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E-BOOK DO I WORKSHOP DE GEOMORFOLOGIA E GEOARQUEOLOGIA DO


NORDESTE. VOL I.

Book · April 2017

CITATIONS READS

0 2,448

2 authors, including:

Fabrizio de Luiz Rosito Listo


Federal University of Pernambuco
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Zoneamento de Processos Morfodinâmicos para o Estado de Pernambuco: Banco de dados georreferenciado das áreas de ocorrência de erosão e deslizamentos de
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E-BOOK DO I WORKSHOP DE GEOMORFOLOGIA E GEOARQUEOLOGIA DO NORDESTE

VOL I

Copyright© Grupo de Estudos do Quaternário do Nordeste Brasileiro – GEQUA

Texto© 2016 diversos autores

Todos os direitos reservados. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte.

Patrocinadores

UFPE; PPGEO; PPGArq; GEQUA; FACEPE; INAPAS; MAP-UFPE; LMRI-DEN/UFPE; CAPES; CNPq

Organizadores

Fabrizio de Luiz Rosito Listo, Demétrio Mützenberg e Bruno de Azevedo Cavalcanti Tavares

Projeto Gráfico

Amanda de Azevedo Cavalcanti Tavares

Editoração eletrônica

Daniela Cisneiros e Larissa Monteiro Rafael

Capa

Amanda de Azevedo Cavalcanti Tavares

E-book do I Workshop de Geomorfologia e Geoarqueologia do Nordeste.


Volume I. Fabrizio de Luiz Rosito Listo, Demétrio da Silva Mützenberg, Bruno de
Azevedo Cavalcanti Tavares (Orgs.). Recife: GEQUA, 2016. 268 f.

Vários colaboradores
ISBN: 978-85-922143-0-2

1.Geomorfologia. 2.Geoarqueologia. 3.Quaternário. 4.Dinâmicas


Superficiais. 5.Geotecnologias. 6.Paleoambientes. 7. Nordeste – Brasil.
I.LISTO, Fabrizio. II.MUTZENBERG, Demétrio. III.TAVARES, Bruno.
I WORKSHOP DE GEOMORFOLOGIA E GEOARQUEOLOGIA DO NORDESTE

COMISSÃO ORGANIZADORA

Antônio Carlos de Barros Corrêa


Coordenador do Evento
Departamento de Ciências Geográficas da UFPE

Demétrio Mutzenberg
Vice-Coordenador do Evento
Departamento de Arqueologia da UFPE

Bruno de Azevedo Cavalcanti Tavares


Comissão Científica do Evento
Departamento de Arqueologia da UFPE

Daniel Rodrigues de Lira


Comissão Científica do Evento
Departamento de Geografia da UFS

Daniela Cisneiros
Comissão Científica do Evento
Departamento de Arqueologia da UFPE

Danielle Gomes da Silva


Comissão Científica do Evento
Departamento de Ciências Geográficas da UFPE

Fabrizio de Luiz Rosito Listo


Comissão Científica do Evento
Departamento de Ciências Geográficas da UFPE

Jonas Otaviano Praça de Souza


Comissão Científica do Evento
Departamento de Geografia da UFPB

Kleython de Araújo Monteiro


Comissão Científica do Evento
Departamento de Geografia da UFAL

Lucas de Souza Cavalcanti


Comissão Científica do Evento
Departamento de Ciências Geográficas da UFPE

Osvaldo Girão da Silva


Comissão Científica do Evento
Departamento de Ciências Geográficas da UFPE
SUMÁRIO

A (DES) CONECTIVIDADE DA PAISAGEM EM AMBIENTE SEMIÁRIDO: BACIA DO RIACHO GRANDE,


SERTÃO CENTRAL PERNAMBUCANO 13
Joana D’arc Matias de Almeida, Antonio Carlos de Barros Corrêa, Jonas Otaviano Praça de Souza

ANÁLISE MULTITEMPORAL DO USO E COBERTURA DO SOLO DA ZONA COSTEIRA DE EXTREMOZ -


RN, BRASIL (2006-2016) 23
Ivaniza Sales Batista, Hudson Domingos Teixeira, Zuleide Maria Carvalho Lima, Joyce Clara Vieira
Ferreira e Antônia Vilaneide Lopes Costa de Oliveira

AS DEFICIÊNCIAS NA ABORDAGEM GEOMORFOLÓGICA NOS ESTUDOS DE IMPACTO AMBIENTAL


NO ESTADO DA PARAÍBA E A BUSCA POR METODOLOGIAS APLICADAS AOS EMPREENDIMENTOS
DE MINERAÇÃO 37
Henrique Elias Pessoa Gutierres, Camilla Jerssica da Silva Santos, Jessika de Oliveira, Neles Rodrigues e
Valdeniza Delmondes Pereira

DETERMINAÇÃO DE PARÂMETROS HIDROLÓGICOS, MORFOMÉTRICOS E PROBLEMAS


AMBIENTAIS EM SETOR URBANO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MUNDAÚ – MUNICÍPIO DE
RIO LARGO (AL) 49
John W. F. Marques, José H. M. da Silva, Damião S. Cordeiro, Roseildo F. da Silva e Genisson P. da Silva

PLANALTOS RESIDUAIS DO RIO GRANDE DO NORTE: ASPECTOS TEÓRICOS E CARACTERIZAÇÃO


FISIOGRÁFICA 57
Jacimária Fonseca de Medeiros e Luiz Antonio Cestaro

PATRIMÔNIO GEOMORFOLÓGICO DA ÁREA DO PROJETO GEOPARQUE CARIRI PARAIBANO 67


Leonardo Figueiredo de Meneses e Bartolomeu Israel de Sousa

ANÁLISE DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS EROSIVOS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO


BEBERIBE 79
José Fabio Gomes da Silva e Manuella Vieira Barbosa Neto

ANÁLISE DO SISTEMA FLUVIAL FRENTE AO USO E OCUPAÇÃO DA TERRA NA BACIA DO RIO TEJIPIÓ
– REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFE 89
Carla Suelania da Silva, Carlos de Oliveira Bispo, Sérgio Bernardes da Silva e Osvaldo Girão

CARACTERIZAÇÃO MORFOMÉTRICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO TRAÍRAS COM O APOIO DE


SIG 101
Alexandre Herculano de Souza Lima e Ronaldo Missura
MAPEAMENTO DAS UNIDADES LITOESTRATIGRÁFICAS E GEOMORFOLÓGICAS DO MUNICÍPIO DE
SERRINHA DOS PINTOS-RN 107
Jacimária Fonseca de Medeiros e Larissa Silva Queiroz

DETECCIÓN DE MINERALES CON USO DE IMÁGENES LANDSAT 8 EN LA REGIÓN DE VALPARAÍSO,


PROVINCIA DE LOS ANDES, COMUNA DE SAN ESTEBAN, LUGAR CAMPOS AHUMADA ALTO – CHILE
117
Nathaly Grau Perez, Keyla Manuela Alencar da Silva Alves e Juan Toledo Ibarra

INVENTÁRIO DE ESCORREGAMENTOS RASOS EM ÁREAS URBANAS E PARÂMETROS


TOPOGRÁFICOS: UMA ANÁLISE INICIAL NO BAIRRO DE NOVA DESCOBERTA, RECIFE (PE) 129
John Kennedy Ribeiro de Santana, Ana Márcia Moura da Costa, Victor da Silva Santa Rosa, Maria Rafaela
da Silva Cruz e Fabrizio de Luiz Rosito Listo

FEIÇÕES COSTEIRAS: ATRATIVOS PARA O GEOTURISMO COMO APLICABILIDADE PARA A


GEOCONSERVAÇÃO 137
Brenda Rafaele Viana da Silva e Elisabeth Mary de Carvalho Baptista

ANÁLISE FISIOGRÁFICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIACHO DO PONTAL-PE 145


Pedro Barbosa de Souza, Paulo Lucas Cândido Farias, Joaquim Pedro de Santana Xavier; Victor Pina
Figueiredo e Arthur Felipe de Melo Teixeira

COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA-ESTRUTURAL DE CAMPINA GRANDE- PB: UMA


RELAÇÃO ENTRE FEIÇÕES DO MODELADO E PADRÕES DE DRENAGEM ATRAVÉS DA
FOTOINTERPRETAÇÃO 153
Jônatas Nascimento da Costa e Sérgio Murilo Santos de Araújo

PROPRIEDADES MORFOMÉTRICAS COMO INDICATIVO DE SUBSIDÊNCIA E CRIAÇÃO DE ESPAÇOS


DE ACUMULAÇÃO SEDIMENTAR NO OESTE PERNAMBUCANO 163
Drielly Naamma Fonsêca, Bruno Araújo Torres, Daniel Rodrigues de Lira, Rhandysson Barbosa Gonçalves
e Antonio Carlos de Barros Corrêa

ANÁLISE DOS ÍNDICES RDE NA BACIA DO RIO MAMANGUAPE, PARAÍBA 177


Rhandysson Barbosa Gonçalves, Drielly Naamma Fonsêca eAntônio Carlos de Barros Corrêa

ANÁLISE MORFOESTRUTURAL PRELIMINAR DO RELEVO A PARTIR DA APLICAÇÃO DO ÍNDICE DE


HACK: UM ESTUDO DE CASO NO MACIÇO DE JOÃO DO VALE (RN-PB) 189
George Pereira de Oliveira, Bruno de Azevedo Cavalcanti Tavares, Clístenes Teixeira Batista e Marco Túlio
Mendonça Diniz

ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS LINEAMENTOS NO MACIÇO ESTRUTURAL DE ÁGUA BRANCA/AL


UTILIZANDO O SOFTWARE MICRODEM 201
Larissa Furtado Lins dos Santos, Ítalo Rodrigo Paulino de Arruda, Rhaissa Francisca Tavares de Melo e
Danielle Gomes da Silva
EXTRAÇÃO DE LINEAMENTOS DE RELEVO PARA INTERPRETAÇÃO MORFOESTRUTURAL DA BACIA
DO RIO PARAÍBA DO MEIO 211
Priscilla Emmanoelle Claudino da Silva, João Paulo da Hora Nascimento, Paulo de Tarso Barbosa Leite,
Kadja Monaysa Mendonça de Paula e Kleython de Araújo Monteiro

MAPEAMENTO DOS LINEAMENTOS DE DRENAGEM E DE RELEVO COMO CONDICIONANTES NA


COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA DO MUNICÍPIO DE SALGUEIRO – PE 217
Viviane Trajano da Silva, Ítalo Rodrigo Paulino de Arruda, Débora Albuquerque Meira Coelho Ramos,
Danielle Gomes da Silva

DINÂMICA COSTEIRA E REGISTRO ARQUEOLÓGICO NA PRAIA DE JERICOACOARA, JIJOCA DE


JERICOACOARA – CEARÁ – BRASIL 227
Verônica Viana, Thalison dos Santos, Cristiane Buco e João Moreira Cavalcante

GEOFÍSICA APLICADA À ARQUEOLOGIA HISTÓRICA: UM BREVE ESTUDO DE CASO NO ENGENHO


INHAMÃ, IGARASSU, PERNAMBUCO, BRASIL 241
Carlos Magnavita, Luiz Severino da Silva Jr, Demétrio Mutzenberg, Bruno Tavares e Cláudia Oliveira

RECONSTITUIÇÃO PALEOAMBIENTAL RECENTE (HOLOCENO) DA LAGOA URI DE CIMA


(SALGUEIRO, PE): UMA CONTRIBUIÇÃO DA PALEONTOLOGIA 257
Andrea Maria Francesco Valli e Demétrio Mutzenberg
PREFÁCIO
Ao longo de quatro dias do mês de dezembro de 2016, o Grupo de Estudos do Quaternário do
Nordeste Brasileiro (GEQUA) conjuntamente com o Programa de Pós-Graduação em
Geografia (PPGEO), o Programa de Pós-Graduação em Arqueologia e os Departamentos de
Ciências Geográficas (DCG) e de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE) promoveram o I Workshop de Geomorfologia e Geoarqueologia do Nordeste. Embora
essa sobreposição temática seja largamente reconhecida pelos acólitos das pesquisas sobre o
Quaternário, arqueologia da paisagem e dinâmica dos sistemas de superfície terrestre ainda não
ocorrera no Nordeste do Brasil um fórum comum entre essas áreas voltado para a discussão e
compartilhamento de pontos de vista teóricos, metodológicos e procedimentais. Desta forma,
este volume surge como parte do registro das contribuições apresentadas durante o Evento, no
qual se buscou construir pontes entre essas ciências sabidamente afins mediante a promoção de
oficinas dialógicas abrangendo um conjunto de áreas tais como a geografia física, a
geomorfologia, a geofísica, a geologia, além da geoarqueologia e seus múltiplos enfoques.

Os frutos dos trabalhos de pesquisa reunidos neste e-book representam um espelho das práticas
acadêmico-científicas contemporâneas dos profissionais do Nordeste brasileiro nas áreas
supracitadas. Como em um panóptico ora debruçado sobre a observação dos esforços de
investigação de profissionais, acadêmicos e diversos grupos de estudo, compila-se neste volume
esforços de pesquisa que transitam entre as abordagens já tradicionais, como as voltadas ao
estabelecimento de inventários fisiográficos, àquelas ainda em vias de difusão e preocupadas
com a aferição de processos ou testagem de novas narrativas teóricas sobre a paisagem; como
o conceito de conectividade para a compreensão das morfologias de estocagem e transmissão
de sedimentos em modelados de agradação.

Destacam-se dentre as contribuições um resgate sui generis de pontos de vista analíticos sobre
a dinâmica dos sistemas físicos de superfície que, ao aparentemente contraporem tempo e
dinâmica, clima e tectônica, bacia hidrográfica e paisagem, de fato nos oferecem uma gama de
opções de escolha dentre o estado-da-arte dos métodos e técnicas atualmente disponíveis para
o tratamento e apresentação da informação geoespacial.

Assim, embora sem pretender esgotar o cotejamento das linhas de trabalho correntes na região
com aquelas já consolidadas sobretudo pela literatura formativa, livros texto e manuais, esse
volume nos serve antes de mais nada como apontamento para a compreensão dos rumos que
vêm sendo perseguidos pela pesquisa e eventuais lacunas que ainda se fazem presentes, e cuja
confrontação, por parte daqueles que se engajam na pesquisa na interface entre as ciências ditas
da terra e as humanidades, seja premente para os avanços futuros. Ainda em uma era na qual o
status quo da pesquisa científica reflete uma profissão de fé sobre os paradigmas vigentes e em
desuso, a possibilidade de se debruçar sobre a ciência que se pratica em uma região em um dado
recorte de tempo constitui um exercício válido para o avanço do conhecimento e sua continuada
aferição. Boa leitura.

Antonio Carlos de Barros Corrêa

Universidade Federal de Pernambuco - UFPE


A (DES) CONECTIVIDADE DA PAISAGEM EM AMBIENTE
SEMIÁRIDO: BACIA DO RIACHO GRANDE, SERTÃO CENTRAL
PERNAMBUCANO
Joana D’Arc Matias de Almeida, Antonio Carlos de Barros Corrêa, Jonas
Otaviano Praça de Souza

geomorfologia com base na aplicação aos


INTRODUÇÃO
sistemas fluviais a partir da postulação do
As atividades antrópicas constituem-se conceito de sensitividade da paisagem,
elementos de destaque na modificação do nesta a ideia de ligação é proposta com base
caráter e comportamento do sistema fluvial, na ideia de resistência do sistema. Assim, o
portanto, intervenções por meio de projetos sistema pode permanecer ligado (coupled),
de gestão fluvial somam esforços para quando há livre transmissão de energia e
minimizar os seus crescentes impactos. Tais matéria entre os seus compartimentos;
medidas devem considerar a compreensão desligado (decoupled), quando a
do comportamento desses sistemas em sua transmissão é interrompida
complexidade. Neste âmbito, a temporariamente devido à existência de
geomorfologia fluvial tem se destacado por alguma forma de barramento/impedimento,
sua aplicabilidade nos estudos atrelados ao que pode vir a ser rompido; e não ligado
planejamento e gestão ambiental, de modo (not coupled), quando não há ligação entre
integrador, considerando as diversas os compartimentos do sistema, em razão de
relações e dinâmicas da paisagem através descontinuidades entre os processos
do papel dos rios na sua modelagem, a partir (Harvey, 2002; Souza, 2014). Deste modo,
de análises em diferentes escalas espaciais e a conectividade da paisagem é entendida
temporais dentro da perspectiva de como a possibilidade de interação de
sistemas. energia e matéria entre os compartimentos
que a integram.
Assim, utiliza-se a abordagem de sistemas
complexos para elucidar a dinâmica dos A conectividade da paisagem como o
sistemas fluviais, sobretudo no que se refere controle primário entre os fluxos de água e
à transferência de fluxos e sedimentos sedimento em bacias fluviais apresentam
dentro de uma bacia (Bracken et al., 2015). distintas ligações determinadas por
Nesta perspectiva, Brunsden & Thornes diferentes processos em cada
(1979) inserem a ideia de conectividade na compartimento do sistema. As ligações
podem ser trabalhadas em diferentes escalas
14

espaciais, podendo ser locais, zonais ou superficial, e por consequência o transporte


regionais. A escala local compreende as de água e sedimentos. O autor discorre
ligações dentro de uma ou entre duas zonas sobre o modo como os impedimentos
adjacentes no sistema fluvial, estando determinarão a capacidade de cada
relacionada às interações entre as ligações compartimento do sistema transmitir o
internas das encostas, entre a encosta e o fluxo por determinado intervalo de tempo,
canal, os tributários e o canal principal e as considerando que mudanças na distribuição
ligações no próprio canal. Atribuem-se as e características dos impedimentos
ligações zonais às relações entre duas zonas provocam alterações na transmissão de
do sistema fluvial; e as ligações regionais fluxo de sedimentos (Souza, 2014). Em
aos elementos que afetam todo o sistema vista disso, a aplicação de estudos que
(Souza, 2014). Portanto, os controles nas tenham a conectividade da paisagem como
ligações locais estão relacionados a foco de análise em regiões de terras secas,
mudanças ambientais que afetam a como o semiárido nordestino, faz-se
transmissão, enquanto que na escala zonal, necessária para a eficácia do gerenciamento
o controle é exercido por mudanças e planejamento dos recursos hídricos,
climáticas, alterando o nível de base, compreendendo a dinâmica e a
enquanto na escala regional os controles são complexidade do sistema fluvial, sobretudo
de ordem tectônica (Harvey, 2002). Logo, no que se refere à transmissão de fluxo e
compreendem-se as ligações a partir de três sedimentos, e identificação de ambientes de
dimensões espaciais: ligações longitudinais retenção de sedimentos. Neste sentido,
(entre a rede de canais), laterais (entre a rede estudos têm sido desenvolvidos no
de canais e encosta) e verticais (superfície e semiárido brasileiro por diversos autores,
sub-superfície). Estas ligações podem ser tais como Souza (2011), Souza e Corrêa
interrompidas por diferentes bloqueios: os (2012), Souza (2014), Almeida & Corrêa
buffers, barriers, blankets; ou (2014), Barros et al. (2014) e Almeida,
impulsionadas através dos boosters, que são Souza e Corrêa (2016).
feições que podem impulsionar a
transmissão de energia e matéria numa Pensando nisso, aplicou-se tal abordagem a
bacia fluvial. Estes bacia do Riacho Grande, com área de 316
bloqueios/impedimentos tratam-se de km², situada na microrregião do Pajeú,
feições geomorfológicas naturais e/ou Sertão Central Pernambucano, visando dar
antrópicas, que dificultam a conexão de destaque a aplicação de estudos que tenham
fluxo e sedimento entre os compartimentos a conectividade da paisagem como foco de
do sistema fluvial. O entendimento da análise em regiões de terras secas, como o
dinâmica e dos processos fluviais que semiárido nordestino, ressaltando a
geram estas formas auxilia na solução de necessidade de tais estudos para a eficácia
problemas relacionados ao transporte e do gerenciamento e planejamento dos
deposição de sedimentos, contribuindo à recursos hídricos, compreendendo a
gestão de recursos hídricos e ambientais em dinâmica e a complexidade do sistema
âmbito local, sobretudo em regiões fluvial, sobretudo no que se refere à
semiáridas, em que o fluxo de água e transmissão de fluxo e sedimentos, e
sedimentos na rede de canais é influenciado identificação de ambientes de retenção de
pela conectividade da paisagem. sedimentos.

Tal que, Souza (2014) destaca a ÁREA DE ESTUDO


complexidade de trabalhar a conectividade
da paisagem em ambientes semiáridos, A Bacia do Riacho Grande, com área de 316
devido aos reduzidos eventos chuvosos km², situa-se na microrregião do Pajeú,
capazes de fornecer fluxo de escoamento Sertão de Pernambuco, englobando em
15

partes os municípios de Serra Talhada, aos maciços residuais, que são distribuídos
Calumbi e Flores (Almeida, Souza & nesta unidade de paisagem com aspecto de
Corrêa, 2016). A bacia do Riacho Grande cristas alongadas (plútons Terra Nova, Suíte
está inserida entre o contexto das seguintes Intrusiva Tipo Itaporanga, Recanto/Riacho
unidades de paisagem: Depressão do Forno, Suíte Intrusiva Prata), seguindo
Interplanáltica do Pajeú e Horst de os controles estruturais da Zona de
Mirandiba (Figura 1). Cisalhamento Afogados da Ingazeira de
direção NE-SW e falhamentos com sentido
A Depressão Interplanáltica do Pajeú, que E-W (Sampaio, 2005).
se desenvolve como uma depressão
alongada para nordeste está confinada entre Nesta unidade desenvolvem-se atividades
os Maciços Remobilizados do Domínio da agropecuárias, sobretudo aquelas voltadas à
Zona Transversal e a Encosta Ocidental do subsistência, com a distribuição de
Planalto da Borborema (Corrêa et al., pequenos sítios, que aproveitam as áreas de
2010). Neste compartimento de aspecto plaino aluvial para o cultivo de lavouras de
aplainado instalou-se a bacia do Rio Pajeú, ciclo curto. Diante da semiaridez na região,
ao qual se encontra inserida a bacia do o desenvolvimento dessas atividades é
Riacho Grande, como um de seus propiciado pela instalação de pequenas
tributários. O aspecto aplainado dá destaque barragens e perfuração de poços rasos.

Figura 1: Unidades de Paisagem na Bacia do Rch. Grande.

O Horst de Mirandiba é representado na apresenta um alto potencial hidrogeológico,


paisagem como um remanescente constituindo o principal sistema aquífero
sedimentar formado por arenitos da intersticial da bacia. Nesta unidade de
Formação Tacaratu – Bacia de Fátima. paisagem, o uso restringe-se ao
Portanto, predominantemente arenoso, desenvolvimento da caatinga arbustiva.
16

MATERIAIS E MÉTODOS pesquisas da Comissão de pesquisa e


mapeamento geomorfológico, da União
A metodologia e os procedimentos Geográfica Internacional (UGI). De acordo
metodológicos do presente trabalho foram com esta proposta, um mapeamento
fundamentados com o objetivo de geomorfológico de detalhe pode ser
identificar os elementos de desconexão da caracterizado com escalas entre 1:25.000 e
paisagem na bacia do Riacho Grande. 1:50.000, ou mesmo 1:100.000 em regiões
Assim, as etapas metodológicas foram com poucas informações. Nesta proposta, o
sistematizadas em: mapeamento conteúdo do mapa geomorfológico de
geomorfológico de detalhe, mapeamento de detalhe deve apresentar: a) propriedades
uso e cobertura da terra, e por fim, morfológicas e morfométricas, tal como
mapeamento da conectividade da paisagem. tamanho, forma, declividade, rugosidade
etc; b) estrutura material/ tipo de rocha e
Mapeamento Geomorfológico de Detalhe arranjo das formas; c) processos dinâmicos
que condicionam outros atributos (Lima et
Esta etapa consiste na identificação da al., 2015).
morfologia e morfometria das formas de
relevo, introduzindo a declividade ao Mapeamento da dinâmica de uso e
mapeamento e deste modo integrando a cobertura da terra
análise qualitativa com dados quantitativos
importantes na avaliação dos processos O mapeamento em questão teve por
geomorfológicos (Rodrigues & Brito 2000). objetivo identificar a atual configuração do
Neste mapeamento são considerados uso da terra nas áreas consideradas neste
também os fatores antropogênicos que trabalho, de modo a identificar a
modificam formas e processos vigentes na contribuição dos diferentes padrões de uso
área, contribuindo com fluxos de energia e sobre a produção de sedimentos. Para isto,
matéria ao sistema. O mapeamento utilizou essa etapa conta com uma base de dados de
dados de Modelos Digitais de Elevação campo obtidos com o auxílio de GPS (GPS
(MDE) e dados secundários, como mapa Garmim Etrex Vista Hcx, e o GPS
geológico, perfis topográficos, curvas de topográfico PRO-XH –Trimble), como
nível, declividade, além de informações também imagens Quickbird (período de
obtidas nos trabalhos de campo e a partir de junho/2013 a setembro/2014, resolução
imagens de alta resolução como as dos espacial de 2,4 m) e RapidEye (período de
satélites Quickbird e RapidEye, essas maio/2013 a agosto/2013, resolução
cedidas pela Universidade Regional do espacial de 5 m), essas cedidas pela
Cariri (Urca) em convênio com o Ministério Universidade Regional do Cariri (Urca) em
do Meio Ambiente. O tratamento dos dados convênio com o Ministério do Meio
foi realizado por meio do uso do SIG Arcgis Ambiente.
10.1, em escala de 1:25.000, seguindo o
Manual da UGI (União Geográfica O tratamento dos dados realizou-se a partir
Internacional) (Demek, 1972). Apesar deste do SIG Arcgis 10.1, em escala de 1:10.000.
trabalho não seguir todos os parâmetros Uma das especificidades é usar imagens de
descritos no manual, como legenda e padrão diferentes períodos do ano, para que seja
hierárquico, de acordo com Lima et al., possível identificar as diferenças intra-
2015, é importante tê-lo como um guia para anuais de uso, como a relação cultura de
universalizar algumas questões básicas do ciclo curto, pasto e solo nu, que ocorre em
mapa geomorfológico descrito adiante. grande parte das áreas utilizadas na bacia
(Souza, 2011), focando nos usos que afetam
O manual de mapeamento geomorfológico diretamente o fornecimento de sedimento
de detalhe (Demek, 1972) é fruto de no sistema. O mapeamento seguiu o padrão
17

de legenda da Fao (Food and Agriculture paisagem, tanto impedindo ou diminuindo o


Organization of the United Nations). fluxo, quanto incrementando-o (Fryirs,
2007b). Esses elementos são divididos em
No presente trabalho optou-se por adaptar a quatro tipos: buffers, barriers, blankets e
legenda da Organização das Nações Unidas boosters (Fryirs, 2007b). A identificação
para Alimentação e Agricultura (Fao) em destes elementos desconectantes se
virtude desta atender melhor ao nível de realizou, inicialmente a partir dos dados de
detalhamento para cada modalidade de declividade, do mapa geomorfológico e do
classificação, além de sua plasticidade mapeamento da dinâmica de uso e cobertura
tipológica. A legenda do mapeamento de da terra (Fryirs, 2007a). Posteriormente
uso e cobertura da terra é definida pela foram incluídas na análise, elementos e
Organização das Nações Unidas para a informações obtidas em trabalhos de
Agricultura e Alimentação pelo critério campo.
funcional, ou seja, considera-se que o
conceito de uso está relacionado à
RESULTADOS E DISCUSSÕES
finalidade para a qual a terra é usada pela
população local (Fao, 1995). A dinâmica da paisagem muito está atrelada
às interações entre os elementos naturais e
A adaptação à legenda da FAO se deu a aos usos antrópicos em apropriação,
posteriori (Quadro 1). A priori foram influenciando a modificação dos processos
definidas as classes a serem mapeadas (erosivos e deposicionais), e suas
seguindo o nivelamento sistemático de morfologias resultantes. Nesse sentindo
classes de uso e cobertura da terra da Fao insere-se a perspectiva da conectividade da
(Fao, 2005), a partir do conhecimento paisagem, que relaciona as diferentes
prévio da área de estudo, e em seguida fez- interações nos usos e a cobertura da terra,
se as adaptações a partir das classes capazes de gerar impedimentos na livre
identificadas e reconhecidas em trabalho de circulação de energia e matéria entre os
campo, realizado em novembro/2015 e compartimentos da paisagem.
maio/2016.
Pensando na proposta dos elementos
Quadro 1: adaptação da legenda de uso e cobertura
da terra da FAO para a bacia do Riacho Grande capazes de impedir a transmissão de fluxo e
sedimento entre o sistema, mapearam-se
inicialmente os diferentes padrões de uso e
cobertura da terra (Figura 2), buscando
identificar os elementos que compõem a
paisagem atual e entre eles, os bloqueios
naturais ou antrópicos na bacia do Riacho
Grande.

Entre os elementos que compõem e afetam


a dinâmica da paisagem na bacia,
predominam as áreas de vegetação
arbustiva, que se apresentam esparsas, com
Mapeamento de Conectividade da espécies caducifólias, típicas da região
Paisagem semiárida do Nordeste, que em períodos de
estiagem apresentam-se desnudas,
O mapeamento da conectividade da denominando-se de “matas-branca”
paisagem consistiu em identificar os (Maciel & Pontes, 2016). Em exceção
elementos naturais ou artificiais que encontram-se as manchas de vegetação
influenciam na transmissão de energia e arbustiva densa, que ocorrem nas áreas mais
matéria entre os compartimentos da
18

elevadas da bacia. Este tipo de vegetação margens dos rios encontram-se voltadas às
ocupa a maior porção da área total da bacia, atividades agropecuárias, com exposição do
enquanto a vegetação do tipo arbórea solo, sobretudo ao longo do canal principal
representa a menor área, essencialmente e seus tributários, devido ao aproveitamento
representada pelas espécies frutíferas nos da água armazenada em subsuperfície em
pequenos assentamentos rurais e ou como leito arenoso, o que resulta na
ornamentação nas vilas e distritos. A remobilização dos sedimentos encosta-
vegetação herbácea corresponde às áreas canal e no entulhamento das confluências.
em regeneração ou em períodos de pousio. Por tratar-se de uma bacia fluvial
Estas áreas também são muito utilizadas exclusivamente rural, as atividades
para pastagem. agropecuárias são responsáveis pela
dinâmica econômica na área, portanto as
A cobertura vegetal mantém um áreas de solo exposto devem-se ao
significativo papel na estabilização do solo desenvolvimento de atividades como o
frente aos processos erosivos, conservando preparo do solo às lavouras de ciclo curto e
as encostas e margens dos canais fluviais. criação de animais de médio a pequeno
Contudo, na bacia do Riacho Grande, as porte.

Figura 2: Uso e cobertura da terra, Bacia do Riacho Grande, PE.

Apesar da menor proporção, destaca-se na sedimentos carreados pelos canais,


bacia a extração mineral. Localizada entre alterando, do ponto de vista ambiental, a
os maciços residuais, a mineração de qualidade dos recursos hídricos
granito para britagem, contribui à superficiais.
intensificação dos processos erosivos
locais, com a supressão da vegetação O mapeamento de uso e cobertura da terra
natural, modificando o aporte de forneceu a base primordial para a
19

identificação dos elementos de desconexão, À vista disso, foram identificados os


juntamente com os mapas de declividade e seguintes elementos de desconexão (Figura
geomorfológico, tendo em vista a ideia 3): as planícies de inundação e tributários
central proposta pela abordagem da aprisionados, como bloqueios naturais;
conectividade da paisagem, barramentos (barragens), aglomerados de
complementando os dados enfatizados por distritos, vilas e povoados, rodovias
Almeida, Souza e Corrêa (2016). pavimentadas e não pavimentadas, e
ferrovia (Transnordestina), como bloqueios
antrópicos.

Figura 3: Elementos de desconexão, Bacia do Riacho Grande, PE.

Notou-se, principalmente, a expressiva alternativas de abastecimento de água para


quantidade de barragens ao longo da bacia a manutenção das lavouras e para pecuária
do Riacho Grande, constituindo as formas diante da escassez hídrica no Semiárido
de impedimento responsáveis pelas maiores nordestino. Por se tratarem de modelos
alterações nos processos de transmissão rústicos, sem o devido aparato estrutural e
dentro da bacia. As mesmas atuam como tecnológico, são bastante comuns durante
impedimentos longitudinais (barriers), os eventos de alta magnitude os
impedindo a livre circulação do fluxo entre rompimentos destas barragens, alterando o
o canal principal e os tributários, rompendo cenário de conectividade dentro da bacia
a conexão entre canais (interação canal (Almeida, Souza & Corrêa, 2016). Uma
principal-tributário). Esses barramentos são exceção a este cenário são as barragens de
frequentes nos canais tributários, e sua concreto, como a construída ao longo do
construção dá-se pela urgência em medidas Riacho Grande (Figura 4).
20

energia e matéria no sistema de drenagem,


alterando a morfologia natural dos rios, do
relevo e das relações entre superfície e
subsuperfície, devido à impermeabilização
dos solos. Portanto, os aglomerados
humanos atuam nas três esferas de
conectividade. Trata-se de impedimentos
laterais, devido à modificação entre a
transferência encosta-canal, através de
Figura 4: Barragem de concreto, canal principal –
obras para a viabilização das mesmas,
Riacho Grande.
alterando a morfologia das encostas,
Em relação à transmissão de fluxo, as modificando também a relação escoamento
barragens de concreto interrompem quase superficial e infiltração de água no solo e a
drasticamente o fluxo de sedimento de obstrução dos cursos naturais. Essas
fundo, depositando-os em planície de morfologias construídas podem atuar ainda
inundação à montante, bem como como impedimentos longitudinais, como no
contribuindo para o incremento dos caso da instalação de vias de acesso, e
processos erosivos à jusante do barramento. mesmo como impedimentos verticais, com
a diminuição da capacidade de infiltração
As estradas, pavimentadas ou não, estão de água no solo, devido à ampliação de
entre os impedimentos longitudinais atividades que vedam a camada superficial,
(barriers) e laterais (buffers), ora evitando a livre circulação superfície-
impedindo a transferência entre o fluxo de subsuperfície, reduzindo, portanto a oferta
sedimentos na própria rede de canais, ora, de água aos aquíferos aluviais livres.
impedindo os sedimentos de alcançarem os
próprios canais, quando provenientes das Os elementos de desconexão naturais
encostas. No decorrer dos eventos de baixa correspondem a formas deposicionais, e se
magnitude, quando o fluxo não tem localizam ao longo do canal principal e nas
competência suficiente para ultrapassá-las, confluências entre os tributários. Tratam-se
o sedimento fica retido nas laterais das das planícies de inundação e dos tributários
estradas, ou seguem-nas paralelamente aprisionados. Ambos se formam a partir dos
modificando a rede de canais (Almeida, processos agradacionais relacionados à
Souza & Corrêa, 2016). No caso da rodovia dinâmica do próprio canal fluvial ou entre o
federal BR-232, a mesma constitui um canal e a encosta.
elemento de desconexão permanente,
As planícies de inundação representam as
devido à impossibilidade de rompimento e
formas deposicionais geradas a partir do
livre circulação canal-canal/encosta-canal
extravasamento do fluxo, presentes em
imposta pela solidez da construção, mesmo
canais parcialmente confinados e
em eventos de alta magnitude, o que resulta
lateralmente não confinados. Entre os
no entulhamento dos sedimentos sob as
canais lateralmente não confinados,
pontes e nas suas laterais. Assim como as
encontram-se os vales preenchidos
estradas, a ferrovia Transnordestina insere-
conservados (Figura 5). De aparência
se como elemento de desconexão
aplainada, têm seu processo evolutivo
longitudinal/lateral, alterando a dinâmica
relacionado à alternância entre fases de
entre a rede de canais.
preenchimento e incisão. Seu
Os aglomerados populacionais foram preenchimento está relacionado, além da
incluídos no mapeamento de conectividade transmissão de sedimentos entre canais, à
da paisagem, pois os mesmos atuam de transferência de materiais das encostas.
forma diferenciada na transmissão de
21

Tal estudo aplicado a Bacia do Riacho


Grande foi de suma importância na
identificação dos elementos de desconexão,
muito influenciados pelos processos
erosivos e deposicionais impulsionados
pelo desenvolvimento das atividades
antrópicas na região. A identificação desses
elementos permite também assinalar as
áreas de grande retenção de sedimentos, que
Figura 5: Vale preenchido conservado, Foz do
Riacho Grande, PE.
apresentam potencial ao abastecimento
alternativo de água com a possibilidade de
Os tributários aprisionados, como barriers, perfuração de poços rasos e instalação de
ocorrem quando da deposição de barragens subterrâneas. Para isso, são
sedimentos na confluência entre canais, necessários estudos mais detalhados e que
entulhando o exutório dos canais sejam direcionados para este fim. Porém, o
tributários. Na bacia do Riacho Grande, dos que se pode garantir é que a proposta da
36 tributários diretos ao canal principal, 16 conectividade da paisagem tem total
encontram-se aprisionados. Parte disso se eficácia na identificação de tais depósitos, e,
deve à relação entre a energia do fluxo e a portanto, pode ser utilizada como uma
sedimentação à montante das planícies de primeira etapa de trabalho, buscando não
inundação no canal principal, ou devido à apenas a identificação dos depósitos
acreção de diques marginais, ou ainda a aluviais, mas também dos elementos que
controles estruturais. contribuem ou não para a conectividade
entre os compartimentos da paisagem,
Apesar de interromperem a conexão entre compreendendo a totalidade do sistema
os diferentes compartimentos na paisagem, fluvial, e não apenas ao que se restringe aos
considerando os impedimentos naturais usos da água.
como formas deposicionais que retém o
fluxo de água e sedimento, esses constituem REFERÊNCIAS
elementos da paisagem relevantes ao
abastecimento alternativo de pequenas Almeida, J.D.M.; Correa, A.C.B. (2014). Dinâmica
comunidades rurais, a partir da utilização dos sedimentos em bacia do semiárido:
desses depósitos para a perfuração de poços conectividade e a relação com a qualidade de
água como suporte para a gestão de recursos
rasos, aproveitando a oferta de água hídricos local. In: 18ª Jornada de Iniciação
acumulada em subsuperfície. Científica – Facepe: Recife.

Almeida, J.D.M.; Souza, J.O.P.; Corrêa, A.C.B.


CONSIDERAÇÕES FINAIS (2016) Dinâmica e caracterização fluvial da
bacia do Riacho Grande: abordagem da
A proposta da conectividade da paisagem, conectividade da paisagem. Geo UERJ: Rio de
dentro da geomorfologia fluvial, apresenta Janeiro, 28, 308-331.
elevado potencial na aplicabilidade aos
estudos atrelados ao gerenciamento de Barros, A.C.M.; Almeida, D.M., Souza, J.O.P.;
Correa, A.C. (2014). Dinâmica dos sedimentos
pequenas bacias hidrográficas, sobretudo em bacia do Semiárido: conectividade e a relação
no Semiárido Nordestino, que necessita de com o escoamento superficial como suporte para
novas metodologias que garantam a a gestão dos recursos hídricos local. Revista
compreensão da complexidade de seus Geonorte, Edição Especial 4, 10.
processos geomorfológicos locais
Bracken, L.J.; Turnbull, L; Wainwright, J.; Bogaart,
influenciando na real oferta de transferência P. (2015) Sediment connectivity: a framework
de água e sedimentos ao longo dos canais. for understanding sediment transfer at multiples
22

scales. Earth Surf. Process. Landforms, 40, 177- breves considerações a partir de um estudo de
188. caso – setor subúmido do Planalto Sedimentar do
Araripe/CE/Brasil. Rio de Janeiro: Ensaios de
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4, 463-484. com o Semiárido: adaptação ao meio e
patrimonialização da Caatinga no Nordeste
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de pós-graduação em Geociências.
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paisagem e dinâmica da precipitação, na bacia de
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Pernambuco. Dissertação (Mestrado). UFPE –
(dis)connectivity in sediment flux in the Programa de pós-graduação em Geografia.
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Australia. Geomorphology, 89, 297-316. Souza, J.O.P. (2014) Modelos de Evolução da
Dinâmica Fluvial em Ambiente Semiárido –
Fryirs, K.A.; et al. (2007a) Buffers, barriers and Bacia do Riacho do Saco, Serra Talhada,
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scale sediment cascades. Catena, 70, 49-67. Federal de Pernambuco, Programa de Pós-
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coupling within fluvial systems. Souza, J.O.P.; Correa, A.C.B. (2012) Conectividade
Geomorphology, 44, 175-201. e área de captação efetiva de um sistema fluvial
semiárido: bacia do riacho Mulungu, Belém de
Lima, F.J.; et al. (2015) Mapeamento São Francisco-PE. Sociedade e Natureza,
Geomorfológico em Escala de semi-detalhe e a Uberlândia, 24, 2, 319-332.
Flexibilização de Manuais de Mapeamento:
ANÁLISE MULTITEMPORAL DO USO E COBERTURA DO SOLO
DA ZONA COSTEIRA DE EXTREMOZ - RN, BRASIL (2006-2016)
Ivaniza Sales Batista, Hudson Domingos Teixeira, Zuleide Maria Carvalho Lima,
Joyce Clara Vieira Ferreira e Antônia Vilaneide Lopes Costa de Oliveira

INTRODUÇÃO Dessa forma, observamos muitas das vezes,


a constatação de impactos ambientais
Configurado na interface entre o oceano,
negativos, concebidos como alterações
continente e atmosfera, o ambiente costeiro
adversas ao meio em decorrência das
constitui-se como um espaço bastante
atividades humanas (Sánchez, 2013), dentre
dinâmico e diverso, proporcionando
eles, pode-se destacar a descaracterização e
condições ideais para o abrigo e
o desaparecimento de campos dunares;
desenvolvimento de distintas espécies
acentuação dos processos erosivos;
faunísticas e florísticas. Trata-se de áreas
degradação e compactação dos solos;
significativamente instáveis e de elevada
assoreamento de canais fluviais; e a
fragilidade natural, com feições
contaminação dos lençóis freáticos, como
geomorfológicas diversificadas e em
consequências danosas ao ambiente
permanente processo de (re) modelagem de
costeiro.
suas formas, gerando configurações
paisagísticas variadas ao longo da costa.
ÁREA DE ESTUDO: ZONA
As distintas formas de uso e cobertura do COSTEIRA DO MUNICÍPIO DE
solo nesses espaços têm corroborado no EXTREMOZ-RN
crescente desencadeamento de mudanças na
paisagem, bem como, na dinâmica do É nesse contexto, que se insere a zona
ambiente costeiro, tendo em vista que as costeira de Extremoz que abrange as praias
ações antrópicas podem interferir nos de Redinha Nova, Santa Rita, Jenipabu,
processos e interações dos sistemas Barra do Rio, Graçandu e Pitangui. Tal
ambientais, a depender de como se dá a município está situado no estado do Rio
relação sociedade-natureza. Salienta-se, Grande do Norte (Figura 1) entre as
que as maiores pressões de ocupação coordenadas geográficas
humana no mundo estão concentradas ao 5° 42′ 21″ S, 35° 18′ 25″ W e integra a
longo dos litorais como bem ressalta Souza Região Metropolitana de Natal, pertencente
(2005). à Microrregião de Natal e Mesorregião
Leste Potiguar pelo Instituto Brasileiro de
24

Geografia e Estatística (IBGE), com área Contudo, utilizamos a abordagem


territorial de 139,575 km², onde se distribui geossistêmica proposta por Sotchava (1977)
24.569 habitantes, com densidade e o conceito de paisagem como categoria de
demográfica de 176 hab/km² (IBGE, 2010). análise geográfica. A realização dessa
pesquisa justifica-se diante do relevante
A problemática deste trabalho está pautada papel desempenhado pelos estudos
no crescente processo de expansão urbana sistêmicos de análise multitemporal do uso
irregular da zona costeira do município de e cobertura do solo. Seus resultados
Extremoz, mesmo considerando que parte fornecem subsídios relevantes para o
deste município está situada na Área de planejamento e gerenciamento racional da
Proteção Ambiental de Jenipabu (APAJ). A área de estudo. Além de configurar-se como
APAJ foi criada em 1995 e, por isso, possui um instrumento colaborador para a
usos controlados, uma vez que as APA"s construção de indicadores ambientais e
são consideradas como: unidades de avaliação da capacidade de suporte
conservação, destinadas a proteger e ambiental. E, por fim, promover o
conservar a qualidade ambiental e os equacionamento de conflitos e a
sistemas naturais ali existentes, visando a maximização das potencialidades naturais
melhoria da qualidade de vida da população locais.
local e também objetivando a proteção dos
ecossistemas regionais. (Ministério do
MATERIAIS E MÉTODOS
Meio Ambiente, Conama, 1988).
O desenvolvimento dessa pesquisa foi
Desse modo, acreditamos que a expansão embasado no uso de técnicas de
crescente e desordenada da malha urbana, sensoriamento remoto e de
pode desencadear uma série de impactos geoprocessamento de imagens, assim como,
ambientais negativos e vir a comprometer a a utilização de um Sistema de Informações
manutenção dos ecossistemas naturais e a Geográficas (SIG) para tratamento e análise
qualidade de vida da população de dos dados espaciais. O sensoriamento
Extremoz. Diante dessa realidade, remoto é definido como “uma ciência que
propõem-se, como objetivo central, analisar visa o desenvolvimento da obtenção de
a evolução multitemporal do processo de imagens da superfície terrestre por meio da
uso e cobertura do solo na zona costeira de
detecção e medição quantitativa das
Extremoz, localizada no estado do Rio respostas das interações da radiação
Grande do Norte, no período entre 2006 e eletromagnética com os materiais
2016. terrestres” (Meneses, 2012: 3).
Para tanto, caracterizamos os aspectos Já o termo geoprocessamento faz referência
físico-naturais e socioeconômicos da zona a uma tecnologia transdisciplinar, que
costeira de Extremoz; apresentamos a permite a integração de dados geográficos,
evolução multitemporal do processo de uso a partir da coleta, tratamento, análise e
e cobertura do solo na zona costeira de apresentação de informações associadas a
Extremoz, entre 2006 e 2016; identificamos mapas digitais georreferenciados (Rocha,
os principais impactos negativos
2002). Por fim, os SIGs são entendidos
decorrentes do processo evolutivo de uso e como sistemas computacionais capazes de
cobertura do solo na zona costeira de armazenar e processar informações
Extremoz; e elucidamos os principais geográficas, constituindo-se como
desafios brasileiros para o planejamento, ferramentas que potencializam a eficiência
gestão e gerenciamento da zona costeira de e a efetividade do tratamento dessas
Extremoz. informações, utilizados para os mais
distintos fins. (Longley et al, 2013).
25

Figura 1: Mapa de localização da zona costeira do município de Extremoz.

Destarte, o uso das técnicas de Em termos operacionais, inicialmente foi


geoprocessamento e a apreciação de dados realizada uma pesquisa bibliográfica de
geográficos foram primordiais para análise caráter exploratório, descritivo e
integrada do processo evolutivo do uso e explicativo sobre a temática proposta, assim
cobertura do solo na zona costeira de como, sobre o objeto de estudo. Paralela a
Extremoz, ao possibilitar o tratamento e a essa fase, realizou-se pesquisa de campo,
interpretação de informações que deram suporte a análise multitemporal
georreferenciadas com significativa do processo evolutivo do uso e cobertura do
eficiência. solo na zona costeira de Extremoz, as
26

produções cartográficas e a análise do Rio Grande do Norte (UFRN) (Santos et


integrada dos impactos negativos al, 2010).
desencadeados na área de estudo.
Culminando na posterior sistematização dos A nomenclatura e terminologias das classes
resultados e obtenção desse artigo como utilizadas nesse artigo foram baseadas no
produto final. Manual Técnico de Uso e Cobertura da
Terra do IBGE. As áreas urbanizadas
Na pesquisa de campo foi realizado o correspondem às superfícies não agrícolas,
reconhecimento das características com estrutura de edificações e sistema
geoambientais da zona costeira de viário. A cultura permanente abrange o
Extremoz (climatologia, hidrologia, cultivo de plantas com ciclo vegetativo de
geologia, geomorfologia, pedologia e longa duração. A classe Florestal engloba as
cobertura vegetal), da ocupação do solo e formações arbóreas com porte superior a 5
observados alguns impactos ambientais m, inclui as áreas remanescentes primárias
negativos ocasionados pelas ações estágios evoluídos de recomposição
antrópicas. Como instrumentos de apoio, florestal, desconsiderando os
utilizamos bússola, câmara digital e um reflorestamentos. Os corpos d’água
Global Positioning System (GPS - Sistema continentais não apresentam origem
de Posicionamento Global, na língua marinha (rios, lagoas de água doce, canais,
vernácula), modelo 79CSX, Garmim. açudes). Os corpos d’água costeiros são
corpos de água salgada e salobra,
Para a elaboração dos mapas que englobando a faixa costeira de praias e
subsidiaram a análise multitemporal do águas abrigadas. Asáreas descobertas são
processo evolutivo do uso e cobertura do compreendidas as áreas de praias, dunas e
solo na zona costeira de Extremoz, fez-se extensões de areias ou seixos no litoral ou
uso das ortofotos 023 e 027, do ano de 2006, no continente, incluindo dunas com
na escala de 1:25.000, concernentes ao vegetação esparsa ou sem cobertura vegetal
levantamento do Litoral Oriental pelo (IBGE, 2013).
Programa de Desenvolvimento do Turismo
(Prodetur).Também foi utilizada uma RESULTADOS E DISCUSSÕES
imagem extraída do Google Earth Pro
(Digital Globe) considerada de alta Percurso teórico-conceitual
resolução espacial, referente ao ano de
2016, na mesma escala sob um sistema de As zonas costeiras são áreas conformadas
coordenadas UTM (Universal Transversa no tríplice contato com o oceano, o
de Mercator) e o datum de referência continente e a atmosfera, apreendida como
SIRGAS 2000, zona 25 Sul. “a borda oceânica das massas continentais e
das grandes ilhas, que se apresenta como
Posteriormente, os produtos gerados foram área de influência conjunta de processos
comparados, sendo possível realizar uma marinhos e terrestres, gerando ambientes
classificação pelo método da interpretação com características específicas e identidade
visual e observar as mudanças ocorridas na própria” (MMA, 2006, p. 22). Esses
zona costeira de Extremoz no decorrer do espaços estão em constante processo de
período estudado. Ressalta-se que as transformação de suas feições
imagens utilizadas foram georreferenciadas geomorfológicas, em decorrência da
e vetorizadas na plataforma ArcGIS 10.3.1 reconhecida dinâmica dos seus
versão trial (ESRI), instalada nos condicionantes geoambientais (clima,
computadores do Laboratório de geologia, relevo, pedologia, hidrologia),
Geoprocessamento do Departamento de assim como, da ação antrópica que ocasiona
Geografia (DGE) da Universidade Federal
27

a remodelagem das suas formas e a Os geossistemas são uma classe peculiar de


modificação dos seus processos. sistemas dinâmicos abertos organizados
hierarquicamente (Bertalanffy, 1977).
Nessa perspectiva, essas espacialidades Sotchava (1977:06) esclarece que "embora
"por constituírem ambientes de formação os sistemas sejam fenômenos naturais,
geológica recente e de grande variabilidade todos os fatores econômicos e sociais,
natural, [...] apresenta ecossistemas em influenciando sua estrutura e peculiaridades
geral fisicamente inconsolidados e espaciais, são tomados em consideração
ecologicamente imaturos e complexos" durante seu estudo e descrições verbais ou
(Carvalho e Fontes, 2006:2), de modo, a matemáticas". Nesse sentido, a apreensão
conferir significativa fragilidade natural do geossistema perpassa tanto pela análise
mediante as ações sociais, uma vez que “os dos elementos naturais, quanto da
sistemas ambientais naturais, face às apreciação das imposições
intervenções humanas, apresentam maior socioeconômicas.
ou menor fragilidade em função de suas
características genéticas.” (Ross, Destarte, para apreender a área de estudos
1998:291). sobre a ótica geossistêmica, adotou-se como
categoria geográfica de análise a paisagem.
Esses espaços são classificados Conforme explana Ab'Saber (2003:9), a
ecodinâmicamente por Tricart (1977) como paisagem é a "herança de processos
meios fortemente instáveis, prevalecendo a fisiográficos e biológicos, e patrimônio
morfogênese e do condicionamento coletivo dos povos que historicamente as
bioclimático. Nesses meios, o sistema herdaram como território de atuação de suas
natural e os demais elementos ficam comunidades". A paisagem está em um
subordinados a morfogênese e são contínuo processo de modelagem de suas
influenciados pela geodinâmica interna formas, exprimindo características antigas e
configurando a paisagem costeira. recentes.

Diante disso, evidencia-se a necessidade de Bertrand (1972) afirma que a paisagem é


compreender e analisar esses espaços sobre um espaço produzido a partir da associação
a ótica geossistêmica, originada a partir da dinâmica, dialética e evolutiva dos agentes
Teoria Geral dos Sistemas, formulada por físicos, biológicos e antrópicos, resultando
Bertalanffy (1977), difundida na Geografia espacialmente uma síntese das imposições
por Sotchava (1977), disseminada por antrópicas sobre o meio natural. As
Bertrand (1972), Tricart (1977) e paisagens costeiras estão em contínuo
Christofoletti (1999). A abordagem processo de (re) modelagem de suas formas
geossistêmica proporcionou consideráveis e estruturas, em decorrência tanto da
avanços na Geografia Física, ao possibilitar dinâmica do lugar (processos oceânicos,
uma análise contundente das relações atmosféricos e continentais) quanto da ação
mútuas e integradas entre os aspectos humana (usos e ocupação do solo).
naturais e sociais.
Salienta-se que elas originam-se de
Bertrand (1972) destaca que o processos erosivos e deposicionais e
geossistema apresenta dados ecológicos dependem da atividade tectônica regional,
com estabilidade relativa. Resultado da da geologia, do clima, da vazão fluvial,
combinação entre os fatores altura das ondas, amplitude das marés,
geomorfológicos, climáticos e hidrológicos dentre outras variáveis, formando distintos
(“potencial ecológico” do geossistema), cenários, de beleza singular (Bloom; Petri;
certo tipo de exploração biológica do Ellert, 1988). Nesse sentido, no litoral de
espaço (vegetação, solo e fauna) e as Extremoz, verifica-se a conformação
intervenções antrópicas. paisagística de campos de dunas móveis,
28

planície de deflação e praias com dunas acordo com a classificação de W. Köppen


frontais e dunas fixas, cujas formas estão (Vianello e Alves, 1991), com média anual
em permanente processo de (re) de precipitação de 1.500 mm e temperaturas
modelagem, condicionadas pelos processos entre 30°C e 24°C. De março e julho,
oceânicos, atmosféricos e continentais, vislumbram-se os maiores índices
somadas a ação humana no processo de uso pluviométricos, com ocorrência de chuvas
e cobertura do solo. torrenciais e esparsas entre março e maio.
Em contrapartida, os meses menos
Compreende-se, por solo a camada chuvosos correspondem aos meses de
superficial formada por partículas minerais setembro e dezembro (meses estivais)
e orgânicas, distribuídas em sessões (Nunes, 2000).
verticais com profundidade variável,
resultante da ação de agentes intempéricos Em termos hidrográficos, 49,45% do
sobre as rochas e da adaptação aos território de Extremoz está inserido na
condicionamentos do meio em que se Bacia Hidrográfica do Rio Ceará - Mirim,
encontram expostas ao intemperismo 28,53% na Faixa Litorânea Leste de
(Embrapa, 2006). Já a expressão “uso do Escoamento Difuso e 22,02% na Bacia
solo”, refere-se “uma série de operações Hidrográfica do Rio Doce (CPRM, 2005).
desenvolvidas pelos homens, com a Configurando-se o Aquífero Barreiras
intenção de obter produtos e benefícios, (hidrogeologicamente confinado, semi-
através do uso dos recursos da terra.” (Bie; confinado e livre em algumas áreas) e o
Leeuwen; Zuidema, 1996 apud IBGE, Aquífero Aluvião (apresenta-se disperso
2013:43). E, por fim, o termo “cobertura do sendo composto por sedimentos
solo”, faz referência aos elementos que predominantemente arenosos, com
constituem a natureza (vegetação (natural deposição nos leitos e terraços dos rios e
ou não), recursos hídricos e o aporte físico riachos de maior porte) (Idema, 2013).
(geologia e seu recobrimento superficial)) e
as construções antrópicas que recobrem a Em termos geológicos, a área de estudo
superfície terrestre. caracteriza-se pela configuração de
sedimentos do Grupo Barreiras, arenitos
Nesse sentido, ressalta-se a importância dos praiais e ferruginosos, depósitos flúvio-
estudos geográficos integrados das formas marinhos e litorâneos de praias dunas. A
de uso e cobertura do solo na zona costeira geomorfologia da área está representada por
de Extremoz, uma vez que fornecem campos de dunas móveis, praias e dunas
subsídios para o seu planejamento e frontais, planícies de deflação, estuário,
gerenciamento, visando minimizar conflitos recifes e terraço de abrasão.
sociais, impactos ambientais negativos e a Pedologicamente, ressalta-se a
conservação dos recursos naturais. conformação de Neossolos Quartzarênicos
(solos de praias e dunas; essencialmente
Caracterização socioambiental da zona quartzosos, profundos, com fertilidade
natural muito baixa, elevada porosidade e
costeira do município de Extremoz-RN
permeabilidade), Latossolos (com horizonte
A zona costeira de Extremoz caracteriza-se, B latossólico abaixo de um horizonte
sobretudo, pela diversidade dos seus diagnóstico superficial, exceto hístico),
aspectos naturais, pelos cenários Gleissolos Tiomórficos (solo de mangue;
paisagísticos exuberantes e pela exploração compostos por material mineral,
de seus recursos para os mais variados fins. apresentando horizonte glei nos primeiros
Extremoz e, por conseguinte, a área de 150 cm, seguido por um horizonte A ou E,
estudo apresenta clima classificado como ou de horizonte H), solos Aluviais (solo de
As’ tropical chuvoso com verão seco, de várzea, constituídos por material mineral ou
29

orgânico pouco espesso, com pouca condicionamentos naturais do ambiente. A


expressividade de alterações ao material partir da década de 1970 foi implementada
originário) (Embrapa, 2006; Batista, 2014). a carcinicultura em seu litoral por meio do
Projeto Camarão, contribuindo para o
A cobertura vegetal predominante na área surgimento de pequenos aglomerados.
de estudo está associada aos campos de
praias e dunas, com destaque para as Na década de 1980, inicia-se o
espécies Cynodon dactilon (capim - de - parcelamento do solo para fins de
burro), Paspalum maritimum (capim – loteamento, servindo predominantemente
gengibre), Paspalum vaginatum (capim – de segunda residência às classes média e
praturá), Remirea marítima (alecrim de alta da sociedade de Natal, RN. Nos anos de
praia) e Ipomoea pes –caprae (salsa - de – 1990 e após o ano 2000, observou-se uma
praia). Vislumbra-se também a vegetação maior expansão urbana local, a partir da
de mangue (representadas pela Rhizophora instalação de restaurantes, hotéis, pousadas,
mangle (mangue sapateiro), Avicenia equipamentos de lazer e comércios,
schaueriana (mangue branco), somados a investimentos de ordem pública
Laguncularia recemosa (mangue manso), - na infraestrutura básica - e de ordem
Acrostrichum aureum (avenção ou privada- atrelados, principalmente, ao
samambaia-do-mangue) e Conocarpus turismo. (Nascimento, 2008).
erecta (mangue-ratinho ou mangue-botão)),
restingas arbustiva – arbórea (destacando-se O Programa de Desenvolvimento do
o Chrysobalanus icaco (guajiru), Turismo (Prodetur) contribuiu
Chamaecrista ensiformis (pau-ferro), significativamente para a expansão da
Eugenia sp. (camboim), Pilosocereus infraestrutura turística em Extremoz.
hapalacanthus (cardeiro-grande), Capparis Aguiar (2013) elucida que o programa
flexuosa (feijão- bravo)) e vestígios de Mata ofereceu crédito ao setor público, visando a
Atlântica nas planícies sedimentares e ao criação de condições propícias para a
longo do curso do Rio Ceará - Mirim, expansão e melhoria da qualidade da
denominados como matas de galeria atividade turística. Atualmente, o turismo é
(Batista, 2014; Nunes, 2000). um dos mais importantes pilares da
economia de Extremoz, o setor de serviços
Esses condicionantes geoambientais vêm é o que mais contribui na composição do
atraindo historicamente pessoas (turistas, Produto Interno Bruto (PIB), contribuindo
residentes e mão de obra trabalhadora) e com 109,343 mil reais do total municipal de
investimentos turísticos ao longo te todo 1641,149 mil reais (IBGE, 2010).
litoral, ocasionando o crescente
adensamento urbano local e as Dentre os mais relevantes atrativos
consequentes pressões sócio-espaciais. turísticos observados na área de estudo,
Atualmente, constata-se em Extremoz, o destacamos o Aquário Natal (em Redinha
número crescente de domicílios particulares Nova), os passeios de dromedários, jegues e
não ocupados (ocupados ocasionalmente ou buggys nas dunas, vendas de produtos
vagos), evidenciando uma expressiva artesanais, a travessia de balsa e descidas
parcela de população flutuante (veranistas) radicais sobre as dunas, somadas ao
que o município abriga. desfrute de lagoas e praias (onde são
encontrados serviços de bar e restaurante).
Vale ressaltar, que enquanto as economias
predominantes em Extremoz associavam-se No entanto, as imposições antrópicas vêm
ao setor primário (pesca artesanal, corroborando na constatação de alterações
agricultura de subsistência e pecuária), o adversas e problemas sócio-espaciais na
processo de organização e ocupação do zona costeira de Extremoz, tais como, a
litoral estava em harmonia com os segregação sócio-espacial, insuficiente
30

acesso aos serviços públicos, inundações outras). Esse fator, corrobora


sazonais, ausência de saneamento básico e progressivamente no desencadeamento de
estação de esgoto, destinação inadequada de mudanças expressivas na conformação
lixo, o uso indevido de recursos naturais paisagística e na própria dinâmica do
pela construção civil e a presença de ambiente costeiro, contribuindo para a
construções irregulares. eclosão de alterações adversas e sua
consequente deturpação, perante as
Nesse sentido, destaca-se a importância da imposições antrópicas.
atuação dos mecanismos legais de
regulação de uso e cobertura do solo que Nessa perspectiva, salienta-se a relevância
atuam na escala local. Através destes, foi desempenhada pelos estudos geográficos
instituída a APAJ por meio do decreto sistêmicos e o uso das técnicas de
estadual nº 12.620 de 17 de maio de 1995, geoprocessamento para apreensão e análise
onde seu objetivo consiste em promover o integrada desses espaços, ao suscitar
ordenamento do uso e proteção dos conhecimentos relevantes para subsidiar o
ecossistemas (dunas, mata atlântica, planejamento e gestão adequada do
manguezal e praias, rios e lagoas) e da território costeiro, visando à conservação
biodiversidade local. É válido ressaltar que dos seus recursos naturais e a mitigação dos
parte da área de estudo, mais precisamente impactos adversos.
a porção sul, encontra-se inserida na APAJ.
Desse modo, o mapeamento das classes de
Portanto, as relações sócio-espaciais na área uso e cobertura do solo na zona costeira de
de estudo, vêm corroborando na Extremoz, entre os anos de 2006 e 2016,
constatação de impactos ambientais apresentou modificações espaciais
negativos de magnitude e importância relevantes nos últimos dez anos (Figura 2).
variável, em função da fragilidade natural - De maneira mais ampla, observamos o
intrínseca aos seus condicionantes expressivo aumento do percentual de áreas
geoambientais - e das imposições urbanizadas e a consequente diminuição de
antrópicas. Desse modo, torna-se evidente áreas descobertas ao longo de toda a costa
sua ineficiente fiscalização e do município. Houve também a diminuição
acompanhamento técnico-administrativo de corpos d’águas continentais, mas
local, visando a conservação dos recursos também o acréscimo das classes florestal e
naturais e o equacionamento dos conflitos de culturas permanentes.
sociais.
Quantitativamente, a área de estudo
Análise multitemporal do uso e cobertura apresentou 21,62 km2 de extensão territorial
do solo na zona costeira de Extremoz: (Tabela 1). Deste total, em 2006 pouco mais
implicações e desafios de 17% estava urbanizada, conforme a
tendência mundial dos países litorâneos
Nos últimos tempos, têm-se observado um observou-se o crescente adensamento
crescente adensamento urbano ao longo das urbano local, perpassando o valor dos 25%
regiões litorâneas no mundo, sobretudo, em da área total no ano de 2016, ou seja, houve
decorrência do aumento expressivo da um crescimento de 8% de área urbana. Este
valorização imobiliária nesses espaços aumento está associado ao desenvolvimento
resultantes, principalmente, do de atividades turísticas, mediante seu
desenvolvimento de atividades econômicas potencial em atrair populações residente,
variadas (pesca, carcinicultura, extração de imigrante e flutuante ao longo dos anos.
sal, indústria, comércio, turismo, entre
31

Figura 2: Mapa da evolução do uso e cobertura do solo na zona costeira de Extremoz, entre 2006 e 2016. Fonte:
Mapeamento do ano de 2006 por Batista (2014).
32

Tabela 1: Classes de mapeamento da cobertura e uso do solo na área de estudo, entre os anos de 2006 e 2016.
Fonte: mapeamento do ano de 2006 por Batista (2014).

MAPEAMENTO DE 2006 MAPEAMENTO DE 2016


CLASSES Área (km²) Percentual (%) Área (km²) Percentual (%)

Áreas descobertas 13,47 62,3 11,63 53,79

Áreas urbanizadas 3,75 17,35 5,61 25,95

Corpos d’água continentais 0,79 3,65 0,1 0,46

Corpos d’água costeiros 1,94 8,97 1,95 9,02

Cultura permanente 0.05 0,23 0,06 0,28

Florestal 1,62 7,5 2,27 10,5

TOTAL 21,62 100 21,62 100

Vale também destacar, que a expansão das A construção de edificações nesses espaços
áreas urbanizadas na área de estudo ocorre, implica na modificação estética da
espacialmente, sob os campos de dunas paisagem, interfere no processo de
móveis e em planícies de deflação, ou seja, transporte dos sedimentos modificando o
em Áreas de Preservação Permanente balanço sedimentar, além de diminuir e
(APP), conforme estabelecido pela descaracterizar os sedimentos dos campos
Resolução Conama 303, tendo em vista sua dunares; ocasiona a contaminação do lençol
função ambiental de manter o equilíbrio e a freático devido ao fluxo de águas servidas,
estabilidade da paisagem local, além de contribui para o assoreamento de corpos
assegurar o fluxo gênico da fauna e flora, hídricos, na devastação da vegetação e na
visando o bem-estar das populações conformação de problemas sociais
humanas. Desse modo, o avanço urbano decorrentes do soterramento de
nessas áreas acaba contribuindo para a sua equipamentos urbanos no processo de
descaracterização e deturpação (Figura 3). migração dunar (Figura 4).

Figura 3: Residência instalada em dunas. Foto: Figura 4: Soterramento de equipamentos urbanos


Ivaniza Sales (Nov/2014) no processo de migração dunar. Foto: Luiz Eduardo
(Ago/2014).
33

Ademais, ressalta-se que há uma costeiros", essas duas últimas classes


incompatibilidade entre as formas de uso e obtiveram uma expansão espacial muito
cobertura do solo e as características pequena em relação as demais (somente
geoambientais dos campos de dunas, pois se 0,01 km²). A classe florestal, por sua vez,
tratam de ambientes bastante dinâmicos e apresentou um crescimento expressivo no
complexos, de formação geológica com período observado (3%), cuja
idades recente, de grande variabilidade espacialização se dá, sobretudo, na porção
natural, compostos fisicamente por norte da área de estudo (Praia de Pitangui) e
sedimentos inconsolidados, ecologicamente às margens da Lagoa de Jenipabu, dentro
imaturos e de reconhecida fragilidade dos limites espaciais da APAJ (Tabela 1).
natural. O grande número de residências em
campos dunares sem um sistema eficiente Podemos associar o aumento espacial da
de destinação dos esgotos resulta em sérios área de floresta com a instituição do Plano
problemas ambientais relacionados à de Manejo da APAJ e do seu Zoneamento
qualidade dos recursos hídricos e drenagem Ecológico Econômico (ZEE), através da Lei
urbana, agravados em função da segregação Estadual 9.254/ 2009, ao promover
social no espaço e dos diversos conflitos de legalmente a preservação e conservação dos
interesses (políticos, econômicos e recursos naturais locais. Evidenciando
ambientais). assim, a importância desempenhada pela
criação de áreas legalmente protegidas para
No que se refere a disparidade dos valores a manutenção da biodiversidade na Terra.
obtidos no mapeamento da classe corpos
d'água continentais nos dois anos Diante do exposto, evidencia-se que os
observados (Tabela 1), faz-nos refletir a principais desafios para o planejamento e
respeito da sua considerável diminuição gerenciamento da área de estudo associam-
percentual em 2016, equiparando-se com o se com a busca pela conciliação entre os
ano de 2006. Uma possível explicação para condicionantes físico-naturais locais e as
esses valores está no afloramento do lençol práticas sociais a materializar-se
freático em algumas áreas, deixando-as espacialmente, visando à manutenção dos
alagadas temporariamente. Os resultados ecossistemas locais e a diminuição de
obtidos por Batista (2014) reforçam essa conflitos.
ideia, pois o percentual de corpos d'água
continentais obtido no mapeamento do ano CONSIDERAÇÕES FINAIS
de 1970, na área de estudo, foi de
apenas1,39 % de sua área total, As regiões litorâneas são espaços dinâmicos
substanciando essa hipótese. Assim no e complexos de reconhecida fragilidade
período em que foi realizado o natural. No entanto, constata-se uma
levantamento do litoral oriental pelo tendência mundial de adensamento urbano
Prodetur, em 2006, estavam aflorando ao longo da costa dos países litorâneos, de
lagoas efêmeras, enquanto que na imagem modo a desencadear no surgimento de
do Google Earth Pró - datada do ano de impactos negativos ao meio e,
2016 - revela o desaparecimento das consequentemente, a população nele
mesmas e o surgimento de vegetação onde inserida.
elas localizavam-se, o que evidencia ainda
mais a dinamicidade dos ambientes Esse é o cenário da zona costeira do
costeiros. município de Extremoz, seu processo
histórico de uso e cobertura do solo
Salienta-se também, o aumento da apresenta íntima relação com a composição
distribuição espacial das classes "florestal", paisagística e o desenvolvimento de
"cultura permanente" e "corpos d'água atividades turísticas. Embora haja
34

mecanismos legais de restrição de uso e Bertalanffy, L.V. (1977) Teoria geral dos sistemas.
ocupação do solo na área de estudo, essa Petrópolis, Vozes LTDA.
espacialidade tem apresentado, na última Bertrand, G. (1972) Paisagem e geografia física
década, um considerável aumento global. Esboço metodológico. Caderno de
populacional. Esse crescimento extrapola a Ciências da Terra. São Paulo, 13.
natureza dos valores quantitativos e
corroboram em mudanças qualitativas nos Bloom, A.L; Petri, S.; Ellert, R. (1988) A orla da
Terra. In: Bloom, A. L; Petri, S.; Ellert, R.
ecossistemas locais.
Superfície da terra. São Paulo: E. Blucher.
Dentre os impactos constatados sócio- Brasil. Ministério das Minas e Energia. Projeto
espaciais observados na área de estudo, Radambrasil. Folhas SB. 24/25 Jaguararibe /
sobressai-se a descaracterização dos Natal; geologia, geomorfologia, pedologia,
campos dunares, a acentuação dos vegetação e uso potencial da terra. Rio de
Janeiro, 1981. 744 p. il., 7 mapas (levantamento
processos erosivos, a degradação dos solos,
de Recursos Naturais, 23).
o assoreamento de canais fluviais, somados
a segregação social e problemas de Brasil. Ministério do Meio Ambiente. Resolução
soterramento de equipamentos urbanos no Conama Nº 303, Dispõe sobre Área de
processo de migração dunar. Preservação Permanente. Data:20/03/2002.

Portanto, torna-se válido o aumento e/ou Brasil. Ministério do Meio Ambiente. Resolução
Conama Nº 404/2008 - "Estabelece critérios e
intensificação da fiscalização e diretrizes para o licenciamento ambiental de
acompanhamento técnico-administrativo na aterro sanitário de pequeno porte de resíduos
zona costeira de Extremoz, tendo em vista sólidos urbanos." - Data da legislação:
sua dinâmica peculiar e sua incontestável 11/11/2008 - Publicação DOU nº 220, de
relevância na manutenção dos recursos 12/11/2008, pág. 93.
naturais disponíveis e da qualidade de vida Carvalho, M.E.S. Fontes, A.L. (2006)
população local. Neste contexto, destacam- Caracterização geomorfológica da zona costeira
se os estudos geossistêmicos no tocante ao do estado de Sergipe. In: Simpósio Nacional de
entendimento das dinâmicas das zonas Geomorfologia / Regional
costeiras para subsidiar o planejamento e ConferenceOnGeomorphology. Vi, Goiânia.
Disponível em:
gerenciamento em escala local. <http://www.labogef.iesa.ufg.br/links/sinageo/ar
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Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Ambiental (APA) Genipabu, nos Municípios de
Natal. Extremoz e Natal e dá outras providências.
35

Governo do Rio Grande do Norte. Gabinete Civil. municípios de Extremoz e Ceará-Mirim/RN.


Lei 9.254 de 06 de Outubro de 2009. Dispõe Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-
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meio ambiente: uma nova face do litoral dos
36
AS DEFICIÊNCIAS NA ABORDAGEM GEOMORFOLÓGICA NOS
ESTUDOS DE IMPACTO AMBIENTAL NO ESTADO DA PARAÍBA
E A BUSCA POR METODOLOGIAS APLICADAS AOS
EMPREENDIMENTOS DE MINERAÇÃO

Henrique Elias Pessoa Gutierres, Camilla Jerssica da Silva Santos, Jessika de


Oliveira, Neles Rodrigues e Valdeniza Delmondes Pereira

INTRODUÇÃO equivocadas com base em estudos


deficientes, acarretará em impactos
Abordar o Estudo de Impacto Ambiental
negativos à preservação e a conservação dos
(EIA) é se reportar à Avaliação de Impacto
recursos naturais, afetando a qualidade de
Ambiental (AIA), enquanto instrumento de
vida das comunidades mais próximas ao
planejamento ambiental, que surgiu na
empreendimento e a sociedade em geral.
National Environmental PolicyAct (NEPA),
a lei da política nacional do meio ambiente O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) é um
dos Estados Unidos, aprovada em 1969 e instrumento previsto no inciso IV do artigo
em vigor desde 1º de janeiro de 1970. No 225 da Constituição Federal de 1988 (IV -
Brasil, a AIA é um dos instrumentos da exigir, na forma da lei, para instalação de
Política Nacional de Meio Ambiente, obra ou atividade potencialmente causadora
instituída pela Lei Federal nº 6.938/81. de significativa degradação do meio
Caracteriza-se como o conjunto de ambiente, estudo prévio de impacto
procedimentos capaz de assegurar, desde o ambiental, a que se dará publicidade;), que
início do processo, que se faça um exame visa analisar a viabilidade ambiental de
sistemático dos impactos ambientais de empreendimentos/atividades com
uma ação proposta. Logo, entende-se que o significativo poder de degradação
EIA está inserido na AIA e o seu ambiental. Obrigatoriamente, todo estudo
aprimoramento metodológico e técnico, necessita abordar conhecimentos
tanto para sua elaboração pelos relacionados ao meio físico (geologia,
profissionais da área, como para a sua geomorfologia, climatologia, pedologia,
análise, seja uma realidade a ser estudada e recursos hídricos etc.), além do meio
aprofundada, pois serão utilizados pelos biológico (fauna e flora) e do
tomadores de decisão para aprovação ou socioeconômico (dinâmica populacional,
rejeição do licenciamento ambiental de economia, patrimônio histórico e cultural,
empreendimentos/atividades públicas ou etc.). Dos conhecimentos do meio físico,
privadas. Caso sejam tomadas decisões
38

destaca-se a geomorfologia, enquanto proposta metodológica para EIAs de


fornecedora de informações essenciais para empreendimentos na área de mineração,
a ocupação de novas áreas pelas atividades que se constitui em um dos ramos que mais
humanas. No entanto, o grande desafio é altera o relevo.
saber como esses estudos estão abordando e
analisando os processos geomorfológicos, MATERIAIS E MÉTODOS
que se fazem presentes nas fases de A área de estudo abrange o estado da
instalação e de operação dos Paraíba, a partir da espacialização dos
empreendimentos sujeitos ao licenciamento empreendimentos em mesorregiões (Mata
ambiental. Sendo a geomorfologia um dos Paraibana, Agreste, Borborema e Sertão) e
itens obrigatórios no Termo de Referência o(s) respectivo(s) município(s).
(documento norteador para a elaboração do
EIA), o presente trabalho propõe analisar a O desenvolvimento deste trabalho foi
abordagem geomorfológica nos EIAs baseado numa pesquisa aplicada e
encaminhados para o licenciamento descritiva sob o método documental. O
ambiental de atividades/empreendimentos referencial teórico utilizado contemplou as
de diversos ramos no estado da Paraíba, publicações de autores que entendem o EIA
entre os anos de 2005 e 2014. como instrumento de planejamento
ambiental (Santos, 2004; Sánchez, 2008;
Dessa forma, o objetivo será demonstrar Paes, 2010; Pereira, 2015) e outros que
que, em alguns casos, o uso da abordam a importância dos conhecimentos
geomorfologia nos EIAs não passa de mera geomorfológicos na elaboração desse
reprodução teórico-conceitual para estudo, como Ross (2000), Guerra e Marçal
descrever a área em que ocorrerão as (2006) e Christofoletti (2007), além do uso
atividades impactantes. Mas que tais da legislação brasileira pertinente ao tema,
conhecimentos devem ser aplicados na especialmente da Resolução nº 01/86 do
prevenção/solução de impactos ambientais Conselho Nacional de Meio Ambiente
ao invés de somente descrever o ambiente, (Conama).
proporcionando um melhor embasamento
para a tomada de decisão no processo de Paralelamente foi realizado o levantamento
licenciamento de empreendimentos que dos EIAs no Centro de Documentação do
causam grande impacto ao equilíbrio órgão ambiental do estado da Paraíba
ambiental. (Superintendência de Administração do
Meio Ambiente - Sudema), que resultou na
Portanto, entendendo que a mesma serve produção de diversos dados, permitindo
também de base analítica para outros fazer uma breve caracterização dos
estudos ambientais, o texto abordará o empreendimentos dos EIAs analisados
entrelaçamento da Geomorfologia com o (Quadro 1).
Estudo de Impacto Ambiental, enquanto
documento integrante do licenciamento Por fim, buscou-se analisar os itens dos
ambiental. Logo, apresenta uma EIAs que abordassem a geomorfologia.
contribuição relevante ao investigar uma Quanto ao levantamento dos dados
realidade objetivando analisar acertos, erros (Diagnóstico Ambiental, Avaliação de
e deficiências na abordagem Impactos Ambientais, Medidas Mitigadoras
geomorfológica, permitindo o e Programas de Monitoramento), estes
aperfeiçoamento na prática da elaboração e foram sistematizados para elaboração de
análise dos estudos ambientais. Por outro tabelas e gráficos.
lado, busca discutir a necessidade de uma
39

Quadro 1: Dados gerais dos EIAs analisados no período de 2005-2014.


Empreendedor: ECO Villas Negócios Imobiliários Ltda. Empreendedor: Foss e Consultores Ltda.
Atividade: Implantação de hotel ecológico Atividade: Condomínio Residencial
Localização: Lucena (Mata Paraibana) Localização: Alhandra (Mata Paraibana)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 4333/2005 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 3068/2010
Empreendedor: AqualunaAquacultura Ltda. Empreendedor: Elizabeth Cimentos Ltda.
Atividade: Produção e comercialização de camarão Atividade: Indústria cimenteira
marinho
Localização: Lucena (Mata Paraibana) Localização: Alhandra (Mata Paraibana)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 2703/2006 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 5317/2010
Empreendedor: Prefeitura Municipal de João Pessoa Empreendedor: Lord Negócios Imobiliários Ltda.
Atividade: Implantação da Estação Ciência, Cultura e Arte Atividade: Complexo Ecoturístico Reserva Garaú
Localização: João Pessoa (Mata Paraibana) Localização: Conde (Mata Paraibana)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 1733/2006 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 5462/2010
Empreendedor: Departamento de Estradas de Rodagem Empreendedor: Companhia de Cimento São
da Paraíba (DER) Simão Ltda.
Atividade: Ligação viária entre as avenidas Beira Rio, Atividade: Extração de calcário, argila e areia
Epitácio Pessoa e Rui Carneiro
Localização: João Pessoa (Mata Paraibana) Localização: Alhandra (Mata Paraibana)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 1800/2009 Nº Processo (ou Licença) /Ano:4606/2011
Empreendedor: Valero Brasil Investimento Imobiliário Empreendedor: Light Engenharia Ltda.
Atividade: Complexo Turístico Imobiliário Pitimbu Golf Atividade: Aterro Sanitário
Marine Resort
Localização: Pitimbu (Mata Paraibana) Localização: Patos (Sertão Paraibano)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 1919/2007 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 3659/2011
Empreendedor: Borborema Energética S.A. Empreendedor: Lambari Gerador de Energia S/A
Atividade: Termelétrica Atividade: Termelétrica
Localização: Campina Grande (Agreste Paraibano) Localização: Campina Grande (Agreste Paraibano)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 1978/2008 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 5547/2011
Empreendedor: Governo do Estado Empreendedor: Termelétrica Termopower VI S.A
Atividade: Ponte Cabedelo-Lucena Atividade: Termelétrica
Localização: Cabedelo (Mata Paraibana) Localização: Santa Rita (Mata Paraibana)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 6513/2008 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 6754/2012
Empreendedor: Governo do Estado Empreendedor: Governo do Estado (Companhia
de Desenvolvimento da Paraíba – CINEP)
Atividade: Aproveitamento integrado das águas da Atividade: Distrito Industrial
vertente litorânea
Localização: municípios diversos (Mata Paraibana e Localização: Caaporã (Mata Paraibana)
Agreste Paraibano)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 3035/2008 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 2642/2012
Empreendedor: Prefeitura Municipal de Puxinanã Empreendedor: Nova Sousa Empreendimentos
Imobiliários
Atividade: Aterro Sanitário Atividade: Loteamento Residencial
Localização: Puxinanã (Agreste Paraibano) Localização: Sousa (Sertão Paraibano)
Nº Processo (ou Licença) /Ano: 051/2010 Nº Processo (ou Licença) /Ano: 3677/2013
40

O trabalho elaborou uma matriz de critérios No tocante a proposta metodológica,


adotada para a análise da abordagem planeja-se executar atividades de campo em
geomorfológica do EIA de cada duas empresas de mineração, que atuam na
empreendimento, buscando orientar o produção de cimento no litoral sul do estado
trabalho e reduzir a subjetividade da da Paraíba, fazendo uso das suas áreas de
análise, além do seu uso ser um instrumento exploração como áreas-piloto para o
corriqueiro na análise da qualidade dos desenvolvimento e aperfeiçoamento de
EIAs (Quadro 2). diversas atividades referentes à abordagem
geomorfológica aplicada aos estudos de
impacto ambiental.

Quadro 2: Modelo de matriz de critérios adotada para análise da abordagem geomorfológica do material de
pesquisa.

QUESITO Sim Não Obs.


Houve levantamento de campo?

A equipe técnica abordou a geomorfologia do local do empreendimento no EIA?

Existe registro fotográfico destacando a geomorfologia da área do empreendimento no


EIA?
Houve uso de instrumento (s) de campo para aquisição dos dados que subsidiem a
análise geomorfológica?
A equipe técnica fez uso de análise (s) em laboratório para subsidiar a análise
geomorfológica?
O EIA possui mapas geomorfológicos que permitam a compreensão dos processos
geomorfológicos na área?
Em relação ao levantamento de dados secundários, consta (m) referência (s) de autores
da geomorfologia na “Bibliografia” do EIA?
Em relação ao levantamento de dados secundários, consta (m) citação(ões) de
publicações (trabalhos acadêmicos, artigos científicos, livros e outros) na
“Bibliografia” do EIA, que tiveram como objeto de estudo áreas próximas ao
empreendimento analisado pelo EIA?
O capítulo de "IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DOS IMPACTOS AMBIENTAIS"
contemplou a geomorfologia? Quantos impactos? Quais impactos?
Foram propostas MEDIDAS MITIGADORAS relacionadas à área da Geomorfologia?
Quantas medidas? Quais medidas?
Foram propostos PROGRAMAS DE MONITORAMENTO para os impactos e
medidas mitigadoras relacionadas à área da Geomorfologia? Quantos programas?
Quais programas?

identificação de soluções e de alternativas,


RESULTADOS E DISCUSSÕES o desenvolvimento de medidas para
prevenir, controlar e compensar os impactos
O EIA tem como objetivo central a inevitáveis. De acordo com a Resolução
prevenção do dano ambiental, o que se Conama nº 01/86, o estudo deverá
constitui em um importante meio de desenvolver, no mínimo, as seguintes
aplicação de uma política preventiva, atividades técnicas: I-Diagnóstico
sendo, portanto, um documento de subsídio ambiental (meio físico, meio biológico e o
ao processo de licenciamento ambiental. meio socioeconômico); II- Análise e
Para Barbieri (2007) tal instrumento identificação dos impactos ambientais; III-
compreende a avaliação dos impactos, a Definição das medidas mitigadoras para os
41

impactos negativos e IV- Elaboração do (Governo do Estado e prefeituras). No


programa de acompanhamento dos tocante a espacialização dos EIAs
impactos negativos e positivos. Assim, analisados, tomando a divisão da Paraíba
constituem os procedimentos de avaliação em mesorregiões geográficas (Mata
do impacto ambiental no âmbito das Paraibana, Agreste Paraibano, Borborema e
políticas públicas, além de fornecer os Sertão), constata-se que é na Mata
subsídios para o planejamento e a gestão Paraibana que está concentrada a maior
ambiental, vislumbrando assim, a parte dos empreendimentos/atividades com
prevenção relativa aos danos ambientais EIAs analisados, totalizando 72,2% do
através do licenciamento ambiental. universo amostral. Enquanto que a
mesorregião do Agreste apresentou um
No recorte temporal de dez anos, foram universo de 16,7% e a do Sertão totalizou
identificados 18 (dezoito) 11,1%. Já a mesorregião da Borborema foi
empreendimentos que protocolaram o EIA a única que não teve licenciamento
no órgão estadual de meio ambiente da ambiental com EIA no período analisado
Paraíba. Deste total, doze EIAs são da (Figura 1).
iniciativa privada e seis do setor público

Figura 1: Distribuição geográfica dos empreendimentos que elaboraram EIA para serem licenciados no estado da
Paraíba entre os anos de 2005 e 2014.

elaboração do diagnóstico ambiental dos


Procedimentos e técnicas em
EIAs. A escolha dessas atividades para
geomorfologia para a elaboração do caracterizar a geomorfologia é algo de
diagnóstico ambiental extrema importância e um item obrigatório
para se fazer uma boa análise e
Um dos itens analisados foi o uso de interpretação da área de estudo. Ross e Fierz
procedimentos e técnicas para o (2009) refletem sobre a importância do uso
levantamento geomorfológico necessário à das técnicas de pesquisa em geomorfologia
42

para uma correta interpretação e análise da erosão do solo, destacam-se os pinos de


área. Entendem que a pesquisa percorre três erosão, as calhas de Gerlach e o
etapas: trabalho de gabinete, trabalho de penetrômetro. Por fim, para
campo e trabalho de laboratório. Os empreendimentos localizados em áreas
“trabalhos de campo frequentemente são costeiras, próximos ou que interfiram na
um meio de coletar previamente dados não faixa de praia, pode-se fazer uso do nível
existentes e necessários para a análise dos topográfico, mira e trenas para a obtenção
impactos” (Sanchez, 2008:163), já que os dos dados que visem a elaboração do perfil
EIAs tratam de e praial.
sánchempreendimentos/atividades com
uma localização específica, sendo
impossível ter publicações (livros, artigos
científicos ou trabalhos acadêmicos) que
façam uma abordagem particular para os
terrenos analisados por todos os EIAs.

No tocante ao campo, constatou-se que


63,8% dos EIAs demonstraram ter realizado
“levantamento de campo” (Figura 2), dos
quais 36,1% dos estudos fizeram uso do
registro fotográfico da área do
empreendimento. Em seu trabalho sobre a
análise da abordagem geomorfológica em
EIAs de projetos hidrelétricos, Aguiar
(2015) destaca que os registros fotográficos Figura 2:Procedimentos e técnicas adotados na
são importantes na composição do análise geomorfológica dos EIAs analisados. Fonte:
Centro de Documentação da Sudema. Org.:
diagnóstico ambiental, uma vez que se Autores.
tornam atestados dos relatos presentes no
texto, validando o conteúdo apresentado e Com relação aos procedimentos de coleta
fornecendo ao órgão licenciador maior de amostras para “análise laboratorial” para
segurança de análise.Logo, tais registros fins de subsídio à caracterização
passam a constituir documentos de geomorfológica local, nenhum EIA adotou
referência para as futuras fases do este procedimento.
empreendimento, como prova da
inexistência ou existência de determinada Por outro lado, 36,2% dos estudos fizeram
degradação ambiental antes do início das uso exclusivo de dados secundários, ou seja,
obras. aqueles que foram obtidos sem a execução
de procedimentos de campo ou laboratório,
Já em 66,7% dos EIAs não foi identificado restringindo-se ao uso de material
o uso de instrumentos de campo para bibliográfico. Deste percentual, verificou-
obtenção de dados que proporcionem uma se que 23,8% não apresentavam uma
melhor caracterização geomorfológica. caracterização geomorfológica mínima do
Como exemplo pode-se destacar o uso do local do empreendimento analisado.
clinômetro ou da bússola geológica, que
permitem medir as declividades das No que tange à cartografia geomorfológica,
vertentes, sendo tal parâmetro utilizado para esta deveria ser um item obrigatório nos
a morfometria, que se constitui em um estudos ambientais para fins de
recurso técnico para a análise licenciamento ambiental, pois os mapas
geomorfológica. No tocante aos permitem representar as formas do relevo e
procedimentos técnicos para medição da os respectivos processos de uma
43

determinada área. Constatou-se que 50% afetados pela ação humana. Nesse contexto,
dos EIAs apresentaram mapas o diagnóstico ambiental não é somente uma
geomorfológicos que descrevem os das etapas iniciais de um EIA: ele é,
processos geomorfológicos da área. Para sobretudo, o primeiro elo de uma cadeia de
Ross e Fierz (2009:80), a cartografia procedimentos técnicos indissociáveis e
geomorfológica está entre as técnicas de interdependentes, que culminam com um
pesquisa mais utilizadas na área da prognóstico ambiental consistente e
geomorfologia, sendo aplicada para conclusivo.
"mapear o que é observável e não o que se
deduz da análise geomorfológica”. Para Como bem reforça Akiossi (2010),a
Sánchez (2008:230), os “mapas são avaliação de impacto ambiental deve estar
essenciais para a representação da maioria subsidiada por uma caracterização do
das informações produzidas ou compiladas empreendimento com dados consistentes e
pelos estudos de base”. Em primeiro plano, por um diagnóstico ambiental com
os mapas devem representar os diferentes informações igualmente consistentes, de
tamanhos das formas de relevo, dentro da modo que a equipe multidisciplinar
escala compatível. Foi possível verificar responsável pela elaboração do EIA,
que em alguns EIAs os mapas estão sem a disponha de informações suficientes para
devida interpretação e visualização dos elaborar as hipóteses de impactos.Logo, o
processos geomorfológicos, como no caso diagnóstico ambiental é referência no
do EIA do “Aproveitamento das Vertentes”, cumprimento das próximas atividades
cujo mapa geomorfológico apresenta uma técnicas do EIA (“análise dos impactos“;
escala satisfatória, porém pela falta de “definição das medidas mitigadoras”;
nitidez da legenda, torna-se “elaboração dos programas de
incompreensível a leitura do mapa. acompanhamento e monitoramento”).
Portanto, a cartografia constitui um dos
melhores caminhos para subsidiar uma Uso dos conhecimentos geomorfológicos
análise geomorfológica. Um mapa para a avaliação dos impactos ambientais
geomorfológico, com uma boa resolução
cartográfica, é um instrumento de leitura Segundo Guerra e Marçal (2006:70), a
universal (Kohler, 2001). correta utilização dos conhecimentos
geomorfológicos implica na diminuição da
Ainda na fase do diagnóstico, é importante possibilidade de ocorrência de danos
que se aborde a geomorfologia da área do ambientais (a exemplo dos movimentos de
empreendimento considerando a massa, erosão dos solos, erosão costeira,
sazonalidade climática para o planejamento assoreamento, enchentes, etc.), após a
das atividades de campo, já que os execução de grandes obras de engenharia,
levantamentos de dados primários em especial quando o EIA leva em conta
realizados em períodos mais secos podem esses riscos ambientais. Ab’Saber (2006)
ocultar a magnitude e a frequência de alguns cita que a avaliação de impactos consiste em
processos, como a erosão e os movimentos um processo complexo, que deve considerar
de massa, minimizando a dinâmica todos os sistemas impactáveis que se
geomórfica da área analisada. A sobrepõem e se entrecruzam. Dessa forma,
importância do Diagnóstico Ambiental no buscou-se verificar como foi considerado o
EIA é tanta, que o Ministério Público conhecimento geomorfológico na avaliação
Federal, em sua publicação “Deficiências dos impactos ambientais e na elaboração
em estudos de impacto ambiental: síntese de das medidas mitigadoras, bem como na
uma experiência” (2004), afirma que o EIA concepção dos programas de
deve ser capaz de descrever e interpretar os monitoramento ambiental. Vale salientar
recursos e processos que poderão ser que existe uma série de métodos de
44

avaliação de impactos ambientais aplicados Uso dos conhecimentos geomorfológicos


aos EIAs (Matriz de Leopold, Matriz de para a determinação das medidas
Correlação, Matriz de Interação, entre mitigadoras e para a elaboração dos
outros), porém, o enfoque dado foi apenas Programas Ambientais
em verificar se foram contemplados
impactos ambientais na área da
geomorfologia, independentemente do
método de avaliação aplicado em cada
estudo.

Os resultados obtidos permitiram identificar


que 17,4% da amostragem não apresentou
nenhum impacto ambiental associado à
geomorfologia, enquanto que em 82,4%
foram identificados impactos ambientais de
cunho geomorfológico. Dentre os impactos
identificados, destacam-se (Figura 3):
“erosão”, “movimentos de massa”,
“assoreamento”, “alteração do escoamento
superficial”, “deficiência de infiltração”,
“alteração morfológica”, “compactação do
solo e perda de solo” e “alteração da
paisagem”.

A “erosão” e a “alteração morfológica”


foram os impactos mais citados nos estudos,
tendo em vista que dificilmente uma obra
será executada sem provocar alguma
alteração, mesmo que de forma pontual e de Figura 3: Identificação dos impactos ambientais
relacionados à geomorfologia apresentados nos
curta duração. A alteração morfológica, EIAs analisados. Fonte: Centro de Documentação
citada por alguns estudos, também é da Sudema. Org.: Autores
passível de ocorrer, pois toda obra de
engenharia implica na transformação da Após a identificação e avaliação dos
paisagem, e dependendo de onde seja impactos ambientais, o EIA parte para a
instalado e do tipo do empreendimento, a definição das medidas mitigadoras e a
morfologia sofrerá alguma modificação. elaboração dos programas ambientais que
favoreçam a minimização ou a eliminação
Os dados apresentados demonstram que dos impactos negativos e a potencialização
61,1% dos estudos apresentaram impactos dos impactos positivos. Constatou-se que
ambientais associados a processos erosivos, em 88,9% dos estudos não houve a devida
que acabam se relacionando aos processos relação entre os impactos identificados, o
de assoreamento, que foi identificado em estabelecimento das medidas mitigadoras e
29,7% dos EIAs. Este fato indica que os a elaboração dos programas de
assoreamentos podem não estar sendo monitoramento.
considerados como uma consequência dos
processos erosivos (pelo menos em 31,4% Nos EIAs que apresentaram tal
das amostras) pelas equipes profissionais. relação, exemplifica-se o caso de um
Por outro lado, tal percentual pode empreendimento de mineração (Mineração
evidenciar também a inexistência de corpos Nacional - Lavra de Calcário/Argila), que
d’água na área de influência direta desses estabeleceu: “Erosão e Assoreamento”
processos. como impactos, propondo “Implantação de
45

sistema de drenagem das águas pluviais” diretamente na área da geomorfologia, mas


como mitigação e a “Vistoria para detecção permite mostrar que em quase 80% dos
de focos erosivos instalados nos períodos EIAs analisados, uma das profissões ou as
chuvosos e após estes; controle de duas estavam presentes na equipe técnica.
processos erosivos” como proposta de um
Programa de Monitoramento Ambiental na Mineração e Meio Ambiente
fase de instalação.
No EIA para a implantação do O ramo da mineração sempre constitui
Distrito Industrial de Caaporã, de iniciativa “problema” para as autoridades públicas, a
da Companhia de Desenvolvimento da sociedade civil e as empresas
Paraíba (CINEP), vinculada ao Governo do (organizações) em diversas partes do
Estado, os impactos apontados foram a mundo. Tradicionalmente, no Brasil, essa
“erosão e o assoreamento”, tendo como tendência se confirma nos estados com forte
medida mitigadora a “implantação do participação do setor mineral em suas
projeto paisagístico/áreas verdes e a economias. A diversidade de biomas e
drenagem pluvial”, contudo não apresentou ecossistemas, no país, faz com que a
nenhum programa de monitoramento mineração, associada à estrutura
ambiental. Em outro estudo para a socioeconômica e porte das cidades,
implantação de uma Usina Termelétrica desempenhe um papel ímpar para cada
(Termelétrica Termopower VI S.A – organização, requerendo maior atenção
município de Santa Rita) não foi para a sua gestão ambiental (Gutierres,
identificado nenhum impacto, nenhuma 2015).
medida mitigadora ou programa de
monitoramento na área da geomorfologia, Diante do cenário retratado, parte-se para a
seja na fase de instalação ou na fase de proposição de novas metodologias e o
operação. Portanto, aperfeiçoamento das existentes na área da
impacto/mitigação/monitoramento devem geomorfologia para uso nos estudos
estar relacionados, e a não existência dessa ambientais. Entende-se que no campo
relação configura um programa de deverão ser adotadas algumas medições
monitoramento falho e de pouca utilidade com instrumentos utilizados pela
(Sánchez, 2008). geomorfologia, bem como a coleta de
Na busca por mais dados que material pedológico para realização de
justificassem tais deficiências, foi realizado análise laboratorial, além de levantamentos
o levantamento das equipes elaboradoras topográficos e de dados de GPS, e dados
dos estudos ambientais analisados. relacionados à análise espacial da área, que
Considerando que a geomorfologia está serão úteis no uso de técnicas de
intimamente ligada a Geologia e a geoprocessamento em laboratório. No
Geografia, procedeu-se a identificação da gabinete, deve-se realizar mapeamento
presença de geólogos e geógrafos nas geomorfológico da área, englobando temas
equipes elaboradoras. Constatou-se a mais específicos (hipsometria,
ausência de pelo menos um geógrafo ou um clinográficos, de erosão) e análises
geólogo em dois EIAs. Em seis EIAs foi estatísticas. Sendo assim, tal proposição
identificada a presença de, no mínimo, um passa pela produção de uma vasta produção
geólogo e um geógrafo. Em outros cinco cartográfica: mapa pedológico; mapa de
EIAs havia a presença de pelo menos um classes de solos; mapa de erodibilidade;
geólogo e em outros cinco estudos a mapa de classes de declividade; mapa de
presença de, no mínimo, um geógrafo. No classes de modelado do relevo; mapa
entanto, sabe-se que a presença de tais preliminar de classes de suscetibilidade à
profissionais não garante que em todos os erosão laminar; mapa de classes de
casos identificados a atuação aconteceu capacidade de uso do solo; uso de imagens
46

de satélite; mapa de classes de uso e ao subestimar impactos ambientais


ocupação atual do solo; mapa de conflitos relevantes resultantes dos processos
de uso do solo; mapa de potencial à erosão geomorfológicos. Dessa forma, o EIA que
laminar (carta de risco); mapa das restrições faz uma utilização correta dos
ambientais (áreas protegidas). Os mesmos conhecimentos geomorfológicos oferecerá
deverão ser aplicados nas diferentes os meios para a solução e a prevenção de
atividades técnicas da estrutura mínima de problemas ambientais ao invés de somente
um EIA, principalmente na elaboração do descrever o ambiente, garantindo uma
“Diagnóstico Ambiental”, “Análise dos tomada de decisão que possibilite gerar o
impactos ambientais – identificação, menor número de impactos ambientais.Ao
previsão e interpretação”, “Definição das se propor trabalhar com o ramo da
Medidas Mitigadoras” e na elaboração dos mineração, buscando analisar o que consta
“Programas de Acompanhamento e nos EIAs e o que tem sido implementado
Monitoramento”. No tocante a Avaliação nas áreas de exploração, parte-se para outro
dos Impactos, a proposta deverá incorporar nível de análise que permitirá aplicar
os conhecimentos geomorfológicos às metodologias aperfeiçoadas nas áreas
metodologias de avaliação de impactos desses empreendimentos, acarretando na
ambientais existentes, a exemplo dos elaboração de metodologias de cunho
Métodos de Matrizes de Interação, Redes de geomorfológico, que venham a ser adotadas
Interação e a Superposição de Cartas. nos próximos EIAs.

Após proceder com essas atividades,


REFERÊNCIAS
espera-se responder os seguintes
questionamentos: os EIAs têm cumprido a Ab’saber, A.N. (2006) Bases conceptuais e papel do
sua função em diagnosticar, avaliar os conhecimento na previsão de impactos. In:
impactos e propor medidas mitigadoras na Müller-Plantenberg, C.; Ab’saber, A.N. (Orgs.).
área da geomorfologia? Será que uma Previsão de Impactos: O Estudo de Impacto
Ambiental no Leste, Oeste e Sul. Experiências no
melhor elaboração do conteúdo Brasil, Rússia e Alemanha. 2. ed. 2. reimpressão.
geomorfológico nos EIAs seria suficiente São Paulo, Edusp, 27-50.
para melhorar as condições dos ambientes
impactados? Ou o problema está na Aguiar, K.B. (2015) Análise da abordagem
verdadeira implementação do que consta no geomorfológica em Estudos de Impactos
Ambientais (EIAs) de projetos hidrelétricos
EIA/RIMA? apresentados ao Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
CONSIDERAÇÕES FINAIS (Ibama) no período de 1993 a 2014. 145f.
Dissertação (Mestrado), Programa de Pós-
graduação em Geografia Física. Universidade de
Foi possível verificar a existência de São Paulo, São Paulo.
estudos ambientais deficientes em
informações, dados equivocados, falta de Akiossi, A. (2010) Análise da abordagem dos
clareza e objetividade. Todos esses processos de dinâmica superficial em
problemas no momento da elaboração do EIAs/RIMAs de projetos urbanísticos no estado
de São Paulo, no período de 1987 a 2007. 186f.
EIA comprometem a transparência, o Tese (Doutorado) – Programa de Pós-Graduação
alcance e a eficiência desses estudos para em Geociências. Instituto de Geociências e
que realmente surtam o efeito desejado pela Ciências Exatas da Universidade Estadual
sociedade. Com isso, os dados apresentados Paulista, Rio Claro.
e discutidos demonstram que a
Barbieri, J.C. (2007) Gestão ambiental empresarial:
geomorfologia tem sido subutilizada no conceitos, métodos e instrumentos. 2. ed. São
âmbito dos estudos de impactos ambientais Paulo, Saraiva.
através de análises baseadas,
exclusivamente, em dados secundários ou
47

Brasil. Resolução Conama nº 001, de 23 de janeiro Paes, H.G. (2010) Contribuições da Geografia ao
de 1986. Disponível em: licenciamento e ao Estudo de Impacto
http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res86/r Ambiental. Dissertação (Mestrado): Programa de
es0186.html >. Pós-GraduaçGeografia Física, USP.

Christofoletti, A. (2007) Aplicabilidade do Pereira, V.D. (2015) Uma abordagem geográfica


conhecimento geomorfológico nos projetos de dos EIAs/RIMAs no estado da Paraíba.
planejamento. In: Guerra, A. J. T.; Cunha, S. B. Monografia (Bacharelado em Geografia) –
Geomorfologia: uma atualização de bases e Departamento de Geociências, Universidade
conceitos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 7. ed. Federal da Paraíba, João Pessoa.
365-39.
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Guerra, A.J.T.; Marçal, M.dosS. (2006) EIA`s-RIMA`s. In: Guerra, A.J.T.; Cunha,
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In: Silva, A.B. da; Gutierres, H.E.P; Galvão, Venturi, Luis Antônio Bittar (Org.). Praticando
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Kohler, H.C. (2001) A escala na análise Sánchez, L.E. (2008) Avaliação de impacto
geomorfológica. Revista Brasileira de ambiental: conceitos e métodos. São Paulo,
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estudos de impacto ambiental: síntese de uma Teoria e Prática. São Paulo, Oficina de Textos.
experiência. Brasília, Escola Superior do
Ministério Público.
48
DETERMINAÇÃO DE PARÂMETROS HIDROLÓGICOS,
MORFOMÉTRICOS E PROBLEMAS AMBIENTAIS EM SETOR
URBANO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MUNDAÚ –
MUNICÍPIO DE RIO LARGO (AL)

John W. F. Marques, José H. M. da Silva, Damião S. Cordeiro, Roseildo F. da


Silva e Genisson P. da Silva

Para contribuir com os estudos ambientais,


INTRODUÇÃO
que muito interessa a sociedade de modo
Bacia hidrográfica, segundo (Christofoletti, geral, fez-se uma análise de setores no curso
1980:102), é definida como “a área drenada da BHM e, como ela é um sistema fluvial
por um determinado rio ou por um sistema complexo, torna-se também necessário à
fluvial”. A Bacia Hidrográfica do Rio determinação de alguns parâmetros
Mundaú (BHM) localiza-se na região hidrológicos (vazão, velocidade média do
centro-oriental do Nordeste do Brasil e está rio, profundidade) e morfométricos (índice
compreendida entre as coordenadas 8º 41’ de sinuosidade, perfil transversal) para
34’’/ 9º 14’ 00’’ S e 36º 03’ 36’’ W/36º 37’ comparações e acompanhamentos de sua
27’’ W (Figura 1), sendo de domínio federal dinâmica. Para operacionalizar a pesquisa,
por drenar áreas de dois estados, utilizou-se como referencial teórico os
Pernambuco e Alagoas (Barros, 2011). estudos de (Christofoletti, 1980; Guerra e
Cunha, 1996; Kayano et al., 2007; Tavares
A BHM nasce em Pernambuco, no et al. 2009; Ferreira et al., 2012).
município de Garanhuns, e deságua em
Alagoas na laguna homônima (Barros, A emergência de um Comitê para a BHM
2011). Ela é subdividida em três sub-bacias;
(1) Alto Mundaú (2) Médio Mundaú e (3) Os comitês de bacia hidrográfica são
Baixo Mundaú. Essa última contém o organismos vinculados ao Sistema Nacional
município de Rio Largo. Como observado de Gerenciamento de Recursos Hídricos e
por (Kayano et al., 2007), a BHM encontra- buscam a participação social na gestão das
se em um profundo processo de degradação bacias hidrográficas, como também a
ambiental e a região do Alto Mundaú é a racionalização do uso dos recursos hídricos
mais atingida pela ação antrópica, podendo (CBH, 2016). Globalmente, experiência de
causar impactos em todas as outras sub- gerenciamento de recursos hídricos,
bacias. baseadas em comitês de bacias
50

hidrográficas, vem mostrando eficiência. ÁREA DE ESTUDO


No Brasil, principalmente a partir da década
Rio Largo é um município do estado de
de 1980, experiências desse tipo são
Alagoas. Localiza-se a 09º 29’ 41’’ S e 35º
implantadas, como aconteceu no Espírito
51’ 12’’ W. Possui uma área total de 310,6
Santos com o primeiro Consórcio
km2, sendo que 235,4 km² estão inseridos na
Intermunicipal que integrava a bacia dos
área da BHM, representando mais de 75%
rios Santa Maria da Vitória e Jucu. O estado
da área total (Barros, 2011). No censo
de Alagoas possui 54 bacias hidrográficas,
demográfico realizado pelo IBGE em 2010,
dentre estas a BHM. Em 2011, o Conselho
o município comportava 65.481 habitantes.
Nacional de Recursos Hídricos (CNRH)
Seu clima é caracterizado como tropical
recebeu a proposta apresentada pela
chuvoso, com verões que apresentam baixa
Secretaria de Recursos Hídricos e
pluviosidade e outonos e invernos chuvosos
Energéticos de Pernambuco e Secretaria de
(Seplag, 2015). Sua temperatura média é de
Recursos Hídricos de Alagoas para a
25º C e sua precipitação anual varia de
criação de um comitê da BHM (Ferreira,
1.390 mm a 1.490 mm, concentrando-se nos
2012). Entretanto, o comitê ainda espera as
meses de abril e julho. A altitude deste
discussões entre a Agência Nacional de
município chega a 130 m nas áreas altas e
Águas (ANA) e os estados de Pernambuco
nas áreas mais baixas a altitude é de 20 m
e Alagoas (Cássia, 2011; Semarh, 2016).
(Mendonça, 2012).

Figura 1: Sub-bacias da BHM (Kayano et al., 2007).


51

A geologia do município é diversificada. Há


afloramentos de rochas cristalinas do
Complexo Migmatito-Granítico e
Sedimentos da Bacia Alagoas, notadamente
as formações; Barreira, Poção e Sedimentos
Praia e Aluviões. As feições
geomorfológicas de Rio Largo são
igualmente diversificadas; colinas sobre
rochas cristalinas, encostas que exibem os
sedimentos da formação Poção, dentre
outras. A planície fluvial quaternária dessa
região é transpassada pelo Rio Mundaú, Figura 2: Setores de análise em falsa cor (Google
com terraços e meandros (Costa et al., Earth).
2011). A vegetação do município apresenta
unidades remanescentes de conservação da O dia em que a visita foi realizada coincidiu
Mata Atlântica que pertencem, a grande com o dia da tradicional feira de Rio Largo.
maioria, a usina de cana-de-açúcar Utinga Então, a partir de registros fotográficos, fez-
Leão (Costa et al., 2011). se uma análise dos problemas ambientais
que estavam em evidência. Replicou-se a
metodologia para o segundo e o terceiro
MATERIAIS E MÉTODOS setor da análise. O segundo setor dista 0,69
Km do primeiro e nele foi feito a
A primeira fase da pesquisa – trabalho de
determinação dos parâmetros hidrológicos
gabinete – constituiu-se em um
do referido rio.
levantamento bibliográfico acerca da
temática focalizada pela pesquisa. Com os Através de técnicas de sensoriamento
objetivos claros e com a metodologia remoto, determinou-se a sinuosidade do rio.
definida, verificaram-se as imagens de Mediu-se primeiramente o comprimento do
satélite disponibilizadas pelo Google Earth curso do rio, neste caso, determinado pelos
para marcar os setores a serem visitados in limites político-administrativos do
loco. A análise do ambiente foi feita através município, com a ferramenta “régua” do
de alguns elementos propostos por (Ferreira Google Earth e também se mensurou a
et al., 2012) e para determinação dos extensão do eixo do vale. Relacionaram-se
parâmetros hidrológicos utilizou-se a os valores obtidos para determinar a
metodologia sugerida por (Christofoletti, sinuosidade assim como (Christofoletti,
1980; Guerra e Cunha, 1996; Tavares et al. 1980) propôs.
2009).
Mediu-se a velocidade média superficial do
A visita ao município de Rio Largo foi rio e, posteriormente, a velocidade média do
dividida em três setores de análise. O rio in loco através do método dos
primeiro setor (A) (9°29'16.82" S e flutuadores. Por três vezes, atirou-se uma
35°51'11.80" O) foi escolhido por estar pequena esfera plástica no curso d'água a
inserido na parte mais urbanizada do jusante do rio e quantificou-se o tempo
município, o segundo setor (B) (9°29'1.52" gasto para que ela percorresse 10 m. Com
S e 35°51'32.73" O) por ter as condições esses dados, aplicou-se a fórmula da
favoráveis à determinação dos parâmetros velocidade média (distância/tempo). Com
hidrológicos e morfométricos e o terceiro isso, calculou-se a velocidade média do rio
(C) (9°28'33.10" S e 35°51'45.13" O) por através da relação matemática apresentada
ser menos urbanizado que o primeiro, por Guerra e Cunha (1996).
permitindo desta forma uma comparação
(Figura 2).
52

Figura 3 – No ponto A percebe-se o lixo acumulado às margens do rio, no ponto B a cana-de-açúcar, plantada a
poucos metros da margem do rio, e no ponto C a presença da barragem.

Para construir o perfil transversal do curso No setor (B) foi visto que as encostas da
d'água, mediu-se com uma trena a largura margem do rio são ocupadas para a
do rio no segundo setor de análise. plantação de cana-de-açúcar – monocultura
Dividindo a largura do rio por onze, que preenche boa parte da paisagem do
obtiveram-se dez pontos de igual município e é uma das principais atividades
comprimento e nestes pontos mediu-se à econômicas do estado de Alagoas (Andrade
profundidade com o auxílio de uma fita et al., 2007), e também foi flagrada a
métrica. Essas medidas foram realizadas extração ilegal de areia. Esse problema não
sobre uma das mais importantes pontes do se restringe a Rio Largo. Em Santana do
município, chamada de “Ponte do Mundaú, (Ferreira et al., 2012) observaram
Riachão”. Com os dados colhidos, a mesma situação e destacam que
construiu-se o perfil transversal do rio que geralmente as pessoas desconhecem os
relaciona profundidade e largura. Por fim, impactos ambientais provenientes de suas
calculou-se a profundidade média do rio no práticas e que é necessário conscientizá-las.
setor das medições hidrológicas para Aqui também foi visto lixões e mais
determinar a vazão. Para calcular este despejamento de esgoto não tratado no
parâmetro, utilizou-se a seguinte expressão: canal.
V= Pm x L onde V significa vazão, Pm
profundidade média e L largura do rio. O setor (C) era menos urbanizado,
entretanto possuía problemas ambientais de
igual magnitude se comparado a outros
RESULTADOS E DISCUSSÕES
setores analisados nesta pesquisa. Em
Lourenço de Albuquerque, zona rural do
Problemas ambientais município de Rio Largo, o primeiro fato que
chamou a atenção foi às pocilgas que
Em todos os setores de drenagem lançam seus rejeitos no rio. Aqui,
analisados, foi constatado o processo de encontrou-se uma quantidade reduzida de
degradação avançado do meio ambiente resíduos sólidos e percebeu-se que o rio de
(Figura 3). No primeiro setor analisado (A), águas turvas fica mais sereno em
no centro da cidade, foram observados decorrência de uma barragem. As barragens
pequenos lixões, desmatamento das alteram o equilíbrio longitudinal dos rios
encostas, descarte incorreto de lixo (Coelho, 2008), em áreas de barragens, as
eletrônico e lançamento de esgoto águas são lênticas (semi-paradas). Em
doméstico diretamente no rio. Este quadro nenhum dos setores observados encontrou-
se repetiu em todos os pontos analisados, se a presença de mata ciliar. Essa
entretanto, com algumas peculiaridades. constatação sucinta o debate do
53

assoreamento do leito do rio denunciado por desta forma, mais suscetíveis à erosão
(Ferreira et al., 2012). (Christofoletti, 1980).

O padrão anastomosado está relacionado,


Determinação de parâmetros
dentre outras coisas, as variações do fluxo
hidrológicos e morfométricos fluvial que se modifica em função do clima,
do substrato rochoso e da presença ou
A tipologia de sinuosidade pode ser
ausência de cobertura vegetal. A duas
definida a partir do índice de sinuosidade do
condições climáticas favoráveis a formação
canal (Tavares et al., 2009). Há três
deste padrão; a semiárida ou árida, com
principais tipos de padrões; os retilíneos
baixos índices pluviométricos, e os climas
(straight), os meândricos (meandring) e os
frios, com a presença de neve e degelos
anastomosados (braided). Relacionando o
vertiginosos. Nenhumas dessas condições
comprimento do trecho do rio que passa por
climáticas se encaixam na área analisada. É
Rio Largo (25,3 Km) com o comprimento
provável que a ausência de mata ciliar,
do eixo do vale (16,3 Km) obteve-se o
aliada aos altos índices pluviométricos do
índice de sinuosidade do rio que foi de 1,5,
município e a degradação do meio
ou seja, anastomosado.
ambiente, contribua para a construção deste
Geralmente, o tipo de sinuosidade de uma padrão.
seção fluvial está atrelado à carga detrítica,
A velocidade de um rio é afetada por vários
no caso dos canais anastomosados existe
elementos, dentre eles; (1) declividade do
uma forte correlação com a carga
canal (2) índice de rugosidade do leito (3) o
sedimentar arenosa do fundo do canal. Os
volume d’água (4) forma da seção
rios que não dispõe de potencial suficiente
transversal (3) viscosidade da água.
para transportar grandes quantidades de
Qualquer tipo de obstáculo pode influir na
material grosseiro para o nível de base final,
eficiência do fluxo das águas dos rios. Por
depositam este material no leito e, neste
isso, a velocidade é variável ao longo do
processo, formam-se ramificações
perfil transversal. A velocidade de um rio
assimétricas, como mostra a Figura 2. Essas
está intrinsecamente relacionada com a
ramificações são pequenas, rasas e ligam-se
“capacidade de erosão das margens e do
e separam-se de maneira estocástica. São
leito fluvial” (Guerra e Cunha, 2007,
formadas de material aluvial, nas épocas de
p.228). A velocidade média do rio no ponto
cheia normalmente ficam submersas. As
de medição (B) foi de 0,59 m/s, como
margens desse tipo de canal são frágeis e,
mostra a Tabela 1.

Tabela 1: Velocidade do rio Mundaú (Rio Largo – Alagoas) obtidas através do método dos flutuadores, em trechos
selecionados de 10 m cada

Tempo Velocidade Velocidade


Tempo Distância superficial média média do rio
médio (m/s) (m/s)1
T1= 15,4 s – – – –
T2= 16,6 s 14,3 s 10 m 0,69m/s 0,59m/s
T3= 10,9 s – – – –

1
Estudos empíricos, como apontado por (Cunha e Guerra, 1996), demonstram que a velocidade média do rio é
0,85 vezes maior que a velocidade média da superfície.
54

Figura 4: Perfil transversal do rio Mundaú.

O perfil transversal (Figura 4), também ocupação e o desmatamento das encostas –


conhecido como seção molhada, apresenta por parte um de moradores por um lado e do
a relação entre a largura e a profundidade do outro pela cana-de-açúcar, o descarte
rio. As medidas da seção transversal podem incorreto de resíduos sólidos (inclusive de
ser repetidas em vários meses ou anos e, lixo eletrônico), a extração ilegal de areia,
desta maneira, ajudam a compreender e contribuindo, assim como o desmatamento
quantificar a erosão das margens do rio e as da mata ciliar, para o assoreamento do leito
sucessivas modificações do leito. É típico do rio, o lançamento de rejeitos no rio,
dos canais largos e rasos, como neste caso, provenientes da criação de porcos e a
apresentar baixos índices de variação existência de barragens, que alteram o
topográfica do leito. equilíbrio longitudinal do rio.

O setor (B) do rio possui 176,72 m de Sobre a determinação de parâmetros


largura e profundidade média de 0,73 m. A hidrológicos e morfométricos; calculou-se
seção transversal de um rio anastomosado é que a seção analisada possui índice de
descrita por (Guerra e Cunha, 2007) como sinuosidade anastomosado, a velocidade
sendo larga, rasa e pouco simétrica, como média do rio é de 0,59 m/s, a seção
mostra a Figura 3. A construção de perfis transversal, como o esperado para o padrão
transversais é importante, segundo (Pedrosa anastomosado, é pouco simétrica e a vazão
et al., 2010:19), para “modelagem do do rio, calculada a partir do perfil
escoamento e estimativas da vazão”. A transversal, foi de 76,11 m³/s. Esses
vazão do rio foi calculada a partir da seção parâmetros são importantes para futuras
transversal2 e obteve-se 76,11 m³/s. pesquisadas ao longo da BHM, pois
fornecem dados comparativos, inclusive
CONSIDERAÇÕES FINAIS sazonais, já que as medições foram feitas no
mês posterior ao período chuvoso.
A análise in loco do ambiente nos três
setores permitiu observar uma paisagem Portando, torna-se imperioso as ações de
fortemente marcada pela degradação educação ambiental da gestão municipal de
ambiental, sendo que a situação mais grave Rio Largo, mas também da integração entre
foi encontrada na área mais urbanizada do Pernambuco e Alagoas para efetivar a
município de Rio Largo. Foi visto o criação do comitê da BHM, que integraria,
lançamento de esgoto sanitário dentro do dentro de uma perspectiva geossistêmica,
rio, ausência de mata ciliar nas margens, a discussões sobre o meio biofísico contidos

2
Para a largura utilizou-se a escala horizontal de 0,5 cm equivalentes a 5 m e na escala vertical 1 cm equivalente
a 1 m.
55

na área da bacia e dos elementos sociais, Maceió. Brasília, Agência Nacional de Águas
econômicos e culturais, trazendo benefícios (ANA).
para os moradores da bacia e também para Ferreira, E.P. et al. (2012) Desafios para a gestão da
o uso racional dos recursos hídricos e a bacia hidrográfica do rio mundaú – diagnóstico
preservação e conservação do meio ambiental de trechos da bacia localizada no
ambiente. Esta pesquisa buscou contribuir, Estado de Alagoas. Enciclopédia Biosfera.
colhendo dados em campo, para a Goiânia, 8, 14, 1123-1134.
compreensão dos problemas ambientais que
Guerra, A.J.T.; Cunha, S.B. (1996) Geomorfologia:
cercam a BHM e sua dinâmica enquanto exercícios, técnicas e aplicações. Rio de Janeiro,
sistema fluvial. Bertrand Brasil.

Guerra, A.J.T.; Cunha, S.B. (2007) Geomorfologia:


REFERÊNCIAS uma atualização de bases e conceitos. Rio de
Janeiro, Bertrand Brasil.
Andrade, L.H.C. et al. (2007) A expansão da cana-
de-açúcar no espaço alagoano e suas Kayano, M.T. et al. (2007) Avaliação dos impactos
consequências sobre o meio ambiente e a da poluição nos recursos hídricos da bacia do rio
identidade cultural. Revista de Geografia Mundaú (AL e PE). Revista de Geografia.
Agrária, 2, 4, 19-37. Recife, 24, 3.
Barros, A.A.S. (2011) Correlação entre o fator de Mendonça, C.A.P. et al. (2012) Enciclopédia dos
refletividade do radar e a vazão no rio Mundaú. Municípios de Alagoas. Maceió: Núcleo de
Dissertação de mestrado (Mestrado em Projetos Especiais.
Meteorologia) – Instituto de Ciências
Atmosféricas, Universidade Federal de Alagoas, Pedrosa, V.A. et al. (2010) Reflexões sobre a cheia
Maceió. de junho de 2010 nas bacias do rio Mundaú e
Paraíba. Maceió, CTEC.
Cássia, O. (2016) Rio Mundaú está morrendo e pede
socorro. Disponível Semarh. (2016) Comitês de Bacias Hidrográfica.
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Christofoletti, A. (1980) Geomorfologia. São Paulo, Tavares, B.A.C. et al. (2009) Contribuição do estudo
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impactados por barragens.1Caminhos de Associação Brasileira de Estudos do
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Costa, W.D. et al. (2011) Estudos hidrogeológicos
para subsidiar a gestão sustentável dos recursos
hídricos subterrâneos na região metropolitana de
56
PLANALTOS RESIDUAIS DO RIO GRANDE DO NORTE:
ASPECTOS TEÓRICOS E CARACTERIZAÇÃO FISIOGRÁFICA

Jacimária Fonseca de Medeiros e Luiz Antonio Cestaro

isolados, separados entre si, em meio à


INTRODUÇÃO Depressão Sertaneja. De acordo com Prates
et al. (1981), destacam-se sobre a topografia
O estado do Rio Grande do Norte é plana da Depressão Sertaneja, na forma de
constituído por diversos sistemas elevações residuais, constituída pelos
ambientais, dentre eles os Planaltos inselbergs ou maciços residuais. Apesar de
Residuais, que se constituem como uma apresentarem-se como uma
unidade de grande importância geográfica, descontinuidade espacial, os mesmos são
tendo em vista a interação entre o seus dotados de uma série de propriedades
elementos constituintes, bem como as comuns, as quais nos permitem aferir que se
associações com outras unidades, como as configuram como uma Unidade
chapadas e a Depressão Sertaneja. Geoambiental.
De acordo com o Manual Técnico de O termo Planaltos Residuais aparece em
Geomorfologia/IBGE (2009), os planaltos alguns trabalhos como sinônimo de
são unidades geomorfológicas definidas Maciços Residuais, os quais são definidos
como conjunto de relevos planos ou por Guerra e Guerra (2010:403), como
dissecados, de altitudes elevadas, limitados, sendo restos de antigas superfícies, ou
por superfícies mais baixas, onde os melhor, antigos pediplanos ou peneplanos,
processos de erosão superam os de geralmente relacionadas com as rochas
sedimentação. Na visão de Ross (2008), os mais duras. Para Souza et al. (1979), são
Planaltos caracterizam a maior parte do constituídos por rochas metamórficas ou
território brasileiro, considerados como intrusivas com morfogênese química e
vestígios de antigas formações erodidas. evolução associada com intensos processos
São chamados de relevos residuais, como a de dissecação do relevo.
ideia do que resultou do relevo atacado pela
erosão. O Nordeste Brasileiro apresenta cenários
contrastantes quanto à sua morfologia,
Os Planaltos Residuais são entendidos abrigando Pediplanos sobre uma Depressão
como áreas de relevo montanhoso, Periférica e Interplanáltica, com a notável
apresentando-se na forma de blocos presença dos relevos residuais.
58

De posse do entendimento do conceito de estados da Paraíba e Rio Grande do Norte,


Planaltos Residuais, faz-se necessário constituem tabuleiros capeados pelos
sedimentos da formação Serra do Martins,
estabelecer também os conceitos de cuja idade é atribuída ao Eoterciário.
Inselbergs, Serras e Maciços, por serem Historicamente, estas feições do relevo
estas formações geomorfológicas têm sido vistas como testemunhos das
características desse tipo de unidade. etapas mais recentes da gênese da
chamada Antéclise da Borborema, feição
Para Souza et al. (1979), os inselbergs são positiva de grande comprimento de onda
que abarca todo o escudo nordestino.
formas disseminadas pela depressão Caracterizada por Barbosa (1966), a
sertaneja que efetivam os efeitos seletivos Antéclise da Borborema seria resultante
de trabalho erosivo no decorrer da história de arqueamentos epirogenéticos lentos,
geológica recente da região. São geralmente atuantes desde o Paleozóico.
áreas despidas de solo ou de vegetação e
quando a pedogênese é efetiva, conduz à Processos evolutivos dos planaltos
formação de solos litólicos, recobertos por residuais
uma caatinga de porte arbustivo. Em
Ab’Saber (1995:5) encontramos a seguinte O entendimento do processo de formação
designação: dos Planaltos Residuais no Nordeste
brasileiro está diretamente atrelado ao
a maior parte dos morrotes do tipo
componente climático da região semiárida,
inselbergs, que servem de baliza e
referência da imensidão das colinas que apresenta uma média pluviométrica
sertanejas, depende quase que anual de 650 mm, distribuídas de forma
exclusivamente do tipo de rochas duras irregular ao longo do ano. As altas
que afloram no local: lentes de quartzito temperaturas verificadas favorecem
resistentes; massas homogêneas de
elevadas taxas de evaporação. Outro ponto
granitos, apenas espaçadamente
fraturados; ou outras exposições rochosas a ser enfatizado, diz respeito à amplitude
também resistentes. térmica diária, responsável pela dilatação
dos minerais que compõem as rochas
Nessa perspectiva, os inselbergs podem ser durante o dia e contração dos mesmos
caracterizados como verdadeiras ilhas de durante a noite, quando se verificam as
rochas, cujos processos evolutivos estão menores temperaturas. A esse processo dá-
condicionados ao clima seco, que propicia se o nome de termoclasia, responsável por
um tipo específico de erosão, a esfoliação ocasionar a desagregação mecânica das
esferoidal. Para Guerra & Guerra (2010), os rochas (Leite, 2001).
Inselbergs são como que resíduos da
pediplanação em clima áridos, quentes e Quanto à formação dessas áreas, Ab´Saber
semiáridos, à semelhança dos monadnocks, (2000:516), salienta que:
devido à peneplanação em locais de clima
úmido. It is impossible to deal with the question
of the summit surfaces without referring
to the tectonic behavior of the old shields
De acordo com o Dicionário Geológico- uplifted by epeirogenesis. In fact, all the
Geomorfológico, Guerra & Guerra (2010), evidences of erosion found in uplifted
Maciço trata-se de um termo descritivo, pre-Devonian terranes, on the top of
utilizado para designar grandes áreas de massifs and ranges, constitute documents
of broad processes of planation happening
rochas metamórficas, que foram
approximately at the close of the
parcialmente erodidas. Cretaceous sedimentation in extra-
Amazonian Brazil. Otherwise, in terms of
Para Morais Neto e Alkmim (2001:95): megageomorphology, they are planations
inherited from the processes begun in pre-
algumas das porções mais elevadas do Devonian “oldlands”, at the time when the
Planalto da Borborema, no interior dos Afro-Brazilian continent still had much
59

continuity. Soon after the gigantic plate encontra-se relacionado a um clima úmido,
tectonics episode that broke apart the two levando em conta a incisão vertical da
continental blocks, erosive processes
continued during the last phases of partial
drenagem. Assim, a desagregação mecânica
subsidence that happened in sectors of the seria a grande responsável pelo recuo
old Paleo-Mesozoic basins, or that paralelo das vertentes, e seus detritos, a
overflowed into late subsiding areas, on partir da base em evolução, se estenderiam
the dorsum of the old formations (Parecis, em direção aos níveis de base, produzindo
Araripe and Areado, western Bahia and
northwestern Minas Gerais).
entulhamento e consequente elevação do
nível de base local. Esse entulhamento se
Com esta citação o autor salienta a daria por atividades ou processos
necessidade de atrelar os processos de torrenciais, originando as formas
formação das superfícies de cimeira, conhecidas como bajadas e proporcionando
maciços e faixas, aos comportamentos o mascaramento de toda irregularidade
tectônicos erguidos por processos topográfica, caracterizando a morfologia
epirogenéticos, constituindo documentos de dos pediplanos.
amplos processos de aplainamento
ocorrendo aproximadamente na Contrariando esta visão clássica
sedimentação cretácea no extra-Brasil apresentada anteriormente, de acordo com
Amazônico. Corrêa (2003), diversos autores como Büdel
(1982), Twidale (1982) e Thomas (1994)
Os relevos do tipo residuais encontrados na refutam fortemente as generalizações
região semiárida são considerados como previstas pelos defensores das superfícies
relevos testemunhos, resultantes da erosão de aplainamento e recuo paralelo das
diferencial. São explicados na literatura sob escarpas; pedimentação, como os principais
a luz de Lester King e sua Teoria da motores da evolução das paisagens tropicais
Pediplanação, a qual se apoia semiáridas. Para Vitte (2005:105), autores
principalmente em critérios como a como Passarge (1895) e Bornhardt (1900)
atividade erosiva de ambientes áridos e também contribuíram para o
semiáridos. Considerando o critério posto e desenvolvimento da geomorfologia tropical
sua área de abrangência, justifica-se então o na medida em que noticiaram a existência
fato da larga aceitação em regiões de extensos etchplains e inselbergs nos
intertropicais, enfatizando o Brasil e a escudos tropicais. Tal descoberta fez com
África. Na visão de Ross (2008), apesar da que todas as atenções se voltassem para o
influência davisiana, a Teoria proposta por contexto regional, no caso, as associações
King se diferencia desta, pelo fato do relevo entre os Inselbergs e as extensas superfícies
não apresentar um comportamento cíclico, planas.
onde a atuação dos efeitos tectônicos
acontece sim, mas de forma intermitente, A Teoria da Etchplanação foi
colocando superfícies de erosão ou de desenvolvida inicialmente por Wayland
pediplanação elaboradas ao longo do tempo (1933). Essa teoria prega que existe uma
em diferentes níveis. integração dialética entre a alteração
geoquímica das rochas e a erosão
Para Casseti (2005), devemos considerar superficial, Büdel, (1982) apud Corrêa
que, a teoria da pediplanação foi (2003). Vitte (2005:107), afirma que:
originalmente relacionada a um clima Os processos de lixiviação e lessivagem
úmido, porém partindo do princípio que promovem a disjunção nas ligações
foram produzidas nas regiões temperadas, ferro-argila instabilizando os horizontes
supõe-se que a horizontalização topográfica superficiais e preparando-os para o
esteja vinculada a um clima seco, assim processo erosivo nas encostas. A
como o desenvolvimento vertical do relevo migração das argilas, oxihidróxidos de
60

ferro e alumínio e ácidos orgânicos em Gurgel (2012), ao analisar a neotectônica


profundidade intensificariam o em áreas dos estados do Ceará e Rio Grande
aprofundamento do intemperismo. do Norte, no Nordeste brasileiro, destaca a
Seguindo essa linha de raciocínio, Vitte necessidade de alteração do termo Maciço
(1998:25) afirma que o relevo se formaria a Residual para Maciços Estruturais ou
partir da interação entre a superfície Tectônicos, em virtude da ineficiência junto
topográfica e uma subsuperficial existente aos padrões morfogenéticos atuais, pois o
no contato entre a rocha e a zona de termo “residual” está imbuído de uma
alteração. conotação atrelada somente aos processos
erosivos, entendidos como resultado de sua
A principal diferença entre as duas teorias clássica interpretação frente aos processos
reside no fato de que, na Pediplanação, os de aplainamento e pediplanação. Outro
inselbergs, se comportam como resquícios ponto que precisa ser enfatizado é que os
da circundenudação, resultantes de recuo maciços graníticos têm sua formação
paralelo das escarpas e formação de relacionada com zonas de cisalhamento,
pedimentos, definidos por Corrêa (2003), além do que a denudação/exumação dessas
como monadnocks de position que unidades acontece em estreita relação com
sobreviveram ao rebaixamento geral da os processos tectônicos atuantes. A autora
superfície regional por suas características salienta ainda que os maciços estruturais
litológicas ou por seu posicionamento constituem fortes registros da evolução
tectônico favorável. O mesmo autor salienta morfotectônica e morfoclimática, através de
que: formas alongadas ou dissecadas pelos vales,
comandados por processos de erosão
É importante considerar que sua diferencial, dados a constituição geológica
ocorrência sob climas semi-áridos formada por rochas mais resistentes.
tropicais e subtropicais deve-se ao fato de
que nestes domínios climáticos os
processos de intemperismo e erosão,
Além da discussão teórica apresentada
atuantes nas encostas, e especialmente nas acerca da gênese e formação dos Planaltos
suas bases, levam a maior inclinação e Residuais, este trabalho objetiva ainda,
recessão das escarpas e concomitante identificar e caracterizar estas unidades
elaboração dum pronunciado ângulo de situadas no estado do Rio Grande do Norte.
piemonte: o knick.

As correntes apresentadas constituem-se ÁREA DE ESTUDO


numa corrente geomorfológica clássica que
afirma que essas áreas de Maciços se No estado do Rio Grande do Norte, os
caracterizam como testemunho ou resto de Planaltos Residuais distribuem-se na região
uma grande área, um Planalto, que se do extremo Oeste, bem como na região do
estendia até o estado do Ceará, abrangendo Seridó, ocupando uma área de
todo o Planalto da Borborema, sendo a atual aproximadamente 224.500 hectares.
configuração moldada por processos Constituem uma unidade geoambiental
erosivos e de denudação, os quais formada por maciços e inselbergs,
acentuaram os declives, bem como os distribuídos ao longo da Depressão
cursos d’água foram cavando os seus leitos Sertaneja, formando um contraste na
atuais. Porém, atualmente, pesquisas com paisagem caracterizada pelas formas
datações realizadas em toda a porção do horizontalizadas e aplainadas. Formam uma
nordeste setentrional apontam para o área limítrofe entre os estados do Rio
soerguimento de bacias tectônicas. Grande do Norte, Ceará e Paraíba. (Figura
1).
61

Figura 1: Mapa de Localização dos Planaltos Residuais no Rio Grande do Norte.

Podemos a partir da Figura 1, identificar as Norte, porém de caráter apenas de


seguintes áreas de Planaltos Residuais para delimitação. Em vista da lacuna existente
o estado do Rio Grande do Norte: acerca da caracterização dessas unidades,
surge o interesse pela pesquisa sobre os
1. Planalto Residual Extremo Oeste Planaltos Residuais, pautada numa revisão
Potiguar; literária, ancorada em autores como Prates
2. Planalto Residual Serras de Martins e et al. (1981), Ab’Saber (1995), Corrêa
Portalegre; (2003), IBGE (2009) e Gurgel (2012).
3. Planalto Residual da Serra de João do
Vale; Num segundo momento, procedeu-se a fase
4. Planalto Residual da Serra da Formiga. de campo com fins exploratórios, cuja
finalidade era testar in loco as informações
MATERIAIS E MÉTODOS coletadas anteriormente através de
pesquisas desenvolvidas nas áreas de
O presente trabalho parte inicialmente de interesse. Num terceiro momento, deu-se a
uma pesquisa de Cestaro et al. (2007), com fase de tabulação dos dados, onde para
a finalidade de identificação das Unidades alguns elementos foram elaborados mapas
Geoambientais do estado do Rio Grande do no software Arcgis 10.2.
62

Figura 2: Mapa altimétrico dos Planaltos Residuais do estado do Rio Grande do Norte.

diversificadoras da paisagem, no caso em


RESULTADOS E DISCUSSÕES
questão destaca-se dentre estes, a altitude.
A apresentação dos resultados pautar-se-á
O substrato rochoso dessas unidades é
na caracterização dos elementos
constituído por rochas cristalinas do Pré-
fisiográficos que compõem os Planaltos
Cambriano, destacando os granitos,
Residuais do Rio Grande do Norte.
gnaisses e micaxistos. A maior parte do
Inicialmente destaca-se que o clima território ocupado por essas unidades estão
predominante na unidade dos Planaltos inseridas dentro da Formação Jucurutu e
Residuais é o sub-úmido, com precipitações somente o Planalto Residual da Serra da
médias anuais superiores a 800 mm e Formiga está soerguido sobre a Formação
estação chuvosa estendendo-se de janeiro a Seridó.
junho. Para explicar a ocorrência desse tipo
Nesse sentido, pode-se aferir que, as áreas
climático em áreas semiáridas, com a
dos Planaltos Residuais estão localizadas
formação de mesoclimas nesses espaços,
sobre o Grupo Seridó, pois segundo Jardim
ampara-se na teoria de interação dos
de Sá (1986) esse termo engloba as rochas
elementos do clima com os fatores da
metamórficas das formações Jucurutu,
atmosfera geográfica. Para Mendonça &
Equador e Seridó, respectivamente, da base
Danni-Oliveira (2007), a grande variação
para o topo da sequência. A Formação
espacial e temporal da manifestação dos
Seridó se constitui por paragnaisses, com
elementos climáticos deve-se à ação de
intercalações de mármores e rochas
controles climáticos, também conhecidos
calciossilicáticas (Formação Jucurutu), uma
como fatores do clima. Os fatores
climáticos correspondem àquelas camada intermediária composta por
quartzitos e metaconglomerados (Formação
características geográficas estáticas
Equador) e uma camada superior
63

essencialmente constituída por micaxistos separadas por vales em “V” e


(Formação Seridó). eventualmente vale de fundo plano.

Percebe-se na área de estudo, 3 – Formas Tabulares – Relevo de topo


especificamente neste domínio, a grande plano, com diferentes ordens de grandeza e
ocorrência das rochas graníticas, expostas de aprofundamento de drenagem separados
pela ação erosiva e constituídas por vales de fundo plano.
essencialmente de quartzo e feldspato, com
pequenas quantidades de outros minerais A área dos Planaltos Residuais encontra-se
como a mica. banhada por duas bacias hidrográficas,
sendo as áreas 1 e 2, inseridas nos domínios
As áreas dos Planaltos Residuais do Rio da bacia hidrográfica Apodi-Mossoró, e as
Grande do Norte apresentam elevadas cotas áreas 3 e 4, se encontram dentro da bacia
altimétricas, variando de 200 m, onde se hidrográfica do Piranhas-Açu (Figura 1, que
encontram as áreas de ligação entre esta trata dessa localização).
unidade e a unidade geoambiental da
Depressão Sertaneja, até a cota acima dos Essas áreas representam grande importância
700 m, onde se encontram as áreas mais para a hidrografia do estado, pois o rio
elevadas do estado. Segundo Cestaro et al. Apodi-Mossoró, que se constitui como a
(2007), O ponto culminante do estado segunda maior bacia hidrográfica do estado,
possui uma cota altimétrica de 852 m, está nasce no município de Luís Gomes, com
localizado nesta unidade geoambiental, uma altitude em torno de 700 m.
mais precisamente na Serra Poço Dantas na
divisa entre os municípios de Luís Gomes De acordo com Jacomine et al. (1971), os
no Rio Grande do Norte e Poço Dantas no solos predominantes na área dos Planaltos
Ceará. Os dados referentes à altimetria Residuais são os Argissolos Vermelho-
podem ser vislumbrados na Figura 2. Amarelos, os Neossolos Litólicos
Eutróficos e os Luvissolos.
Com relação às formas erosivas do relevo,
temos conforme citado as unidades dos Encontramos em Embrapa (2013), que os
Planaltos Residuais. Nesta perspectiva, Argissolos são definidos como sendo
aparecem superfícies de aplainamentos, constituídos por material mineral com
elaborada por processos de pediplanação, argila de atividade baixa ou alta conjugada
situadas sob litologias distintas, com saturação por bases baixa ou caráter
denominadas superfícies pediplanadas. alítico e horizonte B textural imediatamente
Sobre essas unidades de relevo atuam abaixo de horizonte A ou E. Apresenta
diversas formas de dissecação, as quais profundidade variável, desde forte a
serão descritas com base em Prates et al. imperfeitamente drenados, de cores
(1981). Tais elementos podem ser avermelhadas ou amareladas, e mais
visualizados na Figura 3. raramente, brunadas ou acinzentadas.

1 – Formas Aguçadas – Características de Para Embrapa (2013), os Neossolos são


relevo do tipo contínuo e aguçado com constituídos por material mineral ou por
diferentes ordens de grandeza e de material orgânico pouco espesso, com
aprofundamento de drenagem, separados insuficiência de manifestação dos atributos
geralmente por vales em “V”. diagnósticos que caracterizam os diversos
processos de formação dos solos, seja em
2 – Formas Convexas - Relevo de topo razão de maior resistência do material de
convexo com diferentes ordens de grandeza origem ou dos demais fatores de formação
e de aprofundamento de drenagem, (clima, relevo ou tempo) que podem
impedir ou limitar a evolução dos solos
64

Figura 3: Unidades Geomorfológicas dos Planaltos Residuais do Estado do Rio Grande do Norte.

Apresentam predomínio de características espessura, além de altos teores de silte. São


herdadas do material originário, sendo altamente susceptíveis aos processos
definido pelo SiBCS (Sistema Brasileiro de erosivos, em virtude da grande diferença
Classificação dos Solos) (Embrapa, 2006) textural entre o horizonte A e o horizonte B.
como solos pouco evoluídos e sem a
presença de horizonte diagnóstico. Podem Para Cestaro et al. (2007), a vegetação
apresentar alta (eutróficos) ou baixa natural dominante é a Savana-Estépica
(distróficos) saturação por bases, acidez e Arborizada, com Savana-Estépica
altos teores de alumínio e de sódio. Variam Florestada e Floresta Estacional Decidual
de solos rasos até profundos e de baixa a alta nos pequenos vales e base das encostas mais
permeabilidade. protegidas.

Os Luvissolos conforme Embrapa (2013) A vegetação de Savana em sua primeira


são solos rasos a pouco profundos, com classificação é conceituada como uma
horizonte B textural de cores vivas e argila vegetação xeromorfa, preferencialmente de
de atividade alta, apresentando horizonte A clima estacional (mais ou menos 8 meses
fraco, de cor clara, pouco espesso, maciço secos). Segundo o IBGE (2012), este
ou com estrutura fracamente desenvolvida. subgrupo de formação é estruturado em dois
São moderadamente ácidos a neutros, com nítidos estratos: um arbustivo-arbóreo
elevada saturação por bases. Apresentam superior, esparso, e outro, inferior
frequentemente revestimento pedregoso na gramíneo-lenhoso, também de relevante
superfície (pavimento desértico) ou na importância fitofisionômica.
massa do solo e normalmente possuem uma
crosta superficial de 5 a 10 mm de
65

Podemos entender o termo “Uso e Serra de João do Vale e Planalto Residual


Ocupação do Solo” como algo que é da Serra da Formiga.
definido em função das normas relativas à
quantidade de pessoas que habitam Quanto às características fisiográficas,
determinado espaço, as atividades encontram-se sobre terrenos constituídos
desenvolvidas, os dispositivos de controle em sua maioria por granitos, gnaisses e
das edificações e parcelamento do solo, micaxistos, o que lhes confere todo um
dentre outras. dinamismo às formas de relevo,
caracterizado como bastante movimentado.
Nesse sentido para a área que engloba os Essas áreas elevadas favorecem a formação
Planaltos Residuais 1 e 2, Queiroz (2014), de um mesoclima de altitude, caracterizado
identifica diversos usos, com destaque para em sua maioria por um clima sub-úmido, o
as atividades agrícolas tradicionais com que confere a essas áreas um caráter de
corte e queima da vegetação existente para áreas de exceção. Os solos em sua maioria
o cultivo de lavouras temporárias como o são jovens como os Neossolos, mas também
milho, feijão e mandioca. Destaca também se dá a ocorrência de solos medianamente
a presença de pastagens naturais e pastagens desenvolvidos pedogeneticamente, como os
plantadas para a alimentação animal, bem Luvissolos. Como resultado dessa
como de matas destinadas à preservação combinação, se manifesta a formação
permanente ou reserva legal. E quanto à vegetal Savana Estépica Arborizada.
atividade pecuária destaca a criação de
bovinos, ovinos e caprinos. Percebemos diversas interações entre os
elementos fisiográficos e sociais, os quais
Em estudo realizado no Planalto Residual 3, influenciam nas fragilidades dessas
Lucena (2013) identifica usos semelhantes, unidades, sendo a maioria delas,
onde destaca a exploração da vegetação influenciada pelas encostas.
(retirada de lenha para subsistência);
prática da caça pelos moradores da REFERÊNCIAS
comunidade; Solos utilizados para
agropecuária; Pastagem e pecuária Ab’Saber, A.N. (1995) No Domínio das Caatingas.
extensiva. In: Caatingas, Sertão e Sertanejos. Rio de
Janeiro, Livroarte Ed. Alumbramento. 37-46.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ab’Saber, A.N. (2000) Summit surfaces in Brazil.


Revista Brasileira de Geociências, 30, 3, 515-
Ao término dessa pesquisa sobre os 516.
Planaltos Residuais, chegamos às seguintes
Barbosa Á.L.M. (1966) Síntese da evolução
considerações finais: geotectônica da América do Sul. Ouro Preto,
Boletim do Instituto de Geologia/Escola de
Os Planaltos Residuais constituem um Minas, 1, 2,91-111.
Sistema Geoambiental de intenso
dinamismo no estado do Rio Grande, Bornhardt, W. (1900) Zur geologie und
dividido entre Inselbergs e Maciços, tendo oberflachengestaltung Deustsch-Ostafrikas.
Berlin.
o seu processo de formação explicado por
teorias Geomorfológicas, como a Teoria de Büdel, J. (1982) Climatic Geomorphology.
Pediplanação e a Teoria da Etchplanação. Princeton, Princeton University Press.

Os Planaltos Residuais no estado do Rio Casseti, V. (2005) Geomorfologia. Disponível em:


Grande do Norte encontram-se distribuídos <http://www.funape.org.br/geomorfologia/>.
em quatro áreas: Planalto Residual Extremo
Cestaro, L.A.; Araújo, P.C.; Medeiros, C.M.;
Oeste Potiguar; Planalto Residual Serras de Cisneiros, R. (2007) Proposta de um sistema de
Martins e Portalegre; Planalto Residual da
66

unidades geoambientais para o Rio Grande do Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Norte. Anais do XII Simpósio Brasileiro de Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes.
Geografia Física Aplicada – Natureza, Graduação em Geografia.
Geotecnologia, Ética e Gestão do Território.
Natal. Mendonça, F.; Danni-Oliveira, I.M. (2007)
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Informação. Expedition des Deutschen-Kamerun Komitees in
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Janeiro, Bertrand Brasil, 8ed. Geomorfologia. In: Projeto Radambrasil, 23,
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Maciço Estrutural do Pereiro/Província Queiroz, W. (2014) Análise geoambiental da bacia
Borborema. Tese de Doutorado. Universidade contribuinte ao Reservatório Guarapiranga (SP)
Federal do Rio Grande do Norte. para a avaliação da produção de sedimentos.
Dissertação de Mestrado. Universidade
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Ross, J.L.S. (2008) Geografia do Brasil. São Paulo,
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Jacomine, P.K.T.; Rodrigues e Silva, F.B.; Formiga, Compartimentação topográfica do estado do
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Grande do Norte. Monografia (graduação) – Protectorate of Uganda Geol Surv., 1, 77-79.
PATRIMÔNIO GEOMORFOLÓGICO DA ÁREA DO PROJETO
GEOPARQUE CARIRI PARAIBANO

Leonardo Figueiredo de Meneses e Bartolomeu Israel de Sousa

processos morfogenéticos passados e atuais


INTRODUÇÃO às quais foi conferido valor científico,
cultural, estético e/ou econômico (Reynard,
Patrimônio são todos os bens que, pela 2005). Faz parte de um conjunto maior,
percepção humana adquiriram um valor denominado de geopatrimônio, que agrupa
especial (não simplesmente econômico), e os aspectos geológicos (minerais, rochas e
que, por tal valor, se distingue dos restantes fósseis), geomorfológicos (formas de
bens (Pereira, 2006), devendo ser relevo, processos) e do solo que apresentem
considerados de interesse relevante para a valores excepcionais e que, portanto,
manutenção da identidade cultural ou mereçam ser enquadrados como um
equilíbrio ambiental e, portanto, patrimônio (algo que possui valor) por parte
conservados para serem transmitidos como daquelas comunidades que nutram algum
uma herança às futuras gerações. tipo de relação com os mesmos (Lopes e
Costumeiramente divide-se esta categoria Meneses, 2015). A Figura 1 ilustra a relação
em: patrimônio cultural, aquele que é fruto entre os conceitos de ambiente, conjuntos
da ação humana e que apresenta relevante ambientais e patrimônio natural abiótico
interesse para a permanência e identidade (geopatrimônio).
de uma dada cultura (Pereira, 2006); e
patrimônio natural, constituído pelo Conhecer e valorizar esse patrimônio são
conjunto de formações físicas e biológicas caminhos para sua conservação e uso
que apresentam valor universal excepcional compatível com a capacidade de carga dos
do ponto de vista científico, estético e que ambientes onde se inserem, evitando ou
por isso mereçam ser conservados (Unesco, atenuando as possibilidades de degradação
1972). natural ou antrópica. A conservação deve
ter como base a manutenção dos valores:
A partir dessas premissas, entende-se funcional, cultural, econômico e/ou
patrimônio geomorfológico como o científico-pedagógico do patrimônio
conjunto de formações e os respectivos geomorfológico (Figueiró et al., 2013).
68

Figura 1: Relação entre os conceitos de ambiente, conjuntos ambientais e patrimônio natural abiótico
(geopatrimônio).

Uma das formas de alcançar esses objetivos patrimônio geomorfológico presente na


é a partir da criação de geoparques que, por área do que tem sido denominado de Projeto
serem regidos pelos princípios da proteção Geoparque Cariri Paraibano – PGCP,
ao geopatrimônio, educação ambiental e conforme proposto por Nascimento et al.
desenvolvimento sustentável, configuram- (2016).
se como territórios ideais para que o
patrimônio abiótico seja valorizado por suas Buscou-se, ainda, classificar os locais de
características intrínsecas e demais valores interesse geomorfológico identificados na
associados.Na concepção da Unesco área do PGCP com base em suas
(2016), um geoparque corresponde à uma características de conteúdo e tamanho
área onde o geopatrimônio é expressivo e na (área), qualificando-os como ponto
qual, a partir de uma abordagem bottom-up (afloramentos pontuais), seções, áreas,
(da base para o topo) é adotada para paisagens/mirantes e grandes áreas
promover a conservação desse patrimônio e complexas, conforme proposto por Fuertes-
o desenvolvimento econômico baseado no Gutiérrez e Fernandéz-Martinéz (2010),
envolvimento das comunidades locais. além de abordar características geológicas e
geomorfológicas que individualizam tais
Nesse sentido, verifica-se que a região do locais.
Cariri paraibano apresenta uma
geodiversidade bastante expressiva, ÁREA DE ESTUDO
apresentando uma paisagem de excepcional
beleza e que já se consolidou como atrativo O Cariri paraibano localiza-se no Planalto
turístico de expressividade nacional e até da Borborema, ocupando uma área de
internacional. aproximadamente 11.225 km², distribuídos
entre 29 municípios. Já é reconhecido
Assim, visando estimular o regionalmente por suas peculiaridades
desenvolvimento sustentável suportado geológicas, apresentando alguns dos
pela geodiversidade da região, tem-se principais geossítios do Estado da Paraíba,
buscado realizar pesquisas voltadas à a exemplo do Lajedo do Pai Mateus, no
caracterização do geopatrimônio do futuro município de Cabaceiras, com seus
geoparque, como é o caso deste trabalho, matacões em formatos arredondados; a
que tem como objetivo identificar os Serra do Jatobá, em Serra Branca; e o Pico
principais monumentos que compõem o
69

do Jabre, no município de Maturéia, ponto destaque do patrimônio geológico-


mais elevado do Estado (Meneses e geomorfológico, além da beleza natural e
Nascimento, 2014a). Do ponto de vista importância cultural.
geológico, o Planalto da Borborema
encontra-se no Domínio da Zona A área onde se pretende instalar o Projeto
Transversal, que, de acordo com CPRM Geoparque Cariri Paraibano – PGCP,
(2002), se subdivide na Faixa Piancó-Alto- corresponde ao somatório dos territórios
Brígida e nos Terrenos Alto Pajeú, Alto dos municípios de Boa Vista, Boqueirão,
Moxotó e Rio Capibaribe. Salienta-se, no Cabaceiras e São João do Cariri (Figura 2),
entanto, que apenas os três últimos Terrenos o que totaliza cerca de 1.980 km2, salienta-
é que efetivamente podem ser observados se que essa delimitação proposta visa
no território do Cariri paraibano alinhar o futuro geoparque às discussões
internacionais nas quais costuma-se indicar
No final do ano de 2014, o Serviço que se faça coincidir o limite dos
Geológico do Brasil (CPRM), no sentido de geoparques com os limites administrativos
estimular o desenvolvimento sustentável dos municípios nos quais os geossítios estão
suportado pela geodiversidade da região, inseridos.
em particular de caráter turístico, incluiu
parte do Cariri Paraibano na lista de A litologia básica da área é composta por
territórios com patrimônio geológico de rochas magmáticas (granitos e ocorrências
destaque e apto a integrar o “Projeto localizadas de basaltos) e metamórficas
Geoparques do Brasil”. Com isso foram (gnaisses, filitos, xistos e migmatitos). A
iniciados trabalhos de campo com a região é possuidora de notável beleza cênica
finalidade de promover o inventário dos derivada da presença de batólitos,
locais de interesse geológico. Para a inselbergs e diques associados ao
elaboração do inventário foi considerado o magmatismo ocorrido no Neoproterozóico.

. Figura 2: Localização da área de estudo


70

Destaca-se ainda a Bacia Sedimentar de sequer os 200 mm. A vegetação é de


Boa Vista – BBV, onde ocorrem pillow caatinga hiperxerófila com limitações
lavas, depósitos sedimentares bentoníticos. edáficas devido aos solos rasos e, em muitos
casos, com altos teores de salinidade (Souza
Interessante também é destacar o grande e Souza, 2016).
potencial paleontológico e arqueológico
existente na região. Em quase todos os A atuação dos agentes intempéricos
municípios da região pode-se identificar (químicos, físicos e biológicos) sobre as
sítios arqueológicos constituídos rochas da região, ao longo do tempo
principalmente de artes rupestres na forma geológico, produziram feições que se
de gravuras (itacoatiaras) e de pinturas em destacam na paisagem, tais como diques em
rochas e, em pelo menos 06 municípios já forma de muralhas (como a Muralha do
foram relatadas descobertas de registros Meio do Mundo no município de São João
fósseis de animais da megafauna (Lima e do Cariri) e os boulders ou mares de bolas
Meneses, 2012), além de depósitos (Lajedo do Pai Mateus em Cabaceiras, por
fossilíferos de restos vegetais na BBV, onde exemplo), pela denudação ou pelo
predominam espécies das famílias esculpimento das rochas, respectivamente
Fabaceae, Lauraceae, Annonaceae, (Meneses e Nascimento, 2014b).
Burseraceae, Anacardiaceae, Myrtaceae e
Malvaceae (Paniz, 2015). A região onde se insere o PGCP apresenta,
portanto, uma paisagem de excepcional
Com base na classificação geomorfológica beleza, em grande parte relacionada ao seu
proposta por Carvalho (1982), a área do patrimônio geomorfológico, que já se
PGCP insere-se na Superfície dos Cariris, consolidou como atrativo turístico de
que faz parte da Superfície Elevada expressividade nacional e até
Aplainada do Maciço da Borborema. O internacional.O local possui atrações de
relevo regional é predominantemente plano importância para a prática do (geo)turismo,
e a média das altitudes é de 500 m. De modo representando exemplo de sucesso em
generalista, pode-se dividir a área em duas projetos de conservação ambiental e
grandes unidades: interiorização turística.

• Superfície Aplainada dos Cariris, que METODOLOGIA


apresenta altitudes variando entre os 400 e
500 m (op cit.), e relevo A realização deste trabalho se baseou em
predominantemente plano, fruto dos revisões bibliográficas sobre o tema do
processos denudacionais que atuam sobre a geopatrimônio e, em particular do
área ao longo do tempo geológico. patrimônio geomorfológico, além da coleta
• Maciços Residuais, compostos por serras e de dados documentais sobre a área de
inselbergs, constituídos em sua grande estudo.
maioria por granitoides e dioritos op cit.).
Em complemento à fase de escritório, vêm
A região caracteriza-se, ainda, por ser a sendo realizados trabalhos de campo desde
mais seca do Estado, com chuvas anuais o ano de 2011 na região do Cariri paraibano
bastante irregulares e médias e, em particular desde o fim do ano de 2014
pluviométricas não ultrapassando, de modo na área específica onde se pretende
geral, os 500 mm/ano e temperaturas implementar o PGCP, conforme indicado
médias elevadas (cerca de 27°C). No ano de em Nascimento et al. (2016). Estas
2015, por exemplo, as chuvas acumuladas atividades de campo têm como objetivo
no ano no município de São João do Cariri aumentar o conhecimento
alcançaram apenas 233 mm, enquanto que geológico/geomorfológico sobre a área de
nos outros três municípios não alcançou
71

estudo visando inventariar os locais de geoparque, 07 classificam-se como “áreas


interesse geomorfológico – LIG, para que simples”, ou seja, compõem-se de mais de
em momentos futuros possam ser um elemento expressivo da geodiversidade
submetidos a processos de avaliação em um raio de poucas dezenas de metros;
qualitativos e/ou quantitativos. No campo 04 enquadram-se na categoria de
também foram realizados registros “afloramentos pontuais” e 02 configuram-
fotográficos que possibilitassem ilustrar as se como sendo da categoria “seção”
particularidades de cada local visitado. (Quadro 1).
Estas etapas metodológicas são compatíveis
com aquelas propostas por Brilha (2005), Os geossítios Pai Mateus (Figura 3a), Bravo
Nascimento et al. (2008) e Brilha (2015). (Figura 3b) e Salambaia estão cadastrados e
descritos na base de dados SIGEP – Sítios
Conforme citado nos objetivos, os LIG Geológicos e Paleontológicos do Brasil, sob
foram classificados de acordo com a o número 068 e com a denominação de
proposta de Fuertes-Gutiérrez e Fernandéz- “Mar de Bolas do Lajedo do Pai Mateus”
Martinéz (2010) em: (Lages et al., 2013) e correspondem à partes
de um stock ígneo, denominado de Plutão
• Ponto (afloramento pontual): Bravo, composto basicamente por
feições isoladas de pequenas sienogranitos porfiríticos. Nesse complexo
dimensões; incluem-se ainda os geossítios Lagoa da
• Seções: sequências Cunhã (Figura 3c), Lajedo Manoel de Sousa
cronoestratigráficas e/ou feições (Figura 3d) e as geoformas Sacas de Lã
com desenvolvimento espacial (Figura 3e), Muralha do Caririe Pedra do
linear, algumas vezes constituído de Pênis. Nesse complexo já se desenvolvem,
pequenos afloramentos; há algumas décadas, atividades turísticas
• Áreas: sítios de maiores dimensões que tem como base o ambiente dos lajedos,
que apresentem um único tema de sendo o Lajedo do Pai Mateus o precursor
interesse; dessa modalidade de turismo na região. O
• Paisagens/Mirantes: uma grande Lajedo do Bravo apresenta um expressivo
área de interesse geológico ou um conteúdo cultural (em forma de arte
observatório de onde esta área pode rupestre, lendas e folclore) além de
ser vista; ocorrerem diversas geoformas em seu
• Áreas complexas: grandes território, enquanto que os elementos mais
geossítios que apresentem marcantes do Lajedo Salambaia são as
homogeneidade fisiográficas, sendo gnamas, geradas pela dissolução parcial das
compostos de diversos outros LIG rochas, formandos pequenos tanques, e
enquadrados nas classificações caneluras com várias dezenas de metros de
anteriores. extensão e, em alguns casos, podendo
alcançar de dois a três metros de
RESULTADOS profundidade.
Verificou-se, como resultado, que dos 20 As Sacas de Lã correspondem à uma
geossítios atualmente mapeados na área da estrutura morfológica denominada de
proposta do PGCP, 13 têm como tema castlekoppie, que são feições de blocos
predominante a geomorfologia, o que poliédricos empilhados de modo acastelado
ressalta a expressividade e o valor cênico e cujos vértices e arestas são bem marcados
das paisagens da região. Dos geossítios que (Lima et al., 2009), fruto do conjunção entre
compõem, portanto, o patrimônio o diaclasamento de fraturas ortogonais e da
geomorfológico da área do futuro fraturas de alivio de pressão horizontais.
72

Quadro 1: Geossítios do PGCP cujo tema principal é a geomorfologia

Município Geossítio Tipo Tema secundário Atrativos


Pedra da Coxinha
Geoformas Pedra do Jacaré
Boqueirão

Lajedo do Marinho AS Peixe na Pedra


Pinturas rupestres
Arqueológico
Cemitério indígena

Cultural Furna dos Tapuias


Pedra do Caju
Pedra da Vagina
Geoformas
Pedra do Urso
Boa Vista

Lajedo do Bravo AS
Pedra da Formiga
Paleontologia/
Fósseis da Lagoa do Planetário
megafauna
Arqueológico Pinturas e gravuras rupestres

Pedra do Pênis AP Geoforma -


Pedra da Pata AP Geoforma -
Geoforma Pedra da Orelha
Geoforma Pedra da Baleia
Geoforma Pedra do Capacete
Lajedo de Pai Mateus AS Geoforma Pedra do Sapo
Cabaceiras

Fonólito Pedra do Sino


Arqueológico Pinturas rupestres
Lagoa da Cunhã AS Arqueológico Pinturas e gravuras rupestres
Lajedo Manoel de Sousa AS Arqueológico -
Lajedo Salambaia AS Gnamas/ caneluras -
Sacas de Lã AP Geoforma -
Muralha do Cariri Seção Geoforma -

Geoforma Pedra da Tartaruga de Pente


São João do Cariri

Sítio Picoito AS Geoforma Pedra do Lagarto


Geoforma Pedra do Leão
Geoforma Muralha do Meio do Mundo
Pedra da Arara AP Geoforma -
Marmitas/
Cânion do Rio da Serra Seção -
tanques
73

A Muralha do Cariri e a Muralha do Meio O geossítio Lagoa da Cunhã é um lajedo


do Mundo (Figura 3f) são feições que que apresenta uma depressão em sua porção
correspondem a diques de sienito, sendo central, responsável pelo acúmulo de água
que a primeira está associada aos estágios que forma uma lagoa de onde deriva parte
de ativação das zonas de cisalhamento que do nome do local. A outra parte do
delimitam o stock, enquanto que a segunda topônimo (cunhã) significa, na linguagem
corresponde nitidamente ao produto de indígena, mulher jovem, estando, portanto,
intrusões magmáticas que preencheram o nome do local ligado a lendas sobre as
fraturas nas rochas do embasamento, e que populações que habitaram a região do
se sobressaem no relevo devido à maior Cariri. A presença de arte rupestre (pinturas
resistência à erosão em relação às rochas e gravuras) no local reforça essa hipótese.
encaixantes. No que se refere à geologia, o local
apresenta bons exemplos de diques máficos,
O geossítio Cânion Rio da Serra (Figura 4a) enclaves de tamanho decimétrico e
corresponde à uma incisão causada pelo Rio estruturas de deformação rúptil.
Soledade, afluente do Rio Taperoá, em uma
intrusão ígnea que constitui a “serra” que dá Os geossítios Pedra da Pata (Figura 4c),
nome ao geossítio. Apresenta Pedra do Pênis e Pedra da Arara (Figura 4d)
aproximadamente 1,5 km de extensão e, em constituem-se em monólitos, classificados
alguns pontos alcança alturas superiores a como geoformas e que, por suas formas
20 m nas suas encostas e uma largura média curiosas, podem ser utilizadas como
de 25 a 30 m. As estruturas mais marcantes atrativos turísticos para as localidades onde
nesse geossítio são as marmitas gigantes, se inserem e, a partir desse fluxo de pessoas,
formadas pela abertura e desgaste servirem para a transmissão de informações
diferencial de fraturas, pela remoção de básicas sobre a geodiversidade da região,
enclaves que são bastante comuns em tais como, tipos predominantes de rochas,
associação à massa granítica ou, ainda, pelo processos morfogenéticos e demais
atrito de fragmentos de rocha gerado pelo características ecológicas locais.
turbilhonamento das águas de escoamento
superficial quando das épocas de chuvas na Foi possível verificar ainda que em 08 deles
região. (conforme indicado no Quadro 1)
encontram-se registros rupestres na forma
O Lajedo do Marinho é outro exemplo de de pinturas, sendo que em dois desses
destino turístico associado à geodiversidade associam-se ainda gravuras do tipo
que vem ganhando destaque na região nos Itacoatiaras. Em um dos geossítios
últimos dois anos, principalmente a partir verificou-se ainda a presença de vestígios
da criação de uma associação que reúne os que indicam a presença de um cemitério
condutores de turismo e as crocheteiras indígena, mas que necessita de estudos
residentes no distrito do Marinho e que já pormenorizados para atestar sua
produziam esse tipo de artesanato no local. veracidade.
Constituído por monzogranitos a
sienogranitos, de idade estimada em 550 Dentre estes geossítios, o que apresenta o
Ma (Brasilino et al, 2012), o lajedo maior conjunto de pinturas e em melhor
apresenta diversos atrativos tais como estado de conservação é o Lajedo Manoel
geoformas (Figura 04b), sítios de Sousa, onde as pinturas podem ser
arqueológicos e resquícios bem preservados encontradas tanto na face externa dos
da Caatinga que podem ser visitados por matacões quanto no interior dos abrigos
meio de trilhas guiadas com diferentes (localmente denominados de furnas) por
graus de dificuldade. eles formados e que, segundo Cabral
(1997), possivelmente tenham sido locais
de cerimônias rituais para os povos antigos,
74

dadas as condições ambientais ali geomorfologia, reitera que este é o maior


observadas. Estes elementos, apesar de não potencial da região. Considerando que a
ser parte integrante do conceito de geomorfologia é um dos principais
geodiversidade, agregam valor aos elementos constituintes das paisagens e que
geossítios conferindo-lhes ainda mais o relevo é um dos principais atrativos para
expressividade seja para uso científico, seja as pessoas que buscam atividades ao ar livre
para outros usos como o didático e/ou (lazer, esportes, turismo), este elemento
turístico. deve ser visto como um aliado na busca por
alternativas de desenvolvimento regional
CONSIDERAÇÕES FINAIS que tenham como premissa a manutenção
O percentual de geossítios mapeados na da qualidade ambiental associada à novas
área do Projeto Geoparque Cariri oportunidades de negócios, gerando
Paraibano, que têm como tema principal a emprego e renda para a população local.

Figura 3: (a)Boulders no Lajedo de Pai Mateus; (b)Furna do Tapuia/Pedra da Formiga no Lajedo do Bravo;
(c)Lagoa da Cunhã; (d)boulder com pinturas rupestres no Lajedo Manoel de Sousa; (e)Sacas de Lã; (f)pinturas
rupestres na Muralha do Meio do Mundo.
75

Figura 4: (a)Marmitas gigantes no Cânion Rio da Serra; (b)Pedra da Coxinha no Lajedo do Marinho; (c)Pedra da
Pata;(d)Pedra da Arara.

No tocante à vulnerabilidade e à minimiza a possibilidade de perda do


degradação, os geossítios classificados patrimônio em seu conjunto. Tais
como afloramentos pontuais são os que se observações, no entanto, não devem ser
apresentam mais vulneráveis uma vez que, consideradas como regras, havendo a
por suas dimensões, podem ser mais necessidade de realização de estudos de
facilmente alvo de algum tipo de destruição, capacidade de carga e de
perdendo suas qualidades enquanto risco/vulnerabilidade para que efetivamente
patrimônio. Na sequência, destacam-se os sejam verificadas as efetivas ou potenciais
geossítios do tipo seção que são menos ameaças às quais esses ambientes
vulneráveis que os afloramentos por estejam/possam estar à mercê, sendo esta
apresentarem maiores dimensões, mas que informação imprescindível para o
necessitam serem conservados em seu estabelecimento das estratégias de
conjunto para que haja o melhor geoconservação.
entendimento dos processos que deram
origem ao geossítio. Por último, os Todos os geossítios da área de proposta do
geossítios classificados como áreas simples geoparque encontram-se em ambiente rural,
são aqueles que se apresentam menos em propriedades particulares, o que
vulneráveis, particularmente por serem significa que há necessidade de
áreas relativamente grandes e apresentarem conscientização desses proprietários para
diversos atrativos em seu interior, o que que estabeleçam medidas de conservação e
76

critérios para a visitação desses locais como Fuértes-Gutiérrez I. e Fernandez-Martinez E. (2010)


forma de conciliar o desenvolvimento Geosites inventory in the Leon Province
(Northwestern Spain): a tool to introduce
econômico e a manutenção da qualidade geoheritage into regional environmental
ambiental. management. Geoheritage, 2:57-75.

Almeja-se que os resultados da presente Lages, G.A.; Marinho, M.S.; Nascimento, M.A.L.;
pesquisa venham a contribuir na inserção do Medeiros, V.C.; Dantas, E.L.; Fialho, D. (2013)
patrimônio geomorfológico do PGCP em Mar de Bolas do Lajedo do Pai Mateus,
Cabaceiras, PB - Campo de matacões graníticos
ações de desenvolvimento científico e gigantes e registros rupestres de civilização pré-
didático relacionado ao entendimento da colombiana. In: Winge, M.; Schobbenhaus, C.;
evolução geomorfológica e divulgação das Souza, C.R.G.; Fernandes, A.C.S.; Berbert-Born,
geociências de modo geral, em especial M.; Sallun Filho, W.; Queiroz, E.T.; (Edit.) Sítios
para as comunidades inseridas na área do Geológicos e Paleontológicos do Brasil.
Disponível em
projeto e para os visitantes que por ali <http://sigep.cprm.gov.br/sitio068/sitio068.pdf>
transitem, bem como seja possível utilizá-lo
para o desenvolvimento socioeconômico da Lima, G.M.P.; Farias, F.F. de; Barbosa, J.S.F.;
região integrando-o a roteiros geoturísticos, Gomes, L.C.C. (2009) Inselberge: Ilhas
por exemplo. terrestres, EDUFBA.

Lima, L.R.; Meneses, L.F. (2012) Sítios


REFERÊNCIAS Paleontológicos na Paraíba: Esboço de um
Mapeamento. In: V Semana de Geografia da
Brasilino R.G.; Miranda A.W.A.; Marinho S.M. UEPB - Campus III. Guarabira.
(2012) Programa Geologia do Brasil. Carta
Geológica Escala 1:100.000: Folha SB.24-Z-D- Lopes, L.S.O.; Meneses, L.F. (2015)
VI, Santa Cruz do Capibaribe. CPRM Serviço Geopatrimônio: definição e valoração in: XVI
Geológico do Brasil. Disponível em: < Simpósio Brasileiro de Geografia Física
http://geobank.cprm.gov.br/pls/publico/geobank Aplicada, Teresina. UFPI/UESPI. 1. 3656 –
.documents.open_zipfile?id_sessao=201612241 3663.
70959&file=sccapibaribe.zip>.
Meneses, L.F.; Nascimento, M.A.L. (2014) Proposta
Brilha, J.B.R. (2005) Patrimônio geológico e de frameworks para inventariação de Geossítios
geoconservação: a conservação da natureza na do Cariri Paraibano. Caderno de Geografia
sua vertente geológica. Palimage Editora. (PUCMG. Impresso), 24, 105-123.

Brilha, J.B.R. (2015) Inventory and quantitative Meneses, L.F.; Nascimento, M.A.L. (2014) Sistemas
assessment of geosites and geodiversity sites: a de Informação Geográfica Aplicados à
review. Geoheritage. Elaboração de Frameworks de Geodiversidade.
Revista Estudos Geoambientais, 1, 53-64.
Cabral, E.M.C. (1997) O Potencial Arqueológico do
Cariri. p.29-38. In: Cabral, E.M. (org). Os Nascimento, M.A.L.; Meneses, L.F.; Ferreira, R.V.;
Cariris Velhos da Paraíba. João Pessoa. Editora Lages, G.A.; Fialho, D.A. (2016) Projeto
Universitária da UFPB/ A União. Geoparque Cariri Paraibano, Nordeste do Brasil
In: Congresso Brasileiro de Geologia, Porto
Carvalho, M.G.R.F. (1982) Estado da Paraíba: Alegre. 48° Congresso Brasileiro de Geologia -
classificação geomorfológica. Editora da UFPB. as geotecnologias e o século XXI.

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1:500.000 Geoconservação e Geoturismo: trinômio
importante para a proteção do patrimônio
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Patrimônio geomorfológico e paisagem como Geologia.
base para o geoturismo e o desenvolvimento
local sustentável. CLIMEP – Climatologia e Paniz, G.A. (2015) Flora fóssil dos níveis de
Estudos da Paisagem, Rio Claro, 8, 1, 49-81. bentonita da Formação Campos Novos
(Oligoceno Superior) Bacia de Boa Vista, PB,
77

Brasil. Dissertação (Mestrado). Programa de Souza, B.I.; Souza, R.S. (2016) Processo de
Pós-Graduação em Geologia, Universidade do ocupação dos Cariris Velhos – PB e efeitos na
Vale do Rio dos Sinos - Unisinos, São Leopoldo. cobertura vegetal: contribuição à Biogeografia
Cultural do semiárido. Caderno de Geografia,
Pereira, J.S. (2006) Património geomorfológico: 26, 2.
conceptualização, avaliação e divulgação.
Aplicação ao Parque Natural de Montesinho. Unesco, (1972) Convenção para a proteção do
Tese (Doutorado). Programa de Pós-Graduação patrimônio mundial, cultural e natural.
em Ciências. Área de conhecimento em Disponível em:
Geologia. Escola de Ciências, Universidade do http://whc.unesco.org/archive/convention-
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Reynard, E. (2005) Geomorphological sites, public Unesco, (2016) Unesco global geoparks: Celebrating
policies andpropertyrights. Conceptualization earth heritage, sustaining local communities.
and examples from Switzerland. Il Quaternario, Unesco, Paris.
Special Issue, Roma.
78
ANÁLISE DA VULNERABILIDADE A PROCESSOS EROSIVOS DA
BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO BEBERIBE

José Fabio Gomes da Silva e Manuella Vieira Barbosa Neto

espessos regolitos fornecedores do material


INTRODUÇÃO necessário para as primeiras etapas dos
processos erosivos. Assim sendo, a erosão
Eventos erosivos acometem toda a crosta atua como principal agente modelador do
terrestre e estão intimamente relacionados relevo terrestre, sendo constituída por
às características climáticas, vários agentes (transporte, ação mecânica e
fitogeográficas, pedológicas, geológica, química da água dentre outros) que de
geomorfológica, bem como, pela força forma combinada contribuem
abrasiva do ar, atuação das águas dos rios, decisivamente para alterar as formas do
atuação dos mares e oceanos e por fim, a mesmo.
ação antrópica que contribui decisivamente
para agravar um processo natural e que Apesar da erosão ser um problema que
altera o modelado do relevo terrestre. aflige todo globo, na conjuntura
socioespacial dos países subdesenvolvidos
Nesse sentido, o solo corresponde à camada e/ou em desenvolvimento, tal constatação é
superficial da crosta terrestre, sendo no mínimo preocupante, uma vez que
formado principalmente por aglomerados predominantemente a população de baixa
minerais e matéria orgânica resultante da renda é segregada no espaço urbano, tendo
decomposição de animais e plantas (IBGE, que ocupar os terrenos mais vulneráveis a
2007). Esse elemento natural passa por esses tipos de eventos, tendo em vista que
diversas transformações, que podem ser os locais menos suscetíveis a eventos
motivados pela ação das chuvas, dos ventos, erosivos são ocupados pela população com
dos rios, asfaltamento, construções de maiores privilégios socioeconômicos.
cidades, etc. Dessa forma, a erosão passa a
ser uma das modificações do solo mais Devido à relevância da temática em tela, tal
preocupantes. estudo está imbuído de uma grande
importância, na medida em que, eventos
Nas regiões de clima tropical, como é o caso morfogenéticos têm causado perdas
de grande parte do território brasileiro, os significativas e por vezes irreparáveis, tanto
altos índices pluviométricos corroboram do ponto de vista econômico quanto
para um profundo intemperismo químico humano. Assim, no contexto da bacia
das rochas, que resulta na formação de hidrográfica do rio Beberibe, tais eventos,
80

se configuram como catastróficos, na totalmente situada nos limites da Região


medida em que, as características físicas da Metropolitana do Recife. O rio Beberibe
região, como também, a situação surge da confluência dos rios Pacas e Araçá,
socioeconômica da população ali residente, percorrendo cerca de 23,7 km até desaguar
só têm a contribuir para que eventos na foz conjunta com o rio Capibaribe. De
morfogenéticos causem graves perdas acordo com a APAC (2014) tal bacia insere-
materiais e humanas, como vem sendo se no grupo denominado GL1 (Grupo de
registrados nas últimas décadas. Dessa Bacias de Pequenos Rios Litorâneos) o
forma, esse estudo versa sobre uma análise grupo de bacias GL1 possui uma área de
da vulnerabilidade natural a perda de solo 1.188,11 km² estando totalmente inserida
motivada por erosão na bacia do rio no Estado de Pernambuco. A GL1 limita-se
Beberibe-PE. ao norte com a bacia do rio Goiana, ao sul
com a bacia do rio Capibaribe, ao leste com
ÁREA DE ESTUDO o oceano Atlântico e, a oeste, com as bacias
dos rios Goiana e do rio Capibaribe.
A bacia hidrográfica do rio Beberibe possui
uma extensão de 79,0 km² (Figura 1) e está

Figura 1: Localização da bacia hidrográfica do rio Beberibe na Região Metropolitana do Recife-PE, Fonte: Os
autores (2015)

A bacia do rio Beberibe segundo a Campos (2003) no médio e baixo curso a


classificação de köppen possui clima do jusante da rodovia BR 101 a ocupação
tipo AS’, ou seja, quente e úmido, com antrópica alterou fortemente a vegetação
predominância de chuvas de nativa, sendo sua existência bastante
outono/inverno (Ayoade, 2011). Segundo rarefeita. Hoje, as principais formações que
81

margeiam a bacia hidrográfica do Beberibe do diagnóstico das declividades da área de


são as matas densas, no alto curso, estudo, foi utilizado os dados Topodata . No
capoeiras, vegetação hidrófila, no médio processo de produção dos mapas da área de
curso e manguezais, no baixo curso. estudo, foi utilizado o software Arcgis 9.3,
Vasconcelos e Bezerra (2000) destacam gentilmente disponibilizado pelo
ainda que a partir da BR 101 ocorre um Laboratório de Sensoriamento Remoto e
estrangulamento ao longo da calha do rio. Geoprocessamento - SERGEO do
Justamente por conta da ocupação irregular, Departamento de Ciências Geográficas -
como também por obras de passagem DCG - UFPE.
(pontes, pontilhões, bueiros), realizados
inadequadamente. Na análise da distribuição da precipitação
utilizaram-se as médias de precipitação
Ainda segundo Campos (2003) o médio e disponibilizada pelo Departamento de
baixo curso encontra-se profundamente ciências atmosféricas da Universidade
ocupado, tal ocupação se acelerou desde Federal de Campina Grande – (DCA –
1930 até os dias atuais com aterros UFCG), sendo esses dados trabalhados
particulares e oficiais dos manguezais do através do programa “BHnorm” organizado
Beberibe, atrelado a uma atividade em planilha Excel por Rolim et al. (1998)
industrial e a desordenada ocupação dos onde, através da razão entre a precipitação
morros e das áreas ribeirinhas. média anual (PMA) e duração do período
chuvoso (DPC), se obteve os valores de
MATERIAL E MÉTODOS intensidade pluviométrica (IP) e foi
calculado o valor de
Para esse estudo, foi utilizado método de estabilidade/vulnerabilidade à erosão
mapeamento da vulnerabilidade natural à (Crepani et al., 2001).
perda de solo proposta por Crepani et. al,
(2001), ao qual se baseia no conceito da Nesse estudo foi aplicado o Índice de
Ecodinâmica postulada por Tricart (1977), Vegetação da Diferença Normalizada –
com isso buscou-se verificar a IVND ou NDVI (Normalized Difference
vulnerabilidade erosiva da área em estudo, Vegetation Index), e para isso foi utilizada
identificando os níveis de perigo relativos à uma imagem do satélite Landsat 8 do dia 15
erosão pluvial. Tal conceito estabelece uma de maio de 2015, da órbita 214 e ponto 65,
intrínseca dinâmica dos ambientes com o disponibilizada gratuitamente pelo site:
balanço entre pedogênese e morfogênese. http://glovis.usgs.gov/. Sendo essa
devidamente processada no software
O trabalho de Crepani et al. (2001) ArcGis 9.3, onde foi calculado o NDVI.
apresenta diferentes critérios atributivos de Esse índice foi proposto por Rouse et al.
valores de vulnerabilidade para as unidades (1973). Segundo Menezes et al., (2007) tal
territoriais básicas dos temas índice se configura como um indicador da
Geomorfologia, Geologia, Pedologia, proporção e das condições da vegetação. Os
Vegetação e Clima. valores de NDVI podem variar de -1 a 1,
Sendo que, quanto mais próximo de 1, mais
Nessa análise foi empregada a base de densa é a vegetação; os valores abaixo de 0
dados dos solos do Zoneamento (zero) indicam superfície sem vegetação
Agroecológico de Pernambuco – ZAPE e/ou água ou nuvens (Rosendo, 2005). O
(Silva et al., 2001) a qual se encontra na mesmo é alcançado pela razão entre a
escala de 1:100.000, bem como a base de diferença da reflectância do infravermelho
dados geológicos da CPRM – Serviço próximo (NIR) e a reflectância do vermelho
Geológico do Brasil (Gomes e Santos, (R), dividida, respectivamente, pela soma
2001), na escala 1:500.000. Na realização
82

das mesmas (Equação 1), destaca Allen et onde 1 corresponde a atributos


al., (2002): considerados estáveis, e dessa forma,
predominando a pedogênese, 2 para os
𝑁𝐼𝑅−𝑅
NDVI = 𝑁𝐼𝑅+𝑅 (1) intermediários e 3 para os instáveis, onde
predomina a morfogênese. Após a
Com a confecção dos mapeamentos, foi atribuição dos pesos foi realizada uma
possível realizar o processamento destes no progressão aritmética simples através na
software ArcGis 9.3, sendo os dados em ferramenta Math. E deste modo, foi
formato Shapefile transformados para o elaborado um mapa de vulnerabilidade à
formato Raster (Solos, Geologia e erosão da bacia estudada, com o
distribuição e intensidade das chuvas). A cruzamento de dados geológicos,
partir dessa conversão pode-se atribuir geomorfológicos, pedológicos,
pesos de vulnerabilidade à erosão baseado climatológicos e fitogeográficos, no sentido
nas tabelas propostas por Crepani et al. de mapear as áreas mais vulneráveis à perda
(2001) com pesos variando de 1,0 a 3,0, de solo (Figura 2).

Figura 2: Modelo representativo do cruzamento das informações ambientais da bacia hidrográfica do rio
Beberibe – Recife-PE, para a produção do mapa de vulnerabilidade a processos erosivos.1. Mapeamento da
Geologia, 2. Mapeamento da declividade, 3. Mapeamento da Pedologia, 4. Índice de Vegetação e 5. Distribuição
da precipitação para verificação de sua intensidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO concernentes ao grau de vulnerabilidade à


erosão, e pode-se realizar uma avaliação da
De acordo com o mapeamento dos
contribuição a processos erosivos de cada
atributos: Geologia, Declividade,
atributo ambiental estudado.
Pedologia, Índice de vegetação e
intensidade da precipitação na bacia Com a avaliação do atributo Geologia,
hidrográfica do rio Beberibe – Recife-PE, pode-se observar as seguintes classes: Kb –
foram atribuídos valores indicativos
83

Formação Beberibe (Mesozóico – também a presença de duas classes de


Cretáceo): Arenitos friáveis médio a finos, sedimento do período Quaternário com área
cinzentos a cremes, mal selecionados, com de 8,48% e 26,54% e vulnerabilidade de
intercalações de camada síltico-argilosas (3,0) e (2,7) respectivamente. A grande
que ocupa uma área de 2,85% e possui um predominância geológica da área em tela é
índice de vulnerabilidade (2,4). Verificou- o Tb – Grupo Barreiras (Cenozóico-
se a presença da Kg – Formação Gramame terciário) arenitos pouco consolidados, às
(Mesozóico-Cretáceo): Calcarenitos, vezes conglomeráricos com níveis de
calcários arenosos e calcários dolomíticos, argilas variegadas, siltitoslateríticos, que
fossilífero com área de 0,39% e ocupa uma área de 61 a 69%, possuindo um
vulnerabilidade (2,9), bem como rochas do grau de vulnerabilidade (2,5). Dessa forma,
Pgm1 – Complexo Ginássico – constatou-se uma pequena área próxima a
Migmatíticos e indiscriminados estabilidade (1,0), sendo que, a grande
(Paleoproterozóico): Embasamento dom predominância das classes geológicas
terreno rio Capibaribe – Unidade mais existentes na área de estudo estão mais
homogênias. Ortognaisse granítico a próximas da instabilidade (3,0), e dessa
tonálitico, com monzonitos monzodioritos e forma, mais vulnerável a desenvolver
dioritos ocupando área de 0,05% e indicie processos erosivos (Tabela 1).
de vulnerabilidade (1,3). Observou-se

Tabela 1: Valores de vulnerabilidade a erosão da estrutura geológica na bacia hidrográfica do rio Beberibe –
Recife-PE. Fonte: Os autores (2015)

Vulnerabilidade do atributo Geologia


Classe Área (%) Valor de Vulnerabilidade
Kb – Formação Beberibe (Mesozóico – Cretáceo): Arenitos
friáveis médio a finos, cinzentos a cremes, mal selecionados, 2,85 2,4
com intercalações de camada síltico-argilosas
Kg – Formação Gramamae (Mesozóico-Cretáceo): 0,39 2,9
Calcarenitos, calcários arenosos e calcários dolomíticos,
fossilífero.
Pgm1 – Complexo Ginássico – Migmatíticos e
indiscriminados (Paleoproterozóico): Embasamento dom 0,05 1,3
terreno rio Capibaribe – Unidade mais homogênias.
Ortognaisse granítico a tonálitico, com
monzonitosmonzodioritos e dioritos.
Qhe – (Cenozóico – Quaternário): sedmentoseluvionarese 8,48 3,0
coluvionares, areno argilosos, arenosos e conglomerados.
Qi - (Cenozóico – Quaterrnário): Areias, siltes, argilas vasas
diatomáceas, sedimentos turfáceas de ambiente flúvio 26,54 2,7
lacustre, areias de cordões litorâneos subatuais, sedimentos
silteargilosos, de mangue e cobertura.
Tb – Grupo Barreiras (Cenozóico-terciário) arenitos pouco
consolidados, às vezes conglomeráricos com níveis de 61,69 2,5
argilas variegadas, siltitoslateríticos.
84

Quando analisado o atributo declividade Tabela 2: Valores de vulnerabilidade à erosão da


pode-se constatar a predominância das declividade da bacia hidrográfica do rio Beberibe –
classes: média (6 -20%) e muito baixa (< Recife-PE. Fonte: Os autores (2015).
2%) o que corresponde a uma parcela de
75,12% da área de estudo, com valores de Vulnerabilidade do atributo Declividade
vulnerabilidade respectivos de (2,0) e (1,0),
ocorrendo dessa forma, um equilíbrio entre Classe (%) Área (%)
Valor de
pedogênese e morfogênese. Já em 24,70% Vulnerabilidade
da área ocorrem às classes de declividade
baixa (2 – 6%) e vulnerabilidade (1,5) Muito baixa (<2) 9,62 1,0
predominando dessa forma a pedogênese.
Apenas 0,18% da área estudada inserem-se Baixa (2 – 6) 27,81 1,5
na categoria alta e muito alta com indicie de
vulnerabilidade de (2,5) e (3,0) Média (6 – 20) 42,59 2,0
respectivamente (Tabela 2), onde
predominam os fatores morfogenéticos. Alta (20 – 50) 19,97 2,5

Nesse estudo observou-se a predominância Muito Alta (>50) 0,005 3,0


dos solos do tipo Argissolo e Latossolo que
ocupam 98,81% da área, os mesmos
possuem uma vulnerabilidade entre
intermediária a estável, com valores de Tabela 3: Valores de vulnerabilidade à erosão dos
vulnerabilidade de (2,0) e (1,0) solos da bacia hidrográfica do rio Beberibe – Recife-
respectivamente. Os Argissolos são solos PE. Fonte: Os autores (2015).
bastantes intemperizados, assim como os
Latossolos, no entanto apresentam uma Vulnerabilidade do atributo Pedologia
profunda diferenciação textural entre os
horizontes A e B. De acordo com a Embrapa Classe Área Valor de
(2013), os Argissolos apresentam o (%) Vulnerabilidade
horizonte B textural (Bt) imediatamente
abaixo de qualquer tipo de horizonte Latossolo Amarelo 14,03 1,0
superficial, exceto o hístico. São formados
por material com argila de atividade baixa e Argissolo Amarelo 32,96 2,0
alta conjugada com saturação por bases
baixa ou caráter alítico (Lepsch, 2010). Por Neossolo
0,051 3,0
isso, Zaroni e Santos (2016) afirmam que os Quartzarênico
Argissolos tendem a ser mais suscetíveis
aos processos erosivos devido à relação Área Urbana
textural presente nestes solos, que implica (Contexto dos 51,82 1,0 – 2,0
em diferenças de infiltração dos horizontes Latossolo/Argissolo)
superficiais e subsuperficiais. Assim,
constata-se que os latossolos predominam Água 1,2 -
os processos pedogenéticos, enquanto que
nos argissolos predominam os processos Na análise do índice de vegetação,
morfogenéticos. Observa-se também a constatou-se a presença de uma vegetação
presença mínima de Neossolo mais densa e preservada na região do alto
Quartzarênico em apenas 0,051% da área Beberibe, como descrita por (Campos,
com um valor de vulnerabilidade (3,0) 2003) e em alguns pontos do médio curso
ocorrendo a predominância dos processos que se destacam, como por exemplo, a Mata
morfogenéticos (Tabela 3). de Dois Unidos e a Mata de Passarinho. A
85

esse respeito Oliveira et al., (2011), atributo clima, sendo verificada uma média
considera que o fato de haver uma cobertura da precipitação anual de 1651,3 mm,
vegetal, com alta biomassa, minimiza o estando o período mais chuvoso
contato direto das gotas de chuvas com o compreendido nos meses de: abril, maio,
solo, diminuindo dessa forma, o junho, julho e agosto. Sendo a intensidade
escoamento superficial. Portanto, o que se pluviométrica de 330,26 (mm/mês). O que
observa no contexto do alto Beberibe é que atribui à área estudada uma vulnerabilidade
a presença de uma vegetação mais densa de (2,2) sendo atributo considerado
(19,75%), em consonância com outras intermediário. A partir da aplicação de uma
variáveis ambientais, acaba por mitigar os média aritmética nos valores de
eventos morfogenéticos. vulnerabilidade dos mapeamentos citados
anteriormente se obteve o mapa da
Devido as suas características de vegetação, vulnerabilidade natural à erosão da bacia
essa área possui vulnerabilidade (1,0) o que hidrográfica do rio Beberibe – Recife-PE
se caracteriza por espaços estáveis. Nas (Figura 3).
regiões do médio e baixo Beberibe, onde a
mancha urbana e a presença de solo exposto A partir dos dados ora elencados, foi
(35,15%) se destacaram (Tabela 4), é possível aferir que cerca de 43,08% da área
necessário um estudo mais detalhado, pois, estudada, possui características da classe
essas áreas apresentam uma alta densidade medianamente vulnerável, já 26,05% da
populacional, baixo índice de vegetação e bacia está inserida na classificação de
declividade acentuada, sobretudo no médio moderadamente vulnerável e cerca de 5,4%
curso do Beberibe. Nessas áreas os valores encontra-se dentro da categoria
de vulnerabilidade oscilaram de 1,5 a 3,0. morfodinâmica vulnerável.
Tabela 4: Valores do índice de vegetação da bacia É possível verificar também, que cerca de
hidrográfica do rio Beberibe – Recife-PE 24,42% da bacia do rio Beberibe encontra-
se dentro da categoria moderadamente
Vulnerabilidade do atributo Cobertura
Vegetal
estável e apenas 1,05% apresentam feições
Classe (%) Área Valor de
estáveis. Dessa forma, é oportuno destacar
(%) Vulnerabilidade que tais características residem do fato
Água, nuvens 17 0 dessas áreas possuírem uma vegetação mais
e sombras densa, como também, a ocupação humana é
Área urbana e 37,15 3 bastante rarefeita (Tabela 5).
solo exposto
Vegetação 10,75 2,0 Assim, os processos pedogenéticos têm um
rala
Vegetação 15,35 1,5
maior predomínio no alto curso, que vai da
esparsa nascente até a BR 101 norte, na medida em
Vegetação 19,75 1 que, com uma cobertura vegetal mais densa,
densa a energia cinética da chuva diminui
consideravelmente, dificultando a
ocorrência de processos erosivos (Silva,
Destaca-se que as áreas que apresentam uma maior 2011; Guerra e Botelho, 2007; Vitte e
vulnerabilidade (3,0), pois apresentam, a conciliação
de uma vegetação menos densa, com áreas de
Mello, 2007). Já no que diz respeito ao
declividade mais íngreme e ocupada de maneira médio e baixo curso do rio Beberibe, ou
inapropriada pela população de baixa renda, torna seja, da BR 101 até sua foz, por
essa região propícia a eventos morfogenéticos com apresentarem predominantemente áreas
riscos eminentes aos habitantes dessa localidade. vulneráveis (5,4%) a medianamente
Finalmente, foi avaliada a intensidade vulnerável (43,8%), foi possível verificar
pluviométrica da bacia hidrográfica, no maior vulnerabilidade a processos
sentido de indicar vulnerabilidade do morfogenéticos.
86

Figura 3: Mapa do perigo a processos erosivos da Bacia hidrográfica do Beberibe

Tabela 5: Classes de vulnerabilidade a eventos


erosivos da bacia hidrográfica do rio Beberibe – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Recife-PE.
Constatou-se que a bacia hidrográfica do rio
Classes de Vulnerabilidade a eventos erosivos
Beberibe, possui uma maior tendência à
classe medianamente vulnerável em
Classe (%) Área (%) 43,08% da área que variam de 1,8 a 2,2,
sobretudo na região do médio e baixo curso,
Estável 1,05 onde nesse primeiro, verifica-se uma
declividade mais acentuada, bem como, a
Moderadamente estável 24,42 presença de solos com tendência
intermediária a processos erosivos, os
Medianamente Argissolos. Tais características conferem a
vulnerável 43,08 região, maiores chances de processos
morfogenéticos em detrimentos dos
Moderadamente processos pedogenéticos, sendo esse último
Vulnerável 26,05
observado na porção do alto curso do rio
Beberibe.
Vulnerável 5,4
Os resultados ora obtidos nessa análise,
revelam a importância de políticas públicas
que visem mitificar os riscos aos quais os
87

moradores da bacia do rio Beberibe estão Embrapa. (2013) Sistema brasileiro de classificação
submetidos. Uma vez que em suas de solos. 3. ed. – Brasília, Embrapa.
condições naturais a área da bacia do rio Gomes, H.A. e Santos, E.J. (org.). (2001) Geologia
Beberibe, sobretudo, o médio curso do rio, e Recursos Minerais do Estado de Pernambuco.
possui uma susceptibilidade natural a Recife: CPRM.
processos morfogenéticos.
Guerra, A.J.T. (2007) O início do processo erosivo.
Por fim, percebe-se que o estudo em tela, In: Guerra, A.J.T., Silva, A.S. e Botelho, R.G.M.
(orgs.). Erosão e Conservação dos Solos:
está imbuído de uma relevância ímpar para Conceitos, Temas e Aplicações. 3. Ed. Rio de
sociedade, uma vez que, eventos Janeiro, Bertrand Brasil.
morfogenéticos têm gerado perdas
significativas à comunidade mais carente, IBGE. (2007) Manual técnico de Pedologia. 2. ed.
moradora das áreas de morro da Região Rio de Janeiro, IBGE.
Metropolitana do Recife. Salientamos ainda
Lesch, I.F. (2010) Formação e conservação dos
que esse trabalho não pretende, encerrar a solos. 2. ed. São Paulo, Oficina de Textos.
discussão da temática, mas, pretende lançar
as bases para análises mais aprofundadas e Menezes, J.B. et al. (2007) Índice de vulnerabilidade
que visem garantir um maior conhecimento à erosão para uma bacia na mesorregião do São
acerca dessa questão, buscando evitar Francisco pernambucano, a partir das relações
entre morfogênese e pedogênese. Revista
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ANÁLISE DO SISTEMA FLUVIAL FRENTE AO USO E OCUPAÇÃO
DA TERRA NA BACIA DO RIO TEJIPIÓ – REGIÃO
METROPOLITANA DO RECIFE

Carla Suelania da Silva, Carlos de Oliveira Bispo, Sérgio Bernardes da Silva e


Osvaldo Girão

INTRODUÇÃO da terra, destacando a importância de um


estudo introdutório das condições físico-
Os canais fluviais desempenham uma
naturais desse ambiente, como também na
função preponderante no modelado
intenção de contribuir para o planejamento
terrestre, sua representação ocorre de forma
local e gestão ambiental e territorial da
dinâmica e equilibrada, evoluindo no
bacia em questão.
espaço e no tempo. O estudo desse
ambiente, seu comportamento e sua O método de abordagem sistêmico trouxe
evolução faz parte do domínio da contribuições na estruturação dessa
Geomorfologia Fluvial. pesquisa, possibilitando os caminhos para
uma ampla discussão. Os conceitos de
Na atualidade ao realizar o estudo dos
bacias hidrográficas e sistema fluvial
fatores atuantes no sistema fluvial, a
também são pressupostos teóricos
atividade antropogênica precisa ser levada
relevantes da pesquisa realizada. Quanto a
em consideração, principalmente no tocante
Teoria Geral dos Sistemas (TGS), esta foi
ao uso da terra de forma inadequada, sem a
proposta pelo biólogo Ludwig Von
ocorrência de um estudo geomorfológico
Bertalanffy no ano de 1973; segundo
prévio. Em face disso, o presente trabalho
Bertalanffy (1973) era necessário estudar os
teve como objetivo analisar a dinâmica
processos, mais também analisar os
fluvial da bacia do rio Tejipió frente ao uso
problemas organizacionais, a ordem que os
e ocupação da terra, ou seja, compreender o
unifica, observando-o como um todo e as
sistema fluvial dessa bacia e relacionar com
respostas obtidas pelo sistema.
as ações antrópicas, uma vez que esse
exercício ocupacional vem contribuindo As respostas desencadeadas pelo sistema
para mudanças morfológicas nos domínios podem apresenta-se de forma complexa,
fluvial e interfluvial, interferindo assim no onde por sua vez mudanças nos processos
equilíbrio dinâmico dessa bacia. podem alterar as formas e vice-versa. Esses
mecanismos do sistema estão relacionados
O estudo traz contribuições para ampliar
com os fatores de retroalimentação. “as
debates sobre as formas de usos e ocupações
principais características dos sistemas
90

dinâmicos complexos (sistemas caóticos) interagem entre si. Importante salientar que
está o processo de retroalimentação o fluxo e os sedimentos são elementos
(feedback), em que pequenas mudanças relevantes no canal fluvial, como também
podem ocasionar efeitos dramáticos, pois ao próprio sistema, por que são fatores
podem ser amplificadas pela responsáveis pelos processos fluviais
realimentação” (Aumond, et al., (Christofoletti, 1981).
2012:1101).
Os sedimentos são originados do processo
Na Geografia, especificamente na erosivo das margens e fundo do canal,
Geografia Física, a teoria do sistema é porém a maior parte desse material é
trabalhada a partir da idéia de sistemas resultado da dinâmica das vertentes, ou seja,
dinâmicos. Na Geomorfologia foi através advinda do domínio interfluvial. Segundo
de Chorley (1962) que a teoria geral dos Schum (1977) todas as áreas da bacia
sistemas foi entendida devidamente, podem ser caracterizadas como fonte de
contudo alguns estudos anteriores já sedimentos, onde esses sedimentos são
demonstravam um caráter sistêmico como, carreados até o seu nível de base, os canais
por exemplo, Teoria do Ciclo Geográfico de fluviais. O processo do transporte é
Willian Morris Davis, e os trabalhos de realizado a partir dos fatores
Strahler (1950) que já anunciava a hidrogeomorfológicos como a precipitação,
necessidade da geomorfologia estudar os a topografia e a cobertura vegetal;
processos e as formas dentro de um sistema interagindo no ambiente. Já o processo de
dinâmico. deposição pode estar relacionado
principalmente ao sopé das encostas e as
Sob a visão sistêmica é interessante planícies costeiras, uma vez que:
delimitar um recorte espacial para realizar a
análise, no sentido de entender o sistema A associação desses elementos da rede
fluvial, como também para delimitar o fluvial com a altimetria e os controles
estruturais da bacia hidrográfica, que
ambiente da pesquisa. Partindo desse originam importantes níveis de base
pressuposto, o estudo aqui realizado, regionais e locais, permite o
delimitou a bacia hidrográfica do rio desenvolvimento de um perfil
Tejipió, isto porque, segundo Guerra e longitudinal específico, dinâmico e em
Mendonça (2007) as bacias hidrográficas constante busca de equilíbrio, balanço
entre descargas líquidas, erosão,
são sistemas abertos, onde a entrada de transporte e deposição de sedimentos
energia (inputs) acontece através da (Cunha, 2012: 222).
precipitação e a saída de energia (outputs)
através do escoamento e dos sedimentos. A A noção de equilíbrio é um ponto relevante
Teoria Geral dos Sistemas no estudo de na discussão do sistema fluvial, os
bacias hidrográficas contribui na elementos interagem equilibradamente,
possibilidade de integrar e conectar os porém a expressiva atuação antropogênicas,
elementos do meio ambiente, uma vez que pode causar desequilíbrios nesse sistema.
uma bacia representa um todo Uma vez que as atividades humanas
interconectado (Santos, 2004). impetradas a um trecho de um rio podem
alterar formas e escalas de intensidade da
Para compreender o sistema fluvial é dinâmica desse equilíbrio, sendo exemplos
necessário conhecer os processos de tais alterações obras de engenharia,
formadores, os elementos presentes e as como as construções de
principais formas derivadas dessa dinâmica, reservatórios/barragens e
Segundo Souza (2013) o sistema fluvial tem canalizações/retificações (Cunha, 2012).
seu significado a partir da zona fonte de
sedimentos, da rede de transporte e dos As ações antrópicas são forças que quando
sítios de deposição, esses elementos exercidas sobre ambientes de rios e canais
91

emitem energia podendo alterar a fazenda Mamucaia em São Lourenço da


morfologia desses ambientes, esse processo Mata, e sua foz está na Bacia do Pina, na
é denominado de retroalimentação cidade do Recife, com seus 20 km de
negativa, uma vez que podem trazer extensão está compreendido na Região
consequências graves a esse domínio Metropolitana do Recife (RMR), possuindo
fluvial. Nos últimos séculos ocorreu um uma área de 93,2 km2, abrange os
aumento das atividades humanas sobre municípios de São Lourenço da Mata,
bacias de drenagem, na atualidade existe Jaboatão dos Guararapes e Recife, onde
grande interesse no homem como agente ocupa 73% da área total da bacia do rio
geomorfológico (Cunha, 2009). Tejipió.

O incorreto uso da terra na bacia é um dos A bacia do rio Tejipió é a terceira mais
principais fatores responsáveis pela importante da capital pernambucana, junto
intensificação dos processos erosivos, com a Bacia do rio Capibaribe e Beberibe
podendo assim, está liberando energia formam o complexo estuarino do Recife,
necessária para causar mudanças no sistema além de realizar o abastecimento das
fluvial: Regiões Político-Administrativas 5 e 6 da
capital, compreendendo bairros como:
Algumas das grandes causas de pressões Coqueiral, Jardim São Paulo e Boa viagem.
e impactos nos ambientes fluviais
decorrem da intensificação de processos
erosivos em uma bacia hidrográfica. MATERIAL E MÉTODO
Erosão laminar e a erosão de fluxo
concentrado (sulcos, ravinas e voçorocas) Para compreender de forma holística o
podem ser intensificadas pelo manejo
inadequado do solo. Além disso, outras
processo da dinâmica fluvial da bacia do rio
atividades como mineração a céu aberto, Tejipió, utilizou-se como aporte teórico-
urbanização, construção de estradas, metodológico a abordagem sistêmica. Nas
dentre outras, são fontes de sedimentos etapas procedimentais desta pesquisa,
que podem ser facilmente carreados foram feitas a revisão de literatura sobre a
durante as chuvas para os corpos d’água
(Raposo, et al. 2009:2)
temática abordada, elaboração dos
mapeamentos (mapa de uso e ocupação,
Na elaboração de um estudo da dinâmica mapa de localização e mapeamento
fluvial não é possível deixar de considerar a comparativo da ocupação antrópica) e
atuação antrópica nesse processo, isto por trabalho de campo. No trabalho de campo,
que os rios espelham as condições naturais realizado no dia 16 de novembro de 2016,
como também as atividades antropogênicas buscou-se fazer uma análise visual e
que são desenvolvidas na bacia registro fotográfico de três áreas visitadas
hidrográfica, de forma direta ou indireta os da bacia, sendo elas: o bairro de Tejipió,
canais fluviais experimentam mudanças comunidade do Caçote no bairro de Areias
desses dois elementos, trazendo assim e o bairro da Imbiribeira, localizadas na
alterações e/ou impacto no comportamento cidade do Recife. Em campo buscaram-se
desses ambientes (Cunha, 2012). observar os aspectos geomorfológicos
fluviais, processos de sedimentação, assim
ÁREA DE ESTUDO como as ações antrópicas.
A bacia do rio Tejipió localizada no estado Para a confecção dos mapas utilizou-se o
de Pernambuco, pertence ao grupo de software ArcGis 10.3 e Spring 5; os dados
pequenos rios litorâneos do estado (Figura para a confecção do mapa de localização foi
1), é formado pelo rio principal o Tejipió, e proveniente da base de dados do
seus afluentes o Jiquiá e Jordão além de Zoneamento Agroecológico de
outros canais de menor expressividade. A Pernambuco/Embrapa e Imagens SRTM –
nascente do rio Tejipió é localizada na
92

Shuttle Radar Topography Mission, condicionado com alguns fatores como a


resolução de 30 m. Para o mapeamento de declividade, o tipo de solo, a ausência de
uso e ocupação foram utilizadas imagens do vegetação e a própria intensidade das
satélite Landsat, sensor TM, resolução chuvas. A bacia apresenta uma variação
espacial de 30m. Para o mapeamento altimétrica relativamente baixa (Figura 2),
comparativo de uso e ocupação da terra as altitudes de 0 a 25 m compreendem a
próximo ao rio Tejipió foram utilizadas maior parte da bacia. Mesmo assim ela
imagens QuickBird, formato Geotiff, “apresenta alguns trechos acidentados a
resolução espacial de 0,7 cm, utilizou-se o oeste e sudoeste correspondente as Colinas
manual técnico de uso e cobertura da terra da Zona da Mata, constituídas pelo
do Instituto Brasileiro de Geografia e embasamento cristalino, pelos depósitos
estatística (IBGE, 2013) para a classificação cretáceos da formação Cabo e pelos
de uso e ocupação da terra. depósitos areno-argilosos da formação
Barreiras” (Muniz Filho, 2005:93).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A bacia do rio Tejipió possui declividade
O sistema da bacia de drenagem do rio
com valores relativamente pequenos,
Tejipió é apresentado inicialmente pelos
(Figura 3), as áreas declivosas
elementos naturais que compõem a rede de
compreendem entre 10 a 25 m de
drenagem seguidamente pelas atividades
declividade essas áreas chegam a 20% do
antropogênicas. Alguns fatores como:
total da bacia e são classificadas com alto
intensidade da precipitação, relevo,
risco de erosão, próximos ao município de
escoamento superficial e subterrâneo,
São Lourenço, área de cabeceira de
padrão da drenagem, mantém uma relação
drenagem, em sua maioria o relevo é
direta com o desmatamento,
classificado como plano à suavemente
impermeabilização, saneamento, resíduos
ondulado. Importante salientar que
sólidos e uso e ocupação da terra, isto por
principalmente nas áreas do Recife, onde
que esses aspectos sócio-espaciais, muitas
compreende maior parte da bacia, o relevo
vezes, atuam como modificadores dos
apresenta baixa altitude e declividade
elementos naturais. Essa dinâmica entre o
contribuindo para o processo de
social e natural é possível evidenciar no rio
adensamento populacional.
Tejipió, formando assim um sistema
complexo. A sinuosidade do rio principal é de 1,20
(Tabela 1), em algumas áreas ele apresenta
A precipitação é a principal entrada de
o tipo de canal meandrante, em outras áreas
energia (input), ela influencia em todo
apresenta-se retilíneo, devido a algumas
trabalho natural desenvolvido na bacia, seja
obras de canalização do leito do Tejipió. A
nos fatores geológicos e geomorfológicos.
drenagem apresenta um padrão dendrítico,
Na bacia em questão o regime de chuvas é
desenvolvido sobre rochas resistentes. A
bem distribuído ao longo do ano, com maior
densidade da drenagem dessa bacia é
expressividade nos meses de março a julho,
classificada como regular, ou seja, devido
sendo entre junho e julho os maiores
aos fatores físicos como também a atuação
valores, em torno de 350 mm, e a
antropogênica é possível inferir que essa
precipitação anual é de 2.254 mm parte
bacia pode apresentar problemas na
dessa precipitação é infiltrada ou escoada
drenagem, onde utilizando-se dos critérios
superficialmente.
de permeabilidade e precipitação.
O escoamento superficial e subterrâneo,
segundo Freitas Filho (2011), estará
93

Figura 1: Mapa da localização da Bacia do Rio Tejipió

Figura 2: Hipsometria da Bacia do rio Tejipió.


94

Figura 3: Declividade da bacia do rio Tejipió

Tabela 1: Parâmetros de drenagem.

O desmatamento e a ampliação na A partir dessa atuação torna-se relevante


impermeabilização do solo na bacia do rio expor o uso e ocupação da terra na bacia do
Tejipió, principalmente nas áreas de rio Tejipió (Figura 4) que se apresenta como
resquícios de mata secundária, tem-se um o principal fator de mudanças no sistema
aumento no escoamento superficial, fluvial. Conforme a Figura 4, 27% da área
acarretando consequentemente, um da bacia representam a vegetação,
crescimento na erosão das vertentes compreendida por resquícios de Mata
interfluviais, fator responsável pelo Atlântica secundária (floresta tropical) e
assoreamento dos canais fluviais e pela manguezais, áreas como o parque do Jiquía,
redução na inclinação das feições; tal dos Manguezais, Jardim Botânico, Mata do
assoreamento responde por uma maior Engenho Uchôa são áreas de preservação
deposição de sedimentos no canal, ambiental para a Prefeitura do Recife.
influenciando na vazão dos rios e, por
conseguinte, nas enchentes e mudanças na Além desses, em Jaboatão dos Guararapes
forma do canal. encontra-se o açude e mata do Jangadinha
unidade de proteção permanente. A prática
95

agrícola compõe, apenas, 4%, da área da construções urbanas, principalmente na


bacia em foco e está localizada entre os planície de inundação do rio Tejipió.
municípios de São Lourenço da Mata e
Jaboatão dos Guararapes, com um A mesma análise comparativa foi realizada
predomínio do cultivo da cana-de-açúcar. em trecho no baixo curso da bacia em
questão, na região de confluência do rio
A urbanização concentra a maior parte do Tejipió com o rio Jiquiá, importante
uso da terra, com 63% de toda área afluente da margem esquerda. Limites entre
territorial da bacia, isto por que essa bacia os bairros de Areais, Jiquiá e Imbiribeira,
encontra-se no relevo de planície próximo a essa área está localizado a bacia
facilitando, assim, o processo de ocupação do Pina, foz do rio Tejipió. Esse recorte
urbana. Para evidenciar o aumento na estudado apresenta uma área territorial de
urbanização e no crescimento de habitações 2,57 km2.
nas margens do canal principal da bacia do
rio Tejipió, foi realizada uma análise Em 2002 (Figura 7), o uso e cobertura da
comparativa de detalhe do ano de 2002 e terra no baixo curso apresentaram 53% de
2013, em duas áreas do médio e baixo curso uso urbano, isto está relacionado por serem
do rio Tejipió no município do Recife. bairros atrativos por sua centralidade no
Recife, como também nas áreas de margem
Em 2002 na região do médio curso do rio a presença de construções de pequeno e
Tejipió (Figura 5), próximo a BR-232, no médio porte e palafitas, sobretudo a
bairro do Curado, região-limite entre os população menos favorecida que habitam a
municípios de Jaboatão dos Guararapes e planície de inundação. 10% dessa área
Recife. Esse recorte corresponde uma área correspondem a vegetação de manguezal,
total de 1,32 km2, com o uso industrial 4% abrange a área da lagoa do Araçá, 8%
representando 28%, o urbano apresenta da área acomoda a atividade da
24%, a capoeira com 21%, onde segundo o carcinicultura e os rios compreendem uma
IBGE (2012) capoeira é uma vegetação área de 6, 23%. O industrial não apresenta
secundária formada por gramíneas, seguido tanta expressividade para essa área, apenas
do Capão 15%, caracterizado por um 4,73% do total, a vegetação de Capoeira
aglomerado de formação vegetal arbórea de expressa 6% nesse recorte territorial.
mata natural (Longhi, et al., 1992) os 12%
restantes compreende outros níveis no Para o ano de 2013 (Figura 8) ocorreu um
mapa. crescimento na taxa de urbanização,
abrangendo 60,36% dessa área,
No ano de 2013 (Figura 6), ou seja, após 11 principalmente na margem direita do rio
anos a paisagem local foi modificada, Tejipió, os instrumentos urbanos
principalmente pelo crescimento urbano preencheram os espaço de solo exposto e
que passa a abranger 43% dessa área, vegetação de Capoeira, sendo quase
ocorrendo um crescimento de 19% em reduzida em sua totalidade restado, apenas,
relação a 2002, sobretudo nas áreas da 0,4%, obteve um crescimento na vegetação
margem esquerda do rio Tejipió, onde de mangue e diminuição dos bancos de
existia a vegetação de Capão e nas áreas areia, esse processo pode estar relacionado
onde apresentava vegetação de Capoeira e a modificações no transporte fluvial, como
solo exposto, a vegetação no geral foi também deposição a montante do canal.
gradativamente suprimida, ficando apenas Ocorreram modificações nos canais
com 16%, o industrial permanece com a fluviais, principalmente o confinamento em
mesma porcentagem de 2002 (28%). Nesse algumas áreas, reduzindo seu espaço de
intervalo de tempo ampliou-se o número de 6,23% para 2,81%.
96

Figura 4: mapa de uso e ocupação da terra na bacia do rio Tejipió/PE.

Figura 5: Uso da terra no médio curso do rio Tejipió, em 2002.


97

Figura 6: Uso da terra no médio curso do rio Tejipió, em 2013.

Figura 7: Uso da terra no baixo curso do rio Tejipió, em 2002.

16
98

Figura 8: Uso da terra no baixo curso do rio Tejipió, em 2013.

A partir dos mapas analisou-se que em 11 Quando a população passa a habitar as


anos ocorreu uma evolução no crescimento margens dos rios, consequentemente há a
urbano, sobretudo com a redução da supressão da vegetação, provocando
vegetação em algumas áreas. Esse aumento desequilíbrio no ciclo hidrológico, poluição
na urbanização inclui também a elevação do rio causado por lançamentos de resíduos
nas taxas de impermeabilização do solo e sólidos, sedimentos e esgotos (Cunha,
crescimento das ocupações nas margens 2012) conforme observa-se na Figura 9.
fluviais. Além disso, a remoção da vegetação facilita
os processos erosivos, pois provoca
As margens de rios e canais são escoamento superficial e subsuperficial,
frequentemente utilizadas para habitação satura o solo excedendo a sua capacidade
humana, isso se dá devido à ausência de máxima de infiltração (Guerra, 2009;
espaços para ocupação em centros urbanos Bigarella, 2003).
em expansão, levando a segmentos
populacionais ocuparem áreas de baixo
valor devido a riscos, como terras úmidas,
sobressaindo-se margens de canais, e
encostas. Dessa forma, a população de
baixo valor aquisitivo se a própria de
espaços menos visados pelo setor
imobiliário, construindo suas moradias em
áreas ambientalmente frágeis.

Conforme Cunha (2012) a atuação


antrópica vem provocando diversas
mudanças na dinâmica fluvial tais como o Figura 9: Ocupação irregular nas margens do rio
barramento do corpo hídrico, supressão da Tejipió, comunidade do Caçote/Av Recife. No
mata ciliar, intensificação de processos círculo amarelo vê-se cano indicando despejo de
esgoto diretamente no rio, no círculo vermelho,
erosivos e o assoreamento essas deposição de lixo praticamente dentro do rio, e, no
modificações estão intrinsecamente círculo azul banco de sedimento, indicando o
associados ao uso e ocupação da terra. assoreamento do rio.
99

Outra questão decorrente de ações margens, desmatamento e a


antrópicas sobre sistemas fluviais é a impermeabilização do solo, gerando
realização de atividades humanas problemas como o aumento no escoamento
executadas diretamente sobre os canais superficial, erosão das vertentes,
fluviais como, por exemplo, a retificação de assoreamento dos canais fluviais e
canais, que provoca desequilíbrio na diminuição da periodicidade/recorrência de
dinâmica natural do ambiente fluvial, pois, eventos de enchentes, fazendo-se
sempre que altera-se a hidromorfodinâmica necessário ações de planejamento e gestão
o rio busca novas formas de resiliência, voltadas para as formas de usos e ocupações
causando muitas vezes erosão de suas visando mitigar os impactos provocados
margens (erosão marginal) e mudanças na pela apropriação de espaços em domínios
topografia do fundo do seu leito (Cunha, interfluviais e fluviais.
2012).
REFERÊNCIAS
A vegetação ciliar e ripária exerce um papel
primordial no contexto da dinâmica fluvial, Aumond, J.J.; Loch, C.; Comin, J.J. (2012)
contribui para a diminuição da erosão das Abordagem sistêmica e o uso de modelos para
margens dos rios/canais, aumento da recuperação de Áreas degradadas. Revista
infiltração além da recarga de aquíferos. Árvore, Viçosa, 36, 6, 1099-1118.
Quando há remoção da vegetação das Bertalanffy, V.L. (1975) Teoria geral dos Sistemas.
margens dos rios, para viabilizar a expansão Petrópolis, Editora Vozes.
de áreas urbanas, o consequente aumento da
impermeabilização reduz a capacidade de Chistofoletti, A. (1981) Geomorfologia Fluvial, Ed.
infiltração do solo e aumenta o escoamento Edgard Blücher, São Paulo.
superficial em direção às calhas de
Chorley, R.J.; Kennedy, B.A. (1971) Physical
drenagem principal. Geography: a systems approach. London:
Prentice Hall.
Na busca de novos espaços de ocupação e,
principalmente, na solução do problema Cunha, S.B.da. (2012) Canais Fluviais e a Questão
para as enchentes, há recorrentes alterações Ambiental. In: A Questão Ambiental: diferentes
abordagens. Cunha S.B.; Guerra, A. J. T. (org).
nos canais fluviais. As obras estruturais e
Bertrand Brasil, Rio de Janeiro, 219-237.
mecânicas nos cursos d’água, tornando-os
“urbanos”. Tais alterações, que possuem o Cunha, S.B.da. (2009) Geomorfologia Fluvial. In:
intuito de minimizar processos danosos à Geomorfologia: Uma Atualização de Bases de
dinâmica dos espaços urbanos, muitas vezes Conceitos. Cunha S.B.; Guerra, A. J. T. (org).
levam ao agravamento de eventos Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 211- 252.
ambientais naturais, que levam a uma maior Bigarella, J.J. (2003) Estrutura e Origem das
incidência e recorrência de enchentes, Paisagens Tropicais e Subtropicais.
destruição de infraestruturas e, Florianópolis: Editora da UFSC.
eventualmente, a perdas de vidas humanas.
(Botelho, 2011). Botelho, R.G.M. (2011) Bacias
hidrográficas urbanas. In: Guerra, A.T.S.
(org.) Geomorfologia urbana. Rio de
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Janeiro: Bertrand Brasil, 71-115.
Através da pesquisa constatou-se que está
Brasil. Ministério das Cidades/IPT-
havendo um aumento das atividades
Instituto de Pesquisas Tecnológicas.
antrópicas no sistema fluvial estudado,
(2007) Mapeamento de Riscos em
contributos para alterações da morfologia e
Encostas e Margem de Rios. Carvalho,
morfodinâmica do sistema, visto que a ação
C.S., Macedo, E.S.de e Ogura, A.T.
antrópica está associada a ocupação das
(orgs). Brasília: Ministério das Cidades;
100

Instituto de Pesquisas Tecnológicas – Longhi, S.J.; Selle, G.L.; Regagnin, L.I.M.;


IPT. Damiani, J.E. (1992) Composição Florística e
estrutura fitossociológica de um “Capão” de
Podocarpus Iambertii Kiotz, no Rio Grande do
Freitas Filho, J.S.de. (2011) Análise de Sul. Ci. Flor, Santa Maria, 2, 1, 9-26.
problemas de drenagem da bacia do rio
Tejipió com o uso de modelos Muniz Filho, P.T. (2005) Sistemas Hidrográficos
computacionais., Dissertação complexos: dimensões sócio-ambientais da
(Mestrado) Programa de Pós-Graduação bacia hidrográfica do rio Tejipió, Dissertação
(Mestrado) Programa de Pós-Graduação em
em Engenharia Civil, Universidade Geografia, Universidade Federal de
Federal de Pernambuco, Recife. Pernambuco, Recife.

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Encostas. In: CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. T. Righi, R.B.S.; Magalhães JR, A.P. (2009)
(orgs.). Geomorfologia. Uma Atualização de Reflexos de pressões antrópicas e da erosão
Bases e Conceitos. Bertrand Brasil, Rio de acelerada sobre a dinâmica fluvial da bacia do
Janeiro, 149-209. ribeirão sardinha – Quadrilátero Ferrífero/MG,
XII SBGFA, UFV, Viçosa, 1-15.
Guerra, A.J.T.; Mendonça, J.K.S. (2007) Erosão dos
solos e a questão ambiental. In: Vitte, A.C.; Santos, J. M. (2004) Na esteira da abordagem
Guerra, A.J.T. Reflexões sobre a geografia física sistêmica. In: Santos, J.M.; Faria, M. Reflexões e
no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, construções geográficas contemporâneas.
225-256. Salvador: Grasb, 35-57.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Souza, J.O.P.de. (2013) Dos sistemas ambientais ao
IBGE. (2013) Manual técnico de uso e cobertura sistema fluvial uma revisão de conceitos. Revista
da terra, 3 Ed, Ministério de Planejamento Caminhos de Geografia, Uberlândia,14, 46,
Orçamento e Gestão, Rio de Janeiro. 224–233.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Schumm, S.A. (1977) The fluvial system. Caldwell:
IBGE. (2012) Manual técnico da vegetação The Blackburn Press.1
brasileira, 2. Ed, Ministério de Planejamento
Orçamento e Gestão, Rio de Janeiro.
CARACTERIZAÇÃO MORFOMÉTRICA DA BACIA
HIDROGRÁFICA DO RIO TRAÍRAS COM O APOIO DE SIG

Alexandre Herculano de Souza Lima e Ronaldo Missura

sociais e econômicas homogêneas ou


INTRODUÇÃO similares, com vistas a orientar e facilitar o
planejamento e gerenciamento dos recursos
Nos estudos das bacias hidrográficas, uma hídricos. A resolução estabelece ainda que
linha de pesquisa vem sendo desenvolvida a bacia hidrográfica do Rio Traíras é a
de maneira crescente. Trata-se da Unidades de Planejamento nº 14.
morfometria que segundo Florenzano
(2008) é uma subdivisão da geomorfologia Neste contexto a gestão de bacias
que se preocupa em estudar os dados hidrográficas carece do uso de tecnologias,
quantitativos do relevo e desta forma ao ser das quais as geotecnologias revelam-se
aplicada as bacias hidrográficas, assegura como uma alternativa viável e de ampla
uma análise precisa. aplicação. O geoprocessamento através dos
SIG’s permite a integração de dados
O governo de Sergipe através da Lei morfométricos georreferenciados.
Estadual nº 3.870 de 25 de setembro de
1997 estabelece que as bacias hidrográficas O objetivo deste trabalho foi caracterizar a
sãounidades territoriais para implantação da morfometria da bacia hidrográfica do Rio
Política Estadual de Recursos Hídricos e Traíras através do uso de SIG’s, afim de que
atuação do Sistema Estadual de esta pesquisa sirva de subsídio para a gestão
Gerenciamento de Recursos Hídricos. de recursos hídricos e como fonte de
Estabelece ainda que a gestão dos recursos informações para o desenvolvimento de
hídricos deve ocorrer de maneira outros estudos na área.
descentralizada e contar com a participação
do Poder Publico, dos usuários e das
ÁREA DE ESTUDO
comunidades.
A Bacia Hidrográfica do Rio Traíras é uma
A partir da resolução nº 25/2015 do sub-bacia do Rio Vaza Barris, pertence a
Conselho Estadual de Recurso Hídricos o região hidrográfica do Atlântico Leste e está
estado de Sergipe foi adotada uma nova localizada no estado de Sergipe, sua área de
divisão hidrográfica, definido que as abrangência divide-se entre os municípios
unidades de planejamento são parte da bacia de Areia Branca, Campo do Brito,
hidrográfica com características naturais, Itabaiana, Itaporanga D’ajuda e Macambira.
102

Seus pontos extremos são 37°21'6"W ao Para caracterização morfométrica da Bacia


leste, 37°32'1"W ao oeste, 10°38'54"S ao Hidrográfica do Rio Traíras, foram
norte e 10°51'45"S ao sul (Figura 1). utilizados os programas QGIS 2.12 e
Global Mapper 15, os quais tornam
MATERIAIS E MÉTODOS possível o processamento georreferenciado
de dados do tipo vetor e raster.
Esta pesquisa foi delineada com base em
pressupostos teóricos que tornaram possível Inicialmente foram visualizados em
uma abordagem sistêmica de todos os ambiente SIG os arquivos vetoriais dos
elementos envolvidos, compreendendo a municípios de Sergipe adquiridos do sítio
bacia hidrográfica como um sistema aberto, do Instituto Brasileiro de Geografia e
por isso a escolha da categoria geográfica Estatística (IBGE), bem como os arquivos
paisagem. da Bacia Hidrográfica do Rio Vaza Barris e
de sua rede hidrográfica, ambos adquiridos
A paisagem não é a simples adição de do Atlas da Secretaria de Recursos Hídricos
elementos geográficos disparatados. É, de Sergipe 2014. Desta forma foi possível
em uma determinada porção do espaço, o localizar a Bacia Hidrográfica do Rio
resultado da combinação dinâmica,
portanto instável, de elementos físicos,
Traíras, e baixar os modeles digitais de
biológicos e antrópicos que, reagindo elevação que constituem as folhas
dialeticamente uns sobre os outros, fazem 10S375ZN e 10S39ZN adquiridas do sítio
da paisagem um conjunto único e Topodata (Banco de Dados
indissociável, em perpétua evolução Geomorfométricos) do Instituto Nacional
(Bertrand, 2004).
de Pesquisas Espaciais (INPE). .

Figura 1 – Localização da área de estudo.


103

Com os MDE’s foi elaborado um mosaico fator de forma são menos sujeitas a
no QGIS, posteriormente este mosaico foi enchentes que outras de mesmo tamanho,
transferido para o Global Mapper onde contudo com fator de forma maior. Para se
realizou-se um processamento para obter o fator de forma utilizou-se a Equação
obtenção do arquivo vetorial da Bacia 2.
Hidrográfica do Rio Traíras e de uma rede
de drenagem mais detalhada. Kf = A / L² (2)

De posse do arquivo vetorial da Bacia Onde: Kf – fator de forma; L –


Hidrográfica do Rio Traíras, da rede de comprimento da bacia.
drenagem e do MDE da área de estudo
foram mensuradas no QGIS as A densidade dedrenagem demonstra a
características morfométricas, as quais maior ou menor velocidade com que a água
seguiram a proposta de Villela e Mattos deixa a bacia hidrográfica, desta forma é o
(1975). Foram obtidas as seguintes índice que aponta o grau de
informações: área, perímetro, comprimento desenvolvimento da rede de drenagem
total dos canais, comprimento do rio (Villela e Mattos, 1975). Para calculá-lo
principal, coeficiente de compacidade, utilizou-se a Equação 3.
comprimento da bacia, fator de forma e
Dd = Lt/A (3)
densidade da bacia.
Onde: Dd – densidade da drenagem; Lt –
A área da bacia, o perímetro da bacia, o
comprimento total de todos os canais.
comprimento do rio principal, comprimento
da bacia e o comprimento total dos canais O índice de sinuosidade (Is) é a relação
são características básicas para a obtenção expressa pelo comprimento do canal
de todas as outras características principal com a distância vetorial (distância
morfométricas, logo foram calculadas em linha reta) entre os extremos do canal.
automaticamente através da calculadora de Em índices mais altos, menor é a velocidade
campos do QGIS. de escoamento, diminuindo a probabilidade
de enchentes a jusante da bacia. Para
O coeficiente de compacidade (Kc), de
obtenção do índice de sinuosidade usou-se
acordo com Villela e Mattos (1975),
a Equação 4.
aumenta conforme o nível de irregularidade
da forma da bacia, se trata da relação entre Is = 100 (Lc - eV)/ Lc (4)
o perímetro da bacia e a circunferência de
um circulo de área igual a da bacia, desse Onde: Lc – comprimento do canal principal;
modo varia de acordo com a forma da área eV - distância entre a desembocadura do rio
da bacia. Quanto mais o coeficiente for e a nascente mais distante medida em linha
próximo de um, maior será a reta.
susceptibilidade á enchentes. Para calculá-
lo utilizou-se a Equação 1. O coeficiente de manutenção foi proposto S.
A. Schumm (1956) e tem por finalidade
Kc = 0,28 P/ (1) fornecer a área mínima necessária para a
manutenção de um metro de canal de
Onde: P – perímetro; A – área da bacia. escoamento. Para calcular este coeficiente
foi utilizada a Equação 5.
O fator de forma relaciona forma da bacia Cm = 1/Dd x 1000 (5)
com a de um retângulo. Bacias com baixo
104

classes de declividade do relevo, as quais


Tabela 1 – Índices de sinuosidade (Christofoletti,
1980). foram reclassificadas segundo os
parâmetros estabelecidos pela Empresa
Classe Descrição Limites (%) Brasileira de Pesquisa Agropecuária
I Muito reto < 20 (1979), os quais são apresentados na Tabela
2 e Figura 2.
II Reto 20 a 29
III Divagante 30 a 39,9
IV Sinuoso 40 a 49,95 Tabela 2 – Índices morfométricos da bacia
hidrográfica do Rio Traíras (Embrapa, 1979).
V Muito sinuoso > 50
Classe Valor
Plano 0 a 3%
Com a utilização do QQIS foram aplicadas Suave ondulado 3 a 8%
falsas cores ao MDE para representar as
diferenças altimétricas e assim elaborar um Ondulado 8 a 20%
mapa de hipsometria. Foram estabelecidas Forte Ondulado 20 a 45%
10 classes altimétricas com intervalosiguais
de 68,86 m. Montanhoso 45 a 75%
Escarpado > 75%
Por fim foram adquiridas através de
processamentos aplicados aos MDE as a

Figura 2 – Hipsometria da bacia hidrográfica do Rio Traíras


105

Figura 3 – Declividade da bacia hidrográfica do Rio Traíras (EMBRAPA, 1979)

RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com a classificação de Silva e Tabela 3 – Índices morfométricos da bacia
Mello (2008), o valor de 1,95 encontrado hidrográfica do Rio Traíras.
para coeficiente de compacidade denuncia Área 239,46 Km²
uma bacia hidrográfica de forma alongada e
Perímetro 108,28 Km
não sujeita a grandes enchentes. Os valores
deste coeficiente entram em concordância Comprimento total dos 496,26 Km
com o fator de forma quanto à canais
susceptibilidade a enchentes. Comprimento do rio 33,93 Km
principal
Foi constatado o domínio das classes de
declividade plana e suavemente ondulada Coeficiente de 1,95
na maior parte da bacia, havendo assim a compacidade
tendência de baixaintensidade de Comprimento da bacia 22,24 Km
escoamento superficial. As maiores classes
de declividade encontradas estão associadas Fator de forma 1,94
às bordas do domo do Itabaiana, chegando Densidade de drenagem 2,07 Km/Km²
a atingir na Serra de Itabaiana uma
Indice de sinuosidade 29,5%
declividade de classe escarpada.
Coeficiente de manutenção 483,09 m²
Os índices morfométricos obtidos são
demonstrados na Tabela 3.
106

Embrapa. Serviço Nacional de Levantamento e


De acordo com a classificação de Conservação de Solos (1979). Súmula da 10.
Christofoletti (1980) o índice de Reunião Técnica de Levantamento de Solos. Rio
sinuosidade encontrado tende a classe de de Janeiro:. 83p.
divagante, desta forma o canal principal tem
sua velocidade de escoamento superficial Florenzano, T.G. (org.). (2008) Geomorfologia:
conceitos e tecnologias atuais. São Paulo,
moderadamente controlada por sua forma
Oficina de Textos.
sinuosa.
De acordo com Villela e Mattos (1975), a Governo de Sergipe. (2015) Resolução nº 25, de
densidade de drenagem de bacias novembro de 2015. Estabelece a divisão
hidrográfica de Sergipe para implementação da
hidrográficas varia de 0,5 km/km² (para Política Estadual de Recursos Hídricos e atuação
bacias com drenagem pobre) a 3,5 km/km² do Sistema Estadual de Gerenciamento de
ou mais (para bacias excepcionalmente bem Recursos Hídricos.
drenadas). O valor de 2,07 Km/Km²da
densidade de drenagem da bacia Guerra, A.J.T.; Cunha, S.B. (org.). (2012)
Geomorfologia, uma atualização de bases e
hidrográfica do Rio Traíras representa uma conceitos. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil.
bacia com drenagem muito boa, ou seja, o
relevo da região apresenta índices de Guerra, A.T.; Guerra, A.J.T. (orgs.). (2008) Novo
dissecação topográfica expressivos. dicionário geológico-geomorfológico. Rio de
Janeiro, Bretrand Brasil.

REFERÊNCIAS Schumm, S.A. (1956). The evolution of drainage


systems and slopes in bad lands at Perth, Amboi,
Bertrand, G. (1971) Paisagem e geografia física New Jersey. Geol. Soc. Ame. Bull. 67 (5), 597-
global: um esboço metodológico. Revista 646.
IGEOG/USP. Caderno de Ciências da Terra.
São Paulo, USP, 13, 1-27. Silva, A.M.; Mello, C.R. (2008) Apostila de
Hidrologia. Universidade Federal de Lavras.
Christofoletti, (1980) A. Geomorfologia. São Paulo:
Editora Edgard Blücher / EDUSP, 1980. 150 p. Villela, S.M.; Mattos, A. (1975) Hidrologia
aplicada. McGraw-Hill do Brasil, São Paulo.
MAPEAMENTO DAS UNIDADES LITOESTRATIGRÁFICAS E
GEOMORFOLÓGICAS DO MUNICÍPIO DE SERRINHA DOS
PINTOS-RN
Jacimária Fonseca de Medeiros e Larissa Silva Queiroz

como conjunto de relevos planos ou


INTRODUÇÃO dissecados, de altitudes elevadas, limitados,
por superfícies mais baixas, onde os
O nordeste brasileiro destaca-se no tocante processos de erosão superam os de
à diversidade de paisagens, resultante das sedimentação. Na visão de Ross (2008), os
heterogeneidades evidenciadas no Planaltos caracterizam a maior parte do
território. Apresenta também cenários território brasileiro, considerados como
contrastantes quanto à morfologia, vestígios de antigas formações erodidas.
abrigando Pediplanos sobre uma Depressão São chamados de relevos residuais, como a
Periférica e Interplanáltica, com a notável ideia do que resultou do relevo atacado pela
presença dos relevos residuais. erosão.
Não obstante desta realidade, o estado do Os Planaltos Residuais são entendidos
Rio Grande do Norte e especificamente o como áreas de relevo montanhoso,
município de Serrinha dos Pintos abriga apresentando-se na forma de blocos
uma considerável diversidade de formas de isolados, separados entre si, em meio à
relevo, pertencente ao complexo serrano Depressão Sertaneja. De acordo com Prates
Martins-Portalegre. No referido município et al (1981), destacam-se sobre a topografia
destaca-se os domínios de quatro unidades plana da Depressão Sertaneja, na forma de
de Paisagem, a saber: Depressão Sertaneja, elevações residuais, constituída pelos
Planície Fluvial, Planalto Residual e inselbergues ou maciços residuais. Apesar
Chapada. Estas unidades geoambientais de apresentarem-se como uma
encontram-se em constante dinamismo descontinuidade espacial, os mesmos são
quanto à interação entre os seus elementos dotados de uma série de propriedades
constituintes, bem como no tocante às comuns, as quais nos permitem aferir que se
associações entres as mesmas. configuram como uma Unidade
Geoambiental.
De acordo com o Manual Técnico de
Geomorfologia/IBGE (2010), os planaltos O termo Planaltos Residuais aparece em
são unidades geomorfológicas definidas alguns trabalhos como sinônimo de
108

Maciços Residuais, os quais são definidos ÁREA DE ESTUDO


por Guerra (2010 p. 403), como sendo
restos de antigas superfícies, ou melhor, O município de Serrinha dos Pintos está
antigos pediplanos ou peneplanos, localizado na região Oeste do estado do Rio
geralmente relacionadas com as rochas Grande do Norte, mais especificamente na
mais duras. Para Souza et al (1986), são microrregião de Umarizal (Figura 1).
constituídos por rochas metamóficas ou Insere-se no contexto nordestino semiárido
intrusivas com morfogênese química e e, de acordo com CPRM (2005), apresenta
evolução associada com intensos processos clima muito quente, com estação chuvosa
de dissecação do relevo. atrasando-se para o outono, distribuindo-se
entre os meses de janeiro a junho, como
Neste sentido, esse trabalho tem como consequência a vegetação é do tipo
objetivo realizar uma caracterização do Caatinga Hiperxerófila, vegetação de
município de Serrinha dos Pintos, caráter seco, com abundância de cactáceas
considerando os aspectos geológicos e e plantas de porte baixo e espalhadas e a
geomorfológicos. Floresta subcaducifólia, vegetação que se
caracteriza pela queda das folhas das
árvores durante o período seco.

Figura 1: Mapa de Localização do município de Serrinha dos Pintos.


109

Unidades Litoestratigráficas, por entender a


MATERIAIS E MÉTODOS
importância que a litologia assume frente as
Buscando entender os elementos geológicos formas de relevo. A seguir, as Unidades
e geomorfológicos do município de Geomorfológicas serão caracterizadas.
Serrinha dos Pintos, inicialmente
procedemos ao levantamento bibliográfico Caracterização das Unidades
que propiciou a caracterização da área, Litoestratigráficas
através de dados secundários e informações
obtidas em literatura pertinente, dentre as A área de estudo está inserida nos domínios
quais destacamos, Mabesoone et al. (1972), da Província Borborema (PB). A discussão
Barros (1998), Menezes (1999), Almeida et posta a seguir sobre as unidades
al. (1967), Araújo et al. (2001), Suguio litoestratigráficas do município de Serrinha
(2003), CPRM (2005). dos Pintos enfatiza o processo de formação,
a constituição bem como as suas principais
Na sequência ocorreu a elaboração do características considerando também
material cartográfico referente à geologia. aspectos geológicos relacionados ao
Inicialmente criou-se um banco de dados cisalhamento/fraturas, intemperismo físico
georreferenciados utilizando base de dados e químico e porosidade primária.
digitais de projetos e instituições públicas
como: Companhia de Recursos Minerais A partir do mapeamento percebe-se que a
(CPRM) e Instituto Brasileiro de Geografia geologia da área de estudo se caracteriza
e Estatística (IBGE). pelos augengnaisses graníticos, leuco-
ortognaisses, quartzos monzoníticos a granito
Todos estes dados foram analisados e da Unidade Litoestratigráfica Suíte Poço da
editados para a área de estudo. A elaboração Cruz que datam do Paleoproterozóico. A
cartográfica teve como base malha digital Unidade Litoestratigráfica Itaporanga
em formato de dado vetorial da CPRM, com também ocupa significativa área, com rochas
informações sobre a Geodiversidade do Rio graníticas e granodioríticas porfiríticas
Grande do Norte, acessível na escala de associadas a dioritos do Neoproterozóico.
1:500.000, disponibilizadas no site Além destas unidades, destacam-se ainda, em
http://geobank.cprm.gov.br/. Opção: menores proporções as Unidades
downloads/arquivos vetoriais/mapas Litoestratigráficas Caicó, com rochas
paragnaisse, migmatito, mármore, anfibolito
estaduais de geodiversidade.
e ortognaisse, também do Paleoproterozóico.
Os dados obtidos foram processados com E ainda as Unidades Litoestratigráficas
auxílio do software ArcGis/ArcMap versão recentes, do Cenozóico, Formação Serra de
Martins, Depósitos Colúvio-Eluviais e
10.2.2, sendo gerados os mapas de unidades
Depósitos Aluvionares. As unidades podem
litoestratigráficas e geomorfológicas do
ser evidenciadas na Figura 2.
município de Serrinha dos Pintos.
Assim, é perceptível que a estrutura
A partir do embasamento teórico necessário
geológica do município de Serrinha dos
sobre a área de estudo, foram efetuados
Pintos é predominantemente cristalina, com
levantamentos de campo, visando a
uma pequena porção sedimentar
confirmação das informações levantadas.
representada principalmente pela Formação
Serra de Martins, situada na porção
RESULTADOS E DISCUSSÕES Nordeste da área de estudo. Nesta unidade,
os sedimentos repousam sobre as rochas
Para uma melhor compreensão, os cristalinas graníticas e granodioríticas da
resultados serão apresentados de forma a Unidade Itaporanga.
abranger inicialmente a caracterização das
110

Figura 2: Unidades Litoestratigráficas do município de Serrinha dos Pintos-RN


111

Caracterização das Unidades Chapadas e platôs


Geomorfológicas
Segundo Florenzano (2008) as Chapadas
A modelagem do relevo é proveniente da são relevos típicos de planalto sedimentar.
ação de fatores exógenos que favorecem o Se caracterizam como grandes superfícies
intemperismo, e consequentemente planas, geralmente de estrutura horizontal,
processos erosivos que determinam o maior acima de 600m, características das regiões
ou menor grau de dissecação de uma Centro-Oeste e Nordeste do Brasil.
determinada área. Essa dissecação comum
nas formas de relevo vistas em campo, no Na área de estudo as Chapadas e Platôs
caso do planalto residual de Serrinha dos estão associadas às Unidades
Pintos, é condicionada por outro importante Litoestratigráficas Itaporanga e Formação
fator, a geologia local e o contexto tectônico Serra de Martins. No entanto, salientamos
regional. Ao realizar análise principalmente a influência do capeamento
geomorfológica é importante levar em sedimentar formado por lateritas, arenitos
consideração a litologia da crosta terrestre, conglomeráticos, arenitos síltico-argilosos.
uma vez que esta será determinante quanto Este material se caracteriza por elevada
á gênese deste mesmo relevo. porosidade primária, superior a 30% e
domínio hidrogeológico do tipo granular,
Assim, para o entendimento da que se justificam tendo em vista, as baixas
Geomorfologia de área de estudo, deve-se a declividades, típicas do das superfícies
todo momento está atento ao tipo de rocha tabulares, oscilando entre 0 a 5º.
presente nas áreas de estudo. Desta forma,
para o melhor entendimento da morfologia A unidade das Chapadas e Platôs
dos Planaltos Residuais de Serrinha dos apresentam as condições essenciais para a
Pintos, considera-se que estes fazem parte infiltração das águas pluviais, com posterior
do Escudo Cristalino, em que como o acúmulo nas camadas do subsolo. Nesse
próprio nome já diz, são rochas cristalinas sentido, é restrito o escoamento superficial.
(ígneas e metamórficas), com pequena área
coberta por capeamento sedimentar, Escarpas Serranas
conforme citado anteriormente.
Segundo Florenzano (2008:13) as escarpas
As Unidades Geomorfológicas serranas “são rampas ou degraus de grande
correspondem ao terceiro nível taxonômico, inclinação; são características de bordas de
salientando-se que “cada Unidade planaltos.” “Com morfologia muito
Geomorfológica evidencia seus processos acidentada, compostas por vertentes
originários, formações superficiais e tipos predominantemente retilíneas a côncavas,
de modelados diferenciados dos demais.” escarpadas, e topos de cristas alinhadas.”
(IBGE, 2010:29). (CPRM, 2010:89).

Neste contexto, as Unidades A unidade das Escarpas Serranas associa-se


Geomorfológicas evidenciadas no à Unidade Litoestratigráfica Poço da Cruz.
município de Serrinha dos Pintos são: As principais características dessa unidade
Chapadas e Platôs, Escarpas Serranas, são as elevadas declividades, oscilando
Inselbergs e outros relevos residuais, entre 25 a 60º, a baixa porosidade primária,
Planaltos, Planícies Fluviais ou Flúvio- entre 0 e 15%, e sistema hidrogeológico do
Lacustres, Superficies Aplainadas tipo fissural.
Retocadas ou Degradadas, Vertentes
recobertas por depósitos de encostas,
(Figura 3).
112

Figura 3: Unidades Geomorfológicas do município de Serrinha dos Pintos-RN


113

Trata-se, portanto, de uma Unidade


Inselbergs e outros relevos residuais
Geomorfológica de bastante dinamismo,
Ab’Saber (2003) caracteriza os Inselbergs associada aos depósitos aluviais.
como relevos residuais que resistiram aos Constituem o domínio de sedimentos
velhos processos denudacionais, cenozóicos recentes, composto por
responsáveis pelas superfícies aplainadas cascalho, areia, silte e argila.
dos sertões, ao fim do Terciário e início do
Quaternário. Segundo o IBGE (2010), os Superfícies Aplainadas Retocadas ou
inselbergs exprimem feições variadas tipo Degradadas
crista, cúpula, domo ou "dorso de baleia",
com encostas com declives em torno de 50° Refere-se ao compartimento embutido em
a 60°, dominando uma superfície de planaltos, posicionada em situação
topográfica inferior, também submetida a
aplanamento herdada ou funcional. processo de dissecação (Casseti, 2005).

Na área de estudo constituem como uma Constituem uma unidade que bordeja as
unidade de grande importância, destacando- áreas mais elevadas. Apresenta-se na forma
se em meio as superfícies aplainadas da das superfícies rebaixadas com altitudes
Depressão Sertaneja. Apresentam elevados abaixo de 300 m e declividades abaixo de
declives, baixa porosidade primária (0 a 5º. A porosidade primária é baixa, entre 0 e
15%), sistema hidrogeológico do tipo 15%, e o sistema hidrogeológico é do tipo
fissural. fissural.

Planaltos Pode ser entendida como uma área


acumuladora dos materiais que são
Os Planaltos são conjuntos de relevos carreados nas unidades acima situadas, as
planos ou dissecados, de altitudes quais são constantemente submetidos à
elevadas, limitados, pelo menos em um
lado, por superfícies mais baixas, onde os ação gravitacional e processos erosivos.
processos de erosão superam os de
sedimentação. (IBGE, 2010:30). Vertentes recobertas por depósitos de
Aparecem atrelados à Unidade encostas
Litoestratigráfica Poço da Cruz, que
Florenzano (2008) define as vertentes como
conforme citado anteriormente apresentam
superfícies inclinadas que constituem a
baixa porosidade primária e sistema
conexão dinâmica entre a linha divisora de
hidrogeológico do tipo fissural. A Unidade
águas e o fundo do vale (talvegue).
Geomorfológica dos Planaltos localiza-se
Acrescenta ainda que, as vertentes são
entre a Chapada de Serrinha dos Pintos e a
elementos básicos do relevo, no que se
Chapada localizada na Serra de Martins.
refere ao estudo dos processos de erosão e
Caracterizam-se por baixa declividade,
acumulação, pois, com exceção das
entre 0 a 5º.
planícies e terraços, elas ocupam a maior
parte da superfície terrestre.
Planícies Fluviais ou Flúvio Lacustres
O embasamento litológico é composto pelas
Segundo o IBGE (2010), planície fluvial se Unidades Litoestratigráficas Itaporanga e
configura como uma área plana resultado de Poço da Cruz. Ambas com baixa porosidade
acumulação fluvial sujeita a inundações primária (0 a 15%) e sistema
periódicas, correspondendo às várzeas hidrogeológico do tipo fissural.
atuais. Ocorre nos vales com preenchimento
aluvial. Assumem declividades que oscilam entre 5
a 45º e apresentam-se recobertas por
114

depósitos das encostas situadas nas As Unidades Litoestratigráficas


proximidades, podendo-se aferir tratar-se constituírem-se predominante de rochas do
de uma unidade acumuladora e embasamento cristalino, no entanto
transportadora de materiais recebidos de salienta-se em pequenas proporções os
outras unidades geomorfológicas. sedimentos recentes da Formação Serra de
Martins, bem como os sedimentos alúvio-
Nas imagens abaixo é possível perceber coluviais.
algumas especificidades no modelado do
relevo presente no município de Serrinha de Sobre esta litologia sobressaem as seguintes
Martins (Figura 4). Unidades Geomorfológicas: Chapadas e
Platôs, Escarpas Serranas, Inselbergs e
CONSIDERAÇÕES FINAIS outros relevos residuais, Planaltos,
Planícies Fluviais ou Flúvio-Lacustres,
Ao término desta pesquisa concluímos que Superfícies Aplainadas Retocadas ou
o mapeamento se mostrou uma técnica Degradadas, Vertentes recobertas por
bastante eficiente no tocante às Unidades depósitos de encostas
Litoestratigráfica e Geomorfológicas para o
município de Serrinha dos Pintos.

Figura 4: Formas de relevo presentes no município de Serrinha dos Pintos. Fonte: Jiliardo Queiroz (2016)
115

Norte, CPRM, 77-92. Disponível em


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Geodiversidade do Estado do Rio Grande do Edgard Blucher.
116
DETECCIÓN DE MINERALES CON USO DE IMÁGENES LANDSAT
8 EN LA REGIÓN DE VALPARAÍSO, PROVINCIA DE LOS ANDES,
COMUNA DE SAN ESTEBAN, LUGAR CAMPOS AHUMADA ALTO
– CHILE

Nathaly Grau Perez, Keyla Manuela Alencar da Silva Alves e Juan Toledo
Ibarra

para definir las vetas y los tipos de


INTRODUCCIÓN materiales que se pueden extraer (Jiminez e
Lara, 2014).
El uso de herramientas tecnológicas para la
realización de investigaciones en el área de El proceso del análisis se apoya en las
las geociencias ha evolucionado hacia el imágenes satelitales, cartas geológicas,
logro de resultados más precisos y rápidos, estudios de suelo del Sernageomin, etc,
con el objeto de minimizar costos y mejorar contribuyen a la posibilidad de encontrar
la calidad del servicio prestado. Además, el cuerpos mineralizados. La realización de un
salto tecnológico favorece la información y análisis mineralógico no sólo contribuye
análisis de datos a través de algoritmos para orientar un programa de explotación
diseñados para este efecto (Griem, 2015). futura, sino que también comunica el
posible potencial minero de un proyecto a
La elaboración de un estudio mineralógico
aquellos interesados en desarrollar una
implica en trabajo multidisciplinario de
actividad económica tan importante en
varias geociencias, tales como la
Chile como lo es la minería (Sernageomin,
cartografía, geomensura, geografía,
2016).
geología, entre otras. En este caso particular
se relaciona la geomensura con el área de la
geología, puesto que al realizar un análisis ÁREA DE ESTUDIO
de los diferentes tipos de minerales
existentes en una zona con probabilidad de La zona de estudio está ubicada en la región
riquezas de éstos, resulta necesaria la ayuda de Valparaíso, provincia de Los Andes,
de un especialista en el área de la comuna de San Esteban, lugar Campos
geomensura para determinar los posibles Ahumada Alto con una dimensión de 60
lugares donde se realizan los sondajes por Hectáreas. Las características
medio de imágenes satelitales, calicatas u geomorfológicas que tiene esta área es que
otros métodos, y en el área de la geología posee tantas planicies costeras y pendientes
118

abruptas, ya que se encuentra cercano a estudio fue dividida en un área aproximada


zonas montañosas de la cordillera de la de 5 kilometros a la redonda al predio ya
costa. Las características geológicas radican que facilita su minipualcion para conocer de
en que posee una veta histórica de oro y mejor manera los elementos mineralogicos
cobre, y sus concesiones aledañas lo que existen en esa zona.
afirman ya que se ha encontrado este tipo de
minerales al explotarlas (Sernageomin, Según la información proporcionada, la
2016). concesión de exploración tiene las
siguientes coordenadas (Tabla 1):
En la Figura 1, se observael área de
estudiodestacado en la imagen.El área de

Figura 1: Área de estudio

Tabla 1: Delimitación área de estudio de la pertenencia minera.


Coordenadas UTM Coordenadas Geográficas
Esquina Este Norte Longitud Latitud
L1 355.330,000 6.388.000,000 70° 32' 39.4870" W 32° 38' 22.1290" S
L2 355.930,000 6.388.000,000 70° 32' 16.4667" W 32° 38' 22.4102" S
L3 355.930,000 6.387.000,000 70° 32' 17.0219" W 32° 38' 54.8755" S
L4 355.330,000 6.387.000,000 70° 32' 40.0458" W 32° 38' 54.5907" S
119

primer paso es convertir los ND a radiancia


METODOLOGIA (magnitud física) y a partir de ésta obtener
otros parámetros. Para obtener la radiancia
es necesario conocer los coeficientes de
Adquisición de la imagen satelital calibración del sensor que la relacionan con
Landsat-8 los ND:
La imagen satelital utilizada fue Lk = aok + alk ∗ NDk
descargadade la página web del Servicio (2)
Geológico de Estados Unidos. Fue
georreferencianda y se encuentra en Dónde: LK es la radiancia de una banda
coordenadas Utm con Datum WGS-84 huso determinada (en Wmֿ² srֿֿ¹ µmֿ¹); a0 y a1 los
19 Sur. La fecha de adquisición es del 08 de coeficientes de calibración en dicha banda y
agosto del 2015.Se utilizarán de las 11 NDk corresponde al nivel digital de la
bandas disponibles solamente 7 ya que estas imagen en la misma banda (FERNÁNDEZ,
son de interés para la interpretación de 2011).
elementos. La combinación de 3 de estas 7
bandas dará origen a una imagen distinta E0,K cosθi ρ∗k
Lk =
que realzará alguna firma espectral en Dπ
(3)
particular de ciertos elementos (como por
ejemplo para minerales, infrarrojo mediano
Donde: E0.k Cosθes la irradiancia solar en el
7, infrarrojo cercano 5 y azul 2).
techo de la atmosfera (para esa banda); ρ ∗k
es la reflectividad aparente de la cubierta en
Correcciones atmosféricas esa banda K; θi es el ángulo cenital del flujo
incidente, formado por la vertical del
Para el cálculo de la reflectividad de la terreno y los rayos solares; y D es el factor
superficie necesitamos estimar la corrector de la distancia Tierra-Sol.
transitividad de la atmósfera (descendente
τk,iy ascendente τk,0), la irradiancia difusa
Firmas espectrales de minerales en
(Ed, k) y la radiancia atmosférica debida a
la dispersión (La, k).(APN, 2005). Landsat-8

Agregando estos parámetros a la fórmula Para estimar los minerales que abundan en
(1) la fórmula queda: la zona de estudio se utilizó como apoyo la
librería mineralógica de 160 elementos el
Dπ(Lsen,k −La,k )/τk,0 software ENVI 5.1 que contiene
ρ ∗k = E0,k Cosθi τk,i +Ed,k aproximadamente 300 espectros medidos
(1) entre los rangos de longitudes de onda de
0.4 a 2.5 micrómetros en 826 bandas
Cálculo de reflectividades y radiancia (Cnice, 2015).

Para conocer la reflectividad de una Se tiene conocimiento de que existen en el


superficie es preciso relacionar dos área de estudio oro y cobreen muy pequeñas
magnitudes: la energía reflejada y el cantidades.Por lo cual este análisis buscar
incidente. A partir de datos medidos por el comprobar además la existencia de: alunita,
sensor podemos obtener la primera, ya que pirita y turmalina-dravita (Lazariadou,
la radiancia espectral medida por éste es 2005).
consecuencia de la reflexión de la radiación
solar por el suelo. Esa medición se codifica Luego, para estudiar la posible existencia de
en un valor numérico (el ND) (Chuvieco, los elementos mineralizados en el predio se
2002). Conversión a parámetros físicos el realiza la comparación de firmas espectrales
120

entre los elementos seleccionados en la RESULTADOS


librería y las diferentes muestras obtenidas
en el predio mediante la imagen satelital Para efectuar el análisis mineralógico se
Landsat-8. deben conocer primeramente las firmas
espectrales de la alunita, pirita y turmalina
Para poder realizar un estudio óptimo obtenidas del libro, observadas en la Figura
fueron seleccionados 36 perfiles repartidos 3.
en toda el área de las 60 hectáreas que posee
el predio, como se muestra en la Figura 2. La pirita es un elemento perteneciente al
grupo de los sulfuros conocido
comúnmente como el oro falso, el cobre se
puede obtener de este elemento en un 80%,
posee un nivel de reflectividad alto dado
que es insoluble al agua y presenta de color
blanco amarillento. Su perfil muestra que en
la banda 7, 5 y 2 tiene aproximadamente un
10% de reflectancia (Griem, 2015).

La alunita es un elemento perteneciente al


grupo de los sulfatos asociado al yeso,
usado para la obtención de fertilizantes,
contiene hierro por lo cual posee un nivel de
reflectancia muy alto. Su perfil muestra que
en las bandas 7 y 2 tiene un 60% de
reflectancia y en la banda 5 un 90% (Griem,
2015).

Figura 2: Ubicación de los 36 perfiles tomados en


el predio.

Figura 3: Firmas espectrales de los elementos significativos del área de estudiar.Fuente: Captura pantalla
software ENVI 5.1
121

La turmalina-dravita es un elemento Se procede a realizar los 36 gráficos


perteneciente al grupo de los silicatos comparativos de las firmas espectrales
asociado para ser usado como joya y para hechos con el software ENVI 5.1, los cuales
instrumentos de medición de presión, posee son (Figura 4):
una reflectividad alta. Su perfil muestra que
en las bandas 7 y 5 tiene un 38% de El histograma de las 36 muestrasde firmas
reflectancia y en la banda 2 un 10% (Griem, espectralestomadas presenta tendencia de
2015). reflectancia en la banda 7 (infrarrojo medio)
del 13% aproximadamente, en la banda 5
Los colores representativos que tendrán las (infrarrojo cercano) con un valor del 12% y
firmas espectrales de la alunita, pirita, en la banda 2 (azul) con un valor del 15%.
turmalina y de las muestras del predio
tomadas en la imagen serán: Por lo tanto, el elemento que más se acerca
a la tendencia de las firmas espectrales del
Tabla 2: Colores representativos de las firmas predio en relación a su porcentaje de
espectrales reflectancia es la pirita en la banda 5
Nombre Elemento (infrarrojo cercano) ya que este elemento
posee un valor de reflectancia del 10%. Los
Concesión minera Rojo
perfiles número 4, 7, 13, 14, 19, 20, 23, 26,
Pirita Verde 30, 32 y 33 son los más cercanos a los
Alunita Café
valores de reflectancia de la pirita en las
bandas RGB. Mostrando la posible
Turmalina-Dravita Azul tendencia de las vetas (color naranjo) con
mayor probabilidad de presencia de
minerales, como lo indica la Figura 5.

Figura 4:6 Los gráficos del 1 al 36 representan los resultados de firmas espectrales de los minerales alunita,
pirita, turmalina – dravita. Fuente: ENVI 5.1 (cont.)
122

Figura 4:7 Los gráficos del 1 al 36 representan los resultados de firmas espectrales de los minerales alunita,
pirita, turmalina – dravita. Fuente: ENVI 5.1. (cont.)
123

Figura 4:8 Los gráficos del 1 al 36 representan los resultados de firmas espectrales de los minerales alunita,
pirita, turmalina – dravita. Fuente: ENVI 5.1.
124

Figura 5: Posibles vetas con minerales.

Análisis de resultados turmalina-dravita, mostrados en la Figura 5.


Según los resultados obtenidos en el análisis Al ver que en algunos de los 36 perfiles
previo con la imagen satelital Landsat-8, poseen valores se semejantes, surge la
existe la posible presencia de minerales en posibilidad de que haya elementos
gran extensión en el predio, en base a 36 mineralizados en ese punto. Estos datos se
diferentes perfiles comparativos en la muestran a continuación en la tabla 4.
imagen satelital. Estos perfiles muestran la
relación del porcentaje de reflectancia de Las 36 firmas espectrales obtenidas del
los minerales en función de la longitud de predio tienen una tendencia a poseer el
onda, eso quiere decir que tiene un mismo porcentaje de reflectancia que la
comportamiento particular cada perfil en la pirita en la banda 5 (infrarrojo cercano),
banda RGB del infrarrojo medio (banda 7 aunque 11 de los gráficos señalados en
valor: 2.2 µm), infrarrojo cercano (banda 5 amarillo, muestran que el porcentaje de
valor: 0.8 µm) y azul (banda 2 valor: 0.5 reflectancia en las tres bandas RGB
µm) según el nivel de radiación que refleje (infrarrojo medio, infrarrojo cercano y azul)
hacia al sensor el elemento, como en el caso posee una tendencia similar a la del
de la pirita, alunita y turmalina-dravita. elemento.
Como se observa en la tabla 3.
Por lo tanto, según indican los datos existe
La comparación de las firmas espectrales se la posibilidad de que haya pirita, lo cual da
inclina a averiguar cuáles de los perfiles un indicio de que podría existir menas de
hechos en el predio están más cercanos a los oro o cobre en mayor cantidad ya que son
valores de reflectancia de la pirita, alunita y extraídos desde este elemento. Como se
observa en la tabla 5.
125

Tabla 3: Valores de reflectancia en los elementos mineralógicos posiblemente


Elemento Banda 7 (infrarrojo medio) Banda 5 (infrarrojo cercano) Banda 2 (azul)
Reflectancia (%) Reflectancia (%) Reflectancia (%)
Pirita 10% 7% 7%
Alunita 60% 85% 63%
Turmalina 36% 8% 4%

Tabla 4: Valores de reflectancia en los 36 perfiles contenidos en el predio

N° firma Banda 7 (infrarrojo medio) Banda 5 (infrarrojo cercano) Banda 2 (azul)


espectral Reflectancia (%) Reflectancia (%) Reflectancia (%)
1 11% 11% 13%

2 11% 16% 15%


3 12% 12% 12%
4 9% 10% 11%
5 9% 11% 12%
6 11% 14% 12%
7 9% 10% 11%
8 3% 4% 10%
9 3% 4% 6%
10 3% 4% 5%
11 3% 5% 6%
12 2% 5% 10%

13 6% 5% 11%
14 10% 9% 11%
15 14% 10% 11%
16 8% 10% 12%
17 5% 5% 10%
18 13% 15% 12%

19 10% 10% 11%


20 6% 7% 10%
21 14% 10% 10%
22 14% 10% 11%
23 10% 9% 10%
24 15% 13% 13%
25 5% 5% 10%
26 5% 7% 10%
126

27 5% 6% 11%
28 2% 5% 10%
29 2% 5% 10%

30 10% 10% 11%


31 15% 11% 12%
32 6% 5% 10%
33 10% 9% 11%
34 2% 5% 9%
35 2% 4% 9%
36 14% 10% 11%

Tabla 5: Comparación del porcentaje de reflectancia en los elementos


Banda 7 (infrarrojo medio) Banda 5 (infrarrojo cercano) Banda 2 (azul)
Elemento
Reflectancia (%) Reflectancia (%) Reflectancia (%)
Pirita 10% 7% 7%
Promedio 11
8.5% 8.8% 11%
firmas

Con estos datos obtenidos solo usando la dicha área y ver que costos generaría
imagen satelital Landsat-8 aumenta la realizar este tipo de análisis.
probabilidad en un 40% la existencia de
minerales para así explorar más en A través de este largo estudio se pudo ver
profundidad el predio minero. que un análisis mineralógico conlleva el
trabajo en conjunto de muchos
Optando a métodos complementarios como profesionales del área para que sea factible,
el ir a terreno a ver las características de ya que no todas las decisiones pasan por el
cómo se presentan estos elementos y extraer geomensor sino que por geólogos,
muestras más superficiales del suelo para ingenieros en minas, geofísicos, etc.
luego estudiar la opción de realizar sondaje. También se concluyó que el realizar este
tipo de análisis en primera instancia con
CONCLUSIÓN imágenes satelitales como apoyo, es un
complemento para tomar la decisión de dar
Al inicio del presente trabajo, se planteó el siguiente paso de exploración más
como principal objetivo estimar la profunda, actualmente este tipo de método
existencia de ciertos minerales realizando se está usando cada vez más porque es un
un análisis mineralógico con una imagen impulsor para minimizar costos en terreno,
satelital Landsat-8 en un predio minero ya que desde un software se tiene el control
ubicado en la región de Valparaíso, del área de estudio por más grande que sea
provincia de Los Andes, comuna de San acotando los puntos de exploración.
Esteban, lugar Campos Ahumada Alto, para
evaluar la posibilidad de hacer sondaje en
127

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Fotogrametría. Disponivel Em:
Http://Coello.Ujaen.Es/Asignaturas/Teledetecci
on/Tel/Tel_Tfc_ Archivos/Tema6.Pdf.
128
INVENTÁRIO DE ESCORREGAMENTOS RASOS EM ÁREAS
URBANAS E PARÂMETROS TOPOGRÁFICOS: UMA ANÁLISE
INICIAL NO BAIRRO DE NOVA DESCOBERTA, RECIFE (PE)
John Kennedy Ribeiro de Santana, Ana Márcia Moura da Costa, Victor da
Silva Santa Rosa, Maria Rafaela da Silva Cruz e Fabrizio de Luiz Rosito Listo

INTRODUÇÃO que influenciam na ocorrência de


escorregamentos, tais como parâmetros
O processo de urbanização brasileira,
topográficos (ex. declividade e forma da
marcado pela apropriação do mercado
encosta), tipo de cobertura vegetal,
imobiliário das melhores áreas das cidades
alterações antrópicas, entre outros. Dessa
e pela ausência de projetos destinados a
forma, compreender a atuação desses
moradia popular, levou a população de
fatores em conjunto é essencial para
menor poder aquisitivo a ocupar as áreas
entender a dinâmica da paisagem estudada.
menos favoráveis para moradia, tais como
morros e fundos de vales (Carvalho et al Na tentativa de solucionar ou amenizar os
2007).Tal situação contribuiu para o grande problemas das habitações em áreas de risco,
aumento de assentamentos precários em vêm se desenvolvendo um número cada vez
áreas de risco, configurando-se atualmente maior de estudos de susceptibilidade e de
como um dos principais problemas monitoramento de movimentos de massa
socioambientais do país. De acordo com em áreas urbanas, com o objetivo de
dados da CPRM (2016) (Serviço Geológico delimitar áreas com maior probabilidade ou
do Brasil), existem mais de três milhões de incidência dessas ocorrências (Neto e
pessoas em áreas de risco no país, Costa, 2014). Um importante instrumento
distribuídas em 773 mil moradias. Somente utilizado na análise da suscetibilidade é o
no estado de Pernambuco, há 48 mil inventário de escorregamentos, que
moradias em locais de risco onde residem representa a distribuição espacial dos
193 mil pessoas (CPRM, 2016). processos (Parise, 2001), constando
registros pretéritos e recentes dos eventos
Considerando-se que o risco seja a
de escorregamentos. O mapa de inventário
probabilidade de eventos naturais
é a base necessária para a produção de
resultarem em danos materiais e sociais, os
mapas adicionais, como mapas de
escorregamentos classificam-se como
susceptibilidade e de risco a
riscos geomorfológicos exógenos
escorregamentos uma vez que as condições
(Carvalho et al 2007). São vários os fatores
de terreno onde ocorreram os processos
130

passados e recentes, geralmente são as A região é um dos bairros com maior índice
mesmas que poderão deflagrar novos de exclusão social do município de acordo
eventos (Bauzys, 2012). com o Mapa de Exclusão/Inclusão
Socioambiental do Recife (Fundaj, 2007).
Os escorregamentos nas áreas de morros se Caracterizando-se como um bairro de classe
configuram como um dos maiores média a baixa, a região segue a tendência de
problemas encontrados na cidade do Recife várias outras áreas da cidade, onde as
(PE), em função de ocupações irregulares, populações de renda mais baixa se
com moradias precárias sem estruturas ou localizam nos locais com maiores riscos de
planejamento técnico para a construção. O ocupação.
município do Recife é composto, em
relação a sua área territorial, de Conforme Alheiros et al (2003), do ponto de
aproximadamente 65% de áreas de morros vista geológico, a área é formada por
(Alheiros et al, 2003). De acordo com o sedimentos terciários da Formação
Plano Municipal de Redução de Risco Barreiras, cujos sedimentos são
(PMRR, 2006), existiam cerca de 470.000 característicos de deposição fluvial.
habitantes em áreas de morros, sendo que Apresentam camadas mais arenosas na base
deste total, 10.374 ocupavam moradias em e arenosas e argilosas intercaladas nos
locais de risco alto ou muito alto com 140 topos, resultantes de depósitos por
pontos de risco a escorregamentos enxurradas (leques aluviais). A constituição
distribuídos pelo município (PMRR, 2006). de areias típica dessa formação apresenta
um elevado teor de feldspatos, sujeitos aos
Dentre os vários pontos de risco do processos de argilização em função de
município, o bairro de Nova Descoberta climas quentes e úmidos, o que favorece a
caracteriza-se por apresentar encostas com ocorrência de escorregamentos e de
declividades íngremes que apresentam uma processos erosivos (Alheiros et al, 2003). A
intensa ocupação antrópica. A Defesa Civil região está inserida na unidade
do Recife vem registrando vários eventos de geomorfológica dos tabuleiros costeiros, no
escorregamentos na região, onde realiza qual a dissecação desse relevo em direção à
monitoramentos constantes das áreas de costa permitiu a formação de morros
maiores riscos. Dessa forma, o objetivo sinuosos e de colinas arredondadas com
deste trabalho consiste em relacionar o encostas de declividade variável (Alheiros,
inventário de escorregamentos do bairro de 1998).
Nova Descoberta, elaborado com base em
dados da Defesa Civil, com parâmetros O clima da área configura-se por ser quente
topográficos (declividade), obtidos por e úmido, com precipitação média anual que
meio do uso de Sistemas de Informações ultrapassa 2000mm.Os meses de maio,
Geográficas (SIG). junho e julho apresentam os índices de
precipitação mais elevados, nos quais
ÁREA DE ESTUDO ocorrem os maiores números de ocorrências
O bairro de Nova Descoberta localiza-se na de escorregamentos (Instituto Nacional de
zona norte do município do Recife (PE) Meteorologia, 2016).
perfazendo uma área total de 1,8 km2 com
Com relação à cobertura vegetal,
uma população de 34.212 habitantes
apresentava, originalmente, vegetação de
(Prefeitura do Recife, 2010) com altitudes
Mata Atlântica, desmatada em inúmeros
que variam entre 13 m a 91 m (Figura 1).
pontos, sendo substituída por vários trechos
de solo exposto e de vegetação secundária
de pequeno porte (Figura 2).
131

Figura 1: Localização da área de estudo (bairro de Nova Descoberta, zona norte do Recife).

Figura 2: Encosta de alta declividade em área de solo exposto com risco de escorregamentos
132

MATERIAIS E MÉTODOS
HISTÓRICOS DE
ESCORREGAMENTOS E MEDIDAS
PREVENTIVAS Inventários de escorregamentos

O bairro apresenta um histórico frequente O inventário de escorregamentos foi


de episódios de escorregamentos. Por elaborado a partir de um Banco de Dados
exemplo, em 1996, após precipitações fornecido pela Defesa Civil do Município
intensas, 10 casas foram destruídas com com os locais de ocorrência dos processos
ocorrência de 12 vítimas fatais na região, na área entre os anos de 2013 e 2016, bem
configurando-se como um dos maiores como a classificação de alguns setores de
desastres relacionados a escorregamentos risco. Tais dados foram geocodificados na
na cidade do Recife (G1 PE, 2016). base cartográfica do distrito para posterior
análise com outros parâmetros.
Entre 2013 e 2016, foram registrados pela
Defesa Civil do município a ocorrência de Modelo Digital do Terreno, Carta de
90 episódios de escorregamentos, que
Declividade e Análise Conjunta
atingiram diversas moradias. Essas
ocupações passaram por um mapeamento e A elaboração da Carta de Declividade foi
cadastramento pela Defesa Civil, na qual possível, inicialmente, pela geração de um
foram classificadas em diferentes graus de Modelo Digital do Terreno (MDT) a partir
risco (R1 à R4), conforme a Tabela 1 da obtenção de curvas de nível com
(Banco de dados da Defesa Civil do Recife). equidistância de 1m e rede de drenagem,
Tabela 1: Relação das moradias com ocorrências de
adquiridos no ESIG Recife (Informações
escorregamentos e respectivos graus de risco no Geográficas do Recife).
bairro de Nova Descoberta.
Tendo como base os dados
Número de moradias Graus de Risco planialtimétricos, o MDT foi elaborado com
resolução de 1m2 por meio do módulo Topo
17 R4 (Risco muito alto) toRaster (ferramenta 3D Analyst) no
68 R3 (Risco alto) software ArcGIS 10.3. Com o MDT
finalizado, foi elaboradaa carta de
7 R2 (Risco médio)
declividade por meio da ferramenta
2 R1 (Risco baixo) RasterSurface (ferramenta 3D Analyst) no
mesmo software.As classes do mapa de
A Prefeitura do Recife vem realizando declividade (legenda) foram geradas a partir
medidas mitigatórias no bairro para a da classificação proposta pela Embrapa, que
prevenção de escorregamentos durante os
indica seis classes de relevo de acordo com
períodos chuvosos. Além do monitoramento
a declividade: relevo plano de ≅0-1,3°,
das áreas de risco, são colocadas algumas
ações estruturais, tais como lonas plásticas, suave ondulado de ≅ 1,3-3°, ondulado ≅
gel impermeabilizante, construção de muros 3-9°, forte ondulado ≅ 9°-20°, montanhoso
de arrimos e retirada de resíduos sólidos nas ≅ 20-33° e escarpado ≅> 33°.
encostas, além da remoção de famílias onde
as situações são mais perigosas. Para a análise conjunta, os mapas de
ocorrências (inventário de
Apesar da existência de ações estruturais e escorregamentos) e a Carta de Declividade
não estruturais, observa-se no local a foram sobrepostos, permitindo a relação
existência de várias encostas cobertas com entre as classes de declividade com o
lonas, muitas vezes por longos períodos e de quantitativo de episódios de
forma definitiva e não paliativa (Figura 3). escorregamentos na área.
133

RESULTADOS E DISCUSSÕES taludes naturais, áreas de solo exposto e


com grande quantidade de resíduos sólidos
Inventário dos escorregamentos (Figura 5).

O inventario preliminar dos Carta de Declividade e Análise Conjunta


escorregamentos permitiu a criação do
Mapa de Ocorrências (Figura 4), com a A declividade é um dos parâmetros
representação espacial das áreas em que topográficos fundamentais para
ocorreram os processos. Dessa forma, compreender processos de
foram registradas 90 ocorrências de escorregamentos, sobretudo em áreas muito
escorregamentos entre os anos 2013 e 2016 íngremes. Assim, foram geradas seis classes
em áreas de risco, indicando uma alta de declividades, representadas pelo grau de
recorrência de eventos no bairro de Nova inclinação das encostas conforme
Descoberta. classificação da Embrapa (Figura 6).

Em geral, os processos foram verificados Os resultados da carta de declividade


em relevos de topo arredondados com indicam que o bairro possui em sua maioria
sedimentos terciários de deposição fluvial, encostas muito íngremes (cerca de 70%) em
típicos da Formação Barreiras, com solos áreas entre 9º e 20º e 20º e 33º já
suscetíveis e em áreas de precipitações naturalmente muito suscetíveis à
anuais elevadas. Do ponto de vista deflagração de movimentos de massa
antrópico, observa-se que boa parte dos (Figura 6).
processos ocorreu em encostas íngremes e
densamente ocupadas com cortes em

Figura 3: Ações estruturais pouco conservadas para a proteção de encostas (lonas desgastadas).
134

Figura 4: Mapa das Ocorrências de escorregamentos

Figura 5: Encostas densamente ocupadas no bairro de Nova Descoberta das quais foram registradas ocorrências
de escorregamentos.
135

Figura 6: Carta de declividade com pontos de ocorrências dos escorregamentos

Em uma análise conjunta, as ocorrências de


escorregamentos foram sobrepostas à carta
de declividade, visando-se uma análise da
influência deste parâmetro na deflagração
dos processos (Figura 7). A classe de
declividade forte ondulada (9º-20º)
apresenta a maior frequência
(aproximadamente 53%) concentrando
29% das ocorrências de escorregamentos.
Já a classe montanhosa (20º-33°) ocupa
apenas 19% da área, mas foi a que Figura 7: Percentual entre classes de declividade
apresentou o maior número de ocorrências (em azul) e ocorrências de escorregamentos em
de escorregamentos (aproximadamente cada classe (em vermelho).
63% dos processos), enquanto as classes
menos declivosas (abaixo de 9º) Por exemplo, Lopes et al (2007), realizaram
apresentaram poucas ou quase nenhuma uma pesquisa na região da Serra do Mar
ocorrência, indicando que houve uma alta Paulista em Cubatão (SP), onde também foi
coincidência entre classes muito declivosas realizado um inventário de
e a ocorrência de escorregamentos, escorregamentos. Nessa pesquisa, as
conforme já amplamente verificado em cicatrizes de escorregamentos também
muitos casos da literatura geomorfológica aumentaram de acordo com a elevação das
(Figura 7). classes de declividade.
136

CONSIDERAÇÕES FINAIS Bacia do Ribeirão Belchior, Gaspar, Santa


Catarina. Revista Geonorte, 3, (4).
O presente trabalho ainda se encontra em
Carvalho, C.S.; Ogura; A.T.; Macedo, E.S.; (2007)
sua fase inicial de pesquisa, no qual se Mapeamento de Riscos em Encostas e Margens
buscou compreender os fatores de Rios. Ministério das Cidades / Instituto de
condicionantes dos escorregamentos no Pesquisas Tecnológicas – IPT.
bairro de Nova Descoberta, neste caso, em
especial a influência da declividade. Nesse CPRM (Serviço Geológico do Brasil). (2016) Geo
Bank GIS, Setorização de Risco Geológico.
sentido, verificou-se uma alta coincidência
entre o inventário de escorregamentos e as Felgueiras, C.A.; Câmara, G; (2004) Modelagem
classes mais declivosas. Numérica de Terrenos. In Introdução à Ciência
da Geoinformação. Câmara, G.; Monteiro, A.M.
O inventário de escorregamentos se mostra Medeiros, J.S.de. (Org). São José dos Campos,
um importante instrumento inicial que INPE.
identifica as áreas de ocorrências dos
Fundaj (Fundação Joaquim Nabuco). (2007) Mapa
processos e uma primeira análise de de Exclusão/Inclusão Socioambiental do Recife.
suscetibilidade e subsidia mapeamentos
futuros, tais como cartas de risco, novas Instituto Nacional de Metrologia (IMMET). (2016)
cartas de suscetibilidade a partir de outras Climatologia do Meses e Trimestres de Maiores
metodologias, bem como a validação destes ou Menores Temperaturas e Pluviosidades
médias no período de 1961-2009. Brasília.
mapeamentos, que serão elaborados em
trabalhos futuros. Lopes, E.S.; Riedel, P.S.; Bentz, C.M.; Ferreira,
M.V.; Naleto, J.L. (2007) Inventário de
Com relação às medidas estruturais vistas Escorregamentos Naturais em Banco de Dados
em campo para a proteção de encostas, Geográfico – Análise dos Fatores
existe a necessidade da aplicação de obras Condicionantes na Região da Serra de Cubatão –
SP. Annais do XIII Simpósio Brasileiro de
estruturais e não estruturais mais Sensoriamento Remoto, Florianópolis.
duradouras, tais como muros de arrimo,
retaludamentos, entre outras, uma vez que Neto, D.S.; Costa, B.L. (2004) Uso de
as ocorrências de escorregamentos têm se Geotecnologias Para Mapeamento de Risco
mostrado frequentes na área. Obtido por Meio de Inventário de Cicatrizes de
Deslizamentos na Bacia do Rio Cachoeira no
Município de Niterói-RJ. Annais do VII
REFERÊNCIAS Congresso Brasileiro de Geógrafos.

Alheiros, M.M.; Souza, M.Â.A.; Bitoun, J.; Parise, M. (2001) Landslide mapping techniques and
Medeiros, S.M.G.M.; Júnior, W.M.A. (2003) their use in the assessment of the landslide
Manual de Ocupação dos Morros da Região hazard. PhysicsandChemistryofthe Earth. 26, (9),
Metropolitana do Recife. 697-703.

Alheiros, M.M. (1998) Riscos de Escorregamentos Rosa, R. (2005) Geotecnologias na Geografia


na Região Metropolitana do Recife. Aplicada. Revista do Departamento de
Geografia, 16, 81-90.
Bauzys, F. (2012) Mapa de Inventário dos
Movimentos de Massa Ocorridos no Alto da
FEIÇÕES COSTEIRAS: ATRATIVOS PARA O GEOTURISMO
COMO APLICABILIDADE PARA A GEOCONSERVAÇÃO

Brenda Rafaele Viana da Silva e Elisabeth Mary de Carvalho Baptista

costeiras são áreas constituídas por uma


INTRODUÇÃO grande diversidade de ecossistemas,
proporcionados pela interface entre os
As zonas costeiras representam um sistema meios aquático e terrestre, apresentando,
economicamente produtivo, e se assim, um conjunto ímpar de relações entre
caracterizam pela complexidade das os seres vivos que neles habitam e os
atividades que abrigam, bem como pela elementos físicos que os compõem. Neste
sensibilidade de seus ecossistemas contexto estão inseridos ecossistemas como
(Gregório, 2009). O crescimento da manguezais, dunas, restingas, marismas,
população nesta região resulta na praias, estuários, deltas, promontórios,
exploração e degradação destes ambientes recifes de coral e recifes de arenito.
(Pereira, Jimenéz e Medeiros, 2003).
Assim, as zonas costeiras são dotadas de
Deste modo, a maior parcela da população potenciais e valores geológicos e
nacional se aloca em áreas litorâneas, onde geomorfológicos (geodiversidade), sendo
se encontram núcleos essenciais da atributos de interesse para o
dinâmica demográfica brasileira (Moraes, desenvolvimento do Geoturismo, e
2007), na qual esta parcela é responsável consequentemente do processo de
pelo uso exagerado e inconsequente de seus Geoconservação.
recursos, trazendo inúmeras consequências
para essas áreas. O Geoturismo é uma modalidade turística
que promove a geodiversidade e sítios com
As zonas costeiras são sistemas altamente interesse geológico e geomorfológico
complexos, resultantes da intercepção da devidamente protegidos e conservados
hidrosfera, da geosfera, da atmosfera e da (Lima, 2011). A geodiversidade
biosfera. É precisamente desta compreende os elementos abióticos do
complexidade que resultam não apenas a geossistema, ou seja, compõe um dos tripés
elevada variabilidade que apresentam, mas que envolve a análise integrada da
também as grandes potencialidades que as paisagem, a qual pode ser analisada através
caracterizam (Moraes, 2007). Nesse da conjunção dos fatores abióticos, bióticos
sentido, Baptista (2010) afirma que as zonas e antrópicos. E por Geoconservação
138

entende-se que se relaciona à conservação compreensão dos conceitos de


da geodiversidade ou diversidade natural Geodiversidade e Geoconservação.
considerando os aspectos e processos
geológicos, geomorfológicos e de solo, A utilização do termo geodiversidade é
mantendo a evolução natural desses relativamente recente e, segundo Covello
aspectos e processos. (2011):

Dessa forma, o objetivo deste trabalho começou a ser utilizado a partir de 1990 e
se consolidou nos últimos anos dessa
constitui-se em identificar e analisar quais década, sendo aplicado, principalmente,
feições costeiras de modo geral podem ser nos estudos de Geoconservação, voltados
consideradas atrativos geoturísticos com à preservação do patrimônio natural, tais
fins para a Geoconservação. como: geoparques, monumentos
geológicos, paisagens naturais, entre
outros (Covello, 2011:38).
MATERIAIS E MÉTODOS
Para alguns autores como Santos (2012), a
Para realização da pesquisa o procedimento geodiversidade se limita apenas ao conjunto
metodológico empregado foi a Pesquisa de rochas, minerais e fósseis, já para outros
Bibliográfica, a qual segundo Gil (1996) se como Gray (2004) e Brilha (2005), este
constitui na atividade de leitura e análise de conceito é mais abrangente, integrando as
material já elaborado, principalmente livros comunidades abióticas e bióticas, onde a
e artigos científicos, com o intuito de geodiversidade atua em equilíbrio constante
agregar a contribuição de diversos autores com a biodiversidade. Sharples (2002:60)
sobre determinado tema ou objeto. Neste define a geodiversidade como: “a
trabalho o estudo bibliográfico foi realizado diversidade de características, assembleias,
através de artigos, dissertações e teses. sistemas e processos geológicos (substrato),
geomorfológicos (formas da paisagem) e do
RESULTADOS E DISCUSSÕES solo”. A definição proposta no ano de 2002
pela Sociedade Real para Conservação da
Apresenta-se discussão acerca das Naturezado Reino Unido destaca que: a
temáticas referentes à Geodiversidade, geodiversidade consiste na variedade de
Geoconservação e Geoturismo, bem como ambientes geológicos, fenômenos e
apresentar as principais feições costeiras processos ativos que dão origem a
que se constituem em atrativos paisagens, rochas, minerais, fósseis, solos e
geoturísticos. outros depósitos superficiais que são o
suporte para a vida na Terra (Brilha, 2005).
Geoturismo: Geodiversidade e
Apesar da estreita relação entre os conceitos
Geoconservação
de biodiversidade e geodiversidade, quando
O Geoturismo é um segmento da atividade se trata do nível de divulgação dessas
turística que tem o patrimônio geológico temáticas entre a sociedade como um todo,
como seu principal atrativo e busca sua existe um grande empecilho que os separa
proteção por meio da conservação de seus (Santos, 2012). Segundo Nascimento,
recursos e da sensibilização do turista, Ruchkys e Mantesso-Neto (2008), o termo
utilizando para isto, a interpretação deste geodiversidade, ao contrário de
patrimônio tornando-se acessível ao um biodiversidade, ainda é pouco conhecido e,
conhecimento antes só discutido na consequentemente, pouco divulgado e
academia, além de promover sua valorizado entre as pessoas.
divulgação e o desenvolvimento das
Gray (2004) foi um dos primeiros autores a
ciências da Terra. Neste sentido, antes de
classificar os valores atribuídos a
discutir Geoturismo pressupõe trazer a
139

geodiversidade, classificação essa bem um ou mais elementos da geodiversidade


difundida entre os trabalhos acadêmicos com singular valor do ponto de vista
que abordam a presente temática. científico, pedagógico, cultural, turístico ou
Utilizando, essencialmente, as propostas de outro.
Gray (2004), discrimina-se como valores da
geodiversidade: intrínseco, cultural, Para que se aplique o processo de
estético, econômico, funcional, científico e Geoconservação, é necessário que os
educativo. atributos geológicos e geomorfológicos
tenham algum dos valores referentes à
Semelhante a geodiversidade, o termo geodiversidade. Os geossítios surgem como
Geoconservação ainda é considerado pouco uma tentativa de proteger e limitar os
conhecido, em especial no Brasil, e o seu elementos da geodiversidade que uma dada
significado carece ainda de unanimidade área apresente.
entre a comunidade científica. Sharples
(1998) adverte que este termo é o mais As estratégias e etapas da Geoconservação
apropriado para definir as iniciativas de consistem na concretização de uma
conservação da geodiversidade, não apenas metodologia de trabalho que visa
na perspectiva de substrato para a sistematizar as tarefas no sentido da
sustentação de habitats, mas também como conservação do patrimônio geológico de
um conceito abrangente de processos uma dada área. Conforme Brilha (2005),
geológicos naturais. estas tarefas devem ser agrupadas nas
seguintes etapas sequenciais: inventariação,
Sharples (2002:79) resume que o objetivo quantificação, classificação, conservação,
do conceito de Geoconservação relaciona- valorização e divulgação e, finalmente,
se a preservação da geodiversidade ou monitorização. Essas etapas sequenciais são
diversidade natural considerando os fundamentais para a concretização de fato
“significativos aspectos e processos do processo de Geoconservação,
geológicos (substrato), geomorfológicos objetivando a conservação e proteção do
(formas de paisagem) e de solo, mantendo a patrimônio geológico de qualquer área de
evolução natural (velocidade e intensidade) estudo. Neste aspecto a Geoconservação
desses aspectos e processos”. então, pode ser enquadrada no paradigma
da conservação, desenvolvendo atividades
Outros conceitos ligados à presente ou ações que podem ser repetidas por um
temática surgem, como o de patrimônio tempo indefinido.
geológico e o de geossítio, importantes para
a compreensão da Geoconservação. Nieto Considerando que a Geoconservação tem
(2002) define que o: como um dos principais objetivos facilitar o
acesso ao patrimônio geológico e
patrimônio geológico abrange todos geomorfológico para as pessoas, torna-se
aqueles recursos naturais, não renováveis,
incluindo formações rochosas, estruturas
relevante ampliar a discussão sobre esta
e pacotes sedimentares, formas de relevo temática, tendo em vista principalmente o
e paisagens, jazimentos minerais e/ou aprofundamento da abordagem geoturística
fossilíferos e coleções de objetos em regiões costeiras.
geológicos, que apresentem algum valor
científico, cultural ou recreativo (Nieto, Sendo assim, Araújo (2005) afirma que o
2002:52).
Geoturismo é um segmento do ecoturismo
Brilha (2005) classifica como patrimônio que se tem desenvolvido por todo o mundo
geológico o conjunto de geossítios de uma nos primeiros anos do século XXI. Na
dada região, ou seja, conjunto de locais bem realidade há muito tempo que as pessoas se
delimitados geograficamente, onde ocorrem deslocam para visitar “maravilhas
geológicas e geomorfológicas”, no entanto,
140

só nas últimas décadas do século XX é que um segmento da atividade turística que


se verifica uma real aposta neste setor tem o patrimônio geológico como seu
principal atrativo e busca sua proteção por
específico, com a divulgação da meio da conservação de seus recursos e da
geoconservação. Dessa forma, o sensibilização do turista, utilizando para
Geoturismo é considerado uma vertente do isto, a interpretação deste patrimônio
ecoturismo, pelo que deve assentar nos tornando-se acessível ao público leigo,
princípios do turismo sustentável. Segundo além de promover sua divulgação e o
desenvolvimento das ciências da Terra
Hose (2000 apud Brilha, 2005) essa Azevedo (2007:23).
abordagem geoturística já tem sido
desenvolvida ao longo dos tempos, Entende-se pelos conceitos abordados, que
inconscientemente e involuntariamente, no o Geoturismo ainda é um conceito em
que diz respeito a expedições à vulcões, construção, mas que se insere na vertente do
visitas as águas termais e até mesmo na ecoturismo, voltado para Geoconservação
extração de jazidas minerais. de áreas naturais. De acordo com Lorenci
(2013) no Geoturismo, está presente a
Na visão de Araújo (2005) o seu preocupação com a sustentabilidade dos
desenvolvimento tem como embasamento a recursos geológicos e das comunidades
geodiversidade e/ou o patrimônio geológico envolvidas, de forma a promover o
de uma dada área. Lopes (2011) afirma que desenvolvimento econômico, social,
essa prática geoturística busca a cultural, ambiental ao mesmo tempo em que
compreensão dos fenômenos geológico- se utilizam recursos interpretativos e
geomorfológicos atuantes no local visitado, recursos educacionais para tornar a
assim como promover as Ciências da Terra experiência do geoturista satisfatória.
e o desenvolvimento sustentável das
comunidades envolvidas. Segundo Lopes Assim, entende-se que o Geoturismo
(2011), o Geoturismo promove a juntamente com as ações promovidas com a
Geoconservação do patrimônio geológico e Geoconservação e o estudo da
envolve as comunidades locais através das geodiversidade de determinada área, pode
atividades econômicas sustentáveis, colaborar substancialmente para a
aumentando a oferta de emprego e renda, conservação, valorização e divulgação dos
beneficiando o turista a partir da atrativos geológicos e geomorfológicos,
disponibilização de serviços, produtos e dando ênfase neste estudo para as feições
suprimentos. costeiras de modo geral que detêm esse
potencial.
De acordo com Barreto (2007) o
Geoturismo é:
Principais Feições Costeiras: atrativos
uma ponte entre o turismo e a geologia, geoturísticos
haja vista que esse seria inclusive um dos
papéis fundamentais do Geoturismo - ter As zonas costeiras, possuem uma
o grande público com o seu principal alvo,
despertando o interesse pela Geologia da dinâmica e elementos naturais que por si
área, aguçando a curiosidade nesse ramo mesmas, já as tornam como atrativos em
das paisagens naturais (Barreto, 2007:31). muitos sentidos. A geodiversidade
(diversidade natural dos elementos
Desse modo, o Geoturismo teria então os abióticos) existente nas áreas costeiras
conhecimentos não só da Geologia, mas consiste numa gama de ambientes
também da Geomorfologia, como diferentes, mas que se relacionam uns
principais atrativos para os geoturistas. Na com os outros, possuindo valores
visão de Azevedo (2007) o Geoturismo relevantes dotados de diversidade
pode ser entendido como: natural.
141

As principais feições e elementos das Por sua vez, os recifes de arenito se


zonas litorâneas que podem se apresentam em formas paralelas à costa,
constituírem atrativos geoturísticos: apresentando-se constituídos de arenito,
Falésias, Campos de Dunas, Praias, resultante da consolidação de antigas
Promontórios, Costões Rochosos, Recifes linhas de praias, ou a partir de um ou
de Arenito, Recifes de Arenito de Praia mais bancos de areia consolidada, tendo
(Beachrocks), Eolianitos, Planícies como base geológica a sedimentação com
Fluviais, Planícies Flúvio-Marinhas, carbonato de cálcio ou óxido de ferro
Estuários, Delta, entre outros. A seguir (Baptista, 2010:78). De acordo com
têm-se a descrição dessas feições Ferreira Júnior, Araújo e Sial (2013)
costeiras que podem se constituir como arenitos de praia ou beachrockssão
elementos para a prática geoturística. sedimentos litificados na zona intermaré
Segundo o Serviço Geológico do Brasil e formados mediante a precipitação de
(2008:151) falésias podem ser definidas carbonato de cálcio. Em geral, estão
como “escarpas costeiras abruptas não dispostos paralelamente à linha de costa
cobertas por vegetação, que se localizam e apresentam forma alongada e estreita.
na linha de contato entre a terra e o mar, Suguio (1992:83) em estudo afirma que
sendo do tipo ativa ou inativa” e por isso eolianitossão “depósitos eólicos
se constituem em importantes atrativos cimentados por carbonatos em ambiente
geoturísticos de zonas costeiras, continental com diagênse próxima à
evidenciando-se assim o seu potencial. superfície, envolvendo principalmente
De acordo com Lima (2005) os campos de águas pluviais, sendo relativamente
dunas possuem relevo ondulado formado a recentes sem forma definida”. Para Lima
partir da deposição de sedimentos pela (2005:130) as planícies fluviais nos
deflação eólica, transportada da praia, os aspectos geomorfológicos, caracterizam-
quais são depositados pelas correntes, ondas se por “uma área de sedimentação,
e marés. Já Popp (2010) define praia como principalmente no fundo do canal e nas
sendo: margens, sendo mais arenosas com
algum teor de matéria devido à
a área onde ocorre material decomposição ao longo do curso d’água.
inconsolidado, estendendo-se em direção É justamente nas várzeas ou planícies de
à terra, a partir da linha de maré mais
baixa, prolongando-se até o local onde se inundação onde essa sedimentação se
dá a mudança do material que a constitui intensifica”.
ou das formas fisiográficas, como, por
Já as planícies flúvio-marinhas de acordo
exemplo, a zona de vegetação
permanente, de dunas ou de penhascos com Cavalcanti (2000:127) são
costeiros (Popp, 2010:25). “acumulações continentais e marinhas,
com deposição de sedimentos e matéria
As praias em geral são dotadas de atrativos orgânica, compreendendo áreas
geológicos e geomorfológicos consistindo inundáveis com solos indiscriminados
em ambientes que atraem inúmeras turistas recobertos por manguezais e alta
bem como pesquisadores. O promontório produtividade biológica”. Comumente o
rochoso constitui-se em uma encosta que estuário representa um local de
avança mar adentro e “é uma porção desembocadura onde as águas oceânicas
saliente e alta de qualquer área continental, (salinas) e fluviais (doces) misturam-se
que avança para dentro de um corpo nas áreas adjacentes aos continentes
aquoso” (Suguio, 1992:12), que também (Pritchard, 1967 apud Almeida e Suguio,
apresenta inegável valor para a 2011).
Geoconservação.
142

Guerra (2012:100) afirma que delta “é Para visualização das feições costeiras a
um depósito aluvial que se forma na foz se constituírem como potenciais
de certos rios, avançando com um leque geoturísticos a Figura 1.
na direção do mar. Essa deposição exige Portanto, observa-se o potencial
certas condições como: ausência de geológico e geomorfológico existente nas
correntes marinhas, fundo raso, zonas costeiras, podem vir a se
abundância de detritos, etc.” A constituírem como potenciais atrativos
denominação “delta” vem da forma da foz do Geoturismo, como aplicabilidade para
do rio Nilo (Egito) que lembra a quarta a Geoconservação.
letra do alfabeto grego (Guerra, 2012).

Figura 1 – Principais feições costeiras a se constituírem como atrativos geoturísticos: A – Falésias Sete Irmãs, na
Inglaterra; B – Campo de Dunas, em Natal – Rio Grande do Norte; C – Praia da Rocha, em Algarve – Portugal;
D – Promontório Rochoso, em Parnaíba – Piauí; E – Recife de Arenito, em Natal – Rio Grande do Norte; F –
Recife de Arenito de Praia, em Cajueiro da Praia – Piauí; G –Eolianitos, em Algarve – Portugal; H – Planície
Fluvial, em Cajueiro da Praia – Piauí; I – Planície Flúvio-Marinha, em Imbituba – Santa Catarina; J – Estuário,
em Pernambuco; K – Delta, em Parnaíba – Piauí. Fonte: Pires, 2009; Silva, 2014 e 2015; Silva 2013.
143

Azevedo, Ú.R. (2007) Patrimônio geológico e


CONSIDERAÇÕES FINAIS geoconservação no Quadrilátero Ferrífero,
Minas Gerais: potencial para a criação de um
É notório a importância e potencialidade geoparque da UNESCO. Tese (doutorado)
que as zonas costeiras apresentam, Programa de Pós-Graduação em Geologia.
existindo assim no Geoturismo (um Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG.
Belo Horizonte.
segmento da atividade turística que tem o
patrimônio geológico como seu principal Baptista, E.M.C. (2010) Estudo morfossedimentar
atrativo) a tentativa de se conservar, dos recifes de arenito da zona litorânea do
valorizar, bem como divulgar o potencial estado do Piauí, Brasil. Tese (Doutorado)
que estas áreas possuem. Atrelado a essa Programa de Pós-Graduaçõ em Geografia,
Universidade Federal de Santa Catarina,
discussão do desenvolvimento do Florianópolis.
Geoturismo em ambientes costeiros, deve
sempre ser levado em conta a análise das Barreto, J.M.C. (2007) Potencial Geoturístico da
temáticas sobre a geodiversidade e Região de Rio de Contas - Bahia - Brasil.
Geoconservação. Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-
Gradução em Geologia, Universidade Federal da
Bahia – UFBA. Salvador.
As zonas costeiras como um todo, possuem
uma dinâmica e elementos naturais que por Brilha, J.B.R. (2000) Patrimônio geológico e
si mesmas, já as tornam atrativos em muitos geoconservação: a conservação da natureza na
sentidos. Desse modo, as principais feições sua vertente geológica. São Paulo, Palimage.
e elementos das zonas costeiras que podem
se constituir em atrativos geoturísticos são Cavalcanti, A.P.B. (2000) Impactos e Condições
Ambientais da Zona Costeira do Estado do
diversas como: Falésias, Campos de Dunas, Piauí. Tese (Doutorado) Programa de Pós-
Praias, Promontórios, Recifes de Arenito, Gradução em Geografia. Universidade Estadual
Recifes de Arenito de Praia (Beachrocks), Paulista, Rio Claro.
Eolianitos, Planícies Fluviais, Planícies
Flúvio-Marinhas, Estuários, Delta, entre Covello, C. (2011) A paisagem de Itapema: estudo
da geodiversidade para a educação ambiental e
outros. o geoturismo. Dissertação (Mestrado) Programa
de Pós-Gradução em Geografia. Universidade
Portanto, é evidente que as zonas costeiras Federal de Santa Catarina, Florianópolis,
em geral possuem inegáveis potenciais e
valores de sua geodiversidade, no que diz Ferreira Júnior, A.V.; Araújo, T.C. M.; Sial, A.N.
respeito as suas diversas feições, que podem (2013) Gênese dos arenitos de praia no litoral de
Pernambuco interpretada através de estudos
vir a se constituir em atrativos para a isotópicos. Quartenaryand Environmental
atividade do Geoturismo, visando a Geosciences. 4., 9-16.
aplicabilidade e estratégias do processo de
Geoconservação em ambientes costeiros. Gil, A.C. (1996) Como elaborar projetos de
pesquisa. 3. ed. São Paulo, Atlas.

REFERÊNCIAS Gray, M. (2004) Geodiversity: valuing and


conserving abiotic nature. England, Chichester
Almeida, J.R.; Suguio, J.R. (2011) Caracterização
geoambiental dos manguezais brasileiros e suas Gregório, M.N. (2009) Evolução da Linha de Costa
potencialidades para o ecoturismo. Revista e Caracterização da Plataforma Continental
Brasileira de Ecoturismo, Aquibadã, 4, (1). Interna Adjacente à Cidade do Recife – PE. Tese
(Doutorado) Programa de Pós-Graduação em
Araújo, E.L.S. (2005) Geoturismo: Oceanografia, Universidade Federal de
Conceptualização, Implementação e Exemplos Pernambuco, Recife.
de Aplicação ao Vale do Rio Douro no Sector
Porto-Pinhão. Dissertação (Mestrado) Programa Guerra. A.J.T. (2012) Dicionário Geológico –
de Pós-Graduação em Ciências do Ambiente, Geomorfológico. 8 ed. Rio de Janeiro, IBGE.
Universidade do Minho.
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Interna desenvolvida em falésias com aplicação
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Macapá/Luis Correia - PI. Dissertação Geografia, Universidade Federal de Santa
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Desenvolvimento e Meio Ambiente,
Universidade Federal do Piauí, Teresina. Pritchard, D.W. (1967What is an estuary: physical
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Giennenses, 182, 109-122.
ANÁLISE FISIOGRÁFICA DA BACIA HIDROGRÁFICA DO
RIACHO DO PONTAL-PE

Pedro Barbosa de Souza, Paulo Lucas Cândido Farias, Joaquim Pedro de


Santana Xavier; Victor Pina Figueiredo e Arthur Felipe de Melo Teixeira

também gera dados que ampliam o


INTRODUÇÃO inventario de dados científicos.

A bacia hidrográfica é o elemento A manutenção dos recursos hídricos, no que


fundamental de análise do ciclo diz respeito ao regime de vazão dos cursos
hidrológico, principalmente na sua fase d’água e da qualidade de água, decorre de
terrestre que engloba a infiltração e o mecanismos naturais de controle
escoamento superficial (Duarte et al., desenvolvidos ao longo de processos
2007). Ela é uma área de captação natural evolutivos da paisagem (Perico et al.,
da água da precipitação que faz convergir os 2011).
escoamentos para um único ponto de saída,
seu exutório, e limitada perifericamente, Para Ferreira (1997), os SIGs podem ser
pelo divisor de água. Todavia, em função do considerados um instrumento para mapear e
processo de crescimento urbano e sua indicar respostas às várias questões sobre
expansão territorial, cada vez mais, as planejamento urbano e regional, meio rural
bacias hidrográficas têm sofrido alterações e levantamento dos recursos renováveis,
na estrutura física naturais com a construção descrevendo os mecanismos das mudanças
de canais, no aporte de sedimentos, na que operam no meio ambiente e auxiliando
composição da biota, no regime hidráulico o planejamento e manejo dos recursos
e no fluxo de matéria e energia (Perico et naturais de regiões específicas.
al., 2011).
Duarte et al. (2007), também expressam a
O estudo dos recursos hídricos, na importância dos Sistemas de Informações
perspectiva da escala de análise de bacias Geográficas quando afirmam que a
hidrográficas, origina subsídios; índices e utilização de SIGs na determinação das
produtos cartográficos que tem o objetivo características físicas de uma bacia
de dar suporte, tanto para à tomada de hidrográfica (área, fator de forma,
decisões dos gestores e melhor atuação dos coeficiente de compacidade, índice de
diversos atores sociais no sentindo de circularidade, ordenamento de canais e
conservações e gestão do meio ambiente. E densidade de drenagem) vem sendo
amplamente abordada por diversos
146

pesquisadores, que propõem metodologias ÁREA DE ESTUDO


e novas técnicas de análise dessas
características. A bacia hidrográfica do Riacho do Pontal
(Figura 1) se localiza entre 08º19’00” e
A bacia do Riacho do Ponta está presente 09º13’24’’ de latitude sul, e 40º11’42” e
numa região de constante expansão urbana 41º20’39” de longitude oeste, situada no
e agroindustrial ao mesmo tempo apresenta extremo oeste do estado de Pernambuco,
retrocessos ambientais que afetando e com uma área de 6.015,33 km² inserida
alterando tanto na dinâmica social quanto dentro das cidades de Afrânio, Dormentes,
nos processos característicos da região. Lagoa Grande e Petrolina. O riacho
desemboca no rio São Francisco no sentido
Desse modo, o presente trabalho tem por Noroeste-Sudeste abastecendo, assim, um
objetivo demonstrar a utilidade de dos cursos fluviais mais importantes do
ferramentas SIGs para geração de dados e Nordeste. (APAC, 2016). Portanto, a bacia
produtos cartográficos, facilitando trabalho hidrográfica do Pontal desempenha papel
e gestão de bacias hidrográficas usando fundamental para o abastecimento hídrico
como estudo de caso a bacia do Riacho do das áreas circunvizinhas, propiciando a
Pontal-PE. irrigação das agroindústrias e
abastecimento urbano nas cidades.

Figura 1: Delimitação da bacia hidrográfica do Pontal, PE


147

O relevo que consta na região, se caracteriza Para iniciar a análise foi preciso corrigir
como Depressão sertaneja, por apresentar pequenas imperfeições inerentes das
uma superfície de pediplanação bastante imagens de radar SRTM, para isso foi
monótono, com pequenas variações utilizada a função Fill. Com ela espaços
altimétricas, ou seja, uma área extensa com vazios ou incompletos foram preenchidos.
relevos planos a suavemente ondulados. É válido ressaltar que é de extrema
(Filho, 2004). importância que as imagens devem estar o
mais apurado possível para tal análise,
A região apresenta um clima semiárido podendo, assim, extrair informações o mais
quente (BSwh’), com precipitação anual próximo da realidade possível.
entorno de 557,7 mm, mais concentrada
entre os meses de dezembro e março. Prosseguindo, com as imagens corrigidas,
Entretanto a região apresenta um déficit foram gerados novos Rasters com o
hídrico devido a acentuada objetivo de determinar os fluxos
evapotranspiração, 2.090 mm/ano, presente hidrológicos. Inicialmente, a partir do Fill,
na área de estudo. Devido ao clima presente, utilizamos o Flow Direction, que nada mais
a vegetação se apresenta, em sua maioria, na faz do que gerar uma grade digital onde
forma de caatinga arbustiva-arbórea, com a cada célula indica a direção do fluxo
presença de solos do tipo Latossolo d’água. Posteriormente foi obtido a direção
Amarelo, Argilossolos Vermelho-Amarelo, e os locais onde o fluxo se acumula (Flow
Planossolos, Cambissolos, Neossolos Accumulation), considerando, apenas, o
Areias Quartzosas e Neossolos Litólicos na escoamento superficial, através do a grade
bacia do Riacho do Pontal (Silva, 2014). digital gerada anteriormente. Para delimitar,
na bacia, o que será analisado foi preciso
MATERIAIS E MÉTODOS atribuir um limiar igual a 5000, através da
ferramenta Con, com o objetivo de delimitar
Para a realização do trabalho foram usadas sub-bacias de maior área de drenagem. É
quatro imagens SRTM, a SC-24-V-A, a SC- importante notar que o limiar atribuído
24-V-B, a SC-24-V-C e a SC-24-V-D, com limitará a quantidade de sub-bacias, assim
como área da bacia o faz.
resolução de 30m, obtidos do banco de
dados da EMBRAPA, que contemplam o Após a delimitações da rede de drenagem
território da bacia do pontal. no Raster anterior com a ferramenta Con,
foi necessário criar um Shapefile com as
Também foi utilizado o Software ArcGIS
linhas de drenagem, atribuindo valores
10.2, juntamente com alguns dados de
únicos às células para determinar o que é ou
delimitação de municípios, no formato de
não fluxo de drenagem, para isso foi
arquivos Shapefiles disponíveis no IBGE.
utilizado a função Stream To Feature.
Para a o levantamento de informações
Em seguida foi feito um procedimento
através dos Rasters (imagens SRTM), foi
(Stream Link) que consiga distinguir
necessário agrupá-las em um único Raster
intersecções entre os rios, atribuindo
por meio da ferramenta Mosaic to New
valores únicos para os encontros. Agora era
Raster para que o software fosse capaz de
possível o software perceber a existência de
analisar sem qualquer falha ou discordância
rios distintos, ao contrário da função
de resultados. Em seguida, foi utilizada, a
anterior onde os rios eram um único objeto.
operação Extract by Mask com o objetivo de
retirar áreas externas à bacia a partir do A ferramenta Stream Order, foi utilizada a
Raster resultante supracitado. Assim, o fim de atribuir as hierarquias, segundo
software seria capaz de analisar apenas a Strahler, de toda a bacia, se valendo dos
área da bacia do Pontal. Rasters gerados pelo Fill e pelo Flow
148

Direction. É interessante destacar que caracterização de uma bacia Hidrográfica.


mesmo sendo usados os Rasters acima, a Estes índices foram calculados a partir das
hierarquização depende diretamente do equações mencionadas na tabela a seguir
Shapefile gerado pelo Stream Link, pois é a (Tabela 1). Contudo, para a realização dos
partir dele que são distinguidas as junções cálculos foram inseridos novos parâmetros
dos rios. (índices) na tabela de atributos.

Por fim, para a delimitação das sub-bacias RESULTADOS E DISCUSSÕES


foi usada a ferramenta Watershed, onde
Como resultados foram gerados produtos
foram gerados valores únicos para cada
cartográficos, que especializam e
segmento de curso d’água, para tal foi
contextualiza a bacia do pontal e índices que
preciso os Rasters Flow Direction e Stream
são essenciais para a extração de
link. Além da análise do perímetro da bacia
informações da bacia. (Tabela 2). Um
(P) e área da bacia (A). Obtidas através da
exemplo de produto cartográfico é o da rede
ferramenta calculate geometry também do
de drenagem (Figura 2).
ArcGIS 10.2.Também foram calculados
alguns índices importantes para a

Tabela 1: Índices utilizados para o estudo da bacia do pontal

INDICE EQUAÇÃO SIGNIFICADO DOS ÍNDICES


Índice de Circularidade 12,57 . 𝐴 A = área da bacia considerada;
𝐼𝑐 =
(Ic) 𝑃2 P = perímetro da bacia.
Declividade média da bacia ∆h = diferença de altura
Sm = ∆h/ A
(Dm) A = área da bacia
Densidade de drenagem Lt = comprimento total dos canais;
Dd = Lt/A
(Dd) A = área da bacia
Sinuosidade do Rio
Is = 100 (L - Lt)/Lt L= Comprimento do rio principal
(Is)
Coeficiente de compacidade (Kc) P = perímetro da bacia;
Kc = 0,28. P/√A
A = área da bacia.

Tabela 2. Índices da bacia do pontal

INDICE RESULTADOS
Perímetro da bacia (P) 467.17 Km
Área da bacia (A). 6023.12 Km
Comprimento do rio principal (L) 196.20 Km
Índice de Circularidade (Ic) 0.346
Declividade média da bacia (Dm) 2.490x10−07 m
Densidade de drenagem (Dd) 0.1765 Km/Km2
Sinuosidade do Rio (Is) 50.34%
Coeficiente de compacidade (Kc) 1.685
149

Figura 2: Rede de drenagem da bacia do pontal

Sobre a ordem hierárquica da bacia do da bacia é determinada pelo canal de ordem


Pontal, de acordo com a hierarquização de maior.
Strahler (1957), é classificada como uma
bacia de 4° ordem (Figura 3). É composta Existem 81 sub-bacias dentro da área de
por 49 canais, sendo que 37 de 1° ordem, 8 drenagem de 6023.12 Km da bacia do
de 2° ordem, 3 de 3° ordem, 1 de 4° ordem. pontal (Figura 4).
Nesse sistema de classificação todos os
canais sem tributários são de primeira A partir destes dados, podemos extrair
ordem, na confluência entre dois canais de algumas informações, a declividade da
primeira ordem origina um de segunda e na bacia não varia muito, tem aspecto bem
confluência de dois canais de segunda plano, como é de se esperar de uma bacia
origina um de terceira ordem, que pode localizada na unidade geomorfológica da
receber tanto um de primeira como um de depressão sertaneja meridional.
segunda ordem e assim por diante. A ordem
150

Figura 3: Hierarquia da bacia do pontal segundo Strahler (1957)

Figura 4: Sub-bacias da bacia do pontal


151

O canal principal com um comprimento de Desse modo, o trabalho do geógrafo ganha


196.20 Km (Figura 3) percorre forças e valorização ampla, tanto nos
praticamente toda a bacia, com um índice de trabalhos científicos quanto no mercado,
sinuosidade, um fator controlador da pois a utilização do SIG é de suma
velocidade de escoamento das águas, de importância para a tomada de decisões em
50.34% é considerado um rio sinuoso. um plano mestre em uma escala menor ou
(Tabela 2) A densidade de drenagem no planejamento de esfera global, com
apresentou valor de 0.1765 Km/Km2, sendo resolução e detalhamento de informações
considerada uma bacia com baixa Dd, nas diversas particularidades do espaço.
segundo Christofolletti (1969).
REFERÊNCIAS
O índice de circularidade, ou fator de forma
da bacia expressa a tendência de ocorrência APAC, Riacho do Pontal. Disponível em:
de cheias na bacia, quanto mais próximo da <www.apac.pe.gov.br>. Acesso em: 23 nov
unidade, maior a propensão de ocorrer 2016.
cheias. O valor encontrado para a bacia do
Chistofoletti, A. (1969) Análise Morfométrica das
pontal foi de 0.346 indicando um formato Bacias Hidrográficas. Notícias Geomorfológicas
retangular que condiciona o escoamento 9 (18):19-34.
mais eficiente das águas dos canais em
períodos de maior pluviosidade, ou seja, Chistofoletti, A. (1980) Geomorfologia. São Paulo:
tem poucas chances de ocorrência de cheias Edgard Blüchler. 2a ed. 149p.
nessa bacia. (Tabela 2).
Duarte, C.C et al. (2007) Análise Fisiográfica da
Bacia Hidrográfica Do Rio Tapacurá - PE.
O índice que define o grau de irregularidade Revista de Geografia, Recife: UFPE –
da forma de uma bacia, o Coeficiente de DCG/NAPA, 24, (2), 50-64.
compacidade (Kc), que prova o quanto uma
bacia é circular, retangular ou triangular, Ferreira, C.C.M. (1997) Zoneamento Agroclimático
Para Implantação De Sistemas Agroflorestais
mostra para a bacia do pontal, com um valor
Com Eucaliptos, Em Minas Gerais. 156f.
do índice de 1.685, que seu formato se Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-
caracteriza com mais semelhança a de um Graduação em Agronomia. Universidade Federal
retângulo. (Tabela 2). Uma bacia estreita e de Viçosa, Viçosa.
longa, com índice de compacidade maior
que a unidade e índice circularidade menor Filho, J.C.A. (2004) Horizontes cimentados em
Argissolos e Espodossolos dos tabuleiros
que a unidade, apresenta uma menor costeiros e em Neossolos Regolíticos e
possibilidade de ocorrências de chuvas Planossolos da depressão sertaneja no Nordeste
intensas cobrindo concomitantemente toda do Brasil. Tese (Doutorado) Programa de Pós-
a sua área, o que diminui a possibilidade de Graduação em Geoquímica e Geotectônica,
inundação. Instituto de Geociências. Universidade de São
Paulo, São Paulo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Lima, K.C.; Cunha, C.M.Lda; Santos, J.M.dos.


(2010) Análise Geomorfológica da Bacia
Neste contexto a utilização do SIG, foi uma Hidrográfica do Rio Bom Sucesso (Semi-Árido
da Bahia) Através da Aplicação de Parâmetros
ferramenta bastante importante, com ela se Morfométricos da Rede de Drenagem. Revista de
conseguiu os dados e as características Geografia, Recife: UFPE – DCG/NAPA, v.
fisiográficas da bacia de forma mais hábil e especial VIII SINAGEO, 2, 30-44.
precisa. Vale ressaltar que, uma ferramenta
sempre precisa de alguém para manuseá-la Périco, E.; Cemin, G.; Arend, U.; Rempel, C.;
Eckhardt, R.R. (2011) Análise fisiográfica da
de forma correta, como também se precisa bacia hidrográfica do rio Forqueta, RS. In:
de alguém para interpretar estes dados. Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto,
15, 2011, Curitiba, Anais XV Simpósio Brasileiro
152

de Sensoriamento Remoto – SBSR. São José dos Strahler, A.N. (1957) Quantitative Analysis Of
Campos: INPE, 1200-1207. Watershed Geomorphology. New Halen:
Transactions: American Geophysical Union 38:
Silva, E.R.A.C. (2015) Potencial de 913-920.
Desenvolvimento Hidroagrícola no Riacho do
Pontal-PE: subsídios para o uso inteligente da Vilella, S.M.; Mattos, A. (1975) Hidrologia
água. Dissertação (Mestrado), Recife: UFPE – Aplicada. São Paulo: McGraw-Hill.
CFCH/DCG, ed. 22, 2014. SRTM (Shuttle Radar
Topography Mission), NASA. Disponível em:
<www.srtm.usgs.gov>.
COMPARTIMENTAÇÃO GEOMORFOLÓGICA-ESTRUTURAL DE
CAMPINA GRANDE- PB: UMA RELAÇÃO ENTRE FEIÇÕES DO
MODELADO E PADRÕES DE DRENAGEM ATRAVÉS DA
FOTOINTERPRETAÇÃO

Jônatas Nascimento da Costa e Sérgio Murilo Santos de Araújo

recorte espacial do território brasileiro o


INTRODUÇÃO principal evento tectônico ocorreu no ciclo
brasiliano (período entre 950 Ma e 490 Ma,
O planeta Terra é formado por uma extensa segundo CPRM, 2016). Estudado por
variedade de formas em sua superfície Ab’Saber (1952) e Ab’Saber e Bigarella
terrestre e marinha, mas a porção do relevo (1961), com análise do terreno construído
visível e ocupado pelo homem são as terras por esse grande evento orogênico, que
emersas, os chamados continentes, em tais contribuiu para a gênese da província
locais existem uma infinidade de variações geológica da Borborema, umas das
nos terrenos, dos quais os mais marcantes principais províncias da plataforma sul-
são constituídos pelas grandes cadeias de americana, na qual parte do planalto de
montanhas e os vales profundos. A ciência mesmo nome é alvo da pesquisa em foco.
que estuda essas feições é a Geomorfologia,
sendo um ramo da Geografia Física, tendo Na análise morfoestrutural buscou-se
o relevo como principal fonte de estudo. compreender a influência dos mecanismos
Este é construído ao longo das eras e endógenos numa escala regional dos
períodos geológicos, regido por uma série compartimentos do relevo, utilizando
de mecanismos. resgate da Geomorfologia clássica e
contemporânea aliado a novas
Para Penck (1924 apud Corrêa et al, 2010) geotecnologias.
as formas da paisagem são resultados de
forças endógenas e exógenas, seguindo no A pesquisa teve como objetivo analisar a
tempo e espaço, e que as estruturas são compartimentação geomorfológica
resultantes de um jogo de forças internas e estrutural do município de Campina
externas atuantes; para tanto foram Grande-PB, com ênfase nas feições do
utilizados vários conceitos para o enfoque modelado e nos padrões de drenagem,
na área espacial estudada neste trabalho. O através de fotointerpretação do STRM
principal mecanismo gerador de feições (Shuttle Radar Topography Mission).
estruturantes é o tectonismo, e que no
154

ÁREA DE ESTUDO extensas áreas representadas por planaltos,


alinhamentos serranos e depressões
O município de Campina Grande localiza- interplanálticas elaborados em terrenos
se na Mesorregião Agreste do estado da dobrados e falhados, incluindo
Paraíba (AESA, 2010). Tendo uma área de principalmente metamorfitos e granitóides
593,026 Km² (IBGE, 2015), a sede do associados (IBGE, 2009).
município tem uma altitude aproximada de
551 m (CPRM, 2005), a população O relevo está representado pelo Planalto da
campinense está contabilizada com uma Borborema com formas convexas e
estimativa de 407.754 habitantes (IBGE, tabulares (AESA, 2010), com altitude
2016), com uma densidade demográfica de variando entre 250 a 650 m (AESA, 2010),
648, 31 (hab/km²) segundo o Censo 2010 na qual formam um conjunto de terras altas
(IBGE, 2016). A seguir são descritos os no Nordeste oriental brasileiro (Figura 1).
elementos geoambientais da área de estudo.
Num contexto regional da
O município está inserido na Unidade compartimentação tectônica a área possui:
Geoambiental do Planalto da Borborema Granitóides Brasilianos que estão sob
(CPRM, 2005; Embrapa, 2000). Possui um influência da DZT – Domínio da Zona
clima do tipo As’ (quente e úmido com Transversal e que estão inseridos em
chuvas de outono-inverno), segundo a lineamentos e zonas de cisalhamentos
classificação de Köppen e chuvas de 803 (Rodrigues, 2008; Tavares, 2010).
mm/ano (CNPM Embrapa, 2016).
Pela complexidade tectônica e litológica da
Os principais sistemas fluviais são os rios província Borborema, a área de pesquisa
Salgadinho, Bodocongó, São Pedro, do encontra-se em parte dos Terrenos Alto
Cruzeiro e Surrão, além dos riachos Pajeú (TAP) e Alto Moxotó (TAM) (Figura
Logradouro, da Piaba, Marinho, Caieira, do 2). O primeiro(TAP)está distribuído nas
Tronco e Cunha. Os principais cursos áreas: N>NW>NE; sendo formado por
d’água têm regime de escoamento Granitóides (Neoproterozóico Brasiliano
intermitente e o padrão de drenagem é s.l), Granitóides/migmatitos, Rochas
dendrítico (CPRM, 2005), sendo todos supracrustais do Mesoproterozóico
esses pertencentes à área do médio curso da Esteniano (Cariris Velhos), Granitóides
bacia hidrográfica do Rio Paraíba. brasilianos no plúton conhecido por granito
Campina Grande (Super Suíte II -
A vegetação é formada por Florestas Neoproterozóico Brasiliano), segundo
SubCaducifólica e Caducifólica, próprias CPRM, 2002, e que estes detêm as
das áreas agrestes (CPRM, 2005) e os solos seguintes zonas de cisalhamento: de
de Campina grande são os Solo cinemática transcorrente Sinistral (Z.C.
Netzsolodizado (SS), Neossolo Regolítico Matinhas e Z.C. Galante) e de cinemática
Distrófico (RE), Neossolos Litólicos dextral (Z.C. Campina Grande) descritos
Eutróficos (R), Vertissolos (V), Luvissolos por Rodrigues (2008).O segundo(TAM),
Crômicos (NC), segundo Embrapa (2006). está distribuído nas áreas: S> SO> SE; é
formado por Embasamento Gnáissico-
Migmatítico (Arqueano a
Paleoproterozóico), Granitóides/
CONTEXTO GEOLÓGICO E migmatitos do Mesoproterozóico Esteniano
GEOMORFOLOGICO DA ÁREA (Cariris Velhos) e Granitóides
A geologia e geomorfologia estrutural da (Neoproterozóico Brasiliano s.l) (CPRM,
área são compostas de Cinturões Móveis 2002).
Neoproterozóicos – Compreendendo
155

Figura 1: Mapa Hipsométrico e Níveis topográficos da cidade-pesquisa: Organizado por COSTA, 2016; Base de
dados: AESA, 2016; CPRM, 2016.

Figura 2: Mapa Geológico simplificado. Adaptado de CPRM, 2005.


156

base nas informações teórico-


MATERIAIS E MÉTODOS metodológicas, definiu-se a grandeza
escalar do modelado da pesquisa; e neste
A pesquisa foi desenvolvida pelas seguintes caso, a escala de abordagem ficou
etapas metodológicas: 1) Busca e leitura de compreendida na 4ª ordem de grandeza
referências bibliográficas, sob os princípios geomorfológica proposta pelo IBGE
clássicos e atuais da Geomorfologia e (2009), que estão realçados em linha
Geologia; 2) Coletas e observações de vermelha na Figura 3. No que se refere ao
imagens de satélite (Landsat 5 TM e 8 conceito de modelado, o mesmo abrange
ETM+, Google Earth) e relacionadas às um padrão de formas, na qual apresentam
fotografias aéreas disponibilizadas pelo geometrias similares, devido haver uma
Geobank do CPRM (Serviço Geológico do gênese comum e de processos
Brasil – CPRM / Esri. HERE De Lome. morfogenéticos atuantes, resultando na
MapmyIndia. © recorrência dos materiais correlativos
OpenStreetMapcontributors, andthe GIS superficiais (IBGE, 2009). 5) Com os
usercommunity / EarthstarGeographics, resultados obtidos foram desenvolvidos
CNES/ Airbus DS.), os dados imagéticos mapas, melhor maneira de se representar
são resultados do STRM; 3) Para análise uma análise geomorfológica. Para isso,
morfoestrutural das imagens foi utilizada a foram utilizados os softwares ArcGis 8.0, o
interpretação Foto-Geológica, com o programa de computação gráfica
Método Lógico-Sistemático (Guy,1966 CorelDRAW X7® e tratamento de imagens
apud Arcanjo, 2011), na qual utiliza de no Adobe Photoshop CS6 Extended®, nos
conjuntos ou zonas homólogas para estudo quais cada tema foi abordado e discutido
do relevo com repetições de texturas e sobre a área espacial e suas características
formas, e no estudo das propriedades do relacionadas a autores referenciais da
relevo e dos elementos texturais e Geomorfologia.
estruturais. 4) De posse das imagens e com

Figura 3: Estrutura da Geomorfologia. Adaptado de IBGE (2009).


157

falhas ou similares, ou em rochas de menor


RESULTADOS E DISCUSSÕES coalescência (ex. gnaisses).

A pesquisa foi pautada na fotointerpretação No que tange os dois tipos de modelados


e conhecimentos prévios da área, onde as (1A e 1B), homogêneos (D) e estruturais
características visíveis de texturas e formas (DE), respectivamente, eles podem possuir
corroboraram para os resultados. Valendo- outras subclassificações, as formas de topo,
se das metodologias empregadas, foram são elas: as formas de topos convexos (c)
identificados os seguintes tipos de que em nossa situação são esculpidas em
modelados na cidade de Campina Grande, rochas ígneas e metamórficas, em alguns
enumerados e seguindo a classificação e pontos denotando controle estrutural. São
simbologia do IBGE. caracterizadas por feições entalhadas por
sulcos e cabeceiras de drenagem, e alguns
Modelado do Tipo 1 – Dissecados–Este com características de alongamento. As
tipo de modelado são os mais recorrente na formas de topos tabulares (t) tem uma
paisagem brasileira, nossa área de pesquisa analogia visual de lombadas, geralmente
há uma presença marcante dessas formas, esculpidas em rochas metamórficas, ou
dividindo-se em: Modelado Tipo 1 A – áreas de formação superficial (acumulação
Dissecados Homogêneos (D) e Modelado ou autóctone). Possuem uma rede de
Tipo 1 B – Dissecados Estruturais (DE). drenagem de baixa densidade, com vales
Os dois são definidos pela forma dos topos rasos, normalmente com vertentes de
e pelo aprofundamento e densidade da pequena declividade. Resultam da
drenagem. Com as feições de topo do relevo instauração de processos de dissecação,
classificadas em: convexas (c), tabulares (t) atuando sobre uma superfície aplainada,
e aguçadas (a). Destacamos os seguintes esta feição de topo é bastante citada em
tipos na cidade de Campina Grande: levantamentos clássicos na área de
pesquisa.
No Modelado Tipo 1 A – Dissecados
Homogêneos (D) Tem uma feição de fácil Modelado do Tipo 2 - Plano de Inundação
observação textural, possuindo colinas e (Ai) – Possui uma morfologia a bacia da
morros,seu padrão de drenagem é o (côncava), com solos arenoso e/ou argiloso
dendrítico, porém com algumas (IBGE, 2009), sujeita ou não a inundações,
peculiaridades pontuais, na qual serão sob condições pluviométricas acima da
abordadas posteriormente. No Modelado normalidade ou em um curto espaço
Tipo 1 B – Dissecados Estruturais (DE) a temporal, em nossa área de pesquisa se
dissecação fluvial é marcada por influências comportam nas linhas de drenagem com
estruturais, principalmente em áreas de sinuosidade ou áreas mais planas com
bastante rede de drenagem (Figura 4).

Ai

Ai

Ai

Figura 4: Modelado tipo 2 – Ai (área SO da cidade).Imagem Google earth modificada pelo


autor, 2016. Foto do Autor, 2016.
158

Modelado Tipo 2 – Crista Simétrica – transcorrentes em morfoestruturas


Forma de relevo residual alongada, que constituídas por rochas rígidas (IBGE,
inversa a sua faces, mas tem constituição 2009). A escarpa de falha tem
litológica homogênea na área, inferindo que características de faces trapezoidais ao
a paleodrenagem esculpiu o entorno da prosseguimento da erosão (Figura 6).
feição de crista simétrica na área SE da
cidade (Figura 5). Modelado do Tipo 4 – Vale ou Sulco
Estrutural– Estas são formas de vale
Modelado do Tipo 3 – Escarpa de falha– originado a partir de falha, fratura ou
Esta feição é resultante de processos diáclase, submetida à tectônica rúptil, de
erosivos remontantes, acompanhando ocorrência litológica generalizada (IBGE,
paralelamente uma zona de falha. Ocorre 2009). A litologia na área pesquisada são de
nas zonas de falhamentos verticais e/ou granitoides (Figura 7).

Crista simétrica, caso de Campina Ilustração de crista assimétrica.


Grande.Produzido: Costa, 2016.
Fonte: IBGE, 2009.

Figura 5: Modelados de crista simétrica.

Modelo esquemático de escarpa de


Relevo sombreado e Esquema da escarpa de falha, em Campina
falha. Fonte: Arcanjo (2011).
Grande. Produzido: Costa, 2016.

Figura 6: Representações de Escarpa de falha com facetas triangulares/ trapezoidais.

Modelo esquemático de vale ou sulco estrutural.


Relevo sombreado e Esquema da Vale ou sulco
estrutural Caso C. Grande. Produzido: Costa, 2016. Extraído: IBGE, 2009.

Figura 7: Representações de vale e sulco estrutural.


159

Modelado Tipo 5 – Aplanamento ou de dureza ele está sendo degradado, na área


Aplainamento – Estas feições apresentam está inserido o granito Campina Grande
pouco dissecadas, que podem ser separada (Rodrigues, 2008), também contém cristas
por escarpas. Com inclinações suaves e simétricas com a drenagem inversa as faces
possuindo coberturas detríticas e/ou de desse modelado. O compartimento C4
alteração, e que na área da pesquisa muitos ocupa grande parte do município, possuindo
setores estão sob condições deposicionais em geral formas de dissecação homogênea
pretéritas, fazendo assim seu aplanamento, com topo convexo, também controlado por
este faz parte das categorias de Modelados cisalhamentos e falhas tendo interferência
de Acumulação. estrutural.

Sabins (1996 apud Maia, 2014) define que


OUTRAS CARACTERÍSTICAS
lineamentos são feições que podem
GEOLÓGICAS E
representar uma zona de fraqueza estrutural,
GEOMORFOLÓGICAS
tendo características quase retilíneas; seu
ESTRUTURAIS
mapeamento pode ser simples ou
As conhecidas quebras de relevo ou zonas compostos, e que em alguns pontos na
homólogas (Arcanjo, 2011) são abordadas escala da pesquisa os lineamentos não são
de diversas ópticas, principalmente a partir observáveis, indicando assim que foram
das semelhanças de elementos texturais e submetidas à deposição e ou mascaramento
estruturais, fazendo uma relação entre por coberturas de solo. Na geomorfologia,
contatos litológicos, linhas de gênese rúptil lineamentos representam variações na
(Zonas de cisalhamento e falhas), elevação, alinhamento de cristas, segmentos
microrelevos (convexos e côncavos), para de escarpas, trechos de drenagem e vales
junção de tais elementos propomos um (Jordan; Schott, 2005apud Maia, 2014),
mapa esquemático na qual aborda as sendo este um importante indicador
principais feições do modelado, atrelando tectônico para o estudo evolutivo do relevo,
as condições geológicas e de zona de principalmente numa escala regional.
ocupação urbana (Figura 8). Ressalta-se que Campina Grande e região
adjacente, inserem-se no contexto tectônico
No compartimento tipo C1, observou-se do Domínio da Zona Transversal – DZT,
que o modelado possui uma elevada taxa de contendo megacisalhamentos e ao ser feita
dissecação do relevo, seguindo um padrão uma relação geocronológica percebeu-se
preferencial das áreas de tectônica falhadas, que grande parte dos complexos e suítes
ou sulcos estruturais, escarpas de falhas e presentes no município teve origem no
formas que apresentam aparente grau de Neoproterozóico (CPRM, 2002 e 2005),
declividade de suas vertentes, precisando comandado pelo geodinamismo do Ciclo
assim um estudo morfométrico da área C1. Brasiliano e que nesses domínios
No compartimento tipo C2, observa-se um distribuem-se inúmeras suturas. No que se
modelado de aplainamento ou que alguns refere às estruturas rompidas e ou
autores chamam de pediplanície, essa área deformadas, observa-se que estas
possui um relevo suave devido a sua área de influenciam na esculturação do relevo. Para
drenagem e ser um possível local de isso, citam-se a presença de fatores de
deposição das áreas mais altas e íngremes resistência com rochas graníticas, rochas
no norte do município. No compartimento quartzosas e feldspáticas e outros minerais
C3 existe um alto grau de dissecação com claros, e fatores de fraqueza com rochas
semelhanças com o C1, controlado por rede micacéas, biotita ou outros minerais
fluvial erodindo e depositando no relevo, máficos.
mesmo tendo um comportamento litológico
160

Figura 8: Mapa dos elementos Geológicos-Geomorfológicos Estruturais do município. Produzido por Jonatas
Costa, 2016.

classificado em: muito fraco (1); fraco (2);


Características da drenagem
médio (3); forte (4); e muito forte (5).
Para análise e caracterização da drenagem (Figura 9).
do município, com suas particularidades
De forma geral, a drenagem de Campina
devido às diferenças do terreno, adotou-se a
Grande configura-se com um padrão
seguinte classificação quanto à densidade
dendrítico, reforçando assim toda literatura
de drenagem, que relaciona o comprimento
generalizada histórica do município.Mas
total dos canais e a área amostrada (IBGE,
ressalta-se que grande parte da rede
2009), dividida em: muito grosseira (1);
hidrográfica tem padrão direcional sentido
grosseira (2); média (3); fina (4); e muito
N>S, o que configura o padrão sub-
fina (5), representadas nos compartimentos
dendrítico de Arcanjo (2011) e outras
na Figura 9. Sob a óptica do estudo textural,
microformas de drenagem.Na área N da
são as incisões no relevo que configuram a
cidadeexistem alguns pontos alinhados de
competência erosiva fluvial diante das
nascentes, alinhamento de segmentos de
características litológicas; ademais,
direção N>S, com estruturas de drenagem
utilizou-se a metodologia de classes de
tipo candelabro;na área SW tem uma
aprofundamento das incisões (IBGE,
estrutura ovalada o que corresponde uma
2009). As duas caracterizações propostas
dissecação em rochas menos competentes
são propícias área da pesquisa, pois são
(no caso os ortognaisses) ou mecanismos
aplicáveis aos modelados de dissecação
(homogêneo e estrutural), sendo concêntricos complexos na área (Figura 9,
D1).
161

Figura 9: Mapa de drenagem de Campina Grande. Fonte: elaborado por Jonatas Costa,2016.

destas caracterizações. Quanto à drenagem


CONSIDERAÇÕES FINAIS natural, classifica-se um padrão dendrítico,
que variam em espaçamentos, com
As evidências reunidas nesse trabalho uniformidade e simetria e também sem estas
pautadas no estudo Geológico- características (desuniformidade e
Geomorfológico permitiram orientar as assimetria). E que nos compartimentos C1 e
considerações abaixo sobre a C4 possuem um padrão direcional de seus
Geomorfologia estrutural de Campina fluxos no sentido N-S, também variando de
Grande. direção no compartimento C3,
direcionando–se no sentido N-SE, devido às
Os aspectos das formas e texturas linhas das falhas e sua esculturação pela
permitiram delimitar os compartimentos drenagem ali estabelecida.
que variam dos tipos C1 ao C4, essas
estruturas marcam e influenciam a rede de
drenagem, e que em alguns pontos esta rede REFERÊNCIAS
remonta indícios de um passado ora de Ab’Saber, A.N. (1952) O Planalto da Borborema na
erosão (C1) e outros de acumulação (C2). Paraíba. 1952. n. 13, 54-73 p. Boletim Paulista
As diferenças de altitude, as litologias e a de Geografia, São Paulo.
gravidade controlam o desenvolvimento
desses dois processos na evolução do Ab’Saber, A.N; Bigarella, J.J. (1961) Considerações
sobre a geomorfogênense da Serra do Mar. 4/5,
relevo.
4-110. Boletim Paranaense de Geografia,
Curitiba.
A evolução tectônica regional proporcionou
também grande influência para o AESA. Agencia Executiva de Gestão das Águas do
retrabalhamento do relevo, pois são Estado da Paraíba. (2016) Geoportal AESA.
observadas várias zonas de cisalhamento e 2016. Disponível em
<http://geo.aesa.pb.gov.br/>
fraturas também visíveis e descritos em
trabalhos anteriores; mas outras não são Arcanjo, J.B.A. (2011) Fotogeologia: conceitos,
visíveis em aerofotografias e nem métodos e aplicações. Salvador, CPRM/SGB.
mapeáveis, colocando assim a necessidade
de desenvolvimento de estudos Correa, A.C.B., Tavares, B.A.C., Monteiro, K.deA.,
aprofundados e pesquisas de campo afim Cavalcanti, L.C.deS. e Lira, D.R.de. (2013)
162

Megageomorfologia e morfoestrutura do Grande. Dissertação (Mestrado) Universidade


planalto da Borborema. 31 (1/2), 35-52. Revista Federal de Campina Grande.
do Instituto Geológico, São Paulo.
http://www.uep.cnps.embrapa.br/solos/index.php?li
CPRM - Serviço Geológico do Brasil. (2002) nk=pb>.
Geologia e Recursos Minerais do Estado da
Paraíba. Organizado por Edilton, J., Alves, C., IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica.
Ferreira, J.M. Recife: CPRM. (2009) Manual técnico de geomorfologia. IBGE,
Coordenação de Recursos Naturais e Estudos
CPRM - Serviço Geológico do Brasil. (2005) Projeto Ambientais. 2. ed. Rio de Janeiro, IBGE.
cadastro de fontes de abastecimento por água
subterrânea. Diagnóstico do município de IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Campina Grande, estado da Paraíba. Organizado (2016) Disponível em:
Mascarenhas, J.deC.; Beltrão, B.A; Souza <http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang
Junior, L.Cde, Morais, F.de; Mendes, V.A; =&codmun=250400&search=paraiba|campina-
Miranda, J.L.Fde: CPRM/Prodeem. grande |infograficos:-informacoes-completas>.

CPRM - Serviço Geológico do Brasil. Maia, R.P.; Bezerra, F.H.R. (2014)


SIGEP/Glossário. 2016. Disponível em Condicionamento estrutural do relevo no
<http://sigep.cprm.gov.br/glossario/verbete/bras Nordeste setentrional Brasileiro. 13, 127-141.
iliano.htm>Acesso em: 12 de Dez de 2016. Mercator (UFC).

Embrapa. Empresa Brasileira de Pesquisa Rodrigues S.W.O. (2008) Evolução estrutural


Agropecuária. (2016) Solos. Disponível em< brasiliana da Província Borborema na região de
Campina Grande (PB). Tese (Doutorado)
Embrapa. Empresa Brasileira de Pesquisa Instituto de Geociências, USP.
Agropecuária. CNPM /Bdclima. 2016.
Disponível em Tavares, B.deA.C. (2010) A participação da
<https://www.cnpm.embrapa.br/projetos/bdclim morfoestrutura na gênese da compartimentação
a/balanco/resultados/pb/134/balanco.html> geomorfológica do gráben do Cariatá, Paraíba.
Dissertação (Mestrado), Universidade Federal de
Henrique, F.deA.N. (2006) Estimativa da Pernambuco, Recife.
evapotranspiração de referência em Campina
PROPRIEDADES MORFOMÉTRICAS COMO INDICATIVO DE
SUBSIDÊNCIA E CRIAÇÃO DE ESPAÇOS DE ACUMULAÇÃO
SEDIMENTAR NO OESTE PERNAMBUCANO
Drielly Naamma Fonsêca, Bruno Araújo Torres, Daniel Rodrigues de Lira,
Rhandysson Barbosa Gonçalves e Antonio Carlos de Barros Corrêa

propôs de modo inicial, o Índice Relação


INTRODUÇÃO Declividade Extensão (RDE) que indicaria
áreas anômalas nos perfis longitudinais da
A correlação entre a rede de drenagem e o drenagem, posteriormente aperfeiçoados
arcabouço litológico/estrutural está atrelada por Etchebehere (2000) em seu estudo para
a uma abordagem há muito consolidada nos uma bacia no oeste do Estado de São Paulo.
estudos geomorfológicos. Através do Com base nestas premissas, o propósito
aperfeiçoamento das técnicas de desta pesquisa recai sobre como a
geoprocessamento, houve um intenso identificação de setores anômalos na rede
enriquecimento nos estudos de cunho de drenagem auxiliam na identificação de
ambiental, haja vista que estes permitem a setores onde há rupturas de patamares no
obtenção de resultados bastante detalhados. relevo e como estes setores estão
Assim, os parâmetros morfométricos são relacionados aos setores onde há deposição.
utilizados na distinção de segmentos
anômalos e em equilíbrio, especificados no
primeiro caso, pelas irregularidades e ÁREA DE ESTUDO
deformações ao longo dos trechos, ao passo A área para estudo está inserida em duas
que o segundo contaria com declives suaves bacias hidrográficas no oeste do Estado de
e constantes. Pernambuco, entre os limites dos Estados
do Piauí e Bahia (Figura 1), estando grande
Desta maneira, os estudos que tratam sobre
parte no município de Afrânio, no caso da
o perfil longitudinal das drenagens irão
bacia riacho do Pontal, ao passo que a
consolidar as interpretações no tocante do
denominada bacia de Pequenos Rios
papel da erosão diferencial, do controle
Interiores 8 (GI8) se localiza em parte do
litoestrutural, além das identificações
município de Petrolina. O riacho do Pontal
acerca de deformações recentes (Hiruma e
desemboca na margem esquerda do rio São
Riccomini, 1999; Etchebehere et al., 2006;
Francisco, após percorrer uma distância de
Marques Neto e Perez Filho, 2013;
aproximadamente 200 km, apresentando
Monteiro et al., 2014). Em 1973, Hack
164

direcionamento predominante NW-SE, com por Almeida et al. (1977), especificamente


uma área total de 6.015,33 Km². Já a bacia a Província Borborema que é constituída
GI8 é formada por pequenos riachos que por terrenos ou faixas de dobramentos
também desaguam na margem esquerda do associados às orogêneses do
rio São Francisco, onde pode se destacar os Mesoproterozoico e do Neoproterozoico,
riachos Vitória, das Porteiras, Salina, além dos granitóides correlatos, incluindo
Bebedouro e Imburana, com extensão de no fragmentos antigos do
máximo 34 km e uma área total de 1.298,22 Arqueano/Paleoproterozoico, bacias
Km². sedimentares sin-rift do Mesozoico, além
das coberturas superficiais recentes.
Estruturalmente, a área está compreendida
entre duas províncias estruturais definidas

Figura 1: Localização da área pesquisada.


165

Está representada, principalmente, pelo seu unidades litológicas de idade Cenozoicas


Domínio Externo (Santos et al., 1999), quaternárias (Holoceno e Pleistoceno),
fundamentalmente caracterizada pela união limite Terciário-Quaternário,
dos terrenos formadores por uma tectônica Paleoproterozoico e Arqueano, enquanto
thrusts neoproterozoicos, com generalizado que a bacia do Riacho do Pontal apresenta
transporte em direção ao Cráton do São só sua porção final dentro desde domínio
Francisco, demonstrando bem o regime estando, portanto, a porção mais extensa
convergente colisional dessa margem sobre o domínio da Província Borborema,
sanfranciscana. A heterogeneidade do com unidades litológicas que vão do limite
domínio parece refletir uma herança do Terciário-Quaternário, passando pelo
embasamento ou um comportamento Neoproterozoico, Mesoproterozoico, até o
geológico heterogêneo, cujo arranjo Paleoproterozoico.
desencontrado de peças crustais, sobretudo
em nível extra faixa, sugere a chegada de PROCEDIMENTOS
terrenos tectono estratigráfico distintos METODOLÓGICOS
junto à margem do Cráton do São
Francisco, atrelada a uma convergência A rede de drenagem é o primeiro elemento
desencadeada a partir do fim do da paisagem a responder a qualquer
Mesoproterozoico, culminando na deformação crustal e, desta maneira, os
Orogenia Brasiliana, no final do parâmetros morfométricos são amplamente
Neoproterozoico (Santos e Caldasso, 1978). utilizados, sobretudo no contexto de
margens passivas. Estes procedimentos
A segunda província, a Província São foram empregados em trabalhos pioneiros
Francisco, equivalente ao Cráton do São desenvolvidos por Horton (1945), Strahler
Francisco (Almeida et al., 1981), (1952), Shreve (1966), dentre outros a nível
caracterizada como entidade de mundial, enquanto que no contexto nacional
consolidação pré-brasiliana, com história foi Björnberg (1969) o primeiro a inserir
evolutiva desde o Arqueano até o métodos com linguagem matemática com a
Neoproterozoico. Na área, está representada finalidade de hierarquizar e magnificar a
pela sua terminação N-NE, congregando no rede de drenagem.
seu embasamento por suítes
metaplutônicas, sequências metavulcano- Através da perspectiva sistêmica inserida
sedimentares, greenstonebelts e cinturões nos estudos geomorfológicos a partir da
granulíticos de idade arqueana a década de 1960, é que a análise processual
paleoproterozoica (Jardim de Sá, 1994). passou a ser mais bem considerada, em
Ademais, é capeada discordantemente por detrimento da análise interpretativa
metassedimentos paleoproterozóicos e davisiana, uma vez que a dinâmica
sedimentos meso e neoproterozoicos superficial passou a ser considerada como
litificados, não dobrados ou afetados por importante fator no desenvolvimento do
uma tectônica epidérmica, além de modelado (Christofoletti, 1980). Desta
coberturas superficiais pelítico-psamítico- maneira, o primeiro estudioso a definir com
psefíticas e carbonáticas, de idades Tércio- sucesso um método quantitativo que
quaternárias e quaternárias (Souza e Jardim evidenciasse as alterações nos canais
de Sá, 1989). devido ao controle estrutural foi Hack, que
em 1973 propôs um índice, no qual
Geologicamente, a área em questão pode afirmava que a drenagem estaria em
ser sumarizada da seguinte maneira: a bacia equilíbrio geomorfológico a partir do
de Pequenos Rios Interioranos está estabelecimento de uma relação entre a
totalmente inserida no domínio do Cráton declividade e a extensão do segmento
do São Francisco, representado por fluvial.
166

Perfil Longitudinal das drenagens trechos selecionados e estabelece


parâmetros correlativos entre as anomalias
As formas mais comuns de representação na drenagem e os níveis de energia corrente
morfométrica da drenagem se dá pelos (streampower) do rio, que por sua vez são
perfis longitudinais plotados em gráficos de um reflexo da capacidade do rio erodir o
coordenadas cartesianas, empregando como substrato rochoso e transportar a carga
variáveis as diferentes cotas altimétricas sedimentar. Tais índices são indicadores
(H) ao longo do canal no eixo das sensíveis da mudança na declividade de um
ordenadas, à medida que no eixo das canal, podendo ser reflexo dos diferentes
abscissas, plotam-se os dados referentes à controles litológicos e, consequentemente,
extensão da drenagem (L), originada na diferente resistência à erosão hídrica e/ou
cabeceira ou na foz do rio da qual resulta o atividade tectônica (Etchebehere, 2000).
gradiente do canal no trecho estudado e
expresso pela equação [H=f/(L)] O índice é calculado a partir da fórmula
(Etchebehere et al., 2004). SLtrecho= (∆h/∆l).L, onde o∆h irá
corresponder à diferença altimétrica entre
McKeownet al (1988) consideram que o dois pontos extremos de um rio ao longo do
formato côncavo dos perfis longitudinais canal, ao passo que o ∆l será correspondente
demonstraria um curso d’água em à projeção horizontal do segmento. O L, por
equilíbrio, podendo ser descrita por uma sua vez, representa o comprimento total do
equação exponencial. Caso ocorra qualquer curso d’água à montante do ponto para qual
alteração no perfil, a corrente tende a se o índice está sendo calculado (Figura 2).
ajustam em busca de um novo equilíbrio,
seja erodindo o próprio leito, seja
propiciando agradação (Hack, 1957).
Assim, curvas com menor concavidade
indicariam condições de desequilíbrio,
assim como a convexidade indicaria
possíveis soerguimentos tectônicos ou
diferenças litoestruturais sobre as formas.

Na elaboração dos perfis longitudinais da


drenagem das bacias estudadas foi adotado
a drenagem extraída do Modelo Digital de
Elevação (MDE), com resolução espacial
de 30 m, elaborados a partir dos dados de Figura 2: Parâmetros utilizados no cálculo RDE.
radar da missão Shuttle Radar Topography Fonte: Etchebehere et al, 2006.
Mission (SRTM), utilizando como critério a
medição dos cursos d´água com extensão Os setores anômalos serão considerados a
superiores a 10 Km e a escolha dos trechos partir do momento que os valores de SLtrecho
anômalos com distâncias superiores a 10 m, sejam superiores a 2, sendo estas anomalias
indicados para a escala de trabalho, subdividas em primeira e segunda ordem,
conforme Guedes (2008). conforme proposto Seeber e Gornitz (1983),
onde as de primeira ordem deverão
apresentar valores igual ou superior a 10, ao
Relação Declividade X Extensão do curso
passo que as anomalias de segunda ordem
d’água (RDE) irão possuir valores entre 2 e 10.
Traduzindo tais valores para suas
Pela metodologia estabelecida por Hack
representações na paisagem, as anomalias
(1973), na qual consiste na interpretação
de primeira ordem estariam presentes em
dos perfis longitudinais da drenagem ou
áreas com declividade acentuada, enquanto
167

que as anomalias de segunda ordem RESULTADOS E DISCUSSÕES


contariam com declividades um pouco
acima do ajuste ideal para o padrão de As bacias do Riacho do Pontal e GI8
drenagem. abrangem um total de quatro municípios no
Estado de Pernambuco, estando à primeira
Tomando por base a teoria do equilíbrio inserida totalmente no município de
dinâmico proposto por Hack (1975) Afrânio, além de parcialmente nos
parâmetros quantitativos foram municípios de Dormentes, Lagoa Grande e
estabelecidos, levando em consideração a Petrolina, ao passo que a bacia de Pequenos
competência erosiva da drenagem e sua Rios Interiores, está completamente
relação com o perfil longitudinal, haja vista inserida no município de Petrolina,
que o sistema irá variar de acordo com a incluindo a área do sítio urbano. Ambas as
quantidade de material retirado pela erosão, bacias possuem drenagem com padrão
além da quantidade de material adicionado, dendrítico, cujas formas dos canais são em
tento em vista a ação da tectônica e o tempo sua maioria retilíneos e controladas pela
que este material permanece ou não na estrutura geológica, onde os drenos se
paisagem, devido aos parâmetros adaptam às redes de fraturas. Há uma
litoestratigráficos. grande quantidade de canais de primeira
ordem que drenam diretamente para os
O índice RDE das bacias analisadas teve sua canais principais, denotando uma rede com
aplicação objetivada na identificação das baixa hierarquia. A tabela 01 apresenta os
quebras de patamar atreladas à tentativa de resultados dos índices para as bacias, sendo
elucidação em qual das categorias quatro canais analisados para a bacia GI8 e
(competência erosiva atrelada a controles dezenove canais para a bacia riacho do
morfoclimáticos, resistência litoestrutural Pontal. Destrinchando a tabela, nota-se que
e/ou controle tectônico) as anomalias vão há dois comportamentos distintos nas duas
estar inseridas. Neste sentido, foram bacias analisadas. A bacia GI8 apresenta
utilizadas curvas de nível com equidistância uma relação direta entre quanto maior a
de 20 m, ou seja, cada segmento extensão do rio, maior é o valor do índice
compreendido entre duas isoípsas RDE. Entretanto, na bacia do riacho do
subsequentes foi calculado e quantificado Pontal esta relação não é estabelecida, pois
com a finalidade de estabelecer um maior para além dos valores de índice RDE
detalhamento das rupturas ao longo do superior a 20 dos principais drenos, a
canal principal e seus tributários. exemplo do riacho do Pontal, a bacia conta
com drenos que a relação é inversa, ou seja,
Posteriormente, elaborou-se uma tabela mesmo tendo uma extensão inferior a 35 km
relacionando os valores com o RDEtrecho e apresenta valor para o índice de RDE
com os valores de RDEtotal com o propósito elevado, como o riacho da Melancia cujo
de identificação dos setores anômalos e valor é de 21. Da mesma maneira,
posterior confecção de mapa de distribuição drenagens com extensão considerável,
destas anomalias. Subsequentemente, como o riacho São Bento, que possuem
realizou-se visitas à campo para a apuração quase o dobro da extensão do riacho da
das áreas de ocorrência de anomalias de Melancia, mas possui índice RDE com
primeira ordem, na tentativa de atestar a valor pouco superior a 12. Estes valores e
ocorrência ou não de rupturas de patamar e estas relações já são um forte indício que as
quais as prováveis explicações do mesmo. bacias apresentam um intenso controle
estrutural em escala local.
168

Tabela 1: Resultados RDE para as bacias GI8 e Riacho do Pontal.


Nome do rio Linha reta (m) Curso do rio (m) Diferença de altitude RDE
Cota Cab. Cota Foz Amplitude (m)
Bacia de Pequenos Rios Interiores – GI8
Rch. Malaquias 25814 31960 460 380 80 7,72
Rch. Porteiras 35821 28347 480 380 100 9,76
Rch. Baraúna Velha 20917 23553 440 380 60 5,96
Rch. Imburana 33282 39370 480 360 120 11,34
Rch. Bebedouro 14650 17215 400 360 40 4,1
Bacia Riacho do Pontal
Rch. do Pontal 135608 188650 680 360 320 26,34
Rch. do Simão 16470 19434 420 380 40 4,1
Rch. Terra Nova 14511 17170 480 420 60 6,15
Rch. Jardim Terra Nova 27798 36703 560 400 160 15,22
Rch. Sítio Novo 17725 22229 500 400 100 10
Rch. do Tanque 20075 22543 500 420 80 8
Rch. Tigre Novo 30485 33680 480 400 80 7,68
Rch. do Caboclo 55520 56274 680 440 240 21,93
Rch. do Caldeirão 29624 30548 580 440 140 13,55
Rch. da Melancia 28265 34014 680 460 220 21
Rch. do Dormente 69982 90920 680 400 280 25,53
Rch. Poço Barreiro 16310 18963 680 500 180 18,27
Rch. da Roça 12473 14190 600 480 120 12,55
Rch. Poço do Prença 24638 32340 540 440 100 9,63
Rch. São Bento 49504 66165 540 400 140 12,62
Rch. Passo da Pedra 25.166 26725 500 400 100 9,81
Rch. da Formosa 26516 29256 480 380 100 9,72
Rch. do Poço 44235 55446 520 360 160 14,65
Rch. Jatobazinho 21658 25577 500 360 140 13,79

Todos os 24 canais analisados apresentam ordem estão concentradas no setor sudeste


algum tipo de anomalia morfométrica. das bacias, na confluência com o rio São
Contudo, somente foram observadas Francisco (Figura 3), enquanto que as
anomalias de 1º ordem em quatro canais na demais anomalias vão estar normalmente
bacia do riacho do Pontal e em três canais associadas aos controles litoestruturais
na bacia GI8, todos eles com extensão regionais.
maior que 10 Km. As anomalias de 1º
169

Figura 3: Distribuição espacial das anomalias morfométricas nas bacias riacho do Pontal e GI8.

Petrolina, a bacia drena também os


Perfil longitudinal da bacia riacho do
municípios de Dormentes e Lagoa Grande,
Pontal entretanto, apenas o município de Afrânio
está inserido totalmente na área da bacia,
O dreno principal que dá nome a bacia tem
estando ainda as sedes municipais dos
suas nascentes no município de Afrânio,
outros três municípios inseridas totalmente
onde possui o nome de riacho Cachoeira do
ou parcialmente dentro da bacia, como no
Roberto e, a partir do município de
caso do sítio urbano de Petrolina.
Petrolina passa a ser chamado pelo nome
atribuído à sua bacia hidrográfica. O riacho O perfil longitudinal do riacho do Pontal se
desemboca na margem esquerda do rio São apresenta relativamente bem ajustado à
Francisco, após percorrer uma distância linha de tendência, apresentando uma
aproximada de 200 km, tendo um concavidade que, de certo modo, indica que
direcionamento predominante de NW-SE. a drenagem está bem ajustada ao relevo
Além dos municípios de Afrânio e
170

(Figura 4). As primeiras quebras de relativamente constantes de anomalias de 2º


patamares estão relacionadas às cabeceiras ordem, havendo um novo aumento no
atreladas a mudanças bruscas na índice para 5,9 que no gráfico coincide com
declividade. Somente a partir da isoípsa de o perfil longitudinal do rio ultrapassa a linha
460 m, onde o índice de Hack alcança o de melhor ajuste, indicando que a partir
valor de 4,3, podendo ser considerado o deste trecho a drenagem se encontra em
primeiro patamar de quebra em direção a desequilíbrio. Tal ponto, pode ser
Depressão Sertaneja. considerado como mais uma quebra de
patamar, neste caso, em direção a antiga
A partir deste ponto, toda a drenagem planície do rio São Francisco.
parece se encaixar e se ajustar, como
observado no perfil longitudinal,
apresentando valores para o índice

Figura 4: Perfil longitudinal do riacho do Pontal.

A partir deste ponto há um contínuo extremamente recentes, uma vez que a


aumento nos índices, culminando na drenagem não teve tempo suficiente para se
anomalia de 1º ordem, na confluência do ajustar e voltar ao equilíbrio.
riacho do Pontal com o rio São Francisco,
cujo índice de Hack tem o valor de 15,0. A Das drenagens da bacia que apresentaram
explicação para este valor tão expressivo no anomalias de 1º ordem, o perfil do riacho
trecho final da drenagem do riacho do Poço da Prensa faz parte do conjunto dos
Pontal, possivelmente está atrelado a drenos da área definida como alta bacia. Este
mudanças do nível de base do rio São riacho apresenta uma extensão de pouco mais
Francisco devido a mudanças climáticas, de 32 km e tal qual as outras drenagens deste
responsáveis por diminuir a vazão deste e o setor, apresenta uma concavidade pouco
acentuada (Figura 5) demonstrando um
consequente abandono dos seus terraços.
equilíbrio bastante tênue. Toda a extensão da
Tais mudanças levaram ao regime de
drenagem apresenta anomalias de 2º ordem,
semiaridez atual, fazendo com que os com o índice de Hack aumentando
antigos sedimentos do terraço passassem a progressivamente, o que corrobora com a
servir como barragem para o dreno do ideia de um equilíbrio tênue. Entretanto,
riacho do Pontal, uma vez que este não somente a partir da isoípsa de 480 m é que o
possui capacidade hídrica parar carrear os perfil longitudinal mostra o desequilíbrio da
sedimentos como carga de fundo. Ademais, drenagem, se posicionando acima da linha
pode-se inferir que tais mudanças são de melhor ajuste.
171

Figura 5: Perfil longitudinal do riacho Poço do Prença.

A partir deste ponto, o índice de Hack passa algumas convexidades ao longo do trajeto
de 3,9 para 5,9 e quando se leva em (Figura 6). Esmiuçando o perfil
consideração a litologia sob esta drenagem, longitudinal, nota-se que mesmo a
percebe-se que neste setor há uma mudança drenagem apresentando anomalias por toda
brusca de uma litologia metamórfica para sua extensão, somente a partir da isoípsa de
uma litologia intrusiva, o que explicaria 460 m que os valores aumentam
esse aumento no índice de Hack devido à significativamente, coincidente com a
uma maior resistência litológica frente ao convexidade no perfil e na paisagem
poder erosivo da drenagem. No trecho final marcada pelo primeiro knickpoint
da drenagem, por volta de 440 m o índice de observado no perfil longitudinal do riacho
Hack demonstra a ocorrência de uma do Pontal e do riacho Poço da Prensa.
anomalia de 1º ordem no valor de 16,4 que
não pode ser explicado por diferenças A interpretação de que a partir deste
litológicas, como no trecho à montante. Este patamar há uma ruptura no relevo atrelado
valor anômalo no trecho final do riacho ao estruturamento regional, se dá pelo fato
Poço da Prença pode ser explicado, tal qual, que assim como os perfis anteriores, neste
como demonstrado no perfilo longitudinal setor não há mudanças litológicas que
do riacho do Pontal, como o primeiro justifiquem tais anomalias, nem tampouco a
knickpoint de caráter local em direção à ideia de que há uma carga sedimentar que
Depressão Sertaneja, sendo a diferença de crie o desnivelamento. Ainda analisando o
um canal para o outro a magnitude desta perfil longitudinal deste dreno, percebe-se
quebra, que no riacho Poço da Prença se que a partir da cota de 420 m o canal passa
apresenta bastante brusca. a demonstrar uma tendência ao
desequilíbrio, em relação à linha de melhor
O terceiro canal da bacia riacho do Pontal ajuste, corroborado pelo aumento do índice
que possui índices de Hack representativos, de Hack e culminando numa anomalia de 1°
ou seja, setores anômalos de 1º ordem é o ordem cujo valor é de 11,7 na isoípsa de 400
riacho São Bento, um afluente da margem m. Este patamar pode ser considerado um
esquerda do riacho do pontal com pouco segundo knickpoint de caráter estrutural,
mais de 66 km de extensão. Em comparação responsável pela criação de espaços de
aos dois outros canais analisados, este acomodação para a sedimentação
apresenta perfil longitudinal semelhante ao colúvio/aluvial, conforme proposto por Lira
do riacho do Pontal, apresentando uma (2014).
concavidade relativamente acentuada e com
172

Figura 6:Perfil longitudinal do riacho São Bento.

setor, a drenagem conflui com a do riacho


Perfil longitudinal da bacia de Pequenos
Imburana que ainda percorre mais alguns
Rios Interiores GI-8 quilômetros até desaguar no rio São
Francisco.
O grupo de bacias de Pequenos Rios
Interiores é formado por pequenos riachos O riacho Imburana, ao contrário do anterior,
na margem esquerda do rio São Francisco, exibe um perfil com uma concavidade mais
totalmente inseridos no município de acentuada, mesmo apresentando anomalias
Petrolina, com extensões não superiores a de 2° ordem por toda a sua extensão, tal qual
40 Km. Assim como os rios da bacia riacho o perfil longitudinal do riacho do Pontal.
do Pontal, os drenos da bacia GI8 também Este maior equilíbrio, se comparado aos
apresentam setores anômalos por toda sua demais canais da bacia GI8, pode ser
extensão, cujo os valores do índice de Hack respondido por conta da homogeneidade
vão aumentando gradativamente à medida litoestrutural durante todo o percurso, não
que se aproxima da calha do rio São causando rupturas de patamares. Somente a
Francisco, sendo em três dos drenos partir da cota de 360 m é que o perfil
encontrados anomalias de 1º ordem, com os longitudinal exibe o desequilíbrio da
valores mais representativos para toda a drenagem e onde o índice de Hack mostra
área estudada. uma anomalia de 1º ordem com valor 25,68,
bastante expressivo para as duas bacias.
De maneira geral, todos os canais desta
bacia apresentam perfis longitudinais com Já a drenagem do riacho Bebedouro exibe
uma concavidade muito pouco acentuada, um perfil longitudinal completamente em
isto é, não podem ser considerados como desequilíbrio, uma vez que há uma
drenagens em equilíbrio. Exemplo disso é o convexidade bastante ressaltada em relação
perfil longitudinal do riacho Baraúna Velha à linha de melhor ajuste (Figura 8). Esta é
(Figura 7) que possui uma curvatura muito uma drenagem relativamente curta com
próxima da linha de melhor ajuste, uma extensão que não ultrapassa os 20 km,
claramente demonstrando um desequilíbrio. o que pode explicar o pouco equilíbrio da
No que tange aos valores para o índice de drenagem. Ao contrário das demais
Hack, a drenagem conta com anomalias de drenagens da bacia GI8, as anomalias deste
2º ordem que vão aumentando de valor riacho contam com valores altos desde as
progressivamente até a isoípsa de 380 m, suas nascentes, a partir da isoípsa de 400 m
onde o índice atinge o valor de 11,1, que apresenta valor de 6,44 para o índice de
indicando uma anomalia de 1° ordem. Neste Hack. Poucos quilômetros a jusante deste
173

ponto, na cota de 360 m, a drenagem do que os antigos terraços do rio São Francisco
riacho Bebedouro apresenta uma anomalia foram abandonados e, consequentemente,
de 1° ordem com o valor de 71,95, o mais estes pequenos rios passaram a ter que
elevado para as duas bacias analisadas. escavar os antigos sedimentos fluviais até
confluir com o dreno principal. Estas
Os perfis longitudinais destas drenagens pequenas drenagens, no entanto, não
demonstram o evidente desequilíbrio destes tiveram nem tempo nem condições
canais, corroborados pelos valores obtidos suficientes para atingir o equilíbrio,
pelo índice de Hack bastante elevados. Tais ratificando a hipótese aventada por Lira
dados validam as interpretações de que as (2014) que as condições morfoclimáticas
mudanças no nível de base no rio São atuais para a área são fruto de uma
Francisco, por conta de mudanças modificação recente.
climáticas, foram responsáveis pelo
desequilíbrio destas drenagens. Tal
desequilíbrio se deu a partir do momento

Figura 7: Perfil longitudinal do riacho Baraúna Velha.

Figura 8: Perfil longitudinal do riacho Bebedouro.


174

Almeida, F.F.M.; Hasui, Y.; Brito Neves, B.B.;


CONSIDERAÇÕES FINAIS Fuck, R.A. (1981) Brazilian structural provinces:
an introduction. Earth Science Reviews, 17, 1-29.
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bacias do riacho do Pontal e GI8, além das Björnberg, A.J.S. (1969) Contribuição ao estudo
subsequentes evidências encontradas em cenozoico paulista: tectônica e sedimentologia.
São Carlos, SP. Tese (Doutorado) Programa de
campo, atestoua aplicabilidade do método Pós-Graduação em Geociências, Universidade
como a finalidade de identificar de forma de São Paulo, 1969.
mensurada a ocorrência de quebra de
patamares em escala regional e local. Os Christofoletti, A. (1980) Geomorfologia. 2ed., São
RDEs da área estudada, que embora Paulo, Edgar Blücher.
inserida em diversos contextos
Etchebehere, M.L.C. (2000) Terraços
morfoestruturais no Nordeste brasileiro e neoquaternários no Vale do rio do Peixe,
compartimentos que ainda não estão Planalto Ocidental Paulista: implicações
devidamente elucidados, trouxe dados estratigráficas e tectônicas. Rio Claro, SP. Tese
pertinentes aos controles litoestruturais (Doutorado) Programa de Pós-Graduação em
sobre a drenagem e como tais controles se Geociências, Universidade Estadual Paulista.
expressam na paisagem. Assim, os setores Etchebehere, M.L.C.; Saad, A.R.; Fulfaro, V.J.;
com anomalias na bacia riacho do Pontal, Perinotto, J.A.J. (2004) Aplicação do índice
serviram como norteadores do “Relação Declividade-Extensão - RDE” na bacia
comportamento desajustado da drenagem e, do rio do Peixe (SP) para detecção de
sobretudo, como guia dos knickpoints deformações neotectônicas. Revista do Instituto
de Geociências, 4, 2, 43-56.
regionais podendo ser interpretados como
delimitadores dos compartimentos de Etchebehere, M.L.C.; Saad, A.R.; Santoni, G.;
relevo, bem como responsáveis pela criação Casado, F.C.; Fulfaro, V.J. (2006) Detecção de
de espaços de acomodação para os prováveis deformações neotectônicas no vale do
sedimentos colúvio/aluvial. Para além dos rio do Peixe, região ocidental paulista, mediante
aplicação de índices RDE (Relação Declividade-
controle estrutural evidenciados pelas Extensão) em segmentos de drenagem.
anomalias de 1° ordem dos tributários do Geociências, 25, (3), 271-287.
riacho do Pontal, as anomalias de 1° ordem
encontradas nos drenos da bacia GI8 e do Guedes, I.C. (2008) Aplicação de Análise flúvio-
próprio riacho do Pontal resultou na morfométrica na bacia hidrográfica do rio Santo
Anastácio – SP para detecção de deformações
interpretação de mudanças no nível de base
neotectônicas. Guarulhos, SP. Dissertação
do rio São Francisco de caráter climático e (Mestrado), Universidade Guarulhos.
recente como responsáveis pela exposição
de antigas feições deposicionais, agora Hack, J.T. (1957) Studies of longitudinal stream
expostas ao trabalho erosivo destas profiles in Virginia and Maryland. U. S.
drenagens que não tem capacidade hídrica Geological Survey Professional Paper, 294-B,
45-97.
nem tiveram tempo suficiente para
retrabalhar tais sedimentos. Hack, J.T. (1973) Stream profile analysis and stream
gradient index. Journal Research of U.S.
Geological Survey, 1, 421-429.

Hack, J.T. (1975) Dynamic equilibrium and


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Nordeste, 8, Campina Grande – PB. Atas do Hiruma, S.T.; Riccomini, C. (1999) Análise
Simpósio de Geologia do Nordeste. Campina morfométrica em neotectônica: o exemplo do
Grande: SBG, Núcleo Nordeste, 363-391. planalto de Campos do Jordão, SP.Revista do
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176
ANÁLISE DOS ÍNDICES RDE NA BACIA DO RIO MAMANGUAPE,
PARAÍBA
Rhandysson Barbosa Gonçalves, Drielly Naamma Fonsêca eAntônio Carlos
de Barros Corrêa

das áreas fontes e receptoras de sedimentos


INTRODUÇÃO terrígenos (Ollier, 1985; Thomas, 1994).
Embora a maior parte da sua evolução
A evolução geomorfológica depende de geomorfológica dependa do complexo
uma interação dinâmica entre os fatores tectônico/estrutural herdado das fases de
endógenos e exógenos de formação do rifteamento continental do Mesozoico
relevo. Os fatores exógenos desencadeiam Superior são notáveis as evidências de
processos denudacionais e deposicionais reativações tectônicas ocorridas ao longo do
que, associados aos processos endógenos, Cenozóico, estabelecendo uma nova
fornecem os registros morfológicos hierarquização de formas denudacionais e
necessários para o estudo da evolução da agradacionais sobrepostas ao arcabouço
paisagem. Inúmeras pesquisas vêm sendo mais antigo. Nesta linha de investigação,
realizadas desde o início da década de 1940 estudos geocronológicos recentes têm
no intuito de identificar e classificar as mostrado que a porção oriental da Província
superfícies deposicionais no território Borborema, e suas bacias marginais
brasileiro, a partir da delimitação de adjacentes, vêm sofrendo episódios
grandes compartimentos regionais calcados recorrentes de epirogênese pelo menos
em sucessivos eventos erosivos de escala desde o final do Cretáceo, e especialmente
temporal longa (Bigarella e Ab’saber, 1964; durante o Neógeno (Lima Filho et al, 2006,
Demangeot, 1961; Demartonne, 1943; Bezerra et al., 2008).
Dresch, 1957; Ruellan, 1956).
Segundo Gerbova e Tikhomirov (1962) a
As bacias sedimentares marginais neotectônica vem chamando a atenção de
brasileiras, apesar de estarem situadas em estudiosos desde o século XIX, quando
um contexto tectônico de margem pesquisadores russos como Sokolov, em
continental passiva, não são completamente 1939, e Schurovsky, em 1965 perceberam
inativas tectonicamente, estando sujeitas a que a configuração da crosta da Terra não
uma lenta e contínua deformação tectônica, acontecera apenas no passado, como se
que até mesmo ao longo do Quaternário, defendia naquela época, mas ocorreria
tem resultado na modificação morfológica também no tempo presente. Então,
178

começaram a surgir as primeiras precipitação no território da BHRM, da Foz


metodologias de reconhecimento de ao Planalto da Borborema (Nascente).
movimentos neotectônicos, estando
relacionados com as mudanças e geração de O recorte espacial foco deste estudo insere-
novas formas na paisagem geomorfológica. se no contexto de uma bacia de margem
Sendo relevantes para o desenvolvimento continental passiva, neste caso a Bacia
dessa fase inicial, os estudos de Davis em Paraíba, na porção leste da Província
1899, Penck em 1924 e Mirchink em 1929, Borborema. Estruturalmente a Bacia se
dentre outros. caracteriza pela morfologia em rampa e de
pouca espessura sedimentar, assentada
discordantemente sobre o embasamento
ÁREA DE ESTUDO
cristalino, e subdivida em três sub-bacias, a
saber: Olinda, Alhandra e Miriri, de sul para
Localização e aspectos gerais norte, respectivamente, onde a BHRM
insere-se na sub-baciaMiriri (Souza, 2006).
A Bacia Hidrográfica do Rio Mamanguape
– BHRM drena uma área de cerca de 3.500
km² (Barbosa 2006), inteiramente dentro do Contexto Geotectônico
estado da Paraíba, e delimita-se pelos
Geologicamente, a área localiza-se na
meridianos 6°41’57” e 7° 15’58’’ Sul e
porção norte da Bacia Paraíba, abrangendo
pelos paralelos 34°54’37’’ e 36°. O Rio
a faixa costeira compreendida entre o
Mamanguape, de regime intermitente,
Lineamento Patos (Falha de Mamanguape),
nasce entre os municípios Montada e
a norte e a Falha de Itabaiana, a sul.
Areial, a mais de 500 m de altitude na
Barbosa et al, 2003 e Brito Neves et al,
microrregião paraibana do Agreste da
2009 afirmam que a bacia se insere na sub-
Borborema. Ao chegar no município de
baciaMiriri. Para além da porção inserida
Alagoa Grande, após 35 km de percurso, o
sobre os terrenos geológicos sedimentares
rio atinge o seu médio curso onde alcança
das bacias marginais costeiras, a bacia do
níveis altimétricos inferiores a 200 m. Da
rio Mamanguape também drena o
mesma forma, no baixo curso o rio
embasamento cristalino da Província
atravessa cotas abaixo dos 200 m, área
Borborema. Este é composto, segundo Brito
drenada por rios intermitentes e perenes
Neves et al 2000, por terrenos deformados
com vales pouco profundos, até finalmente
do Paleo e Neoproterozoico, na área
desembocar no Oceano Atlântico no
representados pelos terrenos do Alto Pajeú,
município de Rio Tinto, tendo como
Alto Moxotó e Rio Capibaribe.
principais afluentes os rios: Guariba,
Guandu, Araçagi, Saquaiba e Riacho Tectonicamente a área conta com fraturas e
Boqueiro. zonas de cisalhamento dispostas
transversalmente à linha de costa. Estas
Dados apresentados por Molina (2000)
estruturas datam provavelmente do ciclo
revelam a taxa de evapotranspiração média
Brasiliano (~540Ma), sendo suas
anual variando entre 1100 mm a 1600 mm.
expressões superficiais interrompidas pelos
Quanto aos dados pluviométricos anuais,
sedimentos fanerozóicos da Bacia Paraíba.
estes abrangem valores de 700 mm a 1600
Estas estruturas possuem feições de
mm, sendo o período chuvoso de março a
geometria sigmoidal, atreladas às
agosto, e o período seco compreendendo os
deformações do Ciclo Brasiliano à época da
meses de setembro a fevereiro com outubro
colagem do continente Gondwanaocidental
representando o mês mais seco. Lima, et al
(Brito Neves et al 2000). Entretanto, a
2015), através de produtos cartográficos,
última grande atividade tectônica ocorrida
registraram a distribuição gradativamente
neste setor, com influência marcante sobre
mais baixa dos valores anuais de
179

a hierarquização das grandes unidades do McKeown et al (1988) enfatizam que a


relevo, ocorreu já no Mesozoico, durante a forma do perfil longitudinal de um curso
separação do supercontinente, resultando na fluvial deve ser entendida como em
abertura de rifts marginais e abortados, ao equilíbrio ao apresentar uma típica forma
longo do Cretáceo (Almeida et al, 2000; côncava. Na perspectiva proposta por Hack
Brito Neves et al, 2000; Matos, 1992). (1957) o perfil vai refletir o estado de
equilíbrio da drenagem e qualquer alteração
Boa parte dessas bacias apresentam no mesmo levaria o rio a se ajustar na busca
sequencias sedimentares pós-rift, de um novo equilíbrio, erodindo seu próprio
desenvolvidas durante o principal estágio leito ou gerando agradação.
da abertura do Oceano Atlântico. Apesar
dos falhamentos pós-rift terem sidos menos A partir desta ideia, entende-se que trechos
intensos que os da fase inicial da abertura da drenagem que estejam fora da curva de
do oceano, esses foram de fundamental equilíbrio indicam que a drenagem se
importância para a preservação das encontra desajustada. Nestes casos pode-se
sequencias sedimentares pós-cretáceas interpretar as anomalias como indicativas
(Barreto et al, 2002; Bezerra et al, 2008, de atividade tectônica recente (Etchebehere
Bezerra e Vita-Finzi, 2000). et al., 2004), assim como de diferença
estrutural ou litológica sobre a morfologia
Brito Neves et al, 2004 asseveram que a do sistema (Monteiro, 2010).
reativação pós-cretácea possui uma
natureza distencional de direção E-W e
Análise do Índice de Relação entre
ENE-WSW, responsável pelo
desenvolvimento da bacia por afundamento Declividade – Extensão (RDE)
crustal a partir da existência de um sistema
Ao propor o emprego de um índice que
trafogênico inicial. Não obstante, autores
relacionasse a declividade e a extensão de
apontam que a movimentação tectônica não
um rio para identificar trechos fora do
resulta apenas dos esforços distencionais,
padrão considerado normal, Hack (1973)
mas também de esforços gravitacionais que
contribuiu para evidenciar e favorecer a
ocorreram ao longo do Cenozóico,
identificação de setores anômalos no
evidenciados pelo desajuste topográfico de
gradiente do perfil longitudinal, tomando
várias unidades estratigráficas (Bezerra et
como pressuposto que este deveria
al, 2008; Rossetti et al, 2009; Tavares,
apresentar uma diminuição gradativa da
2010).
declividade desde a cabeceira até a foz
(Martinez, 2005).
MATERIAL E MÉTODOS
A utilização deste índice permite
Perfil Longitudinal de um Rio identificar, ao longo do perfil longitudinal
do rio, alterações em seu curso "ideal", pois
O perfil longitudinal de um rio é entendido relaciona a declividade do canal fluvial com
como sendo a curva obtida através de dados a extensão do trecho em apreço, fornecendo
plotados em gráfico de coordenadas um índice comparativo entre trechos de um
cartesianas, cujas coordenadas curso d'água de diferentes magnitudes.
correspondem à altitude (H) em relação à
distância da jusante (L) expressa pela O Índice de Hack - IH por trecho é
equação:H=f(L)da qual a tangente calculado através da seguinte fórmula:
resultante expressa o gradiente do canal no SLtrecho=(Δh/Δl)*L, onde,Δh é a diferença
trecho estudado (Martinez, 2005). altimétrica entre dois pontos selecionados
do curso d’água, Δl corresponde à projeção
horizontal do trecho analisado e L é a
180

extensão total do canal desde a nascente até Desta forma, a partir da análise do perfil
o ponto final para onde o índice está sendo longitudinal de um rio e da aplicação de
calculado. parâmetros morfométricos, a exemplo do
IH, pode-se apresentar um esboço das
Da mesma forma é possível calcular o IH de características de uma drenagem, no que diz
um canal fluvial em toda a sua extensão. respeito às feições estruturais e tectônicas
Para isto considera-se a diferença desenvolvidas.
altimétrica entre a cota superior e a inferior
do canal, ou seja, o ΔH da cabeceira até a RESULTADOS E DISCUSSÕES
foz (em metros) e o logaritmo natural da
extensão total do curso de água, sendo a Análise dos índices RDE
fórmula: SLtotal=ΔH/lnL
A bacia do rio Mamanguape, inserida na
Seeber&Gornitz (1983) consideraram como Zona da Mata e Agreste paraibano,
anômalos os índices de SLtrecho que, compreende total ou parcialmente 46
quando divididos pelo índice de SLtotal, municípios, apresentando sua nascente
resultaram em valores acima de 2 (dois). entre os municípios de Montada e Areial, e
Estas anomalias se subdividem em foz entre os municípios de Rio Tinto e
anomalias de segunda ordem, cujos valores Marcação. O padrão de drenagem
estão entre 2 (dois) e 10 (dez) e as anomalias predominante é o dendrítico, sendo os
de primeira ordem que possuem valores canais em sua maioria retilíneos,
iguais ou superiores a 10 (dez). As controlados pela estrutura a partir da
anomalias de primeira ordem são adaptação dos drenos às linhas de falhas e
encontradas em trechos onde a declividade fraturas. A bacia possui uma quantidade
é bastante elevada, ou seja, setores em que significativa de canais de primeira ordem
o rio não teve tempo ou competência para que confluem diretamente com os canais
suavizar o perfil, enquanto que as anomalias principais, configurando uma rede de baixa
de segunda ordem são encontradas em hierarquia. Na Tabela 1 é possível observar
trechos com declividade pouco acima da os dados totais do índice RDE para toda a
curva normal para o padrão da drenagem. bacia.

Tabela 1: Índices RDE da BHRM.

Analisando a tabela, conclui-se que as principal drenagem, o rio Mamanguape,


drenagens com extensão superior a 40 km mesmo possuindo maior extensão apresenta
possuem índice RDE maiores que a média índice RDE inferior ao do rio Araçaji, seu
(28,8). Entretanto, isto não significa que principal afluente.
seja uma relação direta, haja vista que a
181

Setores anômalos foram encontrados em melhor correspondam aos diferentes


toda extensão da bacia (Figura 1), sejam de contextos.
primeira ou segunda ordem, à exceção do
rio Estiva que apresenta somente anomalias O principal corpo hídrico da bacia, o rio
de segunda ordem e consequentemente Mamanguape, possui inúmeras quebras de
menor índice RDE total, mesmo não sendo patamares nos primeiros 40 km, estando
o corpo hídrico de menor extensão. acima da chamada linha de tendência para o
Percebe-se que a maior concentração de curso normal (Figura 2), correspondendo a
anomalias de primeira ordem está situada uma área que ainda se encontra em processo
no setor noroeste e nordeste da bacia. Sobre de suavização do relevo, e, portanto, ajuste
estes setores que se localizam os principais do curso do rio. O trecho em questão está
afluentes da margem esquerda do rio associado a zonas de cisalhamento e
Mamanguape, além da maior concentração alternâncias bruscas nas características
de canais, fato que corrobora a ideia de litológicas, resultando em vários trechos
assimetria da bacia e maior atuação do com anomalias de primeira ordem. O maior
controle tectono-estrutural. valor de anomalia (133,9) encontrada na
cota de 300 m, pode ser considerado o
O fato da bacia estar inserida em dois knickpoint de ruptura da escarpa do Planalto
contextos geotectônicos – o Planalto da da Borborema neste setor.
Borborema e a Bacia Paraíba -, confere
características peculiares no que diz A partir desse patamar, a drenagem tende a
respeito às anomalias de primeira ordem. assumir um perfil mais semelhante à linha
Enquanto os setores de anomalia de de tendência, mesmo apresentando algumas
primeira ordem da área pertencente ao quebras de patamar relacionadas às
Planalto da Borborema são nitidamente mudanças litológicas, até novamente
condicionados pelas reativações das zonas apresentar um trecho de desajuste na cota de
de cisalhamento brasilianas, que criaram 60 m, que possivelmente está relacionado à
zonas de fraqueza e juntamente com as ruptura para o Gráben do Mamanguape.
diferenças da dureza de rochas estabelecem
boa parte dos knickpoints nestes setores, no Comportamento semelhante pode ser
setor pertencente à Bacia Paraíba, as observado no perfil longitudinal do rio
quebras de patamar possivelmente estão Zumbi, afluente direto do rio Mamanguape,
associadas às movimentações tectônicas sendo um dos poucos localizados à margem
que deram origem ao sistema de grábens e direita do curso principal da bacia. Tem
horsts. suas nascentes no município de
Massaranduba, estando seu curso
Partindo para uma análise mais detalhada atravessando o Agreste paraibano, até
dos perfis longitudinais de cada corpo confluir com o rio Mamanguape no
hídrico que compõe a bacia do rio município de Alagoa Grande. Não
Mamanguape, pode-se perceber que alguns apresenta um perfil longitudinal de
perfis possuem comportamentos concavidade contínua que possa ser
semelhantes, sejam eles ligados às considerada “normal”, demonstrando que a
configurações litológicas e/ou tectono- drenagem ainda não atingiu o seu perfil de
estruturais, auxiliando na interpretação do equilíbrio (Figura 3).
comportamento morfoestrutural na área.
Desta forma, a estruturação do texto se dará
de forma a aglutinar perfis longitudinais que
182

Figura 1: Mapa de anomalias da BHRM.

Figura 2: Perfil Longitudinal do Rio Mamanguape.

Figura 3: Perfil Longitudinal do Rio Zumbi.


183

Em toda sua extensão pôde-se encontrar O maior afluente do rio Mamanguape,


setores anômalos, sejam de primeira ou apresenta uma configuração longitudinal
segunda ordem. As anomalias de primeira diferente da encontrada no rio
ordem estão concentradas entre as cotas de Mamanguape. O rio Araçaji apesenta um
320 e 200 m, sendo o maior índice pouco mais de 100 km de extensão, tendo
encontrado (26,7) situado também na cota suas nascentes situadas no município de
de 320 m, podendo ser observado no gráfico Areial também no Agreste paraibano, até
do perfil longitudinal do rio, respaldando a desaguar no rio Mamanguape no município
ideia que é neste trecho em que há a quebra de Araçagi, cruzando um total de nove
de patamar da escarpa da Borborema, tal municípios.
qual observado no perfil longitudinal do rio
Mamanguape. Ao longo de todo o percurso do rio, há
trechos apresentando anomalias de primeira
A partir deste ponto, há uma alternância e segunda ordem muitas vezes alternados
entre anomalias de segunda ordem e de por trechos sem anomalia, conferindo
primeira ordem, possivelmente características peculiares ao seu perfil
relacionadas aos diferentes tipos litológicos longitudinal. No setor da cabeceira da
alternantes entre rochas migmatíticas e drenagem, que corresponde aos primeiros
metabasálticas. Ademais, o trecho final da 25 km do rio, a análise dos dados aponta
drenagem apresenta um desajuste da para um certo equilíbrio da drenagem,
drenagem em contas inferiores à 140 m e estando o seu perfil abaixo da linha de
mesmo sendo anomalias de segunda ordem tendência e que pode ser corroborado pelo
estariam relacionadas às zonas de fato deste trecho estar assentado sobre um
cisalhamento de caráter transcorrente e único tipo de rocha, sendo as anomalias
compressional, fortalecendo o conceito das encontradas decorrentes a possíveis falhas
reativações dessas zonas de cisalhamento. responsáveis pelos knickpoints (Figura 4).

Figura 4: Perfil Longitudinal do Rio Araçaji.

A partir da cota de 500 m, o curso d’água concentração de anomalias de primeira e


sofre uma mudança para a direção NW-SE segunda ordem. Este desajuste pode ser
que coincide com o basculamento das explicado pelo soerguimento do Planalto da
morfoestruturas nesta mesma direção e com Borborema e reativação das zonas de
a Zona de Cisalhamento Patos que atravessa Cisalhamento, fazendo com que a drenagem
a área com direção SW-NE, a grosso modo. passasse a buscar seu novo equilíbrio. As
Observando o gráfico do perfil longitudinal, pequenas quebras de patamares que se
nota-se que é a partir deste ponto que a observam no perfil longitudinal, explicam-
curva representante da drenagem apresenta se pelo fato da colagem orogênica que
um maior desajuste em relação à curva de estrutura o planalto fomentar o trabalho da
tendência e onde se encontra a maior
184

erosão diferencial a partir da alternância por zonas de cisalhamento, conferindo


entre rochas mais ou menos resistentes. inúmeros trechos retilíneos à drenagem.

Do mesmo modo dos perfis analisados Comparando com a linha de melhor ajuste,
anteriormente, a partir da cota de 300 m, o perfil longitudinal do rio Araçaji-Mirim
ocorre uma série de knickpoints que apresenta a convexidade mais acentuada
coincidem com anomalias de primeira abaixo dos 350 m de altitude, tendo uma
ordem, mas somente a partir da cota de 200 leve diminuição somente abaixo dos 200 m,
m ocorre uma quebra mais acentuada e as demonstrando o desajuste erosivo da
anomalias de primeira ordem de maior drenagem. É neste setor que se encontram
relevância (110,6; 122), já no final do os maiores valores para o índice de Hack
médio curso do rio Araçaji, demonstrando nesta drenagem, sobretudo a partir dos 220
que neste setor da bacia a ruptura da escarpa m que apresenta um valor de 128,9,
do Planalto da Borborema ocorre numa indicando que a ruptura da escarpa do
altitude inferior, indicando que o recuo da Planalto da Borborema neste setor se dá
escarpa não se deu de forma igual para toda numa altitude menos elevada.
a bacia do rio Mamanguape.
A última drenagem da bacia do rio
O rio Araçaji-Mirim, principal afluente do Mamanguape que possui suas nascentes
rio Araçaji, possui metade da extensão deste diretamente ligadas ao Planalto da Borborema
(cerca de 51 km), banhando seis municípios é o rio do Padre, que tem seu curso escoando
do agreste paraibano e com suas nascentes por cinco municípios também do Agreste
no município de Casserenge e foz no paraibano com cabeceiras no município de
município de Pilões, onde conflui com o rio Solânea e foz entre os municípios de Araçagi
Araçaji. O perfil longitudinal do rio e Guarabira, onde desagua no rio Araçaji.
Araçaji-Mirim não apresenta concavidade Possui uma extensão de pouco mais de 50 km
suave e contínua para ser considerado em com trechos anômalos e encaixados,
denotando um controle estrutural da
“equilíbrio” apresentando configuração
drenagem.
semelhante à do rio Araçaji.
O perfil longitudinal do rio do Padre não
Em seus primeiros trechos apresenta possui uma concavidade esperada de uma
anomalias de segunda ordem bastante sutis drenagem que esteja em equilíbrio,
(não superior a 4,0) estando relacionadas a apresentando inúmeros knickpoints em todos
áreas de contato tanto entre litologias os trechos, como pode ser observado na
distintas quanto a zonas de cisalhamentos, o Figura 6. O primeiro trecho da drenagem que
que confere uma curva abaixo da linha de possui a mesma direção do basculamento das
tendência (Figura 5). A partir da cota de morfoestruturas de NW-SE, se inicia abaixo
400 m, o rio muda de direção passando a dos 600 m até cerca de 300 m, apresenta o
correr na direção NW-SE, e assim como no maior número de quebras de patamares e o
rio Araçaji, corrobora a ideia do maior desajuste de todo o perfil longitudinal,
basculamento das morfoestruturas nesta apesar dos knickpoints serem mais suaves do
mesma direção. Neste setor, as anomalias que os do trecho à montante. As anomalias de
de primeira ordem são responsáveis por primeira ordem não ultrapassam o valor de
uma pequena quebra de patamar – que pode 19,1 no índice de Hack, estando todos os
ser observada no gráfico – e que setores anômalos associados às zonas de
corresponde às zonas de fraquezas geradas fraturas e zonas de cisalhamento.
185

Figura 5: Perfil Longitudinal do Rio Araçaji-Mirim.

Os maiores valores encontrados para o índice Traição, numa extensão total de cerca de 21
de Hack (70,9 e 57,2) correspondem às km.
quebras de patamares mais bruscas que se
iniciam abaixo dos 300 m de altitude, Analisando o perfil longitudinal do rio Tinto
podendo ser considerada a área de ruptura da observa-se que o mesmo apresenta uma
escarpa do Planalto da Borborema. A concavidade semelhante à da linha de melhor
drenagem no trecho passa por inflexões ajuste (Figura 7). A drenagem está assentada
também abruptas, ora alternando a direção de sobre os sedimentos da Formação Barreiras,
NW-SE para SW-NE, quando se torna bem como sedimentos associados ao
condicionada aos trend regional da ZC Patos. retrabalhamento dos mesmos, e apresenta
Desde ponto em diante, a drenagem apresenta anomalias de segunda ordem em toda sua
uma configuração de “equilíbrio” extensão atreladas a falhas que controlam o
semelhantes ao do setor do Gráben do rio curso do rio. Esses setores anômalos bem
Mamanguape, o que pode justificar a como as falhas legitimam a ideia das
semelhança morfológica entre os dois setores. movimentações tectônicas recentes pós
deposição dos sedimentos da Formação
Além das drenagens que tem seus cursos Barreiras a partir do estabelecimento do
d’água associados ao Planalto da Borborema, Gráben do Mamanguape.
a bacia do rio Mamanguape apresenta
drenagens com extensões mais modestas O perfil longitudinal do rio Estiva, quando
dentro do contexto da Bacia Paraíba, e comparado ao perfil do rio Tinto, revela uma
consequentemente, apresentando concavidade mais próxima ainda à linha de
comportamentos distintos das analisadas melhor ajuste (Figura 8), demonstrando a
anteriormente. ocorrência de erosão mais efetiva devido às
características friáveis dos sedimentos da
As duas últimas drenagens com extensão Formação Barreiras e seus derivados. Possui
superior a 10 km possuem suas nascentes no anomalias de segunda ordem em toda sua
município de Rio Tinto nas áreas dos extensão, mais uma vez associadas a falhas
tabuleiros dissecados, estando o rio Tinto que controlam a drenagem ratificando a
confluindo com o rio Mamanguape na sede do proposição de ocorrência de movimentações
município numa extensão total de pouco mais tectônicas recentes. Supõe-se que o perfil de
de 13 km, ao passo que o rio Estiva conflui drenagem se apresente mais próximo ao perfil
com o mesmo no município de Baía da de equilíbrio devido à erodibilidade do
material subjacente.
186

Figura 6: Perfil Longitudinal do Rio do Padre.

Figura 7: Perfil Longitudinal do Rio Tinto.

Figura 8: Perfil Longitudinal do Rio Estiva

Mamanguape, assim como a maior


CONSIDERAÇÕES FINAIS
concentração de canais.
A bacia em que se chamou atenção nesse
Nas áreas em que se configuraram
estudo apresentou maiores concentrações
anomalias de primeira ordem dentro do
de anomalias de primeira ordem, apenas o
contexto do Planalto da Borborema são
rio Estiva apresentou anomalia de segunda
claramente relacionados pelas reativações
ordem, a assimetria da bacia e a maior
das zonas de cisalhamento, tais zonas de
atuação do controle tectono-estrutural é
fraqueza associadas às diferenças de dureza
fundamentada no fato de que sobre o setor
de rochas são os responsáveis por criarem
Noroeste se localizam os principais
quantidade significativa de quebras de
afluentes da margem esquerda do rio
187

patamares, gerando suas respectivas Aspekte des Kaenoziokums in Suedbrazilien.


anomalias, entretanto, no setor que Zeitschriftfür Geomorphologie, 8, 286-312.
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ANÁLISE MORFOESTRUTURAL PRELIMINAR DO RELEVO A
PARTIR DA APLICAÇÃO DO ÍNDICE DE HACK: UM ESTUDO DE
CASO NO MACIÇO DE JOÃO DO VALE (RN-PB)
George Pereira de Oliveira, Bruno de Azevedo Cavalcanti Tavares, Clístenes
Teixeira Batista e Marco Túlio Mendonça Diniz

trechos pelos quais esse canal passa e a sua


INTRODUÇÃO extensão (Monteiro, 2015).

A maioria dos estudos clássicos do relevo Além de permitir a análise do efeito da


que objetivaram interpretar a evolução variabilidade litológica nos processos de
geomorfológica das paisagens do Nordeste erosão diferencial, Seeber e Gornitz (1983)
brasileiro sempre esteve atrelada a modelos mostram a importância da aplicação do IH
qualitativos, cuja ênfase é geralmente dada para a identificação anomalias de drenagens
aos processos morfoclimáticos. Contudo, decorrentes de deformações tectônicas ao
estudos recentes (Monteiro, 2015; Tavares, longo do curso dos canais em contextos de
2015) tem atestado a importância da margem ativa. Em margens passivas,
aplicação de índices morfométricos, diversos estudos também vêm relatando o
pautados em variáveis quantitativas, para a uso deste índice para a identificação de
análise do relevo e identificação de deformações neotectônicas intraplaca
condicionantes morfoestruturais e (Etchebehere et al, 2004; Monteiro, et al,
morfotectônicos. Dentre estes índices, o 2014; Monteiro, 2015; Tavares, 2015).
Índice de Hack (1973) se apresenta como
um dos mais dotados de simplicidade e Sabendo-se da importância do IH para o
passível de disponibilizar resultados reconhecimento de deformações tectônicas,
satisfatórios, o que o torna bastante objetiva-se neste estudo aplicar o referido
utilizado até os dias atuais. índice em canais fluviais situados no
maciço de João do Vale (RN/PB) para a
O Índice de Hack (IH), também identificação preliminar de possíveis
denominado no Brasil como Relação anomalias de drenagem decorrentes de
Declividade-Extensão (RDE) (Etchebehere reativações neotectônicas. Este maciço,
et al., 2004), busca demonstrar o grau de cujos estudos geomorfológicos ainda são
equilíbrio geomorfológico no qual se escassos, vem sendo apontado como uma
encontra um determinado canal fluvial, possível área afetada por inversão do relevo
levando em consideração a declividade dos decorrente de tectonismo cenozóico
190

(Morais Neto; Alkmin, 2001; Lima, 2008; Do ponto de vista geológico, o maciço de
Morais Neto et al, 2008; 2009). Isso se dá João do Vale está inserido na Província
em virtude da existência em seu topo de um Borborema na sua porção setentrional
capeamento sedimentar do (acima do lineamento Patos), dentro dos
Paleógeno/Neógeno em cotas que superam limites do Domínio Rio Piranhas-Seridó
os 700 m, o que desafia alguns dos (Angelim; Nesi; Medeiros, 2006). O mesmo
principais pressupostos dos modelos trata-se de um maciço cristalino estrutural
clássicos de evolução baseados em capeado por uma cobertura sedimentar.
variáveis morfoclimáticas.
O embasamento cristalino que constitui as
vertentes na área é neoproterozoico, sendo
ÁREA DE ESTUDO
formado a norte e a leste por rochas
A área alvo deste estudo, onde se tem a graníticas, granodioríticas e dioríticas da
ocorrência do Maciço de João do Vale, suíte intrusiva Itaporanga. A oeste e a sul
apresenta cerca de 230 km², localizando-se predominam biotita-gnaisses, xistos,
no limite centro-leste entre os estados da quartzitos, lentes calcissilicáticas e de
Paraíba e do Rio Grande do Norte, Nordeste mármore da Formação Jucurutu, Grupo
setentrional brasileiro (Figura 1). A mesma Seridó. Na extremidade sudoeste do
abarca parte dos municípios de Belém do maciço, tem-se uma considerável extensão
Brejo do Cruz/PB, Augusto Severo/RN, onde aflora a suíte intrusiva Dona Inês,
Jucurutu/RN e Triunfo Potiguar/RN. constituída por monzongranitos,
sienogranitos e leucogranitos.

Figura 1: Mapa de Localização do maciço de João do Vale (RN-PB).


191

A unidade de topo do maciço de João do bastante íngremes e se apresentam bastante


vale é capeada pelos arenitos- dissecadas (Figura 3-B).
conglomeráticos afossilíferos da Formação
Serra do Martins (FSM) (Figura 2). Os
litotipos da FSM são oriundos de um
sistema deposicional de canais de padrão
“entrelaçado à meandrante grosso”
(Menezes, 1999, p. 75) e apresentam idades
de deposição relativamente recentes.
Morais Neto et al. (2008), a partir da análise
de traços de fissão em apatita (AFTA)
estabeleceu idades de deposição que variam
de 64 a 25 Ma(intervalo Paleoceno-
Oligoceno). Lima (2008), utilizando o
método (U-Th)/He em óxidos e hidróxidos Figura 2: Afloramento do arenito da Formação
de ferro extraídos de perfis de intemperismo Serra do Martins no maciço de João do Vale.
laterítico formados sobre as rochas da FSM,
estabeleceu uma idade mínima de 20 Ma
MATERIAIS E MÉTODOS
(Mioceno Inferior).
A etapa inicial para a elaboração deste
No contexto geomorfológico, o maciço de
estudo consistiu em uma revisão
João do Vale representa uma unidade de
bibliográfica e cartográfica sobre a área
relevo tabular e bordas escarpadas (Figura
analisada.
3-A), cujas cotas altimétricas da unidade de
topo ultrapassam os 700 m, havendo trechos Os dados geológicos obtidos são referentes
sobre o capeamento sedimentar onde estas aos mapas geológicos da Paraíba (Santos;
superam os 750 m. Este maciço está Ferreira; Silva Jr, 2002) e do Rio Grande do
relacionado à um planalto isolado que não Norte (Angelim; Medeiros; Nesi, 2006),
se conecta a macroestrutura do Planalto da ambos em escala de 1:500.000. Para a
Borborema e está circundado pelos extração de informações relacionadas à
pedimentos estruturados das faixas de hipsometria, foram utilizadas imagens de
dobramento paleoproterozoicas e radar interferométrico oriundas da missão
neoproterozoicas. As suas encostas são SRTM (Shuttle Radar Topography
Mission), com resolução de 30 m por pixel.

Figura 3: Paisagens geomorfológicas no maciço de João do Vale (RN-PB). A - Vista do platô sedimentar; B -
Encostas demonstrando alto grau de dissecação.
192

Foram selecionados cinco canais fluviais A identificação das anomalias de drenagem


cujas nascentes se situam sobre o maciço de seguiu a metodologia de Seeber e Gornitz
João do Vale. Os mesmos foram (1983). De acordo com esta, nos trechos
denominados de riacho, sendo atribuído um cuja divisão de seu IH pelo IHtotalfor acima
número logo em seguida a cada um destes. de 2 tem-se a ocorrência de anomalias. Os
Isso se fez necessário em decorrência da valores situados entre2 e 10 correspondem
ausência de nomenclaturas oficiais para a à anomalias de 2° ordem, enquanto nos
maioria dos canais analisados nas bases trechos onde estas forem superiores a 10
cartográficas e do desconhecimento das ocorrem anomalias de 1° ordem. Valores
toponímias empregadas pelos habitantes abaixo de 2 possuem anomalias de ordem 0.
locais.
As anomalias de 1° ordem correspondem
A aplicação do Índice de Hack (IH) (Hack, aos trechos do canal se situam sobre áreas
1973) seguiu os seguintes procedimentos: muito íngremes, o que pode ser um
1) extração das isoípsas com intervalos de indicador de deformações tectônicas. Já as
25 m; 2) medição em linha reta da distância anomalias de 2° ordem estão relacionadas
planimétrica entre as curvas; 3) medição aos trechos do canal que passam por áreas
efetiva dos canais no intervalo das isoípsas íngremes.
analisadas e, posteriormente, em sua
totalidade; 4) elaboração dos cálculos a RESULTADOS E DISCUSSÕES
partir das fórmulas pertinentes e plotagem
dos dados em planilhas eletrônicas; 5) Como destacado por Monteiro (2015), a
elaboração do perfil longitudinal dos canais análise do IH permite a identificação dos
a partir dos dados obtidos; e 6) classificação knick-points de uma determinada região,
das anomalias de drenagem identificadas. explicitando os pontos do relevo onde
ocorrem quebras de patamares. Além disso,
A fórmula 1 utilizada para o cálculo do IH o mesmo procura estabelecer possíveis
dos trechos dos canais foi a seguinte: controles estruturais rasos que podem estar
afetando a configuração das feições
IH = (Δh/Δl)*L (1) geomórficas em escalas diversas (Tavares,
2015), o que o torna uma ferramenta útil na
Onde Δh é à diferença altimétrica entre as
identificação preliminar de possíveis
isoípsas analisadas; Δh corresponde à
indicadores morfoestruturais e
distância em linha reta entre as isoípsas; e L
morfotectônicos.
é o trecho efetivo do canal desde a sua
nascente até o trecho em que se quer No maciço de João do Vale o índice foi
calcular o IH. aplicado em cinco canais fluviais que tem
suas nascentes no maciço e drenam as suas
Além disso, fez-se também a extração do IH
encostas. Numa primeira análise, pôde-se
do trecho total dos canais analisados. Para
notar que as anomalias de drenagem
isso utilizou-se a seguinte fórmula 2:
identificadas são, em sua maioria, de 2°
IHtotal = ∆H/logL (2) ordem e ocorrem em áreas de litologia
relativamente homogênea, principalmente
Onde ∆H é a relação entre a diferença total onde afloram as suítes intrusivas brasilianas
de altitude de cabeceira à foz e logL o (Figura 4), marcando quebras de patamares
logaritmo do comprimento total da na encosta do maciço (Figura 5). A análise
drenagem. do IH de cada um destes canais é
apresentada a seguir.
193

Figura 4: Canais analisados no maciço de João do Vale sobrepostos à litologia.

Figura 5: Canais analisados sobrepostos à hipsometria.


194

De sua nascente até a cota altimétrica de


Riacho 1
350 m o riacho 1 apresenta um
O riacho 1 tem sua cabeceira de drenagem direcionamento NW-SE, devido à controles
em um bloco situado na porção norte- de ordem estrutural, infletindo neste trecho
nordeste do maciço de João do Vale. Este se para NE-SW, onde o mesmo se apresenta
individualiza do restante do maciço por um superimposto à estrutura. É neste segundo
dique de basalto decorrente do vulcanismo trecho onde se concentram as anomalias de
cretáceo Rio Ceará-Mirim. Nesta área o drenagem identificadas, com uma quebra de
capeamento sedimentar já foi totalmente patamar que vai da cota de 325 até 150 m,
erodido, predominando as rochas graníticas voltando o canal a partir deste trecho a ter
da suíte intrusiva Itaporanga, e a altitude direção NW-SE. A maioria das anomalias é
situa-se em torno 450-500 m. Este riacho de 2° ordem, sendo apenas as identificadas
desagua em outros riachos maiores nas cotas de 225 e 200 m de 1° ordem
pertencentes á bacia hidrográfica do rio (Tabela 1).
Piranhas-Açu. O perfil longitudinal do
riacho 1(Figura 6) mostra que este está
abaixo da linha de ajuste normal tanto em
sua nascente como em sua foz. No trecho
que vai da isoípsa de 400 até a de 225 m, o
mesmo se encontra acima, indicando um
trecho onde o canal não conseguiu erodir até
que o perfil se aproximasse da tendência
normal.
Figura 6: Perfil longitudinal do riacho 1.

Tabela 1: Trechos de anomalias de drenagem identificados no riacho 1.


Altitude das curvas Δh Δl L (trecho) L (total) IH (Δh/Δl)*L IH total IHtrecho/IHtotal Anomalias
325 25 190 190 4795 630,9210526 87,8 7,185888982 2° ordem
300 25 151 152 4947 819,0397351 87,8 9,328470787 2° ordem
275 25 263 269 5216 495,8174905 87,8 5,647124038 2° ordem
250 25 180 181 5397 749,5833333 87,8 8,537395596 2° ordem
225 25 105 105 5502 1310 87,8 14,92027335 1° ordem
200 25 134 134 5636 1051,492537 87,8 11,97599701 1° ordem
175 25 174 174 5810 834,7701149 87,8 9,507632289 2° ordem
150 25 545 569 6379 292,6146789 87,8 3,332741218 2° ordem
100 25 1040 1076 9593 230,6009615 87,8 2,626434642 2° ordem
195

Riacho 2 com uma relativa regularidade até a cota de


475 m, onde se identificou mais uma
O riacho 2 tem sua nascente na unidade de anomalia de 2° ordem.
topo do maciço de João do Vale, em uma
área com altitudes de 700 m e de litologia
sedimentar referente aos arenitos da FSM,
vindo a drenar posteriormente a encosta
nordeste do maciço esculpida na suíte
Itaporanga. Este curso d’água pertence à
bacia hidrográfica do rio Piranhas-Açu. O
seu perfil longitudinal mostra que o mesmo
se encontra próximo, ao longo de grande
parte de seu curso, da curva de ajuste
Figura 7: Perfil longitudinal do riacho 2
normal, havendo poucos trechos onde o
mesmo se encontra acima ou abaixo, Em altitudes que vão de 425 a 275 m tem-
geralmente marcados por quebras de se um novo trecho de anomalias que
patamares (Figura 7). marcam uma quebra brusca de patamar na
encosta nordeste, sendo este o trecho com a
O direcionamento inicial deste canal é de maior concentração de anomalias de 1°
NW-SE na medida em que este drena a ordem identificadas entre todos os canais
escarpa do platô sedimentar. A partir da analisados (Tabela 2). Após essa quebra, o
isoípsa de 575 m ocorre o primeiro trecho canal passa a ser submetido a um
anômalo de 2° ordem que marca a quebra de perceptível controle estrutural exercido por
patamar (Tabela 2) havendo uma inflexão um extenso lineamento de direção NW-SE
do canal para NE-SW. Neste trecho tem-se correspondente à continuação do dique de
a ocorrência de um considerável anfiteatro basalto referido anteriormente.
de erosão onde as declividades decrescem
Tabela 2: Trechos de anomalias de drenagem identificados no riacho 2.

Altitude das curvas Δh Δl L (trecho) L (total) IH (Δh/Δl)*L IH total IHtrecho/IHtotal Anomalias


575 25 163 202 2341 359,0490798 156,4 2,295710229 2° ordem
475 25 315 375 4727 375,1587302 156,4 2,398713108 2° ordem
425 25 121 128 5649 1167,14876 156,4 7,462587982 2° ordem
400 25 62 62 5711 2302,822581 156,4 14,72392954 1° ordem
375 25 60 60 5771 2404,583333 156,4 15,37457374 1° ordem
350 25 52 55 5826 2800,961538 156,4 17,90896124 1° ordem
325 25 65 69 5895 2267,307692 156,4 14,49685225 1° ordem
300 25 110 110 6005 1364,772727 156,4 8,726168333 2° ordem
275 25 114 124 6129 1344,078947 156,4 8,593855162 2° ordem
225 25 619 653 8360 337,641357 156,4 2,158832206 2° ordem
150 25 479 499 12002 626,4091858 156,4 4,005173822 2° ordem
125 25 186 186 12188 1638,172043 156,4 10,4742458 1° ordem
100 25 314 331 12519 996,7356688 156,4 6,37299021 2° ordem
196

Uma nova ruptura de patamar ocorre na cota anômalos são de 2° ordem (Tabela 3). Após
de 150 m, marcando o trecho em que o canal esse ponto, o curso do rio que antes era de
deixa de drenar a encosta do maciço e passa NE-SW passa a ser quase E-W, onde se tem
a correr em áreas de pedimentos da a partir da cota de 375 m a ocorrência de
depressão sertaneja. O mesmo segue no anomalias novamente de 2° ordem.
alinhamento preferencial NW-SE até
desembocar diretamente no rio Piranhas-
Açu

Riacho 3

A nascente do riacho 3 também se localiza


sobre o platô sedimentar, a 675 m de
altitude, sendo sua desembocadura no
riacho 2. Este canal se localiza na encosta Figura 8: Perfil longitudinal do riacho 3.
leste do maciço de João do Vale e também
drena em sua maior parte terrenos onde Após esse segundo trecho de anomalias de
aflora as rochas plutônicas da suíte 2° ordem, o curso do riacho passa por outros
Itaporanga. O perfil longitudinal do riacho pontos de inflexão, indicando um complexo
3 (Figura 8) se assemelha ao do riacho 2, padrão de controle da drenagem por
sendo os poucos trechos onde este primeiro estruturas do embasamento. A últimas
se encontra acima ou abaixo da linha de destas inflexões coloca o canal novamente
ajuste normal e as suas quebras de na direção NE-SW, permanecendo nesta até
patamares relacionadas ainda mais sutis. sua desembocadura no riacho 2. Antes
disso, o riacho 3 passa novamente por um
Entre as isoípsas de 550 e 500 m ocorre a pequeno trecho de ruptura nas cotas de 125
primeira ruptura de patamar, não sendo esta e 100 m.
tão acentuada, pois todos os trechos

Tabela 3: Trechos de anomalias de drenagem identificados no riacho 3.


Altitude das curvas Δh Δl L (trecho) L (total) IH (Δh/Δl)*L IH total IHtrecho/IHtotal Anomalias
550 25 102 102 1482 363,2352941 145,1 2,503344549 2° ordem
525 25 57 57 1539 675 145,1 4,651964163 2° ordem
500 25 95 95 1634 430 145,1 2,963473467 2° ordem
375 25 187 188 2930 391,7112299 145,1 2,699594969 2° ordem
325 25 268 276 3507 327,1455224 145,1 2,254621105 2° ordem
300 25 259 277 3784 365,2509653 145,1 2,517236149 2° ordem
275 25 258 258 4042 391,6666667 145,1 2,699287847 2° ordem
225 25 329 488 5444 413,6778116 145,1 2,850984228 2° ordem
175 25 341 355 6536 479,1788856 145,1 3,30240445 2° ordem
125 25 402 417 8797 547,0771144 145,1 3,770345379 2° ordem
100 25 376 387 9184 610,6382979 145,1 4,208396264 2° ordem
197

Pelo que se pôde inferir pelas informações sedimentar da FSM para o ígneo da suíte
obtidas com os canais analisados até agora intrusiva Itaporanga.
é que na maioria dos casos onde se tem
pontos de inflexão nos canais este é Riacho 4
precedido por uma quebra de patamar. Esta
quebra geralmente não é muito Ao contrário dos demais canais analisados
proeminente, predominando anomalias de anteriormente, o riacho 4 situa-se na
2° ordem. encosta ocidental do maciço de João do
Vale. A sua nascente se localiza sobre o
As cotas situadas nas isoípsas 575-550 m platô sedimentar, em altitudes de cerca de
parecem marcar nos riachos localizados na 700 m, sendo sua foz no riacho 6. Os canais
encosta oriental do maciço de João do Vale, fluviais desta área do maciço também
cujas nascentes estão sobre o capeamento integram a bacia hidrográfica do rio
arenítico, uma perceptível quebra de Piranhas-Açu. O seu perfil longitudinal
patamar. Esta quebra, geralmente não tão mostra a existência de quebras de patamares
acentuada, é caracterizada pela sutis que fazem o canal ficaracima da
predominância de anomalias de 2° ordem, o tendência normal em um trecho logo após a
que indica que o canal perde o seu equilíbrio sua nascente (Figura 9), situando-se
por passar a correr sobre um trecho levemente abaixo logo em seguida.
relativamente íngreme. Isso pode estar
relacionado à mudança do litotipo

Tabela 4: Trechos de anomalias de drenagem identificados no riacho 4.


Altitude das curvas Δh Δl L (trecho) L (total) IH (Δh/Δl)*L IH total IHtrecho/IHtotal Anomalias
600 25 123 130 1830 371,9512195 148,2 2,509792304 2° ordem
550 25 93 93 2134 573,655914 148,2 3,870822631 2° ordem
525 25 126 136 2270 450,3968254 148,2 3,039114881 2° ordem
500 25 132 139 2409 456,25 148,2 3,078609987 2° ordem
475 25 71 71 2480 873,2394366 148,2 5,892303891 2° ordem
450 25 61 61 2541 1041,393443 148,2 7,026946306 2° ordem
425 25 66 67 2608 987,8787879 148,2 6,665848771 2° ordem
400 25 73 73 2681 918,1506849 148,2 6,195348751 2° ordem
375 25 90 91 2772 770 148,2 5,195681511 2° ordem
350 25 64 64 2836 1107,8125 148,2 7,475118084 2° ordem
325 25 98 98 2934 748,4693878 148,2 5,050400727 2° ordem
300 25 146 146 3080 527,3972603 148,2 3,558685967 2° ordem
275 25 167 167 3247 486,0778443 148,2 3,279877492 2° ordem
250 25 242 254 3501 361,6735537 148,2 2,440442333 2° ordem
225 25 114 114 3615 792,7631579 148,2 5,349279068 2° ordem
175 25 230 236 4337 471,4130435 148,2 3,18092472 2° ordem
198

Na encosta ocidental tem-se uma maior riacho 5 e possui um direcionamento NW-


diversificação litológica. Além de drenar SE. Os pontos de inflexão são pouco
terrenos ígneos (suíte Itaporanga), o canal expressivos e localizados. Este riacho
passa por áreas onde ocorrem lentes de desemboca no rio Paraú, afluente direto do
mármore e biotita-gnaisses da Formação rio Piranhas-Açu. Dos perfis longitudinais
Jucurutu, estando sua foz sobre ganisses dos canais analisados, o do riacho 5 é o que
bandados do Complexo Caicó, já nas áreas se apresentou mais diferenciado (Figura
de pedimentos. 10). A nascente deste se encontra
consideravelmente acima da linha de ajuste
normal, sendo este trecho marcado por um
desnível que se acentua a partir da isoípsa
de 700 m. Na cota altimétrica de 500 m, o
desnível continua, mas a partir daí o canal
passa a situar-se abaixo da tendência
normal. Apesar de não ser tão proeminente,
essa ruptura se destaca por apresentar um
considerável trecho de continuidade ao
longo do curso do riacho analisado.

Figura 9:-Perfil longitudinal do riacho 4.

Nesta frente do maciço ocorrem os maiores


trechos de anomalias registrados. Contudo,
estas são, na maioria das vezes, de 2°
ordem. No riacho 4, as anomalias ocorrem
no intervalo 600-225 m (Tabela 4). A
quebra de patamar não é tão acentuada. O
rio segue o direcionamento NW-SE, vindo Figura 10: Perfil longitudinal do riacho 5.
a infletir ligeiramente para E-W após a
ocorrência das anomalias de drenagem,
voltando mais tarde a assumir a direção
inicial. Próximo á sua foz, o riacho sobre Assim como no riacho 4, este canal
uma brusca inflexão, vindo á apresentar em apresenta um extenso trecho de anomalias,
seu trecho final um direcionamento NE- a maioria de 2° ordem, entre o intervalo
SW. 625-250 m, havendo apenas um trecho
anômalo de 1° ordem (isoípsa de 375 m).
Essa quebra parece predominar na encosta
Riacho 5 ocidental onde o capeamento arenítico se
encontra mais conservado, iniciando-se
O riacho 5 também tem sua nascente sobre
geralmente nas isoípsas de 600-625 m,
o capeamento sedimentar, em cotas
marcando a transição do platô sedimentar
altimétricas de 725. O canal drena litologias
para a encosta cristalina.
semelhantes à da área de drenagem do
199

Tabela 5: Trechos de anomalias de drenagem identificados no riacho 5.


Altitude das curvas Δh Δl L (trecho) L (total) IH (Δh/Δl)*L IH total IHtrecho/IHtotal Anomalias
625 25 168 200 2019 300,4464286 143,9 2,087883451 2° ordem
600 25 110 115 2134 485 143,9 3,370396108 2° ordem
575 25 58 58 2192 944,8275862 143,9 6,565862309 2° ordem
550 25 67 67 2259 842,9104478 143,9 5,857612563 2° ordem
525 25 76 76 2335 768,0921053 143,9 5,337679675 2° ordem
500 25 103 106 2441 592,4757282 143,9 4,117273997 2° ordem
475 25 87 87 2528 726,4367816 143,9 5,048205571 2° ordem
450 25 58 58 2586 1114,655172 143,9 7,746040114 2° ordem
425 25 76 76 2662 875,6578947 143,9 6,085183424 2° ordem
400 25 60 60 2722 1134,166667 143,9 7,881630762 2° ordem
375 25 47 48 2770 1473,404255 143,9 10,23908447 1° ordem
350 25 75 87 2857 952,3333333 143,9 6,618021774 2° ordem
325 25 62 65 2922 1178,225806 143,9 8,187809635 2° ordem
300 25 105 105 3027 720,7142857 143,9 5,0084384 2° ordem
275 25 179 189 3216 449,1620112 143,9 3,121348236 2° ordem
250 25 137 188 3404 621,1678832 143,9 4,316663539 2° ordem
200 25 346 382 4167 301,083815 143,9 2,092312822 2° ordem

comportamentos diferentes frente à


CONSIDERAÇÕES FINAIS
possíveis esforços tectônicos.
Na encosta oriental do maciço de João do
Os trechos de anomalias de 1° grau
Vale há um maior número de feições
identificados, explicitadores de setores
indicativas de controle estrutural
onde os canais se encontram em
comandando a erosão, situando-se
desequilíbrio por correrem sobre terrenos
geralmente próximas à estas os setores com
muito íngremes, podem ser indicadores de
anomalias de 1° ordem e de relativa
áreas afetadas por deformações tectônicas
homogeneidade litológica. Na encosta
recentes. Estas geralmente ocorrem
ocidental os setores anômalos parecem estar
próximas à destacadas feições estruturais do
relacionadosa processos de erosão
embasamento e em contextos de relativa
diferencial em virtude da maior
homogeneidade litológica, o que diminui o
variabilidade de litotipos.
peso da erosão diferencial nos seus
Uma quebra de patamar situada nas isoípsas processos de origem.
550-575 m ocorre na encosta oriental,
Como destacado no início deste estudo, o
geralmente após o término do capeamento
que se propôs aqui foi a obtenção de dados
arenítico Na encosta ocidental esta ruptura
preliminares. As informações obtidas
indica ser mais elevada, no intervalo 600-
necessitam ser confrontadas com dados de
625 m. Isso indica uma dinâmica
campo para a corroboração das que
denudacional distinta nestas duas frentes do
estiverem coerentes com a realidade da área
maciço de João de Vale, além de
200

de estudo e exclusão das que se Graduação em Geografia, Universidade Federal


apresentarem errôneas em virtude da do Pernambuco, Recife.
simplificação inerente á modelos Monteiro, K.A.; Tavares, B.A.C.; Corrêa, A.C.B.
quantitativos. (2014) Aplicação do índice de Hack no rio
Ipojuca para identificação de setores anômalos
de drenagem e rupturas de relevo. São Paulo,
REFERÊNCIAS Unesp, Geociências, 33, (4), 616-628.
Angelim, L.A.A., Medeiros, V.C., Nesi, J.R. (2006).
Morais Neto, J.M.; Alkmim, F.F. (2001) A
Programa Geologia do Brasil, PGB. Projeto
deformação das coberturas terciárias do Planalto
Mapa Geológico e de Recursos Minerais do
da Borborema (PB-RN) e seu significado
Estado do Rio Grande do Norte. Mapa Geológico
tectônico. Revista Brasileira de Geociências,
do Estado do Rio Grande do Norte. Escala
São Paulo, 31, (1), 95-106.
1:500.000. Recife: CPRM/FAPERN.
Morais Neto, J.M.de. Green, P.F. Garner, G.D.
Etchebehere, M.L.; Saad, A.R.; Fulfaro, V. J.;
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Perinotto, J. A. J. (2004) Aplicação do Índice
Martins Formation, Borborema Plateau,
“Relação Declividade-Extensão – RDE” na
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Bacia do Rio do Peixe(SP) para detecção de
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deformações Neotectônicas. Revista do Instituto
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anomalous topography of the Borborema
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Província Borborema Oriental, Nordeste do
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Brasil: implicações tectônicas e paleoclimáticas.
Tese (Doutorado) Programa de Pós-Graduação
Santos, E.J.; Ferreira, C.A.; Silva Jr., J.M.F. (2002)
em Geodinâmica e Geofísica, Universidade
Programa Levantamentos Geológicos Básicos do
Federal do Rio Grande do Norte, Centro de
Brasil. Projeto Geologia e Recursos Minerais do
Ciências Exatas e da Terra, Natal.
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da Paraíba. Escala: 1:500.000. Recife:
Menezes, M.R.F. (1999) Estudos sedimentológicos e
CPRM/DNPM,.
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Martins, nos platôs de Portalegre, Martins e
Seeber, L.; Gornitz, V. (1983) River profiles along
Santana/RN. Programa de Pós-Graduação em
the Himalayan arc as indicators of active
Geodinâmica e Geofísica, Universidade Federal
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do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências
Exatas e da Terra, Natal.
Tavares, B.A.C. (2015) Evolução morfotectônica
dos pedimentos embutidos no planalto da
Monteiro, K.A. (2015) Análise geomorfológica da
Borborema, Nordeste do Brasil. Tese
escarpa oriental da Borborema a partir da
(Doutorado) Programa de Pós-Graduação em
aplicação de métodos morfométricos e análises
Geografia, Universidade Federal do
estruturais. Tese (Doutorado) Programa de Pós-
Pernambuco, Recife.
ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS LINEAMENTOS NO MACIÇO
ESTRUTURAL DE ÁGUA BRANCA/AL UTILIZANDO O
SOFTWARE MICRODEM
Larissa Furtado Lins dos Santos, Ítalo Rodrigo Paulino de Arruda, Rhaissa
Francisca Tavares de Melo e Danielle Gomes da Silva

Informações Geográficas (SIG) estão cada


INTRODUÇÃO vez mais interligadas dentro da
geomorfologia. Sua área de abrangência nos
No Brasil, o processo de manipulação e diferentes ramos da ciência tem aumentado.
arranjo de imagens de satélites por meio de As imagens coletadas através do
softwares tem avançado em grande escala sensoriamento remoto proporcionam ao
os estudos no âmbito das ciências da Terra, pesquisador uma visão de conjunto
especificamente na Geografia Física, multitemporal de extensas áreas da
possibilitando uma interpretação e análise superfície terrestre, possibilitando assim
muito mais detalhada do relevo em questão. uma visão sinóptica do meio ambiente ou da
Sendo assim, a ciência geomorfológica paisagem na qual produz estudos regionais
torna-se uma das mais beneficiadas no que e integrados. Os resultados apresentam os
diz respeito a este processo, pois foram ambientes e a sua transformação,
confeccionados vários softwares com destacando os impactos causados por
diversas ferramentas de extrema fenômenos naturais como as inundações e a
importância aos estudos mais detalhados da erosão do solo; e antrópicos, como os
paisagem. desmatamentos, a expansão urbana, ou
outras alterações do uso e da ocupação da
Segundo Guerra (2006), as geotecnologias terra (Florenzano, 2002).
podem ser interpretadas como um conjunto
de tecnologias (SIG, Geoprocessamento, De acordo com Rodrigues (1988),
cartografia digital, sensoriamento remoto, geoprocessamento é compreendido como "a
Sistema de Posicionamento Global), que tecnologia que coleta e trata as informações
permitem a coleta, processamento, análise e espaciais e de desenvolvimento de sistemas
configuração de informações a partir da que as utilizam". Dessa forma, a
referência geográfica. empregabilidade desta ferramenta se torna
essencial e eficaz na construção e geração
A aplicação tanto do Sensoriamento de dados específicos, que corroboram com
Remoto, quanto dos Sistemas de informações e interpretações dentro do
202

contexto das análises geográficas, podendo interpretação e análise de imagens de


assim, processar as imagens, fazer satélites confeccionadas através do software
modelagem do terreno, mapeamentos entre MicroDEM, em conjunto com a
outras coisas. Neste sentido, são contribuição das outras geotecnologias,
responsáveis por atividades essenciais afim de produzir uma interpretação concisa
dentro das especificidades dos estudos dos lineamentos presentes no maciço de
geomorfológicos. Água Branca – AL, evidenciando a
importância que os lineamentos possuem na
Já o software gratuito MicroDEM é uma diversificação das feições de relevo
ferramenta indispensável para aplicação dos observadas localmente na paisagem, além
estudos de geomorfologia, tanto local, de dados específicos sobre altimetria,
como regional. Foi desenvolvido pelo estruturas e acidentes geográficos.
Professor Peter Guth do Departamento de
Oceanografia da Academia Naval dos EUA
ÁREA DE ESTUDO
(US Naval Academy) (USNA, online).
Com ele se torna possível o O município de Água Branca está situado
georreferenciamento de imagens de geograficamente na região Nordeste do
satélites, modelos digitais de elevação, Brasil, mais precisamente na porção oeste
entre outras técnicas mais específicas. Vale do estado de Alagoas, correspondendo à
salientar que essas informações precisam microrregião do Sertão alagoano. Suas
estar em um padrão com a base de dados coordenadas geográficas estão localizadas a
GIS. 09º15’39” de latitude sul e a 37º56'10" de
longitude oeste (Figura 1).
Portanto, o presente trabalho tem por
objetivo principal realizar uma

Figura 1: Mapa de localização do município de Água Branca - Alagoas


203

A altitude média do município é de Segundo Cavalcanti (2010), Água Branca


aproximadamente 570 m e, por esta razão, está localizado geomorfologicamente no
possui um padrão de valores de temperatura subdomínio da Depressão Sertaneja
e precipitação diferente das regiões do seu Meridional. Melo (2014) dividiu as feições
entorno. Sendo assim, torna-se possível de relevo de Água Branca entre modelados
observar a transição de regiões de extrema de denudação e modelados de acumulação,
semiaridez, para regiões de temperaturas que caracterizam a dinâmica
mais amenas. Portanto, a região de Água geomorfológica que ocorre na
Branca pode ser caracterizada como um região(Santos et al, 2016).
“brejo de altitude”, remetendo a suas
condições climáticas, que são Quanto à geologia, a área estudada
condicionadas principalmente pelo relevo. corresponde à unidade Paleoproterozoíca
que abarca feições como Plúton de Água
Além da variável representada pela altitude, Branca e Complexo Belém do São
o município recebe ainda a influência dos Francisco, formado por migmatitos com
sistemas climáticos atuantes na região restos de enclaves supracrustais que
Nordeste do Brasil. Estes, por sua vez, têm compõe cerca de 50% de todo o território
a incubência de controlar as alternâncias (Santos et al, 2016) (Figura 2).
entre períodos úmidos e secos, podendo
inibir ou itensificar a formação de chuvas. Por meio da análise do mapa de solos
Além disto, agindo em conjunto, confeccionado por Melo (2014:37), torna-
determinados sistemas conseguem se se possível identificar a predominância de
sobressair com relação aos que predominam Planossolos na região de abrangência do
em dado período, fazendo surgir novas município (Figura 3). Outros tipos de solos
condições climáticas excêntricas ao identificados são os Neossolos Regolíticos,
intervalo de tempo em questão. Cambissolos, Neossolos Litólicos e
Argissolos (Parahyba et al, 2007).

Figura 2: Mapa geológico do município de Água Branca. Fonte: Adaptado pelo autor. Melo (2014).
204

Figura 3: Mapa de Solos do município de Água Branca.Fonte: Adaptado pelo autor. Melo (2014).

em uma resolução espacial de 90 m dentro


MATERIAIS E MÉTODOS
do sistema de coordenadas geográficas. As
Para a elaboração deste trabalho, foi imagens trabalhadas foram consultadas no
realizada uma vasta pesquisa bibliográfica site da Empresa Brasileira de Pesquisas
para a identificação de trabalhos com Agropecuárias (Embrapa) para obtenção da
temática semelhante. O software imagem Shutle Radar Topographic Mission
MicroDEM foi bastante esmiuçado a fim de (SRTM). Estes dados possibilitam a
se identificar todas as suas funcionalidades elaboração de modelos digitais de elevação
dentro de nossas expectativas para o ramo que são primordiais no estudo do relevo
da geomorfologia. terrestre.

Por ser um software que ainda possui uma Após o recorte da área a ser utilizada, foi
baixa aplicabilidade dentro da linha de utilizado diversas funções do MicroDEM
pesquisa em questão, buscou-se tutoriais e como diagrama de Roseta, que para sua
páginas da internet que mostrassem confecção ser realizada atribuem-se cores
informações sobre os principais recursos e para identificação da elevação do ambiente,
funcionalidades do MicroDEM, para que sendo aplicada a ferramenta para
fosse possívelrealizar uma triagem das identificação de possíveis lineamentos
principais funções e as que melhor se (linhas de cristas, vales alinhados e linhas
adéquam aos objetivos propostos de escarpas).Para uma melhor análise, foi
anteriormente. obtido também um bloco diagrama que nos
forneceu em 3D a área selecionada. Além
Na realização deste trabalho foram disso, o software permitiu a análise do
utilizadas as cartas SC-24-X-A, SC-24-X-C histograma de elevação, os direcionamentos
E A SC-24-X-D com articulação preferenciais da encosta, além dos perfis
compatível com a escala 1:250.000 (IBGE) topográficos.
205

Para construção das imagens após serem De acordo com a interpretação realizada do
georreferenciadas no MicroDEM, utilizou- diagrama gerado pelo MicroDEM, o maciço
se a técnica de geoprocessamento no de Água Branca possui um total de 7
software Arcgis 10.2 disponibilizado pelo lineamentos, estando concentrados, em sua
Grupo de Estudos do Quaternário do maioria, no quadrante que corresponde à
Nordeste do Brasil/Laboratório de direção Nordeste (Figura 5).
Geomorfologia do Quaternário (Gequa) da
Universidade Federal de Pernambuco, com O bloco diagrama possui uma
a finalidade de se obter o produto final. Com aplicabilidade interessante no contexto
esta ferramenta, conseguimos concluir o geomorfológico, pois possibilita uma
layout de nossas imagens. melhor compreensão do contraste de
altitude do terreno. Contudo, não foi
possível confeccionar o modelo em 3D,
RESULTADOS E DISCUSSÕES
devido à baixa resolução da carta do Estado
Por meio da manipulação das imagens no de Alagoas oferecida pela Embrapa (Figura
MicroDEM foram obtidos resultados que 6).
corroboram com a análise detalhada do
O bloco diagrama é utilizado para uma
maciço de Água Branca, que contribuem de
melhor visibilidade morfológica do relevo
maneira significativa com o processo
além possuir uma considerável importância
reconhecimento da área necessário no
para a individualização das diferentes
período pré-campo.
superfícies geomorfológicas do ambiente.
Através da interpretação da Figura 3, é
Já o direcionamento das encostas é
possível constatar que o maciço está situado
essencial para que se tenha uma ideia do
a uma altitude entre 400 e 700 m,
movimento neotectônico do relevo em
evidenciando sua condição climática de
questão. A partir da compreensão da
brejo de altitude (Figura 4).
posição geográfica dessas encostas é
Após a delimitação da área, foi possível compreender a forma de deposição
confeccionado o Diagrama de Roseta, que dos sedimentos, além das recentes bacias
tem como função principal delimitar que continuam recebendo materiais (Figura
medidas e direções de estruturas frágeis, 7 e 8).
como os lineamentos.

Figura 4: Área aproximada do maciço estrutural de Água Branca.


206

Figura 5: Diagrama de Roseta da direção e da quantidade de lineamentos presentes no maciço de Água Branca.

Figura 6: Bloco diagrama do maciço estrutural de Água Branca.


207

Figura 7: Principais direcionamentos das encostas inseridas no maciço estrutural de Água


Branca.

Figura 8: Diagrama de elevação do maciço estrutural de Água Branca.

Lineamentos são de fato subconjuntos de que geralmente indicam apenas fraturas. Os


lineações que correspondem às feições principais exemplos de lineamento incluem
topográficas e não incluem os padrões as linhas de cristas, vales alinhados e linhas
lineares produzidos por mudanças de tons, de escarpas (Figura 9 e 10).
208

Figura 9: Representação dos lineamentos encontrados no maciço estrutural de Água Branca.

Figura 10: Modelo de direcionamento das encostas.

A partir de uma visão transversal, é possível que demarca os limites entre as diversas
identificar as variações de altitude que o unidades do relevo de uma maneira bem
relevo possui, sejam elas bruscas ou suaves, mais detalhada (Figura 11).
209

Figura 11: Perfil topográfico do Maciço residual de Alagoas.

em relação aos modelados de denudação e


CONSIDERAÇÕES FINAIS
modelados de acumulação que modificam a
No campo da Geomorfologia, é morfologia do local, além de reorganizar,
fundamental a compreensão da dinâmica do em escala pequena, este corpo. Vale
relevo e de sua importância para o salientar, que a ação antrópica possui certa
desenvolvimento de um leque de atividades porcentagem na modificação dessa
que favoreçam as ações antrópicas, ou que morfologia.
estabilize os domínios da natureza de uma
Por fim, é possível concluir que o
maneira bem geral. Observar as feições
MicroDEM foi essencial para uma vasta
geomorfológicas, suas compartimentações,
identificação de informações que
suas escarpas e seus modelados de uma
possibilitam ao pesquisador uma ampla
maneira mais detalhada, enriquece não só o
variação de informações geológicas e
pesquisador como a própria ciência. Por
geomorfológicas. Informações essas,
isso, o uso das Geotecnologias é essencial
essenciais para o planejamento, análise e
para o desenvolver da grande complexidade
identificação do relevo.
das informações.

De fato, os lineamentos identificados no REFERÊNCIAS


maciço residual localizado no estado de
Alagoas interferem em uma escala pequena Florenzano, T.G. Imagens de satélite para estudos
ambientais. São Paulo, Oficina de Textos, 2002.
nessa grande estrutura. Observou-se que
esta grande unidade é resultados de outras Guerra, Antonio J.T. et al. Geomorfologia
ações geológicas ativas que continuam ambiental. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006.
agindo e modificando parcialmente essa 192 p.
unidade
Melo, R.F.T. (2014) Evolução dos depósitos de
encosta no Leque Malaquias e Lagoa das Pedras
Sugere-se que esse resíduo é ação de
no entorno do maciço estrutural da Serra de Água
neotectônica recente, com atividade ativa
210

Branca. Dissertação (Mestrado), Universidade de Água Branca, Estado de Alagoas, Brasil.


Federal de Pernambuco. Revista Brasileira de Agroecologia. 2.

Oliveira, G.P., Diniz, M.T.M. (2015) O software Rodrigues, M. (1988) Geoprocessamento. Encontro
MicroDEM como recurso didático para o ensino Nacional de Engenheiros Cartógrafos, 5., ,
de Geomorfologia. Regne, 1. (2). Presidente Prudente. Anais do Encontro
Nacional de Engenheiros Cartógrafos,
Parahyba, R.B.V.; Leite, A.P.; Oliveira N.; Manoel Presidente Prudente, Gráfica da Unesp, 144–60.
B.; Oliveira, A.K.C. (2002) Solos do Município
EXTRAÇÃO DE LINEAMENTOS DE RELEVO PARA
INTERPRETAÇÃO MORFOESTRUTURAL DA BACIA DO RIO
PARAÍBA DO MEIO
Priscilla Emmanoelle Claudino da Silva, João Paulo da Hora Nascimento,
Paulo de Tarso Barbosa Leite, Kadja Monaysa Mendonça de Paula e
Kleython de Araújo Monteiro

compreende sua última reorganização


INTRODUÇÃO tectônica mais significativa (Saadi, 1993).

Lineamentos de relevo são segmentos A bacia do Rio Paraíba do Meio encontra-


retilíneos característicos da fisionomia da se, segundo Maia e Bezerra (2012), no setor
superfície da Terra, uma feição Maquiavel sul do rebordo oriental da Borborema,
dessa superfície, de possível detecção por região dominada por zonas de cisalhamento
meio de cartas topográficas, fotos aéreas, reativadas e deformadas no campo dúctil-
sensores remotos e na própria paisagem a rúptil e rúptil, gerando trends de
partir de análises em campo. Para lineamentos. Neste sentido, a extração de
compreensão da compartimentação do lineamentos de relevo, com a utilização de
relevo a extração de lineamentos apresenta- ferramentas do sensoriamento remoto,
se como um dos métodos mais utilizados, apresenta-se como relevante ferramenta na
por contribuir para uma melhor apreensão caracterização morfoestrutural da área em
da sua estruturação e do trend regional. estudo, auxiliando na identificação da
direção preferencial desses lineamentos na
A análise dos lineamentos contribui bacia.
efetivamente com a caracterização
morfoestrutural, dando suporte no que tange
a observação dos estudos morfotectônicos, ÁREA DE ESTUDO
identificando feições neotectônicas ou A bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do
relevos residuais. O termo "neotectônica" se Meio drena os estados de Alagoas e
refere a todo o conjunto de deformações Pernambuco (Figura 1). Ao Norte, limita-se
rúpteis ou dúcteis de caráter ativo, cujo com a bacia do Rio Ipanema no Estado de
limite temporal depende do quadro Pernambuco, ao Sul com as bacias dos Rios
geodinâmico de uma dada área circunscrita São Miguel e Sumaúma, a Leste com a
em uma determinada placa tectônica e
212

Bacia do Rio Mundaú, e a Oeste com as Sul e entre os meridianos 35º45’ e 36º45’ de
Bacias dos Rios Traipú e Coruripe. longitude Oeste de Greenwich. Em 171,98
km de sua extensão, o Rio Paraíba do Meio
Possui uma área de aproximadamente apresenta regime fluvial intermitente e
3.117km² e perímetro de 478 km. Situa-se perene, e o sistema hidrográfico apresenta
entre os paralelos 08º44 e 09º39’ de latitude padrão de drenagem do tipo dendrítico.

Figura 1: Mapa de localização e hipsometria da bacia do Rio Paraíba do Meio.


213

A abertura do Oceano Atlântico, provocada sensoriamento remoto, devido a alguns


pelo rifteamento do continente Gondwana, fatores mencionados por Veneziani:
foi um dos eventos geotectônicos pós-
paleozóicos mais importantes, compondo o Os lineamentos não se restringem a
apenas um tipo de movimento tectônico
que se chama de Reativação Wealdeniana, ao longo de toda sua extensão ou durante
onde falhas e zonas de cisalhamento o decorrer dos diferentes ciclos ou fases
formadas no Ciclo Brasiliano foram tectônicas que afetaram uma determinada
reativadas na Plataforma Sulamericana. área [...] Uma zona de falha pode dar
Este evento gerou um novo nível de base, o origem a vários lineamentos paralelos a
subparalelos, ou vice-versa, ou seja,
oceano Atlântico, que estabeleceu a direção várias fraturas associadas a uma zona de
das drenagens que correm para o mesmo. falha podem dar origem a apenas um
De acordo com Brito Neves et al (1999 apud lineamento distinguível nos produtos de
Maia e Bezerra, 2014) o trend regional dos sensoriamento remoto (Veneziani, 1987).
lineamentos possui predominância de
direção NE e E-W. A Bacia do Rio Paraíba O conceito utilizado de lineamento no
do Meio está inserida neste contexto, na presente artigo é o proposto por
porção sul da encosta oriental da Etchebehere, Saad e Fulfaro (2007), que
Borborema. definem lineamentos como "feições
lineares topográficas ou tonais observáveis
Esta região é dominada por estruturas que nas imagens fotográficas, que podem
são representadas por um conjunto de representar descontinuidades estruturais". E
morfologias desenvolvidas em zonas de esses traços foram registrados, limitando-
falhas herdadas da estruturação pré- se, mais precisamente, ao aspecto baseados
cambriana que inicia-se a partir da na observação feita nos dados de sensores
orogênese Brasiliana no Neoproterozóico remotos.
(Brito Neves, 1999 apud Maia e Bezerra;
Castro et al., 2008, apud Maia e Bezerra, RESULTADOS E DISCUSSÃO
2012).
Aplicando-se o método utilizado por Corrêa
No alto curso, a bacia do Rio Paraíba do e Fonsêca (2010) para extração de
Meio possui relevo ondulado de altitude lineamentos, foi possível identificar os
entre 600 e 800 m. O baixo curso possui principais lineamentos de relevo para os
uma superfície sedimentar dissecada em azimutes 45° (Figuras 2a. 3a), 90° (Figuras
interflúvios tabuliformes e colinas. 2b. 3b), 315° (Figuras 2c. 3c) e 360°
(Figuras 2d. 3d) ao longo da bacia do Rio
MATERIAIS E MÉTODOS Paraíba do Meio. E, a partir da extração
desses lineamentos, elaborar diagramas de
Para a identificação das feições retilíneas do rosetas para demonstração preferencial das
relevo do Rio Paraíba do Meio foi estruturas, observando assim, com base no
confeccionado, através de dados SRTM no comprimento e frequência, a predominância
ambiente GIS, um Modelo Digital de de sua direção em cada azimute analisado.
Elevação (MDE), onde através da técnica
de sombreamento foi possível distinguir as A partir da extração dos lineamentos foi
feições retilíneas do relevo decorrente de possível observar o comprimento e
eventos tectônicos antigos e recentes frequência dos traços encontrados ao longo
presentes na área de estudo para quatro da bacia, bem como se os mesmos mostram-
azimutes diferentes. É necessária a se de forma homogênea ou não, e se
distinção entre lineamentos estruturais e apresentam direções diversas ou se há uma
falhamentos na interpretação de produtos de preferencial. Para melhor visualização
dessas informações são apresentados
214

diagramas de rosetas de comprimento e comprimento e frequência na direção NE. A


frequência desses lineamentos para cada direção N é representada secundariamente
azimute, demonstrando a distribuição na frequência dos lineamentos, sendo, no
desses traços por intervalo angular. comprimento, menos expressiva.

O azimute 315° (Figuras 2c e 3c) apresenta


Lineamentos
direção NE dominante nos lineamentos de
No azimute 45° (Figuras 2a e 3a), os relevo da Bacia do Rio Paraíba do Meio. As
lineamentos de relevo da Bacia do Rio demais direções não são expressivas tanto
Paraíba do Meio apresentam comprimento no comprimento quanto na frequência.
e frequência distribuídos em várias
As rosáceas de lineamento para o azimute
direções, sendo predominante na direção
360º (Figuras 2d e 3d) apresentam maior
NW. As direções E-W e N são expressivas
distribuição que aquelas presentes nos
secundariamente.
demais azimutes analisados, apesar de
Para o azimute 90° (Figuras 2b e 3b) manter a direção preferencial em NE,
apresenta-se predominância de secundariamente E-W, mas possuindo
significativa ocorrência em NW.

Figura 2: Mapa dos lineamentos extraídos do rio Paraíba do Meio: (a) para azimute 45°; (b) para azimute 90°; (c)
para azimute 315°; (d) para azimute 360°.
215

Figura 3: Diagrama de rosetas: (a) para azimute45°; (b) para azimute 90°; (c) para azimute 315°; (d) para
azimute360°

Em suma, nota-se que, a distribuição dos direção NE, acompanhando assim, o trend
lineamentos apresenta-se de maneira regional em que a bacia está inserida
heterogênea, e que embora no azimute 45º a auxiliando, desta forma, na caracterização
direção preferencial encontrada seja NW, morfoestrutural da referida bacia.
no geral, tanto o comprimento como a
frequência para a bacia em estudo apresenta REFERÊNCIAS
direção NE e E-W como preferencial,
indicando que o controle estrutural regional Corrêa, A.C. B; Fonsêca, D.N. (2010) Lineamentos
determina o trend das formas de relevo da de drenagem e de relevo como subsídio para a
bacia, isso ocorre em consonância com a caracterização morfoestrutural e reativações
neotectônicas da área da bacia do Rio Preto,
estrutura dominante da região, a zona de Serra do Espinhaço Meridional – MG. Revista de
cisalhamento Pernambuco, que segundo Geografia. Recife: UFPE – DCG/NAPA, v.
Magnavita (1992 apud Monteiro, 2015) “se especial VIII Sinageo, 1.
caracteriza por ter direção preferencial E-W
com ligeiros desvios nas porções ocidental Etchebehere, M.L.C.; Saad, A.R.; Fulfaro, V.J.
(2007) Análise de bacia aplicada à prospecção de
e oriental. Sua gênese está atrelada ao ciclo água subterrânea no planalto acidental paulista,
Brasiliano (700-500 Ma) tendo sido SP. Geociências, São Paulo: Unesp, 26, (3), 229-
reativadas durante a ruptura do Pangea 247.
(Brasil-África). Reativações que, conforme
Sousa et al (2012) “criaram zonas Maia, R.P; Bezerra, F.H.R. (2012) Geomorfologia e
neotectônica da Bacia Hidrográfica do Rio
miloníticas de direção E-W e também nas
Apodi-Mossoró Ne/Brasil. Revista Mercartor,
suas ramificações de direção NE”. 11, 209-228.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Maia, R.P; Bezerra, F.H.R. (2014) Condicionamento


estrutural do relevo no Nordeste setentrional
brasileiro. Universidade Federal do Ceará.
A utilização de dados SRTM foi de grande Revista Mercartor. 13, (1), 128.
importância nas interpretações acerca das
estruturas lineares na área de estudo e, Monteiro, K.A. (2015) Análise geomorfológica da
através da técnica de sombreamento, foi escarpa oriental da Borborema a partir da
possível distinguir a direção preferencial aplicação de métodos morfométricos e análises
estruturais. 2015. 222 f. Tese (Doutorado),
dos alinhamentos de relevo, onde monteirse
obteve o resultado de uma preferência em
216

Departamento de Ciências Geográficas, região do Espinhaço Meridional (MG): uma


Universidade Federal de Pernambuco, Recife. correlação com processos evolutivos. Tese
(Doutorado) Programa de Pós-Graduação em
Saadi, A. (1993) Neotectônica da Plataforma Geologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.
Brasileira: esboço e interpretação preliminares.
Geonomos, 1, (1), 1-15.

Veneziani, P. (1987) Análise de movimentos de


tectônica rúptil e rúptil-dúctil através da
interpretação de produtos de sensores remotos na
MAPEAMENTO DOS LINEAMENTOS DE DRENAGEM E DE
RELEVO COMO CONDICIONANTES NA COMPARTIMENTAÇÃO
GEOMORFOLÓGICA DO MUNICÍPIO DE SALGUEIRO – PE
Viviane Trajano da Silva, Ítalo Rodrigo Paulino de Arruda, Débora
Albuquerque Meira Coelho Ramos, Danielle Gomes da Silva

espaço de tempo muito inferior em relação


INTRODUÇÃO às técnicas tradicionais de mapeamento.

O avanço nas pesquisas geomorfológicas Segundo Florenzano (2008), os estudos


utilizando geotecnologias cresceu de forma condicionados à caracterização da paisagem
considerável no Brasil nos últimos anos. com variáveis morfométricas têm sido
Estas ferramentas de suporte tecnológico bastante aplicados para o delineamento de
não só foram modernizadas, como houve feições geomorfológicas com o
grande incentivo por parte dos desenvolvimento e progresso de métodos
pesquisadores ao utilizarem destas para automáticos de extração dessas variáveis.
obtenção de melhores resultados em suas Pelo fato do relevo ser uma unidade que se
pesquisas, pois as geotecnologias oferecem destaca nas imagens de satélite, bem como
um vasto nível de reconhecimento da área pela disponibilidade de dados
atreves das informações que podem ser multitemporais que possibilitam o
extraídas. aprendizado de processos morfodinâmicos,
a ciência geomorfológica é fortemente
Freitas Filho e Souza (2005), afirmam que beneficiada pela tecnologia de
as geotecnologias vêm oferecendo um sensoriamento remoto.
grande progresso na execução de
mapeamentos destinados às mais variadas De acordo com Cunha, Mendes e Sanchez
áreas da ciência. Tarefas que antes eram (2003), a compreensão das formas de relevo
executadas manualmente, hoje são e seus processos geradores estão firmados
realizadas de forma digital e no fato de que o relevo se constitui no
confeccionadas com o auxílio e agilidade de substrato físico sobre o qual as atividades
softwares e hardwares de última geração. humanas se desenvolvem. Por isso, o uso
Assim, passou-se a ter mapas com das geotecnologias se torna essencial para o
indicação de mais detalhes, precisão avanço das informações geradas.
cartográfica e qualidade, elaborados em um
218

O mapeamento e a análise dos lineamentos ÁREA DE ESTUDO


de drenagem e de relevo auxiliam na
compreensão da influência da tectônica na O município de Salgueiro está localizado na
compartimentação geomorfológica de uma mesorregião Sertão e na Microrregião
determinada área, tendo em vista que os Médio Capibaribe do Estado de
lineamentos são feições mapeáveis da Pernambuco. A área municipal ocupa
superfície que revelam a estrutura do 1726,4 km2 e representa 1.75 % do Estado
embasamento rochoso. de Pernambuco. Está inserido nas Folhas
Sudene de Jardim, Topanaci e Salgueiro na
Nesta finalidade de compreensão, a escala 1:100.000. Dista 509,9 km da capital
utilização de sensoriamento remoto, do Estado, e o acesso é feito pela BR-232
geoprocessamento e outras geotecnologias (Figura 1).
se tornam fundamentais e essenciais na
construção de informações e interpretações Salgueiro está inserido na unidade
no contexto geomorfológico. geoambiental da Depressão Sertaneja, que
representa a paisagem típica do semiárido
Para o mapeamento em questão, foi nordestino, caracterizada por uma
utilizado o Software MicroDEM, outra superfície de pediplanação, relevo
ferramenta indispensável nos estudos predominantemente suave-ondulado,
geomorfológicos. A partir dele, é possível cortada por vales estreitos, com vertentes
abstrair de imagens SRTM, possíveis dissecadas. Elevações residuais, cristas e/ou
lineamentos no relevo estudado, além de outeiros pontuam a linha do horizonte.
modelos digitais de elevação entre outros.A Esses relevos isolados testemunham os
utilização de imagens SRTM (Shuttle ciclos intensos de erosão que atingiram
Radar Topography Mission) tem se tornado grande parte do sertão nordestino.
cada vez mais periódica em estudos
geológicos, geomorfológicos e ecológicos, A área apresenta clima semiárido com
dentre outros. Para análises tanto chuvas escassas e irregulares, com grande
quantitativas como qualitativas do relevo e variação no tempo, no volume e no espaço.
seus agentes modificadores (Carvalho e Caracteriza-se ainda por um longo período
Latrubesse, 2004), em especial na de seca com duração de 7 a 8 meses, com
elaboração de mapas que possam identificar índice pluviométrico variando entre 500 e
e georreferenciar os lineamentos do relevo 600 mm ao ano e temperatura média anual
em questão. de 26C°.

O objetivo deste trabalho é identificar os A vegetação é basicamente composta por


lineamentos utilizando o software Caatinga Hiperxerófila com trechos de
MicroDEM, com intuito de caracterização Floresta Caducifólia, sendo relativamente
da compartimentação morfoestrutural no densa arbustiva ou arbórea de pequeno
município de Salgueiro, município porte.
localizado no estado de Pernambuco no
Nordeste do Brasil. A partir da extração dos Com respeitos aos solos, na área ocorrem os
trechos retilíneos de relevo, onde se pode Neossolos Flúvicos e Quartezarênicos, os
obter o direcionamento das principais Luvissolos, Planossolos, Argissolos
feições estruturais da área. Vermelho-AmarelosNeossolos Litólicos e
Regolíticos e os Vertissolos (Figura 2).
219

Figura 1: Mapa de localização da cidade de Salgueiro.

Figura 2: Mapa de Solos da cidade de Salgueiro.


220

A região em estudo está situada no contexto (xistos e filitos), muito deformadas e


da Província Borborema, definida como um fraturadas, cujos principais tipos litológicos
cinturão orogênico de idade são muscovita-biotita-granada xistos,
meso/neoproterozóica, que se estende por biotita-quartzoxistos, quartzoxistos de
grande parte do nordeste brasileiro (Figura granulação média a fina, cor cinza a cinza
3). Dentro desta província, a quadrícula de escura e, subordinadamente, outras rochas
Salgueiro ocupa áreas classificadas como metassedimentares de composição
pertencentes aos domínios tectono- calcossilicática, anfibolítica, quartzítica,
estratigráficos Transversal (parte norte) e arcoseana e algumas metavulcânicas. A
Externo (parte sul), limitados pelo hidrografia está representada pelos rios da
Lineamento Pernambuco (Gomes, 2001). sub-bacia do Terra Nova, afluente da
margem esquerda do São Francisco, que
O substrato geológico da área está drenam suas águas para o sul da área. Como
composto por rochas metamórficas de idade principais afluentes do Terra Nova
mesoproterozóicas, compostos basicamente encontram-se o riacho Salgueiro e o rio
por gnaisses, migmatitos e xistos que Ouricuri (intermitentes). A grande maioria
afloram na parte sul da quadrícula. Em sua dos cursos d’água da região são temporários
parte norte, a área está constituída e seus vales são abertos com a presença de
basicamente por rochas metamórficas fina cobertura de sedimentos aluvionares.
xistosas de baixo a médio grau metamórfico

Figura 3: Mapa Geológico da cidade de Salgueiro. Fonte: CPRM(2005).


221

A região está situada dentro da unidade nível, perfis topográficos, visualizações em


geomorfológica denominada Depressão 3D de formas de relevo, e extração de
Periférica do São Francisco (Sudene, 1973), lineamentos, técnicas primordiaispara o
onde está caracterizada a superfície de avanço da concepção de uma determinada
aplainamento esculpida por um sistema de área de estudo.
erosão semiárido. Predominam extensas
superfícies pediplanadas, de relevo suave Para a confecção do mosaico utilizou-se as
ondulado a ondulado, cujas declividades cartas SB-24Y-D; SB-24Z-C; SC-24V-B;
são baixas (1-3%), com caimento para sul. SC-24X-Aque foram abstraídas no site da
Recobrem estas áreas, extensas coberturas Empresa Brasileira de Pesquisas
de cascalhos e seixos (principalmente de Agropecuárias (Embrapa) com obtenção da
quartzo), constituindo um pavimento imagem do Shutle Radar Topographic
detrítico, que capeia solos de pequena Mission (SRTM), com proporções
espessura. Cortando estes pediplanos compatíveis com a escala 1:250.000 (IBGE)
ocorrem vários “inselbergs” e serras e em uma resolução espacial de 90 m dentro
alongadas (maciços residuais), formadas do sistema de coordenas geográficas para
por rochas cristalinas, onde as cotas podem que elas cobrissem todo o território do
passar dos 600 m e a declividade chegar a município de Salgueiro. Estas informações
45%, com a presença de estreita cobertura foram de mera importância na elaboração
coluvial em seu sopé. A orientação dessas dos modelos digitais de elevação utilizados
serras é principalmente SW-NE na parte neste trabalho.
norte da quadricula e NW-SE na sua parte
sul. Estas orientações foram impostas por As ferramentas utilizadas e que
uma tectônica de idade neoproterozóica contribuíram para a compreensão dos dados
(560 m.a), que gerou também a mega zona geomorfológicos do município de Salgueiro
de cizalhamento denominada de foram às denominadas Elevation (Elevação)
Lineamento Pernambuco. e Reflectance (Refletância). Fez-se
necessário também a criação de blocos
diagrama em 3D e de perfis topográficos.
MATERIAIS E MÉTODOS Estes possuem uma considerável
importância para a individualização das
Esta pesquisa foi realizada através de
diferentes superfícies geomorfológicas do
investigação bibliográfica, e com o auxílio
ambiente.
de documentos e artigos referentes à área no
intuito de melhor compreender a geologia e
geomorfologia da área de estudo. Foram RESULTADOS E DISCUSSÕES
utilizadas imagens de satélites aplicando
técnicas do software MicroDEM para O software MicroDEM se tornou essencial
visualização e melhor compreensão da para a confecção de imagens resultantes da
morfologia e dos lineamentos. geomorfologia do ambiente, tendo em vista
que permite a construção de blocos
O Software MicroDEM é uma das mais diagrama indispensáveis para uma
novas geotecnologias livres de mapeamento visualização geral da área com base em sua
e análise geomorfométrica desenvolvido altimetria, perfis topográficos que auxiliam
pelo Professor Peter Guth do Departamento na detecção de áreas de estocagem de
de Oceanografia da Academia Naval dos sedimentos, uma excelente visualização das
EUA (US Naval Academy) (USNA, rugosidades do relevo, assim como a
online). As principais funções identificação de feições lineares e de seus
desempenhadas dizem respeito a criação de direcionamentos que poderão ser uma
Modelos Digitais de elevação coloridos, excelente ferramenta na indicação das
mapas de declividade, mapas de curvas de drenagens, tal como de afeiçoamentos da
222

paisagem que possam estar associadas a 5), que tem como unidade principal
neotectônica. Sendo assim é possível delimitar medidas e direções dos
reafirmar a competência deste software lineamentos. É possível identificar que boa
como ferramenta indispensável para o parte desses lineamentos estão organizada
estudo da paisagem geomorfológica. na posição noroeste sudoeste, que tendem a
seguir um padrão de menor escala dentro do
Realizada a delimitação da área foi possível relevo.
identificar que o município possui uma
variação altimétrica entre 400 e 800 m. Realizou-se também a construção de um
Bloco Diagrama que possibilita uma melhor
Com a utilização do Software é possível compreensão do contraste de altitude do
calcular a quantidade de lineamentos que terreno (Figura 6).
fazem parte das feições do relevo. Os
lineamentos são elevações recorrentes de O bloco diagrama é utilizado para uma
falhas no terreno, visto que estes melhor visibilidade morfológica do relevo,
representam importantes elementos para além de possuir uma considerável
interpretar o contexto tectônico de uma importância para a individualização das
determinada área (Figura 4). diferentes superfícies geomorfológicas do
ambiente.
Realizado o mapeamento dos lineamentos,
foi produzido o Diagrama de Roseta (Figura

Figura 4: Área aproximada do município de Salgueiro e representação dos lineamentos encontrados.


223

Figura 5: Diagrama de Roseta da direção que nos fornece a quantidade de lineamentos no recorte.

Figura 6: Bloco diagrama no recorte com exagero vertical.

O direcionamento das encostas é dos maciços pode-se compreender a


apresentado na Figura 7. A orientação dos distribuição e deposição dos sedimentos,
maciços residuais é principalmente SW-NE além da distribuição geográfica das recentes
na parte norte da quadricula e NW-SE na bacias que continuam recebendo materiais.
sua parte sul. A partir do direcionamento
224

Figura 7: Principais direcionamentos das encostas.

O Software ainda nos permite associar os A partir da Figura 9 é possível perceber a


diferentes níveis de altitude que o relevo existência de duas superfícies
possui, sejam elas bruscas ou suaves, pedimentares, de provável origem
demarcando os limites entre as diversas tectônica, separadas por maciços residuais
unidades do relevo de uma maneira bem em crista.
mais detalhada (Figura 8).

Figura 8: Histograma do modelo de elevação da área recortada.


225

Figura 9: Perfil topográfico da área recortada, onde se encontra o município de Salgueiro.

geomorfológicas se tornaram essencial para


CONSIDERAÇÕES FINAIS
o desenvolvimento dos estudos e
Compreender o relevo se tornou a principal informações a respeito da temática
tarefa dentro da Geomorfologia. Grandes abordada.
são os investimentos aplicados para facilitar
Os lineamentos encontrados dentro do
a compreensão e identificação das formas e
recorte feito no Software MicroDEM,
estruturas da paisagem. Identificar os
lineamentos, os maciços residuais, as localizados no município de Salgueiro e
regiões vizinhas foi bastante satisfatório,
escarpas entre outras unidades
permitindo identificar as rugosidades
226

existentes dentro da morfologia local, CPRM - Serviço Geológico do Brasil. (2005)


considerando que essas grandes unidades, Cadastro de fontes de abastecimento por água
subterrânea. Diagnóstico do município de
participam de uma evolução que ocorreu no Salgueiro, estado de Pernambuco. Recife:
espaço durante milhares de anos e que pode CPRM/PRODEEM.
estar sendo reativada.
Cunha, C.M.L.; Mendes, I.A.; Sanchez, M.C. (2003)
Assim, o uso do MicroDEM foi crucial na A cartografia do relevo: uma análise comparativa
obtenção dos resultados colocados nesta de técnicas para a gestão ambiental. Revista
Brasileira de Geomorfologia, Rio de Janeiro, 1,
pesquisa. Além da ajuda de outras 1-9.
ferramentas como o Sensoriamento Remoto
e o Geoprocessamento que nos possibilitou Florenzano, T.G. (2008) Geomorfologia: conceitos e
uma eficiente qualidade nos dados obtidos. tecnologias atuais. São Paulo, Oficina de Textos.
Dados esses, que são válidos na
Freitas Filho, M. R., Souza, M. J. N. (2005) Análise
interpretação dessas unidades e
geoambiental com aplicação de geotecnologias
compreensão da geomorfológica local. nas nascentes do riacho dos Macacos: bacia do
Sugere-se então, um maior uso deste rio Acaraú-CE. Anais XII Simpósio Brasileiro de
software para que se possa ter um grande Sensoriamento Remoto, Goiânia.
acervo de dados geológicos e
geomorfológicos do território nacional. Gomes, H. A. (2001) Geologia e recursos minerais
do Estado de Pernambuco- Texto explicativo dos
mapas geológico e de recursos minerais do
REFERÊNCIAS estado de Pernambuco. Brasília:
CPRM/DIEDIG/DEPAT.
Carvalho, T.M.; Latrubesse, E.M. (2004) O uso de
modelos digitais do terreno (MDT) em análises Sudene. Ministério da Agricultura; Brasil. (1973)
macrogeomorfológicas: o caso da bacia Levantamento exploratório - reconhecimento de
hidrográfica do Araguaia. Revista Brasileira de solos do estado de Pernambuco. Recife:
Geomorfologia, 85-93. MA/CONTAP/USAID/ETA,
DINÂMICA COSTEIRA E REGISTRO ARQUEOLÓGICO NA
PRAIA DE JERICOACOARA, JIJOCA DE JERICOACOARA –
CEARÁ – BRASIL
Verônica Viana, Thalison dos Santos, Cristiane Buco e João Moreira
Cavalcante

Assim, a importância da caracterização


INTRODUÇÃO ambiental nesse trabalho está presa a
duas preocupações — compreender a
A caracterização geográfica sempre foi relação homem e meio estabelecida
basilar nos estudos arqueológicos para nessa área e, ao mesmo tempo,
contextualizar as ocupações humanas compreender os processos de deposição
pretéritas e, no estudo em questão, e erosão que interferiram na
reveste-se ainda mais de importância em desintegração do contexto arqueológico.
virtude de um aspecto peculiar que tanto O primeiro ponto é resultante da primeira
singulariza a praia de Jericoacoara — a questão alçada diante de sítios dessa
intensa dinâmica ambiental que interfere natureza: seriam possíveis instalações
substancialmente na configuração da humanas nesses ambientes supostamente
paisagem local e, por consequência, na inóspitos à habitação?
formação e desagregação dos sítios
arqueológicos ali existentes. Para o nosso estudo, interessam-nos os
eventos ocorridos, especialmente, a
Essa dinâmica deve-se, dentre outros partir dos últimos 5.100 anos. Todavia,
fatores, à existência do promontório eventos remotos necessários à
denominado Ponta de Jericoacoara, contextualização arqueológica da área
formado de rochas pré-cambrianas não serão descartados, a exemplo da
quartzíticas e gnáissicas que, desde os formação litológica local, a qual
últimos 120.000 anos AP (Antes do subsidiará os estudos acerca da
Presente) tem atuado como um tômbolo, disponibilidade de jazidas para a
proporcionando uma dinâmica peculiar atividade do lascamento, bem como a
na construção da planície, diversificando caracterização das áreas eventualmente
a direção e sentido dos ventos e das utilizadas como abrigo.
migrações dos sedimentos ao longo da
linha de praia e na direção do continente O início do período de nosso interesse,
(Meireles, 2002:84). 5100 anos AP, remete a um tempo de
228

maior calor que provocou a retomada da


tropicalização, correspondendo a um
período que os geógrafos
convencionaram chamar optimum
climático e, de acordo Ab’Saber
(2000:38) representou a “garantia total
de que alguns grupos ocuparam
preferencialmente setores da costa em
áreas dotadas de lagunas, restingas,
estuários e lagamares, ou em margens de
Figura 1 –Sítio Jericoacoara I – Concentração I
baias oriundas de ingressões marinhas
relacionadas com o optimum climático”.

Corroborando essa premissa, sabe-se que


nesse período as ocupações costeiras no ÁREA DE ESTUDO
Brasil vão se dar de forma mais efetiva,
tanto em sítios sambaquieiros que A praia de Jericoacoara está localizada
aparecem com uma interrupção entre os no litoral noroeste do estado do Ceará, a
estados do Piauí e Sergipe, como em cerca de 285 km de Fortaleza, sob as
sítios designados “dunares” ou “erodidos coordenadas 2º 47' 14" S e 40° 30' 26"
sobre dunas”, identificados de forma W. A principal via de acesso, a partir da
ininterrupta na costa brasileira, cidade de Fortaleza, capital do estado do
ocorrendo em profusão nas planícies Ceará, dá-se por meio da rodovia
litorâneas e tabuleiros pré-litorâneos do estadual estruturante CE-085, a rota do
Ceará. sol poente, que leva até a cidade de Jijoca
de Jericoacoara. A partir de Jijoca,
Assim, no tocante à caracterização das segue-se por estrada carroçável até a
mudanças que tiveram lugar a partir do Praia do Preá, tornando-se necessário, a
Optimum Climático, ressaltaremos partir de então, o uso de automóveis
algumas temáticas que nos auxiliarão na tracionados para se chegar à praia de
compreensão das relações homem e Jericoacoara.
meio na zona costeira de Jericoacoara, a
exemplo dos estudos acerca das A área de pesquisa está circunscrita ao
diferentes gerações de dunas, Parque Nacional (Parna) de
fundamentais também para o Jericoacoara, um bioma marinho
entendimento da formação e costeiro com área de 8.862,89 hectares
desintegração dos estratos que compõem que tem como objetivo “proteger e
o sítio Jericoacoara I (Figura 1). No preservar amostras dos ecossistemas
mais, os estudos sobre as últimas costeiros, assegurar a preservação de
regressões e transgressões marinhas são seus recursos naturais e proporcionar
basilares para o entendimento da oportunidades controladas para o uso
configuração paisagística à época das público, educação e pesquisa científica”
ocupações, subsidiando questões como a (Icmbio). O Parna foi criado no ano de
proximidade do mar e as proposições 2002 e teve a sua área redimensionada
futuras acerca das relações estabelecidas por meio da Lei Federal nº11.486, de 15
com esse recurso alimentar, lúdico, meio de junho de 2007.
de transporte e simbólico.
229

A praia de Jericoacoara tem como O sítio Jericoacoara I (Figura 2),


peculiaridade a presença de um caracterizado por ampla dispersão
promontório localmente denominado espacial num raio de 1 km, está situado a
“Serrote de Jericoacoara”, constituído de barlavento do Serrote de Jericoacoara, a
quartzito ferrífero cataclasado, saliência cerca de 200 m da pancada do mar e, em
responsável pela quebra da regularidade alguns trechos, pode ser visualizado em
da linha de costa, mudando bruscamente superfície, dada a sua localização em
da direção oeste-leste para nordeste- área de intensa deflação. Na atualidade,
sudoeste. Sua cota máxima chega a 98 m, podem ser visualizadas seis
formando uma crista de direção ENE- concentrações distintas (Figura 3),
WSW, com aproximadamente 2 km de formadas por vestígios que rolaram para
extensão da linha de preamar (Morais, a base das depressões eólicas
2006:144). Em torno dessa elevação (blowouts)4, ocasionando a destruição
aparecem numerosas concentrações de dos contextos arqueológicos. Todavia,
materiais arqueológicos distribuídas, em ainda existem muitos trechos com
princípio, em dois sítios3 – o estratigrafia preservada nos quais alguns
Jericoacoara I (CNSA CE 00129), vestígios e estruturas de fogueiras podem
também designado “Serrote”, objeto de ser visualizados nas paredes dessas
estudo no presente trabalho, e o depressões.
Jericoacoara II (CNSA CE 00130).

Figura 2 – Sítio Jericoacoara I (Concentração 1) -Trecho no qual se verifica estratigrafia preservada e


inúmeros vestígios que desceram para a base de um corredor eólico

3 4
Sítios identificados por ocasião dos estudos arqueológicos É o termo empregado para descrever depressão produzida
levados a cabo junto à implantação do sistema de pelo vento em uma duna ou complexo dunar (Claudino-Sales,
esgotamento sanitário da Vila de Jericoacoara, a cargo da 2005)
Companhia de Água e Esgoto do Ceará – CAGECE (Viana;
Souza; Soares, 2007b)
230

Figura 3 – Localização do sítio Jericoacoara I com suas respectivas concentrações

transgressões e regressões marinhas que


MATERIAIS E MÉTODOS
tiveram lugar na praia de Jericoacoara.
A metodologia utilizada neste trabalho
O propósito, como referido, foi entender
consistiu em levantamentos
o ambiente à época da ocupação do sítio
bibliográficos exaustivos, incluindo as
Jericoacoara I, além das interferências do
informações cartográficas, das
ambiente na constituição e desagregação
informações geológicas/
do contexto arqueológico. No tocante
geomorfológicos disponíveis em escala
aos procedimentos de campo, foi
local e regional, objetivando-se cotejar
executada uma primeira campanha de
dados arqueológicos e ambientais.
escavação no mês de setembro do ano de
Foram priorizadas informações acerca
2010, executando-se uma trincheira de
da litologia local, dos campos de dunas
existentes na área, bem como os dados 10 x 1 m, num trecho com estratigrafia
preservada. Com o intuito de
relativos aos efeitos das últimas
observarmos a interferência da dinâmica
231

eólica na erosão e deposição na área do Estende-se da praia da Lagoinha até


sítio, as concentrações arqueológicas Jericoacoara, apresenta evolução
estrutural complexa, pois nele
começaram a ser mapeadas persistem vestígios de estruturas
sazonalmente, alternando-se períodos de elevadas e rebaixadas (Grabens e
estiagem (com ventos mais intensos) e Horts) de idade Paleozóica, anterior,
períodos de chuva (com ventos menos portanto, à estruturação atlântica
intensos) e, em seguida, os mapas cretácea, mas que foram soerguidas,
rebaixadas ou deformadas durante
gerados serão sobrepostos para esse episódio, tendo como maior
avaliarmos as áreas que serão erodidas expressão o fenômeno da Ponta de
ou soterradas no futuro. Jericoacoara (Ibid.,p. 235).

Dando continuidade às intervenções, Do ponto de vista geológico (Figura 4), a


serão realizadas novas escavações nas Ponta de Jericoacoara está inserida no
áreas consolidadas das concentrações 1 e domínio do Médio Coreaú, com destaque
6, priorizando-se agora a escavação de para o Grupo Martinópole, composto
ampla superfície. Serão coletadas pelas Formações Covão (topo), Santa
amostras sedimentológicas com o Terezinha e São Joaquim (base) e
propósito de intensificar as análises que vulcânicas sinsedimentares, ocorrendo
responderão por aspectos relacionados ainda litologias representadas
ao paleoambiente.
da base para o topo por quartzitos e
filitos, filitos e xistos e quartzitos.
RESULTADOS E DISCUSSÕES Associados aos quartzitos da
Formação São Joaquim ocorrem
A zona costeira cearense evoluiu ao quartzitos ferruginosos intercalados e
longo do tempo geológico através de paralelos ao acamamento pretérito e à
foliação atual. Além desta sequência
processos internos como as intervenções metassedimentar, ocorrem
tectônicas e isostasia, bem como da ação protocataclasitos grosseiros, alguns
de processos externos como as variações cimentados por óxido de ferro que
do nível do mar, correntes litorâneas, percolou nas fraturas/falhas
precipitações e ventos, gerando cenários remobilizadas da rocha fonte. Na
ponta de Jericoacoara,
que tanto singularizam a costa cearense, especificamente, predominam
a exemplo de praias, falésias, quartzitos e quartzitos ferruginosos da
beachrocks, pontas rochosas, estuários, parte basal da Formação São Joaquim.
lagoas interdunares e extensos campos São rochas de idade neoproterozóica
de dunas. Tal diversidade de paisagens (Toniano) intensamente dobradas e
redobradas (que sofreram um forte
naturais, conforme tem salientado fraturamento formando brechas
Claudino-Sales (2005:234), permite-nos ferruginosas, resultante da ruptura do
definir a existência não de apenas um, continente que levou à formação da
mas de vários litorais cearenses. Margem Atlântica. Ocorrem também
lateritas ferruginosas desenvolvidas
Os referidos “litorais” estão pela oxidação/hidratação dos
quartzitos e quartzitos ferruginosos,
representados na costa cearense por formando crostas conglomeráticas
cinco domínios morfoestruturais — com clastos de quartzo e espessura
Jaguaribe, Choró, Baturité, Jaibaras e métrica. (Júlio et al 2012:4-5).
Chaval, constituídos a partir de critérios
geológicos e geomorfológicos, como a De acordo com a caracterização
tectônica cretácea e a morfodinâmica litológica estabelecida, percebe-se a
costeira, interessando-nos aqui o disponibilidade de jazidas propícias e
domínio Jaibaras, no qual se encontra não propícias à confecção de artefatos
inserida a nossa área de pesquisa: líticos lascados. Os primeiros resultados
232

das pesquisas no sítio Jericoacoara I pela presença de pilares marinhos


(Viana, Soares e Souza, 2007a; Soares, posicionados dentro do mar e na faixa de
2011) revelaram que os grupos que praia, blocos suspensos, além de
habitaram a área utilizaram, paredões rochosos e cavernas, que
preferencialmente, o quartzo e quartzito, começaram a ser modelados por volta de
aproveitando as jazidas disponíveis no 120.000 anos AP.
local; no entanto, rochas não referidas na
caracterização litológica anteriormente O arco marinho, representado pela Pedra
esboçada, a exemplo das sedimentares Furada, um dos principais cartões postais
silicificadas, também foram utilizadas, da área, bem como um conjunto de três
embora em menor proporção. Tal cavernas, esculpidas em quartzito
constatação permite-nos falar em (Figura 5), estão localizadas no entorno
eventuais deslocamentos para aquisição dos sítios Jericoacoara I e Jericoacoara II
de matérias-primas em outros territórios. e é possível que essas formações
rochosas, constituintes importantes das
Ainda em termos litológicos, a planície análises “inter-sítio”, tenham funcionado
costeira de Jericoacoara é possuidora de como abrigos em momentos de níveis de
elementos que a diferenciam dos demais mar mais baixos, como na atualidade,
domínios morfoestruturais da costa servindo assim, à proteção de grupos
cearense, ocorrendo um prolongamento pré-coloniais que habitavam ou
do cristalino para o litoral, exemplificado transitavam nesse interjacente costeiro.

Figura 4: Geologia local- Fonte: Júlio et al 2012.


233

Figura 5: Cavernas esculpidas em quartzito - Fonte: Júlio et al 2012.

Com relação aos campos de dunas, cabe- presença humana na área, em especial a
nos enfatizar que os mesmos se configuração paisagística à época em
configuram como uma peculiaridade do que se deram essas instalações, seja em
litoral brasileiro; no entanto, na região caráter temporário ou permanente. O
que abriga parte das zonas costeiras do cotejamento dos dados propiciará ainda
estado do Ceará (extremo noroeste), na o estabelecimento de cronologias
qual se inclui a praia de Jericoacoara; o relativas e a percepção das escolhas com
Estado do Piauí (Delta do Parnaíba); e relação aos locais originários de
Maranhão, em área correspondente aos ocupação (pisos). Sabe-se que na costa
lençóis, tem-se uma maior erosão e uma cearense os grupos humanos se
maior disponibilidade de areias. instalaram no topo da formação
Barreiras e dos eolianitos5, sobre dunas
Na presente pesquisa, a correlação dos consolidadas e em antigos terraços
dados arqueológicos com as informações fluviais ou marinhos. No mais, um outro
acerca do processo de formação e aspecto de grande interesse, são as
mobilização de dunas na planície interferências que esses depósitos
costeira de Jericoacoara fornece
subsídios para o entendimento da

5 essencialmente produzidas por abrasão eólica, que são


Ocorrem ao longo de quase toda a costa noroeste do Ceará e conhecidas pelos nativos sob a denominação de “cascudos”
são formados por pacotes de rocha sedimentar arenosa, em razão da rigidez que apresentam comparativamente aos
quartzo bioclástica, com cimento de carbonato de cálcio. demais depósitos eólicos. Não se tem certeza da época de
Constituem uma unidade geológica holocênica, rara no litoral formação das dunas que deram origem aos eolianitos, pois as
brasileiro, com estruturas e composição de características datações, até então, têm revelado apenas a época de litificação
especiais que fornecem importantes informações sobre a desses depósitos. Os primeiros resultados obtidos revelaram
dinâmica eólica e as condições climáticas e de ambiente idades entre 1.780 ± 80 a 1.320 ± 50 anos A.P (carvalho et al,
costeiro existentes à época de sua formação. Esses depósitos 2008)
litificados exibem formas de relevo ruiniforme,
234

eólicos exercem na constituição e secundariamente, dômicas, localizadas


desagregação dos sítios arqueológicos. mais no interior da planície de
Jericoacoara. Em setores próximos às
Cinco gerações de dunas holocênicas dunas de segunda geração, estão sendo
foram estabelecidas por Claudino-Sales soterradas pelas dunas móveis. São mais
(2005:247-248) para a costa cearense, elevadas que as outras gerações e
classificando-as nos seguintes grupos: possivelmente atuaram como barreiras
Dunas 1 (D1) – dunas atuais móveis, eólicas para a migração das dunas que se
anteriores a 400 anos AP; Dunas 2 (D2) dirigem para setores SE/SW da planície
– formadas entre 1200 e 400 anos AP, costeira. De tal modo, a primeira geração
sendo a célula sedimentar Barrinha- proposta por esses autores
Jericoacoara-Guriú a área de ocorrência corresponderia, provavelmente, ao
típica — nessa área, dunas móveis chamado grupo D3, estabelecido por
percorrem até 12 km; Dunas 3 (D3) — Claudino-Sales (2005), com datações
dunas acumuladas durante a última entre 2700 e 1200 anos AP.
regressão marinha holocênica, hoje
fixadas (...) situadas, provisoriamente, A 2ª geração, composta pelo conjunto de
entre o intervalo 2700 AP e 1200 anos dunas móveis dos tipos barcanas e
AP, representadas pelas parabólicas barcanóides, está relacionada a pulsos de
hairpin, por parcela dos campos de sedimentos, provavelmente originados
dunas fixas sem formas definidas e por alterações de alta frequência do nível
parcelas de eolianitos; Dunas 4 (D4), relativo do mar e estão associadas com as
formadas durante intervalos de tempos formas espaço-temporais e direcionais
anteriores ou contemporâneos da que definem intervalos de migração e
transgressão holocênica de 5100 anos direção preferencial de deslocamento.
AP, atualmente cobertas por dunas mais Cronologicamente, vincular-se-iam ao
recentes ou representam campos de grupo D2 proposto por Claudino-Sales
dunas descontinuas vegetalizadas e (2005), cobrindo um intervalo de tempo
estáveis que se estendem por vezes até entre 1200-400 AP.
40 km no interior da zona costeira;
Dunas 5 (D5) - dunas formadas antes da Uma terceira geração, a mais recente,
transgressão holocênica que sustentam correspondente ao grupo D1, formado
falésias inativas em diversos setores por dunas anteriores a 400 anos, seria
litorâneos (Icapuí, Canoa Quebrada e representada por dunas móveis atuais do
Lagoinha). tipo longitudinais, dispostas sobre a zona
de berma atual, associada às morfologias
Meireles e Raventos (2002) e Meireles produzidas pelo imediato transporte de
(2011) analisando os depósitos eólicos areia da faixa de praia.
da planície costeira de Jericoacoara,
entre as desembocaduras do riacho Doce Nesse caso, correlacionando os dados
e do rio Guriú, identificaram três arqueológicos preliminarmente
gerações de dunas que podem estar disponíveis para área, que apontaram
associadas a momentos mais recentes do para uma datação de 1140 +/- 30 anos AP
período holocênico, podendo ser (BETA/AMS 290953), a ocupação
vinculadas aos três últimos milênios. humana teria se dado, exatamente, entre
os intervalos D2/D3 (Claudino-Sales,
A primeira geração, mais antiga, é 2005) ou Gerações 1/2 (Meireles e
formada por dunas fixas (vegetação Raventos 2002; Meireles, 2011). Os
arbórea com transição para o tabuleiro remanescentes arqueológicos
pré-litorâneo na borda sul do campo), identificados na concentração I, do sítio
dos tipos parabólicas e, Jericoacoara I, estão na atualidade
235

dispostos sobre uma duna consolidada, temporais e direcionais),


sob um espesso pacote de sedimentos evidenciando direção e sentido de
migração de dunas barcanas; camadas
arqueologicamente estéreis, anteriores a de antigas rochas coralinas e
1140 anos AP, que podem corresponder paleomangues aflorando na linha de
a uma ou duas gerações de dunas que se praia atual sobre paleoplataformas de
depositaram sobre a área (Figura 6 e 7). abrasão e antigos depósitos de
mangue aflorando no estirâncio
Na transição referida, entre as duas (Ibid.:83).
gerações, tem-se, em princípio, um
Com o propósito de esboçar os efeitos
período mais úmido (terceira geração)
das oscilações marinhas ocorridas na
que é seguido por um período mais seco
planície costeira de Jericoacoara, tendo
(segunda geração). Essa última,
como base estudos realizados em outros
conforme sugerem Meireles e Raventos
pontos da costa brasileira, Meireles e
(2002, p. 88) estaria associada a
Raventos (2002), Meireles (2011) e Júlio
condições climáticas com índices mais
et al. (2012) sistematizaram cinco
elevados de aridez, para possibilitar
eventos distintos, cobrindo uma
fluxos eólicos competentes, relacionados
cronologia entre 120.000 a 2100 anos
a valores mais elevados de insolação e
AP.
índices ainda baixos de precipitação
pluviométrica. Sob essas condições Num primeiro momento, durante a
ambientais genéricas, antes do último chamada Penúltima Transgressão do
milênio, grupos pré-coloniais se Pleistoceno, por volta de120.000 anos
instalaram em torno do Serrote de AP, o mar atingiu cerca de 6 m acima do
Jericoacoara. nível atual nesta área e permitiu a
formação das cavernas, do arco marinho
Com relação aos testemunhos deixados
e dos pilares marinhos (Júlio et al.
pelas últimas transgressões e regressões
2012:11).
marinhas no litoral cearense, ocorridas
durante o Quaternário, autores que Posteriormente, na fase regressiva desse
tratam da temática têm mencionado que evento, quando ocorreu a última grande
a área da planície costeira de glaciação (Würm), até cerca de 11000
Jericoacoara representa um dos mais anos AP, o nível do mar desceu até cerca
completos conjuntos de evidências de de 120 a 130 m abaixo do nível atual e
mudanças climáticas e do nível do mar abriu caminho para a construção de uma
ao longo do litoral cearense. Desse ampla planície pleistocênica. Essa
modo, os principais geoaindicadores que abertura disponibilizou sedimentos para
ocorrem na planície de Jericoacoara, a formação das dunas parabólicas
representativos desses eventos, entre os interiores, hoje fixadas pela vegetação
estuários do riacho Doce e do rio Guriú, (Ibid, 11).Ainda nessa fase, de acordo
foram assim definidos: com Meireles e Raventos (2002:89), o
3 níveis de paleoplataformas de
promontório, com seu relevo dômico,
abrasão originadas em rochas pré- representando uma área de
cambrianas (quartzitos e gnaisses); aproximadamente 5 km², atuou como
ocorrência de rochas de praia barreira morfológica à migração dos
(beachrocks) sobre o embasamento sedimentos, uma vez que a direção
cristalino e dispostas em 3 níveis
topográficos; presença de conchas em
preferencial dos eixos das dunas
camadas de sedimentos lacustres, parabólicas não manteve relação com
lagunares e marinhos; gerações de seu posicionamento geográfico atual.
dunas barcanas e parabólicas; Esta regressão elevou a competência
alinhamentos consecutivos e paralelos
de cordões arenosos (marcas espaço-
236

hidrodinâmica do sistema fluvial atuais, com valores de aridez mais


instalado na planície (Figura 8). expressivos, ventos mais potentes e
valores de umidade menores do que os
Num terceiro momento, correspondente encontrados atualmente (Ibid., p. 91).
à última transgressão no Holoceno, o Sob essas condições ocorrerão, de forma
nível do mar atingiu seu máximo em mais intensa, as ocupações
5600 anos AP, alcançando cerca de 5 m sambaquieiras do Brasil, bem como a
acima do nível atual. Nesta ocasião, instalação de outros povos costeiros não-
segundo Júlio et al (2012:11) houve o sambaquieiros, a exemplo dos que
retrabalhamento da plataforma de ocuparam a costa cearense, onde as
abrasão marinha e dos arcos e pilares primeiras pesquisas geraram datações
marinhos, assim como da supressão de iniciais em torno de 5000 anos AP - Sítio
praticamente todos os terraços da área Sabiaguaba II – Fortaleza (Souza, 2011)
originados na regressão precedente. e Sítio Caiçara – São Gonçalo do
Segundo Meireles e Raventos (2002:90), Amarante (Luna, 2013).
esse retrabalhamento local ocasionou
ainda o afogamento de canais fluviais. A partir de 2.100 anos AP, o nível do mar
regrediu constantemente até sua cota
O entendimento dos dois últimos atual (Martin et al. 2003 apud Júlio et al.
eventos, a seguir, são fundamentais à 2012:11) e, de acordo com Meireles e
compreensão do contexto ambiental no Raventos (2002:90) o fluxo fluvial do
qual se deram, pelo menos de forma mais riacho Doce rompeu o campo de dunas
efetiva, as ocupações litorâneas no que o bloqueava, retomando seu fluxo
Brasil, incluindo as primeiras instalações fluviomarinho atual. Segundo os
humanas na costa cearense. mesmos, as dunas recentes, encontradas
sobre a berma atual, apresentaram
A regressão subsequente, a partir dos volume e largura (altura que não
5100 anos AP, foi responsável pela ultrapassa os 8m sobre a berma e largura
origem dos terraços marinhos média de 90 m), até 10 vezes menores
holocênicos, depósitos geológicos que as barcanas de segunda geração, as
referentes às antigas lagoas e lagunas, quais alcançaram largura de até 1.100 m
além de beachrocks. Durante essa fase e altura média em torno de 35 m. O
regressiva, foram descobertas extensas último campo de barcanas encontra-se
zonas de praia, favorecendo a afastado da área-fonte em
remobilização dos sedimentos pelo aproximadamente 2.000 m, o que
vento e origem dos campos de dunas representa uma estabilização na fonte de
barcanas e barcanóides, verificando-se sedimentos, caracterizando uma
que pequenas oscilações no nível melhoria nas condições de aridez.
relativo do mar seriam capazes de
descobrir extensas áreas constituídas por Baseado nos dados arqueológicos
sedimentos arenosos, gerando excelentes disponíveis até o momento, é sob essas
condições de aporte e fonte de areias condições ambientais genéricas,
para origem dos campos de dunas verificadas por volta dos dois últimos
barcanas de segunda geração. Estas milênios, que vão se instalar os primeiros
oscilações de alta frequência, grupos humanos na praia de
provavelmente foram associadas a Jericoacoara.
condições climáticas diferentes das
237

Figura 6: Perfil estratigráfico no sítio Jericoacoara I – camada inferior de ocupação (enegrecida) e dunas
que se sobrepuseram ao sítio (sedimentos mais claros).

Figura 7 – Fogueira identificada a 1,10 m de profundidade, sob sedimentos arqueologicamente estéreis,


datada de 1140 +/-30 anosAP
238

Figura 8 – Aspectos geomorfológicos e localização de geoindicadores na planície costeira de


Jericoacoara. Fonte: Meireles e Raventos2002. Adaptado para identificar a área do sítio Jericoacoara I

foram formadas em momentos


CONSIDERAÇÕES FINAIS
posteriores à ocupação do sítio
Com os estudos preliminares acerca da Jericoacoara I.
geologia/geomorfologia local, em
Essa constatação é importante para
especial os eventos situados nos últimos
pensarmos em cenários de ocupação
5100 anos AP, percebe-se que, em
diferenciados por toda a costa cearense,
termos estruturais, a paisagem não é
hoje completamente tomados por dunas
possuidora de grandes modificações,
de gerações mais recentes que se
exceto no que diz respeito aos cenários
depositaram sobre essas antigas
recorrentemente remodelados pelo
instalações humanas, causando uma
processo de migração de dunas em
falsa impressão de “ocupações sobre
épocas mais recentes. Sob esse aspecto,
dunas móveis”. A exemplo de
observa-se, no entanto, que as dunas
Jericoacoara, constata-se, a partir das
ativas que promovem tais alterações
239

escavações realizadas e dos estudos 2000). Formação: histórias. São Paulo:


acerca da geomorfologia local, uma Editora do Senac, 29-43.
ocupação sobre paleoduna. Brasil. Lei nº. 11.486 de 15 de junho de 2007.
Altera os limites originais do Parque
Os estudos arqueológicos na planície Nacional de Jericoacoara, situado nos
costeira de Jericoacoara prosseguem municípios de Jijoca de Jericoacoara e Cruz,
com o desenvolvimento de uma tese de no estado do Ceará; revoga o Decreto no
doutorado e uma dissertação de 90.379, de 29 de outubro de 1984, e o Decreto
s/n de 4 de fevereiro de 2002; e dá outras
mestrado. Dentre outros aspectos, esses providências. Diário Oficial da República
trabalhos aprofundarão as Federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 jun
caracterizações ambientais com o 2007, p. 1 (edição extra).
propósito de entender o ambiente à época
das ocupações, bem como o processo de Carvalho, A.M.; Claudino-Sales, V.; Maia, L.P.
e Castro, J.W.deA. (2008) Eolianitos de
formação e desintegração dos conjuntos Flecheiras/Mundaú, Costa Noroeste do
artefatuais que formam o sítio Estado do Ceara: Registro ímpar de um
Jericoacoara I. Com a continuidade das paleo-sistema eolio costeiro. In: WINGE, M
pesquisas serão realizadas novas et al. (Org). Sítios Geológicos e
escavações e, na oportunidade, serão Paleontológicos do Brasil. Brasília: CPRM,
2, 121-130.
coletadas amostras de sedimentos
destinadas a análises paleoambientais de Claudino-Sales, V. (2005) Os litorais cearenses.
natureza diversa. In: Silva, J.B.da.; Cavalcante, T.C. e Dantas,
E.W.C. (Org.). Ceará, um novo olhar
Em decorrência do intenso processo geográfico. 1ed. Fortaleza, Fundação
deflacionário a que a área está Demócrito Rocha,. Parte 2, 231-260.
submetida, acredita-se que, num futuro
Claudino-Sales, V. e Peulvast, J.P. (2006)
breve, muitas informações que hoje se Geomorfologia da Zona Costeira do Estado
mantém em certos pontos de estratigrafia do Ceará, Nordeste do Brasil. In: Silva, J. B.
preservada serão irremediavelmente da. et al. (Org.). Litoral e Sertão: natureza e
perdidas, uma vez que as dunas que se sociedade no Nordeste brasileiro. 1ed.
Fortaleza, Expressão Gráfica. Parte 3, 387-
sobrepuseram à camada de ocupação
406.
estão sendo arrastados na direção da vila
de Jericoacoara, conforme análise de Julio, K.; Magini, C.; Maia, L.P. e Castro,
imagens de satélites realizadas por J.W.deA. Ponta de Jericoacoara, CE - Belo
Meireles (2011). Como consequência promontório de rochas neoproterozóicas
desse processo, em diversos pontos do associadas a praias e dunas quaternárias com
registros de variações do nível do mar. In:
sítio, vestígios se misturam na base dos Winge, M. et al. (Org) Sítios Geológicos e
corredores eólicos e geram palimpsestos Paleontológicos do Brasil. Brasília: CPRM,
de difícil interpretação. De tal modo, 2012, p.1-15. Disponível em: http://
torna-se imperativa a realização de sigep.cprm.gov.br/sitio059/sitio059.pdf .
trabalhos interventivos que permitam
Lewin, N.; Tsoar, H.; Maia, L.P.; Claudino-
recuperar o maior número possível de Sales, V. e Herrmann, H. (2008) Lagoas
dados acerca das ocupações pré- costeiras interdunares e branqueamento de
coloniais que tiveram lugar nesse dunas no Nordeste do Brasil. Mercator -
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240

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grupo(s) ceramista(s) da enseada de Arqueológico, Levantamento do Patrimônio
Jericoacoara, extremo litoral noroeste do Cultural Imaterial e Programa de Educação
estado do Ceará: subsídios tecnológicos, Patrimonial. Fortaleza. Relatório.
cronoestratigráficos e etno-históricos.
GEOFÍSICA APLICADA À ARQUEOLOGIA HISTÓRICA: UM
BREVE ESTUDO DE CASO NO ENGENHO INHAMÃ, IGARASSU,
PERNAMBUCO, BRASIL
Carlos Magnavita, Luiz Severino da Silva Jr, Demétrio Mutzenberg, Bruno
Tavares e Cláudia Oliveira

padrões em projetos de salvamento e


INTRODUÇÃO pesquisa na Europa e América do Norte,
comparativamente pouco tem sido realizado
Numa escala global, o uso pioneiro e neste campo na Austrália, África e América
experimental de métodos geofísicos do Sul (Lowe, 2012; Reindel e Wagner,
aplicados à arqueologia remonta às décadas 2009; Magnavita, 2016). No Brasil, a região
de 1930-1950, quando as primeiras Nordeste parece ser uma daquelas com o
prospecções de resistividade elétrica e menor número de prospecções geofísicas
magnetometria foram realizadas em sítios aplicadas à arqueologia. Tanto quanto
arqueológicos na Inglaterra e nos Estados sabemos, a primeira e única prospecção
Unidos. No entanto, é somente no decorrer geofísica bem-sucedida em um sítio
das décadas seguintes (1960-1990) que arqueológico nordestino foi feita
grandes progressos técnicos e recentemente no Lago da Lontra, Penalva,
metodológicos começaram a ser feitos, Maranhão (Rocha et al., 2015).
melhorando tanto a performance de
instrumentos empregados como Neste contexto, a presente publicação pode
‘popularizando’ o seu uso na arqueologia ser vista como uma pequena contribuição
(Clark, 1990; Scollar, 1990; Gaffney e para o futuro desenvolvimento deste ramo
Gater, 2003). de pesquisa no Nordeste. Com efeito, o
breve estudo de caso aqui apresentado
A razão de tal popularidade e, de fato, a demonstra o grande potencial da
grande vantagem daqueles métodos advém metodologia empregada para a investigação
principalmente da capacidade de detecção da estrutura espacial interna de sítios
não invasiva de áreas de provável interesse arqueológicos da região, sejam estes
arqueológico, permitindo assim a históricos ou pré-históricos. Entre os mais
otimização do emprego de recursos antigos vestígios históricos deixados pela
disponíveis para pesquisa. Enquanto esta colonização portuguesa na região
prerrogativa tem feito com que prospecções metropolitana do Recife encontram-se as
geofísicas sejam hoje procedimentos primeiras unidades produtivas coloniais, os
242

engenhos. No âmbito do projeto Os foram iniciadas em 2001, por meio do


primeiros engenhos coloniais da Sesmaria projeto Prospecção de Sítios Arqueológicos
Jaguaribe, os autores deste artigo da Sesmaria Jaguaribe, hoje território dos
realizaram uma prospecção geofísica municípios de Paulista, Abreu e Lima e
experimental na área central do Engenho Igarassu. Nesta fase foi localizado um
Inhamã (séculos XVI-XVII). O objetivo conjunto de sítios que permite discutir
central daquele trabalho foi a detecção e o aspectos sociais da interação entre grupos
mapeamento de estruturas ligadas ao de diferentes posições sociais, como os
engenho as quais ainda não haviam sido indígenas, os de origem africana e europeia.
examinadas por escavações anteriormente Entre os sítios localizados encontra-se o
realizadas no local. Antes de tratarmos os Engenho Inhamã, objeto de estudo dessa
resultados e importância das atividades pesquisa, situado na Região Metropolitana
realizadas em campo, nós especificamos o do Recife, mais precisamente no limite
contexto histórico, arqueológico e entre os municípios de Abreu e Lima e
geoambiental do sítio arqueológico Igarassu (Figura 1). O interesse da pesquisa
investigado. arqueológica nesta área centra-se também
na história de Pernambuco e no período
HISTÓRICO DAS PESQUISAS colonial no Nordeste, uma vez que várias
ARQUEOLÓGICAS NA SESMARIA unidades produtivas localizadas
JAGUARIBE enquadram-se no sistema de produção do
açúcar e da cal. Além disso, a prospecção
As pesquisas arqueológicas realizadas no permitiu o levantamento da ocupação
litoral norte do estado de Pernambuco, onde indígena anterior à colonização e,
se encontra localizado o Engenho Inhamã, possivelmente, contemporânea à mesma.

Figura 1: Localização do sítio arqueológico Engenho Inhamã.


243

A área da Sesmaria Jaguaribe é, portanto, indústria se empregava grande número de


um núcleo de povoamento do século XVI e escravos pertencentes à ordem, até que,
em reunião...
nele procura-se estabelecer os sistemas
produtivos econômicos, as relações sociais Posteriormente, o viajante inglês Henry
e culturais, resgatando a organização Koster, no seu livro “Viagens ao Nordeste
espacial e o cotidiano, assim como, a sua do Brasil”, relata com extrema riqueza de
expansão ao longo dos séculos XVII ao detalhes, o dia a dia do povoado de São
XIX. O estudo desta área permite Bento. No início do século XIX ele havia
compreender o processo de assentamento arrendado o Engenho Jaguaribe e morou
do sistema colonial português, das nesta área por volta de um ano.
populações pré-históricas, assim como o
papel ou função desse núcleo em relação ao Outros fatos históricos relacionados à
contexto histórico da época, analisando este Confederação do Equador, à Revolução
espaço em relação aos centros históricos de Praieira e à fuga dos escravos, demonstram
Olinda e Igarassu. a importância do litoral norte de
Pernambuco e, em especial, a área da
A importância do estudo de uma Sesmaria Sesmaria Jaguaribe, para a investigação
centra-se no fato de que esse planejamento sistemática de nossa história.
ocupacional dividiu as terras da capitânia
em: lotes, sesmarias e data de terras, Do ponto de vista da preservação da
demonstrando como se deu a exploração da memória e do patrimônio arqueológico, o
colônia no século XVI. Pois, sesmaria foi o estudo das estruturas remanescentes da área
termo que indicava as terras incultas e com onde existiu o Engenho Inhamã, centra-se
necessidade de cultivos, para que fossem na necessidade de conservação do
exploradas e pudessem gerar as rendas patrimônio arqueológico brasileiro,
desejadas (dízimos, redízimos, vintenas e conforme estabelecido pela legislação
pensões) entre os colonos e a coroa federal. Desta forma, o avanço urbano sobre
portuguesa (Salvador, 1918). Essa primeira os sítios arqueológicos históricos e pré-
divisão das terras ficou registrada tanto históricos da área da antiga Sesmaria
pelos cronistas da época como também Jaguaribe, configura-se como um dano de
pelos documentos históricos como cartas de alto impacto sobre o patrimônio
doações. Através das fontes históricas é arqueológico nacional.
possível perceber a presença de uma
economia bem estabelecida, denotando No caso especifico do Sítio Arqueológico
assim um desenvolvimento econômico Engenho Inhamã, os danos foram
importante para a área. Esse processo teve provocados pela criação de um loteamento
início em 1540 quando Duarte Coelho fez a para construção de residências, que atingiu
doação dessas terras a Vasco Fernandes de boa parte das ruinas do sítio arqueológico.
Lucena, fundando assim um dos primeiros Promovendo a destruição de camadas
núcleos da porção norte do povoamento. sedimentares ricas em fragmentos materiais
da fase colonial. Com isso, um variado
No século seguinte os beneditinos de Olinda acervo de cerâmicas, vidros e peças
tomam posse de parte dessas terras e Pereira metálicas, acumuladas ao longo de mais de
da Costa (1983:404), informa que: três séculos, foi espalhado pela área do
loteamento criado na segunda metade do
Todas estas terras, reunidamente,
constituem uma grande, importante e ano de 2016.
rendosa propriedade, com uma capela,
casas de vivenda, vastos campos de A terraplanagem para o loteamento também
cultura, e fornos de fabricação de cal, de sepultou parte da área arqueológica que já
excelente qualidade, conhecida no havia sido pesquisada entre os anos de 2008
mercado por cal de S. Bento, cuja
244

e 2012, quando as ruínas do engenho foram geofísica, foi possível delimitar uma área de
escavadas, servindo ainda para o ensino e funções e pacotes sedimentares ainda não
capacitação de alunos do curso de estudados, os quais foram apenas
arqueologia da UFPE (Figuras 2 a 4). sepultados pela terraplanagem. Este achado
permitirá, desta forma, a continuidade dos
Somando-se à abertura do loteamento e de estudos na área, desde que a construção dos
um campo de futebol, além do corte de imóveis residenciais seja embargada pela
estradas, o contexto da paisagem do antigo autoridade competente, o Instituto do
engenho vai perdendo os aspectos visuais Patrimônio Histórico e Artísitico Nacional -
da área da fábrica e das moradias do antigo IPHAN.
Engenho Inhamã. Porém, através da

Figura 2: Vista das áreas previamente pesquisadas no sítio arqueológico Engenho Inhamã (2008). Fonte:
Adaptado de Oliveira e Lara (2012).
245

Figura 3: Terraplanagem na área do sítio arqueológico para criação de loteamento habitacional em 2016. Fonte
das imagens: Google Earth.
246

Figura 4: Vista norte do loteamento criado sobre a área do sítio arqueológico Engenho Inhamã (nov/2016).

Portanto, no âmbito do projeto Os primeiros


CARACTERIZAÇÃO
engenhos coloniais da Sesmaria Jaguaribe
GEOAMBIENTAL DA ÁREA DO
e, considerando as circunstâncias descritas,
ENGENHO INHAMÃ
os autores realizaram uma prospecção teste
utilizando gradiometria na área central do O sítio estudado está inserido nos domínios
engenho. Além de uma primeira avaliação das bacias sedimentares marginais de idade
do potencial de emprego do método em Cretácea e do Mioceno. Há presença da
sítios arqueológicos da região, o objetivo Formação Gramame (Cretáceo) e Formação
primário da prospecção foi a detecção de Maria Farinha (Paleoceno), sendo estas
estruturas antrópicas previamente não sequências estratigráficas compostas de
identificadas, entre elas a casa grande e uma calcários areno-argilosos e calcários
possível capela. Antes de considerar os detríticos (Barbosa e Lima Filho, 2005). Os
métodos e princípios de geofísica aplicada à setores na paisagem estruturados por esses
arqueologia em geral, discutir o método materiais respondem pelos modelados de
utilizado e apresentar os resultados práticos relevo mais rebaixados na área, como as
do breve estudo de caso, será retratado o baixas vertentes e os fundos de vale. Nas
histórico das pesquisas na Sesmaria cercanias do sítio Inhamã também há
Jaguaribe, o quadro geoambiental da área presença significativa dos sedimentos da
em que o Engenho Inhamã foi implantado, Formação Barreiras de idade miocênica, os
o contexto histórico de sua construção e arenitos dessa unidade estratigráfica
uso, assim como, as pesquisas estruturam os topos colinosos e tabulares
arqueológicas já realizadas na área.
247

que marcam a paisagem dos setores da mata vegetação do sítio está bastante antropizada,
norte pernambucana, as porções mais não se encontrando mata nativa e sim uma
elevadas (69 m) apresentam espessos vegetação secundária esparsa, juntamente
mantos de alteração, isso em decorrência com o cultivo, identificando-se bananeiras,
das condições climáticas que permitem a coqueiros, mamoeiros, jenipapeiros
alteração dos minerais pelo intemperismo cajazeiras e uma vegetação rasteira rarefeita
químico. Os rios que dissecam a paisagem que cobre a superfície do solo. No entorno,
na área respondem pelos modelados com a vegetação predominante é de palmáceas e
presença de material de idade Quaternário árvores de médio porte e nas margens do rio
(Holoceno Superior), os sedimentos verifica-se uma vegetação rasa (Oliveira e
aluviais dispostos longitudinalmente ao Lara, 2012).
longo dos canais entulham e colmatam as
várzeas, as planícies dos pequenos rios são O ENGENHO INHAMÃ
os modelados mais rebaixados na área (12
m). Em termos hidrográficos, o sítio está Verifica-se na História que, após receber as
inserido na microbacia do rio Inhamã, este sessenta léguas de terra de sua capitania,
atua como um sistema fluvial dentro da Duarte Coelho desembarca em 1535 no rio
Bacia do rio Beberibe. A dinâmica fluvial Igarassu, em terras de grupos Tupi e passa a
na área é marcada por uma sequência de rios distribuir as terras arrebatadas dos índios,
de curta extensão que tem em suas através de sesmarias para a construção de
cabeceiras os setores tabulares e colinosos e engenhos e fazendas, em geral como
dissecam os principais compartimentos ao recompensas àqueles que houvessem
longo de toda a planície costeira e os prestado determinados serviços à Coroa
tabuleiros da zona da mata. Lusa. Assim a Sesmaria Jaguaribe, foi
concedida no ano de 1540, ao feitor e
Em termos de clima, as condições tropicais almoxarife da casa real na capitania de
úmidas apresentam uma média de Pernambuco, Vasco Fernandes Lucena
precipitação na área de 1500 mm anuais. Os (Costa, 1983).
sistemas atmosféricos atuam intensamente
no período do outono-inverno com o avanço Conforme José Antônio Gonçalves de
da ZCIT (Zona de Convergência Mello e Cleonir Xavier, no ano de 1548,
Intertropical), VCAN (vórtices ciclônicos começou a ser erguido na Sesmaria
de altos níveis) e os DOLs (Distúrbios Jaguaribe, o Engenho Aiamá (Inhamã) e,
ondulatórios de leste). Este último é o em 1550, ele figura como um dos cinco
responsável pelas chuvas torrenciais que primeiros engenhos que estavam em pleno
acometem a região metropolitana e zona da funcionamento na capitania, citado na Carta
mata pernambucana nesse período. de Duarte Coelho a El-Rei (Figura 5). Além
deste, Pernambuco possuía o engenho de
Com relação à cobertura da terra, os solos Duarte Coelho fundado até o ano de 1542;
presentes na área estão associadas às classes o Engenho Velho, fundado por Jerônimo de
de argissolos e latossolos nas vertentes e Albuquerque; o Engenho de Igarassu, de
gleissolos nos setores rebaixados, nas Afonso Gonçalves; o Engenho Camaragibe,
várzeas. Os argissolos e latossolos que foi construído por um grupo associado
apesentam alto teor de argila e uma vez a Diogo Fernandes (Mello e Albuquerque,
retirada a cobertura vegetal que os protege 1997).
torna-se susceptível à erosão linear. A
248

Figura 5: Indicação do rio Inhamã (Aiamá) no mapa do século XVII de Visscher, Claes Jansz (1586-1652).
Cartographe. Perfecte caerte der gelegentheyt van Olinda de Pharnambuco, Maurits-Stadt ende t'Reiffo / door
Claes Ianss Visscher. 1648.

Nesta fase foram registrados vários documentação aponta também os


conflitos entre os indígenas e os lavradores destas unidades produtivas6.
portugueses. Jerônimo de Albuquerque em A cartografia do período revela informações
carta de 1555, dirigida a El-Rey, relata que preciosas acerca dos Engenhos. No mapa de
foram inteiramente destruídos os engenhos Johanes Vingboons (1660), surgem situados
de Igarassu, de Afonso Gonçalves, e o de entre as antigas Vilas de Olinda e Igarassu.
Camaragibe. Refere-se, ainda, a um terceiro
engenho em Igarassu que foi danificado Em agosto de 2008, foram iniciadas
(Costa, 1983), que poderia ter sido, segundo escavações na área do Engenho Inhamã
José Antônio Gonçalves de Mello e Cleonir (Figura 2), onde foram abertas duas
Xavier de Albuquerque, o Engenho de trincheiras, divididas por quadrículas de 2 x 2
Aiaman, devido à sua localização. m. As quadrículas foram escavadas de modo
alternado, semelhante a um tabuleiro de
No século XVII, durante o período de xadrez. A Trincheira I foi aberta numa área
domínio holandês no Nordeste, no Relatório que apresentava estruturas construtivas que,
de Adriaen Van Der Dussen ao Conselho alinhadas, aparentavam um alicerce; a
dos XIX, entre os dez engenhos existentes Trincheira II levou em consideração um
na jurisdição de Igarassu em 1640, são alinhamento de colunas. Nesta fase foram
citados o Engenho Aiama de Riba, então evidenciadas várias estruturas, entre elas,
pertencente aos herdeiros de um Pero da vestígios de coluna de pedra calcária e arenito
Rocha Leitão, e o Engenho Aiama de Baixo, (Figuras 6 e 7), delimitando-se desta forma,
pertencente a Manuel Jácome Bezerra. parte da antiga moita ou fabrica do engenho,
Ambos são apontados, nesta documentação, construída com pedras, lajotas e tijolos
como engenhos d’água e moentes. A batidos (Figura 8).

6
Relatório sobre o estado das capitanias conquistadas no Brasil, XIX na câmara de Amsterdam, em 4 de abril de 1640 (Apud
apresentado pelo senhor Adriaen Van Der Dussen ao conselho dos Mello, 1981:156).
249

MÉTODOS E PRINCÍPIOS
GEOFÍSICOS: UM SUCINTO
SUMÁRIO

Hoje em dia, o arqueólogo dispõe de um


variado número de métodos e instrumentos
geofísicos capazes de localizar e mapear
estruturas antrópicas em sítios de maneira
eficiente e não-destrutiva. Entre os métodos
mais utilizados neste contexto estão a
resistividade elétrica, o eletromagnetismo
Figura 6: Trabalho de campo no Sítio Engenho induzido (EM), o radar de penetração no
Inhamã (Ayama). Fonte: Acervo Laboratório de solo (GPR) e a magnetometria. Enquanto os
Estudos Arqueológicos -LEA
três primeiros são métodos ativos, i.e.
baseados na emissão e recepção de ondas
eletromagnéticas ou correntes elétricas pelo
aparelho, a magnetometria caracteriza-se
por ser um método passivo que meramente
capta as distorções (anomalias) geradas por
estruturas subterrâneas no campo
magnético terrestre local (Gaffner e Gater
2003:25-26).

Todos os métodos mencionados têm suas


vantagens e desvantagens. Isto se dá tanto
no que diz respeito aos limites impostos
pelos princípios físicos com que trabalham,
quanto ao meio ambiente em que os sítios
estão inseridos e à natureza das estruturas
arqueológicas a serem detectadas. Por
exemplo, uma das grandes vantagens da
utilização de radar é a profundidade de
detecção (>15m) assim como a detecção de
Figura 7: Estrutura (restos de coluna). Sítio
Engenho Inhamã (Ayama). Fonte: Acervo estruturas bem definidas (fundações, muros,
Laboratório de Estudos Arqueológicos -LEA urnas funerárias), mas a grande
desvantagem é a pequena produtividade do
método (para grandes áreas) e a pouca
fiabilidade na detecção de estruturas menos
sólidas (fossas, valas). A utilização de
resistividade elétrica é problemática em
regiões áridas e semiáridas e na velocidade
de prospecção, sendo especialmente
adequada a pequenas áreas com construções
maciças. Já a magnetometria (ou
gradiometria) tem sido altamente relevante
no mapeamento de sítios com grandes
áreas, sejam estes com ou sem estruturas
sólidas. Isso tem-se dado principalmente
Figura 8: Estrutura evidenciada. Sítio Engenho graças à existência de sistemas e
Inhamã (Ayama). Fonte:Acervo Laboratório de
Estudos Arqueológicos –LEA.
instrumentos com vários canais, o que
250

permite a investigação de extensas áreas em maiores que os fluxgate (magnetômetros de


um período de tempo relativamente curto. A vapor de césio, ca. 0,03-0,001nT), a
sua grande desvantagem é que ela não complexidade de sua manutenção e custos
funciona em áreas com um substrato associados os fazem menos recomendáveis
geológico vulcânico ou metamórfico para uso arqueológico. Atualmente, a
relativamente próximo à superfície. No grande maioria dos magnetômetros é
entanto, seja qual for o método geofísico produzida como gradiômetros, i.e., incluem
utilizado, o princípio básico de cada um dois sensores dispostos um acima do outro.
deles refere-se à detectabilidade do Esta configuração tem uma aplicação
contraste físico gerado entre uma estrutura prática, pois ela reduz o efeito da variação
antrópica (ou natural) e o solo ao seu redor: diurna do campo magnético terrestre, assim
quanto maior este contraste, maior a automaticamente melhorando a qualidade
probabilidade de detecção. dos dados coletados. Neste caso, a
magnetometria como método é chamada de
Por causa de sua versatilidade e grande gradiometria.
produtividade, a magnetometria (ou
gradiometria) tem sido o método geofísico Tanto os magnetômetros como os
mundialmente preferido para uso em sítios gradiômetros possuem a habilidade de
arqueológicos (Kvamme, 2005:430-432). detectar, medir e mapear as variações
Este também foi o método empregado no (contrastes) do campo magnético local na
estudo do Engenho Inhamã. Os área a ser prospectada, resultantes de
instrumentos utilizados em magnetometria estruturas próximas à superfície. No caso de
(os magnetômetros) podem diferir nos sítios arqueológicos brasileiros tais
princípios físicos com que trabalham, mas estruturas podem ser tanto fossas, valas e
todos têm um ponto em comum: eles têm o fundos de cabana, geralmente relacionados
potencial de detectar e medir a amplitude da a assentamentos pré-históricos como áreas
distorção ou anomalia magnética gerada por de produção (e.g., fornos), fundações e
uma estrutura (ou) de subsurperfície, seja muros de edificações históricas. Seja qual
ela natural ou antrópica, em relação ao for o tipo de sítio a ser prospectado por
campo magnético local. A profundidade de magnetometria, duas propriedades
alcance do método para fins arqueológicos magnéticas são de grande importância neste
é de aproximadamente 1,5 m, desde que as contexto. Estas são a susceptibilidade
estruturas ou anomalias tenham amplitudes magnética e a magnetização remanescente
magnéticas suficientemente grandes para de materiais.
serem detectadas pelo instrumento na
superfície. Todavia e já que os depósitos Em sítios pré-históricos a primeira
arqueológicos estão geralmente em pouca propriedade é de maior utilidade, pois é ela
profundidade, o método funciona bem na que geralmente proporciona a detecção de
grande maioria dos sítios. O magnetômetro estruturas relacionadas a tais
mais comumente utilizado em propecções assentamentos. A susceptibilidade
geofísicas na arqueologia é o fluxgate. Este magnética refere-se à propriedade inerente
tipo de instrumento é robusto para as de certos materiais de se magnetizar por
atividades de campo, necessita de pouca ou indução na presença de um campo
nenhuma manutenção e tem uma magnético. Sabe-se hoje que o
sensibilidade suficientemente grande (ca. estabelecimento de assentamentos humanos
0,1nT) para a detecção da maioria das e uso de tais áreas por algum tempo elevam
estruturas arqueológicas. Embora existam os níveis de suscetibilidade magnética dos
outros tipos de magnetômetros (por solos. Isto acontece principalmente através
exemplo, magnetômetros de vapor da transformação de minerais de argila entre
alcalino), em parte com sensibilidades ainda aqueles menos magneticamente supor meio
251

de efeitos térmicos e químicos conhecidos e descritos (Linford,


consecutivos, conhecidos como Efeito Le 2006:2221; Schmidt 2007:2), o de maior
Borgne (Aspinall et al., 2009:24). Em sítios significância pra o tipo de sítio
arqueológicos tais transformações físico- arqueológico considerado aqui é a
químicas se deram principalmente nas magnetização termo-remanescente.
proximidades de fogueiras através da Enquanto rochas utilizadas em construções
queima diária de material orgânico (e.g., históricas podem ter um magnetismo
lenha). Com o passar do tempo e como remanescente natural que também pode ser
resultado da constante limpeza das detectado por magnetometria, a produção e
fogueiras, a parte superior do solo (a uso de tijolos e outros produtos de
camada húmica) de assentamentos construção são especialmente propensos a
enriquecem-se de partículas este tipo de prospecção. Isto se dá porque a
magneticamente mais suscetíveis do que a queima da argila usada em tais materiais de
parte inferior. Já que o planeta terra possui construção se dá acima do Ponto Curie (>
um campo magnético, a parte superior do 578°C), o que significa que tais materiais
solo de assentamentos possui assim maiores são permanentemente magnetizados. Neste
níveis de magnetismo que a parte inferior. contexto, tanto os fornos onde esses
Hoje, sabe-se que os processos que materiais foram produzidos como
contribuem para elevar os níveis de concentrações desses em fundações e muros
susceptibilidade magnética do solo em tais de edifícios podem ser detectados e
localidades sao muito mais complexos e mapeados por magnetometria. Além disso,
diversos do que antes se pensava (Gaffney até incêndios acidentais (ou propositais) em
e Gater, 2003:38; Linford, 2006:2220; casas de taipa ou de tijolos crus pode elevar
Schmidt, 2007:3). Embora conhecer as o magnetismo de tais construções a níveis
causas do aumento dos níveis magnéticos que podem ser igualmente constatados por
em sítios arqueológicos seja altamente magnetometria. Desta forma e já que muitas
relevante, a consequência de tais efeitos na edificações e estruturas históricas em
formação de camadas arqueológicas e na Pernambuco, sejam elas domésticas,
sua possível detecção através de métodos públicas ou industriais, foram construídas
geofísicos é ainda mais interessante do das maneiras acima descritas, é
ponto de vista científico. De fato, sabe-se teoricamente possível localizá-las e
que qualquer depressão (e.g., fundos de documentá-las por meio de métodos
cabanas) ou estruturas antrópicas escavadas geofísicos não invasivos antes que
no subsolo de sítios pré-históricos (fossas, intervenções arqueológicas clássicas sejam
valas) tendem a ser paulatinamente iniciadas.
preenchidas com o solo húmico e
magnetizado. Quando a concentração de INSTRUMENTO E
solo magnetizado é suficientemente grande PROCEDIMENTOS
e os níveis de magnetismo (ou amplitude
magnética) de tais estruturas superam A área central do Engenho Inhamã foi
aqueles da sensibilidade de magnetometros geofisicamente prospectada pelos autores
e gradiometros (fluxgate, < 1nT), em novembro de 2016. Por um lado, a
teóricamente elas podem ser detectadas, prospecção serviu como teste para
medidas e mapeadas. averiguar o potencial de utilização de
gradiometria de fluxgate em sítios
Embora a suscestibilidade magnética arqueológicos na região costeira de
também possa ser relevante na detecção de Pernambuco; por outro, ela tinha como
anomalias em sítios históricos, a objetivo prático detectar e mapear
magnetização remanescente é neste caso construções e outras estruturas ainda não
ainda mais importante. Entre os processos conhecidas na área central do Engenho, tal
252

como a casa grande e uma possível capela.


Anteriormente à prospecção propriamente
dita, a área a ser examinada havia sido
demarcada mediante o uso de trenas,
delimitando dois retângulos contíguos com
áreas de, respectivamente, 38x50,5 e 36x33
m. A prospecção em si abrangeu assim uma
área total 3.107m² (ca. 0,31ha), tendo sido
concluída em menos de duas horas de
trabalho de campo. O instrumento utilizado
consistiu de um gradipmetro Sensys sobre
rodas com três canais e 55cm de distância-
base dos sensores fluxgate. O intervalo de
amostragem foi de 0,25x0,50 m, assim
produzindo uma malha com uma resolução
de 8 leituras de campo magnético por metro
quadrado (Figuras 9 e 10).
Figura 9: Equipe de pesquisa durante montagem do
instrumento gradiometro Sensys sobre rodas.

Figura 10: Topografia da área prospectada com sobreposição da imagem geofisica do Sítio Arqueológico
Engenho Inhamã
253

Como já descrito anteriormente, a área córrego revela um espaço perturbado com


prospectada havia sido previamente inúmeras anomalias magnéticas de grande
impactada por trabalhos de terraplanagem amplitude. Sem dúvida alguma, a grande
para a construção de um loteamento maioria destas advém de dejetos e sucata
residencial. Tais trabalhos modificaram o metálicas dos últimos 300 a 400 anos,
relevo original do sítio arqueológico originárias do acúmulo de material na parte
consideravelmente. Antes da superior do sítio. Muito provavelmente e já
terraplanagem, a área consistiu de um que as estruturas arqueológicas
terreno com declive relativamente anteriormente escavadas estão em grande
acentuado em cuja parte inferior jazia profundidade, nenhuma delas é realmente
próxima a um córrego, as ruínas da área de visível na imagem. No lado direito da
produção do Engenho (moita) e restos de figura, a situação é completamente
outras construções cujas finalidades e diferente. O espaço exposto pela
contextos ainda estão indefinidos. Em terraplanagem na parte superior do sítio
contrapartida, a parte superior do sítio evidencia uma área relativamente calma,
estava soterrada sob uma espessa camada claramente desprovida do grande número
(ca. 1,0 m) de sedimento e dejetos de anomalias magnéticas (entulho e sucata)
acumulados durante os séculos que já discutidas.
procederam o abandono do Engenho.
Diferentemente da parte inferior do sítio, Sem sombra de dúvida, este é o nível
esta área não havia ainda sido examinada aproximado da ocupação do século XVI-
arqueologicamente. XVII, sendo que pelo menos algumas das
anomalias magnéticas ali visíveis
Os trabalhos de terraplanagem levaram ao provavelmente assinalam a localização de
nivelamento completo do terreno. A espessa construções e estruturas ligadas ao
camada de sedimentos e dejetos na parte Engenho. A anomalia que mais claramente
superior do sítio foi retirada da posição salienta esta interpretação está na parte leste
original e utilizada para aterrar a parte da área prospectada (Figura 12).
inferior. Por um lado, este procedimento Abrangendo uma área de aproximadamente
soterrou os vestígios arqueológicos 4x3 m, ela define um espaço retangular ou
previamente escavados próximos ao sub-retangular em que se encontra uma ou
córrego sob mais de dois metros de entulho. várias anomalias de menor tamanho no seu
Por outro, ele expôs o nível arqueológico na centro. Embora seja possível que este grupo
área superior do sítio revelando no local, de anomalias corresponda ao alinhamento
alguns achados dos séculos XVI e XVII e de pedras visto na superfície e interpretado
um alinhamento de pedras que poderia ser como restos da fundação de uma edificação,
restos da fundação de uma edificação.A esta identificação é incerta no momento.
prospecção por gradiometria de fluxgate
visou mapear esta edificação e localizar Ela pode igualmente representar os restos
outras possíveis construções e estruturas de uma outra edificação ainda não avistada
ligadas ao Engenho que ainda poderiam pelas inspeções de superfície. Pela sua
estar encobertas por sedimentos e assim amplitude magnética (ca. ±20nT), trata-se
imperceptíveis a olho nu. aqui possivelmente da fundação de uma
construção ou feita com material rochoso
alógeno à área, tijolos cozidos, argila
RESULTADOS
queimada ou uma combinação de tais
O resultado da prospecção magnética é materiais. Além desta, pelo menos dois
visível na Figura 11. Ela mostra claramente outros grupos de anomalias magnéticas
a situação decorrente da terraplanagem. No chamam a atenção na parte direita da
lado esquerdo, a área soterrada próxima ao imagem. O primeiro grupo é aquele na área
254

central onde uma grande anomalia (ca. 5x3 sua atribuição como uma edificação. O
m) está flanqueada por dois alinhamentos segundo grupo de anomalias magnéticas
praticamente paralelos de pequenas que podem estar ligadas ao Engenho
anomalias. Diferentemente da anomalia encontra-se na parte oeste do espaço. Ela é
discutida acima, é presentemente difícil de composta por seis diferentes anomalias que
esclarecer o que este grupo de anomalias juntas formam um arco ou semicírculo com
representa. A este respeito, embora seja um diâmetro de aproximadamente 20 m.
possível que este grupo seja os restos de Como no caso do grupo central, é difícil
uma construção do século XVI-XVII, ele dizer no momento o que cada uma dessas
também pode ser sucata ainda enterrada no anomalias/estruturas representam. Na
local. Por um lado, a regularidade dos verdade e devido às suas amplitudes
alinhamentos de pequenas anomalias ao magnéticas (variando de aproximadamente
redor da maior parece apontar para a ±10nT até ±140nT), elas podem tanto ser
presença de uma construção. Por outro, arqueológicas (bases de fornos de cal?)
todavia, a anomalia central tem uma quanto sucata. Pelo menos o seu arranjo
amplitude magnética significativamente parece refletir uma decisão consciente de
alta (ca. ±380nT), o que deixa dúvidas na posicioná-las naquele espaço.

Figura 11: Magnetograma do pseudo-gradiente vertical da área central do Engenho Inhamã após terraplanagem.
Intervalo de amostragem: 0,25x0,50 m. Medições foram filtradas pela mediana e interpoladas
255

Figura 12: Interpretação do magnetograma do Engenho Inhamã mostrando a localização de possíveis vestígios
arqueológicos in situ.

anomalias/estruturas são realmente de


CONCLUSÕES
interesse arqueológico e quais não são. Em
Obviamente, os resultados e interpretações todo caso e sejam quais forem os resultados
da prospecção geofísica considerados acima obtidos, este breve estudo de caso
só podem ser vistos como o começo das demonstra claramente três coisas: (1) que o
investigações arqueológicas na área central uso de gradiometria na região costeira de
do Engenho Inhamã. Embora em pelo Pernambuco é geoambientalmente e
menos um caso a geofísica forneceu geologicamente possível; (2) que
elementos que proporcionam uma gradiometria pode ser utilizada com êxito
interpretação mais precisa de estruturas na detecção e mapeamento de estruturas
arqueológicas ainda preservadas no arqueológicas, sejam elas históricas ou pré-
subsolo, em outros tem-se que buscar históricas; (3) que outros métodos de
indícios que corroborem uma ou outra prospecção geofísica como radar,
interpretação. De fato, prospecções resistividade elétrica e eletromagnetismo
geofísicas auxiliam, mas não podem induzido poderiam desempenhar,
substituir completamente os resultados juntamente com a gradiometria, um
obtidos através de escavações. O ponto relevante papel em futuras pesquisas
forte da prospecção geofísica teste realizada arqueológicas históricas e pré-históricas na
no Inhamã é que ela mostra a localização de região. De fato, uma combinação de pelo
estruturas e áreas de interesse potencial para menos dois destes métodos (por exemplo,
ser examinadas arqueologicamente. gradiometria e resistividade elétrica)
Escavações no sítio estão programadas para poderia aumentar consideravelmente a
ser realizadas no decorrer de 2017 por qualidade de dados requeridos para se fazer
arqueólogos da UFPE e UNIVASF. No interpretações mais precisas sobre
final das contas, serão os resultados potenciais estruturas arqueológicas, assim
daquelas escavações que dirão quais otimizando ainda mais o uso dos recursos
disponíveis a pesquisas.
256

REFERÊNCIAS Recife, Parque Histórico Nacional dos


Guararapes.
Aspinall, A.; Gaffney, C.; Schmidt, A. (2009)
Magnetometry for Archaeologists. Lanham, Mello, J.A.G.de.; Albuquerque, C.X.de. (1997)
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Fundaj, Massangana.
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RECONSTITUIÇÃO PALEOAMBIENTAL RECENTE (HOLOCENO)
DA LAGOA URI DE CIMA (SALGUEIRO, PE): UMA
CONTRIBUIÇÃO DA PALEONTOLOGIA

Andrea Maria Francesco Valli e Demétrio Mutzenberg

cágados e jacarés), presentes nas camadas


INTRODUÇÃO sobrejacentes aquela que deu os ossos da
megafauna, pode ajudar-nos a compreender
Atualmente, a região da Lagoa Uri de Cima a evolução do regime hídrico (no nosso
(Salgueiro, PE) é situada em ambiente caso, a presença de água perene) desta área
semiárido, com índices pluviométricos particular durante o Holoceno.
anuais inferiores de 500 mm (Mutzenberg et Apresentamos aqui a primeira parte desta
al., 2013). No entanto, esta área, como investigação, com a distribuição espacial
muitas outras localidades do Nordeste dos animais considerados.
(Rolim, 1974; Paula Couto, 1980; Bergvist
et al., 1997; Viana et al., 2007, 2010;
Beltrame et al., 2013; Guérin e Faure, 2014) ÁREA DE ESTUDO
era povoada, durante o final do Pleistoceno A Lagoa Uri de Cima é um sítio
e início do Holoceno por uma rica fauna, arqueológico e paleontológico a céu aberto,
incluindo, entre outros, preguiças gigantes localizada no município de Salgueiro (PE),
(Eremotherium), gliptodontes e tatus nas coordenadas 39º10’35”W e 8º04’42”S.
gigantescos (Pampatheriinae), herbívoros Com 199 m de comprimento e 92 m de
endêmicos (Toxodontidae, largura, encontra-se seca a maior parte do
Macraucheniidae), mastodontes ano. Um pacote sedimentar com
(Gomphotheriidae), cavalos (Equidae), profundidade média de 2m recobre o fundo
lhamas (Camelidae), além dos mamíferos da lagoa. Foi evidenciado durante os
típicos atuais (Faure e Guérin, 2013). A trabalhos de identificação e resgate
presença de uma fauna assim estruturada arqueológico do Projeto de Integração do
testemunha, na época considerada, de um Rio São Francisco com as Bacias
ambiente menos severo do que o atual Hidrográficas do Nordeste Setentrional –
(Guérin et al., 1993; Guérin e Faure, 2008). PISF. Nesta localidade, foram encontrados
cerca de 4000 vestígios líticos, fósseis de
Se o estudo de uma assembléia faunística
megafauna e ossos de fauna recente. A
fóssil permite a reconstituição do ambiente
do passado, a investigação dos restos de escavação foi realizada mediante a abertura
de várias trincheiras com 4m de largura que
animais tipicamente aquáticos (como
258

cortaram transversalmente a lagoa (Pessis et com presença incipiente de carbonato de


al., 2013) (Figura 1). cálcio sob a forma filamentosa e granular,
indicando a retomada de condições mais
A camada basal da sequência estratigráfica secas (Mutzenberg et al., 2013) (Figura 2).
da lagoa é formada por uma cascalheira
suportada por clastos datada em A análise da distribuição espacial efetuada
34.600±690 que foi posteriormente sobre os restos de Eremotherium Spillmann,
cimentada por uma concreção carbonática. 1948 do sítio (Valli e Mutzenberg, 2016)
A seguinte é uma camada arenosa, datada sabemos que, algum tempo depois da
em 18.600±1470. Os restos de restos da acumulação dos fósseis, pelo menos na
megafauna foram encontrados sobretudo parte central da lagoa, o nível da água
nessas camadas. A próxima trata-se de um decresceu, deixando a seco parte da
nível argiloso corresponde a uma superfície de alguns ossos da preguiça
sedimentação em ambiente aquoso que gigante e permitindo aos agentes
acompanha de forma irregular o depocentro atmosféricos de marcá-los segundo os
da depressão. Após essa camada existe uma padrões caracterizados por Behrensmeyer
sedimentação holocênica caracterizada por (1978).
fluxos de detrito e de lama (Nível 1B e 1A)

Figura 1: Mapa hipsométrico da Lagoa Uri de Cima (Salgueiro, PE), com indicação dos setores escavados.
259

Figura 2: Níveis reconhecidos na estratigrafia da Lagoa Uri de Cima (Mutzenberg et al., 2013).

nas coleções do Laboratório de Materiais


MATERIAIS E MÉTODOS
Orgânicos e Laboratório de Paleontologia
Para investigar a presença de água perene na da Fundação Museu do Homem Americano
área, foi analisada a presença de cágados e (Fumdham), baseada em São Raimundo
de jacarés, cujos elementos foram Nonato (PI).
evidenciados durante a escavação do sítio.
No texto, eles são indicados pelo código
Os restos de tartaruga incluem, sobretudo,
numérico atribuído a cada um deles, que
fragmentos de carapaça e plastrão, com
prevê a sigla do projeto (PISF "Projeto de
poucos ossos pós-cranianos. É a espessura
Integração do Rio São Francisco com as
dos elementos da carapaça que permite
Bacias Hidrográficas do Nordeste
separar os elementos dos cágados, mais
Setentrional"), o código atribuído ao sítio
delgados, daqueles dos jabutis, mais
(18), e o número de etiqueta (podendo
maciços.
incluir ou não um dígito) que identifica sem
Todos os espécimes ósseos considerados ambiguidade cada espécime.
neste estudo estão atualmente conservados
260

RESULTADOS E DISCUSSÕES genérico. A ausência do mesoplastão (pelo


menos nas formas recentes; Gaffney, 1977)
Os restos de cágados da Lagoa Uri de Cima indica que pertence à família Chelidae,
conservados na FUMDHAM são 599, em enquanto que a falta de ossos neurais
um total de 750 ossos de quelônios. Desses, aparentes (em particular, aquela do neural
577 possuem a informação de camada (as dianteiro permitindo o contato medial do
camadas são apresentadas na Figura 2) e primeiro par de ossos pleurais) e o padrão
527 informações de camada e setor (os das margens laterais da carapaça, apertadas
setores são apresentados na Figura 1). De e viradas para cima, sugere a pertinência ao
fato, 50 restos de cágados coletados não gênero Mesoclemmys Gray, 1873 (McCord
possuem uma indicação precisa relativa aos et al., 2001; Thomson e Georges, 1996).
setores escavados, pois foram coletados na
superfície em áreas não setorizadas do sítio. Outro indivíduo (constituído de 58
Os 22 restos que não possuem informações elementos, com etiqueta PISF-18-952) é
sobre a camada em que se encontravam, muito menos completo. Porém, por suas
foram evidenciados durante limpezas de características, parece apresentar o mesmo
perfis ou durante a escavação de sondagens padrão de caracteres do PISF-18-959 e pode
teste, anteriores ao início da escavação ser atribuído ao mesmo táxon. Finalmente,
arqueológica sistemática. a totalidade dos restos de carapaça e de
plastrão, atribuídos aos cágados, poderiam
Vários elementos da etiqueta PISF-18-959 pertencer à mesma família e também ao
permitem a reconstituição de grande parte mesmo gênero, devido à sua semelhança
de uma carapaça (mesmo que faltando a com os elementos homólogos dos restos
maioria do lado direito) e do plastrão de um PISF-18-959 e -952.
indivíduo (Figura 3), identificado ao nível

Figura 3: Restos do cágado (Mesoclemmys sp.) PISF-18-959. Plastrão à esquerda, carapaça à direita, ambos em
vista dorsal. Escala = 100 mm.
261

Atualmente, quatro espécies de tartaruga de juntos no mesmo setor, é provável que


água doce encontram-se na caatinga pertençam a um mesmo indivíduo (Figura
(Rodrigues, 2003): Kinosternon 4).
scorpioides (Linnaeus, 1758), Phrynops
geoffroanus (Schweigger,1812), O espécime PISF-18-5321-190 é um
Mesoclemmys perplexa Bour e Zaher, 2005 fragmento de mandíbula direita, com sete
e M. tuberculata (Luederwaldt,1926). As alvéolos dentários completos (do segundo
duas primeiras têm ampla distribuição, até o oitavo) e a marca de, pelo menos, três
respectivamente, na América Central e outros traseiros e um anterior. O
parte setentrional da América do Sul; e em comprimento total deste resto é 83,5 mm. O
todo o Brasil, Colômbia, Peru, Bolívia e diâmetro do quarto alvéolo, o maior da
Paraguai. Porém, a presença delas está série, mede 6,5 mm. O fragmento PISF-18-
sempre relacionada a um sistema hídrico 5321-2 é mais incompleto, provavelmente
perene (rios, lagos, pântanos, etc.). M. da mesma mandíbula.
perplexa é encontrada apenas em áreas
úmidas do Parque Nacional Serra das Os restos PISF-18-5786-2 a -6 são cinco
Confusões, no Piauí (Bour e Zaher, 2005) e fragmentos de mandíbula ou de maxila: o
em uma floresta relicta na Estação estado de conservação não permite uma
Ecológica de Nova Roma, Goiás maior precisão. Finalmente, têm-se o dente
(Loebmann, 2008; Siqueira et al., 2011). PISF-18-5786, cujo comprimento mede 29
mm, e os diâmetros da base, maior e menor,
Finalmente, M. tuberculata é um cágado são respectivamente 8 mm e 5,5 mm.
típico da caatinga e da mata atlântica do
Nordeste, com sua ocorrência mais Pela morfologia e tamanho, estes restos
meridional sendo na região noroeste de podem ser atribuídos ao gênero Caiman
Minas Gerais. Como outras espécies de Spix, 1825, sem, porém, identificar
Chelidae, podem migrar de um corpo de precisamente a espécie. Atualmente
corpo de água para outro quando os recursos encontram-se duas na caatinga (Rodrigues,
se tornam escassos (Santana et al., 2016). 2003; Albuquerque et al., 2012): C.
Esta espécie particular é capaz de se enterrar crocodilus (Linnaeus, 1758) e C. latirostris
no solo durante o dia, deslocando-se (Daudin, 1802). Ambos os animais
durante a noite (Bour e Zaher, 2005). precisam de corpos suficientemente amplos
Todavia, como as outras, ela necessita da de água perene para as suas necessidades e,
presença de água doce permanente ou semi- por isso, podem ser considerados bons
permanente para sobreviver (Santana et al., indicadores de ambiente aquáticos.
2016).
Se os restos ósseos de jacaré foram todos
É possível que os restos evidenciados na coletados na camada "Nível 2", cuja datação
Lagoa Uri de Cima pertençam todos à LOE indica uma idade pleistocênica
espécie M. tuberculata, o cágado mais superior (Mutzenberg et al., 2013), aqueles
típico da caatinga. Todavia, caso outras de cágados oferecem um padrão de
espécies também estejam presentes, a distribuição mais amplo. Nas Figuras 5 e 6
discussão dos resultados, de modo geral não é possível verificar a presença de ossos de
seria alterado, já que todos são tipicamente tartaruga em, praticamente, todas as
aquáticos. camadas, mesmo que as 1A e 1B, de idade
holocênicas, sejam as mais ricas.
Faure e Guérin (2013) já indicaram a
presença de um jacaré nos restos faunísticos No entanto, uma maior quantidade de restos
evidenciados na Lagoa Uri de Cima. não necessariamente pode ser traduzida
Apenas oito restos podem ser atribuídos a automaticamente em uma abundância de
este táxon e, como foram todos coletados indivíduos. De fato, o animal PISF-18-959
262

é constituído por, pelo menos, 81 restos animal seria mais aleatória. O mais
diferentes, cada um identificado por um importante para estabelecer a existência de
dígito distinto (então considerados um regime hídrico perene na área, mais do
espécimes distintos). O animal PISF-18- que a quantidade é simplesmente a presença
952 possui, pelo menos, 58 restos. Não de taxa aquáticos. Nenhum dos restos, de
obstante, preferimos apresentar os restos quelônio ou de jacaré, apresenta marcas de
como elementos únicos e não como abrasão. Então podemos considerá-los
indivíduos, porque, por conta da extrema autóctones ou provenientes dos arredores
fragmentação, a atribuição dos ossos a um próximos da lagoa.

Figura 4: Restos de jacaré (Caiman sp.) coletados da Lagoa Uri de Cima. Acima, dente (PISF-18-5786), abaixo
fragmento de mandíbula direita (PISF-18-5321-190). Escala = 20 mm.

Figura 5: Distribuição dos restos de cágado nos setores escavados por camadas. Abreviações: AC, TL, TN, TO,
TS, TSE = Área Central e, respectivamente, Trincheira Leste, Norte, Oeste, Sul, e Sudeste.
263

Figura 6: Distribuição dos restos de cágado por camadas.

pico (Nível 1B) encontra-se um número


CONCLUSÕES
muito menor de restos de animais aquáticos
A existência de jacarés na Lagoa Uri de quanto de artefatos humanos. Torna-se
Cima durante o Último Máximo Glacial evidente que condições de regime hídrico
indica a existência clara de um ambiente caracterizado pela existência de água
com água permanente ou semi-permanente perene, parecem praticamente sempre
no local. Restos de cágados estão presentes presentes até o Holoceno Médio, no interior
em toda seção estratigráfica. No entanto, da lagoa ou nos seus arredores, ao longo do
existe um aumento substancial de restos tempo que no separa da existência da
desses animais durante a Transição megafauna. É necessário, numa segunda
Pleistoceno/Holoceno, período também fase desta investigação, aprimorar o
caracterizado no local pela intensa instrumento de análise, datando amostras
ocupação humana do sítio (Lourdeau e selecionadas para verificar o período real de
Pagli, 2013). Mesmo considerando os regime hídrico perene e o relacionamento
indivíduos PISF-18-959 e -952, que entre as flutuações climáticas já conhecidas
perfazem juntos 47% dos espécimes do na região (Corrêa, 2001; Oliveira et al.,
“Nível 1B”, existe uma distribuição mais 2009; Lira, 2014).
constante pelos diversos setores da Lagoa
É necessário, todavia, salientar que, no caso
nesta camada em relação às demais (Figura
do cágado M. tuberculata, é possível que,
5), conquanto que o depocentro continue a
em época recente (histórica), a
ser indiscutivelmente o local com maior
sobrevivência do táxon nesta área tivesse
densidade de restos.
tido possível também pela ação humana. De
A presença muito maior de restos de fato, ele adapta-se aos ambientes humanos,
cágados cronocorrelatos à ocupação utilizando poças e tanques artificiais da
humana pré-histórica da Lagoa pode indicar mesma forma que aqueles naturais (Santana
também a utilização destes animais para et al., 2016).
alimentação, embora não foram verificadas
Então, datações mais particulares de
marcas que atestassem essa hipótese. Os
amostras eficazes, comparadas com as
indícios levam a crer que havia um
diferentes fases de ocupação humana da
ambiente mais favorável a espécies
aquáticas ao final do Pleistoceno e durante região, são também necessárias para ajudar
a compreender o relacionamento entre estes
a transição para o Pleistoceno. Após esse
cágados e as atividades humanas.
264

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New state record of Mesoclemmys perplexa Bour
266

RELAÇÃO DOS AUTORES

Alexandre Herculano de Souza Lima Danielle Gomes da Silva


Universidade Federal de Sergipe Universidade Federal de Pernambuco

Ana Márcia Moura da Costa Débora Albuquerque Meira Coelho Ramos


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal de Pernambuco

Andrea Maria Francesco Valli Demétrio Mutzenberg


Fundação Museu do Homem Americano Universidade Federal de Pernambuco

Antônia Vilaneide Lopes Costa de Oliveira Drielly Naamma Fonsêca


Universidade Federal do Rio Grande do Norte Universidade Federal de Pernambuco

Antonio Carlos de Barros Corrêa Elisabeth Mary de Carvalho Baptista


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Estadual do Piauí

Arthur Felipe de Melo Teixeira Fabrizio de Luiz Rosito Listo


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal de Pernambuco

Bartolomeu Israel de Sousa Genisson P. da Silva


Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal de Alagoas

Brenda Rafaele Viana da Silva George Pereira de Oliveira


Universidade Federal do Piauí Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Bruno Araújo Torres Henrique Elias Pessoa Gutierres


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal de Pernambuco

Bruno de Azevedo Cavalcanti Tavares Hudson Domingos Teixeira


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Camilla Jerssica da Silva Santos Ítalo Rodrigo Paulino de Arruda


Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal de Pernambuco

Carla Suelânia da Silva Ivaniza Sales Batista


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Carlos de Oliveira Bispo Jacimária Fonseca de Medeiros


Universidade Federal de Pernambuco Universidade do Estado do Rio Grande do Norte

Carlos Magnavita Jessika de Oliveira Neles Rodrigues


Deutsches Archäologisches Institut Universidade Federal da Paraíba

Cláudia Alves de Oliveira Joana D’arc Matias de Almeida


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal de Pernambuco

Clístenes Teixeira Batista João Moreira Cavalcante


Universidade Federal do Rio Grande do Norte Universidade Estadual do Ceará

Cristiane Buco João Paulo da Hora Nascimento


Universidade de Trás-dos- Montes e Alto Douro Universidade Federal de Alagoas

Damião S. Cordeiro Joaquim Pedro de Santana Xavier


Universidade Federal de Alagoas Universidade Federal de Pernambuco

Daniel Rodrigues de Lira John Kennedy Ribeiro de Santana


Universidade Federal de Sergipe Universidade Federal de Pernambuco
267

John W. F. Marques Osvaldo Girão


Universidade Federal de Alagoas Universidade Federal de Pernambuco

Jonas Otaviano Praça de Souza Paulo de Tarso Barbosa Leite


Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal de Alagoas

Jônatas Nascimento da Costa Paulo Lucas Cândido Farias


Universidade Federal de Campina Grande Universidade Federal de Pernambuco

José Fabio Gomes da Silva Pedro Barbosa de Souza


Universidade Cândido Mendes Universidade Federal de Pernambuco

José H. M. da Silva Priscilla Emmanoelle Claudino da Silva


Universidade Federal de Alagoas Universidade Federal de Alagoas

Joyce Clara Vieira Ferreira Rhaissa Francisca Tavares de Melo


Universidade Federal do Rio Grande do Norte Universidade Federal de Pernambuco

Juan Toledo Ibarra Rhandysson Barbosa Gonçalves


Universidad Tecnológica Metropolitana Universidade Federal de Pernambuco

Kadja Monaysa Mendonça de Paula Ronaldo Missura


Universidade Federal de Alagoas Universidade Federal do Sergipe

Keyla Manuela Alencar da Silva Alves Roseildo F. da Silva


Universidad Tecnológica Metropolitana Universidade Federal de Alagoas

Kleython de Araújo Monteiro Sérgio Bernardes da Silva


Universidade Federal de Alagoas Universidade Federal de Pernambuco

Larissa Furtado Lins dos Santos Sérgio Murilo Santos de Araújo


Universidade Federal de Pernambuco Universidade Federal de Campina Grande

Larissa Silva Queiroz Thalison dos Santos


Universidade do Estado do Rio Grande do Norte Universidade Federal de Pernambuco

Leonardo Figueiredo de Meneses Valdeniza Delmondes Pereira


Universidade Federal da Paraíba Universidade Federal da Paraíba

Luiz Antonio Cestaro Verônica Viana


Universidade Federal do Rio Grande do Norte Universidade Federal de Sergipe

Luiz Severino da Silva Jr. Victor da Silva Santa Rosa


Universidade Federal do Vale do São Francisco Universidade Federal de Pernambuco

Manuella Vieira Barbosa Neto Victor Pina Figueiredo


Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Universidade Federal de Pernambuco
de Pernambuco
Viviane Trajano da Silva
Marco Túlio Mendonça Diniz Universidade Federal de Pernambuco
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Zuleide Maria Carvalho Lima
Maria Rafaela da Silva Cruz Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Universidade Federal de Pernambuco

Nathaly Grau Perez


Universidad Tecnológica Metropolitana
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