Educação Ecológica para A Conservação Das Plantas Carnívoras

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Silva e Cruz 2014

Gaia Scientia (2014) Volume 8 (1): 279-293


Versão Online ISSN 1981-1268
http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/gaia/index

Educação ecológica para a conservação das plantas carnívoras


266
Caio Vinicius da Silva1 e Denise Dias da Cruz2

1
Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA), Universidade Federal da Paraíba, Centro
de Ciências Exatas e da Natureza, Departamento de Sistemática e Ecologia, Laboratório de Ecologia
Terrestre. E-mail: [email protected]
2
Docente da Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências Exatas e da Natureza, Departamento de
Sistemática e Ecologia, Laboratório de Ecologia Terrestre. E-mail: [email protected]

Artigo recebido em 24 fevereiro 2014; aceito para publicação em 14 outubro 2014; publicado 23 dezembro 2014

Resumo
Plantas carnívoras constituem um grupo de organismos que detém exigências e tolerâncias ambientais bem definidas,
reconhecidas como bioindicadores de qualidade ambiental e importantes agentes no controle biológico de pequenos
animais. Suas características lhe conferem potencial valor didático direcionado pela curiosidade do aluno, facilitando
a construção da sensibilidade e do saber ambiental. O objetivo deste trabalho foi utilizar plantas carnívoras como
instrumentos didáticos para o desenvolvimento da sensibilidade, do saber e da ação ambiental dos alunos através da
Educação Ambiental na escola. Para tal, foram desenvolvidas palestras, oficinas, questionários, discussões e aulas
práticas com alunos do ensino médio regular da educação pública de uma escola na Paraíba. Baseado nas atividades
desenvolvidas, concluiu-se que as plantas carnívoras podem ser utilizadas como instrumento didático facilitador para
a assimilação de informações relacionadas aos ecossistemas locais, evidenciando a importância do conhecimento
popular e científico, caracterizando e valorando hábitats e espécies regionais, incentivando a pesquisa e dinamizando
o processo ensino aprendizagem.
Palavras-chave: Ecologia. Educação Ambiental. Estratégia didática. Paraíba. Plantas carnívoras.

Abstract
Ecologic Education for the carnivorous plants conservation. Carnivorous plants is a group of organisms that has
well-defined requirements and environmental tolerances, recognized as bio-indicators of environmental quality and as
an important agents of biological control of small animals. Their features give a potential educational value driven by
the curiosity of the students, facilitating the construction of sensitivity and environmental knowledge. The aim of this
study was to use carnivorous plants as educational instrument for the development of sensitivity, knowledge and
environmental action of the students through environmental education in school. To this end, lectures, workshops,
questionnaires, discussions and practical classes involving students from a regular public high school in Paraíba State
were developed. Based on the developed activities, it was concluded that the carnivorous plants can be used as a
faciliting didactic instrument for the assimilation of information related to the local ecosystem, highlighting the
importance of popular and scientific knowledge, characterizing and valuing regional habitats and species, encouraging
research and dynamizing the teaching and learning process.
Keywords: Carnivorous plants. Environmental Education. Didactic strategy. Ecology. Paraíba.

Introdução

A Educação Ambiental (EA), para a construção da cidadania ambiental em


através de meios didáticos eficazes, deve vista da compreensão do meio social,
permitir uma ampla abordagem crítica dos cultural, político-econômico e ambiental
aspectos determinantes da dinâmica do local (MEC 2012). Para que esta educação
ambiente, valorizando a biodiversidade sob seja desenvolvida de forma eficaz, há a
múltiplos olhares e saberes tradicionais e necessidade da atenção docente voltada para
científicos, incentivando a pesquisa e a o uso de estratégias didáticas que direcionem
participação ativa nas tomadas de decisões o olhar e a curiosidade do aluno,
favorecendo a assimilação de conceitos,

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mediando a informação, enraizando os econômicas no contexto das temáticas


saberes e proporcionando o ambientais, permitindo uma maior
(re)conhecimento sobre a biodiversidade abrangência deste campo também na área da
local, incluindo grupos de organismos pouco educação (PELEGRINI E VLACH 2011).
estudados, a exemplo das plantas carnívoras. Neste contexto, a escola passa a ter
O objetivo deste trabalho foi utilizar uma responsabilidade maior sobre a
plantas carnívoras como instrumentos formação intelectual do indivíduo, indo além
didáticos para o despertar da sensibilidade e da instrução sob conteúdos sequenciados,
280 da ação ambiental dos alunos através do formando, portanto, cidadãos ativos,
desenvolvimento da EA em uma escola no participativos nos debates da sociedade, com
agreste da Paraíba, caracterizando a autonomia, dinâmicos, críticos e criativos,
biodiversidade local e incentivando a em vez de jovens passivos, conformados e
proteção dos ecossistemas da região por sem opinião (SAMPAIO 1996). Logo, a EA
intermédio da construção de uma postura mostra-se como um processo contínuo,
crítica dos alunos frente ao meio onde estão permanente e consciente quanto à relação do
inseridos. indivíduo com o meio no qual este está
inserido, proporcionando-lhe a construção
A problemática ambiental e o papel da de conhecimentos, habilidades,
escola experiências, valores e ações individuais e
Contemporaneamente, há a coletivas na busca de soluções para os
necessidade de compreensão do meio problemas ambientais presentes e futuros
ambiente pela sociedade, tendo em vista a (UNESCO 1987).
pressão antrópica exercida sobre a
biodiversidade (MARENGO 2006), livre da A educação ambiental
prática sustentável (BRITO 2006) e expondo Com as inovações conceituais sobre
a biota local à extinção indigente. Faz-se a EA ocorridas a partir de 1975 – onde se
necessário conhecer o meio natural, os destaca a Carta de Belgrado – algumas
fatores que o constituem e o mantém, bem propostas metodológicas relacionadas ao
como os causadores da perda da meio ambiente foram elaboradas visando
biodiversidade – o acesso e uso uma abordagem ambiental holística, além de
desordenados e a exploração excessiva de prática, propondo mudanças às relações
espécies de plantas e animais nos entre professores, alunos, escolas e
ecossistemas e biomas brasileiros, o comunidades (ABÍLIO 2008). Estas
desmatamento, as queimadas e a exploração propostas foram dispostas através de
de extensas áreas para monoculturas sem a objetivos e categorias básicas da EA
implantação de programas de (CARIDE E MEIRA 2001), ajudando as
reflorestamento (BRITO 2006). A sociedade pessoas e os grupos sociais a adquirirem
tem grande parcela de responsabilidade nos maior sensibilidade e compreensão básica
problemas ambientais, cabendo-lhe, sobre o meio ambiente em sua totalidade,
também, a incumbência de participar nas incentivando-os a participar ativamente da
decisões sobre o futuro sustentável da sua proteção, manutenção e melhoria.
conservação da biodiversidade (BRITO A EA constitui uma forma de
2006). educação abrangente, devendo atingir todos
Desde meados do último século as os cidadãos de forma participativa por meio
temáticas relacionadas ao meio ambiente do desenvolvimento de uma consciência
deixaram de envolver apenas questões crítica sobre a problemática ambiental,
pontuais (ABÍLIO 2011) como, por permitindo ao ser humano uma nova visão
exemplo, o uso racional da água, descarte sobre as relações entre este, a sociedade e a
correto de resíduos, ou a qualidade do ar ou natureza (ANDRADE 2008). As
do solo. Esta relação passou a abranger características básicas que fundamentam a
elementos não materiais, bióticos e EA devem, também, priorizar a criação de
abióticos, ideológicos e econômicos, possibilidades para a produção e o
extrapolando o discurso meramente desenvolvimento do conhecimento,
pedagógico, englobando questões evitando-se apenas transferi-lo (FREIRE
socioambientais, culturais e político- 1996). Logo, faz-se necessário que este

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modelo de educação seja transdisciplinar, educação que pouco são trabalhadas em sala
remetendo aos temas que se encontram de aula (SCHNEUWLY 2000). O
entre, através e além da disciplinaridade, entendimento da complexa relação ser-
tendo como objetivo a unidade do humano/natureza, e mais, a prática integral
conhecimento para a compreensão do meio, do saber ambiental racional, depende de um
sem a formação de “espaços” na construção direcionamento didático sólido e estruturado
do saber ambiental para que este seja sólido sobre um contexto lúdico. Para Morin
e integrado ao cotidiano do indivíduo (1998), essa complexidade pode ser
281 (BARROS et al. 2002). Esta forma de saber compreendida como uma reforma do modo
é, segundo Leff (2004), extremamente rica do indivíduo pensar, refletindo num
em interesses, sentidos existenciais, desafiador diálogo entre os diferentes. Esta
significados culturais de sujeitos históricos e dinâmica da construção do saber, entretanto,
subjetividade em sua produção de depende de estratégias educacionais
conhecimento complexa, dinâmica e inovadoras que encarem o pensamento como
estratégica. O saber ambiental flui de forma “um terreno de práticas e um campo teórico
dinâmica e intermitente, envolvendo especialmente rico” (ARDOINO 2002), bem
aspectos científicos, sociais, políticos e como o natural como um meio livre de
econômicos, por meio de movimentos “gaiolas epistemológicas” (D’AMBRÓSIO
culturais e de práticas tradicionais de manejo 2004), onde a transdisciplinaridade
dos recursos naturais. Assim sendo, para simplesmente flui através de uma pedagogia
alcançar o desenvolvimento lúdico e ambiental capaz de gerar possibilidades de
significativo do saber discente, o professor enxergar a complexidade de fundo presente
deve rever constantemente suas formas de na natureza (NEFFA E RITTO 2010).
utilização de propostas didático- Nesse contexto, as plantas
pedagógicas (KISHIMOTO 2000), passando carnívoras podem ser utilizadas como
a adotar em suas práticas meios ou ferramenta para desenvolver a EA. Por suas
instrumentos didáticos que permitam a características, sensibilidade e exigências
realização da educação. ecológicas, aliadas ao mistério e
desconhecimento que rondam esse grupo,
As plantas carnívoras como essas plantas podem ser um subsídio extra
ferramentas didáticas para o despertar da curiosidade ingênua do
A ciência tende a utilizar uma estudante direcionado à preservação do
maneira de pensar e explicar o mundo meio, visto que o aprendizado lúdico
natural que é diferente do pensamento de evidencia o dinamismo do processo ensino-
senso comum, como é feito naturalmente aprendizagem, permitindo ao aluno o estudo
pelos alunos. Enquanto a ciência baseia-se de situações-problema relacionadas às
num conjunto de regras básicas que instruem questões socioambientais, com
ao agrupamento de regras empíricas possibilidades de melhorar a comunidade em
verificáveis e sistematizadas, o aluno, que vive.
normalmente, compreende o mundo São popularmente denominadas
primariamente através do senso comum e de plantas carnívoras aquelas que habitam
experiências atuais e de heranças de regiões de solo comumente pobre em
conhecimentos de algum grupo social, sem nutrientes e que obtêm seus minerais a partir
depender de uma investigação detalhada da captura e decomposição enzimática – por
para alcançar concepções/ideias mais vezes associada a bactérias – principalmente
profundas como as científicas (FEIMAN- de pequenos invertebrados (JUNIPER et al.
NEMSER E FLODEN 1986). 1989, SOUZA E LORENZI 2012). Essa
Diante dos fatos, faz-se necessário decomposição fornece às plantas proteínas e,
explorar a utilização do senso comum dos logo, nitrogênio, essenciais ao seu
alunos mediante instrumentos que metabolismo (PILIACKAS E BARBOSA
viabilizem a prática do conhecimento. 1989). Sendo o Brasil ocupador de uma
Importa-se utilizar instrumentos didáticos posição de destaque mundial em números de
que despertem a curiosidade, bem como o espécies de plantas desse grupo, bem como
prazer no aprender. Tais instrumentos são a Paraíba um berço ainda pouco explorado
fundamentais para a aplicação de formas de nessa área de estudo (SILVA 2013), a

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utilização destes organismos como recurso disciplina, incorporando uma consciência


lúdico ainda propiciará aos alunos o ideológica do indivíduo que tende a levá-lo
desenvolvimento do conhecimento que à construção da sensibilidade contextual, de
cerca a natureza exótica e singular destas valores que promovam a sustentabilidade, o
espécies. Além disso, visto que estas se respeito, a igualdade e a compreensão às
desenvolvem, quase que exclusivamente, em diferenças. Segundo Jacobi (2003), as
locais ambientalmente conservados, o práticas sustentáveis tornam-se possíveis
estudo dos mesmos evidenciará a quando inseridas num contexto de valores.
282 importância de resguardar o meio ambiente, Pode-se dizer que a Ecologia para a EA é a
uma vez que elas podem ser utilizadas como ciência natural multidimensional, gerando
bioindicadores de qualidade ambiental e são conhecimento para o fortalecimento e a
importantes no controle biológico, prática de tais valores e a modificação de
desempenhando seu papel ecossistêmico de comportamentos sociais.
forma bem definida e multi-relacionada. A Ecologia direciona o indivíduo à
Ainda, a utilização de grupos biológicos desconstrução e reconstrução de fatores
pouco explorados em pesquisas como cognitivos, éticos e culturais promovendo
instrumentos didáticos para a construção e uma EA complexa, sugerindo o
desenvolvimento do saber ambiental deve autoconhecimento, a sensibilização, a
ajudar a despertar no indivíduo o desejo de consciência e a ação ambiental, objetivando
conhecer mais sobre o objeto de estudo o desenvolvimento social racional,
propiciando, possivelmente, novas considerando uma vida de qualidade integral
oportunidades de pesquisas inéditas, menos dependente de qualquer variável
inclusive para novas ocorrências de espécies econômica (LOVATTO et al. 2011). Ainda,
em áreas ainda desconhecidas, a ampliação sob sua conotação mais complexa e
das preferências e características das holística, a Educação Ecológica permite a
espécies, bem como descobertas de novas utilização de instrumentos mediadores e
espécies no meio científico. portadores da informação, alcançando
resultados “significativos” quando
A abordagem ecológica relacionados ao incentivo para o
A EA depende de um planejamento desenvolvimento da percepção ambiental do
conjunto às demais áreas do ensino para a indivíduo, tanto pessoal quanto
construção dos valores formadores do senso comunitariamente. Tal afirmação pode ser
crítico e da sensibilização ambiental em bem exemplificada e comprovada mediante
meio a atual situação da sociedade no trabalhos já desenvolvidos, envolvendo
tocante aos padrões de consumo diante da instrumentação didática por intermédio de
influência dos meios de comunicação e de áreas específicas do conhecimento científico
produção e dos sistemas políticos e (BARROSO et al. 2010), grupos específicos
econômicos vigentes no mundo atual. de animais (BENITES E MAMEDE 2008),
Aliada às propostas da EA, a trilhas ecológicas (ROCHA et al. 2010),
Ecologia, tendo sob tema central a interação processos naturais ou biomas (ARAÚJO E
entre organismos e sistemas, tem se firmado SOUSA 2011), autoconhecimento
como a base dos estudos relacionados ao (LOVATTO et al. 2011) e grupos
meio ambiente e à conservação dos recursos específicos de plantas (BARROSO et al.
naturais, permitindo uma compreensão mais 2010), dentre outros temas distintos entre si
ampla, completa e complexa das relações que compartilham um mesmo tronco comum
existentes entre o ser humano e o meio no como centro das discussões: o meio
qual se encontra inserido (MAYER 1998), ambiente.
proporcionando novas formas de pensar, Este projeto foi desenvolvido
enxergar e manejar o ambiente. baseado na hipótese de que o trabalho de EA
Utilizando ideias ecológicas em direciona a sociedade para a construção
abordagens conservacionistas, o sólida da consciência ambiental, integrando
conhecimento não deve ser apenas focado ao seu cotidiano o espírito de
em conceitos puramente biológicos, mas responsabilidade crítica, sustentabilidade e
comportar uma extensa dimensão prática conservação biológica (LOVATTO et al.
que não está concentrada em uma única 2011), proporcionando que, numa escala

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menor, as comunidades locais possam a possibilidade da execução prática do saber


tornar-se importantes aliadas de pesquisa construído durante o projeto.
sobre as espécies presentes nos ecossistemas O projeto foi desenvolvido sob
locais e do entorno (BARROSO et al. 2010), intervalos semanais – salvo feriados e
principalmente enquanto a abordagem eventos relacionados à dinâmica escolar
didática envolve a utilização de instrumentos local – entre maio e dezembro de 2012, com
didáticos possuidores de um potencial lúdico 43 alunos de duas turmas de 1º ano do ensino
que ajudem a despertar e direcionar a médio do turno tarde da Escola Estadual de
283 atenção dos alunos aos problemas Ensino Fundamental e Médio Monsenhor
ambientais locais (BENITES E MAMEDE Emiliano de Cristo (popularmente conhecida
2008). como “Polivalente”), na cidade Guarabira,
Paraíba, Brasil. A escolha desse público alvo
Material e métodos se deu devido à possibilidade destes alunos
permanecerem na escola por mais tempo,
O projeto desenvolveu-se ajudando a disseminar as ideias trabalhadas.
basicamente sob aspectos teórico- Os alunos estavam divididos em duas
metodológicos qualitativos que estão turmas: 1ºB e 1ºC.
relacionados à Fenomenologia e à Para cada informante e seus
Observação Participante. responsáveis foi explicado o objetivo do
Segundo Minayo (1994), a pesquisa estudo, em seguida estes foram convidados a
qualitativa é aquela que “se preocupa com assinar o Termo de Consentimento Livre e
um nível de realidade que não pode ser Esclarecido, solicitado pelo Conselho
quantificada”, apresentando um foco na Nacional de Saúde por meio do Comitê de
interpretação – ao invés da quantificação – Ética em Pesquisa (Resolução 196/96). O
que os próprios participantes têm da situação presente estudo foi aprovado pelo Comitê de
estudada; enfatizando aspectos da Ética em Pesquisa com Seres Humanos
subjetividade à objetividade; demonstrando (CEP) do Centro de Ciências da Saúde da
flexibilidade na condução à pesquisa; Universidade Federal da Paraíba, registrado
preocupando-se com o contexto e a com protocolo CAAE número
experiência do indivíduo; reconhecendo o 03577512.8.0000.5188.
impacto do processo da pesquisa sobre a
situação em foco e admitindo-se que o Área de estudo
pesquisador influencie e seja influenciado A escola Polivalente está
durante a pesquisa (MOREIRA 2002). A localizada na Rua João Lordão nº 125,
Fenomenologia tem seu estudo voltado ao Bairro Nordeste II, na cidade de
significado das experiências de vida sobre Guarabira, Paraíba, Brasil. Esta cidade é
uma determinada concepção ou fenômeno um polo comercial, localizado na
(SATO 2001), explorando o microrregião de Guarabira, pertencente à
desenvolvimento do saber humano. A mesorregião do agreste do estado da
aplicação da Observação Participante está Paraíba. Possui cerca de 56.000 habitantes
relacionada a uma postura comprometida que têm como principal atividade
com a formação da consciência popular econômica o comércio. O município é
(GIL 2005), tendo sua abordagem sob cortado pelo Rio Guarabira, pelo Rio
ascensão pelos educadores ambientais Araçagi e pelo Rio Mamanguape, sendo os
contemporâneos (ABÍLIO 2011). dois primeiros afluentes do Rio
Durante os estudos foram realizadas Mamanguape. O Rio Guarabira nasce no
atividades teóricas e práticas baseadas em município vizinho, Pilõezinhos, e se
temáticas ecológicas contextualizadas. Para estende por 18km até encontrar-se com o
isso foram utilizados questionários, vídeos Rio Mamanguape. O Rio Guarabira é o
documentários, oficinas, debates, único rio que corta a zona urbana do
experimentos e aulas campo. Tentou-se município, apresentando um estado
tornar as abordagens dos conteúdos mais elevado de poluição e desmatamento da
contextualizadas possíveis à realidade da sua mata ciliar.
escola e dos alunos para que fosse ampliada No período do projeto, a escola
Polivalente possuía 41 professores, todos

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com pós-graduação, e serviço técnico- (SOSSAI et al. 1997). Além disso, uma
pedagógico composto por um supervisor sondagem pretérita à pesquisa, realizada
escolar, dois coordenadores escolares e três pelo coordenador do projeto, evidenciou que
gestoras escolares. Estavam regularmente apenas um dos sete professores entrevistados
matriculados 660 alunos, distribuídos nos declarou já ter realizado alguma prática que
turnos da manhã, tarde e noite. tenha envolvido EA na escola. Por estes
Parte da pesquisa – a aula campo – motivos os questionários voltados aos
foi desenvolvida na Reserva Biológica docentes contemplaram apenas os
284 Guaribas (REBIO Guaribas), localizada nos profissionais responsáveis pelas
municípios de Mamanguape e Rio Tinto, no disciplinas de Ciências, Biologia e
litoral norte do Estado da Paraíba, a cerca de Geografia. Para cada professor (N=7) foi
70 km da capital, João Pessoa, e a 50 km de perguntado no questionário sobre sua idade,
Guarabira. Possui três áreas distintas com formação, tempo de serviço, metodologia e
variação das fisionomias vegetais: Área I, conhecimento sobre EA, Ecologia e plantas
localizada em Mamanguape, com superfície carnívoras.
de 616 ha, constituída por manchas de Após a aplicação dos
cerrado e remanescentes de mata atlântica; questionários aos docentes e direção
Área II, também em Mamanguape, com escolar, houve a aplicação de um
3.378 ha, onde a cobertura vegetal questionário pré-teste com o corpo
predominante é a Mata Atlântica, e Área III, discente (N = 43) para aferir o nível de
localizada em Rio Tinto, com superfície de conhecimento sobre as temáticas “meio
327 ha que, embora seja a menor área, ambiente”, “Educação Ambiental”,
apresenta trechos bem conservados da “Ecologia” e “plantas carnívoras” dos
floresta nativa e áreas de tabuleiros. A área alunos das turmas envolvidas no estudo.
visitada durante a aula foi a Área II. A Ao todo, foram realizados 15
escolha da Rebio deu-se pela necessidade de encontros envolvendo temas específicos,
reconhecimento de ecossistemas mas abrangendo entre si o eixo comum
ambientalmente bem conservados, “meio ambiente” (Tabela 1).
possibilitando a comparação destes com Cada encontro durou cerca de uma
outros ambientes antropizados. Além disso, hora. Envolveram, em sua maioria,
a Rebio detém a maior concentração de debates através de questões trabalhadas
plantas carnívoras do estado da Paraíba. que eram geralmente predefinidas –
contudo, questões formuladas pelos
Atividades desenvolvidas próprios alunos também foram
Para início das atividades, foram amplamente debatidas e incentivadas.
realizados questionários semiestruturados Para cada aluno foi entregue uma pasta
com a direção escolar e o corpo docente individual contendo o resumo do conteúdo
para registrar dados relacionados à trabalhado e algumas questões para serem
percepção ambiental dos professores, bem refletidas e respondidas durante a semana,
como à direção e estruturação da escola. ou até o próximo encontro. Essas questões
Sabe-se bem que, teoricamente, as constituíam o questionário de avaliação. A
questões relacionadas à EA são cada novo encontro, os primeiros minutos
transversais e devem abranger a matriz eram destinados à revisão do conteúdo
curricular de todas as disciplinas, em anterior e às questões que os alunos
todos os níveis do ensino básico (PCN). haviam levado para casa.
Contudo, é fato que as temáticas Este estudo buscou proporcionar
ambientais são trabalhadas uma abordagem de temas que costumam
prioritariamente pelos professores de ser pouco explorados no dia-a-dia da sala
Ciências, Biologia e, em menor de aula na escola. Os mesmos puderam,
proporção, Geografia, por estarem em sua maioria, ser trabalhados sob uma
subordinados aos conteúdos visão socioambiental, sistêmica e prática,
programáticos de livros que ignoram ou incluindo o ser humano como parte
menosprezam esta área do conhecimento integrante do ambiente como um todo

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Tabela 1. Quadro cronológico das atividades desenvolvidas durante o projeto.


Encontro Mês Dia Tema Atividade
Caracterização da escola; Questionário à direção escolar;
- Maio 18
caracterização docente questionário aos professores
1 Maio 25 Caracterização discente inicial Questionário pré-teste aos alunos
Exposição do conteúdo, debate e
2 Junho 01 Meio ambiente
questionário
Oficina de desenhos, debate e
3 Julho 13 O que são plantas carnívoras?
questionário
285
Plantas carnívoras: importância Exposição do conteúdo, debate e
4 Julho 20
ecológica questionário
Ecologia e Educação Exposição do conteúdo,
5 Julho 27
Ambiental dinâmica, debate e questionário
Sociedade e natureza: a Exposição do conteúdo, debate e
6 Agosto 03
problemática ambiental questionário
Desenvolvimento e meio Apresentação do documentário
7 Agosto 10 ambiente: qualidade de vida e “Ilha das Flores” debate e
saúde ambiental questionário
Desenvolvimento e meio Apresentação do documentário
8 Agosto 17 ambiente: responsabilidade e “A História das Coisas”, debate
proteção ambiental e questionário
Ecologia e equilíbrio
Exposição do conteúdo, debate e
9 Setembro 14 ambiental: biomas e
questionário
ecossistemas regionais
Os biomas da Paraíba e a Exposição do conteúdo, debate e
10 Setembro 21
Reserva Biológica Guaribas questionário
11 Outubro 19 Contrastes ambientais Aula campo
Compartilhamento de
12 Outubro 26 Roda de conversa
informações pós-aula campo
Organização dos dados para Exposição do conteúdo, debate e
13 Novembro 23
apresentação questionário
Apresentação do conteúdo
14 Novembro 30 Exposição do conteúdo, debate
trabalhado
Questionário pós-teste aos
15 Dezembro 07 Caracterização discente final
alunos
- Dezembro 14 - Confraternização e despedida
Fonte: dados da pesquisa.

Este estudo buscou proporcionar escola. Mais de 85% dos professores


uma abordagem de temas que costumam entrevistados considerou que as condições
ser pouco explorados no dia-a-dia da sala de trabalho poderiam melhorar, declarando
de aula na escola. Os mesmo puderam, em que a falta de incentivo financeiro é um dos
sua maioria, ser trabalhados sob uma visão principais problemas escolares. Apenas um
socioambiental, sistêmica e prática, docente, dentre os sete entrevistados,
incluindo o ser humano como parte declarou que utiliza experimentos ou aula de
integrante do ambiente como um todo. campo como estratégia didática. Ao passo
que todos declararam utilizar
Resultados e discussão frequentemente aulas expositivas ou
metodologias “tradicionais” – termo
O corpo docente escolar utilizado pelos professores – similares.
entrevistado compreendeu-se numa faixa Quando questionados sobre o que
etária variando entre 23 e 55 anos de idade, entendiam por interdisciplinaridade, mais da
sendo em sua maioria (71,43%) do sexo metade dos professores (57,14%) relacionou
masculino. Os professores entrevistados o termo à abordagem de um tema por várias
variaram entre 3 e 25 anos de tempo de disciplinas ao mesmo tempo – refletindo a
serviço em sala de aula. A maior parte deles visão pouco aprofundada dos mesmos ao
(71,43%) declarou trabalhar em mais de uma tema. Geralmente os professores têm

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concepções errôneas ou superficiais sobre Durante as primeiras ações do


interdisciplinaridade, relacionando ao projeto observou-se clara timidez da maior
conceito de multidisciplinaridade e parte dos alunos em participar das atividades
apresentando dificuldades em desenvolver ou expressar sua opinião acerca dos temas
metodologias que contemplem a proposta trabalhados. Esse fato destacou a
adequadamente (AUGUSTO et al. 2004). importância da escolha da estratégia didática
Fato semelhante foi possível de ser para o bom desenvolvimento da pesquisa
observado com o entendimento do que é e da (ARDOINO 2002).
286 importância da EA para o desenvolvimento No questionário pré-teste foi
do saber ambiental. Muitas vezes a possível perceber nos alunos uma noção
construção do saber ambiental do aluno é destorcida ou reduzida em relação ao
sufocada pelo protagonismo docente, quanto conceito de meio ambiente, definindo-o
à segregação do conhecimento e/ou como “a natureza” ou “bichos e plantas de
direcionamento pelo livro didático, quando um local”. Entretanto, apesar de não
deveria subsidiar as propostas pedagógicas incluírem o ser humano como parte
que abordam temáticas ambientais integrante do meio, destacaram a
(MORIGI et al. 2010). A definição de EA importância de conservá-lo mediante a
esteve compreendida por 85,71% dos dependência da sociedade dos seus recursos.
professores como “estudo de temáticas Segundo Bonotto e Semprebone (2010),
ambientais”. Os professores informaram para o estudante a natureza é valorada em
ainda que a temática Ecologia poderia ser função de sua utilidade para o ser humano, o
bem mais explorada se houvesse mais tempo que comumente está relacionado – dentre
disponível para isso. Mais da metade dos outras coisas – a abordagem e orientações
professores (4 dos sete entrevistados) contidas nos livros didáticos, bem como as
caracterizaram as plantas carnívoras como experiências existenciais adquiridas por
plantas que se alimentam de insetos. Os cada indivíduo.
demais professores afirmaram não conhecer Ainda no início do projeto, a oficina
tais organismos (N = 2) ou que os mesmos de desenhos (Figuras 1A-B) sobre como
não existem (N = 1). seriam as plantas carnívoras, na visão dos
Os docentes da escola Polivalente alunos, colaborou positivamente para o
mostraram ter experiência voltada incentivo à expressão dos mesmos sobre a
basicamente ao ensino tradicional, mas temática sem que houvesse necessidade da
pouca ou nenhuma experiência quando se manifestação oral, evitando a timidez ou
trata de temáticas transversais, ou constrangimento diante do desconhecido.
metodologias relacionadas à Esta atividade também permitiu avaliar a
transdisciplinaridade. Quanto ao projeto, compreensão dos alunos sobre a temática. A
apenas uma docente demonstrou claro oficina registrou que o imaginário do aluno
interesse no estudo a ser realizado, enquanto detinha, às plantas carnívoras, seres
os outros se mostraram relutantes em “humanizados”, “comedores de gente”, de
colaborar com o mesmo. Contudo, houve caráter perigoso, oferecendo risco à espécie
uma disposição maior destes em participar humana. Tal visão se deu, segundo os
da viagem para aula campo. próprios alunos, devido à influência da
Dos alunos participantes, 46,51% mídia, através de imagens distorcidas da
informou residir em zona urbana, ao passo realidade, bem como da própria imaginação
que 53,48% informou residir em zona rural dos mesmos diante do termo “sugestivo” que
do município de Guarabira. A idade destes dá nome às plantas: carnívoras. Essa
variou entre 13 e 25 anos de idade, contudo, influência foi debatida com os alunos após a
a maioria (69,77%) estava compreendida na oficina de desenhos. Sabe-se que a sociedade
faixa etária entre 14 e 16 anos de idade, e sob contemporânea tem seus valores
um maior número de jovens do sexo extremamente influenciados pelas mídias,
feminino (72,09%). Além disso, os alunos que informam e desinformam,
foram questionados quanto sua ocupação especializando-se mais a cada dia em
fora da escola, onde a maior parte informou públicos bem específicos, de todas as idades,
dedicar seu tempo livre ao lazer (48,84%), culturas, costumes, espiritualidades,
trabalho (34,88%), ou esportes (20,93%). (i)limitações, contrastes, vontades, gêneros,

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Educação ecológica para a conservação das plantas carnívoras

etnias, cores e pensamentos, condensando diálogo, bem como do pensamento crítico


informações entre o real e o abstrato, profundo ao que vê, ouve e sente (SILVA et
moldando uma sociedade a abster-se do al. 2013).

287

Figura 1. Desenhos produzidos pelos alunos durante oficina (A); alunos participando
de atividade do projeto em sala de aula (B); planta carnívora (Utricularia gibba)
encontrada por aluno, durante o projeto, próximo à sua residência no município de
Guarabira-PB (C).

Durante a primeira metade do mostram a importância da paisagem


projeto, os alunos tiveram dificuldades em anteriormente não percebida, bem como a
construir respostas às questões entregues identificação de organismos que ali vivem e
após as atividades. Pôde-se considerar baixo sua importância, evitando um sentimento de
o nível de conhecimento das turmas rejeição pela paisagem e pelo espaço vivido
participantes sobre as temáticas ambientais (TUAN 1983). Logo, as ações desenvolvidas
trabalhadas, tanto pelas respostas pouco junto aos ecossistemas locais detêm
elaboradas ou desconexas, quanto pelo importância significativa para o
número elevado de perguntas não conhecimento e a valoração de seres,
respondidas, ou respondidas apenas com as ambientes e saberes.
expressões “não sei”, “não lembro”, ou, “já As atividades desenvolvidas em sala
ouvi falar”. Contudo, o aferimento da de aula revelaram, gradualmente, o interesse
percepção prévia e posterior dos alunos do aluno em debater sobre o ambiente, a
(Tabela 2) é de extrema importância, pois cultura, a educação, a política e a economia
direciona a ação educativa, corrigindo as local, ressaltando a importância do incentivo
percepções negativas dos mesmos em docente à discussão sobre o contexto no qual
relação ao local onde vivem, ou o aluno encontra-se inserido. Esses debates
simplesmente frequentam, bem como as mostraram-se como espaços abertos à
percepções negativas a este local (PEREIRA construção de ideias e valores sobre o saber
2005). Assim, ressaltam-se fatos que regional.

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Silva e Cruz 2014

Tabela 2. Quadro comparativo das respostas dos alunos aos questionários pré e pós-teste sobre
diferentes temáticas ambientais.
Respostas mais frequentes dos alunos aos questionários (em %)
Pré-teste Pós-teste
“O meio ambiente é importante para os seres “O meio ambiente é uma fonte de recursos qual o
vivos” (76,74%) ser humano é parte” (91,66%)
“Ter Educação Ambiental é proteger a natureza” “A Educação Ambiental nos conscientiza sobre a
(27,9%) preservação do meio” (97,22%)
288
“Não sei o que é Ecologia” (69,77%) “A Ecologia trata do estudo das relações entre os
seres e o meio” (91,66%)
“Não sei o que comentar sobre plantas “Plantas carnívoras habitam solos pobres, são
carnívoras” (62,79%) bioindicadores e importantes para o equilíbrio
ambiental” (86,11%)
“O desmatamento e a poluição dos rios “O desmatamento, a poluição e a destinação
prejudicam o meio e são causados pelo ser inapropriada do lixo, prejudicam o meio e são
humano” (97,67%) causados pelo ser humano” (100%)
“O ambiente onde vivo não está preservado” “O ambiente onde vivo é rico em biodiversidade e
(62,79%) possui características bem definidas” (86,11%)
“Não sei dizer o que é ecossistema” (76,74%) “Um ecossistema é formado por um conjunto de
interações entre seres e o meio” (91,66%)
“Não sei comentar nada a respeito dos “Característica dos ecossistemas locais:
ecossistemas locais” (100%) Caatinga” (100%), e/ou “Mata Atlântica”
(94,44%), e/ou “Tabuleiro” (77,77%)
Fonte: dados da pesquisa.

Analisando os questionários pré e Filosofia, ideologia, antropologia,


pós atividades e observando a participação antropocentrismo, senso crítico, senso
dos alunos ao longo do projeto, é possível comum, paradigma, paradoxo, economia
identificar uma progressão dos alunos verde e modelo de produção. Tal fato
quanto: a assimilação de informações provavelmente está relacionado à
relacionadas aos conceitos ambientais; a deficiência no ensino nas séries anteriores,
desconstrução e reconstrução de ideias sobre onde os mesmos deveriam ter conhecimento
a temática socioambiental; a facilidade em de conteúdos relacionados ao estudo,
elaborar um argumento durante uma realidade comumente observada nas séries
discussão; a independência à pesquisa; a da educação básica do ensino público
sede pelo conhecimento; o aumento da brasileiro (PINTO 2012). Entretanto, os
percepção e sensibilidade ambiental. Cada alunos também se mostraram conhecedores
progressão apontada foi mediada, direta ou de boa parte dos problemas ambientais que
indiretamente, pela presença do instrumento afetam o município de Guarabira,
didático – nesse caso, as plantas carnívoras – destacando principalmente a situação
topicalizado em dimensões distintas – caótica de poluição do Rio Guarabira, a
ecológica, social, econômica, relacional e imensa quantidade de novos loteamentos na
ideológica, por exemplo – pertencentes a sua cidade, bem como do descaso dos políticos à
própria natureza, proporcionou a construção causa (Tabela 2). O interesse dos alunos
e o desenvolvimento do saber ambiental expôs a temática à condição de meio
livre de qualquer engessamento facilitador do diálogo sobre questões
epistemológico, conforme sugerido por ambientais, ficando registrado aos
Barros et al. (2002). professores da escola a carência de ações
Ao longo da prática do projeto, foi educativas que priorizem a troca de
possível constatar que os alunos possuíam informações e atividades relacionadas à
dificuldades na compreensão de qualidade ambiental da cidade.
determinados conceitos, dentre estes: A continuidade das atividades do
Ecologia, Educação Ambiental, nicho projeto pôde revelar uma mudança gradual
ecológico, equilíbrio ecológico, teia na forma de pensar dos alunos,
alimentar, habitat, ecossistema, bioma, demonstrando um crescimento significativo,
mimetismo, movimentos násticos, na maior parte dos mesmos, na capacidade

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Educação ecológica para a conservação das plantas carnívoras

de assimilação de conhecimentos sobre realização da mesma, dando continuidade à


temáticas ligadas ao meio ambiente, aula campo, os alunos visitaram uma área
refletindo a eficácia do uso das plantas antropizada (Figura 2D), localizada entre a
carnívoras como instrumentos didáticos para Rebio e o município de Guarabira, para que
o desenvolvimento do saber ambiental. se fosse analisado, através de uma leitura do
Segundo Abílio (2011), existem certos local, o contraste existente, entre os diversos
temas que tornam-se subutilizados pelo ambientes visitados durante o dia de aula.
docente que prefere abordá-los, quando o Segundo Rocha et al. (2010), as trilhas
289 fazem, de forma superficial, ignorando o ecológicas são importantes ferramentas de
enriquecimento que estes recursos podem Educação Ambiental, permitindo o acesso
trazer ao planejamento e desenvolvimento prático à informação sobre a preservação e
da prática pedagógica. conservação de ecossistemas ameaçados,
Pode-se destacar a atividade em maximizando a conscientização do
campo como importante estratégia para indivíduo participante da atividade. Após a
assimilação de conteúdos postos em sala de aula campo, os alunos ressaltaram que a
aula. Segundo os próprios alunos, “a prática vivência de um conteúdo é fundamental para
revela dimensões diferentes do conteúdo que a melhor compreensão das informações
a teoria não alcança” (aluno do 1º ano). trabalhadas durante a aula teórica
Mesmo o planejamento da aula campo – (OLIVEIRA 2005). Além disso, puderam
quando bem elaborado – pode mostrar-se relatar que “existem detalhes que, mesmo
como combustível extra, para o aluno, à que o professor mostre imagens e explique
busca da pesquisa e/ou, mesmo, ao bem, só durante uma prática no campo pode-
conhecimento do meio e da biota local. Esta se sentir a riqueza dos detalhes visuais,
afirmação comprova-se mediante o achado sonoros e palpáveis”. Os próprios alunos
de uma espécie de planta carnívora avaliaram a aula campo como
(Utricularia gibba) (Figura 1C) por um dos “inesquecível” ou “muito proveitosa”. Ainda
alunos participantes do projeto, próximo à destacaram que não tiveram cansaço e
sua residência, no município de Guarabira, gostariam que a trilha tivesse sido em um
registrando a primeira ocorrência de planta percurso maior para que pudessem ter
carnívora para o município. O material foi conhecido mais ambientes novos. Para
coletado e tombado no Herbário Lauro Pires Schwantes et al. (2013), o trabalho em
Xavier (JPB) da UFPB, com o nome do campo constitui-se como uma importante
aluno como coletor. estratégia didática, “tornando possível a
Quanto à aula campo, foi possível aprendizagem significativa em decorrência
trabalhar a importância de cada organismo do maior conhecimento das espécies nativas
em um ecossistema complexo como ator locais e contribuindo para a Educação
fundamental para a manutenção do meio, Ambiental”. As experiências adquiridas
bem como a responsabilidade do ser durante a aula campo foram discutidas em
humano mediante as modificações da sala de aula pelos professores participantes
paisagem e as consequências decorrentes da atividade. Fotos e depoimentos dos
da perda da biodiversidade do ambiente, alunos foram publicadas no blog da escola
modificações climáticas, desequilíbrio (http://monsenhoremiliano.blogspot.com.br
social e contrastes ambientais. Durante a ) (Tabela 3).
trilha ecológica (Figura 2A), os alunos Os comentários dos alunos
puderam elaborar em dupla um relatório evidenciaram as diferentes categorias de EA
descrevendo suas experiências à atividade, (ABÍLIO 2011) trabalhadas durante o
mediante um roteiro que fora entregue aos projeto (Tabela 3), revelando que na segunda
mesmos no início da trilha. Em cada metade do mesmo os alunos possuíam desde
ambiente diferente foi possível realizar uma uma visão mais ampla sobre a EA –
pequena discussão sobre a paisagem, bem abordando várias vertentes simultaneamente
como coletas para deposição em herbário – quanto mais específica, explicitando a
(Figuras 2B-C). importância da valoração do meio natural à
Os alunos se mostraram manutenção das gerações futuras,
participativos e atentos às informações sensibilizando e formando ambientalmente o
construídas ao longo da trilha. Após a indivíduo. No início da pesquisa, quando

Gaia Scientia (2014) 8 (1)


Silva e Cruz 2014

questionados sobre suas noções relativas à possível analisar que, ao término do projeto,
Educação Ambiental, a maioria dos alunos os alunos haviam desenvolvido novas
relatou que “ter educação ambiental é compreensões do meio, bem como uma
proteger a natureza”. Contudo, nenhum dos significativa valoração da consciência
alunos soube comentar algo sobre os ambiental contribuindo para a formação de
ecossistemas locais (Tabela 2). cidadãos críticos, responsáveis e
Após a aula campo foi aplicado o participantes às questões relacionadas ao
questionário pós-teste, através do qual foi ambiente.
290

Figura 2. Alunos durante trilha ecológica na aula campo (A); planta carnívora (Drosera
sessilifolia) sendo fotografada por aluno e prensada durante aula campo (B-C); local
antropizado visitado pelos alunos durante a aula campo (D).

O entendimento do estado da proporcionando experiências em atividades


biodiversidade local pelas comunidades relacionadas aos tais.
locais – sobre aspecto científico, cultural, Constatou-se que a utilização de
biológico e econômico – é extremamente instrumentos didáticos para o
importante e necessária no processo de desenvolvimento das práticas educacionais
evolução da ciência, fortalecendo e relacionadas ao meio ambiente pode ser
renovando o conhecimento popular e realizada de modo a aproveitar o contexto
proporcionando a identificação de social, cultural, econômico e ambiental sob
informações que favoreçam o estudo do o qual o aluno está inserido de modo a
meio (ABÍLIO 2011). Ainda, a utilização do ampliar a formação, absorção e
conhecimento científico através da disseminação do saber local. Ao passo que a
instrumentação didática pode contribuir no curiosidade dos alunos foi fator
incentivo dos alunos à pesquisa científica preponderante para o desenvolvimento de
relacionada ao estudo do meio social e tais práticas. Logo, o interesse na descoberta
ecológico, difundindo a importância de esteve presente durante todo o estudo como
trabalhar tais temáticas, bem como combustível estimulante da aprendizagem.

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Educação ecológica para a conservação das plantas carnívoras

Tabela 3. Comentários de alunos, após a aula campo, relacionados a categorias de Educação


Ambiental, segundo ABÍLIO (2011).
Categoria Comentário do aluno ABÍLIO (2011)
Conservacionista
Valoriza o processo de
“Nessa viagem aprendemos que a Reserva foi fundada
conservação dos recursos
para proteger uma bacia hidrográfica e também para
naturais (os recursos naturais
preservar o meio ambiente, e o quanto é interessante
podem ser explorados, desde
estarmos sempre aprendendo um pouco mais sobre a
que sejam utilizados de
291 natureza.”
forma racional).
“Nessa viagem aprendemos que o meio ambiente é bem
Generalista

diferenciado. Apresenta vários tipos de biomas, com


Mostra uma visão ampla
vegetação e características pra cada um. Lá na Reserva
sobre conteúdos e atividades
Guaribas vimos alguns tipos de matas, vegetações e o
da EA.
solo, que se apresenta como um bioindicador
das características do lugar.”
“Aprendemos que as matas e as florestas estão sendo
devastadas, mas existem locais preservados e é
Valoriza “em excesso” o
Preservacionista

diferente. Vimos também diferentes tipos de biomas,


área de Mata Atlântica e regiões com arbustos. Nesse processo de preservação dos
lugar o clima é diferente e o ar é mais puro, o que torna recursos naturais
a reserva muito linda. Tem várias espécies de plantas e (manutenção dos recursos
animais, os macacos famosos, os guaribas, e também naturais intocáveis ou para
plantas carnívoras que tornam o lugar bom para fazer as gerações futuras).
pesquisas e aprender o quanto é bom preservar o
patrimônio paraibano até desconhecido.”
“A reserva Rebio Guaribas foi fundada em 1990 com o
Destaca o processo de
objetivo inicial de preservar as bacias hidrográficas.
Sensibilização

formação do indivíduo que


Logo depois foi elaborado um projeto de proteção dos
busca a sensibilização
macacos Guaribas. A Reserva possui um ambiente de
quanto aos problemas
paisagens variadas, com características de Mata
ambientais e utilização dos
Atlântica, Caatinga e outros. Foi um passeio inspirador
recursos naturais de forma
na trilha, encontramos a espécie de planta carnívora
racional.
(Drosera).”
“Uma viagem inesquecível, aprendemos de maneira Destaca o processo de
Conscientização

agradável e coerente sobre a importância da Mata formação do indivíduo


Atlântica. Vimos também efeitos da devastação humana, crítico e reflexivo que busca
onde um dia foi Mata Atlântica e hoje está a céu aberto e a conscientização quanto aos
vegetação rasteira... De interesses humanos e problemas ambientais e
financeiros, a exemplo da cana-de-açúcar, produzindo o utilização dos recursos
açúcar, etanol e álcool.” naturais de forma racional.
Fonte: dados da pesquisa; adaptado de ABÍLIO (2011).

Faz-se necessário que a temática Editora Universitária da UFPB, p. 325-


transversal seja contextualizada antes de sua 349.
inserção à prática. A EA pode ser trabalhada ABÍLIO FJP (Org.). 2011. Educação
de forma transdisciplinar desde que não Ambiental para o Semiárido. João
esteja engessada ao tradicionalismo didático Pessoa: Editora Universitária da UFPB,
ou à rotina no processo ensino 580p.
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