distanciamento. Segundo ele, a situação chegou a um bom termo depois de diálogos
e debates que modificaram a postura de alguns professores militares que passaram a se
esforçar para criar um relacionamento aberto e amigável com os alunos, com trocas de
experiências e orientações, o que ampliou sua presença no cotidiano dos alunos. A solicitação
central era para que não restringissem a relação a um tipo de controle voltado apenas a
disciplina. Relembra ainda do colégio antes da militarização para contrapor as relações entre
professores e alunos antes e depois da militarização e assim ancorar sua narrativa. Chama a
atenção a frase “os militares são iguais professores mesmo”:
A gente tinha nossa diretora, antiga. Era uma pessoa que tipo, ela sabia o nome de
todos os alunos! Ela tinha essa preocupação de passar na sala, e tudo, e ter aquele
aproximamento mesmo com os alunos, fazer uma família mesmo dentro do colégio.
E aí quando chegou os militares, não tem esse contato, porque eles são mais secos,
não tem toda essa afetividade, então, gerou o que o povo chama de estranhamento.
Porque aí, a gente achava que eles não estavam se importando, aí muita gente
estranhou essa parte de falar assim - Ah, eles não se importam muito com o que está
acontecendo! E aí os professores foram e falou - Não, não é assim, é porque é o jeito
deles, muitos deles já são aposentados, alguns já estão aqui dentro para sair tipo de
trabalho de rua, essas coisas mesmo! Então eles têm um jeito de tratar diferente. E
aí, a gente fez todas essas conversas dos líderes, foi arrumando a escola, usando o
protagonismo, e hoje a gente tem militares que são iguais professores mesmo. Que
preocupam, que se não está bem, o militar próprio conversa. (ALUNO 1, 2018, p.
4).

A coordenadora também expressou a dificuldade em mediar a relação entre


professores militares e alunos partindo do princípio que a imagem que temos dos militares
serem “durões” deve ser desconstruída, porque na relação com os alunos eles sempre se fazem
presentes de forma cordial e preocupada, afirma que os militares em geral “Passam e dá um
143

oi! Encosta nesse menino, e dá um tapinha! Pergunta: - Está tudo bem com você? E aí...esse
militar ele é tutor também” (COORDENADORA, 2018, p.18).
Alguns entrevistados reiteram a ideia de que os militares modificaram sua forma de
pensar, bem como sua postura, para promover um ambiente mais acolhedor aos alunos.
Na visão do militar o estranhamento se deve ao fato de que a relação entre alunos e
militares é pautada no respeito e porque eles corrigem “Queremos o melhor para ele!
Orientamos, chamamos a atenção? Chamamos, mas chamamos corrigindo e mostramos os
erros para eles e onde eles têm que consertar. Então eles gostam disso” (MILITAR, 2018, p.
5).
Como se deu na relação entre professores civis e militares a “harmonia” entre
professores militares e alunos parece acontecer de fato quando sobressai na relação o respeito
à farda e àquele que a usa cumprindo seu papel de autoridade.
A boa relação entre militares e alunos é percebida em ocasiões onde todos estão
agrupados perante alunos e comunidade como acontece durante a entrega de medalha para os
alunos destaques, os “alamares”. É momento que comove os alunos. A coordenadora lembra
de um jovem que “no momento que ele recebeu a medalha ele vibrou tanto lá na quadra, todo
mundo emocionou não teve um que não chorou” (COORDENADORA, 2018, p. 18). A
entrega de medalha a esse aluno foi solicitação de um dos militares, que evidenciou seu
crescimento ao longo dos anos.
Um aluno avalia que a relação com os militares em sala de aula se assemelha à dos
professores com a diferença da farda e de um certo cuidado na definição dos que irão assumir
cada sala de aula. Nestes momentos a escolha parece ser baseada em suas características, “os
que são mais calmos, sabe... mais tranquilos, para entrar na sala de aula e conversar, ter uma
conversa. Não é uma aula de ordem”. E que houve um tipo de preparo dos alunos na aula de
civismo oferecida antes da militarização que “é uma aula que eles trazem conversas, tipo,
debater temas sobre drogas, problemas em casa que podem ser resolvidos aqui na escola, [...]
trazer o regulamento do colégio, para estudar com os alunos” (ALUNO 1, 2018, p. 2).
Também vimos nesse aluno um sentimento de satisfação porque “a postura dos
militares dentro da sala de, em momento nenhum é desrespeitosa, pelo contrário, eles até
ficam um pouco preocupados em ser como os professores” (IBID).

3.1.3. Alunos e alunos


144

O relacionamento entre alunos também foi tratado nas narrativas. Consideramos que
a forma como se relacionam reflete em certo grau a cultura escolar do lugar por isso ressoa
em alguns casos a disciplina, a emulação, a pressão por resultados etc. Nas entrevistas-
narrativas que realizamos dois temas apareceram com mais vigor: o bullyng e a questão da
hierarquia. Do primeiro emerge a ideia de que no colégio o bullyng aparece em menor índice
e há dispositivos para tratamento do tema. Do segundo insurge a ideia que a hierarquia é a
base para a formação de líderes e é promovida por meio da confiança e não pela relação de
poder.
Antes de entrevistarmos os jovens falamos com gestor, coordenadora e alguns
professores que nos indicaram por experiência e conhecimento que acessaríamos falas nas
quais encontraríamos o humano, isso porque estávamos em um lugar ocupado por “gente,
gente, não deixa de ser humano”. Assim, falando de jovens poderíamos por exemplo acessar o
relato de uma briga ocorrida com “unhada, mordida... por um não gostar do outro” (GESTOR,
2018, p. 6). Ou seja, mesmo por se tratar de um colégio militar, que a princípio sugere
disciplinamento e ordem, isso ocorre.
A coordenadora, como que também nos antecipando alguns pontos da relação aluno
e aluno ressalta o fato de que surpreende a muitos da comunidade intraescolar e extraescolar
que exista bulling dentro do colégio militar. Assim como o gestor ela reforça que é algo de
certo modo esperado já que ali
São adolescentes do mesmo jeito, que vem com as dúvidas do mesmo jeito. Nós
tivemos casos de pais falarem assim, no colégio militar tem bulling? E eu, sim! Por
quê? Porque tem gente! Porque que acontece situações de bulling? Porque tem
gente! Gente que as vezes não respeita o outro, gente que as vezes acha que é
superior ao outro, e aí é um processo de formação. (COORDENADORA, 2018, p.
11)

Nesses termos, temos que a explicação de gestores e professores ao fato da existência


do bullyng, está relacionado com a existência de crianças e adolescentes em processo de
formação, que possuem sentimentos e dúvidas, que devem ser corrigidos e orientados, para
que essa prática seja minimizada no ambiente escolar. Em nenhum momento a interpretação
assumiu o caminho da emulação.
Sentimos, todavia, o surgimento de falas no sentido de defender que no Colégio
Polivalente esse fenômeno ocorre em proporções bem menores do que em outros colégios
públicos. E em muitas delas o menor índice do bullyng se relaciona com o fato da escola ser
de tempo integral onde o convívio é grande e há maiores possibilidades de se trabalhar
efetivamente esses assuntos. É o mesmo entendimento do gestor que nos disse que o bullyng
145

não é tão presente porque “a dinâmica de estar o dia inteiro é interessante, porque, vai chegar
um ponto em que ele (o aluno) vai ter que entender que vai ter que conviver com o outro, vai
ter que entender que o outro é diferente, e flui” (GESTOR, 2018, p. 6).
Outro professor também relaciona a diminuição das ocorrências de bulling com a
questão do tempo integral, ele analisa que no Colégio Polivalente,
Nós temos uma prática ética porque nós podemos construir isso com os alunos. Não
há possibilidade de pensar no bullying ou na diminuição desse bullying na escola
pública de tempos, porque não há possibilidade de se trabalhar o contrário. Você não
tem espaços que possibilite, por exemplo, uma formação ética dos sujeitos, coisa
que essa escola permite pelo núcleo diversificado. Então nós temos um projeto de
vida, nós temos a eletiva, ou seja, o projeto de vida é um espaço muito interessante
porque ali ficam muito latentes as individualidades, então naturalmente eles passam
a perceber de forma mais íntima aquilo que não é permitido em outros locais. Ele
percebe que o outro não é ele, o outro é o outro. Então essa escola, por exemplo, tem
um comportamento mais tranquilo com relação ao bullying exatamente porque nós
podemos construir isso com nossos alunos, o que é impossibilitado em outras
escolas, então a impossibilidade de haver essa construção é o resultado que nós
temos: uma sociedade absurdamente violenta, uma sociedade absurdamente
preconceituosa e eu por exemplo, já sofri preconceitos direto entre professor e aluno,
alunos que me desrespeitavam pela minha condição de orientação sexual eventos
dos quais eu nunca tive nessa escola. (PROFESSOR 5, 2018, p. 10).

As narrativas demonstram que a partir do momento em que se percebe o bullyng há


um trabalho efetivo de conscientização que “é uma ação conjunta de civis e militares, no
sentido de orientação mesmo, nunca de punição” (IBID.). Para isso, são realizados projetos
com temáticas que discutem sobre o bullyng, “Mas ações desse nível, que nós não temos
soldadinhos, nós temos adolescentes” (COORDENADORA, 2018, p. 11), para a
coordenadora, a transição da fase infantil para a adolescência é muito complexa, por isso, eles
precisam de orientação.
Na percepção de outro professor surge a ideia (sutilmente colocada na entrevista) que
a forma de lidar com o bullyng é diferente entre civis e militares reforçando a defesa da fala
anterior que o assunto não é tratado com “punição” o que seria referência aos militares
A nossa formação é para lidar com esse tipo de coisa, então a gente cuida. Se fosse
eles, era o seguinte, bulling estava previsto no artigo tal, então sua punição é x. Mas
a maioria das vezes não é só assim que a gente faz, não é assim que a gente resolve
os problemas, não é só o artigo tal punição tal, está resolvido, você nunca mais vai
fazer porque você foi punido, e a gente, o nosso papel lá é fazer ele repensar isso,
refletir. Se ele sabe da gravidade que é isso, se pode ser resolvido, chamar a outra
pessoa que sofreu esse bulling, falar, colocar os dois dialogar, num processo para ver
se resolve ali de uma forma educativa. Se ele repensar isso, refletir sobre isso, vai
ser resolvido de uma forma que ele vai entender o processo e então, talvez ele nunca
mais faça porque ele entendeu o que significa o bulling. E aí todos os problemas que
a gente detecta na coordenação pedagogia, a gente trabalha nas aulas, nas aulas de
projeto de vida, nas aulas de sociologia. (PROFESSOR 5, 2018, p. 17)
146

Nessa mesma linha de pensamento, outra professora destaca a importância das


disciplinas do ND para a formação social dos alunos, “então eu acredito que, exatamente o
próprio projeto de vida, o PJ, desperte essa reflexão no aluno, então a gente tem combatido, a
gente tem refletido com os alunos”. O professor também ressalta o fato de que por ser uma
escola em tempo integral quando há casos de bullyng “a escola em si nota isso com muita
facilidade”. Enfim, acontece “em menor proporção, mas acontece”, (PROFESSOR 3, 2018, p.
5), justamente pela reflexão promovida no ambiente escolar.
O destaque na fala do gestor é que “existe um acompanhamento para isso” afirma
que professores e militares “estão o tempo inteiro fazendo atuações nesse sentido, chama a
família, inclusive a gente tem agora uma, uma psicóloga”. (GESTOR, 2018, p. 7).
Manzini (2013) esclarece que o bulling deve ser combatido por meio de atividades
escolares que valorizem a diversidade, democracia e os direitos humanos estabelecidos nas
relações interpessoais. Para a autora, a prevenção deve ser planejada de forma sistemática e
considerar a dinâmica social. Torna-se essencial que sejam desenvolvidas atividades que
estimulem o diálogo e a reflexão, bem como promovam a comunicação interpessoal, de forma
que os alunos compreendam, reconheçam e respeitem a diversidade e tenha fortalecida sua
identidade pessoal e cultural.
Nesse contexto, observamos que o tratamento contra o bulling deve considerar a
diversidade e estimular a reflexão e convívio entre os pares. Podemos então afirmar que de
fato, a proposta de Educação em Tempo Integral realmente amplia momentos destinados à
estas reflexões e possibilitam uma formação mais ampla no sentido de convivência e
interação. Em contraponto, avaliamos que a figura dos militares, também ordena os
comportamentos e controla “instintos agressores”, ou seja, o próprio regimento interno,
estabelece punições a esse tipo de comportamento. Talvez também nesse ponto, esteja a
explicação para a redução desses índices na instituição.
Quando entrevistamos finalmente os quatro alunos, uma das primeiras percepções
enunciadas foi de fato a da existência de bullyng dentro do colégio. A leitura repercutiu a fala
do gestor e da coordenadora e reforça a ideia de que onde há jovens há bullyng. Ouvimos que
“Não tem como falar que não existe, dentro do ambiente escolar bulling” (ALUNO 2, 2018, p.
5).
Outra aluna entrevistada relata um caso ocorrido no colégio, situação na qual alguns
alunos estavam praticando bullying com um aluno especial. Surpreende-nos a existência de
uma espécie de protocolo para a situação o que nos transpareceu quando ela nos detalha que
147

em um primeiro momento os alunos líderes foram acionados e organizaram uma conversa


com a turma, em que buscaram conscientizá-los sobre essa prática, ela explica que
Aí, a gente conversou e deu uma resolvida, uma amenizada no processo... Mas ainda
assim, algumas pessoas que eram mais... mais afoitas mesmo, que não assimilaram
muito a gente falar com eles, aí os militares tomaram frente, chamaram pai e mãe e
conversaram, explicaram que não pode. E o aluno que estava sendo alvo eles
levaram psicólogos, conversaram se ele queria que fosse outro psicólogo, e não o
psicólogo da escola, talvez ele ficasse constrangido em ver depois. (ALUNO 1,
2018).

Compreendemos então, que inicialmente, os próprios alunos líderes tomam frente na


resolução dos conflitos e dos casos de bulling e, caso o problema não seja resolvido, os
militares são acionados e, em casos com maior visibilidade ou gravidade, há a intimação dos
pais para a efetivação do trabalho em conjunto.
Outros episódios ocorrem e ocorreram sem que esse protocolo tenha sido acionado.
Os próprios alunos teriam criado estratégias como destacado neste excerto
Mas aí a gente começou... a própria sala consegue conversar e dar um gelo... a gente
tem a parte do silêncio por uma semana. Se a pessoa começa a tratar alguém muito
mal, ou fazer bullying, a sala inteira esfria com aquela pessoa. Não a trata mal. Mas
dá uma afastada para ela repensar as coisas. E acaba que depois de uma semana a
semana do gelo acaba e volta tudo bem” (ALUNO 1, 2018, p. 10).

A aluna ainda explica que essa “semana do gelo” foi criada pelos próprios alunos, a
partir de um episódio de brincadeiras que estavam se excedendo dentro da escola. Então, foi
criada e a “escola inteira pegou a semana do gelo. Fica a semana do gelo. E a pessoa repensa
suas atitudes e vê o que ele está fazendo de errado ou certo” (IBID).
Assim, percebemos que apesar dos entrevistados afirmarem que existem problemas
de relacionamento entre alunos no ambiente escolar, este tem sido resolvido e a reincidência
dos mesmos tem diminuído, a partir da conscientização dos alunos.
Outro ponto que emergiu das entrevistas, sobre a relação entre alunos foi a
hierarquia. No capítulo I já havíamos destacado a existência de uma composição hierárquica
observada no regimento militar que prevê que entre os alunos também há uma distinção com
relação às séries. O Art. 194 do Regimento Interno define que todo aluno deverá tratar os
colegas de séries mais antigas com “respeito e disciplina”, os da mesma série com “afeição e
camaradagem” e, os das turmas mais novas com “bondade, dignidade e urbanidade”.
A questão da hierarquia que chegou provocando embates. O terceiro ano, que é a
turma mais antiga do colégio, segundo, primeiro. E aí, a gente ficava muito
preocupados do oitavo ano, que seria no caso a turma mais baixa do colégio, se
sentir subjugado e aí a gente falou: “Olha, não vai dar certo isso, porque se a gente
colocar todo mundo para ter essa parte de um ficar abaixo do outro, não vai
funcionar. Eles vão ficar sentidos, porque tem um estranhamento quando isso
acontece. “Ah, mais aquela turma ali mesmo por ser mais velha, vai mandar em
mim? Ou por serem mais velhas no colégio, a parte do militarismo fala que uma
148

turma mais nova presta continência para uma turma mais velha”. E aí a gente juntou
o protagonismo nessa parte e falou: “Olha, não vamos fazer assim, porque a gente
não quer só que um seja menor do que o outro, dentro da hierarquia seria o que teria
acontecido, vamos fazer a escola inteira tentar se unir. (ALUNO 1, 2018, p. 10).

Nas narrativas dos alunos, há um consenso de que a posição hierárquica do tipo


“quem manda” não é dominante no ambiente escolar ainda que os alunos do terceiro ano
tenham maiores responsabilidades inclusive na vigilância, na organização e no auxílio às
classes menores.
Essa condição na verdade é para eles algo que depreende do regimento interno que
em seu o artigo 201 orienta que os alunos das séries mais avançadas precisam zelar e corrigir
“com urbanidade e disciplina” os alunos das séries mais jovens. Não observamos nenhum tipo
de “correção “mas notamos por diversas vezes que os alunos mais novos se direcionam aos
alunos mais velhos com dúvidas ou questões.
Castro (2016) também buscou compreender a relação entre os alunos no ambiente do
colégio militar e não enxergou a cobrança dos mais velhos com os mais novos. Para ela
inclusive essa correção aconteceu e “Foram poucas as vezes, e não por falta de situações que
demandassem essa atitude do ponto de vista da disciplina”.
Conforme mencionado, o Regimento Interno impõe prerrogativas aos alunos do
terceiro ano, sobre vigilância e controle dos demais alunos, contudo, um dos alunos salienta
que os alunos buscaram meios para promover o auxílio e apoio aos demais. Explica que
durante a formação, os alunos das turmas do 3º Ano do Ensino Médio são os responsáveis por
zelar e cuidar dos demais, nesse sentido, precisam adquirir uma postura de vigilância
constante dos padrões estabelecidos,
As pessoas do terceiro ano foram distribuídas um para cada sala, um para cada
pelotão, porque cada sala forma um pelotão, para auxiliar, invés de só estar lá
cobrando. Então, se tem alguém fora do padrão, a gente fala... vamos ali arrumar,
vamos ali trocar de meia, porque não pode ficar de meia colorida... vamos colocar
essa camiseta para dentro da calça. Tentar ajudar eles para eles não ganharem
transgressão. A gente dividiu assim, uma pessoa do terceiro ano vai sempre ficar
com alguém de salas mais novas, menos antigas na escola, para ajudar essa transição
mesmo, porque eles estão em processo de assimilação da escola, tem muita coisa
que eles ainda não entendem. (ALUNO 1, 2018, p. 6)

Podemos então, perceber que existe uma relação hierárquica no colégio, que coloca
os alunos das turmas mais graduadas acima dos alunos das turmas mais novas, e que aos
olhos dos alunos, não configura como uma forma de dominação e vigilância. Mas que, traz
sim, uma diferenciação entre os que mandam e os que obedecem.
149

Acreditamos, que esses alunos serão formados a partir de interações que reproduzem
comportamentos de dominação e obediência, e que, consequentemente, mesmo que a figura
dos alunos do terceiro ano seja de orientadores, os próprios alunos sabem que caso as normas
não sejam seguidas, sanções disciplinares e punitivas serão tomadas.
Foi nas relações que notamos melhoro colégio como lugar de circulação, reprodução
e disputa por poder. Foucault (1987) nos diz de um poder disciplinar, baseado na vigilância
hierarquizada.
A vigilância hierarquizada, contínua e funcional, não é, sem dúvida, uma das
grandes invenções técnicas do século XVIII, mas sua insidiosa extensão deve sua
importância às novas mecânicas de poder, que traz consigo. O poder disciplinar,
graças a ela, torna-se um sistema integrado, ligado do interior à economia e aos fins
do dispositivo onde é exercido. Organiza-se assim como um poder múltiplo,
automático e anônimo; pois, se é verdade que a vigilância repousa sobre os
indivíduos, seu funcionamento é de uma rede de relações de alto a baixo, mas
também até um certo ponto de baixo para cima e lateralmente; essa rede, sustenta o
conjunto, e o perpassa de efeitos de poder que se apóiam uns sobre os outros: fiscais
perpetuamente fiscalizados. [...] A disciplina faz funcionar um poder relacional que
se auto-sustenta por seus próprios mecanismos e substitui o brilho das manifestações
pelo jogo ininterrupto dos olhares calculados. (FOUCAULT, 1987, P. 158-159)

Podemos então concluir, que mesmo que na percepção dos alunos, a hierarquia das
relações não promova a disputa e a primazia do poder, há sem dúvida, um controle exercido
nas e para as relações. Enfim, avaliamos que a hierarquia existe como um instrumento de
controle e ajustes de comportamentos, mesmo que não seja de forma explícita, exerce
influência nas relações e no comportamento dos alunos, que são constantemente vigiados, seja
pelos militares, professores e pelos próprios alunos.

3.1.4. Escola X Família

É interessante destacar que há unanimidade nas respostas ao afirmar que por se tratar
de um CEPMG há um envolvimento maior dos pais/responsáveis no Colégio Polivalente. A
equipe escolar percebe essa participação com maior efetividade em reuniões, eventos e no
próprio dia-a-dia da instituição “[...] é interessante reconhecer no colégio militar essa presença
maior da família na escola” (PROFESSOR 1, 2018, p.5).
Outro professor compara a participação dos pais antes e depois de se tornar militar,
evidenciando que
Eu nunca, por exemplo, nas primeiras reuniões eu nunca vi setenta por cento dos
pais aqui, setenta por cento. Tinha vinte, dez, e, quem vinha? Os pais dos alunos que
eram, que assim, não tinham grandes problemas, em nenhum nível, eram bons
estudantes, conviviam bem, emocionalmente também tudo bem. Aí os pais vinham
antes, os problemáticos quase não vinham, tinha que ligar, e hoje tem uma maior
participação sim, dos pais, efetiva. (PROFESSOR 2, 2018, p.14)
150

Comprovamos durante a observação a presença constante de pais no ambiente


escolar. Uma vez por semana, na parte da manhã, a coordenadora mantinha sua agenda
voltada para o atendimento dos pais e/ou responsáveis, cujo filho apresentava problemas, seja
disciplinar ou de aprendizagem. Também, evidenciamos o deslocamento dos pais para
explicarem faltas, tirarem dúvidas ou mesmo interessados em acompanhar o desenvolvimento
de seus filhos. Mas a coordenadora salienta,
Longe de ser cem por cento, quando eu chamo, às vezes tem algum problema é de
nota ou de comportamento, assim, é, inadequado, e o inadequado que eu falo é,
drogas, porque não é porque é um colégio militar que não aconteça e tal. E aí eu
ligo, e são atendimentos individuais, e geralmente eles, eles vêm assim, estão
presentes. (COORDENADORA, 2018, p. 10)

Na leitura de um professor civil, a maior participação da família no ambiente escolar,


está relacionada com a cobrança da gestão, e também se relaciona “a questão de, de ser difícil
de entrar [...] conseguir uma vaga no colégio militar é quase uma conquista”. Nesse intento,
para ela, os pais receiam perder a vaga de seus filhos “os pais não querem tirar os filhos
daqui, porque a escola é boa” (PROFESSOR 1, 2018, p. 5).
Por sua vez, outro professor civil, atribui essa presença maior da família no ambiente
escolar “Ao nome, Polícia Militar, a onda que nós temos hoje do conservadorismo, de que
neles eu posso confiar”. Ele destaca a questão também abordada pelo professor, sobre a
cobrança da gestão pela participação dos pais, entretanto, ele salienta, “mas eu acho que o
principal, é por ser um colégio militar”, o professor esclarece não ter certeza dos motivos, mas
o fato de ser militar é uma das suas hipóteses principais, bem como o medo que os pais têm de
perder a vaga dos filhos, ele conclui “é só suposição, eu não sei porque realmente”
(PROFESSOR 2, 2018, p. 14).
Em contraposição, a coordenadora afirma ter problemas também com a participação
da família, ela salienta que “Buscar a família para a escola é uma dificuldade inclusive dessa
escola, como de todas as outras”, no entanto, não desconsidera que há uma participação maior
da família no ambiente escolar, sobretudo, “nas entregas de boletins, nós temos uma presença
até significativa”. Mas, em sua análise, o que realmente provoca esse fenômeno, é a
“contribuição com a associação”.Avalia que a prestação de contas que a Associação de Pais,
Mestres e Funcionários (APMF) precisa fornecer, “acaba trazendo esses pais porque, a gente
mostra para eles que o que eles estão contribuindo está virando recursos, benefícios para os
próprios filhos” (COORDENADORA, 2018, p.9). Ela explica que
151

As reuniões da associação e aí são coisas separadas, a associação é uma coisa e a


escola é outra, porém eu aproveito esse momento da associação, eles vem na reunião
da associação quando são convocados, um número maior do que na reunião
pedagógica, aí o que eu aproveito, aproveito o momento da associação pra fazer
também o pedagógico, aí é o momento onde eu converso com os pais, chamo, tento
buscá-los para participar dessa vida escolar dos filhos, acabo aproveitando mais a
reunião da associação porque eles são mais frequentes lá do que nas pedagógicas.
(IBID).

Pelas narrativas, observamos que é grande a participação dos pais nas atividades e no
ambiente escolar. Assim como os professores, avaliamos que este fato está relacionado
também à presença dos militares, ou seja, podemos atribuir à figura de autoridade imposta
pelos militares, que geram um compromisso maior dos pais pelo acompanhamento da vida
escolar dos filhos.
O gestor assegura que “nós já tivemos muita participação efetiva das famílias, a
ansiedade deles por estarem dentro do colégio é muito intensa”. Entretanto, ele percebe que
por vezes há o “afastamento da família”, que de maneira geral, está relacionado ao
“rendimento do menino”, ou seja, se o aluno está com o rendimento bom, a família acaba se
distanciando um pouco do ambiente escolar. Em contrapartida, se a escola “percebe
fragilidades”, a coordenação pedagógica “convida a família sim para participar, estar com a
gente, conversar com a coordenação pedagógica, passar na direção para a gente poder saber o
que está acontecendo, para fazer essa construção do menino”. O gestor percebe que como a
jornada escolar é ampliada, os problemas pessoais, tensões ou pressões que esse aluno está
sofrendo, “normalmente estouram aqui dentro, então a gente consegue acompanhar isso de
uma forma mais próxima, e a partir daí, chamar também os pais para essa proximidade, para
se resolver o problema” (GESTOR, 2018, p. 11).
Nessa narrativa, encontramos também a evidência da participação dos pais,
sobretudo, quando os alunos estão apresentando problemas disciplinares, emocionais ou de
aprendizagem. Assim, os pais são chamados a participar da vida escolar dos seus filhos, para
o qual, prontamente atendem à convocação. Temos a impressão de que os próprios pais
atribuem valor maior à educação e ao ambiente escolar militarizado, ou seja, há uma
valoração pela educação militar e a desvalorização das demais escolas públicas, questão essa,
provada pela dificuldade que grande parte das escolas encontram para estabelecer uma relação
efetiva com os pais.
Além da participação no pedagógico, a coordenadora também afirmou que a
presença dos pais também se dá por meio da colaboração com a APMF e, ainda, por meio de
contribuição voluntária de prestação de serviços ou benfeitorias à instituição, ela confirma que
152

Nós temos muitos pais envolvidos aqui, nós temos assim, mães de aluno, que falam,
eu não posso contribuir com dinheiro, mas eu posso vir numa sexta feira e ajudar a
dar faxina na escola. Ou um pai de uma aluna nossa, é, trabalha em uma empresa
que fura poços artesianos, ele pediu ao dono da empresa para vir aqui furar um poço,
então a gente tem muito isso. Tem pais que vem, por exemplo, para me ajudar a
organizar livros, então eu tenho muitos envolvidos. (COORDENADORA, 2018, p.
10).

Assim, percebemos que o envolvimento dos pais se dá tanto por meio de reuniões
pedagógicas como por meio das reuniões mensais da APMF. Para além, o colégio ainda conta
com a prestação de serviços de manutenção ou limpeza, realizada pelos pais/responsáveis ou
pela própria comunidade.
Sobre essa categoria, também encontramos o consenso sobre a participação dos
pais/responsáveis, na pesquisa de Ferreira (2018), aponta que após a militarização do colégio
pesquisado, houve crescimento da participação efetiva dos pais e/ou responsáveis, e que estes
passaram a acompanhar com maior interesse a trajetória escolar dos alunos. Fato esse atrelado
à cobrança dos militares e ao receio de perderem a vaga.
Emerge nas narrativas o receio dos familiares pela possibilidade de perder a vaga de
seus filhos, caso não acompanhem efetivamente o desempenho escolar, bem como, a
evidência que a figura de autoridade dos militares, remete à obediência, por meio do
atendimento à convocação para as reuniões. Notamos ainda, que em geral, há por parte da
família, a consideração de que o Colégio Polivalente, por ser um Colégio Militar possui maior
seriedade e credibilidade perante a comunidade escolar. Sobre isso, as narrativas acessadas
(CASTRO, 2016; OLIVEIRA, 2017; FERREIRA, 2018) também deram conta dessa
aproximação entre família e escola nos colégios pesquisados.

3.2.A síntese do Colégio pelas narrativas: o que é? O que forma? Para qual sociedade?

Nos encaminhamos para a conclusão dessa dissertação, assim, ao longo da pesquisa,


formulamos uma série de questionamentos que orientaram o desenvolvimento do estudo.
Assim como nós, pesquisadoras, também os indivíduos que participaram das entrevistas, ao
longo das narrativas construíram suas sínteses e considerações sobre o colégio, propiciadas
assim, pela reflexão e pelos questionamentos propostos no decorrer das mesmas. Em busca de
melhor sistematização para a apreciação de dados, optamos por também estabelecer algumas
categorias de análise.
Ao final de cada entrevista pedimos uma síntese sobre o Colégio. Exploraremos as
respostas a partir de agora.
153

3.2.1. Coexistência: duas escolas, dois projetos

As narrativas demonstraram que houve no princípio grande dificuldade de se


estabelecer relações entre a proposta do Programa Novo Futuro e as orientações provenientes
da parte militar (regimental). Evidenciamos também que após quase dois anos de
militarização, ainda existe dificuldade na formulação e unificação das propostas, que se
relaciona principalmente em relacionar alguns conceitos chaves instituídos pelas propostas,
sobretudo, autonomia e protagonismo de um lado e disciplina, hierarquia e moral de outro. O
entendimento que um dos professores (civil), que já atuava no colégio antes da militarização,
era de que a junção desses dois projetos não iria dar certo, “porque um era hierarquia e
disciplina e o outro é protagonismo juvenil. [...]porque hierarquia seria obediência sem
questionamentos, [...], e aqui seria o contrário disso, protagonismo juvenil” (PROFESSOR 2,
2018, p. 21).
No entanto, a relação que tem sido estabelecida entre a equipe militar e a equipe
pedagógica, tem proporcionado reflexões, das quais permite que seja construída a
autodisciplina, a auto-gestão, “ao invés de imposição, de obedecer sem questionar”, ele avalia
que no Programa Novo Futuro, também são trabalhados alguns aspectos que se alinham a
proposta militar, na questão da “a organização do tempo, sua organização, a organização do
espaço a harmonia” (PROFESSOR 2, 2018, p. 21)
Quanto à hierarquia, que inicialmente ele considerava incoerente com a proposta,
“também acho positivo agora, que já tinha essa hierarquia, mas é uma hierarquia que é, que eu
não vou te respeitar porque você é uma patente maior do que a minha, eu vou te respeitar
porque você é, é o meu próximo”, nesse sentido, estes alunos precisam estar aptos a
conviverem com todos, “independente da patente” (PROFESSOR 2, 2018, p. 21).
Outro professor também destaca que o trabalho desenvolvido pela equipe pedagógica
e os militares buscam “encontrar esse equilíbrio, porque em algumas questões realmente
parece distante o protagonismo do militarismo, mas eu acho que a gente tem trabalhado muito
bem”. Nesse sentido, observamos que pelas narrativas fica claro o interesse em se buscar um
ponto de equilíbrio entre as propostas.
Pelas narrativas, notamos que os professores têm conseguido perceber pontos de
equilíbrio entre as propostas e, mesmo as orientações que em um primeiro momento soaram
distantes, estão em processo de unificação e efetivação de um projeto grandioso (aos olhos da
comunidade escolar), que teve na figura dos militares os executores ideais.
154

Como a proposta (tempo integral + militar) já em certo modo unificada, o que


consideramos é que a ela é mais homogênea no papel que no movimento cotidiano, que ainda
se encontra em construção. A narrativa evidencia esse momento de construção de uma
proposta única, “Nós estamos muito em construção, [...] nós ainda não entendemos por
completo, como que é essa escola de tempo integral e militar ao mesmo tempo”. Sobre a
dificuldade de manter uma práxis entre esses dois modelos, a coordenadora salienta:
Eu tenho dois modelos, eu preciso respeitar os dois modelos, eu preciso cumprir as
regras que tem nos dois modelos, que muitas vezes fala assim, ah, lá é o colégio
militar, então é cheio de regras, as vezes eu me deparo com mais regras no modelo
de tempo integral do que no modelo militar. Porque o modelo de tempo integral ele
vem pronto de Goiânia, ele vem com as diretrizes, estabelecidas e eu preciso me
adaptar a essas diretrizes. Eu vejo assim, muito mais o rigor do tempo integral, do
que o rigor mesmo, do colégio militar (COORDENADORA, 2018, p. 6).

O rigor destacado pela coordenadora está atrelado principalmente à todas as


orientações e diretrizes estabelecidas no Programa Novo Futuro, o qual, analisamos no
primeiro capítulo. Acreditamos que esteja ligado ao que um dos professores narrou sobre a
semelhança com uma indústria. Há mapas que sistematizam a rotina, planilhas que devem ser
elaboradas, reuniões e planejamentos que devem ser sistematizados, todos exigidos pelo
Programa Novo Futuro, mas que, ganharam sinônimo de obrigatoriedade após a militarização.
Um dos professores reflete que o Colégio Polivalente,
Apesar de não termos ainda chegado a uma síntese, o Colégio Polivalente tem
conseguido manter um relacionamento dialético, entra em contradições em algum
momento, mas até o presente o que nós vemos aqui eu acho que tem sido benéfico
não só para os alunos mas para todos aqueles que estão inseridos na dinâmica dessa
escola tanto que eu acho que a experiência dessa escola é muito peculiar e particular.
Eu acho que todas essas pessoas deviam ter no sentido pedagógico porque ela nos
lança desafios do qual as outras fez com que a gente esquecesse. Então a gente
esquece a nossa função enquanto professor, a gente esquece nossa função enquanto
possibilitador como mediador de sonhos. Porque que nós esquecemos? Porque a
rotina das outras escolas não possibilita que a gente lembre desses detalhes que nós
precisamos dar os números, nós precisamos de resultados. Aqui o processo é
reverso. Aqui você não só lembra do seu real papel de construção relacionado à vida
desses meninos como você tem possibilidade de consolidar isso efetivamente por
meio da sua prática. (PROFESSOR 5, 2018, p. 16).

A narrativa nos indica que os profissionais do Colégio Polivalente têm buscado a


união desses dois projetos, de forma que ambos possam coexistir, ou seja, que não haja
predominância de uma ou de outra proposta, e sim, que ambas se complementem. Cabe
salientar, que durante o período de observação e produção de dados, a percepção que tivemos
é que o colégio tem priorizado o protagonismo dos jovens do Ensino Médio, que já se
encontravam na instituição antes de sua militarização, sendo assim, sobretudo com a
ampliação do atendimento para o Ensino Fundamental II, aos poucos esse protagonismo será
155

minimizado, e os alunos aos poucos perderão sua autonomia. Pois em um momento de


conversa informal com um dos militares, o mesmo, afirmou que os alunos do Ensino
Fundamental II são mais fáceis de moldar.
As narrativas levantam uma série de questões que ficaram nítidas ao longo do
trabalho. A congruência do pensamento de que essa escola tem formado os alunos tanto para
o mercado como para a vida. De certa forma, encontramos uma divisão estabelecida, o NC
seria o responsável pela formação científica e preparação para o mercado de trabalho e para as
avaliações em larga escala e, por sua vez, o ND prioriza a formação para a vida e para a
convivência social. Assim, os militares entram com a função disciplinarizadora, que adéqua e
molda o comportamento desses indivíduos e os tornam líderes.
Também percebemos claramente uma divisão entre Núcleo Comum e Núcleo
Diversificado. O NC pouco mencionado nas narrativas, mas que possui grande relevância
para os militares, pois é, a partir deles, que os resultados mensuráveis são alcançados
(aprovação em vestibulares e ENEM; índices). Por sua vez, o ND possibilita a ampliação da
formação dos alunos, pois possibilita aos alunos “conhecerem e participar dos processos de
gestão e suas escolhas. Bem como, opinam a nível pedagógico” (PROFESSOR 4, 2018, p. 3).
Percebemos então, que na perspectiva deste professor, a proposta pedagógica sobrepõe às
propostas militares, pois, devido ao núcleo diversificado, é que fica claramente definido qual
o posicionamento que precisa ser construído nos alunos.
Sobre essa divisão o Capítulo II, ao apresentar o pedagógico do colégio, apontou que
realmente há grande diferenciação na visão da equipe escolar sobre o NC e o ND, sendo que
um, formaria para o mercado de trabalho e o outro para a vida.

3.2.2. Hibridismo: o Frankenstein

Intuímos que os professores civis em um primeiro momento ficaram relutantes e


desacreditavam da possibilidade de sucesso da junção de duas propostas, contudo, a partir de
suas experiências, encontraram nessa junção, a solução para os problemas educacionais,
incluindo a ideia de que todas as escolas deveriam se tornar militares a partir desses moldes.
Surgiu com muita evidência nas narrativas a definição do colégio como um híbrido, isso se
dá, pela inexistência de outra instituição escolar militar e em tempo integral. Um dos
professores, faz uma analogia com a figura do Frankenstein,
Ele é um Frankenstein, porque é composto de partes, que na maioria das vezes são
partes que não fazem parte do mesmo organismo. Isso porque esse colégio é
composto por dois projetos que são em si contraditórios. Nós temos o Novo Futuro
156

com a proposta de estabelecer escolas de tempo integral. Essas escolas têm inclusive
um lema base: escola da escolha. Essa escola da escolha prevê um aluno proativo,
um aluno que é protagonista do processo de formação. Uma escola em que promove
o desenvolvimento do protagonismo, alunos independentes. Então eu acho que a
escola de tempo integral possibilita isso, uma formação, uma capacitação para esse
aluno poder ser um profissional da área que ele desejar, mas, além disso, existe a
formação dele enquanto sujeito. Então os alunos têm acesso a discussões das quais
eles não teriam em nenhuma escola daqui de Catalão, e isso eu digo com
propriedade por ter trabalhado em várias. Em contrapartida a toda essa liberdade que
nós temos no novo futuro nós temos o colégio militar. O que eu ficava confuso não
conseguia entender era como esse aspecto livre de protagonismo do novo futuro
encaixaria com a pressão militar. Só que hoje estando na escola eu entendo que, por
exemplo, a escola militar de tempo integral ela tem uma clareza em que aspecto, os
militares condicionam um comportamento em que aspecto? Você precisa, por
exemplo, entender sobre hierarquia sobre disciplina para você ser um jovem
protagonista, em que sentido? Querendo ou não nós vivemos em uma sociedade de
padrões é de regras estabelecidas. Então naturalmente nós vamos nos adequando
mediante ao que nós vamos desenvolvendo idade nós vamos nos adequando a essas
regras. Mas o ponto que eu acho interessante é que os militares da escola de tempo
integral condicionam o comportamento que possibilite o aluno ser um protagonista
com responsabilidade. (PROFESSOR 5, 2018, P. 6)

A visão que o professor tem do Programa Novo Futuro, vai de encontro com o que
está proposto no documento, ou seja, a formação dos indivíduos adequados a sociedade, que
se modificam adaptam às suas demandas. Quanto aos padrões militar, percebemos que,
considera importante condicionar o comportamento dos alunos, o que possibilita que eles
sejam protagonistas com responsabilidade.
A leitura dos professores civis entrevistados indicou a valorização das contradições
presentes na escola como chance de se “criar algo novo”. Vale reforçar que a perspectiva de
todos os docentes vai ao encontro da narrativa de PROFESSOR 5 (2018, p. 13) em que afirma
que “as contradições dessa escola são o que há de mais rico nela”. Ou seja, a mescla, o híbrido
nascido do atrito entre dois projetos antagônicos se mostra como algo de muito sucesso, que
tem promovido resultados quantitativos satisfatórios.
As narrativas deixam transparecer que estas contradições produzem momentos de
reflexão e debates, que se tornam importantes instrumentos para a busca por melhorias e
sistematizações de novas formas de organização e desenvolvimento da atividade educativa, e,
possibilita a avaliação da função da escola. Por isso, esta escola torna-se “um laboratório da
vida”, e possibilita aos sujeitos que “se identifiquem em todos os níveis que eles precisam
identificar” (PROFESSOR 5, 2018, p. 13), essa conclusão, ratifica o que encontramos nos
trechos acima apresentados bem como nas demais narrativas e sinalizam o lugar como celeiro
de possibilidades.
A fala desse professor ainda levanta questões importantes sobre a integração dos
projetos, para ele, “essa escola só é o que é por esse casamento”, interessante destacar que em
157

várias narrativas, surgiram a união das propostas é definida como um casamento bem-
sucedido. Para a equipe escolar, a base do sucesso está na seguinte fórmula, “os militares
materializam as condições possíveis de trabalho, o novo futuro domina o pedagógico de tal
forma que ele mantém sua estrutura, ou seja, no pedagógico os militares não interferem, na
materialização o pedagógico não interfere”. (PROFESSOR 5, 2018, p. 13).
O professor ainda salienta que apesar de já terem obtidos avanços nessas questões,
ainda precisam melhorar muito “e ganhar muito mais qualidade na nossa equipe”, superar os
atritos e divergências entre a parte pedagógica e militar “acho que é a nossa primeira meta,
para essa, escola ir bem, eles entenderem mais do pedagógico, e entender o tipo de escola que
nós temos, e o interesse de formação que a gente tem”. Enfim, ele conclui que a junção das
duas propostas “está dando certo, [...], eu vejo está sendo um bom casamento” (PROFESSOR
2, 2018, p. 21).
Novamente temos aqui uma divisão específica de funções, que surgiu no segundo
capítulo, como divisão das responsabilidades, e agora, surge como resposta de sucesso ao
casamento, pois, o programa Novo Futuro estabelece o funcionamento do colégio em termos
pedagógicos e a gestão militar, oferece condições para que essa proposta se efetive conforme
os critérios estabelecidos. Assim, os trechos apresentados das narrativas, corrobora para a
conclusão de que há uma crença muito grande sobre a proposta pedagógica do Colégio
Polivalente, sendo assim, o ideário construído pelos docentes é de que a materialização da
proposta de tempo integral só pode ser garantida por meio da militarização, o que ratifica e
torna-se um pretexto para o apoio geral e unânime dos docentes, sobre essa prática.
A coordenadora também ressalta que a proposta pedagógica do colégio “é uma parte
muito rica, que hoje eu não conheço um modelo de educação, conheço muitos modelos de
educação, mas o que nós temos, [...] eu não conheço algo que seja tão é completo, quanto
aqui” (COORDENADORA, 2018, p. 4).
De maneira geral, os professores estão encantados com esta instituição, em vários
trechos das entrevistas, houve a afirmação e reafirmação desse encantamento, essa paixão fica
explícita quando um dos professores afirma “essa escola que é uma escola inclusive um
projeto que eu me apaixonei” (PROFESSOR 5, 2018, p. 5). Outro professor destaca sua
satisfação em trabalhar nessa escola e, na formação que ela propõe, “Melhor projeto que eu já
participei que não é só no papel, que fala, formar o aluno na sua integralidade, em todos os
aspectos da sua vida. Porque aqui acontece, tem espaço para isso” (PROFESSOR 2, 2018, p.
4). O projeto encanta esse professor, devido aos espaços possibilitados aos alunos para que
desenvolva sua autonomia não apenas seja passivo aos conhecimentos, mas que “produza
158

também conhecimento e soluções para possíveis problemas da escola, ele seja agente de
transformação” (PROFESSOR 2, 2018, p. 4).
Outro professor salienta “essa escola me fez novamente ter utopia em relação à uma
educação que forma os sujeitos para além dos aspectos profissionais”, ou seja, uma educação
que possibilite ao aluno não só o desenvolvimento de seu intelecto, mas também, seu
desenvolvimento enquanto indivíduo “É uma educação que forma sujeitos não aptos somente
para entrar na universidade, mas aptos para a vida” (PROFESSOR 5, 2018, p.8).
Com base nas narrativas analisadas, bem como a partir das observações e conversas
informais pudemos observar que os professores se mostram satisfeitos com o trabalho
desenvolvido no Colégio Polivalente, marca disso, surge constantemente nas narrativas “Eu
estou feliz de estar aqui, eu acho que se não tivesse dando certo, eu já tinha saído”
(PROFESSOR 2, 2018, P. 20). Nesse mesmo sentido, em outra narrativa encontramos, “Mas
eu te falo, sou muito feliz aqui, muito feliz, se isso é militarização eu queria que todas as
escolas fossem assim” (COORDENADORA, 2018, P. 18).
Percebemos assim, que o projeto encanta a todos os envolvidos, sobretudo, a
proposta do Programa Novo Futuro, que é evidenciada. Em nossa percepção, os professores
desconsideram a presença dos militares e toda a homogeneização e padronização que o
sistema militar impõe aos alunos.
Na verdade, uma das coisas mais cruéis que a lógica estatal nas escolas públicas
reproduzem é a na verdade reduzir toda as possibilidades que o sujeito teria de
pensar uma vida, na verdade ele é condicionado a pensar uma única forma, então
esse condicionamento para mim é bastante violento, porque ele violenta a parte mais
essencial que nós temos que é quem nós somos. Então naturalmente essa escola
acaba sendo pra mim uma representação de utopia, de acreditar em uma educação
que pense esse sujeito ao mesmo tempo em que o qualifica não para ser exatamente
alguma coisa, mas para ele ter condições de ser quem ele quiser ser. Então apesar de
nós não termos ainda chegado a uma síntese, o colégio militar de tempo integral tem
conseguido manter um relacionamento dialético, entra em contradições em algum
momento mas até o presente o que nós vemos aqui eu acho que tem sido benéfico
não só para os alunos mas para todos aqueles que estão inserido na dinâmica dessa
escola tanto que eu acho que a experiência dessa escola é muito peculiar e particular.
Eu acho que todas essas pessoas deviam ter no sentido pedagógico porque ela nos
lança desafios do qual as outras fez com que a gente esquecesse. Então a gente
esquece a nossa função enquanto professor, a gente esquece nossa função enquanto
possibilitador como mediador de sonhos. Porque que nós esquecemos? Porque a
rotina das outras escolas não possibilita que a gente lembre desses detalhes que nós
precisamos dar os números, nós precisamos de resultados. Aqui o processo é
reverso. Aqui você não só lembra do seu real papel de construção relacionado à vida
desses meninos como você tem possibilidade de consolidar isso efetivamente por
meio da sua prática. (PROFESSOR 5, 2018, p. 30).

Observamos que a visão que o professor possui sobre a função da educação, que
contraria toda essa lógica neoliberal que tem ganhado espaço e prepondera sobre as propostas
159

e práticas pedagógicas. Percebemos que essa idealização vai contra as concepções


identificadas no capítulo I, ou seja, o professor suaviza ou não percebe o viés liberal e
neoliberal estabelecido nos documentos orientadores. O que é possibilitado justamente pelo
que Ball (2013) destaca sobre a interpretação individual das políticas. E, o próprio movimento
cotidiano permite que o professor, a partir de suas experiências com outras escolas, considere
que aquela formação projetada no Colégio Polivalente não esteja ligada ao neoliberalismo.
Um dos professores apresenta alguns dos resultados que em sua concepção têm-se
sido extremamente positivos, além de alcançarem médias satisfatórias em exames externos,
ele expõe que “a gente não negligencia o que os alunos têm que ter. Eles têm que ter
qualidade no ensino, então vamos fazer, eles têm que ter disciplina diferente, então vamos
fazer a melhor disciplina diferente que eles têm” (PROFESSOR 2, 2018, p. 21).
Percebemos claramente nas narrativas o empenho por parte de professores e militares
em elucidarem as qualidades dos projetos e evidenciarem os resultados observáveis após a
militarização. A hesitação que outrora tinham com relação a compatibilidade das propostas,
foi substituída pela certeza da congruência e garantia de que essa união tem fortalecido a
qualidade educacional pública. Enfim, que os próprios professores estão, assim como os
alunos inculcando essa lógica de poder e naturalizando o afastamento da autonomia docente
no âmbito educacional.
Na perspectiva de Professor 3 (2018, p. 7), a junção dessas duas propostas tem sido
bem vista pela comunidade escolar, “os alunos falam muito bem da escola, os alunos gostam
de estar na escola, e a comunidade ela quer vir para dentro da escola, tem muita gente
querendo entrar”, acrescenta também, que a “A comunidade aceita com bons olhos o colégio
militar”.
Completando esse raciocínio do professor, a Coordenadora (2018, p. 16) também
afirma que os dois modelos são complexos, contudo, tem trazidos resultados muito positivos,
“e eu não estou dizendo de resultados numéricos, [...] o que eu observo nessa escola é muito
além de resultados numéricos”. Considera que “é uma escola assim onde esses meninos têm
aqui a extensão da casa deles”, de acordo com sua fala, houve grande índice de aprovação no
ENEM e em vestibulares, dos quais, alguns alunos obtiveram êxito em mais de um curso ou
universidade.

3.3.A seletividade: um colégio para poucos.


160

Todos os dados produzidos ao longo dessa pesquisa, nos permite afirmar que o
Colégio Polivalente não é para todos. É para uma minoria de estudantes que, em um primeiro
momento, precisam possuir disponibilidade de horário, para cursar o Ensino Médio em
Período Integral, ou seja, já exclui boa parte dos adolescentes que principalmente, devido às
desigualdades, precisam entrar precocemente no mercado de trabalho. E, em um segundo
momento, também exclui aqueles alunos que não se adéquam às normas disciplinadoras e
homogeneizadoras de corpos e comportamentos. Essa segunda questão, foi contemplada em
algumas narrativas dos professores, que afirmaram que existe tanto para professores como
para alunos. Também exige responsáveis presentes, atuantes.
As narrativas nos permitem tal afirmação.Quando o professor fala das normas e das
prescrições a serem seguidas, ele afirma “quem não está dentro, está fora” (PROFESSOR 2,
2018, p. 15). Os próprios alunos identificaram que houve mudança no perfil dos professores,
pois os militares anseiam por mais autoridade e disciplina. Ou seja, professores e alunos que
não conseguem se adaptar, seja com o ritmo de trabalho ou com a rotina escolar, são
“convidados” a solicitarem sua transferência à outra instituição.
Outra professora ressalta que grande parte dos alunos que abandonam o colégio “não
se adéquam ao tempo integral, e não ao fato da escola ser militar. Outra avaliação que ela faz,
é com referência a aqueles alunos que “o aluno que não fica realmente porque ele não quer
ficar em escola nenhuma”. Segundo ela, são realizadas várias tentativas de conversas com o
aluno, com os pais, mas mesmo assim esse aluno não quer, “ele tem vários motivos de não
querer estar e as vezes ele é rebelde, ele é agressivo, ele é indisciplinado, mas é porque ele
não quer ficar, mas não é só nessa escola, a gente percebe que ele não quer ficar em escola
nenhuma”, por esses motivos, ela salienta que “eu vejo assim, eu vejo com bons olhos, hoje a
escola” (PROFESSOR 3, 2018, p. 7).
Sobre essa adequação dos alunos às normas do colégio, o professor militar afirma
que há alguns alunos que passam um determinado período “só recebendo transgressão,
transgressão, ele não entra no sistema... ele não aceita, ele tem um resistência enorme, ele não
quer ficar aqui... E ele pede pra sair”, de acordo com sua avaliação esses, são alunos que não
querem melhorar, que “quer ficar naquela vidinha dele... Ele quer os amigos da bagunça”,
mas, no Colégio Polivalente, esse aluno não tem essa opção, ele tem que estudar, tem que se
esforçar, “ele vai ter que ter objetivos na vida dele... Ele não quer isso, ele quer brincar, ele
quer ficar na rua... Então aqui não é o lugar dele... Aqui é o lugar de líderes... Pessoas que
querem objetivos” (MILITAR, 2018, p. 16).
161

O militar acrescenta que alguns alunos também possuem dificuldade “para se


enquadrar, mas querem ficar, [...] Ele tem a resistência, mas aqui vai ser bom... Ele não quer
sair”. Enfim, percebemos que, ou o aluno se enquadra às normas militares, ou precisa
procurar outra escola para concluir seus estudos.

3.4 Para os que nele trabalham: lugar de satisfação, lugar de reconhecimento

A coordenadora relata com emoção sua satisfação em trabalhar neste colégio, neste
ambiente e com essas pessoas que fazem a diferença, sua narrativa, bastante emocionada,
aborda questões importantes para compreender o colégio, mas acende também, um sinal de
alerta, sobre a educação que queremos construir, sobre o nosso papel enquanto profissionais
da educação e não profissionais da escola, para ela,
O que posso te falar é que, se escola militar for isso aqui, que eu estou vivendo, e aí
eu estou falando da minha experiência, não consigo dizer das outras quarenta escolas
militares que tem em Goiás, eu consigo falar da minha experiência, se isso aqui for
militarização, eu queria que todas as escolas fossem, porque eu nunca senti, é, tão
realizada profissionalmente quanto eu sinto aqui, [...] é no sentido mesmo de
formação, é de buscar as coisas, de buscar coisas diferentes, aqui não tem como
acomodar, [...]. A sensação que tinha em outras escolas, é que eu estava o sapo na
panela, eu já estava adaptando, adaptando, adaptando, que estava esperando a morte.
Aqui não! Aqui eu me renovo todos os dias, se eu não me renovo eu morro, porque,
é uma escola muito dinâmica, então hoje, Renata, eu consigo te afirmar assim ó, de
coração muito tranquilo, de alma muito leve, nessa escola, eu sou realizada
profissionalmente, porque aqui eu não vejo professor que mata aula, aqui eu não
vejo colegas que, vamos fazer um projeto de feira de ciências, Aii, para que? Você
não vai ganhar a mais, quanto é que você ganha a mais? Porque eu já escutei em
outras escolas! Eu já venho aí de uma carga de cinco anos de coordenadora
pedagógica, eu já escutei em outras escolas quando eu fazia propostas de vamos
fazer uma feira de ciências, vamos fazer algo diferente, vamos fazer um sarau nessa
escola, algo para movimentar as escolas, eu tive professores que me falavam, quanto
é que você ganha a mais para fazer isso? Isso dá o maior trabalho, seu salário vai ser
o mesmo, e aí isso me incomodava muito. E aqui quando eu proponho para os
professores do Ensino Médio, vamos fazer um sarau, os do fundamental falam,
porque só do Ensino Médio? Vamos fazer um sarau da escola inteira! [...] eu acho
que a nossa escola, não somos a escola perfeita, estamos longe disso, porque nós
temos seres humanos aqui, e o ser humano está longe de ser perfeito, mas nós temos
uma escola que caminha para ser uma escola de referência, por ser militar e tempo
integral? Talvez por ser militar, por ser de tempo integral e militar, e por ter
profissionais tão envolvidos no processo de ensino aprendizagem
(COORDENADORA, 2018, p. 17).

Outro professor também destaca seu contentamento e satisfação em trabalhar na


escola, pois considera que as escolas públicas de forma geral, reproduzem a lógica estatal,
pois não permite que o sujeito tenha a possibilidade “de pensar uma vida, na verdade ele é
condicionado a pensar uma única forma, então esse condicionamento para mim é bastante
violento, porque ele violenta a parte mais essencial que nós temos que é quem nós somos”.
162

Nesses termos, ressalta que no Colégio Polivalente, torna-se “uma representação de utopia, de
acreditar em uma educação que pense esse sujeito ao mesmo tempo que o qualifica não para
ser exatamente alguma coisa, mas para ele ter condições de ser quem ele quiser ser”
(PROFESSOR 5, 2018, p. 16).
Novamente essas narrativas trazem à tona o sentimento de satisfação contentamento
dos educadores de trabalharem nessa instituição, de pensarem na possibilidade de mudança e
de garantir aos seus alunos uma qualidade melhor, uma educação de excelência. Mas, e as
outras milhões de crianças e adolescentes, que não possuem nem as mínimas condições
necessárias para o processo de ensino/aprendizagem? E os colegas de profissão, que lutam por
mínimas condições de trabalho? Um fato intrigante é que os professores dos CEPMG não
podem participar de manifestações sociais, movimentos grevistas, ou seja, eles são impedidos
de exercer direitos constitucionais de luta por melhores condições, não apenas para a escola
que trabalham, mas para toda a sociedade.
Por outro lado, a proposta de Educação em tempo integral, com a carga horária dos
professores também em tempo integral, possibilita momentos de reflexão sobre a prática, bem
como propicia a interação entre os professores e a busca constante por melhoria do trabalho
pedagógico e, sobretudo, possibilita que sejam realizados os momentos de formação, que em
nossa concepção, são eventos importantes que proporcionam ganhos para o ambiente escolar.
A narrativa do militar evidencia um certo deslumbre pela gestão militar, ele salienta
que quando a gestão estava a cargo dos civis, “a estrutura física do colégio estava detonada,
[...]estava um caos o colégio, [...]não tinha estrutura física, no colégio”, porém, ao assumir o
comando, os militares buscaram diversas alternativas, e “está excelente em estrutura física”.
Apesar de afirmar que precisa melhorar, elucida que está bem melhor do que antes
(MILITAR, 2018, p. 16).
O militar destaca o fato de o colégio possuir conforto para os alunos, “salas
climatizadas, limpeza”, ressalta o aspecto de organização e limpeza, “você não vê um papel
no chão”, enfim, o colégio há uma grande orientação dos alunos nessas questões, o que
“acaba refletindo em casa, também, dos alunos, questão de organização, então, assim, é, o
crescimento do colégio juntamente com os militares, é bem outro, e observado” (MILITAR,
2018, p. 16).
Para o militar, há grande interesse do público externo, tanto professores como alunos,
de fazer parte do corpo docente ou discente da instituição, “Porque funciona, porque ele é
construtivo”, e, mesmo com mínimas falhas, estas são corrigidas, enquanto que em escolas
estaduais civis, “dificilmente isso acontece, há barreiras que são encontradas e não são
163

solucionadas, eu vejo assim, a construção, o desenvolvimento do colégio militar, é esse


diferencial” (MILITAR, 2018, p. 16). Nitidamente em sua narrativa ele evidencia com ar
superior que os colégios militares possuem maior capacidade de solucionar problemas e
superar barreiras do que as demais escolas.
Como evidência destaca a concorrência encontrada pelos alunos para conseguirem
uma vaga no colégio, em sua opinião, “Todo mundo quer entrar... quer vir pra cá”, ou seja,
para ele isso é um sinal de sucesso, houve resistência inicialmente, contudo, quando os
resultados começaram a ser obtidos, “Nós estamos aqui dentro, trabalhando, fazendo nosso
trabalho, quem faz a propaganda aqui é o aluno... é o aluno lá, passando em faculdade, e os
alunos chegando na casa do primo, do vizinho, do tio, do colega, e falando as maravilhas que
é isso aqui”. Avalia que os alunos que na maioria das vezes entraram conforme desejo e
ordem dos pais ou responsáveis, “com duas semanas, você pergunta para ele se ele quer sair
daqui... de jeito nenhum”. Enfim, assim como o gestor e outros professores destacaram o fato
de que alunos retornam após a conclusão do Ensino Médio, “de vez em quando batem no
portão, quer entrar... Matar saudade... Eles gostam da organização, não é? Eles gostam daqui”
(MILITAR, 2018, p. 16).
De acordo com o militar, os resultados são propiciados por meio da organização pela
qual os alunos são “treinados” a se organizarem, “Aqui nós organizamos ela, [...] Eu passo a
te organizar”, ele afirma que os ensinam e passam essa organização para os alunos, “Para ele
se organizar. Então isso, ele leva para a vida dele. Então isso é uma das diferenças”. Há
grande investimento por parte da equipe de “tornar a escola melhor”, isso porque, os militares
estão preocupados “com o nosso produto aqui dentro, [...] Para ele, ser o diferencial, que para
nós é satisfatório”, contrariando as expectativas dos professores, o militar expressa ampla
preocupação com resultados numéricos, e com a formação de líderes (MILITAR, 2018, p.
16), ele salienta que os resultados alcançados, “É bom para a gente! A gente tem orgulho
disso, então... E mostra para a sociedade também”. Enfim, fica evidente que os militares
querem garantir um desempenho excepcional e mostrar isso para a sociedade.
Assim como Castro (2016, p. 23), percebemos que os militares mantêm um
sentimento de superioridade para com os civis, o autor identificou esse caráter
preponderantemente com relação a farda, concluiu que “O próprio termo “paisano” é uma
categoria de diferenciação do mundo militar que possui sentido negativo, de menosprezo ao
“civil” – todo aquele que não é militar”. Consideramos ainda, que este sentimento se estende para
os alunos, sobretudo, em momentos de solenidades e desfiles.
164

A narrativa do militar traz à tona algumas preocupações com relação à formação


ética desses alunos, ele afirma que “eles se colocam acima dos outros alunos, por quê? Nós
somos organizados somos melhores porque nós primamos muito para a educação de líderes,
[...] Ele tem que ser o melhor”, podemos evidenciar por meio dessa narrativa, que a percepção
dos militares se distancia da percepção de formação ética e social apresentada pelos
professores, “Hoje o mundo ele é exigente, o mundo é capitalista, então o aluno tem que
buscar ser o melhor sim, [...] Então aqui nós buscamos moldar o aluno pra ele ser o melhor da
sala”, nesse contexto, ele afirma que a entrega de medalhas para os melhores alunos da escola,
estimula uma competição educacional, que em sua concepção, “faz com que ela avança a vida
os estudos deles também. Então isso é muito importante”(MILITAR, 2018, p. 6).
Contrapondo a narrativa do militar, um professor afirma que estão em um processo
formativo, “que é possível desenvolver uma escola que priorize a capacitação dos alunos no
sentido profissional ao mesmo tempo em que possibilite a formação do sujeito no sentido
ético” (PROFESSOR 5, 2018, p. 7).
Uma das professoras afirma “trabalhar no colégio militar integral é muito bom”. Isso
porque, o professor “tem apoio pedagógico, tem a parte de estrutura física, que eles oferecem,
apoio na parte da questão de disciplina, o respeito, dos meninos com a gente, com os
militares”, ela ressalta, “é muito bom” (PROFESSOR 1, 2018, p. 3).

3.4.Duas questões: O que forma? A quem serve?

Primeiro era comum ouvir o que o colégio “não forma”. Foram várias vezes que
ouvimos frases como a expressa pelo gestor “Eu não estou formando soldado para ir para a
guerra, eu estou formando gente para ir para o mundo, então o contexto é um pouquinho
diferente” (GESTOR, 2018, p. 5).Como a da coordenadora “O que eu posso te garantir é que
nessa escola nós não formamos soldadinhos, isso aí eu posso te falar” (COORDENADORA,
2018, p. 6)
Observamos que a visão da coordenadora se alinha muito à do gestor, ambos
destacaram sobre a formação de soldadinhos, no qual, de acordo com as narrativas não é o
objetivo desta instituição.
O Professor 4 (2018, p. 5) salienta “Não creio que os alunos são formados para
obedecer. Se o fazem é porque reconhecem o valor e o sentido da obediência, visto que estes
têm a liberdade (arbítrio) para ver, sentir e questionar”.
165

Apenas depois dessas frases que nos soaram como uma pré-defesa é que ouvíamos
termos como a “formação integral”. Ela aparece no trecho abaixo.
O que eu posso te garantir é que nessa escola nós não temos a intenção e nem a
pretensão de formarmos cidadãos bonzinhos e que respondam sim senhor e não
senhor, pelo contrário. [...] que ele tenha força, que ele tenha resistência, que ele
tenha sabedoria de resolver esses problemas aí fora, não que ele saia lá e aí a, o
patrão fala: -Ah, você tem que trabalhar mais duas horas! E ele diga: -Sim senhor!
Não, o que a gente quer é: -Por que eu tenho que trabalhar mais duas horas? Essas
duas horas elas serão remuneradas? Que esses meninos consigam sair e ter esse, esse
debate, com o, seja com o patrão, seja com o, na universidade, que eles tenham um
arcabouço mesmo teórico, de é oratória para conseguir debater com as pessoas
(COORDENADORA, 2018, p. 7).

Vemos que a formação integral é algo estreitado da formação para a atuação no


mercado de trabalho onde tem valor aquele capaz de questionar e buscar alternativas para a
resolução de conflitos.
Para o gestor, o Colégio Polivalente se destaca devido ao aproveitamento de tempos
e espaços promovido, bem como pelo comportamento de toda equipe pedagógica. Nesse
sentido, ele acredita “desde que os gestores tenham essa percepção da ética, da respeito ao
próximo, do tempo efetivamente sendo, o aluno tendo essas construções, é, a gente passa a ter
uma sociedade mais crítica, não só massa de manobra”, essa formação é propiciada por meio
da escola em tempo integral, que possibilita ao aluno pensar “de uma forma crítica, pra ter
uma sociedade que eleja efetivamente pessoas que tenham composição social que pensem
efetivamente na sociedade, e não, nos próprios interesses, ou no interesse de manutenção de
poder. Enfim, ele avalia que quando se possui um grupo que tenha uma percepção ética, é
possível “construir líderes muito positivos para a sociedade” (GESTOR, 2018, p. 14).
No hall do questionamento, a quem essa escola serve, o professor relata que se sentia
impotente com a educação que “o neoliberalismo tem tentado abafar e romper sempre”, ou
seja, os princípios neoliberais, privilegiam uma educação voltada para o desenvolvimento
econômico, priorizam a formação de “pessoas qualificadas para o mercado de trabalho”, o que
para ele, “é muito cruel com os sujeitos determinar e possibilitar só um caminho só para eles”.
Nesse sentido, o professor considera que nas escolas de tempo integral é possível promover
uma formação voltada para o mercado e, em contrapartida, também possibilita a formação dos
alunos enquanto sujeitos, “Então os alunos têm acesso a discussões das quais eles não teriam
em nenhuma escola daqui de Catalão, e isso eu digo com propriedade por ter trabalhado em
várias” (PROFESSOR 5, 2018, p. 5).
Mesmo após a militarização, outro professor salienta que o aluno é incentivado a
pensar e buscar a resolução de problemas e, não apenas esperar alguém resolver, nesse
166

sentido, “ele tem voz no conselho de classe, ele tem voz na reunião de gestão todo mês com o
diretor, [...]e aí ele vai dar sugestão de como resolver esses problemas, então é isso que me
encantou nesse projeto (PROFESSOR 2, 2018, p.4).

3.5.A síntese dos alunos

Ouvimos nas entrevistas que a maioria dos alunos são obrigados pelos pais a
estudarem no Colégio Polivalente por ser uma instituição militarizada. Um dos alunos
estipulou que só uma “faixa de dez por cento, que quiseram mesmo vir para cá para estudar”
(ALUNO 2, 2018, p. 4). A justificativa é o tempo integral e a disciplina que valorizam, mas
não gostam.
A maioria não gosta. Eu também acho meio puxado por ser integral, mas é o
momento que tem, a gente estuda bem mais do que em um colégio meio período. E
por ser militar muitos alunos não gostam. Por ter disciplina, aí, vem muitos alunos
de fora, e é por sorteio, e acaba que não se adéqua ao ambiente. (IBID).

O colégio seria como um mal necessário, que trará resultados positivos em um futuro
próximo, ou seja, o Colégio Polivalente é visto como um investimento futuro. Nas leituras
reencontramos o híbrido e a coexistência.Em todas as entrevistas havia a indicação do “não
gostar do colégio”, alguns não gostam da “dinâmica em tempo integral”, outros não gostam
do “militar”, houve ainda, aqueles que não gostam de “nenhum dos modelos”. Mas, por
imposição dos pais, e por considerarem aquele um ambiente importante para o seu futuro,
acabam se adaptando e se rendendo às normas e horários.
É a imposição dos pais o que obriga os alunos a frequentarem essa escola. Um dos
alunos explica essa decisão e vemos o colégio como um solucionador de problemas presentes
tanto quanto um fiador do projeto futuro.
Geralmente quando o aluno é muito custoso, aí o pai fala... “Vou levar para o
colégio militar” ... O que não adianta muita coisa, porque ele acaba sendo expulso,
porque o colégio não aceita, não vai mudar ninguém. Ou você entra no padrão, ou
você sai. Ele não vai obrigar ninguém a entrar e a estar. Mas aí, muitos dos alunos
que vieram obrigados, acabaram se encaixando, adaptando, na minha turma, por
exemplo, eu acho que veio quase todo mundo obrigado, e hoje ninguém reclama
mais. Eu acho que todo mundo se encaixou. (ALUNO 3, 2018, p. 5).

Vemos que esse processo de se “encaixar” é visto como benéfico que acontece
apenas depois do ingresso nele. A resistência dos alunos a entrar em um colégio militar,
estava relacionado ao imaginário de que seria “uma coisa horrível de se estar... quando chegar
atrasado, ter que sei lá... fazer exercício... pagar flexão... alguma coisa” (IBID., p. 3).
167

A rejeição dos alunos também depreende da avaliação de que o colégio deveria ser
para quem precisava estudar e não quem quer se tornar um policial. Porém, após um
determinado período passou a aceitar “o regime militar, porque eu gosto muito de estar no
regime integral... então a gente tem que [...] ceder de um lado... para poder conseguir do
outro”. Lembra que quando não estudava no colégio, imaginava que havia muita rigidez, mas,
percebeu que é bem diferente do que imagina, considera que a equipe escolar “eles estão
querendo nos ajudar, não estão querendo impor nada para a gente” (ALUNO 3, 2018, p. 3).
Eu me sinto bem, é um colégio que eu gosto, tenho vontade mesmo de estar aqui,
por minha vontade. E é onde eu aprendo, diferente de outros colégios estaduais, a
estrutura dele é bem melhor do que em outros colégios públicos. Para mim, todas
tinham que ser militar... são um estudo muito melhor do que os colégios públicos,
por experiência de ter estudado já, é muito diferente” (ALUNO 2, 2018, p. 4).

Na perspectiva de um dos alunos, o Colégio Polivalente tem o preparado “Para ser


um cidadão dedicado, que vai ser o futuro da nação, os próximos alunos, vai ser as pessoas
que vão desenvolver o trabalho futuro da nação (ALUNO 2, 2018, p. 5). Nesse sentido, o
aluno salienta “que é um colégio muito bom, que sempre apresenta uma estrutura, sempre
pensando no futuro da gente”. Em sua opinião, há a preocupação com o “desempenho escolar
mesmo, para a gente ter um futuro melhor, e ensina a gente a melhorar, para ser sempre
melhor para ser o futuro mesmo da nação, ser a estrutura do mundo futuro” (IBID.).
Já na perspectiva de outro aluno, o Colégio está o prepara para o vestibular e para a
vida. “Porque no projeto de vida, a gente está preparando nossa vida... E nas aulas, a gente
tem muita cobrança de vestibular”, evidencia que há extrema cobrança no terceiro ano do
Ensino Médio, que busca estimular nos alunos a análise sobre o que precisam para obter
sucesso em sua vida, “Se eu quero ser um jovem a cursar uma faculdade, a ter um emprego
digno”... porque hoje em dia, se você não tem uma faculdade, você não consegue, [...]então,
eu preciso disso, preciso estudar... preciso me dedicar”(ALUNO 3, 2018, 5). Quando
indagado sobre para que o Colégio Polivalente tem o formado, o aluno ressalta:
Para o vestibular... E para a vida, na verdade... Porque no projeto de vida, a gente
está preparando nossa vida... E nas aulas, a gente tem muita cobrança de vestibular...
Até quem está no terceiro ano fica horrorizado, não é? “Meu Deus... chega lá tantos
dias PROFESSOR Enem... como é que eu vou fazer” ...Então prepara muito a gente
para pensar... “Eu preciso disso! Se eu quero ser um jovem a cursar uma faculdade, a
ter um emprego digno” ... Porque hoje em dia, se você não tem uma faculdade, você
não consegue, não é? De um em um milhão a chance... então, eu preciso
disso.Preciso estudar... preciso me dedicar.

Pela narrativa fica evidente que o foco do colégio é a projeção de um futuro, mas não
é qualquer futuro, estes jovens precisam estar entre os melhores. A ênfase é no futuro de cada
168

um, e não do coletivo, prevalece o individualismo. Predomina a ideia do colégio como um


investimento, no qual, pais e alunos apostam que o colégio vai funcionar em prol de sua
diferenciação e de seu destaque perante os demais, ou seja, a formação dos futuros líderes da
nação.
Enfim, percebemos que todos os envolvidos passaram por uma adaptação e
adequação ao sistema militar. Há uma sensação dos professores de realização profissional e
de satisfação em poder ofertar aos alunos um ensino que acreditam ser de qualidade e que
prepara não apenas para o mercado ou para a universidade, mas para a vida.

3.6.Considerações parciais

Esse capítulo buscou compreender o pedagógico a partir das narrativas sobre as


relações interpessoais. Também o fez, apresentando a síntese que emergiu das narrativas em
três grandes questões: O que é? O que forma? E para quem ou o que?
O que sobressai nas narrativas é a hierarquia, cuja representação maior está na figura
do gestor, que em geral, para a comunidade escolar possui postura democrática e aberta. Pelas
evidências, estabelece um relacionamento pautado no respeito e no diálogo, seja com a equipe
pedagógica ou com os próprios alunos. O gestor, irradia um modelo cívico, uma liderança a
ser seguida. Nas relações entre professores e alunos vimos mais claramente a delimitação
específica de papéis dos civis e militares. Os militares percebidos como detentores de maior
poder de decisão e comando. Isso equivale ao entendimento de coexistência de duas
propostas. Quando mescla, torna-se algo positivo e rico,quando não, gera atrito e incoerência.
Quanto à relação entre civis e militares (professores ou não), percebemos que o
ambiente escolar, preponderantemente nos momentos de formação ou reuniões, é espaço de
conflitos e embates, proporcionados principalmente por diferences visões e concepções de
educação, que envolvem posturas, comportamentos e práticas. No entanto, também essas
tensões, trazem resultados positivos, visto que promovem momentos de reflexões e discussões
em busca de soluções.
A relação entre professores civis e alunos, é marcada pela confiança e acolhimento
que, teve na militarização um efeito de afastamento, mas, mesmo assim, por ser um colégio
em tempo integral, as relações estabelecidas garantem maior vínculo afetivo entre os pares.
Por sua vez, os militares no início do convívio com os alunos, mantinham uma relação
distanciada e de controle, mas as interações proporcionaram mudanças para ambos e, o
relacionamento tornou-se mais amigável e com vínculos mais estreitos. Enfatizamos então
169

que a relação com os civis é marcada por proximidade e presença. Com os militares esse
relacionamento tem-se estreitado, inclusive por influência de alunos e professores civis, mas a
base é o respeito lido como maior afastamento e verticalização na relação e acatamento à
hierarquia.
Entre os alunos existe uma emulação e competição gerada pela valorização da
diferenciação e ainda pela busca por medalhas e notoriedade. Ser melhor, estar entre os
melhores é sinal de destaque e diferenciação. A hierarquia gera também um poder, que incide
no comportamento e na dominação. O comportamento que os alunos assumem, baseia-se no
exercício de liderança, ou seja, em um primeiro momento se aprende a obedecer, para em
seguida, aprender a dominar e mandar. A hierarquia também se faz presente na constante
vigilância e supervisão imposta e normatizada entre os alunos. Quanto ao bullyng
evidenciamos que este ocorre em menores proporções considerado à outras escolas, devido à
dinâmica do tempo integral. O risco de ser punido com transgressões, também estabelecem
relações mais cordiais e comportamentos normatizados.
A relação entre os próprios alunos também é marcada pela hierarquia e liderança, ou
seja, sempre existem figuras de autoridade que impõem aos alunos certos limites e modelos
comportamentais a serem seguidos. Conforme verificado, existem conflitos entre eles, que,
em geral, são resolvidos por meio de conversas e sansões. Os próprios alunos criam meios
para resolver conflitos (semana do gelo), ou mesmo utilizam subterfúgios para burlar algumas
regras e normas estabelecidas (continência). Mas, via de regra, as relações em geral são
bastante pacíficas entre os pares, o que, na perspectiva tanto de alunos como de professores, a
dinâmica do tempo integral, possibilita maior interação entre eles.
Notamos uma participação efetiva dos pais/responsáveis na rotina escolar, seja nos
momentos de reuniões, eventos, solenidades ou mesmo por meio de serviços voluntários. Há
grande valorização da comunidade pelo Colégio Polivalente, o que não é específico apenas
nele, mas ocorre em grande parte do CEPMG conforme as dissertações acessadas
(NOGUEIRA, 2014; CASTRO, 2016; FERREIRA, 2018) que evidenciam essa questão.
Também apontamos que as famílias se submetem às normas, pelo receio de perder a vaga do
filho, ou seja, assim como os alunos, se adéquam as normas como forma de garantir o sucesso
dos filhos. Assim, temos que existe uma diferenciação no comportamento dos pais, perante os
colégios estaduais civis e militares.
Das sínteses que surgiram, quanto à questão, o que é o colégio, evidenciamos que as
narrativas apontaram que trata-se da junção de duas propostas distintas, que estão ainda em
processo de construção e efetivação em um único projeto de educação, cuja marca está na
170

disparidade entre projetos (pelo menos dois não tão bem delimitados mas com limites entre o
civil e outro militar sendo o civil mais afeito às orientações da Escola da Escolha, do PPP e do
Programa Novo Futuro e o militar à execução do regimento da política). Embora o processo, o
pedagógico em movimento tenha sido bem avaliado, não deixa de evidenciar a dificuldade de
se estabelecer ideologicamente e como formato um ponto comum entre duas propostas. É
admitido a surpresa de se caracterizar o mesmo colégio com base em campos semânticos
diferentes que adotam palavras como protagonismo, empreendedorismo e norma, hierarquia e
disciplina.
Para a problemática o que forma o colégio, percebemos narrativas de defesa nos
quais o receio inicial baseava-se sobretudo em uma perspectiva de formação de soldadinhos,
ideias constituídas a partir de leituras de outras instituições militares. Contudo, a análise das
narrativas, evidenciou que a equipe escolar (professores, militares, coordenadores e gestão)
não tem como foco a formação de cidadãos bonzinhos e passivos, na leitura deles, busca-se a
indivíduos críticos e participativos.
Avaliamos que o colégio, alinhado à Escola da Escolha, se propõe a uma formação
ampliada dos indivíduos, que vai ter como objetivo o exercício da liderança (para isso, haverá
e necessariamente existe aqueles que são formados para serem liderados), ou seja, esses
alunos são preparados para coordenar equipes, e para se adequar e adaptar às mudanças da
sociedade, em resumo, almejam funções com melhores posições no mercado de trabalho. Na
pirâmide social, esses alunos seriam incentivados e orientados, a se esforçarem e
desenvolverem suas possibilidades para alcançar o mais alto possível nessa estrutura. Se no
capítulo I, a frase síntese é “não é para todos”. O capítulo III amplia e verificamos que além
de não ser para todos, “não forma qualquer um”.
Por fim, a questão para quem ou para que serve o colégio, acreditamos e
evidenciamos que estes alunos não se formam para irem contra o sistema proposto e nem
buscar a transformação social, e sim se adaptarem às demandas da sociedade, em especial à
do mercado. Não se trata de preparar a sociedade para o indivíduo, e sim preparar esse
indivíduo para a sociedade.
171

4. CONCLUSÃO
Você não sabe o quanto eu caminhei, para chegar até
aqui. Percorri milhas e milhas antes de dormir. Eu nem
cochilei. Os mais belos montes escalei, nas noites
escuras de frio chorei. Toni Garrido, Bino Farias e Da
Ghama (1998)

A pergunta: - “Como se constitui o pedagógico do CEPMG de Catalão”? Foi o ponto


de partida para a realização da pesquisa de mestrado que deu origem a dissertação que aqui se
encerra. É preciso reiterar ainda mais a importância de respondermos a esta questão porque o
fenômeno da “militarização” da educação se coloca como pauta, como enredo e aporte ao
governo recém instalado do qual quase nada sabemos. Quando fizemos pela primeira vez esta
interrogação examinávamos o crescente número de alunos fardados por todo o país,
atentávamos a Goiás e a Catalão onde os “paçoquinhas” (como são chamados os alunos do
Colégio Militar devido ao tom dos uniformes) pululavam em profusão e galhardia pelas ruas.
Agora nossa interrogação ressoa em muitas outras vozes que tentam entender o projeto de
educação do novo presidente.
O objetivo de compreender o pedagógico do CEPMG de Catalão se estabelece assim
em novos e mais profundos tons. De necessidade mais que de curiosidade, de inquietação e
posicionamento político.
Tarefa das mais difíceis pela polêmica, pela complexidade, pela paixão que a
educação alimenta, mas que assumimos nos ancorando em um campo teórico que parte do
pressuposto de que a educação é política, e deve ser instrumento de transformação social pela
crítica, pela recusa e enfrentamento das condições que determinam um estado de coisas fixas.
Deve ser emancipadora para usarmos palavra de Paulo Freire. Assim, é da ordem do momento
frisarmos aquilo que será ancoradouro de ponto de vista, posicionamento e análise, dar conta
de que para nós a educação será sempre a recusa aos pensamentos inspirados na fala de
Durkheim (2011, p. 34) para quem “não podemos, nem devemos nos dedicar, todos, ao
mesmo gênero de vida” porque temos “diferentes funções a preencher”. E ainda contrariando
o sociólogo acreditamos sim que, todos somos feitos para refletir.
Também nos ancoramos nas discussões que compreendem a educação como um
processo social que deriva de um pensamento de classe e que manifesta nos elementos do
processo educativo os rumos da ideologia que o fundamenta. Dialogando com autores como
Mizukami (1986), Saviani (2012), Libâneo (2013) e incorporamos como lógica a ideia de que
o processo educativo reflete um projeto de mundo e de sociedade. E na esteira destes autores,
acrescidos de outros como Haydt (2011), estabelecemos o pedagógico como uma dimensão
172

do campo da didática que incorpora elementos do processo educativo (em adesão a um


projeto maior) como a organização curricular, o planejamento, a avaliação, os métodos e os
recursos de ensino.
Por fim colocamos este ordenamento de compreensão na ordem dos acontecimentos
recentes que pela via das leituras sobre políticas educacionais nos revela uma atualidade
marcada pela privatização da educação. Conforme Ball (2011) processo de aproximação de
grupos representantes de setores produtivos e econômicos da gestão educacional para
submissão da educação às demandas de mercado. Que acontece de forma sutil, complexa e
multifacetada como uma nova filantropia.
Abraçando o rigor próprio da pesquisa científica tomamos o expediente
metodológico de abordarmos o todo, que é o pedagógico a ser compreendido, em
perspectivas, dimensões diferentes e complementares. Três partes que juntas ofereceram a
compreensão do pedagógico: a primeira aquela analisada pelos fundamentos da proposta do
colégio constituídos e legitimados em um conjunto de documentos dos quais não se pode
afastar; a segunda aquela que se move diariamente, a parte do pedagógico em movimento que
é o processo educativo, a sala de aula, a dinâmica, funcionamento e a terceira parte a que
chega pelas sutilezas das narrativas sobre as relações interpessoais, expusemos o
enquadramento das funções, a dança do poder decisório, a métrica das obediências e
comandos.
Oferecemos ao longo de três capítulos estas partes. Avançando e aprofundando o
olhar sobre o pedagógico.
No primeiro capítulo apresentamos dados e análise do conjunto de documentos
orientadores do pedagógico e avaliamos que este, tanto pelo encadeamento quanto pelo
conteúdo,assenta o colégio nos propósitos de um pensamento liberal de sociedade, gênese da
tendência liberal em educação e suas tipologias como a pedagogia tradicional, a escola nova e
o tecnicismo. Pensamento que no Brasil ganha um caráter conservador que associa a educação
às exigências de reprodução do sistema capitalista.
Vemos isso na forma como o aluno é visto, centro do processo, mas subalterno em
sua condução (o bom aluno obedece). Jovem visto como futuro, liderança, mão-de-obra
qualificada para entrada no mercado pela porta da frente.Vemos isso na profusão de termos
que coloca a educação sob a métrica da sociedade do conhecimento que nunca deixou de ser
capitalista: empreendedorismo, proatividade, flexibilidade, protagonismo, tecnologia.
De formas mais objetivas é esse pensamento liberal voltado ao mercado que aparece
no documento produzido pelo governo do Estado. Nele vemos a aproximação com o
173

funcionamento da empresa. Colégio-fábrica com turnos, contraturnos, mapas de atividades e


supervisão constante. Não é o taylorismo mas a eficiência toyotista, ordenada, mas moderna.
A nova faceta se produz pela forma exitosa com a qual o pedagógico se reveste em tempos
neoliberais: pela parceria, pelo acatamento como causa de todos que aumenta a atuação de
empresários e comunidade e diminui a responsabilidade do Estado.
No regimento militar a última camada, o lustro, verniz que encapsula tudo e todos
um padrão cujo valor é tanto maior quanto maior se mostrarem o uníssono, a simetria, a
homogeneidade, a disciplinarização e a hierarquia.
Na confluência destes fundamentos (liberalismo e positivismo porque esse é o berço
do pensamento militar) vemos uma instituição calcada em princípios que manifestam o
caráter das políticas públicas disseminadas, preponderantemente, após a década de 1990 que
encontram na mescla com diferentes abordagens conservadoras energia e aceitação e dizem
respeito a privatização da educação.
Mostramos no segundo capítulo II o modo como o pedagógico é produzido na
dinâmica que se guia pelos elementos do processo educativo, da didática. Vemos inicialmente
a padronização dos corpos, cores, formas de falar e calar. A cor, marrom das fardas revela a
imposição no ambiente de uma tradição militar. As fileiras, as continências, as formações, a
passagem de comando, as regras pelas paredes, coques, cabelos curtos, unhas sem esmalte
mostram uma rotina escolar constantemente vigiada, disciplinada e hierarquicamente
organizada. Mesmo sendo um colégio frequentado por jovens há nele a marca do silêncio e de
relações cordiais. A tal ponto que quando livres (como nas disciplinas do núcleo
diversificado) os alunos não fogem ao estruturado ou condicionado.
É no movimento do pedagógico, porém que vemos espaço para artes de fazer que na
influência do liberalismo, do positivismo e em pequeno grau do pensamento progressista ou
dito de outro modo do pensamento do empresariado, dos militares que repercute na mescla ou
na coexistência de projetos distintos de educação. Mas tudo se mostra em escala de poder ou
importância como quase tudo.
Primeiro notamos nas narrativas um processo educativo guiado pela concepção de
educação como instrumento para a preparação para o trabalho depois para a seleção da
propedêutica. Em menor número de ocorrência a educação como instrumento de
transformação da realidade, da sociedade.
A organização curricular acontece como um exercício pensado para diminuir o
cansaço dos alunos, mas se mostra como atividade de ajustamento aos fundamentos da
proposta e lida com duas frentes demandantes de espaço e esforço: uma efetivada nas
174

disciplinas do núcleo comum que seguem os padrões da abordagem tradicional, temos a


premissa do professor como mestre e detentor do saber, a ênfase nos conteúdos e nos
resultados. A busca pelo cumprimento de uma educação propedêutica típica de um país
desigual que equilibra o ensino superior no expediente da seleção. Nela métodos de ensino
mais diretivos e com mais emulação.
A outra frente, estabelecida nas disciplinas do núcleo diversificado destina grande
parte das disciplinas, sobretudo as eletivas à formação dos líderes, dos protagonistas, dos
jovens flexíveis que sabem trabalhar em equipe e anseiam pela diferenciação. Menos
diretividade, a mesma supervisão. Nesta frente vimos professores disputando um espaço tido
como “mais livre”para inserir discussões pertinentes à juventude como a questão do gênero
por exemplo. E militares oferecendo uma disciplina militar para a qual faltam vagas e sobram
exigências. No núcleo diversificado a presença de uma abordagem humanista, que prevê que
o indivíduo desenvolva suas potencialidades. O tecnicismo direcionando os moldes do
indivíduo autônomo, proativo, flexível.
No pedagógico em movimento a indicação de que os recursos são outros, melhores,
em maior quantidade, reveladas pelas narrativas de professores e alunos, de que estão em um
colégio mais “rico”, um “paraíso” muito “diferente de outros colégios”. A justificativa foi
quase sempre direcionada à figura dos militares que obtém mais sucesso na conquista de
parceria, patrocínio, que transferem ao colégio sua figura de autoridade e conquistam
admiradores da “causa” do colégio.
O planejamento foi narrado em duas conotações diferentes: uma como parte da
profissão, como momento indispensável de autonomia docente e outra como supervisão,
como projeção de metas coletivas e individuais. Já é mais do que se observa e outros colégios
em que ele é documento de gaveta.
A avaliação somativa se eleva como padrão ainda que ocorra, sobretudo no projeto
de vida uma espécie de aconselhamento próprio da avaliação formativa. Ela é guiada pelo
Exame Nacional de curso, pela Base Nacional do Currículo Comum.
Vimos que no ajustamento promovido pelo pedagógico em movimento há pouco
espaço, repetindo o ordenamento documental, para a execução de um pedagógico progressista
cujo base é uma educação transformadora. Pouco espaço aos professores ainda que se sintam
satisfeitos com as condições estruturais do trabalho. No ajustamento do pedagógico o militar
aparece dominando senão o conteúdo as formas do conteúdo. É pelo regimento militar que o
ambiente e o processo ganham um tom comportamentalista pelo qual reforços e punições
175

viram elementos centrais. E pelo militar, o patriotismo, o sentimento cívico que congrega e
torna coesa a ideia de grupo.
No terceiro capítulo chegamos à síntese de professores, gestores e alunos sobre o
pedagógico do colégio. Primeiro as relações que nos mostram o porquê da necessidade
estabelecida pelas narrativas de classificar professores em civis ou militares. Um porquê
baseado na territorialização das funções e poderes. Acima o gestor militar, que comandam a
execução, depois a coordenadora civil mediando as relações entre gestão e professores. Os
civis com sua autonomia delimitada pelo padrão regimento militar. Os militares nos espaços
voltados à disciplina e ao civismo. Entre eles a cordialidade.
Narrativas em uníssono de defesa ao destacarem que os alunos não são formados
para obedecer. Dissonantes, contudo, quanto ao disciplinamento que para alguns tem gerado
a acomodação dos alunos e professores pela internalização das normas de comportamento, de
conduta, de relações. Disciplina- disciplinamento que é origem de conflitos que com o passar
do tempo tornam-se cada vez mais raros. Até mesmo os alunos dizendo que questionavam o
porquê do uniforme, o porquê do cabelo, o porquê do padrão, mas que com o passar do
tempo, se acostumaram com a rotina, ou se renderam à obediência.
Nas relações e nos conflitos deflagrados surge também a oportunidade de “criar algo
novo”, de efetivar um pedagógico que mesmo com embates produz resultados perceptíveis
nas notas, nas aprovações, no reconhecimento da comunidade e no retorno dos egressos para
visitas de saudosismo e agradecimento.
Nas sínteses das questões o quê forma? Para quem ou para quê forma? A visão de
cidadãos patriotas, disciplinados, organizados e líderes. Não de soldados, mas de cidadãos em
leitura que coaduna com aquilo que se segue e que está no manual Escola da Escolha. O
destino dessa formação também se alinha, para o mercado, para a sociedade do conhecimento,
para o mundo.
São vários elementos que vão adensando a compreensão do pedagógico do colégio
militar como algo extremamente positivo. A ideia de uma formação de excelência, a clareza
do perfil desejado do egresso como cidadão culto, ético, protagonista e líder, o diferencial do
pedagógico em movimento com tempos garantidos ao trabalho docente, com maior número de
funcionários sendo alguns militares à frente a questão disciplinar, com recursos garantidos,
com o apreço e participação das famílias e alunos preocupados com o trabalho no amanhã e
não no hoje. É persuasivo e encantador estar, atuar e estudar em um colégio que diferencia os
seus até mesmo pelas cores do uniforme.
176

Pensando nos professores é inegável o atingimento de um índice mais alto na


aprendizagem, é inegável o menor esgotamento físico e mental de estar sempre em um único
colégio e ater-se ao ensino do conteúdo deixando de lado os problemas de fora dos muros da
escola. É menor o cansaço ao lidar com aqueles que ficaram, que conseguiram ficar, que se
adaptaram, que podem estar ali e apresentar bons resultados. Pensando nos pais o pedagógico
é ainda mais positivo. Diferencia os seus, vigia os seus, cuida dos seus, prepara os seus,
corrige os seus.
Na perspectiva dos níveis numéricos e mensuráveis, o Colégio Polivalente tem se
mostrado colégio acima da média, tem oferecido uma educação de qualidade, proporcionado
uma formação ampliada, porém, para poucos selecionados alunos, e acrescentamos por
análise própria, alunos estes que, em geral, teriam sucesso em qualquer outra instituição.
Destacamos que os resultados têm mostrado que em nível de desempenho, de fato os alunos
estão conseguindo um desempenho melhor que vai possibilitar entrar nas universidades, mas
criados nesse sistema de obediência e disciplina eles vão sair trazendo resquícios dessa
formação.
Agora, pensando de onde ousamos pensar. Do lugar de pesquisadores e educadores.
Como compreender o pedagógico do colégio para além do que seduz?
O enfeixamento de todos os dados e análises nos permite afirmar a existência de
componentes próprios do fenômeno da privatização da educação. E não somos favoráveis a
ele na medida em que esse tipo de relação busca definir estratégias que possibilitem que o
campo educacional se adéque às demandas do mercado e eximir paulatinamente o Estado de
suas obrigações mínimas de oferta e qualidade de oferta. No bojo desse processo está,
portanto, a flexibilização das formas de financiamento das escolas públicas, o encolhimento
da atuação do estado na garantia dos direitos universais. Além disso, a inserção de militares
na gestão da escola, que reduz o professor à mera execução da proposta pedagógica, exclui e
interfere no seu direito e na possibilidade de lutar por uma educação mais justa e de qualidade
para todos.
No limite, a privatização diz respeito ao expurgamento da educação dos próprios
professores, o alinhamento profissional que leva a perda de autonomia, de identidade, de
poder. Quando compreendemos a lógica do pedagógico do colégio em sentido de fluxo
(empresa-governo-militares-professores) e em sentido de conteúdo (mercado-ENEM-moral-
mundo) isso é contundente no sentido de apontar que sob um manto de ordem e harmonia está
um caminho de elitização de alunos, ampliação de formas militarizadas de ajuste e controle
social e precarização de professores.
177

Assim, concluímos que o pedagógico do colégio polivalente é eficiente, mas não é


pertinente no sentido de formar para a transformação da sociedade ou pelo menos para ações
em prol da diminuição das desigualdades. Ao passo que caminha para ser a chave para a
manutenção e enriquecimento de um sistema desigual o colégio se distancia de uma educação
crítica e progressista e por isso atende aos que pensam de uma forma liberal e que não são
poucos.
Isso para nós é um risco sobremaneira quando se projeta para a educação a “Escola
sem Partido” que dentre outras medidas estipula o silenciamento do professor.Quando os que
não se adéquam são novamente convidados a se retirar.
Se já era necessário discutir sobre a disseminação dos colégios militares, na atual
conjuntura torna-se imperativo.
Esperamos que este trabalho proporcione novas reflexões a respeito da militarização
da educação, bem como abra novas possibilidades de se pensar em educação. O pedagógico
do Colégio Polivalente pela hibridez, pela coexistência, pelas partes do Frankenstein nos faz
refletir sobre a importância de pensar o projeto que queremos para Catalão, para Goiás e para
o Brasil.
178

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186

APÊNDICES

APÊNDICE A

ROTEIRO ENTREVISTA PROFESSORES


Data:_____________________
Nº DA ENTREVISTA________

1. Fale um pouco sobre sua história de vida e seu processo de escolarização.


2. Conte-me sobre a decisão de seguir a profissão PROFESSOR.
3. Em qual área você atua? Qual a sua formação?
4. Há quanto tempo você atua na educação?
5. Antes de atuar no Colégio Polivalente você já trabalhava em outra escola?
6. Como aconteceu sua aproximação com o colégio polivalente?
7. Como ocorreu o processo de organização e estruturação de todo esse processo de
implantação do CPMG em Catalão?
8. Em síntese qual seria a proposta do colégio?
9. Há muita preocupação quanto aos alunos que se formam nessa instituição, muitos
falam que formam apenas para a obediência, qual a sua opinião quanto à essa questão?
10. Como você vê a juventude do colégio?
11. Com relação ao bulling, há casos do tipo aqui no colégio?
12. Como é encaminhada a resolução de conflitos ente os alunos?
13. Na sua opinião, a gestão militar é importante?
14. Como é planejado e executado o cotidiano desse colégio?
15. Há algum acompanhamento para alunos novatos no sentido da adaptação?
16. Há algum acompanhamento para professores novatos no sentido da adaptação?
17. Fale um pouco sobre a rotina do colégio.
18. Há algum treinamento ou reuniões para explicar ou fazer um estudo sobre os
regulamentos/regimentos?
19. Quais as diferençasmais visíveis entre escolas civis e militares?
20. Para finalizar, gostaria de sua opinião acerca da proposta da Escola em tempo integral
no Colégio da Polícia Militar.

ESPAÇO PARA OBSERVAÇÕES DO PESQUISADOR.


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APÊNDICE B

ROTEIRO DE ENTREVISTA GESTOR (MAJOR)


Data:_____________________
Nº DA ENTREVISTA________

21. Fale um pouco sobre sua história de vida e seu processo de escolarização.
22. Conte-me sobre a decisão de seguir a carreira militar.
23. Como é a formação de um militar?Foi difícil sua adaptação à rotina militar?
24. Como aconteceu sua aproximação com o colégio polivalente?
25. De onde surgiu o interesse em assumir a gestão de uma escola militar?
26. Qual a sua formação? Tem formação na área educacional?
27. Como ocorreu o processo de organização e estruturação de todo esse processo de
implantação do CPMG em Catalão?
28. Em síntese qual seria a proposta do colégio?
29. A gestão militar vem se expandindo, sobretudo em Goiás, a que o senhor atribui esse
crescimento?
30. Há muita preocupação quanto aos alunos que se formam nessa instituição, muitos
falam que formam apenas para a obediência, qual a sua opinião quanto à essa questão?
31. Como o senhor vê a juventude do colégio?
32. Com relação ao bulling, há casos do tipo aqui no colégio?
33. Como é encaminhada a resolução de conflitos ente os alunos?
34. Como estão os índices de desistência ou abandono dos alunos? Quais as causas?
35. O CPM favorece ou busca a formação para a carreira militar?
36. Qual o papel que o Senhor atribui a escola?
37. Porque a gestão militar é importante?
38. Como é planejado e executado o cotidiano desse colégio?
39. Há algum acompanhamento para alunos novatos no sentido da adaptação?
40. Fale um pouco sobre a rotina do colégio.
41. Como é a seleção dos profissionais (militares e civis) que irão atuar no colégio?
42. Qual o perfil básico dos professores?
43. Houve resistência quanto a implementação do sistema atual? De onde veio e como?
44. Há algum treinamento ou reuniões para explicar ou fazer um estudo sobre os
regulamentos/regimentos?
45. Quais as diferençasmais visíveis entre escolas civis e militares?
46. Para finalizar, gostaria de sua opinião acerca da proposta da Escola em tempo integral
no Colégio da Polícia Militar.

ESPAÇO PARA OBSERVAÇÕES DO PESQUISADOR.


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APÊNDICE C

ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA ALUNOS


Data:_____________________
Nº DA ENTREVISTA________
I- PERFIL DO ENTREVISTADO (A)
1- IDADE:__________________
2- SEXO: feminino ( ) masculino ( )

II- PERFIL FAMILIAR


1- Com quem reside?
2- Alguém trabalha na sua casa? Quem e no quê?
3- Qual a renda familiar (total aproximado):
4- Quem seria o responsável por acompanhar sua educação? ( pai?, mãe?, ambos?)
5- Alguém tem curso superior? Quem?
6- Mora em casa própria?

III- SOBRE A MILITARIZAÇÃO


1- Desde quando estuda aqui? Onde estudava antes? Era um bom aluno lá? Já havia
reprovado?
2- Acompanhou a mudança para colégio da Polícia Militar?
3- Como era o colégio da polícia militar antes? As relações, as aulas, as avaliações?
4- Conta um pouco como aconteceu, como foram informados, se teve alguma orientação,
reunião etc.
5- Como sua família recebeu a notícia? Falaram em deixar o colégio? Gostaram? O que
falaram na época?
6- E você o que pensou naquela época? O que seus amigos aqui diziam da mudança?
7- Algum amigo deixou o colégio por causa da mudança?
8- Você e-ou sua família participaram da mudança? Como?
9- Deram ideias para o funcionamento do colégio? Quais?
10- Como foi o processo de mudança, o que você sentiu, você teve algum estranhamento
quando a escola se tornou militar?
11- O que melhorou e o que ficou igual? Algo piorou?

IV- PRÁTICAS E ROTINAS


12- As práticas escolares (aulas, provas, recreio etc) mudaram? E os alunos mudaram? Os
professores mudaram? Acha que melhorou?
13- Há diferença entre as aulas dos civis e dos militares? De que tipo?
14- E a direção como funciona? Existe um regimento, o que vc acha dele?
15- Como você se sente estudando aqui?
16- Do seu primeiro dia até hoje, você sente que teve muitas alterações no seu modo de
pensar a escola?
17- No colégio você percebe práticas que imagina serem semelhantes às de um quartel?
Quais?O que você acha delas?
18- Há exigência de continência entre alunos?
19- Há exigência de continência entre você e os militares?
189

20- O que é caso de advertência aqui? Piercings? Batons? Cabelos longos ou soltos, Bonés
etc...Como funciona a advertência?
21- Há bulling no colégio?
22- Como são as aulas? Usam livro e mais o quê?
23- Tem alguma atividade que passou a acontecer após o colégio passar ao comando da
polícia militar? Você gosta?
24- Você concorda comas regras do colégio? Por quê? Alguma que você não concorde?
25- Porque você escolheu esta escola para estudar? Quem escolheu?
26- Você conhece alguém que pretende seguir carreira militar?

V- PERSPECTIVAS
27- Como foi seu ensino médio aqui? Ponto positivo e negativo.
28- Você aconselharia a outras escolas públicas passarem ao comando da polícia militar?
Por quê?
29- Alguém da sua família pretende vir estudar aqui ou já veio?
30- Ela te preparou para quê?
31- O que planeja fazer a partir do próximo ano?
32- Como acha que se sairá no vestibular (ENEM)? Precisará de cursinho?

CAMPO PARA OBSERVAÇÕES SOBRE A ENTREVISTA OU ENTREVISTADO


(preencher logo após a entrevista)
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