Tese
Tese
Tese
Instituto Politécnico
de Lisboa
Escola Superior de
Música de Lisboa
Pedro Sá da Costa
Agosto de 2023
Professor Orientador – Miguel Henriques
Agradecimentos
2
Resumo
Palavras-chave
3
Abstract
Keywords
4
Índice
Agradecimentos 2
Resumo 3
Abstract 4
Índice 5
Introdução 6
A sonata op. 7 de Beethoven: considerações gerais 7
Análise da sonata 9
O piano: das origens a Beethoven 14
Beethoven e o piano 17
Performance/interpretação: história e problemática 20
A música como “linguagem” : expressão, comunicação e receção 24
A edição - considerações críticas 32
O ensino do piano: psicologia, metodologias e estratégias 34
Conclusão 54
Bibliografia 55
Introdução
5
O tema escolhido trata da Sonata para piano de Ludwig van Beethoven, Op.7 nº4. Será
realizada uma investigação que dará origem a uma revisão crítica sobre a mesma com o
objetivo de compreender a obra e de desenvolver estratégias e metodologias de ensino para
a sua abordagem ao instrumento. Essas estratégias serão apropriadas para um estudante de
piano que se encontre na condição de preparação desta obra. Deste modo, serão abordadas
questões como: dificuldades técnicas, exercícios práticos para a sua resolução, dedilhações
Estudos de Chopin, Liszt Cramer Moskovsky e Moscheles e questões de âmbito musical e
interpretativo, a problemática da notação e da interpretação/execução, questões formais,
uma análise global e, também, temas relacionados com o contexto histórico e social. Como
base para facilitar a compreensão do trabalho a desenvolver, este terá, como suporte ao
texto, ilustrações com exemplos de passagens em forma de notação. Basear-me-ei na
edição Urtext da Henle Verlag de 1976 editada por Bertha Antonia Wallner. Esta será
comparada com as edições de Heinrich Schenker pela Dover Publications, New York 1975
e de Artur Schnabel pela Curci Milano 1949, bem como com a edição original de 1979. De
modo a abordar esta obra de maneira aprofundada, irei estudá-la de forma detalhada ao
piano, e recorrerei a diversa literatura publicada em torno desta sonata. Temas como, a
história do piano, a problemática da interpretação, as questões relativas à edição das obras,
a psicologia da música e outros, serão, também, alvo de uma profunda investigação
bibliográfica. O objetivo deste trabalho será adicionar informação concreta e relevante para
o estudo desta obra, quer no campo teórico e musicológico, quer no campo do ensino,
contribuindo, desta forma, para uma melhor compreensão e consequente aprofundada
abordagem e interpretação, por parte dos alunos, que irão trabalhar esta sonata como parte
do programa a executar.
6
"GRANDE SONATE pour le Clavecin ou Piano-Forte Composée et
dediée a Mademoiselle La Contesse BABETTE DE KEGLEVICS
par Louis van Beethoven
Oeuvre 7 A Vienne chez Artaria et Comp.”
Análise da sonata
Exposição
Na tonalidade de Mi bemol maior e em compasso binário composto, a sonata
começa com um tema que evoca o toque de trompas- um dos muitos tópicos musicais
utilizados desde o Barroco- e que poderá significar o chamamento do carteiro com notícias
(o símbolo da trompa mantém-se nos logotipos dos correios), ou evocar um ambiente
idílico, em que a natureza e o campo são a imagem representada (refira-se, novamente, que
a sonata é dedicada à condessa Babette von Keglevics, sua aluna na época, e que terá
inspirado Beethoven na composição da obra). O tema é introduzido após um motivo
enérgico no baixo em que a tonalidade é anunciada de forma reforçada por acordes
cerrados. No compasso 17 surge uma transição até ao compasso 34 composta por
elementos escalares e evocação de acordes, sugerindo, de novo, o tópico do anúncio das
trompas. O segundo tema surge na dominante (Si bemol maior), do compasso 35 até ao
compasso 59, primeiro na mão esquerda e depois, no compasso 51, na mão direita, com o
início formado por grandes saltos- 7ª m e 13ª m. A segunda parte do segundo tema, em
textura de coral, tem início no compasso 61 e evoca um momento de louvor e harmonia,
como que anunciando um estado de felicidade e paz. Outro motivo, em colcheias, é
introduzido a partir do compasso 68. Os dois motivos temáticos são apresentados
sobrepostos, com uma modulação a dó maior no compasso 82, retornando a si bemol maior
no compasso 93. Esta tonalidade é reforçada, na terceira parte do segundo tema, com a
apresentação do acorde em compassos sucessivos terminando numa escala cromática e em
oitavas quebradas, sempre com a apresentação das notas da tríade de si bemol maior,
terminando com acordes quebrados sobre uma pedal no baixo e uma conclusão sobre os
acordes de tónica e dominante de si bemol maior. Um final de exposição bastante assertivo
e esperançoso. A exposição é, depois, repetida.
Desenvolvimento
9
O desenvolvimento é bastante curto. Beethoven parece não querer desenvolver
muito as ideias apresentadas na exposição, como que evitando uma conclusão não
desejada. Utiliza alguns motivos da exposição, transformados, dando-lhes um caráter
diferente, como que sugerindo dúvidas e anseios. Na tonalidade de dó menor e, depois de
fá menor, surge o motivo de terceiras descendentes e de motivos escalares ascendentes e
descendentes, neste caso, criando um ambiente de tensão e dúvida (compassos 137 a 152).
Entre os compassos 153 e 168 aparecem as figurações sincopadas do final da exposição
com um climax no compasso 164 em sol menor, resolvendo em dó maior no compasso
168. Surge, novamente, a partir do compasso 169 o motivo de terceiras descendentes com
fragmentos rítmicos introduzidos entre os compassos 25 e 32 da exposição, agora em lá
menor e ré menor. O motivo de terceiras descendentes, agora invertido (compassos 187 e
188) prepara a transição para a reexposição.
Reexposição
10
estamos perante um tipo de escrita com antecedentes na estética barroca em que a música
“saltou” do Trivium para o Quadrivium, onde passou a ser tida mais como uma arte do
discurso (expressiva) do que uma ciência matemática (do cálculo). A secção A termina no
compasso 24. Esta secção é formada por dois subtemas aba, de 8, 6 e 10 compassos,
respetivamente, sendo a parte b na dominante. Segue-se a secção B (compassos 25 a 50)
em lá bemol maior- quatro compassos- (subdominante da tonalidade de mi bemol maior),
em fá menor (quatro compassos) e em ré bemol maior (quatro compassos). Suportado por
baixos em staccati (semelhante a pizzicati nas cordas) , a textura, aparentada a um coral,
termina, no compasso 37, com o regresso dos motivos curtos com pausas e com o tema do
início em oitavas no registo agudo, agora em si bemol maior, a que se segue uma descida
no âmbito sonoro até ao compasso 50 com figurações rítmicas duplamente pontuadas e em
sf (compassos 45 e 46). Entre os compassos 51 e 73 regressa a parte A do andamento, com
ligeiras transformações melódicas e, neste caso, a subsecção a, com, apenas, nove
compassos no final. A coda abre com a mão esquerda a evocar um motivo da secção B,
durante quatro compassos. No compasso 79 surge o tema inicial com ligeiras
transformações, conduzindo ao final, numa cadência perfeita.
Allegro
12
compositor surpreende-nos com a omissão da segunda parte da secção A, evitando o tema
em f , como se quisesse acabar a sonata num clima de tranquilidade. Sobre a mão esquerda
em acordes arpejados e quebrados, em fusas, Beethoven evoca, em notas curtas com
acciaccatura, uma despedida plena de incertezas.
.
13
que se possa dizer que tenha sido do agrado dos compositores. Coexistindo com o
clavicórdio e o cravo, ao longo do século XVIII, o piano foi, paulatinamente, ganhando
estatuto, devido aos constantes melhoramentos e inovações, precisamente durante a vida de
Beethoven, o que determinará de forma concreta, o modo de escrita e o estilo nas obras do
compositor. Ao longo deste período, as composições para teclado não especificavam o
instrumento a que se destinavam, sendo necessário, para as abordar no piano atual,
observar de forma minuciosa as características da escrita, a fim de as interpretar de um
modo coerente e aceitável. Relativamente à sonata em análise neste trabalho, dever-se-á
realizar uma investigação, com o objetivo de conhecer que tipo de instrumento Beethoven
terá usado aquando da sua composição.
Um influente fabricante de pianos, Gottlieb Gottfried Silbermann, teve um papel
fundamental nos primeiros anos do desenvolvimento do piano. Silbermann, que teve
contacto com J. S. Bach e com o seu filho C. P. E. Bach (na altura, ao serviço de Frederico
II, o Grande, da Prússia), aperfeiçoou o piano e introduziu o princípio do escape (simples),
após algumas críticas desfavoráveis por parte de J. S. Bach, o qual considerava o teclado
muito duro e os agudos fracos, e foi o primeiro a empregar o termo piano-forte, sendo
considerado o grande impulsionador dos primeiros pianos alemães. Carl Philipp adquiriu
um piano Silberman, tendo publicado, em 1753 e em 1762 o seu “Ensaio sobre a
verdadeira arte de tocar instrumentos de teclado”, que viria a ter um papel fundamental em
Beethoven. As inovações de Silbermann incluíam registos manuais para levantar os
abafadores agudos e graves e um melhoramento no dispositivo para deslocar o teclado
lateralmente, fazendo com que os martelos tocassem, apenas, numa das duas cordas
disponíveis, enriquecendo a sonoridade e aumentando a expressividade do novo
instrumento. Dois dos alunos de Silbermann viriam a ter grande influência no futuro do
piano: Andreas Stein ( inventor do chamado mecanismo alemão de ação dos martelos, mais
tarde aperfeiçoado e apelidado de mecanismo de ação vienense), e Johannes Zumpe (que,
em Londres introduz o mecanismo de escape de Silbermann, e irá desenvolver o chamado
mecanismo inglês,). Juntamente com Stein, J. Andreas Streicher vai contribuir para o
melhoramento dos pianos Vienenses. Estes pianos eram de toque mais leve e mais sensível
às variações de toque e dinâmica, enquanto que os Ingleses, mais pesados e robustos,
possuíam maior sonoridade mas eram menos expressivos. Ainda em Londres, outro
importante fabricante de pianos, John Broadwood, continuou a desenvolver a mecânica do
tipo inglês, tendo sido o responsável pela introdução do pedal de prolongamento (sustain),
sendo estes pianos os favoritos de Beethoven, pois permitiam uma maior paleta de
14
sonoridades, o que iria determinar o estilo da escrita para piano do compositor. Refira-se
que Muzio Clementi, em Londres, foi o grande responsável pelo sucesso que viriam a ter
os pianos em Inglaterra. Sebastian Érard, alemão radicado em França, seria outro
construtor de pianos que iria revolucionar a história do piano, com a invenção do duplo
escape, que iria proporcionar grandes avanços na técnica pianística, nomeadamente no
surgimento dos virtuoses.
Numa entrevista para a revista Scherzo, de 1990, Paul Badura-Skoda afirmava que
as características físicas e mecânicas do pianoforte do tempo de Mozart são muito
diferentes das do piano atual. Desde a espessura do tampo harmónico, passando pela
densidade e tensão das cordas e seu consequente tempo de vibração e mistura dos
harmónicos das notas, todos estes fatores levam a que, por exemplo, acordes no registo
grave soem mais límpidos ou que os agudos não vibrem durante tanto tempo no pianoforte,
ao contrário do que sucede nos pianos modernos. Assim, deve-se ter em conta esta
problemática ao abordar peças daquela época tocadas em pianos modernos, sabendo-se
adaptar indicações na partitura, de dinâmica ou a utilização do pedal, e até omitindo notas-
por exemplo, acordes cerrados na mão esquerda, que num pianoforte soam claros, não
sucedendo o mesmo num grande piano atual. Do mesmo modo, há que ter em consideração
tudo isto no que diz respeito à forma como se devem executar todos os tipos de
ornamentação, dado que, em alguns casos, serviam para colmatar insuficiências do
instrumento, quer para criar o efeito de notas longas, quer para evidenciar alguns aspetos
relativos ao fraseado.
15
Beethoven e o piano
Beethoven
"God knows why my piano music still makes the worst
impression on me, especially when it is played badly."
Beethoven
18
Performance/interpretação: história e problemática
19
A
Claude Lévi-Strauss
“You will ask me where I get my ideas. That I can not tell you.
They come unsummoned, directly, indirectly. Incited by moods
which are translated by poets into words, by me into the
tones that sound, and roar and storm about me
until I have set them down in notes.”
Beethoven
Beethoven
Beethoven
20
A escolha da edição de uma obra musical é sempre uma questão problemática, mas, ao
mesmo tempo, muito interessante, estimulante e fonte de investigação musicológica, e que permite
um enriquecimento e uma constante descoberta de novas formas de abordar as peças com o
objetivo da sempre desejada e renovada execução das mesmas. É por esta razão que
compreendemos as diferentes edições que uma obra pode ter, diferenças essas fruto de novas
descobertas, de modos alternativos que intérpretes e editores propõem, derivados de
leituras/interpretações pessoais de acordo com os estilos e convenções da época, entre outros
fatores. No entanto, devemos apresentar sempre um olhar crítico e fundamentado sobre as várias
edições para poder tomar a opção que nos parece mais apropriada, sem nunca nos fixarmos, para
sempre, numa única, pelas razões atrás apontadas. Não tem existido, ao longo do tempo, consenso
entre os estudiosos de Beethoven, quando comparam o manuscrito autografado e a primeira edição
das sonatas e decidem qual será o mais fiável. A posição atual, entre os musicólogos, é a de que
nenhuma das duas opções é considerada consistente, à partida, e que, para cada obra, deverá ser
feito um estudo crítico aprofundado. Por volta de 1860, com a proliferação das edições de
Beethoven, surgiram dois tipos de edições das suas sonatas: o do intérprete-pedagogo- caso de
Hans von Bulow-, com anotações, muitas vezes, arbitrárias, “imagens” verbalizadas e
”melhoramentos” textuais com sugestões interpretativas, e o do teórico-analista, como Hugo
Riemann, mais focado na exegese harmónica e tonal e na estruturação frásica e sintática. A partir
do século XX, a tendência voltou-se para as edições originais e manuscritos, como é o caso da
edição de Schenker e, posteriormente, das edições de Casella, Schnabel e Tovey. Nestas edições as
indicações para a interpretação são mais objetivas e historicamente informadas, o enfoque
pedagógico é abandonado e opta-se por uma edição mais preocupada com a origem do texto,
conduzindo, no entanto, a uma falsa noção, quase de reverência, ao chamado Urtext. Nas últimas
décadas têm surgido, por parte da musicologia, muitas críticas relativamente a alguns
critérios/opções adotados por parte dos editores ao longo do tempo. Existem edições com
instruções relativas a elementos de notação, como a indicação do tempo, dinâmicas, fraseados ou
uso do pedal- quando na notação original nada consta-, edições essas que, no ato da performance,
irão condicionar a audição e apreciação, e que, posteriormente, com a sua divulgação, dão lugar a
uma nova visão estética da obra, podendo chegar a “contrariar” a intenção do compositor. As
edições Urtext são um caso paradigmático desta problemática. Tidas como “Fassung letzter Hand”
ou versão definitiva de uma determinada obra, foram durante muito tempo vistas como a opção
mais fiel ao texto e que refletiam as intenções finais do compositor. No entanto, sabemos que os
manuscritos entregues ao editor eram, em geral, pouco minuciosos e que, mesmo depois de
preparados por um copista, raramente eram revistos pelo compositor (cite-se, no caso da sonata op
21
7, o erro que se encontra no compasso 157 do primeiro andamento- quintas paralelas-, na edição
original de 1797, e que é corrigido nas edições posteriores que serão alvo de análise neste
trabalho). Deste modo, os editores, perante uma dúvida ou ambiguidade, resolviam o problema de
acordo com as suas competências e tendências estéticas e estilísticas. Beethoven, em muitas
ocasiões, via-se obrigado a responder e a criticar as opções tomadas por editores que alteravam as
suas indicações ou que tomavam decisões em caso de dúvida, muitas vezes decisões
completamente contrárias às suas intenções. Especialistas têm vindo a desacreditar algumas destas
edições por não conterem instruções/indicações adicionais ao texto. Por exemplo, as edições da G.
Henle Verlag, fruto do contexto histórico-social da época, e que surgiram depois da Segunda
Grande Guerra, as quais, devido à sua comercialização e proliferação obtiveram um estatuto
considerável e que, ainda, se mantém. O próprio Gunter Henle afirmava que o original e a primeira
edição eram diferentes e que havia a necessidade de se tomarem opções, sem, no entanto, serem
indicadas as razões para tal. Assim, fica por esclarecer se a edição é, na verdade, o texto original
(Urtext) ou a interpretação que dele se fez. Já em 1841, Robert Schumann denunciava
publicamente as edições imprecisas e corrompidas da música de J. S. Bach, Mozart e Beethoven,
chamando a atenção para a necessidade de um estudo cuidado e aprofundado dos manuscritos.
Felix Mendelssohn, numa carta a Ignaz Moscheles em 1846, queixava-se das “liberdades” tomadas
pelos editores. As edições de grandes intérpretes ou teóricos como, Liszt, von Bulow, Arrau ou
Schenker e Riemann, foram, gradualmente, perdendo a importância que tinham, resultado dos
conhecimentos históricos adquiridos no campo da prática performativa e, também, pelo crescente
interesse nas potencialidades expressivas do pianoforte e da influência que este vem tendo, por
parte de muitos pianistas, na abordagem das obras do período clássico no piano atual.
No meu entender, deve-se pensar o texto musical como algo a que se dá vida, sempre
renovável, tal como um texto dramático ou uma coreografia, e que devemos, como “intérpretes”,
fazer renascer a obra musical à luz das mais recentes investigações, do contexto em que nos
inserimos, e da nossa sensibilidade estética e artística, sem, claro está, ultrapassar os limites do
aceitável. Pode-se afirmar que o trabalho de um editor, e de um intérprete, nunca está terminado.
Neste trabalho, das muitas edições que existem das sonatas de Beethoven, optei por
selecionar quatro edições da sonata nº 4 : Vienne da Artaria et Comp. de 1797, Schenker de 1918,
Schnabel de 1949 e Henle Verlag Urtext de 1976.
A edição de Viena de 1979 ainda refere a sonata como sendo para Cravo ou Piano-Forte,
algo normal, na altura, pois o cravo ainda era um instrumento muito comum. As indicações de
dinâmica, no entanto, comprovam que Beethoven tinha o Piano-Forte em mente. É desprovida de
qualquer indicação para o uso do “pedal” (ainda se utilizavam, na altura, mecanismos acionados
pelo joelho, ou de forma manual). Como é natural, não possui qualquer informação adicional ou
notas explicativas. É apresentada na horizontal- mais adaptada às estantes do piano, o que facilita a
leitura e a compreensão global.
A edição de Schenker foi publicada pela Universal Edition em Viena/Leipzig entre 1921 e
1923 e reeditada numa versão revista por volta de 1946/47 e, em 1975 pela Dover Publications. A
Universal Edition afirmava, na altura, que “ as alterações e contaminações que se perpetuavam na
maior parte das edições anteriores, em detrimento do seu conteúdo, tinham sido eliminadas, tendo
como referência os manuscritos, as cópias revistas e as edições originais, pelo que, pela primeira,
se apresentava uma reprodução fiel aos originais de uma das maiores criações musicais”. Schenker
aboliu, das edições anteriores, as indicações de fraseado, dinâmica, pedal, etc., argumentando que
23
Beethoven teria assinalado essas indicações se tivesse achado necessário. No entanto, introduziu
dedilhações e, também, comentários elucidativos.
A edição de Schnabel foi publicada pela Ullstein em Berlim entre 1924 e 1927 tendo sido
reeditada em Nova York pela Simon & Schuster em 1935 e, posteriormente, na Rússia.
Considerada por muitos como uma preciosidade, esta edição integra notas do autor relativamente à
interpretação, tais como, indicações metronómicas, de dinâmica, uso curioso de numerais romanos
para indicar a extensão do número de compassos de determinadas frases, indicações de execução
em italiano e indicações para a utilização de pedal. Dá uma especial importância ao tempo a
atribuir à fermata, indicando valores temporais concretos. Também emprega dedilhações suas,
embora de forma esparsa, com o objetivo de uma melhor execução no que diz respeito ao legato,
tendo sempre em mente o uso do pedal para esse fim.
24
fundamentada e consciente na abordagem ao ensino do piano. Cerqueira toma como referência a
“Teoria da Aprendizagem Pianística”, de José Alberto Kaplan (1935-2009).
O Ex. 1 fornece o diagrama dos conceitos e processos que, a seguir, irei desenvolver.
25
A divisão dos tipos da memória em cinestésica, visual, auditiva e lógica na performance musical
foram feitas pela primeira vez por Matthay (1926), sendo utilizadas por Kaplan”.
1. Memória Cinestésica: armazenamento de informações relativas ao movimento.
2. Memória Visual: retenção de informações provindas da visão. Na prática instrumental,
trabalha ao serviço da memória cinestésica, contribuindo para a automatização dos
movimentos.
3. Memória Lógica: entendimento das relações formais e estruturantes da obra, do estilo
e da linguagem musical, sendo fixados e reconhecidos, estando associada ao
conhecimento racional. Chaffin et al reforçam a importância da análise na
identificação de padrões, visando a retenção do conteúdo musical.
Psicomotricidade: utilização e aquisição das informações de movimento, obtidas através da
consciência. Através de uma educação motora consciente, habilidades motoras são aprimoradas e
evocadas a cada vez que o executante trabalhar um novo repertório. Sendo assim, trata-se da
capacidade de aprimorar e coordenar movimentos. Porém, é necessário observar que podem ser
adquiridos vícios motores através de um estudo desatento e mal direcionado.
Dissociação: desenvolvimento da coordenação motora através de ações musculares
conscientes, buscando maior eficácia e menor utilização muscular (economia de movimento).
Assim, o corpo passa a ser controlado pelo cérebro mais eficientemente – do movimento à
consciência. Este processo é fundamental para a assimilação de habilidades motoras.
Automatização: incorporação de movimentos adquiridos através da dissociação. Distingue-se
do ato reflexo por ser produto de atitudes conscientes, pois é obtida através do estudo. Portanto,
trata-se do armazenamento de um movimento na memória – do movimento à memória.
Compreensão: entendimento das estruturas musicais e da forma (razão), além da consolidação
de uma visão interpretativa sobre a obra em questão (intuição), ou seja, da consciência à memória.
Evocação: utilização de conhecimentos exteriores à obra que influenciam a compreensão
musical, como o estilo musical, a identidade histórico-cultural da obra e conhecimentos de prática
instrumental adquiridos ao longo do tempo, entre outros. Logo, parte da memória à consciência.
26
● Utilização do metrónomo para compreensão da estrutura rítmica e auxílio na automatização
de movimentos, não devendo ser utilizado aquando do estudo da execução da peça, pois
limita a interpretação, nomeadamente no que diz respeito a questões agógicas.
● Repetição de determinados trechos da obra, com significado musical, o que permite
trabalhar a memória, o movimento e a consciência.
● Repetição da peça por diversas vezes, trabalhando a memória e a segurança.
● Estudo por pontos de referência, permitindo auxiliar a memória e reconhecer secções da
obra.
Técnicas de estudo:
● Estudo de mãos separadas, principalmente em passagens complexas, permitindo uma
melhor compreensão e memorização das mesmas.
● Estudo sem pedal em trechos assinalados com o mesmo. Esta estratégia permite, ao aluno,
reagir, apenas, à sonoridade com o controle digital, não dependendo da sonoridade final
quando utiliza o pedal. É muito importante, principalmente, porque prepara o executante
para os diversos tipos de ambiente acústico e diferentes pianos.
Todas estas estratégias e metodologias de trabalho deverão ser implementadas tendo em
vista, sempre, o aluno como indivíduo com as suas idiossincrasias, colocando, em primeiro
lugar, a motivação e o empenho do mesmo. Isto é, devemos saber adaptar e modificar
certas metodologias e estratégias quando estiver em risco a perda da motivação e do
empenho do aluno, contornando, habilmente, algumas resistências que possamos notar por
parte do aluno. Devemos, no entanto, incutir-lhe, sempre, a importância da persistência e
do trabalho necessários para se poder atingir o nível indispensável à realização de uma
performance compensadora e frutuosa, dignificando e valorizando, desta forma, as
extraordinárias criações artísticas que grandes compositores nos legaram.
Conclusão
Bibliografia
27
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29