Genograma Esperança
Genograma Esperança
Genograma Esperança
Zaida Borges Charepe1, Maria Henriqueta de Jesus Silva Figueiredo2, Margarida Maria da Silva Vieira3,
Luís Miguel Vicente Afonso Neto4
1
Doutoranda em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa. Docente no Instituto de Ciências da Saúde da Universidade
Católica Portuguesa. Portugal. E-mail: [email protected]
2
Doutora em Ciências de Enfermagem. Docente na Escola Superior de Enfermagem do Porto. Portugal. E-mail: henriqueta@
esenf.pt
3
Doutora em Filosofia. Docente no Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica Portuguesa. Portugal. E-mail:
[email protected]
4
Doutor em Educação. Docente na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa. Portugal.
E-mail: [email protected]
RESUMO: Nos contextos do cuidar da família da criança com doença crônica, vários têm sido os desafios que se colocam às equipes
de enfermagem, no âmbito da promoção de esperança, em contexto da avaliação e intervenção familiar. O genograma e ecomapa
constituem-se como veículos para uma compreensão mais aprofundada dos vínculos e padrões de interação da família. Pretendemos
apresentar a utilização do genograma e ecomapa na identificação dos recursos de esperança junto a mães de crianças com doença
crônica. Trata-se de uma investigação qualitativa, onde foram identificados os factores que influenciam a esperança nos grupos de
ajuda mútua. A colheita de dados foi realizada através de entrevista semi-estruturada a vinte mães, de Julho de 2009 a Junho de 2010.
Os resultados permitiram identificar os padrões de interação em esperança, os atributos pessoais dos seus membros, a base espiritual
e as memórias moralizantes, possibilitando uma reflexão acerca da rede familiar, como rede de força, resiliência e empowerment.
DESCRITORES: Família. Crianças com deficiência. Confiança. Pesquisa qualitativa.
ABSTRACT: Within the care settings of families of children with chronic diseases, there are challenges nursing teams have to face
within the scope of fostering hope with the context of family assessment and intervention. The genogram and the ecomap have become
vehicles for a deeper understanding of attachments and family interaction patterns. We propose the utilization of genograms and
ecomaps in identifying resources for hope for mothers of children with chronic diseases. This is a qualitative study which identified
factors that influence hope in mutual help groups. Data was collected through semi-structured interviews with twenty mothers,
carried out from July of 2009 to June of 2010. The results permit the identification of patterns of interaction with hope, the personal
attributes of its members, spiritual bases, and moralizing memories, enabling reflexion on the family network as a network of strength,
resilience, and empowerment.
DESCRIPTORS: Family. Disabled children. Trust. Qualitative research.
RESUMEN: En el contexto de los cuidados de la familia del niño con enfermedad crónica distintos han sido los retos que se plantean
a los equipos de enfermería en el ámbito de la promoción de esperanza en el momento de la evaluación e intervención familiar. El
genograma y ecomapa se constituyen en un vehículo para la comprensión más profundizada de los vínculos y de los modelos de
interacción de la familia. Tenemos la intención de proponer la construcción de un genograma y ecomapa para identificar los recursos
de esperanza con madres de niños con enfermedad crónica. Se trata de una investigación cualitativa, donde se identificaron los factores
que influyen en la esperanza en los grupos de ayuda mutua. La recolección de datos se realizó a través de entrevista semi-estructurada
de veinte madres, de Julio de 2009 a Junio de 2010. Los resultados muestran los modelos de interacción en esperanza, los atributos
personales de sus miembros, la base espiritual y las memorias moralizantes, haciendo posible una reflexión sobre la red familiar, como
una red de fuerza, resiliencia y empowerment.
DESCRIPTORES: Familia. Niños con discapacidad. Confianza. Investigación cualitativa.
utilidade, sobretudo, junto de famílias de crianças tificação dos padrões de interação em esperança
com doença crônica.25 Ao ser proposto um geno- com os distintos membros da família (dimensão
grama de esperança, proporcionou-se a descoberta contextual); nas histórias de esperança narradas
e a identificação dos fatores de desenvolvimento e na respectiva expectativa da sua continuidade,
da esperança das mães de crianças com doença tendo em conta o vivido, o momento atual e o que
crônica, participantes no estudo. esperam do futuro (dimensão temporal); na iden-
Numa abordagem genuína, mas ainda rudi- tificação, apropriação dos seus atributos pessoais
mentar da esperança, enquanto construto teórico, e recursos de esperança, tal como o envolvimento
esta foi explanada considerando as dimensões que dos mesmos nos relacionamentos estabelecidos
a caracterizam.21 Destas, destacamos os componen- com a família (dimensão afiliativa); e, por fim, na
tes que estruturam a experiência da esperança: as interpretação das suas memórias moralizantes
mães participantes no estudo centraram-se no seu centradas na esperança e no desejar um melhor
processo emocional e de espera, perante o prog- futuro (dimensão cognitiva).
nóstico/evolução da sintomatologia associada
à doença dos seus filhos (dimensão afetiva); na Identificação das histórias de esperança
orientação de objetivos/metas em prol de uma Da análise do genograma de esperança
gestão mais adequada do tratamento/acompa- (representado na Figura 1), confirma-se a centra-
nhamento (dimensão comportamental); no modo lização dos padrões de interação de esperança na
como traduziram a espera perante o futuro e inter- família nuclear, tal como a identificação dos recur-
pretaram as suas experiências de vida pela iden- sos de esperança nos membros que a integram.
ciou junto do seu marido, filhos e pais. Dentre outros a irmã com convulsões chegando até a ajudar-nos [...]. A
exemplos, os “momentos de respiro” só possíveis de professora do meu filho tem me contado que ele só celebra
ocorrerem pelo apoio que a sua mãe lhe disponibiliza as coisas boas da irmã [...] quando por exemplo a irmã
a tempo inteiro. Estes momentos são citados como riu pela primeira vez [...] se não foi internada quando
“[...] um espaço de tempo em que os pais não têm adoeceu [...] é um optimista [...] só vê as coisas boas [...]
a responsabilidade de cuidar da criança, estando a e isso dá-me muita força (Mãe A). Ao referir-se ao seu
mesma a ser cuidada por outros cuidadores[...]”.26:66 marido: [...] encara os desafios com muita energia [...]
Este apoio permite ainda a manutenção da sua vida é um optimista e consegue sempre roubar um sorriso na
profissional, sentindo-se sustentada na gestão das filha [...] vê também sempre o melhor dos problemas e das
limitações que a sua filha de três anos de idade apre- dificuldades [...] (Mãe A). Por sua vez, a expressão da
senta, quer ao nível da partilha no cuidar da criança, base espiritual, nesta família, foi percepcionada pela
quer na procura de recursos na comunidade. presença de crenças religiosas num dos membros
Em continuidade, destacou na sua mãe, como do casal e na avó materna. Quanto aos recursos de
atributos pessoais, a coragem no enfrentamento esperança presentes no subsistema individual (na
das dificuldades e retrocessos impulsionados pelas mãe A), a ancoragem na questão “o que tem apren-
complicações inerentes à doença crónica da criança, dido de melhor sobre si com a doença da sua filha”:
o carinho e a serenidade, sobretudo nos momentos [...] a coragem [...] o ser capaz de lutar e conseguir atingir
de partilha e orientação para o futuro. Tal como é o que for melhor para ela [...] até porque há famílias e pais
demonstrado na figura 1, esta orientação foi citada com situações em casa bem piores (Mãe A). Perante o
também no casal, sendo determinante para o em- mencionado foi possível tecer as seguintes conside-
powerment desta família, pois permite o estabeleci- rações: o subsistema conjugal é eficaz no estabelecer
mento de um plano de atividades e distribuição de de metas e objetivos concretizáveis na resolução
tarefas, prevenindo o desgaste físico e mental por de situações perante a adversidade, o que lhes tem
sobrecarga do cuidador: nós conseguimos muito bem permitido prosperar com carinho, apoio e coesão.
distribuir tarefas [...] quando uns não estão avançam Significa que existe uma resiliência familiar bem
outros [...] e quando a minha filha está doente trocamos sucedida, depreendida pela qualidade das interac-
a vigília [...] num dia ficam uns acordados no outro dia ções familiares e atitude optimista, continuando a
há uma troca [...] (Mãe A). família a amar e apoiar os seus membros mesmo
perante os desafios inesperados.27
A mãe enfatizou o carinho, a coragem e o
otimismo no seu marido e no filho de 7 anos de Da leitura do genograma representado na
idade: o meu filho compreende perfeitamente o que a figura 2, depreende-se a existência de distintos
irmã tem e adora a irmã por isso é muito carinhoso com padrões de interação em esperança para além dos
ela [...] por outro lado é um corajoso sobretudo quando vê identificados na família nuclear.
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ANEXO 1