Prescrição e Decadência - Consumidor

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DIREITO DO

CONSUMIDOR

Gustavo
Santanna
PRESCRIÇÃO E
DECADÊNCIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Diferenciar a prescrição da decadência.


• Aplicar a prescrição ao caso concreto.
• Demonstrar a decadência ao caso concreto.

INTRODUÇÃO

A prescrição e a decadência estão ligadas à inércia e o decurso do tempo do


titular do direito. Os institutos da decadência e da prescrição têm tratamento
específico no Código de Defesa do Consumidor, respectivamente, nos artigos
26 e 27 do Código de Defesa do Consumidor.

Nesta Unidade de Aprendizagem você vai conhecer a regulamentação destes


dois institutos pelo Código de Defesa do Consumidor

A PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO CÓDIGO CIVIL

A prescrição e a decadência são institutos que decorrem do entendimento


segundo o qual o exercício de um direito não pode ficar pendente de forma
indefinida no tempo. Possuem como objetivo conferir maior equilíbrio e
segurança às relações jurídicas e sociais, visto que impedem que determinado
ato/fato jurídico possa produzir seus efeitos de forma ad aeternum.

Pode-se afirmar, ainda, que a prescrição e a decadência trazem um caráter de


estabilização das relações jurídicas no que se refere aos princípios e garantias
constitucionais, tendo em vista que estes se mostram incompatíveis com
a instabilidade produzida pela possibilidade de exercício temporalmente
ilimitado de direitos.

Importante citar, no que tange à codificação desses institutos, que o Código


Civil de 1916 não os tratava de forma sistêmica e isolada, visto que utilizava
da mesma nomenclatura – prescrição – ao discorrer sobre qualquer um
dos dois. Tal tratamento causou confusão na doutrina e na jurisprudência,
motivando a realização, mesmo que distinta da legislação, de separação
entre os institutos.

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A Codificação de 2002, ao valer-se do princípio da operabilidade, utilizou
da composição de vários entendimentos já consagrados na doutrina e
na jurisprudência, em especial no que tange aos institutos da prescrição e
da decadência, no intuito de conciliar a lei com a prática jurídica (FARIAS;
ROSENVALD, 2013, p. 741).

Da prescrição
Conforme disposto no artigo 189 do Código Civil vigente, a prescrição é a
forma pela qual é extinta a pretensão (é a afirmação de ter direito) de quem
teve violado determinado direito, em decorrência do decurso do tempo,
nos termos dos artigos 205 e 206. Dessa forma, caso o titular do direito de
pretensão quedar-se inerte por prazo superior ao estipulado na lei, receberá
como “pena” a impossibilidade de reclamar a violação sofrida diante do Poder
Judiciário.

Importante ressaltar, nesse ponto, que a extinção refere-se somente à


pretensão, sem qualquer relação ao direito violado, quedando-se este apenas
sem proteção jurídica para solucioná-lo a partir da ocorrência da prescrição.
Tal afirmação é corroborada pelo artigo 882 do Código Civil, que dispõe que
“não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita ou cumprir
obrigação judicialmente inexigível”. Isto é, se alguém pagar uma dívida
prescrita, não pode requerer a devolução do valor pago, já que o direito do
crédito não foi extinto pela prescrição.

Os prazos prescricionais encontram-se dispostos nos artigos 205 e 206.


Enquanto o primeiro traz a regra geral, determinando a ocorrência da
prescrição em 10 (dez) anos, nos casos em que a lei não fixar prazo menor, o
artigo 206 traz rol de casos em que a prescrição se dá em tempo diferenciado
da regra geral.

Artigo 206. Prescreve:


§1º Em um ano:
I – a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados a
consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem
ou dos alimentos;
II – a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele,
contado o prazo;
a) par ao segurado, no caso de seguro de responsabilidade civil, na data em

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que é citado para responder à ação de indenização proposta pelo terceiro
prejudicado, ou da data que a este indeniza, com a anuência do segurador;
b) quanto aos demais seguros, da ciência do fato gerador da pretensão;
III – a pretensão dos tabeliães, auxiliares da justiça, serventuários judiciais,
árbitros e peritos, pela percepção de emolumentos, custas e honorários;
IV – a pretensão contra os peritos, pela avaliação dos bens que entraram
para a formação do capital de sociedade anônima, contado da publicação
da ata da assembleia que aprovar o laudo;
V – a pretensão dos credores não pagos contra os sócios ou acionistas e
os liquidantes, contado o prazo da publicação da ata de encerramento da
liquidação da sociedade;
§2° Em dois anos, a pretensão para haver prestações alimentares, a partir
da data em que se vencerem.
§3º Em três anos:
I – a pretensão relativa a aluguéis de prédios urbanos ou rústicos;
II – a pretensão para receber prestações vencidas de rendas temporárias
ou vitalícias;
III – a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações
acessórias, pagáveis em períodos não maiores de um ano, com
capitalização ou sem ela;
IV – a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa;
V – a pretensão de reparação civil;
VI – a pretensão de restituição dos lucros ou dividendos recebidos de má-
fé, correndo o prazo da data em que foi deliberada a distribuição;
VII – a pretensão contra as pessoas em seguida indicadas por violação da
lei ou do estatuto, contado o prazo:
a) para os fundadores, da publicação dos atos constitutivos da sociedade
anônima;
b) para os administradores ou fiscais, da apresentação aos sócios do
balanço referente ao exercício em que a violação tenha sido praticada, ou
da reunião ou assembleia geral que dela deva tomar conhecimento;
c) para os liquidantes da primeira assembleia semestral posterior à
violação;
VIII – a pretensão para haver o pagamento de título de crédito, a contar do
vencimento, ressalvadas as disposições de lei especial;

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IX – a pretensão do beneficiário contra o segurador e a do terceiro
prejudicado no caso de seguro de responsabilidade civil obrigatório.
§4º Em quatro anos, a pretensão relativa à tutela, a contar da data da
aprovação das contas.
§5º Em cinco anos:
I – a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento
público ou particular;
II – a pretensão dos profissionais liberais em geral, procuradores
judiciais, curadores e professores pelos seus honorários, contado o prazo
da conclusão dos serviços, da cessação dos respectivos contratos ou
mandato;
III – a pretensão do vencedor para haver do vencido o que despendeu em
juízo.

Sobre a contagem do prazo prescricional, o Enunciado nº 14, aprovado na I


Jornada de Direito Civil, assim expõe: “Art. 189: 1) o início do prazo prescricional
ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito
subjetivo”. Este entendimento foi aceito e utilizado pela corrente majoritária
da doutrina, que assevera como termo inicial da contagem do tempo
prescricional o momento do surgimento da pretensão.

Todavia, referido posicionamento é contestado jurisprudencialmente, em


especial pelo Superior Tribunal de Justiça, que se utiliza do princípio da actio
nata, em seu viés subjetivo, para aferir a ocorrência da prescrição. Neste, o
critério utilizado como marco para início da contagem do prazo é o momento
em que sujeito conheça da violação de seu direito.

Administrativo. Responsabilidade civil do Estado. Pretensão de indenização


contra a Fazenda Nacional. Erro médico. Danos morais e patrimoniais.
Procedimento cirúrgico. Prescrição. Quinquídio do art. 1º do Decreto
20.910/1032. Termo inicial. Data da consolidação do conhecimento efetivo
da vítima das lesões e sua extensão. Princípio da actio nata. 1. O termo a quo
para aferir o lapso prescricional para ajuizamento de ação de indenização
contra o Estado não é a data do acidente, mas aquela em que a vítima teve
ciência inequívoca de sua invalidez e da extensão da incapacidade de que
restou acometida. Precedentes da Primeira Seção. 2. É vedado o reexame
de matéria fático-probatória em sede de recurso especial, a teor do que
prescreve a Súmula 07 desta Corte. Agravo regimental improvido. (STJ,

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AgRg no REsp nº 931.896/ES, Relator Ministro Humberto Martins, julgado
em 20.09.2007).

A actio nata objetiva é aquela prevista no Enunciado nº 14, ou seja, prevê como
termo inicial do prazo prescricional a violação do direito, independente do
conhecimento do titular deste. Ressalta-se que a aplicação do viés subjetivo
do princípio da actio nata prestigia a boa-fé de forma mais vigorosa, impedindo
que o indivíduo seja prejudicado em virtude do desconhecimento da lesão de
seu direito, tendo em vista a possibilidade da afronta de um direito sem que o
seu titular tenha imediato conhecimento.

Não nos parece racional admitir-se que a prescrição comece a correr sem
que o titular do direito violado tenha ciência da violação. Se a prescrição
é um castigo à negligência do titular – cum contra desides homines, et sui
juris contentores, odiosa exceptiones oppositae sunt –, não se compreende a
prescrição sem a negligência, e esta certamente não se dá quando a inércia
do titular decorre da ignorância da violação. Nosso Código Civil, a respeito
de diversas ações, determina expressamente o conhecimento do fato de
que se origina a ação, pelo titular, como ponto inicial da prescrição. (LEAL,
1959, p. 37)

Percebe-se, pela citação do autor acima, que desde o Código Civil de 1916, o
prazo prescricional tinha início no conhecimento do fato pelo titular do direito,
pela sua inércia, e não pela sua ignorância.

Da decadência

O Código Civil de 2002 não conceituou o instituto da decadência,


diferentemente do que foi visto com a prescrição. Sua definição deriva do
entendimento doutrinário que a reconhece como “a perda de um direito,
em decorrência da ausência de seu exercício” (TARTUCE, 2016, p. 333). A
decadência é a perda do próprio direito, em decorrência do seu não exercício
em um determinado decurso de tempo, quando a legislação determina um
prazo para a execução deste.

Ocorre a decadência quando um direito potestativo não é exercido,


extrajudicialmente ou judicialmente, dentro do prazo para exercê-lo, o que
provoca a decadência desse direito potestativo. Ora, os direitos potestativos
são direitos sem pretensão, pois são insuscetíveis de violação, já que a eles

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não se opõe um dever de quem quer que seja, mas uma sujeição de alguém
(o meu direito de anular o negócio jurídico não pode ser violado pela parte
a quem a anulação prejudica, pois esta está apenas sujeita a sofrer as
consequências da anulação decretada pelo juiz, não tendo, portanto, dever
algum que possa descumprir). (MOREIRA ALVES, 2003, p. 161)

Os prazos decadenciais, diferentemente dos prescricionais, encontram-se


dispersos por todo o Código Civil vigente. Ademais, outra diferença existente
entre os dois institutos é a forma pela qual é estipulado cada prazo; enquanto
na prescrição o tempo é determinado em anos, na decadência a contagem
é realizada em dias, meses ou anos e dias. Entretanto, cabe o alerta de que
certos prazos decadenciais são determinados em anos, como, por exemplo,
os previstos nos artigos 178, 179, 501 e 1.649 na legislação civil pátria.

Necessário ressaltar que não se aplica como regra geral à decadência as


regras que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição, salvo
disposição legal em contrário, conforme disposto no artigo 207 do Código
Civil. A exceção à referida normativa é apresentada no artigo subsequente que
prevê a aplicação dos artigos 195 e 198, inciso I ao instituto da decadência.

Ao aplicar o artigo 198, inciso I ao instituto da decadência, a legislação civil


prevê a impossibilidade da contagem do prazo da decadência contra os
absolutamente incapazes previstos no artigo 3º da mesma normativa, tendo
em vista que não seria razoável deixar um incapaz sofrer por um prejuízo
causado pela atuação de seu representante. Igualmente, a aplicação do artigo
195 reconhece o direito de ação regressiva dos relativamente incapazes e das
pessoas jurídicas contra seus representantes ou assistentes para os casos de
não alegação oportuna da decadência a favor de seu representado.

Ação rescisória. Prazo decadencial. Discute-se no REsp se o prazo de dois


anos previsto no art. 495 do CPC para a propositura de ação rescisória flui
em desfavor de incapazes. Noticiam os autos que os recorrentes, ainda
menores de idade, ajuizaram ação de indenização visando à condenação
dos recorridos pelos danos morais sofridos em razão da morte de seu avô,
em virtude de acidente em que esteve envolvido veículo pertencente a
um dos recorridos. O acórdão que julgou o recurso de apelação interposto
reformou a sentença para julgar improcedente o pedido. Alegaram, na
inicial da ação rescisória, que os fundamentos da improcedência tomaram
o pedido relativo ao dano moral como se se tratasse de dano material,
pois exigiu a dependência econômica como requisito para acolhimento

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do pleito. O relator, monocraticamente, julgou extinta a ação rescisória
ao fundamento de ter ocorrido decadência. Alegam os recorrentes que,
à época, por serem menores absolutamente incapazes, não fluía contra
eles prazo, nem de decadência nem de prescrição. Admitido o REsp, Min.
Relator entendeu que o prazo para o ajuizamento da ação rescisória
é de decadência (art. 495, CPC), por isso se aplica a exceção prevista no
art. 20 do CC/2002, segundo a qual os prazos decadenciais não fluem
contra os absolutamente incapazes. Esse entendimento foi acompanhado
pelos demais Ministros, que deram provimento ao REsp e determinaram
o prosseguimento da ação rescisória (REsp nº 1.165.735/MG, Relator
Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 06.09.2011).

A PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA NO CÓDIGO DE DEFESA


DO CONSUMIDOR

O legislador, ao elaborar o Código de Defesa do Consumidor – Lei nº


8.078/1990 – disciplinou de forma própria os institutos da prescrição e da
decadência, determinando que há prescrição quando se trata de fato do
produto ou do serviço, ou seja, de acidente de consumo, e decadência no caso
de vício do produto ou do serviço, seja este de qualidade ou de quantidade.

Da prescrição
A prescrição no Código de Defesa no Consumidor está prevista no artigo 27
(também há previsão no artigo 45, § 5º, mas será objeto de estudo em outro
capítulo) que determina que a pretensão à reparação pelos danos causados
por fato do produto ou do serviço prevista prescreve em cinco anos, tendo
como marco inicial para a contagem do prazo a data de conhecimento do dano
e de sua autoria. Confere-se que, diferentemente do previsto no Código Civil,
a prescrição do Código Consumerista possui somente o prazo de cinco anos.
Outrossim, já se encontra com a teoria da actio nata subjetiva consignada,
visto que determina como termo inicial para fluência do tempo o momento
de conhecimento do dano e de sua autoria pelo consumidor.

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. CIVIL. CONSUMIDOR.


NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. INVESTIMENTO FICTÍCIO.
ESTELIONATO PRATICADO POR GERENTE DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
APLICAÇÃO DO CDC. DEFEITO DO SERVIÇO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.

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1. Controvérsia acerca da prescrição da pretensão indenizatória originada
de fraude praticada por gerente de instituição financeira contra seus
clientes.
2. “As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos
causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por
exemplo, abertura de conta corrente ou recebimento de empréstimos
mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal
responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se
como fortuito interno” (REsp 1.197.929/PR, rito do art. 543-C do CPC).
3. Ocorrência de defeito do serviço, fazendo incidir a prescrição quinquenal
do art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, quanto à pretensão dirigida
contra a instituição financeira.
4. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
(AgRg no REsp nº 1.391.627/RJ, Relator Ministro Paulo de Tarso
Sanseverino, julgado em 04.02.2016).

Como bem observou Marcelo Fonseca Boaventura (2011, p. 1242-1243),


inicialmente parece que o CDC inseriu dois requisitos para o início da
contagem do prazo prescricional: o conhecimento do dano e o conhecimento
de sua autoria. Contudo, na verdade, são três, pois acresce-se a esses dois o
conhecimento do defeito “porque o conhecimento do dano deve pressupor o
conhecimento do defeito”.

A decadência
A decadência encontra-se prevista no artigo 26 do Código de Defesa do
Consumidor, que determina a caducidade do direito de reclamação pelos
vícios aparentes ou de fácil constatação em 30 (trinta) dias, quando tratar-se
de fornecimento de serviço e de produtos não duráveis, e de 90 (noventa) dias
nos casos de fornecimento de serviço e de produtos duráveis, iniciando-se a
contagem do prazo decadencial a partir da entrega efetiva do produto ou do
término da execução dos serviços.

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FIQUE
ATENTO

Serviços e produtos não duráveis são aqueles de vida útil breve,


consumidos com pouco tempo de uso, como, por exemplo,
alimentos, alguns tipos de medicamentos, produtos de limpeza,
entre outros. Produtos e serviços duráveis são aqueles que têm
vida útil prolongada, como veículos, eletrodomésticos, móveis,
imóveis, entre outros.

Importante também a diferenciação entre vício aparente e vício oculto.

O primeiro, como o próprio nome indica, é o vício de fácil constatação,


visível ou percebível tão logo o produto é recebido ou o serviço prestado. O
vício oculto é aquele que não pode ser percebido desde logo, que só vem a
se manifestar depois de um certo tempo de uso do produto ou de fruição
do serviço, mas dentro do seu período de vida útil. (CAVALIERI FILHO,
2014, p. 363)

Os prazos para os vícios aparentes e ocultos são os mesmos, o que os


diferencia é o termo inicial para a sua contagem. No vício aparente ou de
fácil constatação, o prazo decadencial é contado a partir da entrega efetiva
do produto ou do término da execução do serviço, conforme o artigo 26, §
1º do CDC. Já no vício oculto, conforme determina o § 3º do mesmo artigo,
o prazo só começa a correr a partir do momento em que ficar evidenciado o
defeito. Ocorre vício oculto quando se exige do consumidor um exame mais
meticuloso para a descoberta do vício. Já é aparente quando o vício é “gritante,
que salta aos olhos” (FERREIRA, 2011, p. 1261).

A partir da leitura do § 3º, do artigo 26, se confere que o Código de Defesa do


Consumidor não estabeleceu um prazo de garantia legal para que o fornecedor
responda pelos vícios do produto ou do serviço prestado. Entretanto,
compreende-se que o fornecedor não pode ser responsável ad aeternum
por seus produtos e serviços, tendo em vista que, por mais duráveis que
possam ser, não são eternos. Desse modo, a doutrina consumerista possui
o entendimento que, nos casos em que o vício é oculto, deve ser adotado o
critério da vida útil do bem.

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Se o vício é oculto porque se manifestou somente com o uso,
experimentação do produto ou porque se evidenciará muito tempo após
a tradição, o limite temporal da garantia legal está em aberto, seu termo
inicial, segundo o § 3º do art. 26, é a descoberta do vício. Somente a partir
da descoberta do vício (talvez meses ou anos após o contrato) é que
passará a correr os 30 ou 90 dias. Será, então, a nova garantia eterna?
Não, os bens de consumo possuem uma durabilidade determinada. É a
chamada vida útil do produto. (MARQUES, 2003, p. 1196-1197)

Na mesma linha segue Antônio Herman Benjamin (1991, p. 134-135),


que coloca: “Diante de um vício oculto, qualquer juiz vai sempre atuar
casuisticamente. Aliás, como faz em outros sistemas legislativos. A vida útil
do produto ou do serviço será um dado relevante na apreciação da garantia”.
O Código de Defesa do Consumidor, diferentemente do disposto no Código
Civil, prevê duas causas de suspensão do prazo decadencial no artigo 26,
§ 2º. Conforme o referido parágrafo, obstam a decadência, a reclamação
comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de
produto e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser
transmitida de forma inequívoca, e a instauração do inquérito civil, até seu
encerramento.

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS E MATERIAIS. ENTREGA DE VESTIDO DE NOIVA
DEFEITUOSO. NATUREZA. BEM DURÁVEL. ART. 26, INCISO I, DO CÓDIGO
DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRAZO DECADENCIAL DE NOVENTA DIAS.
1. A garantia legal de adequação de produtos e serviços é direito potestativo
do consumidor, assegurado em lei de ordem pública (arts. 1º, 24 e 25 do
Código de Defesa do Consumidor).
2. A facilidade de constatação do vício e a durabilidade ou não do produto
ou serviço são os critérios adotados no Código de Defesa do Consumidor
para a fixação do prazo decadencial de reclamação de vícios aparentes ou
de fácil constatação em produtos ou serviços.
3. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação
caduca em 30 (trinta), em se tratando de produto não durável, e em 90
(noventa) dias, em se tratando de produto durável (art. 26, incisos I e II, do
CDC).
4. O início da contagem do prazo para os vícios aparentes ou de fácil
constatação é a entrega efetiva do produto (tradição) ou, no caso

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de serviços, o término da sua execução (art. 26, § 1º, do CDC), pois a
constatação da inadequação é verificável de plano a partir de um exame
superficial pelo “consumidor médio”.
5. A decadência é obstada pela reclamação comprovadamente formulada
pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a
resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma
inequívoca (art. 26, § 2º, inciso I, do CDC), o que ocorreu no caso concreto.
6. O vestuário representa produto durável por natureza, porque não se
exaure no primeiro uso ou em pouco tempo após a aquisição, levando certo
tempo para se desgastar, mormente quando classificado como artigo de
luxo, a exemplo do vestido de noiva, que não tem uma razão efêmera.
7. O bem durável é aquele fabricado para servir durante determinado
transcurso temporal, que variará conforme a qualidade da mercadoria, os
cuidados que lhe são emprestados pelo usuário, o grau de utilização e o
meio ambiente no qual inserido. Por outro lado, os produtos “não duráveis”
extinguem-se em um único ato de consumo, porquanto imediato o seu
desgaste.
8. Recurso provido para afastar a decadência, impondo-se o retorno dos
autos à instância de origem para a análise do mérito do pedido como
entender de direito.
(REsp nº 1.161.941/DF, Relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado
em 05/11/2013).

FIQUE
ATENTO

enquanto a prescrição atinge a pretensão, a decadência atinge o


próprio direito. O CDC não apresentou nenhuma causa interruptiva
ou suspensiva da prescrição, contudo, no caso da decadência,
trouxe duas causas que a obstam: A instauração de inquérito
civil até seu encerramento e a reclamação comprovadamente
formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos ou
serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser
transmitida de forma inequívoca.

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REFERÊNCIAS

BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos. Comentários ao Código de


Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 1991.

BOAVENTURA, Marcelo Fonseca. Os institutos da prescrição e da decadência


no CDC. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (orgs.). Direito do
Consumidor: teoria de qualidade e danos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011, p. 1.233-1.250.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor. 4. ed. São


Paulo: Atlas, 2014.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil:


parte geral e LINDB. 11. ed. Salvador: Juspodivm, 2013.

FERREIRA, Willian Santos. Prescrição e decadência no Código de Defesa do


Consumidor. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (orgs.). Direito
do Consumidor: teoria de qualidade e danos. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2011, p. 1.251-1.278.

LEAL, Antônio Luis da Câmara. Da prescrição e da decadência. Teoria geral


do direito civil. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959.

MARQUES, Cláudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.


São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

MOREIRA ALVES, José Carlos. A parte geral do Projeto do Código Civil


Brasileiro. 2. ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

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Conteúdo:

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