Dorsel Cana de Açucar
Dorsel Cana de Açucar
Dorsel Cana de Açucar
Professor, Departamento de Plantas de Lavoura, Faculdade de Agronomia/UFRGS, Porto
Alegre – RS. E-mail: [email protected]
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Figura 31. A) Tolete e B) Nó do tolete de cana-de-açúcar e suas partes.
Thomas, 2015.
2012; Silva et al., 2014). Entretanto, para que isso ocorra, é necessário
que as exigências climáticas e nutricionais da cultura sejam atendidas
durante seu ciclo de desenvolvimento, o qual inicia com a brotação do
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tolete e emergência das brotações, com posterior perfilhamento,
crescimento da parte aérea, florescimento e maturação dos colmos
(Figura 32).
O plantio da cana-de-açúcar dever ser realizado com colmos
livres de moléstias e pragas, uma vez que a lavoura só será renovada
após 5 ou 6 anos. O plantio mais tradicional consiste no corte dos
colmos no viveiro, distribuição dos mesmos nos sulcos, corte dos
colmos em pedaços menores (toletes) dentro dos sulcos e cobertura
dos toletes com solo.
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O corte dos colmos em toletes é realizado para quebrar a
dominância do meristema apical sobre as gemas laterais existentes nos
colmos. A planta produz auxinas que se movem do ápice para a base,
impedindo ou atrasando a brotação das gemas laterais, especialmente
na base do colmo (Casagrande, 1991; Aude, 1993). O corte é feito para
que ocorra maior uniformidade na brotação das gemas, resultando no
estabelecimento mais rápido e uniforme da lavoura. Entretanto, essa
prática nem sempre proporciona aumento no rendimento de colmos por
área no primeiro corte (cana planta) e não tem efeito sobre o
rendimento dos demais cortes (rebrote ou cana soca) (Marchiori, 2004).
1. Desenvolvimento da planta
A cana-de-açúcar é uma espécie que apresenta metabolismo de
incorporação de CO2 do tipo C4, onde a máxima eficiência
fotossintética ocorre com grande disponibilidade de radiação solar,
umidade no solo e temperaturas do ar elevadas.
O desenvolvimento vegetativo é favorecido por temperaturas do
ar entre 25°C e 35°C. Já a maturação (acúmulo de sacarose no colmo)
ocorre com temperaturas inferiores a 18-20°C e/ou com deficiência
hídrica prolongada. Temperaturas menores que 0°C provocam o
congelamento de partes menos protegidas como folhas novas e gemas
laterais do colmo, podendo levar a planta à morte (Casagrande, 1991).
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1.a) Brotação do tolete e emergência das brotações
A brotação dos toletes inicia 7 a 10 dias após o plantio, com o
desenvolvimento de raízes a partir das pontuações radiculares
existentes na zona radicular do nó (Figura 33A), formando as raízes do
tolete ou de fixação. Posteriormente, ocorre brotação das gemas
(Figura 33B e 34A) com a emergência dos brotos (Figura 34B). Os
brotos originam os colmos principais com suas folhas. Cada broto
desenvolve suas próprias raízes (Figura 35) que são denominadas de
“raízes do perfilho” ou “adventícias permanentes”.
A emergência das brotações ocorre de 20 a 30 dias após o
plantio e depende de vários fatores como variedade, temperatura e
umidade do solo, profundidade de plantio, presença da bainha da folha
protegendo a gema do contato com o solo e posição da gema ao longo
do colmo. Durante esse período, a planta se desenvolve utilizando as
reservas de energia (açúcares) e nutrientes existentes no tolete, bem
como da água e nutrientes absorvidos pelas raízes.
A temperatura do solo mais favorável à brotação dos toletes fica
entre 27°C e 33°C. Enquanto temperaturas inferiores a 20°C e
superiores a 35°C prejudicam a brotação e a emergência da cana-de-
açúcar (Casagrande, 1991; Aude, 1993).
1.b) Perfilhamento
Os colmos principais, desenvolvidos a partir das gemas do tolete,
além de raízes, desenvolvem rizomas (caules subterrâneos, espessa-
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Figura 33. Brotação do tolete de cana-de-açúcar. A) Desenvolvimento
das raízes de fixação a partir das pontuações radiculares, e
B) Desenvolvimento de brotos a partir de gemas.
Thomas, 2015.
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Figura 34. A) Desenvolvimento das raízes do tolete de cana-de-açúcar
e brotação das gemas, e B) Emergência dos brotos e
formação do sistema radicular do tolete.
Thomas, 2015.
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Figura 35. Início do desenvolvimento de raízes do broto (colmo
principal) de cana-de-açúcar.
Thomas, 2015.
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Figura 36. Perfilhamento da cana-de-açúcar a partir de gemas
subterrâneas dos colmos principais.
Thomas, 2015.
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perfilhamento depende de fatores como variedade, temperatura (entre
26°C e 30°C é o ideal), radiação solar, fertilidade do solo,
disponibilidade hídrica, densidade de plantio e competição com plantas
daninhas. O perfilhamento leva a planta a formar uma moita ou touceira
(Figura 37) (Casagrande, 1991; Silva et al., 2010).
Após o perfilhamento, inicia a fase de crescimento mais
acentuado da parte aérea (Figura 32).
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Figura 37. Touceira de cana-de-açúcar formada por colmos principais e
perfilhos.
Thomas, 2015.
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Figura 38. Crescimento da parte aérea da cana-de-açúcar.
Thomas, 2015.
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A medida que a cultura se desenvolve, o sistema radicular do
tolete vai perdendo sua função e a cana planta passa a depender
exclusivamente das raízes dos perfílhos (Cury, 2013).
O sistema radicular da cana planta explora mais intensamente as
camadas superficiais do solo, sendo que 60% delas encontram-se nos
primeiros 20 a 30 cm de profundidade e aproximadamente 85% até 50
cm, havendo pequenas variações nessa porcentagem em função de
cultivares (Vasconcellos & Garcia, 2005; Ohashi, 2014).
1.d) Florescimento
O florescimento é um processo natural e indispensável para a
sobrevivência da espécie. Entretanto, ele é indesejável em lavouras
comerciais, uma vez que o desenvolvimento da inflorescência
(panícula) (Figura 39) reduz o teor de sacarose nos colmos.
O florescimento ocorre quando a planta atinge uma maturação
relativa de desenvolvimento (Silva et al., 2010). Esse processo é
controlado por uma interação de fatores, envolvendo, principalmente, o
fotoperíodo (de 12,5 horas e pelo menos 10 dias ininterruptos é
favorável), a temperatura do ar (entre 18ºC e 32ºC induz), a umidade (a
seca reduz ou inibe a ocorrência), a radiação solar e a fertilidade do
solo. A interação entre esses fatores pode aumentar, manter ou
prevenir a transformação do ápice da cana-de-açúcar de crescimento
vegetativo para reprodutivo (Araldi et al., 2010; CTC, 2015).
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Figura 39. Florescimento da cana-de-açúcar.
Rulkens, 2010.
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Além do uso de variedades com baixa tendência ao
florescimento, algumas práticas de manejo podem ser adotadas para
controlar o fenômeno, como por exemplo, a utilização de inibidores de
florescimento. Em um ano onde o suprimento de água antes do período
da indução é elevado e as temperaturas ficam dentro da faixa
adequada, a aplicação do inibidor torna-se necessária (CTC, 2015).
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Figura 40. Cana-de-açúcar em maturação.
Thomas, 2015.
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ção e o armazenamento dos açúcares, principalmente sacarose, nos
colmos.
O emprego de maturadores químicos serve como ferramenta no
cultivo de cana-de-açúcar, promovendo melhorias na qualidade da
matéria-prima, otimizando resultados agroindustriais/econômicos e
auxiliando no planejamento da safra (Roberto, 2015).
Normalmente, a maturação da cana-de-açúcar cultivada em
pequenas propriedades é determinada empiricamente por aspectos da
planta, tais como coloração do colmo e das folhas e/ou época do ano
(ocorrência de frio e/ou seca). Já em grandes lavouras, a análise da
maturação dos colmos inicia pela análise do grau Brix (% de sólidos
solúveis presentes no caldo, do qual a sacarose faz parte). O grau Brix
(°Brix) é determinado pelo refratômetro de campo e fornece um
indicativo do índice de maturação dos colmos. Entretanto, análises
laboratoriais complementares, como do teor de sacarose aparente
(Pol), pureza (relação Pol/°Brix), açúcares redutores totais (glicose e
frutose) e açúcar total recuperável (ATR), são necessárias para
determinar a maturação da lavoura e sua liberação para colheita, sendo
que cada cultivar tem seus padrões (Stupiello, 1987; Galdiano, 2008).
A colheita da cana-de-açúcar ocorre de 8 a 10 meses após o
plantio.
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2. Rebrote (cana soca ou soqueira)
O corte dos colmos para colheita deve ser rente ao solo para
maximizar o rendimento de açúcar e proporcionar que o rebrote da
lavoura ocorra a partir de gemas subterrâneas dos rizomas (caules
subterrâneos) presentes no sistema radicular (Figura 41A). Caso o
corte não ocorra rente ao solo, a brotação ocorrerá nas gemas basais
do colmo que se encontram acima da superfície do solo, facilitando o
acamamento de colmos e diminuindo a produtividade e longevidade do
canavial.
O rebrote da cana-de-açúcar ocorre quando o fator ambiental
limitante (frio e/ou seca) que induz a maturação é superado. As fases
de desenvolvimento na cana soca são as mesmas da cana planta,
porém a velocidade de desenvolvimento da lavoura da brotação-
emergência até o fechameto do dossel é mais rápida, porque já existe
um sistema radicular estabelecido (Figura 41B).
Após o corte da cana planta, o sistema radicular antigo mantém-
se em atividade por algum tempo, período em que é substituído pelas
raízes dos novos perfilhos da soqueira, sendo esse processo lento e
gradual. As raízes da soqueira são mais superficiais do que as da cana
planta pelo fato dos perfilhos das soqueiras brotarem mais próximo da
superfície do solo do que os da cana planta. Pelo mesmo fato, quanto
maior o número de cortes, mais superficial torna-se o sistema radicular
das soqueiras (Vasconcelos & Garcia, 2005; Cury, 2013).
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Figura 41. A) Rebrote da cana-de-açúcar a partir de gemas
subterrâneas e B) Sistema radicular da soqueira.
Thomas, 2015.
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