Valeria Toledo
Valeria Toledo
Valeria Toledo
Mestrado em Educação
Santos
2007
VALÉRIA DINIZ TOLEDO
Santos
2007
UMA CANÇÃO É PRA ISSO
Aos educandos,
A Elsie, mãe, especialíssima, apoio preciso, anjo presente nos momentos certos.
À família de São Bernardo do Campo: Lívia, Moizes, Rebeca, Julia, Alceu, Miriam,
Alceu Davi, Adelaide, Teresa, Domingos ; e à grande e querida família mineira, pelo
carinho e torcida constantes, mesmo nos momentos mais difíceis.
Às amigas Vanessa, Dislaine, Marina e Fátima (lá de Belém), que, mesmo distantes
e de diferentes maneiras, fizeram-se presentes, incentivando, oferecendo luz e o
estímulo necessário.
Ao professor Dr. Jefferson Ildefonso que, com palavras e ações, abriu-me os olhos,
descortinando a prática educativa numa nova e mais ampla perspectiva.
Ao pessoal do Instituto Arte no Dique Sylvia, José Virgílio, Miriã, Ubiratan, Ana
Beatriz, Jackson, Maria Helena, Zeíres, Maria do PT, Lila e adolescentes da Banda
Querô - pela presteza e atenção em disponibilizar dados, tempo de suas vidas e
compartilhar percepções e vivências relevantes para a elaboração deste trabalho.
The education establish today in a big challenge and finds continuously in process of
reformulation. Appear new educational spaces, varying instruments and the formal
institutions test the crisis of identity and value. The moment demand the exercise of
reconsider the education concepts, to search others educational practices and to
know, with biggest depth, differential proposals of education, that contemplate visions
not reproductive, but transformer of the reality. That inquiry claim to analyze the
context and the inclusive educational practice of experience of non-formal teaching,
that use the art as conductor thread in the education of children, teenagers, young
and adults in situation of risk and social exclusion. And from then to cause reflections
that drive on to establishment of educational actions in the various spaces of
socialization and human formation (especially the school), directions at insertion of
historical subjects, delinquency and leave out of the society, as citizens of law and
fact. The Art Institute at Dique, in suburbs of Santos city, helps the slum residents of
Dique Vila Gilda (Norwest Zone), gets the source of search. Its activities have been
desenvolved since 2002, and it has became cultural reference in the cities around
Santos, especially because the performance of Querô Band, formed by teenagers to
desenvolve their professional abilities. This search has qualitative aspects and its
perspective is dialect. Since the bibliography search, case studies have been dove
base in collecting of facts about involved people. Of the relating documents to the
trajectory and intervuos with components of the projects: components of the band
Querô, master of percussion, team work of the Institute (residents or not in the
community). They utilized like a theoric reference the thought of authors like Castel,
Wanderley and Sawaia (social exclusion); Freire, Gadotti and Brandão (dialected
perpect of education); Giroux and Sacristán (critical pedagogy of the contents);
Afonso, Gohn and Simson (non-formal educacion); Fischer, Langer and Duarte
Júnior (educacion by art). This work pretends to excite a pertinent debate. The
articulation of the process of knowledge and of the apprenticeship with the art, and
the task to observe it like an instrument of social inclusion in a context of non-formal
education, they can contribute to the necessary dialogue and communication spaces,
contributing to the amplification of the frontiers of the actual education and to the
promotion of an inclusion not just quantity, but principly quality.
Key words: social inclusion, non-formal education, educacion by art, Institute Art at
Dique.
RELAÇÃO DE TABELAS
Tabela 5 - Sexo do chefe da família : Caminho São Sebastião e Vila Telma .......... 80
Gráfico 2 - Sexo do chefe da família :Caminho São Sebastião e Vila Telma II.........79
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................13
Apresentação..........................................................................................................13
Justificativa, Problema e Objetivos..........................................................................17
Abordagem e procedimentos metodológicos...........................................................22
ANEXOS .................................................................................................................162
13
INTRODUÇÃO
Apresentação
O estudo em pauta traz como proposta a análise de práticas pedagógicas que
visam a inclusão social e que possuem, como fio condutor das ações educativas, a
arte, aliada à cultura. A pesquisa ocorreu num contexto de educação não-formal que
atende a crianças, adolescentes, jovens e adultos em situação de risco e exclusão
social. A intenção foi verificar se a utilização da arte, como expressão cultural dos
sujeitos analisados, contribui para o processo de inclusão social, e a partir daí,
suscitar reflexões que conduzam ao estabelecimento de ações educativas, nos
diversos espaços de socialização e formação humana (especialmente a escola), que
visem a inserção de sujeitos históricos, marginalizados e excluídos da sociedade
como cidadãos de direito e de fato.
A escolha do assunto partiu de constatações que se transformaram em
ansiedade e, não poucas vezes, em silenciosa angústia, relacionadas à atuação no
espaço escolar, ao longo de minha trajetória pelos caminhos da Educação. Iniciei a
carreira profissional em Belo Horizonte, na década de 1980 (logo após concluir o
Curso de Magistério), como professora de 1ª a 4ª série, função exercida durante
quatro anos numa tradicional escola particular da capital mineira. Ao optar pelo curso
universitário, diplomei-me em História, tendo ministrado, a partir daí, aulas no ensino
fundamental, cursos técnicos e também Magistério, já nas cidades de São Paulo,
São Bernardo do Campo e Santos, desde 1992. Há vinte e dois anos atuando na
educação, doze dos quais na rede particular de ensino, dediquei-me nos últimos dez
anos à Rede Pública Estadual (São Paulo) e Municipal (Prefeitura de Cubatão),
trabalhando com classes de Ensino Fundamental, Médio e Ensino de Jovens e
Adultos. No ano de 2004, como Assistente Técnica Pedagógica de História e Ensino
Religioso na Diretoria de Ensino - Região de São Vicente, coordenei a Educação
Indígena, projeto implementado há alguns anos pela Secretaria de Estado da
Educação de São Paulo. O contato com escolas instaladas em aldeias, nos
municípios de Mongaguá, Itanhaém e Peruíbe (litoral sul de São Paulo), enriqueceu
a visão acerca da prática educativa, e suscitou questionamentos, uma vez que as
comunidades indígenas possuem um olhar diferenciado quanto ao processo de
aprendizagem, mas, ao mesmo tempo, acabam adequando-se, em diversos
14
aspectos, aos moldes de ensino estabelecidos pela instituição formal, que pouco
tem a ver com sua cultura, realidade e situação de vida.
Nesse tempo de experiência na área do ensino, em contato com escolas
particulares direcionadas a um grupo mais elitista e, nos últimos anos, em escolas
públicas de diferentes estilos, atendendo a educandos com menores oportunidades
sociais (alguns deles em situação de extrema carência e precariedade), foi possível
observar e vivenciar muitas das transformações ocorridas no mundo
contemporâneo. Nele estamos inseridos, sofrendo ou provocando mudanças,
resistindo ou adaptando-nos diariamente às novas condições de vida, num ritmo
intenso que impede muitas vezes a compreensão da realidade e suas manifestações
no cotidiano. O momento atual é o de mais uma transição histórica em âmbito
mundial: mudanças nos costumes; nas relações familiares, econômicas e sociais;
nos processos de comunicação cada vez mais acelerados e globalizados. Há uma
reformulação geral dos valores individuais e coletivos, que colocam em cheque
concepções enraizadas durante anos, fato que, de certa forma, desestabiliza
relações, instituições básicas de formação humana e abre caminho para novas
posturas e dinâmicas sociais. Samara (1993), que analisa importantes questões
relacionadas à família brasileira, revela, por exemplo, as transformações no papel
feminino em diferentes momentos econômicos e constata que, já no início do século
XX, mulheres profissionais começam a ocupar espaços e a exercer atividades
inéditas como a prestação de serviços (médicas, advogadas, dentistas, empregadas
públicas, entre outras) e ocupações em vários ramos da indústria. Esse processo
acelerou-se com a globalização e, aliado a outros fatores, colaborou para o
surgimento de uma nova estrutura familiar, diferenciada dos moldes tradicionais -
pai, mãe e filhos.
O mercado de trabalho, absorvendo um número crescente de mulheres, bem
como os intensos processos de migração verificados em nosso país, trouxeram à
tona uma realidade educacional diferenciada. Os pais, em especial as mulheres, têm
menos tempo para a educação e formação de seus filhos, e, via de regra, acabam
transferindo para a escola, além do papel tradicional de sistematização dos
conhecimentos, a tarefa de educar e infundir valores.
Outro fator importante que modificou o perfil da escola pública atual é a sua
popularização. De uma clientela elitista, direcionada para conteúdos e estratégias de
ensino voltados especificamente para as camadas sociais mais privilegiadas,
15
linguagens artísticas como música, dança, teatro, observo uma sensível melhora no
processo de ensino-aprendizagem, que se apresenta mais motivador. Os alunos se
interessam pelo assunto, envolvem-se na preparação do trabalho proposto,
aprendem a expressar suas opiniões e relacionam-se de maneira mais leve e
amigável com a professora.
Em junho de 2003, participando do Congresso Educação para a Cidadania 1,
no SESC Santos, conheci o Projeto Arte no Dique, na época coordenado pelo
Instituto Elos-Santos/SP, e que se tornou objeto de estudo dessa pesquisa (agora
como Instituto Arte no Dique). Mesclaram-se, na ocasião, reflexões teóricas e relatos
de experiências inovadoras realizadas na área da educação em nosso país. Foi
interessante, além das reflexões sobre educação cidadã, a apresentação de projetos
pedagógicos em funcionamento no Brasil, com ênfase nas atividades artísticas.
Alguns deles conduzidos por instituições educacionais, governos municipais; outros
por grupos autônomos, geralmente Organizações Não Governamentais, que têm
obtido resultados no processo de aprendizagem de seus integrantes, principalmente
entre grupos sociais excluídos e desfavorecidos. Esses grupos, que conduzem
experiências educacionais não escolares, vêm ocupando espaço significativo na
atual sociedade brasileira.
Tais projetos parecem apontar para a tentativa de preencher lacunas que a
instituição escolar tem deixado. Existe, em muitos deles, um traço comum: valem-se
da Arte e da Cultura como fio condutor para trabalhar o conhecer e o fazer. Os
educandos são ouvidos e valorizados, tornando-se protagonistas de sua própria
aprendizagem. Cesare La Rocca 2, coordenador de um desses projetos, que
promove a educação por meio da fusão entre música e dança, defende a utilização
da arte e cultura a serviço da educação. Sua experiência com crianças, jovens
pobres e marginalizadas na cidade de Salvador (BA), é narrada no livro Plantando
Axé: uma Proposta pedagógica (BIANCHI, 2000). O educador incorpora o
1
O Congresso se realizou nos dias 18 a 21 de junho de 2003, no SESC Santos, com a presença de
palestrantes reconhecidos na área da Filosofia, História e Educação: Nicolau Sevcenko, Jaime
Pinsky, Renato Janine Ribeiro, Carlos Rodrigues Brandão, Mário Sérgio Cortella, entre outros.
Projetos como A arte construindo cidadania (Faculdade Latino Americana de Educação/CE), O
Som é assim (SESC Ipiranga /SP), Reinventando a vida - Público que dança (Prefeitura de
Votorantin/SP), Teatro do Oprimido: construindo cidadania (Prefeitura de Santo André), A arte
construindo possibilidades (Casa do Zezinho/SP), Encontro com o diferente (ONG Casa das Artes
da Mangueira/RJ), ganharam maior visibilidade através das comunicações orais realizadas.
2
Vencedor do Prêmio Educador, conferido pela Revista Educação e Cidade Escola Aprendiz no ano
de 2000, pelo belo trabalho do Projeto Axé (BORGES, 2000).
19
pensamento de educadores como Paulo Freire, que afirma o caráter político do ato
de educar, e Jean Piaget, do qual obteve a compreensão de como ocorre esse ato.
Mais tarde assimilou também conceitos desenvolvidos pelos psicanalistas Sigmund
Freud e Jacques Lacan, conhecendo melhor a dinâmica do desejo no ser humano.
Daí, surgiu a pedagogia do desejo, síntese da metodologia do Projeto Axé. Ele
afirma:
Segundo autores como Fischer (2002), Langer (1971) e outros, a arte, que
não é neutra (pois expressa valores e as inquietações de seu tempo), tem
importante papel no resgate do educando enquanto sujeito histórico e ser integral,
uma vez que promove o desenvolvimento da auto-estima, das faculdades mentais,
da capacidade ética e da aquisição de uma postura crítica frente à realidade. Para
Macedo (2000, p. 71), coordenadora de Cultura e Arte do Projeto Axé, a arte não se
constitui apenas como meio de educação, e sim como educação em si mesma,
uma vez que, através da poética, mobiliza os sentimentos, a razão e o fazer,
transformando o ser humano e ressignificando o mundo. Faz-se necessário buscar
sua importância no processo educativo, entendendo-o de maneira mais ampla que o
simples ensino escolar.
As instituições de ensino não-formal estimulam a participação coletiva,
fundamentam-se na cultura, na memória, na educação e na arte, alternando
espaços de tradição e de inovação transgressora. O conceito de educação não-
formal aqui empregado baseia-se nas idéias do sociólogo Almerindo Janela Afonso4
(1989), que distingue entre ensino formal, informal e ensino não-formal. Segundo
ele, a educação não-formal se constitui num processo estruturado e organizado,
porém diferenciado das escolas, e diverge destas principalmente no que respeita à
não fixação de tempos e locais e à flexibilidade na adaptação dos conteúdos de
aprendizagem a cada grupo concreto (p.78). Autoras como Von Simson (2001) e
Gohn (2001) contribuem para a percepção de que estas instituições não possuem as
amarras da educação formal, procuram pautar-se por parâmetros diferenciados e
buscam conduzir o processo educacional por caminhos inovadores.
Ao observar experiências em educação não-formal, em que a prática artística
é essencial e valorizada, a idéia inicial foi verificar se, nesse tipo de ensino, os
resultados educacionais poderiam ser significativos e a arte utilizada de forma mais
livre e facilitadora da aprendizagem. No Instituto Arte no Dique (que pareceu
adequado como objeto de pesquisa), foram feitos levantamentos através de
4
Doutor em Educação, na área de conhecimento de Sociologia da Educação pela Universidade do
Minho - Portugal, onde exerce funções docentes e de investigação desde 1985, e licenciado em
Sociologia pela Universidade de São Paulo, no Brasil.
21
5
Falaremos no terceiro capítulo, com maiores detalhes sobre as parcerias e as relações
estabelecidas entre empresas, governo e o Instituto Arte no Dique.
23
adotam essa orientação se dedicam não mais às regularidades dos fenômenos, mas
à análise dos significados que os indivíduos dão às suas ações, no meio ecológico
em que constroem suas vidas e suas relações, à compreensão dos sentidos dos
atos e das decisões dos atores sociais (CHIZZOTTI, 2003, p.78). Conforme esta
abordagem, existe uma relação dinâmica entre o sujeito e a sua realidade, uma
ligação forte entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. Por isso, a mera
quantificação de resultados não basta para desvendar a realidade pesquisada. Além
disso, o sujeito observa outros sujeitos; de modo que o objeto de observação não é
neutro nem inerte; possui significados e estabelece relações.
Severino (2001) afirma que as formas de conhecimento e de pesquisa, na
área educacional, não podem ocorrer da mesma maneira que as ciências naturais, o
que não significa uma oposição ao conhecimento científico tradicional, baseado na
concepção cartesiana. O que se faz necessário, segundo ele, é uma outra
abordagem do conhecimento que vá além daquela aplicada às ciências naturais. O
campo da ciência da educação pertence às ciências humanas, é permeado pela
prática histórico-social dos objetos de pesquisa (também sujeitos), por isso exige
uma abordagem diferenciada e uma metodologia específica.
Dentro dessa visão, utiliza-se a concepção dialética, por ser mais abrangente
que a fenomenológica. Conforme Severino:
24
6
No Barracão Plínio Marcos, erguido pela comunidade em regime de mutirão, funcionaram as
oficinas de arte até final de outubro de 2006. Com a requisição do local para a construção de
moradias populares, as oficinas passaram a funcionar na sede da COHAB Santista, situada no bairro
Jardim Rádio Clube, a partir de novembro de 2006.
7
O deputado estadual Fausto Figueira Silva, vereador por três mandatos e eleito pela segunda vez
deputado estadual pelo partido dos Trabalhadores, realiza um trabalho também como médico há
muitos anos junto a comunidades carentes da Baixada Santista, sempre acompanhado por Jurema
Lins, sua assessora parlamentar, formada em Serviço Social pela Universidade Católica de Santos.
8
José Virgílio é atualmente o articulador do grupo. Com a experiência adquirida junto à Secretaria de
Cultura de Salvador e ao Grupo baiano Olodum, é peça importante no estabelecimento de contatos e
parcerias para a continuidade do trabalho do Instituto Arte no Dique.
9
Sylvia Bari tem formação em Psicologia pela Unisantos e especialização em Psicologia Social e
Comunitária pelo Sedes Sapiens, em São Paulo. Trabalha desde 1987 na área de projetos sociais
com crianças, adolescentes e famílias.
10
Bira formou-se nas escolas de percussão do Olodum, em Salvador. Comanda o trabalho artístico
e musical das oficinas de percussão, é compositor e vocalista da banda Querô.
26
11
Conceito marxista que diz respeito à totalidade e inteireza do ser humano em contraposição ao
homem fragmentado, dividido a partir da divisão da sociedade e da especialização do trabalho.
28
CAPÍTULO 1
Neidson Rodrigues
29
12
Baseamo-nos na obra de Giroux (1997), que fornece as bases de uma teoria social crítica da
aprendizagem escolar e utiliza as idéias de Gramsci, Adorno, Horkheimer, Marcuse e Walter
Benjamin. O autor também se fundamenta nos escritos do educador brasileiro Paulo Freire, que,
segundo ele, conseguiu o grande mérito de aliar, à crítica da instituição escolar, um discurso de
esperança e possibilidade de transformação.
32
13
O sociólogo Renato Ortiz foi um dos primeiros intelectuais brasileiros , juntamente com Milton
Santos e Octavio Ianni, a estudar a mundialização, no final dos anos 1980 e início dos 1990. A
temática foi negada inicialmente e exigiu uma espécie de ruptura com o pensamento mais
convencional das ciências sociais. O conceito abrange , não só as transformações econômicas, mas
também as transformações sociais e culturais verificadas no mundo nos últimos trinta anos.
34
Castel (2000, p. 34-35) centraliza sua análise da exclusão não nos efeitos
mais visíveis da crise, mas no processo geral de desestabilização da condição
salarial. Sua abordagem é relevante para a construção dessa dissertação e
perpassa pelo fenômeno do desemprego e da vulnerabilidade do trabalho, que criam
uma nova categoria de pobreza, formada por trabalhadores excedentes, sobrantes,
que não encontram mais espaço no mercado como pessoas produtivas. Ele observa
uma multiplicação de categorias da população que sofrem de um déficit de
integração com relação ao trabalho, à moradia, à educação, à cultura, e, portanto,
pode-se dizer que estão ameaçadas de exclusão (op.cit., p. 43). A pobreza de hoje,
portanto, amplia-se na medida em que ocorre uma degradação da situação anterior
aos últimos trinta anos o trabalho era precário, mas os trabalhadores eram
35
14
Termo traduzido da expressão francesa desaffilié, utilizado por Castel em suas análises sobre a
exclusão social.
36
própria escola, a crise hoje apresenta novas faces e contraditórias explicações que
podem abranger fatores econômicos, sociais, políticos e ideológicos. Ao analisar
esses fatores, o autor incorpora aspectos já mencionados no decorrer desse estudo:
15
Isso foi comprovado durante a pesquisa no Instituto Arte no Dique: há uma tentativa de controle de
freqüência (embora não muito utilizada ou valorizada por alunos e professores), planos anuais de
trabalho, cronograma e relatórios de atividades desenvolvidas.
47
nem sempre claros, nem sempre capazes de contribuir para um processo realmente
democrático de inclusão da sociedade.
16
Conceito redefinido na década de 1960 a partir da atuação dos movimentos de Educação Popular
no Brasil que se inspiraram na prática pedagógica de Paulo Freire. Esses movimentos foram
analisados por Carlos Eduardo Brandão (1985). Esse assunto será tratado com maiores detalhes no
capítulo 3.
51
desse indivíduo com outros espaços educativos ou mesmo deseducativos, que ele
freqüenta, além da escola.
A escola é um espaço cultural dialético onde convivem o conjunto de normas
institucionalizadas, que buscam padronizar e controlar a ação dos sujeitos. Mas é
também formada por uma trama de relações sociais e cotidianas entre os sujeitos
envolvidos, que incluem alianças e conflitos, imposição de normas e estratégias
individuais, ou coletivas, de transgressões e acordos (DAYRELL, 2001, p.137).
O tratamento homogêneo dado ao educando e a valorização apenas da
cultura dominante, além de ignorar as estratégias de resistência, só reforçam a
desigualdade e as injustiças de suas origens sociais, pois muitas vezes o
conhecimento não se torna significativo, sendo mais difícil a aprendizagem.
A instituição de educação-não-formal deve colaborar com a escola no
processo de inclusão dos educandos, trabalhando com sua cultura própria, criando
um espaço intercambiável de ressignificação de saberes e sentidos e a possibilidade
de soltar ou mesmo afrouxar as amarras da visão dominante instituída.
CAPÍTULO 2
Este capítulo propõe uma reflexão sobre o papel da arte como mediadora de
uma educação significativa capaz de promover a inclusão social. A arte desponta
como uma das mais valorizadas práticas pedagógicas da educação não-formal e
constitui-se o eixo central das atividades realizadas pelo universo de pesquisa desse
estudo, o Instituto Arte no Dique. É comum, nestes espaços de ensino, o
desenvolvimento de atividades baseadas nos interesses dos educandos, que
buscam enriquecer sua experiência e valorizar suas raízes culturais:
Isso não quer dizer que diversão e arte séria são fatores excludentes; devem
antes ser complementares e interativos. A arte como diversão não precisa ser
alienante e nem a arte que dialoga e desvela a realidade precisa ser enfadonha e
desinteressante.
A proposta dos que levantam a bandeira da Cultura Popular é trabalhar na
criação de instrumentos culturais e políticos capazes de conscientizar e mobilizar os
subalternos para a transformação de suas condições. Essa visão não desmerece e
nem anula o valor da cultura erudita, mas a redimensiona. Ela servirá não para
manter a distância entre as classes sociais ou para impor sua forma própria de ver o
mundo, e sim para instrumentalizar os excluídos numa práxis autônoma e
libertadora.
O Instituto Arte no Dique tem como ponto forte a música de origem africana.
A batida forte dos instrumentos de percussão alia-se à voz e ao violão do mestre que
conduz o ritmo da banda Querô no estilo samba-reggae. Há um trabalhar constante
com as emoções coletivas as do grupo e as do público. A música, para Fischer,
apresenta um conteúdo muito diversificado e esquivo, notavelmente escorregadio
(2002, p. 222). Possui o poder de, por alguns momentos, igualar emocionalmente as
pessoas. De todas as artes, a música é a que dispõe de maior capacidade de
nublar a inteligência, de embriagar, de criar uma obediência cega e, naturalmente,
67
CAPÍTULO 3
Plínio Marcos
69
17
Estatuto do Instituto Arte no Dique. Aprovado em Assembléia Geral realizada em 29 de setembro
de 2004. Cf. capítulo 1, artigo 1º.
18
O dramaturgo brasileiro, nascido em Santos em 29 de setembro de 1935 e falecido em 19 de
novembro de 1999, representa uma forte inspiração para o Instituto Arte no Dique, pela identificação
com sua obra, voltada para os excluídos da sociedade e a defesa de seus direitos. Cf. <htpp://
www.pliniomarcos.com>. Acesso em: 12 novembro 2006.
71
19
O GRUPUS desenvolveu esse projeto a partir do Plano Diocesano para a Superação da Miséria e
da Fome, da Igreja Católica, que se fundamentou no documento 69, Exigências Éticas e Evangélicas
para a Superação da Miséria e da Fome da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil). O
trabalho realizou-se sob a encomenda da Diocese de Santos por uma equipe multidisciplinar da
UNISANTOS: Marinez Vilella Macedo Brandão (sociologia), Dalva Mendes Fernandes (estatística),
Maria Cidália Ferreira (serviço social) e João Carlos Gomes (economia ). O estudo foi gravado em
CD-ROM, no ano de 2004.
72
20
SIGGeo é uma empresa com experiência e conhecimento em geoprocessamento, engenharia,
consultoria, planejamento e projetos em diversas áreas de atuação Localiza-se na capital paulista.
73
Tabela 1
Distribuição da População Pesquisada por Caminhos: Dique da Vila Gilda
Local Distribuição %
C.Capela 10,45
V.Telma 8,50
C.Divisa 6,92
União 1,39
Durante essa pesquisa foram feitas fotos aéreas, além de visitas domiciliares e
preenchimento de formulários As fotos aéreas representaram uma tentativa de
minimizar o problema do difícil acesso e mapeamento da região. Através delas, os
pesquisadores fizeram a contagem dos telhados e levantaram estatísticas, utilizando
também os dados recolhidos junto à população para chegar ao número de habitantes.
Mangue Seco
Foto 1 : Vista aérea da ilha de São Vicente, onde se avistam os municípios de São
Vicente e Santos.
Vila Telma
Caminho da Divisa
Caminho São José Caminho da Capela/ União
Foto 2 : Vista aérea do Dique de Vila Gilda
76
Tabela 3
Distribuição dos Moradores, segundo a Faixa Etária.
Dique da Vila Gilda
Faixa Etária %
De 4 a 6 anos 6,8
De 7 a 10 anos 13,2
De 11 a 15 anos 10,5
De 16 a 18 anos 7,2
De 19 a 25 anos 11,6
De 26 a 40 anos 21,3
De 41 a 50 anos 7,6
De 51 a 65 anos 5,0
TOTAL 100,0
F
Fonte: Fernanda Muniz, da SIGGeo, 2006.
80
Sexo Nº %
Feminino 879 57,2%
Masculino 609 39,6%
Sem Informação 47 3,2%
Total 1535 100%
São jovens, a grande maioria, mulheres que têm que dar conta da
casa, do trabalho geralmente informal (são empregadas
domésticas, faxineiras). Percebemos de início, por exemplo, que a
gente chamava para a reunião das mães e pouquíssimas vinham,
porque elas já estavam acostumadas a vir para as reuniões e ouvir
só reclamações dos filhos. Elas já estão cansadas de saber e não
falam nada, só escutam. Isso é mais um estresse pra essa mãe,
porque normalmente a mãe, nessa comunidade e também em
outras que eu já trabalhei, vamos dizer, 80% por cento dessas
famílias são matriarcais: é a mãe que mantém, em todos os
sentidos, que é a provedora, embora eu não tenha esse
levantamento, mas eu acho que é isso mesmo. Então é uma mãe
já sobrecarregada (SYLVIA BARI, 2006).
Chefes %
Com registro 38,4
Sem registro 61,6
Total 100,0
Tabela 7
Distribuição dos Chefes de Família Segundo Situação de Trabalho.
Dique da Vila Gilda
Chefes %
Alguma ocupação 74,4
Sem nenhum rendimento 25,6
Total 100,0
3.2.1. Início
21
Para a análise da renda, adotou-se a renda familiar média e renda per capita.
83
da Vila Gilda [...] Nesse espaço, num determinado dia, nós fomos
à favela, porque fomos convidados para uma festa e quando
chegamos lá, tinha ambiente preparado para tocar vários grupos,
palanque com som. E o que chamou atenção foi aquela música
provocativa, tremendamente agressiva e eu diria que inspirava
fortemente aqueles meninos e aquelas moças que estavam ali ao
redor. E tinha somente ela naquele ambiente, nenhum outro tipo
de música, o que me deixou com a impressão de que isso poderia
ser pobre... que o jovem só tivesse aquele tipo de música. Puxa,
como seria bom que a gente trouxesse outras : samba, pagode,
várias... para eles ouvirem de tudo e aí vários deles poderiam
optar. Seria outra coisa : eu acho que me identifiquei com isso ou
com aquilo. Então tivemos a idéia de trazer, de propor a eles que,
através da Sociedade de Melhoramentos, alguma coisa em termos
de outras músicas fosse introduzida ali (JUREMA, 2006).
22
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), o Instituto Elos atua junto a
comunidades e grupos através de projetos participativos que bucam o protagonismo juvenil, o
desenvolvimento sustentável, a valorização da cultura e a inclusão social. Cf.
<http://www.institutoelosbr.org.br>. Acesso em: 25 outubro 2005.
23
O Grupo Cultural Olodum constitui-se numa Organização não Governamental do movimento negro
brasileiro. Foi fundado em Salvador, Bahia, em 25 de abril de 1979 e promove a valorização da
cultura afro-brasileira.Desde 1998 se dedica a desenvolver oficinas de percussão também em
comunidades carentes do Estado de São Paulo: Diadema , Santo André e Rio Grande da Serra.
84
como marca o estilo baiano do Olodum. Houve uma identificação entre esses jovens
e os jovens da comunidade do Dique. A partir daí, a idéia começou a ser
desenvolvida com mais força:
24
Hoje Comissão de Moradores do Arte no Dique, formada por cidadãos e entidades da Zona
Noroeste como: Sociedade Esportiva Cantareira, Creche Cantinho da Criança, Creche Tia Nilda,
Sociedade de Melhoramentos do Dale Coutinho, SESI, escolas públicas e Igreja Católica Sagrada
Família.
85
3.2.2. Organização
25
Não foi possível estabelecer a quantidade precisa de alunos no ano de 2006; apesar da existência
dos diários de classe, esses não são utilizados regularmente ou atualizados diariamente.
87
inscritos nessa modalidade, que se divide em iniciantes (grupo mirim e grupo misto) e
banda Querô.
Outras oficinas são oferecidas em horários diferenciados: teatro, técnica
vocal, violão, pintura em tecido, dança, arte-terapia, alfabetização, desenho gráfico.
Há também a oferta de capoeira, aos sábados, ensinada por um grupo da
comunidade que usa o espaço para as aulas.
Durante a pesquisa realizou-se um levantamento de dados, através de
questões fechadas, com os integrantes da oficina de dança (43 fichas) e da banda
Querô (16 fichas), perfazendo um total de 59 fichas preenchidas26.
Gráfico 3
Freqüência dos integrantes da Banda Querô e Dança Axé.
30 67%
(29)
25
20
15 26%
BANDA QUERÔ
56%
DANÇA AXÉ
10 38% (11)
(9)
5% 6% 2%
5 (6)
(2) (1) (1)
26
A intenção, de início, era fazer o levantamento com todas as oficinas, mas as que deram retorno
foram as de dança, Banda Querô e Mulheres Criativas (grupo de arte-terapia).
88
Gráfico 4
Tempo de participação dos integrantes da Banda Querô e Dança Axé.
TEMPO DE PARTICIPAÇÃO
25 51%
(22)
20
33%
15 (14)
BANDA QUERÔ
DANÇA AXÉ
10 43%
14% 38%
(7) 19%
(6)
5 (6)
2%
(1) (3)
50 96%
40 (41)
30
BANDA QUERÔ
20 DANÇA AXÉ
76%
10 (12) 13% 2% 6% 2% 6%
(2) (1) (1) (1) (1)
0 06 - 20 anos 21 - 30 anos 31 - 40 anos 41 - 50 anos
A flexibilidade com relação à idade dos participantes das oficinas foi uma
reivindicação e uma conquista da própria comunidade do Dique, envolvida no
Projeto.
3.2.3. Parcerias
O estabelecimento de parcerias constitui-se uma das fontes de recursos para a
manutenção do Instituto Arte no Dique (ESTATUTO, 2004). Na prática é essa a
principal forma de sustento (as oficinas são gratuitas). Não há ainda fonte de
recursos próprios capaz de gerar aplicações financeiras em prol do projeto, embora
exista uma caminhada nessa direção.
O Projeto Arte no Dique, ao começar o seu trabalho em novembro de 2002
(antes de se formar como ONG autônoma), passou a receber o apoio de vários
setores da sociedade. No Portfólio (p.11) estão estampadas as logomarcas dessas
empresas e entidades que colaboram de diversas maneiras: estabelecendo acordos,
prestando serviços, sustentando financeiramente. O grupo Olodum entra com a
metodologia e a tecnologia musical; o Santos Futebol Clube estabeleceu um acordo
em que a banda Querô se apresenta na abertura de jogos que não sejam clássicos;
a Contemporânea Brasil facilita a aquisição dos instrumentos musicais utilizados
pelo grupo; o Sistema A Tribuna de Comunicação promove matérias na TV e
imprensa escrita; a COHAB Santista já forneceu material de construção e empresta
atualmente sua sede na zona noroeste para a realização das oficinas e
funcionamento da administração; a empresa Elvira Matilde, uma franquia de Belo
Horizonte instalada no Shopping Praia Mar, em Santos, também apóia fornecendo
figurinos para os espetáculos. Há ainda a Prefeitura Municipal de Santos que doou o
terreno para a construção do Centro Cultural Plínio Marcos e o Ministério da Cultura,
através do qual o Instituto foi incluído no Programa Cultura Viva, um convênio com o
governo federal, que o tornou ponto de referência cultural na Baixada Santista, o que
dá direito a uma verba recebida semestralmente para aplicações. Ainda há outros
parceiros como o Serviço Social do Comércio (SESC), Serviço Social da Indústria
(SESI), Universidade Metropolitana de Santos (Unimes) e empresa Deicmar.
Embora não sejam regulares, patrocinam o grupo na organização de grandes
eventos.
93
27
Cf. < htpp:// www.portogente.com.br>.Acesso em: 07 junho 2006.
94
28
Professora do curso de Estatística da Faculdade de Comunicação da Unisantos, integrante do
GRUPUS e uma das professoras responsáveis pela realização do estudo O Grão de Trigo.
Apresentou sua dissertação de Mestrado O papel do Educador nas áreas de pobreza frente à
exclusão social e digital, na UNISANTOS.
97
distância da moradia até os cestos, seja por falta de informação das conseqüências
do lixo jogado na maré (ibid., p. 55 ).
Os moradores apontaram como principais problemas do domicílio os riscos
relacionados à fragilidade das palafitas, aos feixes de fios elétricos próximos aos
becos de passagem; à falta de água; à quantidade de ratos e baratas, além do
cheiro forte decorrente da falta de saneamento (ibid., p.52). As palafitas, que são as
casas do fundo, encontram-se em estado de degradação e ameaçam a segurança
dos moradores.
Percebe-se claramente a segregação espacial dessa população. Castel
(2002, p. 23) afirma que os excluídos povoam a zona mais periférica, caracterizada
pela perda do trabalho e pelo isolamento social Dubet (2001, p. 8 e 9) refere-se à
periferia como bairros de exílio, onde cresce aprisionada uma pobreza escandalosa
e se concentram os grupos mais frágeis e estigmatizados. Ocupam espaços que
poderíamos chamar delimbo; elas estão e ao mesmo tempo não estão na cidade,
embora integrem a área geográfica desta (FERNANDES, 2005, p.107).
Segundo os próprios moradores, as principais necessidades da região giram
em torno de itens básicos e essenciais a qualquer comunidade para que usufrua um
mínimo de dignidade e cidadania: educação, saúde, segurança, lazer. Condições
que, numa região de periferia, podem tornar-se raras ou até inexistentes.
Tabela 8
Principais necessidades do bairro Dique da Vila Gilda
palafita, nadar no rio dos Bugres, local de despejo do esgoto da região ou assistir
televisão.
E ainda: Antes eu ficava na rua, ficava jogando bola o dia todo, aí meus
irmãos me chamaram e minha mãe foi e me inscreveu (Adolescente F, 2006).
O Instituto Arte no Dique representa, nesse contexto, uma boa opção para os
moradores do Dique, embora seu alcance seja pequeno, se levarmos em
consideração o número de integrantes (de 170 a 220 pessoas, em 2006) e o
tamanho da comunidade do Dique (cerca de 20.037 habitantes, em 2004). Ao propor
um trabalho cultural e artístico desenvolvido pela comunidade, desvelando seus
talentos, valorizando suas origens e discutindo suas questões pessoais e coletivas,
abre-se um espaço de auto-conhecimento e auto-valorização, tão necessário à
recuperação da dignidade e da auto-estima desses sujeitos. Espaço de
transformação e luta e não apenas de reprodução e resignação.
O fato de ter um lugar pra ficar representa muito para essas pessoas, que não
possuem um ambiente confortável e agradável que as segurem dentro de suas
casas. O espaço domiciliar, além de precário, é pequeno e sem privacidade. Daí a
opção da rua para a maioria deles. O Instituto Arte no Dique, assim é local de
encontro e partilha e não apenas de realização das oficinas de arte. Uma espécie de
casa, onde há conversas; jogos como pingue-pongue, dama, cartas; uso de
aparelhos de som. Ali, crianças, adolescentes e jovens, passam boa parte do seu
tempo: costumam chegar cedo para os ensaios e ficar, depois que terminam.
O Instituto representa uma das raras opções de contato com formas
diferenciadas de lazer, arte, cultura e trabalho. Além da oportunidade de conhecer e
conviver com outros lugares, nunca antes freqüentados.
Os adolescentes da banda Querô empolgaram-se ao alistar os lugares onde
já se apresentaram: SESC de Santos e Pompéia, em São Paulo; Centro de
Convenções Mendes, rua XV de Novembro (tradicional ponto de encontro no centro
103
histórico da cidade; Clube Sírio Libanês, entre outros, em Santos. Foi um momento
da entrevista em que todos lembravam e citavam nomes, ao mesmo tempo.
Vejamos a fala de um deles:
O melhor lugar em que nós tocamos aqui [em Santos] foi o Sírio
Libanês com o Chiclete com Banana. As meninas aqui sempre
gostam de folia, assim, ficar no show, se divertir... e foi legal,
meu, porque tinha muita gente, muita gente e a gente foi tocar.
A gente tava num palco humildezinho, pequenininho. A gente
olhava assim, não tinha como ver aquela pessoa, porque era
muita gente (Adolescente A, 2006).
Ele estava aqui e a gente já tinha falado com ele e com sua mãe,
porque ele toca muito bem e estávamos querendo que ele
participasse das apresentações. Nós falamos: Olha, ele precisa
voltar.Mas ela falou: Ah, mas não tem vaga, não deu ainda.Aí
surgiu uma apresentação em Minas Gerais, eles iam também ficar
hospedados em um hotel. E falamos para ele: Infelizmente você
não poderá ir, você está fora dessa. Três dias depois ele foi
sozinho à escola (a mãe dele estava trabalhando), e voltou
matriculado. Ele veio sozinho com o comprovante de matrícula e
disse: olha aqui, eu fui lá, estou matriculado. A gente nem
acreditou! Depois ficamos acompanhando e ele estava
freqüentando. Ele sabe que se sumir, na próxima não vai de novo
(SYLVIA BARI, 2006).
29
Na primeira etapa da pesquisa ( GRUPUS, 2002, p. 47) havia um grande número de crianças fora da creche,
situação que melhora consideravelmente à medida em que ingressam na pré-escola.
105
Zulmira Campos.
seguintes instituições:
Tabela 9
Distribuição da População Segundo Escolaridade
Dique da Vila Gilda
Ensino Sem
Faixa etária 1ª. À 4ª. Série 5ª. à 8ª. série Superior
médio informação
De 7 a 15 anos 59,41 31,37 3,32 0 5,90
Gráfico 6
Escolaridade do chefe da família: Caminho São Sebastião e Vila Telma
A falta de tradição escolar dos familiares incide na vida escolar dos jovens,
pois o incentivo para estudar torna-se menor por parte das pessoas mais velhas que
constituem sua referência cultural, o que acentua a falta de contato, em casa, com
as formas de linguagem escrita e com o universo cultural erudito.
A evasão escolar é comum entre as crianças e adolescentes. Nas entrevistas
realizadas com os integrantes do Instituto Arte no Dique, essa realidade veio à tona
várias vezes, constituindo um fator preocupante para a equipe de trabalho:
30
Entrevista realizada no dia 02 de dezembro de 2006.
109
Desenvolve, mas não tão legal quanto aqui. Aqui a gente pode
botar pra fora o que a gente sente, na escola já é meio fechado,
se a gente coloca alguma coisa que sente pra outra pessoa, já
começam a tirar sarro; aqui não, entendeu?A escola é restrita (A,
2006).
111
Esta postura velada e sutil assumida pelos agentes escolares, muitas vezes
não percebida e quase nunca discutida, impede uma aproximação maior entre
professor e aluno, cultura escolar e cotidiana, linguagem escrita e artística, escola e
comunidade. Isso acentua o processo de evasão escolar e a culpabilização do
aluno, que assume e internaliza o seu fracasso pessoal.
112
Tabela 11
Distribuição dos Moradores Segundo Recebimento de
Programas Governamentais Dique da Vila Gilda
Uma vez nós estávamos tocando com um artista quando ainda era
no caminho da capela. A gente estava tocando e tinha um cara
com uma placa escrito Fora barulho!, jogando lixo na gente. Aí
veio o que marcou mesmo. O que marcou foi que ele [o artista]
falou que era melhor ouvir o barulho de um tambor do que ouvir o
barulho de um tiro. Porque ele viu o pessoal com aquela placa
fora barulho, jogando casca de banana na gente e tudo mais A
gente que morou sempre na periferia, sempre passou por esse
tipo de dificuldade. E também teve um certo preconceito quando a
gente passou ali para o Barracão, que tinha creche. Fizeram
abaixo-assinado pra gente sair. Só que nunca conseguiram tirar a
gente. A gente saiu agora porque teve um lance aí do espaço
[referindo-se à utilização do local para a construção de casas
populares] (A, 2006).
E também na escola:
A provocação não foi esquecida com o passar dos anos e, mesmo agora, com
todas as mudanças ocorridas em função da atuação da banda Querô, é devolvida de
forma irônica:
articulada sobre suas habilidades manuais e mostra os bordados que faz em ponto-
cruz, para vender.
A questão da pobreza, segundo Lima (apud GRUPUS, 2004), se relaciona,
entre outras coisas a situações como:
Dique. Estudou no nordeste até a 5ª série, mas, depois que migrou para São Paulo,
não voltou à escola. Ela se expressa bem oralmente e por escrito. Na sua opinião, o
grupo com o qual mais se identificou e pôde realizar sonhos foi o Arte no Dique. Ela
vê jovens, crianças e adultos participando. Acha que as pessoas sentem-se mais
valorizadas. Hoje ela diz que não tem mais vergonha de dizer onde mora. As
pessoas tinham má impressão do lugar e quando vinham, era para se aproveitar com
fins eleitoreiros.
Os indicadores mencionados neste capítulo parecem comprovar as
observações dos autores ligadas à questão da pobreza no mundo atual: desemprego
gerando apartação, isolamento e exclusão social; dificuldades da escola em abraçar
os educandos das classes oprimidas e estabelecer com eles um processo realmente
significativo de aprendizagem; ineficácia do Estado (que enxuga as políticas de bem-
estar social e volta-se cada vez mais para os interesses de mercado), em contemplar
esses moradores e lançar políticas para o saneamento de tais condições.
A exclusão do mercado de trabalho, de benefícios atrelados ao emprego e
mesmo daqueles oferecidos pelo governo, penaliza a sociedade como um todo, pois
gera o aumento da violência, da criminalidade, além de reforçar cada vez mais o
poder paralelo do narcotráfico, já visto por muitos como uma opção de trabalho e
inclusão social. Tal realidade colabora também para o enfraquecimento da instituição
escolar, que já não é mais garantia de uma colocação no mundo produtivo. O
surgimento de instituições ligadas à educação não-formal configura-se como uma
alternativa complementar à escola e uma possibilidade rica de inclusão para essa
população estigmatizada.
É neste contexto complexo e desafiador que o Instituto Arte no Dique
desenvolve sua prática pedagógica, utilizando a arte como alavanca para o
processo de humanização e recuperação da dignidade pessoal e coletiva dos seus
integrantes. Essa ação que permeia tanto a dimensão subjetiva, quanto objetiva da
exclusão, constitui-se o tema do último capítulo.
119
CAPÍTULO 4
Plínio Marcos
120
físicas; em suma: não haverá qualquer preconceito contra o indivíduo (ibid., cap. 3,
art.4º, par.1º), com direito a votar e ser votado.
Dentre as intenções do Instituto Arte no Dique grupo, elencadas no Portfólio
(p.03), algumas merecem destaque:
! Inclusão social através da profissionalização para a cultura, arte e
entretenimento;
! Colaborar para a consciência de uma cultura de paz e não de violência;
! Estimular a participação de crianças e jovens para a construção de uma
sociedade justa, solidária, próspera e livre;
! Combater a discriminação e devolver a dignidade a todo o ser humano;
! Criar uma rede de atenção para proteção da infância e juventude contra todas
as formas de violência: física, sexual, psicológica, econômica e social;
! Defender a liberdade de expressão e a diversidade cultural.
31
Este relato é fruto de uma observação de campo que realizei no dia 29 de setembro de 2006.
Cerca de um mês depois, o espaço foi requisitado pela COHAB e o barracão foi desocupado.
124
longo da pesquisa. Elas exercem uma função importante na condução dos filhos -
muitas delas incentivam a participação nas oficinas artísticas, conforme relato de
alguns adolescentes. No entanto há o contraponto; algumas mulheres do grupo
esclarecem que tem mãe que não liga.
As oficinas do Instituto Arte no Dique acontecem sempre integradas a um tema
que funciona como eixo central, convergindo na apresentação de um espetáculo
teatral, apresentado geralmente no mês de novembro, aniversário do Instituto. Nesse
espetáculo, com a participação de todas as oficinas, há oportunidade de desenvolver
o espírito de coletividade. Os indivíduos, fundindo-se no coletivo, dialogam consigo
mesmos, interagem com o público, expressam suas emoções e sentimentos através
do grupo, que ganha visibilidade e afirma sua identidade cultural. Através das
apresentações ocorre a oportunidade de colocar as próprias questões para o outro
que são também interpretadas e vivenciadas pelo público. Nessa interação reforça-se
a auto-estima e o senso de valoração.
A arte pode ser, portanto, valioso instrumento para que se forje uma auto-
estima saudável e uma consciência crítica nascida da partilha dos problemas
cotidianos, capaz de substituir as opções assistencialistas e paternalistas,
temporárias e paliativas por alternativas transformadoras, estruturais, envolvendo a
ação dos próprios sujeitos excluídos e focando no que eles realmente necessitam.
Dois espetáculos de teatro foram organizados. O primeiro, Sem perder a
ternura jamais, construído com a utilização de textos de Plínio Marcos,
pensamentos de Che Guevara e música de Gonzaguinha. Foi apresentado em
novembro de 2004 no SESC Santos e posteriormente no SESC Pompéia, em São
Paulo, no dia 08 de junho de 2005. As músicas foram tocadas pela banda Querô
com a participação da velha guarda da Escola de samba X-9 e do grupo de rap da
periferia de Santos, Contrabando de Atitude, que atuou na reapresentação. O
segundo espetáculo aconteceu no dia 29 de novembro de 2005. O musical Raul
Seixas há dez mil anos na frente foi dirigido por Maria Tornatore, com direção
musical de Ubiratan Santos, o mestre da percussão, e José Simonian. O roteiro
baseou-se na vida e obra do conhecido cantor e compositor, que completaria
sessenta anos de idade, se estivesse vivo. A intenção foi prestar homenagem ao
roqueiro baiano e refletir sobre o impacto de sua obra através de várias gerações de
brasileiros. Esses espetáculos utilizaram as linguagens artísticas da música, dança,
expressão corporal e teatro. Contaram com a presença e participação de pessoas
128
conhecidas no meio artístico brasileiro, como Moraes Moreira, Pepeu Gomes e Davi
Moraes.
Para o ano de 2006 estava previsto o Refavela, que pretende abordar a obra
de Gilberto Gil nas décadas de 60, 70 e 80 através dos temas: Amor, Política,
Negritude, Religião afro-descendente. Esse espetáculo será apresentado no SESC
Santos, no dia 30 de agosto de 2007, sob a direção de Renato di Renzo, do Grupo
Orgone e contará com a presença do Ministro da Cultura Gilberto Gil.
O mais visível e sólido fruto das oficinas promovidas pelo Instituto Arte no
Dique é a Banda Querô. Formada nas oficinas de percussão, leva para vários locais
da Baixada Santista o samba-reggae inspirado no Olodum da Bahia. Em Santos
participa, especialmente no verão, do Projeto Música na XV, no tradicional ponto de
encontro do Centro Histórico; apresenta-se em casas noturnas, clubes, em festas
religiosas, em aberturas de partidas de futebol no estádio da Vila Belmiro. Já se
apresentou também no Praia Mar Shopping e, recentemente, no terminal de navios
Concais (Porto de Santos) para recepcionar turistas (24 de fevereiro de 2007).
Apresentou-se em 2005 no programa de TV Ação, dirigido por Serginho Groismann,
pela TV Tribuna e, em 2006 no programa Cidade contra Cidade da TV Bandeirantes.
Recebeu convites para se apresentar no exterior: Johanesburg, Pretoria, Durban e
Thekwini na África do Sul; Maputo, em Moçambique; Kuanda, em Angola; cidade do
Porto, Braga e Cascais, em Portugal.
O grupo, formado principalmente por crianças e adolescentes, não é fixo.
Podem ser requisitadas pessoas também das oficinas de iniciantes, conforme vão se
destacando em suas habilidades. O mestre, compositor e também vocalista, é
formado nas escolas de percussão do Olodum, de Salvador. Dirige a percussão, toca
violão e empresta sua voz a canções de Gonzaguinha, Ivete Sangalo, Chiclete com
Banana, Gilberto Gil, Araketu e muitos outros compositores da música popular
brasileira, sempre com versões em samba-reggae. O grupo ganha cachê pelas
apresentações. A psicóloga esclarece que quando o cachê é melhor, divide-se entre
os músicos e a instituição. Mas quando o valor é menor, é dividido somente com os
músicos.
Quem explica sobre o começo e a evolução da Querô é o adolescente que
dela faz parte desde o seu início. Ele se preocupa em apontar o caráter não
excludente da banda:
129
Percebe-se nessa fala que as aulas de percussão, para esse adolescente, são
encaradas com responsabilidade, mas também com leveza e disposição. Ele revela
que esse processo faz parte de sua vida cotidiana, e, por gostar e se identificar com
o que faz, poderia até mesmo ensaiar em momentos de folga, como no domingo.O
aprendizado se mistura com o prazer e os ensaios têm uma função específica: não
permitir que ninguém se enferruje ou perca a noção do que está fazendo.
Os integrantes da banda Querô atribuem significado ao processo de
aprendizagem e incorporam ao seu cotidiano o valor desse aprendizado, pois este
depende o tempo todo da participação ativa e da interação estabelecida entre eles e
130
com o público, que lhes dá o retorno. As falas dos alunos a seguir revelam que a
tarefa de ensaiar e tocar é vista com seriedade e prazer pelos integrantes da banda
Querô:
Quando tem show, a carga de ensaio é mais pesada porque tem
que ser mesmo. Na área da música, ou sabe, ou vai pra assistir,
entendeu? Eu digo por mim, quando eu não sei, já fico meio assim
(tenso). Aí, no começo, a gente vai tocando assim; o ensaio mais
longo que a gente fez foi 4 horas e meia ou 5 horas direto. E
quando é no começo todo mundo fica meio nervoso. Mas a partir
da segunda música a gente começa a se soltar e vai embora, a
gente nem vê a hora passar. Pensa que passou uns 20 minutos,
mas a gente passou horas ali e quanto mais o povo está gostando,
é sinal de que está sendo compensador (A, 2006).
Adolescente D (menina): O Bira, além de nosso mestre, é um pai... às vezes ele liga
pra minha casa porque eu não estou comendo. Então ele se preocupa.
Adolescente A (rapaz): Isso, um tutor. Teve uma vez que o Dedé tava doente, de
cama, não podia nem se levantar. Ele ligava, ficava preocupado. Você vê, quando
um aluno dele ficava doente... Ele sempre se preocupou assim com o pessoal que
parava de estudar e voltava. No projeto, principalmente o Zé e o Bira sempre
132
estavam ali dando uma ajuda pra poder prosseguir com a vida e tudo o mais. Tava
doente, tava ele em casa, ajudava... eu não digo só por mim, mas por todos, não sei
se todos pensam a mesma coisa. Mas o Bira já virou quase como da família. A gente
já considera ele não como amigo, professor, mas como se fosse um irmão,
entendeu? Quando ele tá dando a aula, ele é nosso professor, agora quando do
estamos na rua, já muda o contexto. Ele sai com a rapaziada... tem um barzinho de
esquina, ele sai com o pessoal, vai pra show com a gente divertir. Que é
completamente o contrário do que os outros professores fazem hoje em dia. Isso até
estimula o aluno com o professor.
Entrevistadora: O que você acha que os outros professores fazem hoje em dia?
Adolescente A: Eu acho que é aquela rotina... ele é meu aluno, é meu aluno,
acabou. Só ali na sala de aula e nada mais. Agora, o Bira já quebra essa rotina.
A responsabilidade com que esses artistas encaram a sua prática seja de que
idade forem, demonstra não só o aspecto prazeiroso da arte, mas o senso profundo
de utilidade e pertencimento adquirido, conforme podemos perceber na história de
um pequeno garoto, integrante da banda mirim, que mesmo acidentado, chorava,
não tanto por causa do seu ferimento, mas pela possibilidade de não tocar seu
instrumento naquela ocasião, tão especial para ele:
! a busca de parcerias
Olha, foi tudo muito rápido, eu costumo dizer que foi um projeto
carregado de bons fluidos. Em 2002 eles já estavam prontos pra
fazer uma espécie de construção de um projeto que tinha
aceitação em várias unidades, em vários ministérios onde eles
foram buscar recursos. E hoje eles têm a Lei Rouanet, conseguem
se formatar na Lei Rouanet, conseguem captar recursos, tanto da
iniciativa privada, como eles fazem tentativas, algumas com
sucesso, outras não. Isso tudo é muito natural, mas eles estão
andando... A gente deu todos os elementos que nos foi possível;
mostramos a eles... olha nós somos uma possibilidade, não
somos a única. Então, em direção ao empresariado, alavancar
recursos, a gente apresentou,e aí juntávamos. Quer dizer, juntar
as partes é uma coisa, agora, se a parte do projeto que são eles,
os jovens, não tivessem feito uma apresentação, ou não tivessem
ido lá, demonstrado que eles estavam firmes naquilo que eles
queriam ,não teria passado, ninguém teria investido neles [...].
Com certeza, foi todo um esforço que a gente conseguiu
simplesmente colocar um suporte. Eu acho que eles têm vida
própria, eles têm consciência do que já alcançaram, eles sabem
como lutar.É lógico, crises do ponto de vista da gestão, da
administração, das dificuldades que hoje é você depender de
recursos de uma empresa que às vezes você não tem
auto-sustentabilidade, mas eles estão aí para atingir tal coisa...
(JUREMA, 2006).
! a busca da profissionalização
O cachê é muito legal; você ter seu dinheiro. Assim pode fazer o
que quiser, não precisa depender de ninguém. Quando está
precisando de alguma coisa pode comprar, não precisa ficar
pedindo pros outros... roupa [risos] a gente compra
(ADOLESCENTE H, 2006).
! a gravação do cd
32
Projeto Educacional de Conscientização e Orientação (PROECO) e quando o
projeto do Dique começou, ela e as meninas [outras senhoras] correram atrás.
Distribuíram fichas de matrícula para as pessoas interessadas, convidaram o
Instituto Elos para ajudar na gestão, fizeram reuniões com as mães da comunidade.
Foi ela que sugeriu o campo do Cantareira para ser utilizado como espaço para as
oficinas de arte. Os próprios alunos pintaram os instrumentos e com a ajuda dos
pais, ampliaram o barracão. Para ela, não há muita diferença entre os líderes da
comunidade e os de fora, só mesmo para assinar documentos. A equipe realiza
almoços onde cada um traz um prato para colaborar. Isso ajuda as pessoas a se
conhecerem melhor e tratarem-se com mais carinho. As declarações abaixo revelam
esse fato e apontam para o fato de ser a mobilização da população local, uma das
chaves para o sucesso e continuidade do projeto.
32
Organização não Governamental sem fins lucrativos, que atua junto à comunidade da Zona
Noroeste de Santos, de segunda a sábado, das 8h às 20h. Oferece atividades educacionais,
esportivas, artísticas, culturais, de lazer, de capacitação profissional, assistência à família e terapia
comunitária.
143
Eu sei que sempre teve uma visão muito negativa sobre o Dique
de Vila Gilda. Eu conversei com o Zé Virgílio e ele falou que
depois que começou o Arte no Dique, a mídia deixou de ir lá pra
noticiar essas coisas e começou a noticiar a arte, é uma coisa bem
diferente (ADOLESCENTE A, 2006).
A gente tem uma lacuna nesse projeto, que é ainda esse trabalho
com a comunidade e com os alunos. Uma organização de grupo,
tanto com os alunos, quanto com a comunidade, isso falta ainda. A
gente tem, mas é muito incipiente, porque temos dificuldade de
estrutura, não tem pessoal pra isso. Hoje eu gostaria mais de estar
fazendo essa parte, mas estou também numa equipe de coordenação,
para elaboração de projetos, captação de recursos, esse tipo de coisa.
E aí fica faltando um trabalho mais competente, quando digo mais
competente, quero dizer, sistemático, com mães, com os alunos, com
o grupo. Porque não dá pra se pensar em projeto social se não se
trabalhar com grupos. Atendimentos individuais não cabem em
projeto social, é uma coisa de grupo; e a partir do grupo você pode
fazer encaminhamentos (ibid., 2006).
A gente vai ter que ter, em 2007, uma pedagoga para organizar.
Tem uma organização aqui: 24 pessoas trabalham, 14 da
comunidade, 10 técnicos, entre professores e técnicos; mas foi
aquela coisa que nós construímos com a intuição. Então isso é um
sentimento que eu pessoalmente tenho, que a gente precisa ter um
sentido de organização mais apurado (JOSÉ VIRGÍLIO, 2006).
33
Este jovem cursa atualmente o curso de Ciência da Computação na Universidade Santa Cecília, em Santos.
150
CONSIDERAÇÕES FINAIS
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
34
A Escola da Ponte é uma instituição pública portuguesa, que se notabilizou pelo projeto educativo
inovador, baseado na autonomia dos estudantes. José Pacheco - especialista em Música e em
Leitura e Escrita, mestre em Ciências da Educação e professor de Ciências da Educação na
Universidade do Porto - é o coordenador da escola, desde 1976.
156
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LA ROCCA, Cesare de Florio. É tempo de recordar. In: BIANCHI, Ana Maria (org.).
Plantando Axé: uma proposta pedagógica. São Paulo: Cortez, 2000. p. 11-14.
LUKÁCS, Georg. Arte livre ou arte dirigida? In: Revista Civilização Brasileira, Rio de
Janeiro, ano III, n.13, p.159-183, maio 1967.
MARX, Karl & ENGELS, Friederich. A ideologia alemã - 1º capítulo seguido das
Teses sobre Feuerbach. São Paulo: Editora Moraes, 1984.
SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um outro olhar: filosofia. São Paulo: FTD, 1995.
VON SIMSON, Olga R. de Moraes, PARK, Margareth B. & SIEIRO, Renata F. (orgs).
Educação não-formal: cenários da criação. Campinas: Ed. da Unicamp, 2000.
Entrevistas
Maria Helena, Maria do PT, Lila e Zeíres, moradoras do Dique de Vila Gilda,
integrantes da diretoria do Instituto Arte no Dique e auxiliares de serviços gerais, no
dia 08/08/2006. Entrevista coletiva.
Fotos do anexo X:
! p.204 - Acervo do Instituto arte no Dique. Ano 2007.
! Demais fotos - Autoria e acervo de Valéria Diniz Toledo. Ano 2006 / 2007
.
161
ANEXOS
162
ANEXO VIII : Folder do espetáculo Raul Seixas - há dez mil anos na frente.........186
ANEXO X : Imagens.................................................................................................205
163
ANEXO I
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
ANEXO II
FICHA
DADOS PESSOAIS
NOME:______________________________________________________________
ESCOLARIDADE
SÉRIE ( ) 1ª A 4ª E.FUNDAMENTAL
( ) 5ª A 8ª E.FUNDAMENTAL
( ) 1º AO 3º ENSINO MÉDIO
( ) EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
( ) NÍVEL SUPERIOR
NOME DA ESCOLA:
______________________________________________________________
PARTICIPAÇÃO NA OFICINA
ANEXO III
FICHA
NOME: _____________________________________________________________
FORMAÇÃO ESCOLAR:
( ) SEM ESCOLARIDADE
ANEXO IV
passo adiante nessa propositura de que eles pudessem se ver primeiro, como
pessoas protagonistas de arte, estimávamos que eles tinham condições, muitas
condições, mas você sabe que as pessoas tem uma espécie de desconfiança , que
as segura , que as paralisa: Será que vou ser capaz? eu nunca vivi isso, o que é
isso? será que vou quebrar a cara? será que esse povo está me iludindo, que não
vai levar a nada? eu estou me entregando e daqui a pouco isso deságua numa
experiência ruim e eu vou ficar frustrado, mais ainda. A gente tem que ter em mente
que as pessoas passam a acreditar, mas também há uma vida que elas levaram até
então... eu penso que a possibilidade delas levarem algo adiante é muito carregada
de insucessos, há uma clara dificuldade que alguns órgãos, em especial os órgãos
públicos e mesmo órgãos privados, compreendam a cultura própria desses
ambientes, cultura que tem que se respeitar, tem que dar o tempo de maturação
pra essa pessoa nos ver com certa credibilidade. Então tudo isso a gente viveu...
Será que vai dar certo? Esse será foi um ponto de interrogação muito grande,
porque as pessoas se entregaram, mas se entregaram meio ressabiados, claro, com
toda razão. Mas fomos em frente e foi dando pra perceber que estávamos todos
muito envolvidos, tanto o Arte no Dique, quanto a direção, as lideranças de lá.
Enfim, tivemos problemas seríssimos, tensionamento, conflitos, principalmente de
gestão. Imagina ter de se fazer a gestão de um projeto que envolve o corpo técnico
da direção da ONG, lideranças do bairro que compõem essa gestão, os próprios
jovens, os pais desses jovens todos, apreensivos, porque aquilo parecia ser uma
espécie de salvo conduto, um momento de transição de uma vida em que o menino
estava completamente entregue ao acaso, uma vida próxima até do crime em
algumas situações e aquilo que poderia ser um passaporte pra um outro tipo de
vida, pra um outro tipo de mundo. Então esse mundo de expectativas e de
ansiedades, tudo isso se chocou em determinado momento.
outras não.Isso tudo é muito natural, mas eles estão andando. Demos todos os
elementos que nos foram possíveis:Olha, nós somos uma possibilidade, não somos
a única. Então eles foram em direção ao empresariado para alavancar recursos.
Dissemos a eles Elaborem uma apresentação, vão lá, a gente abre o espaço para
vocês.Juntar as partes é uma coisa, agora, se a parte do projeto que são eles, os
jovens não tivessem feito uma apresentação, ou não tivessem ido lá, demonstrado
que eles estavam firmes naquele que eles queriam, não teria passado, ninguém teria
investido neles.
concentra - de população , de modo de ser e que, como qualquer outro lugar reúne
pessoas - estes se beneficiaram. Quando a gente vai à nossa reunião de
condomínio, se relaciona com pessoas menos agradáveis, não agradáveis, e de
repente, quando termina, a gente está livre dela e escapou , não é? O projeto
também tem um pouco isso, a gente tem que aprender a ser tolerante com todos.
Essa é uma tarefa e uma das maiores dificuldades: a população se relacionar e
entender que tem que tolerar socialmente os diversos que eles são, porque há toda
uma diversidade muito grande.Tem que saber continuar, saber deliberar, saber levar
a cabo aquilo que a maioria quer e não o que um ou outro quer. Enfim, esse é um
jogo, a dinâmica de um projeto como esse. Isso é um projeto que nós todos, como
classe média, como eles lá tem que aprender. Gerir um problema, gerir um projeto é
isso. O projeto tem ganhos de diferentes tamanhos, cores e nuances, cada um dos
pais ali representa algum tipo de possibilidade, ver seus filhos ali apresentando, ver
seus netos se apresentando.Uma coisa que eu acho que era errada no começo é
que a gente dizia que o projeto era só pra crianças ou para jovens, em termos de 6
a 22 anos, 25 no máximo(hoje em dia se diz que a adolescência vai até os 25). Mas
o projeto na verdade concentra idosos - tem o canto, tem o teatro - ele traz a
possibilidade de várias pessoas viverem o que queriam viver, mas suas vidas não
lhe trouxeram no tempo devido, agora está sendo a oportunidade. Eu fico
encantada! Você veja: o que significa um pai tocar numa banda? Provavelmente ele
sempre teve uma vontade de ser músico, de ter a música como uma coisa
importante na sua vida, mas ele nunca tinha tido oportunidade. Quando esse projeto
chega, ele não só quer pro filho, como também quer pra ele, e nós aprendemos
também a respeitar isso. Então, num dado momento causamos estranheza, porque
todos os projetos que a gente conhece, que estão formatados por aí, focam, como
público-alvo, o jovem na faixa etária de 6 a 12 anos, e parecia impróprio, inadequado
que eles abrissem para uma faixa maior.Nisso eu acho que eles foram felizes, isso
partiu da própria comunidade, a gente não barrou, nem teria como barrar, porque
nós vimos que eles, de fato, estavam querendo e era dessa maneira que tinha que
acontecer, com várias idades.
espetáculos que eles apresentaram, eu assisti a dois que são dignos de uma
reapresentação.Têm características bem profissionais, eles têm uma marca, uma
espinha dorsal , em termos de arte. Um dia, se você for a um desses espetáculos, é
emocionante. Eles foram à Vila Mariana, em São Paulo, foi maravilhoso!
174
ANEXO V
ENTREVISTA COM SYLVIA BARI, EM 22/08/2006.
abaixo da linha da miséria, porque essas moradias são invasões que vêm crescendo
a cada ano, em cima de diques. A grande maioria dessas famílias é de
descendência nordestina, sendo que os filhos já nasceram aqui, mas os pais, mães,
tios, avós, são migrantes. São pessoas profundamente atingidas pela questão do
desemprego e da violência. São as duas piores formas de violação de direitos que
eles sofrem. E por conta disso, esses adolescentes e crianças com os quais a gente
trabalha, são frutos, produtos dessa realidade social, de muita miséria, muita
dificuldade. Eles têm ainda uma certa estrutura familiar, porque moram com as
famílias, mas estão 24 horas por dia expostos a todo tipo de violência urbana,
doméstica, de tráfico de drogas e criminalidade. Então, são crianças e adolescentes
em condições de alto risco, riscos graves e vulnerabilidade social e pessoal. Até por
conta de todas essas dificuldades, a gente percebe um problema grande, que é a
evasão escolar. Muitos deles, quando nos procuram já estão evadidos ou num
processo de evasão (a maioria), até porque a gente promove essa coisa de que eles
venham para o projeto, principalmente esses que estão fora da escola, porque no
processo de trabalho nosso, eles têm que voltar à escola. Queremos trabalhar com
esses, que estão fora da escola, que estão em processo de evasão, porque eles são
os que mais precisam, com toda certeza. São crianças e adolescentes que não têm
vivência de rua, não tem aquela coisa da vida de menino de rua, de menina de rua,
não ser no Dique mesmo. Mas são famílias em condições de vida sub-humanas.
teve um menino que estava na banda, mas fora da escola e eles iam fazer uma
viagem para Minas. Aí ele veio sozinho com o comprovante de matrícula e disse:
olha aqui, eu fui lá, estou matriculado. Então quando existe essa possibilidade de
viajar também, a gente entra em contato com a escola pra saber do desempenho e
da freqüência desse aluno.
6) O que falta nas escolas para que eles se sintam envolvidos, aceitos?
Eu acho que falta, a grosso modo, que a escola, como instituição, crie o seu
programa de ensino, a sua pedagogia a partir daquilo que ela conhece do aluno e
não a partir daquilo que já vem pronto e o aluno tem que se adaptar. Muitas vezes o
que a escola já tem pronto, fechado e acabado, não corresponde às necessidades
desses alunos, que estão em condições especiais. A escola vem de um modelo, às
vezes, de classe média , de classe média alta, que não tem uma história de exclusão
e de sofrimento. E aí a criança tem de se adaptar a esse modelo e daí vêm as
dificuldades. Embora a gente esteja muito próximo do Dique, têm crianças que não
chegam até aqui e ficam lá fora, na rua, brincando lá na maré. Eles não chegam até
aqui, embora a gente queira trazer, mas não tem como (nós temos plano de
mudança pra lá, então ,graças a Deus, vai melhorar muito nesse sentido). Mas
então, se ele não chega até aqui que tem todos os atrativos, imagine numa escola
que ele tem horários rígidos, que tem uma postura muitas vezes... há professores
que exigem que os alunos fiquem sentados assistindo aula, e uma aula
completamente desvinculada da vida dele, da sua realidade dele, da sua condição.
Então, se já é difícil vir aqui pro Projeto, pra escola então... Acho que a escola
precisa rever, isso acontece já em algumas escolas, mas não como uma política
educacional, é mais por uma postura pessoal de quem dirige a escola.
tarde eles ficavam aqui desocupados. Nós não tínhamos percebido isso, foi através
das mulheres da equipe que percebemos. Então eu tive que voltar todo o
cronograma oferecido e vi que precisava haver percussão de manhã e à tarde, todos
os dias. Foi tão rápido que os meninos voltaram, inclusive, foi rápido por causa da
informação que elas trouxeram. Porque elas vêem o menino lá na comunidade.
com beleza, com estética, com coisas de prazer. Com isso, o processo de reversão
de suas condições é mais rápido. A gente percebe, tanto nas mulheres quanto nos
meninos.Tem alunos que chegam aqui descalços, não têm o cuidado de pôr um
chinelo, é como eles costumam andar na região. É um costume, é cultural, não que
eles não tenham um chinelo, podem não ter um tênis, mas têm um chinelo. E aí
lógico, a gente recebe, da mesma forma. Pode entrar descalço...só que no processo,
eles começam a vir com uma bermuda melhorzinha, sem a gente pedir. Porque é
uma necessidade ...aí eles começam a vir de tênis, de meinha. Então a gente
percebe isso. As mulheres, por exemplo, têm uma mudança radical. As mulheres
que vêm aqui hoje são mães de alunos e aí a gente percebe: um batom, um brinco,
um cabelo pintado. Isso é interessante porque é muito visível, é rápido, você vai
vendo os processos nas várias pessoas. Depois de um tempo, ninguém precisa
falar nada, ele já não consegue vir sem o cabelo com gel, calçado, as mulheres de
batom, arrumadinhas.
Eu diria que a arte é um elemento verdadeiramente transformador da auto-
estima, da auto-imagem, da auto-valorização, porque ela produz dentro deles
conteúdos que eu acho que eles não tinham contato. Todo mundo tem talentos e
habilidades, mas se você não tem oportunidade de exteriorizar, de praticar, de
exercitar, acaba não sendo descoberto. Então de repente eles se vêem fazendo
alguma coisa. Normalmente a visão que se tem desses meninos e meninas é ligada
à criminalidade, à droga. As pessoas têm medo na rua, atravessam, não entram. E
aí de repente esses meninos saem daqui, vão se apresentar, por exemplo, no SESC
Pompéia em São Paulo, e lá tem o coquetel, tem o espetáculo em que eles são os
artistas, tem o público aplaudindo. No público tem a direção do SESC, tem
deputados que apóiam, então todo mundo aplaude. Quer dizer, é uma mudança
muito grande, muito profunda, muito rápida que ocorre. E isso é muito fácil de ir
internalizando, e fortalecendo essa questão da auto-estima.
No lançamento de um espetáculo, no SESC Pompéia, teve um coquetel. Um
menino, o Ronaldinho, estava uma hora lá no meio do coquetel, e ele disse assim:
Nossa eu estou me sentindo um rei hoje.Aí eu falei: Por quê? Ele falou: Porque
veio um homem e ele me deu refrigerante aqui na bandeja.Ele abaixou para servi-
lo, num lugar daquele, que é maravilhoso!A gente que já está mais acostumada se
sente encantada, imagine eles que nunca viram isso, nunca tinham ido nem a São
Paulo. Lá estão sendo as estrelas, o centro da festa. E ainda tem gente toda
182
paramentada , que vem e serve. Então eu senti o que ele falou, eu me senti do lado
de um rei naquela hora.
que a escola nos avise sobre quem está faltando ou deixou de ir. Porque aí a gente
retoma e puxa por aqui de novo.
ANEXO VI
Texto escrito por Maria das Graças Miranda Santana, a Maria do PT - moradora
da comunidade, membro da diretoria do Instituto Arte no Dique e ajudante de
serviços gerais para homenagear a oficina do coral Arte no Dique.
ARTE NO DIQUE
Este projeto vem mostrando a cada um de nós um outro lado da vida que
antes não conhecíamos. Somos pessoas marcadas pela desigualdade social, mas
nunca perdemos a esperança e nunca deixamos de sonhar.Estar aqui hoje é realizar
mais que um sonho.
Falar do coral arte no Dique é algo que me emociona porque tenho certeza de
que a amizade, o respeito e a confiança são o que fortalece a nossa existência e
constrói nossos valores. Aqui somos amigos em todos os momentos e sentimos a
falta daqueles que desistiram.
Falar desse momento especificamente é tão gratificante...só sabe quem o
vive. O coração é da gente e de emoção pode chorar, mas o rosto é do público e
deve cantar.
ANEXO IX
ANEXO X
IMAGENS
207
SOBRE A AUTORA
Contato: [email protected]