O Uso Da Técnica Estendida para Acordeon Como Estímulo Composicional
O Uso Da Técnica Estendida para Acordeon Como Estímulo Composicional
O Uso Da Técnica Estendida para Acordeon Como Estímulo Composicional
ESCOLA DE MÚSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA
Salvador
2017
EDSON DE AGUIAR LIMA
Salvador
2017
Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema Universitário de Bibliotecas (SIBI/UFBA), com
os dados fornecidos pelo(a) autor(a).
Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Música,
Escola de Música da Universidade Federal da Bahia.
O presente trabalho se propõe a apresentar o uso de técnicas estendidas para acordeon como
estímulo composicional. Com este intuito, tal estudo aborda especificidades sobre o universo
deste instrumento, mostrando o seu potencial técnico, tímbrico e particularidades de sua
escrita, revelando assim, dados que podem contribuir para o processo criativo musical. Dentro
deste campo, pretende-se abordar características dessas técnicas estendidas num repertório de
música contemporânea para acordeon, motivado pela carência do assunto em manuais de
orquestração, bem como, de modo geral, faremos uma revisão da literatura do ponto de vista
histórico e de perspectivas técnicas que envolve este instrumento. E como produto final deste
trabalho de pesquisa, apresentamos três obras compostas especificamente sob esta
perspectiva, acompanhadas de um memorial analítico.
This work proposes to present the use of extended techniques for accordion as a
compositional impulse. In this direction, this study approaches specificities on the universe of
this instrument, showing its technical and timbre potentials, and particularities of its writing,
thus revealing data that can contribute to the musical creative process. Within this field, we
intend to approach characteristics of these techniques extended in a repertoire of
contemporary music for accordion, motivated by the lack of subject in orchestration manuals,
as well as, in general, we will review the literature from the historical point of view and
perspectives techniques that this instrument involves. And as the final product of this research
work, we present three works composed specifically from this perspective, accompanied by
an analytical memorial.
Keywords: Accordion. Accordion free bass. Bayan. Extended technique. Effects. Advanced
accordion techniques. Composition.
LISTA DE FIGURAS
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 12
2 REVISÃO DE LITERATURA I .............................................................................. 16
2.1 UMA VISÃO GERAL SOBRE TÉCNICA ESTENDIDA ............................................................ 16
2.1.1 Notação Musical Contemporânea ...................................................................... 25
3 REVISÃO DE LITERATURA II ............................................................................. 28
3.1 O ACORDEON/ ASPÉCTOS HISTÓRICOS E ESTRUTURAIS; TRAJETÓRIA REGIONAL/
UNIVERSAL; TÉCNICAS ESTENDIDAS PARA ACORDEON ............................................................ 28
1 INTRODUÇÃO
1
Na peça Ionization (1993), escrita para uma enorme bateria de instrumentos de percussão (incluindo piano e
campainhas), além de correntes, bigornas e sirenes, Varèse criou uma forma que se define pelas massas e blocos
sonoros contrastantes.
2
Tradução direta da expressão em inglês “extended technique” (TOKESHI 2004, P. 52).
13
compreender melhor a inserção dos mesmos em um contexto como sendo técnicas estendidas,
Tokeshi diz: “Recursos considerados tradicionais como, harmônicos, pizzicato e vibrato,
quando tratados de forma não convencional, também são objeto de estudo de técnica
estendida” (TOKESHI 2004, p.53). Compositores como: Brian Ferneyhough (ver obra Unity
Capsule), Helmut Lachenmann (ver obra Gran Torso), Felipe Ribeiro (ver obra Desassossego
Latente), Arthur Kampela (ver obra Percussion Study I), dentre muitos outros, passaram a
explorar cada vez mais toda a potencialidade de instrumentos acústicos e eletrônicos,
ampliando ainda mais a paleta de recursos tímbricos disponíveis na literatura.
Apesar desta exploração tímbrica cada vez mais crescente, na busca por novas
sonoridades e técnicas de execução, observa-se ainda uma grande lacuna sobre o assunto
referente a muitos instrumentos, sejam estes tradicionais ou não convencionais ao âmbito
orquestral. Esta busca está relacionada à curiosidade, inventividade do compositor e ao
domínio técnico do intérprete sobre o seu instrumento. Neste âmbito, um dos instrumentos
que muito tem chamado atenção no cenário da música contemporânea principalmente na
Europa, graças à sua evolução no que diz respeito às possibilidades sonoras e técnicas, é o
Acordeon. Considerado um instrumento aerofônico, este tem como seu “antepassado” o
Cheng, instrumento Chinês criado a cerca de 3.000 anos A.C.
O Acordeon pode ser classificado em dois tipos básicos: o diatônico e o unissonoro.
Os dois (sub)tipos que tem despertado o fascínio de compositores e instrumentistas são os do
tipo unissonoro: Primeiro surge o acordeon conhecido como BAIXO STANDARD e em
seguida o acordeon BAIXO SOLTO ou Free Bass, estas duas denominações estão
relacionadas diretamente aos distintos mecanismos para a mão esquerda (baixos). Para a mão
direita, tanto no acordeon Baixo Standard quanto no Acordeon Baixo Solto, está disponível
um teclado semelhante ao do piano, ou podendo este ser um teclado de botões.
Posteriormente, após muitos experimentos e inquietude por parte de instrumentistas e
fabricantes pesquisadores, estes dois mecanismos para a mão esquerda puderam estar contidos
em um mesmo instrumento, sendo acionado um ou outro com um rápido click por meio de
uma chave conversora, surge então o ACORDEON CONVERSOR. O moderno Acordeon
Conversor tem tido uma inserção progressiva no âmbito orquestral e camerístico, tanto como
um instrumento solista, quanto fazendo parte de um conjunto. Compositores como Ole
Schmidt, Nils Viggo Bentzon, Per Norgard, Poul Rovsing Olsen, Torbjörn Lundquist, Arne
14
3
Um dos responsáveis pelas obras compostas por estes autores foi o virtuose acordeonista dinamarquês
Mogens Ellegard (1935-1995).
4
Esta decisão nos traz algumas limitações que consequentemente acabam interferindo na inventividade do
compositor, mas não nos acarreta limitações relacionadas à técnicas estendidas.
15
2 REVISÃO DE LITERATURA I
Neste capítulo são apresentadas as principais discussões que envolvem este tema na
atualidade, buscando sempre através de autores que tratam o assunto demonstrando empenho,
dedicação e compromisso. Concordâncias e divergências se fazem presentes, diferentes
pontos de vista, diferentes contextualizações, porém todos apresentam relevantes
contribuições sobre o tema.
espécie de lógica equivalente àquela lógica que nos satisfaz na melodia das
alturas.5 (CARTER, 1978, p.421) (Tradução nossa).
Schoenberg (1938, apud ISHI, 2005)6 destaca não somente a importância deste
parâmetro, mas já nos deixa transparecer aqui o que podemos entender como já sendo uma
atitude técnico/composicional de manipulação do timbre. Outro que dedicara esforços, tendo
consciência quanto ao protagonismo do timbre, é Schnittke. Este compositor parece dar
seguimento ao pensamento de Schoenberg ao se ocupar com a busca pela definição e
esclarecimento de termos como: consonância tímbrica, harmonia tímbrica, dissonância
tímbrica, polifonia tímbrica, modulação tímbrica e contraponto tímbrico (SCHNITTKE, 2002,
p.102).
Em decorrência desta busca por novas cores sonoras a partir da utilização de novas
maneiras ou de novas técnicas não habituais de se tocar um instrumento, houve então uma
atenção específica por parte de pesquisadores, que passaram a denominar tais técnicas como
técnicas estendidas. Tanto no Brasil quanto em outros países, entre as diferentes áreas da
música, com ênfase nas áreas da composição e da performance, muitos têm sido os
pesquisadores que vêm se dedicando a este tema. Padovani e Ferraz (2011) dizem:
Outra definição de técnica estendida, desta vez segundo Ishi, é: “O termo [...]
comumente usado para descrever uma técnica não convencional de se tocar um instrumento
[...]” (ISHI 2005, p. 1)7 (Tradução nossa).
5
Anyway, our attention to tone colors is becoming more and more active, is moving closer and closer to the
possibility of describing and organizing them[...] Now, if it is possible to create patterns out of tone colors that
are differentiated according to pitch, patterns we call ‘melodies’, progressions, whose coherence evokes an
effect analogous to thought processes, then it must be possible to make such progressions out of the tone colors
of the other dimension, out of that which we simply call ‘tone color’, progressions whose relations with one
another work with a kind of logic equivalent to that logic which satisfies us in the melody of pitches. (CARTER,
1978, p.421)
6
Schoenberg, Arnold. Drei Klavierstucke, Op. 11. Vienna: Universal Edition, 1938.
7
The term extended techniche is commonly used to describe an unconventional techniche of playing a musical
instrument. (ISHI, 2005, P.1)
18
técnicas que foram desenvolvidas e/ou exploradas desde o início do século XX: O piano
preparado, novos harmônicos, multifônicos, utilização do vibrato com a língua nos
instrumentos de sopro; nos instrumentos de cordas, o uso de partes do corpo do instrumento
para sons percussivos, alguns tipos de trêmulo e glissandos, além de sons falados e
murmurados (palavras, sílabas, letras, ruídos) nas peças vocais e, por vezes, em peças
instrumentais e muitos outros recursos.
Atualmente mesmo com o considerável número de literatura destinada ao tema técnica
estendida ou extended techniques, alguns pontos, algumas abordagens, assim como a
levantada por Tokeshi que recém foi apresentada, são tidos(as) ainda como obscuros e
carecem de um debate mais objetivo na tentativa de um consenso que melhor delimite este
território, ou seja: O que de fato podemos considerar como sendo técnicas estendidas? Um
segundo ponto que neste momento inicial desta dissertação enfatizaremos e que também tem
gerado controvérsia é: em se tratando de Brasil, a importância de um consenso a respeito da
tradução do inglês para o português da terminologia extended techniques; isto pois, foi
possível observar em muitos trabalhos a utilização quase que sem distinção ou sem o devido
discernimento tanto dos termos ‘técnica estendida’ como também ‘técnica expandida' ao se
referir à essência deste escopo. O reflexo destas duas questões abordadas, é que,
primeiramente no cenário internacional, temos uma relevante incerteza quanto às delimitações
deste território, e segundo, para as pesquisas no Brasil, temos entraves ou impasses que
podem dificultar a busca de informações por parte de estudantes interessados neste assunto.
A revista Hodie, volume 11, n.2 (2011), que tem como responsável a pesquisadora e
contrabaixista Sonia Ray, traz nesta edição importantes contribuições com textos
apresentando as principais discussões envolvendo técnicas estendidas na prática musical da
atualidade. No editorial desta publicação Ray diz:
A esta fala de Ray é possível ainda acrescentar outro ponto a fazer parte desta
discussão, ou seja, a recorrente presença do termo ‘não usual’ associado às definições de
técnica estendida. Sobre este termo, Toffolo diz: “[...] o termo ‘não usual’ na maneira de se
tocar um instrumento mudou sensivelmente ao longo da história” (TOFFOLO, 2010). Isto nos
mostra que as técnicas instrumentais, historicamente estão em uma constante transformação, e
o que fora considerado em algum momento como não usual, pode em outro vir a ser
considerado convencional. Muitos podem ser os fatores que corroboram para estas
transformações e estas considerações, por exemplo, a evolução dos instrumentos, curiosidade
dos instrumentistas, a inventividade dos compositores, dentre outros. Vejamos ainda o que diz
Cerqueira (2007), onde se referindo à inquietude e o desejo pelo “novo”, embora
particularmente acreditando que o mesmo não tenha a pretensão de se referir diretamente a
técnicas estendidas, mesmo assim, entendo através da seguinte fala como sendo algo que
fomenta este ponto desta discussão:
[...] as obras artísticas são objetos incômodos, não tanto por serem estranhos,
mas por serem diferenciados, tendendo a desviar-se, propositadamente, de
toda função convencional, mesmo quando a servidão histórica os obriga. A
mudança e a ruptura dos estilos são a resposta dos criadores à pressão das
sociedades e dos modelos tradicionais para que a expressão artística se torne
um consenso, uma linguagem pública e transparente, acomodada ao gosto e
à comunicação cotidiana (CERQUEIRA, 2007, P. 161)
estendida”. Enquanto pesquisadores como: Tokeshi (2005), Onofre; Alves (2010), Cuervo
(2009), Sousa (2013), Aquino (2017), Oliveira, O; Oliveira, H.(2012) adotaram como
tradução o termo “técnica expandida”.
Os dicionários The Landmark Dictionary (2010, p.89), Cambridge Dictionary Online8,
Collins Dictionary9, nos traz para o português as seguintes traduções do verbo extend; o
primeiro define como: estender, prolongar, prorrogar; o segundo define como: ampliar,
aumentar; e o terceiro como: prolongar, aumentar, estender, prorrogar. O resultado desta
consulta nos mostra grande similaridade entre as definições encontradas, e certamente como
esperado, temos a presença do verbo ‘estender’, o qual, de acordo com o Dicionário Aurélio
de Português Online10, apresenta as seguintes definições: desenrolar, esticar, prolongar,
desenvolver, dilatar-se, desdobrar, entre outras. Este último dicionário nos traz uma maior
quantidade de sinônimos, mas sempre mantendo a essência do significado de origem, em
inglês, e as ligações com conceitos de técnica estendida, como por exemplo, os de Tokeshi
(2014), já mencionados, e os de Padovane e Ferraz, onde agora estes dois últimos autores, de
modo mais abrangente, dizem que técnicas estendidas são:
[...] modos de tocar um instrumento ou utilizar a voz que fogem aos padrões
estabelecidos principalmente no período clássico-romântico. Em um
contexto mais amplo, porém, percebe-se que em várias épocas a
experimentação de novas técnicas instrumentais e vocais e a busca por novos
recursos expressivos resultaram em técnica estendidas. Nesta acepção, pode-
se dizer que o termo técnica estendida equivalente a técnica não-usual:
maneira de tocar ou cantar que explora possibilidades instrumentais, gestuais
e sonoras pouco utilizadas em determinado contexto histórico, estético e
cultural (PADOVANE; FERRAZ, 2011, P. 11)
Dentro deste contexto apresentado pelos autores supracitados e fazendo referência aos
verbos estender, desenvolver, ampliar, ultrapassar, os quais se encontram relacionados nos
dicionários recém-mencionados, é possível entender ‘técnicas estendidas’ como técnicas não
usuais que desenvolvem-se (com base, ou inspiradas em técnicas “convencionais”),
ultrapassam contextos históricos, estéticos e culturais sejam quais forem, e sem ao mesmo
tempo deixá-los de lado, e com isto adquire de certo modo uma autossuficiência que garante a
sua inserção em diferentes contextualizações ou diferentes ‘sistemas composicionais’11.
8
http://dictionary.cambridge.org/
9
https://www.collinsdictionary.com/
10
https://dicionariodoaurelio.com/
11
Neste caso o termo sistema composicional está ligado à perspectiva de Pitombeira apresentada no artigo: A
produção de teoria musical no Brasil (PITOMBEIRA, 2015 p. 61-72)
21
Talvez esta autossuficiência adquirida seja o que abre precedentes para que Ray viesse a
considerar como técnica “inovadora”.
A pesquisadora Sônia Ray, como foi possível perceber, adotou como tradução do
termo em inglês, extend technique, como sendo ‘técnica estendida’ no português; além disso,
na já mencionada edição da revista Hodie (2011), a mesma sugere aos autores a utilização do
termo ‘técnica estendida’, no intuito de unificar o termo, e por entender que os autores tendem
a não diferenciar seu significado, mesmo com o considerável distanciamento entre as grafias;
a mesma ainda argumenta que: “[...]o verbo estender que vem do latim extendere, e nos leva a
intuir a grafia com ‘x’. Entretanto como tantas outras palavras com origem no latim, não se
manteve o prefixo original na ortografia brasileira”. Ray (2011, p.11).
A opção adotada nesta pesquisa foi por seguir em concordância com a pesquisadora
pelo uso do termo ‘técnica estendia’, como já foi possível observar desde o título. Além dos
argumentos de Ray em prol deste termo como tradução para o português, julgo enriquecedor
acrescentar nesta pesquisa que, diferentes línguas podem ter em comum uma mesma língua
mãe, como é o caso do português e o inglês que derivam do latim12; há palavras que tanto em
relação à língua de origem quanto em relação a diferentes línguas de mesma origem, podem
receber duas diferentes classificações; vejamos os seguintes casos: a) quando a palavra em
questão mantem a proximidade gráfica e ao mesmo tempo mantem o significado original,
tanto em relação à língua de origem ou em relação entre diferentes línguas de mesma origem,
neste caso dá-se a classificação como “cognato”; e b) quando a palavra em questão mantem a
proximidade gráfica tanto entre a língua de origem ou entre línguas de mesma origem, porém
em consequência de diversas questões, como culturais, ou de adaptação destas novas línguas
em diferentes ambientes, o resultado pode ser diferentes significados para esta palavra, tanto
entre estas línguas derivadas, ou quanto entre alguma língua derivada e a língua da qual esta
teve sua origem; estes casos são classificados como “falsos cognatos”. Sendo assim, ao
retornarmos às traduções trazidas pelos dicionários consultados, fica evidente que do inglês
para o português o verbo extend sofreu uma desprezível alteração gráfica, e nenhuma
alteração quanto ao seu significado entre estas duas línguas, (isto se evidencia mais ainda ao
compararmos as conjugações, extendend e estendida relacionadas ao nosso escopo); concluo
então tratar-se de um “cognato”. Desta forma, entendo como mais coerente adotar como
12
O inglês tem sua origem no idioma dos Anglos e Saxões, povos bárbaros germanos, que no século V depois de
Cristo invadiram a Bretanha, atual Reino Unido da Grã-Bretanha. Durante sua evolução, diferentes línguas
exerceram influência sobre o inglês, assim como o latim por influência do cristianismo (RICARDO, 2017)
22
13
Significado equivalente a: Prolongar, dilatar, estender, derramar, ampliar, difundir.
14
[...] either the performer’s actions affect the computer’s output, or the computer’s actions affect the
performer’s output. These can occur at fairly simple levels or at more complex levels, and they can be combined
in vari ous ways.
23
15
Na peça Tanpura for hipercello (2011-2013) de Cristian Gentilini podemos conhecer melhor este conceito.
Acesso através do seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=NKyvt8O5OYw
16
Período na história da música que engloba o Barroco, Classicismo e o Romantismo, aproximadamente de 1600
a 1900.
17
"Does he think I have his silly fiddlein mind when the spirit talks to me”?
24
Esta fala de Ray reforça ainda mais a visão de Foss sobre a importância do trabalho
em conjunto entre compositor e intérprete, além de levantar a atual questão sobre o número
bastante reduzido de compositores-intérpretes em relação a outros períodos da história da
música.
Agora, em uma síntese realizada por Stefen (2012), vejamos como o mesmo procura
situar abordagens sobre técnicas estendidas, dentre as quais, muitas foram já discutidas neste
capítulo.
[...] os novos grafismos surgidos na tentativa de melhor escrever o som novo que
começou a ser inventado pelos compositores da segunda metade deste século, como
Schaeffer, Stockhausen e outros. Um som/ruído, inicialmente batizado de
"concreto", "eletrônico" e atualmente um som sintetizado, digitalizado,
computadorizado [...], provavelmente sempre reflete sua origem no avanço
tecnológico. Mas houve também, por influência desse som eletro-acústico, a procura
de um equivalente no campo da música instrumental e vocal. (ANTUNES, 1989)
história da música não mais atendia as necessidades deste novo momento em que se
encontrava os anseios e olhares experimentais dos compositores para as suas criações.
Além das necessidades de uma grafia objetiva para a representatividade de ordem
mecânica, a qual está mais associada ao nosso escopo, estende-se ainda esta necessidade para
vertentes experimentais comuns à música de a partir de meados do século XX, como, por
exemplo, aleatoriedade, indeterminismo, improvisação, música eletroacústica (Fernandéz,
2007).
Como curiosidade vejamos o que diz Villa Rojo:
Esta fala de Jesus Villa Rojo reforça o que já elucidamos sobre as necessidades de
uma nova grafia; além disto, o que nos é curioso aqui diz respeito à notação musical a qual a
música, o resultado sonoro em se, passa a ser tratado por muitos de modo secundário, e a
grafia, a partitura passa a estar mais associada às artes plásticas. Como foi possível perceber
nesta fala de Rojo, o conceito implícito conhecido como ‘música gráfica’ não se encontra em
conformidade com o pensamento do mesmo. É importante frisar, mais uma vez, que coube
aqui colocar esta vertente ligada à grafia musical apenas como objeto de curiosidade.
Além de toda a simbologia ligada à nova notação musical, muitas vezes explicações
através de textos se fazem necessárias para que estes símbolos os quais envolvam a
exploração de instrumentos, ou envolvam momentos de improvisação, de indeterminação, de
aleatoriedade sejam melhores compreendidos pelo(s) intérprete(s).
Diante da vasta e efervescente simbologia utilizada nos trabalhos de diversos
compositores, e com o intuito de unificá-las trazendo praticidade e transparência para o
intérprete, no início da década de 1950 foram publicados os primeiros exemplares expondo
muitos dos símbolos da nova notação musical, os quais tiveram como base análises de peças
de compositores que neste momento ainda não eram familiares como, por exemplo, Luciano
Berio, Pierre Boulez, Sylvano Bussotti, Roman Haubenstock-Ramati e Karlheinz
Stockhausen. Diversos outros encontros ainda se deram com este mesmo propósito
unificador, porém merece destaque a ‘International Conference on New Musical Notation’,
18
La transformación de la partitura surge como verdadera necesidad de buscar los signos más apropiados
para expresar la idea musical, nunca como un propósito auténticamente plástico o extramusical.
27
realizada em parceria com Index Project e com a Belgian State, em Ghent em 1974. (Stone,
1980, p. xvii, xviii)
Muitos atuais manuais sobre notação musical contemporânea trazem símbolos e/ou
grafias estabelecidos(as) a partir desta conferência em Ghent, manuais estes que fazem parte
do cotidiano de muitos compositores e intérpretes.
Portanto com base em todas as discussões abordadas neste primeiro capítulo
envolvendo as mais variadas perspectivas sobre técnicas estendidas e suas possíveis formas de
representações, julgo a partir de então que o leitor se encontra melhor contextualizado para
que com naturalidade assimile as especificidades que circundarão o instrumento em foco
nesta pesquisa durante os dois capítulos seguintes.
Até o presente momento nesta pesquisa, como foi possível observar, não foram
apresentados exemplos práticos de técnicas estendidas direcionadas à nenhum instrumento em
particular. Assim sendo, por entender que com as especificidades e exemplos que envolverão
o acordeon nos capítulos seguintes e com os já abordados conceitos de técnicas estendidas,
ficarão subentendidas as diversas possibilidades e aplicações destas técnicas contextualmente
ligadas a todo e qualquer instrumento musical.
28
3 REVISÃO DE LITERATURA II
19
Grupo atuante entre os anos de 1966 até 1973; se consolidou como uma das maiores expressões criativas da
composição contemporânea brasileira. Revelando o seu forte caráter experimentalista, vejamos a declaração de
princípios exposta no manifesto do Grupo: “Principalmente estamos contra todo e qualquer princípio declarado”
(GOMES, 2002).
20
Refere-se ao termo geral empregado para classificação de instrumentos musicais que produzem som através da
produção de vibrações de ar em um corpo. Os aerofones formam uma das quatro classes originais dos
instrumentos (juntamente com idiofones, membranofones e cordofones) na classificação hierárquica concebida
30
base em palhetas livres, tem uma caixa de teclado (teclas iguais às do piano) ou botões
destinada à mão direita (treble keyboard), e outra caixa constituída apenas por botões,
destinada à mão esquerda (bass keyboard). Estas duas caixas são conectadas por um fole que
quando acionado pelo braço esquerdo, os movimentos de abrir e fechar impulsiona o ar
através das palhetas metálicas, produzindo determinada(s) nota(s). Apresentando
características físicas similares e seguindo o mesmo princípio de funcionamento tem-se a
‘concertina’ e o ‘bandoneon’, figura 1. (HARRINGTON e KUBIK 2001, p. 56).
Mais adiante será esclarecido o termo ‘cromático’ presente nas especificações da
figura a baixo.
(a) (b)
(c) (d)
(Domínio público)
por E.M. von Hornbostel e C. Sachs, e publicado pelos mesmos no Zeitschrift für Ethnologie em 1914 (BROWN
e PALMER, 2001).
31
música folclórica nos mais distintos países pelo mundo desde o século XIX. Ao mesmo
tempo, as contínuas melhorias ocorridas lhe garantiram uma relevante inserção na música
contemporânea, principalmente desde a segunda metade do século XX se estendendo cada vez
mais até os dias atuais onde a sua presença tem sido bastante significativa nas salas de
concerto por toda Europa.
Figura 2 - Cheng e seu princípio de funcionamento: a) cheng com palheta livre; b) palheta em
movimento, similar à do cheng.
(a) (b)
Fonte: Monichon (1985, p. 12, 20)
(Domínio público)
O grupo dos aerofones de palhetas livres pode ser classificado ainda de acordo com o
elemento que provoca a geração do ar que irá excitar as palhetas: boca, mão, pés ou
mecanicamente. Desta forma a família do acordeon se ajusta à segunda subcategoria - sendo
portanto, um instrumento que funciona pela passagem do ar através de palhetas livres,
metálicas, por acionamento de um fole manual.
Para elaborar todo este princípio de taxonomia supracitado e apresentado por
Doktorski, o mesmo levou em consideração o sistema de classificação de instrumentos
musicais proposto em 1914, pelos musicólogos Erich Moritz (1877-1935) e Curt Sachs (1881-
1959). Disponível em: <http://www.ksanti.net/freereed/description/taxonomy.html>. Acesso
em: 10 mai. 2017.
33
Com a introdução do Cheng na Europa em 1777 por Père Amiot, houve um estímulo
ao uso do princípio de palhetas livres para a construção de diversos instrumentos. Isto se
passa em Viena por volta de 1818. Algumas contribuições importantes no desenvolvimento
de instrumentos foram dadas por Buschmann e Demian. Christian Friedrich Ludwig
Buschmann (1805-1864) construiu o mouthblown (Aura) em 1821; no mesmo ano,
acrescentou a este instrumento um teclado de botões e um fole a ser acionado pela mão
esquerda patenteado com o nome de ‘Handaeoline’. Em 1829, a partir do instrumento de
Buschmann, Cyrill Demian (1772-1847), vienense de origem Armênia, com a colaboração de
seus dois filhos, Carlo e Guido, patenteou um instrumento com o nome de ‘Acordeon’, figura
4. O acordeon de Demian continha cinco teclas para a mão direita onde cada uma gerava dois
acordes, sendo um ao abrir o fole e outro ao fechar; desta forma fica então disponível um total
de 10 acordes. Em um trecho da patente de Demian, figura 5, o mesmo diz que seria possível
interpretar marchas, canções, melodias, mesmo por um ignorante em música (dando a
entender ser um instrumento de fácil aprendizado) - devido a esta disposição de “acordes” na
configuração deste instrumento pode-se então deduzir a razão pela escolha do nome
“acordeon”. (MONICHON, 1985)
Ainda sobre o acordeon de Demian, e pensando nos próximos modelos que seguirão,
faz-se necessário esclarecer alguns detalhes do funcionamento das palhetas livres. Este
funcionamento pode ser classificado em: a) sistema de ação única (single action) ou
‘bissonoro’22, quando um botão ou tecla está associado a duas notas, sendo uma acionada ao
abrir e outra ao fechar o fole. Portanto, a ‘ação única’ de abrir o fole está associada a uma
determinada nota, e a ‘ação única’ de fechar o fole está associada à outra nota (sendo isto
possível através de uma única tecla ou botão) – este sistema é responsável por acionar os
acordes do acordeon de Demian. A segunda classificação é: b) sistema de ação dupla
22
Classificação utilizada por Monichon (1985, p. 70)
35
(double action), ou ‘unissonora’23, a ação dupla de abrir e fechar o fole acionam a mesma
nota. (HARRINGTON e KUBIK, 2001 p. 57-59)
Mecanicamente estes dois sistemas funcionam da seguinte maneira: Na figura 6 (a),
temos uma peça do acordeon conhecida como ‘cassoto’, nela se encontram pequenas
cavidades (alvéolos), onde serão coladas placas metálicas de tamanho semelhante a cada
alvéolo. Cada placa contém duas palhetas de aço, sendo que uma das extremidades de cada
palheta se encontra presa a uma base fixa (na própria placa metálica), figura 6 (b). As palhetas
se encontram presas em diferentes lados de cada placa, ficando uma do lado interno do
alvéolo, e outra na face oposta ao interior do alvéolo, figura 6 (b). Na base de cada alvéolo
contém um pequeno orifício, figura 6 (a); este pequeno orifício permite a passagem do ar que
fará vibrar as palhetas; isto acontece quando ‘sapatas’ se levantam com o acionamento das
teclas ou botões.
Cada movimento de fole faz vibrar apenas uma das palhetas; isto acontece das
seguintes maneiras: a) ao fechar o fole, o ar é soprado para o interior do alvéolo, exercendo
uma pressão sobre a película de cor amarela, figura 6 (b), que se encontra apenas apoiada na
face externa da placa; desta forma, a pressão do ar para sair do interior do alvéolo provoca o
afastamento da película externa apoiada na placa, o ar então passa pela cavidade na placa
metálica, e consequentemente faz vibrar a palheta voltada para o interior do alvéolo. Ao
mesmo tempo, a pressão do ar para sair do interior do alvéolo faz com que a película interna,
referente a segunda palheta, seja empurrada contra a face interna da placa metálica,
impedindo qualquer passagem de ar por esta segunda cavidade; desta forma a palheta presa na
face externa da placa permanece em repouso. Ao abrir o fole, todo o processo de ativar as
palhetas é bastante semelhante; neste caso, o ar ao invés de ser soprado, o que acontece é uma
espécie de sucção no alvéolo, desta forma, todo o processo anterior acontece de modo inverso,
sendo ativada apenas a palheta voltada para a face externa da placa.
As duas palhetas metálicas fixas em cada placa podem ter tamanhos iguais ou
diferentes, por esta razão é que o acordeon de Demian produz acordes distintos ao abrir e ao
fechar o fole mesmo pressionando a mesma tecla. Portanto este acordeon funciona sob o
sistema de ‘ação única’ ou ‘bissonoro’.
23
Classificação utilizada por Monichon (1985, p. 70)
36
Figura 6 - Cassoto sem palhetas e com palhetas: a) Cassoto sem palhetas; b) Cassoto com
palhetas.
(a) (b)
(Domínio público)
Figura 9 - Acordeon diatônico com teclado para mão esquerda - Alemanha 1840
Como já elucidado no tópico 3.2.4 deste mesmo capítulo, os acordeons do tipo unissonoro
contêm duas palhetas metálicas de mesmo tamanho e igual afinação associadas a cada alvéolo
e/ou a cada tecla, por conseguinte, tanto ao abrir ou fechar o fole obtem-se a mesma nota.
Segundo Hermosa (2013, p. 25), Leon Douce em 1840 patenteou o primeiro acordeon deste
38
tipo; infelizmente durante esta pesquisa não foi encontrada nenhuma imagem deste modelo,
foi possível apenas a sua patente, figura 10.
Ainda de acordo com Hermosa (2013), em 1846 surge os primeiros acordeons utilizando
registros24, esta é uma invenção de Jacob Alexandre; este fato permite ampliar a tessitura dos
acordeons e ao mesmo tempo começa ser ampliada a paleta de timbres que posteriormente se
mostrará como um dos grandes atrativos do acordeon. Um outro fato de relevância, porém
que se mostra sob controvérsias, é a respeito dos idealizadores do teclado para a mão direita
de botões, figura 11, similares aos dos acordeons de botões atuais; esta discussão fica entre
Franz Walther em 1850, Nikolai I. Belobodorov em 1870 e Georg Mirwald em 1891.
Em 1853 foi idealizado o teclado para a mão direita igual ao do piano, por esta razão
alguns autores chamam os acordeons que utilizam este modelo de teclado de ‘acordeon a
piano’; esta ideia atribui-se a Auguste Alexandre Titeux e Auguste Theópile Rousseau em
Paris. A utilização deste teclado a piano, em destaque na figura 12, é mais comum entre os
acordeonistas do Brasil.
24
Posteriormente será discutido de forma mais detalhada sobre registros.
39
3.1.8 Estruturas dos teclados para mão esquerda a partir do final do século
XIX
Desde a implantação do teclado para a mão esquerda em 1834 por Adolf Müller, o
qual segue o princípio de notas soltas e acordes pre-organizados, este princípio foi sempre
mantido, inicialmente seguindo o sistema ‘bissonoro’ e em seguida o ‘unissonoro’; houve
implementações referentes à quantidade de acordes e notas soltas, porém, por um longo
período não se estabeleceu uma padronização deste teclado a ser seguida pelos fabricantes de
acordeon. A partir do final do século XIX três significantes padrões na organização deste
teclado para a mão esquerda se estabeleceram: 1) a padronização dos mecanismos conhecidos
como ‘baixo standard’25 (standard basses); 2) ‘baixos soltos’26 (free bass); 3) baixos
anexados ou (añadidos), neste último mecanismo, o que temos são os dois primeiros
mecanismos contidos no mesmo acordeon encontrando-se um ao lado do outro, figura14 (em
destaque como 1 e 2) ; há controvérsias quanto ao idealizador deste terceiro mecanismo,
alguns autores atribuem à Pasquale Ficosecco em 1898 na Itália, outros atribuem à Savoia
Gagliardi em 1905 em París . Os dois primeiros mecanismos serão explicados de maneira
mais detalhada um pouco mais adiante; o que pretendo de antemão chamar a atenção nestes
dois primeiros é que, ‘fisicamente’, ao se olhar tanto para um teclado esquerdo organizado
sob o mecanismo ‘baixo standard’ quanto para um teclado esquerdo organizado sob o
mecanismo de ‘baixo solto’, os mesmos não aparentam diferença física, ambos se encontram
enfileirados e dispostos como no destaque da figura 13, não havendo necessidade de uma
segunda figura para compará-los, (GERVASONI; HERMOSA 1986, 2013)
25
Mecanismo do teclado da mão esquerda formado por acordes já pré-organizados, (ao pressionar um único
botão é possível ouvir determinado acorde) e notas soltas (com uma oitava de extensão).
26
Mecanismo para a mão esquerda o qual contém apenas notas soltas (atualmente podendo haver até cinco
oitavas de extensão).
40
27
Mecanismo para a mão esquerda caracterizado pela adição do mecanismo de baixos livres ao mecanismo de
baixos standard.
28
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=CnWwNLskaJk
41
esquerda que de uma só vez pudesse apresentar os dois mecanismos presentes nos acordeons
de baixos anexados, porém, que este apresentasse características ergonômicas mais
favoráveis29. É neste momento que surge os primeiros ‘acordeons conversores’, os quais, por
meio de uma chave conversora podia-se optar pela utilização do sistema ‘baixo standard’30,
ou pelo sistema de ‘baixos soltos’31.
Após o surgimento dos primeiros acordeons que utilizavam o mecanismo de baixos
conversores, algumas melhorias ainda foram possíveis de serem realizadas, sempre no intuito
de diminuir qualquer limitação técnica, permitindo ao acordeonista trabalhar os mais
diferentes repertórios e de qualquer gênero, estilo ou estética musical, além é claro da
ampliação de um repertório original consistente.
Atendendo estas necessidades, de forma bastante satisfatória, surge então o moderno
Acordeon Conversor, criado na Itália, na cidade de Castelfidardo32, por Vittorio Mancini
em 1959 (GERVASONE, 1986).
cada mecanismo, usaremos com frequência as abreviações “MI”, “MII” e “MIII” esclarecidas
neste parágrafo.
Vejamos separadamente as origens e as particularidades destes mecanismos que
compõe o ‘Acordeon Conversor’ atual, (MI/MII/MIII).
O teclado para a mão direita pode ser tanto de botões ou de teclas como as do piano,
(já foi exposto suas respectivas origens no tópico 3.2.6). Sua extensão (utilizando o teclado a
piano) normalmente vai desde o “mi 2” até o “dó 6”, figura 15. (desconsiderando os
registros).
Fonte: www.pigini.com
34
O seu teclado para a mão direita tem uma extensão menor do que o utilizado no acordeon conversor; se
extende do “fa 2” até o “la 5” (desconsiderando os registros).
43
acordeon; embora apresente suas limitações quanto à tessitura do telado esquerdo, (que será
mostrada logo adiante), este atende as necessidades diante do escopo desta pesquisa.
Vejamos este mecanismo na figura 16.
44
Este segundo mecanismo que compõe o teclado esquerdo no acordeon conversor tem
sua origem ainda no final do século XIX, mas é atribuído a Vittorio Mancini, na Itália em
1959, de apresenta-lo como este se encontra atualmente presente no Acordeon Conversor.
(GERVASONE, 1986).
Vejamos sobre a sua organização na figura 18.
Os botões que se encontram destacados pelo colchete menor são organizados
igualmente aos do mecanismo anterior, (são também considerados baixos pedais), no entanto
os botões que estão destacados pelo colchete maior, que antes funcionavam como acordes
pre-organizados, agora são notas individuais (soltas), organizadas cromaticamente.
Observando a pequena figura, que é a ampliação de parte da figura maior, temos a nota “DO”
e “FA” em destaque, e entre elas podemos concluir que estão as notas “Do#”,”RE”,”RE#” e
“MI”. Portanto este mecanismo apresenta uma tessitura bastante extensa36.
35
, , , .
36
No Acordeon Conversor ‘RUSSO’, conhecido como ‘Bayan’, no mecanismo de baixos soltos a direção de
ascendência das notas se encontra de baixo para cima, ou seja, o contrário de como acontece na figura 18, mas
segue o mesmo princípio de cromatismo.
47
Portanto, o Acordeon Conversor atual é formado por: a) um teclado para a mão direita
que pode ser de botões ou de teclas como as de um piano, e b) um teclado para a mão
esquerda constituído de dois mecanismos distintos, sendo o primeiro formado por notas soltas
e acordes pre-organizados (baixo standard), e o segundo mecanismo formado apenas por
notas soltas (baixo solto). Estes dois mecanismos podem ser acionados um ou outro
facilmente por um breve clique em uma chave conversora.
3.1.11 Registros
Desde o acordeon desenvolvido por Jacob Alexandre em 1846 em París, o qual pela
primeira vez fazia uso de registros, este recurso passou por um longo processo de evolução, e
49
que consequentemente tem uma interferência direta na projeção do acordeon não só inserido
em um contexto musical regional, mas também possibilitando sua inserção para um patamar
amplamente universal. As elucidações sobre registros que serão apresentadas a partir de agora
se fundamentam em (Llanos e Alberdi 2011).
A figura 21, contendo os registros mais comumente utilizados em MI, está organizada
de dois em dois compassos, o primeiro compasso se refere à escrita, e o segundo compasso é
o resultado sonoro obtido em consequência do respectivo registro utilizado.
50
Com o intuito de possibilitar uma melhor ideia destas particularidades tímbricas dos
registros para MI, foram associados aos mesmos, nomes de outros instrumentos como
podemos observar sobre cada símbolo da figura 21. O objetivo não é reproduzir os timbres
dos instrumentos associados aos registros, mas apenas para que se tenha uma referência.
Através da figura 23, relembremos a região destinada para escrever as notas soltas em
MII.
51
Voltando mais atrás, na figura16 é possível conferir toda a extensão alcançada pelo
teclado MIII. Vejamos agora na figura 28 o resultado em consequência dos registros
utilizados.
53
Portanto, todas as elucidações sobre registros aqui apresentadas nos revelam que os
mesmos têm uma relação direta com dobramento ou não dobramento de oitavas, e estas
possíveis combinações de vozes têm como consequência os diversos timbres que tanto tem
chamado atenção de compositores e contribuído para o considerável número de novos
acordeonistas que tem surgido praticamente em todo mundo. Outro fator que tem uma relação
direta com os registros, diz respeito ao potencial sonoro, (amplitude do som, dinâmica);
quanto mais oitavas estão sendo dobradas, maior é o potencial sonoro, e de acordo a redução
destes dobramentos de oitava, este potencial sonoro vai se recuando.
A utilização consciente dos registros tem uma grande associação com o pensamento
composicional de orquestração.
37
O acordeon de Isoard não mais continha acordes pré- organizados como o de Demian, ao invés de cinco teclas,
passou a ter oito teclas, cada uma emitindo duas notas, uma ao abrir e outra ao fechar o fole (sistema de ação
‘bissonoro’.)
38
O teclado para a mão esquerda que Adolf Müller anexou ao acordeon continha basicamente acordes maiores
de tônica e dominante. Os botões destinados a emitir acordes, cada um deles emitia dois acordes, um ao abrir e
outro ao fechar o fole. Os botões que emitiam notas soltas eram as tônicas dos referentes acordes.
54
Portanto, de acordo às informações que nos chegam através dos autores supracitados, é
possível observarmos a presença deste acordeon diatônico desde o final do século XIX, se
mantendo perceptivelmente atuante até os dias atuais nas diversas regiões do Brasil; por
39
No Rio Grande do Sul o acordeon, independente do modelo, é conhecido popularmente como “GAITA”.
55
O que conseguiu o acordeon com estes avanços organológicos, foi ser o rei do
repertório da música popular de verbena. Adaptou para se todos os temas em voga
do momento fazendo o papel de três músicos: um baixo, um acompanhamento
harmônico e uma melodia [...]. Nem o piano, por ser de difícil portabilidade, podia
fazer sombra ao acordeon nesta faceta em que tem sido o rei até a chegado dos
órgãos elétricos (HERMOSA 2008, p. 63) (tradução nossa40).
40
Lo que sí consiguió el acordeón con estos avances organológicos, fue ser el rey del repertorio de música
popular de verbena. Adaptó para sí todos los temas en boga del momento haciendo el papel de 3 músicos: un
bajo, um acompañamiento armónico y uma melodía [...]. Ni el piano, por ser de difícil portabilidad, podia hacer
sombra al acordeón en esta faceta em la que há sido el rey hasta la llegada de los órganos eléctricos.
56
41
Luiz Gonzaga utilizava o Acordeon Baixo Standard
57
O grupo ‘Falamansa’, formado por quatro jovens paulistas apaixonados por forró lançam um
CD, o qual se torna sucesso em todo o país; este fato impulsiona o surgimento de novas
bandas e consequentemente um significativo número de novos acordeonistas. Este forró, o
qual se mantém fiel principalmente em relação aos aspectos rítmicos consolidados por Luiz
Gonzaga, no entanto, apresenta diferenças quanto ao ambiente representado através das letras.
Este estilo de forró recebe o nome de Forró Universitário42. Algo parecido envolvendo o
acordeon vem acontecendo nos últimos dez anos em decorrência do estilo musical que se
tornara conhecido como: ‘Sertanejo Universitário’; nos arranjos apresentados o acordeon
insistentemente tem se mostrado presente. Estas influências da “música popular” têm
repercutido no perceptível número de novos e jovens acordeonistas no Brasil.
42
Pelo fato de a maioria destes novos adeptos do gênero serem estudantes universitários.
43
Embora composições para acordeon tenham sido originalmente escritas por estes compositores, estas não eram
o bastante para desassociarem o acordeon do repertório de transcrições e reduções destinadas ao mesmo.
58
Pietro Frosini já utilizava o acordeon de baixos soltos (sem a chave conversora) e foi um dos
pioneiros a trabalhar com este mecanismo. (GERVASONI, 1986).
Vejamos algumas das primeiras obras originais para acordeon realizadas por estes
compositores-acordeonistas supracitados: Trancuillo Ouverture e Pietro’s return de Pietro
Deiro; Carnaval à Venise e Dizzi Accordéon de Pietro Frosini. (GERVASONI, 1986).
Na Europa, importantes escolas ou centros de referência que ganharam destaque
durante quase todo o século XX foram: A escola de Trossingen44(Alemanha), a escola
Francesa, a escola Russa, a escola Italiana, entre outras; utilizaram inicialmente o acordeon
Baixo Standard, passando pelo Baixo Solto (sem conversor) até o surgimento do modelo com
conversor (MI/MII/MIII) (HERMOSA, 2008).
De acordo com Gervasoni (1986), na segunda metade do século XX, principalmente
devido ao surgimento do Acordeon Conversor, cada vez mais este instrumento conquista seu
espaço na música contemporânea. Um dos grandes responsáveis por esta conquista é o
acordeonista dinamarquês Mogens Ellegaard, que se unindo a diversos compositores como
Ole Shimidt, Niels Viggo-Bentzon, Torbjorn Lundquist, estreou mais de 200 peças para
acordeon. Entre as primeiras estreias merece destaque a obra Sonatina Piccola, escrita em
1965 por Torbjorn Lundquist, a qual é considera de extrema relevância para a inserção do
acordeon na música contemporânea da segunda metade do século XX.
Gervasoni (1986) destaca um interessante episódio acontecido com Ellegaard:
44
Segundo Gervasoni (1986), Trossingen é considerada o primeiro grande centro de atividade musical
envolvendo o acordeon, com interferência direta no surgimento e no trabalho desenvolvido por posteriores
centros em toda Europa; em atividade nesta escola, o compositor Hugo Herrmann em 1927 compôs Sieben Neue
Spiemusiken, considerada a primeira obra de concerto escrita para acordeon; Herrmann é tido como um
incansável explorador do acordeon não medindo esforços para inserir totalmente o acordeon na música de
concerto.
45
Todo comenzó a la salida de um concierto por el joven danés em Copenhague em 1957. Interpretó em aquella
ocasión um concerto escrito por su professor Vilfrid Kajaer. Uno de los oyentes muy impressionado por las
cualidades del solista se aproximo para felicitarle no sin antes reprocharle la inadecuación de la obra a la
musicalidade del intérprete. Ellegaard aprovechó habilmente la ocasión que se lo ofrecía para señalar:”Por
qué, si es así, no compone usted mismo para el acordeón?” Algunos meses más tarde, Ole Schimidt, compositor
y diretor de orquestra de renombre en Dinamarca daba los últimos toques em colaboración com Ellegaard a la
59
Fantasie Symphonique et Allegro para acordeón y orquestra.(tradução para espanhol de Aranza Rivas
Leonardo)
60
consultados somente um dedicara um pequeno parágrafo ao acordeon, o qual aqui merece ser
apresentado; Casella (1950) diz:
Tem-se conhecimento apenas de uma obra, Wozzeck de Alban Berg, a qual, pra dizer
a verdade, quando se faz presente o acordeon, é apenas integrando uma formação
orquestral reduzida. A natureza particular do instrumento parece impedir algum uso
sinfônico. De qualquer maneira, não se pode afirmar com absoluta certeza que, no
futuro, algum compositor não precisará recorrer ao acordeon quando for necessário
devido a exigências tímbricas. Hoje em dia, o principal obstáculo que impede o uso
deste intrumento na orquestra é, sem dúvida, a qualidade do som, que não se
amálgama com nenhum outro instrumento ou conjunto orquestral, (CASELLA
1950)46 (tradução nossa)
46
Se conoce un solo emploe, el del Wozzeck de Alban Berg, en el cual - a decir verdad- un grupo de estos
instrumentos forma parte de una pequena orquestra en el escenario. La naturaleza particular del instrumento
parece impedirle algún uso sinfónico. De cualquer modo, también en este caso, no se puede afirmar con
absoluta certeza que, en el porvenir, algún compositor no tenga que recurrir también , al acordeón cuando sea
necessario por exigencias tímbricas, Hoy por hoy ,el principal obstáculo que impide el uso de este medio fónico
en la orquestra es sin duda la fealdad del sonido, que no se amalgama con ningún otro instrumento o conjunto
orquestral.
61
Curso os mais difíceis exercícios, peças e estudos do Piano, bem como incluindo
Bach, com suas invenções a 2 e 3 vozes, Suítes Francesas e Inglesas, Prelúdios e
Fugas, etc .” (MASCARENHAS 1940, p. 4)
Mascarenhas em seu prefácio revela uma realidade que se fizera presente em diversos
países, e não somente no Brasil; este cenário de ausência de um repertório próprio só começa
modificar com a chegada do Acordeon Baixo Solto e posteriormente o Acordeon Conversor,
isto em países europeus. Levando em consideração que a presença do Acordeon Conversor no
Brasil ainda é bastante reduzida47, o repertório para estudo nos conservatórios atuais
praticamente continua o mesmo de meados do século XX.
Antes de iniciarmos a análise propriamente, esta que terá como foco a análise de
técnicas estendidas para acordeon, se faz necessário conhecermos as similaridades técnicas
deste instrumento com relação às técnicas de alguns outros instrumentos, isso para que
imaginemos com maior proximidade o real resultado sonoro obtido. De acordo ao
desenvolvimento e aperfeiçoamento ocorrido com o acordeon ao longo de sua história, logo
nas primeiras melhorias, foi possível perceber algumas características técnicas em comum
com outros instrumentos; além disso, este aperfeiçoamento consequentemente causou certa
inquietude nos intérpretes no sentido de buscar a técnica que melhor se adequasse, ou que
melhor atendesse suas expectativas diante do repertorio proposto (que num primeiro momento
eram transcrições de peças de diferentes períodos da história da música). O acordeon é
considerado um instrumento “aerofônico e que também contém um teclado”, portanto, quando
pensamos em articulação digital, por exemplo, os instrumentos de tecla muito se assemelham,
tanto que em muitos métodos específicos para acordeon é muito comum encontrarmos
exercícios de Hanon, Czerny, entre outros. A respeito da dinâmica e do controle dos pontos
limites para mudança de direção do fole, muito se assemelha aos instrumentos de sopro, nos
quais as variações de dinâmica são obtidas através da intensidade da pressão dos lábios e do
controle da liberação de ar, enquanto no acordeon a dinâmica é controlada ao aplicar maior ou
47
No Brasil, um dos pioneiros em estudar o Acordeon Conversor (modelo Russo ‘BAYAN’) trata-se do
acordeonista, professor e compositor gaúcho, OSCAR DOS REIS. Reis foi aluno de Friedrich Lips, um dos mais
relevantes acordeonistas da segunda metade do século XX na Rússia. Também no Rio Grande do Sul, Porto
Alegre, o QUINTETO PERSH faz um excelente trabalho utilizando o Acordeon Conversor, se apresentando não
somente na região sul do Brasil, como também já tendo realizado turnês por todo o país.
63
menor força do braço esquerdo ao abrir ou fechar o fole. O limite do prolongamento de uma
só respiração para os sopros se assemelha ao limite do prolongamento do fole em uma mesma
direção. A respeito dos instrumentos de corda friccionada existe a similaridade de efeitos
obtidos com o uso do arco que se assemelham a efeitos obtidos ao abrir e ao fechar o fole
consecutivamente, por exemplo, o trêmulo se assimilando ao bellow shake e para o ricochete
utilizado nas cordas existe também o ricochete no acordeon. Estas são apenas algumas das
muitas similaridades técnicas do acordeon com outros instrumentos. Portanto, quando um
compositor tem consciência destas similaridades técnicas do acordeon com outros
instrumentos, isto certamente pode muito contribuir para o resultado de suas criações.
Para finalizar este capítulo serão apresentados a partir de agora alguns exemplos de
técnicas estendidas para acordeon em peças de três relevantes compositores de destaque no
cenário internacional, os quais já foram mencionados.
48
Informações disponíveis em: http://www.musicsalesclassical.com/composer/work/21714
64
A análise das técnicas estendidas encontradas nas três peças já mencionadas será
organizada categoricamente de acordo à natureza de cada uma delas. Previamente é
apresentada uma bula com informações para a performance em Anatomic Safari.
65
Figura 30- Símbolo que representa a válvula de escape de ar (associação feita com os
valores das figuras musicais)
49
Creio que tenho encontrado a resposta para a grande pergunta, a pergunta que tem sido a locomotiva do
pensamento humano, por quê, por quê?, por quê?, por quê? por quê não?
Por que todo conceito e razão só depende do enfoque: é fragilíssimo, tudo somente é fragilíssimo.
68
No exemplo 3 foi destacada com as setas a utilização da válvula de ar, que agora se
encontra inserida em meio à clusters de diferentes alturas, esta combinação, nos passa a ideia
de um momento com caráter de improviso. Posteriormente toda esta ideia acaba assumindo a
função de um segundo plano que contrasta com o plano apresentado pelas cordas.
mecanismo de baixo standard (MII), elas se encontram na primeira e segunda coluna dos
botões do teclado esquerdo, as quais estão destacadas pelo colchete menor nas figuras
anteriores 16 e 18.
No exemplo 5, os cliques já pré-anunciados no exemplo 4 assumem agora uma postura
determinante para o desenvolvimento do sexto movimento da peça, o qual recebe o nome de
“Percussion”.
3.3.3 Band
No exemplo 8 encontra-se em destaque uma técnica estendida conhecida como band,
pequeno glissando, que pode se estender até por meio tom. O título que Norgard deu a este
sétimo movimento nos parece sugerir um mal-estar, um enjoo, que é representado por este
efeito em destaque.
73
Exemplo 8 - Band
Exemplo 9 - Band
Portanto, tendo como base apenas estas três peças que foram escolhidas para esta
análise, já se revelam aqui, através das técnicas estendidas utilizadas e os contextos aos quais
elas se adequaram, a dimensão do real potencial sonoro do acordeon, o quanto este
instrumento pode contribuir para os mais diversos processos composicionais.
75
50
Estilo mais livre de composição, neste caso específico, seria como um passeio apresentando diferentes
influências obtidas ao longo da trajetória musical do autor.
77
vermelho outro tipo de percussão, os dedos da mão esquerda percutem sobre os botões do
teclado esquerdo, os botões afundam superficialmente evitando emitir alguma nota.
No exemplo 13, temos o inicio de uma nova subseção que ainda mantém inicialmente
as características percussivas da subseção anterior, porém neste início tem-se um tipo de
transição para uma textura mais contrapontística que segue a partir do compasso 24.
81
Fonte: EdGito p. 3, 4
Ainda sobre o exemplo 13, encontram-se trinados os quais nos pontos em destaque o
objetivo é ouvi-los sem a emissão das notas, o objetivo nesta técnica é que fique em foco
apenas o ruído das teclas.
82
No exemplo 14, em destaque, está presente uma técnica estendida que consiste em um
tipo de vibrato que apresenta fortes características percussivas, para isto o autor elaborou o
seguinte símbolo para representa-la: ( ). De acordo ao ritmo indicado na partitura, percutir
com a mão direita fechada (socos), no canto superior do teclado direito, enquanto a nota do
“baixo” está soando. Devido à sensibilidade do fole, conforme a aplicação dos golpes, a
intensidade da nota do baixo não se mantém constante, esta reação, portanto, caracteriza um
tipo de vibrato muito ríspido (percussivo). Neste caso em particular, o ritmo especificado
caracteriza o ritmo de xote. Este ritmo nesta região se estabelece como um plano que perdura
por alguns compassos.
Fonte: EdGito p. 11
suma importância para o equilibrio formal de toda a peça. Começa com a mão direita
percutindo sobre a frente do fole (no centro do mesmo), e ao mesmo tempo a mão esquerda
percutindo sobre os botões do teclado esquerdo; o objetivo aqui é simular uma zabumba
realizando uma variação do rítmo de baião. A partir do compasso 95, tercho destacado pelo
retângulo “3”, a mão direita começa se deslocar do ‘centro do fole’ indo em direção à ‘lateral
do teclado direito’, (observe este deslocamento acontecendo no desenho esplicativo abaixo do
retângulo “3”). Logo em seguida, do compasso 99 ao 102, destacados pelo retângulo
ondulado, inicia-se um glissando sem a emissão de notas, o objetivo é somente o ruído das
teclas, ( fole parado).
Fonte: O Passeio p. 4, 5.
84
Ainda sobre o exemplo 15, todo este trecho comentado envolve técnicas estendidas de
caráter percussivo. Para concluir este exemplo, dos compassos 95 até o compasso 102, ou
seja, este deslocamento ocorrido caracteriza-se como uma modulação tímbrica que prepara a
entrada dos clusters a partir do compasso 103.
Após a seção percussiva do exemplo 15, esta ideia só volta a acontecer novamente no
último compasso da peça, com um único ‘tapa’ sobre o centro do fole, exemplo 16; porém
esta ação tem um sentido bastante relevante, valoriza o final, fazendo uma referência ao
trecho do exemplo15 (onde entendo favorecer para um final não previsível, porém coerente),
e ao mesmo tempo valoriza toda a seção destacada no exemplo 15; portanto, os dois
momentos percussivos presentes nesta peça, além de proporcionar um contraste com todo o
restante, é de suma importância para o equilíbrio formal de toda a música.
Fonte: O Passeio p. 7
4.2.3 Band
Observando o exemplo 17 temos em destaque a técnica ‘band’, a qual foi possível
observar durante esta pesquisa ser bastante recorrente em muitas composições
“contemporâneas” para acordeon desde a segunda metade do século XX. Consiste em um
pequeno glissando descendente de no máximo meio tom. Para obtê-lo, primeiramente
pressiona-se uma tecla totalmente, em seguida bem lentamente retira-se o dedo desta tecla,
(deixando-a ligeiramente pressionada, sem afundar totalmente), esta ação associada ao
aumento da pressão do fole resulta então neste pequeno glissando. Esta técnica funciona
melhor em uma região mais grave (palhetas vibratórias grandes) e quando ao mesmo tempo
são utilizados os registros com as vozes de (16’ pés) ou (8’ pés). No exemplo 17, esta técnica
ajuda na construção da textura da subseção (multi-tímbrica) já mencionada no exemplo 11.
85
Fonte: EdGito p. 2
4.2.4 Ricochete
(a) (b)
Fonte: Marcos (2011, p. I 73)
86
Exemplo 18 – Ricochete 1
Fonte: O Passeio p. 4
87
Exemplo 19 – Ricochete 2
Fonte: EdGito p. 15
Exemplo 20 – Ricochete 3
4.2.5 Cluster
Partindo da definição de Padovani e Ferraz (2011), em que consideram técnica
estendida como sendo os modos de tocar um instrumento fora dos padrões estabelecidos
principalmente no período clássico-romântico, e também sobre o que diz Stefen (2012) a
respeito da ‘extensão por deslocamento de contexto’. Portanto, nesta pesquisa, entende-se o
‘cluster’ como cabível de ser inserido no campo das técnicas estendidas.
No exemplo 21, é conveniente expor o trecho da peça Alma Nordestina que vai do
compasso 212 - 250, com o objetivo de melhor esclarecer o contexto em que este acorde de
altura indeterminada foi utilizado. Como pôde ser observado no parágrafo que descreve esta
peça, o intuito para a mesma é que fossem expostos dois sentimentos bastante antagônicos
(alegria e tristeza). Uma das alternativas utilizadas diz respeito à utilização de distintos
contextos harmônico/melódicos. Até o surgimento do primeiro cluster que acontece no
compasso 218, prevaleceu em compassos anteriores um contexto harmônico e melódico de
centralizações de notas e utilização de conjuntos simétricos (os quais nesta peça simbolizam a
‘alegria’); no compasso 218 o primeiro cluster aparece simbolizando esta alegria extravasada
através deste tipo de acorde; a partir de então, observando o exemplo 21, este cluster, ou seja,
esta alegria contrasta com uma melodia de caráter extremamente melancólico e triste.
Portanto, estes clusters inseridos neste contexto melódico de melancolia e tristeza, são
compreendidos como sendo cabíveis de considera-los aqui como técnica estendida.
89
Seguindo o princípio de deslocamento de contexto, o cluster se faz presente também nas peças
O Passeio e EdGito.
Diante das técnicas estendidas apresentadas nas três peças deste memorial, além da
experiência do autor como compositor, outro fator de relevância que propiciou as devidas
contextualizações e escolhas destas técnicas é o fato da proximidade do mesmo com o instrumento, ou
seja, de ser também acordeonista; sem também deixar de mencionar a forte ligação do autor com a
cultura regional do nordeste do Brasil. Assim como a história tem mostrado o relevante papel do
compositor-instrumentista, no sentido de revelar técnicas ou experimentos mecânicos que se adequam
de forma mais idiomática ao seu instrumento específico, acredito que este fator tenha influenciado
diretamente nas escolhas apresentadas. Quando mencionado sobre cultura ‘regional’, esta se justifica
por ser também um dos fortes recursos que busco evidenciar dividindo espaço com o ‘universal’, isto
se deve, por acreditar que a não polarização de técnicas ou de ‘sotaques’, de conceitos harmônicos,
rítmicos e tímbricos só tem a contribuir com os processos composicionais.
91
PARTITURAS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
sempre presentes no decorrer de minha trajetória musical, tem-se entre os objetivos desta
pesquisa adequar estas técnicas estendidas com o intuito de que traços deste regionalismo
sejam perceptíveis durante os processos composicionais apresentados nas peças do memorial.
Partindo desta perspectiva, acredito que este é mais um fator positivo a ter sido alcançado
neste estudo, e que ainda não presenciei em outros autores.
Outro ponto positivo quanto aos processos composicionais apresentados é que, embora
o foco seja técnicas estendidas para acordeon, houve sempre muita cautela para que a
recorrência a estas técnicas não tornasse algo demasiadamente sem equilíbrio e enfadonho
(observação feita com base em muitos compositores os quais acredito não terem sido muito
felizes neste equilíbrio ao trabalharem com técnicas estendidas para acordeon). Por esta razão,
dentre os procedimentos composicionais utilizados, a estruturação da forma nas três peças
teve uma atenção bastante especial.
Com base no conteúdo aqui apresentado, creio que esta pesquisa pode contribuir não
somente no campo da composição musical, mas como também da performance. Acredito
ainda que esta pode ter uma contribuição direta na produção de um repertório original
atribuído especialmente à compositores brasileiros, que em relação ao acordeon me parecem
tímidos tanto em quantidade quanto em “qualidade”51, (poucas são as exceções).
Esta pesquisa mostra o real potencial dos dois modelos de acordeon mais utilizados na
atualidade, que em ordem cronológica são: 1) O Acordeon Baixo Standard (mais comum no
Brasil)52, é utilizado na música de concerto porém suas limitações referentes ao teclado
esquerdo o torna mais comum na música popular e ou folclórica; 2) O Acordeon
Conversor53, as possibilidades que apresenta o duplo mecanismo do seu teclado esquerdo
tem resultado direto na sua presença cada vez mais constante nas salas de concerto
principalmente na Europa.
Portanto, entendo que esta pesquisa contribui com inúmeras vertentes associadas ao
acordeon no campo da composição e da performance. É importante frisar mais uma vez que
embora tenha sido mencionado com ênfase sobre o Acordeon Conversor, as peças
apresentadas no memorial foram escritas para o Acordeon Baixo Standard, por ser o
instrumento de posse do autor e visando a execução das obras pelo mesmo. Desta forma,
principalmente no Brasil, esta pesquisa serve também como suporte para que novos estudos
51
Refero-me à exploração consciente das possibilidades técnicas e tímbricas do acordeon.
52
Seu teclado para a mão esquerda é constituído de botões que apresentam notas soltas e botões os quais em
cada um se encontram acordes já pre-organizados, (figura 16).
53
Apresenta um duplo mecanismo no teclado da mão esquerda, o primeiro é exatamente igual ao mecanismo do
teclado esquerdo para Acordeon Baixo Standard e o segundo é um mecanismo contendo até cinco oitavas de
extensão (baixos soltos). Para ativar um ou outro mecanismo basta um simples clique em uma chave conversora.
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REFERÊNCIAS
BROWN, H. M.; PALMER, F. Aerophone. Grove Music Online. Oxford University Press,
Jan. 2001. Disponível em: < http://oxfordindex.oup.com/view/10.1093/gmo/9781561592630
.article.00242>. Acesso em: 26/10/2017.
COUTO, S. A. O ensino do acordeon no Brasil: Uma reflecção sobre seu material didático.
76 folhas. Monografia. Licenciatura em Educação Artística com Habilitação em Música -
CMU-ECA-USP, São Paulo, 2010.
DEL NERY, A. O Brasil da Sanfona. São Paulo: Myriam Taubkin Produções Artísticas,
2003.
______. Material and Techniques of Twentieth-Century Music. 3rd Ed. New Jersey
Prentice Hall, 2006.