Arruda, S M C P
Arruda, S M C P
Arruda, S M C P
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
2001
i
ii
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Assinatura:---------------------------------------------
Comissão Julgadora:
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
2001
iii
CATALOGAÇÃO NA FONTE ELABORADA PELA BIBLIOTECA
DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO/UNICAMP
Bibliotecário Rosemary Passos - CRB-8ª/5751
iv
...será como um homem que reuniu seus
servos e lhes confiou seus bens.
v
vi
DEDICATÓRIA
vii
viii
AGRADECIMENTOS
ix
x
“Os primeiros anos da educação primária são,
por assim dizer, a última oportunidade que se tem
para propiciar a esses jovens uma experiência
espontânea de sucesso, sancionado pela sociedade,
antes que atinjam a idade da reflexão. Se lhes falta
essa experiência, passam a considerar-se como
fracassados, tanto a seus próprios olhos como aos
olhos da sociedade. Reabilitação, recuperação e
recomeço são remédios que alguns deles receberão
de uma sociedade benevolente que talvez não seja
tão hostil quanto pensam alguns, mas que comete a
leviandade de não proporcionar as condições
apropriadas de habilitação na época adequada,
quando as possibilidades de êxito são grandes e os
investimentos financeiros relativamente pequenos” .
xi
xii
RESUMO
ABSTRAT
xiii
xiv
INDICE
Página
INTRODUÇÃO ......................................................................................... 1
CAPÍTULO I
CAMINHOS DO ESTUDO A PARTIR DE NOSSA EXPERIÊNCIA 7
CAPÍTULO II
UM OLHAR NA LITERATURA .......................................................................... 13
CAPÍTULO III
UMA QUESTÃO A APROFUNDAR .................................................................. 47
CAPÍTULO IV
O ESTUDO REALIZADO ................................................................................... 57
xv
xvi
INTRODUÇÃO
1
visão até a perda da projeção de luz, não havendo possibilidades de uso do
resíduo visual para a maioria das situações diárias, mesmo que se possa
utilizar a percepção de luz como recurso na execução de tarefas e na
mobilidade e orientação espacial. O processo de aprendizagem da pessoa com
cegueira se fará por meio da integração dos sentidos tátil, cinestésico, auditivo,
olfativo, gustativo, de aparelhos de áudio e de equipamentos especiais,
utilizando o sistema Braille como meio principal de leitura e escrita
(SÃO PAULO,
1993; BRASIL, 1995).
Na concepção qualitativa, a visão subnormal é uma perda irreversível da
visão que, mesmo depois de tratamento e/ou correção óptica, permanece
limitada, porém, útil na educação e nas atividades diárias. A visão subnormal ou
baixa visão pode abranger desde a projeção de luz até o grau em que a
redução da acuidade visual interfere no desempenho ou o limita. Seu
funcionamento visual pode melhorar com o uso de auxílios ópticos e não-
ópticos especiais, de recursos técnicos e modificações ambientais. O processo
educativo para as pessoas com essa deficiência será desenvolvido,
principalmente por meios visuais, mesmo que seja necessário o uso de
recursos específicos, ópticos e não ópticos C( ARVALHO et al., 1994; MASINI,
1994; BRUNO, 1997).
Assim, vamos nos referir à deficiência visual quando a situação for
pertinente tanto às pessoas com visão subnormal como àquelas com cegueira.
Entretanto, o presente estudo é dirigido a estas últimas.
Nossa trajetória de mais de 26 anos realizando um trabalho de
reabilitação, utilizando as AVD com pessoas com deficiência visual, tornou-nos
testemunha e parte da história deste campo de conhecimento.
No Brasil são poucas as pesquisas sobre AVD no que se refere às
pessoas com deficiência visual. Temos verificado a escassez de estudos
científicos relacionados ao tema, principalmente no que diz respeito a
conhecimentos e a estratégias que podem ser desenvolvidos por meio destas
atividades. Também em função desta situação, vemos insuficiência de
2
atendimentos em AVD às pessoas com deficiência visual, em escolas e mesmo
em instituições especializadas, talvez pela carência de profissionais
preocupados com este trabalho. Torna-se evidente, em alguns serviços e
profissionais, um distanciamento do movimento inclusivo e das propostas que
contribuem na melhoria da qualidade de vida humana. Isto tem acontecido,
apesar de as AVD, sob esse aspecto, serem importantíssimas, tanto para as
pessoas que enxergam quanto para as com cegueira, embora para estas
últimas a aprendizagem das AVD não ocorra informalmente e tragam maiores
dificuldades.
Dentro da perspectiva pedagógica e suas implicações sociais verificamos
que a finalidade dos atendimentos em AVD tem sido associada unicamente à
idéia de proporcionar às pessoas a independência nestas atividades, em uma
concepção restrita ao ensino de técnicas e estratégias específicas. Tal situação
começou a nos inquietar, quando percebemos que as AVD não estavam
limitadas a um conjunto de técnicas para a sua mera aprendizagem, nem
restritas a aspectos de treinamento. Poderia o educador considerar a finalidade
específica do atendimento, que é a de favorecer a independência dessas
pessoas. Poderiam, também, as AVD, serem utilizadas como instrumentos para
que as pessoas com deficiência visual encontrassem condições adequadas
para ampliar suas capacidades adaptativas e construir conhecimentos.
Um outro aspecto importante diz respeito ao direito da pessoa com
deficiência visual aprender a fazer as AVD, organizar e atuar nos diferentes
aspectos do seu cotidiano. Tudo isto lhe permite agir como cidadão
independente, autônomo, tornando-lhe possível ser o protagonista de sua
própria vida, o que lhe dá condições de influenciar os movimentos sociais
direcionados à inclusão.
No paradigma da inclusão, é reconhecido o direito à igualdade, assim
como o reconhecimento da diferença frente à diversidade humana. A inclusão
“é um movimento dinâmico e permanente, que reconhece a diversidade
3
humana e tem como fundamento a igualdade na participação e na construção
do espaço social, compreendida como direito”K( AUCHAKJE, 2000, p. 204).
Oferecer condições de aprendizagem, considerando as singularidades de
cada pessoa, demanda reconhecer tanto as particularidades pessoais como as
condições ambientais e assegura o direito à diferença na participação igualitária
em diferentes atividades sociais.
Uma vez que as AVD são ações que mobilizam diversas fontes de
conhecimento, estas atividades podem propiciar estruturas capazes de
assimilar e acomodar conteúdos específicos, influenciando consideravelmente o
desenvolvimento e o desempenho das pessoas com deficiência visual na vida
diária.
Analisando os mecanismos subjacentes à construção das estruturas
mentais com pressupostos piagetianos, encontramos fundamentos para a
compreensão do processo de pensar e agir da pessoa e do conhecimento em
geral. Conforme Jean Piaget, todo conhecimento está ligado a uma ação, pois o
conhecimento é construído na interação do sujeito com os objetos do meio. A
ação se transforma em uma construção interna de contínua adaptação e
evolução.
As diversas fontes ambientais de desenvolvimento cognitivo decorrem
tanto da experiência social - daquilo que se adquire em interações com outras
pessoas, como da experiência não-social - daquilo que se adquire nas
negociações com o mundo físico inanimado. Tais experiências podem ser
explicitamente instrutivas, por exemplo, a escolarização, ou aquelas nas quais
os objetivos cognitivos são mais incidentais ou circunstanciaisF(LAVEL; MILLER;
MILLER, 1999).
Decidimos, então, colocar em foco as AVD, investigando detalhadamente
os conhecimentos e os aspectos do desenvolvimento que pudessem ser
desenvolvidos por meio dessas atividades, os processos de ensino e
aprendizagem utilizados e a sua aplicação por pessoas com deficiência visual.
Para isto, analisamos o conteúdo de algumas AVD, e revelamos os tipos de
4
conhecimentos e os aspectos do desenvolvimento que podem ser propiciados
quando estas atividades são realizadas nas diferentes experiências do dia-a
dia. Focalizamos a solicitação dos aspectos cognitivos para compreender como
as AVD podem ser ocasiões de desenvolvimento e meio facilitador para a
inserção das pessoas com deficiência visual, tanto na família como na
sociedade.
Com este estudo acreditamos poder contribuir para que profissionais,
estudantes e familiares tenham uma outra perspectiva, diferente daquela,
bastante difundida, que reduz as AVD a uma mera técnica. Aqui procuraremos
demonstrar os conhecimentos - a partir de suas bases teóricas - que podem ser
adquiridos quando as atividades são realizadas, Pensamos, ainda, que este
estudo poderá fornecer maior compreensão sobre as AVD e as oportunidades
que oferecem para as crianças com deficiência visual aprenderem a fazê-las,
de modo a se tornarem autônomas.
5
6
CAPÍTULO I
CAMINHOS DO ESTUDO A PARTIR DE
NOSSA EXPERIÊNCIA
7
Como professora especializada nas AVD, atuando nos programas de
atendimento às crianças e adultos com deficiência visual, participei de inúmeras
situações em que as AVD foram vivenciadas, estudadas e discutidas,
objetivando a compreensão de tais atividades no contexto das pessoas com
esta deficiência.
Os conteúdos, procedimentos e estratégias utilizados no ensino das AVD
e aqui expostos, foram paulatinamente construídos por nós e repensados ao
longo deste período. Nossa prática foi se aperfeiçoando passo a passo,
favorecendo cada vez mais o desenvolvimento global dos usuários, oferecendo-
lhes instrumentos para isso.
Após muita reflexão durante todos esses anos de trabalho, sentimos que
era preciso investigar de forma mais detalhada e aprimorada as AVD.
Relataremos, a seguir, algumas questões que contribuíram para a realização
deste estudo. São situações observadas nos atendimentos à pessoas com
deficiência visual e seus familiares, nas aulas, e na supervisão de profissionais
e estagiários.
8
A proposta de atendimento consiste em oferecer aos usuários condições
pessoais, ambientais e emocionais que lhes propiciem novos conhecimentos a
partir da realização das AVD. Experiências anteriores os levam a comparar,
analisar, sintetizar e generalizar, resultando em novos conhecimentos,
procedimentos e maneiras de pensar. É desta forma que se constrói um novo
saber. É nesta relação que os educandos em questão conhecem as próprias
capacidades e limitações e aprendem a lidar com elas de forma ativa. É desta
maneira que aprendem a viver em grupo, aprendem a respeitar e são
respeitados como pessoas.
Procuramos oferecer instrumental que leve cada criança, adolescente ou
adulto, com deficiência visual, a aprender sobre si própria, sobre as outras
pessoas e sobre os objetos nas atividades diárias.
2. Cursos e aulas
9
No decorrer dos cursos tais questões foram debatidas, assim como os
conceitos de AVD. Foi possível concluir que, de modo geral, os alunos não
tinham senão a idéia costumeira das AVD. O modo rotineiro de se considerá-las
deve-se, a nosso ver, ao fato de os alunos não terem, muitas vezes, um
referencial teórico, como o piagetiano e outros, para ensinar tais atividades. Os
alunos tinham também algumas noções sobre as dificuldades encontradas
pelas pessoas com deficiência visual para realização das AVD e percebiam, de
imediato, os ganhos que tais pessoas podiam ter ao realizar as atividades,
embora acreditassem que o maior ganho fosse a independência nas ações.
Nos cursos, procuramos propiciar aos alunos a possibilidade de
compreenderem que o processo de ensino das AVD não se reduzia ao domínio
de técnicas, que conduzissem as pessoas com deficiência visual a
desempenharem da melhor forma possível essas atividades, nem ainda que
tais técnicas pudessem ser adquiridas mediante treinamento e, muito menos,
que as sugestões oferecidas às pessoas com deficiência fossem as mais
indicadas.
Acreditamos que o papel do professor não se restringe a explicar, mas
também a propor atividades que levem o educando à compreensão e à reflexão
(OLIVEIRA LIMA, 1998).
3. Supervisão de estagiários
10
Quando consideramos as diferentes situações de aprendizagem
provocadas pelas AVD, fomos buscar fundamentação teórica para os
procedimentos que utilizávamos e destacar os conhecimentos nelas implícitos.
Ficou claro que as ações de ensinar, aprender, refletir, pesquisar, quando
compartilhadas, como ocorreu nas supervisões de estágio, foram muito valiosas
na configuração do presente estudo. Muitos alunos questionavam,
argumentavam, traziam idéias e sugestões, possibilitando a troca de
conhecimentos e opiniões e enriquecendo o trabalho realizado.
A pesquisa teórica sobre os tipos de diferentes conhecimentos e os
aspectos do desenvolvimento que podem ser utilizados no ensino das AVD,
levaram-nos a constatar a importância da reflexão sobre a prática.
11
12
CAPÍTULO II
UM OLHAR NA LITERATURA
13
Preparar alimentos, serviços e organização da casa, cuidar dos filhos, hábitos
sociais, usar medicamentos, jardinagem, pequenos consertos domésticos,
costura, administração financeira e fazer compras também estão incluídos nas
AVD (T ROMBLY, 1989; MAC DONALD, 1990; VALVERDE CARRILLO ; FLOREZ GARCIA ;
SANCHES BLANCO, 1994).
14
1.1 - Uma concepção clínica
15
“Para tanto um cuidadoso programa de exercícios e atividades é
elaborado com a finalidade de tornar a pessoa incapacitada capaz de
manejar seu corpo da maneira a mais eficaz para que seja o mais
independente possível na sua vida diária. Com efeito, é no contexto do
treinamento funcional, do recondicionamento do corpo biológico que surge
a preocupação com o cotidiano da pessoa incapacitada, tendo como
princípio a independência. Entretanto, independência que tem sua raiz na
execução das ações físicas, do corpo biológico, necessárias para a
efetivação do dia-a-dia”(FRANCISCO, 1988, p.84).
16
quantificada, a dependência do sujeito em atividades fundamentais e apontam
as ações terapêuticas que podem ser adotadas como tratamento.
Entre as várias escalas criadas, destacamos o “Índice Kenny”, indicado
para documentar progressos na reabilitação. O “Índice Mahoney e Barthel” é
um dos mais estudados e utilizados para medir as AVD, no caso de pacientes
cronicamente deficientes, apresentando dez itens para avaliação de cuidados
pessoais, incluindo alimentação, transferências, mobilidade, uso de escadas,
capacidade para se vestir, arrumar-se, higiene, banho, e controle de intestinos e
bexiga (CHRISTIANSEN; SCHWARTZ; BARNES, 1992). Por sua vez, o “Índice Katz”
tem a finalidade de estudar o prognóstico e os resultados do tratamento em
enfermos crônicos e idosos.
Tais escalas permitem avaliar os problemas e prioridades, reconhecer,
medir e reduzir os déficits, assim como planejar o tratamento, realizar o
prognóstico, e avaliar o desenvolvimento dos pacientes analisados, o que tem
proporcionado muitos benefícios, principalmente em pacientes com deficiência
física ou mental e idosos P
( ESSOTTI , 1982; FLOREZ GARCIA, 1994; GOMES T OLON,
1994).
Os autores citados ressaltam - e concordamos com eles - que as escalas
não identificam as razões que causam a incapacidade na pessoa, nem indicam
como ela pode conseguir a independência no desempenho das AVD. Refletem
o que o sujeito faz, não o que ele é potencialmente capaz de fazer. Constituem-
se em elemento importante para indicar a elegibilidade da pessoa para ingresso
em instituições, para avaliar a sua capacidade de vida independente e ainda os
seus rendimentos diante de uma tarefa.
Há determinadas posturas científicas que, com o propósito de se
aprofundarem no conhecimento do homem, separam-no do contexto em que
vive, retalham-no em suas múltiplas formas de capacidades e, com isso,
perdem de vista o ser humano, estudando “apenas um aspecto, uma parcela do
verdadeiro homem – aquele homem integral, enraizado em seu mundo, que se
realiza, realizando o mundo”(FRANCISCO, 1988, p.33).
17
A autora faz referência ao fato de que as AVD foram, inicialmente,
caracterizadas apenas como destinadas aos cuidados pessoais. Ampliando
este conceito, o uso do termo foi posteriormente incorporado a outras atividades
como locomoção, comunicação, destrezas manuais e tarefas domésticas. Ela
argumenta que as AVD não podem ser entendidas somente como processos
mecânicos, porque o homem seria visto apenas sob o ângulo de funcionalismo,
em que o cotidiano deixaria de exercer uma prática transformadora.
A tendência, no geral, é de um redirecionamento dos diferentes
segmentos da ciência para um enfoque global do ser humano. No entanto, a
literatura consultada indica maior ênfase aos procedimentos e testes
padronizados para a avaliação da independência nas atividades diárias, com
maior enfoque nas pessoas idosas, bem como na deficiência física e mental.
18
“As situações que estimulam o desenvolvimento são aquelas em
que as crianças têm a oportunidade de descobrir conceitos e noções
através da exploração ativa dos objetos de que dispõe no ambiente
escolar”(MANTOVANI DE ASSIS, 1989, p.27).
19
porém, um fator limitante pode ser o desconhecimento, por parte do professor,
dos benefícios que as AVD podem oferecer.
20
saber como ela interage com o meio, organiza e constrói o seu conhecimento
(p.40-45).
Considerando que a atitude dos pais tem uma influência substancial no
desenvolvimento do filho, BRUNO (1997) sugere ao educador uma proposta de
programação pedagógica com eles, tendo em vista o enriquecimento de
experiências e vivências da criança com deficiência, indicando as AVD como
situações ricas para o desenvolvimento cognitivo.
Segundo FERRELL (1996), as AVD precisam ser ensinadas pelos
familiares desde a mais tenra idade e terem prosseguimento na escola e/ou
centros especializados, para oferecer às crianças, com deficiência visual, as
mesmas possibilidades de vivenciarem as atividades e se desenvolverem por
meio de tais experiências.
Para LORA (1997) as AVD constituem um dos aspectos mais importantes
de um programa de educação ou reabilitação, tanto para a criança como para o
adulto com cegueira. A autora considera que o aluno deficiente visual deverá
ser devidamente orientado em todos os aspectos que estas atividades
envolvem,
21
enfatiza a necessidade de quem recebe o treinamento nas AVD de conhecer
aspectos como, por exemplo, propriedades físicas dos objetos envolvidos em
cada atividade: áspero e liso; temperatura, forma geométrica e outros.
CALLEGARI (1994), define princípios básicos para o ensino das AVD em
manual dedicado a crianças com múltipla deficiência, incluindo surdez e
cegueira. Nele há sugestões gerais e adaptações para os ambientes e os
objetos de uso diário, enfatizando a importância de se contextualizar cada
atividade. Também constam os programas de vestuário, controle de esfíncteres,
hábitos de higiene e alimentação, e é também apresentada uma divisão de
etapas de cada atividade, com uma seqüência de habilidades necessárias para
a sua aquisição.
YEADON (1974) descreve, de maneira detalhada, inúmeras AVD (em seus
diferentes aspectos, por exemplo, objetivos, técnicas, estratégias de ensino
etc.) como propostas para serem desenvolvidas em centros de reabilitação.
Encontramos ainda outros manuais de AVD, como o deMYRIMER (1982), que
relaciona os conteúdos de higiene, vestuário, alimentação e um rol de
atividades domésticas, cujo objetivo é apresentar propostas de trabalho para
favorecer a independência em tais atividades. Consiste de orientações a
familiares e profissionais que atuam na área da deficiência visual e dizem
respeito a algumas técnicas que podem ser aplicadas.
O “Manual de actividades de la vida diaria”foi organizado com o fim de
oferecer um apoio aos professores das escolas e centros de reabilitação de
pessoas com deficiência visual. Apresenta técnicas para o ensino das AVD, e
destaca a necessidade de enriquecer essas técnicas com as experiências tanto
do educador quanto do aprendiz (BERNHART et al., s/d).
No contexto da New Mexico School for the Visually Handicapped
Preschool (NMSVH), as AVD compõem as atividades necessárias para o
desenvolvimento da criança com deficiência visual, entre as quais se incluem
técnicas e receitas culinárias que podem ser utilizadas visando o
desenvolvimento integral da criança. DOMINGUEZ e DOMINGUEZ (1991)
22
apresentam aos pais e educadores o programa desenvolvido naquela escola,
com base nas seguintes premissas: toda criança tem capacidade para
aprender; a família oferece influência significativa na vida da criança; o
processo, e não o produto, é a essência da aprendizagem; as crianças
apresentam diferentes modos de aprendizagem e para se trabalhar com elas é
preciso procurar enfoques individualizados; as áreas de desenvolvimento
afetivo, cognitivo e psicomotor não devem ser trabalhadas isoladamente, pois
afetam a forma global de aprendizagem; o jogo é uma atividade natural e
importante para as crianças, envolvendo comportamentos que interferem nos
aspectos do desenvolvimento global.
O Programa das Atividades da Vida Diária F
( ERREIRA, SANTA ROSA,
MOTA, 1994) abrange conteúdos relativos à saúde e segurança, situações da
vida diária e uso de recursos da comunidade, dentre outros. É um programa
destinado à orientação de familiares, professores e técnicos que atuam com a
criança com deficiência visual. Na literatura nacional é a literatura mais
completa, pois favorece o ensino das AVD.
Acreditamos que, em muitos aspectos, um educador que não saiba nem
fazer nem ensinar algumas AVD, sentirá a necessidade de explicações mais
detalhadas, de acesso a técnicas e recursos adequados para realizar cada
atividade, podendo se beneficiar deste tipo de literatura. Entretanto, há pouca
literatura especializada nesta área.
23
Apresentamos, a seguir, alguns dos conteúdos básicos das AVD que
podem ser utilizados tanto nas salas de aula, no lar, como em programas de
habilitação e reabilitação, nas diferentes faixas etárias.
HIGIENE PESSOAL
? importância da higiene
? mãos: ensaboar, enxaguar, enxugar e secar
? orelha: limpeza
24
VESTUÁRIO
25
ALIMENTAÇÃO
? sabor / cheiro
Discriminar ? temperatura
? consistência / textura
Localizar alimentos ? na mesa / geladeira / armários
Limpeza e segurança
26
ORGANIZAÇÃO, LIMPEZA E CUIDADOS COM O
AMBIENTE
27
HÁBITOS E ATITUDES SOCIAIS
Favorecer a autonomia
? cumprimentar as pessoas
? utilizar gestos sociais: acenar, negar,
Conhecer e utilizar normas de concordar...
interação social ? usar expressões de cortesia
? bater na porta para entrar em um recinto
? como se dirigir aquele que fala
? colocar a mão na boca ao bocejar
? ao conversar com outras pessoas
Cooperar
28
2. Contribuições da teoria piagetiana na compreensão das AVD
29
este, se orienta, essencialmente, para o equilíbrio. Da mesma maneira
que um corpo está em evolução até atingir um nível relativamente estável
- caracterizado pela conclusão do crescimento e pela maturidade dos
órgãos -, também a vida mental pode ser concebida como evoluindo na
direção de uma forma de equilíbrio final, representada pelo espírito do
adulto”(PIAGET, 1994, p.13).
30
Os objetos do conhecimento humano são coisas, seres da natureza,
pessoas, cultura, valores, história. O meio, por sua vez, tem uma importância
fundamental no desenvolvimento humano e engloba a sociedade, a cultura, a
classe social, a família, e o ambiente,de maneira geral (físico e social).
31
Existem quatro estágios de desenvolvimento, necessariamente marcados
por uma ordem de sucessão das aquisições, sendo indicada, para cada criança,
uma idade aproximada, uma vez que a idade é variável de acordo com as
possibilidades de cada uma, e a solicitação do meio.
Os estágios estão assim divididos: sensório-motor (zero a dois anos), pré-
operatório (dois a sete anos), operatório concreto (sete a onze anos), operatório
formal (onze anos em diante). Eles ocorrem em uma seqüência hierárquica,
diferenciando-se em função das estruturas mentais que se constróem em cada
um; as estruturas construídas em um estágio tornam-se parte integrante das
estruturas do estágio seguinte, constituindo uma totalidade, sempre em forma
de um equilíbrio melhor.
32
precisa assimilar os conceitos transmitidos pelo meio exterior, acomodando-os
em estruturas previamente adquiridas P
( IAGET , 1983).
A equilibração é vista como o fator essencial e definitivo ao
desenvolvimento cognitivo. Ocorre como um processo contínuo de adaptação
do sujeito ao meio, como uma auto-regulação do sistema cognitivo, permitindo
formas de equilíbrio cada vez melhores e níveis superiores de operações.
A maturação, a experiência física, a transmissão social e a equilibração
têm grande influência sobre a estruturação mental do sujeito, mas a
equilibração destaca-se como fator fundamental do desenvolvimento, atuando
sobre os demais. É um processo conduzido por reflexão e reconstrução de
estágios de estruturação superiores.
33
As regulações visam um equilíbrio relativo de uma estrutura organizada
ou de uma organização em via de construção. As regulações só acontecem
quando o sujeito, diante dos obstáculos, modifica a ação em sua retomada, no
sentido de um aperfeiçoamento da forma precedente, alcançando um novo
estado de equilíbrio.
34
1977a, p.167). A lacuna favorece novas possibilidades que conduzem a um novo
equilíbrio.
Assim como todas as crianças, as com cegueira desenvolvem-se
progressivamente, passando das ações sensório-motoras e chegando até a
fase do raciocínio formal. Gradativamente, a criança passa a distinguir o que
pertence ao objeto, a si própria e à ação realizada, considerando a
transformação de um estado inicial de conhecimento até o seu estado final.
Quanto mais elevado o pensamento da criança, mais as suas
construções tornam-se elaboradas, em busca de estados progressivos de
equilíbrio (PULASKI, 1986).
Contudo, como uma criança chega a uma forma de pensamento mais
elaborada do que o simples agir? O que assegura a mudança de um estágio de
compreensão para outro mais elevado?
Segundo Piaget, a criança utiliza-se dos processos de abstração para
este fim.
35
A abstração reflexivante comporta dois sentidos: por um lado ela projeta
para o patamar superior aquilo que foi tirado do patamar inferior (como por um
refletor) e, de outro lado, uma reflexão, entendida como “o ato mental de
reconstrução e reorganização sobre o patamar superior daquilo que foi assim
transferido do inferior”(PIAGET, 1995, p. 275, 276).
Na abstração reflexivante Piaget identifica também a abstração pseudo-
empírica, na qual o sujeito, tendo ainda necessidade de atividade concreta,
retira informações da coordenação das ações.
Também em suas formas superiores, a abstração refletida ou
pensamento reflexivo dá lugar a sistemas formais elaborados, distanciando o
sujeito dos conteúdos concretizados, de tal maneira que ele passa a proceder à
abstração a partir das ações coordenadas sobre os objetos, em um processo
consciente, ou seja, uma reflexão de reflexão P( IAGET , 1995, 1977c).
A abstração refletida assegura um progressivo equilíbrio interno entre os
sub-sistemas, pois a acomodação procura compensar os desequilíbrios, e a
abstração reflexiva reorganiza os instrumentos da assimilação, permitindo a
constituição dos sistemas lógico-matemáticos de caráter formal, e desta forma,
o pensamento científico.
36
Ao discutir sobre as diferenças no desenvolvimento,ELOSÚA (1994) se
reporta à afirmação de Piaget e Inhelder, segundo a qual “a falta da visão
implicaria em um desenvolvimento cognitivo mais lento” destas crianças. Neste
sentido, a falta da visão traria problemas na construção da inteligência sensório-
motora, uma vez que esta é elaborada a partir de atividades em que a visão
exerce um papel importante. A autora cita outros estudos sobre a imitação da
criança com deficiência visual, que é muito pobre quando comparada à da
criança vidente; conseqüentemente, o jogo simbólico pode estar comprometido,
o que é provavelmente causado pela falta da visão. Enfatiza, ainda, a escassez
de trabalhos sobre o desenvolvimento da representação e simbolização em
criança cega, no período pré-operacional.
De fato, já nos primeiros tempos de vida, na fase em que a criança
realiza o exercício funcional do olhar e posteriormente provoca “experiências
para ver”, a criança com cegueira já tem seus prejuízos, pois estas experiências
implicam ações que, ao variarem, enriquecem e potencializam os seus
esquemas de ação (PIAGET, 1987,1990). A seqüência do desenvolvimento é
igual para todas as crianças, porém, um bebê com cegueira congênita, em
geral, apresenta um ritmo mais lento, podendo apresentar atraso no
desenvolvimento motor e transtornos musculares, como a hipotonia. Ele tem
necessidade de mais tempo para conhecer uma pessoa, uma situação ou um
objeto para, posteriormente, reconhecê-los e estabelecer diferenças
(LEONHARDT , 1992).
A superproteção por parte dos adultos pode ser prejudicial à criança com
deficiência visual; uma vez que consiga se mover de forma autônoma e dirigir-
se aos sons produzidos no seu ambiente, o que constitui o começo da
permanência do objeto, ela alcançará as demais fases do desenvolvimento com
mais experiências sobre os objetos O
( CHAIATA, et al., 1988).
A pesquisa desenvolvida por Hatwell, citada porELOSÚA (1994) mostrou
que no período das operações concretas, crianças com cegueira apresentavam
um atraso de três a quatro anos na realização de tarefas operatórias com
37
material manipulativo, nas quais o fator figurativo-espacial predominava, não
encontrando atraso na realização de tarefas que tinham, principalmente, uma
base oral. Este resultado sugere questionamentos a respeito da
correspondência entre o funcionamento verbal e a representação mental
coerente e rica.
Na aplicação das provas piagetianas em 30 crianças institucionalizadas,
com deficiência visual, com idades entre cinco e treze anos,RIVERO CARAZAS
(1985) demonstra ter encontrado seis anos de atraso no desenvolvimento
delas, possivelmente causado pelo ingresso tardio na escola e pela falta de
estimulação adequada. Em estudo do mesmo autor (1997), o desenvolvimento
da criança com deficiência visual foi novamente pesquisado. Nele, foram
aplicadas provas piagetianas para a avaliação das estruturas operatórias e
realizadas intervenções pedagógicas com o objetivo de desenvolver as
atividades do conhecimento físico. Os resultados indicaram que a criança pode
avançar satisfatoriamente no período pré-escolar, devendo para isso ser
proporcionados meios que lhe permitam a construção dos conhecimentos e
criando relações entre conhecimentos e objetos da sua vida diária.
38
que se pode supor, e a linguagem parece ter uma influência maior. Este
possível atraso parece ser vencido posteriormente, na adolescência.
39
a estados ou sucessão de estados. O aspecto operativo é resultado de
transformações relacionadas a tudo que modifica o objeto, das ações às
operações, desde as ações sensório-motoras, às ações interiorizadas(PIAGET,
1987; DOLLE, 1987).
Os aspectos figurativo e o operativo representam a maneira de
apreender o real, estando o aspecto figurativo sob a dependência do operativo.
A dissociação destes aspectos em uma ação, permite diagnosticar o que
depende da inteligência ou da figuração simbólica P
( IAGET, 1983).
Ao se referir às relações entre sujeito e objeto como o problema central
do conhecimento, Piaget destaca a experiência física e a lógico-matemática
como os contextos nos quais se exercem as ações e as operações. Delas
procedem três tipos de conhecimentos possíveis: o conhecimento físico, o
lógico-matemático e o social. Esses conhecimentos são interdependentes nos
seus processos construtivos.
A experiência física consiste em agir sobre os objetos para se descobrir
as suas propriedades observáveis e inerentes e extrair daí um conhecimento.
O conhecimento físico é gerado pelos objetos do meio, ou seja, na
“forma com que o objeto proporciona ao sujeito oportunidades para observação”
(KAMII, DEVRIES, 1986, P.32). Este conhecimento procede da percepção, mas,
ela não age sozinha. Piagetexplica:
40
abstração reflexivante e, neste processo, a criança cria e introduz relações
entre os objetos. Ele não pode ser ensinado, pois é construído pela criança e,
uma vez construído, não será jamais esquecido; não é arbitrário, mas acontece
pela coerência (Kamii; Devries, 1992;KAMII, 1993).
Estabelecendo uma relação entre o conhecimento físico e o lógico-
matemático vemos que, enquanto o conhecimento físico é alimentado e
abstraído dos próprios objetos, as coordenações das ações do sujeito
constituem a fonte do conhecimento lógico-matemático. O conhecimento físico
não pode ser construído sem um quadro lógico-matemático subjacente. Ao
pegar, derrubar, rolar, enfim, agir sobre os objetos é que a criança descobre as
propriedades do mesmo e estabelece relações entre eles. A experiência física e
a experiência lógico-matemática estão sempre juntas nas diferentes
experiências, mas são dissociáveis à análise M
( ANTOVANI DE ASSIS, 1999a;
CARMICHAEL, 1975; KAMII, DEVRIES, 1986).
Em múltiplas experiências a criança age sobre os objetos e constrói o
conhecimento. Uma criança com cegueira, ao tatear uma mesa, por exemplo,
encontra alguns chocolates; manipula-os, experimenta e descobre que são
doces. Tal descoberta mostra a tomada de consciência de uma propriedade dos
chocolates (sabor), abstraída inicialmente por sua percepção, pois o sabor é
uma propriedade do chocolate (conhecimento físico).
Comendo alguns chocolates descobre que uns são mais doces e outros
menos doces. Mostra então, sua preferência pelo chocolate doce com formato
retangular. Em um outro momento, a criança reconhece o lugar em que os
chocolates ficam guardados e dirige-se até o local. Ao escolher dois chocolates
mais doces que têm a forma retangular, está atribuindo aos alimentos
propriedades que os chocolates não possuem por si mesmos, e aplicando
conceitos de espaço e de seriação quando os chocolates são comparados e
escolhidos, isto é, está demonstrando conhecimento lógico-matemático.
Juntamente com o conhecimento físico e o conhecimento lógico-
matemático, caminha a construção do conhecimento social. O conhecimento
41
social decorre da concordância entre as pessoas, fundamentando-se no
consenso social como as regras, as informações, as explicações, a moral, a lei,
os valores, a ética e o sistema de linguagem. Sendo assim, é um conhecimento
arbitrário, como o nome de um doce que tem determinado sabor é chocolate, e
o conhecimento é integrado à própria concepção de mundo de cada sujeito.
MANTOVANI DE ASSIS (1999a) afirma que:
42
Assim, o conhecimento é proveniente das pessoas a partir das
informações adquiridas no meio físico, fazendo parte deste conhecimento o
conceito de família, escola e comunidade, entre outros essenciais na adaptação
da criança ao meio em que ela vive.
43
para o conhecimento físico como para o lógico-matemático. Entre os aspectos
do desenvolvimento, o cognitivo aciona a evolução do pensamento,
impulsionando e determinando os demais.
Nas intervenções em AVD, o conhecimento físico pode ser desenvolvido
por meio de conceitos e noções referentes à aquisição das propriedades dos
objetos como a forma, textura, consistência, temperatura, som, peso, odor,
sabor e conhecimentos relativos às propriedades dos objetos a partir da ação
realizada sobre eles.
Quanto ao conhecimento lógico-matemático, as atividades de comparar,
corresponder, aumentar, diminuir, reconhecer objetos, fazer coleções,
classificar, seqüenciar, repartir e outras, permitem a aquisição de noções e
conceitos referentes à noção de conservação de quantidades descontínuas ou
discretas, conservação de quantidades contínuas (líquido); conservação de
quantidades contínuas (massa); classificação operatória; seriação operatória,
conceito de espaço, tempo e compreensão de relações causais.
A função simbólica ou semiótica está presente na vida da criança e faz
parte do conhecimento lógico-matemático. No final do período sensório-motor a
capacidade da criança conhecer as coisas vai, aos poucos, sendo substituída
pela capacidade de representar o que é conhecido, marcando o aparecimento
do período intuitivo ou pré-operatório. A função simbólica “consiste na
representação de um significado qualquer, isto é, um objeto, um acontecimento
ou um esquema motor, por meio de um significante diferenciado e específico
para este fim”(MANTOVANI DE ASSIS, 1999b, p.287).
A criança realiza atividades lúdicas (jogos simbólicos), durante as quais
toma consciência do real, ainda que, às vezes deformado. Ela também
reproduz as situações vividas, assimilando-as a seus esquemas de ação e aos
seus desejos (afetividade). Para a criança, o jogo simbólico é um meio de
adaptação intelectual e afetivo A
( JURIAGUERRA, 1983). A imitação diferida, o jogo
simbólico, o desenho ou imagem gráfica, a imagem mental e a linguagem
44
impulsionam o progresso da socialização da criança e sua inclusão na sua
realidade social.
Na construção do conhecimento, a afetividade corresponde à energética
das ações. A afetividade e a inteligência caminham paralelamente e são
indissociáveis, uma vez que toda ação pressupõe um interesse, necessidade ou
curiosidade que mobilize o sujeito a agir até encontrar uma solução para os
problemas.
Para favorecer o desenvolvimento afetivo é importante oferecer à criança
um ambiente em que ela possa valorizar a si mesma e aos outros, tendo como
base o respeito, a compreensão, e o afeto, demonstrados em situações de
criatividade e de participação ativa, que favorecem a independência, iniciativa e
responsabilidade. Isso não acontece em um ambiente carregado de tensão,
autoritarismo e coação, o qual dificulta a expressão dos sentimentos e a
cooperação.
Assim também, o desenvolvimento do aspecto social é paralelo e
indissociável do cognitivo e do afetivo (PIAGET, INHELDER, 1994). No processo
de socialização a criança vai construindo sua identidade, seus valores e
princípios conquistando, desta forma, não só a independência, mas também a
autonomia para o desempenho de suas ações. Tudo isto é proposto para
estimular a autonomia e o desenvolvimento social com atividades de interação
entre as crianças e entre crianças e os adultos, visando a aprendizagem de
normas e condutas que regem as interações sociais e a construção de normas
e valores próprios (MANTOVANI DE ASSIS, 1999a).
O aspecto perceptivo-motor envolve a coordenação voluntária dos
grandes e dos pequenos músculos e a formação de hábitos e atitudes. Deste
modo,
45
modo adequado às suas necessidades e desejos e finalmente combiná-
los entre si de modo mais variável possível”B
( RANDÃO, 1984, p.79).
46
CAPÍTULO III
UMA QUESTÃO A APROFUNDAR
47
aquelas que enxergam, é difícil entenderem o que significa ser cego total, uma
vez que suas imagens mentais sempre serão visuais e, portanto, representando
uma série de elementos e relações distintas daquelas que a pessoa cega forma
no seu pensamento (LEONHARDT , 1992, p. 9).
A deficiência visual ocasiona perdas ou implicações que variam de
pessoa para pessoa, dependendo de sua singularidade e do seu meio
ambiente. As variáveis citadas referem-se ao grau da deficiência, ou seja, à
condição visual da pessoa, ao tipo de doença que caracterizou a deficiência, à
idade em que ocorreu a perda, e ao tempo transcorrido O( CHAIATA et al,1988;
SÃO PAULO, 1993).
Em função das variáveis podem existir lacunas no desenvolvimento da
pessoa com deficiência visual, principalmente nos primeiros anos de vida.
Estudos citados por LEONHARDT (1992), sobre o desenvolvimento da percepção
em crianças cegas, de cinco anos, mostram inferioridade na percepção auditiva
e tátil e em manipulação, quando comparadas com crianças videntes da mesma
idade.
48
que lhes proporcionam conhecimentos e organização de experiências, e lhes
informam sobre a direção e a distância que está o objeto sonoro, porém,
recebem poucos dados sobre a forma, tamanho, cor ou localização no espaço,
especialmente quando os objetos que causam os sons referidos não estão
relacionados à experiências anteriores, nem podem ser tocados.
O sol, a lua, as nuvens, as montanhas, por exemplo, escapam de uma
observação tátil, mostrando que as percepções restantes necessitam de ajuda
auditiva para ir se organizando e conferir um significado à experiência externa,
principalmente, nas primeiras etapas da vida da criança com cegueira
(LEONHARDT , 1992, p.9).
De acordo com Brandão (1984) a dificuldade de agir sobre os objetos
prejudicará muito, a percepção das imagens sensoriais táteis e das experiências
sobre o mundo que a cerca.
49
comportamentos. A linguagem, igualmente, pode apresentar séries de
dificuldades para a criança cega, quando não compreende com exatidão o
significado das palavras e sons que são pronunciados. Há também dificuldades
para ela iniciar o processo de generalização na mesma etapa que aquela que
enxerga.
50
Embora importantes, as AVD têm sido pouco aplicadas como aliadas na
aprendizagem, pois os alunos tendem a adquirir o conhecimentocientífico “por
meio da repetição, da memorização e de enunciado que, geralmente, não
entendem” (DELVAL, 2001, p.58). Este conhecimento, apesar do seu papel
fundamental na educação, encontra certa oposição:
51
propiciam o desenvolvimento cognitivo, afetivo, social e perceptivo-motor das
crianças com deficiência visual.
Este problema é pertinente, porque pretendemos ampliar a concepção do
ensino das AVD, ainda arraigado à medidas pedagógicas fortemente restritivas,
permeadas de técnicas e regras rígidas que, muitas vezes, limitam a
possibilidade de promoção do desenvolvimento humano.
Quando a população alvo é formada por pessoas que apresentam uma
deficiência visual, é importantíssimo levar em conta a diversidade e a
heterogeneidade dos educandos. O respeito às peculiaridades e interesses
pessoais é um meio de promover o desenvolvimento, e medidas pedagógicas
restritivas bloqueiam a liberdade das pessoas pensarem e agirem por elas
mesmas.
O desafio colocado por este trabalho está, portanto, em procurar
demonstrar como as AVD podem ser instrumentos para aquisição de
conhecimentos, além de possibilitar a tantos quantos se interessam por esta
área, uma idéia de como estes conhecimentos podem ser adquiridos e
praticados com independência na rotina diária da pessoa com deficiência visual;
e que a aquisição de conhecimentos e habilidades é resultado de processos
individuais, e não moldadas por técnicas, regras ou padrões pré-definidos.
A escassez de pesquisas sobre as AVD na área da deficiência visual e,
principalmente, das que analisam os diferentes conhecimentos que podem ser
construídos na prática destas atividades, justifica, por si só, a realização do
presente estudo.
Além das considerações citadas, como nos lembraHELLER (1970), um
outro aspecto que pode justificar esta pesquisa é o fato de que a vida do
homem é composta de atividades bastante diversificadas e, que, o desempenho
de cada uma delas vai se aprimorando, na mesma medida em que ocorre o seu
desenvolvimento intelectual, social, afetivo, motor e sensorial.
Cada pessoa retrata as suas características particulares ao realizar os
pequenos afazeres, ao cumprir as rotinas do seu cotidiano e que compõem a
52
história de sua vida. Das muitas atividades costumeiras, as AVD são
sobremodo interessantes para estudos e merecem um destaque especial, pois
estão presentes e são necessárias na maioria dos momentos da nossa
existência. Podem significar algo mais que simples atividades de rotina quando
realizadas por pessoas que possuem uma deficiência visual, em função das
limitações decorrentes da própria deficiência. Contudo, é necessário realizar
tarefas básicas na rotina diária, principalmente na adolescência e na vida
adulta.
Em qualquer sociedade o amadurecimento do homem significa que ele
adquire as diversas habilidades indispensáveis para a vida em grupo. A pessoa
adulta deve dominar, antes de qualquer coisa, a manipulação dos objetos
imprescindíveis para a vida cotidiana.
53
enxergado, dependem de outra que enxergue para receberem informações
sobre o meio ambiente, situações, pessoas e demais objetos.
O que seria considerado uma dependência normal nos primeiros anos de
vida tem sido prolongado até à idade adulta, mesmo em se tratando daquelas
pessoas com deficiência visual que apresentam condições físicas e mentais
para realizarem as AVD, independentemente da idade, desempenho acadêmico
ou situação sócio-econômica. É importante chamar a atenção para o fato de
que até com alto grau de escolaridade (curso médio ou até universitário), muitas
apresentam uma dependência acentuada nas AVD, não sendo independentes,
por exemplo, na alimentação, vestuário ou higiene.
Compreendemos que, para as pessoas com cegueira, o domínio das
AVD, além da aquisição de conceitos, pode significar um fator facilitador na
participação social, uma vez que a condição de agirem por si mesmos
possibilita-lhes uma vida independente e autônoma, assegurando-lhes
condições para o exercício de seus direitos de cidadãos.
O conceito de vida independente, neste caso, “compreende movimento,
filosofia, serviços, equipamentos, centros, programas, em relação aos quais as
figuras centrais são os cidadãos portadores de deficiência, que se libertam ou
estão em vias de se libertar da autoridade institucional e familiar”S(ASSAKI,
1997, p.51). Ter vida independente é uma pretensão daqueles que a
empreendem; envolve decisões e responsabilidades, bem como favorece o
acesso aos direitos e participação quanto aos deveres de cidadania.
O desejo de contribuir no sentido de possibilitar às pessoas com
deficiência visual não somente a aprender a fazer, mas fazer compreendendo,
aprendendo e generalizando a aplicação dos conhecimentos para outras
atividades, levou-nos a enfrentar o desafio de traçar alguns caminhos neste
sentido.
Quando nos remetemos ao modo particular de a pessoa com deficiência
visual realizar as AVD, temos como objetivo específico esclarecer, tanto aos
profissionais e educadores, quanto aos familiares e pessoas interessadas,
54
como procedemos para ensinar tais atividades e a importância delas no
desenvolvimento humano. Não se trata de transmitir uma maneira de fazer para
ser reproduzida, mas de contribuir para uma intervenção direcionada e revelar
os talentos de cada criança com cegueira, abordando a AVD como uma
atividade/meio que promova o conhecimento.
Portanto esta pesquisa tem como objetivo principal revelar o que está
“oculto” nas AVD, desvendando os diferentes aspectos do desenvolvimento,
recursos, técnicas e práticas implícitos nestas atividades com crianças com
cegueira.
55
56
CAPÍTULO IV
O ESTUDO REALIZADO
Este estudo foi realizado segundo uma abordagem qualitativa, uma vez
que o pesquisador compartilha das práticas, das percepções e experiências do
objeto da pesquisa, no caso, as AVD.
57
educandos e estudamos, igualmente, alguns recursos e oportunidades que
podem ser utilizados no decorrer do processo de aquisição das AVD.
Na busca de novas alternativas para entender as AVD, tomamos por
base o aspecto cognitivo, o afetivo, o social e o perceptivo-motor do
desenvolvimento bem como os tipos de conhecimento lógico-matemático, social
e físico envolvidos nas ações selecionadas.
O objeto de estudo deste trabalho, portanto, são as próprias AVD, as
quais, submetidas à análise, permitem-nos destacar as possibilidades para se
estimular o desenvolvimento global das crianças com deficiência visual.
A observação recaiu sobre os educandos e seus familiares atendidos no
CEPRE nos últimos três anos. Direcionamos o trabalho à criança com cegueira
porque ela não utiliza a visão para realizar as AVD, e por ser a infância o
período de maiores aquisições e desenvolvimento.
A seleção das crianças observadas obedeceu os seguintes critérios: já
estar recebendo atendimento em AVD no CEPRE; ser cego congênito ou ter
perdido a visão até os três anos de idade; e pertencer à faixa etária entre quatro
e dez anos. Os atendimentos foram realizados individualmente ou em grupo,
uma vez por semana, em sessões de cerca de meia hora de duração,
registrados nos prontuários de cada criança e a maioria foi documentada em
vídeo.
Selecionamos algumas atividades para observação e consideramos o
seguinte: o desenvolvimento da própria atividade, as técnicas e recursos
utilizados, a aquisição de conhecimentos e as possibilidades de generalização
dos conhecimentos para outras situações.
Os atendimentos transcorreram em um ambiente propício à
aprendizagem e à aquisição de conhecimentos significativos. Criamos situações
de atendimento em uma sala especial para AVD. Ressaltamos que durante os
atendimentos houve uma relação dialógica entre os sujeitos e o pesquisador;
trata-se de um recurso usado para promover a reflexão, permitindo a
58
compreensão da atividade. Contamos, geralmente, com a participação das
mães ou responsáveis na rotina dos atendimentos.
A sala, conforme foto a seguir, está organizada com móveis, utensílios,
roupas pessoais, de cama, mesa e banho, compondo um conjunto básico para
o funcionamento de uma casa, o que facilita a realização das AVD pelas
pessoas com deficiência visual.
59
funções mentais das crianças, para sua adaptação à vida social. Desta forma,
precisamos estar preocupados não só em favorecer-lhes a aprendizagem
específica de determinadas ações, mas sobretudo, em levá-las a refletirem nas
suas ações e a buscarem seus próprios meios para tentar realizá-las, para não
só fazerem uma atividade, mas compreenderem o que fazem.
PIAGET (1998) afirma que:
“... uma experiência que não seja realizada pela própria pessoa, com
plena liberdade de iniciativa, deixa de ser, por definição, uma experiência,
transformando-se em simples adestramento, destituído de valor formador
por falta da compreensão suficiente dos pormenores das etapas
sucessivas. (...) compreender é inventar, ou reconstruir através da
reinvenção, e será preciso curvar-se ante tais necessidades se o que se
pretende, para o futuro, é moldar indivíduos capazes de produzir ou de
criar, e não apenas de repetir”(p. 17).
1
Programa de Educação Pré-Escolar: objetivos/atividades e/ou conteúdos, organizado pela
profa. Dra. Orly Mantovani de Assis, FE/UNICAMP.
60
a execução de cada uma delas, conhecer os objetos e o que ocorre quando
estes são manuseados. Apesar de haver alguns passos considerados
obrigatórios para se fazer as atividades, eles podem ser simplificados com a
prática; cada criança cria e aprende a sua própria seqüência e maneira de
realizá-las.
É fundamental que o educador conheça bem a atividade, de maneira a
propiciar solicitações do meio para estimular a criança a agir ativamente,
fazendo suas próprias descobertas.
MANTOVANI DE ASSIS (1976) afirma que muitos educadores negligenciam
as possibilidades de desenvolvimento intelectual da criança, um período da
vida em que a carência de estímulos adequados pode comprometê-lo
seriamente.
“o verdadeiro sentido da educação pré-escolar deve ser o de contribuir
para o desenvolvimento da criança a fim de que esta realize todas as
suas possibilidades humanas do período em que está vivendo. (...). As
atividades curriculares mais comumente empregadas nem sempre são
adequadas para se atingir os fins propostos (p. 3).
MANTOVANI DE ASSIS (1976) cita as palavras de Piaget, que diz: “.. Cada
vez que ensinamos prematuramente a uma criança alguma coisa que poderia ter
descoberto por si mesma, esta criança foi impedida de inventar e,
conseqüentemente, de entender completamente” (p. 3).
Da necessidade de querermos estudar os focos de intervenção do
educador nas AVD, elaboramos uma seqüência de passos que podem ser
observados, listamos alguns objetos sugeridos para nelas serem utilizados,
oferecemos algumas orientações básicas e criamos um instrumento específico
de ações pedagógicas.
Uma de nossas intenções, entre tantas outras, é facilitar aos profissionais
de forma geral e aos familiares, a compreensão da extensão das AVD; outra é
orientá-los a selecionar e organizar os objetivos de suas intervenções, utilizando
61
estas atividades como meio para a aquisição do conhecimento e para o
desenvolvimento global da criança.
Não pretendemos, contudo, criar um manual de procedimentos ou uma
tabela para avaliar desempenhos, muito menos critérios para aplicação de
objetivos instrucionais nas AVD. Propomos, sim, o detalhamento das ações
envolvidas nas atividades diárias, tendo como referência os aspectos do
desenvolvimento e os tipos de conhecimento envolvidos nas AVD: o cognitivo, o
social, o afetivo e o perceptivo-motor.
A - Aspecto cognitivo:
? conhecimento físico: propriedade dos objetos quanto à forma, textura,
consistência, som, odor, sabor, temperatura e peso, a partir da ação
direta do sujeito sobre o objeto;
B - Aspecto social:
? interação com os pares;
? interação com os adultos (familiares, profissionais, amigos...);
? aprendizagem de normas, regras e valores próprios;
62
? formação de hábitos e atitudes.
C - Aspecto afetivo:
? independência;
? iniciativa;
? responsabilidade;
? expressão de sentimentos e emoções;
? interesse;
? criatividade;
? curiosidade;
? autonomia.
D - Aspecto perceptivo-motor:
? coordenação dos grandes músculos;
? coordenação dos pequenos músculos.
2. Atividades selecionadas
? lavar as mãos;
? encher um copo de água; e
63
? vestir uma camiseta.
64
ambiente com o dorso da mão direita e a mão esquerda posicionada na altura
do rosto, para proteção superior, ou no abdômen para proteção inferiorM( ELO,
1991; SÃO PAULO, 1993). Também, pode reconhecer os ambientes pelo odor,
barulho, localização espacial e outros indícios por ela definidos. Ela deve
receber informações sobre a existência de certos locais típicos da casa, escola
ou instituição, onde se encontram móveis e objetos permanentes e onde são
realizadas determinadas atividades.
65
D - Adequar a quantidade de água da torneira. A criança aprende a
controlar e a adequar a saída de água da torneira, girando-a para maior ou
menor fluxo e escolhendo, ela mesma, a quantidade desejada.
66
J - Enxaguar as mãos. O movimento de rotação e a pressão de uma
mão sobre a outra com a água caindo sobre elas, permite à criança enxágua-
las, percebendo se ainda resta sabonete. Após o enxágüe, ela fecha a torneira,
estabelecendo uma relação de causa-efeito.
67
As fotos, a seguir, ilustram algumas ações desta atividade.
68
detalhadas sobre ele, para ter mais facilidade para agir. Por isso, é muito
importante, para a criança com cegueira, localizar e conhecer o espaço físico, a
fim de apreender o contexto no qual realiza a AVD. Uma das pistas que pode
ser utilizada é o cheiro característico dos ambientes.
69
F - Aproximar a jarra do copo. A criança tateia o espaço e percebe o
copo, segurando-o entre os dedos polegar e indicador,podendo utilizá-los como
referência, ou apenas o polegar, para posicionar a jarra ao lado do copo. A jarra
deve estar posicionada na direção do meio do copo, para facilitar o
transvasamento do líquido e evitar o risco de transbordamento.
70
J - Descansar a jarra na mesa. Após despejar a água no copo, a
criança descansa a jarra na mesa. Primeiramente, porém, deve tatear o local da
mesa onde a jarra descansará.
A seguir, fotos que ilustram algumas ações desta atividade.
71
Uma possível seqüência da atividade
72
E - Colocar a camiseta em cima da mesa, com a frente virada para
baixo. Uma das maneiras de vestí-la é colocá-la em cima da mesa. Aos
poucos, a criança aprende a relacionar as partes da camiseta com o seu corpo,
localizando a abertura do quadril, que é importante para orientá-la a colocar a
cabeça no decote, e os braços nas mangas.
73
J - Arrumar a camiseta no corpo. A criança veste a camiseta e a
ajusta ao corpo. A sensação de conforto ou desconforto vai lhe informar se a
ação está correta ou não.
74
Segundo Piaget, o papel do professor é “confeccionar no espírito da
criança uma ferramenta, um método que lhe permita compreender o mundo”
(PARRAT-D AYAN e T RYPHON, 1998, p. 12).
KAMII, DEVRIES (1986) retiraram da teoria piagetiana quatro formas ou
níveis de ação sobre os objetos: “agir sobre os objetos e ver como eles reagem;
agir sobre os objetos para produzir um efeito desejado; ter consciência de como
se produziu o efeito desejado; explicação das causas” (p. 63, 64).
Podemos considerar as mesmas formas de agir ao definirmos as
orientações básicas para o ensino das AVD. As orientações, a seguir, não estão
relacionadas de uma maneira seqüencial e hierárquica, mas se aplicam
conforme as necessidades da criança, levando-se em consideração o momento
e o espaço físico onde ocorrem as atividades. Foram concebidas e organizadas
visando dar suporte aos educadores e aos familiares de pessoas com cegueira
ao estimularem e ensinarem as AVD.
75
ativa, passava grande parte de seu tempo conversando e ouvindo as conversas
dos outros. Buscamos oferecer-lhe oportunidades para realizar suas próprias
atividades diárias, ajudando-a neste sentido, a partir de ações rápidas e simples
para que ela percebesse que tinha condições de realizá-las. A família também
foi igualmente orientada nesta direção.
No refeitório do CEPRE, Di não gostava de se alimentar sozinha, não
mantinha a comida na colher ou garfo e não levava o prato utilizado até ao
balcão - um indicativo da sua dependência tanto da família quanto de outras
pessoas nas AVD. Também demonstrava falta de equilíbrio pela dificuldade de
segurar e manter o prato na horizontal. Sempre conversávamos sobre o espaço
físico do refeitório, a distribuição dos móveis, a localização da cozinha e do
bebedouro, para que Di se locomovesse com independência e escolhesse,
entre algumas opções, o seu lanche, além de participar da limpeza da mesa.
Um dia, quando outras crianças estavam planejando o que fariam após o
lanche e quem iria limpar a mesa do refeitório, Di, repentinamente, pegou o seu
prato e, sem derramar os resíduos, levou-o até o lixo e ainda separou os
talheres de inox, dizendo que não poderiam ir para o lixo. É interessante notar
que nunca havíamos falado que os talheres de inox não eram jogados no lixo,
mas Di percebeu que eram colocados ao lado do prato pelo barulho que faziam
ao serem depositados no balcão. Ele compreendeu que o ambiente era propício
para realizar diferentes ações e mudou suas atitudes.
76
valor formador por falta de compreensão suficientes dos pormenores
das etapas sucessivas”(1998, p.17).
77
O conhecimento lógico-matemático pode ser adquirido pela criança
quando ela prepara a mesa para o lanche, conta o número de colegas,
seleciona igual número de copos e guardanapos para cada um ou ainda
quando despeja suco nos copos, em maior ou menor quantidade. Ao pegar os
copos no armário, ela poderá classificar e selecionar os iguais e, ao recolocá-
los no lugar, arranjá-los em ordem crescente ou decrescente, realizando uma
atividade de seriação. Simultaneamente, a criança poderá dar explicações
causais das ações que realiza, ultrapassando o “saber fazer” e passando a
compreender o que está acontecendo, a partir de suas ações.
O conhecimento social vai sendo adquirido pouco a pouco a partir das
trocas que a criança estabelece com seus pares e com os adultos, aprendendo
normas e regras referentes às relações interpessoais e grupais. Aprende a ter
respeito pelos colegas, a cooperar na casa e na escola, a compreender o papel
de cada pessoa e a ter iniciativa e independência nas suas ações.
Portanto, a criança cria e recria condutas adaptativas ao realizar as AVD.
Este trabalho deve ser orientado no sentido de: a) propiciar a atividade da
criança nas situações do cotidiano, levando-a a compreender sua ação sobre
os objetos e como estes reagem; b) resolver os problemas com os quais se
defronta; c) perceber os resultados das suas ações na independência e
autonomia do dia-a-dia.
78
Pa (sete anos) lavou as mãos com muita segurança e domínio da AVD.
Em seguida, procurou a toalha de tecido para se enxugar. Tateou o lado direito
da pia, localizando a toalha. Fixamos na parede uma faixa em relevo, indicando
o lugar da pia, para que a criança soubesse onde ela estava, bem como os
objetos usados, para facilitar a sua orientação espacial. Fizemos um destaque
na saboneteira e no local da toalha, e preocupamo-nos em deixar os objetos em
um lugar definido. (A faixa e o destaque foram retirados assim que Pa dominou
o espaço de aprendizagem desta AVD).
Após enxugar as mãos, Pa localizou o cabide e, a seguir, pendurou a
toalha. Ao se afastar uns dois passos, percebeu que a toalha havia caído.
Rapidamente recuou e abaixou-se para localizá-la e pegá-la. Segurou-a por um
de seus cantos, pendurando-a no cabide e, novamente, a toalha caiu. Pa voltou
e pegou a toalha, mas, desta vez, procurou explorá-la.
Foi muito interessante observar como a criança tateou e explorou toda a
toalha, segurando-a em uma das pontas, parecendo estar medindo-a e, então,
pendurou-a pelo meio. Ficou esperando alguns segundos diante da toalha, para
verificar se ela continuava pendurada. O ruído de uma toalha de rosto caindo no
chão é quase imperceptível, assim como o movimento de sua queda.
Entretanto, ao perceber a toalha caindo, Pa compreendeu o que estava
acontecendo com uma percepção muito maior do que a de muitas crianças que
enxergam.
Naquele dia, aproveitamos a oportunidade para explorar o acontecido.
Pa explicou o que fez para não deixar a toalha cair, compartilhando o ocorrido
com outras crianças com cegueira. Todas quiseram experimentar como
pendurar a toalha e como perceber estes e outros objetos caindo no chão.
Pendurar uma toalha no cabide é algo que pode passar desapercebido
quando trabalhamos com crianças videntes. Mas, para a criança com perda
visual, estas situações de aprendizagem são relevantes, pois contribuem para
sua independência nesta ou em outras situações como, por exemplo, pendurar
roupas ou esticar uma toalha na mesa, além de favorecerem a construção de
79
conhecimentos. A mãe de Pa acompanhou a atividade, ficando admirada ao
verificar a reação do filho. É de extrema importância a participação da família no
processo de formação da criança, a partir do diagnóstico da deficiência e ao
longo do processo educacional.
FERREL (1985) considera que todos os momentos em que a mãe interage
com a criança constituem momentos de ensino. Eles acontecem nas
brincadeiras, conversas, rotinas diárias, ou simplesmente fazendo as AVD e,
nestes momentos, a mãe ensina a criança a viver. Ressalta a importância de a
mãe conhecer a criança, dedicando-lhe atenção, oferecendo-lhe brinquedos e
objetos de uso diário para ela manusear e aprender em situações agradáveis.
Os conhecimentos resultantes destas interações precisam ser aplicados
na vida fora do lar, dando oportunidades para a criança praticar o que
aprendeu. A parceria com a família neste processo é essencialF(ICHTNER ,
1981). Ela precisa acreditar na criança, descobrir suas possibilidades,
incentivando-a e dando-lhe oportunidades de vivenciar, com independência e
autonomia, as AVD.
80
D. Expandir as possibilidades individuais da criança com cegueira
criando recursos específicos para ensinar as AVD
81
Um recurso utilizado para compor conjuntos de peças de vestuário
consiste em se separar conjuntos de roupas para finalidades específicas,
organizando-os em fileiras, guardando-os em sacos plásticos, ou ainda
separando-os, por divisórias, nos armários ou gavetas.
A criança deve aprender a localizar a gaveta e o local onde ficam, por
exemplo, as suas roupas para usar em casa e assim encontrar e vestir uma
camiseta sem necessidade de ajuda. Com crianças mais velhas, que dominam
a leitura e escrita, pode ser feita uma relação em braile das seqüências de
roupas no armário. Quando uma peça é retirada da relação coloca-se um
marcador para que a peça seja recolocada no lugar certo. As roupas também
podem ser separadas nos cabides, fazendo-se pequenas marcas neles, ou
estabelecendo-se seqüências, ou ainda colocando-se alguma identificação em
braile.
Muitos outros recursos adaptativos são criados na atividade espontânea
da criança quando ela tem liberdade e interesse em resolver uma situação.
Inúmeras vezes, ao trabalhar com crianças que não enxergam, pudemos
constatar o quanto elas recorrem aos seus sentidos remanescentes e ao
manuseio dos objetos do meio, para obter informações sobre o estado e a
situação deles, utilizando, de forma muito melhor, o seu corpo e o espaço, do
que as pessoas que enxergam.
O educador não deve pensar apenas na falta de visão da criança com
cegueira, mas ajudá-la a “ver”, descobrir e entender a ação com o seu corpo
inteiro. É importante que os recursos sejam criados e priorizados pela própria
criança, pois somente assim ela fará uso real e efetivo dos mesmos,
82
personalizando sua maneira de fazer e revelando, neste fazer, suas
características pessoais.
Acreditamos que, muito mais importante do que recursos ou técnicas,
sejam as experiências da criança quando, ao agir no mundo, reinventa suas
técnicas e opta pelos recursos de que necessita para melhor resolver situações-
problema. O educador, porém, precisa saber fazer a ação e conhecer alguns
recursos que podem ser utilizados, a fim de sugerir pistas à criança, como
também criar e também aprender com ela outras formas de proceder para
realizar as AVD.
83
dificuldades à criança com cegueira na aquisição do significado das palavras,
provocando ecolalias e o verbalismo próprio dos cegos.
84
A linguagem precisa ser inicialmente contextualizada e compreensível,
para que a criança com cegueira entenda o que está sendo solicitado. Assim,
ela se interessará em desenvolver estratégias que contribuirão para que
obtenha sucesso em qualquer aprendizagem e, principalmente na
aprendizagem das AVD.
No início do nosso trabalho no CEPRE, éramos nós que propúnhamos
as AVD. Muitas atividades não correspondiam às necessidades das crianças e,
apesar de visarmos o desenvolvimento delas, não tínhamos uma preocupação
explícita com o processo de construção de conhecimentos, nem mesmo com a
importância da linguagem nos avanços da atividade cognitiva. Em geral, as
AVD não eram contextualizadas, e as crianças não se empenhavam muito em
realizar as ações propostas, não demonstrando muita iniciativa para resolver os
problemas e enfrentar as dificuldades que surgiam.
Com o decorrer do tempo, passamos a desafiar as crianças na
aprendizagem das AVD, posto que o conhecimento se adquire por um processo
de construção interna e não apenas por intermédio de informações vindas do
exterior. Incentivamos as crianças a realizar as AVD, propondo atividades de
seu interesse.
85
F. Atentar para a funcionalidade da aprendizagem das AVD e dar
liberdade para a criança cega agir com segurança
86
para enxugá-las, passava as mãos na toalha com movimentos verticais.
Gostava de sentir a água caindo em suas mãos, e virava-as de um lado para o
outro, apreciando as experiências. Ela passou a explorar as mãos,
discriminando suas partes (dorso e palma; dedos, unhas, punho), aprendendo a
nomeá-las e a coordenar os movimentos.
No decorrer das atividades foram criadas muitas situações para Tay lavar
as mãos e outros objetos. Algumas vezes os objetos estavam sujos e a sujeira
era perceptível. Ela aprendeu a perceber a sujeira dos objetos, melhorando
assim a preensão e os movimentos da mão e dos dedos. Anteriormente, para
realizar as atividades, ela mantinha os dedos esticados, não mostrando
habilidade e destreza nos movimentos.
Destacamos a importância da criança com deficiência visual “ver”, a sua
maneira, como uma atividade é realizada. Ou seja, é importante que ela
acompanhe os movimentos de outra pessoa que saiba fazer a ação, que
perceba a atividade utilizando os outros sentidos, que ouça explicações
detalhadas do ambiente, contextualizando a ação, e assim, adquirindo a noção
de como realizá-la, já que não tem a possibilidade de visualizar e imitar. Para
aprender um movimento é recomendado que o educador posicione-se atrás da
criança, segurando-lhe as mãos e orientando-lhe os movimentos.
Tay percebeu que podia fazer pressão para tampar a saída da água,
colocando a mão debaixo da água; ficou virando a mão de um lado para outro,
apreciando o “espetáculo” da água caindo sobre as suas mãos e prestando
atenção nas conseqüências de seus atos. Aprendeu que podia tampar a pia e
enchê-la de água e, após destampá-la, ficar observando a água escoar. Nestas
situações, perguntávamos o que estava acontecendo e para onde ia a água.
Tay respondia: “Foi embora, no buraco”
. “Agora a pia está vazia”; “Estava
cheia”. “Não tem mais água”. Tay deixava o sabonete escorregar na pia e,
algumas vezes, jogou-o no chão. Ela gostou de “ver” o sabonete partido em
pedaços. Pedimos que juntasse os pedaços, separando os maiores dos
menores, fazendo pequenos agrupamentos, e classificando-os.
87
Sendo a brincadeira uma oportunidade para Tay aprender a lavar as
mãos e construir os conhecimentos, oferecemos vários objetos para que ela os
lavasse, e exercitasse na atividade os movimentos de rosquear, apertar,
ensaboar, enxaguar e enxugar.
Da mesma forma, Tay foi aprendendo sobre a consistência dos objetos,
o peso, a forma, odor, temperatura, criando relações de tamanho, quantidade,
qualidade e correspondência. Também desenvolvemos noções de causa e
efeito, por exemplo, mais abertura da torneira, maior volume de água.
Trabalhamos o aspecto perceptivo-motor, coordenando os pequenos músculos
e fazendo novos movimentos para controlar a quantidade de água, adequando
os movimentos ao interesse da criança. Encorajamos a criança a brincar de
lavar a boneca, levando-a a se interessar por lavar outros objetos, entendendo
a funcionalidade de suas ações.
A mãe foi orientada a oferecer à Tay diferentes potes com roscas,
tampas, formas e tamanhos para que pudesse manipulá-los e brincar com eles.
Nesta e em outras situações, a criança poderá aprender a ordenar segundo as
diferenças e semelhanças, a trabalhar com conceitos e noções diferentes e ser
incentivada a realizar outras atividades, generalizando os conhecimentos.
Durante os atendimentos que se seguiram, Tay foi aprendendo a fazer a
atividade e, ao mesmo tempo, começando a compreender a importância de
lavar as mãos para a saúde, higiene e aparência pessoal.
88
adequadas ao paladar de cada um. Nesta atividade temos a possível
seqüência: selecionar mentalmente os ingredientes e os recipientes, localizar e
pegar os objetos, medir os ingredientes e adicioná-los. Essa seqüência é
natural, podendo variar a quantidade e a ordem de colocação dos ingredientes.
De maneira geral, as crianças podem aprender a fazer as atividades por
imitação, mas isso não é aprendido naturalmente por aquelas que não
enxergam.
Uma criança que não vê tem maiores dificuldades para saber fazer uma
ação que nunca fez antes. À medida que experimenta, descobre os seus
próprios passos para realizá-la. Aprende a organizar mentalmente a sua
seqüência e a preparar o material necessário, criando procedimentos peculiares
e finalizando a ação corretamente, pois compreendeu o quê e como deve fazer.
A atividade de colocar pasta na escova de dente é outro exemplo de
atividade que tem uma seqüência. A criança cega aprende esta seqüência,
assim como percebe o comprimento das cerdas da escova (começo e final),
posicionando-a entre os dedos polegar e indicador. Com o cabo voltado na
direção da mão, coloca a pasta na posição vertical sobre o começo das cerdas
e aperta o tubo até a quantidade ideal de pasta dental, parando ao sentir o
limite das cerdas. A seqüência parece óbvia, porém, muitos familiares e
educadores não imaginam as implicações e os detalhes que envolvem cada
passo. São ações que requerem muitas habilidades para serem realizadas.
É preciso estar em contato com os objetos e viver as situações para ter
oportunidade de aprender. Ações como um jato de água gelada da torneira do
chuveiro ou o toque em uma panela quente, que causam mudança rápida no
ambiente e na própria pessoa que faz a ação, precisam ser realizadas com
cautela e muita atenção, pois tais mudanças podem desnortear uma criança
que não vê.
As AVD são compostas de várias ações e cada uma tem um efeito. A
criança com cegueira precisa conhecer os efeitos das suas ações. Ela precisa
89
de explicações mais detalhadas sobre as mesmas, pois a falta da visão limita
também a antecipação dos fatos.
Aos poucos, com o crescimento, a criança estabelece uma relação entre
a causa e o resultado de uma ação.PIAGET (1970) explica que é esta relação e
não a automatização em hábitos que define a causalidade:
90
Conforme Ba interagia com os objetos, foi adquirindo as noções de
dentro e fora, e compreendendo a atividade. Estas situações, corriqueiras para
as pessoas videntes, requerem muita atenção e experimentação das crianças
com cegueira, para serem concluídas com eficácia e precisam ser muito
exercitadas para que possam ser coordenadas e compreendidas em
pensamento, posteriormente.
91
PARRAT-DAYAN e T RYPHON (1998) afirmam que Piaget pede ao professor
não apenas para:
92
O processo de ensino das AVD precisa, portanto, ser propositadamente
desencadeado e assistido pelo educador, para que cada criança crie, descubra,
invente e reinvente sua maneira de fazer as AVD. A criança, por sua vez,
somente terá disposição para refletir quando lhe forem oferecidas
possibilidades de pensar e construir novos conhecimentos, sendo estimulada
pela situação, pelo material e pelas questões formuladas pelo professor.
I. Favorecer a inclusão social das crianças com cegueira por meio das
AVD
“Hoje, ela bem dizer, faz tudo sozinha, não depende da gente para
nada. Largou a mamadeira, até que enfim, só toma o leitinho no copo.
Teve muitas, muitas vantagens de vir aqui, para ela e para mim também,
mais ainda, me sobra um pouco mais de tempo para fazer as coisas”.
93
A mãe de Tay informou também que tinha a preocupação de ensinar a
criança a fazer as atividades, mas não sabia como: “Você tem vontade de
ensinar, mas não sabe como”. Perguntamos a ela como a filha está hoje, em
casa e na escola e sua resposta foi:
94
No momento atual, a inclusão social e a escolar são as bandeiras das
pessoas com deficiência, de seus pais e dos que lutam pelos direitos das
minorias em geral.
Para MANTOAN (2000):
95
4. Instrumento de orientação
96
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE: LAVAR AS MÃOS
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO FÍSICO
? Explorar, nomear e identificar texturas semelhantes e diferentes dos objetos utilizados na atividade
TEXTURA (áspero, liso, rugoso).
? Procurar em uma coleção os sabonetes que têm texturas semelhantes ou diferentes de um dado
97
sabonete.
? Manusear diferentes objetos utilizados na atividade (sabonete, saboneteira, toalha...) a fim de identificar
SOM o som que emitem ao serem balançados, tocados ou esfregados uns contra os outros.
? Identificar características sonoras dos objetos: sabonete, saboneteira, pia...
? Perceber pelo som a quantidade de água que sai da torneira.
98
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE: LAVAR AS MÃOS
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO FÍSICO
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
? Manusear diferentes objetos da atividade para descobrir que eles têm peso.
PESO ? Avaliar o peso dos objetos da atividade.
99
ODOR ? Identificar e nomear o odor característico dos objetos e do ambiente onde realiza a AVD.
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
CONSERVAÇÃO ? Fazer duas fileiras com quantidades iguais, uma de sabonetes e uma de toalhas.
DE QUANTIDADES ? Indicar se há a mesma quantidade de sabonetes nas duas fileiras.
DESCONTÍNUAS ? Repartir idêntico número de sabonetes e toalhas entre os colegas.
OU DISCRETAS ? Comparar as quantidades de objetos da atividade, estabelecendo entre eles relações de
equivalência e de não-equivalência.
DO PESO
? Verificar se há a mesma quantidade de água nas mãos em concha (do aluno e do educador).
CONSERVAÇÃO ? Transvasar água de uma para a outra mão.
DE QUANTIDADES ? Colocar a mesma quantidade de água em frascos iguais e diferentes.
CONTÍNUAS ? Modelar diferentes objetos com a mesma quantidade de sabão derretido.
(líquido e massa) ? Aumentar e diminuir a quantidade de massa de sabão.
? Comparar a mesma quantidade de massa em formas iguais e diferentes.
? Repartir a massa de sabão de forma que os colegas recebam quantidades iguais.
102
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE: LAVAR AS MÃOS
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO LÓGICO-MATEMÁTICO
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
SERIAÇÃO ? Comparar dois sabonetes que se diferenciam pelo tamanho e apontar a diferença.
OPERATÓRIA ? Organizar o armário, ordenando os objetos de higiene pelo tamanho, peso, odor.
? Comparar duas toalhas de tamanhos diferentes.
104
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE: LAVAR AS MÂOS
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO LÓGICO-MATEMÁTICO
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
? Reconhecer os objetos utilizados na atividade pelo tato (sabonete, toalha de rosto, pia,
escada para subir na pia, saboneteira...).
ESPAÇO ? Movimentar-se na sala e localizar os objetos usados na atividade.
? Escolher o lugar de sua preferência para colocar a saboneteira, o toalheiro.
? Guardar os objetos nos lugares adequados, após o uso.
? Identificar um sabonete diferente dentre outros depositados em uma caixa.
? Pendurar toalhas em um varal, obedecendo a uma seqüência.
105
FORMA ? Manipular e nomear as formas de diferentes tipos de copos e jarras (redondo, quadrado...).
? Identificar formas semelhantes e diferentes de copos e jarras.
? Reconhecer o seu próprio copo pela forma.
? Manipular, explorar e nomear as texturas de diferentes copos e jarras (áspero, liso, rugoso).
TEXTURA ? Discriminar a textura dos copos e jarras utilizados na atividade.
? Identificar o seu próprio copo pela textura.
107
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
CONSERVAÇÃO ? Comparar o volume de água colocado em copos idênticos, estabelecendo entre eles relação
DE QUANTIDADES
111
de equivalência e não-equivalência.
CONTÍNUAS ? Colocar a mesma quantidade de água em copos iguais
(líquido e massa) ? Transvasar água de uma jarra para um copo e de um copo para uma jarra e observar as
diferenças.
? Transvasar água de um copo maior para um menor e vice-versa, e relatar o que percebe.
CLASSIFICAÇÃO ? Fazer coleções de copos, jarras ou outros objetos, segundo uma seqüência estabelecida.
OPERATÓRIA ? Classificar copos e jarras de acordo com uma qualidade (vidro, plástico, grande, pequeno...).
? Classificar os copos e jarras pelo tamanho, peso...
Selecionar entre vários copos e jarras aquele que têm a mesma forma, textura...
112
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE: ENCHER O COPO DE ÁGUA
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO LÓGICO-MATEMÁTICO
SERIAÇÃO ? Manipular livremente diferentes copos e jarras e ordená-los do menor para o maior e vice-
OPERATÓRIA versa.
? Comparar copos da mesma espécie que se diferenciem pelo tamanho (menor, maior).
? Encaixar em uma prancha uma série de figuras em relevo de copos e jarras.
? Reconhecer e localizar na própria casa, na escola e em outros locais que freqüenta, os
móveis e utensílios de uso diário usados na atividade.
? Movimentar-se com independência nestes espaços.
? Em uma prancha, representar com figuras geométricas em relevo os ambientes e móveis da
ESPAÇO sala.
113
SOM ? Perceber as características sonoras de camisetas ao serem jogadas no chão ou no atrito com as
mãos.
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
PESO ? Discriminar a diferença de peso de camisetas com e sem mangas e de tecidos diferentes.
COR ? Criar identificação tátil que lhe permita discriminar as cores das camisetas.
118
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
ATIVIDADE : VESTIR CAMISETA
ASPECTO COGNITIVO: CONHECIMENTO LÓGICO-MATEMÁTICO
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
CONSERVAÇÃO ? Fazer uma fileira de camisetas e pedir para a criança fazer outra fileira com a mesma
DE QUANTIDADES quantidade.
DESCONTÍNUAS ? Comparar a quantidade de camisetas em duas fileiras.
OU DISCRETAS ? Fazer várias pilhas de camisetas com a mesma quantidade de elementos.
? Comparar quantidades de camisetas, estabelecendo entre elas relações de equivalência e
não- equivalência.
? Repartir uma dada quantidade de camisetas entre os colegas.
119
AQUISIÇÃO DO
CONHECIMENTO AÇÕES PEDAGÓGICAS
123
Quando uma criança com cegueira brinca de boneca com uma colega e
oferece à boneca um copo de água, ela exercita a AVD de encher o copo e, ao
mesmo tempo, dramatiza a cena. Ao brincar, a criança conversa com a colega,
expressa seus sentimentos, aprimora suas habilidades motoras, seu raciocínio,
representa o papel de mãe em ações simultâneas de interação e pede a
cooperação da colega para realizar tal ação.
Conforme o enfoque que dermos à ação, diferentes aspectos do
desenvolvimento e tipos de conhecimento podem ser solicitados, favorecendo o
progresso da criança. A observação e o exame detalhado das possibilidades
que se apresentam em cada AVD, são pontos que precisamos considerar para
levar a criança a avançar em seu desenvolvimento, ou seja, para ela ir além das
AVD, como pretendemos demonstrar neste estudo.
5. A intervenção do educador
124
à construção do conhecimento, na proposta de atingir patamares mais elevados
de estruturação mental.
Neste sentido, a seguir apresentamos, como síntese, algumas
contribuições para o educador ao ensinar as AVD:
125
126
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO - AVD
INTERVENÇÃO DO EDUCADOR
? Dar tempo à criança para observar e explorar as coisas ao seu redor. Ela pode conhecê-las por
meio das técnicas de orientação e mobilidade, informações verbais, tateando, cheirando e
experimentando.
? LEVAR A ? Deixar a criança experimentar os alimentos, sentir seu sabor, cheiro e consistência, tocando-os,
CRIANÇA A comendo com os dedos, inicialmente, para, depois, aprender a utilizar os talheres.
OBSERVAR E ? Promover situações para a criança brincar com argila, areia, água, massa de farinha. As
A EXPLORAR experiências facilitam a aprendizagem e a compreensão de inúmeras AVD.
O MEIO ? Ajudar a criança a observar e reconhecer tamanhos: que as cadeiras menores são utilizadas pelas
crianças menores, que o sapato da professora é maior que o dela, a distinguir suas meias entre
outras maiores, que há vários tamanhos de panelas, a reconhecer os objetos pessoais etc...
? Levar a criança a auxiliar nas tarefas de casa ou da escola.
? Incentivar a organização de pequenos álbuns com diferentes materiais.
128
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO – AVD
INTERVENÇÃO DO EDUCADOR
? Incentivar a criança a sistematizar as tarefas, para ela não se perder na execução das AVD.
? Auxiliar a criança a situar os objetos no ambiente, dando-lhe pistas para se deslocar e
alcançar as coisas ao seu redor.
? Pedir para a criança descrever a organização dos armários ou gavetas, ensinando-a a guardar
? FACILITAR O os objetos pessoais.
DESEMPENHO ? Contribuir para a criança aprender a escutar e a memorizar.
NAS AVD ? Evitar o emprego de palavras ”aqui, lá, ali” ou gestos para indicar direções, pois a criança não
pode ver o que está sendo mostrado.
129
? Ensinar a criança a guardar os objetos em locais de fácil acesso, conservando-os nos lugares.
Coisas jogadas no chão ou espalhadas pelo caminho, bem como portas entreabertas
atrapalham a locomoção e a orientação da criança com deficiência visual.
? Dar oportunidades para a criança se envolver nas AVD, cuidar de si própria e das suas coisas
e agir com independência nos ambientes.
? Estimular a criança a cooperar nas tarefas, diminuindo gradualmente a ajuda até ela agir por si
? PROMOVER A mesma.
INDEPENDÊNCIA ? Proporcionar situações em que a criança escolha as atividades que deve fazer, os objetos,
alimentos e roupas, avaliando seus trabalhos e atitudes.
? Estimular a criança a tomar iniciativas.
? Ensinar a criança a combinar roupas e calçados e a reconhecer os diferentes tipos.
? Estimular a criança a aprender a abotoar e desabotoar roupas, a dar nós e laçadas.
? Ensinar a criança a pentear os cabelos, usar pentes e fivelas nos cabelos.
? Marcar em braile os vários potes, gavetas, objetos pessoais.
130
INSTRUMENTO DE ORIENTAÇÃO - AVD
INTERVENÇÃO DO EDUCADOR
? Cultivar a confiança da criança, pois as AVD são ações que envolvem risco e expõem a
? FAVORECER A deficiência.
SEGURANÇA ? Ajudar a criança a sentir segurança ao manusear os objetos, estando com outras pessoas.
? Deixar a criança perceber que há coisas que você vê e nota antes que ela, e mesmo que há
coisas que ela não pode ver.
? Esclarecer aos pais sobre as implicações da deficiência visual nos diferentes aspectos.
? PROPORCIONAR ? Motivar os familiares para que apóiem, ensinem e incentivem a criança a realizar as AVD.
O ENVOLVIMENTO ? Promover atividades em que os pais presenciem a criança realizando as AVD.
FAMILIAR NAS ?
131
? Levar a criança a perceber a presença de outras pessoas e a entrar em contato com elas,
cumprimentando-as, e conversando com elas.
? ENCORAJAR A ? Ensinar como cumprimentar as pessoas, como estender as mãos, dirigir a cabeça e o corpo
INTERAÇÃO COM na direção da voz das pessoas.
OUTRAS ? Reconhecer as pessoas pela voz.
CRIANÇAS E ? Ensinar a realizar as atividades, organizando o material e o espaço em que vai trabalhar.
ADULTOS ? Compartilhar a rotina diária da escola e da família, os afazeres domésticos, as compras, os
sentimentos frente ao desafio das AVD.
132
CONSIDERAÇÕES FINAIS
133
Enfatizamos que o nosso trabalho direcionou a utilidade das AVD, do
conhecimento espontâneo para o conhecimento científico adquirido na escola.
Uma vez que os conhecimentos que podem ser construídos nesta
aprendizagem, oferecem oportunidades para os educandos passarem das
experiências físicas para experiências lógico-matemáticas, as AVD favorecem-
lhes o desenvolvimento do pensamento. Ou seja, neste grande desafio não nos
limitamos apenas a transmitir informações, mas também levarmos os
educandos a refletirem sobre as AVD, aplicando seus esquemas de ação e
construindo relações de causa e efeito, ao descobrir e inventar a sua própria
maneira de realizá-las.
Aprofundando os conhecimentos implícitos nas AVD, percorremos
caminhos que conduzem ao aprendizado das AVD, de tal forma que estas
crianças aprendem a fazer as AVD e que esta aprendizagem se revela um meio
para a construção de conhecimento e, desta maneira, adquirem independência
e autonomia na vida cotidiana.
Foi preciso ultrapassar as questões do treinamento e da rigidez das
técnicas de ensinar e avançar para a análise das possibilidades de aquisição de
conceitos, habilidades, conteúdos de cada atividade, de maneira que a prática
delas despertasse o interesse das crianças com cegueira, pelas coisas ao seu
redor e promovessem o desenvolvimento pleno.
Nesta reflexão, pudemos fazer uma nova leitura das ações na vida
cotidiana, uma vez que as AVD implicam mais do que um conjunto de
atividades que requerem procedimentos, regras ou técnicas para serem
realizadas porque envolvem os tipos de conhecimento e os aspectos do
desenvolvimento.
As contribuições da teoria piagetiana permitiram compreender tais
possibilidades nas AVD, e colaboraram para que sejam consideradas não
apenas como atividades triviais. Ao revisarmos a nossa prática de ensino sob
esta perspectiva, tivemos a preocupação de fazer uma análise minuciosa das
atividades enfocadas neste estudo, contemplando os aspectos do
134
desenvolvimento cognitivo, afetivo, social e perceptivo-motor. Quanto ao
conhecimento físico, verificamos as noções de forma, textura, consistência,
som, cor, temperatura, peso, odor, uma vez que estes conceitos procedem dos
objetos do meio exterior.
Uma análise quanto ao conhecimento lógico-matemático foi realizada,
verificando as noções de conservação de quantidades contínuas e
descontínuas, classificação, seriação, como nos conceitos de noção de espaço
e tempo. Igualmente, observamos o que poderíamos encontrar no ensino das
AVD para solicitar o conhecimento social, pois na interação com as pessoas, o
sujeito constrói representações, o que lhe permite conhecer e explicar a
realidade social do meio em que vive.
Investigando e identificando os aspectos que propiciam o
desenvolvimento das crianças com cegueira, no aprendizado das AVD,
procuramos estimulá-las a usar instrumentos que lhes possibilitassem
ultrapassar o simples “saber fazer” as AVD.
Nestas ações, as crianças deixam transparecer o próprio
desenvolvimento. Cada uma reflete sua história na maneira de fazer as
atividades. Afinal, a ação nas AVD é o produto de cada uma.
O problema proposto neste trabalho, ou seja, revelar o conhecimento
implícito nas AVD permitiu-nos ampliar a concepção do ensino das AVD. Ao
analisarmos os dados referentes à aquisição de conhecimentos, organizados e
aqui apresentados neste trabalho, podemos constatar esta ampliação.
Evidentemente, a análise de outras AVD será imprescindível para que
tais atividades sejam mais bem aproveitadas tanto pelos educadores, como
pelos educandos e seus familiares. Enfatizamos também que as seqüências, as
orientações e os procedimentos, contidos neste estudo, são exemplos
vivenciados por nós. Tratam-se de sugestões de orientações para o
atendimento nas AVD; não são regras que precisam ser seguidas, como se faz
em determinados treinamentos específicos. Eles são instrumentos para os
135
educadores utilizarem como um guia ao ensinar as atividades, servindo como
estratégias para favorecer o desenvolvimento dos educandos.
Os educadores que compreendem o processo da construção do
pensamento e a importância da participação ativa dos educandos para isso,
consideram cada um individualmente, levando em conta as aptidões que os
distinguem, atendendo suas necessidades de aprendizagem para assegurar o
desenvolvimento pleno.
Portanto, este estudo possibilitou-nos visualizar muitos conhecimentos
que podem ser construídos ao realizar as AVD, propiciando aos familiares e
educadores pistas ou estratégias para trabalhar com estas atividades. Permitiu-
nos observar detalhes nas AVD, que podem passar desapercebidos na
aprendizagem da pessoa que enxerga, mas que fazem diferença quando é a
pessoa com deficiência visual quem as realiza.
O direito da criança, do adolescente e do adulto de se desenvolver e
cuidar de si mesmo é garantido pelos preceitos democráticos de igualdade e de
justiça. As pessoas com cegueira também precisam
, para ser autônomas,
aprender tanto o que é mais complexo, como o que é mais simples na vida
cotidiana e não podemos impedí-las de que se confrontarem com esta
realidade. A autonomia nas AVD é o primeiro passo para a conquista da
cidadania e é também uma das metas da educação.
As AVD podem ser consideradas também como um canal para a
inclusão social destas pessoas. Como as AVD possuem um forte conteúdo
cultural, o seu domínio favorece a participação efetiva e ativa das pessoas com
deficiência, nas atividades sociais e culturais desenvolvidas na família, escola,
trabalho e lazer.
Em pleno século XXI, o avanço tecnológico tem contribuído para o
desenvolvimento das AVD. Atualmente, inúmeros instrumentos que estão
sendo fabricados, contribuem e facilitam a vida cotidiana das pessoas, mesmo
as com deficiência visual.
Mantoan (2000) refere que:
136
“o desenvolvimento de estudos e de aplicações envolvendo o uso
de tecnologias em educação e reabilitação das pessoas com deficiência
são, no geral, centrados em situações locais e tratam de incapacidades
específicas. Servem para compensar dificuldades de adaptação, cobrindo
déficits da visão, audição, mobilidade, compreensão e outros. Projetos,
protótipos e instrumental dessa natureza conseguem reduzir as
incapacidades, atenuar as dificuldades, fazem falar, andar, ouvir, ver,
aumentam as possibilidades de aprender”(p. 64).
137
Neste sentido, a tecnologia, a reabilitação e a educação podem
compartilhar do mesmo ideal que é a inclusão de todas as pessoas,
complementando conhecimentos para garantir-lhes o acesso e a participação
plena no meio em que vivem.
Ainda nos nossos dias, podemos constatar rejeição e superproteção da
família, dos educadores, pelas pessoas com deficiência. De modo geral, é a
falta de conhecimento das necessidades pessoais, tanto relacionadas às
possibilidades de cada uma, como das possibilidades que a própria ação
apresenta de constituir uma estratégia, um meio para as pessoas com
deficiência alcançarem o conhecimento científico que estão na base destes
sentimentos contrapostos.
Como já foi discutido, os conhecimentos práticos envolvidos nas AVD
também podem se tornar muito importantes e eficientes, se os relacionamos
com os conhecimentos escolares.
Acreditamos que este estudo abre possibilidades à comunidade
acadêmica de diferentes áreas, profissionais e estudiosos do tema e famílias de
virem a construir outras relações com a teoria piagetiana, por nós escolhida, ou
até mesmo com outras teorias, pois oferece pistas de procedimentos
pedagógicos e oportunidade para reflexão não só para aqueles que já atuam
com pessoas com deficiência visual, mas também aos iniciantes.
Esta pesquisa pode contribuir também para que as AVD sejam
percebidas como parte do conhecimento e prática de várias profissões que são
afins como, serviço social, psicologia, terapia ocupacional, pedagogia,
fisioterapia, entre outras, pois as AVD têm um perfil prático e teórico que pode
ser apropriado e redimensionado de acordo com a especificidade de cada área
profissional.
Podemos considerar que os objetivos propostos foram alcançados, uma
vez que este estudo possibilitou-nos visualizar diferentes conceitos, noções,
habilidades, entre muitos conhecimentos que podem ser construídos ao realizar
138
as AVD. Igualmente, permitiu-nos observar detalhes nas AVD, que podem
passar desapercebidos na aprendizagem da pessoa que enxerga, mas que
fazem diferença quando é pessoa com deficiência visual quem as realiza.
Assim, acreditamos ter o presente estudo alcançado a meta proposta, ao
colocar um novo paradigma para as AVD, deixando este enfoque ao alcance da
comunidade acadêmica de diferentes áreas, famílias e usuários. Esperamos
que se reverta em contribuição para o que consideramos essencial em todos os
atendimentos educativos para as pessoas com cegueira e/ou com outras
deficiências: a inclusão social.
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