Cactácea v02 n05 - A Ferida Colonial Não Vai Cicatrizar 4-15
Cactácea v02 n05 - A Ferida Colonial Não Vai Cicatrizar 4-15
Cactácea v02 n05 - A Ferida Colonial Não Vai Cicatrizar 4-15
Sandro A. Baraldi
Este ensaio (p.43) de Walter Mignolo foi concebido em uma reunião do grupo M/C
em 2004 e editado em 2010 pela Ediciones del Signo, Argentina, Colección Razón
Política.
2. Como poderia ajudar uma Teoria Crítica que surgiu na história interna européia
quando os judeus foram tratados como colonizados internos desde 1492?
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Revista Cactácea – V.02 – N.05 – ISSN: 2764-0647– Julho de 2022 – IFSP: Câmpus Registro
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Capítulo I – Desprendimento epistemológico
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enquanto que a crítica pós-colonial e a teoria crítica são projetos de transformação ue
operam e operaram basicamente na academia européia e estadounidense” (p.15).
A Descolonialidade, por outro lado, que surge das ruínas dos povos colonizados,
ataca frontalmente a Matriz e o pensamento único (p.27) criando um ambiente
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interativo de coexistência de diversas culturas, mundos, linguagens, etc., em
constante construção crítica. Como “Nada possui a razão e a verdade absoluta”
(p.30), dependendo da circunstância não há mal algum em utilizar ou não conceitos
originários da Europa, não é uma proibição, só depende das ações entre as diversas
coexistências. Europa que significa “o legado Greco Romano – Itália, Espanha,
Portugal, França, Inglaterra e Alemanha” (nota p.30).
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como utilizar técnicas ou estratégias imperiais com propósitos descoloniais” (p.39).
“Em outras palavras, o desprendimento seria difícil de pensar desde uma perspectiva
marxista, porque o Marxismo oferece um conteúdo diferente mas não uma lógica
diferente” (p.41).
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No século XX, após a Segunda Guerra Mundial, a retórica moderna permaneceu
mudando seu conteúdo para países desenvolvidos e subdesenvolvidos, mas não sua
lógica. Assim reorganizou-se a diferença colonial mudando os termos, mas dizendo a
mesma coisa. O mundo subdesenvolvido ou “atrasado” (p.66) não produz ciência ou
filosofia; só produz cultura (p.67).
Las Casas sabia que o sultanato Otomano (no século XVI) tinha o mesmo poder que
os europeus, talvez até mais poderoso, por isso para eles a diferença era imperial. Já
para os Astecas e Incas, embora civilizados tal qual os europeus, eram vistos como
crianças com necessidade de orientação. Para estes a diferença era colonial. Só no
século XIX, quando o mundo árabe e islâmico perdeu “poder imperial” por conta da
expansão colonial da Inglaterra e França, foram tratados como colônia, ou seja,
“recuou” seu status para “diferença colonial” (p.68 a 69). Eu penso, a partir do
preposto, que a única emancipação prescrita para os não europeus é ser sempre
colônia pois não se estimulará em nenhuma circunstância uma civilização que possa
enfrentar os europeus. Como vimos, até mesmo uma civilização que competia com a
Europa foi destruída e “alçada” – melhor dizendo “reduzida” – à colônia.
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referência. Para evitar a ‘expectativa moderna’ e sua ênfase na de-notação, digamos
que as palavras não nos conduzem ao verdadeiro significado da coisa, mas a formas
de consciência e a universos de sentido nos quais a palavra adquire significado. O
significado não é uma questão de objetividade referencial mas uma reflexão
cognitiva (epistêmica e hermenêutica) forjada e incorporada em desenhos
geopolíticos particulares” (p.75). Por exemplo, para a modernidade os termos “novo”
e “novidade” nos fazem alcançar o “progresso” e a “emancipação” sem mencionar as
consequências dessas mudanças (p.76). O que se omite é a falta de alternativas, o
caminho já está prescrito e não há espaço para outros formatos.
O Capitalismo é a filosofia econômica que foi aplicada nas Américas por meio do
racismo e do patriarcado; distinto do capital que são os recursos. Não podemos tratar
este dois termos como se um fosse a mesma coisa que o outro. “O Capital” de Marx
trata do capitalismo mais do que do capital (p.86). Distinguir estes dois termos é
fundamental para compreender que o capital são os recursos usados pelos povos e
eles diferem dos recursos usados por outros povos. O Capitalismo é uma maneira
particular de uso de recursos dos europeus homens brancos cristãos que se
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consolidou a partir do século XVI com a colonização das Américas. Ele não é
absolutamente a única solução econômica para o mundo (p.88). Logo, a imposição
do Capitalismo não faz eco com as necessidades de outros povos não europeus. A
problemática dos povos subalternos depende muito mais das suas condições geo e
corpopolíticas (ver capítulo IV item 1). “O pensar descolonial exige um giro
epistémico em que a afirmação de ‘ser de onde se pensa’ substitua a de ‘saber que se
existe porque se pensa’” (p.93). Ou seja, substituir a egopolítica eurocentrada pela
corpopolítica localizada.
1. A construção das noções para descolonizar estão em processo no planeta. Por isso,
Mignolo sugere conceitos diferentes para se pensar a descolonialidade: a geopolítica
e a corpopolítica sobre a hegemonia da teopolítica e da egopolítica, os dois pilares da
colonização das almas e das mentes.
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duas últimas categorias filosóficas “que são mecanismos para aprofundar e ampliar o
giro descolonial” (p.105).
Não basta a denúncia do que foi invisibilizado pela colonialidade; é necessária uma
ação epistêmica como sugerido pelos documentos da Universidad Intercultural de los
Pueblos Indígenas del Ecuador: “aprender a desaprender, para poder assim re-
aprender” (p.98).
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imposta pela Matriz Colonial, portanto algo mudou no seu conteúdo porém sem
mudar em nada a sua lógica. A “classe”, a “raça” e o “gênero” são termos diferentes,
que dizem coisas diferentes, mas cujo propósito é o mesmo da lógica da
modernidade: a subjugação das pessoas para fins eurocêntricos sob a estrutura da
Matriz. Os projetos de liberação e descolonização do planeta tem por inimigo a
Matriz Colonial mais do que o Capitalismo (p.102).
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Desprender-se da modernidade/colonialidade e do eurocentrismo já é uma parte do
controle do conhecimento. Porém, como povos subalternos ainda estamos sob a
hegemonia européia que planeja a teo e egopolítica e ela é imposta na geo e
corpopolítica que nos faz sofrer “na pele” os idealismos eurocêntricos. Então, habitar
a fronteira imperial/colonial permitirá uma racionalidade-outra baseada nas
experiências e expectativas geo e corpopolíticas. Trazer as experiências dos povos
negros, indígenas, homossexuais, queer, etc., para reconstruir uma sociedade
pluriversal é a prioridade. Mas “Universalizar [por exemplo] a experiência do negro
ou da chicana lésbica seria voltar a cair na mesma lógica na qual foi capturado todo
fundamentalismo (seja ele europeu, indígena, africano ou latino-americano” (p. 120).
“Cada história local […] habita sua própria fronteira, sua própria linguagem, sua
própria memória, sua própria ética, sua própria política e política econômica”
(p.121). O que temos em comum com essas histórias locais é a inevitável presença
do mundo moderno/colonial e esta experiência comum a principal conexão entre os
povos subalternos. “O pensamento crítico fronteiriço é então o método que conecta a
pluri-versalidade (diferentes histórias coloniais capturadas pela modernidade
imperial) com o projeto uni-versal de desprendimento do horizonte imperial, da
retórica da modernidade junto com a lógica da colonialidade, e de construção de
outros mundos possíveis onde não exista um líder mundial, de direita, de esquerda ou
de centro” (p. 122). Esgotaram-se as soluções originárias do ocidente derivadas de
Platão, Aristóteles, Maquiavel, Hobbes, Locke, Marx, Gramsci, Carl Schmitt e Leo
Strauss (p. 124). A comunicação precisa ser intercultural para intercambiar
experiências e significados inter-epistémicos e dialógicos rumo ao projeto da pluri-
versalidade. Consumir para viver, não viver para consumir; trabalhar para viver, não
viver para trabalhar. Vida livre em vez de mercado livre; viver bem em vez de viver
melhor que o outro, uma construção comunal que dispense um plano mestre. Ou, se
tiver um plano mestre, que seja construído por meio de um processo comunal e não
por uma elite que sabe o que é melhor para todas e todos.
Bibliografia
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Sandro Adrián Baraldi
Doutor em Filosofia da Educação pela Universidade de São Paulo, é editor da
Revista Cactácea e pesquisador do Grupo de Pesquisa Mandacaru: educação e
filosofia <http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/4273081596423963> e do
GRUPEFE. ORCID: <https://orcid.org/0000-0001-5055-2071>. Plataforma Lattes:
<http://lattes.cnpq.br/6246489151782898>.
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