Novos Estudos em Próximo Oriente
Novos Estudos em Próximo Oriente
Novos Estudos em Próximo Oriente
PRÓXIMO ORIENTE
André Bueno [org.]
Reitor
Mario Sérgio Alves Carneiro
Chefe de Gabinete
Bruno Redondo
Direção
Pró-reitora de Extensão e Cultura
Cláudia Gonçalves de Lima
Produção
Obra produzida e vinculada pelo Projeto Orientalismo,
Proj. Extens. UERJ Reg. 6078, coordenado pelo Prof.
André Bueno [Dept. História].
Rede
www.orientalismo.blogspot.com
Ficha Catalográfica
Bueno, André [org.]
Novos Estudos em Próximo Oriente. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Proj. Orientalismo/
UERJ, 2022. 95 p.
ISBN: 978-65-00-54416-9
História da Ásia; Orientalismo; Próximo Oriente; Oriente Médio; Islã; Árabes.
No âmbito das relações modernas, ‘Resiliência: uma breve história sobre a luta
das mulheres curdas’ por Tanya Mayara Kruger, é um excelente texto sobre as
questões de gênero e afirmação do feminino dentro da sociedade curda,
marcadamente islâmica, em processo de autodeterminação e historicamente
pressionada por diversas tensões étnicas e geográficas. Já ‘História é poder:
conflito israelo-palestino revolução ou terrorismo?’ por Yasmin Rodrigues
Roque e Jeanne Silva, toca na ferida crucial das impressões que temos
construído sobre as relações entre israelenses e palestinos, duas sociedades
igualmente atravessadas por conflitos de escala geopolítica que se projetam
sobre suas existências cotidianas.
André Bueno
Primavera, 2022
Introdução
Maria Madalena é uma personagem um tanto enigmática de versões distintas
construídas sobre esta mulher, e no tocante a teologia a suas narrativas
referente à sua pessoa e sua História apresentam interpretações pelos
evangelhos, sendo uma delas de uma mulher pecadora ou sendo Maria
Madalena dita como prostituta. Já dentro da literatura, como exemplo a obra o
Código Da Vinci, romance de Dan Brown [2004] apresenta essa personagem
não como uma prostituta, mas como uma suposta companheira de Jesus e
mãe de uma filha fruto de uma relação carnal com Jesus o nazareno. Um
romance um tanto polêmico que apresenta alguns nuances históricos sobre
Maria, representada também na Longa metragem do filme com o mesmo nome
o ‘Código da Vinci’.
Maria Madalena assim como Jesus pertenciam a essa tradição Judaica, assim
é importante abordar nesse ponto qualquer descrédito ou intolerância aos
Judeus, pois Jesus nasceu Judeu, viveu como Judeu e morreu como Judeu.
Não existe até o momento uma relação de Maria Madalena tenha casado
diante os registros históricos, apenas algumas especulações de um possível
casamento em Migdal. Essa especulação foi representada na série mexicana
Maria Magdala produzida por Lina Uribe, Darío Vanegas e Jaqueline Vargas,
[2018] na sua cidade casou-se contrariada ao seu pedido de seu pai ao se
casar com um Judeu chamado Ur. Logo depois, pressionada pela violência de
Ur, Maria foge da sua residência e logo foi presa como escrava por um
centurião romano.
Outro fato que não existe também provas históricas é que entre Maria
Madalena e Jesus Histórico havia um relacionamento afetivo ou que até
mesmo Maria era supostamente esposa de Jesus. Essa versão foi difundida
pelo fato de uma passagem do texto apócrifo de Felipe em que relatava que
“Maria beijava Jesus”, ora, a questão do beijo era comum também entre Jesus
e seus apóstolos, sendo assim essa ideia de Jesus e Maria terem um
matrimônio e uma mera especulação que não se prova tal versão.
.
Os textos testamentários nos fornecem narrativas da ressurreição de Jesus e o
quanto está enfatizando a presença das mulheres nesse início do movimento
cristão, e uma das mulheres que se apresentam neste episódio pós-morte e
ressurreição do nazareno é Maria Madalena conforme quadro explicativo
segundo: [Chevitarese, 2012].
Mas o detalhe que Maria Madalena estava presente nesse episódio e das
diversas narrativas bíblicas dos evangelistas informam versões distintas sobre
aparição angelical, o ponto foi a aparição de Jesus, dado como ressuscitado, e
o mesmo se apresentou para as mulheres, sendo elas Maria ou Maria
Madalena, antes até de Pedro, como cita os textos de Mateus 28:9-10 e
também o de João 20:14-17. Já os textos de Lucas 24: 34 e de Paulo aos
coríntios 1.15:5 afirmam que Jesus apareceu primeiro a Pedro, sendo assim
para Chevitarese [2012], torna-se bastante contundente a preocupação dos
textos Lucanos e Paulino em terem uma ideia de divisão de gênero com
apreciação a visão de Pedro da imagem de Jesus ressuscitado.
Esse fato da presença de Maria sublinha sua relação com a imagem de Jesus
ressuscitado como a escolhida para dar a boa nova aos demais discípulos;
mas por outro lado, trechos Paulinos tentam obscurecer a presença de Maria
não somente nesse fato, como em outros acontecimentos no período inicial da
formação da igreja. Crossan [2010] faz uma reflexão com relação aos textos de
Paulo, em que alguns momentos passam a mensagem de um conservadorismo
baseado em modelo de um cristianismo Romano com preceitos de uma
sociedade patriarcal, como cita Paulo aos Efésios 5:22-24: “Vós, mulheres,
sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor; Porque o marido é a cabeça
da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, sendo ele próprio o
salvador do corpo. De sorte que, assim como a igreja está sujeita a Cristo,
assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos”.
Outro texto Apócrifo de Felipe, que já abordamos aqui sobre o beijo entre Maria
Madalena e Jesus, que para muitos era uma relação conjugal, analisamos aqui
pelo lado de um confronto e de posição dentro da missão de Jesus, conforme o
texto de Felipe-Nag Hamaddi: “Quanto Maria, o Senhor [afeiçoado o amou]
mais que [todo] o discípulo [e] o beijou na boca. O restante dos [discípulos] 64
[. . ] Eles lhe disseram: Pedro perguntou: “Por que você o ama mais do que a
todos nós”. Esse questionamento é notável, e Pedro estaria intrigado pelo
quanto Jesus considerava Maria Madalena, e isso causou a Pedro um
sentimento de descrédito pela aproximação entre Maria e Jesus.
Deste modo, esses acontecimentos que revelava o quanto Maria era admirada
por Jesus, consequentemente após a morte do salvador se tentou obscurecer a
imagem de Maria, principalmente nos anos iniciais da formação da Igreja
Cristã. Assim poucas são as citações da vida de Maria principalmente nos
evangelhos. Pedro certamente se sentiu ameaçado por esta mulher, que era
motivo de seus questionamentos do seu envolvimento com o Nazareno.
Porém nos momentos mais difíceis da vida de Jesus, Maria estava presente e
compartilhou do seu sofrimento desde a sua prisão até após a sua morte. Já
Pedro, apesar de ter sido um mártir pela igreja católica, negou a Jesus três
vezes quando ele estava preso na fortaleza Antonia e levado ao sumo
sacerdote, conforme comentado no evangelho de Lucas 22:54-71.Então como
Assim durante anos Maria Madalena foi esquecida e ignorada desde o início do
cristianismo arcaico, pois seria difícil esta personagem e sua história resistir a
uma sociedade com um pensamento machista, pensamento este pautado por
conceitos e teologias preconceituosas.
Considerações Finais
Não é de hoje que discutimos e observamos as tendências machistas e
preconceituosas referente a figura do feminino em todos os setores da
sociedade. No nosso século ainda vemos o quanto a sociedade tem tendências
machistas e que tenta ridicularizar e minimizar a importância feminina, tanto
social, político e religioso, na qual este último é sustentado pelo conceito do
fundamentalismo. A História apresenta diversas pesquisas sobre a mulher e
suas perspectivas de lutas, embates sociais para promover seu pertencimento,
visibilidade na trajetória nos mais diversos períodos.
Referências
ELOIS ALEXANDRE DE PAULA. Graduado em História Fafi-UV União da
Vitória-PR, Especialista em História Cultura e Arte UEPG, Ponta Grossa-PR
BROWN, Daniel Gerhard. Mário Dias CORREIA (trad.). O Código da Vinci. Edi
Sextante, Rio de Janeiro, 2004.
CHAVES, Júlio Cesar Dias. A biblioteca copta de Nag Hammadi uma historia
da pesquisa, Oracula, São Bernardo do Campo, 2.4, 2006. Acesso em
http://www.uel.br/laboratorios/religiosidade/pages/arquivos/textosNaqHammadi
LERR.pdf. 12/07/2022
TOMMASO, Wilma Steagall. ‘Maria madalena nos textos apócrifos e nas seitas
gnósticas’. Revistas Puc SP, Último Andar [14], São Paulo, 2006: ACESSO
EM https://revistas.pucsp.br/index.php/ultimoandar/article/view/12896.
Introdução
Os debates acerca da Base Nacional Curricular Comum [BNCC] possibilitaram
importantes reflexões públicas acerca do lugar ocupado pela História enquanto
disciplina escolar e, consequentemente, acerca daquilo que era/é abordado em
sala de aula. Nesse sentido ganhou visibilidade [principalmente nas
considerações sobre a primeira e segunda versão da BNCC] a discussão sobre
a pertinência, ou não, de se estudar História Antiga e Medieval num país como
o Brasil. No caso de afirmações positivas, outras indagações eram
necessárias: como estudá-las? Que usos do passado queremos e devemos
realizar?
Sobre a fonte
No século X Ahmad Ibn Fadlãn recebeu uma ordem do califa da dinastia
abássida Almuqtadir Billãh para deslocar-se até o reino dos búlgaros do Volga
[na região da atual Bolgar, Rússia] visando atender a solicitação do rei dos
búlgaros, realizada por meio de uma carta endereçada ao citado califa, pedindo
auxílio na construção de uma mesquita, um mimbar e um forte de proteção. O
pedido, que oficialmente tinha como base um suposto interesse em propagar o
Islã enquanto fé, tinha nas entrelinhas uma dimensão política: visava o apoio
do califa contra aqueles que visavam subjugar os eslavos [CRIADO, 2019].
De acordo com Criado [2019] o relato de viagem produzido por Ibn Fadlãn foi
utilizado no século XIII d.C [VII H.] sendo, depois disso, encontrado novamente,
ainda que de forma incompleta [pois não há vestígios do retorno à Bagdá]
somente em 1923 no Irã. O pesquisador ainda nos informa que essa versão
parcial passou a circular em 1939.
O referido relato circulava em vários idiomas; entre eles o inglês [versão mais
procurada pelos estudiosos de literatura árabe que desejavam ter contato com
a obra]. Em 2018 a editora Carambaia, numa parceria realizada com Pedro
Criado, publicou uma versão em português traduzida diretamente do árabe. A
grande procura fez com que uma nova edição bilíngue fosse publicada em
2019 [CRIADO, 2021], versão essa utilizada neste trabalho.
A viagem
Viagem ao Volga pode ser inserido no gênero textual literatura de viagem
[CRIADO, 2021]. Cabe destacarmos dois pontos: o significado da viagem para
o Islã medieval e dos produtos dessas viagens que aqui estamos denominando
de literatura de viagem. Aqui recorremos à Bissio [2010, p.5] que argumenta o
seguinte: “Para os muçulmanos, todo conhecimento humano, seja relacionado
à religião ou não, tem a sua origem em Allah, o Deus único e o escopo do que
os seres humanos podem conhecer é claramente delimitado pelo Corão, que
invoca a onisciência de Deus [BISSIO, 2010, p.5 ].”
Com uma cultura que tanto valorizava as letras e o ato de viajar surgiu na
civilização árabe textos sobre tais experiências. São registros e contos
daqueles que viajavam em decorrência das mais distintas razões: comércio,
religião, busca por conhecimento ou guiados pela própria curiosidade. Viajar
se tornou um ato característico do povo arábe, mesmo que para eles já fosse
reconhecido os riscos de tal ato: contrair doenças, se deparar com assaltos,
desvios de rota e ocasionalmente morte. Ibn Fadlãn, por exemplo, não apenas
é consciente desses perigos a serem enfrentados, como também o expressa
em vários momentos de sua narrativa. Estes perigos são perceptíveis na
própria escolha do trajeto a ser realizado: a opção por um caminho longo está
relacionado com a consciência de se evitar passar por territórios de grupos
inimigos. Os perigos da viagem podem ser vistos em passagens tais como:
Breves considerações
Durante o medievo as viagens entre os mulçumanos se caracterizaram como
importante instrumento de expressão da fé e de aquisição de conhecimento,
sendo importante destacar não apenas o conhecimento em relação ao “outro”,
mas também em relação a si: suas práticas, crenças, costumes e tudo o mais
que pudesse caracterizar o viajante como um fiel de Allah. No caso do relato
em questão, o contato com povos não arabizados (ou em vias de tornar-se)
possibilitou ao viajante contato não apenas com climas e vegetações
totalmente distintas daquela de Bagdá, mas também com práticas e valores
que, em quase nada, se assemelhavam aos seus. Embora estejamos olhando
tudo a partir da perspectiva de Ibn Fadlãn, encontramos em sua narrativa
indícios de que enquanto ele observava [e por vezes julgava] tudo
atentamente, os grupos com os quais teve contato também faziam o mesmo
com ele e sua comitiva.
Referências
Felipe Lomba Ferreira é graduando em Licenciatura em História pela
Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e estuda em sua iniciação a
construção identitária armênia a partir do cinema.
Introdução
Ibn Battuta é uma figura ímpar no Islã. É muito possível que historiadores do
século XIV o tenham como uma fonte, mesmo tendo como recorte de estudos
a Índia, a China, o Mali, dentre outros locais. Quase trinta anos distante de
sua terra natal renderam ao marroquino inúmeras experiências com os mais
diversos outros e as mais diversas realidades. Em 1325 ele viu sua cidade
natal, Tânger, sumir no horizonte. Sua intenção era a peregrinação à Meca,
mas ele foi bem além. O viajante passou por Argel, Bugia, Túnis, Tripoli, para
finalmente chegar a Alexandria. Adiante ele vaga por várias localidades da
Península Arábica e da região da Pérsia. Após isso, seu próximo destino é a
costa índica da África, em Mombaça e Kilwa, no século XIV. O tangerino
retorna ao Egito e, dessa vez, parte para a Anatólia. Nesse momento de sua
viagem, ele conhece o chefe do Ilkhanato e parte rumo à Constantinopla.
Finalmente, Ibn Battuta viaja para o extremo oriente. Permanece na Índia por
cerca de dez anos, no qual ele atua como qadi, assim como nas Maldivas.
Antes de retornar para o Marrocos, ele visita o Sudeste Asiático, a China e a
ilha de Sumatra. Por fim, em 1349 ele retornaria ao Sultanato Marínida, em
Fez. Entretanto, os longos deslocamentos não cessaram: após dois anos, ele
novamente viaja rumo à Península Ibérica. Após isso, próximo de 50 anos de
vida, ele se uniu a uma caravana e cruzou o Sahara e chegou ao atual Mali.
Entretanto, Ibn Battuta não parte e é bem sucedido sem antes haver um
contexto prévio estabelecido de viagem, isto é, sem as condições materiais
para realizar tal feito. Apesar da peregrinação ser um dos principais motivos
dos viajantes, vale ressaltar que ela não era a única. Esses personagens
possuíam vários objetivos e eram figuras multifacetadas, podendo ser
mercadores, estudantes, embaixadores, missionários ou aventureiros
[TOUATI, 2006, p. 830].
O Islã
Um recorte interessante a ser feito é quanto ao Islã e sua prática no oceano
Índico. Ao pensar nisso, é imprescindível localizar a rihla de Ibn Battuta em
uma posição de fonte qualitativa. O particular e o individual de um homem
podem demonstrar a maneira em que o Islã se expandiu para diversos locais
no século XIV, além dos costumes que passavam pelo seu filtro individual. Ele
está localizado em um momento em que regiões, no índico, encontram-se entre
o Islã como religião estrangeira trazida por comerciantes e um Islamismo
adotado pela nobreza e o governante. Obviamente essas relações são
complexas, com diversos fluxos que englobam inúmeras localidades.
Eis a situação de Ibn Battuta: alguém que é a ponte entre um Islã ortodoxo e o
estrato popular. Na Índia e nas Maldivas, ele deixa de ser apenas um
observador para ter poder de legislação sobre o outro. A partir disso, há de se
notar que o príncipe dos viajantes tem consciência de sua persona como um
estrangeiro e sabe que a legislação dali é construída de maneira diferente de
sua terra natal: o Maghreb. Até a própria madhhab [escola de jurisprudência] e
Nas Maldivas, por exemplo, o maghrebino narra que o primeiro costume que
ele altera é a da permanência das esposas na casa do marido mesmo após o
divórico. Para fazer cumprir isso, por mais que ele reconhecesse as
diferenças, ele açoitou alguns homens. Aparentemente, isso parece ter tido
sucesso, entretanto, nem todas as suas ações tiveram êxito. Uma delas, por
exemplo, foi a tentativa de vestir as mulheres.
O comércio
Por fim, a rihla fornece também informações sobre o comércio praticado na
costa. Os produtos comercializados através das rotas marítimas do Oceano
Índico e atestados na rihla de Ibn Battuta demonstram as conexões existentes
entre os povos do Oceano Índico. Dentro deste contexto, um recorte
interessante a ser feito é o da comida e seu fluxo, assim como dos cauris
[wada] das Maldivas.
Sobre os alimentos, vale ressaltar que o primeiro livro de receitas no Islã data
de aproximadamente do fim do século X, que contém uma coletânea dos
desenvolvimentos culinários de um emergente grupo comerciante em Bagdá.
Até o século XIV, podem ser apontados diversos livros que discorrem sobre a
comida, além de discussões teológicas, como o próprio Al-Ghazali, autor com
grande influência no sunismo. Esse assunto é importante em Ibn Battuta, já
que ele oferece um material rico em questões como recursos alimentares
[WAINES, 2010].
As comidas e como elas são preparadas dizem muito sobre o fluxo material e
cultural, além de revelar uma relação com a própria religião no sentido da
Referências
Gabryel Garcia Lima é graduando em História pela Universidade Federal do
Espírito Santo [UFES]. Atualmente é bolsista pela CNPq e desenvolveu,
durante dois anos, pesquisa de iniciação científica na área de África Antiga
sendo integrante do projeto: Representações sociais,alteridades e estigmas na
África Antiga e Medieval.
IBN BATTUTA. A través del Islam. (trad., Introd. e notas: Serafín Fanjul;
Frederico Arbós). [S.l.]: Titivillus, 2017.
WAINES, David. The odyssey of Ibn Battuta. Londres: I.B. Tauris, 2010.
É muito comum existir uma aura de curiosidade quando debruçamos nos livros
de história e nos deparamos com os sumérios. Sua existência gerou um status
quase “místico”, sempre sendo atribuída como o berço da civilização. É claro
que não podemos negar as influências humanísticas, como a literatura,
urbanismo, escrita, que por volta do quarto milênio a.C., no Sul da
Mesopotâmia, começaram a ficar mais evidentes, e hoje são os alicerces do
que é considerado “civilizado”. O que muitas vezes é apresentado como
sumérios, é um conceito muito vago, que geralmente pressupõe uma
comunidade homogênea, de um povo que não se sabe muito sobre as origens,
e que teriam migrado para a Mesopotâmia se estabelecendo como a “cultura
mais avançada” daquelas redondezas, ganhando primazia sobre as outras.
Uma característica adicional que geralmente se apresenta como o “milagre
sumério”, é o surgimento da escrita cuneiforme, que fomentou tudo o que viria
a ser a “civilização mesopotâmica” e suas zonas de influência. Um ponto
importante de reflexão para entendermos questões étnicas e culturais dessa
região, é nos distanciarmos desse substrato uniforme sumério, e partimos do
princípio que essa sociedade coexistiu com culturas distintas que fizeram parte
de sua construção histórica.
O Problema sumério
Um ponto muito debatido na historiografia mesopotâmica foi a questão étnica
da região, conhecido como o famigerado “problema sumério”, que
resumidamente baseia-se na discussão se os sumérios eram os habitantes
No entanto, isso não significa que o portador do nome semita falasse alguma
língua relacionada a esse tronco, nem que a presença de um nome sumério
apontasse para outra coisa que não o contexto social e religioso. Diante das
dificuldades de esboçar qualquer figura etnolinguística do início da
Mesopotâmia, a velha dicotomia sumério/acadiana às vezes é substituída com
outra supostamente mais sutil: norte (semita) contra o sul (sumério). Tal
polaridade é na maior parte do tempo baseada em seus diferentes sistemas de
posse de terra, mas que no final das contas, recicla a tradicional divisão étnica.
Mesmo com duas línguas diferentes bem atestadas, a história e cultura
mesopotâmica devem ser entendidas como uma rica tapeçaria, cujos variáveis
fios estendiam-se ao longo de um período de mais de três milênios, com uma
variedade geográfica continuamente pontuada por interações com outras
áreas. (RUBIO, 2007, p. 8). Essa problematização é fundamental para não
cairmos na trampa de buscar as “origens da civilização”, e como muito bem
lembra Nicole Brisch (2013, p. 111), embora exista um desejo de investigar os
atores por de trás desse “prelúdio”, devemos entender que a designação
“sumério”, em primeiro lugar, deve ser aplicada ao fator linguístico, não para
um grupo étnico. Os sumérios se denominavam como “povo da cabeça negra”,
e chamavam seu habitat simplesmente de “terra nativa”. Provavelmente uma
reconstrução da palavra Kengi (r) = lugar e Gir = nativo. Já a linguagem
suméria era conhecida como eme-gir, literalmente “língua nativa”.
Períodos arqueológicos
Com base em um conjunto arqueológico de artefatos, pondera-se que a cultura
mais antiga da Mesopotâmia meridional é a de Samarra datada do sexto
milênio a.C. Ela fora identificada em lugares como o leste iraquiano perto da
fronteira com o Irã, e também ao norte de Bagdá. Ana María Vázquez Hoys
(2004, p. 16) descreve que esse período foi caracterizado por sua cerâmica de
superfície bege clara, um pouco arrugada e decorada com temas geométricos
pintados de vermelho vivo com asserções figurativas de animais e dançarinos.
Essa sociedade aparentemente exercia atividades como a agricultura, pecuária
e caça, praticando uma forma rudimentar de irrigação; utilizando as cheias do
Tigre para regar os campos de trigo, aveia, cevada e linho. O centro do
assentamento apresentava um fosso, talvez para proteger os habitantes contra
invasores. As casas possuíam certo estilo arquitetônico em plano retangular,
O período que segue Ubaid é conhecido como Uruk (4000 – 2900 a.C.), onde
ocorrera a substituição da cerâmica pintada, por uma sem adornos e feita em
tornos, denotamos aqui o surgimento de traços mais sofisticados tanto nos
aspectos urbanísticos quanto humanísticos, não tendo mais características de
um povoado, mas sim algo muito similar com o que viriam ser as cidades-
estados sumérias, e como bem resume Harriet Crawford (1991, p. 17) o
período Uruk foi caracterizado pelo rápido crescimento da quantidade de
assentamentos e o surgimento de uma hierarquia em quatro níveis. Pela
primeira vez essas construções tinham tamanho suficiente para serem
chamadas cidades. Com mudanças acentuadas, veio à tona o desenvolvimento
de um sistema administrativo complexo com uma sociedade estratificada, com
o advento do que podemos chamar líderes seculares.
Para começarmos a ter uma noção dessas redes, é necessário explicar como
esse período fora importante para enrijecer contatos com outras regiões, é o
que Guillermo Algaze (2008, p. 68) defende como “expansão de Uruk”, que
resumidamente podemos entender como uma integração das sociedades da
Mesopotâmia meridional por volta da segunda metade do quarto milênio, onde
a cultura dessa região foi difundida por nódulos em várias localidades, embora
Gonzalo Rubio (2007, p. 20) aponte que essas conexões culturais poderiam ter
existido já no quinto milênio no período Ubaid. A penetração de Uruk foi um
processo de implantação citadina, ao passo que as formas sociais e urbanas
mesopotâmicas foram introduzidas em paisagens essencialmente virgens
(ALGAZE, 2008, p. 69). Apesar dessa explicação ter muitas controvérsias por
se basear na Teoria de sistema-mundo do sociólogo Immanuel Wallerstein, e
pelo fato de muito pouco sabermos do período Uruk, ela é um caminho para
entendermos essa teia que gerou uma gama de entrepostos ao sul,
estabelecendo locais estratégicos de suma importância na periferia
mesopotâmica, beneficiadas pela intersecção dos rios e outras rotas terrestres.
Período Protodinástico
O período Protodinástico é mais abundante em fontes textuais e dados
arqueológicos, sendo maior em sua composição e homogeneidade histórica.
Essa época é constantemente classificada como a “clássica Suméria” que tanto
ouvimos ser o berço da civilização. No entanto, uma reconstrução do passado
sumério é um exercício bastante complicado, e como muito bem destacou
Samuel Noah Kramer (1963, p. 33), essa sociedade não escreveu uma história,
na concepção geral de seu significado, em termos de desdobramento e
processos subjacentes. Os intelectuais sumérios, não possuíam conhecimento
de definição ou generalização, nem uma abordagem evolutiva para uma
avaliação histórica. Limitados pela visão cotidiana do mundo, aceitando a
verdade axiomática de fenômenos culturais e acontecimentos. A denominação
de sequência arqueológica chamada Protodinástica foi estabelecida pelo
Instituto Oriental de Chicago, e segue classificada em subdivisões (PD I, II, III A
e B).
Para Marc Van de Mieroop (2004, p. 41) após o período Uruk, a influência da
Mesopotâmia meridional cessou em outras partes do Oriente Próximo,
restringida no âmbito local, embora alguns séculos mais tardes essa rede de
conexões voltou a ser estabelecida. Certas habilidades como a escrita se
tornaram abundantes (embora raras fora da região sul-mesopotâmica),
possibilitando um melhor entendimento do desenvolvimento político e cultural.
A organização se deu em forma no estabelecimento de cidades-estados, que
constantemente viviam em interação competindo uma com a outra. Paul Garelli
(1982, p.69) menciona que o processo de urbanização já se mostrava
avançado na planície meridional. Duas linhas de cidade desenhavam curvas
aproximadamente paralelas próximas ao Eufrates, e um canal que ligava este
Mario Liverani (2016, p. 151) faz uma análise sobre a distribuição do vale
mesopotâmico durante essa época, e conclui a existência de um arranjo
regional mais engendrado, embora as comunidades estivem um tanto isoladas
por estepes áridas ou pântanos. Piotr Michalowski (1997,p. 98) chama a
atenção para o conjunto de artifícios simbólicos e outras similaridades na
cultura material, que levam o leitor a crer que a Suméria foi uma entidade
cultural, todavia, existia muita diversidade entre as cidades-estados, assim
como semelhanças superficiais. Elas foram propícias para novas elites
regionais e hierarquias locais de poder, diferentes representações simbólicas
dessas relações e novas categorias (principalmente escribas e sacerdotes),
que possuíam suas posições e controle sobre esses símbolos. Tais grupos
tinham um forte interesse no status quo e as forças separatistas resultantes
das cidades sumérias, resistiram às tentativas de unificação em um estado
territorial.
Fontes
Como já mencionado, as fontes históricas desse período são mais
consistentes, embora não nos permita formar uma construção detalhada do
passado. No campo da cultura material, Amelie Kuhrt (2000, p. 43) menciona
que esses objetos são procedentes de diversos centros urbanos em forma de
restos de edifícios, placas esculpidas, selos cilíndricos, figuras em posição de
oração e cerâmica. Já o aparato escrito encontra-se distribuído de forma
desigual ao longo de toda essa época, formado por grupo de tabletes que
correspondem a diversos depósitos de anos distintos. Uma das principais
fontes textuais para a interpretação das cidades-estados é conhecida como
“Lista Real”, apesar de alusões a reinados que duraram milênios, fazendo nos
questionar sobre a natureza mitológica dessa fonte. I.M Diakonoff (1991, p. 74)
descreve que essa lista registra todos os reis que supostamente governaram
em ordem consecutiva, sucedendo um ao outro nas múltiplas cidades da
Mesopotâmia desde o início dos tempos. A sucessão real em uma mesma
cidade, era convencionalmente relacionada a uma dinastia.
Outras fontes importantes, mas não tão conhecidas, são os “Hinos sumérios do
templo”. Essa obra diferencia-se um pouco das outras, pois sua compilação é
atribuída a uma mulher, que pode ter sido uma das primeiras autoras da
história, conhecida como Endehuana. Gwendolyn Leick (2003, p. 142) defende
que ela causou uma enorme impressão em sucessivas gerações de escribas,
sendo suas obras copiadas e lidas durante séculos após sua morte. Recentes
estudos revogam dúvidas anteriores sobre a autenticidade de sua criação
literária, situando-a firmemente no período acadiano durante o reinado de
Naram-Sin. Endehuana não só compilou os hinos, como também foi autora de
uma complexa composição literária conhecida como Nin-me-sara. Nicolas
Postgate (1999, p. 41) especifica que essa coletânea de hinos é baseada em
poemas de curtas invocações individuais de todos os templos da planície
meridional. Cada um descreve o templo e sua deidade, em uma linguagem
figurativa que deve estar cheia de alusões, em sua maioria, perdidas para
nossas modernas concepções.
Referências
Leonardo Candido Batista, Mestre em História Social pela UEL
DIAKONOFF. I.M. The City-States of Sumer. In I.M Diakonoff and Philip L. Kohl
(orgs). Early Antiquity. Chicago: Chicago University Press, 1991.
HOYS, Ana María Vázquez. Historia Del Mundo Antiguo Volumen I (Próximo
Oriente y Egipto). Madrid: Sanz y Torres, 2004.
KRAMER. Samuel Noah. The Sumerians: Their History, Culture, and Character.
Chicago: Chicago University Press, 1963.
MIEROOP, Marc Van. A History of the Ancient Near East ca. 3000-323 BC.
Malden: Blackwell Publushing, 2004.
Referências
Maura Regina Petruski. Doutora em História pela Universidade Federal do
Paraná. Professora do departamento de História da Universidade Estadual de
Ponta Grossa (UEPG). Integrante do corpo docente da pós-graduação
Mestrado de Ensino de História (PROFHIST) da Universidade Estadual de
Ponta Grossa (UEPG)
O corsário e rei de Argel, Khayr ad-Din, mais conhecido por Barbarossa (1483-
1546), protagonizou a expansão dos seus domínios, do comércio de
escravizados, do combate contra os espanhóis e impôs-se contra outros piratas
com a ajuda de renegados europeus que atuaram nas embarcações
capitaneadas por turcos [BRADFORD, 2013]. Deste modo, Barbarossa
comandou uma frota de corsários otomanos em nome de Solimão I, açoitando
a costa mediterrânica ocidental, impondo grandes baixas na frota papal e do
mercenário, Andrea Doria (1466-1560). Entre os anos de 1541-1544,
Barbarossa avançou nos domínios costeiros italianos da Espanha em pacto
sigiloso com os franceses. Trinta anos depois, sua frota foi destruída no Golfo
de Lepanto [NOLAN, 2006]. Desta forma, o historiador Ernle Bradford descreve
a importância das galés e a diferença entre os remadores turcos e cristãos:
Por fim, o vácuo de poder ocasionado pelo conflito lepantino jamais foi
reconquistado entre as frotas cristãs e otomanas com a mesma veemência,
assim as rotas marítimas estenderam-se para irromper o conflito de
fundamentação individual e mercenária: a guerra corsária [SENIOR, 1972].
Muitos europeus associaram-se aos muçulmanos e “tornaram-se turcos”,
visando o pagamento de dívidas e sobrevivência às rigorosas leis.
Considerados “de pouca serventia para a igreja cristã”, os indivíduos admitidos
desfrutavam “dos benefícios que isso poderia trazer num lugar como Argel, que
rapidamente ia se tornando tão rica, próspera e civilizada como qualquer
cidade na Europa” [BRADFORD, 2013, p. 107-108]. Desde modo, a tênue
autoridade do sultão entrou em conflito com o apoio aberto à pirataria nas
margens de sua soberania [HANNA, 2015], pois as ilhas mediterrânicas em
seus domínios tinham se tornado “vespeiros de piratas” [BRADFORD, 2013, p.
30].
Referências
Nelson Rocha Neto é graduado em História pela Universidade Tuiuti do Paraná
(UTP) e mestrando em História pela Universidade Federal da Integração
Latino-Americana (UNILA). E-mail: [email protected]
DIMMOCK, Matthew. New Turkes: Dramatizing islam and the Ottomans in Early
Modern England. London: University of Sussex, 2005.
HANNA, Mark G. Pirate Nests and the Rise of the British Empire, 1570–1740.
Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2015.
KAGAN, Richard L.; PARKER, Geoffrey (orgs.). Spain, Europe and the Atlantic
world. Essays in honour of John H. Elliott. Cambridge: Cambridge University
Press, 2002.
WRIGHT, Elizabeth R. Juan Latino. Del advenimiento de una era de paz (De
natali serenissimi). Disponível em: https://openiberiaamerica.hcommons.org.
Acesso em: 1 dez. 2021.
Os falasifa
Abu Yusuf Ya’qub ibn ishaq al-kind ou simplesmente Al-Kindi [796-873 d.C. –
185-260 H.] foi o primeiro estudioso a produzir textos em árabe seguindo a
tradição do pensamento filosófico grego, sendo portanto, o primeiro filósofo
árabe da falsafa. Foi um pensador importante na promoção e transmissão das
traduções dos textos filosóficos gregos para o árabe através do chamado
circulo de Al-Kind. Foi o primeiro filósofo genuinamente árabe, de
descendência, de nascimento, de idioma e que nele se expressou, daí o título
de filósofo dos árabes, além do “mérito de introduzir Aristóteles no ambiente
intelectual do Islãm pregando uma exegese filosófica do Alcorão” [Faylasuf al-
arab]. [Attie Filho, 2006, p. 100].
Al-Farabi [em algumas fontes conhecido como Muhammad ibn Muhammad ibn
Tarkhan ibn Uzlagh al-Farabi] conhecido no ocidente como Alpharabius, Al-
Farabi, Alfarabi, Farabi e Abunaser [872-850 d.C. – 259-339 H.] foi um polímata
da Ásia Central que promoveu um salto na falsafa e um dos maiores cientistas
e filósofos da Pérsia e do mundo islâmico. É um neo-platônico teocêntrico que
segue a doutrina mística religiosa e o monismo emanatista.
Ibn Sina [980 – 1037 d.C.] conhecido no ocidente como Avicena, foi
considerado um dos zênites da humanidade, seu nome ultrapassou os limites
da própria falsafa. Foi um dos mais importantes pensadores da Era de Ouro
Islâmica e ícone da história do pensamento oriental, cuja filosofia medieval e
saber universal o colocou ao lado dos maiores nomes da história. Foi um
polímata muçulmano persa, além de poeta, médico, músico, matemático,
gramático e filósofo. Grande parte da família de Ibn Sina seguia vertente sunita
da religião islâmica. Sua filosofia ocupou lugar ímpar e seu pensamento atingiu
papel de destaque tanto na filosofia islâmica como na filosofia medieval do
Ocidente. Diversas teses avicenianas repercutiram pelo mundo desde o
medievo até a modernidade. Segundo Attie Filho [p.143] tal fato justifica-se por
três motivos: “o primeiro foi por Ibn Sina ter recolhido grande parte das ciências
e da filosofia de sua época; o segundo, por ter sistematizado e reelaborado
esse conjunto, resultando numa abordagem própria e renovadora; e o terceiro
diz respeito a sua presença marcante nos destinos da filosofia e das ciências
posteriores”.
A biografia de Al-Ghazali [1058 - 1111 d.C. / 450 - 505 H.] está inserida em
sua obra autobiográfica O salvador do erro [Al-Muqid min Al-dalal]. Nela Al-
Gazali dividiu a sua vida em quatro períodos: O primeiro, marcado por estudos
em sua cidade natal; o segundo, na sua vida como professor em Bagdá; o
terceiro, em suas viagens e o último, retratado pelo retorno à sua cidade natal.
Escreveu diversas obras, dentre elas Maqasid al-falasifa [As intenções dos
Filósofos] e Tahafut al-falasifas [A autodestruição dos filósofos], duas obras
críticas aos filósofos. Pretendeu com essas obras expor as idéias dos filósofos,
Algumas obras foram traduzidas para o latim durante a Idade Média, período
em que era conhecido como Algazel. Apesar de ter deixado muitos escritos, é
difícil encontrar suas obras no ocidente somando-se a dificuldade de
estabelecer a autenticidade dos escritos.
Conhecido como Ibn Khaldun ou Ibn Jaldun [1332 – 1406], Wali ad-Din Abu
Zayd’ Abd ar-Rahman Ibn Muhammad Ibn Muhammad Ibn Abu Bakr
Muhammad Ibn al-Hasan Ibn Muhammad Ibn Jabir Ibn Muhammad Ibn Ibrahim
Ibn Muhammad Ibn’ Abd ar-Rahman Ibn Khadun al-Hadrami al-Ixbili, foi “um
africano genial, demente tan clara y tan pulidora de ideia como la de um griego”
[Ortega y Gasset, 1927, p. 679]. Nasceu em Túnis, à época Capital da Ifriqiya
[deriva do nome romano África e na Idade Média compreendia o leste Argelino
e a Tunísia – Hoje: atual Tunísia em 27 de maio de 1332 [732 H.] em uma
família originária de Hadranaut, Iêmen.
Foi um homem do século XIV, do final da idade média [de acordo com a
historiografia ocidental] e que viveu entre o mundo muçulmano dos marínidas
Infelizmente muitas das contribuições literárias dos falasifa não chegaram até
nós, outras encontram-se em manuscritos arquivados em bibliotecas no oriente
editadas em árabe e sem tradução para o português. Os títulos considerados
mais importantes tiveram tradução para o latim durante a idade média, porém
pouquíssimos deles foram traduzidos para os idiomas modernos. [Attie Filho,
2006, p. 102] Em português, temos um número escasso de obras traduzidas,
fato que dificulta a divulgação e a cognição sobre a falsafa em nosso país, não
obstante o valor imensurável do legado destacado e engrandecedor que a
falsafa nos deixou. Nas palavras de Libera [p. 7] “sempre perdida, perseguida e
denunciada como a manifestação mais evidente das trevas do ‘obscurantismo’,
mil anos de pensamento, de reflexão, de inovações e de trabalho dormem no
silencioso interregno que separa a antiguidade e o renascimento.”
Referências
Renata Ary é doutoranda em educação, mestre em direitos difusos e coletivos
e pós graduada em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo [PUC-SP].
ARAUJO, Richard Max de. Ibn Khaldun – A idéia de Decadência dos Estados.
Ed. Humanitas Editorial – Fapesp. 2007.
ATTIE FILHO. Miguel. FALSAFA: a Filosofia entre os Árabes. São Paulo: Palas
Athena, 2002.
LIBERA. Alain de. A filosofia medieval. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
1990.
Afinal, não poderíamos propor uma discussão teórica que desse conta de mais
de mil anos de história válida enquanto noção universal. Contudo, debater as
campanhas militares e a prática da atividade militar em termos comparativos,
partindo das fontes e da historiografia, nos possibilita evidenciar semelhanças e
distanciamentos em contextos tão distintos.
Ainda assim, a fim de propor uma noção geral que desse conta de explicar a
atividade guerreira nesta conjuntura, podemos fazer uso do conceito de guerra
de posição definido por Francisco García Fitz [2001]. As batalhas em campo
aberto se tornavam cada vez mais escassas enquanto as campanhas militares
passaram a visar a tomada de castelos e vilas importantes. A partir da
conquista de fortificações deste tipo, os exércitos se reagrupavam,
organizavam seus recursos e partiam para novas investidas ofensivas.
“[...] Gengis Khan decretou que à frente de dez homens fosse posto
um, e chama-se ele, à nossa maneira, um decano; que à frente dez
decanos fosse posto um que se designa centenário; que à frente de
dez centenários fosse posto um que se chama milenário; que à
frente de dez milenários fosse posto um, e esse número é chamado
de ‘trevas’” [CARPINI, 1929, p. 35].
Para conquistar e subjugar novos territórios, Temür utilizava de sua força militar
e, por vezes, estabelecia acordos com outros líderes, os quais auxiliavam-no
em novas conquistas. Estas alianças não eram duradouras, devido aos
próprios costumes dos povos turco-mongóis e mongóis, no qual os interesses
“pessoais” dos comandantes eram mais importantes do que criar laços
militares/políticos duradouros [Tibor, 2007].
Referências
Lucas Vieira dos Santos é mestrando no Programa de Pós-Graduação em
História [PPH] da Universidade Estadual de Maringá [UEM] e membro do
Laboratório de Estudos Medievais [LEM].
BREA, Luis Charlo (Org). Crónica Latina de los Reyes de Castilla. Madrid: Akal
Ediciones, 1999.
TIBOR, R. Z. The Timurid Empire and The Ming China: Theories and
Approaches Concerning The Relations of The Two Empires, Hungria: ELTE,
2007.
Posteriormente, foi o palco dos cimérios – 1.500 a 750 a.C. – vindos da Ásia
Central e que devido ao seu estilo de vida de montaria nômade, difundiram o
uso do cavalo e das ferramentas de ferro na região [YEKELCHYK, 2007]. Essa
presença equina em solo ucraniano marcaria durante séculos o modus
operandi do povo que por ali se desenvolveria. Logo, os citas substituíram os
cimérios e fundaram novas povoações.
Para Yekelchyk [2007], a presença dos cazares nessa região permitiu que ela
servisse como uma “super estrada” comercial e cultural, entre Europa, Ásia e
Oriente Médio, influenciando, inclusive, a Grande Rota da Seda da China. E
outro elemento de destaque estava na fertilidade de seu solo, motivo de cobiça
por todos que habitavam além das suas fronteiras [BURKO, 1963]. Controlar
todas estas características trazia benesses e problemas.
Os cossacos
Se o território ucraniano estava dominado por diferentes grupos étnicos no final
da Idade Média, é preciso destacar que ao sul, surgia um novo inimigo: os
tártaros. Para Yekelchyk [2007] os tártaros eram originalmente o povo turco
que constituía o exército mongol no século XIII. Mas, os que viviam na Crimeia
no final do século XV após a ocupação da Rus haviam se separado do
enfraquecido Império Mongol.
A partir do ano 1480, eles partiam das suas terras e invadiam e devastavam os
territórios da atual Ucrânia. Além de alimentos, ferramentas e animais, outro
objetivo desses assaltos era a obtenção de escravos para serem vendidos no
Porto de Kaffa na Crimeia [SUBTELNY, 2009]. As consequências desses
ataques inviabilizavam a vida por décadas, como se percebe no trecho:
Não obstante os ucranianos serem assaltados pelos tártaros ao sul, sob o jugo
dos impérios polaco-lituano pelo norte e oeste, logo se depararam com
diversos problemas sociais que faziam a vida ficar praticamente insustentável.
Além das diferenças culturais com seus senhores, contrastava a questão
religiosa: os poloneses eram católicos, enquanto os ucranianos, ortodoxos.
Falta de terras, abuso de poder, preconceito e a servidão, logo passaram a
alimentar um sentimento contrário às autoridades.
Difícil tolerá-los, pior sem eles, eram um mal necessário. Houve três grupos
cossacos distintos durante o século XVII: aqueles que eram contratados pelo
reino polonês, aproximadamente 3 mil homens; os da Zaporizhia; e aqueles
que viviam nas fronteiras, espalhados em diferentes locais com o mesmo estilo
de vida; estes dois últimos grupos totalizavam aproximadamente 50 mil
homens [SUBTELNY, 2009]. Houve disputas entre os que trabalhavam para os
poloneses, únicos que possuíam alguns direitos reconhecidos, e os demais,
que por vezes, viviam na extrema pobreza.
E não eram apenas exímios guerreiros nos mares. Expedições terrestres ágeis
e estratégicas também figuravam como uma marca da atuação cossaca. O
Devido ao seu sucesso nas batalhas e entraves com outros grupos europeus,
os cossacos logo passaram a se enxergar como representantes do
Cristianismo ortodoxo, perante seus senhores católicos e seus inimigos
muçulmanos. Também se percebiam como defensores do seu povo no quesito
étnico, pois os ucranianos viviam sob o jugo da servidão e como se não
bastasse, das ofensivas tártaras/otomanas. Questões externas e internas
alimentavam a motivação dos cossacos [SUBTELNY, 2009].
Considerações
Se para Sasse [2007] a Ucrânia foi o palco onde se efetivou de diferentes
formas a articulação entre os impérios Habsburgo, Russo e Otomano enquanto
atores externos, desprende-se disso de que, certamente, no mesmo cenário
um dos principais protagonistas internos foram os cossacos. Não obstante em
sua história terem deslocado sua concepção de inimigo, reconhecendo como
tais ora poloneses, ora tártaros e turco-otomanos [BURKO, 1963], sua
presença foi essencial em diversas batalhas para deter invasões estrangeiras.
OPANOVIC, Olena. The Cossack Republic. In: SKRYPNYK, Mary. Folk heroes
of Ukraine. Toronto: The Ukrainian Canadian Press, 1966. [Livro]
Além disso, os curdos possuem uma língua propria, apesar de não poderem
pratica-la em diversas partes do mundo (PESSUTO, 2017). Sobre sua
identidade, Kelen Pessuto (2017, p.82), afirma:
Assim, o povo curdo vem lutando pela sua autonomia e radicalização política,
sendo que além de um sistema política diferenciado, a Confederação
Democrática, também possuem diversos grupos armados, que dentre eles está
o tema matriz deste artigo: uma organização armada, politicamente coesa e
antipatriarcal formada exclusivamente por mulheres curdas.
Diante disso, a partir dos anos de 1980, com a criação das primeiras guerrilhas,
as mulheres se engajavam cada vez mais na frente de combate. Vale resslatar,
segundo Ribeiro (2021, p. 21): “tal adesão teve como cenário a intensificação
dos conflitos na Turquia, a repressão política aos movimentos sociais e as
práticas discriminatórias que impactam a vida das mulheres.”
Assim, a inserção na luta armada não só eram um eixo pela autonimia dos
povos curdos, mas também acabou tornado-se um valiosso meio de
contestação feminina a cerca dos pepeis de gênero e da opressão sofrida
pelas mulheres (Ribeiro, 2021). Logo, é através das montanhas do Curdistão,
as mulheres se uniram às linhas de frente do PKK para fugir de casamentos
forçados, violência doméstica, opressão, humilhação e reclusão (Akan, 1992;
Al-Ali e Käser, 2020).
No ínicio dos ano 2000, foi fundada a União Estrela das Mulheres Livres
(Yekîtiya Star, no original), uma organização voltada a atuar no território de
Rojava. Vale ressaltar que, Rojava, fica localizada entre as regiões norte e
leste da Síria desde 2012, sendo uma região autônoma sendo instaurados
alguns princípios da base do povo curdo, como o Confederalismo Democrático,
a igualdade de gênero, a ecologia radical e a democracia direta (Silva, 2017;
Dirik, 2018; Schmidinger, 2018; Amorosi, 2019). De acordo com siglana
(RIBEIRO, 2021):
Considerações finais
A lutas das mulheres curdas é de suma importância para a compreensão do
movimento de emancipação das mulheres. De acordo com Brito (2020), as
revolucionárias do Curdistão relatam que enquanto o dito “feminismo
hegemônico” lutam pela democracia esquecendo muita das vezes que o
patriarcado está intrisicamente ligado ao capitalismo.
Referências
Tanya Mayara Kruger tem História Social das Relações Políticas (PPGHIS)
pela Universidade Federal do Espírito Santo (2020) e membro do Laboratório
de Estudos de Gênero, Poder e Violência (LEG-UFES).
AKAN, Sara (1992), “Women in Kurdistan: A History of Their Struggle since the
’70s”, in Kurdistan Solidarity Committee (org.), Kurdish Woman: The Struggle
for National Liberation and Women’s Rights. Interviews and Articles. London:
KSC-KIC Publications, 7-16.
Introdução
Os desafios atuais para o professor(a) de História é a desvinculação do ensino
histórico ao modelo tradicional/positivista e eurocêntrico. A formação à
docência influência diretamente nesta desvinculação do saber hegemônico,
sendo a projeto político pedagógico dos cursos, responsáveis pela
(des)construção para o saber subalterno. Logo, é necessário a busca pela
troca de conhecimento e aprendizado a partir da perspectiva da História e
Cultura Asiática e Oriental, visando que o Brasil em sua formação enquanto
nação, tem influência direta das sociedades orientais, por meio da emigração
árabe (sírio-libanesa), japonesa, chinesa até os dias atuais.
A Guerra Fria foi um período histórico relevante para países da Ásia e África
oriental, os conflitos armados resultaram em (re)conquistas dos territórios
orientais colonizados por países europeus, Inglaterra-França-Holanda-Bélgica.
Contudo apesar de todas as guerras, revoluções, (re)conquistas sócio-
históricas e culturais, o ensino de História e Cultura Asiática é marginalizada
nos currículos escolares na educação básica brasileira, influenciando as aulas
de história e os direcionamentos do corpo docente.
Apesar do Darwinismo Social ter sido uma teoria e discurso superado pelas
ciências sociais e humanas, as relações ocidente-oriente foi construída com a
narrativa de superioridade, Edward W. Said debate o oriente como invenção do
ocidente, sendo necessária a segregação, inferioridade de culturas, para que
se tenha a potência no Ocidente. Sendo Israel (criação com influência
estadunidense e a ONU) e a Palestina, dois países que representam essa
dicotomia oriente-ocidente. O presente trabalho visa, através da declaração de
independência do Estado de Israel e de trabalhos acadêmicos, analisar como o
ocidente e os estudos históricos eurocêntricos, positivistas e tradicionais veem
os conflitos da israelo-palestino, fazendo uma crítica aos costumes e valores do
século XIX e a diluição das culturas e tradições para a atual globalização.
“Estava iniciando, então, o conflito que dura até hoje, com cerca de
250 mil palestinos fugindo ou expulsos da Palestina. Quando o prazo
do mandato [Mandato Britânico da Palestina] expirou em 1948, Ben-
Gurion declarou independência de Israel [proclamando o
estabelecimento do Estado Judeu na Palestina, que chamaria
Israel], causando uma declaração de guerra por parte de uma junta
Ken Stein, aponta que após oito horas da declaração lida por Ben-Gurion, a
Força Aérea do Egito lançou suas primeiras bombas nos arredores de Tel Aviv
[cidade na costa israelense do mar mediterrâneo], a guerra de independência
de Israel durou até o início de 1949.
É notório que os dois lados adotam a violência e o terrorismo para validar suas
conquistas, em que ambos acabam desrespeitando as culturas, religiões,
cultos, ideologias em prol da dominação sobre seus corpos. Porém é
importante ressaltar alguns pontos: 1) Israel tem influência geopolítica e
econômica direta com os países europeus e norte-americanos, sendo o
principal deles, Estados Unidos. 2) Os direitos humanos foram constituídos e
moldados por homens europeus e presentes em grandes potências, ou seja,
para os povos árabes esta cultura de respeitar o inimigo não se encaixa em
suas tradições, deixando claro, que este ponto não é uma justificativa para as
ações terroristas, mas sim uma análise de costumes do Oriente e Ocidente. 3)
Israel e Palestina, lutam pela a ocupação e permanência de seus territórios,
entretanto ocorre uma situação de desigualdade nas conquistas destas terras,
visando que Israel têm aporte da maior potência econômica na atualidade, os
Estados Unidos.
Conclusão
Após o atentado nas Torres Gêmeas em 11 de setembro de 2001, Israel só
teve dois presidentes, o ex-presidente Shimon Peres e o atual presidente
Reuven Rivlin, ambos de partidos voltado a uma ideologia de extrema direita. O
Estado de Israel vive uma onda ultraconservadora, em que ambos os
presidentes foram votados com a campanha principal de segurança ao país,
devido ao atentado ocorrido nas Torres Gêmeas. Para Israel e o mundo
ocidental positivista e tradicional, os países árabes foram ligados aos
movimentos terroristas, o que fez com que a esquerda israelense, não tivesse
apoio o suficiente para chegar ao poder, gerando ainda mais uma dificuldade
no diálogo israelo-palestino, e o aumento dos conflitos em terras palestinas e
nas fronteiras com demais países árabes.
O estudo da História enquanto ciência, permite entender que ela possui poder
sob as revoluções contemporâneas. A História é capaz de recontar o passado
de acordo com suas fontes e sujeitos históricos, permitindo que novas
gerações possam analisa-las e estuda-las a fim de compreender o seu
presente. O poder da História é capaz de reconstituir culturas e de
descentralizar o pensamento eurocêntrico, positivista, tradicional e colonial pelo
mundo, permitindo que as demais filosofias, como as orientais, sejam
estudadas de acordo com suas histórias, memórias e patrimônios.
Notas biográficas
Yasmin Rodrigues Roque: graduanda do curso de Licenciatura em História, na
Universidade Federal de Catalão (UFCAT).
Referências
FAINGOLD, Reuven. Memória e história do movimento sionista: Nechama
Puchachevski, escritora da odisseia sionista. WebMosaica: revista do instituto
cultural judaico marc chagall. v.2, n.1 (jan-jun) 2010.
FISCHER, Louis. Título do Original: Gandhi, his life and message for the world.
Tradução: Raul de Polillo. Nova York, EUA: Círculo do Livro, 1982. p.278.
HOURANI, Albert. Uma história dos povos árabes. Tradução Marcos Santarrita.
São Paulo: Companhia das Letras, 2006.