Sobre Kianda e Afins

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REVISTA ELETRÔNICA DO INSTITUTO DE HUMANIDADES


ISSN 1678-3182
VOLUME VI NÚMERO XXII JUL – SET 2007

Entre cassandra, carmina e kianda, feminino e nação

Prof. Dr. Robson Lacerda Dutra

UERJ
FAPERJ

Muitos são os mitos cosmogônicos e diversas as interpretações tecidas ao seu redor,


de modo que, através deste tipo de narrativa privilegiada, as sociedades espelhem suas
contradições, exprimem seus paradoxos, dúvidas e inquietações que resultam na
possibilidade concreta de o homem refletir multiplamente acerca da essência de seu estar
no mundo, inquirindo a si próprio sobre suas origens.
Como forma de aproximação das verdades buscadas no universo de possibilidades
em que se inserem, é freqüente a personificação desses mitos sob formas, hábitos e
costumes humanos, muitos das quais, assumem identidade feminina. Essa parece ser
uma das razões pelas quais Hesíodo, em sua Teogonia (2003, p. 50), narra a união entre
Oceano e Tétis, sua irmã. Sob a forma de um grande rio-serpente que circunda toda a
terra, Oceano, filho de Urano e Géia, representações do céu e da terra, é o primeiro deus
das águas e o mais velho dos doze titãs, descritos como deuses maiores, governadores
supremos do universo (Brandão, 1997, p. 103). Logo, significa o elemento masculino que,
unido a Tétis, origina mais de três mil rios e as quarenta e uma filhas chamadas
Oceânidas, ninfas do alto-mar. Essas corresponderiam à personificação de riachos, fontes
e das nascentes, de cuja descendência viriam, por exemplo, figuras mitológicas como
Electra, Dione, Europa e Calipso. Segundo a concepção de Homero, todos os deuses
eram igualmente originados desse casal primordial, Tétis e Oceano, o que concederia a
Hera, Vênus e Baco, por exemplo, traços comuns, apesar das muitas disputas travadas
entre eles no Olimpo (Empédocles, 1973, p. 15).
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Tétis e Oceano são, portanto, dotados da incumbência de trazer para o presente,
atualizar em realidade e dar continuidade àquilo que estava em germe em seus
ancestrais. Por isso, possuem a capacidade constante de reconstituição, já que, como
elementos de composição do mundo, estão presentes nos momentos de transformação,
na passagem do caos ao cosmo e na criação do mundo visível.
Como representação feminina, Tétis é associada ao fundo do mar, sendo também
encarnada pelas fontes, lagos e lagoas que fazem parte de sua descendência. Enquanto
imagem mitológica da polaridade feminina do oceano ancestral, do mar das origens, essa
divindade representa o princípio de todas as coisas, a fonte universal feminina da criação
e também o saber originário da natureza e do conhecimento primitivo que circunda,
envolve, protege, nutre e preserva.
Considerada a mais jovem das titanisas, Tétis é, como vimos, uma das filhas de
Urano e Géia que, com Oceano, realiza a junção mítica de duas forças primordiais. Dela,
tal como da união de seus pais, advém a possibilidade de (re)criação do universo de
modo simbiótico e harmônico, de onde, por sua vez, resultam a harmonia e o equilíbrio do
mundo.
Por ser uma das representações do arquétipo de Grande Mãe, Tétis também é
associada à fecundidade e à abundância da natureza, ao impulso de fazer crescer e
circundar, posto que suas origens remontam ao movimento ordenativo e construtivo que
despontou no início do caos dos tempos. Já que sua natureza é constituída de água e
essa é a matéria-prima da fecundidade e substância primordial na composição do
universo, ela assume o significado mitológico de vida, a garantia de sua abundância, da
estabilidade e da manutenção do próprio fluxo vital.
Vênus, a divindade da cultura associada ao amor é, segundo Junito Brandão (2003,
p. 37), “a forma grega da deusa semítica da fecundidade e das águas fecundantes”. De
acordo com a Ilíada, tal divindade descende de Dione e de Zeus tendo, por isso, como
epíteto Dionéia. Contudo, uma versão mais antiga sobre sua origem encontra-se na
Teogonia, segundo a qual ela nasceu da mutilação de Urano, o que a faz, também, ser
conhecida como “aquela que surge das ondas do mar”. Se investigarmos o universo
clássico, nos depararemos com diversos outros exemplos míticos de feminilidade
associada ao bem-estar da família e da nação. Hera, por exemplo, esposa de Zeus, deus
supremo do Olimpo, é a divindade que protege e reverencia o casamento e a família, do
mesmo modo que o sacrifício de Alceste em favor de Admeto, seu marido, corrobora a
ordem social de que Eurípedes se valeu como matéria de composição de sua tragédia.

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Por outro lado, a concepção de uma fonte divina representando a integralidade do
mundo grego revela um conhecimento preservado na memória da humanidade, que
demonstra que o homem conservou a memória primordial de um deus criador universal.
Essa idéia do Deus Pai e da Mãe criadora primordial sofre, no entanto, algumas
modificações e interpretações de acordo com diferentes épocas e com a cultura. A
tradição cristã, por exemplo, afirma que a humanidade se originou do corpo de Adão,
concepção judaica que atribui ao homem grande potencial criador e entende o corpo
miticamente como organismo que contém riquezas e uma grande potencialidade gerativa
e criativa.
O arquétipo feminino rege, em geral, tanto o caráter elementar da vida quanto sua
esfera mais espiritual. Sendo assim, Tétis, como senhora das águas, propicia às suas
filhas, as ninfas, este mesmo tipo de saber restaurador que acede à porta que une os
mundos, nos quais os potenciais criativos se exteriorizam. Esse portal articula a
passagem entre duas realidades, entre o conhecido e o desconhecido, entre o mundo
profano e o sagrado, entre a luz e as trevas, entre as águas claras e as escuras.
No que se refere à representação feminina no universo mítico africano, percebemos
a manutenção de algumas formas mítico-cristãs, como, por exemplo, a também existência
de um casal primordial. Se o texto bíblico descreve o surgimento de Eva a partir de uma
costela retirada de Adão, a concepção dos povos bantos, afirma que Nzàmbi, seu deus
primordial, criou homem e mulher simultaneamente, utilizando o fogo como matéria-prima.
Após modelá-los, colocou-os à sombra da mulemba – a árvore que representa o poder
divino e em torno da qual se constroem as aldeias angolanas –, e espargindo-lhes a água
que lhes deu vida.
A esse casal primordial chamou Samba e Máwèzé, que, no intuito de povoar o
universo, originou inúmeros filhos. A esse respeito, o antropólogo angolano Virgílio
Coelho afirma que
sendo irmãos Samba e Máwèzé, não poderiam casar nem fazer sexo.
Isso fez com que, depois de acordado com os progenitores, Nzàmbí
decidiu purificar a prole. Para tanto, os filhos do casal deveriam na
madrugada seguinte atravessar o rio Kwànzà. Chegada a hora aprazada,
apenas dois dos irmãos acordaram ao canto do galo e cumpriram com o
estipulado, isto é, atravessar o rio, o que metaforiza o ritual de
purificação. Quando chegaram ao outro extremo estavam
completamente esbranquiçados e transformados em “seres
maravilhosos”, e Nzàmbí atribuiu-lhes os nomes de Mpèmbà e Ndèlè.
Decidiu ainda que, doravante, deveriam passar a viver nesse mundo que
alcançaram, isto é, o mundo harmonioso das águas, da umidade, do
brilho e luminosidade, da brancura e da felicidade absoluta. Os outros

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irmãos que não cumpriram com a ordem estipulada passaram a viver
definitivamente na terra, com os seus problemas e angústias.

Esses são, assim, os primeiros habitantes de Angola dos quais descende a nação.
Por advirem dos primeiros seres sobrenaturais, garantem ao povo angolano as
características do “reino da brancura”, ou seja, aquele em que se origina o bem e a
felicidade eterna.
No que se refere ainda à pesquisa desse antropólgo, aprendemos que diversas
narrativas orais apontam que, além do casal primordial, Nzàmbi criou, igualmente, seres
denominados gênios da natureza, que são dotados de componentes humanos e divinos.
Dentre eles, destacamos as Kiandas forças da natureza que mesclam traços humanos,
que variam entre o masculino e o feminino. Esses seres podem ser designados em
idioma quimbundu, no singular, de kyàndà, kitúta ou kíxìmbí, a depender do local onde
façam suas aparições e sejam reconhecidos. Desse modo, a kituta ou kíxímbì é
encontrada nos rios, nas nascentes, nos lagos, nas lagoas e nos poços, ao passo que a
Kianda habita esses mesmos lugares, além do mar oceânico. Semelhante ambigüidade
se dá com relação ao seu sexo, que não é definido, podendo, portanto, serem
identificadas tanto como homens e mulheres. Grosso modo, podemos afirmar com base
no material fornecido por Coelho que a classificação Kyàndà é dada na região do rio
Kwanzà que banha a cidade de Luanda e avança em direção ao interior do país. À
medida que o rio segue seu rumo, a denominação Kitútá fica mais evidente. Kixìmbí é o
termo antigo, atualmente pouco usado, mas que tem idêntico significado. Há que se notar,
todavia, que a etimologia da palavra remete ao verbo Kwàndà que indica ação de “mover,
levar de um lado ao outro, sonhar, imaginar, fantasiar”, já que a vida se dá pelo sonho, no
mundo luminoso onde vivem os seres sobrenaturais que originaram o povo quimbundu.
Apesar de vários relatos sobre a aparição desses seres não há traço corporal
específico que permita unificar sua aparência. Isso justifica a afirmação feita
anteriormente sobre a diversidade do seu sexo e suas formas. No entanto, todos os
depoimentos afirmam serem esses seres míticos cercados por “um clarão, cintilação de
luz, a cor branca, remoinhas das águas ou do ar”.
Por estarem ligadas à fecundidade feminina, as Kiandas nutrem especial atenção
pelas crianças, sendo atribuído a elas o nascimento de gêmeos ou ainda a presença de
sinais que, identificados pelos líderes religiosos das comunidades quimbundas, lhes
outorgarão poderes espirituais. É comum atribuir ainda a elas o desaparecimento de
crianças que, transformadas em um de seus filhos, são levadas a morar no interior das
lagoas, rios e mares. Por isso, é freqüente sua associação dessas a Iemanjá. No entanto,
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as deusas angolanas nada têm a ver a divindade iorubá. Uma das diferenças marcantes é
que esta não apresenta ligações com gêmeos e crianças.
De acordo com o imaginário cultural africano, contudo, as crianças e idosos ocupam
lados complementares do ciclo de vida no mundo visível. Uma particularidade das
crenças quimbundas é o fato de crianças com deficiências físicas serem portadoras de
dons especiais a serem usados em benefício de seu povo. Os jingongos, gêmeos, em
língua quimbundu, são considerados também gênios da natureza, abençoados pela
Kianda, que vêm à terra nortear a sociedade com relação ao seu devir. Tradicionalmente,
ao nascerem gêmeos em uma família de origem quimbundu, os nomes adotados serão,
respectivamente, Kakulu, que quer dizer “o mais velho, o mais antigo” (palavra cuja
etimologia remete a kulu, que significa “universo, terra, começo, o mundo original”) e, por
fim, kabasa, que é o nome recebido pelo segundo dos gêmeos.
São também estes os nomes por que são conhecidas as duas filhas do casal Nzuwa
e Madiya, personagens de um outro texto oral recolhido por Virgílio Ferreira, que explica a
origem do mundo em para os povos quimbundu em conexão à mitologia das águas, cujo
relato é o seguinte:
Há muito tempo sem terem filhos, certo dia, a senhora Madiya teve em sonho a
revelação de que teria duas filhas gêmeas. Incumbiu, pois, seu marido, Nzuwa, de
providenciar duas panelinhas de barro e dois balaios para que as meninas, mais tarde,
brincassem. Na noite do nascimento das meninas, Madiya sonhou outra vez e, dessa
feita, foi-lhe avisado para que vigiasse constantemente as filhas a fim de que elas jamais
se aproximassem do rio Kwanza, às margens do qual moravam.
Uma ocasião, no entanto, Kakulu, a mais velha, decide tirar água do rio com seu
balaio, mas a corrente o leva. Chorando, a menina entra na água e, cantando, pede que
seu balaio lhe seja devolvido. Kabasa, vendo a irmã desviar-se, mergulha com seu balaio
atrás, o qual também lhe é tirado das mãos pelas águas do Kwanza. A mãe, vendo-as ir
rio adentro, grita-lhes que retornem à terra firme, à terra das abóboras e das bananeiras,
prometendo-lhes comprar outros balaios. As meninas, no entanto, não ouvem seu clamor.
Os balaios são levados cada vez mais distantes pelas ondas e as gêmeas desaparecem
no fundo do mar, apesar de suas cantigas ainda serem ouvidas. A mãe, que pulara no rio,
retrocede e grita pelo marido que também se esquiva quando a água lhe chega ao
pescoço. À noite, a mesma voz que lhe anunciara as crianças e lhe mandara deixá-las
longe do rio lhes aparece em sonho, dizendo: “quiseste filhos, dei-tos. As crianças foram
para debaixo d’água, mas receaste ir até lá. Ora, tanto morrias no fundo do rio, como em

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tua casa. Pois tuas filhas não morreram. Se tivesses ido sempre atrás delas, virias com as
crianças. Agora ficam comigo”.
Diz a tradição oral que tanto a mãe quanto o pai não viveram mais contentes por não
terem sido capazes de salvar as gêmeas, morrendo ambos de melancolia.
É evidente a relação entre este texto e a tradição angolana que associam os sonhos
à realidade humana, na medida em que assumem tom augúrico. Além disso, impõem
injunções como os nomes das crianças e a compra das panelas de barro e dos balaios.
Estes são tecidos manualmente com fibras de plantas aquáticas, o que preserva sua
característica, mesmo quando usados em terra firme. O barro que serve de matéria-prima
às panelas é de constituição dupla, uma vez que resulta da mescla entre água e terra.
Também as panelas retêm os líquidos que servem de sustento ao homem.
A entrada das meninas no rio é associada, assim, um retorno às origens, já que este
alegoriza o útero materno. Significa, ainda, uma passagem de nível que restaura a
circularidade presente na tradição, visto que é pelo sonho que se apresenta a
transitoriedade da vida na terra, uma vez que adentrar na água implica dar início a um
novo tempo. A passagem do seco ao úmido simboliza a da vida à morte. Representa a
insatisfação dos gênios da natureza com o mundo em que vivem. Todavia, essa morte
não se configura como fim, mas como o início de um novo ciclo, de uma nova vida que
preserva o canto, a forma divina de comunicação que estabelece um memorial, assinala a
diferença entre homens e gênios, sinalizando o estado de precariedade do mundo.
Voltar às águas implica, portanto, perpetuar a vida em um novo espaço que o
homem comum não está apto a acessar, pois se encontra profundamente enraizado na
“terra das abóboras e bananeiras”. Desse modo, reforça-se, mais uma vez, a relação
primordial de divindades das águas como fonte de vida, revitalização, conhecimento e
sacralização.
Este substrato mítico é recuperado não apenas por antropólogos, mas também por
escritores como Pepetela que, ciente do valor dessas representações, lançam mão de um
saber ancestral em seus textos. Desse modo, sua escrita questiona a história, resgatando
em seus desvãos outras “verdades” em sua acepção benjaminiana e, em decorrência,
outras possibilidades de leitura da nação.
Um desses aspectos põe em xeque o porquê da guerra e, sobretudo, do cenário que
se seguiu a ela, uma vez que a independência tão sonhada com o fim do colonialismo
português não pôs fim aos anseios que levaram o país à guerra de libertação. Pelo
contrário, o pós-guerra tornou-se cenário da guerrilha civil travada por grupos políticos
angolanos que almejavam o poder. Desse modo, Pepetela revela a preocupação em
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resgatar memórias da guerra de que participou e que o fazem tentar compreender e
encontrar saídas para a situação de caos que Angola vivencia deste então.
Tal traço, recorrente em sua obra, é reconhecido em romances diversos romances,
dos quais destaco O Desejo de Kianda, obra em que a figura feminina é notadamente
associada ao imaginário cultural angolano. Publicada em 1995, a obra apresenta um
retrato da Angola no pós-guerra civil e das eleições presidenciais então realizadas. A
ação se desenvolve sobre dois eixos básicos que são apresentados no início da obra: um,
de cunho “cronístico”, que é o casamento de Carmina Cara de Cu e João Evangelista,
que se alterna com outro, de viés “mítico” (Alves, 1997, p. 228) que é assinalado pelo
início de uma série de desabamentos misteriosos de prédios na região do Kinaxixi, em
Luanda, que começa a ocorrer no exato momento do casamento das personagens.
Através deste matrimônio Pepetela alegoriza a união de duas ideologias a princípio
incompatíveis: João Evangelista representa o princípio moral religioso por ser filho de
Mateus Evangelista e neto de Rosário Evangelista, pastores protestantes no interior de
Angola, cuja essência é revelada ao leitor, em primeira instância, pela simbologia de seus
nomes e sobrenomes. Carmina, por sua vez, nos é apresentada como o oposto de seu
marido: é atéia, voluntariosa e obstinada. Por conta de personalidade forte, não goza de
boa reputação entre os mais velhos e experientes, razão pela qual é conhecida como
“Cara de Cu”.
Extremamente politizada e defensora extrema do sentimento de nacionalismo que
guiou Angola rumo à independência a partir dos anos 60, a personagem acredita que o
país deve seguir seu próprio caminho, livre não apenas de resquícios colonialistas
portugueses, mas igualmente do capitalismo mundial neoliberal representado, sobretudo,
pelos Estados Unidos e sua preponderância no tempo enunciado.
Ainda que Pepetela afirme desconhecer a obra, o nome Carmina é bastante
sugestivo, uma vez que remete a Carmina Burana, uma cantata profana em que o músico
alemão Carl Orff emprega textos medievais em latim e alemão, dos quais o primeiro e
mais famoso descreve a fortuna imperatrix mundi, ou seja, a sorte que rege a humanidade
e que tem como um de seus paradigmas o prazer da vida vivida intensamente. Assim,
evidencia-se a analogia entre a Carmina alemã e sua congênere angolana visto que tal se
dá através da ligação próxima que esta tem com o governo angolano e pela forma como
passa a usar, na pós-independência, seus contatos políticos em benefício próprio,
olvidada dos compromissos éticos que a fizeram lutar pela independência do país,
algumas décadas antes.

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Ao longo de seu percurso, a personagem vai abrindo mão de suas convicções
anteriores, envolvendo-se em negócios fraudulentos e fundando, por exemplo, uma
empresa-fantasma que fornece armas e munições, ou seja, instrumentos de fomento e
multiplicação de outras guerras.
João Evangelista, por sua vez, é regido pela passividade que o faz, igualmente, abrir
mão de sua formação moral e aceitar cargos e benefícios advindos unicamente da
posição política de sua mulher:
João Evangelista também aproveitava do carro, sobretudo quando ela
tinha daquelas reuniões de três dias que entravam pela noite e só
acabavam de madrugada. Nessas alturas ele levava-a ao trabalho e
depois ela aproveitava boléia, pois nunca se sabia quando terminaria a
reunião. Ele ficava com o carro todo o dia. O trabalho era chato e sem
grandes perspectivas. E ninguém notava a sua ausência, como
acontecia com quase todos os funcionários. (Pepetela, 1995, p. 13).

Através destes exemplos, o narrador evidencia a falência dos valores morais e éticos
que vigoram em Angola em que a corrupção passa a ser a mola-mestra no cotidiano do
país desmoronado pelo conflito bélico e que não consegue se reerguer, uma vez que a
minoria que o governa abandonou os princípios utópicos, optando por uma adaptação
destes aos interesses pessoais da nova elite.
Ao relacionarmos esses fatos ficcionais ao discurso histórico que Pepetela utiliza em
sua trama narrativa, nos deparamos com a afirmação de Duby e Lardreau (1980, p. 217)
que revelam que “há fissuras no tecido, mas essas fissuras não são sempre, em sua
totalidade, acidentais, não são todas provocadas por uma degradação, por uma usura do
tempo; lacunas existem porque certos elementos do passado deixaram traços menos
duráveis que outros”.

Apesar de Pepetela referir-se ao tecido histórico já constituído, vemos que, em O


Desejo de Kianda essa trama nos é narrada simultaneamente ao momento da sua
tecedura, de modo que a história se dá quase que em justaposição ao real
contemporâneo. Nesse caso específico, mostra Angola pós-independente, estendida no
tear, sendo manipulada, dessa vez, diretamente por mãos africanas. O “olho azul do
colonizador tinhoso” já fora substituído formalmente pelo dos nativos da terra, mas as
questões de poder apenas se inverteram.
João Evangelista e Carmina CCC se associam tanto ao discurso ficcional quanto ao
histórico. Pertencem àquele como personagens de uma trama que se processa e ordena
de acordo com a vontade do narrador e a esse por apresentarem características

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semelhantes às dos cidadãos angolanos que representam. A transformação das colônias
portuguesas em países livres segue, em geral, caminhos semelhantes, quer no próprio
território africano como de expressão portuguesa como os países com colonizadores de
outras nacionalidades, visto que as características que regem o sistema colonial são
homogêneas.
O texto de Pepetela evidencia bem isso. Ao discurso histórico este autor acrescenta
elementos míticos como forma de percepção daquilo que o discurso racional não explica.
É a força dos mitos angolanos que origina o segundo eixo temático da narrativa, ao qual
nos referimos anteriormente e faz com que os prédios do Kinaxixi venham ao chão. A
junção destas duas linguagens não pretende justificar o real, mas, sim, interpretar os
múltiplos significados que se encontram encobertos e devem ser aclarados. É este,
acreditamos, o pensamento de Roland Barthes ao afirmar que:
O mito não cega as coisas, sua função, ao contrário, é falar delas;
simplesmente purifica-as, inocenta-as, funda-as em natureza e
eternidade, dá-lhes uma clareza que não advém da explicação mas da
constatação: se constato o imperialismo francês sem explicá-lo, estou a
um passo de considerá-lo natural, evidente: eis-me, então, tranqüilo.
Passando da história à natureza, o mito faz uma economia: abole a
complexidade dos atos humanos, dá-lhes a simplicidade das essências,
suprime toda e qualquer dialética, toda e qualquer discussão que vá
além do visível imediato, organiza um mundo sem contradição por não
ter profundidade, um mundo mostrado na sua evidência; o mito funda
uma clareza feliz: as coisas parecem significar elas mesmas. (Barthes,
1985, p. 252).

A força mítica que Pepetela apresenta como forma de organização do caos angolano
surge, portanto, através da feminilidade expressa por Kianda. Esta divindade é também
conhecida como Kiximba ou Kimbuta e é comum em toda a extensão do rio Kwanza, um
dos principais do país, e é um dos mitos cosmogônicos de Angola. Como representante
do “espírito das águas” (Pepetela, 1995, p. 98) é uma das entidades reguladoras das
águas, dos peixes, das marés e da pesca. Manifesta-se ainda sob lençóis de luz imersos
nas águas, formando feixes de fitas coloridas a que se juntam guizos, que, com seu
sonido, dão conta de sua presença. Quando enfurecida, a deusa torna-se implacável,
semeando morte e desolação. A mafumeira e o imbondeiro são árvores que também lhe
servem de abrigo e, por isso, é ao pé delas que os pescadores lhe fazem oferendas a fim
de obterem sorte nas viagens e pescarias.
Como forma de ressaltar o esgarçamento das tradições e esquecimento de
elementos telúricos, Pepetela resgata as vozes de Luandino Vieira e Arnaldo Santos –
escritores angolanos que resgatam, igualmente, o saber primordial angolano –, fazendo-
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os personagens de O Desejo de Kianda. É da enunciação atribuída a Arnaldo Santos que
João Evangelista apreende o relato do corte da mafumeira dedicada à deusa das águas,
no largo onde outrora também existira uma lagoa a ela dedicada e sobre a qual foram
erguidos os prédios que, posteriormente vieram ao chão. Evangelista ouve, ainda, a
estória que narra o “sangramento” da árvore, ou seja, da seiva avermelhada vertida por
sete dias antes do fenecimento da árvore e do aterramento da lagoa, alegorias que se
associam à perda da identidade cultural nacional em função do capitalismo e do
afastamento das tradições africanas na Angola pós-independente.

Desabamentos e mistério

Apesar do aspecto trágico que permeia o desabamento dos prédios, todos os


moradores saem surpreendentemente ilesos deles, cobertos apenas de pó. A voz
enunciadora revela que pesquisadores e estudantes de Angola reúnem-se após cada
acidente para estudar os escombros dos prédios. A conclusão a que chegam é a de que
os detritos são totalmente sólidos, visto que a água usada na mistura da argila com o
cimento se esvaiu completamente, fazendo, assim, com que, uma vez sem sustentação,
os prédios viessem ao chão.
A água, elemento mítico primordial, é retirada, sugada dos prédios por Kianda em
sinal latente do desagrado dos gênios da natureza diante do presente. Não se encontram,
por isso, explicações racionais para os desabamentos, nem tampouco para a quantidade
de água esverdeada que se acumulava a olhos vistos na antiga lagoa de Kianda. É, pois,
através da injunção de elementos míticos que Pepetela evoca os elementos da tradição,
personificados na figura feminina da divindade, para darem conta da realidade histórica
esfacelada, conforme aponta, mais uma vez, o pensamento crítico de Maria Theresa
Abelha Alves (1997, p. 228) em que
evidencia-se, assim, mão só o caráter ficcional do relato, como também
a opção por uma escrita em construir-se enquanto verdade teorética
sem olvidar o tradicional contributo do mito: antes, pelo contrário,
utilizando-o como geratriz que qualifica e anima, utilizando-o como
perspectiva para a leitura do mundo, utilizando-o, em suma, por
reverência à angolanidade, enfim, opção política de um narrador que
sabe que a verdade não é desnudamento que aniquila o segredo, mas
revelação que lhe faz justiça. É, pois, no prisma da magia, do mistério,
do segredo que a realidade é refratada, desvelando as negativas cores
com que o presente se pintou.

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A lagoa de Kianda, também conhecida como dizanga dia muenhu, na língua
quimbunda falada em Luanda, significa “lagoa da vida” e é por esta razão que a divindade
enfurecida, tenta recuperar sua lagoa que, após sua extinção, tornou-se uma poça de
água apodrecida que, aos poucos, por sua intervenção, foi-se expandindo, abrindo maior
espaço físico, abrigando girinos e peixes. Essa nova lagoa fétida, segundo Carmen Tindó
Secco (1998, p. 213), “alegoriza a putrefação social, a morte e a asfixia do tecido mítico,
(...) o esgarçamento das utopias culturais e políticas na Angola atual e alerta para a perda
dos elos com a ordem cósmica reguladora das tradições do imaginário popular”.
É, portanto, dessas águas que brota o canto de Kianda que a deusa passa a entoar à
medida que vai recuperando o espaço que outrora fora seu. O primeiro registro dessa
nova música é simultâneo ao da queda do primeiro prédio e, à medida que os outros
desabamentos ocorrem, o canto torna-se mais audível por ser sempre mais alto. A altura
a que me refiro não é apenas acústica, mas também de ordem física porque, na medida
em que a voz torna-se mais clara e as palavras inteligíveis, o canto passa a tons
melódicos mais agudos que assinalam a superação dos limites físicos que a voz humana
pode emitir. A música entoada por Kianda, por essa razão, apesar de, inicialmente,
assemelhar-se à dos homens, ultrapassa os liames da laringe, lançando-se como um
brado de desafio às barreiras que cerceiam a habilidade de emissão de sons, propondo
uma nova música que se liga à uma função restauradora. Tal cântico situa-se, por isso,
entre a obscuridade da vida inconsciente e a claridade das representações intelectuais,
encontrando-se, dessa forma, inscrita em grande parte do mundo dos sonhos.
Essa música, contudo, é inaudível ao ouvido de todos, exceto os do velho Kalumbo e
da menina Cassandra, que passa a ser ridicularizada ao comentar o som que percebe.
Mais uma vez, o saber primordial africano é trazido à cena, posto que a criança e o idoso
situam-se nos extremos do que se chama linha divisória entre o mundo visível e o
invisível. Se imaginarmos um círculo atravessado por uma reta, vislumbraremos os limites
entre estes dos espaços, em cujas extremidades se encontram velhos e crianças. Estes
estão mais em contato com o mundo dos antepassados, ou seja, daqueles que
abandonaram a vida física para, como espíritos, habitarem os elementos da natureza e,
de lá, vislumbrar o mundo vivente. Essa é, então, a razão por que apenas o idoso e a
menina conseguem, em meio à agitação contemporânea de Luanda, perceber o som que
a divindade entoa. É, de igual modo, motivo da perpetuação do saber tradicional que se
revela no modo como o ancião ensina à criança a captar e entender o som da música de
Kianda.

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Esse aprendizado revela a importância de um ditado popular africano que afirma que
a morte de um ancião equivale à perda de uma biblioteca inteira, visto ser ele
testemunha e repositório de traços culturais singulares. Esse saber revela, por exemplo,
segundo o filósofo malês Amadou Hampâté-Bâ, que o ser supremo, força cosmogônica
do universo, Maa Ngal’a, o homem, é repositório de três potencialidades: o poder, o
querer e o saber. Essa energia jaz nele como forças muda, até que a palavra venha pô-
las em movimento. O verbo divino é quem a inaugura e faz com que se converta em
pensamento, numa primeira etapa, em som numa segunda e em palavra, finalmente. De
acordo com Hampâté-Bâ, “uma vez que a palavra, kuma é a exteriorização das
vibrações das forças, toda manifestação destas, não importa em que forma, será
considerada sua palavra”. Se juntarmos a este pensamento o fato de que o canto nada
mais é que a junção de palavra e música, concluiremos que a melodia de Kianda
também é uma exteriorização desta força fundamental que é exercitada.
Outro aspecto interessante é que, graficamente, o canto entoado por Kianda é
escrito em letras em itálico que difere da tipologia no restante da obra. Esta letra, com
seu traço inclinado, remete às águas das chuvas quando caem, assemelhando-se
também à obliqüidade da linguagem poética a que me referi anteriormente. Ainda no
que se refere ao aspecto gráfico, o espaço tomado na página impressa do livro pela
narração do canto também é limitado, não ocupando o mesmo tamanho do restante da
narrativa. Acreditamos que esta representação comprimida espacialmente do canto de
Kianda no romance indica também as restrições que o universo mítico sofre na Angola
pós-colonial, invadida pelo capitalismo e esquecida de sua identidade.
Apesar de O Desejo de Kianda ser marcado pela busca da angolanidade
fragmentada, Pepetela considera o multiculturalismo resultante do sistema colonial e do
melting pot que caracteriza a pós-modernidade. Na obra em questão, os traços culturais
europeus se presentificam nome de Cassandra e na recuperação mitológica da pitonisa
grega que previu o destino funesto de Tróia (Harvey, 1987, p. 103), mas fora
desacreditada por haver resistido ao assédio do deus Apolo que, despeitado, vaticinou
que suas profecias seriam desacreditadas . Tal como a Cassandra mitológica, a
personagem de Pepetela não obtém crédito à informação de que ouvia um canto vindo
do fundo das águas. No entanto, ao invés de ser arrastada e morta como a filha de
Hécabe e Príamo, a menina é conduzida por Kianda para a profundeza de sua lagoa, a
fim de receber a orientação e o cuidado que esses gênios da natureza destinam às
crianças.

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Após o último agudo de Kianda em seu canto de guerra, a água sorvida dos
prédios do Kinaxixi deixa de ser lago e transforma-se em rio caudaloso que segue novo
curso ao longo das ruas e avenidas de Luanda até desembocar no mar. O que antes era
putrefato, por fim, se regenera e, do tom esverdeado da estagnação, surge o verde
germinante que aponta para o ressurgimento de forças restauradoras. Estas se mostram
metaforizadas pelo novo rio avança em direção à ponte construída pelos portugueses,
tempos antes, e que transformava a ilha em península. A força de sua onda faz com que
esta antiga marca do colonizador também se rompa e volte a um tempo mítico e
primordial. Kianda, ao final, se liberta das águas da lagoa. Sua fuga aponta para a
retomada do espaço mítico-literário renegado e para a possibilidade de uma nova
realidade poder ainda se erigir em Angola.
No romance de Pepetela, lemos que o último prédio a ruir é exatamente aquele em
que moram João Evangelista e Carmina. O edifício cai logo após grande reforma e a
adaptação do apartamento ao novo estilo de vida emergente o casal. Ao longo do livro,
Pepetela traça um perfil irônico de João Evangelista que se vai intensificando no
decorrer da narrativa. Alienado no trabalho e no casamento, passa por fim horas a fio
distraído diante de um videogame. Esquecendo-se da realidade de seu país e da
monotonia da sua própria vida, João Evangelista veste o elmo do guerreiro moderno e
inicia sua guerra particular, em frente à tela do micro, contra um Império Romano virtual.
A ironia referente à Carmina se dá pela negação e pelo antagonismo em relação
às suas crenças anteriores. Se, a princípio, a personagem acreditava em ameaça ou
manipulação norte-americana com relação à queda dos prédios, ao fim da narrativa, já
totalmente “aculturada”, compra um telemóvel, “sua última aquisição e marca de status”
(1995, p. 117). Seja no tocante à sociedade norte-americana, paradigma do easy way of
life, ou mesmo no que se refere ao colonizador europeu, Carmina torna-se um “corpo
dócil”, segundo a definição de Foucault: “um corpo que pode ser submetido, que pode
ser utilizado, que pode ser transformado”. O exercício exacerbado do capitalismo em
Angola, tal como a ideologia burguesa em ascensão na França do século XVII descrita
por Foucault, incutiu na personagem reações de docilidade e utilidade. Estas
demonstram como “se pode ter domínio sobre o corpo alheio, não simplesmente para
que se faça o que se quer, mas para que opere como se quer, com as técnicas segundo
a rapidez e a eficácia que se determina” (Foucault, 1999, p. 118). Essa posição a
distancia cada vez mais dos ideais defendidos no período da guerra de independência e
marca uma aculturação que se confronta com a pureza e sabedoria representadas por
Kalumbo e Cassandra.
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Ao término da enunciação, damo-nos conta de que um grande sentimento de
insatisfação permeia todo o texto de Pepetela. A voz do narrador veicula profundo
desconforto e inadaptação ao status quo, revelando um tom de grande melancolia. Se,
para Freud esse sentimento se caracteriza por uma depressão profunda e inibição dos
sentimentos pela perda de um referencial, lemos, em Walter Benjamin, um amor ao objeto
e sua salvação pela alegorização. Nesse processo, “o melancólico se esvai de sua
própria vida para subsistir exclusivamente como suporte de significações, depreciando o
objeto para em seguida (ou através desta depreciação) satisfazê-lo” (Rouanet, 1981 p.
40-41). Será, então, pela alegoria e sua capacidade de exprimir “o outro” reprimido que
Pepetela expõe sua visão crítica e denuncia o estilhaçamento das utopias, assim como o
distanciamento de Angola de seus mitos primordiais, deixando em aberto novas
possibilidades de reescritura da história de seu país.
Na contramão do caminho feito por Narciso, não foi o homem quem se jogou no fundo
das águas em busca do conhecimento primordial, mas sim elas que, diante da
impossibilidade e passividade humanas, resgatou e reinaugurou o diálogo cósmico que
conduz e orienta os mundo visível e invisível.
Após o grand finale do canto de Kianda, a Cassandra angolana é arrebatada pela
divindade e levada para o fundo das águas, para o início de uma nova aprendizagem que,
retomaro destino profético das gêmeas da tradição oral africana, revelando, assim, novos
caminhos que vão além dos discursos hegemônicos e totalitários. É através deles que se
dá o refluir das águas da lagoa do Kinaxixi, a erupção de fitas multicoloridas e o
desabrochar de um novo espaço de possibilidades em que a realidade se amplia rumo a
uma nova reflexão e à capacidade de regeneração por meio do diálogo com o imaginário
e o maravilhoso.

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