O Ensino e A Educação Brasileira
O Ensino e A Educação Brasileira
O Ensino e A Educação Brasileira
O ENSINO E A
EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Saberes e Partilhas
2022
© Dos Organizadores - 2022
Editoração e capa: Schreiben
Imagem da capa: Pixabay
Revisão: os autores
Conselho Editorial (Editora Schreiben):
Dr. Adelar Heinsfeld (UPF)
Dr. Adelar Heinsfeld (UPF)
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Dr. Douglas Orestes Franzen (UCEFF)
Dr. Eduardo Ramón Palermo López (MPR - Uruguai)
Dr. Enio Luiz Spaniol (UDESC)
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Dr. Guido Lenz (UFRGS)
Dra. Ivânia Campigotto Aquino (UPF)
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Dr. Marcos Pereira dos Santos (FAQ)
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CDU 37(81)
Bibliotecária responsável Kátia Rosi Possobon CRB10/1782
SUMÁRIO
PREFÁCIO...................................................................................................7
Claudimir José da Silva
APRESENTAÇÃO.......................................................................................8
Daniela Simone de Azevedo
POSFÁCIO...............................................................................................311
SOBRE OS ORGANIZADORES..............................................................313
PREFÁCIO
Em minha escola pública, todos os anos, centenas de jovens lêem Mundo Jovem nas
aulas de OSPB [Organização Social e Política do Brasil] e Língua Portuguesa. Com
isso, os jovens se livram daqueles livros-textos insípidos e supostamente neutros. E
ganham, ao desenvolverem o senso crítico para assumir já seu papel na sociedade.
(MUNDO JOVEM, 1987, p.12)
Osvaldo Biz, professor
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4 Vale a pena explicar o termo “revista” e “jornal” aplicado ao Mundo Jovem. Na década de
1960, o periódico Informações Vocacionais era publicado em preto e branco com seis edições ao
ano. Pouco a pouco, ampliou-se o número de páginas e, sobretudo, a participação dos leito-
res na publicação de textos e mensagens. Além disso, como Mundo Jovem, o periódico passou
a ser impresso em duas cores e publicou noves edições anualmente. Com base nisso, o mais
adequado seria o uso do termo “revista” e não “jornal”. Quer dizer, Mundo Jovem foi – e
ainda é – publicado mensalmente e se dedica, sobretudo, aos jovens e a comunidade escolar.
Portanto, esses dois elementos lhe conferem o status de “revista” e não “jornal”. Mesmo
assim, no presente trabalho utilizamos o termo “jornal” ou “revista” como sinônimos.
5 Até o ano de 2016 – quando o jornal fechou oficialmente – foi organizado pela PUCRS.
6 Aqui não empregamos “secularização” como antônimo ao religioso. Na realidade, o jor-
nal Mundo Jovem coadunou temas religiosos – normalmente de cunho católico – com te-
mas seculares. Por estar ligado ao Instituto de Teologia e a PUCRS, a questão religiosa
foi desde o início o bastião do jornal. Com “secularização” estamos querendo dizer que
o jornal se consolidou editorialmente com textos interdisciplinares acerca do mundo e,
quiçá, da realidade brasileira.
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de trabalhar com a educação e seu aspecto transformador na sociedade. Há,
portanto, um cruzamento da perspectiva cristão-católica com um ideal mais se-
cularizado acerca do papel da educação.
Mais exatamente, o editorial começava com a citação das Conclusões de
Puebla promovidas por João Paulo II (1920-2005)7 que aludia à função da edu-
cação católica: produzir agentes de transformação na América a partir de uma
formação cívica e política inspirada nos moldes da Igreja. Além disso, o editor
esclarecia que, à luz das Conclusões de Puebla, fazia-se necessária refletir a educa-
ção no Brasil, pois naquele momento havia uma polêmica instalada no cenário
brasileiro sobre a opção partidária das comunidades e líderes cristãos.
Para tanto, defendia que tanto nas comunidades cristãs ou na escola não
cabia uma opção partidária definida homogeneamente. Ou seja, qualquer insti-
tuição era livre para escolher sua opção partidária e que tal escolha não poderia,
ao final de tudo, ser arbitrária de um único grupo, pois “Na atual conjuntura
política nacional, tenho receio [Jesus Hortal Sánchez, diretor naquela época] de
apontar para um partido como para o único viável para o cristão. Foi um erro
cometido em épocas passadas [...]”. (MUNDO JOVEM, 1982, p.4).
O mais revelador disso, no entanto, é o entendimento do papel da educa-
ção frente à escolha de uma corrente partidária: não era da alçada da institui-
ção impor uma concepção ideológica. Ao contrário, para não cair nos erros de
“épocas passadas”, a escolha deveria resultar da decisão de cada um, já que o
papel da “autêntica educação” – dizia o editorial – era oferecer as ferramentas
necessárias para a transformação da realidade. Isso significava duas coisas na
compreensão do editorial do MJ: converter o educando em sujeito e, ao mesmo
tempo, promover uma reflexão sobre seu contexto.
Nesse ínterim, nasceu à seção dentro do Mundo Jovem intitulada
“Educação e Fraternidade” com o objetivo de converter o educando em sujeito
do conhecimento e, igualmente, fornecer “instrumentos necessários de análise
da realidade e de reflexão teológica sobre ela”. Os temas debatidos na seção
de educação foram ao encontro desse objetivo traçado na edição de número
143 de 1982. Assim, delimitamos na presente pesquisa a análise dos artigos que
foram publicados na campanha “Educação e Fraternidade” durante todo o ano
de 1982. Por outro lado, reiteramos que é necessário alargar o período de estudo
da revista MJ antes de 1982 e, especialmente, o período posterior. Sem dúvida,
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a análise de outras edições poderá fornecer novos elementos de análise sobre a
educação na revista MJ, traçar tendências, identificar pressupostos teórico-me-
todológicos, entre outras coisas.
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Cabe explicar que, de acordo com o Quadro I, havia uma divisão no edi-
torial do MJ entre “tema” e o “título” 8. Tal separação corresponde ao formato
da própria revista. Assim, o “tema” era o assunto principal da revista. Ao me-
nos duas ou três páginas eram dedicadas ao “tema”. Por exemplo, na edição de
Maio, n. 143 de 143, a revista MJ trouxe como “tema” o assunto sobre a cidade
de Lages em Santa Catarina. Pelo Quadro I, o “tema” apareceu como “A força
do povo (no campo e na cidade) por uma vida melhor”. Tratava-se de uma en-
trevista9 com o prefeito a respeito da administração da cidade e o sucesso obtido
na área da saúde, educação, habitação, alimentação, etc.
Ademais, como foi ressaltado anteriormente, a publicação da campanha
“Educação e Fraternidade” iniciou com o esclarecimento editorial que a revis-
ta Mundo Jovem do ano de 1982 privilegiaria a temática da educação. Isso se
mostrou em diversas seções da revista: a parte destinada a documentos da igreja,
entrevistas, sociologia, educação política, problemas brasileiros, entre outros.
Assim, foram publicados nove artigos na seção de educação tratando especifica-
mente das finalidades da educação e seu aspecto reprodutivista.
O primeiro artigo, Gastar ou investir na educação, foi escrito pelo soció-
logo Pedrinho Guareschi na edição de março. Segundo próprio autor, a re-
vista Mundo Jovem se “[...] propõe dentro da Campanha da Fraternidade,
“Educação e Fraternidade”, discutir alguns tópicos sobre essa realidade no
Brasil”. (GUARESCHI, 1982, p.5). O objetivo do respectivo artigo era discutir,
em primeiro lugar, a finalidade da educação e, em segundo, que tipo de escola-
-educação se tinha no Brasil daquele período.
Para tanto, o que se sobressai no artigo são dados estatísticos no IBGE do
ano de 1979 referentes à educação – em que cerca de 50 % da população encontra-
va-se na escola e o resto fora do ambiente escolar – e, principalmente, a concepção
da escola como reprodutora das desigualdades sociais. Não somente isso, na com-
preensão do respectivo autor, os excluídos da escola eram predominantemente os
filhos de “família pobres de camponeses e operários”. A segregação iniciava-se na
escola e arrastava-se, posteriormente, para outros ambientes sociais, como o mer-
cado de trabalho. Frequentar a escola e sair dela em dado momento significava,
nos termos do autor, aprender uma lição: que “valem menos”.
A edição seguinte, número 144 de Abril, trouxe o artigo de Lenadro Rossa
com o título O fracasso escolar: programado para reproduzir o sistema. De início, o tí-
tulo do artigo já demonstra a linha de interpretação adotada: que a educação
8 Outros títulos apareceram nas edições da revista. De um lado, havia o “tema principal” e,
de outro, uma variedade de artigos publicados tratando sobre sociologia, realidade brasi-
leira, documentos da Igreja, etc.
9 Esse modelo de “entrevistas” e a separação de um “tema” principal acompanhou, pois, o
formato do MJ.
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reproduz ideias do sistema capitalista. Para corroborar tal perspectiva, o autor
realizou o mesmo procedimento de sociólogo Pedrinho Guareschi ao citar da-
dos estatísticos e contrastar com a realidade no Brasil. No entanto, diferente
do artigo anterior, o objetivo do artigo de Paulo Rossa foi explicar as razões do
fracasso escolar brasileiro.
Embora o aspecto quantitativo seja o mais evidente nos dados estatísticos,
Rossa chama a atenção para outra coisa: o que efetivamente exclui as crianças
e jovens reside, fundamentalmente, no aspecto qualitativo. Nos termos apresen-
tados por Rossa (1982), o qualitativo refere-se, sobretudo, à dimensão cultural.
Desse modo, o entendimento do fracasso escolar passa, necessariamente, pela
explicação da cultura ensinada nas escolas. O autor é enfático em dizer que a
escola é, acima de tudo, o “templo da cultura burguesa” em contraposição à
“cultura do povo”.
Observa-se a tentativa do autor de desconstruir a crença que o fracasso
escolar seria resultado de duas coisas: a incapacidade do aluno de aprender e,
no mesmo sentido, do professor em ensinar. Havia a ideia de que a educação
se fazia exclusivamente “dentro das quatro paredes da escola”. Com tal pressu-
posto, os estudiosos e o governo buscavam explicar que os motivos do fracasso
escolar seriam encontrados dentro da própria escola e não fora dela. Tal crença
foi, segundo Rossa (1982), disseminada no âmago da escola com o objetivo de
mascarar o real motivo do fracasso escolar.
Ora, se nas duas primeiras edições de 1982, o MJ trouxe uma visão críti-
ca-realista e pessimista da educação, o artigo do mês de maio contemplou outro
aspecto: a educação é, sim, reprodutora de desigualdades, mas pode funcionar
como agente de transformação da sociedade. Há, em especial, um destaque ao pa-
pel transformador que a educação pode desencadear. Com o título, Para quem leva
a sério a educação, a autora Lucinda Maria Lorezoni enfatiza que a educação pode
gerar mudanças a partir do momento que considera duas coisas: que o verdadeiro
objetivo da escola é transmitir a cultura e desenvolver, com isso, o educando.
Neste artigo, Lorezoni (1982, p.11) lança uma série de questionamentos
que contemplam basicamente algo: o (s) propósito (s) de se educar. A autora
busca chamar atenção para o impacto da escola na sociedade. Mais do que mera
instituição burocrática e repositório de pessoas, a escola lida com o mundo do
conhecimento, da descoberta, da crítica e, desse modo, da transformação. É di-
fícil pensar uma sociedade sem educação e, igualmente, pensar uma educação
sem compromisso com a sociedade a qual está inserida. Por conseguinte, escola
e sociedade estão intimamente ligadas. Problemas societários afetam, dialetica-
mente, a escola e vice-versa.
O artigo da edição de julho iniciava-se com um profundo questionamento
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sobre a educação: para onde caminha a educação? De autoria de Aristides
Cimadon e com o título Para onde caminha a educação?, descreveu os objetivos
legais e explícitos sobre a educação ou seja, formação integral da criança e do
adolescente, o desenvolvimento de suas potencialidades, qualificação para o tra-
balho e exercício da cidadania, entre outros aspectos.
O mês seguinte da edição do MJ, julho, foi publicado dois artigos sobre
educação. O título dedicado à educação trouxe o artigo do Armindo Cattelan
chamado Educação para o trabalho. Em termos gerais, a preocupação do autor foi
desconstruir a ideia de “educação para o trabalho” como reduzida ao apren-
dizado de uma técnica especializada. Nessa acepção de educação, a empresa
oferece – ou escolhe – os indivíduos preparados profissionalmente para que,
assim, aumente a produção. Longe desse sentido, Cattelan (1982, p.10) assinala
que “Educação é um processo pessoal e permanente de libertação não apenas de
ensino, seja profissional e muito menos, mera domesticação”.
Numa determinada parte do texto, o autor explica que, muitas vezes, há
certo idealismo nas concepções sobre a educação. Na prática – explica Gattelan
(1982) – as “massas operárias” precisam todas as manhãs vestir seus macacões
de trabalho, acionar as máquinas e rotinizar, por consequência, suas vidas.
Tornam-se, nesse processo, em “objetos instrumentalizados e bem treinados de
produção” (Ibidem). Em face disso, toda a concepção acerca da educação pre-
cisaria reconhecer o cotidiano do trabalhador. O idealismo – ou a concepção de
educação ideal – não ajudaria o trabalhador.
Ademais, o mais interessante no artigo de Gattelan (1982) é a alusão a
“Reforma do Ensino”10 encabeçado pelo regime ditatorial no Brasil. Para tanto,
explica que “[...] é insuficiente e totalmente falha uma Reforma de Ensino vol-
tada unicamente para a profissionalização. Ela responde a nada [...]” (Ibdem).
Portanto, aqui compreendemos com maior clareza as razões do próprio título do
artigo: educação para o trabalho. A respectiva reforma enfatizou, entre outras coi-
sas, a profissionalização como o caminho para a educação brasileira. O objetivo
recaiu basicamente num ensino técnico voltando para o mercado de trabalho.
Na mesma edição apareceu à entrevista com Moacir Gadotti com o tema
Escola amordaça o aluno. Foram cinco perguntas formuladas a respeito da educação
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brasileira. De maneira geral, percebe-se que Gadotti buscou responder cada uma
dessas indagações colocando em relevo a realidade do Brasil naquele contexto.
Para Gadotti (1982, p. 12) tornou-se visível que os problemas na educação brasi-
leira existiam porque a “[...] educação neste país não foi considerada como priori-
dade”. A falta de investimentos durante décadas criou problemas que, na década
de 1980 ou até antes, colocaram a educação num impasse: o desenvolvimento
do Brasil havia congelado porque, antes de qualquer coisa, congelou-se os inves-
timentos na educação e gerou, consequentemente, “ a má qualidade de ensino”.
A próxima edição do MJ do mês de agosto trouxe uma temática específi-
ca: a pré-escola. Ora, se até agora se falou das finalidades e limitações da escola
brasileira, o artigo publicado nesse mês contemplou um problema específico.
De autoria de Mariazinha Beck Bohn e Vera Lúcia S. Benvenuti (1982), o artigo
Um desafio: a pré-escola, buscou tratar da pré-escola no Brasil. Nesse sentido, as
autoras explicam que o interesse de discutir o assunto da pré-escola decorreu,
sobretudo, da notícia em 1982 do Ministério da Educação (MEC). Tratava-se
da proposta do MEC de implantar a partir de 1983 um “amplo programa de
ensino pré-escolar, atingindo os quatro mil municípios brasileiros [...]” (BOHN
& BENVENUTI, 1982, p.18).
Para tanto, o objetivo das autoras foi discutir tal projeto do MEC e, com
isso, problematizar a situação da pré-escola no Brasil. Assim, a justificativa do
MEC para criar o projeto baseava-se no fato que a pré-escola não recebeu a de-
vida importância do governo. Inclusive, a própria Constituição não considerava
essa etapa da educação como obrigatória. Por outro lado, a segunda motivação
tratava-se de “carências irrecuperáveis, de ordem nutricional, afetiva e cultural”
identificada na maioria das crianças.
A discussão das autoras inicia-se com a proposta do MEC e amplia-se com
a inclusão do conceito de “educação compensatória”. Desse modo, esclareceram
que “alguns educadores” compreendiam a pré-escola como uma maneira de “[...]
suprir deficiências e desvios do currículo oculto das crianças da classe média e das
crianças de famílias de baixa renda” (Ibidem). Havia o entendimento, portanto,
que a pré-escola seria capaz de solucionar “todos os males” das crianças de baixa
renda. Segundo as autoras, estava implícito em tal conceito uma “tendência de
mitificar” a pré-escola e considerá-la, com efeito, como panaceia dos problemas
no Brasil. Além disso, Bohn e Bevenuti (1982, p.19) alertam que o perigo da edu-
cação compensatória reside no aprofundamento das diferenças. Mais exatamente,
tal perspectiva educacional se fundamenta na crença que as crianças entram a pré-
-escola com “carências irreparáveis” e que, por conseguinte, caberia à instituição
suprir tais necessidades. O perigo é justamente esse: propor uma diferença estaque
entre “crianças carentes” e aquelas “sem carências”.
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Nesse contexto, a edição do mês de setembro abordou a questão da edu-
cação num sentido mais geral. O assunto discutido contemplou a relação entre
amor e educação. De autoria de Ademir Weiderkehr e José Rodolfo Hess (1982),
o artigo Educação para o amor não buscou analisar nenhuma problemática especí-
fica da educação brasileira. O objetivo dos autores recaiu em breves apontamen-
tos acerca da educação baseada no amor ou, melhor dizendo, em afetos.
O artigo iniciou com definições sobre o amor. Assim, Weiderkehr e Hess
(1982, p.11) explicam que normalmente o amor é compreendido como três tipos: o
amor-sexo (eros), amor-amizade (filia) e, por fim, o amor-doação (ágape). Haveria
outra definição mais específica e realista acerca do amor. Segundo os autores, o
amor poderia ser dividido em “afetivo” e “efetivo”. O amo-afetivo basicamente in-
clui o reino dos sentimentos, isto é, das emoções exacerbadas, da hiper motivação
de dois amantes ou, mais simplesmente, o carinho dos pais pelos filhos. Por outro
lado, o amor-efetivo é um sentimento “sem muita poesia nem romantismo. É o pai
que trabalho pesado e chegada cansado [...]; é o líder que é perseguido e torturado
pelo poder e muitas vezes é incompreendido pelos próprios colegas” (Ibidem).
O mais interessante nas definições sobre o amor são os autores citados.
Quer dizer, Weiderkehr e Hess (1982) demonstram que havia uma literatura ex-
tensa acerca do amor. Citam três teóricos: Carl Rogers11, Maslov e Erich Fromm.
Mesmo não aprofundado a concepção de amor desses estudiosos, há ao menos
a explicação da filiação teórica desses autores. Desse modo, Carl Rogers é defi-
nido como “psicólogo”, Maslov de “psicólogo existencialista” e Erich Fromm
como “psicólogo neofreudiano”. Nesse ínterim, importa observar que já na dé-
cada de 1980 tais autores eram, pouco a pouco, incorporados no debate acerca
da educação.
Para tanto, a relação entre amor e educação baseou-se nas concepções
desses teóricos12 e, igualmente, na proposta da Campanha da Fraternidade no
ano de 1982. Esse último aspecto, aliás, foi bastante evidenciado por Weiderkehr
e Hess (1982). Acrescentaram, então, que a Campanha da Fraternidade definiu
que o ator de educar “[...] não é transmitir a outros a forma de ser homem, mas
é o esforço de cada um para fazer-se homem” (Ibidem). Portanto, a “educa-
ção para o amor” seria, na compreensão de Weiderkehr e Hess (1982), uma
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educação voltada para vivências e reflexões. O ambiente escolar se tornaria, de
fato, educativo na medida em que aspergia a alegria, a recepção, a amizade entre
alunos e incentivava, por fim, a participação.
A edição de outubro abordou o “tema” das eleições no Brasil. Houve ali
uma tentativa de situar a realidade brasileira no contexto da década de 1980 e,
especialmente, o regime ditatorial. Não por acaso que o editorial daquele mês
trouxe o seguinte questionamento: eleição ou farsa? Explicaram que “O Grupo
que se instalou no poder [os militares] há dezoito anos tem um tema bem defi-
nido: continuar a dirigir os destinos deste país” (MUNDO JOVEM, 1982, p.4).
Além disso, outro artigo do jornal intitulado Partidos políticos brasileiros: da inter-
dependência aos nossos dias de autoria de Joaquim José Felizardo mostrou que,
a partir de 1964, o quadro partidário no Brasil sofreu profundas transforma-
ções. Os passos nessas mudanças foram, segundo o autor, resultados do Ato
Institucional n°2 pelo qual extinguiu “todos os partidos então existentes”.
Por sua vez, o “título” dedicado à educação analisou a relação da Igreja
Católica com a educação Brasil. Intitulado A igreja e a Educação no Brasil de
Leandro Rossa – o mesmo autor havia publicado em 1982 outro artigo sobre a
educação, Fracasso escolar: programado para reproduzir o sistema, e que já analisa-
mos no presente estudo – buscou analisar a história da educação brasileira com
base num aspecto: a atuação da Igreja Católica.
O primeiro parágrafo do texto lança as teses do autor: ora, se o Brasil tinha
cerca de 500 anos desde a conquista pelos portugueses, a Igreja acompanhou a
ocupação do território e atuou, principalmente, como agente educador. Essa é a
primeira consideração do autor (o primado da Igreja na educação). A segunda,
por outro lado, mostra que no decorrer dos anos a Igreja foi se consolidando e,
em 1980, era possível observar “[...] um projeto alternativo de educação para a
sociedade brasileira: a educação libertadora” (ROSSA, 1982, p.14).
Por fim, a última edição do MJ de 1982 foi publicada em novembro. Com
o “tema” Os últimos 18 anos passados a limpo contou com um texto de Argemino
J. Brum acerca da “realidade brasileira”. Especialista em histórica econômica,
o dito autor havia publicado naquele mesmo ano o livro “O Desenvolvimento
Econômico do Brasileiro”. Tratava-se, em geral, de um estudo dos modelos eco-
nômicos pelos quais o Brasil se baseou ao longo de sua história. No MJ, do texto
de Brum retomou as principais teses de seu livro e analisou, além disso, as ca-
racterísticas do modelo de desenvolvimento adotado pelos militares enfatizando
“os altos custos sociais decorrentes deste modelo que se fundamenta numa visão
economista” (BRUM, 1982, p.11).
No mesmo sentido, a edição de novembro trouxe, entre outras coisas, uma
discussão das eleições de 1960 e o governo de Juscelino Kubitschek, o retorno
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do ensino de Filosofia no 2° grau, propostas de análise literária, documentos da
Igreja, etc. O próprio MJ publicou nesta edição um artigo pelo qual problema-
tiza as eleições de 1982. Mais exatamente, em 1982 ocorreriam as eleições para
governador, senador, prefeito, deputado federal e estadual e para vereador13.
Para tanto, a parte dedicada à educação tratou de analisar a relação do
estatuto de verdade com a proposta de liberdade ou, dito de outra forma, o
conceito de “educação para a liberdade”. De autoria de Olírio Plínio Colombo,
Somente a verdade liberta, retomou o objetivo da Campanha da Fraternidade –
cujo lema era “A verdade vos libertará – daquele ano e buscou contextualizá-la
com a educação. Na realidade, pode-se dizer que o texto de Colombo se preo-
cupou mais com o sentido cristão do termo “educação e liberdade” do que pro-
priamente uma discussão no aspecto secular. Aqui, aliás, vale a pena lembrar o
que havíamos afirmado no início: o MJ buscou coadunou temas religiosos com
temas seculares. Por conseguinte, não estranha o fato que, muitas vezes, temas
tidos como seculares fossem tratados sob o prisma religioso14.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Do que foi analisado e discutido até agora, talvez se possa dizer que a
história do jornal Mundo Jovem se confundiu, parcial ou integralmente, com a
história do Brasil contemporâneo. Ou seja, o período que se inicia em 1960 com
o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), passando pelo regime civil-mili-
tar (1964-1985), a redemocratização do Brasil, (a partir de1985), a introdução do
plano real em 1994, entre outros acontecimentos. Tais momentos e conjunturas
político-econômicas foram registrados nas páginas do jornal, especialmente às
questões ligadas à educação brasileira.
O estudo do jornal no período ditatorial nos mostra, em primeiro lugar,
que a década de 1980 foi marcada por uma “abertura gradual” sob o governo
de João Figueiredo (1979-1985). Desse modo, a publicação do Jornal Mundo
Jovem indiciou que, a partir daquele período, a censura do governo aos meios de
comunicação diminuiu radicalmente. Os temas debatidos na revista, com ampla
influência da teoria marxista e da Teologia da Libertação, deixaram transparecer
que o jornal atuou, sobretudo, como denunciante e crítico do regime ditatorial.
Vale dizer que tal abertura política foi, aliás, um dos motivos pelo qual o
próprio Mundo Jovem circulou pelo Brasil e abordou temas ligados à política
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e a esfera econômica. Nesse sentido, o tema da educação foi um dos objetivos
do jornal no ano de 1982. Ancorados na Campanha da Fraternidade daquele
ano, o MJ discutiu uma variedade de temas educacionais, sobretudo as fina-
lidades da educação e seu aspecto reprodutivista. Por exemplo, artigos como
de Pedrinho Guareschii, Leandro Rossa, Amindo Cattelan e até a entrevista
de Moacir Gadotti analisaram, com efeito, a educação brasileira no contexto
da década de 1980. No mesmo sentido, termos como “fracasso escolar”, “re-
produção social”, “desigualdade”, “ensino tecnicista”, “alienação” apareceram
abundantemente nos textos do jornal. Urgia, sobretudo, denunciar a proposta
do governo ditatorial do ensino profissionalizante introduzido pela reforma da
educação básica e do ensino superior.
Conforme já explicava Souza (2013) no seu estudo acerca do jornal, o
uso do nome “Mundo Jovem” em 1967 assinalou o abandono parcial de “temas
vocacionais” para “temáticas seculares” ou, mais exatamente, temas preocu-
pados com a realidade social brasileira e latino-americana. Não por acaso que,
pouco a pouco, os temas se dilataram e contaram com artigos transversais sobre
sexualidade, comunicação, política, direitos humanos, entre outros. Nesse in-
terim, inserir artigos sobre a educação foi, entre outras coisas, uma maneira de
compreender e dar visibilidade para a própria realidade do Brasil no contexto de
1980 e, com isso, se posicionar criticamente. Além disso, o Jornal Mundo Jovem
se constituiu como uma fonte importante para o estudo da História da Educação
brasileira no período da ditadura.
REFERÊNCIAS
AQUINO, Maria Aparecida de. Censura, Imprensa e Estado autoritário
(1968- 1978). Bauru: EDUSC, 1999.
BENVENUTI, Vera Lúcia S. BOHN, Marizinha Beck. Um desafio: pré-escola.
In: Jornal Mundo Jovem. Porto Alegre, ano 20, n.148, p.18-19, Agosto. 1982.
CATTELAN, Armindo. Educação para o trabalho. In: Jornal Mundo Jovem.
Porto Alegre, ano 20, n.147, p.11, julho. 1982.
CIMADON, Aristides. Para onde caminha a educação? In: Jornal Mundo Jo-
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COLOMBO, Olírio Plínio. Somente a verdade liberta. In: Jornal Mundo Jo-
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22
TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS E SUAS
MANIFESTAÇÕES NO CURRÍCULO: UM OLHAR
SOBRE A PEDAGOGIA HISTÓRICO-CRÍTICA NO
PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS SUJEITOS
Eunice Nóbrega Portela1
Dirce Maria da Silva2
1 INTRODUÇÃO
Sacristán (1998) esclarece que “as práticas e as palavras têm sua história
e refletem as atividades nas quais forjaram os significados que arrastam até nós,
projetando-se em nossas ações e pensamentos, na forma de dar sentido à expe-
riência” (SACRISTÁN, 1998, p. 119).
Por sua vez, Saviani (1985) explica que “os tipos de homens os quais o
processo educativo pretende formar variam de acordo com as exigências das
diferentes e respectivas épocas”. Logo, a educação tem relação direta com a rea-
lidade vivenciada pelo ser humano e atende a interesses pertinentes ao contexto
em que ele vivencia.
Nesse sentido, conforme Gadotti (1995) e Pinto (1982), “a educação é um
fato existencial e refere-se, pelas ações exteriores que sofre, a como o homem se
faz ser homem”, ou seja, a educação configura o homem em toda sua realidade
(PINTO, 1982; GADOTTI, 1995, p. 251).
Nesse mesmo sentido, Jacques Delors (2002), ao falar sobre a Educação
para o Século XXI, alerta a respeito do mecanismo e finalidades da educação,
A educação não serve apenas para fornecer pessoas qualificadas ao mun-
do da economia: não se destina ao ser humano enquanto agente econô-
mico, mas enquanto fim último do desenvolvimento. Desenvolver os ta-
lentos e as aptidões de cada um corresponde, ao mesmo tempo, à missão
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
fundamentalmente humanista da educação, à exigência da equidade que
deve orientar qualquer política educativa e às verdadeiras necessidades de
um desenvolvimento endógeno, respeitador do meio ambiente humano e
natural, e da diversidade de tradições e culturas (DELORS et al, 2002, p.
85).
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B runa B eatriz da R ocha | R ebeca F reitas I vanicska (O rganizadores )
respostas, de vertente apenas conceitual.
Já as Tendências de cunho progressista foram adquirindo maior destaque
e solidez a partir da década de 1980, período dominado pelas Teorias Críticas.
Segundo José Carlos Libâneo,
A Pedagogia Progressista parte de uma análise crítica das realidades so-
ciais e sustentam implicitamente as finalidades sociopolíticas da educa-
ção. Nessas tendências, a educação possibilita a compreensão da realidade
histórico-social, explicando o papel do sujeito como um ser que constrói
sua realidade, pois assumem um caráter pedagógico e político ao mesmo
tempo (LIBÂNEO, 1990).
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contribuindo com a sua transformação. Da mesma forma, pode-se inferir que
ela é também crítica, por ter consciência da determinação exercida pela socieda-
de sobre a educação. A Pedagogia Histórico-Crítica surge, assim, da necessidade
de contrapor a falta de consciência histórico-social das práticas pedagógicas até
então conhecidas no Brasil.
A Pedagogia Histórico-Crítica tem como desígnio estimular a atividade e
a ação do educador, defendendo o diálogo entre os educadores e os educandos,
considerando suas experiências históricas e sociais, sem perder o foco da siste-
mática, da lógica dos conhecimentos, suas ordenações e conteúdo.
Nessa proposta, existe a convicção de que o conhecimento se constrói,
necessariamente, a partir da base material e social. Para Saviani (2007) “é a
existência social dos homens que provoca o conhecimento; trazer para a sala de
aula as experiências da realidade concreta dos educandos é colocá-los no centro
do processo de aprendizagem”.
Para ressaltar um pouco mais a importância da Pedagogia Crítica, Saviani
(1991) explica que, “a sociedade é construída em contextos históricos, socioeconô-
micos e políticos marcados por processos de colonização e dominação. Estamos,
portanto, no terreno das desigualdades, das identidades e das diferenças”.
Portanto, não se pode olvidar que a visão de homem e sociedade é fruto
de construções historicamente situadas e, conforme Silva (2007, p. 15), “a cada
um desses “modelos” de ser humano corresponderá um tipo de conhecimento,
um tipo de currículo” e como consequência, uma configuração de homem, com
mentalidade e valores determinados.
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
Para a Pedagogia Histórico-Crítica, o processo educativo deve ocorrer em
sua totalidade, gerando uma visão ampla e complexa, relacionando os conteú-
dos com o processo de formação do sujeito (educando) com o cotidiano no qual
ele está inserido (sociedade).
Nesse contexto pedagógico, considera-se que todos os sujeitos envolvi-
dos têm uma carga social e histórica. Compreende-se que o ato educativo deve
ocorrer em sua totalidade, tornando o ato de ensinar um processo de desenvolvi-
mento histórico-social, superando uma educação compartimentada e simplista
(SAVIANI, 1991; LUCKESI, 1994; BOHRER, 2017, p. 7).
Dessa forma, a Pedagogia Histórico-Crítica pretende integrar os envolvi-
dos no processo educacional (docentes e discentes) para que, através da apro-
priação do conhecimento consigam ressignificar o ato de ensinar e aprender.
Quando se proporciona uma sala de aula Histórico-Crítica, está-se captando o
fenômeno educativo na sua realidade constitutiva, de maneira completa e dialé-
tica, percebendo as interligações das partes com o todo, ou seja, trata-se de com-
preender o fenômeno educativo em e para suas relações sociais.
Cipriano Luckesi reafirma que “aprender dentro da visão da Pedagogia
Crítico-Social dos Conteúdos, é desenvolver a capacidade de processar informa-
ções e lidar com os estímulos do ambiente, organizando os dados disponíveis da
experiência” (LUCKESI, 1994, p. 72).
E ainda de acordo com Saviani (1991),
A Pedagogia Crítica implica a clareza dos determinantes sociais da educa-
ção, a compreensão do grau em que as contradições da sociedade marcam
a educação e, consequentemente, como é preciso se posicionar diante des-
sas contradições e desenredar a educação das visões ambíguas, para perce-
ber claramente qual é a direção que cabe imprimir à questão educacional
(SAVIANI, 1991, p. 103).
4 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
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estruturação do processo de ensino.
Por conseguinte, uma formação humana e social para o homem, o cidadão
que se quer desenvolver, perpassa pela compreensão do sentido político e social
em que se está inserido, pois, como afirma José Carlos Libâneo, “aprender é um
ato de conhecimento da realidade concreta, isto é, da situação real vivida pelo edu-
cando, e só tem sentido se resultar de uma aproximação crítica dessa realidade”.
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CULTURA E FORMAÇÃO CULTURAL
NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Graciela Mendes Nogueira Targino1
Keyla Andrea Santiago Oliveira2
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As brincadeiras, para o autor, carregam em seu bojo elementos essenciais
para o desenvolvimento humano. A criança vive diferentes papéis ao brincar, e
ao sair da brincadeira ela estará mudada, visto que aprendeu uma nova maneira
de ser, de falar, de estar, de agir e de ver o mundo à sua volta. O brincar se cria
e se aprende. Ao brincar, o faz-de-conta funde-se com a realidade e as crianças
constroem saberes e vão se constituindo como sujeitos. Nesse sentido, os adultos
têm papel essencial em ensinar as crianças a brincar, a interagir e motivar essa
atividade lúdica, no entanto, as crianças constroem seus significados, modificam
e criam novas formas de brincar e pensar o mundo real. As brincadeiras passam,
assim, a ganhar vida e não se mostram apenas como um saber transmitido para
as crianças e sim como um saber construído também por elas.
Através da brincadeira, a criança tem a possibilidade de experimentar no-
vas formas de ação, exercitá-las, ser criativa, imaginar situações e reprodu-
zir momentos e interações importantes de sua vida, ressignificando-os. Os
jogos e as brincadeiras são uma forma de lazer no qual estão presentes as
vivências de prazer e desprazer. Representam uma fonte de conhecimento
sobre o mundo e sobre si mesmo, contribuindo para o desenvolvimento de
recursos cognitivos e afetivos que favorecem o raciocínio, tomada de deci-
sões, solução de problemas e o desenvolvimento do potencial criativo. A
brincadeira assume um papel essencial porque se constitui como produto
e produtora de sentidos e significados na formação da subjetividade da
criança. (PEDROZA, 2019 p. 62).
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
às suas experiências. Através das relações que a criança estabelece na brincadei-
ra, ela amplia suas possibilidades de exploração, aprendizagem e desenvolvi-
mento. Para que haja a compreensão desses elementos, as ideias sobre cultura,
criança e brincadeiras precisam ser consideradas.
A cultura é uma palavra que vem sendo compreendida de diversas ma-
neiras, apresentando conceitos transitórios de acordo com valores ideológicos,
temporais e locais. Para Eagleton (2011):
A própria palavra ‘cultura’ compreende uma tensão entre fazer e ser feito,
racionalidade e espontaneidade, que censura o intelecto desencarnado do
iluminismo tanto quanto desafia o reducionismo cultural de grande parte
do pensamento contemporâneo. (EAGLETON, 2011, p. 14).
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Não utilizaremos, neste trabalho, um conceito fechado acerca da palavra
Cultura, pois, acreditamos que fechar este conceito seria, talvez, uma possibilida-
de de empobrecimento da experiência cultural. A palavra Cultura vem sendo com-
preendida de maneiras diversas. Ao analisar a cultura de forma histórica, percebe-
mos que existem concepções generalizantes e outras mais particulares desse termo.
Assim, em qual vertente sobre cultura esta pesquisa se ancora? Para
que possamos refletir sobre as concepções dessa categoria, nos remetemos
a Benjamim (1994 p. 231): “as ideias se relacionam aos fenômenos, como as
constelações às estrelas.” Adorno utiliza esse termo “constelações” para des-
construir a ideia de que um conceito fechado possa abranger a totalidade do
objeto. Assim, para que possamos entender sobre cultura, precisamos analisar
uma “constelação” de categorias, nos aproximando de alguns elementos como:
economia, indústria cultural e cultura versus barbárie, e suas relações. Não par-
tiremos, portanto, de um conceito fechado, mas agregaremos vários elementos
para a discussão da cultura.
Adorno e Horkheimer (1947) defendem que a razão desenvolvida pelos
iluministas tinha por intuito, a princípio, emancipar e instrumentalizar, mas
com o desenvolvimento da sociedade capitalista, a dimensão de emancipação
foi se perdendo e a razão tornou-se técnica, transformada em instrumento para
alcançar o progresso e negando a possibilidade de crítica e emancipação. A en-
grenagem da sociedade capitalista nega a formação cultural aos sujeitos ofere-
cendo a eles a semiformação cultural. Para Adorno (2010, p. 13): “Na ideia de
formação cultural, necessariamente se postula a situação de uma humanidade
sem status e sem exploração”. No entanto, percebe-se que, hoje, no lugar da
formação cultural com sujeitos racionais, críticos e livres, existe a semiformação
cultural, contribuindo para a formação de sujeitos alienados e domesticados a
servir a um sistema econômico.
Neste sentido,
No clima de semiformação, os conteúdos, objetivos, coisificados e com
caráter de mercadoria da formação cultural perduram à custa de seu con-
teúdo de verdade e de suas relações vivas com o sujeito vivo, o qual, de
certo modo, corresponde à sua definição. (ADORNO, 2010, p.19).
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Saberes e Partilhas
o fetiche, as mercadorias assumem caráter autônomo e consolidam as contradi-
ções sociais do capitalismo. A formação cultural, defendida por Adorno, pauta-
da na criticidade e na liberdade, apresenta-se como possibilidade de resistência a
essa semiformação cultural. Acerca das ideias sobre cultura, nos apoiamos nas
concepções de Adorno, para ele:
[...] a cultura só é verdadeira quando implicitamente crítica, e o espírito que
se esquece disso vinga-se de si mesmo nos críticos que ele próprio cria. A
crítica é um elemento inalienável da cultura, repleta de contradições e, ape-
sar de toda sua inverdade, ainda é tão verdadeira quanto não-verdadeira é a
cultura. A crítica não é injusta quando destrói – esta ainda seria sua melhor
qualidade - mas quando, ao desobedecer, obedece. (ADORNO, 1998, p. 11).
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e apenas assim, será possível uma formação cultural verdadeira.
Para os pensadores da Escola de Frankfurt, a cultura não é uma cate-
goria autônoma, ou seja, não podemos analisá-la sem levar em consideração
outras categorias. Para esta análise vamos utilizar a seguinte metáfora: a cultura
é como uma grande teia, e para compreendermos essa teia, precisamos entender
como cada fio se constitui. Os fios que fazem parte dessa teia são: a economia,
consciência de classes, indústria cultural e cultura versus barbárie.
A análise destas categorias, como fios de uma teia, nos ajuda a ter uma
dada compreensão acerca de cultura a partir da Teoria Crítica. É preciso ressal-
tar que, para esses teóricos, os conceitos não são cristalizados, e por se tratar de
uma teia, suas concepções se alteram à medida que os fios são tecidos de manei-
ras diferenciadas. Ou seja, a história, a época e o contexto podem influenciar na
(des)construção dos conceitos.
A Teoria Crítica foi inspirada nas ideias marxistas e surgiu por meio das
teorias de alguns intelectuais que criaram o Instituto de Pesquisa Social. O ins-
tituto tinha por objetivo documentar e teorizar sobre problemas relacionados ao
capitalismo e aos movimentos operários, ampliando os horizontes marxistas.
Este grupo estabeleceu um vínculo com a Universidade de Frankfurt e dois pes-
quisadores são seus expoentes: Horkheimer e Adorno.
Horkheimer foi o 2º diretor do Instituto de Pesquisa Social e, em 1937,
escreveu sobre a Teoria Crítica da escola de Frankfurt, descrevendo a Teoria
Tradicional como uma tentativa de produzir verdades absolutas. As raízes da
Teoria Crítica pautam-se nas preocupações do marxismo: capitalismo, luta de
classes e relações de poder. Porém, ela preocupa-se em aprofundar a cultura, e
toda a constelação de ideias que permeia essa categoria.
Theodor Adorno, co-diretor do instituto, e Max Horkheimer eram intelec-
tuais marxistas não ortodoxos e juntos escreveram o livro A dialética do Esclarecimento
(1947). Nessa obra, os autores tecem uma crítica à razão instrumental, idealizada
pelo iluminismo. Para eles, a ciência pautada unicamente na razão era reducionista
e valorizava a técnica, desvalorizando o pensamento, o conhecimento local e os
saberes construídos não-institucionalizados. Nessa perspectiva, as relações sociais
são determinadas como mercadorias industrializadas, a cultura deixaria de ser a
produção do povo, passando a ser um produto para o povo, dessa forma, as pessoas
não seriam vistas como produtores de cultura, mas sim como consumidores.
A partir disso, fazendo um recorte no âmbito cultural relacionado às
crianças, a brincadeira não seria uma atividade espontânea lúdica e passaria
a ser um produto a serviço do capital. Neste trabalho procuramos evidenciar a
brincadeira como atividade espontânea e como uma possibilidade de fuga da
lógica capitalista.
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e uma regressão da autonomia das pessoas. Para Adorno e Horkheimer (1947, p.
69) esta indústria “realizou maldosamente o homem como ser genérico.” Ocorre
que essa generalização desenvolveu-se “maltratando com tanto sucesso a indivi-
dualidade.” (ADORNO; HORKHEIMER, 1947 p.73). Dessa forma, o sistema
político e econômico produz bens culturais para serem consumidos como estra-
tégia de controle social e consolidação do sistema, visando lucro, indiferenciação
entre as pessoas e, consequentemente, a manutenção do status quo.
A indústria cultural controla o tipo de mercadoria cultural que a popula-
ção vai consumir, principalmente através dos meios de comunicação de massa.
E quanto mais consumo, mais o sistema capitalista se fortalece, ficando sua ma-
nutenção cada vez mais edificada. Nesse contexto, trazemos a poesia de Manoel
de Barros: “A máquina: a máquina segundo H.V., o jornalista”, que mesmo não
tendo o compromisso de fazer-se entender a partir de uma racionalidade técnica,
nos leva a reflexões profundas acerca desse fenômeno de industrialização cultural.
A Máquina mói carne
Excogita
Atrai braços para a lavoura
Não faz atrás de casa
Usa artefatos de couro
Cria pessoas à sua imagem e semelhança
E aceita encomendas de fora
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Saberes e Partilhas
A Máquina tritura anêmonas
Não é fonte de pássaros
etc.
etc. (BARROS, 2010, p. 140)
A Teoria Crítica é sensível às diferenças das pessoas e dos povos, ela va-
loriza essas individualidades, apontando as questões conflitantes referentes ao
processo de criação e propagação de cultura, mesmo quando critica a cultura
afirmativa, neste sentido, nos remetemos a Marcuse que traz possibilidades de
superação. Para Marcuse (1997), a cultura afirmativa é a cultura construída pela
burguesia, que tinha caráter ideológico e opressor. Este teórico, mesmo que mui-
to crítico a toda essa cultura que reifica as características do capitalismo, em
especial de exploração do trabalho e controle da consciência, ainda apresenta
elementos otimistas em seus estudos naquilo que se refere à cultura:
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Saberes e Partilhas
A obra de arte é bela na medida em que opõe a sua própria ordem à da
realidade – a sua ordem não repressiva, onde a própria maldição é prefe-
rida em nome de Eros. Aparece nos breves momentos de realização, de
tranquilidade – no “belo momento” que suspende a dinâmica incessante e
a desordem, a necessidade constante de fazer tudo o que deve ser feito para
se continuar a viver. (MARCUSE, 1986, p. 71).
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reflexão e a criticidade, possibilitando que cada sujeito construa, de forma me-
diatizada, sua formação cultural. Nesse sentido, a educação não pode perder a
autocrítica, pois, isso significaria reviver a barbárie.
A cultura que não é crítica transforma-se em barbárie, um produto que ma-
nipula os consumidores de acordo com o interesse dos seus líderes (ADORNO,
1947). A educação seria, assim, o caminho para romper essa barbárie. Quando
os indivíduos passarem a ter consciência do seu estado de dominados, e quando
a educação valorizar o olhar sensível e solidário, será possível o sujeito libertar-
-se da ignorância e da semiformação cultural.
O papel da educação da infância na formação cultural é essencial, pois,
para Adorno (1986, p. 35): “Uma educação que queira evitar a reincidência
haverá de concentrar-se na primeira infância.” Assim, a formação cultural deve
acontecer desde a Educação Infantil. A partir disso, esta pesquisa mostra-se rele-
vante, pois aponta a necessidade de trabalhar a formação cultural com crianças
desde a tenra idade, considerando a brincadeira e suas singularidades como fon-
te enriquecedora da cultura.
Adorno (2008, p.18) defende que “A recusa da inessência dominante da
cultura pressupõe que nela se participe o suficiente para a sentir, por assim dizer,
palpitar entre os próprios dedos, mas que ao mesmo tempo dessa participação
se extraíram forças para a denunciar.” Assim, o processo de formação cultural
exige do indivíduo um entrelaçamento na cultura de seu povo e, ao mesmo tem-
po, um distanciamento dela, com o intuito de enxergá-la como ela se mostra em
suas diferentes nuances, e dessa forma, ser anunciada, denunciada, construída
ou reconstruída.
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46
A RESPONSABILIDADE SOCIAL
DO ENSINO SUPERIOR PERANTE À
QUALIDADE DE VIDA DA SOCIEDADE
Leandro de Souza Silva1
Tiago Santos Barreto Thomaz2
Elma Francisca Lopes Costa3
48
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
de diversos setores da sociedade. Em especial, a economia e a educação estão
em constante processo de modificações nas suas estruturas. As TICs são inova-
ções tecnológicas não isoladas que tanto impulsionam quanto são impulsiona-
das pela globalização. (CASTELLS, 1999).
Isso representa, segundo Martinsi (2008), maneiras de agir, ensinar e
aprender, por meio da consideração de contextos culturais e formas de expres-
são pertinentes. Considerar estes fatores implica reflexão acerca da evolução tec-
nológica, pois esta evidencia mais necessidade de repensar a diversificação dos
métodos de ensino utilizados de modo a atribuir-lhes mais sentido e efetividade.
Significar as relações didáticas representa consolidar uma postura mais
próxima às realidades estudantis em detrimento de uma postura tradicional.
Nesse sentido, Beherens (2000) defende uma prática pedagógica sempre rea-
valiada. Para ele, não se deve restringir a inovação à utilização da tecnologia.
Então, o mais adequado é o professor se apropriar desses recursos com o pro-
pósito de conceber metodologias que superem a reprodução do conhecimento e
conduzam à sistematização desse saber.
Essa superação apresenta a necessidade de rever a maneira de planejar
o aprendizado e todas as atividades próprias deste planejamento. Logo, ater-se
somente às aulas convencionais em que professores se portam como detentores
do saber e percebem os alunos como meros receptores é postura obsoleta.
É fundamental que os educadores tenham flexibilidade nas suas estratégias
e integrem as várias possibilidades permitidas pelas tecnologias nas salas de
aulas. Não obstante, essa integração tem que ser consciente e respeitar o que
Beherens (2000) denomina de princípios metodológicos norteadores. A saber:
incluir textos escritos, hipertextos, multimídia, levar o ambiente do audiovisual
para dentro da escola, variar a forma de lecionar e o processo avaliativo e apre-
ciar a presença da transmissão virtual da comunicação.
Fundamentado nessa visão, faz-se necessária a mediação das informa-
ções, dado que há diversas origens e meios de acesso a elas. Caso contrário,
pode ser tratada como verdade uma notícia falsa - as chamadas fake news.
Consequência disso, a credibilidade da cientificidade poderá alterar-se e causar
prejuízos. Logo, a correta interpretação do que se lê, a verificação da fonte vei-
culadora da informação e a contextualização apropriada se fazem primordiais.
Só é viável esta intervenção, a partir da apreensão da clareza do signifi-
cado de novidades tecnológicas educacionais. Beherens (2000) assim as define:
é a utilização da informática, do computador, da internet, da hipermídia, da
multimídia, educação a distância, chats, fóruns de debates, correio eletrônico.
De fato, esse entendimento reforça a consciência de que se convive na
sociedade da informação. No ambiente universitário, acrescentou-se uma nova
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relação do professor com materiais didáticos. Conforme Chagas (2010), a pro-
fissão de docente tinha uma relação direta com livros, gizes, quadros negros e
papeis. Contudo, há alguns anos isso mudou muito. Os recursos docentes se am-
pliaram – foram hoje incorporadas conexões diretas com as TICs. Conscientizar-
se disso envolve discernimento quanto às representatividades desse novo tempo:
mais celeridade na transmissão de informações com mais facilidade de criar,
processar, armazenar e vinculá-las.
Com efeito, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB
- orienta, no artigo 43, inciso I, direcionar a atenção no que se refere a traba-
lhar com pesquisas e investigações científicas e a objetivar desenvolver a evolu-
ção científica e tecnológica. Também, o artigo 62, § 2º, trata deste progresso ao
orientar que haja preparação contínua e capacitação dos profissionais de ma-
gistério com o uso de recursos e tecnologias de educação a distância (BRASIL,
2009). Essa mediação tecnológica assíncrona se faz necessária para atender as
demandas da preparação docente, uma vez que a capacitação síncrona não é
suficiente na intenção de capacitar aqueles que estão à frente, como mediadores
do processo de ensino.
É oportuno entender a educação superior e as legislações que tratam
dela. Nessa lógica, o artigo 9º, inciso IX da LDB confere a incumbência da
autorização, reconhecimento, credenciamento, supervisionamento e avaliação
dos cursos das instituições que ofertam este nível de ensino à União. Essas
mesmas atribuições também podem ser atribuídas aos Estados ou ao Distrito
Federal, caso mantenham instituições de educação superior (BRASIL, 2009).
O artigo 49 desta mesma Lei menciona a abrangência deste segmento
educacional quanto aos cursos e programas: os sequenciais por campo de saber,
de graduação, de pós-graduação, e de extensão. Os sequenciais por campo de sa-
ber, com diferentes níveis de abrangência, disponíveis aos candidatos desde que
atendam às exigências estabelecidas pelas organizações de ensino, e já tenham
concluído o ensino médio ou equivalente. Os de graduação, acessíveis àque-
les que concluíram o ensino médio ou equivalente e tenham sido submetidos a
processo seletivo e classificação. Os de pós-graduação - mestrado, doutorado,
especialização, aperfeiçoamento e outros - abertos a diplomados em cursos de
graduação e que preencham os pré-requisitos estabelecidos pelas instituições de
ensino. Os de extensão, disponíveis aos que atendam a critérios definidos pelas
instituições de ensino. (BRASIL, 2009).
Merece destaque a característica da indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão desse segmento educacional, presente no artigo 207 da
Constituição Federal. Essa tríade compõe um relevante paradigma da univer-
sidade e expressa expectativa da construção da sociedade. Para maior ênfase
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
desse processo construtivo, às universidades é facultada a admissão de docentes,
técnicos e cientistas estrangeiros, conforme o parágrafo primeiro deste mesmo
artigo. (BRASIL, 2020).
Nessa percepção, esse princípio retrata a qualidade do trabalho acadêmi-
co. Nisto, incluem-se a proximidade entre universidade e sociedade, autorrefle-
xão crítica e a emancipação inerente à teoria e à prática dos estudantes, além da
acepção social do trabalho universitário. A Consolidação deste princípio pres-
supõe realizar propostas coletivas de trabalho referenciadas na avaliação institu-
cional, nos planos das ações institucionais e na avaliação que respeite a vontade
majoritária da sociedade (ANDES, 2013).
A regulação e acompanhamento da oferta da educação superior exi-
ge transparência das ações acadêmicas, de informações e titulações do corpo
docente atuante, do plano de curso e currículos programáticos adotados e do
processo seletivo estabelecido. Regras de expedição de diplomas são, também,
definidas. Com este monitoramento, ficam as universidades autorizadas a expe-
dir certificados e diplomas de conclusão referentes aos cursos oferecidos por elas
e pelas faculdades particulares consoante indicação do Conselho de Educação.
Diplomados em universidades estrangeiras terão seus diplomas revalidados
por universidades públicas cujo nível e área sejam os mesmos ou equivalente.
Salientam-se os acordos internacionais de reciprocidade ou equiparação em
conformidade com o artigo 48, parágrafo segundo da LDB (BRASIL, 2009).
Entendidas essas regulamentações, é relevante destacar Gabriel (2013),
porque declara que o educador que outrora selecionava os conteúdos a serem
ministrados, na era digital dos tempos atuais, atribui ao professor uma atuação
que mediatiza o processo da chegada das informações, a fim de refletir, construir
significados e validá-las.
Ainda, nesse viés, essa mudança de paradigma com o emprego de mais
TICs consiste em condição essencial de evidência de melhora nesse nível educa-
cional. Isso posto, urge a verificação da autenticidade do que é comunicado aos
aprendizes e a busca pela fonte originária dessa comunicação, porquanto são,
também, de suma relevância.
Então, é preponderante ater-se a ideia de planejar e consolidar aulas mais
atraentes e dinâmicas. Ou seja, favorecer a relação de complementaridade en-
tre ensino e novas pedagogias concernentes a este tema. Isso suscita conside-
rar conhecimentos prévios do alunado e saber relacioná-los com a intenção de
ressignificá-los.
Essa ressignificação vai ao encontro da emancipação estudantil oferecida
pelas TICs. Emancipar-se significa mais envolvimento ativo e efetivo nas
atividades acadêmicas e, por conseguinte, na vida em sociedade. Isso requer
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fomentar e fundamentar processos formativos para auxiliar a compreensão des-
sa autonomia de modo a torná-la mais produtiva e com boa repercussão social.
Além disso, de acordo com Takahashi (2000) é criado um novo cenário
a partir das tecnologias digitais. Para educar diante da sociedade significa não
somente preparar as pessoas para o uso das novas TICs, mas também investir na
criação de cidadãos competentes para tomarem decisões essenciais.
Diante dessa conjuntura, é impreterível que os incumbidos pela apren-
dizagem criem planejamentos adaptáveis às diversas realidades e dificuldades
vivenciadas pelos estudantes (MOORE; KEARSLEY, 2011). Assim sendo, essa
adaptação tende a apontar para a eficácia na resolução de problemas e para o
protagonismo na vida pessoal e coletiva.
Isso gera experiências exitosas e instigantes com desenvolvimento do senti-
mento de pertença e estímulo à curiosidade e à indagação. Indagar é, pois, deixar
começar a fluir reflexões criativas, lógicas e críticas. Segundo esclarece a Base
Nacional Comum Curricular - BNCC, mediante à idealização e a consolidação
da habilidade de perguntar, avaliar respostas e de discutir, amplia-se a compreen-
são do próprio indivíduo e das relações interpessoais. Também afirma este texto
a inevitabilidade de pensar sobre as mudanças ocasionadas em função do avanço
das TICs, do uso de novos gêneros do discurso e novas práticas de linguagem
intrínsecas à cultura digital. Isso inclui a reestruturação dessas produções textuais
feitas até mesmo por mais de um autor em locais diferentes, mas compartilhando
as atualizações em tempo real, ao utilizar, por exemplo, o Google Docs.
Silva e Cabrero (1998) estendem as contribuições da educação para o fo-
mento da iniciação científica para médio e longo prazos. Neste, há a formação
de futuros doutores; naquele, os avanços da ciência e o progresso de publicações.
Por meio dessas contribuições, a divulgação dos saberes institucionalizados e
daqueles evidenciados em prática por meio de laboratório de pesquisa e pesquisa
de campo, por exemplo, chegam ao conhecimento maior do público leigo e da
comunidade de pesquisadores.
Já Saviani (2002) salienta que o princípio científico não objetiva precipua-
mente instruir o pesquisador, e, sim favorecer ao aluno de graduação a vivência
com metodologias e processos da pesquisa. No entanto, Pereira (2009) afirma a
existência de um número reduzido de instituições de ensino superior no Brasil
que fomentam a conexão entre o ensino e a pesquisa. Para este autor, embora
haja universidades que propõem essa vinculação a seus planejamentos, a au-
sência de engajamento do corpo docente ou, até mesmo, a ausência de recursos
prejudica este elo.
Portanto, para um melhor entendimento acerca deste tema, convém men-
cionar que as teorias e atividades acadêmicas têm mais efetividade e qualidade
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Saberes e Partilhas
no momento em que os avanços científicos e acadêmicos contribuem para me-
lhorar a estrutura da sociedade. Logo, aspira-se a integração dos estudantes uni-
versitários com as demandas do sistema produtivo do país.
Demo (2001) conceitua atributo, nessa acepção, como a ação humana na
qualidade; capacidade de utilizar meios, ferramentas, maneiras, métodos, proce-
dimentos diante dos embates do desenvolvimento como expedientes primordiais
para a inovação. Assim, na busca por compreender os aspectos que envolvem
esse aspecto qualitativo, é preciso relatar a repercussão da avaliação sobre a or-
ganização da educação brasileira. Consoante declara Cury (2003), esta com-
porta-se como um termômetro para constatação da qualidade ideal. Isso ocorre
tanto no setor privado quanto no setor público da educação superior em busca
do alcance das suas metas.
Sendo assim, outro fator relevante a ser mencionado são as políticas públi-
cas, haja vista que estas só são consistentes quando elaboradas a partir de parece-
res periódicos no tocante a resultados individuais dos alunos e das instituições de
ensino. Portanto, por meio do processo avaliativo, são viabilizadas intervenções
pontuais e assertivas. A partir desse raciocínio, criam-se cenários com o intuito de
promover debates que objetivem a elaboração de políticas públicas direcionadas
ao fortalecimento da relação existente entre ensino e pesquisa, teoria e prática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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responsabilidade perante seu próprio progresso. Com isso, este autor afirma ser
papel da educação alcançar metas a fim de introjetar melhorias desejáveis na
promoção da qualidade de vida.
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VIOLÊNCIA NAS ENTRELINHAS: UMA
ANÁLISE DOS DISCURSOS DISCRIMINATÓRIOS
OBSERVADOS NO COTIDIANO DE DUAS
ESCOLAS EM ACARI, RIO DE JANEIRO
Raquel Brum Fernandes1
1. INTRODUÇÃO
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estrutura física prejudicada entre outras coisas e que não conseguem promover
a aprendizagem dos alunos, é classificado por Alba Zaluar (2001) como uma
outra violência sofrida pelos jovens, na medida em que não os prepara para en-
frentar os problemas presentes no mundo. Muito já se discutiu sobre as causas
da violência ou ao menos as causas de sua expansão nos últimos anos. Sobre
isso, Dellasoppa, Bercovich e Arriaga dizem:
De maneira geral, é reconhecido (CDC,1994) que, no presente, as causas
específicas e imediatas desse problema continuam incertas. O aumento na
ocorrência de homicídios pode ser o resultado do recrutamento de jovens,
principalmente das classes média e baixa, pelo mercado de drogas, do uso
de armas de fogo nesses mercados e da consequente distribuição de armas
para outros jovens da comunidade. Isso, em retorno, pode resultar em um
uso mais frequente de armas para resolver conflitos (Blumstein, 1994).
(Dellasoppa et al, 1999, p.165-166).
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Saberes e Partilhas
a partir dessas discussões sobre possíveis causas, que se precisa ter cuidado para
não naturalizar a presença da violência em determinadas regiões desfavorecidas.
Falando das escolas situadas nessas regiões ele diz que:
(...) nada nos pode levar a concluir que os alunos destas escolas são “por
natureza” mais violentos. O que pode ajudar a explicar esta situação de
“maior violência” é o facto de em escolas de meios desfavorecidos se tor-
nar mais evidente o contraste/ confronto entre quadros culturais e organi-
zacionais da escola e as heranças culturais e trajectórias escolares e sociais
dos alunos. (Sebastião, 2009, p. 39)
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violência e a criminalidade não são dados naturais, já que possuem uma
história, sua produção deve ser vinculada às diferentes e múltiplas práticas
sociais. (Coimbra, 2001:74)
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estabelecido como indignos de confiança, indisciplinados e desordeiros”(2000,
p. 27). Ao trazermos a reflexão mais uma vez para a sociedade brasileira, po-
demos perceber as questões elucidadas por Elias. As classes estigmatizadas em
relação a violência o seriam justamente por serem atribuídas a elas uma caracte-
rística anômica, já que o próprio comportamento violento consistiria na quebra
das normas sociais de respeito ao outro.
Passando para o cenário das escolas que estudei, seriam nelas encontra-
das expressões desse estigma que relaciona pobreza e violência? Se existirem, de
que forma eles se manifestam? Os casos narrados a partir de agora favorecem o
raciocínio nessa direção.
3. DADOS DA PESQUISA
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chuteira para jogar bola! (Dirigindo-se a mim) Tia, a casa dele você pre-
cisa ver, não tem nem quarto, é um barraco! (Dirigindo-se ao aluno) Se
você ganha dinheiro porque você não compra uma meia para vir para a
escola?”
Menino: “E eu vou deixar faltar o pão em casa?” (Pausa)
Menina: “Tia, ele corta o cabelo sabe aonde? No CEASA! Paga 1 real para
cortar o cabelo.”
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Saberes e Partilhas
realização, a professora da turma fez uma leitura em voz alta das questões, a fim
de que os alunos pudessem repensar suas respostas. Uma das questões na prova
de Língua Portuguesa possuía um texto que dizia que todas as pessoas precisam
ter onde morar; precisa de um quarto, uma cama, e não se pode ficar jogado
na rua igual a papel. Não só o texto pode ser considerado discriminatório em
relação à população de rua, como dada a condição socioeconômica das crianças
presentes naquela sala de aula e em muitas outras onde a prova foi aplicada,
tomando como exemplo o caso do aluno já tratado aqui, que de acordo com
sua colega não possuía nenhum quarto em sua casa, o texto poderia também
ser considerado discriminatório em relação a algumas crianças que o leram. Até
porque Hélio Silva e Cláudia Milito (1995) já destacaram que muitos meninos
de rua frequentam as escolas públicas e podem inclusive ser moradores de fa-
velas e bairros pobres que “usam a rua para auferir vantagens” (1995, p. 102).
Segundo os autores:
Quando se fala em menino de rua, o senso comum logo reage com o relato
acabado de um ser em abandono, sem laços familiares, desamarrado para
o que der e vier, armado com o seco temperamento dos desprovidos de
afeto e com os instrumentos letais que o crime organizado coloca em suas
mãos. A convivência relata que tais fantasias servem apenas para alimen-
tar a compulsão à cautela dos amedrontados e a eficácia das investidas
desses meninos, que dependem muito mais da legenda que de seus reais
recursos. A maioria tem família. (Silva e Milito, 1995, p.79).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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indicar como ideal uma condição que muitos brasileiros não possuem (um quar-
to e uma cama) e comparar a papel aqueles que ficam nas ruas, parece localizar-
-se nessa concepção condenada pela autora. Ela diz:
O professor/educador empenhado em resolver o problema da educação
escolar dessas camadas terá que enfrentar a questão política de uma so-
ciedade que, sob a capa de neutralidade, responde aos interesses daque-
les que, por condições concretas de vida, fazem parte das camadas que
contam, que têm peso nas decisões, por isso, representam o “homem
integral”(abstrato e irreal em relação aos outros) que ingenuamente os
professores/educadores persistem em impor como padrão às crianças das
camadas populares. (1982, p. 57).
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SOCIOEDUCAÇÃO E PANDEMIA:
DESAFIOS PLURAIS DENTRO DAS
UNIDADES SOCIOEDUCATIVAS
Laura Carolina Carelli Pereira1
INTRODUÇÃO
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ou regime aberto (prestação de serviços à comunidade e liberdade assistida),
além da internação provisória (ZAPPE et al., 2011).
Para Rizzini, Sposati e Oliveira (2019) a definição de socioeducação no
Brasil surge em meados de 1980, com a intenção de impor limites a ideia de pu-
nição para os menores delinquentes, trazendo assim oportunidades de ressocia-
lização e possibilidade de aprender uma profissão ainda dentro das instituições
em que se encontravam. Assim, a educação não se limita ao processo de huma-
nização, mas na reabilitação da humanidade dos excluídos (ARROYO, 2002).
Em 2019 haviam no Brasil 18.086 adolescentes submetidos a medida so-
cioeducativa em privação de liberdade em 330 unidades em todo o país, ultra-
passando o limite das 16.161 vagas disponíveis (BRASIL, 2019). No caso da me-
dida de internação, o Estado deve ofertar, obrigatoriamente, acesso à educação
básica, estando previsto no art. 124 do ECA/90: “São direitos do adolescente
privado de liberdade, entre outros, os seguintes: (...) XI - receber escolarização e
profissionalização”. Porém, existem aspectos que corroboram a fuga escolar de
adolescentes em conflito com a lei, dentre eles: exclusão, discriminação, falta de
estrutura dentro das unidades, distanciamento da prática escolar e realidade em
que se encontram e falta de incentivo (DIAS; ONOFRE, 2010).
Baseado nessas ideias criou-se o SINASE (Sistema Nacional de
Atendimento Socioeducativo) em 2006 como uma Resolução do Conselho
Nacional dos Direitos das Crianças e Adolescentes (CONANDA/SEDH nº 119,
de julho de 2006). Em 2012 foi sancionada como Lei Federal (Lei nº 12.594, de
18 de janeiro de 2012) e sua criação define a política de atendimento socioeduca-
tivo e se baseia nos direitos do adolescente e funcionalidade das unidades.
A socioeducação pode ser sistematizada em duas possibilidades: de cará-
ter protetivo, em que existe ameaça ou violação de direito do adolescente e outra
voltada para o trabalho social e pedagógico dos jovens em cumprimento de me-
dida disciplinar (COSTA, 2004). Nesse cenário, os centros socioeducativos de-
vem estar ligados a políticas públicas de integração social, como formação esco-
lar, cultural e profissional, cabendo aos gestores de cada unidade conduzirem as
crianças e adolescentes a educação e convívio em sociedade (GURALH, 2010).
Entretanto, em consulta realizada em 2013, a Companhia de Planejamento
do Distrito Federal (CODEPLAN) apresenta dados alarmantes sobre os adoles-
centes em situação de medida socioeducativa. A pesquisa mostrou que 49,1%
dos adolescentes em liberdade assistida disseram não estar matriculados em es-
colas e 7,6% dos matriculados não frequentavam as aulas. A mesma consulta
informou que 61,6% desses adolescentes não tinham instrução ou não comple-
taram o ensino fundamental (SECRETARIA DE DIREITOS HUMANOS DA
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 2015).
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ENSINO REMOTO
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Desse modo, é essencial pesquisar as dificuldades encontradas por profes-
sores do sistema socioeducativo, que já não bastasse os diversos percalços sociais
vivenciados pelos alunos, tiveram a difícil tarefa de adaptar o ensino-aprendiza-
gem diante da pandemia da Covid-19. A crise sanitária trouxe um sofrimento
social para a educação, forçando adaptações educativas e mostrando a necessi-
dade de políticas públicas para amenizar o contexto crítico (VALENCIO, 2021).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
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REPENSANDO A EDUCAÇÃO:
A BUSCA POR UMA ESCOLA INCLUSIVA1
Helenice da Silva e Castro2
INTRODUÇÃO
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Atualmente nota-se uma maior abordagem sobre educação inclusiva afi-
nal está o direito de todo cidadão frequentar a escola. Uma escola onde todos
sejam respeitados e valorizados por suas características individuais em que seu
objetivo principal seja garantir que seus alunos tenham seus direitos respeita-
dos cumprindo-se a Constituição Federalde 1988, em que a educação é direito
de todos os indivíduos.
As vantagens da prática da educação inclusiva são inúmeras e refletem
em todos, quando professores, familiares e toda a comunidade estiverem con-
vencidos de que o objetivo da educação inclusiva é garantir que todos os alunos
participem de forma igualitária sem exclusão de qualquer proposta pedagógica.
Não podemos deixar de ressaltar que cada aluno tem seu próprio ritmo de apren-
dizagem e estes devem ser respeitados tanto o tempo quanto o ritmo de cada
aluno às diferenças nos processos de aprendizagem caracterizam uma escola
inclusiva, aberta a receber todos.
A diversidade presente da sala de aula bem como em cada escola é preciso
que o professor tenha em mente que perceber e valorizar as diferenças são uma
atitude que só acrescenta na formação humana, pessoal e profissional.
Na educação inclusiva o aluno é quem irá produzir seu próprio resultado. Os
professores, profissionais por sua vez capacitados atuam como mediadores, facili-
tando o pro- cesso de aprendizagem desse aluno, a partir de técnicas apropriadas.
As mudanças deverão necessariamente começar nas concepções pedagó-
gicas dos professores e em suas atitudes para com os alunos em dificulda-
de. A perspectiva pessoal do professor informará toda a sua construção
e implementação de esquemas e rotinas. (RODRIGUES, Armindo de J.
Apud RIBEIRO e BAUMEL 2003, p. 24).
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papéis fundamentais.
Sabe-se, entretanto, que a família tem se encontrado, historicamente,
numa posição de dependência de profissionais em diferentes áreas do
conhecimento, no sentido de receberem orientações de como proceder em
relação às necessidades especiais de seus filhos. (BRASIL, 2004)
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Educar no contexto em que vivemos hoje não é uma simples tarefa é algo
muito além temos que nos comprometer com esta missão buscando a plena e
igualitária transmissão de conhecimento a todos, realçando os novos paradig-
mas em relação à inclusão de pessoas com necessidades especiais assim todo
cidadão para um ensino regular de qualidade.
A melhoria do ensino envolve necessariamente maior aproximação dos
pais, da família e da comunidade em relação à escola; no momento no mo-
mento em que essa aproximação é traduzida em resultados, percebe-se que
ela reforça a ideia de prestação de pequenos serviços, colaboração material
e humana para a unidade de ensino. (SPOSITO, 1994, p.201).
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a escola, através do serviço de intercâmbio com a comunidade, pode
fazer tais visitas e colocar as informações à disposição dos professores.
(PILETTI, 1987, p.185).
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participa da facilitação da inclusão, através do fornecimento de materiais didáti-
cos adaptados e mais do que isso ela deve oferecer cursos aos educadores com a
finalidade de conhecer novas práticas de ensino para portadores de deficiências,
como lidar e como incluí-los nas atividades, pois a partir da iniciativa da escola
em estabelecera a inclusão entre seus objetivos prioritários o caminho fica mais
fácil para posteriormente à prática educativa nas salas de aula seja realizada a
fim de incluir. A escola deve se empenhar com a mudança, com a modificação
da cultural e organizacional da escola.
O desenvolvimento profissional dos professores deve estar sempre basea-
do em conhecer as diversidades existentes na sala de aula, nem todos os alunos
Além disso, pode dar suporte, atenção e credibilidade ao trabalho dos
profissionais que atuam na escola como: retribuição econômica e valorização
de seu perfil profissional fazem como que eles cada vez mais deem o seu melhor
no que foi proposto.
Visando uma proposta de mudança da escola para facilitar este processo
de inclusão algumas atitudes quando estabelecidas irão auxiliar neste processo,
por exemplo:
1. Reforçar a cultura da escola;
2. Realizar uma boa questão;
3. Impulsionar o desenvolvimento dos professores;
4. Estabelecer uma comunicação direta e frequente;
5. Compartilhar com outros o poder e a responsabilidade;
6. Utilizar símbolos e rituais para expressar os valores culturais.
(LEITHWOOD E TANTZI 1990 Apud Coll et al 2004, p. 45)
Estas estratégias devem afetar a cultura da escola para que eu seja esta-
belecido compromisso com a mudança educativa, a fim de garantir a inclusão
através da modificação seus valores, normas, atitudes profissionais, meto-
dologias de ensino, participação dos pais, da comunidade, buscando de forma
conjunta a inclusão dos portadores de deficiências em todos os ambientes, a
partir da ideia de democratização da informação e dos conhecimentos e bana-
lização de preconceitos em relação à educação inclusiva consegui-remos enfim
colaborar de forma eficaz para que todos sintam a importância de se repensar
os direitos de todos os cidadãos principalmente o da educação que é direito de
todo cidadão brasileiro, seja ele pertencente a qualquer raça, crença ou religião.
Todas as crianças possuem características, interesses, habilidades e necessidades
de ensinos únicos, não só os deficientes, portanto não há razão para exclusão,
o sistema educacional deveria ter plena capacidade de programar seu método
de ensino para abrigar a diversidade existente de capacidades, atendendo-as de
forma eficaz e completa, só assim a educação será de todos.
Este capítulo teve como prioridade trazer grandes contribuições em
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repensar sobre a escola brasileira diante da inclusão das pessoas com deficiên-
cia, bem como uma avaliação se estamos realmente preparados para acolher
qualquer cidadão em nossas instituições de ensino buscando efetivamente uma
sociedade mais justa, consciente e igualitária.Uma escola inclusiva é aquela que
possui condições de oferecer uma educação de qualidade, planejamento, orga-
nização, buscando um trabalho conjunto com a escola e seus profissionais,
a família e a sociedade devem estar abertos e dispostos a assumir o papel de
agentes transformadores da realidade que vivemos apresentando propostas e
metas para que eu se atinja o objetivo da inclusão.
No espaço escolar onde se reúnem valores, respeito, princípios, construção
do conhecimento, todos os alunos aprendem, com ou sem deficiência, pois a es-
cola, bem como a sociedade precisam se conscientizar-se de seus papéis, lutando
pela inclusão de todos os alunos, com ou sem deficiência. Não cabe apenas à es-
cola o desafio de fazer acontecer à inclusão, mas também à família e a sociedade.
Na inclusão os alunos deverão se adaptar até o limite que conseguirem
chegar cabe ao professor desenvolver suas habilidades se o ensino for de
qualidade, isto é, se o professor considera o nível de possibilidades de de-
senvolvimento de cada ume explora suas possibilidades, por meio de ativi-
dades abertas, nas quais cada aluno se enquadra por si mesmo, na medida
de seus interesses e necessidades, sejapara construir uma ideia, ou resolver
um problema, realizar uma tarefa. Eis aí um grande desafio a ser enfren-
tado pelas escolas regulares tradicionais, cujo paradigma é condutista, e
baseado na transmissão dos conhecimentos. (MANTOAN, 2005)
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Saberes e Partilhas
especial, quando necessário, e de conscientizar os participantes deste processo
educadores, funcionários das escolas, alunos e seus familiares. Adquirir uma
escola inclusiva não é fácil, no entanto é necessário e urgente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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DIFERENÇAS VERSUS HOMOGENEIZAÇÃO,
TRAÇANDO CAMINHOS PARA A EDUCAÇÃO
EM UMA PERSPECTIVA INCLUSIVA
Beatriz Viana Motta1
Célio Rafael dos Santos Viana2
Elissilvia de Souza Pereira3
1. INTRODUÇÃO
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
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Dentre os inúmeros métodos existentes nas pesquisas de natureza quali-
tativa, o presente estudo trata-se de uma pesquisa bibliográfica, sendo utilizada
a revisão de literatura, sistematizando experiências e vivências com leituras de
artigos científicos e obras de autores que estudam a temática em questão.
Conforme Martins (2018, p. 2):
A revisão de literatura refere-se à fundamentação teórica que você irá ado-
tar para tratar o tema e o problema de pesquisa. Por meio da análise da
literatura publicada você irá traçar um quadro teórico e fará a estruturação
conceitual que dará sustentação ao desenvolvimento da pesquisa.
Nesse sentido, o presente artigo foi concebido através das análises de ex-
periências vivenciadas pelos pesquisadores, alinhando-se aos teóricos estudados
no decorrer dos seus processos formativos.
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que eles constituem um bloco único, com a mesma cultura, compartilhan-
do as mesmas crenças, a mesma língua. Ora, essa é uma idéia equivoca-
da, que reduz culturas tão diferenciadas a uma entidade supra étnica. O
Tukano, o Desana, o Munduruku, o Waimiri-Atroari deixa de ser Tukano,
Desana, Munduruku e Waimiri-Atroari para se transformar no “índio”,
isto é, no “índio genérico”.
Isto posto, é importante enfatizar que ao longo deste século, tal configu-
ração social vem sofrendo mudanças gradativas, pois, em âmbito educacional,
busca-se a inclusão desses sujeitos, entretanto, apesar dos avanços obtidos, ainda
se faz necessário investimento na formação inicial e continuada dos docentes
que atuam com este público no ensino básico.
Mantoan (2006, p. 15) mostra em seus estudos que: “Algumas escolas
públicas e particulares já adotaram ações nesse sentido, ao proporem mudanças
na sua organização pedagógica, de modo a reconhecer e valorizar as diferenças,
sem discriminar os alunos nem segregá-los”.
Ainda com relação à perspectiva inclusiva, nos últimos anos, foram ins-
tituídas uma série de políticas públicas inclusivas que propiciam direitos para
as pessoas indígenas e pessoas com deficiência, de maneira que estas possam
exercer sua cidadania plena e viver com qualidade dentro do contexto social, é
importante esclarecer que tais políticas iniciaram em âmbito educacional, haja
vista que o espaço escolar abriga uma diversidade de pessoas que possuem suas
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Saberes e Partilhas
peculiaridades individuais.
Nesse sentido, é importante enfatizar os conceitos de diferença e homoge-
neização, pois, é por meio da compreensão destes conceitos em âmbito educacio-
nal, que propiciam um novo olhar social para os grupos historicamente excluídos.
Conforme os estudos de Abramowicz, Rodrigues e Cruz (2011, p. 92):
Na vertente marxista, em alguma medida, diferença e diversidade também
podem ser apaziguadas sob a forma de uma síntese totalizante das con-
tradições, mesmo que em última instância. Nesta perspectiva há algumas
contradições que podem e se apaziguam. Reconhece-se neste campo as
desigualdades sociais, na medida em que elas são as fundantes da própria
diferença e/ou diversidades. Mas o estatuto teórico dado a etnia, a raça,
ao gênero nesta matriz conceitual são considerados como epifenômenos
do embate, poeira ideológica que se despregam da luta.
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Entende-se a educação escolar indígena como uma modalidade de ensino
que prioriza os saberes culturais de suas etnias.
Melià (1999, p. 11) define que:
No processo de educação escolar dos indígenas a perda da alteridade e a
dissolução das diferenças são sentidas como ameaças reais, prementes e
iniludíveis. Essa perda e essa dissolução, para alguns, relacionam-se até de
forma direta e quase exclusiva com a escola. A escola seria um dos fatores
decisivos de generalização e uniformidade.
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Saberes e Partilhas
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao ple-
no desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho (BRAIL, 1988).
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procedimentos avaliativos, assim, causando como consequência dificuldades
para quaisquer indivíduos que não estejam emersos ao padrão almejado.
As reflexões trazidas por Esteban (2000, p. 3) ilustram a:
Sala de aula, lugar múltiplo onde se cruzam saberes e desejos diversos e
que convida ao diálogo, mesmo quando só dá espaço para o diálogo inte-
rior. Sala de aula, lugar que procura organizar-se no singular, ocultando
que sua singularidade está na pluralidade que a compõe, impedindo que os
trajetos, desejos e possibilidades peculiares se expressem e se afirmem fa-
zendo que muitos tentem se adequar ao ritmo imposto, à tarefa dada, aos
tempos fixos, ao movimento previsível e uniforme, que obrigam a deixar
de fora a turbulência da vida e desobrigam a vivê-la, ainda que por pou-
co tempo, em toda sua intensidade. As crianças chegam à escola, assim
como as professoras e professores, encharcadas da vida e freqüentemente
não encontram na sala de aula espaço-tempo para viverem o movimento
no qual estão imersas, tendo que entrar todas numa sintonia única, que
encobre a polifonia.
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sua maioria o multiculturalismo e por consequência exclui as pessoas indígenas
que frequentam a rede regular de ensino nos grandes centros urbanos, de modo
que estes utilizam-se do espaço escolar para compreender a cultura do branco e
via de regra não serem enganados.
Como apontam Bergamasch e Silva (2007, p. 125):
O silêncio, a invisibilidade histórica e o “encobrimento” de um tema rele-
vante, que diz respeito à constituição individual e coletiva das pessoas que
vivem na América - na nossa América - justificam a importância de tornar
mais visível a educação escolar indígena.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
5. REFERÊNCIAS
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95
ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS UTILIZADAS
POR TRABALHADORES-ESTUDANTES
ANTES E DURANTE O PERÍODO PANDÊMICO
Vanessa Aparecida de Santana1
INTRODUÇÃO
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Na busca de revisão da literatura observou - se que nos estudos de Vargas
e Paula (2013) as instituições de ensino não tem uma estrutura adequada para
atender o seu maior contingente, que é o trabalhador estudante e estudante tra-
balhador, pois estão voltadas para o ensino em tempo integral. Também con-
cluem que os documentos legais embora preguem a igualdade, não dão conta de
atender às carências das trabalhadoras que estudam nas instituições de ensino
superior. Estudos de Fagundes, Luce e Espinar (2014) concluem que o ensino
médio favorável pode ser uma variável que aumenta o êxito acadêmico dos alu-
nos no ensino superior e sugerem medidas de orientação que incluam estudantes
de diferentes perfis, como, idade, situação econômica e nível educacional, ten-
do em conta os novos papeis desempenhados pela educação em nível superior.
Silva, et al. (2015) observaram em seus resultados, que os alunos com maior
renda familiar participam mais de atividades acadêmicas. Constam também
que o fato de não trabalhar e não ter filhos aumenta o desempenho acadêmico.
Concluem que o tempo disponível aos estudos é um elemento fundamental para
otimizar o desempenho acadêmico e que a dedicação exclusiva para a faculdade
influencia diretamente nas notas alcançadas pelos alunos.
Do ponto de vista social a urgência na criação, testagem e uso efetivo de
vacinas e medicamentos, ações para conter a propagação da doença indicam as
inferências éticas e de direitos humanos que requer uma análise crítica e pruden-
te para ações estratégicas. As doenças são fenômenos biológicos e sociais. As
emergências, principalmente globais, como é o caso da Pandemia do Covid-19
desafiam, intensificam e aceleram processos como sentidos, transitoriedade e
incertezas do momento presente tornando-se objetos de estudos para cientistas
sociais e historiadores. Oportunidade ímpar para analisar a própria “ciência em
ação” como coloca Latour em seu livro, Ciência em Ação e o quanto a perspec-
tiva etnográfica afeta a análise da pesquisa5. A circulação do novo Corona vírus
evidenciou as contradições do capitalismo, ou seja, mesmo que o vírus não faça
distinção de pessoas, as próprias desigualdades sociais dão conta disso. Para a
filosofia, é a pobreza, a xenofobia e a falta de políticas assistenciais que põem em
xeque o debate sobre quais vidas realmente importam.
A crise ecológica global retomou algumas noções de fato social, totalidade
social, consciência coletiva, dualidade humana, representações coletivas e simbó-
licas, indistinção entre cultura e natureza. O Sars-Cov-2 até então desconhecido
ganha representação e simbolização, o real impõe-se de modo inevitável produ-
zindo crises sociais. A natureza torna-se portanto o inconsciente em movimento e
no lugar de encontro entre a natureza e cultura, o Sujeito e o Outro, o inconsciente
fundamenta a intersubjetividade adquirindo função simbólica. Para a sociologia,
5 LATOUR, 2012
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o Sujeito é dotado de intencionalidade, do ponto de vista transitório definido pelo
olhar do Outro, constitui um habitus, portanto é descentrado, colocando-se em
dúvida e abrindo-se a fontes de conhecimentos e respectivamente relacional.
Decreto 47.891, 20 de março de 2020 declarou estado de calamidade pú-
blica em todo território de Minas Gerais em decorrência da pandemia causada
pelo Coronavírus. O Plano Minas Consciente6, criado pelo Governo mineiro.
Em 19 de março de 2020 o Prefeito do município de São João Del Rei,
Nivaldo José de Andrade assinou o decreto 8.601 com medidas de prevenção,
enfrentamento e contingenciamento da Covid-19. A partir deste decreto de en-
frentamento criou-se um Comitê de enfrentamento ao Covid-19, dentre as ações
estavam: páginas em redes sociais para divulgação de combate a pandemia, bo-
letins diários com números de casos de infectados e óbitos.7
Em Ouro Preto o Prefeito, Júlio Ernesto de Grammont Machado de
Araújo assinou o decreto 5.660 declarando situação de emergência em Saúde
Pública criando ações para contenção e propagação do novo Coronavírus e em
23 de Março declarou calamidade pública. Dentre as atividades para contenção
e segundo o Plano Minas Consciente, de acordo com o decreto 5.657 de 17 de
março, considerando o agravamento do vírus estavam: aquisição de bens e ser-
viços para o município, suspensão de atividades como: shoppings, salões de be-
leza, clubes de serviços e lazer, academias, autoescola, casas noturnas, cinemas,
consumos em bares, padarias e lanchonetes e quaisquer atividades que facilitem
a aglomeração. 8O município também aderiu ao Plano Minas Consciente no
intuito de participar no enfrentamento da pandemia foi definida como micror-
região sendo atendida e auxiliada pela macrorregião da região central, Itabirito.
Diante deste fragilizado cenário da democracia e das possibilidades de
6 O Plano Minas Consciente definiu as Ondas como: Verde, Amarela, Vermelha e Roxa,
elas possuíam uma lógica gradual e sequencial de abertura, para que a retomada acon-
tecesse de forma progressiva na sociedade, observando os impactos na rede assistencial.
Esta analise era feita pela Secretaria de Estado de Saúde, os dados por macrorregião e
microrregião de saúde. Os indicadores utilizados eram: Taxa de Incidência Covid-19; taxa
de Ocupação de leitos UTI Adulto; taxa de Ocupação por Covid-19; leitos por 100 mil
habitantes; positividade atual RT-PCR; % de aumento da incidência; % de aumento da
positividade dos exames PCR. Várias ações foram utilizadas para conter a doença, como:
aquisição de respiradores, verba para manutenção e melhoramento dos hospitais e casas
de saúde da cidade, fechamento do comércio, restaurantes e bares.
7 O primeiro caso registrado na cidade de São João del Rei foi no dia, 24 de março de 2020;
e até 23 de março de 2022 a cidade notificou 17083 (7741 do sexo masculino, 9342 femini-
no) positivos dentre estes 265 óbitos confirmados pelo Covid-19. Até a data 12 de abril de
2022 4ª dose da vacina, chamada segundo reforço já estava chegando a população maior
de 70 anos – Fonte: https://covid.saojoaodelrei.mg.gov.br.
8 Em Ouro Preto o primeiro caso registrado pelo corona vírus foi no dia 16 de maio de 2022
e até a data, 08 de abril de 2022 a cidade registrou 13042 casos positivos, destes 141 óbitos
confirmados pela doença.– Fonte: https://ouropreto.mg.gov.br/coronavirus e https://de-
fatoonline.com.br/ouro-preto-confirma-primeira-morte-por-coronavirus/
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conter o vírus, da crise sanitária mundial, as aulas presenciais da Educação
Básica e Superior presenciais foram interrompidas. Os Institutos Federais do
Sudeste de Minas e os Institutos Federais de Minas suspenderam suas aulas e
as atividades presenciais, em 17 de março de 2020 de acordo com as exigências
e orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) no intuito de conter a
transmissão da doença, considerando a Portaria MEC nº329, de 11 de março de
2021. As atividades administrativas continuaram de forma remota.
O indivíduo analisado nesta pesquisa, trabalhador-estudante pertencente
a um segmento social limitado que se insere no mundo do trabalho cada vez
mais precocemente, tanto para ajudar a família, garantir sobrevivência, como
para afirmação de sua identidade, autonomia material, capacidade de consumo.
Tem obstáculos como o cansaço do dia-a-dia para dificultar o seu desempenho
no aprendizado. As políticas públicas são meios que este indivíduo utiliza para
a busca da equidade socioeconômica e educacional.
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investimento em educação e outras políticas sociais, além de condições de oferta
de ensino diferenciadas (SILVA, 2017, 2019).
Uma outra variável importante analisada relacionada à estratégia utili-
zada pelo trabalhador-estudante nas pesquisas de 2017 e 2019 é a participação
em atividades extracurriculares. Dos entrevistados (40%) responderam nunca ter
participado de atividades extracurriculares, 55,3% (83) raramente, ou, ocasional-
mente participavam, 12% (18) participavam frequentemente, ou, sempre das ati-
vidades. As pesquisas de Carvalho; Dias; Silva (2018) demonstram que 40% dos
investigados nunca participaram desse tipo de atividade. Já em 2019 a taxa de
não participação foi de 40% (98), justificando a dificuldade de conciliar estudo
e trabalho, enquanto 60% (146) não há relatos. Partindo do princípio de igual-
dade e dos direitos de igualdade específicos consagrados numa Constituição, se
assegura que o Estado trate os seus cidadãos como fundamentalmente iguais, e,
por consequência, aplica-se a função de não discriminação a todos os tipos de
direitos: aos direitos, liberdades e garantias pessoais; de participação política;
direitos sociais e aos direitos à prestação.
Dando continuidade à pesquisa foi observado a variável local para estu-
dar, Carvalho; Dias; Silva (2018, p. 142) apontam que “no geral, entre os discen-
tes investigados, em 69% dos casos, os espaços para estudar são a casa, seguido
do local de trabalho (36,3%). O espaço da biblioteca aparece em apenas 2% das
respostas”.
Assim, ao serem perguntados sobre a possibilidade de se dedicarem so-
mente aos estudos, somente 7% disseram que sim (CARVALHO, DIAS; SILVA,
2018), enquanto na pesquisa realizada por Matos et al. (2020) esse número foi
de 18%.
A estes dados pode-se analisar que mesmo antes do período pandêmico,
da crise que paralisou o mundo e a economia o trabalhador-estudante utilizava
como local de estudo, quase de forma exclusiva o lar e a maior parte dos entre-
vistados já encontrava dificuldade para se dedicar exclusivamente aos estudos
sendo a necessidade de trabalhar, sobreviver e sustentar a família se tornando
um ponto norteador para a evasão escolar nos cursos superiores.
As estratégias didático-pedagógicas para conciliação entre trabalho e estu-
do foram identificadas por Carvalho; Dias; Silva (2018), conforme tabela seguinte:
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Tabela 1 – Identificação e frequência de estratégias didático-pedagógicas dos estudantes
para conciliar trabalho e estudo.
Cursos Técnicos Cursos Superiores
% %
Máxima atenção às aulas 31,9 17,2
Fins de semana (folga) 17,7 35,5
Estudar logo após as aulas 14,9 20,4
Internet (videoaulas) 13,5 14
Anotações no caderno/notebook 5,6 8,6
Pesquisas extras 4,2 1,2
Estudar somente para provas 1,4 -
Outros 6,4 3
Nesta variável observa-se que apenas 31,9% dos discentes dos cursos técni-
cos e 17,2% dos cursos superiores tem máxima atenção às aulas, enquanto 4,2% dos
estudantes dos cursos técnicos e 1,2% dos cursos superiores fazem pesquisas extras.
Logo nota-se que no curso superior a demanda maior e há maior dificuldade de se
dedicar. Os dados corroboram com os resultados obtidos no estudo de Moreira, Lima
e Silva (2011) onde existe clara dificuldade dos alunos da amostra de pesquisa, em
conciliar trabalho e estudo, lesando seu rendimento acadêmico.
Em relação as estratégias dos docentes, em 2019, os estudantes identifica-
ram que os docentes utilizaram como estratégias as seguintes ferramentas:
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saberes escolares. Os elementos das estratégias didáticas, a relação entre docente,
discente, conteúdos, objetivos, planejamento, avaliação e metodologias requerem
um fio condutor possibilitando um sentido à prática de ensino e à aprendizagem
do aluno. É a didática que conduz o professor apontando caminhos para que o
aluno alcance o objetivo proposto (LIBÂNEO, 1990). Cada vez mais os estudos
demonstram que seja necessário considerar o aluno enquanto ser social, conside-
rar seu conhecimento de mundo e garantir que as estratégias didático-pedagógicas
possibilitem que os discentes cheguem juntos ao objetivo final.
A materialidade viva do trabalho didático envolve aspectos como: relação
educativa em sua concretude, formas históricas do docente e discente, recursos
que mediam essa relação. O momento histórico torna a prática docente um mo-
mento singular.
Assim as relações didáticas passam por desafios (conhecer quem é o alu-
no, atrair o aluno, postura de ambos que devem ser considerados quanto à es-
colha das estratégias metodológicas, da definição dos objetivos, da avaliação e
de outros elementos didáticos, colocando ao professor premissas básicas para
efetivação do processo de ensino e aprendizagem (ALMEIDA, 2015).
9 Aulas remotas são entendidas como as que docente e discente estão em diálogo sincrôni-
co, mas distantes espacialmente. E é por isso que a preferência para descrever o que tem
sido encaminhado para o processo educacional durante o afastamento social é empregar
a expressão: atividades de promoção do processo de ensino-aprendizagem mediadas pelas
TDIC - Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação. (cf. CAMPANHA NACIO-
NAL PELO DIREITO À EDUCAÇÃO, 2020, p. 5)
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estava preparado para enfrentar transformou-se na única possibilidade de fazer
a educação chegar ao aluno, escancarando o despreparo e a falta de políticas
voltadas para unir os atores sociais do âmbito educacional, professor, aluno e
a tecnologia. Mais uma vez a estratégia é a base para o fazer se tornar possível.
É importante tratar do despreparo dos docentes e da impossibilidade dos
alunos na adequação deste ambiente virtual, visto que a educação deveria ser
voltada para todos e conforme dados 33,6% responderam não ter condições de
acompanhar as aulas. A disponibilização das aulas em modo ERE (Ensino
Remoto), mediados pelas TIC’s (Tecnologias de Informação e Comunicação)
reverberaram problemas educacionais e de ordem socioeconômicas a que o tra-
balhador-estudante enfrenta para traçar estratégias que o conduzam de forma
equitativa e proveitosa o ensino-aprendizagem.
Desta forma, se faz necessário o diálogo com gestores, profissionais da
educação, comunidade escolar e todos os atores sociais envolvidos no pro-
cesso educacional, de maneira que as decisões a serem tomadas em cada
sistema de ensino, contribuam decisivamente para minimizar os prejuízos
decorrentes desta situação de pandemia, com impactos não apenas no ca-
lendário escolar, mas na vida de cada cidadão(a) brasileiro(a), e mais que
isso, que possam contribuir para que as atividades curriculares assegurem
as aprendizagens previstas no Projeto Pedagógico das Escolas, que devem
ser ressignificados (UNCME, 2020, p. 3).
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necessário buscar o conceito de identidade trazido por Bauman (2003, p. 22-
23), antes do século XX, o debate sobre identidade estava relacionado única e
exclusivamente a “um objeto de meditação filosófica”. Falar sobre identidade,
no momento em que uma pandemia escancara ainda mais os obstáculos de desi-
gualdades torna-se relevante trazê-la para o âmbito sociopolítico. Há uma dúbia
de definições com perspectivas que direcionam tanto para identidade social e
pessoal, a qual se define por conceitos e representações de si; quanto para iden-
tidade cultural, conjunto de significados compartilhados e características que
assinalam pertencimento de realidades, grupos ou categorias.
É importante também destacar o conceito de identidade enquanto narrati-
va. Gerada e constituída no processo prático de ser contada para os outros, chama-
do de interculturalidade, a sociedade embebida no sujeito. Se o discurso não cria
a diferença, ao menos a organiza, produzindo identidades que se consolidam em
processos sociais que se expressam em ações simbólicas, textuais ou contextuais.
Do mesmo modo é válido ressaltar o conceito de identidade profissional.
Pela perspectiva da psicologia social este conceito passa pelo reconhecimento
do sujeito nas relações sociais, pelo aspecto consciente (unicidade e coerência
no discurso para outros sujeitos no meio social), a constância, a continuidade
(a construção que envolve aspectos do passado, presente e futuro na constru-
ção do profissional inserido em um projeto de vida), semelhanças e diferenças.
Caracterização por semelhança e não por igualdade, sujeitos diferentes compar-
tilhando a mesma identidade social.
Cabe aqui conceito de habitus do sociólogo Pierre Bourdieu (1972) que
define como “sistemas de disposições duráveis, estruturas estruturadas predis-
postas a funcionarem como estruturas estruturantes”, um conjunto de modo de
pensar, comportamentos, estilo de vida herdado do meio familiar e reforçado no
meio escolar. Processo simultaneamente individual e coletivo, práticas sociais e
um processo de incorporação de valores morais, articulação de uma construção
sócio-histórica de valores morais, tornando-se hegemônica para conjuntos de
classes. (BOURDIEU, Pierre, 1972. p. 89-94).
Na oportunidade de identificar o indivíduo analisado no estatuto do tra-
balhador-estudante direcionado especificamente aos cidadãos que conciliam
trabalho com os estudos, encontra-se amparado no Código do Trabalho nos
artigos 89° e em legislações complementares. A Lei n.º 5.452, de 1° de Maio de
1943 e acrescido pelo Projeto de Lei (PL) n° 5524/2019, denomina “trabalha-
dor-estudante, o trabalhador que frequenta qualquer nível de educação escolar,
bem como curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento, com duração
igual ou superior a seis meses10
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O discurso obscurantista da dinâmica neoliberal pregou durante o pro-
cesso pandêmico a negação em relação a vacina e ao isolamento social, preo-
cupando-se apenas com o atraso econômico. A lógica desta fala neoliberal e
com formatos Toyotistas propagou-se fakenews e salientou-se a possibilidade de
maior flexibilidade trabalhista à classe que SOUZA (2009, p.25) ironicamente
denomina como, “ralé estrutural”, destituída tanto do capital cultural quanto do
econômico e desprivilegiada de meios para obtê-los; classe herdeira da tradição
escravocrata. O senso comum tem a função de justificar a estruturação de classes
a partir da ideia de meritocracia “ganha mais quem se esforça mais” e Souza de-
nomina “mito de brasilidade”. Para este autor a naturalização da desigualdade
social brasileira ocorre a partir da desvalorização simbólica em atividades como:
trabalho desqualificados e informais levando o indivíduo a exaustão.
A variável apoio familiar representa uma estratégia na dúbia jornada entre
trabalhar e estudar, tendo o trabalho como prioridade de sobrevivência e o estudo
como forma de ascensão socioeconômica, considerando o nível socioeconômico e
cultural que esses indivíduos participam. Numa escala de 1 a 5, onde 1 representa
nenhum apoio e 5 apoio total, no Campus de São João Del Rei 7,8% responde-
ram não ter nenhum tipo de apoio, enquanto 36% responderam ter apoio total. No
Campus de Ouro Preto 17,6% afirmaram não ter nenhum apoio e 42% apoio total
para acompanhamento às aulas remotas. Esta variável salienta a necessidade da rede
de apoio que o trabalhador-estudante precisa para continuar no mundo acadêmico,
principalmente frente as novas estruturas de trabalho e estudo que a pandemia do
Covid-19 trouxe preconizando cada vez mais o tempo, o espaço e a disponibilidade.
Como fica a situação do trabalhador-estudante que não detém desta rede
de suporte? Com as várias mudanças que a sociedade, a família e as instituições
de ensino passaram com toda a catástrofe que o Covid-19 trouxe, a reestrutura-
ção do cotidiano fez com que a rede de apoio se tornasse cada vez mais impor-
tante no equilíbrio entre estudar e trabalhar. O trabalhador-estudante enfrentou
experiências devastadoras. O medo, o isolamento, a morte, o desemprego, a fa-
mília toda em casa em muitos casos, a divisão dos equipamentos eletrônicos
para uso dos filhos na continuidade dos estudos, trabalhar em casa e dar atenção
aos filhos, ou trabalhar fora e enfrentar o medo de ser contaminado e transmitir
aos demais familiares. Nesse contexto de dificuldades econômicas, sociais e psi-
cológicas o fracasso escolar e a evasão ficam ainda mais propícias.
Aliado a este dado a pesquisa traz a variável gênero, na qual a predomi-
nância do sexo feminino é identificada. Em São João del Rei dos entrevistados
70%(135) dos respondentes são do sexo feminino e em Ouro Preto esse núme-
ro representa 57,10% (69) são do sexo feminino. Dados que coloca a mulher,
Leis do Trabalho (CLT); CLT - 5452/43 – Projeto Lei n° 5524/2019 - Artigo 441-A
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mesmo sendo muitas vezes a principal representante do seio familiar com obri-
gações que vão além de mãe, mulher estão em busca de sua conquista profissio-
nal. Além disso, as “[...] indústrias diretamente afetadas [...] – como viagens,
turismo e produção de alimentos – têm maior concentração de mulheres. A car-
ga de cuidados para as mulheres, que costuma ser três vezes maior do que a dos
homens, aumentou exponencialmente.” (NAÇÕES UNIDAS – BRASIL, 2020,
s/p.). A mulher, trabalhadora e estudante representa grupo social bastante afe-
tado no período pandêmico.
[...] dominam na prestação de cuidados dentro e fora das famílias.
Dominam em profissões como enfermagem ou assistência social, que es-
tarão na linha da frente da prestação de cuidados a doentes e idosos dentro
e fora das instituições. Não se podem defender com uma quarentena para
poderem garantir a quarentena de outros. São elas também que continuam
a ter a seu cargo, exclusiva ou maioritariamente, o cuidado das famílias.
[...] o machismo que impera e quiçá se reforça em momentos de crise e de
confinamento familiar. Com as crianças e outros familiares em casa du-
rante 24 horas, o stress será maior e certamente recairá mais nas mulheres.
O aumento do número de divórcios em algumas cidades chinesas durante
a quarentena pode ser um indicador do que acabo de dizer. Por outro lado,
é sabido que a violência contra as mulheres tende a aumentar em tempos
de guerra e de crise – e tem vindo a aumentar agora. Uma boa parte dessa
violência ocorre no espaço doméstico (SANTOS, 2020, p. 16).
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
De acordo com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) o trabalha-
dor deve comprovar sua condição de estudante e o empregador deve elaborar
um horário flexível que permita que o trabalhador-estudante frequente às aulas,
não sendo possível ajustar o horário ele poderá se ausentar do trabalho para
frequência de aulas e provas avaliativas sem perda de quaisquer direitos. Além
disso, o artigo 92º do Código do Trabalho estipula que “o trabalhador-estudante
tem direito a marcar o período de férias de acordo com as suas necessidades es-
colares, podendo gozar até 15 dias de férias interpoladas, na medida em que tal
seja compatível com as exigências imperiosas do funcionamento da empresa”12
Trabalhadores com relações cada vez mais fragmentadas, tendo seus di-
reitos, ou, até mesmo seu trabalho extinto devido ao aumento da nova forma de
“uberização” ainda mais robotizada, tão logo esse indivíduo necessita garantir
o seu sustento se anulando e sentindo sua mão de obra explorada ao máximo.
(ANTUNES, 2020).
Por outro lado, um dado é revelador da importância dos estudos na vida dos
investigados: ainda que em condições ainda mais desfavoráveis que antes da pan-
demia, a maioria absoluta dos estudantes que trabalham pretende dar continuidade
aos estudos: 88,2% no Campus Ouro Preto e 83,9 % no Campus São João del Rei.
Bernard Charlot, sociólogo que analisa a relação entre desempenho esco-
lar, a classe social dos pais e sucesso, ou fracasso escolar pontua a partir de suas
análises, que o ser humano vai se apropriando, se constituindo e se construindo
através do tornar-se homem, homonização; do tornar-se único, singularidade
e do pertencimento social, socialização e para que esse movimento contínuo
aconteça o indivíduo está sempre aprendendo e fazendo uma relação cada vez
mais intrínseca, direcionada, mobilizada e motivada. O indivíduo aqui analisa-
do busca na educação uma ascensão social, mas em meio a tantas dificuldades
para conseguir continuar e concluir precisa ser mobilizado e motivado para que
a relação do saber seja significativa. (CHARLOT, 2000)
Nesse sentido, e complementando o estudo aqui proposto, será tratado a
seguir as ações institucionais frente à pandemia. As estratégias institucionais fo-
ram identificadas em ambos os Campus que adotaram medidas sociais de auxílio
financeiro, de equipamentos e de internet para que o trabalhador-estudante tives-
se condições que propiciassem a continuidade dos estudos, aos alunos de baixa
renda, como Processo de Seleção do Benefício Emergencial de Inclusão Digital,
editais de aquisição de equipamentos e contratação de serviços de internet. Além
de questionários de Avaliação do Ensino Remoto Emergencial, norteando a
2020. Seção 1- extra p. 1. Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-
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12 Decreto-Lei n° 5.452, de 1° de Maio de 1943 - Legislação Trabalhista; Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT); CLT - 5452/43 – Projeto Lei n° 5524/2019 – Artigos 441-B, C, E, F,G
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B runa B eatriz da R ocha | R ebeca F reitas I vanicska (O rganizadores )
participação dos alunos ao ERE (Ensino Remoto Emergencial) como forma de
acompanhamento da evolução e do contato com o sistema educacional; acompa-
nhamentos psicológicos e pedagógicos, através de projetos que auxiliam os alunos
no enfrentamento do momento para a continuidade ou trancamento dos cursos.
A princípio e de forma estratégica, o Comitê de Ensino do Instituto Federal
elaborou questionário para verificar a possibilidade de acesso à internet e as ha-
bilidades na utilização de ferramentas de ensino-aprendizagem no ambiente vir-
tual possibilitando intervenção e auxílio aos estudantes que necessitarem. O Edital
“Benefício de inclusão Digital” tanto para aquisição de serviço de internet, no valor
de R$60,00 a R$80,00 pagos em quatro parcelas, quanto para aquisição de equipa-
mentos tecnológicos (para compra de notebook, computador ou tablet), no valor
entre R$800,00 a R$1500,00 para alunos com renda per capita mensal família de até
1,5 salário-mínimo. Este edital teve como objetivo oferecer aos alunos a possibilida-
de de participar das aulas no ensino remoto. Além do auxílio Emergencial no va-
lor de R$200,00. Para auxiliar os alunos no funcionamento do Sistema Acadêmico
(SIGA) os Institutos lançaram Edital para seleção do Mediador digital.13
[...] A conectividade de Internet é um ponto crítico do cenário digital brasi-
leiro. [...] ainda existe uma população grande sem nenhum tipo de acesso,
principalmente entre os mais [...] pobres e os que vivem em áreas rurais.
Dados nacionais têm mostrado que 61% das residências brasileiras estão
conectadas. Nas áreas rurais, apenas 34% das famílias [...]. Enquanto a
Internet está presente em apenas 30% dos domicílios de baixa renda (sta-
tus socioeconômico D e E), nos domicílios de alta renda (A e B) as propor-
ções são de 99% e 93%, respectivamente, revelando grandes desigualdades
em termos de acesso [...] (UNESCO, 2019, p. 188 – tradução livre).
110
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
em situação de extrema vulnerabilidade sentiu sua situação sendo potencializa-
da pela pandemia do Corona vírus, precarizando cada vez mais o trabalho com
a perda dos diretos trabalhistas. 14
Para o sociólogo francês, Bernard Lahire em uma de suas obras Sucesso
Escolar nos Meios Populares – As razões do Improvável “a escola precisa ser uma
estrutura estável para pessoas que fazem parte de um contexto social e familiar
instáveis.” (LAHIRE, 2004) Os abismos já naturalizados e os que evidenciaram
neste momento singular da história educacional deixa questionamentos: Qual o
real papel da escola, enquanto estrutura física, social e de práticas pedagógicas?
Qual aprendizado leva-se para o futuro educacional nas relações de estratégias
entre os atores no processo de ensino aprendizagem? De que forma a perspectiva
metodológica a partir da prática social transforma os saberes escolares?
O trabalhador-estudante colapsando de forma social, econômica, político e
psicológica, ainda sim através de estratégias desenvolvidas por eles mesmos, pelas
instituições e pelos docentes continuam em busca da mobilidade, utilizando os
estudos como um instrumento eficaz de cidadania e pertencimento social. O sis-
tema híbrido através de experiências e saberes partilhados de forma ubíquas pro-
blematizam deslocamentos que o ambiente escolar físico traz através das trocas de
vivências enquanto ambientes de rede coletam e difundem nossas subjetividades
e experiências, o que torna claro neste momento de crise de saúde pública que
educação e tecnologia são indissociáveis no processo de ensino-aprendizagem.
Em suma as análises que esta pesquisa trouxe possibilitará um direcio-
namento para pesquisas futuras, pois a educação é uma ciência em ação, se
o homem evolui, se há transformação social, tão logo a sociedade – políticos,
discente, docentes e a instituição familiar - e a instituição acadêmica precisam
identificar meios, práticas sociais através da leitura da realidade para que o ho-
mem se torne cada vez mais pertencente e crítico.
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desafios. Estação Científica. Juiz de Fora, MG, 2015
14 Como mulher, pesquisadora, trabalhadora e estudante de baixa renda recebi apoio familiar
e institucional financeiro e pude imprimir na minha busca durante a pesquisa um senti-
do, uma direção e entender o porquê das limitadas situações que eu mesma vivenciei e
senti. O qual difícil se tornou a dúbia jornada de trabalhar e continuar os estudos com o
aparecimento do Covid-19, avanço do vírus, o contagio, o isolamento, o medo da morte,
o medo de perder o emprego e a nova configuração de aproximação com a instituição e
os docentes de forma remota, em ambiente virtual, em “escola sem tijolo”. A minha não
desistência estava ligada ao sentido e ao prazer pelos estudos, às motivações extrínsecas
e intrínsecas trazidas pelo aporte familiar e pela experiência do momento em que tudo
acontecia de forma rápida e devastadora.
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114
DESENVOLVIMENTO DA COMPREENSÃO
LEITORA NA PERSPECTIVA DA
APRENDIZAGEM AUTORREGULATÓRIA:
UM ESTUDO DAS INTERVENÇÕES
Bruna Aser Vidigal Pereira1
Elaine Leporate Barroso Faria2
INTRODUÇÃO
116
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Saberes e Partilhas
e linguístico. (Silva e Barreto, 2021)
Como afirma Daniel Pennac (1993), a leitura não envolve obrigação e,
sim, sedução. Portanto, é imperioso considerar nas práticas de ensino os inte-
resses do leitor, suas motivações frente ao material, bem como, seus objetivos
(Viana et al., 2017). Uma vez que “é importante que os alunos entendam o por-
quê do seu esforço na aprendizagem, apoiado em razões que eles compreendam
e que, desejavelmente, tenham conseguido construir com argumentos próprios”
(Rosário et al., 2006, p. 84).
Neste trabalho adota-se a vertente interacionista na concepção do proces-
so de leitura por pactuar que existe uma constante interação entre texto e leitor
(Solé, 1998). Segundo a autora que se baseia em outros renomados estudiosos,
a leitura configura-se como:
(...) o processo mediante o qual se compreende a linguagem escrita. Nesta
compreensão intervêm tanto o texto, sua forma e conteúdo, como o leitor,
suas expectativas e conhecimentos prévios. Para ler necessitamos, simulta-
neamente, manejar com destreza as habilidades de decodificação e aportar
ao texto nossos objetivos, ideias e experiências prévias; precisamos nos
envolver em um processo de previsão e inferência contínua, que se apoia
na informação proporcionada pelo texto e na nossa própria bagagem, e
em um processo que permita encontrar evidência ou rejeitar as previsões e
inferências antes mencionadas. (Solé, 1998, p. 23).
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comprovam sua complexidade: a identificação de letras, reconhecimento de pa-
lavras, acesso aos significados, integração sintática e semântica (Salles e Paula,
2016), isto é, diferentes áreas cerebrais são ativadas.
É relevante apontar o papel fundamental das funções executivas e a im-
portância de serem promovidas dentro deste cenário. De modo bem genérico,
pode-se defini-las como um agrupamento de processos que exigem diferentes
níveis de consciência e regulação; permitindo que o indivíduo se oriente e geren-
cie suas tarefas cognitivas, emocionais e comportamentais diante de exigências
externas e internas (Faria e Mourão, 2013; Salles e Paula, 2016).
As funções executivas seriam necessárias a uma série de tarefas cotidianas
que exigem desenvolvimento da autonomia, intencionalidade, persistên-
cia e autorregulação, tais como requeridas na leitura proficiente, realizada
com fluência e compreensão. Seriam também influenciadas pelas deman-
das criadas por estas mesmas tarefas. Estas funções podem ser promovidas
em um contexto de instrução. (DIAS; SEABRA, 2013 citado por Salles e
Paula, 2016, p. 59).
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Saberes e Partilhas
cognitiva, motivacional, comportamental e contextual, e, segundo Pintrich, não
são organizadas de modo hierárquico, apenas são ordenadas para fins didáticos,
consequentemente, podem ocorrer de forma simultânea, ou mesmo, integrada.
Genericamente a primeira fase está relacionada ao momento anterior da
tarefa, para exemplificar, de leitura. Como o próprio nome evidencia, está re-
lacionada ao planejamento por meio da ativação de conhecimentos prévios e
das crenças motivacionais; do estabelecimento de objetivos e de um tempo para
cumprir com a tarefa; da seleção de estratégias; entre outros. A segunda fase re-
fere-se à auto-observação e análise do processo como um todo, de modo a emba-
sar a terceira, em que, de acordo com os resultados da análise, o indivíduo age/
se adapta às condições verificadas para se alcançar seus objetivos. Por último,
a quarta fase refere-se à avaliação do processo como um todo e dos resultados
obtidos, promovendo reflexões que retroalimentam o ciclo.
É fato que os educadores têm se conscientizado mais a respeito da impor-
tância do desenvolvimento de estratégias e competências autorregulatórias para
a potencialização da aprendizagem dos discentes (Frison, 2016). Sendo assim,
se o trabalho destes agentes se volta para o restabelecimento da esperança, ao
apresentarem alternativas e novos caminhos com a finalidade de promover o
desenvolvimento da compreensão leitora, essas ações constituem um suporte
fundamental para que os alunos, atolados em suas incapacidades, possam se
motivar e se envolver nas suas atividades de aprendizagem, monitorando suas
reflexões (Rosário et al., 2006).
Assim, na perspectiva da aprendizagem autorregulada, embora o docente
tenha um papel muito relevante ao oportunizar experiências e se apresentar como
um modelo, o aluno é o principal responsável pelo seu desenvolvimento. Aqui, a
palavra-chave é “adaptação”, por isso, “a autorregulação não pode reduzir-se a
uma lista de passos pré-formatados ou a um menu de estratégias de aprendizagem
pronto a usar” (Rosário et al., 2006, p. 81). Deve haver decisão e flexibilidade pe-
los estudantes frente aos diversos contextos aos quais se deparam.
A promoção de competências auto-regulatórias a desenvolver na sala de
aula não deve confinar-se, miopemente, à manipulação de um conjunto
de estratégias de aprendizagem avulsas e descontextualizadas, mas sim à
discussão de uma lógica auto-regulatória que perpasse, orientando, todo
o trabalho dos educandos no sentido de o robustecer qualitativamente.
(Rosário, Trigo e Guimarães, 2003, p.118).
INTERVENÇÕES
120
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Saberes e Partilhas
autorregulatórias, bem como, do ensino explícito de estratégias.
Existe uma escassez de relatos interventivos realizados em âmbito nacio-
nal, por essa razão, buscando abrir horizontes e possibilidades de atuação, fo-
ram realizadas algumas pesquisas no cenário exterior. Retomando o objetivo em
investigar até que ponto o ensino de estratégias, principalmente, metacognitivas
antes, durante e após a leitura podem promover a aprendizagem autorregula-
da dos estudantes, a análise e descrição de instrumentos e técnicas empregadas
durante as intervenções inspiram futuras práticas.
Entende-se, aqui, por intervenções pedagógicas:
(...) investigações que envolvem o planejamento e a implementação de inter-
ferências (mudanças, inovações) - destinadas a produzir avanços, melhorias,
nos processos de aprendizagem dos sujeitos que delas participam - e a poste-
rior avaliação dos efeitos dessas interferências. (Damiani et al., 2013, p. 58)
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pensamentos; promover situações visando ampliar a motivação dos estudantes
e o processamento profundo das informações. Segundo Boruchovitch (2007), o
tipo de intervenção mais comum é a “mista”, que engloba, de forma combinada,
o desenvolvimento das dimensões cognitiva, metacognitiva e afetiva.
Com objetivo de analisar propostas interventivas pautamos na proposta
de Vieira (2014), que, baseada no desenvolvimento das estratégias de compreen-
são leitora dentro do contexto da aprendizagem autorregulada, realizou sua in-
tervenção em uma escola pública do Brasil com alunos do 8º ano do Ensino
Fundamental. A metodologia adotada é marcada por instrumentos relevantes
propostos por Veiga Simão (2004 apud Vieira, 2014) como a modelagem meta-
cognitiva, os guias de interrogação metacognitivas e os cartões-registro.
Em conformidade com os objetivos deste estudo, é válido aprofundar e
planificar as técnicas utilizadas, a fim de ilustrar futuros projetos. A “mode-
lagem metacognitiva” é uma técnica importante, em que o professor se torna
modelo para seus alunos (Vieira, 2014), neste caso, o docente explica as justifi-
cativas por trás de sua própria seleção das estratégias, e, os discentes observam o
uso adequado de acordo com a tarefa cognitiva. Essa técnica proporciona uma
abertura na relação ensino-aprendizado, pois, o docente ao utilizar esta técnica,
prova sua adesão ao desenvolvimento da aprendizagem autorregulada, que só
é efetiva se são ofertados estímulos e espaço para seu uso em sala de aula e em
contextos educativos reais.
Desta maneira, corroborando com as ideias de Polydoro e Azzi (2009,
p. 84), “para que o estudante perceba a instrumentalidade da autorregulação e
envolva-se neste processo, é preciso que o sistema de ensino esteja organizado
em direção à aprendizagem autônoma do estudante, que valorize sua posição de
agente,” até porque, é válido destacar que, sozinhos, os professores não seriam
capazes de curar todas as incompetências e dificuldades dos alunos (Rosário et
al., 2006). Então, trata-se de uma rede colaborativa em que há a necessidade
de que todos os envolvidos no processo educativo atuem, dentre eles, o próprio
indivíduo, a família, a comunidade e o sistema em geral.
Outra técnica interventiva, é o uso de “guias de interrogação metacog-
nitivas”, como o próprio nome evidencia, que objetivam guiar as perguntas au-
torreflexivas que os alunos devem fazer em cada momento frente à atividade
cognitiva. A título de exemplo: “Consigo explicar com as minhas palavras o
que leio?” (Vieira, 2014, p. 67). Interessante salientar que a pergunta vem na
primeira pessoa do singular, reforçando a orientação na direção do pensar so-
bre o próprio pensar. Seu emprego em intervenções pedagógicas é importante
para auxiliar na tomada de consciência sobre a dificuldade da tarefa, bem como,
ao uso de determinadas estratégias e adaptações de acordo com as exigências.
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Saberes e Partilhas
Assim, conforme os estudantes vão aprimorando suas habilidades autorregula-
tórias, menos perguntas prontas são encontradas nos guias, possibilitando que
eles mesmos sejam autores de seus roteiros.
Por fim, outra técnica é a do “cartão registro” para o momento de autoa-
valiação, em que, através de anotações é possível avaliar o processo, a aprendiza-
gem, as atitudes, e os resultados obtidos. Também são estruturados em formato
de roteiro com algumas frases guias, como: “Durante esta aula aprendi que...”,
“Percebi que...”, “Gostaria de saber mais sobre...” (Vieira, 2014, p. 68). Então,
em linhas gerais, o cartão registro atua como um feedback interno que retroa-
limenta o ciclo da autorregulação, o que significa que interfere diretamente no
planejamento das próximas ações.
Os resultados da intervenção realizada por Vieira (2014) se mostram ani-
madores e apontam uma melhoria considerável no que diz respeito à consciência
e utilização de estratégias no processo de leitura, assim como, na compreensão
leitora. Assim, através da modelagem, guias, cartão-registro e do comportamen-
to estratégico dos discentes, pode-se afirmar que houve uma sistematização e
reflexão dos processos de aprendizagem, e um aprimoramento das habilidades
para uma compreensão leitora eficiente (Frison, 2016).
O segundo estudo que pautamos na pesquisa é o de Cerqueira (2016),
que apresenta um projeto de intervenção com resultados positivos frente à com-
preensão leitora, direcionada aos 2º e 3º anos escolares em Portugal. Foi desen-
volvido mediante a adaptação do programa elaborado por Viana et al. (2010)
intitulado “Aprender a compreender torna mais fácil o saber”. Esse programa
foi pensado para atender às turmas de 3º e 4º anos, com a finalidade de elevar os
níveis de compreensão leitora, por meio da promoção de um conjunto de ativi-
dades a fim de ensinar a compreender de modo planificado.
Segundo Viana et al. (2010, p. 12), “o ensino explícito da compreensão da
leitura requer que o aluno seja capaz de identificar o processo que está subjacen-
te à pergunta ou à tarefa proposta”. Sustentado por este ideal, surgiu a “Família
Compreensão” (Viana et al,, 2010) composta por seis personagens - Vicente
Inteligente, Juvenal Literal, Durval Inferencial, Conceição Reorganização,
Francisca Crítica e Gustavo Significado, em que cada membro corresponde a
um subprocesso envolvido na compreensão. Exemplificando, se há um proble-
ma com relação à compreensão do significado de uma palavra, deve-se recor-
rer ao “Gustavo Significado” que poderá guiar a utilização de um dicionário.
Assim, diante de dificuldades, os alunos podem solicitar ajuda aos personagens
de acordo com os requisitos da tarefa, permitindo a autorregulação.
Essa técnica consagra-se como uma ferramenta lúdico-didático ao per-
mitir a explanação dos processos abstratos e incentivar o uso de estratégias
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metacognitivas (Viana et al., 2017).
A operacionalização das estratégias através dos diferentes membros da
Família Compreensão visa modelar, no leitor, estas mesmas estratégias, mu-
nindo-o de instrumentos para regular a sua compreensão, colmatar lacunas
e dificuldades que surjam para decifrar o código escrito, extrair o significado
de vários tipos de textos e planificar a sua compreensão, tornando-se um
leitor cada vez mais autônomo e crítico (Viana et al., 2010, p. 8).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
124
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Saberes e Partilhas
compreensivamente e a aprender a partir da leitura, estamos fazendo com que
ele aprenda a aprender, isto é, para que ele possa aprender de forma autônoma
em uma multiplicidade de situações”, tornando-se autor de seu processo eman-
cipatório e libertador.
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A DIVERSIDADE SOCIOLINGUÍSTICA
CONTEMPORÂNEA E O ENSINO DE
PORTUGUÊS PARA ESTRANGEIROS:
COMO AS IDEOLOGIAS DA LINGUAGEM
INFLUENCIAM O ENSINO DE PORTUGUÊS
COMO LÍNGUA ADICIONAL
Giovanna Martinez Ursulino1
1. INTRODUÇÃO
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discussões para além do contexto acadêmico, possibilitando uma expansão dos
debates a respeito da diversidade sociolinguística e ideologias da linguagem.
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Saberes e Partilhas
para o que é colocado para dentro certos grupos e/ou excluído desse sistema,
tornando a língua disciplinar e de caráter político (MOITA-LOPES, 2013).
Esse caráter nacionalista de língua liga-se às noções de centro e periferias,
como discutidos nos trabalhos de Pietikäinen e Kelly-Holmes (2013). Segundo
as autoras, centro-periferia é uma metáfora usada para descrever a distribuição
desigual de poder na economia, na sociedade e na política, sendo que o centro
é normalmente definido em termos de avanço, poder econômico, político e co-
mercial e a periferia é tida como marginal, fronteiriça ou alheia ao centro. O
centro é uma metáfora espacial usada para descrever e explicar a distribuição
desigual de poder na economia, na sociedade e na política.
Desse modo, torna-se relevante pensar de que forma essa construção de
centro e periferia molda também as questões de multilinguismo e das línguas
minoritárias. Como as autoras apontam, a própria minoritarização das línguas
é parte do processo de periferização, tornando-se tópicos para a renegociação e
contestação de características envolvendo a relação centro – periferia.
A questão é muitas vezes mais complexa do que se imagina, o multi-
linguismo acaba sendo experienciado sob a ideologia da língua padrão, desse
modo o falante multilíngue se vê dependente da língua padrão e segregado lin-
guisticamente por ela. Na esteira do que afirmam as autoras, ressalta-se a impor-
tância de professores e pesquisadores da linguagem questionarem como esses
processos se estabelecem, buscando compreender como os tipos particulares de
multilinguismo se tornam periféricos ou centrais, quais as consequências, quem
as causa e quem é afetado por elas, para que haja um melhor entendimento des-
sas práticas linguísticas em sala de aula, levando a reflexões da prática docente
quando em contextos de ensino multilíngue.
Retomando Moita-Lopes (2013), mencionado anteriormente, o autor ex-
plica que a noção de língua, como sinônimo de Estado-nação, já não cabe mais
no contexto da nova economia globalizada, porque é desafiada constantemente
pelas práticas locais como sistema de comunicação. Quando se olha a própria
realidade linguística do Brasil, observa-se como, de fato, essa ideologia de lín-
gua não cabe mais em um ambiente linguisticamente heterogêneo, constituído
por cidadãos falantes não apenas do português, mas de línguas de migração
e também das línguas indígenas e da Libras. Além disso, o repertório de um
falante é composto de recursos linguísticos e semióticos, bem como de línguas
que, algumas vezes, não são nem mesmo nomeadas. Essas línguas faladas por
esses migrantes, nas últimas décadas, são muitas vezes periféricas no cenário
econômico mundial, uma vez que a maioria desses imigrantes migra de países
marcados por algum tipo de conflito de ordem social, político ou geográfico e,
marcadamente, não-europeus, evidenciando seu caráter periférico.
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Na próxima seção, será apresentado a relação entre linguagem e econo-
mia, uma vez que pela linguagem desencadeia-se a desigualdade entre os falan-
tes, motivados em maior ou menos medida pelas ideologias da linguagem e pelo
lugar que a língua ocupa como mercadoria de troca nas diversas práticas sociais,
atrelando-se as noções de orgulho e lucro e tendo seu valor atribuído de acordo
com a economia globalizada.
132
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Esse valor que a linguagem possui na nova economia globalizada fica evi-
dente nos trabalhos dos pesquisadores da sociolinguística reunidas em um dossiê
especial publicado em 2021 que mostram a presença desse novo papel da lingua-
gem em práticas do cotidiano, seja em propagandas de produtos de higiene pessoal
(FONSECA, 2021) ou propagandas de cursos de idiomas e turismo (GARCEZ;
JUNG, 2021; CARVALHO, 2021). De modo geral, todos esses fatores estão liga-
dos a uma nova fase do capitalismo vivenciada na economia global atual.
Carvalho (2021) explica que, após os anos 1980, a expansão do capita-
lismo atingiu novos níveis, pautado na busca por novos mercados, mercadorias
e consumidores, devido à saturação dos mercados (HELLER; MCELHINNY,
2017) e, consequentemente, houve transformações no âmbito da sociolinguísti-
ca, uma vez que as questões de linguagem e identidade passam a ser empregadas
na produção e no consumo cultural, por meio do chamado ‘Discurso de Lucro’,
discutido por Heller e Duchêne (2012).
Enquanto na modernidade a noção de língua ajudou a construir a ideia
de Estado-nação, na sociedade contemporânea a linguagem passou, segundo
Garcez e Jung (2021), a ser usada como marca de distinção para o mercado de
trabalho global, por meio de ideologias que a colocam como habilidade técnica
e produto cultural ‘autentico’. Essas transformações envolvendo a linguagem
marcam a mercantilização da linguagem que é fruto da nova economia global e
do capitalismo tardio.
Heller e McElhinny (2016) destacam a importância de se discutir o papel
da linguagem dentro desse novo contexto político-econômico. É importante ter
em vista o papel da linguagem na sociedade contemporânea e as transformações
trazidas pelo capitalismo tardio para se entender as relações que se estabelecem
entre as diferentes práticas de linguagem, especialmente no que diz respeito aos
sentimentos de orgulho, pertencimento e lucro.
É importante ter em vista que existem diferentes pesos e medidas para
cada língua nomeada, o que, consequentemente, atua no posicionamento dos
falantes em relação a essas línguas e seus falantes, como se pode observar nas
relações entre falantes de uma língua materna e o estrangeiro, especialmente
imigrante. Afinal, na esteira de Bourdieu (2017), é possível afirmar que a lin-
guagem, vista como um recurso simbólico e linguístico articulado a essa nova
economia global, é produtora de distinção social.
Nesse sentido, vista como prática,
a linguagem é parte de um conjunto complexo de atividades sociais e eco-
nômicas, nas quais atores sociais utilizam recursos linguísticos para agen-
ciar outros recursos, algumas vezes mínimos, e alcançar propósitos especí-
ficos em condições específicas. Como discutem Heller e McElhinny (2017,
p. 3), as pessoas têm interesse na linguagem porque ela tem valor e “[...]
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tem valor porque está articulada ao modo como todos os tipos de recursos
são produzidos, como circulam e como são consumidos, incluindo tam-
bém como eles são identificados como recursos” (JUNG; MACHADO E
SILVA, 2021, p. 366).
2 The idea of language as commodity helps us understand part of what people are trying to do with
language (whether successfully or not is another matter), not just in how they think of it but in
how they concretely try to turn it into an exchangeable resource with measurable value in economic
term […] The commodification of communicative resources under contemporary conditions raises
a tension between understanding those resources as unified objects, somehow outside human agen-
cy, obedient only to the laws of the market, or as inalienable aspects of social action (HELLER;
MCELHINNY, 2016, p. 144-45).
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a supervalorização das gramáticas e normas de prestígio que pressupõe uma
desvalorização dos modos de falar dos alunos de classes menos prestigiadas ou
periféricas. Por isso, García e Sylvan (2011) defendem novos modelos de ensino,
pautados na individualidade de cada aluno em ambientes nos quais a plurali-
dade se faz presente. Deste modo, as autoras argumentam que o ensino deve-
ria estar focado na comunicação com todos os alunos e na negociação de con-
teúdos desafiadores, ao invés de simplesmente ensinar norma-padrão, uma vez
que aprender não é apenas aceitar formas linguísticas, mas produzir constante e
agentivamente a adaptação aos recursos linguísticos empregados em cada práti-
ca de linguagem, tornando o aluno capaz de gerar sentidos em diferentes situa-
ções comunicativas (GARCÍA; SYLVAN, 2011).
Nas salas de aulas, a questão da superdiversidade trouxe novos olhares
em relação à questão da migração, uma vez que, nos últimos anos, o número de
migrantes trouxe a diversidade da diversidade, não apenas na quantidade de et-
nias, mas em relação às variáveis que afetam o modo como as pessoas vivem e se
relacionam com os outros e com o espaço (VERTOVEC, 2007). Algumas variá-
veis que devem ser levadas em conta para se entender quem são esses migrantes
são o país de origem, canal de imigração, status de migração, capital humano
desses imigrantes, acesso a emprego, moradia e segurança, entre outros fatores.
Vertovec (2007) ressalta que, muitas vezes, apesar de saber a nacionalidade de
origem desses imigrantes, não é possível de fato saber qual sua etnia, suas afilia-
ções políticas e religiosas e outros critérios de pertencimento, e esse pode ser o
caso de muitos dos alunos em ambientes multilíngues de aprendizagem.
García e Sylvan (2011) chamam atenção justamente para essa varieda-
de de realidades quando ilustram o caso da professora que foi contratada para
lecionar a alunos bilíngues e pensava tratar-se apenas de duas línguas, inglês e
espanhol, o que a fez desconsiderar a presença de outras realidades étnicas em
sala de aula. Esse dado mostra que conceber o ensino meramente em termos bi
e ou multilíngues pode não dar conta da diversidade de variáveis que o estudante
estrangeiro traz para as práticas pedagógicas. Saber de antemão tais conceitos
e, sobretudo, tê-los claramente explicitados nos cursos de graduação e formação
continuada, pode evitar generalizações excludentes e garantir um melhor pro-
cesso de ensino e aprendizagem para ambos, professores e alunos, além de criar
um ambiente mais dinâmico, vivo e humanitário.
Considerar as diferentes práticas de linguagem e a noção de pertenci-
mento do sujeito torna-se, desse modo, essencial ao olhar para a realidade do
sujeito migrante, em especial, os estudantes imigrantes em contexto escolar
(LEHMANN, 2016), visto que a relação com a língua e as práticas sociais em
que se inscrevem são fatores decisivos para a construção de sua identidade e das
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imagens que tem de si mesmo e dos usos que fazem da língua e que acompanha-
rão toda sua vida. Ressaltamos a importância de lançar luz a essa nova realidade
linguística vivenciada pelas escolas que recebem alunos migrantes e refugiados,
pois muitas vezes eles representam grupos linguísticos que ainda não foram con-
templados pelas políticas públicas nem amplamente estudados nos cursos de
formação de professores (DINIZ; NEVES, 2018).
Por isso, ao discutirmos os modelos de ensino e de sala de aulas mul-
tilíngues, é preciso pensar novas formas de ensino em contextos multilíngues,
sempre considerando uma forma de ensino que dê conta das diversidades socio-
linguística e que tensione as ideologias e as práticas que atuam na regulação do
poder pela linguagem. Heller, em entrevista, chama a atenção para a desigual-
dade existente na comunicação, uma desigualdade na linguagem que reflete na
diferença e na desigualdade social, percebidas nas práticas situadas (OLIVEN,
GARCEZ, 2020). Essa situação surge a partir de ideologias da linguagem, uma
vez que geram tensionamentos no terreno da linguagem, de forma a serem ex-
plicitados, contornados e superados pelos falantes.
García e Sylvan (2011) refletem sobre o papel do multilinguismo em sala
de aula, ao descreverem que modelos de ensino bilíngue, baseados no bilinguis-
mo subtrativo, não dão conta dessa nova realidade, uma vez que o modelo de
bilinguismo subtrativo representa a perda gradativa da língua materna do falante
em razão da segunda língua aprendida. Muitas salas de aulas pautadas ainda
em um conceito de língua de base nacionalista fazem uso de um ensino bilíngue
subtrativo, não sendo incomum que o aluno vivencie a experiência de perder sua
língua ou vê-la anulada nas práticas escolares.
Existe, atualmente, um interesse pela pedagogia da translinguagem, que, se-
gundo García e Sylvan (2011), assumiria um papel relevante nas discussões sobre
multilínguismo em sala de aula. As autoras defendem que a translinguagem tem
o potencial de dar voz aos alunos falantes de línguas minoritárias. Esse modelo
pedagógico propõe que alunos e professores se engajem em práticas discursivas
complexas para fazer sentido e se comunicarem, reforçando que esse processo
dever ser visto como uma prática discursiva e representa a norma comunicativa
das comunidades multilíngues (GARCÍA; SYLVAN, 2011).
É preciso cautela, no entanto, com a ideia de translinguagem vista de forma
celebratória, em um caráter de vale-tudo, pois acaba-se negando o direito desses
alunos de ter acesso ao ensino bilíngue em contextos voltados a isso, por exemplo.
Há que se trabalhar no sentindo de tensionar as estruturas de poder para que haja
uma verdadeira mudança das realidades escolares desses alunos e da forma como
seus repertórios linguísticos3 são vistos pelos seus pares e professores. Afinal, o
3 “‘Repertoire’ so became the word we use to describe all the ‘means of speaking’, i.e. all those means
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Saberes e Partilhas
uso da translinguagem como celebração da diversidade, per se, não garante uma
mudança nos olhares e preconceitos existentes na sociedade.
Em concomitância a isso, torna-se cada vez mais urgente as discussões
das questões multilíngues e de superdiversidade, de modo que sejam minimiza-
das as situações de exclusão e mal-estar causadas pelo desconhecimento, des-
preparo ou visão de língua como símbolo de nacionalismo e pertencimento, que
invisibilizam as identidades desses migrantes que se deparam com a exclusão
ou o julgamento por conta de suas práticas linguísticas. É preciso adotarmos
modelos em sala de aula que permitam aos alunos se engajarem e deem sentido
a sua trajetória, sem perdas nem abusos, validar seus conhecimentos ao invés de
excluí-los, mas principalmente, que sejam feitos os tensionamentos necessários
no sentido de buscar mudanças nas relações de poder.
Além disso, ressalta-se a necessidade de se discutir noções de pertenci-
mento e identidades fluidas (VERTOVEC, 2007), não apenas pela demanda de
migrantes e estrangeiros nas salas de aulas no ensino básico atualmente, mas
também considerando as diferentes variedades linguísticas que se inserem no
uso da própria língua portuguesa, seja em termos de língua padrão e não-pa-
drão, seja em termos de línguas de contato em regiões de fronteiras e em colô-
nias de imigração alemãs e italianas em que o português não é tido como língua
materna e muitas vezes ocupa um lugar de negociação com as línguas faladas
pelos moradores locais. Outro fator que deve ser levado em conta é a questão do
bilinguismo subtrativo, que leva a gradual substituição pela língua portuguesa,
ainda que de forma velada e, claramente sob o peso de uma violência simbólica,
nos termos de Bourdieu (1996), uma vez que para esses falantes a lenta e gra-
dual substituição de sua língua materna pela língua oficial do Estado gera, no
mínimo, desconforto.
Segundo Bourdieu (1996, p. 16), “a violência simbólica é uma violência que
se exerce com a cumplicidade tácita daqueles que a sofrem e também, frequente-
mente, daqueles que a exercem na medida em que uns e outros são inconscien-
tes de a exercer ou a sofrer”. Isso significa que professores e estudantes podem
exercer violência simbólica, co-construindo ideologias da língua, por exemplo,
agindo de forma inconsciente em relação a isso, reforçando nosso pressuposto
inicial neste capítulo de que tais conceitos devem ser levados ao contexto de
ensino para que todos os profissionais da educação, inclusive professores de lín-
guas, estejam a par das discussões na área da linguagem e possam reconhecer
como, por quem e para que tal ideologia foi construída.
that people know how to use and why while they communicate, and such means, as we have seen,
range from linguistic ones (language varieties) over cultural ones (genres, styles) and social ones (norms
for the production and understanding of language).” (BLOMMAERT; BACKUS, 2013, p. 11)
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5. CONCLUSÕES PRÉVIAS
Este capítulo teve como objetivo discutir o papel das ideologias de lingua-
gem na construção do conceito língua, associado a Estado-nação, assim como
outras ideologias da linguagem, como da mercantilização, e sua relação com o
ensino de português para migrantes que se viram forçados a migrar. A relevância
dessa discussão se dá pela grande demanda de falantes de outras línguas, que
não o português, e a necessidade de compreender os discursos sobre diversidade
sociolinguística e como esses discursos têm no centro certos grupos sociais en-
quanto outros estão excluídos desses discursos. Importa olhar não somente para
quem está falando, mas quem está escutando e a partir de quais ideologias. Olhar
para a superdiversidade é importante, mas é central reconhecer quais construtos
de linguagem orientam professores, pesquisadores e também estudantes em suas
práticas de linguagem.
Discussões nessa área ganham novas dimensões ao passo que propiciam
um ensino para a justiça social, preocupado com a realidade dos indivíduos e
cada uma de suas especificidades, levando à criticidade, ou seja, porque uma
comunicação é desigual.
Tendo em vista a relação entre a linguagem e diferentes fatores socio-po-
lítico-econômicos, resultantes do capitalismo recente e da mercantilização da
linguagem, que cada vez mais transformam a linguagem em capital de troca e
meio pelo qual processos de exclusão e inclusão se instauram, fica evidente a
importância de discussões e de uma formação de professores, voltadas ao reco-
nhecimento do trabalho ideológico da linguagem. Com isso, espera-se fomentar
novas discussões sobre ideologias da linguagem que importam para a questão
dos migrantes e refugiados, além de gerar questionamentos sobre formas de en-
sinar e aprender em contextos de superdiversidade sociolinguística.
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141
PROPOSTA DE ENSINO
DO GÊNERO DISCURSIVO CAUSO
Tainara de Oliveira da Silva1
Kethlyn Karla da Silva2
1. INTRODUÇÃO
2. GÊNERO DISCURSIVO
3 Geraldo Policiano Nogueira conhecido por Geraldinho nasceu na zona rural do muni-
cípio de Bela Vista de Goiás, na fazenda Aborrecido. Casou-se com D. Joana Bonifácio
e teve oito filhos. Faleceu no dia 5 de dezembro de 1993, vítima de insuficiência renal.
O caipira contador de causos ficou conhecido por sua simplicidade e autenticidade, ele
tinha o domínio da narrativa que envolvia os interlocutores. Geraldinho foi apresentado
ao público goiano por Hamilton Carneiro, em 1984, apresentador do programa televisivo
Frutos da Terra, exibido por uma emissora local, a TV Anhanguera, desde então, o prosa-
dor ganhou popularidade nacional com suas divertidas narrativas.
4 Ver: https://www.youtube.com/c/FrutosdaTerraPrograma
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língua, são igualmente determinadas pela comunicação” (BAKHTIN, 2016, p.
117). O enunciado é um “elo na cadeia da comunicação verbal”, ele reflete e
refrata a estrutura de outros enunciados no mundo. Em resumo Bakhtin (2003).
O emprego da língua efetua-se em forma de enunciados, (orais ou escritos),
concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo
da atividade humana. Esses enunciados refletem as condições específicas
e as finalidades de cada referido campo não só por conteúdo (temático) e
pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção de recursos lexicais, fraseo-
lógicas e gramaticais de língua, mas, acima de tudo, por sua construção
composicional. Todos esses três elementos – o conteúdo temático, o estilo,
a construção composicional – estão indissoluvelmente ligados no todo de
enunciado e são igualmente determinados pela especificidade de um de-
terminado campo da comunicação. Evidentemente, cada enunciado par-
ticular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus
tipos relativamente estáveis, de enunciados, os quais denominamos Gêneros do
discurso. (BAKHTIN, 2003, p. 261-262).
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
à entonação. E a construção composicional do causo é a materialidade do texto, a
seleção das narrativas bem-humoradas no tipo de texto que utiliza.
5 Os causos são histórias que têm origem na cultura popular sobretudo utilizam a linguagem
verbal, podem ser histórias engraçadas ou assustadoras, mas que devem ser contadas de
maneira singular. Um causo, para ser bem contado, tem que conferir às palavras entona-
ção, ritmo e até mesmo sotaque e expressões interioranas. Esses elementos são fundamen-
tais para capturar a atenção de quem ouve e provocar as mais diferentes sensações.
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indissociável para obter a atenção do público alvo e gerar o humor.
Para obter efeitos de sentidos positivos numa contação de causo é preciso
que o prosador sinta a história, viva cada acontecimento cada situação, mos-
trando aos interlocutores que de fato ele acredita naquilo que está contando.
Percebemos isso claramente nas histórias de Geraldinho que em muitas vezes
foi o narrador-personagem vivenciando os acontecimentos de cada enredo, ele
não dava título nem tema para seus causos, mas a moral de cada história era
muito bem compreendida em cada desfecho. O prosador teve uma performance
perfeita para alcançar os efeitos de sentidos desejado.
Um bom contador de histórias sobrevive as transformações da historicidade
vivida, sendo envolvido pela arte e nunca perde o prazer em contar quantas vezes
for preciso a mesma história com a mesma riqueza de detalhes. Além disso, é pre-
ciso assumir um papel social de narrador para saber contar uma história de uma
maneira simples para que os interlocutores possam memoriza-la, e o mais impor-
tante é contar a mesma história com a atuação invariável várias vezes.
Assim, entendemos que uma narrativa como o causo traz histórias que con-
tagiam e instigam a imaginação. Carregado por gírias e uma linguagem informal, o
prosador com uma performance natural e espontânea inicia seu enredo com a orga-
nização e elaboração de ideias. Além disso, é importante ensinar sobre as mais diver-
sas culturas brasileiras, uma vez que, o causo também deve ser instrumento de ensi-
no nas salas de aula de educação básica. Como elenca os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNS), um dos objetivos da escola é que os alunos possam “conhecer
características fundamentais do brasil nas dimensões sociais, materiais e culturais
como meio para construir progressivamente a noção de identidade nacional e pes-
soal e o sentimento de pertinência do país [...]”. (BRASIL, 1998, p. 7-8).
Para utilizar esse gênero em sala o professor precisará assumir uma pos-
tura de observação da turma para elaborar as atividades propostas. Adotar um
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Saberes e Partilhas
modelo didático levando em consideração a capacidade de leitura e interpreta-
ção dos alunos, observar a situação do contexto de ensino. Em primeira instan-
cia é preciso levantar um questionamento sobre o que é um causo.
Perguntas que podem ser feitas numa roda de conversa verbalmente:
Objetivo: Explorar verbalmente os conhecimentos prévios sobre os alunos em
relação a leitura e ao conhecimento sobre o gênero causo.
1) Vocês sabem o que é um causo? Já ouviram ou leram alguma história?
2) Qual tipo de história foi essa?
3) Onde você ouviu essa história?
4) Quem pode produzir um causo?
5) O gênero causo pode ser atual?
6) Para qual público o causo é destinado?
7) Quais locais o gênero causo circula?
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( ) Direto ( ) Indireto
A narrativa está em
( ) 1º pessoa ( ) 2º pessoa ( ) 3º pessoa
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Saberes e Partilhas
- Explique por que Geraldinho decidiu primeiramente fazer uma “xaropa
da” para sua esposa para depois leva-la ao médico?
- O que significa a expressão perrenguice?
Proposta de Atividade 04 – Atividade de Análise Linguística
Objetivo: Proporcionar a produção textual do discurso direto e indireto.
Observe o trecho abaixo retirado do causo, ele ocorre na forma do discurso direto
que é a fala do próprio personagem.
“[...] oiá eu trouxe a muié, o senhor espia o que tá fartanu nela e arruma ela pra mim eu
não posso fica aí não, eu tinha serviço e era longe [...]”.
- Sendo assim, lembrando que o discurso indireto os personagens não
exprimem livremente sua fala, pois as falas nesse discurso são apresentadas pelo
narrador, isto é, o narrador fala pelo personagem, transforme o trecho acima em
um discurso indireto.
- Agora faça ao contrário transforme o trecho abaixo que está no discurso
indireto, para o discurso direto.
[...] Aí eu tentei levar ela pra cidade pro doutô dá uma reforma nela pra mim. Aí fui lá
rumei um agasaio, e levei ela [...]
CAUSO DA BICICLETA
Acesso: (https://www.youtube.com/watch?v=y3iYdTAz6IA&t=285s&ab_
channel=FrutosdaTerra)
Proposta de Atividade 05 – Pesquisa sobre causos contados por familiares:
avós, tios, primos etc.
Objetivo: Proporcionar aos alunos conhecimento sobre causos contados por
familiares.
• Fazer com que os alunos busquem conhecer as histórias que seus familiares contavam,
principalmente os mais velhos.
• A atividade é para que os alunos pesquisem com seus familiares histórias de suas famí-
lias e transcreve-los para a escrita para apresentar na sala de aula.
• Nessa aula será desenvolvida uma roda de contação de histórias no pátio da escola, os
alunos deverão se sentar no chão, e todos os causos pesquisados deverão ser contados.
• Depois da leitura dos causos que os alunos buscaram de seus familiares, é necessário
fazer alguns questionamentos para saber sobre a criação do causo contado:
• Quem contou esse causo?
• Qual idade a pessoa tem?
• O causo foi criado pela pessoa ou ela já tinha ouvido de alguém?
• Essa pessoa contou somente este causo ou mais?
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4. CONCLUSÃO
Dessa forma, entendemos que o gênero causo possui elementos que ajudam
no desenvolvimento sociocomunicativo fazendo o aluno obter uma competência
comunicativa interativa e expressiva podendo ser o protagonista de suas narrati-
vas, de modo que, o gênero discursivo causo traz em seus enredos um mundo ima-
ginário com uma linguagem simples e fácil de serem memorizadas, estas histórias
fazem com que se desenvolva a oralidade dos alunos e se inicie uma compreensão
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de elaboração de novas ideias. Portanto, é importante pensarmos que quem ouve
e conta histórias em qualquer âmbito social que seja, exterioriza o que tem dentro
de si compartilhando suas ideologias, valorações e saberes.
Assim, a proposta desse texto foi trabalhar com métodos que instigue a
imaginação dos alunos para que eles aprendam sobre novas culturas, bem como
a produção de escrita e de novos causos trabalhando principalmente a oralidade.
Esperamos que essa proposta de ensino contribua para a utilização dos métodos
pedagógicos adotados na sala de aula na educação de ensino básico, podendo ser
utilizado tanto no Ensino Fundamental II quanto no Ensino Médio, pois na con-
tação de histórias os estudantes conseguem organizar a própria experiência que
tiveram nas relações comunicativas, pois “é por meio das práticas sociais, ou seja,
das mediações comunicativas que se cristalizam na forma de gêneros, que as sig-
nificações sociais são progressivamente construídas”. (BAKHTIN, 1992, p. 53).
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FrutosdaTerra. Acesso: 24 de maio 2022 às 14:32h.
152
NA ROÇA É DIFERENTE:
UMA PROPOSTA PARA TRABALHAR
A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA, NO 5º ANO1
Claudimir José da Silva2
APRESENTAÇÃO
154
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Saberes e Partilhas
compreendê-la como parte de nós e sendo nossa. É através dela que nos coloca-
mos presentes no mundo.
Compreendendo a língua como variável, pulsante, que salta de nós para
ir de encontro com o outro para criar elos ou não, pois ela nos permite concor-
dar ou não com aquilo que é dito ou não dito, pensamos no ensino, na sala de
aula e em como podemos levantar essas reflexões para os alunos, de modo que
eles compreendam que essa variação só tem sentido quando percebemos que a
língua é nossa.
Sendo o ensino hoje norteado pela Base Nacional Comum Curricular
(BNCC), trazemos algumas considerações que contemplem a nossa concepção
de linguagem e ensino da língua materna, voltado a reflexão sobre os usos e de
interação social. A BNCC traz que:
As atividades humanas realizam-se nas práticas sociais, mediadas por di-
ferentes linguagens: verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita),
corporal, visual, sonora e, contemporaneamente, digital. Por meio dessas
práticas, as pessoas interagem consigo mesmas e com os outros, constituin-
do-se como sujeitos sociais. Nessas interações, estão imbricados conheci-
mentos, atitudes e valores culturais, morais e éticos. (BRASIL, 2017, p. 63)
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A BNCC diz que o ensino da língua portuguesa está baseado na concep-
ção enunciativo-discursiva de linguagem, assim como proposta em documentos
com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’S). Busca-se proporcionar aos
alunos experiências para a ampliação dos letramentos, através de participações
significativas, em diversas práticas sociais, constituídas bem como pelas lingua-
gens oral e escrita, como também imagéticas, sonoras, entre outras.
A proposta deste trabalho, visa contemplar o eixo da oralidade, presente
no componente de língua portuguesa. Segundo Geraldi (2013) a escola se dedica
em trabalhar textos escritos, porém se esquece de trabalhar textos orais com os
alunos, deixando que a oralidade seja vista como menos importante que a escri-
ta. Complementando esse pensamento, Marcuschi (2001) irá dizer que não há
superioridade entre um e outro, são apenas modos diferentes de usar a língua e
que ambos devem ser trabalhados.
A oralidade é vista pela BNCC como práticas de linguagem que são pra-
ticadas em contextos de face a face ou não, através da fala. Ela ainda traz como
práticas de oralidades situações como a produção de textos orais e a relação da
fala com a escrita, por exemplo. Para a produção de texto orais, o documento
aconselha que o aluno seja capaz de “produzir textos pertencentes a gêneros
orais diversos, considerando-se aspectos relativos ao planejamento, à produção,
ao redesign, à avaliação das práticas realizadas em situações de interação social
específicas”, já na relação da fala com a escrita que ele seja capaz de:
Estabelecer relação entre fala e escrita, levando-se em conta o modo como
as duas modalidades se articulam em diferentes gêneros e práticas de lin-
guagem (como jornal de TV, programa de rádio, apresentação de semi-
nário, mensagem instantânea etc.), as semelhanças e as diferenças entre
modos de falar e de registrar o escrito e os aspectos sociodiscursivos, com-
posicionais e linguísticos de cada modalidade sempre relacionados com os
gêneros em questão.
Oralizar o texto escrito, considerando-se as situações sociais em que tal
tipo de atividade acontece, seus elementos paralinguísticos e cinésicos,
dentre outros.
Refletir sobre as variedades linguísticas, adequando sua produção a esse
contexto. (BRASIL, 2017, p. 80)
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da variação linguística, demonstrando atitude respeitosa diante de variedades linguísticas
e rejeitando preconceitos linguísticos”. (BRASIL, 2017, p. 87 - grifo nosso).
Isto exposto, propomos a elaboração de uma sequência didática que con-
temple a nossa concepção de língua materna e ensino a fim de trabalhar a va-
riação linguística presente na oralidade, o preconceito linguístico e a reflexão
sobre o uso da língua em diferentes contextos. O objetivo dessa proposta é con-
tribuir para melhoria do ensino de língua materna nos anos iniciais, sobretudo,
no quinto ano, a partir de reflexões quanto ao uso da língua e compreensão de
que a língua é uma manifestação viva e social.
Por fim, percebendo que a escola precisa mediar as reflexões acerca das
variação linguística, como modo de combater, também, o preconceito linguístico,
além de proporcionar um ensino de língua que apresente sentido ao aluno, no
qual ele possa fazer uso das diferentes linguagens e usar a língua para sua real
função, proporcionar interação entre sujeitos a partir dos discursos enunciativos,
teceremos uma breve a contextualização da nossa proposta de sequência didática
e a apresentação do produto educacional que contemple a práxis dessa proposta.
Na língua existe uma relação de poder que nos permite dizer que o lugar
de onde se fala tem mais valor que a língua em si, ou seja, às vezes cria-se um
pensamento negativo com relação à língua, mas não por ela não seguir as regras
gramaticais, e sim, pela relação que existe entre o lugar de quem fala e quem
fala. Observamos nos textos de Bagno (2009), (2014), (2015), que a língua(gem)
sofre mudanças constantes, mesmo entre uma geração ou outra, fato que a torna
dinâmica. Ainda que dentro de um mesmo país, questões regionais, culturais ou
econômicas irão se relacionar com as próprias questões linguísticas, de modo
que a língua passe a ser construída conforme o tempo, porém sem um fim ou
que haja um produto após essa interação.
Os escritores Soares (2007), Cagliari (1992) e Marcuschi (2001) retratam
que nos dois momentos em que usamos a língua (escrita ou oral), é possível
percebermos que em alguns momentos é notável uma relação entre fala e escrita
e há outros momentos que essa relação não existe. Esta discussão torna-se neces-
sária quando nos propomos a fazer uma reflexão acerca da língua oral e escrita
no processo de alfabetização e letramento ou quando nos propomos a pensar
sobre o uso da língua em diferentes contextos, que é o nosso caso no momento.
Quando pensamos em trabalhar a variação linguística na escola, na
perspectiva do vídeo do Chico Bento é justamente para proporcionar ao aluno
vivências que lhe permitirão refletir os diferentes usos da língua. O vídeo Chico
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Bento na roça é diferente levanta questões acerca do jeito diferente de falar da
população, que infelizmente só é vista como sendo do interior, mas não dife-
rente no sentido de que há outras possibilidades de falar, e sim sob a ótica de
inferioridade, uso errado da língua, incorreto ou marginalizado.
Pensando nisto, percebemos o quanto a língua, também, representa re-
lações de poder. Durante muito tempo defendeu-se o pensamento de que havia
línguas superiores e inferiores, ou ainda, que algumas línguas eram deficientes
linguisticamente. Embora hoje já se saiba que esse argumento não apresenta
bases significativas para as ciências da linguagem, continuamos perpetuando
tal pensamento. A professora Soares (2020) trabalha em seu texto duas teorias
que discutem as variedades linguísticas. Elas são apresentadas como a deficiên-
cia linguística, que acredita na existência de línguas ou variedades linguísticas
superiores ou melhores, em relação à outra. O fato ocorre devido a deficiência
relacionada ao fator social do sujeito, ou seja, seu contexto não lhe proporciona
contatos com a linguagem de privilégio. A segunda teoria se volta à diferença
linguística, defendendo, a partir de estudos antropológicos e sociolinguísticos,
que as línguas são diferentes entre si e não cabe a ideia de que uma seja superior
ou melhor que a outra.
Contudo, conforme aponta Soares (2020, p. 86) ambas as teorias, “acei-
tam um único saber linguístico como legítimo, o saber das classes privilegia-
das”. Isto faz com que a desigualdade linguística torna-se resultado da de-
sigualdade social. A escola, infelizmente, torna-se a maior instituição que
propaga essas diferenças e, principalmente, com o discurso de modo correto
ou errado de usar a língua. Segundo Soares (2020) a escola ainda mantém a
função de perpetua a estrutura social, as desigualdades e privilégios que cabe
a uns e torna-se prejuízo a outros, promovendo a desigualdade social, a dis-
criminação e a marginalização de sujeitos estigmatizados pela maneira como
usam a língua.
Em uma perspectiva bakhtiniana, essa questão de linguagem pode ser
compreendida como consideração valorativa da língua, no qual é atribuído va-
lor ao que é dito tanto pelo sujeito que fala como pelo sujeito que escuta, que
participa do diálogo e da construção enunciativa ocasionada.
Logo, assim como trazem Soares (2020) e Bagno (2014) percebemos que a
escola quando não toma a iniciativa de discutir as questões da variação linguís-
tica, dentro da sala de aula que é o exemplo da diversidade presente no mundo,
ela compactua com a manutenção dos preconceitos, da falta de reflexão da lín-
gua, do pensamento de que o nativo brasileiro não sabe o próprio idioma, além
de alimentar que escrever é apenas codificar a língua fala, uma vez que a escrita
é o espelho simples da fala, refletido tal como é.
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No vídeo Chico Bento: na roça é diferente, lançado em 1998 e escrito por
Maurício de Souza, embora não há indicações que mostre de forma intencional
que o objetivo era falar da variação linguística, é possível perceber como são
estereotipados os discursos entre as personagens quando ouvimos as falas entres
as personagens – da roça e da cidade. O próprio título sugere essa diferença ao
não mostrar o que na roça é diferente, deixando em aberto para a compreensão
do leitor. Consequentemente nos fazendo acreditar na inferioridade, não apenas
linguística, mas também na condição de vida ou tecnológica. Isto é percebido no
vídeo quando o primo do Chico Bento, que vem da cidade, compara o meio de
transporte e falta de aparelhos eletrônicos dentro da casa.
A seguir, trazemos a proposta da sequência didática, apresentada em cin-
co aulas e pensada para o 5º ano das séries iniciais, através de atividades que
buscam refletir a variação linguística e como podemos trabalhá-la em sala de
aula, refletindo os diferentes usos da língua nos diferentes contextos em que isso
ocorre, dentro da nossa sociedade.
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caminho que irá conduzir as discussões e identificar possíveis dificuldades e
potencialidades.
Ao professor também é importante observar a rotina e contexto dos seus
alunos e da escola. Isso poderá auxiliar na coleta de dados necessários para a
prática que podem enriquecer as discussões e o andamento do trabalho.
O uso da linguagem está inteiramente ligado às práticas sociais da lín-
gua, logo aos letramentos. O professor poderá, também, usar de outros letra-
mentos e gêneros para complementar as discussões acerca do tema proposto.
A utilização desta sequência didática poderá dar luz às questões sobre o uso da
língua e sua variação e variedades, além de ser um modelo adaptável e discuti-
do conforme as necessidades de cada escola e público-alvo.
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Desenvolvimento:
1º Momento:
Fazer o levantamento prévio sobre a variação linguística. Questionar o que eles pensam
que podem ser variações? Mediar a conversar sobre os diferentes modos de falar: falamos
sempre do mesmo jeito? (Tanto no uso das palavras como nos diferentes lugares). O modo
como eu converso na escola com meus amigos é o mesmo modo como eu converso em
casa ou com outras pessoas? Será que todas as pessoas falam igual? Como as pessoas na
cidade falam e como as pessoas na roça falam? (Aqui é importante observar se os alunos
já apresentam uma concepção de língua “errada” e língua “certa” em seu modo de falar,
ou seja, se irão responder que na roça os moradores falam “errado”). Importante refletir,
caso a resposta seja positiva, sobre as questões: 1) por que eles falam errado? 2) será que
eles realmente falam assim? 3) será que na cidade todo mundo fala igual e “correto”? 4) o
que significar falar “errado”?
Após essas discussões acerca do tema, as crianças assistirão ao vídeo Chico Bento - na roça
é diferente, o vídeo é produzido pela Turma da Mônica, assinado por Maurício de Souza,
lançado em 1998 e tem duração de 7 minutos e 38 segundos. Trabalhar a escuta atenta no
momento em que o vídeo estiver passando e nos momentos de conversa.
2º Momento:
Após assistirem ao vídeo, pode-se perguntar aos alunos se eles já conheciam as persona-
gens apresentadas na história e quais características de cada um, principalmente do Chico
Bento e do primo. Dialogar com os alunos a relação entre os dois personagens, semelhan-
ças e diferenças. Refletir sobre o modo como eles usam a língua e a função que ela está
desempenhando naquele contexto: eles estão se interagindo? Há diálogos entre eles? Existe
resposta ao que é dito ou não há? Por quê?
3º Momento:
Iniciar a roda de conversa com o tema variação do modo de falar. Deixar que os alunos
exponham suas considerações sobre relação entre essa variação, presente no filme, e bus-
quem fazer analogias com o contexto social e familiar em que vivem. Refletir se a opinião
do início da aula se mantém ou se mudou. Mediar a roda de conversa buscando fazer com
que os alunos compreendam que a variação é natural entre os seres humanos. Pedir que
fiquem atento na fala do colega e depois dizer se eles falam igual ou se falam diferente,
buscando destacar essas semelhanças e diferenças dentro da própria sala de aula. Levantar
hipóteses de situações em que falamos de maneira mais espontânea e livre e momentos
em que falamos de maneira mais convencional. Buscar nas experiências situações em que,
apesar das diferenças no modo de falar, houve interações entre eles, ou seja, não deixaram
de conversar e interagir porque falavam de modos diferentes. Por fim, refletir sobre o “cor-
reto” e o “errado” e o respeito às manifestações linguísticas que devemos ter.
Recursos didáticos e metodológicos:
Exposição oral.
Vídeo Chico Bento, na fazendo é diferente, disponível em https://www.youtube.com/
watch?v=Bfx_E3zvnjc
Carteiras em círculos.
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2º Momento:
Neste momento o professor irá trabalhar com os alunos a escrita. Pontuando uma das
funções da escrita: registro. O professor poderá usar o momento para trabalhar questões
ortográficas. Juntamente com o professor, os alunos irão anotar em seus cadernos as per-
guntas que a turma elaborou e selecionou para o questionário, refletindo a relação da lín-
gua falada com a escrita, apresentando elementos que na fala não são necessários, ou são
usados através de outros marcadores, como gestos e expressões, mas na escrita torna-se
necessários para contextualizar para que produza sentido para quem for responder.
3º Momento:
No final, o professor poderá orientar os alunos como realizar essa pesquisa em casa, con-
siderando a oralidade da criança, na hora de fazer a pergunta, a oralidade da pessoa que
será entrevista e o registro escrito em cada resposta.
Atividade elabora pelo o autor.
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Objetivos:
- Trabalhar a fala pública.
- Apresentar as respostas coletadas na pesquisa realizada em casa.
- Fazer análise da opinião das pessoas com relação ao tema.
Desenvolvimento:
1º Momento:
Iniciar a aula questionando os alunos como foi a experiência de entrevistar alguém. Deixar
que contem quem foi a pessoa entrevistada. Após os relatos, propor que eles iniciem suas
apresentações de modo que seja trabalhada a fala pública com clareza, coerência e coesão,
além do respeito à fala do outro, no momento da escuta. Deixar que os alunos percebam
pontos em comuns nas respostas dadas. O professor deverá ficar atento as respostas e prin-
cipalmente no viés da concepção que tais respostas estão sendo dadas, como, por exemplo,
se tendem à um viés preconceituoso, superior, inferior, da língua ou se há uma concepção
de língua enquanto interação social e respeito as variações.
2º Momento:
Quando os alunos acabarem de apresentar suas respostas, o professor deverá refletir com
os alunos o porquê das respostas dadas, ou seja, por que será que as pessoas têm aquela
opinião sobre a língua que falamos? Levantar reflexões de como poderíamos agir com
relação ao preconceito, ou seja, para quem não fala conforme as convenções ou que não
sabe ler ou escrever.
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REFERÊNCIAS
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SOARES, Magda. Diferença não é deficiência. In: Linguagem na escola: uma
perspectiva social. 18ª ed. 2ª reimp. São Paulo, SP: Contexto. 2020. p. 59-82
SOUZA, Maurício de. Chico Bento: na fazendo é diferente. Acessado em 10
de setembro de 2020 e disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=B-
fx_E3zvnjc>
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LIVRO DIGITAL: UMA ANÁLISE DA INSERÇÃO
DA TECNOLOGIA NAS AULAS DE LITERATURA
NO ENSINO MÉDIO1
Luã Leal Gouveia2
1. INTRODUÇÃO
A discussão proposta por este trabalho tem sua gênese na experiência tida
com o estágio curricular obrigatório, prática essa que é encarada como um ter-
reno fértil para se debater questões que envolvem o ensino-aprendizagem, rea-
lizado com alunos do Ensino Médio da rede estadual de ensino do Maranhão
SEDUC-MA. O estágio obrigatório II (etapa I) é uma fase dos graduandos do
curso de Linguagens e Códigos – Língua Portuguesa realizada no ensino médio
e desenvolvida em um percurso estruturado em: debates antecipados sobre o
campo onde será realizado, apresentações de microaulas para a supervisora de
estágio, agendamento das observações na escola, ambientação com o espaço
escolar e a realização das aulas com os alunos.
Essa etapa curricular foi desenvolvida com as turmas do 3º ano do ensino mé-
dio com a disciplina de Literatura, área essa que corresponde ao ensino de Língua
Portuguesa, preocupação essa enquanto alunos do curso de Linguagens e Códigos
– Língua Portuguesa. Desse modo, essa atividade pode esclarecer, aprofundar e de-
senvolver tanto as teorias discutidas dentro da universidade, quanto os estudos para-
lelos gerados pelo contato com a sala de aula, aos acadêmicos do curso.
Assim sendo, esse trabalho compreende o estágio curricular, do curso de
Linguagens e Códigos – Língua Portuguesa, como essencial para as atividades
profissionais e suas vertentes, pois entende que não há possibilidade do real exer-
cício profissional não ser delineado por uma experiência antecipada, isto é, há
uma necessidade de experimentar antecipadamente da prática profissional para
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resultados. Assim, é evidente que o mundo está em constante mudança e não
se podem descartar as hipóteses de que as teorias podem ser contestadas e/ou
descartadas.
Partindo disso, observa-se que na licenciatura não é diferente, pois o pro-
fissional de educação refuta e recepciona as teorias pedagógicas. Conforme des-
taca Arnon de Andrade (2005, p. 21-22) o professor é necessário vivenciar tudo
o que implica a escola e que há uma diferença entre o profissional com bachare-
lado e licenciatura, pois ambos possuem práticas e focos diferentes. De acordo
com o autor, não basta saber a ciência, mas sim ensiná-la e como reproduzi-la no
mundo, ou seja, o profissional da educação busca condensar os conteúdos, co-
nhecer os alunos e as vivências, com o interesse de decodificar e produzir apren-
dizagem. Assim, saber lidar com essas práticas, de certo modo, requer bastante
esforço, e o profissional é impulsionado a realizar pesquisas que possibilitem
a evolução de sua prática profissional, por isso o professor não deve esquecer
que, também, deve ser pesquisador para aliar a teoria e prática ao ensino. Ainda
sobre o que Andrade aborda:
O Estágio permite a integração da teoria e da prática e é o momento de
concretude da profissão. É, portanto, uma importante parte integradora
do currículo, em que o licenciando vai assumir, pela primeira vez, a sua
identidade profissional e sentir, na pele, o compromisso com o aluno, com
sua família, com sua comunidade, com a instituição escolar, que represen-
ta a inclusão civilizatória de vastas camadas da população com a produção
conjunta de significados em sala de aula; com a democracia, com o sen-
tido de profissionalismo que implique competência, isto é, – fazer bem o
que lhe compete (ANDRADE, 2005, p. 24).
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Introduzir a ferramenta no ensino modificam as práticas pedagógicas,
mas não retira a figura do professor. Sendo assim, promover o ensino é descobrir
quais estratégias mobilizam a progressão da educação e uso da tecnologia vem
somente para somar.
2. 3 O exercício da leitura.
A prática com a leitura de certo modo é, por vezes, uma dificuldade que
atravessa um número significativo dos níveis de escolaridade. Pode-se observar
alguns alunos da educação básica com dificuldades pelo interesse da leitura, ou-
tros do ensino médio preocupados com as interpretações cobradas pelo ENEM
(Exame Nacional do Ensino Médio) e chegando até a determinados acadêmicos
da graduação com a sua pouca experiência com as práticas de leituras e que se
deparam com um universo da escrita que a graduação os coloca em cena.
Desse modo, é importante observar que esse cenário tem uma razão, pois
de acordo com Eliana Yunes (1995) nos meados do início da década de 1990 os
governantes passaram a se preocupar com a prática leitora, sendo assim, esses
buscaram criar hábitos de leitura, porém, como aponta Yunes, não era o suficiente
para produzir bons leitores e reconhecedores das diversas comunicações que as
linguagens nos disponibilizam.
Quando se refere ao termo “linguagem” é o que é apresentado pelos
PCNS (2000) acerca da ideia de que a esfera das linguagens agrupa uma sé-
rie de elementos comunicativos da natureza humana que passam pelas Artes,
Filosofia, Matemática, saberes cotidianos entre outros, que configuram a inte-
ração humana. Desse modo, as atividades artísticas como: Música, Literatura,
Cinema, Pintura e outras, estariam nessa configuração de percepção do mundo
como um leque de possibilidades discursivas.
Assim, as narrativas e criações que se encontram a todo momento sen-
do descortinadas pelas experiências humanas, através da leitura, disponibilizam
um emaranhado de significados e que fazem parte de uma junção entre autoria
(escritor) e a coautoria (leitor). Essa união se articula pela formulação de que
um autor disponibiliza a leitura que faz do mundo (suas experiências singulares)
e inclina essa sua percepção a um leitor, esse que também realiza uma leitura
dinâmica desse universo da leitura.
Desse modo, há uma riqueza na prática leitora, visto que ela amplia a
visão de mundo. Sobre essa questão da leitura é importante retomar ao questio-
namento da professora Eliana Yunes(1995). Para a autora, partindo do princípio
que a leitura pode transformar o leitor, essa atividade não se dá com tanta faci-
lidade, pois apenas disponibilizar sistematicamente leitura aos leitores não cria
hábitos de leitura. Isso significa que automatizar o exercício da leitura coloca
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os sujeitos leitores em uma posição de vassalo e a leitura, ou tudo aquilo que se
aproxima com essa prática, na condição de suserania.
Assim, é importante observar que o ser humano busca compreender ou
racionalizar o mundo, na tentativa de compreender e interpretar o mundo e não
apenas de receptor. Desse modo, é a partir dessa prática interpretativa que nas-
ce a preocupação pelos estudos a partir das linguagens, pois ela se encontra
em conformidade com aquilo elencado acima sobre perceber as nuances que o
cotidiano disponibiliza aos que estão em plena atividade do viver, pois não se
trata apenas de acordar todos os dias e realizar todas as tarefas diárias automati-
camente, mas sim de realizar uma reflexão acerca do que será necessário para o
bem estar, como: alimentação, higiene pessoal, horários das atividades diárias, e
isso se dão através da leitura do mundo.
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podia brigar com esse contexto, sabendo que o mundo eletrônico já faz parte da
realidade contemporânea. A professora solicitou que as atividades prosseguis-
sem com o conteúdo correspondente ao modernismo no Brasil, mais especifica-
mente a produção realizada na terceira fase dessa escola literária.
O momento que antecipou o período de regência foi apresentado à pro-
fessora um planejamento, do qual foi elencado que na primeira aula, em cada
turma, seria apresentado o que corresponde ao movimento literário (contexto
histórico, período, influências e autores) e em seguida seriam eleitas três obras e
autores que tiveram sua produção no período e que se pudesse ter a experiência
literária. - Mas como realizar isso?
Foi a partir desse questionamento que suscitou a ideia de buscar fontes
virtuais e agregar a tecnologia nas atividades. Desse modo, buscou-se entre as
plataformas de buscas virtuais por obras do período modernista e a disponibi-
lidade, foram encontradas obras dos seguintes autores: João Cabral de Melo
Neto, com a obra “Morte e vida severina” (1954 e 1955); João Guimarães Rosa
com a obra “A terceira margem do rio” (1994) e Clarice Lispector com a obra
“Uma galinha”(1994), todos com a versão E-book. O computador foi utilizado
como suporte, mas a priori foi utilizado o sistema Bluetooth para compartilhar
as obras com alguns alunos e eles mesmo compartilhavam entre si o arquivo.
Diante desse cenário de trocas e compartilhamentos é importante dialogar com
o que a professora Clesiane Benevenuti (2017, p. 7) aborda:
Despertar a criatividade do aluno e utilizar a dramatização em sala, com
o auxílio de tecnologia, é saber inovar, isto é, é ter em mente recursos
metodológicos diferenciados que irão ensinar e, ao mesmo tempo, cativar
o discente, tornando a relação professor x aluno e aluno x aluno mais con-
creta (BENEVENUTI, 2017, p. 7).
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3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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celular para sua aula e lendo com os alunos proporciona a segurança de que eles
estão tendo contato com as obras.
REFERÊNCIAS
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DIDÁTICA ANALÓGICA X DIDÁTICA DIGITAL:
IMPLICAÇÕES DO USO DAS TECNOLOGIAS
DIGITAIS DA INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
(TDIC) NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Daniela Simone de Azevedo1
1 Mestre em Educação - Formação de Professores para o Uso das Tecnologias pela Univer-
sidade Federal de Lavras, MG.
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seus papéis como cidadãos, considerando a autonomia no uso das TDIC como
uma das habilidades que possibilitará que ele assuma este protagonismo.
Outrossim, o uso dos artefatos digitais no ambiente escolar pode ser,
também, uma forma de contribuir para o letramento digital e social no desen-
volvimento dos conhecimentos de base conceitual e procedimental para agir
e relacionar-se na congruência dos espaços real e cibernético (AZEVEDO e
MARTINS, 2020)
Diante dos argumentos supracitados, percebemos que é preciso avançar
na construção de um currículo tecnológico que enseje uma visão ampliada do
uso das TDIC para que nossos alunos tenham mais oportunidades de acesso aos
processos de inteligência coletiva, desde a infância. Precisamos moldar nossos
pensamentos em relação a inclusão das TDIC na educação, virar a chave, clicar
no ícone, apertar o botão… estabelecer uma díade que inclua o professor e o
aluno, no processo de interação e mediação do conhecimento através das TDIC.
Inserir as tecnologias na vida das crianças e adolescentes é possibilitar que eles
tenham mais acesso à informação e aumentem suas possibilidades de apropria-
ção do conhecimento. Segundo Cabral e Cabral (2010, p. 10), para além do pro-
cesso de aquisição do conhecimento, o acesso às novas tecnologias pode, ainda,
contribuir para a superação da fome, da pobreza e do atraso em todos os países.
O entendimento de que as mídias digitais podem afetar a vida, as relações
pessoais e sociais, influenciar a inserção no mundo do trabalho, etc, garante que
nossas posturas em relação a ela se transformem. É uma espécie de despertar da
consciência tecnológica. A partir desse “despertar” nossos olhares se apuram
para cada detalhe que envolve o seu uso e passamos a fazer parte da engrenagem
digital que move a sociedade e que a interliga. Isso não acontece apenas com
os adultos: com as crianças, como veremos na experiência que trazemos para a
apreciação ao longo deste artigo, é a mesma coisa: quando elas experimentam
esse contato com as TDIC o seu interesse se amplia. Há um encantamento pela
aprendizagem com o uso das tecnologias que envolve as possibilidades de uti-
lizar cores, movimento, sons, narrativas, etc, aspectos que compõem a vida da
própria criança e que se materializam através das tecnologias. Esse movimento,
no entanto, precisa acontecer em todos os espaços sociais para elevar as chances
de inclusão e de aprendizagem, incluindo a escola.
Obstante, migrar de uma didática analógica para uma didática digital re-
quer que o professor também tenha conhecimentos básicos sobre as tecnologias e
que, tanto ele quanto a equipe pedagógica estejam dispostos a incluir as TDIC em
seus planejamentos. É uma mudança significativa que envolve métodos e instru-
mentos de trabalho e que demanda esforço de todo o grupo escolar, pois, ao optar
pela utilização das mídias digitais na instituição, o trabalho implicará em estar
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Saberes e Partilhas
engajado num movimento de inclusão digital e deverá, nesta direção, ser redefini-
do. Ademais, será necessário adequar o currículo escolar considerando as melho-
res opções tecnológicas para a abordagem desta ou daquela habilidade cognitiva.
Queremos com isso, dizer que, cabe à escola ou rede educacional refletir
sobre o propósito de uso das TDIC no ensino. Que tipo de metodologia pre-
tende-se instituir e que tipo de modificação no comportamento dos estudantes
pretende-se desenvolver com esta nova metodologia? Queremos apenas jovens
reprodutores de informações predispostas na web ou queremos desenvolver jo-
vens atuantes, protagonistas, que utilizam as TDIC para aprender, colaborar,
ensinar e construir? Neste sentido, escolher usar as mídias digitais na educação
não é uma ação aleatória, porquanto ela influenciará diretamente no perfil do
estudante que se pretende formar e na relação destes jovens com as mesmas e
com as perspectivas que elas oferecem.
Um dos fatos, entretanto, que ainda impede a ampla inserção das TDIC
no ensino é a falsa ideia que se criou a respeito da relação das crianças com as
tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), fruto da repetição
de uma afirmação expressa por um empresário do setor tecnológico no início
da década de 2000 e publicada no artigo Nativos Digitais x Imigrantes Digitais
de Marc Prensky (2001). Tal afirmação alardeou a pretensa capacidade natural
das crianças no uso das tecnologias, sem que tenham havido estudos científicos
consistentes neste sentido. O texto de Prensky que potencialmente afirmou a
existência de “Nativos” e “Imigrantes digitais” ressoou entre os estudiosos e
educadores da época (2001) e perpetua até hoje, difundindo, no senso comum,
uma percepção inadequada e falaciosa de que crianças e adolescentes são natu-
ralmente aptas para fazer uso das tecnologias. No entanto, concordamos com
Xavier (2014, p. 5) quando o autor defende que as habilidades de manuseio dos
equipamentos tecnológicos devem ser aprendidas, compreendidas e experimen-
tadas para que façam algum sentido cognitivo e social para quem as utiliza.
Segundo o autor, qualquer mudança cognitiva está relacionada ao processo de
aprendizagem, pois a transformação mental acontece naquele que aprende a
partir da “experimentação concreta” e a partir de momentos de observação e
exposição sistemática de um saber mais experiente para outro.
Em síntese, o fato é que, temos um espaço-temporal de 21 anos entre as
afirmações de Prensky e o que vivenciamos na sociedade contemporânea, e, ain-
da assim, a falácia dos Nativos Digitais continua reverberando fortemente nos
debates e discussões sobre as habilidades de uso das TDIC pelos jovens, mesmo
nos ambientes educacionais, entre formuladores de políticas públicas, gestores
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educacionais e professores. A cada geração que nasce e cresce, a responsabilida-
de de ser “naturalmente apto’’ para o uso das TDIC lhes é atribuída. Fantin, no
entanto, nos adverte:
devemos ter cautela com a retórica fácil da chamada “geração digital”,
ou seja, a ideia de que os jovens possuem uma espontânea afinidade com
a tecnologia. [...] não é possível isolar a tecnologia e sua capacidade de
“produzir efeitos sobre as pessoas” de outros elementos do contexto so-
ciocultural, que também interferem nesta relação. (FANTIN, 2016, P. 7)
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Saberes e Partilhas
pública municipal de educação infantil (centro infantil), de horário integral,
localizada em uma região economicamente vulnerável, na periferia de uma
cidade da Região Metropolitana de Belo Horizonte, no primeiro semestre de
2018. Utilizou-se para a realização da atividade um computador e um proje-
tor PROINFO3 Interativo que é ao mesmo tempo, projetor e computador e que
funciona sob a Plataforma Linux Educacional, únicos materiais tecnológicos
para uso com os alunos que a escola dispunha. Para atingir o objetivo definido,
a educadora usou o software GCompris que é uma plataforma de atividades
educacionais (conforme será descrito adiante) e as crianças imediatamente se
identificaram com ele demonstrando interesse pelos sons e imagens coloridas
que o constituem.
O equipamento foi instalado no centro da sala de aula, para que as crian-
ças tivessem fácil acesso a ele, e a educadora foi apresentando letra por letra
para os estudantes. A cada letra apresentada um som era emitido (o fonema da
letra) e as crianças iam repetindo os sons enquanto a professora ia fazendo a
intervenção, associando a letra ao nome dos alunos, como vinha fazendo através
dos recursos didáticos anteriormente descritos. Após apresentar todas as letras
e seus sons correspondentes, os estudantes fizeram uma fila, sentados de frente
para a tela. A educadora foi chamando, um a um, para ir até o teclado e encon-
trar a tecla da letra que estava “caindo” na tela.
G-COMPRIS
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Figura 1 - Tela Inicial GCompris
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Saberes e Partilhas
experiência descrita no presente artigo, selecionou as que mais se ajustavam ao
seu planejamento didático.
Fonte: Print Screen das telas de acesso e de atividades de leitura do software, capturado pela
autora.
Fonte: Print Screen da tela inicial da atividade “Trem das Letras”, capturado pela autora.
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A segunda atividade, Letras Cadentes (Figura 5) consiste em digitar a letra
que está caindo antes que ela atinja o chão. Para a realização desta atividade os
alunos tinham que, antes, procurar a letra no teclado. A professora ajudava indivi-
dualmente porque os estudantes não tinham conhecimento anterior deste periférico.
Fonte: Print Screen da tela inicial da atividade “Letras Cadentes”, capturado pela autora.
OBSERVAÇÕES E DISCUSSÕES
A educadora G.I. observou que: “as atividades ensinaram mais que o al-
fabeto, as crianças ficaram curiosas com o computador, a tela, as teclas e acha-
ram tudo aquilo muito diferente”, visto que “nenhuma das crianças tinha tido
algum contato anterior com computadores, a experiência provocou um grande
alvoroço entre eles”. Para a educadora, as atividades despertaram ainda mais o
interesse das crianças em aprender as letras e o alfabeto, além disso, elas ficaram
“empolgadas” com a possibilidade de utilizar o computador.
Este despertar tecnológico da criança, como dissemos, é extremamente im-
portante porque provoca uma mudança no seu comportamento. A criança começa
a perceber que existe uma forma de interação com o conhecimento que pode ser
divertida, criativa e colaborativa e inicia uma nova fase de relacionamento com a
tecnologia: ela passa a explorar os seus recursos no processo de apropriação das
TDIC e este passo a aproxima do desenvolvimento de habilidades digitais que vai
ocorrendo à medida que ela estreita seu contato com os instrumentos tecnológicos.
A experiência aqui relatada notabiliza a relevância de se proporcionar
momentos de interação com as TDIC nas escolas, desde a educação infantil,
para que os jovens tenham a oportunidade de, então, crescerem em contato com
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Saberes e Partilhas
elas. Rematando as observações feitas pela professora G.I. e as discussões
apresentadas, concluímos que é preciso garantir espaços de uso das TDIC nas
escolas e capacitar as crianças e jovens para o uso delas, para desenvolver ha-
bilidades motoras e técnicas, linguísticas, matemáticas, de conhecimento geral,
etc, a partir do entrelace/mediação que elas propiciam, a fim de que se tornem
indivíduos letrados digitais, independentes e autônomos.
Ao lado disso, este relato de experiência nos leva a refletir sobre a necessi-
dade de colocar de lado o falso argumento de que as crianças já nascem sabendo
utilizar tecnologias”. Não podemos generalizar o conhecimento e as habilida-
des dos jovens, imputando-lhes uma competência que não possuem. Quando
o fazemos, admitimos que não é preciso “ensiná-los” a utilizarem os recursos
da TDIC e cometemos erros como solicitar trabalhos escolares que dependem
desta competência para serem realizados. (Azevedo, 2019, p. 103)
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tecnologias naquele sistema de ensino. Para Passos e Abreu (2011) é preciso
observar, no planejamento de uso das TDIC, aspectos educativos que levem a
uma conscientização crítica, sem a qual o processo servirá apenas como adestra-
mento para o uso automático das mesmas.
É essa consciência ampliada que recomendamos no uso das TDIC na
escola. Como na experiência relatada, as ferramentas tecnológicas atenderam a
um propósito, não foram utilizadas aleatoriamente e não substituíram a ativida-
de do dia de improviso. Elas foram, como o são os livros didáticos e o quadro
negro, inseridas no planejamento didático visando obter através do seu uso um
maior aproveitamento cognitivo e, neste sentido, foram utilizadas como formas
mais atraentes e criativas na promoção da aprendizagem e na construção do sa-
ber-experimentado. É uma “nova” maneira ensinar-fazendo. A aprendizagem,
que na educação infantil, tradicionalmente, se dá a partir de livros, cartazes,
quadros negros, revistas, etc, acontece de uma forma linear, gradual e controla-
da, mas isso muda quando se inclui as TDIC. As possibilidades de aprendizagem
se ampliam e se diversificam. O “controle” que se tem ao utilizar os recursos
impressos no desenvolvimento do conhecimento, torna-se flexível e individuali-
zado, porque há uma quantidade muito maior de tarefas a serem realizadas que
vão surgindo e sugerindo novas trilhas e formas de aprender.
O livro/revista é um suporte de textos ( verbais ou visuais) que conduz a
um determinado aprendizado, traçado, coletivo… mas o computador, por outro
lado, é um condensador de diversas ações, relacionadas não só à escrita e leitura.
(DIAS E NOVAIS, 2009, p. 6) Os cliques, símbolos e enters podem direcionar a
aprendizagem para esta ou aquela direção. Essa flexibilidade e as diversas pos-
sibilidades que as TDIC oferecem para os seus usuários pode ser compreendida
como a oportunidade do professor ser de fato apenas um mediador do conheci-
mento, mas, em contrapartida, implica na necessidade de um planejamento pon-
tual que preveja as extensões digitais de cada hiperlink e software a ser utilizado
e, paralelamente, defina ações para o redirecionamento (caso necessite) a fim de
se obter o objetivo proposto. Os leitores devem estar se perguntando como isso
é possível? A partir do momento que o educador vai se adaptando e adequando
o currículo escolar considerando o uso das TDIC, ele vai aprendendo a “con-
trolar” os desvios e distrações sem tolher a criatividade e a liberdade do aluno.
Ele vai conhecendo, juntamente com o estudante, novas formas de aprender e
de ensinar e o processo de aquisição do conhecimento torna-se uma experiência
única para cada discente, surge daí uma nova forma ensinar que se baseia na
interação estudante-professor-saber-tecnologia.
Ainda há muito a se discutir sobre a inclusão das tecnologias no ensino,
mas deixamos aqui a nossa contribuição para que essa nova didática (digital)
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O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
seja definida em grupo, vista como uma metodologia do sistema de ensino ou
da instituição escolar e que não seja apenas uma decisão individual, de cada
professor. Quando as tecnologias são vistas como instrumentos significativos de
aprendizagem e são consideradas pelo corpo docente como tal, é mais fácil esta-
belecer limites e possibilidades de uso, caso contrário, as ações pontuais podem
implicar em usos reprodutores e automáticos, reforçando e quiçá ampliando as
desigualdades sociais.
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187
SALA DE AULA INVERTIDA E JÚRI SIMULADO
COMO METODOLOGIA ATIVA: UM
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Rosimara Cargnin 1
Juliana Porto de Souza2
Marcela Martins Nunes3
Anália Ferraz Rodrigues4
Vanessa Dias Espindola5
INTRODUÇÃO
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Saberes e Partilhas
Esse modelo é caracterizado de forma que o conteúdo teórico é estudado
no formato on-line (à distância) e o presencial é realizado no espaço escolar. Nesse
momento, os estudantes usufruem do ambiente de sala de aula para juntamente
com o professor realizar discussões, resolução de atividades, tirar dúvidas, debater,
expor suas ideias. É justamente nesse ponto que a sala de aula invertida contem-
pla um dos principais benefícios, que é a otimização do tempo. Na maior parte
do período de aula, ao expor um conteúdo, o professor passa boa parte do tempo
tirando dúvidas e sofrendo interrupções que, muitas vezes, fazem com que a aula
não gere os resultados tanto quanto o professor estima (SANTOS, 2019).
Ao aprender antecipadamente o assunto proposto, o aluno se prepara me-
lhor, controla seu tempo e desenvolve autonomia para seguir seu ritmo e escolher
o formato que julga ter mais facilidade para assimilar o conteúdo proposto, sen-
tindo-se mais preparado para debater com propriedade e discutir a aplicabilidade
desses conceitos em situações reais e práticas (BERGMANN; SAMS, 2016).
Ainda em relação à sala de aula invertida, (SANTOS, 2019), propõe que
é preciso levar em conta a importância da abordagem dessa metodologia fun-
damentada em quatro pilares conhecidos como, “F-L-I-P”: Flexible Environment
(Ambiente Flexível); Learning Culture (Cultura de Aprendizagem); Intencional
Content (Conteúdo Dirigido) e Professional Educator (Educador Profissional), ex-
plicados no Quadro 1:
PILAR DESCRIÇÃO
Ambiente Preconiza uma variação constante das ferramentas e configurações utili-
flexível zadas.
Cultura do Os alunos construam ativamente sua educação em casa e em sala de aula,
aprendizado estimulando também seus colegas a fazerem o mesmo.
Esse pilar propõe que o ensino seja útil de alguma forma para a vida dos es-
Conteúdo
tudantes, baseado em conteúdos e temas que se relacionem com o contexto
intencional
específico de aprendizado.
Professor precisa ser aquele que acompanha o aluno também em outros
Educadores
momentos, que está pronto para ouvir críticas e reformular suas ações a
profissionais
partir das demandas particulares.
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com a formação abrangente dos educandos, promovendo desenvolvimento, au-
tonomia, criatividade, atitudes e habilidades essenciais para a transformação in-
tegral e social dos sujeitos.
Nesse contexto, a metodologia do júri simulado, como caracteriza Diesel,
Santos e Martins (2016), incentiva a busca pela pesquisa, desperta habilidades
como trabalho em equipe, criatividade, autoestima, senso crítico e desenvolve a ar-
gumentação contemplando os pilares da sala de aula invertida. A seguir é apresen-
tada a descrição da experiência vivenciada sobre os aspectos citados anteriormente.
METODOLOGIA
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Saberes e Partilhas
simulado a PNEEPEI (2008). O desenvolvimento desta proposta foi influencia-
do pela autonomia discente de maneira a organizar como seria elaborada esta
proposta. Nesse sentido far-se-á o relato da atividade proposta e da experiência
vivenciada em sala de aula, imbricada com os aportes teóricos proporcionados
pelos autores estudados. O grupo se propôs a refletir sobre o uso de metodolo-
gias ativas como metodologia de ensino, em especial o júri simulado imbricado
na sala de aula invertida.
Para a atividade de júri simulado foram realizados encontros virtuais com
as integrantes do grupo a fim de planejar a execução da encenação e assim aten-
der ao seu objetivo de exemplificar os desafios e possibilidades que a inclusão de
estudantes com necessidades especiais demanda das escolas. Para tanto, apoiou-
-se sobre a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva
(BRASIL, 2008) como fundamento teórico para dinâmica. Foi acordado que o
caso relataria um compilado de experiências já vivenciadas profissionalmente e
pessoalmente pelas autoras.
Assim, escolheu-se um caso que abordasse a adaptação curricular, item
enfatizado na política e problematizado nos espaços de debate da temática. A
adaptação seria para um estudante com Síndrome de Asperger, público-alvo da
política ao se encaixar em transtornos de desenvolvimento global, segundo a
décima versão do Código de Doenças Internacional (CID106) de 1990. Esta sín-
drome representa uma desordem neurobiológica e é caracterizada por desvios
e anormalidades em três amplos aspectos do desenvolvimento: interação social,
uso da linguagem para a comunicação e atitudes repetitivas. Entretanto, podem
possuir elevadas habilidades cognitivas em determinadas áreas, pessoas com
esta síndrome possuem uma forma característica de percepção do mundo e de
interagir com outras pessoas (TEIXEIRA, 2005).
A etapa seguinte da atividade foi a distribuição dos personagens necessá-
rios para a encenação, escolhidos pelo grupo de forma livre, sendo necessários:
uma juíza, duas advogadas (defesa e acusação), testemunha de acusação e ré.
Logo, elaborou-se o roteiro, criado de acordo com as experiências comparti-
lhadas. A intencionalidade do roteiro era de se aproximar ao máximo com um
julgamento, contendo elementos que lembrassem a dinâmica de um júri. Em
resumo, o enredo organizado tem uma professora de português da rede pública
municipal como “ré” que se recusa a adaptar o currículo para um estudante com
síndrome de Asperger. Sua justificativa é que não é possível adaptar o conteúdo
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sobre figuras de linguagens para o estudante e a impossibilidade de conseguir
ministrar sua aula como o planejado visto que ele fica inquieto e perturbando os
colegas. Diante disto, a juíza escuta as advogadas das partes, a ré e testemunhas
para dar sua sentença. A seguir será descrito alguns momentos do roteiro que
julgamos ser necessário para compreensão da dinâmica e do seu objetivo.
A encenação inicia-se com a abertura da juíza descrevendo o caso e
logo após a advogada de acusação expõe seus pontos embasados na Política
de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva de 2008. Os pontos levantados
foram embasados em legislações como a Lei de Diretrizes e Bases Curriculares
(LDB, 1996), Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e traz aspectos da polí-
tica ao mencionar que os sistemas de ensino devem se organizar e ofertar condi-
ções de acesso aos espaços, recursos pedagógicos, comunicação que favoreça a
promoção da aprendizagem e a valorização das diferenças, de forma a atender
as necessidades educacionais de todos os estudantes. Ao finalizar expõe-se que
a oferta das adaptações curriculares ao estudante é direito, visto que ele possui
um diagnóstico de Síndrome de Asperger, público-alvo da política.
A professora ao se defender relata características típicas da Síndrome de
Asperger como justificativa de induzir que o estudante apresenta mal comporta-
mento ao citar que interrompe a aula com perguntas complexas, que a deixam
constrangida por não saber responder e dando a entender que quer humilhá-la
e se exibir perante a turma. Outra característica apontada foi quanto aos movi-
mentos repetitivos, como ficar andando ao fundo da sala de aula. E em relação
às adaptações curriculares, a professora expressa sua indignação por exigir isso
do professor que tem muitas turmas e estudantes para conseguir elaborar a mo-
dificação de sua didática. Finalizando sua argumentação, a docente expõe que
não tem capacitação para atender estudantes com este tipo de deficiência.
Após a fala da professora, a advogada de acusação questiona se ela bus-
cou informações sobre a síndrome do estudante ou conversou com a família ou
comunidade escolar para conhecer características relevantes do mesmo, também
se a docente havia realizado cursos de formação sobre inclusão educacional.
Estes questionamentos são vivenciados na prática da efetivação da inclusão, que
mesmo após mais de dez anos da política, ainda se debate sobre formação e
falta de informações referente às características do público-alvo. Remeter-se a
estes aspectos no júri simulado demonstra que a atividade vai ao encontro com
a realidade presente nas instituições de ensino.
O próximo personagem a se apresentar foi a advogada de defesa da pro-
fessora que expõe incertezas que a política possui, como não haver comprova-
ção escrita de que é responsabilidade do professor de sala de aula elaborar a
adaptação curricular, além da falta de oferta de capacitação para os docentes
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Saberes e Partilhas
atenderem a esta demanda. O acolhimento, foi o outro aspecto apontado na
defesa, muitas vezes usado como justificativa para não se problematizar o êxito
e permanência do estudante, ou seja, o processo de aprendizagem deste.
Deste modo, foi estabelecido que na atividade haveria o relato de exem-
plos exitosos que são possíveis no relato de uma testemunha. A ideia foi trazer
uma docente que já tivera contato com o estudante, que já realizou a adapta-
ção curricular e apontar as características da Síndrome de Asperger que poten-
cializam seu processo de aprendizagem, como: fácil compreensão, tendência
a altas habilidades em áreas específicas. Também, considerou-se no relato da
testemunha a importância de observar o que leva a “inquietação” do estudante
para assim poder ter uma ação que a neutralize. O exemplo usado foi de ofertar
exercícios mais avançados para focar sua atenção no “desafio” e não o deixar
inquieto. O relato da testemunha se deteve na política e seus objetivos, como ir
além do acolhimento, mas também assegurar a participação e a aprendizagem.
As personagens que representaram as advogadas questionaram pontos
importantes relacionados à política como: formação continuada, garantia da
adaptação curricular, respeito às diferenças. Porém, foram apontados na ativi-
dade de júri simulado aspectos que devem ser levados em consideração, dentre
eles, o excesso de horas/aula, turmas com grande número de estudantes, dificul-
dade de realizar cursos de capacitação e de romper barreiras atitudinais geradas
pelo preconceito.
Ao levar em conta todos os relatos, finalizamos a encenação da atividade
com a fala da juíza que aponta sua decisão mediada pela LBD onde expressa
que é dever do Estado garantir a educação básica, a LBI que garante respeito e
autonomia às pessoas com deficiências possam exercer suas vidas em condições
dignas de igualdade e principalmente, seguindo o teor da política de educação
especial de 2008 que afirma que a inclusão é uma ação política, cultural, social e
pedagógica, definindo que o currículo seja adaptado para o estudante.
A sentença foi que a professora realize no mínimo 100 horas de formação
continuada sobre o tema, visto que em suas falas apresenta desinformação sobre
o tema e demostra discriminação em suas ações concluindo que a inclusão deve
não apenas superar barreiras pedagógicas, mas também atitudinais que serão
rompidas assegurando os direitos das pessoas com deficiências. Também, a juí-
za designou que a escola contrate uma professora de Atendimento Educacional
Especializado para auxiliar os docentes na adaptação do estudante com os
demais colegas, visto que a política determina o uso do orçamento do Fundo
Nacional da Educação Básica para esta contratação.
Deste modo, a atividade do júri simulado relacionou as situações vi-
venciadas na escola, referentes a inclusão, através de uma metodologia ativa
195
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proporcionando uma encenação didática e informativa. A utilização da sala de
aula invertida também se fez importante para preparar os personagens para a
atividade do júri simulado, por meio de leituras importantes que em aula, emba-
saram fortemente as discussões e posições de cada personagem.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
196
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
mais abrangente e complexa com o conteúdo (VASCONCELOS, 2015).
De acordo com Macedo et al. (2022) utilizar-se da sala de aula inverti-
da apresenta ganhos significativos na compreensão conceitual, bem como no
ganho de habilidades para resolver problemas comparáveis aos adquiridos nas
aulas tradicionais. Não obstante, Vasconcelos (2015) destaca que o professor
deve colaborar com o aluno na interpretação do objeto estudado, pois podem
ocorrer associações com outros conteúdos e representações, possibilitando ao
aluno tirar as próprias conclusões, sendo esta dimensão fundamental para asso-
ciar conhecimentos significativos para sua aprendizagem.
Este estudo possibilitou unir vários conhecimentos como: as metodolo-
gias ativas, a sala de aula invertida, o júri simulado, desenvolver o relato da expe-
riência da atividade e aprofundar conhecimentos sobre a PNEEPEI. O relato de
experiência viabilizou, a partir da organização estruturada, a análise de aspectos
significativos na evolução da prática discente, indicando os aspectos positivos e
as dificuldades identificadas na organização e no desenvolvimento da atividade.
O relato de experiência, de forma geral, apresentou informações sobre a
aula que foi realizada, de acordo com as informações do planejamento, e resul-
tados alcançados fazendo a relação entre teoria e prática, conhecimentos de-
senvolvidos no curso e aplicados na prática da realização do júri simulado. O
princípio maior das metodologias ativas não é apenas fazer com que o aluno
seja protagonista de sua aprendizagem e desenvolva autonomia. Corroborando,
Berbel (2011) cita que é necessário que o aluno seja capaz de inserir-se nas dis-
cussões, teorizar e trazer elementos novos, ainda não considerados na aula ou
na perspectiva do professor.
Nessa perspectiva, Filatro e Cavalcanti (2018) apontam que as metodolo-
gias ativas têm apresentado êxito, pois possibilitam a construção de um conheci-
mento significativo ao aluno, para colocá-lo como sujeito central do seu próprio
processo de aprendizagem e desenvolvimento de suas competências.
Desse modo, no contexto escolar o professor pode fazer uso de diversifica-
das metodologias e estratégias de ensino, visando o desenvolvimento das
potencialidades dos estudantes. Isso também deve ocorrer em sala de aula
que possui alunos com deficiências, pois estes sujeitos devem ser entendidos
em suas potencialidades e não vistos sob o prisma de crenças que destacam
somente suas limitações (ESQUINSANI; SILVA; GUERRA, 2021, p.28).
Por fim, concorda-se com Esquinsani, Silva e Guerra (2021) sobre a im-
portância do desenvolvimento de novos estudos sobre os caminhos para uma
educação especial inclusiva que estimule a aprendizagem e socialização dos
estudantes público-alvo. Tal argumento e sua efetivação podem ser uma base
sólida para a construção de espaços de diálogo e inclusão real das diferenças em
suas múltiplas especificidades
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CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
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200
AS CONTRIBUIÇÕES REVELADAS PELO ENSINO
ATRAVÉS DA ANÁLISE DE PAISAGENS
NAS AULAS DE GEOGRAFIA
Abraão Danziger de Matos 1
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
DEFINIÇÕES DE PAISAGENS
202
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
nem toda paisagem tem todos esses componentes, por exemplo, no deserto não
veremos águas superficiais.
Tradicionalmente, a geografia tem diferenciado as paisagens em paisagens
naturais e culturais, exigindo uma abordagem que leve em consideração a avalia-
ção dos elementos envolvidos, escala e temporalidade na paisagem. Schier (2003)
descreve a diversidade conceitual desse tópico. seguindo Bertrand (1971) de forma
homogênea, entendendo que “sociedade e natureza estão relacionadas e formam
uma única ‘entidade’ de um mesmo espaço geográfico” (SCHIER, 2003, p. 80).
Não é fácil definir uma paisagem cultural. Este é provavelmente um alívio
terrestre que surgiu após as ações transformadoras das pessoas para atender a
certas necessidades espirituais e práticas. Qual é a ideia do espaço cultural? Para
muitos, a paisagem cultural é um tecido contínuo de várias camadas na forma de
um tapete integral que combina elementos naturais e culturais.
Todos os objetos e lugares na superfície da terra são tubérculos de tecidos
paisagísticos com um padrão holístico. Pode-se dizer que a paisagem cultural é
um espaço terreno que é integral e ordenado, contém elementos naturais e cul-
turais. O próprio homem influenciou muitos dos espaços da Terra, complemen-
tando-os com artefatos. Foi a atividade humana que influenciou a dinâmica das
condições naturais. Tais paisagens alteradas também são chamadas de paisagens
feitas pelo homem.
Por este termo significa um complexo territorial natural e cultural domi-
nado pela sociedade humana. A paisagem antropogênica (cultural) é um com-
ponente natural da cultura. Esse território cultivado preserva e herda bases na-
turais. Partículas antropogênicas complementam tanto as bases naturais quanto
obedecem às suas leis. Um exemplo é um assentamento rural. O autor também
concorda com Sauer (1998) que a natureza projeta dois tipos de forma, uma
antes e outra depois da apropriação humana, e favorece uma sucessão histórica
entre elas (SCHIER, p. 81)
Santos (1996) considera a paisagem como uma história viva e congelada,
que se alterna no espaço por suas funções sociais e sua simultaneidade, sem con-
siderar a dinâmica cultural que essa sociedade exerce sobre ela. associar a uma
representação cultural.
Por exemplo, a descrição da paisagem retratada na imagem abaixo pode-
ria ser assim.
203
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Figura 1: Paisagem costeira natural.
Fonte: https://c.pxhere.com/photos/82/6d/path_beach_ocean-345.jpg!d
204
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
existentes e deixando de se concentrar na paisagem em si. ela começa a descre-
ver à luz de uma dialética entre os elementos sólidos da paisagem natural e os
elementos humanos distanciados pelo método de análise.
Segundo Schier (ibid.), La Blach aborda seu contemporâneo Ratzel, por
meio de um olhar positivista e dialético entre “ordem e progresso”, cujo movi-
mento está ligado ao espírito humano em Ratzel e à capacidade de inovação em
La Blach. Em meados do século XX, a paisagem passou a ser vista como um
conjunto meramente estável de elementos, até ser chamada de ‘geografia da pai-
sagem’, ‘ciência da paisagem’ e organizada por Hattner em três perspectivas ‘to-
das de origem kantiana’. geografia geral, nomotética e ideográfica” (SCHIER,
2003, p. 83). Nesta perspectiva, o autor destaca que nas primeiras quatro dé-
cadas do século XX, as ciências nomotéticas e idiográficas desenvolvidas por
Immanuel Kant influenciaram fortemente a forma de analisar a geografia da
paisagem segundo determinados critérios, enquanto a perspectiva idiográfica se
concentra no conjunto específico de uma única paisagem” (SCHIER, ibid., p.
83) Ambos consideram uma série de fatores humanos e naturais na paisagem,
que se demarcam entre geografia física e humana.
Tais significados dialogam com o pensamento de Claval (1999), que tra-
tou a paisagem a partir de uma perspectiva morfológica, apresentou seus as-
pectos ecológicos e humanos, e trabalhou com a geografia cultural sob forte
influência do positivismo descritivo da época.
No início da década de 1960, principalmente nos Estados Unidos, o ter-
mo “paisagem” em círculo geográfico parece ser substituído pelo termo “re-
gião”, motivado pela influência de Richard Hartshorne, aquele geógrafo, au-
xiliado pela diferença semiótica entre os dois termos, que se valeu da geografia
clássica, considera o conceito de paisagem como tipologia morfológica uma
linha de raciocínio primitiva, pois não leva em conta as influências da região
que a circunda, ao contrário do conceito de região, cujo conceito científico é
com base na diferenciação espacial comparativa de estruturas regionais em uma
síntese complexa entre influências físicas e humanas. A partir dessa mentalidade
é introduzida uma compreensão sistêmica das entidades geográficas, filtradas
através de estatísticas e matemáticas, médias, variações e tendências; guiada
pela terceiridade (no sentido peirceano) que apresenta interpretações funcionais
da paisagem e se destaca como “Nova Geografia” (SCHIER, 2003, p. 84).
2.3 CONTRIBUIÇÃO DA UTILIZAÇÃO DE PAISAGENS COMO
RECURSO ANALÍTICO NAS AULAS DE GEOGRAFIA
205
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e outros profissionais que direcionam seu trabalho para a percepção e análise
segundo suas lentes ela pode cotribuirpor meio de novos métodos analíticos que
vão além do paradigma da abordagem descritiva da paisagem em busca da es-
truturação espacial, nesse sentido Cavalcanti (2011) para destacar a importância
da percepção da paisagem através dos estudos indicados pela Geografia Física e
a Geografia da Percepção, seja objetiva ou subjetiva.
Para Santos (1996), a percepção da paisagem é sempre um processo percep-
tivo seletivo, em suas palavras “tudo o que vemos que chega à nossa visão é a pai-
sagem, que pode ser definida como o reino do visível, aquilo que engloba a visão,
consiste não só de volume, mas também de cores, movimentos, cheiros, sons etc.”
(SANTOS, ibid., p. 61). Para o autor, a tarefa do geógrafo é alcançar a importân-
cia expressa pela subjetividade, que é tomada nas formas extraídas da paisagem.
Nesse sentido, Cavalcanti (2011, p. 99) enriquece a compreensão do con-
ceito de paisagem ao realçá-lo também na dimensão artística (estética), tanto
para quem o constrói tecnicamente (paisagistas) quanto socialmente (cidadãos).
Eles revelam a estrutura da sociedade e o imaginário social, crenças, valores
e sentimentos das pessoas que a constroem. Trabalhando na construção desse
conceito para a percepção das paisagens a serem analisadas, essa beleza estética
(ou mesmo sua ausência) é um primeiro elemento a ser explorado.
Assim, os autores defendem que é preciso construir uma crítica da paisa-
gem, a partir da análise do espaço do todo do qual ela faz parte, em um quadro
territorial menor em que se articulam o geral e o particular. Para essa análise, ele
também considera fazê-lo do ponto de vista fenomenológico, tornando visível a
presença invisível especial no “visível” como a “essência” dos sistemas materiais
e de valores mencionados em toda paisagem. é preciso, como Claval, reconhecer
a paisagem como coexistência e explorar seus fios de cruzamento e sua troca
mútua” (CLAVAL, 1999, apud SERPA, 2010, p. 134).
Em busca de um debate teórico-crítico e de aprofundamento do pen-
samento geográfico construído através do estudo e da pesquisa, Cavalcanti
(2011) foca na formação de conceitos e métodos em geografia, uma contribui-
ção para uma teoria crítica da geografia do espaço, e compreende como um
“produto social e histórico intelectualmente construído que constitui uma fer-
ramenta que permite analisar a realidade” (ibid., p. 195), por isso é baseado na
dialética entre as diferentes abordagens que apreender inter-relações entre seus
elementos sem dicotomias, que busca apropriar-se das escalas mais amplas,
passando do local ao global e deste ao local. Portanto, por compreensão dialé-
tica que requer realidade em sua multiplicidade e todos os fenômenos como
resultado da relação contraditória entre todos e parte. Cavalcanti acredita que
ao abordar as escalas analítica e perceptiva torna-se essencial compreender as
206
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
matrizes do pensamento crítico na concepção dialética do mediato e do ime-
diato e suas relações no processo de cognição.
Isso foi bem estudado por Lima (2001), que tenta mostrar que o conhe-
cimento é um processo que vai além do sentimento imediato, pois envolve a
percepção (habilidade resultante de uma atividade prática e um trabalho de
compreensão) que é um processo indireto. As regras práticas do método dialé-
tico resumidas por este autor podem ser visualizadas de forma resumida para
realizar um desenvolvimento espiral e contínuo, no sentido de um retorno ao
início para repetir o caminho para verificar e superá-lo.
As premissas apresentadas pelos autores permitem compreender a cons-
trução de uma análise crítica da paisagem, uma vez que seu processo de percep-
ção se cruza com a simples prática de ver e sentiro que é relevante para agregar
ferramentas diversificadas ao método proposto, tais como: deriva, observação,
mapas, fotos, croquis, entrevistas, etc., que podem ser atribuídos a cada fase
descrita, complementados pelas abordagens voltadas às intervenções urbanas de
autores como Kevin Lynch, Gordon Cullen e Maria Helena Kursdorf Delve no
método adequado, criar procedimentos consistentes que favoreçam a inter-rela-
ção entre teoria e prática.
É um processo complexo que exige do profissional um olhar atento ao
problematizar essa visão geográfica de sua análise: essa atitude permite a in-
trodução de novos objetos nos arranjos cidade-regionais, tornando os lugares
pontos reais. de apoio à construção de paisagens e mais espaços cívicos.
3. CONCLUSÃO
208
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Saberes e Partilhas
4. REFERÊNCIAS
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209
AULA DE METODOLOGIA DA PESQUISA:
PARA ALÉM DA INSTRUMENTALIZAÇÃO
Marcos dos Reis Batista1
1 Mestre em Letras pela Universidade Federal do Pará (UFPA). É docente de Estudos Lin-
guísticos e Metodologia científica na Faculdade de Letras da UFPA. Atualmente é douto-
rando no Programa de Pós-Graduação em Linguística e Literatura da Universidade Fede-
ral do Norte do Tocantins (UFNT).
2 Texto original: ¿Qué hay de cierto? ¿Qué es lo estático? ¿Qué es la permanencia? ¿De certe-
za a certeza o la certeza de la duda? ¿Quién tiene la razón? ¿Quién tiene la verdad? ¿Acaso
las verdades son rompecabezas a los que les faltan piezas o éstas se pueden combinar de
otras maneras?
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Saberes e Partilhas
nomenclatura, esta disciplina carece – em muitos casos – de uma maior atenção
por parte dos departamentos e, principalmente, por parte dos professores que
ministram – claro, que nem todos, pois toda generalização é abusiva – pois di-
versamente de outros elementos que compõe a chamada “matriz curricular”,
esta não se encontra em nenhum campo de estudos como as demais. Teremos
como exemplo a disciplina de didática, que supostamente deve ser ministrada
por um profissional com formação em pedagogia, ou sintaxe, ministrada por um
bacharel ou licenciado em Letras.
Outro exemplo, ao tratar do curso de Letras – indiferentemente da habili-
tação na qual o curso está destinado, seja língua primeira, segunda ou adicional
– a disciplina de fonética encontra-se no grande campo da chamada “linguística
teórica”, já os estudos da “estética da recepção” são postos no chamado campo
dos estudos literários e, assim, temos outros tantos casos disciplinares no âmbito
desta formação que é o curso de graduação em Letras em nível brasileiro.
Neste texto optamos em fazer uso do termo “metodologia da pesquisa”
por considerarmos de modo mais direto e popular acerca da disciplina que es-
tamos tratando. Assim, há de se levar em consideração que encontramos nos
cursos de Letras presos ao espectro da disciplinaridade no qual existe forte in-
fluência do paradigma tradicional que disjunta os conhecimentos e dificulta um
exercício epistemológico que colabore com uma visão ampliada e atual da reali-
dade na qual estamos inseridos.
Costumamos chamar a atenção de nossos interactantes acerca da busca
por um exercício quanto à atualidade quando afirmamos que “muda-se o calen-
dário, mas não se muda a mentalidade”. Dessa forma, não sabemos ao certo se
algum pensador na história já havia observado tal aspecto. Mas, é de fundamen-
tação importância refletirmos sobre o local e o papel da referida disciplina a qual
nos debruçamos em nossas ações docentes no âmbito formativo em que estamos
inseridos. Porém, precisamos situar nossos leitores a partir de onde e de quando
nossa inquietação nasce. Se é que podemos marcar um ponto dessa gênese para
tal comportamento.
Nosso interesse começa ainda em nível de graduação, entre as duas pri-
meiras décadas do século XXI sobre o elemento curricular “Metodologia do tra-
balho científico”. As primeiras palavras sobre esta disciplina na qual deveríamos
ser aprovados e nos serviria de base para a construção de uma pesquisa científica
chegavam nos causando tamanha curiosidade. Uma das primeiras perguntas,
entre tantas, era: O que é pesquisa? Essa era o pontapé de uma avalanche de
perguntas, tais como: “o que é método?”, “o que é metodologia?”, “o que é
ciência?”, “o que é científico?”. Em um primeiro momento com materiais e dis-
cursos provenientes de uma professora-pesquisadora, percebemos que ao tratar
211
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de ciência, seria fundamental um mergulho em um âmbito abstrato, do qual não
estávamos nem um pouco familiarizados.
O início dos estudos da metodologia da pesquisa apontava que havia uma
ruptura causada pela ausência de uma apropriação ou envolvimento com outros
saberes necessários a um olhar mais aprofundado quanto à construção científi-
co-humanística. Assim, as leituras e reflexões trazidas para a sala de aula nos
faziam notar a carência da filosofia e da epistemologia para sujeitos que cami-
nhavam em uma perspectiva formativa para docência. Essa lacuna nos motivava
a entender que a educação bancária, aquela que Paulo Freire tanto nos falou,
nos limitava a receber apenas aquilo que os professores, dentro dos engessados
currículos e controles do sistema, se viam a tratar. Olhar para trás nos causava
certa angústia ao considerar que espaços mais existenciais – como a filosofia ou
o autoconhecimento – nos causavam tamanha lacuna.
Mas, qual a importância de colocar em destaque essa lacuna? A proble-
mática trazida pela oferta da disciplina metodologia da pesquisa no âmbito de
um curso de graduação, mais necessariamente de licenciatura, nos inquietava
ainda mais por se tratar de uma formação para a Educação. Dessa forma, diante
do início dos estudos acerca das abordagens investigativas, nos deparávamos
com escritos de Pedro Demo (2017) e de Maurice Tardif (2014) que colocavam
o papel do professor como uma ação científica, ações que podem/devem cola-
borar criticamente, tendo a ciência como princípio educacional. É a partir desta
observação que a sensação do compromisso para com a sociedade se amplia e
nos deixa ainda mais integrados ao pensar a construção do conhecimento na
formação do sujeito crítico do século XXI.
Nesse âmbito, precisaríamos voltar um pouco para alguns séculos e lem-
brar que ao decorrer de sua caminhada, a Universidade começou a deixar de ser
um espaço de construção de ideias para dar lugar a um espaço muito mais pro-
fissional. O espaço privilegiado para servir de palco às grandes discussões, hoje
abre lugares muito mais voltados para um conhecimento utilitarista do que para
um conhecimento existencialista. Morin (1988) já apontava para a importância
de a humanidade repensar sobre a construção de um conhecimento que ultra-
passe divisões disciplinares e que auxilie a superar seus desafios e demandas.
A falta do reconhecimento dos fatores filosóficos e históricos comprome-
tem significativamente a formação de futuros professores e, não apenas destes,
mas de todo e qualquer sujeito que se deseja ter uma construção crítico-humanís-
tica. Entender os possíveis e potenciais papéis dos quais podemos desenvolver e
ter colaboram consubstancialmente com a chamada “mudança de pensamento”
da qual Morin nos orienta em seus mais variados trabalhos. Essa tomada de
consciência por meio desta mudança torna-se uma via para o entendimento do
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Saberes e Partilhas
jovem ao entender que a ciência, assim como outros saberes, contribui para a
manutenção e bem-estar da condição humana, ajudando a preservação planetá-
ria e prezando pelo respeito à dimensão ecológica.
Uma tomada de consciência deve ser entendida aqui não como uma sim-
ples ação na qual deve-se listar o que devemos fazer para o desenvolvimento hu-
mano. Mas, uma profunda reflexão diante do que se pode entender por ser hu-
mano. Assim, citamos o trabalho de Laszlo (2001) no qual o pensador húngaro
aponta para a macrotransição, um macroconceito do qual podemos pensar acerca
da necessidade de atitudes que colaboram com uma mudança de pensamento na
qual o ser humano reconhece no outro a sua fraternidade. Assim, apresentamos
dez princípios da vida responsável e da ética planetária: 1) Atendimento às suas
necessidades básicas e deixe que os outros tenham o mesmo direito; 2) Respeito ao
direito dos outros de viver e se desenvolver; 3) Respeito ao direito à vida de todas
as coisas que existem na Terra; 4) Busca à felicidade conservando a Natureza e
permitindo que os outros possam fazer a mesma coisa; 5) Exigência do governo
para uma atitude de paz e cooperação com os outros povos e países; 6) Exigência
de empresas com o interesse verdadeiro por toda a sociedade e pelo meio ambien-
te; 7) Exigência que os meios de comunicação divulguem informações confiáveis,
para que os sujeitos possam tomar decisões corretas sobre saúde, desenvolvimento
e futuro; 8) Abertura do espaço na vida para ajudar os que estão em dificuldades
a viverem com dignidade ajudando a preservar ou a restaurar os equilíbrios essen-
ciais do meio ambiente; 9) Reconhecimento da união essencial da humanidade
como uma família planetária aceitando e apreciando as diferenças individuais e
culturais para perceber que a consciência de que o planeta é a casa de todos sendo
vital para a sobrevivência da humanidade no século 21 e; 10) Apoio aos outros
a se desenvolverem para que possam tomar decisões corretas sobre as questões
importantes que decidirão o futuro da humanidade.
Estas 10 orientações indicadas por Laszlo podem nos ajudar a atender a tal
urgente e necessária mudança de tanto necessitamos para perceber que o mundo
do qual tratamos em nosso percurso formativo em uma sala de metodologia da
pesquisa está aquém de toda e qualquer classificação de tipos de pesquisa.
A percepção e o entendimento das orientações trazidas por este pensador
podem colaborar significativamente com um olhar que vai além da taxonomia
dos métodos e técnicas de pesquisas que muitas vezes são tratados como os úni-
cos aspectos a serem conhecidos e discutidos no âmbito da referida disciplina.
Voltando mais especificamente para o processo disciplinar, a metodologia
da pesquisa visa dar elementos e subsídios aos estudantes sobre o que é e como
se faz uma pesquisa científica, ou mais especificamente uma pesquisa no âmbito
do curso no qual o acadêmico se encontra. Assim, um estudante de enfermagem
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tende a se deparar com orientações metodológicas bem diversas daquele estu-
dante de um curso de economia, por exemplo. Nesse momento, notamos a au-
sência de um possível diálogo no qual diferentes campos não interagem, apesar
de fazerem parte do espaço humano. Um olhar que ultrapasse os fantasiosos
limites disciplinares criados ao decorrer dos séculos na academia colaboraria – e
muito – com uma visão crítica mais apurada, fazendo com que os sujeitos pu-
dessem superar uma visão disjuntiva e aglutinar conhecimentos que facilitariam
o entendimento, a reflexão, a percepção e a construção da realidade.
Dar início à caminhada da disciplina metodologia da pesquisa partindo
dos estudos filosóficos nos mostra uma interessante ação considerando a neces-
sidade de colocar em relevo que nada parte do “por acaso”, que existe toda uma
construção ao decorrer dos séculos que colaborou e colabora com a formação
do homem/mulher atual. Sendo assim, o sujeito ao se deparar com um passado
– que não é tão recente assim – mergulha em um oceano de ideias que lhe dar
um horizonte de inquietações buscando colaborar significativamente com seu
desenvolvimento humanístico.
Esse retorno aos estudos clássicos, tais como Grécia e Roma, à Idade
Média e a outros momentos da caminhada da sociedade nos ajuda a entender as
inquietações e aos desafios tratados pela humanidade diante de tantos obstácu-
los nos quais serviram de motivação para superar lacunas. A ciência não apenas
serviu e serve para dar conforto e bem-estar ao homem, mas também coloca
determinados grupos sobrepostos aos outros, visto que descobertas científicas
atribuem valor e poder a determinados grupos fazendo com que ocorra uma
dependência tecnológica entre diversos sujeitos.
No momento inicial da produção deste ensaio enfrentávamos ainda a cri-
se pandêmica do novo coronavírus que teve início em meados do final do ano
de 2019, e em um espaço de quase dois anos tivemos a corrida por parte de
laboratórios em diversas nações para a produção de imunizantes, não apenas
para salvar vidas; mas, também, para se superar como instituições de pesquisa.
Diante da problemática ocasionada por uma pandemia que ceifou milhões de
vidas e afetou outros tantos milhões, não podemos criar uma visão romântica
de que é belo a produção de vacinas e, sim, ter a consciência de que se trata de
uma ação de compromisso científico e econômico no qual aqueles que investi-
ram em conhecimento colheram frutos e a outros cabe apenas pagar por esses
frutos. Enquanto que alguns países investem em energia nuclear ou em material
bélico, outros se desdobram para superar suas limitações estruturais buscando
o bem-estar das suas populações. A referida crise mostrou bem quais governos
estão compromissados com o bem-estar de suas populações e quais são aqueles
que apresentam propostas duvidosas.
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Saberes e Partilhas
Ter uma visão ampliada da situação na qual nos deparamos e entender
que falar de fazer pesquisa não é apenas aprender a taxonomia existente nos
manuais de metodologia da pesquisa é fundamental pois em muitos casos, há
uma preocupação com o acadêmico que deve ou precisa saber qual a diferença
entre as diversas abordagens, tais como qualitativa, quantitativa e mista, se a
pesquisa será básica ou aplicada, se será descritiva, exploratória ou seja lá o que
for. O espaço do referido elemento curricular é visto como um momento no qual
o professor deverá oferecer – e por que não afirmar em “dar” – todo e qualquer
orientação que suporte o entendimento quanto ao fazer pesquisa. Porém, outros
aspectos devem ser levados em conta quando se pensa neste processo que se refe-
rem ao ensino e à apropriação da escrita acadêmica e às orientações das normas
de formatação/apresentação de trabalhos acadêmicos.
É de nosso conhecimento que diversas associações e instituições criaram
normativas para a apresentação dos trabalhos acadêmicos em nível tanto inter-
no (nas próprias instituições) quanto externo (o caso dos periódicos científicos).
Assim, podemos citar a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a
American Psychological Association (APA) e o International Committee of
Medical Journals Editor (ICMJE) como instituições que definem características
estruturais que devem ser levadas em conta na digitação/apresentação dos manus-
critos dos textos científicos. É válido destacar que nenhuma destas tem poder de
lei, ou seja, os centros universitários fazem uso dessas normas de modo voluntário.
Na atualidade, as referidas normas têm sido usadas de modo automático
pois já são oferecidos alguns aplicativos dos quais podem automatizar a organi-
zação de um trabalho acadêmico. Apesar deste aspecto, ainda nos deparamos
com docentes que ministram aulas de metodologia da pesquisa nas quais tratam
apenas desta instrumentalização para o alunado. Diante de uma mecanização
do texto acadêmico, o estudante acaba perdendo a oportunidade de pensar acer-
ca do teor crítico e humanístico que pode tratar em suas reflexões. De acordo
com Marcuschi (2008), o texto é muito mais do que um estilo de língua no
qual ideias são apresentadas pois é válido considerar toda a sua construção e
intenção já que as palavras por si só não estão vazias de sentido e muito menos
se resumem a uma certa beleza estilística.
As normas para trabalhos acadêmicos, basicamente, orientam os estudan-
tes quanto ao tipo e tamanho de fonte, margens, como distribuir os textos e as
apresentações de citações direta e indireta e as referências completas dos mate-
riais que serviram de base para a pesquisa apresentada. Detalhes pontuais e es-
truturais que muitas vezes um dado profissional pode ser facilmente consultado
ou contratado. Notamos, então, que perdemos a oportunidade de colocar em
voga aspectos mais relevantes da formação docente em aula de metodologia da
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pesquisa quando nos deparamos com aspectos pontuais.
Ir além do simples aspecto disciplinar colabora com uma formação de
um futuro docente que não apenas precisará das orientações da metodologia
da pesquisa para a construção de um trabalho final de curso que necessita ser
construído com o intuito de servir de feedback por parte do acadêmico para
mostrar para a sociedade o que este estudou ou para que o referido estudante
saiba produzir de modo consistente – mesmo que simplório – um artigo cientí-
fico ou projeto de pesquisa no qual possa ser aprovado para galgar novos níveis
de formação científica.
Essa visão disjuntiva não é mais suficiente para que nas aulas de meto-
dologia da pesquisa o estudante possa desenvolver um olhar crítico diante da
complexa e líquida realidade (BAUMAN, 2001) em que nos encontramos no sé-
culo XXI. Assim, a transdisciplinaridade, fruto do paradigma da complexidade,
é um conceito, um princípio epistemometodológico (MORIN, 2015), que busca
construir novos modos de compreensão da relação sujeito/sociedade/natureza
na contemporaneidade e colaborar consubstancialmente com a formação que
ultrapassa as reflexões e percepções do novo professor. Enquanto que no século
XX a concepção de homem era de ser histórico e sociocultural, Morin ampliou
esta considerando o homem como ser histórico, social, cultural, mas também
biológico, cognitivo, pleno de subjetividade, psicoafetivo e enigmático, um ser
de razão, emoção e corporeidade.
A partir desta percepção, é válido considerar que a epistemologia da com-
plexidade compreende a realidade como sendo multidimensional dada a sua
constituição complexa (todo e partes) e o conhecimento construído como uma
reconstrução do sujeito por meio de seu nível de percepção da realidade. Com
isso, ao reconhecer o sujeito diante de uma dimensão complexa, devemos en-
tender a dinâmica na qual esse se encontra em volta às demandas de um mundo
cada vez mais dinâmico e integrado. Assim, é de considerar que tudo está inter-
ligado pois em um dado acontecimento do outro lado do globo, rapidamente ou-
tras partes do planeta tomam consciência do que está acontecendo, fazendo com
que os sujeitos em uma sociedade cada vez mais líquida se mostrem integrados
quanto aos mais variados desafios do século XXI (BAUMAN, 2001).
Quando pensamos em uma aula de metodologia da pesquisa, não faz
mais sentido pensar em um espaço que instrumentaliza os estudantes ao infor-
mar tipos de fontes ou margens ou apenas a taxonomia dos tipos de investigação
em uma abordagem qualitativa, quantitativa ou mista. Nesse âmbito, é preciso
transgredir todo e qualquer pensamento que mantenha uma visão redutora e dis-
juntiva da realidade pois o discente da atualidade não se encontra mais em um
espaço fragmentado. Ele está envolto em um mundo rodeado de altos e baixos
216
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
no qual a incerteza faz parte de cada passo e que a cada dia velhos e novos de-
safios se mostram e se desdobram na complexa sociedade na qual está inserido.
Ir além das antigas ideias tratadas nos currículos da disciplina metodolo-
gia da pesquisa torna-se um grande desafio que hoje pode ter por base os estudos
da epistemologia da complexidade e da transdisciplinaridade. Tais âmbitos nos
ajudam ao desafio de superar uma visão redutora e ultrapassada contribuindo
para que o jovem acadêmico possa ampliar sua percepção científica. Assim,
Suanno (2015) nos brinda com interessantes orientações que nos ajudam a pen-
sar em uma didática em uma dimensão complexa e disciplinar que ajuda com
a desconexão de um percurso tradicional e colabore significativamente com as
reais necessidades acadêmicos do século XXI.
A didática, na perspectiva complexa e transdisciplinar, visa:3 1)
Reintroduzir o sujeito cognoscente no processo de aprendizagem, no processo de
produção do conhecimento e na transformação do seu estilo de vida com o intui-
to de potencializar a capacidade de sentir/pensar/agir complexo; 2) Possibilitar
o autoconhecimento, a autocrítica, a tomada de consciência e autopoiése, por
meio de pesquisas e reflexões por meio de narrativas contextualizadas, histórias
de vida e histórias de formação, visto que se compreende o conhecimento como
autoconhecimento contextualizado; 3) Estudar o destino multifacetado do ser
humano, ou seja, o destino da espécie humana, o destino individual, o destino
social, o destino histórico, de modo entrelaçado e inseparável. Afim de pro-
mover a ampliação dos níveis de percepção do sujeito para que este se perceba
como sujeito multidimensional, que também é sujeito planetário. E assim, mobi-
lizá-lo por interesses coletivos planetários, qualificando o para pensar e agir em
prol do bem comum, da cidadania planetária, da dignidade humana, da paz, da
justiça social, da qualidade de vida sustentável no planeta Terra, e dessa forma
buscar se afastar desses tempos de individualismo, desapego e desamparo social
da modernidade líquida (BAUMAN, 2001); 4) Compreender que a significação
e a complexidade são relações simultaneamente antagônicas e complementares;
5) Reconhecer a pluralidade cultural, a multiplicidade de vozes e olhares na pro-
dução e disseminação do conhecimento nos mais diversos âmbitos; 6) Religar
cultura científica e cultura das humanidades, no intuito de ampliar a capacidade
de reflexão crítica e complexa sobre a realidade e a condição humana (ecolo-
gia dos saberes); 7) Educar para a resiliência frente a incerteza cognitiva e a
incerteza histórica, comprometendo-se com o presente e pensando prospectivo;
8) Promover a estratégia didática sentirpensar (MORAES; LA TORRE, 2018)
que mobiliza conjuntamente razão, emoção e corporeidade e possibilita a emer-
gência de novas relações com o conhecimento, com a natureza, as culturas e a
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transcendência; 9) Trabalhar a multidimensionalidade humana a partir de estra-
tégias de aprendizagem que envolvam não apenas os aspectos cognitivos, racio-
nais e técnicos, mas também os aspectos afetivos, simbólicos, intuitivos, míticos,
ou seja, as múltiplas vias que dão sentido e significado a existência humana; 10)
Promover processos e ensino com pesquisa, bem como processos e ensino com
pesquisa e extensão, a fim de construir metapontos de vista, metaconceitos e prá-
xis complexa e transdisciplinar; 11) Criar ambientes de aprendizagens saudaves,
ativos, interativos, auto-eco-organizadores, dialógicos, colaborativos, solidários,
de modo a favorecer o trabalho coletivo, a autonomia dos grupos e dos sujeitos
e que produza ecologia dos saberes e pensar complexo; 12) Criar representações
visuais de conceitos e dinâmicas de interação (fluxos, recursões, retroações, cir-
cuitos) que atendam a finalidade didática de construção do conhecimento trans-
disciplinar; 13) Favorecer processos de autoformação, heteroformação e ecofor-
mação; 14) Relacionar ciência, docência e consciência visando a ampliação da
capacidade de percepção e de ação docente; 15) Desenvolver a empatia, a escuta
sensível e o diálogo afetivo no processo didático e; 16) Promover metamorfose
social, individual e antropológica (MORIN, 2013), que permita transformar e
recriar o ser, a realidade e o conhecimento.
A listagem de aspectos trazidos por Suanno (2015) é uma composição de
intenções que geram interesse de nossa parte no âmbito formativo de modo a
constituir procedimentos de uma pesquisa futura na qual se pensa em colocar
em relevo tais orientações. Para tanto, tais indicações tem a função de nos fazer
pensar em um caminho a ser projetado para ações próximas.
O presente texto teve o intuito de apresentar algumas inquietações e obser-
vações acerca do ensino e da apropriação no âmbito disciplinar de metodologia
da pesquisa com foco em um curso de licenciatura. Partimos nossa inquietação
observando aspectos concernentes da época de graduandos, passando pelas la-
cunas das quais ainda nos fazem refletir sobre determinadas necessidades que, se
sanadas, podem colaborar com um percurso formativo que colabore com um fu-
turo profissional da educação que tenha uma visão complexa e transdisciplinar,
que ultrapasse uma olhar disjuntivo e redutor pois a sociedade na qual estamos
inseridos cada vez mais coloca em evidência a necessidade de uma integração
ainda maior diante dos desafios do homem contemporâneo.
REFERÊNCIAS
BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.
CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão dos sistemas vivos. São
Paulo: Cultrix, 2002.
218
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Saberes e Partilhas
DEMO, P. Pesquisa – princípio científico e educativo. São Paulo: Cortez, 2017.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. 58. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1997.
IÑIGUEZ, M. Relexiones sobre la creatividad. 2001. Disponível em: https://
neuronilla.com/reflexiones-sobre-creatividad-marga-iniguez/. Acesso em: 20
jun. 2022.
LASZLO, E. Macrotransição – O desafio para o terceiro milênio. São Paulo:
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São Paulo: Parábola, 2008.
MORAES, M. C.; DE LA TORRE, S. Sentipensar. Fundamentos e estratégias
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MORIN, E. O método 1 – A natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, 2016.
MORIN, E. O paradigma perdido. Rio de Janeiro: Europa-América, 1988.
SUANNO, M. V. R. Educar em prol da macrotransição: emerge uma didática
complexa e transdisciplinar. In: BEHRENS, M. A.; ENS, R. T. (org.). Com-
plexidade e transdisciplinaridade: novas perspectivas teóricas e práticas para a
formação de professores. Curitiba: Appris, 2015. p. 199-213.
TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes,
2014.
219
RELATO DE EXPERIÊNCIA EM TUTORIA
EM UMA SALA DE ARTICULAÇÃO DO
PROJETO PIBID VIVENCIADO POR UMA
ACADÊMICA DO CURSO DE PEDAGOGIA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Eliani Silveira Viana1
Marlene Gonçalves2
1 INTRODUÇÃO
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Josane Oliveira Nascimento de Oliveira, que tem como função, professora de
em uma sala de articulação denominada de laboratório de aprendizagens em
uma escola pública na cidade de Cuiabá-MT cuja função na escola ficou deter-
minada e denominada de “professora articuladora”.
Para que esta função seja exercida necessita de uma sala denominada
“sala de articulação” autorizada pela Portaria Nº 586/10/GS/SEDUC/MT:
Dispõe dos critérios para atribuição do professor articulador e professor da
sala de recursos multifuncionais das Unidades Escolares da Rede Estadual
de Ensino considerando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
nº. 9.394/96 e Lei Complementar nº. 49/98; considerando ainda as
Resoluções do Conselho Nacional de Educação e do Conselho Estadual
de Educação de Mato Grosso que defini critérios para atribuição de clas-
ses e/ou aulas nas funções de professor articulador, de professor da sala
de superação e de professor da sala de recursos multifuncionais in https://
www.cuiaba.mt.gov.br/upload/arquivo/13%20-%20PORTARIA%20
%20586.pdf, acesso em 21/08/2019.
222
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2. LABORATORIO DE APRENDIZAGENS
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Saberes e Partilhas
anterior e ainda, qual a melhor metodologia a ser aplicada em cada atividade
que seria desenvolvida com os alunos de acordo com as suas necessidades.
No momento de iniciar as atividades de articulação a docente responsável
pelo laboratório se dirige a cada uma das salas convocando os alunos e orientan-
do-os que se dirijam à sala especificada a fim de dar início às aulas diversificadas.
Ressaltamos ainda, que alguns alunos se sentiam incomodados por serem chama-
dos ao horário de aula já que os colegas faziam chacota com eles por considerem
que os mesmos estariam em condições inferiores de aprendizagem se comparando
ao nível de aprendizagem dos demais alunos da mesma turma.
Outras metodologias aplicadas foram jogos matemáticos com as quatro
operações: cada estagiária ficava com uma dupla de alunos que competiam entre
si e aquele que obtivesse o maior número de acertos era o vencedor da rodada
e assim, trocavam de pares ficando vencedor com vencedor para nova rodada.
A alfabetização matemática é bastante privilegiada no projeto o que de-
monstra ser essa a maior dificuldade dos alunos nessa escola. Entretanto, ainda
tem as crianças com dificuldades de leitura e escrita.
Entre as diversas atividades que desenvolvidas foram pelas acadêmicas do
projeto Pibid destacou-se: Leitura de textos e encontrar palavras com as letras:
Z, X, CH e SC, Banco de palavras e produção de 4 frases criativas, Leitura com
o temporizador (ampulheta) que foi confeccionado pela professora com material
reciclado (garrafas pet).
Desenvolvemos ainda, atividades de gramaticais com a escrita de frases
com as sílabas sa, se, si, so, su. As atividades eram desenvolvidas com textos
soltos e não se utiliza de uma leitura mais complexa.
Atividades de reforço como multiplicação, adição, subtração e divisão são
desenvolvidas de acordo com o grau de aprendizado de cada aluno e as crianças
fazem uso do material dourado para auxiliá-los nas aprendizagens. O desenvol-
vimento da superação nas aprendizagens da matemática mostrou-se satisfató-
rios pela professora articuladora que segundo nos relatara os professores de área
consideraram satisfatório o desempenho dos discentes após a inserção deles na
articulação.
Ao final do ano letivo foi realizada uma formatura simbólica com os/
as estudantes participantes do projeto de articulação realizando uma breve ce-
rimônia e uma festinha em comemoração que foi extremamente satisfatória e
significativa para os discentes que desejavam a superação de suas dificuldades e
assim, esse momento culminou com a frase: “Dispensados da Articulação”, os
alunos receberam ainda, um certificado simbólico.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Saberes e Partilhas
cidadania e superação dos desafios impostos na vida dos/das discentes bem
como dos/das docentes.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Frade e Nóbrega in https://novaescola.org.br/conteudo/17568/o-be-a-ba-dos-
-metodos-de-alfabetizacao. Acesso em 20/09/2019.
Gomes, Delarim Martins, Gestão Pedagógica e seus os Mecanismos, Escola de
Gestores da Rede Municipal de Cuiabá-MT, 1ª Edição, 2019, in https://drive.
google.com/file/d/1adTIjBKw1Wn-caZ9BeX43KuoXgYLeLwh/view, acesso
em 24/08/2019.
Nóvoa, (2003, p. 5) in Araújo, Ramos e Soares (2015).
Paro, Vitor Henrique, Diretor Escolar, educador ou gerente? 2015, p. 67, Ed.
Cortez, 1ª Edição.
Portaria Nº 586/10/GS/SEDUC/MT http://www.cuiaba.mt.gov.br/upload/
arquivo/13%20%20PORTARIA%20%20586.pdf.
BRASIL, Ministério da Educação MEC, 2019. in http://portal.mec.gov.br/
pibid acessado em 10/09/2019.
BRASIL, Ministério da Educação MEC, 2019. in http://portal.mec.gov.br/
pibid, acessado em 10/09/2019.
BRASIL, DECRETO Nº 7.219, DE 24 DE JUNHO DE 2010. https://www.
ufmt.br/noticias/ufmt-conquista-642-bolsas-para-pibid-e-residencia-pedagogi-
ca-1591211177 acesso em 10/09/2019.
227
A IMPORTÂNCIA DA ARTETERAPIA
NAS PRÁTICAS INTEGRATIVAS E
COMPLEMENTARES DE SAÚDE
Elizabete Adelaide da Silva1
Dirce Maria da Silva2
1 INTRODUÇÃO
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da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares de Saúde4 apro-
vada pela Portaria GM/MS nº 971, de 3 de maio de 2006. Em 2015 houve a
aprovação da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no
SUS: atitude de ampliação de acesso (PNPICS-SUS, 2015).
As Práticas visam prevenir doenças como depressão, hipertensão e trans-
tornos diversos, auxiliando na promoção da qualidade de vida e manutenção
do bem-estar. Em alguns casos podem ser usadas como tratamentos paliativos
para algumas doenças crônicas. Os atendimentos começam na Atenção Básica,
principal porta de entrada para o SUS. Suas ações são direcionadas à garantia da
integralidade no atendimento, um dos três pilares de sustentáculo do SUS, vol-
tado para atenção à saúde básica e promoção da humanização do atendimento
integral ao usuário (BRASIL/PNPICS, 2015; ROSEGHINI, 2019).
O desenvolvimento das PICS está ancorado em racionalidades diferen-
tes dos modelos mecanicista, racionalista e reducionista, e conforme Roseghini
(2019), envolve conceitos filosóficos ampliados sobre a compreensão do proces-
so saúde-doença e a promoção global do cuidado e do autocuidado, pois elas são
compreendidas como abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais
de prevenção de agravos e recuperação da saúde.
Atualmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece 29 procedimen-
tos de Práticas Integrativas e Complementares à população. Estão dentre elas
a Medicina Tradicional Chinesa, a Homeopatia e a Medicina Antroposófica,
além de outros recursos terapêuticos que respondem a uma visão ampliada do
processo saúde-doença, com vistas à promoção global do cuidado (PNPICS,
2015; ROSEGHINI, 2019; SILVA E SILVA, 2022, p. 26).
Em relação às diretrizes das PNPICS para o SUS, são enfatizadas, dentre
outras:
(I) A prevenção de agravos e a promoção e recuperação da saúde, com ênfase na
atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em
saúde; (II) a contribuição ao aumento da resolubilidade e a ampliação do aces-
so, garantindo qualidade, eficácia, eficiência e segurança no uso; (III) a promo-
ção e racionalização das ações de saúde; (IV) o estímulo das ações de controle/
participação social, promovendo o envolvimento responsável e continuado dos
usuários, gestores e trabalhadores da saúde (PNPIC/SUS/MS, 2006).
4 Políticas Públicas: Não há uma conceituação única para o termo. Mead (1995) a define
como campo dentro do estudo da política que analisa o governo à luz de grandes questões
públicas e Lynn (1980) como um conjunto de ações do governo que irá produzir efeitos
específicos. Peters (1986) segue o mesmo veio: política pública é a soma das atividades dos
governos, que agem diretamente ou por delegação, e que influenciam a vida dos cidadãos.
Políticas Públicas associam diversas áreas de estudos, dentre elas a Administração Pública
e a Ciência Política, Sociologia, Antropologia, Relações Internacionais, Direito, Psicolo-
gia Social, Demografia, Economia e a História, uma vez que a natureza de seu objeto é
multidisciplinar (In: SILVA, 2017, p. 56).
230
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
Nesse sentido, as Práticas Integrativas vêm juntar-se à oferta de serviços,
numa perspectiva holística, não excludente, com vistas à promoção, além do
cuidado, da prevenção de agravos e tratamento de doenças.
A Coordenação Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, na
apresentação de seu Relatório de Gestão 2006-2010, informa que a OMS avaliou
os índices de utilização, investimentos em pesquisas, características de consumo
e a institucionalização das PICS nos últimos dez anos, e estabeleceu metas para
a ampliação de sua utilização na Atenção Primária à Saúde (BRASIL, 2010, p.
4; RODRIGUES, 2011).
É importante salientar que as PNPICS no Brasil são reconhecidas
internacionalmente pela OMS como experiência de referência na implantação
de medicinas tradicionais e complementares em um sistema nacional de saúde,
sendo esse um dos principais motivos pelos quais essas práticas são incorporadas
de forma integral e não apenas como formas de estrutura alternativa ao SUS
(GODOY & DITTRICH, 2018; ROSEGHINI, 2019).
Por conseguinte, em 2015 houve a inclusão da Ayurveda, da Biodança,
Dança Circular, Meditação, Musicoterapia, Naturopatia, Osteopatia,
Quiropraxia, Reflexoterapia, Reiki, Shantala, Terapia Comunitária Integrativa e
Yoga, na PNPICS/2015, tornando-as novas modalidades da política nacional.
Em seguida, a Portaria Ministerial GM/MS nº 849/2017 ampliou ainda
mais a oferta de práticas integrativas, incluindo também no rol de novas ofertas,
a Arteterapia, modalidade apta a cuidar do ser humano em sua totalidade, em
consonância com a visão integrativa e complementar da nova cultura voltada
para a grande área médica.
231
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B runa B eatriz da R ocha | R ebeca F reitas I vanicska (O rganizadores )
em si mesma (foco no processo criativo, no fazer) ou na análise/investi-
gação de sua simbologia (arte como recurso terapêutico), que utiliza ins-
trumentos como pintura, colagem, modelagem, poesia, dança, fotografia,
tecelagem, expressão corporal, teatro, sons, músicas ou criação de perso-
nagens, usando a arte como uma forma de comunicação entre profissional
e paciente, em processo terapêutico individual ou de grupo, numa pro-
dução artística a favor da saúde (BRASIL/MS/PNPICS/GLOSSÁRIO
TEMÁTICO, 2022).
232
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
busca do valor terapêutico dos tratamentos, legou inestimáveis pesquisas para o
campo da Arteterapia no país.
Por conseguinte, de acordo com as bases analíticas psicológicas jun-
guianas, através da arte o homem comunica de forma simbólica o que está no
seu consciente e inconsciente, por meio de técnicas e de expressões criativas,
e, nesse sentido, desenvolveu-se a abordagem terapêutica da Arteterapia, fun-
damentada nos campos da Psicologia, da Filosofia e da Arte, principalmente
(SCHAMBECK, 2004).
O Criativo é o fator que alimenta cada fase do trabalho com ambiência, com
a exploração das sensações, por meio dos materiais expressivos, pela motivação,
pelo acolhimento, mobilizando a energia psíquica do indivíduo para o “fazer”, de
modo que “a cada produção expressiva que transforma um material, “analoga-
mente aconteçam transformações no nível psíquico” (PHILIPPINI, 2000, p. 20).
Isso se dá por que “através da expressão artística, o indivíduo pode pro-
duzir imagens que representam seu mundo interior ou exterior e sua maneira de
percebê-lo” (SANTANA, 2000). De acordo com Maira Sei (2011), a estratégia
de intervenção arteterapêutica visa,
Promover qualidade de vida ao ser humano por meio da utilização dos re-
cursos artísticos advindos principalmente das Artes Visais, mas com aber-
tura para um diálogo com outras linguagens artísticas. Foca-se o indivíduo
em sua necessidade expressiva e busca-se ofertar um ambiente propício ao
surgimento de uma expressividade espontânea e portadora de sentido para
a vida (SEI, 2011, p. 7-8).
234
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
e suporte para a interpretação da realidade, assim como para a exposição de
afetos, desafetos e da cognição, ajudando, inclusive, na promoção da integração
corpo e mente.
No processo de criação estão presentes experiências vividas pelas pessoas,
suas fantasias, ideias, desejos, pensamentos, angústias, experiências que podem
ser externadas por meio dos recursos artísticos em contextos terapêuticos. Assim,
conforme Ruy de Carvalho e Ciornai, a Arte é terapêutica. O processo do fazer
artístico tem o potencial de cura quando o cliente é acompanhado pelo artetera-
peuta6 que com o paciente/cliente constrói uma relação que facilita a ampliação
da consciência e do autoconhecimento, possibilitando mudanças na autoestima
e no autocuidado (CARVALHO, 2000; CIORNAI, 1995; CIORNAI, 2004, p. 7).
É necessário, portanto, o conhecimento acerca das relações entre Arte,
Psicologia Analítica e expressão criativa, sob o olhar da Arteterapia, com toda sua
vasta gama de investigação e contribuição, enquanto área de conhecimento que
ganha cada vez mais visibilidade acadêmica e profissional, com vistas ao equilí-
brio, autoconhecimento, autoestima, ajustes emocionais e capacidade de enfrenta-
mento aos mais diferentes conflitos internos das pessoas e das relações humanas.
De acordo com excerto do Projeto de Lei que regulamenta a profissão do
Arteterapeuta, “a implementação da Arteterapia se traduz em uma forma eficaz
para resolução de conflitos pessoais. Traz a possibilidade da catarse emocional,
de forma direta e não intencional, desenvolvendo programas de prevenção, pro-
moção da saúde e qualidade de vida” (BRASIL. PL Nº 3.416/2015).
Mediante isso, vê-se que, por meio do exercício da expressividade artística
e pessoal, os clientes podem observar novos sentidos, percepções, divertirem-se,
promover uma reforma íntima, uma busca de si, desenvolvendo, pelo entendi-
mento, atitudes de maior resistência, e mais esperança.
4 CONSIDERAÇÕES
235
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psicológicas, sociais e espirituais, dimensões que contribuem para o surgimento
de patologias. Esse paradigma emergente é também chamado de Holismo.
O paradigma holístico, do grego holos nos reporta a um reencontro univer-
sal entre as ciências e tradições de sabedoria, que nos dá a ideia das propriedades
de um sistema coeso e efetivo. Nesse sentido, deixamos aqui um pensamento de
Fernando Pessoa, que nos diz: “Para ser grande, sê inteiro; nada teu exagera ou exclui.
Sê todas as coisas. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda
brilha. Porque alta vive.”
O enquadramento arteterapêutico representa, dessa forma, significativa e
necessária importância voltada para uma maior compreensão de aspectos subja-
centes ao desenvolvimento humano; de novas técnicas para a promoção da saú-
de, que nos auxiliam a sair da perspectiva reducionista, de vertente unicamente
curativista e caminhar para a prevenção, o cuidado e o autocuidado, objetivo
que pode ser alcançado pelas Práticas Integrativas Complementares de Saúde,
promovendo-as também em ambientes de trabalho, escolas e universidades.
É importante salientar que as Práticas Integrativas e Complementares não
substituem o tratamento tradicional. Elas são um adicional, um complemento
no tratamento e devem ser indicadas por profissionais específicos conforme as
necessidades de cada caso.
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238
ENSINO DE EDUCAÇÃO FISCAL E NOTA
FISCAL GAÚCHA EM MORMAÇO-RS
Jackson Adair Gonçalves1
1. INTRODUÇÃO
240
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
ou discriminação. ( GRZYBOVSKI e HAHN, 2006, p.01).
Dentro do estudo do estado, vários outros valores fundamentais para a
formação do jovem educando são essenciais, como: cidadania, ética, discipli-
na, união, cooperação, compreensão, etc. A educação fiscal engloba diferentes
aspectos de estudo, conforme a série e etapa do estudante, ficando o professor
responsável por conduzir os conteúdos de forma apropriada.
Cabe ressaltar a educação fiscal no município de Mormaço, no interior do
Rio Grande do Sul, já é realizado a muito tempo, nos últimos 4 anos mais espe-
cificamente na disciplina de filosofia, no entanto, acontece na educação infantil
também com metodologias apropriadas para suas idades.
Correspondendo a demandas que perpassam as diferentes disciplinas do
currículo, a Educação Fiscal se expressa como um desafio educacional contem-
porâneo de grande relevância, tendo-se em vista que aborda aspectos presentes
na vida cotidiana dos educadores e educandos (BUTI e BATISTA, 2007, p. 07).
Neste contexto, várias ações são realizadas, como cursos de formações
através da receita estadual e encontros regionais. Busca-se com isso, a perma-
nente eficácia dos trabalhos em sala de aula, com a socialização dos conteúdos,
debates e apresentações.
Ainda Buti e Batista ( 2007, p. 09) afirma:
Na escola, a implementação deste desafio educacional se constitui como
prática educativa voltada para o entendimento da realidade social e dos
direitos e responsabilidades nos níveis pessoal e coletivo e a afirmação do
princípio da participação política. Compreendem a socialização de conhe-
cimentos acerca da Administração Pública, de modo especial, a tributa-
ção, a alocação e o controle dos gastos públicos, conceitos imprescindíveis
para a consciência da cidadania. O gestor escolar, os educadores, os edu-
candos, a equipe pedagógica, funcionários e colegiados reproduzem no es-
paço escolar as relações que existem na sociedade; portanto, a abordagem
da Educação Fiscal deve partir dos conteúdos historicamente acumulados
e se dar através de assuntos que mobilizam a vida dos que atuam na esco-
la, bem como da comunidade onde ela está inserida, representando suas
reais necessidades, refletidas nas relações sociais vigentes.
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Saberes e Partilhas
tudo existem impostos e regras, que coíbem o cotidiano das mesmas.
Estado é um grupo de funcionários sui generis, no seio do qual se elabo-
ram representações e volições que envolvem a coletividade, embora não sejam
obra da coletividade. Não é correto dizer que o estado encarna a consciência co-
letiva, pois esta o transborda por todos os lado. (TOMAZI Apud DURKHEIM,
2012, pg. 105).
Como alguns autores já a denominavam: “A Revolução Francesa foi
um grande marco. É considerado o mais importante acontecimento da his-
tória contemporânea. Inspirada pelos ideais iluministas; o lema “Liberdade,
Igualdade, Fraternidade” transpôs as barreias da distância e ecoou por todo o
mundo, pondo abaixo regimes absolutistas e ascendendo os valores burgueses”.
( GONÇALVES e BERGARA, 2008, p. 02).
Conforme os autores acima, a revolução francesa marcou uma época com
seu lema de “ Igualdade, Fraternidade e Liberdade” destituindo o poder do rei e
instituindo novas regras e leis, propondo uma liberdade do ser humano e igual-
dade perante as leis, o qual o rei ( no iluminismo) detinha o poder e somente ele
decidia as virtudes e absolvições.
4. CONCLUSÃO
5. REFERÊNCIAS
BUTI, Dalva Maria Bertola; BATISTA, Flávio Donizete. Educação Fiscal: Um
243
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244
O SAMBA DE ADONIRAN BARBOSA E A
DIMENSÃO CULTURAL DO DESENVOLVIMENTO
NO BRASIL: UM ESTUDO A PARTIR DAS
CONTRIBUIÇÕES DO EDUCADOR PAULO
FREIRE E DO ECONOMISTA CELSO FURTADO
Roberto Gomes Monção Junior1
Ana Enedi Prince2
INTRODUÇÃO
246
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
Celso Furtado passam a teorizar sobre a importância da centralidade da educação,
criatividade e cultura no contexto de expansão da civilização industrial.
Este estudo define como hipótese o fato de que o uso do dialeto “caipira” de
Adoniran Barbosa é intencional. O uso da variação linguística é de cunho ideológi-
co, emblemático, o que permitia ao compositor inserir-se no grupo dos alijados do
desenvolvimento do Brasil. O estudo parte da evidência que, durante os anos que
compreenderam a metade do século XIX e a primeira do século XX, o Brasil foi
certamente uma das economias que mais cresceram no mundo, Paulo Freire e Celso
Furtado observam que o povo, de modo geral, no entanto, beneficiou-se pouco des-
se crescimento, cujas benesses foram absorvidas pela classe dominante que esteve
empenhada em produzir e reproduzir as formas de vida dos países ricos. Assim,
o aumento da renda, que deveria ser orientado para as atividades reprodutivas, foi
absorvido pela modernização dos padrões de vida de uma minoria privilegiada: a
classe dominante. O Brasil não se desenvolveu, apenas se modernizou.
Do ponto de vista teórico-metodológico, a pesquisa toma como base a análise
de discurso a partir de um estudo qualitativo, levando em conta a posição do can-
cionista popular como um cronista que interioriza o conhecimento da construção
coletiva, tornando-se porta-voz de um discurso contrário à ideologia modernizante
em meados do século XX no Brasil. Em relação à cultura, reflete-se que a sociedade
em um processo de ajuste, vivenciava resignação e também oposição e resistência
aos novos padrões que estavam sendo impostos no meio urbano.
Em relação à análise das canções, este trabalho vai se valer da análise
do discurso, uma disciplina de interpretação inscrita na área da linguística.
Leva-se em consideração para essa pesquisa o seguinte postulado: ideologia que
está relacionada à história, que por sua vez se expressa através da linguagem.
(CAREGNATO, 2006).
Na perspectiva do discurso, o texto é lugar de jogo de sentidos, de trabalho
da linguagem, de funcionamento da discursividade (ORLANDI, 1983, p.204-
205). Entende-se assim o texto como um esteio, um suporte da linguagem e
passível, portanto, de interpretação.
Compreende-se que utilizar a análise do discurso como instrumento me-
todológico implica observar que todo texto traz um sentido, mesmo que este
sentido possa revestir-se de múltiplas leituras (idem).
Para Orlandi (2011), a compreensão da individualidade está incorporada
por uma condição histórica concreta das condições de sociabilidade e é dessa
maneira que se procura-se observar as canções populares nas aulas de Língua
Portuguesa. Reflete-se aqui a partir de canções que perfazem discursos heterogê-
neos sobre as vivências na cidade, no campo, em condições marcadas por uma
tensão social, os alunos reconheçam-se partícipes dessa mesma língua, dessa
247
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B runa B eatriz da R ocha | R ebeca F reitas I vanicska (O rganizadores )
mesma linguagem. Para o estudante, a canção é construtora de sentidos, de dis-
cursos e dizeres, uma manifestação cultural que compõe nossa cultura, história,
comportamentos em suas vivências. Com o uso da canção popular em sala de
aula, as discussões fluem, as interpretações dos textos ganham vida.
A canção é portadora da fala cotidiana, importantíssima para sala de aula e
para o ensino da lingua materna, é uma mistura de sons, ritmos e poesia. “A me-
lodia entoativa é o tesouro óbvio e secreto do cancionista” (TATIT, 1996, p. 11).
Em síntese, a canção popular é um instrumento discursivo sobre a cidade
e o campo e assim porta-voz do nosso povo, linguagem e língua.
Quanto ao embasamento teórico, este texto perfaz uma análise bibliográ-
fica que objetiva compreender: a) o contexto do imaginário de desenvolvimento
e de subdesenvolvimento que ocorreu no Brasil no período pós-guerras; b) as
contradições presentes no processo de industrialização no contexto centro-peri-
feria, as quais Paulo Freire e Celso Furtado passam a teorizar sobre o papel cen-
tral da educação, criatividade e cultura no contexto de expansão da civilização
industrial; c) como o Brasil, neste período em um contexto de desenvolvimento
imitativo e de opressão social, vivenciava por meio da dependência tecnológica
e financeira a regulação de suas atividades produtivas, enquanto o processo de
acumulação era posto a serviço de um ideário de modernização, de acordo com
o estilo de vida da elite; d) como a partir das canções de Adoniran Barbosa, o
discurso de certo modo homogeneizador da modernidade será deslocado para
dar lugar à voz dos “autoidentificados” e mesmo, alijados, do desenvolvimento
e do progresso, oportunizando uma reflexão acerca da importância de uma pers-
pectiva cultural para o desenvolvimento, refletindo-se a partir de Paulo Freire e
Celso Furtado, a necessidade de um desenvolvimento endógeno que tenha como
objetivo reverter a heterogeneidade social e a dependência cultural, buscando-se
superação do subdesenvolvimento do país.
DESENVOLVIMENTO
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Saberes e Partilhas
portanto, crucial para as investigações sociológicas no período). A questão que
se colocava era a da “transição para a modernidade”, sobre a qual é formulada
uma série de teorias e proposições nesse período. De fato, Octávio Ianni (2004)
observa que grande parte da produção intelectual brasileira se dedica a com-
preender e interpretar as condições de modernização brasileira. Evidentemente,
dessa pluralidade não resultam interpretações consoantes ou coerentes: o que se
tem, de fato, é “um amplo leque, no qual se encontram inclusive os que preferem
corrigir o presente pelos parâmetros passados, preconizando a modernização
conservadora” (IANNI, 2004, p. 35).
Nessa perspectiva, em relação às contradições e rupturas presentes no
processo de industrialização no contexto centro-periferia, é que Celso Furtado
passa a teorizar sobre o papel central da criatividade e cultura no contexto de
expansão da civilização industrial. De acordo com Cunha & Britto (2011, p. 17),
Celso Furtado se volta à compreensão dos processos de acumulação, expansão da
atividade industrial e relações de dependência nas áreas subdesenvolvidas, tendo
como objetivo analisar como a cultura está interligada em relação ao processo de
industrialização das áreas periféricas. Para Furtado, há dualidades no processo de
industrialização nas áreas periféricas presentes não somente quanto às práticas da
oferta, mas também quanto à demanda, gerando assim um processo contraditório
de inadequação tecnológica que resultaram em padrões de consumo e emprego in-
compatíveis com as tecnologias presentes nos centros. Celso Furtado aponta que
há um complexo círculo vicioso presente nas economias periféricas que aponta
uma dependência tecnológica e cultural dos países em desenvolvimento.
Paulo Freire, de maneira equânime, em sua obra Educação como prática
da liberdade, disserta sobre sua concepção de educação de maneira contextuali-
zada à formação histórico-cultural brasileira. Freire (1965, p.55) aponta que “o
homem é um ser de relações e não só de contatos, não apenas está no mundo,
mas com o mundo” e por isso tem um “domínio que lhe é exclusivo – o da
história e o da cultura”. O educador, em seguida, apresenta a diferença entre
integração e adaptação dos homens na sociedade, vislumbrando que integração
resulta da capacidade de ajustar-se à realidade, transformá-la, constituindo-se
assim como sujeito ativo e dotado de valor revolucionário. Para o educador, a
acomodação favoreceria um processo passivo de objetificação do homem, inca-
pacitando-o na ação de alterar a realidade. Para isso, a solução está educação
de base que poderia prover mudanças no futuro. Futuro este que Freire (1965,
p.63) denomina como “tempo de trânsito”: “é este choque entre um ontem esva-
ziando-se, mas querendo permanecer, e um amanhã por se consubstanciar, que
caracteriza a fase de trânsito como um tempo anunciador”.
Freire (1965, p.113) assinala sua preocupação em encontrar uma resposta
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no campo da pedagogia às essas condições negativas de transição brasileira: “ha-
veria de ser a de uma educação crítica e criticizadora. De uma educação que
tentasse a passagem da transitividade ingênua à transitividade crítica”.
De maneira semelhante, Cunha & Britto (2011) apontam que os proces-
sos criativos são questões-chaves do desenvolvimento na perspectiva de Celso
Furtado, pois estão intrinsecamente relacionados com as mudanças culturais e
são determinados tanto por mudanças materiais quanto imateriais da cultura,
não obstante, o processo de industrialização dos países periféricos é demarcada
por dependência cultural e tecnológica, que para Furtado seria a explicação para
o subdesenvolvimento dessas sociedades.
Ressalta Sampaio Jr (2013), que para Celso Furtado, a transferência das téc-
nicas produtivas do centro para a periferia não foi conduzida por transformações
internas de cunho cultural o que impactou consideravelmente a identidade cultu-
ral das economias periféricas, oportunizando a ausência de um centro de tomada
de decisões internas nessas economias que conduziriam ao desenvolvimento.
Segundo Furtado (1984, p. 27), a industrialização tardia brasileira foi con-
duzida no quadro de um desenvolvimento imitativo ou “mimético”, que refor-
çou tendências ao elitismo e à opressão social.
Nesse contexto de desenvolvimento imitativo e opressão social, busca-se
neste estudo ilustrar o período pós-guerras, como representativo deste contexto,
o qual cabiam às dependências tecnológica e financeira à regulação das ativida-
des produtivas, enquanto o processo de acumulação era posto a serviço de um
ideário de modernização, do estilo de vida da elite, como veremos a seguir.
DISCUSSÃO
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Saberes e Partilhas
cabalmente no de uma ou algumas de suas partes; ao mesmo tempo, entende-se
que a cultura constitui um sistema no qual a mudança e o enriquecimento são
inerentes. Sempre no marco de uma perspectiva geral, entende-se que essa mu-
dança se explica pela introdução de inovações. (RODRÍGUEZ, 2009, p. 415)
Para Rodriguez (2009), a introdução de inovações, promove uma altera-
ção em relação à coerência entre os componentes do sistema cultural, que com
o passar do tempo, pode levar a modificações e rupturas que propiciam novas
redefinições que são mutáveis entre seus componentes. Desta forma, pode-se
inferir que Celso Furtado compreende a cultura, neste contexto, como um “sis-
tema mutável” e que aceita readaptações ao longo do tempo.
À proporção em que a capacidade criativa dos cidadãos os conduz para
a geração de inovações, tanto no âmbito da cultura material quanto na cultura
não-material, põe-se assim em curso o processo de desenvolvimento. É importante
ressaltar que no âmbito da cultura material, correspondente ao progresso técnico
e à acumulação, as inovações possibilitam a geração de excedentes econômicos,
oportunizando uma renovação de perspectivas aos membros da sociedade.
A partir destas considerações, as canções de Adoniran Barbosa, aqui co-
tejadas, associam, nessa perspectiva, sua divergência com a representação de
modernidade a partir de seu lugar social. Ao fazê-lo, o discurso de certo modo
homogeneizador da modernidade será deslocado para dar lugar à voz dos “au-
toidentificados” e mesmo, alijados, do desenvolvimento e do progresso, assu-
mindo assim, uma postura desviante do ideário predominante da elite.
O caráter das canções de Adoniran Barbosa, no que se refere ao uso emble-
mático e intencional da variação linguística em suas composições retrata as classes
excluídas da sociedade. Nota-se que o compositor utilizava esse recurso para repre-
sentar e compor uma crítica às diferenças culturais presentes naquele contexto.
Para esse trabalho, leva-se em conta o caráter linguístico e grafocêntrico
do cantar e grafar do cancionista popular, que se fazia de acordo com a classe
social menos favorecida a que pertencia, a partir do seu lugar ou espaço vivido,
que no caso retratado, tratava-se das periferias.
Ressalta-se que a Língua Portuguesa falada em toda a extensão do territó-
rio brasileiro não é única, uníssona, homogênea. Não se pode apagar de nossa
língua os processos migratórios que constituíram e continuam constituindo a
história. Salienta-se que as diferentes estruturas sociais constroem formas distin-
tas de linguagem dentro do português do Brasil. (JOGAS, 2003).
Para apresentar aos alunos a grandeza e a naturalidade da composição da
língua, o docente pode preparar uma atividade em que se mostra o uso da variação
linguística por exemplo na canção “Conselho de mulher” de Adoniran Barbosa,
oportunizando aos alunos uma reflexão acerca de como a variação linguística é
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determinante para a livre escolha da situação social a que pertence o eu-lírico:
Pogréssio, pogréssio,
Eu sempre iscuitei falar
Que o pogréssio vem do trabaio
Então amanhã cedo nóis vai trabaiá
Quanto tempo nóis perdeu na boemia
Sambando noite e dia
Cortando uma rama sem parar
Agora, iscuitando o conselho da mulher
Amanhã vou trabaiá, se Deus quisé
Mas Deus num qué
Fonte: Compositor Adoniran Barbosa, 2003
Observa-se na canção de Adoniran Barbosa (2003) um aspecto crítico
quanto à massa trabalhadora, vista pelo compositor como explorada pela classe
dominante no início do século XX. Na canção Iracema (1956) de Adoniran
Barbosa, a discussão acerca do crescimento desordenado das grandes cidades,
traz à tona o papel dos alijados do seu meio urbano. Não faltam conselhos do
eu-lírico para seu grande amor, que por meio de sua fala, buscava adaptar-se à
modernidade, pois ali não pertencia.
Canção 3 – Iracema
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Há portanto nessa interpretação textual uma representação de identidade
que remete ao sentimento de pertencimento social do compositor, observada
por meio da variação linguística. A interpretação dessa canção em sala de aula,
oportuniza ao professor, diversas atividades como promoção de um debate, rese-
nhas críticas, crônicas que tratem acerca do uso da variação linguística como um
recurso linguístico que pode ser compreendido como valor ideológico e cultural
de resistência e pertencimento, valores esses enriquecedores para melhor com-
preensão da Língua Portuguesa como uma disciplina que está além do ensino
da gramática.
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atentou para a sinalização. Em termos metafóricos, o “progresso” que na com-
posição anterior tolhia a liberdade, nesta ceifa vidas daqueles inaptos a se apro-
priar do novo ambiente.
Essa “dominação cultural” de uma classe sobre a outra constitui um in-
teressante aspecto hegemônico e de exclusão social e simbólica, presentes no
Brasil em meados do século XX. Observa-se que segregação, representação e
poder relacionam-se, pois, a segregação e sua representação foram o resultado
de um processo de produção simbólica presentes no discurso urbano. A iden-
tidade do grupo segregado, assim como a diferença, estabeleceram a relação
social. Isso significa que há a necessidade de refletirmos acerca das origens de
nossa dependência: um dos principais pontos da teoria do subdesenvolvimento
à luz de Celso Furtado, “cujo campo central de estudo são as malformações
sociais engendradas durante esse processo de difusão” (Furtado, 1998, p. 47).
[...] a crise que aflige nosso povo não decorre apenas do amplo processo
de reajustamento que se opera na economia mundial. Em grande medida
ela é o resultado de um impasse que se manifestaria necessariamente em
nossa sociedade, a qual pretende reproduzir a cultura material do capita-
lismo mais avançado, privando assim a grande maioria da população dos
meios de vida essenciais. Não sendo possível evitar que se difundam, de
uma ou de outra forma, certos padrões de comportamento das minorias
de altas rendas, surgiu no país a contrafação de uma sociedade de massas
em que coexistem formas sofisticadas de consumo supérfluo e carências
essenciais no mesmo estrato social, e até na mesma família. (FURTADO,
2002, p.35-36)
Importante ressaltar que nesse processo, não houve somente tensão e dis-
puta de grupos sociais, houve também a imposição de uma cultura que se julgou
superior a outra, que deveria ser apagada, excluída.
Diante desse quadro, observa-se que se buscou reproduzir a cultura ma-
terial do capitalismo mais avançado, privando a grande maioria da população
de ser representada culturalmente. Nesse sentido, pensar opções de desenvolvi-
mento que levem em conta a superação do impasse aqui observado, exige tanto a
defesa de um processo endógeno de desenvolvimento – na perspectiva de Paulo
Freire e Celso Furtado - quanto uma articulação consistente entre esse processo
e o sistema cultural.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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A heterogeneidade social forma-se a partir de uma representação da vasta
quantidade de mão de obra de escassa produtividade, resultantes de processos
de acumulação e progresso técnico reduzidos. Nesse sentido, forma-se também
uma dinâmica social que impossibilita a melhoria das condições de vida dos
grandes contingentes de mão de obra.
Quanto à dependência cultural, esta aniquila as culturas periféricas ao
encerrá-las à civilização industrial, impedindo suas potencialidades criativas.
Nessa perspectiva, Paulo Freire aponta que a sociedade brasileira preci-
sa manter um diálogo, mantendo-se uma relação horizontal de comunicação,
oportunizando assim uma matriz crítica, resultando, segundo o educador em
criticidade, nutrindo-se de amor, humildade, esperança, fé e confiança. E assim,
O centro do desenvolvimento endógeno, à luz dos pensamentos de Paulo Freire
e Celso Furtado, fundamentam-se no estabelecimento de uma identidade cultu-
ral própria à periferia e, desta forma, admitem que se dê curso às potencialidades
criativas insertes no acervo cultural da sociedade brasileira para que se reverta a
dependência cultural.
Nesse sentido, a emergência da criatividade nas sociedades periféricas
constitui um importante instrumento para o desenvolvimento. A reversão da
heterogeneidade estrutural, por sua vez, agrega-se a uma transformação socio-
política que poderia reverter a esterilização de grandes montantes de excedente
na imitação de padrões de consumo estrangeiros, permitindo a apropriação local
dos excedentes gerados e a dinamização do mercado interno.
De acordo com Celso Furtado, as mudanças tecnológicas são essenciais
para a continuidade do processo de acumulação nos países periféricos e para
assegurar a endogeneidade do desenvolvimento nesses países, o acesso às tecno-
logias modernas não pode resultar na aceitação de valores que não articulem a
identidade cultural da periferia.
Para a efetivação do aprendizado da língua portuguesa, principalmente
quanto à condução do processo de interpretação de textos, leitura e escrita tex-
tual, é necessário que se leve em conta que a leitura textual vai além da codi-
ficação e decodificação de signos linguísticos. É um processo do qual se exige
consciência de que há na linguagem a concretização do seu uso social e que, por-
tanto, posiciona discentes e docentes em uma perspectiva sociológica e assim, a
linguagem é fruto de uma criação coletiva, histórica, social e cultural e que sua
análise oportuniza uma perspectiva que compreende a enunciação individual
como um fenômeno sociológico. Reflete-se aqui essa noção que utiliza as can-
ções populares, como discursos que se somam a diferentes códigos – palavras,
melodias, ritmos.
Destaca-se aqui Adoniran Barbosa, que canta muitas vezes em nome de
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um tempo perdido, apontando as perdas individuais à memória daqueles que
viram desaparecer seus antigos espaços de sociabilidade, trazendo à tona as con-
tradições de um processo de modernização que excluiu parcelas expressivas da
população.
Em relação a essas contradições, Paulo Freire contribui com essa discus-
são, ao considerar o desenvolvimento endógeno, como um importante cami-
nho, quando insere a cultura no debate das opções de desenvolvimento. Para o
educador, um expediente adequado para a superação das desigualdades encer-
ra-se a partir do desenvolvimento como premissa para o resgate da educação e
criatividade da cultura brasileira e como realização das competências humanas.
Conclui-se, assim que o desenvolvimento endógeno, a partir desta perspectiva,
oportuniza a realização das potencialidades da cultura periférica, incluindo, des-
sa forma, as expectativas mais legítimas do povo brasileiro.
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BREVES REFLEXÕES SOBRE A ATUALIDADE
DOS PRINCÍPIOS FREIRIANOS
Camila Beltrão Medina1
Denise Henrique Mafra2
Maria Angélica Gomes Maia3
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Pensar e discutir gestão da sala de aula, emana refletir sobre os alicerces
que definem e estruturam a identidade docente, uma identidade estabelecida em
um fazer coletivo; um fazer social e coletivo. O ato de ser professor é, portanto,
amalgamado a função social da escola de formar homens conscientes de seu
papel social e autônomos em suas escolhas para um bem comum. Estas atribui-
ções exigem um pensar constante sobre a função do ser professor: um pensar
sobre quem é e o que cabe, a ele ser realizado. No entanto, a escola sob a estru-
tura que se apresenta na atualidade, bloqueia essa reflexão, dificultando ou até
impedindo uma possível mudança ou superação a partir do trinômio freiriano
ação-reflexão-ação.
Esse não espaço para a reflexão não deve ser entendido como algo ines-
perado ou sem intenção, mas como fruto da sociedade capitalista focada na
competição e na submissão de uma classe social em relação à outra, além de um
sistema de ensino marcado por “fortes tendências de homogeneização, diver-
sificação e até hibridização de suas identidades culturais” (MOREIRA, 2002,
p.17). A sociedade capitalista em toda a sua complexidade conduz a escola para
a perda de sua função social, visto que não se faz coerente com o perfil dessa
sociedade um professor que tenha clareza de sua função. Esse conflito coloca o
professor mergulhado em uma crise identitária com sentimento de impotência
e o conduz à busca de operacionalizar determinações legais, curriculares nacio-
nais ou desejos do corpo administrativo escolar em detrimento de ações voltadas
à gestão.
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Saberes e Partilhas
Indicando, dessa maneira, que cada um, cada uma, assumam seu papel crítico-
-transformador para que se estabeleça um trabalho pautado em princípios como
ética, respeito e democracia.
A escola e a sala de aula como um espaço democrático pressupõem conhe-
cimento e prática, um saber fazer que deverá ser construído dentro do processo
ação-reflexão-ação (anteriormente mencionado). É o conceito puro de “huma-
nização”, assumindo lugar central sobre o mundo e, consequentemente, sobre
a ação pedagógica e suas elaborações teóricas acerca da realidade. Imerso na
tríade ação-reflexão-ação, palavra e atitude caminham juntas rumo à conscien-
tização do papel que ocupamos e que queremos ocupar ou assumir no mundo.
O propósito desse processo deve ser sempre o desenvolvimento da autonomia
de todas as partes envolvidas no ato de ensino-aprendizagem que se configurará
a partir de um esforço coletivo de ruptura com o autoritarismo e a incoerência.
Esse é um trabalho árduo e possibilita o fortalecimento de princípios dia-
lógicos e reflexivos. Permite a oportunidade de revisitar e incorporar princípios
básicos do ato educativo como dialogicidade, ética, autonomia, politicidade,
emancipação, problematização etc. Esse processo nos ensina que, como seres
reflexivos que somos, devemos constantemente (re)avaliar nossa prática, conhe-
cer as responsabilidades a partir da função social que exercemos e do papel que
assumimos no mundo.
Freire nos ensinou que todo ato educativo é também um ato político. Por
isso, ao não ser escolhida uma postura de politicidade, deixa-se de acreditar na
autonomia dos pares que compõem o cotidiano escolar, de acreditar nas insti-
tuições de ensino que seguem sob o foco do caráter tecnicista e desumanizador.
Cooperação, convivência e diálogo são princípios que devemos perseguir
desde a primeira formação buscando compreender a oportunidade de aprender
que princípios são caminhos fundamentados na racionalidade humana, mas não
na racionalidade vã, daquele ser que por nascer se denomina humano, e sim na
lógica humanista, dialética e dialógica que se constrói historicamente (FREIRE,
2001). De acordo com as palavras de Freire (2001, p. 10):
A possibilidade humana de existir – forma acrescida de ser – mais do
que viver, faz do homem um ser eminentemente relacional, estando nele,
pode também sair dele. Projetar-se. Discernir. Conhecer. É um ser aberto.
Distingue o ontem do hoje. O aqui do ali. Essa transitividade do homem
faz dele um ser diferente. Um ser histórico. Faz dele um criador da cultura.
A posição que ocupa na sua “circunstância” é uma posição dinâmica.
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estará inserida. Esse movimento forma uma rede complexa e dialética de trans-
formações estruturais, metodológicas e de cultura escolar.
O ensino híbrido, como o nome indica, mistura formas variadas de apren-
dizagem e é composto por elementos diferentes para que o aluno possa apren-
der, considerando o estudante como o centro do processo educacional. Segundo
Valente (2014), o ensino híbrido tem diversas formas de aplicação. Como exem-
plos o autor cita: flex, blended misturado, virtual aprimorado ou rodízio. Todos
eles utilizando como recurso plataformas on-lines, nas quais os estudantes rece-
bem parte dos conteúdos, sem abandonar atividades presenciais. Esse modelo
ganhou força e adequação com a proliferação do ensino superior a distância,
no entanto, devido à necessidade da saída das crianças da escola pela situação
pandêmica de 2020 e a busca por seu direito à educação, algumas escolas de
educação básica (especialmente as particulares), adaptaram o cotidiano escolar
a partir desses modelos. Mesmo com o retorno à presencialidade, os ganhos do
ensino híbrido não foram ignorados e questões metodológicas foram mantidas,
entre elas o objeto de pesquisa deste texto: a sala de aula invertida.
O trabalho a partir da “sala de aula invertida” ou flipped classroom orga-
niza-se em três momentos. O primeiro que pode ser nomeado por pré-aula, no
qual o professor ou a instituição de ensino apresenta um disparador do tema
da aula aos estudantes. São materiais como vídeos curtos, jogos de palavras ou
imagens, artigos curtos ou textos, disponibilizados normalmente em uma pla-
taforma on-line. O objetivo desses materiais reside no despertar o interesse dos
estudantes pelo assunto a ser trabalhado. O material deve ser desafiador, moti-
vando o estudante para a busca de saberes (MEDINA e RODRIGUES, 2021).
Trazendo essa dinâmica para uma aula freiriana, pode-se associá-la a apresenta-
ção do “tema gerador”, no qual, educar é concebido como um ato de conheci-
mento da realidade e de experiências concretas estabelecendo um elo entre a não
consciência do mundo e de seu papel nele e o pensamento crítico dessa realidade
e experiência concreta. O tema gerador se torna a alavanca para o processo de
construção da descoberta do mundo. Segundo Tozoni-Reis, (2006, p 103), por
emergirem do saber popular, os temas geradores são extraídos da prática de vida
dos educandos, substituem os conteúdos tradicionais e são buscados através da
“pesquisa do universo vocabular”.
O tema gerador é o disparador do conteúdo a ser refletido em uma deter-
minada aula. É o elemento que permite, em um primeiro momento, os estudan-
tes apresentarem suas pré-ideias do conteúdo. É o início da construção de um
conhecimento pautada em uma prática libertadora. Na pré-aula da sala de aula
invertida, os materiais oportunizados aos estudantes compõem esse elemento
disparador. São materiais eleitos pelo professor ou pela instituição, não pelos
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estudantes, no entanto, funcionam como alavancas para a reflexão e constatação
de pré-ideias dos estudantes.
Em seguida, na sala de aula invertida, há o momento considerado como
a aula propriamente dita, na qual os alunos verbalizam dúvidas, compreensões
e ideias acerca dos conceitos presentes nos recursos introdutórios e viabilizados
na pré-aula. O professor, a partir da mediação, vai consolidando as ideias apre-
sentadas e discutidas em um ritmo ditado pelos estudantes. O professor proble-
matiza, estimula a apresentação oral das ideias, propões atividades que visam
desequilibrar o estado cognitivo do estudante, para que, ao solucionar seu pro-
blema, avance nesse estado. Nenhum conhecimento deve ser dado/informado
aos estudantes, mas sim construídos por eles. O papel mediador do professor
também se faz presente no ideário freiriano. A aula dialógica é o caminho para
a aprendizagem e a partir de grupo de discussão, o processo educativo vai sendo
conduzido, buscando conteúdos problematizadores, realizando as discussões,
compartilhando as descobertas, definindo as atividades. Neste sentido, a pe-
dagogia libertadora, dispensa um programa pronto e as atividades tradicionais
pautadas no mecanicismo.
Por fim, no terceiro momento de uma sala de aula invertida, nomeado
de pós aula, serão disponibilizados aos alunos, textos ou atividades que apro-
fundem os conceitos tralhados. Esses materiais, como os da pré-aula, são mais
comumente oportunizados em plataformas online. Observa-se que o aluno é
autônomo intelectualmente na construção de seus saberes e o professor, o articu-
lador dessa construção. O exercício do desenvolvimento de autonomia intelec-
tual consubstanciado com a formação acadêmica estabelece o aprender e mais
que isso o prazer pelo aprender. Estabelece sentido e significado às experiências
escolares.
A reflexão sobre essa experiência possibilita observar a superação das
limitações individuais para a construção de novos conhecimentos que se tor-
naram coletivos. Essa construção cooperativa é emancipatória e se transforma
em um instrumento que auxilia seus atores a produzirem novos conhecimentos.
Conhecimentos esses que contribuem com a superação de intermináveis desa-
fios dispostos no processo de conscientização e libertação em busca de ética,
reflexão e diálogo. Condições e valores imprescindíveis na produção de uma
realidade, melhor e mais humana
O reconhecimento de que somos sujeitos em plena construção, compro-
missados com um processo educativo significativo e prazeroso, permitirá que
os desafios se transformem em estímulo na continuidade da construção de uma
educação de boa qualidade.
A sala de aula invertida facilita a posição do aluno como ativo, porque
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Saberes e Partilhas
possibilita e cria momentos de discussões, debates e articulação com os temas
tratados em sala de aula. Ajuda a desconstruir o que Paulo Freire (2015) cha-
mava de educação bancária e nos imprime a dúvida sobre a positividade de
um ensino pautado em um tipo de relação social estabelecida verticalmente,
do professor (autoridade intelectual e moral) para o aluno. Entretanto ensinar,
diferente do pontuado pelo viés diretivo, deve levar em consideração o contexto,
a reflexão, o senso crítico, a relação professor-aluno estabelecida de maneira
horizontal, buscando trocas de saberes.
De acordo com Paulo Freire (2015):
É neste sentido que ensinar não é transferir conhecimentos, conteúdos,
nem formar ação pela qual um sujeito criador dá forma, estilo ou alma a
um corpo indeciso e acomodado. Não há docência sem discência, as duas
se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se
reduzem à condição de objeto um do outro. (p. 24)
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Certamente, o papel do professor, enquanto mediador também se torna
decisivo nesta concepção. A aprendizagem não pode ser concebida como algo
diretamente ofertado, mas elemento que influenciará os resultados somente na
medida em que ativam nos alunos respostas de processamento de informações a
partir do pesquisar e do pensar.
É neste sentido que, que o professor com comportamento mediador terá
alunos que sob mesmas estratégias de ensino, podem ativar diferentes processos
cognitivos e afetivos, emanando aprendizagens muito diferente.
Seguindo as proposições freirianas, esse enfoque delibera que o estudante
não é um passivo receptor de estímulos e informações e que o conhecimento,
nunca é uma simples e fiel cópia da realidade, mas uma verdadeira elaboração e
reelaboração subjetiva, assemelhando-se assim, com o ideário proposto da “sala
de aula invertida”.
É o ideário de uma sala de aula percebida de modo sistêmico, estreitando
seu cotidiano a um sistema social, aberto, de comunicação e de troca. Segundo
Gómez (b1998), o sistema aberto, não permite explicar situações educativas sem
antes, conhecer a estrutura e o funcionamento do conjunto, além de suas co-
nexões com outros sistemas externos a sala de aula e a escola. Neste sentido,
estabelece como fronteiras da vida da aula e o mundo, características multidi-
mensionais, simultâneas, imprevisíveis e históricas. A vida da aula sob a ótica
freiriana, bem como, imbuída pela proposta da sala de aula invertida obedece a
um movimento complexo e dialético do aprender. Movimento sine qua non, com
o educar ativo, reflexivo e coletivo aqui estabelecido como ideal.
Mesmo que a concepção de educação esteja longe da realidade social
atual, se faz importante ater-se à escola de nosso tempo vivido; uma escola,
ávida por uma pedagogia humanista, libertária e emancipadora e é sob essa
ótica que a discussão sobre as denominadas metodologias ativas, especificamen-
te, sala de aula invertida, aqui se firma.
A curiosidade como possibilidade da aquisição de conhecimento é o que
move o ideário apresentado e mais, pensar em um saber dinâmico, a ser criado
e recriado à medida em que o mundo se transforma colocando sempre, o estu-
dante no centro do processo de aprendizagem e o concebendo como ser capaz
de desenvolver-se nos impulsiona.
Paulo Freire afirmou que o propósito do conhecimento é a humanização
que se baseia no diálogo crítico e, por isso, libertador, como resultado da re-
flexão-ação. Defendendo essa ideia compreende-se que um ser sócio-histórico
atuante na construção de seus saberes, alcançará um pensar autônomo atingin-
do o objetivo de liberdade que aqui propomos como fruto de uma educação/
aprendizagem verdadeiramente ativa.
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Neste sentido, entende-se que a forma de ensinar contribui significativa-
mente com a metodologia aplicada nas escolas, mas com um diferencial, con-
textualiza a realidade dos jovens, das crianças de uma geração tecnológica, sem
perder aspectos como a importância da cooperação, da humanização, da harmo-
nia entre o uso das novas tecnologias com o processo de ensino aprendizagem.
Uma metodologia ajustada a seu tempo histórico, que conduz os estudantes a
olharem para si e, também, para os outros, potencializando as individualidades
sem perder a noção de grupo, sociedade e de seu potencial de humanização
aproximando-se assim, dos princípios freirianos.
A escola deve contribuir na leitura de mundo para que possamos como
disse Freire, transformá-lo. Para uma aprendizagem ativa necessitamos de me-
todologias ativas para que a sala de aula seja um espaço de produção-troca de
conhecimento em que os temas estudados se transformem em ação para que
sejam superados desafios e dilemas da realidade.
Para que possamos ler o mundo com olhos próprios e, assim, transfor-
má-lo, necessitaremos de professores que se disponibilizem a retirar não somen-
te da metodologia aqui apresentada como das demais os benefícios possíveis
criando alternativas, propostas e condições para o estímulo das habilidades dos
estudantes.
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UMA EXPERIÊNCIA, MUITAS TRANSFORMAÇÕES
A PARTIR DA COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO
PROGRAMA ALFABETIZAÇÃO SOLIDÁRIA NO
RIO GRANDE DO NORTE
Ana Enedi Prince1
Roberto Gomes Monção Junior2
INTRODUÇÃO
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pessoas que ensinavam como para as que aprendiam. Nesse contexto, realizava
a seleção de professores alfabetizadores nesses municípios, desenvolvia o proces-
so de formação continuada, orientando o processo de ensino e aprendizagem,
a fim de se otimizar o uso do material didático e pedagógico fornecido pelo
referido Programa. O professor mestre Roberto Gomes Monção Junior, apoiou-
-me naqueles momentos, preparando os materiais e a capacitação que iria ser
ministrada.
Construiu-se o referencial teórico, para a realização deste trabalho, a par-
tir dos pressupostos de Freire (1987) Haidt (1994), e dos Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCNs (1997). Esta pesquisa realizou-se, por meio de um trabalho de
campo, nos anos de 2004 e 2005, nas cidades de Vila Flôr e de Canguaretama,
municípios do Rio Grande do Norte.
Os dados foram coletados por intermédio de registros das observações,
em salas de aula de alfabetização de jovens e adultos; e, também, por meio de
entrevistas realizadas, mensalmente, com alfabetizadores desses municípios, du-
rante o período de capacitação.
Como coordenadora pedagógica, tive uma função significativa na for-
mação de professores alfabetizadores, por propiciar a educação continuada em
serviço, e, dessa forma, possibilitei-lhes espaços para que refletissem sobre a sua
atuação em sala de aula, permitindo- lhes, assim, que atualizassem os seus co-
nhecimentos, por intermédio de constantes estudos e reflexões que aliados à
teoria e à prática alfabetizadora, possibilitava-lhes a transposição desses conhe-
cimentos para o cotidiano escolar, e, concomitantemente, para a vida discente.
Atuei nos municípios de Canguaretama e Vila Flôr / RN, nos anos de
2004 e 2005. A cada início de semestre, realizava a seleção de alfabetizadores,
em que avaliava as possibilidades e disponibilidades que os candidatos apresen-
tavam para atuarem, proficientemente, no Programa, uma vez que, segundo a
filosofia popular “Bom o professor, melhor o aluno”. Uma das questões impor-
tantes para o bom desempenho desse segmento de ensino é a formação de pro-
fessores, no sentido de se desenvolver uma prática pedagógica articulada com as
necessidades desses jovens e adultos.
Formar o professor é capacitá-lo, em uma área específica, com questões
teóricas e metodológicas, articuladas a uma ação escolar na sua totalidade.
Nessa perspectiva, a formação do professor toma contornos mais amplos, pro-
move novas exigências.
Práticas relacionadas à educação de jovens e adultos têm evidenciado,
para o seu sucesso, a necessidade de uma metodologia que respeite e valorize
os saberes já adquiridos pelos educandos ao longo de suas vidas, nos espaços e
tempos mais diversos e de maneiras diferenciadas.
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A capacitação às pessoas selecionadas era promovido mensalmente - a cada
visita aos municípios -, em forma de “oficinas pedagógicas”, nas quais eram traba-
lhadas, com os alfabetizadores, interdisciplinarmente, metodologias diversificadas
do ensino da língua portuguesa, matemática, noções gerais de geografia, história,
ciências e artes e o resgate da cultura regional, por intermédio das lendas e músi-
cas. Nessas ocasiões, produzíamos materiais para serem trabalhados em sala de
aula, a partir de sucatas que os alfabetizadores levavam aos treinamentos. Era
gratificante visitar as salas de aula, as quais funcionavam no período noturno, e,
nesses locais, constatar que os alfabetizadores incrementavam as atividades desen-
volvidas nas “oficinas pedagógicas”, para as proporem a seus alunos.
As visitas mensais a essas salas de aulas subsidiaram o redirecionamento
do processo de alfabetização e garantiram uma aprendizagem interdisciplinar,
proficiente, de forma contextualizada, uma vez que, da coleta de dados, análise
e interpretação da realidade discente, realizadas no contexto escolar, eram esta-
belecidos os objetivos, selecionadas as metodologias e mapeados os conteúdos,
para propor aos alunos novos desafios que, aceitos e transpostos, colocavam
cada aprendente em uma nova realidade de conhecimentos construídos.
Os textos utilizados em sala de aula pelos alfabetizadores eram signifi-
cativos e ligados ao cotidiano discente. Textos com os quais o aluno tivesse fa-
miliaridade, e que, a partir das ideias neles contidas buscasse as respostas que
necessitava para desenvolver as atividades que lhes eram propostas. Acredito
que a dificuldade para ler uma palavra se intensifica quando esta se encontra
descontextualizada na atividade de análise típica do contexto escolar, pois, se-
gundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997, p. 35):
Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é
possível tomar como unidade básica de ensino, nem a letra, nem a sílaba,
nem a palavra, nem a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com
a competência discursiva, que é a questão central. Dentro desse marco, a
unidade básica do ensino só pode ser o texto, mas isso não significa que
não se enfoquem palavras ou frases nas situações didáticas específicas que
o exigem. (Parâmetros Curriculares Nacionais 1997, p. 35.
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nessa ocasião, tive contato, e, nesse processo, descobri professores maravilhosos
e maravilhados pela arte de ensinar. Docentes com práticas metodológicas para
se evitar a evasão discente, pois esta, muitas vezes, poderia comprometer o bom
desenvolvimento do Programa, visto que o sucesso deste está, intrinsecamente,
ligado à atuação do professor em sala de aula e à frequência do aluno.
Em diálogos estabelecidos com os alfabetizandos, para elevar a sua au-
toestima, apresentava-lhes o texto “A canoa”, apontada por Paulo Freire. A par-
tir das ideias contidas nesse texto, esse autor nos aconselha a valorizar, indistin-
tamente, todas as pessoas com as quais tenhamos contato, uma vez que cada
uma delas tem algo de diferente para nos ensinar:
Em um largo rio, de difícil travessia, havia um barqueiro
que atravessava as pessoas de um lado para o outro.
Em uma das viagens iam um advogado e uma
professora. Como quem gosta de falar muito, o
advogado pergunta ao barqueiro: ___ Companheiro,
você entende de leis? Não. – Responde o barqueiro. E
o advogado compadecido: É pena, você perdeu
metade da vida! A professora muito social entra na
conversa: Seu barqueiro, você sabe ler e escrever?
Também não. – Responde o remador. Que pena! –
Condói-se a mestra – Você perdeu a metade da vida!
Nisso chega uma onda bastante forte e vira o barco. O
canoeiro preocupado, pergunta: Vocês sabem nadar?
Não! – Responderam eles rapidamente. Então é uma
pena – Concluiu o barqueiro – Vocês perderam toda a
vida!
Nesse texto, podemos observar que “não há saber mais ou saber menos:
Há saberes diferenciados”, e, a partir dessa afirmação, dizia aos alfabetizadores
e alfabetizandos que o não saber ler e escrever se constitui em apenas um peda-
cinho da vida, mas que eles possuíam muitos outros conhecimentos os quais ser-
viriam de ponto de partida para se apropriarem da leitura e da escrita, e, quando
isso acontecesse, estariam completos.
Nessas ocasiões, percebia que a minha fala elevava muito a autoestima
de todos, e, a partir daí, ouvia depoimentos diferenciados e emocionados, tais
como: “na minha idade, quarenta e cinco anos, estou conhecendo um colégio
pelo lado de dentro, e o melhor, estou aprendendo a ler e escrever”; ou o de um
senhor, com setenta e cinco anos de idade, que nasceu com dificuldades auditi-
vas: “A vida inteira pensei que era meio surdo, mas, agora, que estou aprenden-
do a ler e a escrever, percebi que, durante toda a minha vida, fui muito cego”, ou,
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ainda, de um senhor cuja filha era alfabetizadora na localidade: “Fiquei sozinho
no boteco, enquanto meus amigos estavam aprendendo com minha filha ensi-
nando, e eu estou ficando para trás. Então, aqui estou, e contente por ter vindo
aprender”; ou, ainda, também, “Eu não preciso sujar mais o dedo para assinar
o meu nome, agora, sei ler e escrever”.
Esses depoimentos me traziam à lembrança os versos de Bernardes (2005):
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Minha vida, enquanto profissional da Educação, perpassou da pré-escola
aos cursos de pós-graduação, e posso afirmar, com convicção, que trabalhar com
alfabetização de jovens e adultos é prazeroso e, acima de tudo, gratificante.
Segundo a Declaração da Cúpula Mundial da Educação, da ONU, em
seu Artigo sexto: “A educação enquanto um direito humano fundamental é a
chave para um desenvolvimento sustentável, assim como para assegurar a paz
e a estabilidade entre países e, portanto, um meio indispensável para alcançar
a participação efetiva nas sociedades e economias do século XXI. Não se pode
mais postergar esforços para atingir as metas da Educação Para Todos. As neces-
sidades básicas da aprendizagem podem e devem ser alcançadas com urgência.”
Constatei isso ao atuar, durante dois anos, no Projeto Alfabetização
de Jovens e Adultos, como coordenadora pedagógica setorial nas cidades de
Canguaretama e Vila Flôr, localizadas no Estado do Rio Grande do Norte.
A educação de jovens e adultos se constituía em meta de projetos que
tinha como objetivo a alfabetização de pessoas em diversas localidades brasilei-
ras. Esses projetos buscavam otimizar as condições para a realização da apren-
dizagem, em relação à aquisição da linguagem escrita. Para a consecução desse
objetivo eram somados esforços entre órgãos de diferentes segmentos sociais.
O Projeto Alfabetização Solidária de Jovens e Adultos, conjunção de for-
ças entre a Universidade, o Município e a União, realizou ações significativas
e proficientes nas localidades em que se propõe atuar. Seus principais objetivos
eram: reduzir o índice de analfabetismo; alfabetizar jovens e adultos; estimular
parcerias e responsabilidades sociais no setor público e na iniciativa privada; e
promover a cidadania.
De acordo com o Parecer CNE/CEB, a Educação de Jovens e Adultos
(EJA) é um programa que busca reparar àqueles que não tiveram acesso à leitura e
à escrita ao longo da vida. A privação da aquisição do letramento é uma perda sig-
nificativa para a sociedade. Nessa perspectiva, Magda Soares (1995) defende que
(...) um adulto pode ser analfabeto, porque marginalizado social e eco-
nomicamente, mas, se vive em um meio em que a leitura e a escrita têm
presença forte, se se interessa pela leitura de jornais feita por um alfabeti-
zado, se recebem cartas que outros leem para eles, se dita cartas para que
um alfabetizado as escreva, (...), se pede a alguém que lhe leia avisos ou
indicações afixados em algum lugar, esse analfabeto é, de certa forma,
letrado, porque faz uso da escrita, envolve-se em práticas sociais de leitura
e de escrita. (SOARES, 1995, p.24)
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de parâmetro aos principais programas de alfabetização de adultos, segundo os
quais os analfabetos eram conhecidos como homens e mulheres produtivos, que
possuíam uma cultura e leitura de mundo, uma vez que, segundo esse autor “a
leitura de mundo precede a leitura da palavra”. Freire também criticou a edu-
cação bancária que considerava o analfabeto uma espécie de gaveta vazia, na
qual o educador deveria depositar o conhecimento sócio-histórico produzido
pela humanidade; e, para Haidt (1994, p. 130), muitas dessas experiências po-
dem ser relatadas como forma contributiva à expansão da pesquisa científica na
Educação de Jovens e Adultos:
Um conteúdo será significativo e interessante para o aluno quando estiver
relacionado às experiências por ele vivenciadas. Por isso, o professor deve procu-
rar relacionar, sempre que possível, os novos conhecimentos, a serem adquiridos
pelos alunos, com suas experiências e conhecimentos anteriores fazendo uma
ponte para ligar o já conhecido ao conhecido novo e ao desconhecido. É esta
ligação do conhecido vivenciado ao desconhecido novo que torna o conteúdo
significativo e interessante.
Sendo assim, o objetivo deste capítulo se constitui em tecer reflexões e
considerações gerais relativas a uma experiência e a algumas das muitas trans-
formações que ocorreram por ocasião da realização do Projeto em dois dos mu-
nicípios do Rio Grande do Norte (Canguaretama e Vila Flôr), do qual participa-
ram, além do governo federal, as secretarias municipais, e esta professora, como
Coordenadora Pedagógica Setorial, e representante da Universidade do Vale do
Paraíba - Univap, da cidade de São José dos Campos, do Estado de São Paulo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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sua nova vida, e há de se destacar, contando com alfabetizadores de suas loca-
lidades - como mediadores -, no processo de aquisição de seus novos saberes. A
principal motivação dos jovens e adultos que ingressam em cursos de alfabetiza-
ção é, segundo seus depoimentos, “aprender a ler e a escrever”, “conseguir um
emprego melhor”, “ter autoconfiança”, “ter autoestima”, ”entender melhor as
coisas”, “falar bem”, “ser gente” e “aprender a trabalhar coletivamente”.
Como Coordenadora Pedagógica Setorial, pude constatar que, em âmbito
nacional, as diferenças culturais entre coordenadores, alfabetizadores e alfabe-
tizandos acabaram encontrando semelhanças incríveis que contribuíram de
maneira significativa para a construção social, política, ideológica e cultural da
sociedade brasileira.
Nas capacitações realizadas mensalmente, sempre procurei conscientizar
os professore alfabetizadores sobre a importância de se construir uma escola
voltada para a formação de cidadãos, criando condições que permitam aos jo-
vens e adultos terem acesso ao conjunto desconhecimentos socialmente elabo-
rados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania. Sendo assim,
é função do professor alfabetizador instrumentalizar o alfabetizando para uma
atuação crítica e produtiva no processo de transformação e construção de uma
sociedade justa, humanitária e igualitária.
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277
O CALEIDOSCÓPIO DA OBRA FREIREANA NA
EDUCAÇÃO INFANTIL: LUTAS E CONQUISTAS
NA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE
Camila Beltrão Medina1
Denise Henrique Mafra2
Maria Angélica Gomes Maia3
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especificidade no seu cumprimento enquanto ser tia é viver uma relação de
parentesco. Ser professora implica assumir uma profissão enquanto não se
é tia por profissão. Se pode ser tio ou tia geograficamente ou afetivamente
distante dos sobrinhos, mas não se pode ser autenticamente professora,
mesmo num trabalho a longa distância, “longe” dos alunos. (FREIRE (b),
1997, p. 9)
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TODAS as pessoas.
Sob esses princípios do atendimento escolar a todas as crianças, indepen-
dente da sua classe social, o referido nível de ensino ganha olhares e, com isso,
ampliam-se e solidificam pesquisas voltadas a práticas pedagógicas, a compreen-
são do pensar e do desenvolvimento de seu público-alvo, bem como, a formação
de professores/educadores (e não cuidadores ou “tias”). Com isso, os cursos
de Pedagogia, reestruturam suas matrizes curriculares incluindo disciplinas e
conteúdos que abordem a história da infância e da constituição da educação
infantil, desde o âmbito legal até os fundamentos ideológicos; o aprender formal
pela criança pequena e, consequentemente o processo de desenvolvimento bio-
-psico-afetivo-cognitivo-social; práticas pedagógicas adequadas ao pensar e ao
momento do desenvolvimento que a criança pequena se encontra; conjecturas
sobre a importância do “jogo, brinquedo e brincadeira como instrumento de
aprendizagem; o mergulho no pensamento de autores que defendem e propõem
teorias pedagógicas para o ensinar e o aprender da crianças pequenas. É o des-
locamento de uma instituição, com base assistencialista, voltada ao cuidar, para
uma instituição que tem por função, além do cuidar (visto que estamos falando
de crianças de faixa etária entre zero e 6 anos), o educar. É a regularização do
trabalho docente na Educação Infantil, no âmbito da legislação, fortalecida com
o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/90), aprovado dois
anos após a Constituição de 1988.
O ECA emerge, entre outras questões, a consolidação da inserção das
crianças no mundo dos direitos humanos, corroborando para a viabilização
de um sistema integrado de promoção e fiscalização de políticas públicas.
Subsequente a publicação do ECA, entre os anos de 1994 e 1996, Paschoal e
Machado (2009), apontam que o Ministério da Educação, publicou uma série de
documentos compondo a Política Nacional de Educação Infantil. Segundo os
autores, “tais documentos estabeleceram as diretrizes pedagógicas e de recursos
humanos com o objetivo de expandir a oferta de vagas e promover a melhoria
da qualidade de atendimento nesse nível de ensino” (Paschoal e Machado, 2009,
pg 86).
Entre as diretrizes estabelecidas, mais uma vez a formação de professores
entra em voga: “política de formação do profissional de educação infantil, que
reafirma a necessidade e a importância de um profissional qualificado e um
nível mínimo de escolaridade para atuar nas instituições de educação infantil”
((Paschoal e Machado, 2009, pg 86)
A construção da identidade docente, dos educadores da primeira infância
enfrenta, portanto, a partir dos anos noventa (1990), uma ressignificação em
representação quanto a valorização e identidade profissional, em decorrência do
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reconhecimento da sua importância.
No percurso de construção de identidade do educador tem-se ainda a
identificação do professor que atua neste segmento a partir da representação
da imagem de “boa moça”, “bom moço”, “a tia” “o tio”, atributos os quais os
educadores perdem nome e identidade, como salientado anteriormente.
Toda prática que transforma é alimentada em um exercício de ação-re-
flexão em que o processo de se conscientizar origina. Trata-se de um processo
contínuo próprio de seres humanos comprometidos com a mudança do mundo
e de si. A constituição da identidade docente percorre esse caminho, sendo que:
se não o conseguem ao longo de sua experiência, não lhes é possível saber
com clareza o que querem, como caminhar para tratar o que querem, que
implica saber para quê, contra que, a favor de quê, de quem se engajam na me-
lhora de seu próprio saber. (FREIRE, 1997, p.75)
282
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Saberes e Partilhas
bem como, de luta pelo direito a educação (e aqui, a educação infantil, em prol
das camadas populares).
Constituiu-se, então, um espaço privilegiado de formação continuada e
formação inicial tendo como eixo precípuo a práxis pedagógica, em que ser
humano/aluno são compreendidos em sua relação com o mundo, um ser em
situação que trabalha e transforma o mundo. Portanto, o humano é um ser da
“práxis”: da ação e da reflexão.
Destaca-se aqui que a educação compreendida como humanizadora te-
nha como objetivo substanciar o processo ensino-aprendizagem somando ao
currículo trabalhado em sala de aula com os saberes adquiridos pelos alunos
a partir de suas vivências pessoais. Para Freire, portanto, a consciência da hu-
manidade se constrói na interação e construção da leitura de mundo de cada
ser humano com seu entorno na disposição de conhecer a si e ao mundo. Para
que isso ocorra se faz necessário uma “pedagogia da comunicação com a qual
pudéssemos vencer o desamor do antidiálogo. Lamentavelmente por uma série
de razões esta postura – a do antidiálogo vem sendo mais comum na América
Latina.” (FREIRE, 1979, p.69)
Portanto, seguimos com a perspectiva Freireana (1980) em que, a pedago-
gia deve ser vislumbrada a partir das relações sociais, produtoras de sociabilida-
de humana, pois, só assim se torna possível humanizar essas relações, condição
fundamental para a educação.
De acordo com Solon Freire (2010 p. 8):
A práxis é um modo de compreender a existência a partir da relação entre
subjetividade e objetividade, entre ação e reflexão. Desenvolver um pensa-
mento pedagógico baseado na práxis é possibilitar o élan relacional entre
humanização e educação. Enquanto parte do processo educacional, o ato
pedagógico requer uma atenção direta aos sujeitos nele envolvidos e aos
fins próprios da ação desses sujeitos. Paulo Freire aprofunda o conceito
de práxis no universo pedagógico, como sendo a capacidade do sujeito
de atuar e refletir, isto é, de transformar a realidade de acordo com as
finalidades delineadas pelo próprio ser humano. Concebe uma teoria pe-
dagógica a partir da práxis, da dialética consideração entre a vivência das
condições identitárias do ser humano e a sua disposição à educabilidade.
Este cenário revela que a região Sudeste tem o maior número de matrícu-
las e, é onde está localiza a cidade de São José dos Campos, com uma população
estimada em 737.320 pessoas, salário médio mensal dos trabalhadores formais
de 3,5 e com renda mensal per capita de até ½ salário-mínimo, distinguindo-se
como um município privilegiado em relação ao estado de São Paulo.
A rede municipal de ensino concentra a maior parte das matrículas da
educação infantil, com 71,4%. Em seguida, rede privada com 27,9% (2.505.837)
do total. Das matrículas da rede privada, 29,4% pertencem a instituições par-
ticulares, comunitárias, confessionais e filantrópicas conveniadas com o poder
público. A distribuição de escolas voltadas ao atendimento gratuito na educação
infantil no município de São José dos Campos é:
Tipo de escola Número
EMEIS (escola municipal de educação infantil 65
CECOI (centro de convivência infantil) 19
CEDIN (centro de educação infantil) 29
CONVENIADA (privadas) 35
284
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2017 demostram que, naquele ano, o município não atendeu a demanda total
de alunos de 0 a 3 anos. Esses dados indicavam que mais de 5.000 crianças
aguardavam por uma vaga na rede. As novas matrículas foram realizadas por
meio da construção de nove unidades escolares, reforma e ampliação de outras
34 escolas, que geraram mais de 8.000 vagas, priorizando os que mais precisam.
Outras duas unidades para crianças de 0 a 5 anos estavam em construção e em
fase de licitação, outra escola de educação infantil estava sendo planejada. O
investimento total de 2017 na educação infantil superava R$ 79 milhões segundo
a prefeitura em seu site oficial. (Prefeitura São José dos Campos).5
De acordo com a meta e diretriz previstas no Plano Municipal de Ensino
(2015-2025), o município deverá universalizar o atendimento da Educação
Infantil e, dentro deste contexto, é que realiza a parceria/convênio de compras
de vagas excedentes de escolas particulares para o atendimento de crianças de 0
a 6 anos em regime de meio período e integral. Em função do baixo valor pago
pelas vagas poucas escolas aderiram ao programa, no entanto, tem sido vislum-
brada como uma alternativa para a resolução do problema de escassez de oferta.
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artista vai à escola”, com o objetivo de propiciar e potencializar a linguagem do
desenho tão comum às crianças, que no ato de desenhar apresentam suas ideias
e abstrações sobre o mundo que a rodeia.
Durante o ano letivo a escola convidou artistas para uma imersão com os
alunos de 2 a 6 anos. As atividades privilegiam o contato das crianças com o con-
vidado a partir de roda de conversa sobre vida, obra e temática de seus trabalhos e,
ao longo do ano o artista participa de vivências em que ele e as crianças juntos, vão
experimentando materiais, suportes, estilos, linguagens diferentes mediadas num
contato direto entre a arte, a figura do artista e o professor que também aprende e
explora o que foi realizado em cada encontro ao longo do bimestre.
A culminância do projeto foi uma exposição aberta à comunidade, or-
ganizada pela equipe da escola e alunas da Pedagogia. Já passaram pela escola
artista importantes do cenário nacional e internacional como: Ramis, Sérgio
Capparelli, Mônica Nador, Guataçara Monteiro, Eliana Chaves, Pitiu Bonfim,
Lindsay Ribeiro, Camila Nador, Ronaldo Oliveira. É interessante pontuar que
o contato direto com a figura do artista permite às crianças ampliarem a com-
preensão do que teóricos apresentam sobre o desenho seja ele uma garatuja ou
uma imagem figurativa são formas genuínas de comunicação da criança, cons-
tituindo-se numa forma privilegiada de linguagem e como linguagem, tem seus
códigos, signos que devem ser compreendidos, respeitados e estudados pelo pro-
fessor ao longo de seu trabalho docente.
Fonte: Arquivo pessoal: vivência desenvolvida no primeiro semestre deste ano com a artista
plástica Pitiu Bonfim.
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Durante o desenvolvimento do projeto, na universidade os licenciandos
de Pedagogia e de Artes Visuais participaram de grupos de estudos com o in-
tuito de pesquisar, analisar e refletir sobre fases do desenho infantil, desenvol-
vimento cognitivo e a utilização dos símbolos pela criança, aprendizagem por
meio do lúdico, metodologia e prática de ensino, a arte como uma linguagem
e um conteúdo escolar. Esses estudos organizados em relatórios e transpostos
em estratégias pedagógicas, foram experenciados na escola conveniada. Assim
houve uma migração da produção na universidade para o ambiente educativo
da creche e, a experimentação da aplicação desses saberes gerando e promoven-
do novas reflexões sobre a ação docente e o ser professor. É o exercício de uma
educação libertadora para a humanização; da ideia do indeterminismo e do ina-
cabado, sempre estando em um movimento dialético de formação.
A busca constante por aprender, significar e ressignificar conhecimentos,
é a premissa inexorável de que existe no ser humano a imaginação e a curiosida-
de, pois somente por meio dela é possível encontrar o que Paulo Freire nomeia
de “raison d’entre” das coisas. O ser mais, constituindo-se a partir da constante
humanização do existir. Humanização pela via da curiosidade que faz o ser hu-
mano tomar distância de si mesmo e da vida e lançar-se ao conhecimento, uma
epistemologia própria da existência (Solon Freire, 2010, p 72). Como afirma
Freire (2016, p. 71): “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho, os
homens se libertam em comunhão”.
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de proposições teóricas de Paulo Freire com uma breve constituição da história
da educação infantil no Brasil somados a um projeto pedagógico desenvolvido
em uma instituição de ensino para crianças de 0 a 5 anos, a formação continua-
da de professores desta instituição e a formação inicial de estudantes licencian-
dos em Pedagogia e Artes Visuais. Colocando como ponto axial a composição
da identidade docente, visto que o ser professor perpassa por uma educação
humanista e critica.
A educação humanista e, portanto, democrática, deve compor-se a par-
tir da preparação técnica e científica dos indivíduos. Uma educação que pelo
diálogo alcance o desenvolvimento e a democracia, efetivando, exclusivamente
por esse meio, o processo educativo e, assim, permitindo uma educação pela
participação, que desenvolva o homem brasileiro e sua criticidade (Freire, 1979).
Correspondendo a esse ideário – o diálogo como essência do ato educativo – que
se estabeleceu a parceria entre a escola conveniada e a universidade.
Ao aluno estagiário foi proporcionada oportunidade de participação e ob-
servação ativa na construção de um projeto vinculado à prática educativa para
crianças de 0 a 6 anos, vivenciando de fato o processo de aprendizagem infantil
com suas singularidades, a maneira peculiar de como as crianças aprendem e a
importância da afetividade na construção de crianças felizes, cheia de vida, e
sonhos.
Aos professores da escola parceira os fóruns de discussão sobre funda-
mentos teóricos alicerces de suas ações cotidianas, permeadas pela visão dos
artistas convidados, consubstanciou autoavaliação sobre seus saberes teóricos e
práticos, permitindo trilhar novas reflexões sobre sua ação docente. E as crianças
que foram respeitadas em seu processo de aprendizagem e, principalmente em
seu direito a educação de qualidade.
Nossa capacidade de aprendizagem é um eterno construir e reconstruir,
significar e ressignificar, é transformar, é refazimento, pois ser freireano significa
reinventar, reformular, recriar, recompor e reconstituir cotidianamente nossas
práticas.
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Federal de Pernambuco, Recife, 2010.
289
REFLEXÕES SOBRE A TEOLOGIA DA
LIBERTAÇÃO NA CONSTRUÇÃO DE UMA
PRÁXIS EDUCATIVA LIBERTADORA NA
AMÉRICA LATINA
João Pedro Ruggieri1
Lauren Mariana Mennocchi2
INTRODUÇÃO
A TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO
291
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Historicamente, o pensamento no qual a Teologia da Libertação se encon-
tra alicerçada remete ao período em que o continente americano se encontrava à
mercê dos processos colonizadores europeus. Tal modo de pensar consistia em
questionamentos e indagações sobre os modos pelos quais a Igreja Católica se
fazia presente no território estrangeiro e como esta tradição religiosa abordava a
realidade dos povos originários, indígenas, africanos e população empobrecida
do campo e da cidade (BOFF e BOFF, 1986).
Estes autores se referem, também, a um conjunto de personalidades cujas
práticas eclesiásticas podem ser consideradas como próximas daquelas defendi-
das pelos teólogos da libertação, como por exemplo: Bartolomeu de las Casas,
Antônio de Montesinos, Antônio Vieira e Frei Caneca. “O que hoje emerge à
tona da consciência social e eclesial tem [nesses nomes] a sua fonte” (BOFF e
BOFF, 1986, p. 93).
Löwy (2016) expande a compreensão do termo Teologia da Libertação, refe-
rindo-se a um conjunto de textos publicados por autores latino-americanos, não
necessariamente vinculados ao catolicismo, mas próximos a esse movimento
eclesial, tais como Gustavo Gutiérrez (Peru), Rubem Alves, Hugo Assmann,
Carlos Mesters, Leonardo e Clodovis Boff, Frei Betto (Brasil), Jon Sobrino,
Ignacio Martin-Baró, Ignacio Ellacuría (El Salvador), Segundo Galilea, Ronaldo
Munoz (Chile), Pablo Richard (Chile-Costa Rica), José Miguez Bonino, Juan
Carlos Scanone, Ruben Dri (Argentina), Enrique Dussel (Argentina-México),
Juan-Luis Segundo (Uruguai) e Samuel Silva Gotay (Porto Rico).
Löwy (2016), refere-se à Teologia da Libertação como sendo, portanto, o
“produto espiritual” advindo de um movimento social iniciado, sobretudo, após
a década de 50, quando as condições concretas de vida do povo latino-america-
no determinaram a renovação experimentada nas atividades da Igreja Católica.
Os governos populistas que vingaram na América Latina, tais como o de
Juan Domingo Perón na Argentina e o de Getúlio Vargas no Brasil impuseram
um sistema de desenvolvimento industrial, que acabou por beneficiar as bur-
guesias nacionais e ampliar a desigualdade social, sobretudo, da população que
vivia no campo.
Tal método desenvolvimentista foi realizado aos moldes de um capitalis-
mo dependente, na medida em que a burguesia se associou ao capital estrangei-
ro, submetendo deliberadamente os países dependentes às ordens do imperialis-
mo (OLIVEIRA; VAZQUEZ, 2010).
As profundas desigualdades causadas pelo modelo de desenvolvimento
econômico adotado pelos países da América Latina tornaram necessárias trans-
formações da estrutura socioeconômica, reivindicadas por movimentos popula-
res e mobilizações urbanas. Sendo assim, a revolução cubana de 1959, elucida ao
292
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mundo uma forma de romper com a condição de dependência. É neste contexto,
portanto, que membros da Igreja Católica reafirmam sua missão social: o com-
prometimento com o trabalho popular e a propagação dos ideais progressistas.
Sobre este período da história do catolicismo, escrevem Boff e Boff (1986,
p. 95):
Há práticas realmente promotoras da consciência e das condições de
vida das populações carentes: são os vários movimentos da Igreja como
JUC (universidades), a JOC (operários), a JAC (camponeses), o MEB
(movimento educação de base), as escolas radiofônicas, as primeiras
Comunidades Eclesiais de Base. [...]. O Concílio Vaticano II (1962-1965)
forneceu a melhor justificativa teórica para práticas elaboradas sob o signo
de uma teologia do progresso, da autêntica secularização e da promoção
humana.
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8. O desenvolvimento de comunidades de base cristãs entre os pobres
como uma nova forma de Igreja e como alternativa para o modo de vida
individualista imposto pelo sistema capitalista. (LÖWY, 2016, p. 77).
294
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Freire (1983), ao abordar o tema da capacidade humana de alterar o meio
social ao seu redor, afirma:
O homem pode refletir sobre si mesmo e colocar-se num determinado mo-
mento, numa certa realidade; é um ser na busca constante de ser mais e,
como pode fazer esta autorreflexão, pode descobrir-se como um ser inaca-
bado, que está em constante busca. Eis aqui a raiz da educação. (FREIRE,
1983, p. 27).
Entende-se, deste modo, que Freire atesta o local privilegiado das expe-
riências religiosas ao longo do processo de libertação da população oprimida.
Em uma dissertação sobre as simetrias a serem observadas entre a pedagogia
freiriana e a Teologia da Libertação, Pereira (2017) afirma que a ótica de Freire
sobre o cristianismo se refere à uma experiência religiosa aberta, tolerante e li-
bertadora. Ainda, segundo o autor, é justamente esta compreensão do cristianis-
mo que proporciona a aproximação deste autor com os pensadores da Teologia
da Libertação.
Sobre a influência do trabalho de Paulo Freire para a Teologia da
Libertação, afirma Boff (2014, p. 13):
A Teologia da Libertação, na esteira de Paulo Freire, assumiu e ajudou a
formular essa estratégia. É uma solução adequada à superação da pobre-
za. Quando essa prática vem motivada pela fé cristã e o seguimento de
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Cristo, fornece a base de uma reflexão crítica, que passa a se chamar então
de Teologia da Libertação.
Por fim, Freire (1978), em uma explanação sobre o trabalho dos teólogos
da libertação, discorre sobre o papel fundamental exercido por estes em seus
projetos de transformação social, afirmando que esta teologia é estritamente re-
volucionária, dado o fato desta se opor à opressão e à exploração da população.
Todavia, conforme diz Pereira (2017), não se deve esquecer que somente aqueles
que se encontram na condição de oprimidos podem transformar sua própria rea-
lidade, uma vez que o futuro destes não deve ser visto como uma repetição do
presente, mas sim como a concretização de sua libertação, do rompimento com
os grilhões ideológicos e materiais que lhe foram impostos e os quais carregaram
consigo ao longo de toda sua vida.
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Assim como para Freire, a Martín-Baró, a desumanização imposta à po-
pulação é um fato concreto da história, mas não um destino dado. É a condição
objetiva em que vive grande parte da população e, em qualquer atividade que
objetive o pleno desenvolvimento da humanidade, haverá de existir um com-
promisso radical com a humanização, com o trabalho livre, a desalienação, a
afirmação dos homens como pessoas e como seres para si, em síntese, um com-
promisso com a libertação de qualquer forma de exploração, opressão ou depen-
dência. (GONÇALVES e CASTRO, 2021).
Por mais que não caiba ao psicólogo, educador ou mesmo o teólogo, al-
cançar tais objetivos sozinho, estes devem contribuir para a elaboração de um
caminho que torne possível e necessária a superação da atual forma de sociabi-
lidade desumanizante em que se vive. Somente de tal maneira, os diferentes (e
congruentes) objetivos dos campos de atuação poderão ser alcançados.
A Psicologia da Libertação, como é conhecida a proposta elaborada por
Martin-Baró (1996) é compromissada com a conscientização dos sujeitos e im-
plica em um “[...] processo dinâmico, conflituoso, de transformação do ser hu-
mano que, de forma pessoal e social, pensa e atua numa realidade histórica num
vir a ser (devir) que se efetiva na práxis, envolvendo suas dimensões psicológicas,
sociais e políticas”. (MENDONÇA, 2017, p. 123).
Evidencia-se assim, importante diálogo entre o que propõe Martín-Baró,
Paulo Freire e os teólogos da libertação, que tomam a análise da vida vivida em
uma sociedade de classes, fundamento para o pensar-agir libertário e, sobrema-
neira, educativo.
Em uma perspectiva que considera o ser humano como ser social e histo-
ricamente constituído, torna-se fundamental voltar-se às bases sobre as quais os
indivíduos se desenvolvem, as relações que estabelecem e que têm potência para
torná-los sujeitos conscientes e críticos da realidade em que vivem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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processo educativo, mais a participação se torna possível nas ações sociais de
transformação e, por meio da participação, é possível a mobilização no combate
às relações de exploração e injustiças e na busca de condições materiais que su-
perem a sociedade capitalista.
A Teologia da Libertação, a Pedagogia Freiriana e a Psicologia da
Libertação de Martín-Baró, ao compreenderem a constituição humana a partir
de uma perspectiva histórica, tecem importantes análises sobre como se proces-
sam as relações diante das condições em que vivem as pessoas – suas necessida-
des, sua liberdade, seu bem-estar, o trabalho e sua sobrevivência. Isto leva a uma
posição crítica e contra hegemônica, independente do campo do saber-fazer em
que se situe e evidencia as aproximações entre as áreas do conhecimento deba-
tidas no presente texto.
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300
ARTIVISMO E PEDAGOGIA FEMINISTA
ENCONTRAM PAULO FREIRE NA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Ângela Aparecida de Almeida1
Maria Vitoria Caetano Rodrigues2
INTRODUÇÃO
302
O EN S I N O E A ED U C A Ç Ã O BR A S I LEI R A
Saberes e Partilhas
liberdade e de emancipação das pessoas. Quando dirigiu a Secretaria Municipal
de Educação de São Paulo (SME-SP)5, de 1989 a 1991, Paulo Freire deu grande
ênfase à formação permanente dos educadores, criando propostas políticas para a
construção de uma educação democrática. Em suas palavras:
[...] um dos programas prioritários em que estou profundamente empe-
nhado é o de formação permanente dos educadores, por entender que os
educadores necessitam de uma prática político-pedagógica séria e com-
petente que responda à nova fisionomia da escola que se busca construir.
(FREIRE, 2001, p. 80).
ARTE E ARTIVISMO
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sentidos e funções se quiser entendê-la no processo artístico, social e
educativo.A arte é uma das mais inquietantes e eloquentes produções
do homem. Arte como técnica, lazer, derivativo existencial, processo
intuitivo, genialidade, comunicação, expressão, são variantes do conheci-
mento arte que fazem parte de nosso universo conceitual, estreitamente
ligado ao sentimento de humanidade (FERRAZ; FUSARI, 2010, p.101)
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as pessoas que unem Arte e Ativismo, os artivistas, procuram transformar a
sociedade despertando razão e emoção, promovendo tensões e fissuras a fim de
proporcionar novas formas de ser livre e existir no mundo.
Através deste movimento artístico e transdisciplinar o artivismo tem a
possibilidade de contribuir para práticas mais criativas na formação de profes-
sores na atualidade. Buckingham e Banaji (2006) sugerem que, na educação, as
definições de criatividade que tiveram mais efeitos nos últimos 50 anos foram
aquelas que casaram criatividade e imaginação, adotando uma abordagem in-
clusiva, sugerindo que todos têm potencial para criatividade, pois é um aspecto
fundamental de natureza humana.
PEDAGOGIA FEMINISTA
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de aula, bem como entre a sala de aula e seu ambiente mais amplo.
4) No caso de privilegiar a voz individual como forma de conhecimento,
a pedagogia feminista incentiva a autoridade nos outros e vê o conhecimento
como construído e limitado pela cultura.
5) Quanto ao respeito pela diversidade de experiências pessoais, a teoria
feminista privilegia experiências vividas como base para análise, geração de teo-
ria, ativismo e pesquisa (Foss & Foss, 1994). Assim, uma pedagogia feminista
envolve uma ênfase na experiência e validação pessoal (Chapman, 1997). Essa
perspectiva resulta em vários resultados positivos, incluindo maior respeito, em-
patia aprimorada, melhores habilidades de pensamento crítico e compreensão
mais ampla das verdades. Um dos objetivos da sala de aula libertadora é que os
membros aprendam a respeitar as diferenças uns dos outros, em vez de temê-las.
6) Incorporado aos cinco princípios discutidos anteriormente está um sex-
to princípio: desafiar as visões e práticas tradicionais. De tal modo, a pedagogia
feminista desafia a noção de que o conhecimento e os métodos de ensino podem
ser gratuitos. “As escolas reproduzem e reforçam a construção social de gênero
por meio da dicotomização de nutrição e autonomia, público e privado, mas-
culino e feminino” (SCERING, 1997). Além disso, as professoras feministas
desafiam as origens das ideias e teorias, as posições de seus promotores e os
fatores que influenciam como o conhecimento passa a existir em sua forma atual
(MIDDLECAMP & SUBRAMANIAM, 1999).
A intenção é unir uma práxis libertadora, na perspectiva Freireana, com
a execução de uma pedagogia feminista. Sabe-se que o ambiente educacional
é alvo de mudanças constantes, possuindo um corpo discente e docente cada
vez mais diversificados e, nesta perspectiva, a pedagogia feminista oferece uma
metodologia de ensino inclusiva para o século atual. Apesar de ser uma proposta
desafiadora, tem potencial suficiente para justificar o esforço.
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histórica. Trata-se, como veremos, menos de um axioma pedagógico que
de um desafio da história presente (FREIRE, 1975 p. 7).
Afinal, ainda segundo Freire, em sua obra “Professora sim, tia não - car-
tas a quem ousa ensinar”,
estudar é, em primeiro lugar, um que-fazer crítico, criador, recriador, não
importa que eu nele me engaje através da leitura de um texto que trata ou
discute um certo conteúdo que me foi proposto pela escola ou se o realizo
partindo de uma reflexão crítica sobre um certo acontecimento social ou
natural e que, como necessidade da própria reflexão, me conduz à leitura
de textos que minha curiosidade e minha experiência intelectual me suge-
rem ou que me são sugeridos por outros. (FREIRE, 1997, p. 20)
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mesmo e ao outro, de forma a abarcar o contexto social. É este tipo de forma-
ção comprometida que se pretende usando o artivismo aliadas aos princípios da
pedagogia feminista.
Alguns exemplos do que pode ser trabalhado nas diversas esferas da Arte
dentro e fora das instituições: oficinas de pinturas, rodas de conversas com cria-
ção de painéis, cursos lúdicos variados, arte com materiais reciclados, monta-
gem com colagens, lambe-lambes, grafites com pincéis e/ou giz, artes digitais,
memes, banners com ferramentas on-line, quadrinhos, fotonovelas, vídeos, pod-
casts, charges, fotografias, performances, poesias, entre outros. Tudo que possa
tornar o processo mais interessante, menos entediante para o professor, que já
tem tanto a processar durante todas as suas horas de trabalho.
Em relação à pedagogia feminista, ela pode ser trabalhada utilizando as
premissas e valores que Shrewsbury (1987) traz para a sala de aula: empodera-
mento, comunidade e liderança. O primeiro item tem o objetivo de aumentar o
poder de todos os atores, transformando-os em protagonistas de seu aprendiza-
do. Em relação à segunda premissa, explica-se que a sala de aula deve cultivar
um senso de mutualidade, conexão e cuidado, onde as tomadas de decisão são
feitas pelo processo de consenso. Além disso, a última premissa é o desenvolvi-
mento da liderança, parte importante dos objetivos libertadores, onde os alunos
adquirem habilidades de liderança por meio da participação responsável no de-
senvolvimento do seu aprendizado.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
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estudos referentes à educação, pois a partir de conhecimentos já estudados, o
pesquisador busca analisá-los para responder seu problema do objeto de estudar
ou comprovar suas hipóteses, adquirindo novos conhecimentos sobre o assunto
pesquisado. De tal modo, foram analisados artigos, livros, dissertações e teses
que abarcavam os temas abordados, a fim de permitir uma melhor compreensão
dos conceitos e dos textos subsequentes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Criar arte é, em si, um ato político. Essencialmente pela maneira que afeta
o mundo, como um ato de resistência cultural. O artivismo aliado à pedagogia
feminista tem a possibilidade de criar uma formação de professores mais di-
nâmica, bonita, consciente, engajada. Sabe-se que há muito que mudar na e a
partir da educação superior para tornar as experiências de aprendizagem signi-
ficativas e empoderadoras nas salas de aula. Porém, conforme disse Freire, há
de se esperançar, se levantar, ir atrás, construir e jamais desistir! Deve-se levar o
sonho adiante e juntar-se com outros para fazer de outros modos.
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