Psicanálise e Técnicas de Abordagem Comunitária

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Psicanálise e Técnicas de

Abordagem Comunitária
Prof.ª Maria Clara Alves de Barcellos Fernandes

Indaial – 2021
1a Edição
Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:
Prof.ª Maria Clara Alves de Barcellos Fernandes

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

F363p

Fernandes, Maria Clara Alves de Barcello

Psicanálise e técnicas de abordagem comunitária. / Maria Clara


Alves de Barcellos Fernandes – Indaial: UNIASSELVI, 2021.

154 p.; il.

ISBN 978-65-5663-901-7
ISBN Digital 978-65-5663-902-4

1. Psicologia institucional. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo


da Vinci.

CDD 150

Impresso por:
Apresentação
Seja bem-vindo ao Livro Didático Psicanálise e Técnicas de
Abordagem Comunitária. Ao inaugurar um novo momento de estudo
com uma disciplina nova, muitas vezes os estudantes se perguntam sobre
a relevância de determinados assuntos para a sua formação e para a vida
prática. Nossa conversa se inicia, então, com um pensamento de Bleger
(1980), o qual defende que todo ser humano tem algo a ensinar, além de dizer
que toda experiência pode ser convertida em ensino. Assim, explicitamos a
importância deste conteúdo inserido na grade curricular da psicologia.

O psiquiatra e pesquisador argentino José Bleger é autor de um livro


importantíssimo para a psicologia institucional, no qual aborda, com muita
sutileza, a sua forma de enxergar a capacidade que temos de ensinar e aprender
uns com os outros. Estamos constantemente ensinando e aprendendo a partir
dos nossos encontros com pessoas, livros, objetos, música, cursos etc. Por
este motivo, não estamos nunca terminados, há sempre algo que podemos
partilhar com o outro e receber dele.

Para entender um pouco mais sobre os processos que fazem parte da


nossa composição como seres humanos, é importante ter acesso ao percurso
de pesquisa dos diferentes autores que se debruçaram sobre a temática
das instituições, das grupalidades, principalmente no que diz respeito à
psicologia institucional e à sua contribuição para a transformação dos nossos
modos de ver e pensar o mundo e as forças que nos constituem.

Como pensar a partir da premissa de Bleger, de que podemos sempre


enriquecer mais e mais a nossa vida com as trocas, se estivermos com o pote
cheio de saberes, sem estarmos dispostos a pensar e repensar as nossas
certezas absolutas?

O estudo sobre as instituições e grupos, bem como de seu aparato


histórico, são essenciais para as práticas dos psicólogos, e esse é o conteúdo
que teremos aqui.

Na Unidade 1, veremos a relação entre psicologia e instituição,


conhecendo os diferentes conceitos de “instituição” e suas abordagens a
partir de diferentes teóricos.

Já na Unidade 2, problematizaremos as instituições hospitalares,


educacionais e de trabalho, descobrindo as formas de atuação do profissional
da psicologia nesses espaços, bem como entendendo as propostas dessa
corrente.
Por fim, na Unidade 3, falaremos sobre a psicologia comunitária,
estudando sua origem e história e suas contribuições para a prática do
psicólogo. Identificaremos, então, os principais conceitos da psicanálise
utilizados e sua aplicabilidade prática.

Bons estudos!
Prof.ª Maria Clara Alves de Barcellos Fernandes

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!
LEMBRETE

Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela


um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro


que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá
contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares,
entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


Sumário
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO............................................................................. 1

TÓPICO 1 — O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?............................................. 3


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................................... 3
2 A DIFERENÇA ENTRE PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E PSICOLOGIA
NA INSTITUIÇÃO............................................................................................................................... 3
2.1 INSTITUIÇÕES E SUA ESTRUTURA SOCIAL ......................................................................... 5
2.2 O PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO........................................................................... 7
2.3 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL E SUA INTERVENÇÃO CLÍNICA................... 8
3 PSICOLOGIA NA INSTITUIÇÃO................................................................................................. 10
3.1 A CLÍNICA NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES .............................................................. 11
3.2 A PSICOLOGIA NAS ORGANIZAÇÕES.................................................................................. 12
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 13
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 14

TÓPICO 2 — PSICOLOGIA INSTITUCIONAL............................................................................. 17


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 17
2 A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL: DEFINIÇÃO E MODELOS TEÓRICOS..................... 17
2.1 DEFINIÇÃO DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL................................................................. 19
2.2 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL DE BLEGER................................ 19
2.3 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E PSICANÁLISE................................................................. 20
3 O PAPEL E A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO INSTITUCIONAL ............................................. 20
3.1 O TRABALHO DO PSICÓLOGO INSTITUCIONAL.............................................................. 21
3.1.1 Ser humano visto como ser biopsicosocial........................................................................ 22
3.2 PSICOHIGIENE, PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E A MONTAGEM DE UM
CAMPO DE TRABALHO............................................................................................................. 23
3.3 MÉTODO DE TRABALHO DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL........................................ 24
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 27
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 28

TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO........................................................................................... 31


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 31
2 AS INSTITUIÇÕES, AS ORGANIZAÇÕES, OS GRUPOS E O PAPEL DE CADA
UM PARA AS INSTITUIÇÕES........................................................................................................ 31
2.1 A RELEVÂNCIA DA PESQUISA SOBRE GRUPOS NA PSICOLOGIA............................... 32
2.2 JOSÉ BLEGER E OS GRUPOS...................................................................................................... 34
2.3 KURT LEWIN E O COGNITIVISMO......................................................................................... 35
2.3.1 A teoria de campo de Lewin............................................................................................... 36
3 WILFRED BION E ENRIQUE PICHON-RIVIÈRE...................................................................... 38
3.1 BION E OS GRUPOS TERAPÊUTICOS..................................................................................... 38
3.1.1 Grupo Terapêutico................................................................................................................ 40
3.2 PICHON-RIVIÈRE E OS GRUPOS OPERATIVOS................................................................... 40
3.3 O PROCESSO GRUPAL................................................................................................................ 42
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 44
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 48
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 49

REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 51

UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES,


EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO.............................................. 53

TÓPICO 1 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


HOSPITALARES........................................................................................................... 55
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 55
2 O TRABALHO DO PSICÓLOGO NA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR.................................. 55
2.1 O AMBIENTE HOSPITALAR E O TRABALHO DO PSICÓLOGO....................................... 56
2.2 LIMITES DO TRABALHO DE UM PSICÓLOGO HOSPITALAR A PARTIR DA
PSICOLOGIA INSTITUCIONAL................................................................................................ 58
2.3 POSSIBILIDADES DO TRABALHO DE UM PSICÓLOGO HOSPITALAR A PARTIR
DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL......................................................................................... 60
3 DESAFIOS E PROBLEMATIZAÇÕES DA ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO
HOSPITALAR..................................................................................................................................... 61
3.1 DESAFIOS DO TRABALHO DO PSICÓLOGO EM AMBIENTE HOSPITALAR........................ 61
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 64
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 65

TÓPICO 2 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


EDUCACIONAIS......................................................................................................... 67
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 67
2 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL AO UNIVERSO ESCOLAR.......... 67
2.1 ANÁLISE DA ESCOLA PELA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL.......................................... 69
2.2 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E SUAS CONTRIBUIÇÕES PARA O UNIVERSO
ESCOLAR . ..................................................................................................................................... 71
2.3 GRUPOS OPERATIVOS NAS ESCOLAS................................................................................... 72
3 O PAPEL DO PSICÓLOGO AO INTERVIR NA ESCOLA........................................................ 74
3.1 DEMANDAS ESCOLARES AOS PSICÓLOGOS...................................................................... 74
3.2 A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL FRENTE ÀS DEMANDAS ESCOLARES ................... 75
3.3 O PSICÓLOGO CLÍNICO E A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL.......................................... 77
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 80
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 81

TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO


DAS INSTITUIÇÕES................................................................................................... 83
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 83
2 MARLENE GUIRADO E A ANÁLISE INSTITUCIONAL DE UM CASO DE
PSICODIAGNÓSTICO .................................................................................................................... 83
2.1 TODO PSICODIAGNÓSTICO É UM ESTUDO INSTITUCIONAL . .................................... 84
2.2 A PSICOLOGIA VIÁVEL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES.................... 86
2.3 A DIMENSÃO INSTITUCIONAL DA PRÁTICA DO PSICÓLOGO..................................... 86
3 ANÁLISE DO DISCURSO A PARTIR DE FREUD E FOUCAULT .......................................... 88
3.1 FOUCAULT E O DISCURSO....................................................................................................... 89
3.2 FREUD E O DISCURSO................................................................................................................ 91
3.3 A TRANSFERÊNCIA E AS INSTITUIÇÕES.............................................................................. 91
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 94
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 97
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 98

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 100

UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA......................................................................... 103

TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA........................................................ 105


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 105
2 O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA.............................................................................. 105
2.1 HISTÓRIA E CONCEITUAÇÃO DE COMUNIDADE.......................................................... 106
2.2 COMUNIDADE ONTEM E HOJE............................................................................................ 108
2.3 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA.................................................................... 110
3 FORMAÇÃO E PRÁTICA DO PSICÓLOGO NA COMUNIDADE...................................... 112
3.1 COMUNIDADE COMO INSTRUMENTO TEÓRICO DA PSICOLOGIA . ....................... 112
3.2 A PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA......................................... 114
3.3 EXPERIÊNCIAS COMUNITÁRIAS FORMALIZADAS EM GRUPOS............................... 115
RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 117
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 118

TÓPICO 2 — CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL........................................ 121


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 121
2 O MOVIMENTO DA ANÁLISE INSTITUCIONAL................................................................. 122
2.1 O MOVIMENTO INSTITUCIONALISTA................................................................................ 123
2.2 PRINCIPAIS CONCEITOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL.............................................. 124
2.3 ANÁLISE INSTITUCIONAL NO BRASIL............................................................................... 125
3 PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO .............................................................................................. 127
3.1 NOÇÃO DE SUBJETIVIDADE.................................................................................................. 127
3.2 MODOS DE SUBJETIVAÇÃO . ................................................................................................. 128
3.3 SUBJETIVIDADE E O PROCESSO GRUPAL.......................................................................... 129
RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 131
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 132

TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO


PSICANALÍTICO....................................................................................................... 135
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................. 135
2 TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA ................................................................. 135
2.1 TRANSFERÊNCIA FREUDIANA E SEUS IMPASSES PARA A PSICOLOGIA
INSTITUCIONAL ....................................................................................................................... 137
2.2 CONCEITOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL E A SUA RELAÇÃO COM A
TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA.................................................................... 138
2.2.1 Análise de Implicação, transferência e contratransferência.......................................... 140
2.3 PSICOTERAPIA INSTITUCIONAL EM RELAÇÃO AOS CONCEITOS DE
TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA............................................................... 141
3 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E SEUS PROCESSOS............................................ 142
3.1 QUEM É O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO.................................................................. 143
3.2 HISTÓRIA DO SURGIMENTO DA FUNÇÃO ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO......... 144
3.3 PAPEL DO ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO.................................................................. 146
LEITURA COMPLEMENTAR........................................................................................................... 147
RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 150
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................. 151

REFERÊNCIAS..................................................................................................................................... 153
UNIDADE 1 —

PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

● entender os diferentes conceitos de instituição;

● compreender a diferença entre psicologia institucional e psicologia na


instituição;

● compreender as contribuições de diferentes teóricos para a psicologia


institucional;

● discutir sobre as diferentes formas de conceber o trabalho de grupo nas


instituições.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

TÓPICO 2 – PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

TÓPICO 3 – GRUPO E INSTITUIÇÃO

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

1
2
TÓPICO 1 —
UNIDADE 1

O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, abordaremos a psicologia em sua relação com
o nome instituição. Veremos que o significado de instituição, para a psicologia
institucional, ganha uma acepção diferente da que temos usualmente. Para tanto,
a fim de não haver confusão, precisaremos entrar em contato com os possíveis
entendimentos de instituição dentro da psicologia de um modo geral.

Com essa distinção, conseguiremos fazer a diferenciação entre a psicologia


institucional e a psicologia na instituição.

Falaremos, por fim, sobre o trabalho do psicólogo na instituição. Acompanhe!


2 A DIFERENÇA ENTRE PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E


PSICOLOGIA NA INSTITUIÇÃO
Ao nos depararmos com o termo “instituição”, logo nos vem à mente algo
identificado a um prédio, um estabelecimento ou uma organização. Porém, tanto
determinados campos das ciências sociais, quanto da psicanálise e até mesmo
ramos da psicologia se utilizam dessa significação comum.

Ao dizermos, por exemplo, “eu trabalho em uma instituição”, a palavra


“instituição” nos remete a um espaço físico, um prédio em que o profissional atua,
tal qual nos mostra a figura 1. Pensando objetivamente, todos nós trabalhamos
em alguma instituição, seja ela empresa, hospital, escola, consultório ou qualquer
outro prédio.

3
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 1 – INSTITUIÇÕES COMO PRÉDIOS

FONTE: <https://shutr.bz/3FunshN>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Já para José Bleger (1981), psiquiatra argentino de abordagem psicanalítica


e fundador da psicologia institucional, o conceito de instituição é: um grupo
originado de negociações que se fazem entre as organizações e as pessoas que
compõem essas organizações. Ele toma a instituição como uma totalidade, e tudo
aquilo que perpassa e compõe as instituições é alvo de intervenção.

E
IMPORTANT

A diferenciação entre instituição e organização é muito importante para o


entendimento da perspectiva apresentada pela psicologia institucional. Assim, a instituição
irá se referir a um conjunto de normas, leis e práticas instituídas que são reificadas, e a
organização equivalerá a prédios, estabelecimentos.

Bleger faz questão de diferenciar o trabalho do psicólogo nas instituições,


cujo objetivo não é avaliar as relações que as atravessam e as estruturam, do
trabalho do psicólogo institucional, muito baseado na diferenciação do conceito
de instituição.

O movimento da Análise Institucional encabeçado pelo psicólogo de


formação Georges Lapassade (1977) compreende a instituição de uma maneira
diferente das caracterizadas anteriormente. Ele toma a instituição não como algo
observável, mas como uma dinâmica, como os movimentos dialéticos que vão se
fazendo na história, com o tempo.

4
TÓPICO 1 — O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

De acordo com Bock et al. (2003), a instituição é um valor ou regramento


social, reeditado no dia a dia, com efeito de verdade, que vai funcionar como
um modelo de condução para os grupos. Instituição, então, nessa perspectiva,
são práticas de fabricação de realidades que ganham estatutos de verdade e que
vão sendo reproduzidas, mas que, muitas vezes, passam despercebidas no nosso
cotidiano, embora estejam nele, produzindo modos de ver e agir.

TUROS
ESTUDOS FU

Mais adiante, a partir da explicação sobre a psicologia institucional, o conceito


de instituição ficará ainda mais claro. Não deixe de acompanhar.

Para os teóricos da Análise Institucional, por exemplo, a Igreja Católica


pode ser considerada uma instituição, não como um prédio físico, mas como algo
que foi sendo construído ao longo do tempo e das mudanças históricas a partir de
práticas, concepções e modos de ver o mundo que interferiram e ainda interferem
na forma como as sociedades vão se engendrando.

Assim também é a instituição “Psicologia”, aquela que, como a Igreja


Católica, fabrica modos de se relacionar, modos de ver o homem e de produzir
diferentes realidades.

2.1 INSTITUIÇÕES E SUA ESTRUTURA SOCIAL


Para que possamos entender melhor a conceituação de instituição, não
como estabelecimento, mas enquanto práticas (conjunto de leis, regras, normas,
modos de ver), iremos inseri-la em uma estruturação social, ou seja, ver como ela
nos estrutura, bem como nossa vida em sociedade.

As instituições, compreendidas como um apanhado de formações sócio-


históricas constituídas pela sociedade, participam tanto do nosso cotidiano
que produzem a ideia de que sempre estiveram e estarão presentes. Desde que
nascemos, estamos mergulhados num conjunto de regras e códigos de conduta
constituídos por um grupo, em certa cultura. Não se sabe muito acerca da origem
desses preceitos instituídos e pouco se quer saber sobre isso: “sempre foi assim”.

Os indivíduos são, portanto, ensinados por essas regras e constituídos em


meio a elas, ou seja, são formados por essas instituições. Como exemplo, podemos
citar a instituição família (Figura 2). Nascemos num determinado núcleo familiar,
com seus ritos e normas, e somos educados a partir dela.

5
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 2 – INSTITUIÇÃO FAMÍLIA

FONTE: <https://shutr.bz/3uQwIbe>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Dessa forma, as instituições são tidas como inerentes à nossa vida, fazendo
parte do modo de agir natural do homem. As nossas vidas estão tão entrelaçadas
às instituições que é difícil pensar como seria sem elas.

UNI

Referir-se à família como uma instituição significa dizer que existe uma
determinada organização social que faz com que esse modo de agrupamento entre as
pessoas seja considerado normal através dos anos, sem ser questionada, tornando-se uma
tradição, uma formação a ser repetida pelas pessoas.

O mundo social é entendido pelo indivíduo como se sempre estivesse


aí, pois o sujeito se introduz em um mundo já estruturado, com uma vida
sociocultural pré-determinada e pré-sistematizada, cujo arranjo é um efeito
de processos históricos em cada sociedade. Assim, conseguimos entendendo a
existência de diferentes culturas e modos de organização da sociedade.

Logo que nasce, o sujeito é lançado no mundo e vai montando a sua


vivência subjetiva a partir das diferentes instituições que o atravessam. A partir
dessas experiências, a pessoa irá tentar ler o mundo utilizando lentes históricas,
culturais, familiares, econômicas, entre outras, e seguir configurando a sua
história.

Schultz e Schultz (2005) vão dizer que toda nossa leitura de mundo
se funda num reservatório de experiências precedentes a nós, nas próprias
vivências individuais e naquelas que nos foram transmitidas. Todo esse saber
virará um código de referências, a partir do qual olharemos o mundo. Os
6
TÓPICO 1 — O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

dados e compreensões passados pela cultura e pelo social a nós serão tidos
como verdadeiros na medida em que já se provaram eficientes para o viver em
conjunto. Os modos de ver são instituídos pela repetição, não necessariamente
questionados e, então, pela sua consequente naturalização. É dessa maneira que
se estrutura a formação social das instituições.

2.2 O PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAÇÃO



O processo de institucionalização de regramentos e tradições que formam
os nossos modos de olhar o mundo se inicia com a determinação de regularidades
comportamentais. Os sujeitos irão, pouco a pouco, percebendo maneiras mais
aceleradas, econômicas e fáceis de executar as tarefas do dia a dia.

Vamos pensar no homem primata, no ponto em que ele conseguiu obter


a noção da realidade ao redor. As repetições foram formando aprendizados e
criando maneiras mais simples de executar suas atividades. Desse aprendizado,
vieram as regularidades. Podemos dizer, então, que as regularidades formaram
um hábito e o hábito, a partir da passagem do tempo e das gerações, se transforma
em tradições.

Essas formações, pelo fato de já terem sido comprovadas como eficazes,


vão sendo incorporadas na cultura e não mais questionadas, apenas repetidas.
Quando se passa muito tempo e se perde a referência de onde veio determinada
prática que segue sendo repetida, podemos dizer que houve um processo de
institucionalização.

Podemos ilustrar esse processo de institucionalização com o exemplo


da educação em um processo escolar. Todos nós já temos como premissa que a
educação é fundamental para o desenvolvimento de um ser humano.

No Brasil e em outros lugares do mundo, esse processo educacional se


dá, em geral, a partir da inserção dos sujeitos nas escolas e por um processo de
etarização das séries (em que cada idade de um aluno corresponde a uma série
determinada) em um formato curricular; a disposição das cadeiras e dos alunos
em sala de aula também é algo que pouco se modifica e se questiona, ou seja, está
naturalizado ou institucionalizado.

7
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 3 – INSTITUIÇÃO ESCOLA

FONTE: <https://shutr.bz/3iJyuG5>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Ainda assim, existem escolas que fogem da etarização, propondo outra


dinâmica de ensino e outra configuração curricular, ou até mesmo os homeschooling
(que é a proposta de ensino doméstico ou domiciliar), mostrando que existem
possibilidades de questionar os modelos educacionais aos quais estamos tão
acostumados, embora vejamos que não sejam tão mais eficazes assim (BOCK et
al., 2003).

ATENCAO

A configuração de escola pelo modelo de etarização é aquela na qual os


alunos com a mesma idade ou idade próxima são separados em uma mesma série. É o
modelo mais comum, embora não seja o único.

Continue acompanhando nosso estudo!

2.3 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA NO BRASIL E SUA


INTERVENÇÃO CLÍNICA
Para chegarmos ao início do trabalho do psicólogo em instituições
(hospitais, empresas, justiça, entre outros) passaremos antes pela entrada da
psicologia reconhecida como profissão no Brasil.

A psicologia foi primeiramente legitimada em nosso país como saber a


partir de sua versão clínica no século XX. Durante um bom tempo, o que mais
se produzia em termos de conhecimento era a atuação clínica do psicólogo. Essa
8
TÓPICO 1 — O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

vertente clínica da psicologia à época foi acentuada a partir dos conhecimentos


psicológicos que eram produzidos pela medicina, ciência já reconhecida e
legitimada naquele século. De acordo com Jacó-Vilela (2012), foi a partir da
medicina que se deu a estruturação da psicologia como ciência e como profissão
em terras brasileiras.

Nesse momento, a psicologia vai se interessar pela produção do


psicodiagnóstico infantil, orientação de pais e utilização de testes psicológicos.
Essa perspectiva de focar mais no indivíduo tem a sua raiz na Europa do século
XVIII, com o Romantismo, ilustrado na Figura 4 – um movimento artístico,
político e filosófico que enalteceu os valores da individualidade ao reforçar o culto
ao “eu”. Com isso, introduziu-se, em uma psiquiatria que tinha uma abordagem
puramente mecanicista e organicista, um modo de ver o ser humano de modo
mais complexo e psicológico.

O encontro da medicina com a filosofia, o surgimento das ideias de


Sigmund Freud (médico psiquiatra e fundador da psicanálise) e o pioneirismo
de Philipe Pinel no tratamento humanizado da loucura institucionalizada em
manicômios fez com que a psiquiatra abrisse os olhos para a dimensão psicológica
do ser humano, não sendo mais puramente organicista.

FIGURA 4 – O MOVIMENTO ROMANTISMO

FONTE: <https://shutr.bz/3FEaMoT>. Acesso em: 13 jul. 2021.

A psicologia brasileira, sobretudo em seu início, foi herdeira desses


movimentos no mundo todo até a sua regulamentação como profissão, no século
XX. Para ser reconhecida pelas demais ciências e pela sociedade como saber
respeitável, precisava acompanhar uma determinada cartilha exigida naquele
tempo: seguir na esteira da medicina, da higiene social e da clínica, numa
proposta mais individualizante, em que o sujeito era foco de intervenção.

9
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 5 – ATENDIMENTO PSICOLÓGICO CLÍNICO

FONTE: <https://shutr.bz/3llxfyC Acesso em: 13 jul. 2021.

NTE
INTERESSA

A psicologia clínica, ilustrada na Figura 5, foi a área de atuação mais investida


no início da regulamentação da psicologia como ciência e profissão no Brasil em 1964: a
psicologia dos atendimentos clínicos individuais e da avaliação diagnóstica infantil.

No entanto, havia dissidências e movimentos que procuravam questionar


esse modo de atuação da psicologia, pensando que ela própria deveria ser tomada
como instituição, na medida em que institucionalizavam determinadas maneiras
de concebê-la e de intervir a partir dela. É o que trabalharemos mais adiante.

3 PSICOLOGIA NA INSTITUIÇÃO
Você deve estar talvez se perguntando: como atua o psicólogo que
está dentro de uma instituição compreendida como estabelecimento? Qual é
a diferença de atuação de um psicólogo institucional para um psicólogo que
trabalha nas instituições?

Aqui traremos alguns exemplos de atuação do psicólogo nas instituições,


compreendidas enquanto estabelecimentos, e que não seguem a via da psicologia
institucional, posto que não trabalham com a noção de instituição como práticas
naturalizadas e intervêm para modificá-las.

10
TÓPICO 1 — O QUE É A INSTITUIÇÃO PARA A PSICOLOGIA?

3.1 A CLÍNICA NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES


A psicologia clínica tradicional é um modelo de cuidado e de trabalho do
psicólogo com enfoque nas questões do indivíduo, com o mapeamento diagnóstico
e a resolução dos conflitos do sujeito, muitas vezes, sem alianças multidisciplinares
ou multiprofissionais, ou seja, sem a participação coletiva de profissionais de
diferentes áreas. Como exemplo, temos: a atividade psicodiagnóstica e a terapia
individual ou grupal com foco nos processos psicológicos e psicossomáticos
daquele sujeito que procura a clínica.

Mediante a urgência diante do sofrimento do paciente em ambiente


hospitalar, fez-se a necessidade da presença do psicólogo nesse território, numa
intervenção também clínica, porém em uma instituição. Sabe-se que muitas
doenças físicas têm o seu quadro agravado a partir do fato, por exemplo, de o
paciente não saber lidar com um determinado diagnóstico.

Portanto, o objetivo do psicólogo em instituição hospitalar é minimizar


o sofrimento, proporcionar bem-estar e encontrar soluções de questões
psicossomáticas para que estas não exacerbem o quadro fisiológico do paciente,
tal como mostrado na Figura 6.

FIGURA 6 – PACIENTE INTERNADO EM SOFRIMENTO PSICOLÓGICO

FONTE: <https://shutr.bz/3oJvHkj>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Quando o psicólogo se propõe a trabalhar na perspectiva da psicologia


institucional no hospital, por exemplo, sua proposta de intervenção será também
a análise das instituições que perpassam aquele sujeito enfermo: como as práticas
hospitalares interferem na cronificação daquele paciente e o que o psicólogo
pode trazer para que os demais profissionais possam pensar em suas práticas
e a consequente mudança delas. Assim, é a instituição que vira o paciente do
psicólogo institucional.

11
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

3.2 A PSICOLOGIA NAS ORGANIZAÇÕES


A psicologia organizacional nas empresas tem como mote a melhoria
do espaço de trabalho e a compreensão de situações relacionadas à vida do
profissional que ali trabalha, tanto em âmbito profissional quanto pessoal,
buscando trazer bem-estar para o ambiente de trabalho.

Por meio da psicologia das organizações, é possível realizar os


procedimentos de recrutamento e seleção, treinamentos de pessoal, análise do
clima organizacional, além de dirimir conflitos entre os profissionais e organizar
dinâmicas de grupo com objetivos definidos pela empresa, para trabalhar algum
aspecto relacional e psicológico.

O psicólogo, neste território, tem por objetivo conscientizar os funcionários


sobre o seu papel na empresa, levando em conta a saúde e a subjetividade dos
mesmos, bem como o melhor desenvolvimento da empresa. As práticas que o
psicólogo executa ali são instrumentalizadas por teorias e técnicas próprias
da psicologia organizacional ou psicologia do trabalho, que visam atingir um
melhor resultado para o empregado e a empresa (ZANELLI et al., 2010).

FIGURA 7 – PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL

FONTE: <https://shutr.bz/3Dnd8Xc>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Analisando a proposta da psicologia das organizações, percebe-se que a


instituição, muitas vezes, permanece intacta de análises por parte do psicólogo.
Coloca-se mais por uma perspectiva adaptativa do trabalhador do que questionar
as lógicas de funcionamento da empresa e como ela pode produzir práticas
adoecedoras nele, tal como propõe a psicologia institucional. Daí, verificamos a
diferença entre um psicólogo que trabalha em uma instituição e o que psicólogo
que trabalha em uma instituição seguindo a orientação da psicologia institucional.

12
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

● É preciso saber diferenciar os conceitos de instituição utilizados pela


psicologia.

● Trabalhar como psicólogo em instituições não significa necessariamente


trabalhar com a perspectiva da psicologia institucional.

● É necessário conhecer como se dão os processos de institucionalização de


práticas.

● O trabalho do psicólogo em organizações pode se utilizar de outras vertentes


da psicologia.

13
AUTOATIVIDADE

1 Existem algumas definições existentes de instituição para a psicologia de


modo geral. Com base nessas definições, assinale a alternativa CORRETA que
corresponde à definição retratada pela Psicologia Institucional de José Bleger.

a) ( ) O conceito de instituição utilizado pela Psicologia Institucional de


José Bleger é aquele que se refere à instituição como um prédio ou
estabelecimento no qual as pessoas trabalham.
b) ( ) O conceito de instituição utilizado pela Psicologia Institucional de
José Bleger corresponde ao entendimento de um grupo que tem sua
origem a partir de negociações que se realizam entre as organizações e
as pessoas que fazem parte dessas organizações.
c) ( ) O conceito de instituição utilizado pela Psicologia Institucional de José
Bleger toma a instituição como uma pequena parte do estabelecimento,
e essa parte é o foco de intervenção.
d) ( ) O conceito de instituição utilizado pela Psicologia Institucional de José
Bleger compreende que a instituição não é algo observável, mas uma
dinâmica, com atividades dialéticas que vão se compondo na história
com o tempo.

2 Para que se entenda melhor a complexidade do conceito de instituição para


a Psicologia Institucional, é importante ter acesso ao modo como ela se
forma na nossa sociedade e os impactos que produz em nossa constituição.
Por exemplo, a família pode ser considerada uma instituição, bem como a
Igreja, o casamento, a educação, entre outros. Com base nesses exemplos
sobre a estrutura social das instituições, analise as sentenças a seguir:

I- As instituições, tais como elas se encontram no mundo, sempre existiram,


independentemente de contexto histórico e cultural.
II- Assim que nascemos, somos inseridos em um universo de regras e códigos
de conduta, formados por um grupo em certa cultura.
III- Toda nossa perspectiva de mundo está atravessada por um estoque de
experiências anteriores a nós, nossas vivências individuais e aquelas
que nos foram ensinadas. Todo esse conhecimento se transformará em
um ponto de referência a partir do qual julgamos o nosso universo. Os
conhecimentos transmitidos a nós pela cultura e pelo social corresponderão
a uma verdade no ponto em que eles já mostraram ser eficazes para o
viver em sociedade. A nossa maneira de olhar, então, é instituída pela
repetição, e por não serem questionadas, acabam sendo naturalizadas.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.
14
3 No Brasil, nem sempre a Psicologia se fez presente como atuação profissional
dentro das instituições. Olhando para a história da Psicologia no Brasil e a
sua regulamentação profissional, conseguimos visualizar os motivos. De
acordo com a história da inserção e da posterior regulamentação profissional
desta área em nosso país, classifique V para as sentenças verdadeiras e F
para as falsas:

( ) A Psicologia foi inicialmente reconhecida no Brasil como saber científico


a partir de sua vertente clínica, no século XX. Ao longo de um tempo, o
que mais se pesquisava era a atuação clínica do psicólogo.
( ) O ramo da clínica da Psicologia no início do século XX foi introduzido a
partir dos fundamentos psicológicos que eram produzidos pela sociologia,
ciência já reconhecida e legitimada naquele século.
( ) A psicologia brasileira, em seu início, é herdeira dos movimentos do
Romantismo, do tratamento humanizado do psiquiatra Philipe Pinel
dado aos pacientes psiquiátricos institucionalizados e de Sigmund Freud
e suas descobertas sobre o campo psíquico, até a sua regulamentação
como profissão no século XX.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Os estudiosos e formuladores da Psicologia Institucional fazem questão de


deixar marcada a diferença entre a Psicologia Institucional e a Psicologia
nas instituições. Cada uma destas terá um modo de conceber instituição
e se utilizarão de teorias próprias a cada abordagem do profissional ali
inserido. Disserte sobre a atuação do psicólogo na clínica hospitalar.

5 Os estudiosos e formuladores da Psicologia Institucional fazem questão de


deixar marcada a diferença entre a Psicologia Institucional e a Psicologia
nas instituições. Cada uma destas terá um modo de conceber instituição
e se utilizarão de teorias próprias a cada abordagem do profissional ali
inserido. Disserte sobre a atuação do psicólogo organizacional.

15
16
TÓPICO 2 —
UNIDADE 1

PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 2, trabalharemos mais detidamente acerca da
psicologia institucional, sua história, sua proposta, seus principais teóricos e a
atuação do psicólogo seguindo essa proposta de trabalho.

A partir da definição de instituição, colocando a diferenciação entre a


psicologia nas instituições, aquela que se faz dentro de um estabelecimento, e a
psicologia que investe na concepção de instituição como leis, regulamentos, normas,
práticas institucionalizadas que perpassam os sujeitos e, portanto, as relações.

É por essa última definição que iremos operar daqui em diante. Isso
significa que um psicólogo pode trabalhar em um estabelecimento e utilizar o
modo de fazer psicologia pela psicologia institucional ou se utilizar de uma outra
proposta de trabalho.

2 A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL: DEFINIÇÃO E MODELOS


TEÓRICOS
Nas décadas de 1970 e 1980, começou a se tornar necessidade pensar uma
psicologia que pudesse ir além dos ambientes nos quais ela já estava acostumada
a atuar, a saber: os estudos em laboratórios, o psicodiagnóstico, as diferentes
psicoterapias, o recrutamento, a seleção e o treinamento de pessoal.

Embora a conformação da psicologia em ciência e saber regulamentado,


em seus primórdios, na década de 1960, tenha tido como origem a perspectiva
mais clínica, individualizante e adaptativa dos sujeitos, existia uma vontade de
que a psicologia pudesse participar mais ativamente das ações políticas, dos
movimentos sociais e comunitários.

Foi nesse breve contexto histórico que se começou a pensar que a


psicologia poderia se estender para as áreas de saúde, educação e promoção
social. E, assim, estar presente em instituições, entendidas, no momento, como
organizações (GUIRADO, 2009).

17
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

Guirado (2009) relata que em 1982, o governo do Estado de São Paulo


abriu edital de concurso público para o trabalho de psicólogo em diferentes
instituições. A partir do instante em que o psicólogo começa a trabalhar em uma
instituição, ele entra em contato com diferentes outras profissões e modelos
teóricos de supervisão. A autora precisa que é a partir desse encontro que os
psicólogos brasileiros entram em contato com sociopsicanalistas, psicólogos
institucionais e analistas institucionais advindos de diversos lugares do país e
do mundo.

FIGURA 8 – CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL (CAPS)

FONTE: <https://bit.ly/3aiD3CL>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Desse caldo, a proposta da psicologia institucional e da análise institucional


passam a compor a perspectiva de trabalho de alguns psicólogos.

ATENCAO

O Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) (Figura 8) é um dispositivo da saúde


mental para tratamento e reinserção social de pessoas com transtorno mental grave
e persistente criado em 1987 e foi uma das instituições cujo concurso público abarcou
a profissão de psicólogo em seu edital, abrindo margem para o trabalho da psicologia
institucional nesses espaços.

Como psicólogos, não podemos ficar indiferentes aos efeitos que


nossas intervenções produzem, sejam eles em que espaço forem. Dessa forma,
não podemos nos isentar do nosso papel político e social, descolando a nossa
profissão do mundo. E é nesse viés que a psicologia institucional trabalha.

18
TÓPICO 2 — PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

2.1 DEFINIÇÃO DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL


Psicologia Institucional é uma nomenclatura criada por José Bleger,
psiquiatra argentino de abordagem psicanalítica. Bleger (1981) acreditava que era
importante a interconexão entre a psicanálise e o marxismo como contribuição
à psicologia para além das psicoterapias e consultorias. Foi em 1970 que seus
escritos aportaram aqui no Brasil, driblando o período conturbado de censura
que vivíamos.

Bleger (1981) definia a sua psicologia institucional como sendo uma


dinâmica de investigação e ação em que o modo de fazer se dá pela indagação
operativa como ferramenta básica de pesquisa. Seria, então, uma proposta de
intervenção psicológica com significado social, numa correlação com psicanálise
e política – política entendida por ele como relações de poder que intervêm na
vida dos grupos e das classes sociais.

É por meio da função social do psicólogo que este irá se propor a trabalhar
as tarefas diárias de um grupo, trazendo seu bem-estar (psicohigiene): manejar as
relações interpessoais e o desenvolvimento do grupo.

2.2 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL DE


BLEGER
A grande contribuição do trabalho de Bleger para a psicologia foi tomar a
instituição como foco de intervenção, como uma totalidade. O seu manejo seguia
pela ótica da psicologia como significação social e, por meio dela, implementar o
trabalho preventivo de promoção de bem-estar.

Bleger (1981) trouxe a possibilidade do psicólogo de se pensar como um


grande agente de mudanças nas relações sociais. Por meio da junção entre a
problematização, a interpretação e a ação, a sua orientação de trabalho para o
psicólogo visava a ressignificação dos discursos e práticas que permeiam o dia
a dia das instituições, fazendo com que pudessem mexer em algumas estruturas
já adoecedoras do ambiente de trabalho, mas que permaneciam inquestionadas.

Como já dissemos, a tendência das práticas nos estabelecimentos é


se cristalizarem, não mudarem – a modificação de uma instituição passa pela
mudança nos sujeitos que a compõem. O autor, assim, irá propor que os sujeitos
possam investir em si, no seu conhecimento próprio, no do outro e no da
instituição para que se efetive a mudança, cuja finalidade sempre será o bem-
estar das pessoas e da sociedade como um todo.

Outro grande reforço de Bleger (1987) foi na operacionalização do trabalho


em grupo, que veremos mais minuciosamente adiante.

19
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

2.3 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E PSICANÁLISE


Operar com a psicologia institucional de José Bleger (1984) é trabalhar
com a psicanálise, mais especificamente a psicanálise inglesa.

Em seu livro Psicohigiene e Psicologia Institucional (1984), Bleger vai enfatizar


a importância do trabalho do psicólogo por meio dos grupos, seguindo desde a
relação direta com o cliente até a direção, e se utilizará do enfoque da clínica
psicanalítica para sustentar este trabalho.

O psiquiatra vai, dessa maneira, compreender as relações interpessoais


por meio da simbiose e ambiguidade nos vínculos, estando estas relacionadas
e estruturadas a partir da teorização da psicanalista inglesa Melanie Klein, que
fala sobre as posições nas relações de objeto. Essa simbiose e ambiguidade dos
vínculos estaria remetida na psicanálise à posição dupla que o indivíduo se coloca
nas relações, tanto como objeto quanto como sujeito. O que não tem a ver, por
exemplo, com o conceito de narcisismo de Sigmund Freud (TORRES et al., 2018).

Sendo assim, se alguém afirma estar trabalhando com a psicologia


institucional segundo o modelo teórico de Bleger, essa pessoa se comprometerá
em operar pela compreensão de que a instituição e as suas relações são o seu
campo de intervenção e, ao mesmo tempo, tendo a psicanálise de escola inglesa
como aporte teórico. Interpretações ou intervenções realizadas por essa ótica de
compreensão das instituições vão configurar sua introdução nos grupos e o seu
próprio agir.

3 O PAPEL E A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO INSTITUCIONAL


O psicólogo institucional, ao começar a trabalhar em um estabelecimento,
vai se encontrar com o mundo institucional e todas as peças que o compõem,
sejam elas: o grupo de trabalho, o paciente-instituição e as diversas inconstâncias
que o fazem reanalisar sua função, suas estratégias e foco de intervenção.

A instituição para a psicologia institucional não é algo apreensível, é um


organismo vivo, que sofre mutações de acordo com as dinâmicas relacionais
ali presentes. Algumas agem para conservar o estado de coisas e outras para
modificar algumas práticas institucionalizadas.

Escutar os relatos dos sujeitos, operar com os grupos, mexer com os


prontuários ou formulários, arquivos, trabalhadores do local e as pessoas que
passam pelo local, conforme ilustrado na figura a seguir.

20
TÓPICO 2 — PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

FIGURA 9 – DINÂMICAS INSTITUCIONAIS

FONTE: <https://shutr.bz/3llvxgQ>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Isso quer dizer que todos os materiais que constituem o ambiente


institucional, seja ele uma parede frágil que permite escutar os sons de uma
conversa sigilosa do outro lado, seja um espaço para tomar café utilizado como
ponto de parada no trabalho que serve para reunir profissionais para a troca
de conversas e diagnósticos, ou a escrita de um prontuário que oferece uma
visão multiprofissional do paciente, tudo isso pode se tornar alvo de análise do
psicólogo institucional.

3.1 O TRABALHO DO PSICÓLOGO INSTITUCIONAL



A psicologia institucional ofertou grandes oportunidades de exercício
profissional para psicólogos em grupos, em empresas e instituições.

O psicólogo que opta por trabalhar por meio da psicologia institucional


atuará na concepção da instituição como um organismo concreto, mas tendo
como seu principal mote pesquisar os fenômenos humanos que se desenvolvem
na relação com as estruturas, as dinâmicas e os propósitos da instituição.

No início de sua teoria, Bleger (1981) afirma que a posição geral do


psicólogo será sintetizada pelas propostas de que:

● o psicólogo como profissional não deve se ater à finalidade psicoterápica


(que vai do par doença e cura), mas trabalhar com a psicohigiene (população
saudável e promoção de saúde);
● é necessário que o psicólogo passe de uma abordagem nas questões individuais
para um enfoque no social.

No decorrer das formulações de suas teorias, Bleger (1984) vai desenhando
a atuação do psicólogo nas seguintes perspectivas:

21
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

● esfera psicossocial (indivíduos);


● esfera sócio-dinâmica (grupos);
● esfera institucional (instituições);
● esfera comunitária (comunidades);

Nessa aposta social, Bleger (1984) enxerga a importância de um psicólogo


compor as equipes de saúde pública, posto que a psicologia não estaria presente
apenas para atuar como clínica, mas para pensar o campo social. Tomando como
ponto de partida que as questões de saúde que afetam um sujeito estão para além
do individual, pois o social atinge e forma esses indivíduos.

Bleger (1984) afirma que o papel social do psicólogo clínico não é só focar
nas práticas curativas, mas trabalhar a saúde pública, de modo que se chegue a
uma psicohigiene da população (BLEGER, 1984).

3.1.1 Ser humano visto como ser biopsicosocial


Para compreender o trabalho do psicólogo institucional, também é
importante saber como ele enxerga as pessoas com as quais atua.

Nessa abordagem, o ser humano é lido como ser biopsicossocial, ou seja,


visto de uma maneira global, com múltiplas constituições: emocional, psíquico,
biológico, histórico e social.

FIGURA 10 – O SER HUMANO COMO SER BIOPSICOSSOCIAL

FONTE: <https://shutr.bz/3lpWpfq>. Acesso em: 13 jul. 2021.

A velha maneira de enxergar o homem a partir de um lugar dicotômico


entre mente e corpo, nos primórdios da filosofia, já não cabe mais. Todos esses
fatores produzem os sujeitos e, portanto, devem ser levados em conta no momento
das análises das relações interpessoais.

22
TÓPICO 2 — PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

3.2 PSICOHIGIENE, PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E A


MONTAGEM DE UM CAMPO DE TRABALHO
A passagem de uma psicologia de uma perspectiva cujo foco é curativo
para uma abordagem da promoção de saúde para a população marca a psicologia
institucional de José Bleger (1984). Trata-se, dessa forma, de seguir da higiene
mental para aquilo que este autor convencionou como psicohigiene.

O psicólogo que opta por trabalhar a partir desse viés precisa ter em mente
que não poderá estabelecer outra instituição dentro da que se comprometeu
a investigar, ou seja, o psicólogo operando pela psicohigiene não pode se
encaixar em outro modelo de organização e normatização, tais como escritórios,
consultórios ou laboratórios, posto que é necessário que ele se reserve em constante
investigação do ambiente em que se encontra para qualificar o seu trabalho como
psicólogo institucional, como disciplina e modo de condução clínica.

Essa noção de Bleger (1984) segue pela afirmação da impossibilidade de


desvinculação da investigação, do desenvolvimento científico e da práxis do
psicólogo. Sendo assim, o pesquisador nos coloca que a psicologia institucional
não será somente objeto de aplicação de um saber da psicologia (ciência), mas um
modo de fazer psicologia como ciência e profissão, em permanente construção.

Para Bleger (1984), a atuação do psicólogo institucional não deve se limitar


a executar as tarefas estipuladas pela instituição, deve, antes, ter autonomia para
que possa montar suas estratégias de intervenção, realizar seus diagnósticos
institucionais, em que tanto os objetivos da instituição quanto os seus próprios
sejam levados a cabo. Seguindo os conceitos da psicohigiene, o psicólogo se
comprometerá em ser um técnico da relação interpessoal, das relações humanas:
seu papel não será o de executor, de decidir ou resolver problemas, e sim o de
mobilizar as relações para que elas mesmas produzam suas próprias respostas
e caminhos.

A psicologia institucional blegeriana vai entender que não é estudando


a personalidade de cada indivíduo que compõe a instituição que se chega a um
trabalho efetivo, mas sim investigando a dinâmica psicológica que se desenrola
na instituição, à medida que os sujeitos têm sua personalidade impactada pela
movimentação institucional e, de outro lado, esses sujeitos também são parte
integrante dessa movimentação, imprimindo suas personalidades nas redes
institucionais.

Então, da mesma forma que a instituição oferta um anteparo à


personalidade dos indivíduos, ela precisa oferecer também dispositivos de
crescimento e desenvolvimento da personalidade, entendendo que esta é uma
forma de se promover saúde. Para Bleger (1984), quanto mais desestabilizada a
personalidade de um indivíduo, mais ele precisará da instituição como suporte.

23
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 11 – O TRABALHO DE GRUPOS

FONTE: <https://shutr.bz/3akeNAd>. Acesso em: 13 jul. 2021.

O que a psicologia institucional de Bleger também inaugura é pensar que


ao mesmo tempo que a instituição atua como modo de regulação, organização e
controle social, ela é um meio de equilíbrio da personalidade. Por esse motivo se
dá a importância do trabalho do psicólogo, compreendendo que é ele quem vai
mapear os pontos de urgência a serem operacionalizados em técnicas grupais,
assunto que veremos mais detalhadamente adiante.

3.3 MÉTODO DE TRABALHO DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL


Para que o método de trabalho da psicologia institucional de Bleger (1984)
possa ficar um pouco mais claro, colocaremos a seguir um formato esquemático
para melhor visualização:

O método de investigação científica:

● o psicólogo é responsável por investigar os fenômenos psicológicos nas


instituições, partindo do pressuposto para além do individual e da prática
curativa.

O modelo clínico:

● utilização da abordagem psicanalítica, cujo foco é a observação detalhada e


atenta;
● uso da indagação operativa, ou seja:
1. observar minuciosamente as movimentações institucionais;
2. entender o que essas movimentações podem estar indicando e a maneira
como se interrelacionam ou se conjugam;
3. integrar os efeitos desses entendimentos por meio da interpretação, da
pontuação e da análise como modos de fazer da abordagem psicanalítica,
empregados no ambiente institucional;
4. compreender que também faz parte do processo clínico o que o coletivo
consegue alcançar de análise, de correção e de melhorias.
24
TÓPICO 2 — PSICOLOGIA INSTITUCIONAL

● processo pedagógico da intervenção:


1. a instituição deve aprender a educação em saúde, posto que o trabalho do
psicólogo institucional fornece a possibilidade de a instituição aprender a
enfrentar situações e análises sobre ela mesma;
2. o trabalho também investe no aprendizado dos coletivos presentes na
instituição de produzir métodos de enfrentar e ressignificar os acontecimentos;
3. ao aprender a construir um olhar observador e reflexivo para a instituição,
as pessoas que fazem parte desse espaço conseguem ser mais autônomas,
e este fato contribui para a promoção de saúde e fortalece a proposta
preventiva de Bleger (1984) com relação às doenças mentais.

Para que o psicólogo consiga produzir essa dinâmica de aprendizado, ele


precisa se constituir como o que Bleger (1984) denominou de consultor ou assessor. A
função de consultor e assessor garante ao psicólogo autonomia técnica na condução de
suas intervenções, explorando todas as relações da instituição e a própria instituição
a partir de uma abordagem psicológica com enfoque psicanalítico.

Assim, o psicólogo consultor/assessor vai investigar:


● quais são as metas da instituição;
● qual são o papel, as ferramentas e as atividades a serem delineadas;
● como se constroem as relações e como elas perduram;
● quais são os grupos presentes na instituição;
● como se dá a comunicação dentro e fora dos grupos;
● quem são as lideranças instituídas.

O psicólogo pesquisará as instalações e os sistemas de trabalho, partindo


do ponto de que cada material utilizado e cada posicionamento, ou seja, o todo
da instituição irá interferir nas práticas do sujeito.

Como exemplos, temos o a maneira como são estipuladas as relações; o


motivo pelo qual um professor se posiciona à frente dos seus alunos; o motivo pelo
qual as carteiras são alinhadas uma atrás da outra em uma sala de aula (Figura
12); porque o diretor tem uma visão ampla de tudo que acontece na empresa e os
demais funcionários não podem vê-lo da mesma maneira.

FIGURA 12 – CONFIGURAÇÃO ESCOLAR

FONTE: <https://shutr.bz/3v1FQKg>. Acesso em: 13 jul. 2021.

25
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

Para o psicólogo institucional executar seu trabalho é preciso compreende


as ações a seguir:

● estabelecer um enquadramento de investigação e análise;


● executar o paradigma clínico de distanciamento na intervenção, posto que
precisará deste distanciamento para analisar as fantasias inconscientes e a
interpretação das pessoas;
● estabelecer prazos, honorários, explicar sua metodologia de trabalho para as
demais pessoas;
● referenciar-se ao grupo para a devolutiva e consequente análise conjunta,
fazendo com que o próprio grupo chegue a soluções;
● não tomar partido ou se posicionar de um lado ou de outro na organização;
● entender que a saúde organizacional não é a ausência de conflitos, mas
trabalhar a partir deles na busca de soluções;
● entender a resistência ao trabalho por parte da organização, que pode servir
como material de investigação, tal qual nos diz a psicanálise;
● consolidar um posicionamento ético e estratégico com o uso das informações
que circulam nas instituições.

NTE
INTERESSA

Neste curto artigo você encontra uma descrição muito interessante de um


trabalho de grupos sob a perspectiva da teoria de Bleger em um Centro de Juventude em
São Paulo.

Disponível em: https://bit.ly/3iItVvT. Acesso em: 27 jul. 2021.

Continue acompanhando!

26
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

● A entrada da psicologia institucional no Brasil se dá a partir não só da abertura


de mercado de trabalho nas instituições, mas também da necessidade de se
pensar o efeito das instituições na saúde da população.

● A primeira definição de psicologia institucional no Brasil adveio com as


contribuições do psiquiatra argentino José Bleger.

● José Bleger contribuiu muito para a visão do psicólogo na instituição não só


como clínico, mas como promotor de saúde numa perspectiva mais social.

● O trabalho do psicólogo como atuante da psicologia institucional precisa


seguir um método de trabalho.

27
AUTOATIVIDADE

1 Psicologia Institucional é uma abordagem da psicologia cujo pioneiro e


inventor foi José Bleger, psiquiatra argentino com viés psicanalítico. Bleger
afirmava a importância da inter-relação entre a psicanálise e o marxismo
como reforço à psicologia para além das psicoterapias e consultorias, aos
quais a psicologia da época (década de 1970) estava mais acostumada a
trabalhar. Sobre a Psicologia Institucional, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Bleger definia a sua psicologia institucional como sendo uma dinâmica


de investigação da saúde mental dos funcionários que faziam parte da
instituição de intervenção.
b) ( ) Bleger estabelecia a psicologia institucional como uma forma de
intervenção psicológica com sentido social, em uma interface da
psicanálise com a política - esta significando as relações de poder que
interferem na organização dos grupos e das classes sociais.
c) ( ) Para Bleger, o objetivo do psicólogo que atua a partir da psicologia
institucional como orientação deve ser minimizar os efeitos deletérios
das instituições na saúde mental dos sujeitos, recrutar e selecionar
pessoas e realizar atendimentos individuais.
d) ( ) Para Bleger, o psicólogo que atua a partir da psicologia institucional
como orientação deve estudar a personalidade de cada um dos
indivíduos que fazem parte da instituição na qual ele atua.

2 Na história da psicologia brasileira, sabemos que o desenvolvimento da


psicologia institucional como aposta de trabalho e modo de intervenção
trouxe muitas mudanças para a inserção da área em postos de trabalho
até então não pensados, desde a sua regulamentação no Brasil, em 1962.
José Bleger, como criador da psicologia institucional, ofereceu grandes
contribuições para o crescimento da psicologia. Acerca dessas contribuições,
analise as sentenças a seguir:

I- Uma das importantes contribuições da pesquisa de Bleger para a psicologia


foi entender a instituição como alvo de intervenção, vendo-a como uma
totalidade. O seu trabalho tomava a psicologia pela perspectiva de uma
significação social mais do que individual e, por meio disso, seu objetivo
era o trabalho preventivo de promoção de bem-estar.
II- Para Bleger, o trabalho do psicólogo se constituía pela problematização,
interpretação e ação, e deveria ter como objetivo a reorientação dos
discursos e práticas que permeiam o cotidiano das instituições, realizando
o deslocamento de algumas estruturas já adoecedoras do ambiente de
trabalho, mas que permaneciam inquestionáveis.
III- Bleger afirmava a impossibilidade do psicólogo de se pensar como um grande
agente de mudanças nas relações sociais. O psicólogo, para o pesquisador,
precisava focar suas energias de intervenção para a clínica institucional,
para que pudesse realizar diagnósticos, estudar a personalidade dos
indivíduos pertencentes à instituição e aplicar testes psicológicos.
28
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Com as suas pesquisas, o psiquiatra argentino José Bleger chegou à


conclusão de que a psicologia institucional não poderia ser somente objeto
de aplicação de um saber da psicologia científica, mas um modo de fazer
e pensar a psicologia como ciência e profissão, em permanente construção.
Sobre a Psicohigiene de Bleger e a montagem de seu campo de trabalho,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A passagem de uma psicologia que sai de uma abordagem cujo alvo é


meramente curativo para uma perspectiva de promoção de saúde para
a população e que, portanto, sai de uma lógica da higiene mental para a
psicohigiene, marca a psicologia institucional de José Bleger.
( ) O psicólogo que escolhe atuar a partir da psicologia institucional
blegeriana precisa conservar a ideia de que não deverá se estabelecer em
outra instituição que não aquela que se comprometeu a investigar, isto é, o
psicólogo trabalhando com a psicohigiene não pode se estabelecer em outro
modelo de organização e normatização, tais como escritórios, consultórios
ou laboratórios, pois é preciso que ele se reserve em permanente pesquisa
do ambiente em que se encontra, para qualificar o seu trabalho como
psicólogo institucional, como disciplina e modo de condução clínica.
( ) Para Bleger, a atuação do psicólogo institucional deve se limitar à
execução das atividades estabelecidas pela instituição. Seguindo os
preceitos da psicohigiene, o psicólogo se coloca como um técnico da
relação interpessoal, das relações humanas: sua função será a de executor,
de decidir ou resolver problemas trazidos pela instituição.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 A introdução da psicologia institucional ofertou grandes possibilidades de


atuação profissional para psicólogos em grupos, em empresas e instituições.
O psicólogo que exerce sua profissão seguindo a psicologia institucional
como norte entende a instituição como um organismo concreto, e tem como
seu principal objetivo investigar os fenômenos humanos que se dão nas
estruturas, nas dinâmicas e os pressupostos da instituição. Disserte sobre
o método de trabalho e o modelo clínico de intervenção da psicologia
institucional de Bleger.

29
5 Bleger entendia que o trabalho proposto pelo psicólogo institucional deveria
ser uma lógica pedagógica de intervenção e, para tanto, o psicólogo deveria
se posicionar como consultor ou assessor em um trabalho operacional em
grupos. Disserte sobre como Bleger entendia o processo pedagógico da
intervenção e a função de consultor/assessor do psicólogo no trabalho com
a psicologia institucional.

30
TÓPICO 3 —
UNIDADE 1

GRUPO E INSTITUIÇÃO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 3, trabalharemos acerca da importância do grupo
como componente complementar das instituições e das organizações. Entraremos
em contato com a produção de diferentes teóricos, que durante as suas pesquisas
se detiveram na relevância da função do grupo em uma instituição. São eles: José
Bleger, Kurt Lewin, Wilfred Bion e Enrique Pichon-Rivière.

Antes de chegarmos nesses autores, falaremos brevemente do papel de


cada um na complementaridade da dinâmica de construção social da realidade
de uma instituição: o papel da instituição, o papel da organização e o papel do
grupo.

Para facilitar sua compreensão sobre os modelos de trabalho dos autores


citados, abordaremos também a importância da pesquisa sobre grupos para a
psicologia.


2 AS INSTITUIÇÕES, AS ORGANIZAÇÕES, OS GRUPOS E O
PAPEL DE CADA UM PARA AS INSTITUIÇÕES
Como já trabalhado anteriormente, a instituição para a psicologia
institucional significa um valor ou regra social que, de tanto ser repetida ao
longo do tempo, ganha status de verdade, ou seja, instituição não se trata de um
estabelecimento/prédio, mas um modo de ver e viver que segue se reproduzindo
pela sociedade. Ela segue de maneira não necessariamente visível, pois não é
questionada. Somente se torna visível no instante em que passa a ser questionada
ou quebrada como regra. Um exemplo é a instituição casamento.

Para que a instituição seja mantida como um conjunto de regras e


valores, ela precisa de uma organização. As organizações seriam aquelas que
instrumentalizam e se constituem como base concreta na sociedade em que se
realizam as instituições. Pegando o exemplo do casamento, a organização seria a
Igreja ou o cartório que chancelam – como organização – a instituição casamento
(Figura 13).

31
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 13 – INSTITUIÇÃO CASAMENTO

FONTE: <https://shutr.bz/3mzDxdl>. Acesso em: 13 jul. 2021.

O grupo, nesse conjunto que forma a estruturação social da realidade,


seria o sujeito que reproduz as normas, regras e valores nas organizações. O
grupo, a medida em que é o agente que operacionaliza as instituições, pode
operacionalizá-las tanto no sentido da reprodução acrítica das normas e valores,
como pode trazer uma certa singularidade, modificando-as.

E
IMPORTANT

É importante atentar para a diferenciação dos conceitos de instituição,


organização e grupos, entendendo o papel de cada um na estruturação da realidade social.

Trabalhando com o exemplo do casamento, existem aqueles que escolhem


não se casar, aqueles que decidem viver juntos, isto é, temos infinitos exemplos
de modulações dessa instituição.

2.1 A RELEVÂNCIA DA PESQUISA SOBRE GRUPOS NA


PSICOLOGIA
Ao falarmos da pesquisa sobre grupos na psicologia, estamos falando de
um conceito que é muito caro à Psicologia Social. Foi a partir deste ramo da
psicologia que os iniciais estudos sobre grupos começaram. Eles datam do final
do século XIX, quando um estudioso francês chamado Gustav Le Bon escreveu
um tratado sobre a mente popular e as multidões, cujo nome era Psicologia das
Massas ou Psicologia das Multidões, publicado em 1895 (BOCK et al., 2003).

32
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

Sob a influência da Revolução Francesa – que havia espalhado pelo


mundo o potencial revolucionário das multidões – e de filósofos do século XVIII,
como Hegel, interessava a Le Bon o motivo pelo qual uma grande quantidade de
pessoas se sentiram estimuladas a lutar e participar da revolução. Mais ainda, para
a psicologia na época, era interessante saber: o que fez com que uma multidão se
permitisse deixar ser orientada por um líder, ainda que isso os levasse a colocar
em risco a sua própria vida? Quais mecanismos psicológicos viabilizaram a
coesão das massas?

Ao exemplo demonstrado na história sobre o nazismo e a movimentação


das massas organizadas por Hitler (1939–1945), percebemos que entender essa
dimensão psicológica passa longe de não ser importante. Este episódio da história
nos mostrou o quanto é provável a formação de um certo hipnotismo coletivo.

No entanto, não é só de irracionalidade que se fazem os movimentos


de massas, em que em algum momento as pessoas decidem seguir um líder
carismático como o foi Hitler e decidir quem deve morrer e quem deve viver
–, mas as multidões também podem se mobilizar na direção de metas claras e
racionais, como aconteceu no movimento das Diretas Já (1984) no nosso país, em
que milhares de pessoas se organizavam em protestos e passeatas para derrubar
a ditadura civil militar instaurada desde 1964, tal qual ilustrada na Figura 14.

FIGURA 14 – MOVIMENTO DIRETAS JÁ

FONTE: <https://shutr.bz/30af4UD>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Ainda que a psicologia social tenha sido construída a partir do estudo


das grandes movimentações de massas/multidões, foi com a pesquisa de grupos
menores – que é mais mapeável, melhor para analisar com clareza os objetivos –
que a pesquisa de grupos se delineou.

33
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

DICAS

Uma dica bem interessante para entender a psicologia das massas e a sua
formação de grupos é o filme A Onda, de 2009. Confira!

E é um pouco da história e funcionamento da pesquisa com grupos que


veremos agora.

2.2 JOSÉ BLEGER E OS GRUPOS


É muito importante que entremos em contato com a pesquisa de
diferentes autores que influenciaram e ainda influenciam o trabalho do psicólogo
com grupos para entendermos a relevância dos grupos nas nossas práticas como
psicólogo.

O primeiro pesquisador sobre grupos que traremos aqui será José Bleger,
criador da psicologia institucional. Bleger (1987) definiu o grupo como uma
reunião de indivíduos que se relacionam, dividindo algumas normas e regras na
execução de uma atividade.

Para além disso, também é uma sociabilidade que está guardada sob
uma dinâmica de indiferenciação, isto é, existem modos de as pessoas estarem
organizadas sob normas sem que elas interajam entre si. Bleger (1987) denominou
esse modelo como sociabilidade sincrética, em contraposição à sociabilidade por
interação.

A sociabilidade sincrética funciona como em uma comunicação pré-


verbal, em um estado de fusão no qual não se consegue discriminar o que o Eu do
não-Eu, as pessoas já estariam tão programadas para agir segundo determinados
regramentos de convivência que não precisariam comunicar-se entre si para fazer
acordos. Por exemplo, uma parada de ônibus em que as pessoas estão cada uma
esperando seu respectivo ônibus. Não é preciso necessariamente que elas se
comuniquem para estabelecer o funcionamento das filas, das entradas.

Bleger (1987) vai dizer também que os grupos são instituições muito
complexas. De um lado, o grupo pode ser representado pela reunião de
instituições, mas por outro, ele pode se constituir também por organizações.
Dito de outra forma, o grupo, na medida em que vai passando o tempo, vai se
autonomizando e perdendo um pouco do objetivo inicial. Quando os objetivos se
perdem, esse grupo pode começar a se tornar antiterapêutico, pois ele passa a se
comportar como uma organização, um dever e não como experiência de trabalho
que possui metas a serem atingidas.
34
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

O objetivo de um trabalho de grupo das instituições, para Bleger (1988),


não era de estabelecer harmonia dentro ou fora do ambiente grupal, nem
amenizar as diferenças individuais em nome de um bem comum, mas sim o de
promover espaços em que as diferenças possam ser trazidas e trabalhadas, em que
o mecanismo grupal possa favorecer a superação de processos narcísicos, tendo
como mote final um relacionamento mais saudável, amadurecido e proveitoso
para as pessoas e as organizações.

FIGURA 15 – O TRABALHO COM GRUPOS EM INSTITUIÇÃO

FONTE: <https://shutr.bz/2Yz4tl2>. Acesso em: 13 jul. 2021.

A proposta de trabalho de Bleger (1987) segue com a proposta de Pichon-


Rivière, que é a denominada de grupos operativos, que vai entender que questões,
conflitos e metas devem ser pesquisados e utilizados pelo próprio grupo para
superação de suas dificuldades.

2.3 KURT LEWIN E O COGNITIVISMO


Podemos dizer que Kurt Lewin foi um dos pioneiros no estudo sobre
grupos (BOCK et al., 1999). Em 1930, o professor, fugindo do nazismo alemão,
seguiu para um instituto renomado nos Estados Unidos para desenvolver sua
pesquisa sobre grupos. Sua teoria teve tanta força sobre a psicologia que fez
surgir uma corrente teórica na Psicologia Social, sob o nome de Cognitivismo.
As pesquisas de Lewin também foram importantes para o crescimento de uma
teoria organizacional psicológica que, no ambiente empresarial, é utilizada nas
pesquisas das relações humanas no trabalho.

A possibilidade que a teoria dos grupos oferecia de melhorar as relações


organizacionais naquele momento fez com que tanto a indústria quanto as Forças
Armadas investissem em provisões financeiras para entender melhor como os
grupos funcionavam e de que modo as pessoas poderiam ser motivadas para o
trabalho.

35
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

FIGURA 16 – AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS NAS FÁBRICAS

FONTE: <https://shutr.bz/3uU4nAF>. Acesso em: 13 jul. 2021.

UNI

O psicólogo americano Elton Maio em 1930 descobre e instrumentaliza em


teoria a importância das relações interpessoais nos trabalhos nas fábricas (Figura 16).

Em conjugação com a descoberta do psicólogo americano Elton Mayo,


nesse mesmo 1930, que em uma pesquisa em uma fábrica percebeu que as relações
interpessoais são fortes fatores de motivação e melhoria do ambiente de trabalho,
a pesquisa com grupos cresceu consideravelmente.

2.3.1 A teoria de campo de Lewin


Kurt Lewin foi um dos grandes teóricos dos estudos sobre grupos, com
pesquisas sobre climas sociais de uma empresa ou no campo social (LAPASSADE,
1977).

Lewin, então, criou aquilo que denominou como teoria de campo.


Afirmava que esta não era uma teoria, mas uma forma de analisar relações causais
e elaborar conceitos; de atuar com a concepção de que qualquer situação é efeito
de múltiplos fatores. Sua noção de que qualquer comportamento ou alteração
no campo psicológico resulta somente do campo psicológico naquele momento

36
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

também fez pensar em uma proposta diferente sobre o tempo (o presente, o futuro
no presente e o passado no presente), isto é, uma visão de processualidade e
indispensabilidade de operar tanto no nível macroscópico quanto microscópico,
abrangendo o que ele denominou de unidades situacionais.

Para o pesquisador, o comportamento humano é efeito de um campo,


o indivíduo e o seu externo nunca podem ser tidos como duas realidades
desconectadas. Na prática, são duas esferas que estão sempre se relacionando
entre si e que se transformam mutuamente em tempo real.

Assim, Lewin afirma que, quando necessitamos entender o comportamento


humano, precisamos levar em conta as inúmeras variáveis que compõem seu
espaço vital. Como Lewin acreditava que o comportamento precisa ser estudado
em sua totalidade, ele inventou o seu conceito de grupo que, para ele, não se
configurava somente como a soma das características de seus membros, mas
como algo novo, resultante dos processos que ali ocorreram. Ele estudou:

● Coesão grupal – as condições básicas para a sustentação de um grupo (Figura 17).


● Pressões e padrões de um grupo – justificativas reais ou inventadas que
participantes de um grupo fazem para sustentar a fidelidade dos outros
participantes aos objetivos do grupo.
● Motivações individuais e as metas do grupo – quais são os componentes que
fazem com que um grupo seja fiel aos seus objetivos e quais são as motivações
que levam as pessoas a querer pertencer a um determinado grupo.
● Lideranças e seus tipos e a dinâmica de grupo – como se dá o convencimento
(carisma) que algumas pessoas exercem sobre outras, a ponto de elas seguirem
determinadas sugestões ou ordens, e o modelo de atividade operada em um
grupo.
● Propriedades estruturais de um grupo: modos de comunicação, a função de
cada um em um grupo, relações de poder etc.

FIGURA 17 – COESÃO GRUPAL

FONTE: <https://shutr.bz/3alUP8k>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Vejamos agora outros teóricos importantes para o nosso estudo. Acompanhe!


37
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

3 WILFRED BION E ENRIQUE PICHON-RIVIÈRE


Os teóricos que veremos neste tópico foram extremamente relevantes
para a composição da psicologia de grupos. Podemos dizer que os trabalhos de
grupo de Bleger, Lewin, Bion e Pichon-Rièvere estão relacionados e baseados uns
nos outros, embora cada um tenha imprimido a sua vertente.

Ao discorrer sobre as contribuições de Wilfred Bion e Enrique Pichon-


Rivière, conseguiremos ver que as suas teorias têm ressonância na psicologia
até o momento presente, tanto no campo da psicologia institucional quanto na
psicologia organizacional ou psicologia do trabalho.

Ambos os autores se utilizaram da psicanálise, mas cada um construiu


suas alianças e caminhos. A seguir, acompanharemos um pouco das contribuições
desses pesquisadores.

3.1 BION E OS GRUPOS TERAPÊUTICOS


O psiquiatra e psicanalista inglês Wilfred Bion (1975) é um importante
nome da psicologia dos grupos, o qual desenvolveu uma teoria em torno das
dinâmicas de grupo. As principais linhas teóricas de inspiração de Bion são a
psicanálise freudiana, no que tange ao seu trabalho com a psicologia das massas,
a teoria das três pulsões do Dr. Hadfield (da clínica Tavistock) e as contribuições
da psicanálise kleiniana.

No período da Segunda Guerra Mundial, Bion era médico e diretor de


uma ala do hospital com um quadro aproximado de 400 pacientes, em que se
presenciava um forte quadro de anarquia e indisciplina. Com a finalidade de
fazê-los entender suas dificuldades e descobrir modos de lidar com elas, Bion
(1975) decidiu fazer uma experiência reunindo esses pacientes.

O que se observou a partir dessa reunião em grupos foi a criação de um


senso de grupo entre eles e como isso interferia no comportamento de cada um
isoladamente. Assim, depois da guerra, o pesquisador foi estruturando a sua teoria a
partir da abordagem psicanalítica, dando um contorno para o trabalho com grupos.

NTE
INTERESSA

O trabalho de Wilfred Bion com a psicologia dos grupos teve início em uma
ala do hospital da Segunda Guerra Mundial, em que era médico (Figura 18), com um quadro
aproximado de 400 pacientes, em que se presenciava um forte quadro de anarquia e
indisciplina. Com a finalidade de fazê-los entender suas dificuldades e descobrir modos de
lidar com elas, decidiu fazer uma experiência reunindo esses pacientes em grupos.

38
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

FIGURA 18 – ALA DE HOSPITAL NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

FONTE: <https://shutr.bz/3BrM2NM>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Bion (1975), então, começou as suas pesquisas saindo da função e do


papel que exercia anteriormente, estipulando regramentos para os pacientes que
cumpriam as seguintes instruções:

I- Uma hora diária de treinamento físico.


II- Os pacientes se agrupariam para atividades estipuladas.
III- Novos grupos poderiam ser organizados se assim fosse o desejo dos
pacientes.
IV- Os pacientes que se designassem impossibilitados se destinariam
para a sala de repouso, onde estava disponível leitura, escrita, jogos de damas e
conversas em voz baixa para não incomodarem os demais.

Bion (1975) apostou na proposta de intervenção que não tentasse solucionar


os conflitos que aparecessem e nem interferir até que os pacientes pudessem
amadurecer suas questões e suas resoluções. O psiquiatra supervisionava os
grupos e permitiu que os membros pudessem supervisioná-lo também, como
uma forma de aprendizagem.

Essa experiência foi considerada efetiva por Bion. Aí, ele cunhou o
conceito de espírito de grupo, que ocorre quando existe uma meta em comum e
pela admissão, por parte do grupo, de seus limites.

Assim, podemos dizer que o objetivo de um grupo para Bion é a pesquisa


das causas que provocam interferências e problemas no comportamento mais
racional do grupo.

39
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

3.1.1 Grupo Terapêutico


Bion (1975) formalizou suas experiências nos estudos com grupos
nomeando-os como grupos terapêuticos. Nesses grupos, era preciso convencer
as próprias pessoas doentes a tomar como responsabilidade o estudo de suas
próprias questões.

Destes grupos, Bion (1975) retirou a sua teoria de funcionamento dos


grupos. Assim, um bom produto de um grupo era:

● conservar uma identidade grupal, ainda que tivesse certa flexibilidade;


● valorizar os subgrupos e os seus limites;
● reconhecer seus membros;
● trabalhar também com a relevância do campo social ao qual o grupo está
localizado, quando se intenciona uma análise psicopatológica das relações
grupais.

No acompanhamento dos grupos, Bion (1975) foi observando que não
necessariamente os grupos se comportavam tal qual o descrito acima, alguns
membros pareciam agir por forças estranhas; ainda que estes tivessem pactuado
uma determinada forma de agir que convergisse para o objetivo comum, agiam ao
contrário do que haviam pactuado. É nesse momento que o estudioso se dá conta
das formações do inconsciente, o que ele chamou de mentalidade de grupos.

A mentalidade de grupos significa o fenômeno em que o grupo estabelece


um vínculo em que as pessoas ali expressam de modo anônimo impulsos e
desejos que gostariam de atender, mas para os quais não gostariam de atribuir
responsabilidade.

Nessa convergência com a psicanálise, Bion (1975) irá afirmar que o


homem como ser político necessita do grupo para a satisfação da sua vida mental,
convergindo para uma vida plena. No entanto, um grupo pode não cumprir
esse lugar de ambiente de satisfação das necessidades, quando direcionado pela
mentalidade grupal.

3.2 PICHON-RIVIÈRE E OS GRUPOS OPERATIVOS


O psiquiatra argentino Enrique Pichon-Rivière também foi um importante
pesquisador sobre grupos. O seu trabalho segue na esteira de Kurt Lewin, com a
aliança de seus estudos psicanalíticos.

Depois de uma greve em um hospital psiquiátrico, Pichon-Rivière –


com a finalidade de acabar com a situação crítica – escolhe os pacientes menos
adoecidos para cuidar dos mais adoecidos. O psiquiatra observou significativa
melhora nos quadros de ambos os subgrupos, principalmente porque houve

40
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

nessa experiência uma ruptura de papéis pré-definidos de quem cuida e quem


é cuidado. É nesse momento que Pichon-Rivière formaliza a técnica dos grupos
operativos (SAIDÓN, 1983).

O grupo operativo é definido como a técnica de trabalho com grupos cuja


finalidade é produzir um processo de aprendizagem. Aprender em um grupo se
relaciona com a possibilidade de realizar uma leitura crítica da realidade, quando
os membros do grupo se apropriam dessa realidade, uma postura investigativa
em que cada resposta obtida dessa leitura possa promover uma nova pergunta e
assim sucessivamente.

O aprendizado na pesquisa pichoneana significa mudança, e está


vinculado à teoria de regressão e da fixação libidinal, quanto à transferência.
Assim, a pessoa que fosse resistente à mudança regrediria a comportamentos
relativos à etapa libidinal em que estaria fixado.

Sintetizando o grupo operativo, ele é um modo de intervenção, organização


e desenvolvimento de soluções grupais, que é baseado no que Pichon-Rivière
chamou de a teoria do vínculo. A teoria do vínculo parte do pressuposto de que
ainda que duas pessoas se relacionem de modo consciente, existem ali presentes
na relação outras figuras internalizadas.

FIGURA 19 – TRABALHO DE GRUPO

FONTE: <https://shutr.bz/3FwPzgc>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Esse modo de conceber o trabalho em grupo de Pichon-Rivière se tornou


uma excelente ferramenta de intervenção em ambientes organizacionais e ainda
é utilizado. Por meio de sua aplicação, podemos analisar um grupo específico
na sua execução de tarefas e analisar a manifestação das fantasias e simbolismos
inconscientes presentes nas relações interpessoais dos componentes do grupo.

41
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

3.3 O PROCESSO GRUPAL


É de muita importância para a formação em psicologia que entremos
em contato também com as pesquisas grupais mais atuais, principalmente
as apropriações, críticas e considerações que estas fazem a autores que foram
pioneiros nos estudos de grupos.

A formulação da psicologia social crítica – datada da década de 1970 –


fez com que alguns autores, tais como Silvia Lane e Martin-Baró, realizassem
determinadas críticas com relação às teorias dos autores apresentados
anteriormente.

Embora conseguissem visualizar a importância das construções de Kurt


Lewin, Lane (2012) e Baró (1993) criticam o modo estático com que os cognitivistas
abordam a concepção de grupo, isto é, não contextualizam que a cada tempo
histórico, acontecimentos vão interferir no modo como as pessoas pensam, como
os grupos funcionam.

Do mesmo modo, caracterizam como relevante a delimitação de leitura


a partir da psicanálise Pichon-Rivière, ainda que insistam que a visão de grupo
não possa ser descontextualizada de cada momento histórico a qual ela pertence.
Com base nessas leituras, Lane (2012) vai caracterizar três espécies de categoria
de produção grupal, a saber:

● Categoria de produção: a elaboração das urgências de um grupo está


intimamente vinculada à elaboração grupal. O processo grupal se define
como atividade produtiva de cunho histórico.
● Categoria de dominação: os grupos acabam por reproduzir algumas formas
de relações de poder. Ainda que um grupo possa se afirmar como democrático,
pode reproduzir determinadas hierarquias habituais do sistema dominante
vigente (o modo de produção capitalista).
● Categoria grupo-sujeito: aqui, Lane (2012) se inspira em René Lourau e afirma
que podem existir níveis de resistência à mudança nos grupos. Quando os
grupos têm mais capacidade de fazer autocrítica e se propor a mudanças, eles
são denominados grupos-sujeitos. No entanto, os grupos que são mais avessos
a se autoanalisar e se submetem com muita facilidade às regras institucionais
são os grupos-sujeitados.

Essas três categorias podem atravessar o grupo, mas o produto ou


resolução final é que responderá se esse grupo está sendo mais grupo-sujeito
ou grupo-sujeitado. Por exemplo, uma banda de música (Figura 20): a banda
estará submetida às condições históricas do seu momento de produção, portanto
terá que objetivar também o lucro financeiro (visto que estamos sob o regime
capitalista). As regras de montagem da banda podem se estabelecer em um
primeiro momento de modo democrático, com as pessoas tomando decisões e
estando posicionados e respondendo do mesmo lugar. Mas pode ser que, em
algum momento, o vocalista (como frontman) possa ganhar mais destaque, ser
chamado para mais trabalhos individualmente e exija ganhar mais que os outros.
42
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

FIGURA 20 – BANDA DE MÚSICA

FONTE: <https://shutr.bz/3v7jfvX>. Acesso em: 13 jul. 2021.

Esse movimento corresponderá àquilo que Lane (2012) nomeou como


categoria de dominação. O grupo decide, então, conversar sobre este movimento
e reavaliar o papel de cada um naquela banda e ver se as condições e objetivos
estão justos e afinados para cada um ali e propor a mudança (grupo-sujeito) ou,
na inviabilidade de se fazer a autocrítica, continuar sob o jugo do vocalista e ter
aquilo que Lane nomeou como grupo-sujeitado.

43
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

LEITURA COMPLEMENTAR

UMA INTRODUÇÃO AOS GRUPOS OPERATIVOS: TEORIA E TÉCNICA

Pablo Castanho

RESUMO

No Brasil e no mundo, atualmente são muitos os profissionais que trabalham


com pequenos grupos. Ao menos entre nós, o trabalho é muito frequentemente
realizado de modo empírico, sem o suporte de uma teoria de grupo. O referencial
de Grupos Operativos é muito evocado, porém pouco conhecido de fato. Nos
casos em que o profissional busca saber sobre essa abordagem, costuma encontrar
dificuldades grandes para integrar à sua prática o conhecimento atualmente
disponível nos textos em português. Este artigo representa uma estratégia para uma
primeiríssima leitura introdutória sobre os Grupos Operativos. Nele, visamos um
recorte sintético e funcional dos conceitos, noções e pressupostos estruturantes da
teoria dos Grupos Operativos e da técnica dos Grupos operativos de Aprendizagem.
Tais elementos são apresentados em suas relações com outras teorias e em especial
com a perspectiva psicanalítica de grupo. Assim, introduzimos o Grupo Operativo
comprometidos com seu caráter prático e destacando sua inserção histórica no
ramo das teorias psicanalíticas de grupo.

Palavras-chave: Grupos Operativos – Psicanálise de Grupo – Psicoterapia de


Grupo – Dinâmica de Grupo – Pichon-Rivière

O Dispositivo do Grupo Operativo de Aprendizagem

Primeiramente, é útil a distinção entre um uso genérico e outro restrito do


termo "grupo operativo". Em um sentido abrangente podemos chamar um grupo de
operativo na medida em que nele identificamos o acontecer da espiral dialética. Já em
um sentido estrito, nos referimos a "grupo operativo" como técnica de intervenção.

Como técnica de intervenção, tomaremos como referência para este trabalho


o dispositivo utilizado no processo de formação dos coordenadores de grupo
operativo, denominado de "grupo operativo de aprendizagem". Notemos que, até
onde pudemos averiguar, essa é a única modalidade de grupo operativo cuja técnica
é detalhada na literatura e no processo de formação de coordenadores pichonianos.
Sublinhemos que o termo "aprendizagem", em Pichon-Rivière, corresponde ao que
descrevemos como o movimento da espiral dialética no grupo, portanto, deve ficar
claro que o "grupo operativo de aprendizagem" não tem sua aplicação restrita aos
contextos de educação formal, mas diz respeito a uma possibilidade de intervenção em
qualquer campo da vida social. O dispositivo do grupo operativo de aprendizagem
é idealmente composto por até 15 integrantes e ao menos dois profissionais
responsáveis na função de coordenadores ou de coordenador e observador.

44
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

Uma duração entre uma hora e uma hora e meia é normalmente


recomendada, mas, em nossa experiência, grupos significativamente mais
curtos se justificam em algumas circunstâncias. Como qualquer grupo, o grupo
operativo de aprendizagem reúne-se para a realização de uma tarefa, um objetivo
a ser realizado, compartilhado por todos. As tarefas podem ser coisas muito
diversas, como a realização de um trabalho, o estudo ou a terapia. A técnica de
grupo operativo caracteriza-se como terapia quando a tarefa explícita do grupo
é essa. Entretanto, em todos os outros casos o grupo operativo também pode ser
realizado com ganhos psíquicos para seus membros. Não existe, para Pichon-
Rivière, uma incompatibilidade a priori entre fazer algo, realizar um trabalho e o
desenvolvimento psíquico. Vejamos o que Bleger comenta a esse respeito:
No hay ningún instrumento que funcione sin el ser humano. Nos
oponemos a la vieja ilusión, tan difundida, de que una tarea se realiza
mejor cuando se excluyen los llamados factores subjetivos y solo se la
considera 'objetivamente'; por el contrario, afirmamos y sostenemos
operativa, prácticamente, que el más alto grado de eficiencia en una
tarea se logra cuando se incorpora sistemáticamente a la misma al ser
humano total (BLEGER, 1999b, p. 57).

A Tarefa como um "Disparador" de Pensamentos, Sentimentos e Ações

Isto não significa dizer que qualquer "fazer" tenha efeitos terapêuticos.
O conceito de tarefa em Pichon-Rivière é complexo e fruto de muitos mal-
entendidos. Muitas pessoas acham que, se o grupo realiza a tarefa explicitamente
colocada, então o grupo trabalhou de modo operativo, e a saúde mental de seus
membros está sendo promovida. A despeito de algumas brechas que de fato
podemos encontrar no pensamento de Pichon-Rivière dando apoio a essa leitura,
acreditamos que ela não se sustente no conjunto da obra. Para esclarecermos esse
ponto, um texto particularmente interessante é
La noción de Tarea en Psiquiatría" (PICHON-RIVIÈRE, 1985).
Nesse artigo, Pichon-Rivière e Bauleo expõem a dissociação como
característica da pré-tarefa (aquilo que, como o próprio nome diz,
se opõe à tarefa): "Además es en esta pretarea donde se observa un
juego de disociaciones del pensar, actuar e sentir, como formando
parte también de los mecanismos antes enunciados [mecanismos de
defesa]" (PICHON-RIVIÈRE, 1985, p. 34, parênteses nosso).

Essa dissociação pode permitir a realização da tarefa explicitamente


colocada, porém sem a elaboração psíquica concomitante. Pichon-Rivière prevê
esta possibilidade e reserva o termo "tarefa" somente para quando houver
elaboração psíquica. Essa compreensão é evidente no seguinte trecho do próprio
Pichon-Rivière:
El momento de la tarea consiste en el abordaje y elaboración de
ansiedades y la emergencia de una posición depresiva básica, en la
que el objeto de conocimiento se hace penetrable por la ruptura de una
pauta disociativa y estereotipada, que se ha funcionado como factor de
estancamiento en el aprendizaje de la realidad y de deterioro en la red
de comunicación. (PICHON-RIVIÈRE, 1985, p. 35, grifo nosso).

45
UNIDADE 1 — PSICOLOGIA E INSTITUIÇÃO

Assim, a visão de saúde de Pichon-Rivière pressupõe uma ação humana


em que figurem integradamente o sentir, o pensar e o agir. Só quando há
essa integração é que se pode falar de tarefa. Sublinha-se ainda que, na visão
pichoniana, como Bleger já havia aludido antes, o natural seria a integração dessas
esferas, sendo a dissociação um mecanismo de defesa acionado para a proteção
contra as angústias que circulam entre elas. É nesse registro, da "alienação" ou
fragmentação do membro do grupo, que se coloca o problema pichoniano da
"impostura". Como define o próprio autor:
Se nos presenta en esas semiconductas de la pretarea el problema de
la impostura. Si la significación está reducida y el sujeto no presenta la
opacidad que su presencia requiere, hay una cierta transparencia. En
su cuerpo la decantación significativa se efectúa con falta de totalidad.
El sujeto es una burla de sí, su "negativo". Le falta la revelación de sí
mismo, su denominación como hombre. La situación se le presenta con
un dejo de extrañeza y es esa extrañeza la que lo desespera, acudiendo
para sobrellevarla a comportamientos extraños a él como sujeto, pero
afines con él como hombre alienado. (PICHON-RIVIÈRE, 1985, p. 34,
destaque nosso).

Retomando o registro do processo grupal, essas ressalvas fundamentais


quanto ao conceito de "tarefa" encontram no pensamento de Pichon-Rivière
um termo próprio, o "como se". O "como se" é uma falsa tarefa, pois dela tem
apenas a aparência, estando a elaboração psíquica totalmente ausente. O "como
se" pode se apresentar na forma de realizações "pragmáticas" ou mesmo como o
simulacro de um grupo operativo, onde os sentimentos expressos e as associações
disponibilizadas são apenas "da boca para fora" e estão na verdade a serviço de
"apaziguar" o coordenador, defender o grupo contra suas possíveis interpretações,
que poriam os membros do grupo em contato com suas angústias.
Podemos estipular que el "como si" aparece a través de conductas
parcializadas, disociadas, semiconductas –podríamos decir– pues
las partes son consideradas como todos. Los aspectos manifiestos y
latentes son imposibles de integrar en una denominación total que los
sintetice. (PICHON-RIVIÈRE, 1985, p. 34).

A importância de abordar essa dimensão da tarefa em uma introdução


ao grupo operativo se impôs ao autor deste texto em função de uma experiência
em uma oficina sobre grupos operativos. Após uma aula introdutória sobre o
assunto, foi proposto um grupo de elaboração de aprendizagem. Ou seja, um
grupo operativo de aprendizagem com a tarefa de discutir o que fora apresentado
na aula. Após uma dificuldade inicial, alguns alunos trazem lembranças de outro
curso que teriam feito sobre o tema do grupo operativo. Em seus discursos,
enfatizam a tarefa e a descrevem como algo bastante objetivo. Controlam-
se de modo a evitar que qualquer membro saia destas referências racionais. O
coordenador tem a impressão de que as pessoas parecem pouco confortáveis
sentadas em círculo olhando umas para as outras. Nota que alguns membros
mostram-se extremamente desconfortáveis, como se tivessem medo de algo, mas
estes, quando tentam falar, são cortados pelos colegas. O coordenador intervém
no grupo dizendo que talvez haja algo que incomode bastante no tema "grupo"
e que seja difícil falar disso. Alguém no grupo comenta sobre um desenho que

46
TÓPICO 3 — GRUPO E INSTITUIÇÃO

havia feito em grupo recentemente e descreve-o como uma espécie de monstro.


Aos poucos, outros podem falar de angústias de estar em grupo, surgem termos
como "aniquilamento" e "dissolução". São feitas algumas relações com o conteúdo
da aula ministrada. O monstro inicialmente apresentado pode então ser nomeado
como um "monstro disforme". O tempo para o grupo operativo termina e, dentro
do cunho pedagógico da proposta, discutimos um pouco sobre o que ocorreu.
Uma parte do grupo defende que havíamos fugido da tarefa, pois não havíamos
discutido os temas da aula, outra parte discorda. Concordamos com esta segunda
visão, pois, em vista do que apresentamos neste texto, a fuga da tarefa teria ocorrido
se tivéssemos ficado restritos à discussão racional dos temas da aula. Uma vez que a
tarefa seja enunciada, ela suscita e mobiliza fantasias no grupo que são exatamente
aquilo que tem que ser explicitado para que a tarefa possa ser cumprida sem
dissociação entre sentimentos, pensamentos e ações (quesito fundamental para a
elaboração psíquica e, portanto, para todo o trabalho de grupo operativo). Estar
em tarefa implica seguir o fluxo associativo inconsciente intersubjetivo que a tarefa
dispara no grupo. Prender-se ao enunciado explícito pode ser um modo de evitar
a angústia suscitada por ele, caso em que constituiria uma forma de pré-tarefa.
Deve-se ter em mente a concepção dialética de Pichon-Rivière de uma espiral sem
fim (a dialética não termina, seu movimento é sua essência e sua identidade) – nesta
perspectiva, o fundamental é colocar-se no caminho da tarefa. Claro que muitas
vezes o "caminho" da tarefa inclui prazos, que têm que ser objeto de discussão no
grupo, para serem confirmados ou repudiados.

Para terminar este tema é interessante pensar que, quando propomos


uma atividade lúdica ou expressiva em um grupo, estar em tarefa não é somente
realizar o proposto; de fato, por vezes a proposta é apenas um meio para que se
trabalhem determinados aspectos internos e vinculares. Cito o exemplo de um
grupo que coordenamos, no qual apenas alguns membros falavam o tempo todo.
Averiguamos que estes já se conheciam de muito antes de o grupo ter sido formado,
enquanto os mais quietos eram, na maioria dos casos, estranhos uns aos outros.
Julgando que pudesse se tratar de uma espécie de "inércia", dividimos os membros
do grupo em pares e propusemos que conversassem por dois ou três minutos e
depois reportassem ao grupo o conteúdo de cada conversa. A proposta pareceu "cair
como uma pedra" no grupo. Passamos o resto do grupo rastreando os sentimentos e
fantasias disparadas por nossa proposta. Rapidamente explicitou-se o medo de ser
invadido ou invadir o outro e emergiram várias lembranças de momentos em que
a fala do outro foi devastadora para si ou, de modo inverso, mesmo sem nenhuma
intenção de ofender, a própria fala magoou muito os outros (fantasias suscitadas a
partir da proposta de uma conversa de dois ou três minutos!). Desta maneira, o grupo
não realizou a proposta da "entrevista" a dois, mas nosso objetivo foi totalmente
atingido, pois pudemos investigar o medo de falar (e ouvir) nesse grupo e, portanto,
ganhamos insight no problema da "parte silenciosa do grupo".

FONTE: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-24902012000100007>.
Acesso em: 30 jul. 2020.

47
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

● Existe uma função, tanto para as instituições, quanto para as organizações e


os grupos na estruturação social das instituições.

● Existe uma relevância histórica para o estudo de grupos para a psicologia.

● Há muitas contribuições de diferentes pesquisadores, cada um a seu modo,


e alguns autores convergindo em alguns pontos, para a estruturação da
pesquisa de grupos na psicologia.

● Como se dão as contribuições atuais do trabalho de grupos a partir das


pesquisas dos autores pioneiros na formulação do estudo com grupos.

CHAMADA

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48
AUTOATIVIDADE

1 O desenvolvimento da psicologia institucional fez com que fosse necessário


separar as concepções de instituições, organizações e grupos para enfatizar
a dimensão social de intervenção e como está nos constitui e nos atravessa.
Sobre as definições de instituição, organização e grupos e o papel de cada
uma delas na nossa estruturação social para a psicologia institucional,
assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A instituição, para a psicologia institucional, corresponde a valores e


regramentos sociais, e para que a instituição seja mantida como um
conjunto de regras e valores, ela precisa de um grupo.
b) ( ) As organizações são aquelas que instrumentalizam e se constituem
como base concreta na sociedade em que se realizam os grupos. Um
exemplo é o casamento.
c) ( ) O grupo representa o sujeito que reproduz as normas, regras e
valores nas organizações. O grupo, na medida em que é o agente que
operacionaliza as instituições, pode funcionar tanto no sentido da
reprodução acrítica das normas e valores, como pode trazer uma certa
singularidade, transformando- as.
d) ( ) O grupo corresponde a uma reunião de pessoas que, quando juntas,
conseguem formar estatutos de verdade, ou seja, estabelecem um
modo de ver e viver que segue se reproduzindo pela sociedade.

2 A psicologia apresenta um vasto campo de estudo acerca dos grupos.


Diferentes autores, ao longo da história do desenvolvimento da
psicologia, entenderam que esta temática tinha bastante relevância para
o funcionamento do psiquismo e para as movimentações sociais de nossa
sociedade. Com base na importância do estudo dos grupos para a psicologia,
analise as sentenças a seguir:

I- O início dos estudos sobre grupo na psicologia se deu no final do século


XIX, quando estudiosos começaram a se interessar pela pesquisa do
funcionamento de pequenos grupos.
II- Para a psicologia que estudava os grupos no século XIX, era importante
saber: o que fez com que uma multidão se convencesse a deixar ser guiada
por um líder, ainda que isso os encaminhasse a pôr em risco a sua própria
vida? Quais fenômenos psicológicos possibilitaram a coesão das massas?
III- Foi por meio da pesquisa de grupos menores, que são mais mapeáveis e
melhores para analisar com clareza os objetivos, que a pesquisa de grupos
na psicologia se delineou.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.

49
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Diferentes pesquisadores investiram no estudo sobre grupos na psicologia


ao longo de sua história. Ainda hoje podemos perceber a importância dos
grupos nos trabalhos dos psicólogos e, mais ainda, que as contribuições que
alguns desses pesquisadores legaram estão sendo utilizadas e aprimoradas
até hoje. Acerca do trabalho de Kurt Lewin com os grupos, classifique V
para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Podemos dizer que Kurt Lewin foi um dos pioneiros no estudo sobre
grupos.
( ) Kurt Lewin fundou a sua corrente teórica na Psicologia Social sob o nome
de Cognitivismo. As pesquisas de Lewin também foram relevantes para o
desenvolvimento de uma teoria organizacional psicológica que, no espaço
empresarial, é abordada nos estudos das relações humanas no trabalho.
( ) Kurt Lewin foi o responsável por criar os grupos operativos, grupos estes
que se fundamentavam na sua teoria do vínculo.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Muitos foram os estudiosos que contribuíram para a expansão do


conhecimento sobre grupos na psicologia institucional. Há destaques para
alguns nomes, posto que suas ideias, esquematizações, objetivos e formas
de trabalhar os grupos permanecem até os dias atuais, como forma ou
inspiração de trabalho com grupos. Disserte sobre os grupos terapêuticos
de Wilfred Bion.

5 O desenvolvimento da psicologia social crítica, que se iniciou a partir da


década de 1970, fez com que alguns pesquisadores da psicologia, tais como
Silvia Lane e Martin-Baró fizessem críticas e apropriações com relação a
alguns teóricos de grupo. Com isso, foram configurando as suas próprias
teorias. Disserte sobre as categorias de produção grupal de Silvia Lane.

50
REFERÊNCIAS
A ONDA. Direção: Dennis Gansel. Alemanha: 2008. 101 min.

BARÓ, I. Sistema, grupo y poder: psicologia social desde Centroamerica II. San
Salvador: UCA, 1993.

BION, W. R. Experiências com grupos. Rio de Janeiro: Imago; São Paulo:


EDUSP, 1975.

BLEGER J. Temas da psicologia. São Paulo: Martins Fontes, 1981.

BLEGER, J. Psicohigiene e psicologia institucional. Porto Alegre: Artes Médicas,


1984.

BLEGER, J. Simbiose e ambiguidade. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1987.

BLEGER, J. Grupos Operativos. In: Temas de Psicologia. São Paulo: Martins


Fontes, 1998.

BOCK, A. et al. Psicologia e compromisso social. São Paulo: Cortez, 2003.

GUIRADO, M. Psicologia Institucional: o exercício da psicologia como


instituição. In: Interação em Psicologia, Curitiba, v. 13, n. 2, jul./dez.
2009, p. 323-333. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/psicologia/article/
viewFile/9447/11377. Acesso em: 10 jul. 2021.

JACÓ-VILELA, A. M. História da Psicologia no Brasil: uma narrativa por meio


de seu ensino. In: Revista Psicologia: ciência e profissão. Brasília, 2012 (32).
Disponível em: https://bit.ly/3lnLItQ. Acesso em 15 jun. 2021.

LANE, S. T. M. Psicologia Social: o homem em movimento. São Paulo:


Brasiliense, 2012.

LAPASSADE, G. Grupos, organizações e instituições. Rio de Janeiro: Francisco


Alves, 1977.

SAIDON, O. Práticas grupais. Rio de Janeiro: Campus, 1983.

SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. São Paulo:


Pioneira Thompson Learning, 2005.

TOLEDO, R. O grupo e a instituição. In: Revista SPAGESP, Ribeirão Preto, v. 1,


n. 1, 2000.

51
TORRES, C. et al. Psicologia social: principais temas e vertentes. Porto Alegre:
Artmed, 2018.

ZANELLI, J. C. et al. Estresse nas organizações de trabalho: compreensão e


intervenção baseadas em evidências. Porto Alegre: Artmed, 2010.

52
UNIDADE 2 —

PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES


HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO
MUNDO DO TRABALHO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

● entender a proposta da Psicologia Institucional nas instituições;

● reconhecer a importância da problematização de práticas na formação


do psicólogo;

● conhecer as diferentes formas de atuação da Psicologia Institucional nos


hospitais e escolas;

● analisar a utilização de ferramentas de intervenção e a análise dos seus


efeitos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


HOSPITALARES

TÓPICO 2 – A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


EDUCACIONAIS

TÓPICO 3 – A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO


DE INSTITUIÇÕES

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

53
54
TÓPICO 1 —
UNIDADE 2

A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


HOSPITALARES

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, falaremos sobre o trabalho do psicólogo
institucional nas instituições hospitalares, seus limites e alcances. Para tanto, a fim
de que possamos entender o exercício profissional de um psicólogo em ambiente
hospitalar, orientado pela Psicologia Institucional, precisaremos trabalhar alguns
conceitos que orientam a prática desse profissional.

A viabilidade do trabalho de um psicólogo no hospital está colocada


no quanto ele consegue analisar as dinâmicas institucionais e, com base nisso,
realizar um diagnóstico preciso da realidade. Acompanhe!

2 O TRABALHO DO PSICÓLOGO NA INSTITUIÇÃO HOSPITALAR


Ao começar pela definição do conceito de instituição, percebemos que há
acepções diversas e complexas.

FIGURA 1 – INSTITUIÇÃO HOSPITALAR

FONTE: <https://shutr.bz/3mDvaxs>. Acesso em: 15 jul. 2021.

De acordo com Bleger (1984), a instituição é uma organização permanente


de determinada característica da vida em coletivo, estruturada por regras,
normas, costumes, tradições e leis. O autor nos coloca que a instituição tem a
possibilidade de ser utilizada de modo abstrato (como exemplo, a Igreja Católica)
ou específico (um prédio, estabelecimento), tal como ilustrada na Figura 1, em
55
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

que é possível estabelecer a diferenciação entre a instituição como organização


(Hospital) e a instituição como conjunto de regras e normas que perpassa o fazer
coletivo. Assim, surge a diferenciação entre instituição e organização.

Sendo assim, de acordo com o autor, a instituição representa um composto


das normas, regras e práticas reunidas ao redor de preceitos e funções sociais.
De outro lado, Bleger (1984) define organização como um arranjo hierárquico
das funções que comumente acontecem dentro de uma área definida, como um
edifício, por exemplo.

Retomando essa diferenciação, conseguimos entender melhor a


especificidade do método de trabalho do psicólogo institucional dentro do
ambiente/organização hospitalar.

2.1 O AMBIENTE HOSPITALAR E O TRABALHO DO


PSICÓLOGO
Quando falamos do ambiente hospitalar, automaticamente temos a
referência de um lugar em que a fragilidade humana, a finitude da existência,
a doença e os limites do homem estão colocados. A Figura 2 ilustra a relação do
psicólogo hospitalar com o paciente em sofrimento, quando esse profissional em
seu trabalho precisa se defrontar constantemente com a fragilidade humana.

FIGURA 2 – O PSICÓLOGO NO HOSPITAL

FONTE: <https://shutr.bz/3iKYQrh>. Acesso em: 15 jul. 2021.

A prática de um psicólogo hospitalar está remetida ao funcionamento da


instituição, ao que o hospital, por exemplo, se propõe a tratar e às possibilidades
de entrada que o psicólogo tem no circuito do cuidado.

56
TÓPICO 1 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES

Entendemos que na mesma medida em que o hospital se coloca em uma


posição de cura, ele também pode ter efeitos de sofrimento para o paciente. O fato
de o paciente não poder delimitar seu tempo de internação, não poder escolher
qual tipo de tratamento será efetuado, o tempo e a hora de suas refeições, quando
fará a sua própria higiene – ou quando se sente invadido ao precisar ser higienizado
por outras pessoas – se está dividindo o quarto quando gostaria de ficar sozinho
ou o contrário são situações que dimensionam a posição de impotência em que o
paciente internado no hospital se localiza.

Sendo assim, o sofrimento de um paciente, tanto físico quanto psíquico,


em um hospital pode encontrar algum tipo de ressignificação no encontro com
o trabalho de um psicólogo. Poderíamos, então, nos questionar quais são as
possibilidades de atuação do psicólogo nesse contexto?

No entanto, é importante salientar que toda prática de um profissional em


qualquer ambiente em que ele esteja precisa estar pautada e orientada por uma
dinâmica própria, singular, produzida a partir das suas relações com o ambiente
em que trabalha, mas também seguir uma abordagem técnica.

De acordo com Bleger (1984), uma instituição se define não apenas


pela soma de elementos de existência física concreta, com determinado nível
de conservação no espaço e no tempo, mas também pela vida humana e pelos
eventos humanos que se dão no encontro com a estrutura, funções e metas
da instituição. Desse modo, a atuação de um psicólogo institucional deve ser
pensada no encontro com as características do ambiente ao qual se encontra.

Marlene Guirado (2004), uma importante pesquisadora sobre a Psicologia


Institucional, corrobora com a perspectiva de Bleger ao enxergar a instituição
como totalidade e dinâmica psíquica, mas vai além, colocando a urgência de se
analisar as relações de poder, para que os grupos possam apresentar consciência
de efeitos de dominação: na reprodução e naturalização do instituído (das práticas
já engessadas e sem questionamento, que podem estar produzindo adoecimento)
e no reconhecimento de que existem práticas que estão no campo consciente e
outras que estão no nível inconsciente, mas que continuam produzindo efeitos.

Guirado (2004) afirma, então, que a conduta de um psicólogo inserido


em uma instituição cabe ser dividida em duas: a primeira se orienta a partir de
ferramentas teóricas e técnicas, ensinadas pelo curso de Psicologia, trilhando uma
intervenção cujo objetivo foca no sujeito que está na instituição; e na segunda,
por outro lado, se põe em relevo a urgência de se analisar as subjetividades
produzidas nas relações institucionais. É esta última definição de conduta do
psicólogo que a autora utiliza em seus estudos.

De acordo com a autora, o psicólogo que se propõe a analisar como os


sujeitos se compõem a partir de como a instituição se organiza, sendo que esta o
atravessa, vai enfatizar a posição do sujeito na dinâmica institucional e não as
suas características ou capacidades pessoais de resiliência, por exemplo. Dessa

57
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

maneira, as desordens, os desvios e as inadequações do paciente não serão


pensados como, necessariamente, um sintoma do indivíduo que está no hospital,
mas como a sua posição diante do que a instituição e suas dinâmicas fazem
com ele. Por esta razão, na Figura 3 você poderá ver o quanto é importante que
se trabalhe com o paciente internado a partir de uma perspectiva biopsicossocial,
isto é, estar atendo a sua saúde biológica, psicológica e social.

FIGURA 3 – ABORDAGEM PSICOSSOCIAL

FONTE: <https://shutr.bz/3mEBnsS>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Assim sendo, Guirado (2004), em sua orientação de intervenção, enaltece


sua concepção de que os sujeitos/pacientes não devem ser tidos como coisas em
si, mas analisados a partir da constelação de suas representações e afetos, além
da maneira como estes estão integrados no discurso institucional.

2.2 LIMITES DO TRABALHO DE UM PSICÓLOGO HOSPITALAR


A PARTIR DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL
A partir do referencial de análise das dinâmicas institucionais que a
Psicologia Institucional nos oferece, traremos aqui alguns dos limites encontrados
no trabalho do psicólogo hospitalar.

É importante ressaltar que os médicos desempenham historicamente um


papel mais valorizado e reconhecido pela sociedade, em que vigora o pensamento
de que somente eles "poderão salvar as vidas" ali em sofrimento diante do
adoecimento, da fragilidade e da finitude da existência. Portanto, é comum a
prática dentro do espaço hospitalar em que é o médico que avalia a necessidade
ou não do trabalho do psicólogo com um determinado paciente.

58
TÓPICO 1 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES

Guirado (2004) entendeu essa relação como uma relação de poder, haja
visto que médicos não estariam em uma escala de superioridade de saber diante
de um psicólogo ou qualquer outro profissional dentro de um hospital, embora o
imaginário social caminhe nesse sentido.

Outro limite encontrado no exercício profissional do psicólogo no hospital


se localiza na ideia construída sobre a singularidade do trabalho do psicólogo por
outros profissionais na instituição. Quando se atende pessoas internadas, alguns
acreditam que o papel do psicólogo é garantir a adesão do paciente ao tratamento
esquematizado pelo médico, o que acontece também para outros profissionais que
precisam convencer o paciente a colaborar com os cuidados que o seu tratamento
requer para que ele melhore.

Quando um paciente traz queixas de dores persistentes e não adere ao


tratamento ou não quer tomar a medicação correspondente à dor, a entrada do
psicólogo para pacificá-lo e realizar o procedimento é requisitada. Contudo, o
psicólogo pode perceber que, ao permitir que os pacientes tragam suas questões,
eles apresentam certo desconhecimento a respeito de sua doença e sobre a
utilidade de determinado procedimento para a sua melhora. Isto é, em muitos
casos, o paciente não é bem-informado sobre o seu quadro de saúde, restando ao
psicólogo a função de lhe apresentar essa informação.

No entanto, essa não poderia ser a função de um psicólogo. Esse


profissional não está em um hospital para convencer o paciente ou adaptá-lo à
lógica hospitalar. Existe uma confusão acerca da especificidade do trabalho do
psicólogo em um hospital e, segundo Guirado (2004), essa confusão está ligada a
questões ideológicas das dinâmicas institucionais.

Ou seja, parece que à psicologia está reservado o lugar de falar os “não-


ditos” pertinentes à configuração do quadro do paciente, que outros profissionais
do hospital não conseguem dizer. O psicólogo acaba ocupando um lugar de
resolver os conflitos relativos à doença do paciente (tais como contar sobre a
gravidade, o tipo de tratamento etc.) e, como é impossível resolvê-los, pela
delicadeza que é lidar com esses processos, o psicólogo se vê diante da angústia,
da impotência e do medo de ser lido como incompetente.

As burocracias institucionais requerem lugares definidos e as relações de


poder que vigoram na lógica hospitalar não deixam com que se questione ou que
se proponha outras formas de pensar o que foi instituído.

O limite do trabalho do psicólogo está, então, em não aceitar esse lugar de


adaptar o paciente ao tratamento e nem de lhe oferecer a informação sobre o seu
quadro de saúde, mas o de oferecer um espaço em que estas notícias possam ser
trabalhadas da maneira como o paciente consegue lidar com essas informações.

59
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

2.3 POSSIBILIDADES DO TRABALHO DE UM PSICÓLOGO


HOSPITALAR A PARTIR DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL
Quais seriam as possibilidades de trabalho do psicólogo em um contexto
hospitalar orientado pela Psicologia Institucional?

Ismael (2005) nos dá algumas pistas para pensarmos que o trabalho do


psicólogo em um hospital deve ser focal, no que diz respeito ao sofrimento e à
ressonância que a doença e os efeitos da internação trazem para o paciente, em
conjunto com outros condicionantes, como a história de vida, o modo como ele
se organiza diante da doença e o seu perfil de personalidade.

Dessa forma, podemos pensar que a atuação do psicólogo hospitalar deve


caminhar no sentido de entender o sofrimento psíquico do paciente mediante
os acontecimentos de adoecimento do corpo e de sua hospitalização, além de
observar como a família encara esse processo, levando em conta sua subjetividade,
olhando-o como um sujeito singular, que transpassa a questão de sua doença
e que precisa ser considerado de modo global. Na Figura 4 você poderá ver a
importância do trabalho do psicólogo hospitalar estar pautado no trabalho em
equipe, no respeito as pessoas e pela divisão de responsabilidades.

FIGURA 4 – O TRABALHO NO HOSPITAL

FONTE: <https://shutr.bz/2YBi4bW>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Sendo assim, com relação ao trabalho do psicólogo em uma instituição


hospitalar, para que este seja de qualidade, é preciso respeitar as pessoas
(reconhecimento da diversidade), trabalhar em equipe (demonstração de
solidariedade), poder falar e saber escutar (ter autonomia), dividir responsabilidades
e estar aberto para aprender e melhorar sempre (equidade).

60
TÓPICO 1 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES

3 DESAFIOS E PROBLEMATIZAÇÕES DA ATUAÇÃO DO


PSICÓLOGO HOSPITALAR
O trabalho com pacientes gravemente doentes, muitas vezes com um
quadro definido de irreversibilidade, provoca nos profissionais de saúde
diferentes sentimentos, que devem ser sinalizados, com o objetivo de que possam
se avaliar e encontrar modos de executar seu trabalho adequadamente. A Figura
5 ilustra o sofrimento do paciente internado – é geralmente nestes quadros que se
dá a atuação do psicólogo hospitalar.

FIGURA 5 – DESAFIO DO PSICÓLOGO HOSPITALAR

FONTE: <https://shutr.bz/3oYL1K3>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Especificamente, o psicólogo, enquanto está cuidando do paciente


internado, entra em contato com a sua história de vida, suas motivações, seus
planos e objetivos a serem conquistados.

Porém, fica o questionamento: como este profissional pode enfrentar o


fato de se deparar com a interrupção das metas do paciente, tendo produzido
suas identificações e sentimentos por ele?

3.1 DESAFIOS DO TRABALHO DO PSICÓLOGO EM AMBIENTE


HOSPITALAR
O espaço hospitalar nos traz o forte contato com a delicadeza humana, a
dependência e a falta de controle.

Perante essas situações, Bock et al. (2003) entendem que, em sua atuação,
o psicólogo precisa investir na análise de seus limites perante a independência e
autonomia que o paciente deve exercer sobre sua própria vida, com atenção para
o psicólogo não ser mais um agente que limita as suas escolhas já restritas.

61
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

O psicólogo, portanto, não pode ser o agente que somente convence o


paciente a aderir ao tratamento, mas deve buscar ferramentas para fazer o
indivíduo se sentir ativo em suas escolhas.

Dessa maneira, os autores entendem a importância da constituição de


um vínculo terapêutico, isto é, ficar próximo do paciente, tentando acessar os
valores e comportamentos que são significativos para ele. A Figura 6 apresenta a
importância da constituição do vínculo terapêutico do psicólogo com o paciente
para que se estabeleça um bom trabalho.

FIGURA 6 – VÍNCULO TERAPÊUTICO

FONTE: <https://shutr.bz/3FqJz8S>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Quando está internada, a maioria dos pacientes se encontra acompanhada


por um familiar. Com isso, acompanhar uma pessoa internada é também estar na
presença da família, escutando suas queixas, lidando com suas angústias, seus
medos e suas dúvidas sobre o prognóstico do familiar hospitalizado.

A atuação do psicólogo junto aos familiares do paciente pode enriquecer


bastante o tratamento deste. Assim, oferecer ajuda e amparo ao familiar que
também pode adoecer, necessitando de atenção, constitui uma ferramenta
importante para a intervenção do psicólogo hospitalar.

De acordo com Lopes (2012), o lugar do psicólogo não está definido de


antemão em uma instituição, precisando ser definido conforme este profissional
vai se ambientando no hospital, a partir de uma aposta técnica e ética e afinada
com as metas e demandas institucionais. O trabalho dessa construção está
relacionado ao entendimento do funcionamento da instituição hospitalar: não só
às regras, leis e tradições, mas, também, à análise das relações que permeiam
aquele espaço. Em outras palavras: o psicólogo, em um hospital, deve estar
antenado à clientela e às demandas a serem atendidas, a sua orientação teórica e
prática, aos objetivos pretendidos na intervenção e ao contexto institucional.

As possibilidades de atuação do psicólogo institucional em ambiente


hospitalar estão atreladas à capacidade que ele tem de observar a dinâmica
institucional, estando atento para não se misturar a ela. Isso é possível quando

62
TÓPICO 1 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES

o profissional consegue colocar em análise a sua vivência, seus sentimentos


contratransferenciais (raivas, alegrias, medos, inseguranças, culpas, impotência
etc.) e, utilizando-se das ferramentas da Psicologia Institucional, constitui seu
diagnóstico dentro desse universo institucional.

Esse diagnóstico se refere à possibilidade de observar as relações de poder


que permeiam aquele espaço, criar consciência da dominação de alguns grupos
sobre outros, das naturalizações e da reprodução do instituído, do reconhecimento
e do desconhecimento de determinadas práticas.

De acordo com Bleger (1984), a atuação de um psicólogo na instituição


geralmente incomoda, pois este é um profissional que pode gerar ansiedades
e resistências até então não pensadas ou reprimidas, visto que seu trabalho é
pensar sobre o sofrimento.

Desse modo, é possível afirmar que a maior das possibilidades da atuação


do psicólogo em um hospital é sua capacidade em enfrentar as angústias que
serão nele transferidas e observar e ler a dinâmica institucional do espaço, para
que entenda os encargos e demandas que foram colocadas sobre ele e os demais
profissionais que compõem o espaço hospitalar.

ATENCAO

A importância de se analisar a dinâmica institucional está em entender


as razões pelas quais determinados reconhecimentos ou oportunidades de trabalho do
psicólogo não são permitidos em um hospital. Reconhecer essa questão é precisamente
uma oportunidade de sair um pouco da dinâmica repetitiva, se distanciar e analisar o lugar
que o psicólogo foi convidado a ocupar naquele ambiente e por quais razões. É importante
salientar que o psicólogo se distanciar para analisar melhor não significa que ele assuma
uma posição de não-trabalho ou destacada dos demais, ao contrário, poderá trabalhar de
maneira mais eficaz.

Essa consciência é tomada como libertadora, pois torna viável construir


propostas de intervenção mais eficazes ao levar em conta a dinâmica institucional
em que está inserido.

63
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

● A instituição representa um conjunto de normas, regras e práticas reunidas


ao redor de preceitos e funções sociais, e o termo “organização” remete ao
arranjo hierárquico das funções que comumente acontecem dentro de uma
área definida, como um edifício.

● A possibilidade do trabalho de um psicólogo no hospital se configura no


quanto ele consegue observar as dinâmicas institucionais nas quais está
inserido e, com base nisso, realizar um diagnóstico preciso da realidade.

● O limite do trabalho do psicólogo está em não aceitar o lugar de adaptar


o paciente ao tratamento e nem de lhe oferecer a informação sobre o seu
quadro de saúde, mas o de oferecer um espaço em que estas notícias possam
ser trabalhadas da maneira como o paciente pode escutar e lidar com essas
informações.

● É importante a constituição de um vínculo terapêutico no trabalho do


psicólogo hospitalar, isto é, ficar próximo do paciente, tentando acessar os
valores e comportamentos que são significativos para ele.

64
AUTOATIVIDADE

1 Para entendermos melhor o trabalho do psicólogo institucional dentro


do ambiente hospitalar, é importante que possamos fazer a diferenciação
do conceito de instituição utilizado pela Psicologia Institucional. Sobre a
diferenciação realizada por José Bleger, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A organização é uma instituição permanente de característica específica


da vida em coletivo, formada por regras, normas, costumes, tradições
e leis. Bleger nos coloca que a instituição tem a possibilidade de ser
concebida de modo abstrato (por exemplo, um prédio, estabelecimento)
ou específica (o casamento, por exemplo). Aí se dá a diferença entre
instituição e organização.
b) ( ) A instituição é uma organização permanente de determinada
característica da vida em coletivo, estruturada por regras, normas,
costumes, tradições e leis. Bleger nos coloca que a instituição tem a
possibilidade de ser utilizada de modo abstrato (como exemplo, a Igreja
Católica) ou específica (um prédio, estabelecimento), diferenciando
instituição e organização.
c) ( ) Para Bleger, a organização representa um composto das normas,
regras e práticas reunidas ao redor de preceitos e funções sociais. De
outro lado, a instituição é definida como a organização hierárquica
das funções que comumente acontecem dentro de uma área definida,
como um edifício, por exemplo.
d) ( ) Para Bleger, as organizações são estruturas ou mecanismos de ordem
social que regulam o comportamento de um conjunto de indivíduos
dentro de uma determinada comunidade, e as instituições se referem
aos estabelecimentos nos quais os indivíduos trabalham.

2 Quando falamos em ambiente hospitalar e do trabalho do psicólogo nesses


espaços, deve-se levar em consideração todo o contexto de fatores físicos e
psíquicos que ali ocorre nesse espaço. Sobre o descrio, analise as sentenças
a seguir:

I- Quando falamos do ambiente hospitalar, rapidamente nos remetemos a


um lugar em que será preciso lidar com a fragilidade humana, a finitude
da existência, a doença e os limites do homem.
II- A prática de um psicólogo hospitalar está remetida ao papel que ele
entende ser melhor executar, não estando necessariamente vinculada ao
que o hospital requer que ele desempenhe.
III- Entendemos que na mesma medida em que o hospital se propõe a ser um
espaço de cura, ele também pode ter efeitos de sofrimento para o paciente.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
65
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Marlene Guirado é uma renomada professora e pesquisadora da área


de Psicologia Institucional, e vai corroborar com a perspectiva de Bleger
quando este afirma que a instituição tem totalidade e dinâmica psíquica, mas
entende que o trabalho do psicólogo institucional em ambiente hospitalar
precisará ir além disso. Acerca do trabalho do psicólogo institucional,
classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Guirado insistirá na urgência de que o psicólogo institucional analise


as relações de poder, que os grupos possam apresentar consciência de
efeitos de dominação, na reprodução e naturalização do instituído (das
práticas já engessadas e sem questionamento, que podem estar produzindo
adoecimento) e no reconhecimento de que existem práticas que estão
no campo consciente e outras que estão no nível inconsciente, mas que
continuam produzindo efeitos.
( ) Guirado vai afirmar que um psicólogo inserido em uma instituição precisa
se orientar a partir de ferramentas teóricas e técnicas ensinadas pelo curso
de Psicologia, trilhando uma intervenção cujo objetivo foca no que é
demandado pelo hospital.
( ) Guirado vai enaltecer sua concepção de que os sujeitos/pacientes não
devem ser tidos como coisas em si, mas analisados a partir da constelação
de suas representações e afetos, além de como estes estão integrados no
discurso institucional.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – F – V.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 A partir do referencial de análise das dinâmicas institucionais que a


Psicologia Institucional nos oferece, é preciso reconhecer que o psicólogo
hospitalar encontra alguns entraves, impasses e limites na realização de
seu trabalho na instituição. Disserte sobre os limites encontrados pelos
psicólogos hospitalares a partir da perspectiva da Psicologia Institucional.

5 O trabalho do psicólogo hospitalar se encontra no fio da navalha entre


o profissional que vai ajudar a todos a lidar, de alguma maneira, com o
sofrimento produzido diante da fragilidade da existência e, na mesma
medida, com a necessidade de ajudar as pessoas a lidarem com o sofrimento.
Disserte sobre as possibilidades do trabalho do psicólogo hospitalar.

66
TÓPICO 2 — A
UNIDADE 2

PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NAS INSTITUIÇÕES


EDUCACIONAIS

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 2, abordaremos as contribuições da Psicologia


Institucional para o universo escolar e o papel do psicólogo institucional nas escolas.

Ao tentarmos responder de que maneira a escola pode contribuir para


a formação e o desenvolvimento dos indivíduos que dela fazem parte, e quais
são as possibilidades de trabalho do psicólogo no território escolar, estaremos
explorando o potencial de trabalho que existe ali, ao mesmo tempo investindo na
análise de quais efeitos esses trabalhos produzem na formação de subjetividades.

A escola teve e continua tendo um papel bastante relevante para a nossa


sociedade, lugar em que se instrumentaliza a maior parte dos processos educativos
da vida de um indivíduo, portanto, nos cabe entender essa grandiosidade e o
papel que ela cumpre nas nossas vidas e na formação da nossa coletividade.

2 CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL AO


UNIVERSO ESCOLAR
O diferencial trazido pela Psicologia Institucional se coloca no conceito de
instituição com que esta vertente trabalha: relações sociais que se repetem e que pela
repetição instituem práticas e naturalizações. Esse reconhecimento das instituições
pela sociedade dá a entender que as situações sempre se deram dessa maneira e
nunca apresentaram formas de ser diferentes antes na história (CORRÊA, 2010).

FIGURA 7 – AMBIENTE ESCOLAR

FONTE: <https://shutr.bz/3iEVAhh>. Acesso em: 15 jul. 2021.

67
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

Quando falamos da escola, por exemplo, estamos falando de uma


invenção da modernidade, ou seja, ela não existe desde sempre. No entanto, é
difícil imaginar esse formato de ensino não convencionado em escolas tal como
conhecemos hoje. Na Figura 7, você pode ver crianças correndo no pátio escolar,
dando a entender sobre a intimidade que as crianças desenvolvem logo cedo com
este espaço que parece que sempre fez parte da sociedade. Docentes e estudantes,
na configuração das salas de aula, na repetição dos rituais cotidianos, dos horários
estabelecidos, nas disciplinas de corpos e pensamentos, pensam que podem até
modificar algum ponto aqui, outro ponto acolá da escola, dos currículos, das
posições em sala de aula ou da inserção da tecnologia, mas nunca a escola em si.
Para ensinar é necessário ter a escola. Sempre foi assim.

A Figura 8 ilustra a estrutura de uma sala de aula em que ali está presente
a configuração das relações de poder, as disciplinas de corpos e pensamentos etc.

FIGURA 8 – SALA DE AULA

FONTE: <https://shutr.bz/2ZY0fEn>. Acesso em:15 jul. 2021.

ATENCAO

Ano após ano, professores e alunos na mesma configuração das salas de aula,
na repetição dos rituais cotidianos, dos horários estabelecidos, nas disciplinas de corpos e
pensamentos. Mudamos algum ponto aqui, outro ponto acolá da escola, dos currículos, das
posições em sala de aula ou da inserção da tecnologia, mas nunca a escola em si.

Quando se propõe trabalhar com a Psicologia Institucional, é preciso


desnaturalizar as instituições, colocá-las em seu contexto histórico, interrogar a
que e a quem elas servem e analisar os efeitos de seus discursos.

68


2.1 ANÁLISE DA ESCOLA PELA PSICOLOGIA INSTITUCIONAL


Seja uma escola com perspectiva interacionista, construtivista, histórico-
crítica ou outra proposta de trabalho, o que se pode perceber é que, no fundo, no
aspecto humano, a escola permanece antiga; os discursos produzidos, na maioria
das vezes, continuam os mesmos de algumas décadas atrás.

Em ambiente escolar, é comum escutar de docentes algumas queixas com


relação aos desmandos de coordenadores e supervisores sobre seus trabalhos
e, na contramão disso, ainda continuam querendo receber uma programação
pronta para suas aulas. Outra prática comum é a queixa de que os alunos não
querem aprender. Por sua vez, da parte dos alunos, há algumas resistências em
aprender a pensar, quando isso significa sair de seu lugar de ouvinte e assumir
uma posição mais autônoma. E a questão que paira no ar: de quem é a culpa do
fracasso escolar? As análises que não conseguem sair dos binarismos – culpa do
professor, do aluno ou da família – ou da caçada a um culpado. A Figura 9 vai
ilustrar o momento em que o corpo escolar (professores, direção, alunos) irão
apontar para a individualização do fracasso escolar, culpabilizando o aluno pelo
seu mau desempenho ou dificuldade de aprendizagem, por exemplo.

FIGURA 9 – JULGAMENTO

FONTE: <https://shutr.bz/3aiHUUn>. Acesso em: 15 jul. 2021

O mais importante no entendimento de instituição trazido pela Psicologia


Institucional é que ela nos convoca, seja professor, aluno, família, psicólogo ou
qualquer outro agente escolar, a nos comprometermos com a mudança. É a nossa
ação que faz a instituição, ou seja, são as nossas ações que constituem a escola,
que a reproduzem e legitimam do jeito que ela é.

Dessa maneira, não existe motivo para conceber a instituição como um corpo
estranho, acima de nossas cabeças, com vida própria e independente de nós. Somos
nós que a fazemos. E, mesmo que na nossa consciência ou na nossa prática cotidiana
não reconheçamos tanto esse fato, concebemos a escola como natural e legítima.
Não podemos nos eximir, assim, de nosso papel como sociedade de pensá-la.

69
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

Ademais, toda instituição produz um objeto (imaterial, impalpável): é aquilo


(ou a relação básica) em nome de que ela se faz, e cuja apropriação é requerida em
um estabelecimento de esfera de ação com outras instituições (ALBUQUERQUE,
2004). A cura, por exemplo, pode ser lida como objeto das instituições médicas;
o das instituições escolares podemos dizer que tem como objeto não somente o
ensino formal, mas também a direção e a disciplina dos atos dos estudantes, para
dentro e fora dos muros escolares, com a concordância (e a convite) da família
(por exemplo, demonstrada pelas palestras de médicos, psicólogos e educadores
sobre o uso de drogas, que as escolas têm disponibilizado aos familiares, inclusive
a pedido destes). A Figura 10 ilustra o momento em que os pais – como clientes
de uma escola – irão conversar com a escola, a fim de entender alguma demanda,
mostrando as relações de poder que perpassam o território escolar.

FIGURA 10 – RELAÇÃO COM O CLIENTE

FONTE: <https://shutr.bz/3BwHwOo>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Por fim, ainda é possível ressaltar que a escola, geralmente, se afirma no


e pelo relacionamento com a clientela, isto é, na relação dos profissionais com os
clientes dessas instituições. Os clientes (seja o agente público ou os pais) solicitam
um tipo de serviço e a escola se destina a cumpri-lo. É nessa relação que se configura
a tensão entre posse e alienação do objeto institucional, ou seja, uma relação de
poder que produz efeitos nas relações escola-aluno, professor-aluno.

DICAS

Um filme muito interessante para pensar acerca dos questionamentos sobre a


instituição escola é a produção Quando sinto que já sei (2014).

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=HX6P6P3x1Qg&t=14s. Acesso em 15


jul. 2021.

70


E nisso a gente pode se perguntar: será que esse professor ou esse aluno
tem sido convidado a dizer, sinceramente, o que pensa e sente quanto às definições
estabelecidas e das quais eles serão os principais agentes?

2.2 PSICOLOGIA INSTITUCIONAL E SUAS CONTRIBUIÇÕES


PARA O UNIVERSO ESCOLAR
Com o objetivo de entender melhor o processo de desempenho das
instituições escolares e as dinâmicas institucionais que, por muitas vezes, podem
produzir exclusão, a Psicologia Institucional elaborada por José Bleger (1984)
pode nos ajudar a visualizar como esse campo pode ajudar no investimento na
saúde mental dos indivíduos relacionados à dinâmica educativa.

A Psicologia Institucional investe, então, em uma junção contínua entre


a problematização, a interpretação das relações que compõem a instituição e a
própria ação. Dessa forma, intenciona promover a ressignificação dos discursos
que atravessam o dia a dia escolar, proporcionando a transformação das questões
naturalizadas pelas repetições cotidianas, mas que não deixam de produzir
sofrimento. O questionamento das práticas escolares pelos movimentos que a
Psicologia Institucional propõe permite a mudança nas relações interpessoais
problemáticas, que só fazem paralisar qualquer possibilidade de invenção no
processo educativo.

Quando tomamos a instituição e, mais singularmente, as relações


institucionais como objeto de análise e intervenção, e por meio da investigação das
representações imaginárias e práticas que já se encontram cristalizadas na escola,
estamos dizendo o tipo de intervenção realizada pela Psicologia Institucional.
Principalmente quando o objetivo dela é fazer com que se mantenha a capacidade
do pensamento crítico em uma sociedade que quer a todo momento estagnar.

O exemplo disso é quando a Psicologia Institucional entende que


para haver mudanças na escola e, portanto, na sociedade, é necessário que os
sujeitos (professores, alunos, pais, coordenadores) se proponham a ir atrás de
sua autonomia. A Figura 11 ilustra a importância que tem para a psicologia
institucional os espaços em que é possível problematizar as relações interpessoais
e a autonomia para poder pensar e repensar seus lugares no cotidiano escolar,
propiciando a invenção no processo educativo

71
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

FIGURA 11 – TRABALHO EM EQUIPE

FONTE: <https://shutr.bz/3Ftp0Zk>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Autonomia para conhecer e resolver como se posicionar diante das


propostas que lhe são apresentadas ou até impostas. Autonomia para poder
repensar os seus lugares, os lugares que são conferidos a eles, se eles devem
obedecer cegamente ou constituir práticas que façam sentido no cotidiano escolar.
Autonomia como efeito de uma edificação e de uma conscientização pessoal (o
saber sobre si), que tenha como efeito um indivíduo investido de escolher e de se
comprometer com ela (LANE, 2012).

2.3 GRUPOS OPERATIVOS NAS ESCOLAS


Vimos que os discursos institucionais são propensos a manter o igual
e preservar sua permanência a produzir repetições. É possível, por exemplo,
verificar na fala de alguns professores já descrentes na instituição escolar a
afirmação “não vai dar certo”, para qualquer intervenção ou proposta diferente
que se apresente. No entanto, ainda existem aqueles que acreditam que podem
operar mudanças no que já está determinado.

De acordo com Patto (1984, p. 12), é na função de “auxiliar de produção”


de operação de mudanças que um psicólogo pode definir seu lugar na escola.

Pela via do grupo operativo com professores, alunos, equipe técnico-


administrativa e pais, em que o objetivo é o debate sobre as diversas características
que fazem o operar educativo (motivação, responsabilidade, expectativas, angústias
e conflitos, papéis, representações, relações com o contexto sócio-histórico etc.), é
possível verificar em conjunto a comunidade escolar o nível de entendimento que
estes têm da lógica de funcionamento dentro e fora dos grupos, o nível de saber
sobre as problemáticas que perpassam a escola, as dificuldades presentes e o grau
de autonomia que estes têm para propor soluções.

72


Sabemos que a prática educativa se torna difícil, pois além de ser


atravessada por questões financeiras e de má conservação de suas estruturas
(quando estas são públicas), ainda apresentam a questão das subjetividades dos
indivíduos que podem se tornar um fator complicador.

O corpo escolar, em muitos momentos, sabe identificar as soluções


requeridas aos problemas, pois sabe bem das leis e do funcionamento das lógicas
educativas; no entanto, entre o saber e o fazer existe a ação. O saber de algo
remete a uma dedicação pessoal maior (o querer saber), um envolvimento maior
de apropriação e de edificação do conhecimento, que vai além do estar apenas
informado, posto que entre o saber e o desejo de fazer algo com esse saber, torna-
se necessário sair da estagnação.

Um dos grandes entraves do nosso tempo na prática educativa é pensar


em termos de coletividade. A contrariedade em se trabalhar em grupo faz cair
até as soluções que já se sabem. Os psicólogos institucionais, ao elaborarem o
diagnóstico institucional, podem enfrentar a falta de clareza por parte da equipe
pedagógica ou da comunidade escolar com relação a esses fatores de inação ou
da dificuldade de se pensar coletivamente.

Sendo assim, cabe a pergunta: como constituir a escola como um


espaço de criatividade, de desenvolvimento, de autonomia, se esta se encontra
impossibilitada de se mobilizar? Como investir no fazer coletivo sem antes
entender a vontade da coletividade condizente a este fazer? (LANE, 2012).

Segundo Bleger (1984), o trabalho com a informação é de fundamental


importância, pois a transformação na instituição escolar passa, antes de tudo,
pela transformação nos sujeitos, os quais corporificam a instituição, ao passo que,
na mesma medida, nela colocam suas ansiedades mais primitivas.

Dessa forma, o que o autor quer dizer é que é preciso que as pessoas possam
se implicar em um conhecimento sobre si, sobre o outro, sobre a instituição e as
relações que perpassam a escola. Por isso, a relevância do trabalho com grupos
nas instituições, não tentando constituir um espaço de paz nos grupos ou em que
os conflitos sejam amenizados, muito menos excluir as diferenças individuais
para chegar a uma atmosfera mais harmônica ou a um denominador comum.

Quando Bleger elege o grupo operativo como método de trabalho, ele


fala no favorecimento de espaços em que as diferenças possam aparecer e ser
objeto de análise, em que a prática grupal possa ser a superação de processos
narcísicos, tendo como efeito relações mais saudáveis e produtivas, em que a
atividade educativa possa estar mais enriquecida e forte.

Por fim, é importante trazer uma fala sobre grupos em que o próprio
Bleger (1984, p. 52) afirma:

73
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

O melhor grau de dinâmica de uma instituição não é dado pela


ausência de conflitos, mas sim pela possibilidade de explicitá-los,
manejá-los e resolvê-los dentro do limite institucional, quer dizer, pelo
grau em que são realmente assumidos por seus atores e interessados
no curso de suas tarefas ou funções.

3 O PAPEL DO PSICÓLOGO AO INTERVIR NA ESCOLA


O que o psicólogo tem encontrado na sua prática profissional tem sido
cada vez mais desafiante, expondo que ainda é preciso modificar e repensar não
só a sua prática em âmbito escolar, mas a própria instituição escolar, quando essa
ainda se faz fonte de exclusão e de reprodução de práticas desiguais.

Reorganizar a função da escola, seja na vida de cada um, seja na sociedade


como um todo, pensando que ela ainda é um elemento de ampliação das
desigualdades sociais vigentes na nossa sociedade, é importante, posto que ela se
afirma e reafirma como lugar educativo.

Então, se a função da escola é educativa, é importante que se faça a


pergunta da posição de um psicólogo, quando este é convocado a trabalhar no
espaço escolar: qual é o papel do psicólogo que se dispõe a intervir em uma escola?

3.1 DEMANDAS ESCOLARES AOS PSICÓLOGOS


Quando um psicólogo chega para trabalhar em uma escola, é muito comum
escutar a seguinte demanda: “será que vocês, psicólogos, não conseguem dar um
jeito naquela criança ali que não quer aprender ou fica conversando o tempo todo
e não fica bem-comportada em sua cadeira?”. E, quando o psicólogo problematiza
essa fala, questionando sobre o quanto o ambiente em que esta criança se encontra
pode estar sendo o que está contribuindo para o comportamento referido, em
resposta, o psicólogo recebe: “é verdade, tudo o que a gente faz aqui, os pais
desorganizam!”. Ou: “não se tem o que fazer para sanar a falta afetiva, financeira
e cultural dessas crianças, é uma mazela social”. Como você pode ver, a Figura
12 ilustra a demanda clínica que, geralmente, a escola faz ao psicólogo escolar,
solicitando que este profissional intervenha no mau comportamento, timidez, nas
relações interpessoais etc..

74


FIGURA 12 – DEMANDA ESCOLAR NO TRABALHO COM O PSICÓLOGO

FONTE: <https://shutr.bz/3oK96nv>. Acesso em 15 jul. 2021.

O que é importante analisar nessa intervenção é que qualquer justificativa


serve para não lidar com o sentimento de impotência. Na contramão disso, a
menção ao universo familiar e social retira a chance de se levar em conta outro
âmbito em questão: o escolar (CÔRREA, 2010).

As demandas da escola direcionadas aos psicólogos seguem na via desse


trabalhar/melhorar/consertar as relações interpessoais, a comunicação, a motivação
de estudantes e de docentes, os transtornos psicológicos, as dificuldades de
aprendizagem, os comportamentos dissonantes (o aluno-problema), geralmente
com propostas de intervenção clínica e terapêutica, além de driblar a oposição a
modificações na escola.

3.2 A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL FRENTE ÀS DEMANDAS


ESCOLARES
O psicólogo escolar, por vezes, é demandado a atuar sob a perspectiva
terapêutica e, por essa via, pode acabar reforçando alguns estereótipos
pedagógicos, como a do fracasso escolar do estudante, ou a estigmatização da
“família carente”. A Psicologia Institucional propõe pensar que a Psicologia do
Escolar – que pressupõe a atuação sobre o “aluno-problema” – possa introduzir
uma Psicologia Escolar, que invista no entendimento de que a escola é um
microcosmos social, e que nele se produz e reproduz diversos modos e graus de
relacionamentos. A psicologia escolar se proporia, assim, a pensar um espaço de
ação psicológica que parta de uma proposta preventiva e entenda a instituição
escolar de forma global.

75
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

Respondendo, assim, à pergunta sobre qual seria o papel do psicólogo no


ato de intervir em uma escola, temos: não o de ser mais um agente de reprodução
de exclusão e de estereótipos sobre o aluno e a sua família, ao produzir diagnósticos
psicológicos que mais afastam o aluno da escola e da sua possibilidade inventiva,
mas sim o de ser um agente de mudanças nas relações sociais (GUIRADO, 1987).

DICAS

O filme Pro dia nascer feliz (2007) é um documentário brasileiro muito importante,
que traz os universos escolares, tanto da esfera pública quanto da particular.

Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=nvsbb6XHu_I. Acesso em: 15 jul. 2021.

Valore (2008) traz exemplos de experiências de psicólogos no universo


escolar. Ela conta que seus estagiários de psicologia se encontraram com alguns
estudantes que estavam perfilados em suas carteiras, de frente para um corredor.
Seus estagiários observaram que cada docente ou outro funcionário que passava
por esses alunos lhes chamavam a atenção, dando a entender que os estudantes
estavam cumprindo um castigo por algum mau comportamento que tiveram. Os
estagiários da psicologia perguntaram, então, o que havia acontecido para que
eles estivessem sendo castigados e tiveram a resposta: “Ah! Não sei não, mas
coisa boa não é!”. Ainda assim, mesmo sem saber o motivo pelo qual reprimiram
os estudantes, eles continuavam a penalizá-los.

Segundo a autora, esse episódio aconteceu logo após eles terem realizado
um trabalho de intervenção com grupos operativos naquela escola, o que a levou
a pensar em como o psicólogo pode se sentir frente às possibilidades de trabalho
em uma instituição tão direcionada à repetição e reprodução das instituições de
penalidades e castigos. A Figura 13 ilustra que a escola, embora insira algumas
mudanças, acaba incorrendo a penalidades e castigos como forma de educar.

76


FIGURA 13 – CASTIGOS NA ESCOLA

FONTE: <https://shutr.bz/3iK9xdM>. Acesso em 15 jul. 2021.

Nesses momentos, é crucial que o psicólogo se coloque constantemente em


análise e consiga reavaliar suas expectativas frente às limitações de seu trabalho
e frente à cristalização de práticas da instituição.

3.3 O PSICÓLOGO CLÍNICO E A PSICOLOGIA


INSTITUCIONAL
Mencionamos aqui que a demanda majoritária da escola acaba sendo a do
trabalho clínico do psicólogo. A perspectiva da Psicologia Institucional diante
da atividade de escuta clínica do psicólogo, em que a instituição passa a ser o
cliente de análise, proporciona possibilidades interessantes para a construção da
autonomia escolar, constituindo esse espaço como um lugar de desenvolvimento
e inventivo.

Na atividade de escuta clínica, se prioriza o método da Psicologia


Institucional que foi elaborado por Bleger. De acordo com Bleger, a atividade
institucional se referencia pela proposta clínica cunhada pela Psicanálise, que
será compatível com as urgências da instituição em que se trabalha. Esse método
se vale da observação detalhada, meticulosa e total, em que é preciso haver a
investigação do ambiente antes de qualquer ação, em uma correlação dialética
entre a compreensão e a intervenção, exercida a partir do enquadre do local, da
atividade e das práticas a serem investidas e que exigem do psicólogo saber lidar
com um “grau de dissociação instrumental” que, de acordo com Bleger (1984, p.
48) seria um instrumento que, ao psicólogo,
[...] permita, por um lado identificar-se com os acontecimentos ou
pessoas, mas que por outro, lhe possibilite manter com eles uma certa
distância que faça com que não se veja pessoalmente implicado nos
acontecimentos que devem ser estudados e que seu papel específico
não seja abandonado (p. 48).

77
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

ATENCAO

O método de trabalho para o psicólogo, de acordo com José Bleger pode ser
esquematizado da seguinte maneira:
• enquadre do local, da atividade e das práticas a serem investidas pelo psicólogo;
• observação detalhada;
• investigação;
• compreensão e intervenção.

De outro lado, quando se trabalha com a Psicologia Clínica na instituição,


é entendido que se deve atuar no campo do atendimento psicoterápico dos
sujeitos que, de algum modo, trazem desvios em seu comportamento e que,
assim, incomodam o funcionamento da escola.

Trazendo de modo mais esquematizado, a proposta de escuta clínica


investe na posição do sujeito na dimensão institucional, analisando os diferentes
contextos que atravessam aquele sujeito ou aquela questão que aparece como um
problema para a escola. Já a psicologia clínica está mais focada na personalidade
ou nas capacidades individuais. A figura 14 traz a proposta da psicologia clínica
que é mais centrada no atendimento individual, na análise da personalidade ou
nas capacidades individuais do aluno contrapondo-se a perspectiva da escuta
clínica proposta pela Psicologia Institucional que acredita na análise da posição
que o sujeito ocupa na dimensão institucional, tomando como exercício o olhar
sobre as relações de poder que atravessam aquele sujeito.

FIGURA 14 – ATENDIMENTO DO PSICÓLOGO NA ESCOLA

FONTE: <https://shutr.bz/3uUzH2d>. Acesso em 15 jul. 2021.

78


Em resumo, o trabalho do psicólogo institucional está direcionado para


pensar o desenvolvimento pessoal e profissional de todas as pessoas relacionadas
ao espaço escolar, tornando possível refletir sobre a concepção de educação, escola,
aprendizado, função do docente e da comunidade e as expectativas da sociedade
na escola. Nesse processo de reflexão, busca-se trazer possibilidades de pensar
as situações de maneiras diferentes, deslocando certezas arraigadas, saindo das
soluções fáceis e punitivas e favorecendo o potencial criativo da escola, de modo
que ela possa ressignificar os processos de pulsão de morte.

79
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

● O diferencial trazido pela Psicologia Institucional se coloca no conceito de


instituição com que esta vertente trabalha: relações sociais que se repetem e
que pela repetição instituem práticas e naturalizações.

● A Psicologia Institucional investe, então, em uma junção contínua entre a


problematização, a interpretação das relações que compõem a instituição e
a própria ação. Dessa maneira, intenciona promover a ressignificação dos
discursos que atravessam o dia a dia escolar, proporcionando a transformação
das questões naturalizadas pelas repetições cotidianas, mas que não deixam
de produzir sofrimento.

● Existe uma diferença entre a atividade de escuta clínica e a psicologia clínica


na instituição.

● O trabalho do psicólogo institucional está direcionado para pensar o


desenvolvimento pessoal e profissional de todas as pessoas relacionadas ao
espaço escolar, tornando possível refletir sobre a concepção de educação e
escola, trazendo possibilidades de pensar as situações de maneiras diferentes.

80
AUTOATIVIDADE

1 A Psicologia Institucional nos introduz ao conceito de instituição, com a


qual ela trabalha e operacionaliza a sua prática de intervenção. Sobre o
modo como a Psicologia Institucional se refere ao seu trabalho em território
escolar e como poderíamos nos referir à escola como objeto de intervenção
da Psicologia Institucional, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Quando falamos da escola, estamos falando de uma instituição que


sempre existiu. Era possível identificá-la no período socrático, a
forma que os filósofos transmitiam seu conhecimento a partir dos
estabelecimentos escolares.
b) ( ) Quando falamos da escola, estamos falando de uma invenção da
modernidade, ou seja, ela não existe desde sempre. No entanto, é difícil
imaginar este formato de ensino não baseado em escolas tal como
conhecemos hoje. Para a Psicologia Institucional, então, seria preciso
desnaturalizar a escola e suas práticas.
c) ( ) Quando falamos da escola, estamos falando de uma invenção da
antiguidade, ou seja, ela não existe desde sempre. No entanto, é difícil
imaginar esse formato de ensino não configurado em escolas tal como
conhecemos hoje. Para a Psicologia Institucional, é preciso legitimá-la
como forma de transmissão de conhecimento.
d) ( ) Quando falamos da escola, por exemplo, estamos falando de uma
invenção da modernidade, ou seja, ela não existe desde sempre. No
entanto, é difícil imaginar esse formato de ensino não configurado em
escolas tal como conhecemos hoje. Para a Psicologia Institucional, é
preciso produzir outras instituições que deem conta do ensino, porque
as escolas estão ultrapassadas.

2 Seja uma escola com perspectiva interacionista, construtivista, histórico-


crítica ou outra proposta de trabalho, o que se pode perceber é que, no fundo,
no aspecto humano, a escola permanece antiga; os discursos produzidos,
na maioria das vezes, continuam os mesmos de há algumas décadas. Com
base nas análises das práticas e discursos que circulam no território escolar,
analise as sentenças a seguir:

I- Em ambiente escolar, é comum escutar de docentes algumas queixas


com relação aos desmandos de coordenadores e supervisores sobre seus
trabalhos que, na contramão disso, ainda continuam querendo receber
uma programação pronta para suas aulas.
II- Em ambiente escolar, é comum a queixa de que os alunos não querem
aprender. Por sua vez, da parte dos alunos, há alguma resistência em
aprender a pensar, quando isso significa sair de seu lugar de ouvinte e
assumir uma posição mais autônoma.
III- Na maioria das vezes, a culpa do fracasso escolar de um estudante recai
sobre a sociedade.
81
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Com o objetivo de entender melhor o processo de desempenho das


instituições escolares e as dinâmicas institucionais que, por muitas vezes
podem produzir exclusão, a Psicologia Institucional, elaborada por José
Bleger (1984), pode nos ajudar a realizar modos mais sólidos de visualizar
como essa área do conhecimento pode ajudar no investimento na saúde
mental dos indivíduos relacionados à dinâmica educativa. Sobre o trabalho
da Psicologia Institucional nas escolas, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

( ) A Psicologia Institucional trabalha a partir de uma ação conjunta entre a


problematização, a interpretação das relações que compõem a instituição
e a própria ação, intencionando promover a ressignificação dos discursos
que atravessam o dia a dia escolar, proporcionando a transformação das
questões naturalizadas pelas repetições cotidianas, mas que não deixam
de produzir sofrimento.
( ) O questionamento das práticas escolares pelos movimentos que a
Psicologia Institucional propõe a mudança nas relações interpessoais
problemáticas, que só fazem paralisar qualquer possibilidade de invenção
no processo educativo.
( ) Quando a Psicologia Institucional atua, ela deve tomar o aluno
problemático como objeto de análise e intervenção e, por meio da
investigação das representações imaginárias do aluno, promover a
resolução do problema que ele está causando na estrutura escolar.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Os discursos institucionais na escola são propensos a se repetir, na alusão


de manter o igual e sua permanência a produzir repetições. Disserte sobre
como o psicólogo institucional pode intervir em mudanças na escola.

5 O psicólogo que é convocado a atuar em espaço escolar, por vezes, é


demandado a trabalhar sob a perspectiva terapêutica, na produção de
psicodiagnósticos, melhorando as relações interpessoais, aumentando a
motivação dos alunos, tratando os que se desviam da conduta esperada
pela escola. Disserte sobre a diferença entre o psicólogo clínico na escola e
a Psicologia Institucional diante da atividade de escuta clínica.

82
TÓPICO 3 —
UNIDADE 2

A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO


DAS INSTITUIÇÕES

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 3, trabalharemos as demandas dirigidas ao psicólogo
usualmente e veremos, também, como a Psicologia Institucional entende que
se deve operar a partir e com essas demandas e expectativas sobre a atuação do
psicólogo.

Neste tópico, traremos ainda alguns conceitos e perspectivas da análise


institucional e da psicanálise para sustentar a prática da Psicologia Institucional.

Por último, veremos um estudo de caso que traz a dimensão das relações
institucionais na composição de um diagnóstico de um paciente.

2 MARLENE GUIRADO E A ANÁLISE INSTITUCIONAL DE UM


CASO DE PSICODIAGNÓSTICO
O entendimento social que se tem sobre o trabalho de um psicólogo
geralmente segue pela via de que este profissional pode realizar psicodiagnósticos.
O psicodiagnóstico nada mais é que a possibilidade de realizar um estudo de caso
em que, no final, se produza um diagnóstico psicológico do indivíduo avaliado.

O instrumental utilizado para a realização do psicodiagnóstico é


diversificado, mas se compõe de entrevistas e aplicação de testes psicológicos;
pode-se, também, usar a caixa de ludo (material lúdico para crianças) ou seus
correspondentes para adolescentes e adultos. Em termos teóricos, segue pela
escolha da linha teórica de cada profissional psicólogo que se propõe a trabalhar
com a avaliação psicodiagnóstica.

O que chama a atenção nessas avaliações é a formatação de que de um


lado existe um sujeito que busca ajuda e se expõe à análise de outro que, por
outro lado, se entende como sendo especializado na avaliação de seu problema.
Toda intervenção diagnóstica se constitui e se sustenta nesta convicção: de que
um especialista com seus recursos técnicos chegará à verdade sobre o que tem
produzido o seu desconforto ou angústia.

83
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

Cabe ressaltar que essa relação de alguém que sabe (especialista) e


detém um saber sobre o outro que não sabe (paciente) não é específica do
psicodiagnóstico; podemos afirmar que essa é uma prática instituída, ou seja,
que a relação já está colocada de antemão e que, na maioria das vezes, não é
questionada. O que se entende é que a relação profissional-cliente está permeada
por um conjunto de expectativas e definições.

Sendo assim, segundo a Psicologia Institucional, essas relações são a marca


das instituições: um efeito de reconhecimento/desconhecimento "naturaliza"
nosso fazer, ou seja, já existe uma autorização prévia desse funcionamento (uma
pessoa que não sabe sobre si vinculada a uma pessoa que sabe) e, segundo Guirado
(2000), esse funcionamento se dará mediatizado por recursos discursivos, que
são os instrumentais teóricos do psicólogo.

É por meio do discurso que pode ser tomado também como ato, como
dispositivo que fabrica as palavras e as ideias – que estruturam as expectativas,
as verdades, as apropriações dos direitos de fala e das posições. Toda essa
composição é material de trabalho da Psicologia Institucional.

2.1 TODO PSICODIAGNÓSTICO É UM ESTUDO INSTITUCIONAL


Um diagnóstico psicológico pode ser realizado como parte de um
processo psicoterapêutico, ou para a entrada no processo, em uma avaliação
psicodiagnóstica exclusiva e sem finalidade psicoterapêutica, em espaços
escolares, hospitalares, empresas e outros mais. De acordo com Guirado (2004),
todo diagnóstico psicológico é sempre um estudo institucional.

Em uma situação de consultório, por exemplo, estando o psicólogo diante


de seu cliente-paciente que lhe solicitou o estudo ou avaliação, escutará o que lhe
é trazido pelo paciente com os termos que compõem a sua base teórica, isto é, vai
escutar como queixa, fantasia, destrutividade, voracidade, paranoia, reparação,
culpa, inveja ou, ainda, como demanda, desejo, necessidade, fantasma, discurso
imaginário, palavra plena e assim por diante. Como você pode ver na Figura 15, é
mostrada uma situação de consultório em que o psicólogo diante de seu paciente
faz a escuta a partir da sua base teórica, sendo assim, a análise do paciente estará
atravessada por esse modo de olhar da teoria do psicólogo.

84
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

FIGURA 15 – PROCESSO PSICOTERAPÊUTICO

FONTE: <https://shutr.bz/3AjzS8s>. Acesso em 15 jul. 2021.

Quando um psicólogo traz a sua descrição de um caso, percebe-se (com


algum conhecimento prévio) em qual abordagem ele está se amparando, isto
é, podemos identificar o discurso que instrumentalizou sua escuta. De outro
modo, o psicólogo que segue, por exemplo, o viés da psicanálise, vai tirar suas
conclusões a partir desse referencial.

Essa construção de pensamento não segue pela via da desqualificação


do trabalho do psicólogo e da relação que ele constitui com seu paciente/cliente,
mas nos leva a uma postura de edificar eticamente o atendimento psicológico em
outras bases.

Para a Psicologia Institucional, é preciso levar em conta uma escuta que


está junto do dizer do paciente, na forma de sua organização, nos discursos e
instituições que perpassam sua fala, uma escuta que pondera não só o discurso
do paciente, como também o do profissional que está trabalhando com ele.

É preciso considerar a Psicologia Institucional não como uma área de


atuação profissional, como aquelas já reconhecidas (clínica, social e do trabalho,
escolar, experimental), mas como um modo de fazer a psicologia; uma maneira
de entendê-la na interrelação com outras modalidades do conhecimento
humano, estabelecendo aí seu objeto e exercendo-se ela própria como instituição
(GUIRADO, 2009).

Por esse motivo, é possível considerar que todo diagnóstico psicológico é


um estudo institucional.

85
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

2.2 A PSICOLOGIA VIÁVEL NO ENTRECRUZAMENTO DAS


INSTITUIÇÕES
Ao pensar, por exemplo, em um psicólogo que atue em uma instituição de
saúde tal qual um centro de atenção psicossocial (CAPS) ou um hospital ou um
lugar de atendimento psicoterapêutico, podemos perceber que a relação dele com
a pessoa que ele atende é permeada por um variado número de práticas sociais:
temos o serviço público ou particular de saúde e as expectativas que são geradas
no atendimento ofertado, dos profissionais que trabalham com esse psicólogo, dos
clientes que ele atende, da família etc. Além disso, existem os outros profissionais
de saúde daquele estabelecimento que seguem diferentes orientações teóricas e
têm orientações/ordens superiores a serem seguidas.

Dessa maneira, a sua posição como psicólogo é efeito de ser um profissional


em um serviço público ou privado, estar submetido a algumas relações de poder
com médicos, outros profissionais da saúde e psicólogos que seguem outras
vertentes de trabalho teórico naquele espaço.

É, portanto, a partir dessas dinâmicas institucionais que se define o


trabalho de um psicólogo institucional: pela formação de práticas dominantes
e dominadas, pela atividade de um conglomerado de forças no jogo de poder/
resistência estabelecidos naquele espaço de atuação. Tendo este profissional o
objetivo de fazer o diagnóstico institucional do que pode perceber de si e dos outros,
do que pode analisar do seu usuário do serviço em meio às dinâmicas institucionais
que o constituem e o que podem fazê-lo sofrer ou potencializar sua vida.

2.3 A DIMENSÃO INSTITUCIONAL DA PRÁTICA DO PSICÓLOGO


Qual seria, assim, o diferencial proposto pela Psicologia Institucional para
a prática do psicólogo? Seria a de tentar manter, como posicionamento ético, um
determinado modo de se fazer a leitura e o atendimento dos casos.

De acordo com Guirado (2009), é toda uma narrativa sobre diagnóstico que se
modifica, porque ela se faz a partir de uma noção de que os discursos que permeiam
o espaço de trabalho são também uma instituição, um dispositivo de análise.

As pessoas que procuram o trabalho da Psicologia Institucional terão


sua demanda olhada a partir de um viés de questionamento, de reestruturação
das verdades prontas, como o exemplo de uma entrevista psicológica situada
no contexto de um centro de atenção psicossocial (CAPS) tal como ilustrada na
Figura 16. O Centro de Atenção Psicossocial é um dispositivo da rede de saúde
mental que se dedica a atender quadros graves de transtorno mental (Figura 16).

86
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

FIGURA 16 – CAPS

FONTE: <https://bit.ly/2YtO95d>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Como seria, então, trabalhar com a entrevista psicológica a partir do olhar


da Psicologia Institucional? Este procedimento será analisado a partir do modo pelo
qual cada instituição trabalha com esse recurso da entrevista psicológica: é preciso
levar em conta em que momento do atendimento do paciente ocorre a entrevista.

Existem instituições que realizam as entrevistas já nos serviços de recepção


e de triagem, em que o paciente já relatou sua história e sua queixa e teve o seu
respectivo acolhimento. Além disso, já passou por uma avaliação inicial que o
conduziu a um atendimento individual com o psicólogo, por exemplo, já tendo
passado pela avaliação de um psiquiatra.

O paciente que é atendido pelo psicólogo pela primeira vez já se tornou


um paciente da instituição, tendo em vista já ter passado por outros serviços e ter
se vinculado a outros profissionais que o atenderam. Quando conta a história para
o psicólogo, a sua fala já se encontra atravessada por todas essas intervenções às
quais passou inicialmente.

Assim se inicia a entrevista psicológica, e tudo o que será falado pelo


paciente será relacionado com tais posições. A partir desse fato, não será mais
viável conferir sentidos na fala do paciente somente a uma realidade psíquica
endógena. As razões e as causas do paciente, usuário do serviço, já obtiveram
outros sentidos.

87
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

E
IMPORTANT

É muito importante que se entenda que a escuta de um psicólogo precisa não


cair nas interpretações psicológicas imediatas e fáceis, justamente para que o profissional
consiga focar na maneira como ele estrutura sua fala naquele ambiente, para aquele
profissional e como a instituição tem oferecido esse espaço, tal como ilustrada na Figura
17, é preciso que a prática do psicólogo vá além das determinações diagnósticas que mais
aprisionem o paciente do que efetivamente planejem sua melhora. É justamente nesse
momento que se consegue realizar um diagnóstico mais amplo.

Tendo isso em mente, a entrevista com o psicólogo precisaria permitir que


aparecessem as representações/encenações referentes às posições que o paciente
se olha ocupando naquela e em outras relações, a posição que confere aos outros
as expectativas que elabora para sua vida e suas relações, contendo também a sua
expectativa sobre aquele atendimento público (GUIRADO, 2009).

FIGURA 17 – DIAGNÓSTICO DO PACIENTE

FONTE: <https://shutr.bz/2Yy9b2t>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Continue acompanhando!

3 ANÁLISE DO DISCURSO A PARTIR DE FREUD E FOUCAULT


As teorias podem nos levar a determinadas práticas, principalmente
pelo modo como as utilizamos. Elas podem ganhar o status de verdade e servir
como um porto seguro para os conflitos e angústias de um psicólogo que se vê
diante de um paciente em sofrimento ou de um ambiente de trabalho caótico que
demanda uma intervenção.

88
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

NTE
INTERESSA

Se o psicólogo afirma que uma pessoa tem transtorno de déficit de atenção,


por exemplo, esse diagnóstico vai interferir na forma como ela organiza a sua vida, a forma
como se vê, a sua relação com o outro, o seu posicionamento no mundo e as estratégias
que vai engendrar para lidar com este selo. Portanto, há que se ter cuidado.

As teorias podem nos vincular a uma vontade de verdade: até consideramos


que podemos errar, mas a teoria nos respalda desse engodo.

FIGURA 18 – NECESSIDADE DE INVERTENÇÃO

FONTE: <https://shutr.bz/2Ys1GdA>. Acesso em 15 jul. 2021.

Não se trata de negá-las ou produzir uma prática sem elas, mas entender
que ela, como instrumentalizadora do olhar que o psicólogo vai dirigir ao seu
paciente/cliente, fabrica determinadas verdades e essas verdades produzem
realidades na vida de uma pessoa.

3.1 FOUCAULT E O DISCURSO


Michel Foucault (Figura 19), importante estudioso francês que direcionava
sua pesquisa para as relações de saber-poder e como elas se engendram,
pesquisou bastante acerca do efeito dos discursos nessas relações, entendendo
discurso como ato, como acontecimento, como dispositivo que constrói sujeitos
(CORRÊA, 2010).

89
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

FIGURA 19 – FOUCAULT

FONTE: <https://shutr.bz/3lml9oW>. Acesso em: 15 jul. 2021.

O si mesmo de Foucault é efeito de práticas discursivas e essas práticas são


compreendidas como um apanhado de normas estabelecidas em um determinado
contexto histórico, uma determinada cultura, em que o efeito principal é o de
constituir divisões entre o falso e o verdadeiro, entre o que deve ser considerado
e o que não deve, acabando com a complexidade do saber (FOUCAULT, 1979).

Sendo assim, o autor entende que a narrativa de uma pessoa não se dá


somente por uma vontade interior, mas por uma questão de contexto no qual ela
está inserida, as relações em que ela acredita que deve responder. O conceito de
sujeito e de subjetividade se refere, pois, a uma dimensão de construção histórica,
por e nos dispositivos institucionais-discursivos.

A linguística, na década de 1970, tomou de empréstimo a concepção


foucaultiana de discurso como ato. Dessa forma, uma vertente da linguística
contemporânea – a Análise do Discurso Francesa – seguiu pela via de acreditar
na teoria da enunciação, em que é entendida a fala de uma pessoa não como a
sua expressão em particular, mas da posição em que ela pode falar, a partir das
relações em que ela se encontra, isto é, todo discurso só se pode dizer relacionado
ao contexto de sua produção, que é onde se encontram as expectativas em relação
ao que se tem como interlocutor (GUIRADO, 2000).

De outro lado, a sociologia também tomou para si algumas concepções


de Foucault: a Análise de Instituições Concretas (1978), de Guilhon Albuquerque.
Deste saber, entende-se o conceito de instituição tomado como prática social, que
se repete e se legitima, sendo acolhida por quem a utiliza como natural, em que
não se questiona acerca de seu contexto histórico ou das relações que puderam
produzi-la tal como ela é.

A Psicologia Institucional pega, então, para si estas contribuições para


pensar e realizar a sua atuação.

90
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

3.2 FREUD E O DISCURSO


Sigmund Freud (Figura 20) foi um médico, pesquisador das questões
humanas e fundador da psicanálise. Suas pesquisas, teorizações e estudos são de
fundamental importância para determinadas correntes da Psicologia Institucional.

FIGURA 20 – SIGMUND FREUD

FONTE: <https://shutr.bz/3v2nl8w>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Na psicanálise freudiana, por exemplo, sobressai o princípio da


singularidade do sujeito que nos fala, a repetir, inconscientemente, em uma
situação atual, configurações de relações vividas no passado. Assim, repetindo a
posição que ocupou no passado, reatualizando-a em situação de transferência na
análise com o seu psicanalista.

Dessa maneira, à Psicanálise é conferida uma direção própria ao campo


desse conhecimento, que entende que o sujeito que interessa na análise é o sujeito
do inconsciente, o sujeito singular da fala, das representações e/ou fantasias e afetos
inconscientes, um sujeito que se constitui pelos deslocamentos de pulsões de vida
e de morte, sexualidade e destruição; um sujeito que, por expressão narcísica de
forças pulsionais, se fabrica na conexão com as exigências pulsionais do meio.

Assim, a sobrevivência, para que se mantenha, necessita da relação com


o outro tanto quanto do íntimo das forças pulsionais (GUIRADO, 2000). Esta é a
subjetividade freudiana.

3.3 A TRANSFERÊNCIA E AS INSTITUIÇÕES


A Psicologia Institucional se utilizará bastante do conceito de transferência
advindo da psicanálise freudiana. É justamente por esse conceito que se pensará
uma proposta ética da Psicologia Institucional. Sendo assim, cabe explicá-lo
brevemente tal como entende a psicanálise.

91
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

FIGURA 21 – A TRANSFERÊNCIA NA PSICOLOGIA

FONTE: <https://shutr.bz/3arJDXv>. Acesso em: 15 jul. 2021.

Quando trabalhou no Caso Dora (1905/1969), em Repetir, Recordar


(1914/1969) e em Observações Sobre o Amor (1915/1969), Freud entende a
transferência como uma reedição de impulsos e fantasias, como estruturas
mentais inconscientes que se repetem e se atualizam, quando existem situações
externas que favorecem a substituição de uma figura anterior representativa
para o indivíduo em análise, como ilustra a Figura 21, que retrata os movimentos
de uma transferência na análise.

Quando em análise, o analisado estabelece com o seu psicanalista uma


reedição de afetos e atitudes, cujos fatos saíram da memória, mas os afetos
continuam presentes, ainda que o paciente não se saiba repetindo-os. É esse
movimento que constitui a transferência (GUIRADO, 2000).

Quando assim falamos sobre o conceito de transferência para a Psicologia


Institucional, o que se entende é que o psicólogo vai analisar como se organiza
a fala do paciente/cliente/instituição, levando em conta a posição atribuída
e apropriada pela pessoa que fala, no ambiente daquele atendimento, a partir
da relação que ele sente com aquele psicólogo. É preciso considerar também as
expectativas geradas pelo próprio psicólogo naquela relação e como este opera
com essas expectativas, como ele dá conta de manejar as repetições e projeções da
pessoa (CORRÊA, 2010).

Às vezes, em um ambiente de consultório particular fica um pouco menos


complexo de se analisar as dimensões transferenciais. Quando o ambiente é
de uma instituição, a complexidade se multiplica por conta da interrelação de
diferentes práticas sociais, pelas diversas posições de lugares instituídos, pelas
relações de poder e dominância que perpassam aquele local e aquele sujeito e
como isso pode aparecer em um atendimento psicológico.

92
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

Aí, o conceito de transferência nos ajuda a analisar essas relações e


conseguir sair como psicólogos de uma posição de instituição de verdades,
entendendo que a relação paciente-psicólogo se encontra determinada pela
transferência que o sujeito consegue estabelecer com o profissional.

93
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

LEITURA COMPLEMENTAR

PERSPECTIVAS EM PSICOLOGIA INSTITUCIONAL – INVESTIGAÇÃO/


INTERVENÇÃO EM ESCOLAS PÚBLICAS DA MARÉ/RJ

Angela Maria Dias Fernandes


Adriana Rozenowicz
Elaine Cristine de Moura Freitas
Joseane Pessanha Ferreira

O presente trabalho propõe apresentar a pesquisa-intervenção, realizada


de 2000 a 2002 em escolas públicas da Maré – Rio de Janeiro. Tal pesquisa
objetivou a investigação dos efeitos das ações implementadas pelo Programa de
Criança na Maré e se insere em uma perspectiva de contribuir para a construção
de um instrumento de avaliação de projetos sociais a partir da fala dos sujeitos
envolvidos, apontando para uma linha de ação que valorize a participação e a
construção da cidadania.

Consiste, também, em uma possibilidade de aplicação dos estudos sobre


o impacto de projetos sociais na distribuição de renda, buscando a construção de
indicadores de qualidade específicos na área da Educação que focalizem as relações
sociais. No primeiro ano, esta pesquisa teve como especificidade investigar as
estratégias de ação utilizadas por professores, alunos e arte-educadores ligados
ao projeto social em questão, construindo um olhar sobre as ações cotidianas que
se efetivam nas escolas na busca de apreender a dinâmica das relações sociais
estabelecidas. Entende-se que as ações desse programa nas escolas, dado a entrada
de novos atores sociais (profissionais de arte/educação que não pertencem aos
quadros da Prefeitura, estagiários e bolsistas da UFF), promovem uma intervenção
na atividade pedagógica na forma como ela é prescrita.

As oficinas de arte se constituem em um espaço que escapa aos


mecanismos da escola em termos de conteúdo, disciplina e avaliação. O que se
pretendeu foi a construção de procedimentos (entrevistas com profissionais e
reuniões, questionários e outros dispositivos de abordagem) que permitissem
tornar visíveis as novas relações que se constituíam a partir da parceria com esse
projeto social, visando a contribuir para sua permanente avaliação e construção.
A “costura” coletiva do material resgatado se inscreve, primordialmente, nessa
possibilidade de intervenção sobre o cotidiano. No segundo ano, foi realizado
o mapeamento dos indicadores gerais de qualidade que pudessem servir como
parâmetros para a construção de um instrumento de avaliação do programa
focalizando os efeitos produzidos nos alunos, a partir da inscrição no projeto
social, em termos de sua vinculação com a escola, com a família, com os colegas e
suas projeções para o futuro.

94
TÓPICO 3 — A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL NO ENTRECRUZAMENTO DAS INSTITUIÇÕES

O instrumento elaborado teve o formato de questionário respondido pelo


conjunto de alunos atendidos pelo projeto (cerca de seiscentos, ao final de 2001),
no qual cada sujeito analisava sua própria inserção. A definição de indicadores
realizada com a participação de educadores e a apropriação coletiva dos dados,
pelos diversos sujeitos, é um procedimento que caracteriza essa proposta de
aproximação com o campo de ação. A presente pesquisa serviu, ainda, como
objeto de reflexão sobre a atual prática da Psicologia na escola, direcionando um
olhar sobre o cotidiano escolar na busca de marcas e ações que visam à produção
do sujeito seriado, encerrado em si. As práticas pedagógicas também são postas
em análise a partir de um processo de coletivização, apontando para uma
possibilidade de desmontar mecanismos disciplinares atravessados pelo discurso
hegemônico, como as relações de causalidade na explicação dos efeitos da origem
social no desenvolvimento do aluno e a despotencialização e incapacidade do
professor em intervir nos discursos e práticas instituídos.

Entendendo o Campo de Ação da Pesquisa O campo de investigação


privilegiado nesta pesquisa foi o Programa de Criança, inserido em sete das
treze escolas públicas da Maré, área localizada nas imediações da Av. Brasil, que
reúne dezesseis favelas. O Programa de Criança, iniciado em 1999, atende alunos
do primeiro e segundo segmentos do ensino fundamental através de quinze
oficinas que buscam criar condições de acesso a diferentes linguagens, como artes
plásticas, música, teatro, dança, informática, folclore, desenho em quadrinhos
etc. Essas oficinas, que se realizam nas dependências das escolas envolvidas em
horários extraclasse, são ministradas por educadores que têm formação específica
na área e trabalham, segundo objetivos colocados pelo programa, no sentido de
contribuir para a dinamização e o aprimoramento do cotidiano escolar desses
alunos, visando ao pleno exercício da cidadania e à ampliação da possibilidade de
inserção social, seguindo o que afirma Paulo Freire – ensinar implica compreender
que a educação é uma forma de intervenção no mundo (FREIRE, 1998, p. 110).
O objetivo maior é o de contribuir para o desenvolvimento das crianças numa
perspectiva mais global, construindo, através da parceria com a escola, uma
proposta que possibilite um enriquecimento do espaço educativo, garantindo não
só a permanência dessas crianças na escola, mas uma interferência na qualidade
dessa permanência (PROGRAMA de Criança na Maré, 2001, folder).

As diferentes propostas pedagógicas que norteiam as ações dos educadores


e professores da rede municipal marcam as formas de inserção desses profissionais,
atualizando concepções políticas distintas na área da Educação. Nesse campo de
forças, o Programa de Criança se situa em uma perspectiva instituinte, um movimento
de ruptura, de desnaturalização das práticas instituídas na dinâmica escolar, sendo
importante tornar visíveis quais mecanismos vão sendo acionados para capturar
esses movimentos, já que o instituído e o instituinte estão em luta permanente.
Entende-se que a força do programa está em sua realização enquanto oficina de
arte e criação no espaço escolar oficial, gerando efeitos como o questionamento de
práticas instituídas, cristalizadas. A pesquisa pretendeu investigá-las, entendendo
que, nesse processo, passa a intervir e a sofrer as intervenções, no e do campo,
localizando aí as possibilidades e limites enquanto metodologia.

95
UNIDADE 2 — PROBLEMATIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES HOSPITALARES, EDUCACIONAIS E DO MUNDO DO TRABALHO

Descrevendo e Refletindo Sobre a Metodologia

A metodologia adotada para esta pesquisa constitui-se em ações que


produzem a um só tempo investigação e intervenção nas organizações escolares,
fazendo disparar no cotidiano das escolas e atores envolvidos novas práticas e
interesses. Essas estratégias situam-se na perspectiva do que, em ciências sociais,
convencionou-se como Análise Institucional, corrente francesa que surgiu nas
décadas de 1960/1970. Formula a ideia de pesquisa/intervenção, questionando os
sentidos cristalizados nas instituições, entendidas como um conjunto de práticas
que atravessam todas as relações sociais. Propõe-se, como metodologia, a afetar os
espaços de poder constituídos, de modo a permitir a promoção de novos territórios.

A pesquisa/intervenção tem como base o questionamento do sentido da


ação e, como afirma Benevides de Barros, ocorre uma criação de campos que ao
mesmo tempo criam sujeitos/objetos que se revezam como teorias e práticas (1994,
p. 311). A intervenção associa-se à construção e/ou utilização de analisadores, ou
seja, de acontecimentos que produzem rupturas e análises, em um processo de
desnaturalização das instituições. Na pesquisa/ intervenção, o pesquisador não é
neutro, visto que a neutralidade positivista não é possível de ser conseguida. O que
ocorre é a análise de implicações onde pesquisador e pesquisado, sujeito e objeto
do conhecimento, constituem-se no mesmo espaço. O momento da pesquisa é o
momento da intervenção, já que sempre se está implicado. Lourau (1993) irá dizer
que o escândalo da Análise Institucional talvez seja, justamente, o de propor a noção
de implicação. Além disso, sua política traz como motriz o conceito de autogestão,
que acontece em uma contradição total, já que a vida cotidiana se organiza no
terreno da heterogestão, onde as relações de poder são demarcadas, ou como diz
Lourau, nós funcionamos, em todos os lugares sob a heterogestão, ou seja, geridos
por outrem. E a vivemos, geralmente, como coisa natural (p. 14).

FONTE: <https://www.scielo.br/j/pcp/a/KttSqk5tnLhjRm3YzNyMVxC/?format=pdf&lang=pt>.
Acesso em: 30 jul. 2020.

96
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

● O entendimento social que se tem do trabalho de um psicólogo, geralmente,


segue pela via de que este profissional possa realizar psicodiagnósticos.

● Para a Psicologia Institucional, todo o psicodiagnóstico é um estudo institucional.

● As teorias podem nos levar a determinadas práticas, principalmente pelo


modo como as utilizamos. Elas podem ganhar o status de verdade e implicar
muitas mudanças na vida de quem o psicólogo direciona suas análises.

● O conceito de transferência vai ajudar bastante a Psicologia Institucional


a analisar as relações e conseguir sair como psicólogos de uma posição
de instituição de verdades, entendendo que a relação paciente-psicólogo
encontra-se determinada pela transferência que o sujeito consegue estabelecer
com o profissional.

CHAMADA

Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem


pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao
AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo.

97
AUTOATIVIDADE

1 O entendimento social que se tem do trabalho de um psicólogo, geralmente,


é que este profissional pode realizar diagnósticos psicológicos. O
psicodiagnóstico nada mais é que a possibilidade de realizar um estudo de
caso em que, no final, se produza um diagnóstico psicológico do indivíduo
avaliado. Sobre o entendimento da Psicologia Institucional acerca do
psicodiagnóstico, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Para a Psicologia Institucional, é preciso analisar as relações que se


engendram entre paciente e psicólogo e levar em conta que é por meio do
discurso que pode ser tomado também como ato, que se estruturam as
expectativas, as verdades, as apropriações dos direitos de fala e das posições.
b) ( ) O instrumental utilizado para a realização do psicodiagnóstico é
diversificado, mas se compõe de entrevistas, aplicação de testes
psicológicos, pode se usar a caixa de ludo (material lúdico para
crianças) ou seus correspondentes para adolescentes e adultos.
c) ( ) Em termos teóricos, a Psicologia Institucional entende que se deve
seguir pela escolha da linha teórica de cada profissional psicólogo que
se propõe a trabalhar com a avaliação psicodiagnóstica.
d) ( ) Toda a intervenção diagnóstica, para a Psicologia Institucional, precisa
se constituir e se sustentar na convicção de que exista um especialista
com seus recursos teóricos e técnicos, que chegará a uma verdade sobre
o que tem produzido o seu desconforto ou angústia de seu paciente.

2 Um diagnóstico psicológico pode ser realizado como parte de um processo


psicoterapêutico, ou para a entrada no processo, em uma avaliação
psicodiagnóstica exclusiva sem finalidade psicoterapêutica ou espaços
escolares, hospitalares, empresas e outros mais. Com base na afirmação de que
todo psicodiagnóstico é um estudo institucional, analise as sentenças a seguir:

I- Para a Psicologia Institucional, é preciso levar em conta uma escuta que


está junto do dizer do paciente, na forma de sua organização, nos discursos
e instituições que perpassam sua fala, uma escuta que pondera não só o
discurso do paciente como também o do profissional que está trabalhando
com ele.
II- Para a Psicologia Institucional, o psicólogo deve partir de um ponto de
neutralidade com relação ao seu paciente, pois sabe que seus posicionamentos
e modos de olhar e dizer não devem interferir na avaliação do paciente.
III- A Psicologia Institucional entende que a própria psicologia é uma
instituição, haja visto que ela é instituída como verdade e como dado de
nossa sociedade. É também por esse motivo que cabe dizer que a avaliação
diagnóstica é também institucional.

98
Assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Ao pensar, por exemplo, em um psicólogo que atue em uma instituição


de saúde tal qual um centro de atenção psicossocial (CAPS), um hospital
ou um lugar de atendimento psicoterapêutico, podemos perceber que
a relação dele com a pessoa que ele atende é permeada por um variado
número de práticas sociais diferentes. Sobre as dinâmicas institucionais
que atravessam o trabalho do psicólogo institucional, classifique V para as
sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A posição como psicólogo é efeito de ser um profissional em um serviço


público ou privado, estar submetido a algumas relações de poder com
médicos, outros profissionais da saúde e psicólogos que seguem outras
vertentes de trabalho teórico naquele espaço.
( ) A intervenção de um psicólogo institucional se dá pela análise das práticas
dominantes e dominadas, pela atividade de um conglomerado de forças
no jogo de poder/resistência estabelecidos naquele espaço de atuação.
( ) O objetivo do psicólogo institucional é fazer o diagnóstico do paciente
a partir de suas vivências, a partir de sua personalidade, suas questões
psíquicas, sem levar em conta as dimensões institucionais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V – F – F.
b) ( ) V – V – F.
c) ( ) F – V – F.
d) ( ) F – F – V.

4 Michel Foucault, importante estudioso acerca das relações de saber-poder


e como elas se engendram, é um pesquisador que ajudou e influenciou
bastante a composição da Psicologia Institucional. Disserte sobre a
influência do pensamento de Foucault sobre a Psicologia Institucional.

5 Sigmund Freud foi um médico, pesquisador das questões humanas e fundador


da psicanálise. Suas pesquisas, teorizações e estudos são de fundamental
importância para determinadas correntes da Psicologia Institucional. Disserte
sobre a contribuição freudiana do conceito de transferência para a Psicologia
Institucional.

99
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, J. A. Metáforas da desordem: o contexto social da doença
mental. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

BLEGER, J. Psico-higiene e Psicologia Institucional. Porto Alegre: Artes


Médicas, 1984.

BOCK, A. et al. Psicologia e compromisso social. São Paulo: Cortez, 2003.

CORRÊA, M. Psicologia social contemporânea: livro texto. 13. ed. Rio de


Janeiro: vozes, 2010.

FREUD, S. O mal-estar na civilização. In: Obras psicológicas completas de


Sigmund Freud: Edição standard brasileira. Vol. XXI. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

FREUD, S. Observações sobre o amor transferencial (novas recomendações


sobre a técnica da psicanálise III). In: Obras psicológicas completas de
Sigmund Freud: Edição standard brasileira. Vol. XII. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

FREUD, S. Recordar, repetir e elaborar (novas recomendações sobre a técnica


da psicanálise II). In: Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: Edição
standard brasileira. Vol. XII. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

FOUCAULT, M. Microfísica do poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

GUIRADO, M. Psicologia Institucional. São Paulo: EPU, 1987.

GUIRADO, M. A clínica psicanalítica na sombra do discurso: diálogos com


aulas de Dominique Maingueneau. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.

GUIRADO, M. Psicologia Institucional: o exercício da psicologia como instituição.


Rev. Interação em Psicologia, Curitiba, v. 13, n. 2, p. 323-333, jul./dez. 2009.

ISMAEL, S. A prática psicológica e sua interface com as doenças. São Paulo:


Casa do Psicólogo, 2005.

LANE, S. Psicologia Social: o homem em movimento. 14. ed. São Paulo:


Brasiliense, 2012.

LOPES, S. A psicologia hospitalar na teoria e na prática. In: GIOIA-MARTINS,


D. (Org.). Psicologia e saúde: formação, pesquisa e prática profissional. São
Paulo: Vetor, 2012.

100
PATTO, M. Psicologia e Ideologia: uma introdução crítica à psicologia escolar.
São Paulo: T.A. Queiroz, 1984.

SALGUEIRO, J. Descrição e compreensão dos processos de perdas e luto


vivenciados por uma pessoa com Esclerose Lateral Amiotrófica. 2008.
Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Instituto de Psicologia, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 2008.

VALORE, L. A. Contribuições da psicologia institucional ao exercício da


autonomia na escola. In: SILVEIRA, A. F. et al. (Org.) Cidadania e participação
social [on-line]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008.

101
102
UNIDADE 3 —

PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

● compreender a Psicologia Comunitária e a sua importância;

● discutir a formação e a prática do psicólogo na comunidade;

● reconhecer a relevância da Análise Institucional e as suas principais


contribuições para a Psicologia;

● identificar os principais conceitos da Psicanálise utilizados na Análise


Institucional e verificar sua possibilidade prática.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade,
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 – O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

TÓPICO 2 – CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

TÓPICO 3 – A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO


PSICANALÍTICO

CHAMADA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos


em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá
melhor as informações.

103
104
TÓPICO 1 —
UNIDADE 3

O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 1, trabalharemos mais detidamente sobre a Psicologia
Social Comunitária. Neste tópico, diferentes características das relações entre o
psicólogo e a comunidade serão trazidas, especificamente o histórico, as perspectivas
teóricas, os instrumentos de análise e intervenção disponíveis e a atuação do psicólogo
em comunidade.

Veremos, assim, como a Psicologia Social Comunitária pode fortalecer


a edificação de relações sociais mais democráticas e solidárias, além de poder
cooperar para a garantia de autonomia e do aperfeiçoamento da qualidade de vida
nas comunidades.

2 O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA


Trabalhar e pensar a partir da Psicologia Comunitária é investigar as
condições (internas e externas) ao homem que o impossibilitam de ser sujeito e
as circunstâncias que o constituem como tal em uma comunidade. Na Figura 1 ,
podemos interpretar que a Psicologia Comunitária se define como uma área da
Psicologia social que pesquisa o funcionamento do psiquismo que é relativo ao
estilo de vida do lugar/comunidade.

FIGURA 1 – PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

FONTE: <https://shutr.bz/3AtWy68>. Acesso em: 01 ago. 2021.

105
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

No movimento de estudar, podemos compreender esse homem a


partir dessas circunstâncias, o engendramento de sua personalidade, de sua
individualidade crítica, da consciência de si (identidade) e a possível construção
de uma nova realidade social.

Sendo assim, podemos dizer que a Psicologia Comunitária se define


como uma área da Psicologia social que pesquisa o funcionamento do psiquismo
que é relativo ao estilo de vida do lugar/comunidade. Pesquisa também a
organização das relações e representações, a identidade, os graus de consciência,
a identificação e o pertencimento dos indivíduos ao lugar/comunidade e aos
grupos comunitários.

Portanto, tem como objetivo investir no desenvolvimento da consciência


das pessoas como sujeitos históricos e comunitários, por meio de um funcionamento
interdisciplinar que atravessa o progresso dos grupos e da comunidade. Sua
questão primordial é a modificação do indivíduo em sujeito (CAMPOS, 2002).

TUROS
ESTUDOS FU

Veremos mais detalhadamente a definição da Psicologia Comunitária e seu


trabalho mais à frente. Acompanhe!

2.1 HISTÓRIA E CONCEITUAÇÃO DE COMUNIDADE


A comunidade, quando tomada pelo aspecto geográfico (um bairro, por
exemplo) ou psicossocial (por exemplo, a comunidade escolar tal como ilustrada
pela Figura 2), é o território em que a maior parte da vida cotidiana é vivenciada.

FIGURA 2 – COMUNIDADE ESCOLAR

FONTE: <https://shutr.bz/3Dsi9O8>. Acesso em: 01 ago. 2021.

106
TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

No entanto, o conceito de comunidade trabalhado pela Psicologia Social


Comunitária apresenta determinados aspectos próprios, relativos ao modo como
a Psicologia social surgiu como área de conhecimento dentro da Psicologia.

Embora a ciência positivista queira se afirmar isenta e neutra às questões


sociais, é sabido que a ciência se estrutura a partir do seu contexto histórico e das
movimentações sociais que se dão a partir dela. Sendo assim, a Psicologia Social
Comunitária também se vê condicionada aos processos históricos.

A partir do final da década de 1960, no Brasil, pouco depois da


regulamentação da Psicologia como profissão, a Psicologia passa a ter interesse
também em realizar trabalhos e produzir pesquisas em comunidades de baixa
renda. Essa vontade parte tanto da necessidade de abrir acesso da Psicologia para
pessoas sem poder aquisitivo, quanto da urgência em promover melhorias na
situação de vida da população trabalhadora. É, portanto, nesse cenário e nesse
desejo que se constituiu o ambiente teórico e prático do que se efetivou chamar
de “Psicologia Comunitária”, ou ”Psicologia na comunidade” (FREITAS, 1994).

Bairros periféricos, favelas, associações de bairro, comunidades eclesiais


de base, movimentos populares em geral compunham os espaços em que se
efetivaram inicialmente essas experiências de Psicologia Comunitária.

FIGURA 3 – BAIRROS PERIFÉRICOS

FONTE: <https://shutr.bz/3v2J5RJ>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Foi apenas há pouco tempo, com a estruturação maior dos sistemas de


saúde e incentivo à educação pública do país, em paralelo ao crescimento da
formação de psicólogos interessados em atuar em postos de saúde, creches,
instituições de promoção do bem-estar social, organizações socias sem fins
lucrativos (ONGs), centro de atenção psicossocial (CAPS) ou defensorias públicas
circunscritos ao atendimento de famílias e crianças pobres que a Psicologia Social
Comunitária foi estruturando melhor suas ferramentas de análise e intervenção,
referentes às novas questões trazidas para os psicólogos sociais.

107
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

2.2 COMUNIDADE ONTEM E HOJE


O termo “comunidade” não era presente na história da Psicologia até
constituir um conceito analítico em 1970, quando uma vertente da Psicologia
Social se denominou de Comunitária.

Quando se instituiu dessa maneira, a Psicologia Social Comunitária quis


definir para si objetivos e população-alvo, para ser lida como ciência engajada com
a realidade pesquisada, principalmente com os tidos “desassistidos de cidadania”.

O encontro com o termo “comunidade” não foi um movimento solitário


da Psicologia Social, posto que existia um movimento das ciências humanas
e sociais nas décadas de 1960 a 1980 de questionar a pretendida neutralidade
científica. Foi quando o termo “comunidade” fez mais sentido de ser trazido,
principalmente na atuação na área de saúde mental.

O advento do conceito de comunidade trouxe outro modo de olhar o


mundo e as práticas em Psicologia Social, posto que esta traz a perspectiva de
conceber o mundo com o intuito de transformá-lo (CAMPOS, 2002). No entanto,
“comunidade” acabou virando um conceito possível de englobar qualquer prática
profissional que fosse efetivada fora de consultórios, dando margem para que
seu uso fosse apropriado para manipular e para caracterizar compromisso com o
povo, reivindicando uma pureza étnica e cultural.

FIGURA 4 – PRÁTICAS DE ASSISTENCIALISMO OU DE CARIDADE

FONTE: <https://shutr.bz/3mJKOr3>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Quando falamos sobre o conceito de comunidade hoje, este termo surge a


partir dos atravessamentos e efeitos do processo de globalização. Isso quer dizer
que a partir do advento da tecnologia, as tradicionais fronteiras que existiam entre
os países não existem mais, fazendo surgir o que se chama de “comunidade virtual”.

108
TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Ao mesmo tempo, é possível ver que outras formas de segregação


e exclusão vão sendo erigidas, colocando a alteridade e a identidade como
problemas a serem resolvidos, movimentando as ciências humanas a se haverem
com as pesquisas sobre comunidade, tentando trazer de volta a ideia de um modo
de fazer e atuar ético e como categoria de integração e autonomia (por exemplo,
a população aprendendo a lutar e reivindicar: associações de bairros, entidade de
defesa do cidadão, grupos de educação popular, pastorais do operário, da criança
e do adolescente e da mulher).

FIGURA 5 – MODO DE FAZER E ATUAR ÉTICO

FONTE: <https://shutr.bz/3oYRMLw>. Acesso em: 01 ago. 2021.

O conceito de comunidade nos traz o significado de coletividade, mas


também o da valorização das potencialidades humanas do indivíduo que forma
essa coletividade.

Nessa acepção, a comunidade desfaz com a divisão clássica entre


coletividade e individualidade, ser humano em geral e ser humano particular,
constituindo-se como lugar ideal da passagem da universalidade ética humana
à singularidade do gozo individual, ou seja, para que os preceitos comunitários
sejam tomados como algo importante, esses valores precisam criar significado
para o indivíduo e, deste significado, partilhar com outros e mobilizar a ação de
transformação.

Nos anos 1970, o objetivo da Psicologia Comunitária tinha a ver com a


necessidade de tomada de consciência por parte da população trabalhadora. No
entanto, é importante também que se coloque a “tomada de inconsciência”, posto
que as pessoas são motivadas por interesses pessoais de busca de felicidade,
que devem ser lavados também para a esfera coletiva. Não se pode dicotomizar
coletivo e individual, correndo o risco de que as pessoas entendam que todo
mundo precisa sacrificar suas questões pessoais em detrimento do coletivo
(SAWAIA, 1994).

109
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

NOTA

Sintetizando, a definição de comunidade compreende todos os modos de


relacionamento vinculados a um nível de intimidade pessoal, profundidade emocional
e implicação moral, mantidos e construídos com o tempo. Ela tem seu motivo de ser
no homem sua totalidade, e não em uma função que possa exercer na dinâmica social.
A sua potencialidade psicológica está no seu grau de motivação e funciona a partir da
união das vontades individuais, o que não funcionaria se ela estivesse calcada apenas na
conveniência ou em aspectos racionais. A comunidade se dá, então, a partir da união entre
sentimento e pensamento, individual e coletivo, tradição e criação, ação e desejo.

2.3 HISTÓRIA DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA


Quando falamos sobre a história da Psicologia Comunitária no Brasil,
não podemos deixar de contextualizá-la a partir do momento histórico, político e
econômico em que ela foi sendo gestada, a saber: a ditadura civil militar de 1964.
Esse acontecimento está enormemente vinculado ao surgimento da Psicologia
Comunitária, pois no período de dura repressão da ditadura (1968-1975) em que
havia extrema censura e violência, era necessário que a Psicologia pudesse pensar
seu trabalho junto à população e qual seria a sua função no questionamento,
conscientização e organização das pessoas.

Esse questionamento do papel da Psicologia na ocasião foi mais


operacionalizado nas universidades, estimulado pelos movimentos de 1968 na
França (eventos revolucionários de Maio de 1968 em Paris, que surgiram a partir
de demandas estudantis, solicitando reformas no sistema educacional francês,
que questionavam o ensino e o saber acadêmico.

Esse movimento nas universidades pôde gerar uma reflexão crítica quanto
à profissão da Psicologia e a sua função na sociedade, sobretudo em países do
Terceiro Mundo, que estão constantemente sendo vítimas de violação de direitos
humanos.

Nesse período, os professores dos cursos de formação profissional do


psicólogo começam a interrogar a sua prática, ao passo que a Psicologia como
ciência estava vivendo uma crise, pois a antipsiquiatria começava a por em
cheque os conceitos de doença mental, fazendo com que o problema migrasse
para a questão da saúde mental e para uma provável proposta preventiva em
conjunto com a população pobre, oprimida e desassistida pelo Estado.

110
TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

FIGURA 6 - SAÚDE POPULAR

FONTE: <https://shutr.bz/3aorVo5>. Acesso em: 01 ago. 2021.

É nesse momento que emerge, nos Estados Unidos e em outros países


da América Latina, o termo ”Psicologia Comunitária”, vinculado ao trabalho de
psicólogos engajados nas questões das populações desassistidas. É importante
sinalizar que o trabalho ainda ganhava um viés bastante assistencialista e
caritativo, instrumentalizando-se de procedimentos sem reflexão crítica.

Fora do espaço acadêmico, médicos e psiquiatras mais engajados com a


saúde pública e a promoção de políticas preventivas concebem, na década de
1970, os centros comunitários de saúde mental que, segundo A. Abib Andery
(1981, p.12), são estabelecidos com o intuito de forjar outro métodos de trabalho
diferentes dos tradicionais hospitais psiquiátricos (que tinham a tradição dos
tratamentos que violavam direitos básicos). Segundo Lane (2012), essas foram
apenas tentativas que não operacionalizaram grandes mudanças.

FIGURA 7 – EDUCAÇÃO POPULAR

FONTE: <https://shutr.bz/3v2KozK>. Acesso em: 01 ago. 2021.

111
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Em paralelo a todos esses movimentos acontecendo com a institucionalização


da Psicologia Comunitária, na década de 1960 existia uma forte inquietação com a
educação popular (Figura 7), com a alfabetização de adultos. É com Paulo Freire e
outros pesquisadores do ensino e psicólogos que começa a ser pensada a educação
como ferramenta de conscientização, de perspectiva de se pensar a cidadania. Todas
essas vivências conduziram os psicólogos, no período de 1970, a trabalharem em
ações em comunidades, enfatizados na educação popular, tendo como objetivo a
conscientização da população (LANE, 2012).

DICAS

Para saber um pouco mais sobre a história da Psicologia Comunitária, leia o


livro: CAMPOS, R. H. F. (Org.). Psicologia Social Comunitária: da solidariedade à autonomia.
8. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

3 FORMAÇÃO E PRÁTICA DO PSICÓLOGO NA COMUNIDADE


Geralmente, os trabalhos comunitários realizados pelos psicólogos
precisam de uma catalogação das urgências e da escassez experimentadas pelo
grupo alvo de intervenção, principalmente sobre as questões de saúde, educação
e acesso a saneamento básico.

Logo após essa sistematização, utilizando-se métodos e processos de


conscientização, segue-se a efetivação do trabalho com a população, buscando
a autorização gradual da autonomia e intervenção nos seus processos, sabendo
mais sobre o seu contexto político, histórico e propositivos, na procura de
soluções para as problemáticas que essas pessoas vivem. O investimento no
desenvolvimento da consciência crítica, da ética da solidariedade e de práticas
cooperativas ou até mesmo autogestivas, por meio da investigação das questões
cotidianas da comunidade, revela o modo como a Psicologia Social Comunitária
conduz a feitura de sua teoria e de sua prática.

3.1 COMUNIDADE COMO INSTRUMENTO TEÓRICO DA


PSICOLOGIA
O conceito de comunidade na Psicologia Social somente aparece a partir
dos anos 1970, quando a Psicologia Social trouxe para si o ramo da Psicologia
Comunitária.

112
TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Ainda que houvesse muitas discussões acerca do homem em sociedade


e sobre como se formam as consciências, a comunidade apenas surge para dizer
do campo intermediário entre o homem e a sociedade ou como significado de
sociedade. Como exemplo, podemos falar sobre as pesquisas de Wundt em 1904,
em que comunidade surge como semelhante a uma relação coletiva. Wundt, assim,
concebia a Psicologia popular como aquela que estudava os produtos mentais
produzidos por uma comunidade humana, que não se resumiam à consciência
individual, pois presumem-se ações mútuas de muitos indivíduos. O que era gerado
da dinâmica coletiva fazia os membros de uma nação ficarem juntos (BARÓ, 1983).

Freud foi também um outro autor que trouxe a dimensão homogeneizadora


da comunidade, apontando, no entanto, a sua parte negativa de acreditar que
todos os homens fossem iguais em desejos e necessidades. De acordo com Freud,
a força que existe das pulsões humanas vai além das questões da comunidade
social. Para ele, para se estabelecer como civilização, os humanos precisam
“trocar uma parte de felicidade pessoal por uma parte de segurança, através de
mecanismos que facilitam essa má troca” (FREUD, 1978). Essa segurança adviria
do viver em sociedade.

Com relação à Psicologia Social, vertente da Psicologia concebida no início


do século XX com o objetivo de investigar a relação homem/sociedade, o termo
“comunidade” não aparecia como tão importante. Em vez disso, o conceito de
grupo e interação social foram mais prevalentes nas pesquisas sobre as questões
coletivas, especificamente na Psicologia Social norte-americana, direcionada às
questões sociais produzidas pela imigração e pela Segunda Guerra Mundial, com
o intuito de garantir a relação de grupos e indivíduos na sociedade americana.

É nesse contexto que o termo comunidade foi apresentado como fonte


de trabalho, seguindo um movimento mais geral da época. Na década de 1950, o
conceito de comunidade esteve mais presente nas Ciências Sociais, depois de ter sido
trazido da cena política mesclada com as idéias liberais-populistas e corporativistas.

Dessa maneira, o conceito de comunidade adentrou na Psicologia em


uma conjunção das teorias de Wundt e o seu modelo experimental, com os
pensamentos de Freud e a dinâmica da interrelação entre indivíduo e civilização,
a partir dos estudos psicossociais sobre grupo.

Os psicólogos que, portanto, atuavam em comunidades, começaram a se


influenciar pelas teorias psicológicas que mais abarcavam o social na análise da
subjetividade, tanto de abordagem psicanalítica, quanto institucional e sociométrica.
Os autores mais utilizados foram Kurt Lewin, Goffman, Reich, Moffart e Bleger.

Sawaia (2002) aponta que foi somente na década de 1970 que a Psicologia
Social conseguiu trazer mais consistência acerca do seu objetivo e do seu alvo de
intervenção, a partir do momento que se colocou como Psicologia Comunitária,
vertente de conhecimento que se coloca como não-elitista, a serviço do povo, com
o objetivo de suprimir a exploração e a dominação.

113
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

A Figura 8 ilustra agentes de saúde e sociedade civil organizados na


luta pela garantia do atendimento em saúde para a população usuária de crack.
Ao mesmo tempo, em que há intervenção policial na região que é denominada
“crackolândia” em São Paulo.

FIGURA 8 – AÇÕES COMUNITÁRIAS

FONTE: <https://shutr.bz/3Fz3zGv>. Acesso em: 01 ago. 2021.

O psicólogo, na Psicologia Comunitária, assume o papel de garantir a


tomada de consciência do trabalhador, da exploração, submissão e alienação
na qual ele é colocado, a fim de que ele possa se engajar em movimentos de
resistência e luta por melhorias.

Nessa direção, o conceito de comunidade se transformou em um lugar


de reunião da classe trabalhadora, em que está colocada nela a responsabilidade
de operacionalizar a teoria crítica sobre submissão em ação, em reivindicação,
ou seja, ir contra a exclusão que o sistema capitalista lhe impõe pela exploração
da sua mais-valia, bem como o fato de esse mesmo trabalhador não ter acesso ao
fruto de seu trabalho.

3.2 A PERSPECTIVA DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA



A perspectiva da Psicologia Social Comunitária preconiza as questões
apresentadas a seguir:

● Em termos teóricos, a problematização da relação entre produção teórica


e prática do conhecimento: entende-se que o saber se faz na relação entre o
psicólogo e as pessoas que são alvo da intervenção. É possível afirmar que os
psicólogos que trabalham a partir da Psicologia Social Comunitária estão no
papel de intelectuais tradicionais, posto que sistematizam o conhecimento já
produzido pela Psicologia Social e se colocam na função de passá-lo adiante
para a população, com a função de formar intelectuais orgânicos, ou seja, formar
pessoas competentes em organizar a perspectiva da comunidade e transformar
esse conhecimento em questionamento de práticas instituídas.
114
TÓPICO 1 — O QUE É A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

● Em termos de metodologia: trabalha-se com a metodologia da pesquisa


participante, em que se entende que o pesquisador e as pessoas participantes
da pesquisa precisam atuar juntos, com o objetivo de procurar soluções para
as questões apresentadas, no planejamento e na ação de mudança da realidade
experenciada.
● Em termos de valores: a atuação do psicólogo comunitário preconiza a ética
da solidariedade, os direitos humanos básicos e a promoção da melhoria da
qualidade de vida da população com a qual se trabalha.
● Em termos éticos: objetiva-se atuar na direção de trazer as condições necessárias
para o exercício da cidadania plena, da democracia e da justiça social.
● Em termos políticos: problematiza-se os modos de opressão e submissão, além de
trabalhar a partir da lógica de autogestão cooperativa (BOMFIM; MOTA, 1987).

FIGURA 9 – TRABALHO FORÇADO

FONTE: <https://shutr.bz/3Aub2mn>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Agora, veremos as experiências da comunidade em grupo. Acompanhe!

3.3 EXPERIÊNCIAS COMUNITÁRIAS FORMALIZADAS EM


GRUPOS
As diferentes práticas comunitárias vêm mostrando a relevância do grupo
como premissa, tanto para entender a realidade das pessoas, para que pudessem se
pensar nessa realidade, como também para pensar em atitudes coletivas e organizadas.

Segundo Campos (2002), quando falamos da Psicologia Comunitária,


estamos atentos à questão da consciência e da atividade - elementos importantes do
psiquismo humano, que organizam bastante o que se sabe sobre comportamento,
aprendizagem e cognição. Quando se vai trabalhar com o conceito de subjetividade,
pressupõe-se o trabalho com a identidade, categoria que induz ao saber da
singularidade do indivíduo que se expressa em aspectos afetivos e motivacionais,
por meio das relações com os outros -, isto é, na experiência grupal.
115
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

A investigação dos três elementos principais - atividade, consciência e


identidade - apenas se realiza por intermédio da linguagem (e do pensamento),
condição fundamental para as relações com os outros e que vai produzir os conteúdos
da consciência. São essas relações sociais que se dão por meio de atividades e que vão
sofrer a intervenção das emoções individuais, produzindo elementos inconscientes
presentes tanto na consciência como na atividade e na identidade.

Em outras palavras, o psicólogo comunitário atua principalmente com a


linguagem e as representações, com processos grupais - relação fundamental entre o
indivíduo e a sociedade - e com as emoções e afetos próprios da subjetividade, para
viabilizar sua prática a nível da consciência, da atividade e da identidade dos sujeitos
que vão, em algum momento, estar em verdadeira comunidade (CAMPOS, 2002).

É no processo grupal que nos conectamos com o outro e é nele também que
reconhecemos nossa diferença e, dessa forma, produzimos a nossa identidade,
sendo o grupo exigência para a sua garantia ou transformação.

No entanto, é também por meio do contexto grupal que presenciamos a


incidência do poder, que oferece a possibilidade de refutar a nossa identidade e
reconfigurá-la. Por exemplo, existir uma pessoa no grupo que possui poder de
persuassuão e quer impor o seu pensamento aos outros, como se fosse uma verdade
absoluta. De outra parte, existem aqueles que talvez se sintam mais acuados
e identifiquem na pessoa persuassiva uma liderança, o que pode fazer com que
acabem deixando o poder de decidir nas mãos de quem identificam como líder.

Desse modo, o processo grupal também pode fazer com que nos fixemos
em nossos modos de ser, nos subjugando a um poder autoritário, não levando em
conta que em um grupo, antes de mais nada, devemos ser considerados iguais em
direitos e deveres.

116
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

● Trabalhar e pensar a partir da Psicologia Comunitária é investigar as condições


(internas e externas) ao homem que o impossibilitam de ser sujeito, assim
como as circunstâncias que o constituem como sujeito em uma comunidade.

● O termo “comunidade” não era presente na história da Psicologia até


constituir um conceito analítico em 1970, quando uma vertente da Psicologia
Social se denominou de comunitária.

● O objetivo da Psicologia Comunitária tinha a ver com a necessidade de


tomada de consciência por parte da população trabalhadora.

● As diferentes práticas comunitárias vêm mostrando a relevância do grupo


como premissa, tanto para entender a realidade das pessoas, para que
pudessem se pensar nessa realidade, como para pensar atitudes em coletivo e
organizadas.

117
AUTOATIVIDADE

1 No movimento de atuar e pesquisar a partir da Psicologia Social


Comunitária, podemos compreender o homem pelo engendramento de
sua personalidade, de sua individualidade crítica, da consciência de si
(identidade) e a possível construção de uma nova realidade social. Sobre a
Psicologia Comunitária, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Podemos dizer que a Psicologia Comunitária se define como uma área


da Psicologia Social que pesquisa o funcionamento do psiquismo, que
é relativo ao estilo de vida do lugar/da comunidade.
b) ( ) Podemos dizer que a Psicologia Comunitária é uma vertente de
trabalho da Psicologia, que foca nos estudos das relações entre
emoções, pensamentos, comportamento e estados fisiológicos. Esta se
fundamenta na crença da não-existência da mente, tendo uma visão
monista do ser-humano.
c) ( ) Podemos dizer que a Psicologia Comunitária é um ramo da Psicologia
que acredita que, para se entender as partes, é necessário, antes,
entender o todo. Está atrelada a um processo de dar forma.
d) ( ) Podemos dizer que a Psicologia Comunitária é um ramo da Psicologia
que estuda a cognição, os processos mentais que motivam o
comportamento do ser humano.

2 A comunidade, quando tomada pelo aspecto geográfico, um bairro, por


exemplo, ou psicossocial, por exemplo a comunidade escolar, é o território
em que a maior parte da vida cotidiana é vivenciada. Com base nas
definições de comunidade para a Psicologia Social Comunitária, analise as
sentenças a seguir:

I- O conceito de comunidade trabalhado pela Psicologia Social Comunitária


apresenta determinados aspectos próprios, relativos ao modo como a
Psicologia social surgiu como área de conhecimento.
II- O termo “comunidade” era presente na história da Psicologia antes mesmo
da Psicologia Social se institucionalizar como vertente da Psicologia.
III- O uso do conceito de comunidade trouxe outro modo de olhar o mundo
e as práticas em Psicologia Social, posto que esta traz a perspectiva de
conceber o mundo com o intuito de transformá-lo.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

118
3 O conceito de comunidade nos traz o significado de coletividade, mas
também o da valorização das potencialidades humanas do indivíduo que
formam essa coletividade. De acordo com o entendimento de indivíduo
e sociedade da Psicologia Comunitária, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

( ) Para que os preceitos comunitários sejam tomados como algo importante


pela sociedade, esses valores precisam criar significado para o indivíduo e,
deste significado, partilhar com outros e mobilizar a ação de transformação.
( ) Não se pode dicotomizar coletivo e individual, correndo o risco de que
as pessoas entendam que todo mundo precisa sacrificar suas questões
pessoais em detrimento do coletivo.
( ) O objetivo da Psicologia Comunitária tinha a ver com a necessidade de
tomada de consciência por parte da população trabalhadora, ou seja,
entender que os valores coletivos estão acima das questões individuais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V - F - F.
b) ( ) V - V - F.
c) ( ) F - V - F.
d) ( ) F - F - V.

4 Geralmente, os trabalhos comunitários realizados pelos psicólogos necessitam


de uma catalogação das urgências e escassez experimentadas pelo grupo
alvo de intervenção, principalmente sobre as questões de saúde, educação
e acesso a saneamento básico. Disserte sobre a perspectiva de trabalho do
Psicologia Comunitária.

5 As diferentes práticas comunitárias vêm mostrando a relevância do grupo


como premissa, tanto para entender a realidade das pessoas, como para
pensar atitudes coletivas. Disserte sobre o processo grupal na Psicologia
Comunitária.

119
120
TÓPICO 2 —
UNIDADE 3

CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 2, abordaremos as contribuições da Análise
Institucional para a Psicologia. No entanto, antes, precisamos entender o que foi
a Análise Institucional, seus conceitos e suas operacionalizações.

De acordo Guirado (2009), a Psicologia Institucional compreende


diferentes teorias acerca da intervenção da Psicologia nas instituições, com
diferentes abordagens, escolas e tendências.

Em seus estudos, a autora traz três vertentes da Psicologia Institucional: a


Psicologia Institucional da Psicogênese, que foca na promoção de saúde mental,
que é a de José Bleger; a Psicologia Institucional de Félix Guattari; e a Análise
Institucional de René Lourau e Georges Lapassade, que problematiza o viés
psicologizante da Psicologia Institucional atravessada pelas leituras psicanalíticas,
e que vai preconizar sua intervenção como ato político.

ATENCAO

Relembre a proposta da Psicologia Institucional de Bleger em alguns pontos:


• intervenções em saúde mental e psico-higiene (promoção do bem-estar) nos grupos
e atividades cotidianas;
• problematiza as relações de poder e a tomada de consciência da dominação entre
os grupos, ou seja, traz de volta dentro dos processos grupais a dimensão política e
institucional em uma abordagem psicanalítica;
• compreensão da relação e da intervenção social, entendendo as relações que se
estabelecem nas instituições nas famílias, comunidades, nos diversos grupos como
elementos de análise, para a intervenção e promoção da saúde.

121
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

2 O MOVIMENTO DA ANÁLISE INSTITUCIONAL


A Análise Institucional é um movimento que teve seu início na França,
na década de 1960, com René Lourau e Georges Lapassade. Análise Institucional
foi, então, o nome cunhado ao movimento que pressupunha uma determinada
maneira de entender as relações sociais, com um conceito de instituição próprio e
uma forma de compreender a atuação do profissional psicólogo que é de natureza
eminentemente política.

O psicólogo que assume a perspectiva da Análise Institucional precisa


se colocar em um lugar de suscitar os movimentos autônomos dos grupos nas
organizações, um profissional que analisa os atravessamentos institucionais que
perpassam a dinâmica dos grupos, e não como um detentor da verdade que fará
interpretações ou assinalamentos.

De acordo com Lapassade (1974/1977), o analista institucional precisa ser


um proporcionador de rachaduras e desvios na burocracia das relações instituídas.
Está, portanto, atuando na perspectiva instituinte, ou seja, na perspectiva de
trazer novos pensamentos para além do que já está dito e afirmado. Para trazer
essa abertura, o profissional precisa sempre colocar o seu lugar de especialista
também em análise, não apenas analisar os movimentos grupais alheios.

O criador da Análise Institucional é o Georges Lapassade, psicólogo


de formação, que começou a atuar a partir da Psicossociologia e seguiu com
seu fervoroso caminho intelectual e político, o qual culminou na criação desse
movimento chamado de Análise Institucional.

NOTA

A Psicossociologia tem a sua nascente na década de 1930, na estruturação


do Serviço Social, e se fortalece década de 1970, pois apresenta a crítica aos métodos de
investigação e modelos teóricos práticos poucos funcionais a população. Seus principais
autores são pesquisadores da educação popular, tais como: Paulo Freire, Silvia Lane,
Pichón-Riviére, Martin-Baró, Martiza Monteiro, dentre outros. Compreende a intervenção
na investigação; a pesquisa-ação; o planejamento Participativo; o Grupo Operativo;
a Intervenção Psicológica, a Intervenção Diagnóstica, dentre outros. Tem o modelo de
autogestão como prática: poder na comunidade e saber fabricado a partir da prática.

Mas por que chamar de “movimento”? Porque, a partir do seu debate


caloroso e polêmico, ele acaba trazendo mais pessoas para acreditar no movimento
da Análise Institucional. Pela proposição de uma leitura política na constituição
das relações, faz convocar a pessoa que o estuda a tomar partido, a fazer algum
movimento na direção da mudança do status quo.

122
TÓPICO 2 — CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

2.1 O MOVIMENTO INSTITUCIONALISTA


Para compreendermos melhor a Análise Institucional, precisamos passar
pelo que se convencionou chamar de Movimento Institucionalista. O conceito
“Movimento Institucionalista” apareceu nas décadas de 1960 a 1980, em diferentes
lugares do mundo, abarcando uma série de teorias, práticas e experiências que
têm como referência a autogestão e a autoanálise, com a perspectiva de encorajar
vivências mais coletivas e produtoras de novos saberes (BAREMBLITT, 1994).

Podemos mencionar as seguintes áreas de estudo do movimento: Análise


Institucional, Pedagogia Institucional, Psiquiatria Democrática, Sociopsicanálise,
Psicossociologia, Esquizoanálise, Sociologia Clínica, Grupo Operativo, Educação
Popular e outros.

No lugar de adotar uma postura identitária, esses movimentos intencionam


propor a lógica da diferença, buscando promover descontinuidades objetivas
e subjetivas em experiências institucionais já cristalizadas de um determinado
modo. As experiências institucionais, às vezes, tendem à alienação, à falta de
autonomia e à proibição da expressão da alteridade.

O movimento institucionalista vai trabalhar com a noção de poder, não


a partir da lógica vertical e hierárquica, mas de um entendimento relacional,
que converge para pensá-lo como relações de forças, ou seja, como um dado que
se dá apenas na relação, fazendo-nos pensar em possibilidades de resistência.
A noção relacional do poder se refere a pensá-lo como algo difuso, sem estar
necessariamente nas mãos de alguém, a priori, nem do Estado e nem de classes
dominantes. (FOUCAULT, 2003, p. 29).

DICAS

Para entender melhor as relações de poder e as possibilidades de resistência,


assista ao filme Bacurau (2019), dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles.

Desse modo, é possível pensar que pessoas antes excluídas podem atuar
mais vivamente no cenário da vida comunitária, pois podem conseguir produzir
diferentes movimentos.

Também estava assentado aos princípios do Movimento Institucionalista


diferentes grupos que compunham os novos movimentos sociais. Novos sujeitos,
antes submetidos ou excluídos socialmente, desempenham o papel de atores:
mulheres, gays, negros, indígenas, favelados.

123
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

FIGURA 10 – NOVOS SUJEITOS

FONTE: <https://shutr.bz/2X6QbrO>. Acesso em: 01 ago. 2021.

A Análise Institucional ou Socioanálise é um dos modos de intervir do


Institucionalismo mais trabalhados no Brasil. Elaborada por René Lourau e
Georges Lapassade a partir da década de 1960, apareceu como uma extensão
da Terapia Institucional, da Pedagogia Institucional, da Filosofia, da Sociologia
Política e da Dinâmica de Grupo americana de Kurt Lewin. Seguiu-se depois para
a análise de grupos sociais (e não de indivíduos).

2.2 PRINCIPAIS CONCEITOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL


A Análise Institucional trabalha muito no entendimento dos conceitos
como ferramentas de intervenção. Foi Georges Lapassade quem cunhou alguns
dos principais conceitos utilizados por institucionalistas e psicólogos que utilizam
a Análise Institucional como proposta de trabalho.

Um conceito muito importante é a diferenciação entre instituinte/instituído.


O instituinte representa um aspecto ou momento do processo de institucionalização
em que os sentidos e as ações ainda estão em movimento e constituição; é o
momento e a operação mais produtivos da instituição. O instituído, por outro lado,
seria o engessamento desse processo representado pelo instituinte, o momento em
que não há questionamento, ele se confunde com a própria instituição.

Outra diferenciação importante de dois outros conceitos é entre


organização e instituição. Organização configura um nível da realidade social
em que as relações são instrumentalizadas por regras e que se localiza no interior
de estabelecimento, isto é, em espaços físicos determinados. A instituição é o que
representa a lei que organiza todo o tecido de uma formação social; está acima
dos estatutos das organizações.

Como exemplo, podemos citar a sala de aula: a relação entre as pessoas


é organizada por normas e regras que, em alguma medida, estão regidas no que
está inscrito em uma lei maior para o ensino. Nesse âmbito, o professor pode
se constituir como um representante do Estado diante de seus alunos, o que
configuraria, nessa relação, uma relação de poder, mas remetida à obediência a
uma determinada burocracia. Isso passa pelo questionamento da escola em seus
processos de produzir autonomia e não-alienação das relações que o constituem.

124
TÓPICO 2 — CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

FIGURA 11 – SALA DE AULA

FONTE: <https://shutr.bz/2X2xdm7>. Acesso em: 01 ago. 2021.

O trabalho do psicólogo a partir da via da Análise Institucional seria mais


estrategicamente político, mas também psicológico, ao analisar essas relações
institucionais e convergir para a promoção da autonomia dos sujeitos. Segundo
Campos (2002), a denominação “Análise Institucional” abarcou uma diversidade
de entendimentos e modos de trabalhar, sobretudo os psicanalíticos, de tal modo
que, hoje, a referência comum tem sido o fato de trabalhos institucionais e/ou
junto a instituições.

2.3 ANÁLISE INSTITUCIONAL NO BRASIL


Quando falamos de trabalhos guiados pela Análise Institucional no
Brasil, estamos falando de experiências de trabalho em escolas, favelas, hospitais
psiquiátricos, instituições correcionais etc.

Os psicólogos que atuam a partir dessa abordagem mostram suas


experiências de trabalho com uma questão em comum: quais são as contradições,
obstáculos e desafios que estão em jogo no trabalho dos agentes que, dentro das
instituições públicas, buscam atuar a partir de uma proposta verdadeiramente
alternativa, política e produtora de conhecimentos?

FIGURA 12 – SISTEMA PRISIONAL

FONTE: <https://shutr.bz/2YIf5hW>. Acesso em: 01 ago. 2021.

125
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Outro aspecto comum é voltado para a concepção da prática institucional


como processo, em que o técnico atua como mediador dos obstáculos e conflitos
presentes entre o modo de ver da população ao demandar por serviços públicos
dignos, que atendam às suas necessidades e direitos, e a recepção assumida pelo
Estado diante dessas exigências.

A proposta de fazer análises da prática institucional de grupo, que possam


pensar acerca da relação conflituosa entre o Estado e a população usuária dos
serviços públicos, traz para o cenário acadêmico e para a vida das pessoas a visão
de que é possível tomar a prática como geradora de teoria, ao passo que pode ser
orientada por ela. Isto é, na medida que a população toma para si esse conhecimento,
consegue adotar posturas mais reivindicadoras e mais propositivas.

FIGURA 14 – POSTURAS REIVINDICADORAS E PROPOSITIVAS

FONTE: <https://shutr.bz/3Awwt6f>. Acesso em: 01 ago. 2021.

A Psicologia, a Psicanálise e a Socioanálise fazem aliança com a política


na produção de um saber-instrumento que possibilite o entendimento dos
componentes que fazem parte da ação estatal por meio de suas instituições. A
função dos técnicos da Análise Institucional, a má-remuneração e as condições
indignas de trabalho, os aspectos da população-clientela, os melindres político-
partidários nas instituições públicas, os desejos e frustrações do grupo, o
andar e desandar da perspectiva de trabalho são elementos levados em conta
pelos analistas institucionais e que mobilizam os profissionais interessados na
construção de uma prática social inovadora e criativa.

126
TÓPICO 2 — CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

DICAS

Para ter acesso às intervenções dos analistas institucionais no Brasil, leia o livro:
KAMKHAGI, V.; SAIDON, O. Análise Institucional no Brasil. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1987.

3 PROCESSOS DE SUBJETIVAÇÃO
Quando trabalhamos com a Psicologia Institucional, com a Psicologia
Social Comunitária ou com a Análise Institucional, é sempre importante lembrar
que essas perspectivas levam em consideração a necessidade histórica de efetivar
novas lutas, sempre na direção da produção da diferença de si e do outro.

Essas lutas se organizam em torno da problematização da organização


social que já temos constituída, mas também sobre as outras que podemos vir a
constituir. Dessa forma, é preciso analisar que estamos sob o contexto histórico
da compreensão de um Estado que funciona a partir de dispositivos de controle
para sempre se manter em seu formato já instituído, sendo auxiliado com toda
uma rede de poder-saber.

Ainda assim, é importante ressaltar que o trabalho da concepção de poder


relacional nos permite pensar as resistências que se dão a essa rede de poder
organizada. Sendo assim, quando pensamos no trabalho da Psicologia nessas
perspectivas, não podemos refletir sua atuação que não seja aliada à ação política,
isto é, da perspectiva ética de ir além da investigação sobre os modos de viver, mas
também efetivar outros modos de viver. Isso diz respeito a lutar para transportar
o resultado das invenções subjetivas para o cotidiano das relações sociais.

3.1 NOÇÃO DE SUBJETIVIDADE


A ideia de subjetividade foi trabalhada por vários teóricos, de diversas áreas.
No curso de sua história, o homem não cessou de se construir a si mesmo,
ou seja, de trasladar continuamente o nível de sua subjetividade, de se
constituir numa série infinita e múltipla de subjetividades diferentes
que nunca alcançam um final nem nos colocam na presença de algo
que pudesse ser o homem (FOUCAULT, 1985, s.p.).

A subjetividade é um conceito muito importante para a Psicologia Social,


posto que viabiliza pensar na dinâmica relacional e não excludente entre individual
e coletivo, interior e exterior, dentro e fora, indivíduo e sociedade, acabando com
as dicotomias que fizeram parte da composição dessa área (NARDI, 2006), sendo
que a etimologia do próprio conceito de "subjetividade" se refere a sujeito.

127
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Mas o que é o sujeito? O percurso moderno e contemporâneo do


pensamento ocidental foi construído também a partir dessa pergunta. Os grandes
nomes da filosofia, especialmente Descartes, edificaram a concepção do sujeito
como indivíduo, como substância que existe com uma essência (“penso, logo,
existo”, dando a ideia de um sujeito que surge a partir da razão).

Guattari (2004) também vai se referir a essa tradição filosófica que fez
coincidir com o sujeito uma essência ou uma natureza humana. Sob esse aspecto,
o simples fato de existir enquanto espécie seria o bastante para conferir ao humano
uma essência. Em grande proporção, não deixamos de ser atravessados por essa
noção que, de inúmeras formas, contribui para que a nossa vida seja estruturada
de modo bastante enrijecido, agindo a partir de regras e valores instituídos que,
ao tomarem uma determinada forma dominante, são naturalizados como algo
que deve continuar como é.

De acordo com Guattari (2004, p.31), a “subjetividade é essencialmente


fabricada e modelada no registro do social”, ou seja, a produção da subjetividade
não pode estar desatrelada das condições históricas em que ela vive. Por exemplo,
quando o Brasil passou pela ditadura civil militar (1964-1984), os sujeitos que
existiam ali estavam fabricados a partir dos movimentos de interdição, censura,
impossibilidade de estar em grupos, caçada de manifestantes contra o regime e
se organizavam a partir desse modus operandi. O Brasil e, portanto, os sujeitos da
realidade democrática vivem a partir de um registro da Constituição Brasileira
de 1988, com liberdade de expressão, possibilidades de dizer e manifestar suas
insatisfações.

Sendo assim, quando a Psicologia Social pensa sobre o conceito de


subjetividade, refere-se a esta como uma matéria-prima viva e mutante a partir da
qual é possível vivenciar e criar diferentes modos de perceber e atuar no mundo.
Dessa forma, diferentes elementos são diariamente criados e abandonados a
partir de múltiplas combinações, tendo valor e duração históricos. Para entender
como esses elementos subjetivos se agrupam e, assim, obtêm diferentes formas,
veremos a seguir o conceito de modos de subjetivação.

3.2 MODOS DE SUBJETIVAÇÃO


Para entendermos esse conceito, precisamos compreender o que é definido
como sujeito. Segundo Campos (2002), nós somos constituídos das bilhões de
relações que estabelecemos no dia a dia. Alguns usam a palavra “sujeito” para
definir essa constituição.

Etimologicamente, sujeito é o subjectum, e o subjectum configura o que


está por baixo, o fundamento, o suporte em que nos penduramos. Seguindo essa
concepção, podemos conceber a subjetivação como um processo de constituição
do sujeito em que se produz relações com tudo o que coabitamos, podendo ou
não se escolher a que se quer conectar.

128
TÓPICO 2 — CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

Para Foucault, existem três modos principais de modos de subjetivação,


são eles:

● os diversos modos de investigação que intencionam alcançar o estatuto de


ciência;
● as práticas divisoras que seccionam o sujeito no interior dele mesmo;
● o modo pelo qual o poder interfere no sujeito ao se servir não só das maneiras
de subjetivação, mas também ao criar outras.

DICAS

Para entender melhor os processos de subjetivação, leia o artigo: MANSANO,


S. Sujeito, subjetividade e modos de subjetivação na contemporaneidade. Revista de
Psicologia da UNESP, n. 8, v. 2, 2009. Disponível em: https://seer.assis.unesp.br/index.php/
Psicologia/article/view/946. Acesso em: 16 set. 2021.

3.3 SUBJETIVIDADE E O PROCESSO GRUPAL


Podemos, assim, definir como subjetividade o modo pelo qual uma pessoa
sente, pensa, sonha, ama, bem como o modo de fazer de cada um. Subjetividade
é o que se refere ao nosso modo de ser: sou filho de brasileiros, estudo Psicologia,
não gosto de matemática, curto rock e black music, pratico Crossfit, tenho namorado.
Meu melhor amigo é filho de descendentes portugueses, vai super bem em
matemática, trabalha e estuda, gosta de samba, adora comer comidas exóticas
e é solteiro. Isto é, cada um a seu modo, com seus gostos e peculiaridades: sua
singularidade.

FIGURA 15 – SUBJETIVIDADE

FONTE: <https://shutr.bz/3iRtBLo>. Acesso em: 01 ago. 2021.

129
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

No entanto, falar de subjetividade não representa que os modos de ser são


inatos do indivíduo. O sujeito se constitui gradualmente, compondo-se a partir do
que o mundo social e cultural lhe fornece, e faz esse movimento em paralelo à
sua atuação no mundo, modificando-o; isso significa que nós somos ativos nessa
construção.

Produzindo e modificando a sua realidade externa, o homem está


constituindo e transformando a si próprio, sua realidade interna. E transformando
o mundo (externo), o homem constrói e transforma a si próprio. Portanto, cabe
dizer que os indivíduos estão constantemente trazendo para si novas matérias-
primas para edificarem suas subjetividades.

Sendo assim, podemos afirmar que a subjetividade não só é fabricada,


produzida, moldada, como também é auto moldável, ou seja, o homem pode
construir novas formas de subjetividade, refutando o assujeitamento e a
submissão à perda de memória imposta pela profusão de informações; indo
contra a padronização que exclui e estigmatiza o diferente, o reconhecimento
social atrelado ao consumo, a medicalização do sofrimento, que são as produções
de subjetividades hegemônicas do nosso contemporâneo.

Nessa direção, existe uma aposta de que a Psicologia Social Comunitária,


a Psicologia Institucional ou a Análise Institucional possa encorajar processos
em que os sujeitos se sintam capazes de participar da construção do seu próprio
destino e coletividade.

NOTA

Sintetizando, podemos afirmar que estudar a subjetividade, nos tempos atuais,


é tentar entender a construção de novos modos de ser, ou seja, estudar as subjetividades
emergentes, cuja produção é social e histórica. A pesquisa dessas novas subjetividades
vai esclarecendo as interrelações do cultural, do político, do econômico e do histórico
na fabricação do mais íntimo e do mais observável no homem — aquilo que o captura,
o submete ou o mobiliza para pensar e agir sobre os efeitos das formas de submissão da
subjetividade (BOCK; PATTO; YAMAMOTO, 2003).

130
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

● Análise Institucional foi o nome dado ao movimento que pressupunha uma


determinada maneira de entender as relações sociais, com um conceito de
instituição próprio e uma forma de compreender a atuação do profissional
psicólogo, que é de natureza eminentemente política.

● A Análise Institucional ou Socioanálise é uma das propostas do


Institucionalismo mais trabalhadas no Brasil.

● Os psicólogos que atuam a partir da Análise Institucional mostram suas


experiências de trabalho com uma questão em comum: quais as contradições,
obstáculos e desafios que estão em jogo no trabalho dos agentes que, dentro das
instituições públicas, buscam atuar a partir de uma proposta verdadeiramente
alternativa, política e produtora de conhecimentos.

● Podemos afirmar que estudar a subjetividade, nos tempos atuais, é tentar


entender a construção de novos modos de ser, ou seja, estudar as subjetividades
emergentes, cuja produção é social e histórica.

131
AUTOATIVIDADE

1 A Análise Institucional é um movimento que teve seu início na França, na


década de 1960, com René Lourau e Georges Lapassade. Sobre a Análise
Institucional, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A Análise Institucional foi o nome dado ao movimento que pressupunha


uma determinada maneira de entender as relações sociais, com um
conceito de instituição próprio e uma forma de compreender a atuação
do profissional psicólogo, de natureza eminentemente política.
b) ( ) A Análise Institucional compreende as intervenções em saúde mental
e psico-higiene (promoção do bem-estar) nos grupos e atividades
cotidianas.
c) ( ) A Análise Institucional problematiza as relações de poder e a tomada
de consciência da dominação entre os grupos, ou seja, traz de volta,
dentro dos processos grupais, a dimensão política e institucional, em
uma abordagem psicanalítica.
d) ( ) A Análise Institucional se baseia na compreensão da relação e da
intervenção social; entender as relações que se estabelecem nas
instituições, nas famílias, comunidades, nos diversos grupos como
elementos de análise, para a intervenção e promoção da saúde a partir
da leitura psicanalítica.

2 Para compreendermos melhor a Análise Institucional, precisamos passar


pelo que se convencionou chamar de Movimento Institucionalista. Com
base no que foi o Movimento Institucionalista, analise as sentenças a seguir:

I- O conceito “movimento institucionalista” apareceu nas décadas de 1960,


1970 e 1980, em diferentes lugares do mundo, abarcando uma série de
teorias, práticas e experiências, que têm como referência a autogestão e
a autoanálise, com a perspectiva de encorajar vivências mais coletivas e
produtoras de novos saberes.
II- Podemos mencionar, do Movimento Institucionalista, as seguintes
áreas de estudo: Psicologia Comunitária, Psicologia Comportamental,
Psicologia Positiva e Psicologia Cognitiva.
III- No lugar de adotar uma postura identitária, o Movimento Institucionalista
intenciona propor a lógica da diferença, buscando promover
descontinuidades objetivas e subjetivas em experiências institucionais já
cristalizadas de um determinado modo.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

132
3 A Análise Institucional trabalha muito no entendimento dos conceitos como
ferramentas de intervenção. Foi Georges Lapassade quem cunhou alguns
dos principais conceitos utilizados por institucionalistas e psicólogos
que utilizam a Análise Institucional como proposta de trabalho. Sobre os
conceitos cunhados pela Análise Institucional e o trabalho do psicólogo na
área, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Um conceito muito importante para a Análise Institucional é a diferenciação


entre instituinte/instituído. O instituído representa um aspecto ou momento
do processo de institucionalização em que os sentidos, as ações ainda estão
em movimento e constituição. O instituinte seria o engessamento desse
processo, o momento em que não há questionamento.
( ) Um conceito muito importante para a Análise Institucional é a diferenciação
entre organização e instituição. Instituição configura um nível da realidade
social em que as relações são instrumentalizadas por regras e que se localiza
no interior de um estabelecimento, isto é, em espaços físicos determinados.
A organização é o que representa a lei que organiza todo o tecido de uma
formação social.
( ) O trabalho do psicólogo a partir da via da Análise Institucional seria mais
estrategicamente político, mas também psicológico, de analisar essas relações
institucionais e convergir para a promoção de autonomia dos sujeitos.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V - F - F.
b) ( ) V - F - V.
c) ( ) F - V - F.
d) ( ) F - F - V.

4 A Análise Institucional ou Socioanálise é uma das propostas do


Institucionalismo mais trabalhadas no Brasil. Disserte sobre a Análise
Institucional no Brasil.

5 Quando pensamos no trabalho da Psicologia na perspectiva da Análise


Institucional, não podemos refletir sua atuação que não seja aliada à ação
política, isto é, da perspectiva ética de ir além da investigação sobre os modos
de viver, mas também efetivar outros modos de viver, ou seja, de promover
outros processos de subjetivação. Disserte sobre a noção de subjetividade.

133
134
TÓPICO 3 —
UNIDADE 3

A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO


PSICANALÍTICO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, no Tópico 3, veremos como a Análise Institucional (A.I.)
tem inspirado muitos movimentos no Brasil. A influência vai desde a clínica
psicológica, as práticas em saúde coletiva, as intervenções no território da gestão
em saúde ou na pesquisa universitária; seus conceitos são constantemente
revisitados e usados.

Como vimos anteriormente, a A.I. assumiu uma proposta de se estabelecer


como um campo também de criação e operacionalização de conceitos, desde
o momento em que foi criada, na década de 1960, na França. O objetivo deste
tópico é trazer os conceitos fundamentais da A.I, trabalhando com a pesquisa-
intervenção, que é um instrumental bastante utilizado em terras brasileiras.

Daremos enfoque aos conceitos de análise da encomenda, análise da


demanda, transversalidade, analisador e análise da implicação, passando pelos
conceitos de inconsciente institucional, transferência e contratransferência
institucional e sobre implicação.

2 TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA

Neste trecho, traremos a concepção de transferência e contratransferência
de Sigmund Freud, para que fique mais claro abaixo os desdobramentos deste
conceito por algumas correntes do movimento institucionalista.

A transferência foi um conceito produzido por Freud para falar de uma


classe de fenômenos psíquicos que se manifesta pelo constante reaparecimento
de padrões inconscientes de relações amorosas vivenciadas no passado, e com
outras pessoas, agora no presente (FREUD, 1912/1976).

Freud, como em grande parte de sua obra, foi elaborando esse conceito
ao longo de toda a sua pesquisa, pois o autor criava e reeditava suas ideais a
partir da experiência de sua prática clínica. Portanto, o conceito de transferência
ao longo de seus escritos foi trabalhado de algumas maneiras, mas sem
corromper seu sentido original, que é: os sujeitos fazem reedições dos vínculos
com as personagens significativas do início da sua vida (mãe, pai etc.), quando
aparece uma situação atual próxima de algum registro traumático infantil. Essa

135
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

repetição é o ponto de partida e a possibilidade de análise nas neuroses, sendo


que os conflitos afetivos podem ser projetados na figura do psicanalista, dando a
possibilidade de conhecer os motivos inconscientes do comportamento do sujeito
e guiando a interpretação do analista.

A Figura 16 ilustra os principais conceitos da teoria freudiana, a saber:


psicanálise, associação livre, transferência e complexo de édipo. Freud produziu
esses conceitos a partir da sua prática e investigação clínica.

FIGURA 16 – FREUD E A PSICANÁLISE

FONTE: <https://shutr.bz/3ByDOUa>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Já quando falamos da contratransferência, precisamos ter em vista


a relação transferencial com o analisando. Toda análise é atravessada pela
contratransferência. Esse mecanismo corresponde a uma das temáticas principais
e mais conflituosas da teoria e da técnica psicanalíticas, posto que interfere na
prática do analista no cotidiano de sua clínica e o coloca frente à sua análise
pessoal, supervisão e estudo clínico, tal qual a angústia diante dos caminhos da
transferência do analisando.

A transferência e a contratransferência foram observadas nos obstáculos


advindos do tratamento clínico por estarem relacionados aos entraves da relação
analítica e, portanto, serem tidas como obstáculos ao processo analítico.

O que se registra é que o conceito de contratransferência foi pouco trazido


por Freud em seus escritos. Poucas foram as passagens dedicadas ao conceito do
termo, ainda que seja possível recuperar algumas linhas sobre o assunto de forma
indireta em diferentes textos de sua obra.

136
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

No primeiro momento, Freud (1912) acreditava que seriam as emoções


experimentadas pelo analista em atendimento que proporcionariam um melhor
entendimento do psiquismo humano. No entanto, em um segundo momento
de suas pesquisas, Freud vai conceber que as particularidades ou emoções do
analista podem produzir uma interferência negativa na experiência clínica e,
dessa forma, necessita ser controlada.

Essa ambiguidade em relação à contratransferência permanece ao longo


de seus escritos: ao mesmo tempo, algo importante da relação transferencial a ser
considerado, mas uma barreira a ser transposta.

A ambiguidade no conceito deixou margem para haver dois pontos


de vista sobre o assunto: a clássica e a contemporânea. Na proposta clássica, a
contratransferência é lida como um empecilho e uma resistência inconsciente
do analista para possibilitar as associações livres do analisando e atrapalhar a
continuidade da análise (LEITÃO, 2003), sendo que na ótica contemporânea, a
contratransferência é tida como importante para o processo da análise.


2.1 TRANSFERÊNCIA FREUDIANA E SEUS IMPASSES PARA A
PSICOLOGIA INSTITUCIONAL
Marlene Guirado, professora de Psicologia e grande expoente da Psicologia
Institucional atual, propôs, em sua tese, um reajuste do conceito de transferência
para pensar essa relação entre psicólogo e público-alvo não só dentro de uma
dinâmica institucional (uma organização), mas em perspectiva com a análise das
instituições que atravessam o sujeito (GUIRADO, 2010).

Guirado entende a importância da reinvenção do conceito de transferência,


ainda que na clínica da Psicanálise, para que se pudesse redimensionar a escuta.
A autora afirma que o discurso do analista faz parte do discurso em análise, e
de que esse discurso pode transferir para o contexto concreto de uma sessão as
teorias creditadas como verdade sobre o paciente, que assim se antepõem à sua
fala (GUIRADO, 2010, p. 51). Dessa maneira, o discurso em análise é o da própria
Psicanálise como prática clínica.

A autora traz um exemplo de atendimento psicológico, pensando o


conceito de transferência para além do cenário do setting analítico, em um contexto
institucional: imaginemos o atendimento psicológico a adolescentes internos
da FEBEM (hoje, Fundação CASA). O público que está ali cria relações muito
singulares com o seu terapeuta ou analista. Neste território, o psicólogo tem a
responsabilidade de produzir relatórios, avaliações de periculosidade, avaliação
emitida ao juiz, se o jovem pode ou não ter a liberdade.

Então, é possível afirmar que o jovem produz muita expectativa com


relação ao trabalho do terapeuta, posto que ali está colocado o direcionamento de
sua vida. De outro lado, o terapeuta também possui as suas próprias expectativas
137
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

(medos também) em relação ao adolescente que chega algemado para a avaliação.


O terapeuta pode ter notícias do comportamento desse jovem na internação,
chegadas aos seus ouvidos por outras fontes. Fora isso, existe ali instituído o
lugar de quem atende e do outro que será atendido, uma relação de poder que
não passa só pelas mãos do terapeuta, mas do jovem também, com o poder que
é exercido sobre ele.

FIGURA 17 – ADOLESCENTES ENCARCERADOS

FONTE: <https://shutr.bz/3iQ2GzI>. Acesso em: 01 ago. 2021.

A partir desse exemplo, Guirado (2010) conclui que não é possível atuar
somente com a ideia inicial de transferência, quando o psicólogo terapeuta tem
pouca margem de liberdade com relação aos seus incômodos e pontos de angústia
e quando o paciente ou analisando se apresenta de maneira bem diferente daquele
paciente que procura um terapeuta em seu consultório.

2.2 CONCEITOS DA ANÁLISE INSTITUCIONAL E A SUA RELAÇÃO


COM A TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA
Para a Psicanálise, em uma situação analítica, o indivíduo procura o
psicanalista a partir de uma demanda, uma queixa, como “preciso que você me
ajude a resolver isso”, “estou em sofrimento, porque me separei”, ou seja, a pessoa
leva um pedido para o setting. No entanto, o psicanalista não pode ceder a essa
demanda sem que ele e o analisando consigam escutar as formações inconscientes
que perfazem essa queixa. E esse movimento só é possível de ser feito a partir do
estabelecimento da relação transferencial.

A relação transferencial para a Psicanálise permite que o sujeito consiga


colocar o analista na posição de Outro (sujeito suposto saber) e projetar nele as
suas reedições infantis.

138
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

FIGURA 18 – ANÁLISE INSTITUCIONAL

FONTE: <https://shutr.bz/3DvjqE9>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Para a Análise Institucional, acontece uma dinâmica muito parecida


quando ao psicólogo é colocada uma encomenda de trabalho. Uma das primeiras
etapas da intervenção na A.I. é a análise da encomenda, que é realizada depois
que o pedido de trabalho (encomenda) se dá pela organização.

Nessa análise da encomenda está contida toda a análise que o profissional


vai realizar, ou seja, entender a correlação de forças em que o problema está inserido.
O trabalho de Análise Institucional começa quando dinâmicas não observadas
aparecem em paralelo ao pedido de intervenção da organização. A perspectiva
crítica da A.I. faz surgir as demandas de intervenção que nunca aparecem de
antemão, apenas aparecem quando se dá o encontro com o analista institucional
e este faz surgir perguntas e dinâmicas que não estavam presentes até o momento
do pedido. Uma das perguntas que podem aparecer no momento da análise da
encomenda é sobre quem é o cliente: os participantes da organização ou os diretores
que produziram a encomenda discutiram o contrato em nome de todos os que ali
trabalham? Estes aceitam ser também ser alvo da análise? (LOURAU, 1993).

A análise da oferta é outro dispositivo da A.I. que diz respeito a um


mecanismo da contratransferência, pois significa pôr em análise os próprios
profissionais que ofertam o serviço de intervenção. O exercício é se colocar
também enquanto profissional como uma instituição (que pode estar cristalizada
em algumas práticas), procurando se interrogar sobre o modo como as próprias
intervenções podem suscitar uma espécie de especialismo (BAREMBLITT, 1994).
Por exemplo, na sua oferta de trabalho, o psicólogo que diz curar as pessoas
da ansiedade gera uma expectativa na pessoa que procura seus serviços. Os
psicólogos, os analistas institucionais e todos aqueles que são convocados
a falar algo sobre a realidade ou a intervir sobre ela com o mandato social de
possuidores da verdade sobre o sujeito precisam colocar constantemente em
análise a encomenda de intervenção e as ofertas por eles realizadas.

139
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

NOTA

“Mandato social” corresponde ao pedido realizado a intelectuais e especialistas


para que falem a “verdade” sobre a realidade (BAREMBLITT, 1994).

Vejamos exemplo da análise de encomenda e da análise da oferta: a diretoria


de uma unidade escolar privada pede a intervenção da Psicologia em sua escola,
solicitando que professores pudessem melhorar a sua relação com os alunos, pois
estavam recebendo reclamações de pais e alunos. Os psicólogos, por sua vez,
trabalhando pelo viés da A.I., se não colocarem essa encomenda em análise, correm
o risco de entrarem na escola para corrigir a conduta dos professores com os alunos,
sem entender de antemão o que acontece naquela escola. Os psicólogos precisam
analisar a oferta, no sentido de se questionarem qual serviço estão oferecendo, na
medida em que a escola entendeu que o psicólogo pode se constituir no papel de
consertar determinadas relações.

FIGURA 19 – PERSPECTIVA DA ANÁLISE INSTITUCIONAL

FONTE: <https://shutr.bz/3ByKHVx>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Dessa maneira, a A.I. coloca a si própria em análise, como caso. Além dos
casos da clínica, a própria clínica como caso.

2.2.1 Análise de Implicação, transferência e contratransferência


Existe um outro conceito muito importante da A.I. que remete a
transferência e a contratransferência: é a Análise da Implicação. Em um movimento
de produção incessante desse termo, uma de suas linhas de composição se refere
ao conceito psicanalítico de contratransferência.

140
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

A elaboração conceitual das práticas da Análise Institucional se firmou


na tese que Lourau (1993) defende no ano de 1969. Nesta, vemos que Lourau
pega de empréstimo conceitos de muitas áreas aparentemente díspares: a
transversalidade de Guattari; a implicação tomada do Direito e da Matemática;
a transferência institucional e a contratransferência institucional herdada da
Psicoterapia Institucional.

Para a A.I., a intervenção não significa observar de fora um objeto dado,


ou seja, um especialista que olha o seu objeto de estudo com neutralidade.
Intervir significa construir o objeto de intervenção de dentro, simultaneamente
construindo a si mesmo no momento da intervenção.

Nesse movimento de ser parte da intervenção, os analistas precisam


analisar também aquilo que compõe a sua parte, ou seja, seus afetos, emoções,
seu desejo, suas formações inconscientes etc.

Dessa forma, concebem que para trabalhar com as contratransferências


institucionais precisam entender seu sistema de respostas, ou seja, fazer a sua
análise de implicação: a resposta que o analista dá ao público com que trabalha,
em relação a várias; a resposta que oferece à organização-cliente, atuando
como instituição e, dado que se coloca como instituição de análise, analisar a
resposta que dá às respostas (transferências) de sua própria organização analítica
(LOURAU, 1993). O analista emerge, assim, como ator social.

2.3 PSICOTERAPIA INSTITUCIONAL EM RELAÇÃO AOS


CONCEITOS DE TRANSFERÊNCIA E CONTRATRANSFERÊNCIA
Podemos localizar na história de construção da A.I. na França, na década
de 1960, algumas vertentes de trabalho, mas a que trataremos aqui é a Psicoterapia
Institucional que está conectada à saúde mental, elaborada a partir da década de
1940 com a experiência inicial no hospital psiquiátrico de Saint Alban, durante
a Segunda Guerra (CAMPOS, 2002). É importante ressaltar o trabalho do autor
Félix Guattari, que, no final da década de 1950, elaborou conceitos significativos
para a A.I., dentre eles, o de analisador e transversalidade.

Felix Guattari introduz o conceito de transversalidade como aquele


com diferentes referências, principalmente como tentativa de modificar, nas
organizações psiquiátricas, a hierarquia vertical, entendendo que o pensamento
institucional podia ser trazido para outros modos de relação entre os grupos, o que
denominou de “grupos sujeito” e “grupos sujeitados”. Pegando de empréstimo
a contribuição dual e fantasmática da transferência psicanalítica (naquilo que se
refere às contribuições do conceito de inconsciente), a amplia e a correlaciona aos
movimentos grupais em seus diversos níveis de abertura.

141
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

Ao ampliar o conceito de transferência, Guattari o nomeia como


transversalidade, afirmando as dinâmicas libidinais, em jogos fantasmáticos,
em regimes de afetabilidade que se dão no registro coletivo e, assim, conferem
um sentido que é também político. Clínica e política se tornam indissociáveis
nessa linha da A.I. que sofistica o conceito de grupo a partir de suas dinâmicas
subjetivas: a dinâmica de menor grau de abertura para a mudança e análise
representa o grupo assujeitado e a de maior transversalidade, os grupos sujeitos.

Outro conceito importante de Guattari é o de inconsciente institucional, que


também faz paralelo com a Psicanálise. O termo “instituição” corresponde a uma
realidade que perpassa as organizações e estabelecimentos, mas representando
um conjunto de forças que estão nesses estabelecimentos. Esse conjunto de
forças, numa relação que não para de fazer e desfazer, produz nas organizações
demandantes do trabalho da A.I. um não-dito institucional.

Esse não-dito é nomeado inconsciente institucional (BAREMBLITT, 1994),


que sempre esteve subentendido na análise dos vínculos, das transferências
e contratransferências institucionais. Essas análises não eram efetivadas no
plano da consciência, do imediato, explícito: as encomendas não expostas pelas
organizações de pronto, os vínculos estavam em um outro registro mais implícito
e as análises das encomendas seguiam, justamente, na direção de tentar esclarecer
esses não-ditos da instituição.

3 ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO E SEUS PROCESSOS


O Acompanhamento Terapêutico (A.T.) é uma modalidade de trabalho
clínico surgida dos movimentos político-ideológicos da Antipsiquiatria, do qual o
movimento institucionalista, em especial, a Psicoterapia Institucional de Guattari
contribuiu de forma contundente (SILVA, 2004).

Grande parte dos estudos acerca do A.T. tenta produzir um perfil para o
acompanhante terapêutico a partir do seu aparecimento e conjuntura histórica.
No entanto, não se tem uma unanimidade científica, embora haja algumas marcas
que a caracterizam. Ainda não se chegou a um consenso científico: ela pode ser
vista a partir do olhar de diferentes teorias.

A prática diversa não facilita a identificação precisa do A.T e, como efeito,


a tradução de um conceito definitivo. Ainda assim, com o objetivo de caracterizar
o Acompanhamento Terapêutico, traremos a sua definição, as características
de seu surgimento na história e o seu papel e o olhar a partir dos movimentos
institucionalistas.

142
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

3.1 QUEM É O ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO


A designação de Acompanhamento Terapêutico vem das propostas
psicanalíticas. O Acompanhamento Terapêutico advém dos efeitos e movimentações
políticas do Movimento Antipsiquiátrico e da Psicoterapia Institucional que
aconteceu nos idos da década de 1950 na Europa e nos Estados Unidos.

Na América Latina, estudiosos demarcam o aparecimento da figura do


AT no final da década de 1960, em Buenos Aires, na Argentina, que contava com
a efervescência de psicanalistas conectados aos hospitais psiquiátricos (SILVA,
2004). A Reforma Psiquiátrica no Brasil, preconizando os direitos fundamentais
do direito a saúde e da dignidade de condições de vida, teve por um de seus
objetivos desativar manicômios que ofereciam péssimas condições de tratamento
aos pacientes ali internados.

FIGURA 20 – REFORMA PSIQUIÁTRICA

FONTE: <https://shutr.bz/3auhWxA>. Acesso em: 01 ago. 2021.

No entanto, o trabalho do AT não somente ultrapassa a terapia de


consultório, como também se coloca à disposição de intervir no ambiente do
indivíduo, isto é, atuando dentro e fora da instituição, encorajando o paciente a
se deslocar física e psicologicamente.

A prática institucional acaba por homogeneizar as características, as


histórias e as singularidades dos pacientes que lá estão. Os usuários se tornam
"abrigados" e "protegidos", em muitos momentos até de suas próprias histórias.
São produzidos subjetivamente como "incapazes", "deficientes", "loucos" ou "com
problemas", fixados e aglutinados no cotidiano da instituição, que vai formando
seus comportamentos e uniformizando suas experiências.

A vida da pessoa em internação acaba sendo constituída pela falta de


vínculos afetivos, pela insuficiência de objetos particulares e pela falta de rituais
de passagem (comemoração de aniversários, festas etc.). O atendimento interno é

143
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

caracterizado pela disciplina rígida, que se dirige a aquietar e disciplinar o corpo,


pelo castigo físico exagerado e arbitrário, pela humilhação, pela insistência em se
constituir um “bom assistido” e, dessa forma, se tornar dependente e infantilizado
(ALTOÉ, 1993, p. 18).

O A.T, assim, pode ser identificado como modalidade clínica que se


beneficia do espaço público da cultura como território para o ato terapêutico.
O trabalhador de saúde que se vale da metodologia de atuação do A.T. na sua
prática se propõe a circular com o usuário pelo tecido social, produzindo a
emergência de um encontro com a cidade em que este usuário habita. O A.T.
se transforma, então, em acompanhante do processo de mudança do usuário,
produzindo outros espaços para seu paciente transitar pela cidade, promovendo
a interlocução da sociedade com aquilo que ela não quer lidar, desmistificando
a visão do “louco” na cidade. A cidade é, nessa direção, também participante
especial da cena, junto com acompanhado e acompanhante.

DICAS

Para saber mais sobre a história da Reforma Psiquiátrica e sobre a história do


funcionamento dos hospitais psiquiátricos brasileiros, vale a pena ler: ARBEX, D. Holocausto
brasileiro. São Paulo: Geração Editorial, 2013. Assista também aos filmes Bicho de Sete
Cabeças, 2000 (dirigido por Laís Bodanzky); Nise - No coração da loucura, 2016 (dirigido
por Roberto Berliner) e à série Colônia, 2021 (dirigida por André Ristum).

O A.T. nos oferece possibilidades de estabelecer uma relação do paciente


com a cidade e da cidade com o paciente, na qual é viável não precisar anular a
alteridade dele, em que se pode criar modos de existência menos estereotipados
e trabalhar a diferença como mais uma forma de existir. Esse caminho nos leva
a pensar a clínica do A.T. como um ato político que promove outros modos de
estar e ver a cidade, mais acolhedores e menos produtores de exclusão, a partir
das mudanças de olhar.

3.2 HISTÓRIA DO SURGIMENTO DA FUNÇÃO ACOMPANHANTE


TERAPÊUTICO
Trazer a perspectiva histórica do aparecimento da figura do Acompanhante
Terapêutico é extremamente importante, posto que nos ajuda a entender as
práticas atuais desse profissional.

O Acompanhamento Terapêutico, como categoria clínica, está historicamente


atrelado às propostas de desinstitucionalização advindas da Reforma Psiquiátrica
(NETO, 1995). O movimento antimanicomial produziu transformações significativas
144
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

no modo de se entender o atendimento às pessoas com transtorno mental, lançando


diretrizes para a Reforma Psiquiátrica (BRASIL, 2001). Essa reforma tem como
mote a alteração do tratamento fundamentado no modelo hospitalocêntrico por
categorias de cuidado interdisciplinar e intersetorial às pessoas que apresentam
sofrimento psíquico grave.

Sendo assim, o que se quer com a reforma psiquiátrica é a transformação


do modelo clássico hospitalar por um modelo territorial, no qual o sujeito possa
estar em contato com a cidade, com o território em que ele reside, onde possa
constituir seus vínculos. Essa nova abordagem não se refere somente a tirar
os pacientes psiquiátricos já internados há muito tempo dos hospitais ou de
encerrar as atividades dos hospitais psiquiátricos, mas de desinstitucionalizar a
loucura. Nessa direção, começa-se a operar buscando a produção de um espaço
de produção de subjetividade, de modo que o indivíduo possa se estabelecer sem
ser moldado a partir das lógicas e normas institucionais.

FIGURA 21 - TRANSFORMAÇÃO DO MODELO CLÁSSICO HOSPITALAR POR UM MODELO


TERRITORIAL

FONTE: <https://shutr.bz/3lvlztn>. Acesso em: 01 ago. 2021.

O Acompanhante Terapêutico será, então, um desses atores cujo objetivo


é poder promover as passagens entre a cidade e a instituição, entendendo que
o paciente cronificado (já internado há muitos anos) não está mais acostumado
a viver fora da instituição. O acompanhamento terapêutico, assim, "como
modalidade de atenção em saúde constitui uma grande ferramenta da Reforma
Psiquiátrica, através da qual se investe na constituição de um enlace entre sujeito
e social" (CABRAL; BELLOC, 2004, p. 116).

O acompanhante terapêutico se tornou uma figura aliada no processo


de desenvolvimento e manutenção de relações sociais e na atuação constante na
qualidade de vida do sujeito que é portador de algum problema de saúde, que
o inviabiliza ou inviabilizou a continuidade de seus laços de trabalho, estudo,
familiares e do cuidado consigo mesmo.

145
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

3.3 PAPEL DO ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO


O papel do AT se constitui pelo ato de apresentar o "dentro" para o "fora"
e o "fora" para o "dentro", ou seja, trabalhar na intercessão entre o paciente e a
instituição e, mais do que isso, diminuir a distância entre eles.

Como já dito, a instituição pode assumir um papel de homogeneização


dos pacientes, apagando as suas singularidades, sua história, seus gostos e
necessidades. O A.T., ao acompanhar o sujeito, resgata essas especificidades do
paciente, tanto para a instituição, quanto para a cidade, nos momentos em que
saem à rua, seja para passear pela cidade, para resolver questões burocráticas,
para resgate das relações familiares ou para práticas de lazer.

FIGURA 22 – ACOMPANHANTE TERAPÊUTICO

FONTE: <https://shutr.bz/3v1AXk6>. Acesso em: 01 ago. 2021.

Gradualmente em seu trabalho, o A.T produz um território de existência


para que esses indivíduos deixem de ser somente os “abrigados do mundo”
(TAVARES, 2004), posto que eles também são moradores do bairro. Pensando
a partir da proposta do AT, entende-se que o sujeito precisa ser visto a partir do
seu contexto social e de existência, para além da administração dos sintomas,
frequências e intensidades.

Dessa forma, entende-se que a clínica se encontra com a política, pensando


sua prática como uma proposta de costura entre o sujeito e o social: o coletivo; o
coletivo referindo-se a estar integrado com o plano de produção, em que se pode
experimentar a diferenciação (BENEVIDES, 2005).

146
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

LEITURA COMPLEMENTAR

PSICOLOGIA INSTITUCIONAL: O EXERCÍCIO DA PSICOLOGIA COMO


INSTITUIÇÃO

Marlene Guirado

RESUMO: O presente texto visa a atualizar e recolocar, agora no âmbito das


mudanças de contexto conceitual e concreto do exercício da Psicologia como
instituição, o que já se vinha esboçando como uma proposta de Psicologia
Institucional que respeitasse a especificidade de ação do psicólogo. O capítulo
quatro do livro Psicologia Institucional (GUIRADO, 1987/2004), intitulado “Em
busca de uma especificidade de atuação do psicólogo”, é revisitado e revisado
à luz dessas mudanças. Mais que isso, é reescrito numa tal ordem que se pode
acompanhar o avanço do pensamento e da prática profissional, desde então.
Partindo da diferenciação entre os modelos psicanalítico e sociológico de
Psicologia Institucional, discute-se tal distinção, confluindo para uma terceira
proposta, a qual permite tratar a própria Psicologia como instituição, bem como
permite tratar o seu exercício, no interior de outras práticas institucionais, como
Análise Institucional do Discurso. Situações exemplares são destacadas para dar
a conhecer essa estratégia de pensamento.

Palavras-chave: Psicologia Institucional; Psicologia como instituição; Análise


Institucional do discurso.

Desde o final da década de 1980, tenho procurado discutir a especificidade


do trabalho e da pesquisa em Psicologia quando esta se faz junto a outras
instituições sociais.

Essa discussão estendeu-se à clínica, numa inversão aparentemente


contraditória, uma vez que nesse contexto, a Psicologia teria tudo para “reinar
absoluta”, para definir o quê e o como as coisas devem ser feitas. Afinal, pela
formação, pela regulamentação da profissão bem como pela expectativa do
público e dos agentes institucionais, esse é o território-rei do psicólogo.

No entanto, ao partir da especificidade de atuação do psicólogo nesse


contexto, como que num movimento de boomerang, acabamos por considerar
o consultório como instituição e isto nos exigiu esclarecer, cada vez mais, o
campo conceitual desse modo de pensar e fazer e pensar a Psicologia, já então
reconhecida como Psicologia Institucional.

O presente artigo visa a revisitar tais discussões, desenvolvidas


nesses quase 20 anos de trabalhos contínuos e intensos. Visa a demonstrar a
sustentabilidade da estratégia de pensamento que assim se organizou, no tempo
e pela experiência concreta e refletida, para hoje tratar a Psicologia Institucional,
não como uma área de atuação profissional, ao lado daquelas já conhecidas

147
UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA

(clínica, social e do trabalho, escolar, experimental), mas como um modo de fazer


concretamente a Psicologia; um modo de produzi-la na interface com outras
modalidades do conhecimento humano, configurando aí seu objeto e exercendo-
se ela própria como instituição.

Parece infindável essa tarefa: demonstrar a viabilidade de pensar a


Psicologia como instituição e daí derivar a ideia de que onde e como quer que
se a exerça, estaremos de algum modo reafirmando esse seu caráter; estaremos
produzindo e/ou reproduzindo uma prática, um conjunto de relações, que
reconhecemos legítima e naturalmente ser... Psicologia.

PSICOLOGIA: INTENÇÃO E EXTENSÃO

Há aproximadamente três décadas, começou a se tornar visível, entre nós,


a preocupação de estender a Psicologia para além das áreas em que habitualmente
se exercia: pesquisas de laboratório, psicodiagnóstico, psicoterapias, treinamento
e seleção profissional, predominantemente.

Por currículo e por lei, ora mais e ora menos contraditoriamente, o ensino
e a atuação profissional vão produzindo o desenho de uma Psicologia que não
parece querer ficar à margem das reflexões filosóficas e sociológicas, feitas nas
salas de aula, ou à margem de ações políticas das agremiações estudantis e dos
movimentos sociais e comunitários em geral.

Nesse desenho da profissão, ganhou espaço o trabalho junto a instituições


(aqui entendidas como organizações), sobretudo as de saúde, educação e
promoção social.

Em 1982, o governo do estado de São Paulo abriu vagas para psicólogos,


nos serviços públicos, contribuindo para a extensão dos limites institucionais da
profissão. Vários egressos das faculdades dirigiram-se para esses atendimentos
que tomaram um caráter multiprofissional, dada a abertura feita, também em
outras áreas. Os mestres universitários e profissionais mais experientes (entre
eles, estavam psicólogos e psicanalistas que migraram da Argentina para
cá) dedicavam-se à supervisão desses trabalhos. Não tardou a aparecer uma
disciplina na Universidade de São Paulo, ainda optativa: Psicologia Institucional.

Com o passar do tempo, os currículos de outras faculdades foram


incorporando o mesmo título. É assim que, cada vez mais, Psicologia e instituição
vão se tornando um binômio conhecido e reconhecido.

Tal efeito, no entanto, não resolve as questões oriundas de um trabalho


que, apesar de tudo, ainda não tinha um respaldo suficiente na formação e no
currículo. E, sendo as práticas concretas o carro-chefe, multiplicaram-se, quase às
raias da dispersão, os modos de compreensão e intervenção.

148
TÓPICO 3 — A ANÁLISE INSTITUCIONAL A PARTIR DO PENSAMENTO PSICANALÍTICO

Estamos falando agora do estado das coisas no final da década de 1980


e início da de 1990. Isto de tal forma que parecia haver tantos modelos de
trabalho quantos fossem os mestres e supervisores em campo. Uns se diziam
sociopsicanalistas, outros psicólogos institucionais, outros ainda, analistas
institucionais (e aqui, agrupava-se a maior variedade de posições, desde os
adeptos de Lapassade até os de seu parceiro intelectual, Lourau; ou, desde os que
assinavam uma autoria pessoal até os que se filiavam à orientação de Delleuze e
Guattari; e assim por diante).

Apesar da liberalidade na nomeação daquilo que faziam, profissionais e


autores sobre o tema produziam trabalhos até certo ponto diferentes sob a insígnia
institucional. Em parte, deriva dessa diversidade, no limite da indiferenciação,
uma vantagem para o exercício da Psicologia: multiplicaram-se (e se multiplicam)
iniciativas e tentativas de alargar os horizontes do pensamento e do fazer
concreto, extrapolando os já distantes limites legais e provocando os psicólogos a
abandonar determinadas certezas cristalizadas em suas modalidades de atuação,
para abraçar desafios ainda muito tensos e informes. O que está longe de ser
algo negativo. Gradativamente, permanecem dois títulos a significar os trabalhos
“junto às instituições”, como se costuma dizer: Psicologia Institucional e Análise
Institucional. Seriam elas a mesma coisa? A rigor, não.

FONTE: https://revistas.ufpr.br/Psicologia/article/viewFile/9447/11377. Acesso em: 30 jul. 2021.

149
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

● O conceito de transferência freudiano corresponde aos sujeitos que fazem


reedições dos vínculos com as personagens significativas do início da sua
vida (mãe, pai etc.), quando aparece uma situação atual próxima de algum
registro traumático infantil.

● Para a Psicologia Institucional, não é possível atuar somente com a ideia inicial
de transferência, posto que o psicólogo institucional tem pouca margem de
liberdade com relação aos seus incômodos e pontos de angústia, e o paciente
ou analisando se apresenta de maneira bem diferente daquele paciente que
procura um terapeuta em seu consultório.

● Existem conceitos da A.I. que remetem à transferência e à contratransferência.

● O acompanhante terapêutico é uma modalidade clínica que se encarrega de


atuar no espaço dentro e fora da instituição, entendendo esse movimento
como um ato terapêutico.

CHAMADA

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150
AUTOATIVIDADE

1 A transferência foi um conceito produzido por Sigmund Freud, pai da


Psicanálise, em sua clínica, e o termo operou muitas contribuições para o
movimento institucionalista. Sobre o conceito de transferência em Freud,
assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A transferência foi um conceito produzido por Freud para falar de


uma classe de fenômenos psíquicos que se manifesta pelo constante
reaparecimento de padrões inconscientes de relações amorosas
vivenciadas no passado, e com outras pessoas, agora no presente.
b) ( ) A transferência foi um conceito produzido por Freud que afirmava as
dinâmicas libidinais, em jogos fantasmáticos, em regimes de afetabilidade
que se dão no registro coletivo e, assim sendo, conferem um sentido que é
também político.
c) ( ) A transferência foi um conceito produzido por Freud que corresponde
a uma realidade que perpassa as organizações e os estabelecimentos, mas
representando um conjunto de forças que estão nesses estabelecimentos.
d) ( ) A transferência foi um conceito produzido por Freud que sofistica o
conceito de grupo a partir de suas dinâmicas subjetivas: a dinâmica de
menor grau de abertura para a mudança e análise representa o grupo
assujeitado, e a de maior transversalidade, os grupos sujeitos.

2 Toda análise na dinâmica psicanalítica é atravessada pela contratransferência.


Esse mecanismo corresponde a uma das temáticas principais e mais
conflituosas da teoria e técnica psicanalíticas, posto que interfere na
prática do analista no cotidiano de sua clínica. Com base no conceito de
contratransferência freudiano, analise as sentenças a seguir:

I- Freud, ao longo de toda a sua obra, acreditava que a contratransferência


se referia às emoções experimentadas pelo analista em atendimento e que
estas proporcionariam um melhor entendimento do psiquismo humano.
II- Freud, ao longo de toda a sua obra, concebe que as particularidades
ou emoções do analista podem produzir uma interferência negativa na
experiência clínica e, dessa forma, precisam ser controladas.
III- Na proposta de leitura da Psicanálise clássica, a contratransferência é
lida como um empecilho e uma resistência inconsciente do analista para
possibilitar as associações livres do analisando e atrapalhar a continuidade
da análise.

Assinale a alternativa CORRETA:


a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.
b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

151
3 A Análise Institucional (A.I.) tem inspirado muitos movimentos no Brasil.
A influência vai desde a clínica psicológica, as práticas em saúde coletiva, as
intervenções no território da gestão em saúde ou na pesquisa universitária;
seus conceitos são constantamente revisitados e usados. Ela criou um corpo
de conceitos que é bastante utilizado por psicólogos brasileiros. Acerca dos
principais conceitos da Análise Institucional, classifique V para as sentenças
verdadeiras e F para as falsas:

( ) A análise da encomenda é um dispositivo da A.I. que diz respeito a um


mecanismo da contratransferência, pois a análise da oferta significa pôr
em análise os próprios profissionais que ofertam o serviço de intervenção.
( ) Na análise da oferta está contida toda a análise que o profissional vai
realizar, ou seja, entender a correlação de forças em que o problema
trazido pela organização demandante está inserido. O trabalho de Análise
Institucional começa quando dinâmicas não observadas aparecem, em
paralelo ao pedido de intervenção da organização.
( ) A análise de implicação se refere ao momento em que os analistas precisam
analisar também aquilo que compõe a sua parte na intervenção, ou seja,
seus afetos, emoções, seu desejo, suas formações inconscientes etc.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) ( ) V - F - F.
b) ( ) V - F - V.
c) ( ) F - V - F.
d) ( ) F - F - V.

4 Podemos localizar na história de construção da A.I. na França, na década


de 1960, algumas vertentes de trabalho; uma delas se trata da Psicoterapia
Institucional, que está conectada à saúde mental e que foi elaborada a partir
da década de 1940 com a experiência inicial no hospital psiquiátrico de Saint
Alban, durante a Segunda Guerra, e cunhada por Felix Guattari. Disserte
sobre o conceito de transversalidade cunhado por Félix Guattari.

5 Podemos localizar na história de construção da A.I. na década de 1960


algumas vertentes de trabalho, por exemplo, Psicoterapia Institucional
elaborada durante a Segunda Guerra e cunhada por Felix Guattari. Disserte
o conceito de inconsciente institucional.

152
REFERÊNCIAS
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