DISS - 2012 - Frankes Marcio Batista Siqueira
DISS - 2012 - Frankes Marcio Batista Siqueira
DISS - 2012 - Frankes Marcio Batista Siqueira
Cuiabá - MT
2012
FRANKES MÁRCIO BATISTA SIQUEIRA
Cuiabá - MT
2012
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente e acima de tudo a Deus, pela vida, pela saúde e pela
oportunidade de escrever um trabalho científico, ainda que tenham aqueles que discordam da
relação do supremo Deus com a academia científica, acredito que há a total relação, pois é o
criador e formador de tudo o que existe e do nosso laboratório de estudos, o universo, a
natureza, a cidade...
Aos meus pais, que hoje descansam no Senhor, a quem devo todas as conquistas até
hoje alcançadas, pois sempre me ensinaram a perseverar diante das adversidades e que me
estimularam a ser um vencedor.
À minha esposa Lucimery e meus filhos Gabriel e Calebe, pelo carinho, amor, afeto,
compreensão e companheirismo nesta caminhada.
Ao meu irmão Francioly Marcos, aos meus amigos Cleyton Normando e Mauro
Sérgio que me incentivaram a pleitear um espaço no programa de mestrado.
Aos meus irmãos Francisley, Francisney, Françoises pelas palavras de incentivo
quando as coisas emperram nas nossas vidas.
Ao Prof. Dr. Cornélio Vilarinho Neto, que além de ser um excepcional professor é
uma magnífica pessoa que nos incentiva através do seu exemplo e conduta. Muito obrigado
por ter me aceitado e me acolhido, me orientando e incentivando na buscar da compreensão e
aprofundamento no temas abordados.
As Profª. Drª. Cleusa Zamparoni e a Profª. Drª. Sônia Romancini que sempre me
incentivaram e confiaram no meu potencial. A essas duas pessoas meu profundo respeito e
admiração.
Gostaria também de fazer menção aos meus amigos e colegas de profissão,
professores que não medem esforços para mudar a sociedade com seus conhecimentos, que
sempre estão dispostos a nos orientar e dirimir as eventuais dúvidas.
Por fim, agradeço aos colegas do Mestrado pelo incentivo nos momentos de
dificuldades e pelas amizades conquistadas. A todos um grande abraço.
"Não temas porque eu sou contigo, não te assombres porque eu
sou teu Deus, eu te fortaleço, eu te ajudo, eu te sustento com a
minha destra fiel”. (Isaías 41:10)
(Bíblia Sagrada)
RESUMO
A presente dissertação tem como objetivo analisar as ações e estratégias dos agentes
sociais transformadores do espaço urbano, principalmente o Estado e os incorporadores
imobiliários que influem e/ou determinam a valorização dos terrenos e imóveis nas áreas
circunvizinhas do Estádio Verdão, atual Arena Pantanal, na cidade de Cuiabá. Avalia-se aqui
o impacto desse fenômeno na apropriação do espaço pela sociedade. Parte-se do pressuposto
que as muitas dimensões da valorização imobiliária impactam no uso e apropriar do espaço,
também vistas como dimensões desse cotidiano. A recente reestruturação imobiliária em
Cuiabá tem produzido um novo tipo de espaço como resultado da preparação para a Copa do
Mundo de 2014. Uma grande quantidade de investimento público e privado tem sido alocado
em megaprojetos. Este estudo investiga a experiência de viver em uma cidade durante o
período de produção e valorização de propriedade imobiliária. O tema busca analisar e
entender o processo de apropriação da área e suas consequências. O estudo também apresenta
as categorias de análises de produção e valorização do espaço. As ações e estratégias contidas
nos planos e projetos, valores de tributos e preços de imóveis, as leis de acesso ao solo e a
publicidade dos empreendimentos imobiliários são importantes para compreensão do processo
de valorização empreendido na área. O resultado deste processo de valorização e especulação
imobiliária é uma acentuada segregação residencial e social que vão de encontro à proposta de
justiça social e “direito à cidade” como condições para se democratizar o ambiente urbano.
The aim of the present work is to analyze both the strategies and the actions of the
social agents that transform the urban space, in particular the State and real estate corporations
that influence and/or determine the valorization of the surrounding area of the Verdão
Stadium, which was renamed as Arena Pantanal, in the city of Cuiabá. It was evaluated the
impact of this phenomenon on the social appropriation of space. It was supposed that many
aspects of the real state market valorization influence the use and the appropriation of space,
that are considered as aspects of the city's daily life. The recent real estate reestructuring in
Cuiabá has produced a new type of space as a result of the preparation for the 2014 World
Cup. A great amout of public and private capital has been invested in megaprojects. This
study investigates the experience of living in a city during the time of property production and
appreciation. The theme seeks to analise and understand the process of the area appropriation
and its consequences. The study also presents the cathegories of analysis of the space
production and appreciation. The actions and strategies expressed by the plans and projects,
the tax values, the price of properties, the laws concerning land appropriation and the
publicity concerning the real state enterprises are all important to comprehend the valuation
process of the above mentioned area. The result of this process of valorization and speculation
carried on by the real state market is a marked housing and social segregation that conflicts
with the ideas of social justice and "right to the city" as being conditions to democratize the
urban ambient.
AI - Ato Institucional
INTRODUÇÃO
edificado neste período de aumento do perímetro urbano da cidade, com a lei municipal
número 1.346 de 12 de março de 1974, atendendo à demanda de melhoria da circulação e
ocupação de uma área até então “ociosa” obedecendo a um movimento de expansão da
cidade. As obras do estádio foram iniciadas no ano de 1973 e, concomitantemente, alguns
conjuntos habitacionais financiados pelo Estado foram construídos nas áreas adjacentes.
Na década de 1960, o perímetro urbano de Cuiabá perfazia 4,5 km² pulando para 48,45
Km² com a nova lei da expansão urbana de 1974. A população total do município até 1960
mantinha-se em aproximadamente 50 mil habitantes, chegando a 100.880 habitantes em 1970,
segundo o IBGE continuando a se incrementar com levas de migrantes durante as décadas de
1970 e 1980. Em 1980 a população chegou a 212.984, em 1991 segundo o IBGE chegou à
marca de 402.813 habitantes, em 2000 o censo divulgou uma população de 483.346. O censo
2010 do IBGE afirmou que Cuiabá tinha um total de 551.350 habitantes.
A partir de então, estruturou-se ao longo de três décadas um mercado imobiliário
“agressivo”, segregador e com estratégias imbuídas de um discurso que coloca o entorno do
estádio como um dos metros quadrados mais rentáveis da cidade atualmente.
Neste contexto, fica difícil imaginar que numa cidade ainda com consideráveis
reservas de terrenos solváveis, ou seja, terrenos teoricamente baratos – principalmente ao
longo do eixo em questão – tenha uma supervalorização do espaço, principalmente com o
argumento de “escassez do espaço”. Enquanto isso, uma considerável fatia de terrenos da
cidade permanece como reserva de valor, favorecendo a estruturação de uma especulação
imobiliária que eleva o preço dos terrenos.
Todos esses fenômenos aqui relacionados deixam reflexões para pensar os agentes
produtores de espaço como podemos citar como exemplos: o Estado, os grandes grupos
imobiliários e a população residente que atuam na transformação espacial da cidade,
produzindo espaço, refletindo-se num processo de valorização acentuada dos terrenos e
imóveis dessas áreas. Nesse ínterim, surge o conflito, porque o espaço como condição para
realizar a vida encontra restrições de uso, com a predominância nessas relações do valor de
troca, orientadas principalmente pelas práticas de dominação do espaço na cidade de hoje?
A materialidade do estádio reflete as contradições e estratégias dos agentes que
produzem o espaço, principalmente o poder do Estado capitalista. Com a Copa do Mundo de
Futebol de 2014 e as mudanças previstas para o perímetro urbano da cidade, ocorre uma
supervalorização do espaço, fugindo à racionalidade dos preços de mercado, o que torna
evidente a mudança que reestrutura o acesso a terra na cidade. A partir da dialética entre uso e
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troca é que podemos tecer conceitos e ideias mais sólidas e abrangentes sobre a produção do
espaço. Na problemática aqui explicitada é que se estrutura a presente dissertação.
Na perspectiva de um estudo sobre a valorização do espaço urbano é que a pesquisa se
volta para a produção deste espaço, elo entre sociedade e natureza, exemplificada aqui com
um recorte espaço-temporal da Cuiabá contemporânea, em sua área de ocupação e valorização
mais recente: a Construção da Arena Pantanal no espaço que abrigava o antigo “Estádio
Verdão”.
O trabalho aborda problemas fundamentais com a finalidade de conhecer a dinâmica
espacial da cidade, a partir de sua produção em relação ao fenômeno de expansão e ocupação
dos seus terrenos ociosos e sua consequente reprodução, consumo e uso pela sociedade.
A relevância deste trabalho está na contribuição para os estudos da geografia urbana
brasileira, dos fenômenos de valorização fundiária e imobiliária do espaço, decorrentes do
processo de produção da cidade fomentadas principalmente pelos agentes de transformação
do espaço urbano.
A Arena Pantanal está se tornando o novo eixo da modernidade da cidade. Junto à
complexidade da dinâmica de fluxos da Região Metropolitana, surge a necessidade de se
compreender a reprodução capitalista no espaço urbano, que se reflete no acesso a terra e na
valorização diferenciada em relação às outras áreas da cidade, tentando compreender e
analisar a ação dos agentes que legitimam este processo geral de acumulação do capital. Nela
encontramos também a segregação, fruto do conflito entre uso e troca, produção e reprodução
do espaço, que é também da vida, já que entendemos o espaço – a natureza transformada –
para existência humana. São esses processos implícitos e especializados que validam uma
investigação científica a respeito do tema.
A relevância social está na compreensão de como a aplicação de um planejamento
diferenciado pelo Estado, incorporando os anseios de agentes como os incorporadores
imobiliários podem provocar tensões sociais, forjar uma valorização distinta na área deste
estudo e segregar ainda mais o espaço já tão fracionado de uma cidade. A intenção deste
estudo é conhecer os processos que levam às tensões socioespaciais, próprias do processo de
produção do espaço, para no futuro possibilitar ações no sentido de equacioná-las,
principalmente nas áreas de expansão e supervalorização urbana.
Entre os objetivos gerais e específicos que se procura alcançar com o desenvolvimento
deste trabalho destacam-se:
*analisar a ação e as estratégias dos agentes sociais transformadores do espaço urbano,
principalmente o Estado e os incorporadores imobiliários que influem e/ou determinam a
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valorização dos terrenos e imóveis nas áreas adjacentes ao estádio “Arena Pantanal”,
avaliando o impacto dessa produção na apropriação do espaço pela sociedade, revelada na
dialética entre valor de uso e de troca;
*avaliar as dimensões da valorização imobiliária no cotidiano da sociedade, ou seja,
como se comportam o valor de uso e de troca nesse “apropriar o espaço”;
*caracterizar o processo de produção do espaço, principalmente no que tange a
influência do Estado e das corporações imobiliárias na valorização distinta dessa área de
expansão da cidade;
*estudar o papel dos agentes produtores do espaço urbano;
*identificar as consequências da valorização deste espaço na reprodução de terrenos
para expansão de Cuiabá;
*avaliar o custos de sediar um Megaevento esportivo e suas consequências para o
espaço urbano.
Este trabalho prioriza algumas ações para atingir os objetivos gerais e específicos,
utilizando como procedimentos metodológicos um levantamento documental e cartográfico da
área estudada. A escala de análise definida para o estudo contribui para a compreensão do
fenômeno proposto, que é a produção e supervalorização dos terrenos e imóveis adjacentes à
Arena Pantanal.
Inicialmente foi realizado um levantamento documental sobre a formação da expansão
urbana de Cuiabá, principalmente a respeito das ações dos agentes sociais – Estado e
incorporadores imobiliários, que fomentaram a ocupação da área, para, a partir de então,
tecer uma análise sobre o processo de apropriação desse espaço. A investigação documental
prossegue para entender as mudanças na legislação municipal quanto ao uso e ocupação do
solo que permitiu a estruturação e dinamização de um mercado imobiliário, que hoje tem um
papel decisivo no processo de supervalorização da área. As reconstituições das determinantes
e os fatos que nos permitem entender melhor os processos de produção e valorização recente.
Os itens discutidos no decorrer deste estudo fornecem importantes subsídios para a
compreensão de conceitos como produção e supervalorização do espaço e a ação dos agentes
sociais transformadores da cidade como também são fundamentais para elaborar um amplo
panorama que contribuí para entender os fenômenos aqui pesquisados. Esses elementos e
categorias de análise revelam o viés científico e metodológico do trabalho, assim como os
próprios métodos de análise aqui empregados.
A reflexão sobre o tema “supervalorização imobiliária”, o ato de habitar a cidade,
entre sua produção e valorização, dá-se com a utilização das categorias e conceitos-chave que
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(Imposto Predial Territorial Urbano), utilizado para efeito de cálculo de tributação e cobrança
de impostos, bem como através de levantamento de arquivos de classificados de jornais de
grande circulação local, para coletar informações a respeito de ofertas, produção, preço médio
e características de imóveis anunciados também ao longo do período de 2007 a 2011,
buscando sistematizar esses dados e informações com o rigor científico com que eles
deveriam ser trabalhados.
Os dados sobre os preços de imóveis apresentam deficiências: os registros sobre
compra e venda são realizados em cartórios, que não dispõem de uma infraestrutura de
informação para torna-los publicáveis e disponíveis para pesquisas dessa natureza. Em visita
aos cartórios cuiabanos, percebemos pouca vontade de disponibilizar tais dados, sendo
recorrente o argumento que as informações não existem no sistema cartorário de Mato
Grosso. Outra deficiência encontrada nas nossas pesquisas é o valor mensurado da transação
financeira, pois para fins de cartório e prefeitura são comuns os valores declarados serem
inferiores ao realizado, porque, segundo as partes envolvidas, isso diminui a cota de impostos
a pagar. Contou-se, nesta dissertação, com os dados da Prefeitura - preço de metro quadrado
por logradouro - e com os classificados de ofertas de vendas de jornais impressos para
registrar o valor pretendido por um imóvel. Cabe lembrar que nem todos os imóveis
continham a informação de preço – em média 60% dos anúncios continham esta informação –
mas ainda assim foi possível observar genericamente a evolução do valor de imóveis na área.
Além destas informações aqui descritas, foram feitas pesquisas formais e informais
junto aos agentes imobiliários a fim de buscar dados mais concretos e fidedignos para
embasamento desta pesquisa. Foi feita ainda a leitura da paisagem e a observação dos
fenômenos acerca da produção do espaço nessa área durante o período desta pesquisa, sendo
realizadas visitas ao entorno do estádio semanalmente para a busca de imóveis e terrenos a
serem negociados e sua supervalorização à medida que avançam as obras da arena
futebolística. Definiu-se isso como instrumento e técnica de análise importante para realizar
este estudo e compor um quadro significativo sobre o tema aqui proposto.
Nossa pesquisa começa com os estudos do pensamento geográfico do século XIX,
passando por várias outras linhas de pensamento, até desencadear, no inicio do século XXI, na
assim denominada Geografia Pós-Moderna. Repassando pela rede epistemológica de cada
escola, buscaremos as diferentes formas de análise para o estudo da região e a evolução da
ocupação urbana. Destaca-se a importância da Ciência Geográfica na construção das cidades,
onde utilizaremos tanto elementos da geografia crítica, como elementos da concepção pós-
moderna.
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Este trabalho está composto por nove capítulos onde se procurou demonstrar a
importância dos megaeventos e a atuação do Estado como agente fomentador da dinâmica
urbana, sendo que esta pesquisa continuará disponível a fim de captarmos os dados após as
obras de Copa do Mundo 2014 e suas consequências para o perímetro urbano da cidade de
Cuiabá.
22
Cuiabá, assim como os demais centros urbanos da região Centro-Oeste, tem sentido,
neste início do século XXI, uma transformação no seu espaço regional, produzindo um novo
ordenamento territorial e acirrando com isso a competição no mercado imobiliário, que
procura impor seus interesses nas transformações arquitetônicas e de infraestrutura do espaço
regional.
A escolha de Cuiabá como cidade sede da copa do Mundo de 2014 tem tornado essas
transformações mais latentes do que outras áreas também dinâmicas do Centro-oeste do
Brasil. A possibilidade de maior aplicação de recursos públicos e recursos internacionais na
cidade tem possibilitado o surgimento de mais atividades econômicas e mais
empreendimentos imobiliários, o que proporciona um adensamento e uma intensificação do
uso de determinadas áreas, enquanto a evasão de atividades econômicas e de população
ocasiona o abandono e a degradação de outras. Assim, como as transformações do espaço, o
pensamento geográfico também sofreu com essas rupturas, o que são caracterizadas por Capel
(1981) como “mudanças de paradigmas”. Essas mudanças enriquecem o debate, citando
novamente as palavras de Capel (1981, p.251): “A ciência progrediria mediante uma evolução
truncada e não linear em que cada uma das fases representa uma ruptura a respeito do saber
anterior”. Na progressão do estudo buscamos, o caminho da evolução da geografia a partir da
sistematização do conhecimento geográfico. Para isso fizemos um recorte temporal que se
estende do final do século XIX, com a geografia clássica, passando pela escola da Nova
Geografia, pelas correntes críticas marxistas, até o inicio do século XXI, com a denominada
geografia pós-moderna. Diante do exposto, este estudo pretende mostrar a importância da
ciência geográfica na construção pós-moderna das cidades.
Sendo a cidade uma mistura complexa, A aparência dela e o modo como os seus
espaços se organizam formam uma base material a partir da qual é possível pensar, avaliar e
realizar uma série de possíveis sensações e práticas sociais. Carlos (2001) defende que o
processo de reprodução do espaço se realiza criando novas contradições, tomando em seu
estudo a contradição da “raridade do espaço”. Segundo ela, o fenômeno da raridade se
concretiza pela articulação de três elementos indissociáveis: a existência da propriedade
privada do solo urbano, a centralidade da área e o grau de ocupação (índice de construção) da
área no conjunto do espaço da metrópole.
Nos últimos anos, o espaço urbano tem sido alvo de uma série de ações do setor
público e dos diversos agentes afins, acentuando sua centralidade. A interferência humana no
espaço tem provocado alterações socioeconômicas em grandes áreas construídas. É o que
ocorre nos grandes centros urbanos, como no caso da Grande Cuiabá, aqui entendida como
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toda a região metropolitana do Vale do Rio Cuiabá, englobando Cuiabá, Várzea Grande,
Santo Antônio do Leverger e Nossa Senhora do Livramento. O crescimento horizontal e
vertical da aglomeração urbana, em especial entre Cuiabá e Várzea Grande, provocou a
elevação dos preços das áreas construídas e proporcionou a abertura de novas áreas. A
especulação imobiliária no entorno da área urbana, a intensa urbanização e a possibilidade de
Cuiabá sediar alguns jogos da copa do Mundo de 2014 provocaram a alteração no valor
imobiliário de vários pontos da cidade, em especial nos arredores do estádio “Arena
Pantanal”.
A ocupação do espaço das cidades sofre as influências da legislação. Ainda que os
incorporadores utilizem de estratégias a fim de viabilizar seus interesses e desejos, as normas
existem e devem ser seguidas. Com isso, pretendemos uma leitura mais atenta da legislação
em vigor, ressaltando a importância do poder público frente aos diversos interesses,
principalmente dos demais agentes e classes sociais envolvidas. Corrêa (1999) sugeriu que o
conhecimento sobre o papel do Estado como agente de atuação no espaço urbano seja
aprofundado, contribuindo para o entendimento do Estado enquanto agente modelador do
espaço urbano capitalista.
Dessa forma, pretende-se também discutir se a atual configuração da ocupação do
espaço segue os parâmetros de uso, ocupação do solo, os Códigos de Obras e Posturas
vigentes. Caracterizar se, numa postura estatal rígida em Cuiabá, o Estado
manipulava/manipula o mercado ou vice-versa. Para isso, alguns questionamentos ganham
destaque: até que ponto pode-se dizer que a valorização imobiliária foi uma atividade
meramente de mercado? Ou ainda, em que intensidade o Estado, por meio da construção de
um estádio de futebol para o evento Copa do Mundo de 2014, interferiu e interfere no
processo? Qual o papel do Estado nesse processo? Quais as estratégias e ações da
incorporação imobiliária quando se deparam com situações adversas a seus interesses? Que
mecanismos utilizam? Quais os parâmetros de ocupação e uso do solo que nortearam o
processo de ocupação de Cuiabá?
Tais elucidações se fazem necessário, pois David Harvey trata deste novo processo de
acumulação flexível segundo três perspectivas, a saber: a do trabalho, da produção e do
Estado.
Harvey (1993, p. 140) relaciona tais processos ao pós-modernismo ao dizer que este:
Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos,
novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e,
sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica
e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos
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pensamento em geral não se revelam como verdadeiras, nem falsas. Todas deram as suas
parcelas de contribuição para o estudo regional, para a Geografia e procuraram atender a
sociedade, e obviamente o Estado. Naquilo que lhe foi ou é proposto, cada uma teve e/ou tem
sua eficiência. A grande maioria das correntes de pensamento geográfico com seus métodos e
teorias representam a projeção na crença de se fazer ciência nos moldes daquela exigida pela
modernidade – mesmo aquelas que a contestavam. Atualmente, numa “condição pós-
moderna”, para lembrar Harvey (1999), não nos obrigamos a escolher um determinado
caminho para afirmarmos uma leitura real sobre as categorias espaço, região, território,
paisagem, lugar. Os novos tempos nos permitem a flexibilidade de aproveitar ou não daquilo
que a modernidade foi eficiente e somar com a novidade dos tempos atuais.
Milton Santos ainda em A Natureza do Espaço assume uma postura bem definida na
construção da sua noção de valor olhando para cidade, ao dizer que, as diversas frações da
cidade se distinguem pelas diferenças das respectivas densidades técnicas e informacionais.
Os objetos técnicos, de alguma forma, são os fundamentos dos valores de uso e dos valores de
trocas dos diversos pedaços da cidade. Pode-se dizer que, consideradas em sua realidade
técnica e em seus regulamentos de uso, as infraestruturas “regulam” comportamentos, e desse
modo “escolhem”, “selecionam” os atores possíveis. Certos espaços da produção da
circulação e do consumo são áreas de exercício dos atores “racionais”, enquanto os demais
atores se contentam com as frações urbanas menos equipadas. A ação humana é, desta forma,
compartimentada segundo níveis de racionalidade da matéria. Sendo assim, a valorização do
espaço urbano proporciona uma exclusão social que faz aumentar a mancha urbana, com a
periferização da mão de obra. Cuiabá tem sentido essas consequências, principalmente após o
anúncio de ser uma das sedes da Copa do Mundo de Futebol de 2014.
Cabendo destacar que vários estudos no Estado de Mato Grosso foram feitos para
investigar o processo de urbanização e suas consequências destacando-se, entre outros,
VilarinhoNeto (2002) e Romancini (2008). Sendo assim, as ideias propostas neste trabalho
visam a contribuir para o estudo dos diferentes métodos e correntes geográficas que
contemplem as transformações do espaço urbano motivado pelas obras que deverão ser feitas
para receber a Copa 2014 e seus “benefícios” para a cidade de Cuiabá.
Aproveitemos a possibilidade do nosso tempo, tido como pós-moderno, para
encararmos um debate que é nosso, na empreitada de atualizá-lo mediante os novos arranjos
espaciais redefinidos pela globalização.
27
A discussão do papel do Estado está inserida nesta pesquisa, para tanto buscou-se o
referencial no seguinte paradoxo, no que se refere à sua atuação frente à produção do espaço
urbano: de um lado, remetendo-se à ideia do Estado como controlador, produtor e (re)
produtor do espaço urbano, por meio de suas estratégias, ações e ferramentas, tais como, por
exemplo, a legislação urbanística, sendo considerado de suma relevância para a configuração
das cidades e para a produção do espaço social e, de outro, um Estado submisso, não neutro,
controlado por uma determinada elite social, que, de modo geral, intervém no espaço urbano
de acordo com seus interesses, demonstrando a ineficácia do aparelho estatal, enquanto agente
espacial. Ou seja, em ambos os casos, as relações sociais, de alguma maneira, distribuem os
espaços, fragmentando-os.
Percebe-se que é evidenciado nitidamente que o Estado é apenas mais um agente que
produz o espaço social, ainda que, na essência de sua atuação, há o comando dirigente de
determinada classe que detém o poder, sendo o espaço material construído pelo produto de
atividades privadas, como os promotores e incorporadores imobiliários (SERPA. 2011, pág.
42) . Novamente se tem um paradoxo: de um lado é apontado que as atividades que se
arrolam no espaço, “as atividades privadas que nele se desenrolam” se inscrevem em
condições sempre já dadas, herdadas do passado, ou seja, sobre o prisma das inscrições do
urbanismo, das leis que regem a cidade, tendo como o coadjuvante do processo o Estado. De
outro lado, há a “aparência inversa”, designando que tudo que é material, produto no/do
espaço é produto de atividades privadas, ou seja, dos demais agentes que produzem a cidade.
As mudanças espaciais na cidade muitas vezes ocorrem de forma violenta, em um
ritmo acelerado como decorrência da mudança constante das direções de fluxo, do traçado ou
do alagamento de ruas e avenidas, como uma necessidade imposta pelo escoamento do
30
A autora faz referência aos principais agentes e os define muito bem. Conhecermos o
papel de cada um é importante a fim de conhecermos melhor os agentes do espaço urbano. Se
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consultarmos a lei federal n.º 4.591, de 16 de dezembro de 1964, que trata das questões do
condomínio, encontramos a seguinte definição de incorporador:
Artigo 29 – Considera-se incorporador a pessoa jurídica ou física,
comerciante ou não, que embora não efetuando a construção, compromissa e
efetiva a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais
frações a unidades autônomas, a edificações a serem construídas ou em
construção sob o regime condominial, ou que meramente aceite a proposta
para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a
incorporação e responsabilizando-se conforme o caso, pela entrega em curto
prazo, preço e determinadas condições das obras concluídas.
seja possível de ser encontrado em partes na pesquisa, como nas inúmeras referências a
autores marxistas – escolhemos estas reflexões para compor um painel mais próximo do
nosso pensamento sobre a cidade e os processos urbanos.
Para captar a essência da categoria e valorização do espaço, mostra-se necessário
explicar a origem do valor, porém a partir de como a riqueza é produzida e transformada.
Esclarecendo esta categoria de análise termina-se sempre tangenciando aos conceitos de
renda, juros e lucro.
Quando pensamos em valor pensamos em preço, que poderíamos dizer ser a sua
projeção numérica. Mas o preço como conhecemos é um “preço arbitrário”, como diria os
economistas clássicos. O valor real é o “preço natural”, que poderíamos dizer que é
determinado pela quantidade de trabalho necessário à produção de um determinado bem mais
a variação desse valor. O avanço acerca da noção de valor dada pela economia mostra um
aprimoramento nesse pensamento. Para Adam Smith o valor que nos interessa é o valor de
troca de uma mercadoria, que é dada pelo trabalho que ela contém.
Seguindo a evolução do pensamento sobre valor chegamos a Marx que vem a ser o
primeiro a destacar o valor do lugar. E segundo seu pensamento, é dado por características
como fertilidade do solo, entre outros.
Em Marx o valor é antes de tudo uma categoria social. Não há valor sem trabalho.
Essa noção tem duplo significado: é valor de uso, mas também valor de troca.
A primeira forma expressa seu fundamento material, a utilidade do objeto para
satisfação das necessidades humanas, o trabalho do homem materializado. A medida real
desse valor será dada pela quantidade de trabalho socialmente necessário para sua obtenção.
O valor de troca, assim, reorientaria as práticas sociais para o fragmento do espaço
(pelas estratégias) e da sociedade (pelo poder do consumo), possibilitando o surgimento de
uma nova urbanidade, caracterizada pela predominância dos objetos, em detrimento às
relações sociais e pela emergência de um individualismo de massa, em que a mercadoria é
contemplada por seus signos, redefinindo as relações sociais. Por esse ângulo o valor de troca
predomina em nossas relações.
Tal fato pode ser observado nos bairros da região oeste da cidade de Cuiabá, onde
moradores antigos e tradicionais dessa região da cidade têm sido “atacados” pelos agentes de
mercado, que propõem a compra desses imóveis que, pelo advento da Copa do Mundo de
2014, tornaram-se espaços preciosos no contexto do espaço urbano local. Alguns desses
imóveis são adquiridos como permuta, onde o dono do imóvel passa a titulação do imóvel
para a empresa a fim de que haja uma construção de condomínio vertical ou horizontal e
40
recebe em troca um imóvel novo no mesmo lugar, quando o empreendimento estiver pronto.
Desse modo muitas famílias tem trocado seus extensos terrenos, com mais de mil metros
quadrados onde, as famílias educaram seus filhos, tendo as mesmas grandes quintais repletos
de árvores frutíferas, por uma casa ou apartamento onde observamos grande restrição na
circulação de pessoas.
A produção do espaço tem como essência o processo de agregação de valor. Desta
forma se manifesta em todas as formas de renda fundiária, seja nas transações de compra e
venda, no aluguel ou sob a forma de arrendamentos. Em ambos os casos, cobra-se pelo
simples direito de ocupação de uma fração do espaço, seja para sua produção, ou apenas para
existência. O espaço não é só recurso, é fator para circulação.
Nesse percurso, descobrimos que a sociedade relaciona-se com o seu material e todas
as coisas que ele contém, através de um permanente processo de valorização. O homem, com
seu trabalho cria e transfere valores. Partes desses valores se agregam ao espaço e vão
condicionar, assim como os recursos da primeira natureza, processos futuros. (MORAES;
COSTA, 1999, p. 119)
Poderíamos dizer ainda, segundo Moraes e Costa (1999), que para ampliar nosso
conceito de valorização do espaço temos que entender dois dos seus principais processos
complementares, mas distintos quanto à finalidade: o valor do espaço e o valor no espaço. O
primeiro é o valor concreto e mercantil do espaço; o segundo é virtual, ou seja, reserva-se à
virtualidade da circulação e a uma imanência do espaço real.
Carlos (2004) considera que na dialética do valor de uso e troca cabe ainda ressaltar
uma orientação sobre seus possíveis usos: o uso produtivo (econômico stricto sensu) que
realiza na cidade uma segregação orientada pelo sentimento de “raridade” e “escassez”, que
agrega ao valor de troca – muito peculiar à valorização imobiliária que se vê nas cidades.
Outro uso seria o uso improdutivo (ou não econômico), centrado na vida e no cotidiano em
que realiza a segregação espontânea. O uso improdutivo é revelado pelo corpo e pela
atividade humana, que, em movimento pelos sentimentos, revelam a essência do espaço. É o
plano da produção da vida. É o plano do habitar, imbuído do plano do vivido e cotidiano que
está na base do sentido do ser humano. Embora não se encontrem dissociados, é importante
frisar que ocorrem imbuídos de sentimentos antagônicos.
Quando o indivíduo compra uma casa, pensa em si, no conforto, na segurança e nas
possibilidades de ali realizar sua vida de forma satisfatória. Junto a tudo isso estaria a sua
disposição em possuir também um bem valorizado, que lhe fornecesse status e segurança
financeira perante a sociedade e que se agregasse desta forma ao seu patrimônio. O primeiro
41
sentimento está relacionado ao uso improdutivo, o segundo pelo uso produtivo. Assim como
foi descrito nos eventos acima, o uso é um sentimento ambíguo e permeia nosso cotidiano.
Interpretando a relação sociedade-espaço como um processo de valorização, se
percebe assim que este é de permanente criação de valores. O espaço, embora seja objeto de
valorização, não tem a mesma essência dos objetos de produção material imediata. Isso
porque ele não é apenas um produto, mas condição fundamental para produção e existência
humana.
A espacialidade é uma condição que se manifesta no valor final. A quantidade de valor
produzido no espaço retroage no valor agregado ao espaço. A apropriação no tecido urbano de
localizações diferenciadas gera lugares mais ou menos valorizados de acordo com sua
disposição aos elementos estruturantes do espaço. Este é um momento prévio e necessário à
valorização. Com o “caminhar” da sociedade podemos constatar que pode haver inúmeros
processos de apropriação ou dominação de dada fração do espaço, que decorre desses
diferentes fenômenos, num movimento constante de dominação, desapropriação, redominação
e/ou reapropriação (LEFEBVRE, 2001).
O capitalismo engendra no seu processo de valorização a sua continuidade ou
depreciação futura. Quando nos apropriamos do lugar, nos apropriamos dessas variáveis
também. A valorização pode ser transitória, quando ocorre em uma área de exploração
esporádica, ou perene, se o trabalho acumulado amplia seus potenciais técnicos.
Mas e quando adicionamos investimentos e construímos “solo urbano” a partir das
edificações? Esses novos valores, criados, e superpostos a terra, tornam-se capital porque são
investimentos, e, assim, transformam matéria-prima (um bem natural) em mercadoria, ou seja,
ativo num mercado de troca. Somam-se a isso algumas reflexões a cerca da paisagem que
ganha contornos de mercadoria também.
O processo de urbanização tanto em áreas periféricas, quanto em áreas consolidadas –
introduzindo novos usos a áreas degradadas – implicam na mudança de funções urbanas. O
detentor do poder, ou melhor, de sua “apropriação monopolista”, insere-se no processo de
apropriação da mais-valia.
A renda absoluta de uma área pode aumentar em decorrência da escassez, ou da sua
simulação, como ocorre com o objeto deste estudo. Essa escassez pode ser forjada pelo
discurso que tem como prerrogativa a terra como bem não produzido. Mas se atentarmos para
a produção imobiliária recente, podemos nos arriscar a dizer que é possível produzir
paisagens semelhantes a exemplo dos condomínios fechados e assim haveria, além dos
42
atributos relacionados aqui, outros como a marca comercial que indica um padrão de
qualidade do produto agregando ao seu valor final.
Dentre as estratégias do mercado imobiliário, destaca-se o discurso de “um novo
modo de viver”, utilizando-se do verde, da paz e da segurança, frente ao aumento do caos
urbano. Por isso mesmo as edificações não possuem preço uniforme no mercado, mesmo
quando se destinam a funções semelhantes. O preço de venda estará atrelado a sua
localização, que indica sua posição em relação aos elementos estruturantes do espaço urbano.
O local vale por seus atributos e características, entre eles podemos citar como exemplos: a
acessibilidade, características paisagísticas (novamente aqui imbuídas do discurso
competente), montantes de investimentos públicos, as funções e os usos que agregam valor ao
espaço.
A área de nosso estudo é o espaço que mais receberá investimento público dentro da
cidade de Cuiabá com o advento do Mundial de Seleções em 2014, pois além dos
investimentos na construção do estádio de futebol, estão previstas obras de mobilidade urbana
como o melhoramento do calçamento de pedestres, asfalto de boa qualidade nas ruas e
acessos ao estádio, melhoria na sinalização turística e de veículos, facilidade no escoamento
de veículos, além da principal obra de mobilidade que é a construção do Veículo Leve sobre
Trilho (VLT), obras urbanísticas de convivência social além de criação de uma infraestrutura
de prestação de serviços. Essas obras somadas darão à região um investimento público
superior a 1,5 bilhão de Reais. Sendo que a previsão inicial para todas as demais obras em
Cuiabá e Várzea Grande girava em torno de 3 bilhões de Reais. Baseado nesses dados,
podemos deduzir que nossa área de estudo perfaz 50% do valor do investimento inicial
previsto para toda a cidade de Cuiabá e Várzea Grande.
Essa previsão de investimentos tem atraído os agentes imobiliários que adquirem a
qualquer custo os terrenos e casas das ruas e avenidas que darão acesso ao estádio de futebol.
Isso tem gerado uma supervalorização do espaço elevando os valores dos terrenos a preços
astronômicos e irreais. O metro quadrado de terra sem nenhuma edificação tem sido
negociado a R$500,00 (quinhentos Reais), muito acima do metro quadrado de bairros nobres
ou ambientes comerciais de outras áreas da cidade.
Desta forma, a especulação imobiliária surge com o aumento na apropriação de
parcelas da mais-valia produzidas pelos diferentes agentes. Nesse período de reprodução
ampliada do capital, a terra, que sob a ótica marxista não é capital, passa a ter acentuada
especulação no espaço urbano e é manipulada como tal quando a vemos destinada a se tornar
43
reserva de valor, portanto se transforma em uma das mercadorias mais caras do mercado de
compra e venda.
Como o espaço é produzido e o espaço urbano é produto desse processo, vivemos na
cidade o paradoxo do consumo e da circulação do imóvel (terra e benfeitoria).
Poderíamos então considerar que a valorização do solo se dá de acordo com os
seguintes fatores: acesso, coeficiente de aproveitamento e proximidade a equipamentos e
serviços urbanos; investimentos, principalmente do poder público; a virtualidade do poder de
troca que sua posse traria: mais status, condição paisagística, entre outros.
consolidação de um mercado de terras pelo mercado imobiliário que permitirá uma maior
liquidez do bem.
Hoje a especulação pode ser tida como uma das maiores segregadoras de classes no
núcleo urbano. Ela impõe uma “fratura” no espaço por vezes intransponível. Só ganha fôlego
e vida graças ao Poder Público. Mm bom exemplo é que ela não ocorre somente em terrenos
que recebem investimentos públicos e permanecem ociosos. Ela ocorre também em áreas já
degradadas que passam por requalificação urbana, como os centros antigos. Esses espaços
servem como verdadeiras “grifes” do mercado imobiliário (SERPA, 2011, p. 26).
Sendo assim Santos aponta que a especulação é “O resultado das formas pelas quais se
realiza a acumulação do capital na produção imobiliária. Não é possível separar valorização
das terras da valorização capitalista do meio urbano.” (apud GONÇALVES 2002, p.55).
A terra, como produto do capital, possui um valor de uso (advindo da estrutura física,
que implica nas possibilidades dos usos possíveis de serem realizados) e um valor de troca (a
possibilidade de ganhos futuros dada pela posse e domínio pleno). Só se torna um produto em
função da propriedade privada (como produto torna-se propriedade) e a mercantilização das
relações sociais negociadas pela lógica da circulação (fluxos), através de instrumentos
jurídicos. Como produto, seu valor é dado pelo trabalho – que pode ser investimentos estatais
e/ou investimentos particulares – e através do tempo incita a permanente criação de valor.
A especulação ganha nova cara também graças às informações privilegiadas e trocas
de favores nos órgão públicos, parte da burocratização. Assim ocorreu na área em questão, a
região do entorno da futura Arena Pantanal, quando da confirmação por parte da FIFA
(Federation Internacional Football Association), de Cuiabá como uma das subsedes da Copa
do Mundo 2014. Aliada a isso surgem projetos por parte do poder público de empreendidos
que estão criando um novo dinamismo econômico na região da cidade, com isso forjam sua
especulação.
Como o investimento público é um elemento chave nesse processo, as informações
privilegiadas se antecipam e garantem a sobreposição de mais-valia à mercadoria.
Esses investimentos sociais tornam-se instrumentos de valorização de terras urbanas.
A localização da classe trabalhadora segue os interesses do capital imobiliário, culminando
em sua segregação: “a construção do espaço em nossos dias não resulta unicamente da
atividade direta e imediata, mas também das expectativas de valorização.” (SANTOS, 2004,
p. 169).
45
Percebe-se que o próprio plano diretor foi escrito para combater o uso especulativo, o
que colabora com os artigos 182 e 183 da Constituição Federal. Apesar da lei, o que
percebemos na realidade é o fim especulativo dos imóveis urbanos da cidade.
As demandas são por terrenos com algumas características básicas de
construtibilidade. Uma delas é a localização que deve receber infraestrutura pública de
urbanização. Seu preço pode se alterar pelas mudanças na política econômica e fundiária.
Pode também ser alterado quando a forma de uso é alterada ou pelas possibilidades
(virtualidade) de investimentos em planejamentos urbanos.
mercado dominado por tais agentes de “urbanização corporativa”, que a seu ver é
empreendido no comando dos interesses das grandes firmas. A expansão da cidade, como
mostra este trabalho, é caracterizada pela ocupação ao longo dos anos de superfícies repletas
de “vazios”, onde as especulações fundiária e imobiliária destacam-se.
Além disso, a especulação se fortalece com o crescimento intensivo das cidades,
consequente déficit de residências e a expulsão da população mais pobre para as periferias. O
Estado, para completar o quadro, tende a ser um investidor das áreas de urbanização
corporativa.
Tudo isso tende a diferenciar ainda mais a cidade em áreas divididas socialmente, o
que acaba marcando profundamente a estrutura do espaço intra-urbano.
Porém o que ocorre é que as estratégias do capital hoje são apoiadas em publicidade e
em uma ampla divulgação midiática, fomentada pelo discurso competente que cria
“necessidades” que envolvem questões simbólicas e subjetivas relacionadas ao lugar e ao
indivíduo.
O marketing imobiliário termina por incentivar a população a deslocar-se para áreas
não ocupadas do tecido urbano, obrigando o poder público a investir em infraestrutura básica.
Cria e recria espaços, alterando a paisagem e incorporando-a à lógica do modo capitalista.
A proposta aceita pela FIFA de trazer a copa para áreas pantaneiras fez com que as
incorporadoras adquirissem grandes espaços ociosos, ou ocupados pela população local no
entorno do estádio, a fim de construir seus empreendimentos voltados para a super
valorização do espaço proporcionado pela possibilidade do evento Copa do Mundo de 2014.
Podemos concluir que o capital imobiliário é uma categoria de análise de suma
importância para o estudo da produção do espaço urbano. O capital se apresenta de várias
maneiras no processo de construção e apropriação deste espaço, do qual podem ser citadas a
função fundiária, produtiva, financeira e imobiliária.
Nosso estudo evidencia o processo de urbanização que, no caso da cidade de Cuiabá,
foi motivado pela migração intensa a partir dos anos de 1970. Esse processo de urbanização
sempre se mostrou excludente, com as forças produtivas e as relações de produção
estabelecidas conduzindo o processo. As relações de produção referem-se às relações
construídas socialmente entre os próprios homens, a exemplo da forma de propriedade e das
relações de trabalho e as forças produtivas equivalem às relações entre o homem e a natureza,
dadas pela força de trabalho e pelos meios de produção, os objetos (a terra) e instrumentos de
trabalho.
47
Figura 01: Localização do Brasil, Mato Grosso, município de Cuiabá e o perímetro urbano da
cidade
Figura 01 - elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira (2011)
Organização: Siqueira(2012)
50
Para evidenciar esse aspecto, buscou-se apoio em Neto 2002, p.286 que afirma:
[...] após a construção de Brasília, que provocou um forte impulso
desenvolvimentista a toda a região Centro-Oeste, Cuiabá, como a Capital do
Estado e com localização estratégica, despontou como centro de capacitação
de recursos para a ampliação da área agrícola, e expansão da pecuária. A
partir da segunda metade da década de 60, o Estado de Mato Grosso é
incorporado ao processo de expansão do capital nacional na Amazônia e, ai,
a cidade de Cuiabá integra-se efetivamente ao processo produtivo nacional,
sendo denominada de “Portal da Amazônia” e transformada, de acordo com
os defensores do capital, em polo de desenvolvimento [...].
Complementar 083 de 18 de maio de 2001, que praticamente não saiu do papel, ou seja, não
foi posto em prática pelos dirigentes das duas cidades.
Já no ano de 2009, através da Lei estadual 359/2009, foi criada a primeira região
metropolitana do Estado de Mato Grosso, sendo composta pelos municípios de Cuiabá,
Várzea Grande, Santo Antônio do Leverger e Nossa Senhora de Livramento. Do ponto de
vista formal, a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 25, dá competência aos estados da
Federação a prerrogativa mediante a lei complementar a criação dessas regiões
metropolitanas. Assim afirma o texto constitucional:
§ 3º - Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões
metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por
agrupamentos de Municípios limítrofes, para integrar a organização, o
planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
Cabe ressaltar que apesar da lei estadual instituir a região metropolitana desde 2009,
Mato Grosso não possui nenhuma cidade considerada como metrópole de acordo com o
IBGE, pois a cidade de Cuiabá sozinha segundo o instituto não pode ser considerada como
tal, no entanto o processo de metropolização dá-se devido a junção com os outros municípios
que se limitam a Cuiabá.
A partir dos procedimentos teóricos realizados até aqui, aponta-se que a morfologia, a
estrutura, a função, entre outras características da cidade, são oriundas de estratégias e ações
dos diversos agentes que produzem o espaço. Sabe-se também que o Estado é um agente que
tem estratégias particulares como também alianças com outros agentes. Também é conhecido
que há uma gama de instrumentos que são utilizados pelo próprio Estado para a realização de
suas ações nas transformações do espaço urbano. Dessa forma, no decorrer deste trabalho,
53
vários termos e conceitos do urbanismo serão discutidos, tais como planejamento urbano,
plano diretor e, dentro ou fora deste, o zoneamento, o uso do solo, o coeficiente de construção
ou coeficiente de aproveitamento, o código de obras e posturas, outorga onerosa do direito de
construir no solo criado, entre outros. Sendo assim, trataremos da fundamentação dada pela
legislação no âmbito federal, estadual e municipal, no que tange a ocupação do solo urbano.
Durante o século XX no Brasil, houve uma tentativa de consolidar uma República
Federativa de fato, com a representatividade de estados e municípios. A constituição de 1934
assegurou independência financeira aos municípios, permitindo a cobrança e arrecadação de
impostos, liberando-o, assim, parcialmente, da tutela do Estado.
Em 1937, com o Estado Novo, a legislação restringiu novamente a autonomia
municipal. A legislação sobre o bem imóvel – terras e edificações – permanecia na tutela da
União. Já a Constituição de 1946 assegurou ao município autonomia em 3 (três) níveis:
político, com eleição direta para prefeito e vereador, administrativo, para organizar o serviço
público local e financeiro, para efeito de arrecadação tributária. Com o golpe militar de 1964,
através de atos institucionais e emendas constitucionais consolidadas em 1967, ou seja, com a
outorga da constituição de 24 de janeiro de 1967, essa autonomia conseguida na Carta de
1946 foi restrita. O AI (Ato Institucional) n° 5 de 1968 e outros que se seguiram, introduziram
alterações que acabaram por destinar funções meramente administrativas aos municípios e as
aplicações de recursos da União estavam contingenciados aos programas federais, numa
tentativa de perpetuação dessa forma de poder vigente.
Esse processo leva em consideração um momento político e econômico delicados, em
que a crescente produção de bens duráveis implicou em uma necessidade de concentração de
renda em nível nacional que condizia com a integração física do País, fazendo com que o
município perdesse sua autonomia. Essa crescente redução de autonomia estadual e municipal
foi uma pré-condição para orientar os investimentos na esfera federal. Essa perda de
autonomia jurídica e econômica expressou-se politicamente, limitando as classes populares –
base da industrialização que garantiu o chamado “Milagre Brasileiro” – de expressarem-se
politicamente. Os projetos regionais de desenvolvimento passaram a ser ditados pelo Governo
Federal, num claro movimento de centralização política. Desta forma, Cuiabá recebeu
projetos como o Poloamazônia e Polonoroeste, com a ideia central de ocupar a Amazônia
através das rodovias federais as BRs 163 e 364.
A Constituição Federal de 1988 no seu artigo 182, quando trata do ordenamento feito
pelo poder público municipal com respeito à política urbana nos diz:
54
Já a constituição do Estado de Mato Grosso fala sobre a mesma temática no seu artigo
181. “A Lei Orgânica Municipal, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias
e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, observará
todos os preceitos do Art. 29 da Constituição Federal.”
A partir dos artigos consultados recorremos a Lei orgânica do Município de Cuiabá
onde encontramos o Art. 191: “Os objetivos da Política de Desenvolvimento Urbano
serão os de garantir plenamente as funções sociais da cidade e o bem- estar dos habitantes.”
Os artigos das leis acima citadas nos deixam a clara intenção que o solo urbano tem a
função social para garantir a moradia digna aos seus cidadãos e o bem-estar a todos os
munícipes. A legislação urbana de Cuiabá de 2004 deixa ainda mais transparente essa
intenção ao dizer em seu preâmbulo:
A política de desenvolvimento urbano de Cuiabá deve ordenar as funções
sociais da cidade, isto é, assegurar as condições favoráveis ao
desenvolvimento da produção econômica e a plena realização dos direitos
dos cidadãos. A propriedade urbana, o uso e a ocupação do solo devem
sujeitar-se às exigências da sociedade, ao Plano Diretor e a instrumentação
legal decorrente.
A partir dessa base legal, começamos a analisar tais leis em conjunto com a evolução
do perímetro urbano de Cuiabá. Podemos resumir na tabela 03 sobre a evolução do perímetro
urbano da cidade de Cuiabá.
Desde a sua fundação até 2011, o município de Cuiabá passou por nove
regulamentações do seu perímetro urbano. A primeira aconteceu no ano de 1938. O
fortalecimento das políticas de ocupação do governo Militar com a criação da SUDAM
(Superintendência de desenvolvimento da Amazônia) e, por consequência, a ocupação do
norte de Mato Grosso por grandes empresas agropecuárias consolidou a capital de Mato
Grosso como portal da Amazônia. Para que essa consolidação fosse efetivada, novos espaços
foram sendo transformados dentro do perímetro urbano da cidade de Cuiabá, dotando a
cidade de uma multiplicidade de equipamentos urbanos. Parte desses migrantes, que tinham
como destino a “Amazônia Legal”, fixaram residência em Cuiabá. Desta forma, abruptamente
foram inseridas novas áreas ao espaço urbano da cidade, como podemos observar na figura
02:
56
Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira (2011)
Organizado: Siqueira(2012)
Anteriormente a estas ampliações do perímetro urbano, a cidade de Cuiabá já
dispunha de grande número de lotes não edificados em loteamentos já dotados de
infraestrutura, em grande parte aguardando a valorização imobiliária. E ainda, com os
sucessivos acréscimos, à área urbana foram incorporadas grandes áreas não edificadas e
ociosas, acarretando uma densidade demográfica urbana baixíssima de 20,88 hab./ha no ano
de 2004 CUIBÁ, 2010).
Estes fatos ocasionam maior custo-cidade, visto que cabe ao poder público municipal
prover e manter rede de infraestrutura urbana, como serviços de saneamento, pavimentação
viária, equipamentos urbanos e ainda serviços públicos, como o transporte coletivo e a coleta
de lixo, além de outros.
57
Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira (2011)
Organizado: Siqueira(2012)
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Cuiabá destacou-se como uma das capitais brasileiras que mais cresceram nas últimas
décadas, o que se deu através de loteamentos residenciais, conjuntos habitacionais e outras
formas de ocupação urbana através do processo de ocupação ilegal. Devido essa rápida
expansão urbana, Cuiabá conta atualmente com 118 bairros conforme mostra o figura 04 a
seguir:
Figura 04: Divisão do abairramento de Cuiabá
Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira (2011)
Organizado: Siqueira (2011)
Novamente podemos perceber que a ideia do legislador em tornar a cidade mais social
é excelente, no entanto a prática não é observada, pois existem grupos de excluídos sem
acesso a terra urbana
Como visto nos parágrafos expostos no texto anteriormente, o Bairro Cidade Alta faz
parte da história da cidade de Cuiabá, sendo um dos bairros mais antigos, regulamentado
oficialmente no ano de 1974 pela lei municipal número 1346. Ressaltamos ainda que esse
bairro é composto principalmente por moradores nascidos no município, ou nos municípios
adjacentes. A construção do estádio ajudou a alavancar a ocupação do bairro no inicio da
década de 1970.
O Estádio “Governador José Fragelli”, popularmente chamado de “Verdão”, tem sua
construção iniciada em 1973, fruto de uma tentativa de alavancar a economia do estado que
estava em um período recessivo. Ressalta-se ainda que nessa época a área com maior
percentual de arrecadação estava na região sul do estado, área essa que viria a desmembrar-se,
fundando o atual estado de Mato Grosso do Sul. Assim, era necessário alavancar a economia
de Cuiabá e a construção do estádio de futebol colaborou para reduzir os efeitos da recessão
econômica que era global, devido a crise do petróleo no Oriente Médio.
A figura 05 mostra vista aérea do antigo estádio e da região oeste da cidade, tendo
uma área de abrangência de 3 km, a partir do estádio.
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Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira ( 2011)
Organizado por: Siqueira(2012)
O processo de ocupação do entorno do estádio é alavancado, recebendo novos
moradores para o bairro Cidade Alta, formando assim o loteamento “Verdão”, que foi
regulamentado através da lei municipal 1.346 de 1974, com a expansão do perímetro urbano
da cidade de Cuiabá, conforme mostrado na figura 02.
A expansão dessa área da cidade foi contínua, no entanto essa região não é o espaço
mais densamente povoado na cidade de Cuiabá, pois são inúmeros os lotes não edificados na
região.
Podemos visualizar na figura 06 a seguir a ocupação do entorno do estádio, já no ano
de 2010.
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Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira(2011)
Organizado por: Siqueira(2012)
O Loteamento Verdão pertence ao bairro Cidade Alta, está localizado na região Oeste
da Cidade, tem sua ocupação anterior a construção do estádio. É um bairro pouco
verticalizado, composto por dois condomínios desse tipo, a saber: Ilhas do Sul, composto de
três torres e o condomínio Ilha dos Açores, composto de duas torres. Consideramos aqui os
condomínios com mais de quatro andares. Sendo assim, é um bairro composto de construções
residenciais, onde dominantemente são habitados por cuiabanos, conforme pesquisa informal
feita por nós nas adjacências do estádio de futebol .
62
Figura 07: vista parcial do entorno do estádio, mostrando torres, edifícios residenciais
Esse artigo com certeza não está sendo cumprido a risca, pois o uso especulativo é
comum na área urbana de Cuiabá. A foto a seguir, figura 09, deixa explicito o objetivo da
venda do proprietário, em que, junto ao anúncio da venda está a logomarca da copa do mundo
de 2014. A possibilidade desse Megaevento esportivo tem valorizado abruptamente os preços
dos imóveis. Deixamos a fachada do imóvel encoberto para maior discrição.
1%
6%
22%
9% 62%
casas
apartamentos
cômodos
improvisados
coletivos
Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira ( 2011)
Organizado por: Siqueira(2012)
A promoção de eventos tem sido uma das principais estratégias utilizadas pelos
gestores urbanos na busca de maior atração de capitais. Esses eventos podem ser de diferentes
naturezas, organizados por distintos atores e instituições que desempenham as mais diversas
atividades na sociedade. Há uma predileção especial dos gestores empreendedores pelos
eventos com repercussão internacional, uma vez que tais eventos poderão conferir uma
imagem “mais qualificada” para a cidade sede. Além disso, os eventos internacionais podem
significar a circulação de turistas com alto poder aquisitivo, dispostos a consumir os serviços
e bens comercializados localmente. Para abrigar esses eventos, a cidade sede deve apresentar
alguns equipamentos diretamente relacionados com o evento em si, como centro de
convenções e hotéis, além de amenidades culturais e uma adequada infraestrutura de
transportes que permita o deslocamento rápido dos participantes ao evento. Em relação à
temática dos transportes, destaca-se a proximidade de aeroportos, além de outras modalidades
que permitam os deslocamentos rápidos e seguros entre os principais locais de circulação dos
participantes dos eventos.
72
Nesse sentido, logo após o anúncio oficial da FIFA que Cuiabá iria sediar um evento
de tamanha grandeza, começaram as especulações nos diversos espaços da cidade, com a
possível transformação do perímetro urbano de Cuiabá. Essas especulações não se limitaram a
Cuiabá, mais sim a toda a região Metropolitana do Vale do Rio Cuiabá e seu entorno. A
capital vibrou com a possibilidade de abrigar os centros de treinamento, que acarretariam em
mais investimento e, por consequência, em um maior desenvolvimento local.
Para conquistar o direito de se tornar provisoriamente grandes “Centros Midiáticos
Globais” (MASCARENHAS, 2011, p. 17), países e cidades esmeram-se na construção de
projetos fabulosos. O Brasil vem se firmando como nação capaz de abrigar grandes eventos
esportivos.
A Copa do Mundo da Alemanha em 2006, Os Jogos Pan-americanos do Rio de Janeiro
em 2007, a Olimpíada de verão em Pequim 2008, a Copa do Mundo da África do Sul em
2010, As Olimpíadas militares no Rio de Janeiro em 2011, a Copa do Mundo de 2014 e as
Olimpíadas no Rio de Janeiro em 2016 apresentam investimentos eminentemente públicos
que são calculados em bilhões de dólares. Parte destes recursos financeiros é utilizada apenas
para a realização do espetáculo esportivo em si, sem embargo, outra parte significativa do
bolo orçamentário é utilizada na construção de equipamentos e estruturas que modificam o
tecido urbano.
A primeira pergunta diante desses investimentos públicos é: quais foram ou serão os
efeitos urbanísticos, ambientais, sociais e econômicos nas cidades sedes?
Os megaeventos esportivos têm tamanha envergadura, que são capazes de redefinir
centralidades, constituindo com isso verdadeiros marcos na evolução urbana.
O uso de eventos para a atração de investimentos não é propriamente uma novidade,
no entanto esse recurso passou a ser mais utilizado a partir de mudanças na política urbana e
do acirramento da competição global. Reconhece-se que desde os anos 1980 houve um corte
dos investimentos do governo central nas cidades, e isso não é uma particularidade brasileira,
pois também ocorreu na maior parte dos países ocidentais. Sendo assim, os políticos de
algumas administrações locais começaram a adotar um posicionamento empreendedor na
gestão de seu território.
Os palcos esportivos e as acomodações eram bem modestas até a II Guerra Mundial,
pois os jogos eram basicamente amadores. No entanto, uma nova fase se inicia com a
olimpíada de Roma 1960, pois os países começaram a superar as dificuldades financeiras
impostas pela Segunda Grande Guerra e, contando ainda com receitas oriundas das
transmissões televisivas, os Jogos passaram a dispor de generosos aportes de recursos para
73
É cada vez mais comum a realização de grandes intervenções urbanas com diferentes
dimensões e impactos sobre os territórios. Trata-se de um fenômeno que guarda relação com
novos ordenamentos associados à globalização e à redefinição de posicionamentos dos
gestores urbanos. Os ajustes espaciais nas cidades estão sendo realizados de forma cada vez
mais acelerada e com transformações territoriais que promovem novos significados para
governos, empresas e cidadãos, especialmente nos países centrais. Novas territorialidades são
conformadas a partir do movimento de atores que detêm a hegemonia dos processos
decisórios voltados para os investimentos em projetos urbanos.
Nas palavras de Mascarenhas (2011, p. 37):
O planejamento urbano tradicional, modernista, sistêmico-funcional e
integrador, do ponto de vista físico-territorial ( o master plan), vem sendo
mundialmente substituído por um novo paradigma de planejamento e gestão
das cidades, no contexto internacional de afirmação do neoliberalismo.
existir melhorias é preciso haver recursos e esses são facilmente captados quando se há
grandes eventos que dinamizam as cidades. Por isso, há uma disputa política entre os lugares
para sediarem os megaeventos, sobretudo aqueles relacionados aos esportes, uma vez que
estes trazem consigo grandes investimentos financeiros e fomentam o empreendedorismo
urbano.
Como recurso ilustrativo das fases de implementação dos Jogos, foi esboçado o
diagrama da figura 13. Cada um dos estágios representados (candidatura, preparação, jogos e
legados) tem especificidades que merecem ser detalhadas com o fito de aprofundar a
compreensão sobre o objeto empírico em análise.
Na primeira fase, a da candidatura, há muitas expectativas sobre as intervenções que
serão realizadas na Cidade. Muitas vezes estas expectativas ofuscam o planejamento das
transformações urbanas que é consolidado nos Cadernos de Encargos. Estes Cadernos
funcionam como contratos com as organizações responsáveis pelos Jogos (FIFA, COI, etc.)
que registram as decisões locacionais delineadas por grupos seletos. A oficialização das
candidaturas ocorre em períodos entre 2 e 4 anos. No entanto, a FIFA já escolheu a Rússia
para a Copa 2018 e o Catar para a Copa de 2022.
Quanto à etapa da preparação, esta compreende o período entre a escolha da cidade
que sediará os Jogos pelo Comitê responsável e o início das atividades esportivas do evento.
O período dessa fase varia entre 5 e 7 anos que antecedem o megaevento, podendo ser um
tempo menos extenso para eventos com níveis de complexidade inferiores. É nessa etapa que
as intervenções necessárias para a realização do evento ocorrem, com obras de reforma ou
construção de arenas esportivas, vilas de atletas e de mídia, bem como de estruturas de
transporte.
77
Dados: FIFA
Fonte: Siqueira(2011)
Organização: Siqueira (2012)
A fase dos Jogos é a mais efêmera de todas, contudo é em razão dela que todas as
outras existem. Trata-se da fase realização do megaevento propriamente dito com as
competições esportivas ocorrendo nas arenas preparadas na fase anterior. Com duração que
pode variar entre 15 e 60 dias, esta etapa é caracterizada por uma visibilidade intensa da
cidade sede dos Jogos. Essa etapa marca data limite para que todas as intervenções planejadas
e executadas estejam finalizadas. Essa é uma característica que distingue as políticas públicas,
realizadas em função dos megaeventos, das demais.
Muito anunciada pelos organizadores dos Jogos, com o intuito de legitimá-los junto
aos cidadãos, a fase dos legados tem duração indefinida. Todo o conjunto de intervenções
permanentes realizadas em função dos Jogos é, após o término destes, apropriada de
diferentes maneiras pelos citadinos. Como legados mais significativos para a Cidade se
destacam as estruturas de transporte, dentre as quais se exemplificam: a ampliação de
aeroportos, construção de novas vias, ampliação da rede viária. Novos usos e processos são
inaugurados nas arenas e vilas implantadas na malha urbana.
Vale registrar o entendimento de que a modernidade é portadora não só de novas
expectativas e transformações sociais, mas também traz grandes transformações na
78
VALORES EM
RELAÇÃO DE EVENTOS
BILHÕES DE R$
Olimpíada de Atlanta - EUA 1996 5
Copa do Mundo da França - 1998 3,6
Olimpíada de Sydney - Austrália - 2000 11,8
Copa do Mundo da Coréia do Sul e Japão -
2002 16
Olimpíada de Atenas - Grécia - 2004 21,3
Copa do Mundo da Alemanha - 2006 6
Olimpíada de Pequim - China - 2008 40
Copa do Mundo da África do Sul - 2010 30
Olimpíada de Londres - Inglaterra - 2012 * 19
Copa do Mundo do Brasil - 2014 * 40
Olimpíada do Rio de Janeiro - Brasil - 2016 * 15
Os dados acima citados referem-se aos investimentos previstos pelo Estado, assim
como os investimentos previstos pelo capital privado no âmbito nacional e transnacional.
Esses dados são apenas para uma mensuração genérica do tamanho do investimento previsto
para os Megaeventos.
Os eventos esportivos são vantajosos para os países que os promovem desde que
também sejam aproveitadas as oportunidades para reverter os benefícios dos Jogos para as
cidades e as comunidades.
É neste contexto que os entrevistados indicam a necessidade de modernização dos
aeroportos, serviços aeroportuários, o desenvolvimento da infra- estrutura e da construção
como atividades a serem potencializadas pelos investimentos. Os jogos podem fomentar o
turismo local, no entanto a infraestrutura criada possibilita uma vida melhor para os habitantes
da cidade, com a melhoria da logística urbana da região. Veja a tabela 07, onde estão
previstos os investimentos das Cidades-Sede.
83
Orçamentos totais
Cidades- Sede da copa Orçamento para os Estádios estimados em bilhões
2014 ( em milhões de reais) de reais
Rio de Janeiro * 430 11
Salvador 550 1,5
Recife 500 5
Manaus 580 1,5
Cuiabá 430 3
Fortaleza 400 9,4
Natal 300 3,5
São Paulo * 450 33,4
Brasília 600 3,5
Belo Horizonte 650 1,5
Porto Alegre 130 5
Curitiba 138 4,5
do evento nunca muda, os atrasos e a falta de controle dos custos podem comprometer a
qualidade do evento em si.
Portanto, o planejamento da infraestrutura ajuda a garantir um evento de sucesso.
Ainda mais importante, ele fornece a base para um legado duradouro. Anfitriões que planejam
cuidadosamente seus eventos integrando-os aos planos existentes para os transportes e outras
infraestruturas se destacam daqueles que, sem tempo, acabam criando estruturas que só
atendem aos requisitos mínimos do evento. Por exemplo, acabam por construir uma estrada
que só serve para o acesso aos estádios, em vez de investir a mesma quantia de dinheiro em
projetos que também atendam às exigências do evento e de toda a sociedade, ao melhorar a
sua rede de transportes em geral.
Diante de tantos investimentos, tanto o poder público quanto o privado não tem
poupado esforços publicitários pregando a coesão social, deixando a percepção dos próprios
cidadãos de que não haveria futuro nem esperança para a cidade sem a implantação de
grandes projetos para os eventos esportivos. Sediar a copa significa “um salto de
modernização, de capacidade de organização, força econômica para captar investimentos e se
tornar um grande destino turístico” (PORTAL 2014, 2010). É a oportunidade de se mostrar
para o mundo.
No entanto a construção da infraestrutura para os megaeventos, proporciona suas
consequências. Dos estádios construídos para a Copa da Coréia do Sul em 2002 e África do
sul em 2010, a maior parte se transformou em verdadeiros “elefantes brancos”, pois são
subutilizados ou estão simplesmente abandonados demonstrando um verdadeiro desperdício
dos escassos recursos públicos.
Um bom exemplo de gastos exorbitantes e pouco investimento social foram o Pan no
Rio de Janeiro em 2007, pois os projetos iniciais projetavam um custo de infraestrutura em
torno de R$ 500 milhões de reais. O custo final chegou a R$ 3,7 bilhões de reais, sendo que
parte da estrutura criada está inutilizada ou precisando de novas adequações.
85
Futebol e eventos possuem uma estreita relação há mais de sete décadas, por
proporcionarem lazer e diversão para todas as pessoas de todas as faixas etárias. Diversos
países adoram o futebol e são movidos por paixões que movimentam milhões de dólares em
função desse esporte. A paixão gera o consumo de produtos e movimenta as pessoas na busca
pela realização dos seus desejos.
O turismo de eventos é um segmento que vem crescendo muito nos últimos anos por
ter a característica de utilizar os recursos e serviços de uma região, gerar empregos diretos e
indiretos, divulgar a localidade receptora e contribuir para o desenvolvimento do turismo em
âmbito local, regional nacional e internacional. Esses fatores são conhecidos como efeito
multiplicador do turismo, pois a atividade possui a capacidade de gerar impactos em todos os
setores da economia.
Durante o período de candidatura, os países/cidades procuram se destacar em relação
aos seus concorrentes, mostrando seus atrativos turísticos, tanto culturais como naturais, pois
acreditam que sediar esses megaeventos é a oportunidade de destacar e projetar sua imagem
internacionalmente. Atrair investimento é o principal objetivo, mesmo que para atingi-lo seja
necessário ignorar direitos sociais fundamentais, como, por exemplo, desapropriação da
população local, a fim de adequar os espaços para facilitar a mobilidade urbana.
Com a cidade de Cuiabá não foi diferente, uma vez que foi exortada como pontos
positivos da candidatura as diferentes manifestações culturais encontradas em Cuiabá e
cidades próximas, sua rica biodiversidade, sendo a localização geográfica privilegiada, pois se
situa no bioma do Cerrado, no limiar do bioma do Pantanal, sendo que o bioma do Pantanal o
principal cartão postal da candidatura de Cuiabá, foi preponderante, pois o governo brasileiro
queria a que a Copa do Mundo 2014 fosse para o Pantanal, sendo chamada de “Copa do
Pantanal”. Os atributos econômicos também foram exortados com os discursos de que Mato
Grosso tem tido um crescimento econômico acima da média nacional, estando entre os
principais produtores agrícolas do Brasil e um dos maiores exportadores dentre os estados
brasileiros, processo este denominado de agronegócio. Devido a essa pujança econômica,
Cuiabá teria condições de arcar com os custos oriundos das exigidas transformações impostas
pela organização do referido evento.
Com o discurso ambiental afinado, aliado a prosperidade econômica do Estado,
Cuiabá venceu a disputa regional com a cidade de Campo Grande, revivendo as rusgas
86
limites da “ordem”; e esse poder, nascido da sociedade, mas se colocando acima dela e,
progressivamente, alienando-se dela, é o Estado (ENGELS apud HARVEY, 2006, p. 80).
Percebe-se que ação do Estado não é neutra e diante de situações antagônicas se faz
necessário assumir posições e ao mesmo tempo evitar confrontos. É fato que os interesses
capitalistas são antagônicos a interesses sociais e os megaeventos esportivos podem servir
como justificativa para intervenções que contemplem prioritariamente a interesses do capital.
As obras públicas favorecem a dinâmica do mercado capitalista através do
planejamento urbano estratégico que, por sua vez, favorece os valores coletivos. Entretanto,
suprimem a coletividade da classe trabalhadora, cuja demanda é maior, em detrimento do
conjunto de bens coletivos destinados às classes dominantes, caracterizadas essencialmente
como abastadas. Ou seja, o Estado não só gerencia, mas germina a segregação espacial.
Logo após a confirmação de Cuiabá como sede, foi anunciada a criação da AGECOPA
(Agência Estadual de execução dos Projetos da Copa do Mundo), com o objetivo de criar e
acompanhar os projetos de mobilidade urbana para a Copa do Mundo de 2014 e
acompanhamento da criação das estruturas necessárias para a ocorrência do Megaevento. Essa
autarquia tinha ligação e intervenção direta com o governo estadual.
Neste caso, busca-se evitar a criação de “elefantes brancos” com dimensões monumentais e
custos de manutenção astronômicos. Pois o mundo comprovou a partir da observação de
edições pretéritas como Copa do Mundo da África do Sul em 2010, Olimpíada de Pequim
2008, Olimpíada de Atenas 2004 e, Copa do Mundo no Japão e Coréia do Sul em 2002, que
as obras mal planejadas e mal orçadas podem levar as cidades e os países sede dos
megaeventos em grandes dificuldades financeiras. Os mato-grossenses, assim como os
brasileiros, esperam os megaeventos com ansiedade, não só pelo acontecimento, mas
pretendem que as promessas de cidades melhores e mais organizadas sejam verdadeiras e
proporcionem um viver melhor para seus citadinos.
92
Para esta etapa do trabalho buscou-se os dados junto à Prefeitura de Cuiabá que tem
uma classificação de valor venal do terreno por metro quadrado para efeito de cobranças de
impostos, consideramos o valor até o período cobrado no ano de 2011. A busca dos dados
também ocorreu no cartório do sétimo ofício da cidade que é o responsável pelo registro dos
imóveis na área estudada, bem com dados relacionados à oferta de imóveis colhidos nos
classificados dos jornais de circulação regional como os jornais: A Gazeta, A Folha do Estado
e o Diário de Cuiabá no período compreendido entre os anos de 2008 a 2011. Foram feitas
três consultas mensais em cada um dos jornais, onde se buscou em dias aleatórios tais
informações. Cabe ressaltar que devido a gama de informações obtidas a partir das datas que
foram escolhidas, procurava-se eliminar os anúncios do mesmo imóvel que estava contido em
mais de um jornal no dia selecionado.
Os dados sobre os preços de imóveis têm algumas deficiências. Os registros sobre
compra e venda da cidade são realizados em cartórios, que não dispõem de uma infraestrutura
de informação para tornar esses dados publicáveis e disponíveis para trabalhos dessa natureza.
Além do mais, ainda existe a prática de declarar no cartório o preço a menor do que realmente
foi negociado, pois é a partir desse preço que se arbitram os impostos e taxas cobradas.
Contamos apenas com os dados da Prefeitura quando se trata de preço de metro quadrado por
logradouro e com os classificados de ofertas de vendas para registrar principalmente o valor
que se pretende por um imóvel, além de outras variáveis subjetivas.
Onde temos:
VVT = Valor venal do terreno
At = Area do terreno
Vm = Valor do metro quadrado por padrão de rua (tabela 11).
Fst = Fator de influencia da situação do terreno (tabela 12).
Fct = Fator das Características do terreno ( tabela 13)
Fmp = Fator de melhorias publicas (tabela 14).
Obs: Quando um imóvel possui duas frentes, ou seja, frente voltada para duas ruas,
considera-se o valor a partir do arruamento mais valorizado, que é o mesmo critério utilizado
pela prefeitura.
Fst - Fator de
influência da situação
do Terreno
Ordem Discriminação Índice
0 Uma ou duas frentes 1,00
1 Encracado 0,80
2 Vila 0,90
Dados: Prefeitura de Cuiabá – 2011
Fonte: Siqueira 2011
Organização: Siqueira 2012
Outra variante a ser considerada pelo valor do imóvel é o tipo de acabamento dos
edifícios, sendo necessária novamente uma pesquisa na prefeitura para que pudéssemos
conhecer o referencial utilizado pelo poder público. Diante disso, encontramos a tabela 12 e a
tabela 13 em relação aos imóveis residenciais e comerciais do município como um todo.
Tabela 13: Valor de metro quadrado em relação ao tipo de acabamento em imóveis não
residenciais
características físicas do terreno, como declividade, entre outros, considerando assim apenas o
“valor-localização”. Em pesquisa informal junto a sete imobiliárias que atuam nessa região,
esse valor corresponde em média a 70% do valor de mercado (imobiliário), ou seja, a
localização é o fator primordial para comercialização de um imóvel. Esse fator também é
utilizado para o cálculo do imposto urbano – o IPTU.
Desta forma, podemos utilizar os valores para efeito de comparação entre os
logradouros no período pertinente a esta análise. Ainda neste ponto, podemos compreender a
percepção do Poder Público quando se observa a valorização de determinada área em
comparação a outras.
Com uma nova pesquisa junto aos dados cadastrais da prefeitura de Cuiabá, buscamos,
para nossa análise, as ruas e avenidas mais valorizadas próximas ao estádio de futebol, pois a
partir delas já podemos verificar os dados que fundamentam este trabalho. A seguir listamos o
valor de cada uma das ruas e avenidas mais valorizadas do entorno que foram analisadas em
nosso trabalho. A localização exata dos pontos a seguir listados se encontra na figura 14 logo
abaixo:
- Rua Barão de Melgaço – padrão da rua é de R$ 200,00 (duzentos reais) o metro
quadrado. O trecho considerado está entre a Avenida Senador Metello a Avenida Miguel
Sutil.
- Rua Comandante Costa – padrão de rua é de R$ 150,00 ( cento e cinquenta reais) o
metro quadrado. O trecho considerado entre a Avenida Senador Metello a Avenida Oito de
Abril.
- Avenida São Sebastião – entre a Senador Metello e a Avenida Agrícola Paes de
Barros o padrão é de R$ 200,00 ( duzentos reais) o metro quadrado. Entre a Avenida Agrícola
Paes de Barros a rua jornalista Alves de Oliveira o padrão é de R$ 100,00 ( cem reais) o metro
quadrado.
- Avenida Senador Metello – entre a rua Barão de Melgaço a Avenida Oito de Abril o
padrão é de R$ 200,00 ( duzentos reais ) o metro quadrado. No perímetro entre a Oito de
Abril e a rua das Tulipas o valor altera para R$ 350,00 ( trezentos e cinquenta reais ) o metro
quadrado.
- Avenida Ipiranga – entre a Senador Metello a Avenida Agrícola Paes de Barros o
padrão é de R$ 170,00 ( cento e setenta reais ) o metro quadrado. Entre a Avenida Agrícola
Paes de Barros e a rua Jornalista Alves de Oliveira o valor é de R$ 140,00 ( cento e quarenta
reais ) o metro quadrado.
99
- Avenida doutor Agrícola Paes de Barros – entre a rua Barão de Melgaço e a Avenida
São Sebastião o valor é de R$ 270,00 ( duzentos e setenta reais ) o metro quadrado. E entre a
Avenida São Sebastião e a Avenida Miguel Sutil o valor é de R$ 450,00 ( quatrocentos e
cinquenta reais ) o metro quadrado.
- Avenida Oito de Abril – entre a rua Barão de Melgaço a Avenida Ipiranga o valor é
de R$ 150,00 ( cento e cinquenta reais ) o metro quadrado. E Entre a Avenida Ipiranga a
Avenida Senador Metello o valor de referência é de R$ 170,00 ( cento e setenta reais ) o
metro quadrado.
Mapa elaborado a partir dos dados cartográficos do SIG- Cuiabá com recursos técnicos do Argis
Fonte: Siqueira(2011)
Organização: Siqueira (2012)
Esses valores acima citados serviram de base para o cálculo do IPTU 2011 da
localidade. Cabe ressaltar que se buscarmos o valor de referência de 2009, que estão 30%
menores em média. No entanto, se considerarmos a inflação no período, o valor acumulado
100
entre 2009 a 2011, segundo o Banco Central – BACEN, é de 16,7%. O gráfico abaixo,
mostrado como figura 17, exemplifica bem tal situação.
Gráfico 03: Inflação e Valorização imobiliária no entorno do estádio entre 2009 a 2011
O argumento oficial para essa majoração no imposto foi a valorização natural da área
e afirma ainda que toda a cidade também sofreu tal valoração. Aprofundando um pouco mais
nossos estudos e comparando o valor lançado do IPTU das principais ruas que dão acesso a
nova Arena de Futebol, podemos observar áreas que foram valorizadas com mais de 70%,
chegando a um caso extremo de 83%, conforme pesquisa que fizemos junto aos moradores da
região. Estamos nos referindo a imóveis que não sofreram adequações no período, pois
existem edifícios que sofreram maiores valorações, no entanto são imóveis que foram muito
modificados, o que impossibilita tal comparação.
Quando se observam as áreas de expansão urbana da cidade de Cuiabá, compreende-se
melhor a estratégia de ocupação da cidade. A expansão horizontal de uma localidade urbana,
por seu sítio, quase sempre se deu em vetores – chamados também de vetores de expansão – e
que podem acumular em seu caminho diferenciações contidas também na divisão social da
cidade.
Assim no período de 2009 a 2011, foi possível observar uma significativa mudança
nas intenções do Poder Público de “adequar” o valor venal dos imóveis à demanda e às
101
intenções verificadas nos seus projetos, tanto no âmbito do capital imobiliário, quanto no
âmbito do Estado como agente produtor e transformador do espaço urbano.
Se, como já dissemos acima, o valor venal imposto pelo poder público para a região foi muito
acima da inflação, ao pesquisarmos os anúncios de jornais, ou pesquisando junto aos
moradores, ficamos ainda mais estarrecidos, pois imóveis residenciais com padrões populares
de construção, estão sendo ofertados a R$1.000,00 (mil reais) o metro quadrado. Em conversa
informal com os moradores dessa área, o argumento é unânime que a proximidade do estádio,
onde se realizará a Copa do Mundo de 2014, fez com que houvesse essa supervalorização.
Apenas para efeito de analogia, buscamos junto ao mercado imobiliário os valores do espaço
nos condomínios fechados mais valorizados da cidade, que são os condomínios Florais
Cuiabá e Alphaville. Nesses locais, o metro quadrado do espaço sem construção pode ser
encontrado a R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais), desprezando a taxa de condomínio cobrado
nesses empreendimentos. Consideramos o espaço nos condomínios sem construção, pois os
imóveis comercializados nas proximidades do estádio são demolidos para que sejam erguidos
novos empreendimentos com um padrão de construção muito mais elevado. Portanto se
considerarmos essa analogia podemos concluir que o espaço no entorno da Arena Pantanal
está mais valorizado que as áreas consideradas mais nobres da cidade.
valorização do espaço não pode ser explicada por si só, mas no contexto da produção da
cidade pelos instrumentos jurídicos e administrativos de regulação da sociedade urbana e que
servem ao processo de especulação imobiliária. “Esse raciocínio sugere ser preciso considerar
a reprodução da sociedade, em sua totalidade, realizando-se através da produção/reprodução
do espaço”. (CARLOS, 2011, p. 53).
O fator principal da valorização de terrenos e imóveis urbanos é dado por uma
conjuntura maior, mas pode-se dizer que o agente fundamental dessa transformação é o
Estado, que, investindo na produção da cidade, com recursos vultosos que deveriam estar
voltados para equalizar as desigualdades sociais, implicam sobremaneira na valorização
imobiliária das áreas onde atua. O Poder Público como veículo da “organização e
manutenção” da unidade urbana, em seu desempenho intervencionista, influi justamente numa
dialética desigual da produção do espaço. É o setor público que viabiliza as ações do setor
privado, e o que parecia estar nitidamente separado em duas esferas e que, na verdade, as
fazem caminhar juntas.
Por isso, o processo de produção do espaço urbano não se dissocia de seu processo de
super valorização. A propriedade da terra, inserida na lógica do mercado, passa a ser objeto de
troca e tem um preço que representa assim uma proporção da riqueza social criada. Mais
tarde, a supervalorização dos recursos naturais acaba por contribuir ainda mais com a
especulação do solo privado, transformando-se em mercadoria de alto valor financeiro.
Esses investimentos culminam em criar também as localizações, importante variável
para compreensão do valor imobiliário urbano. A partir dos valores de uso e troca são que os
lugares acabam se definindo pela classe dominante e o espaço ganha a condição de objeto
como espaço-mercadoria. Recorremos novamente a Carlos (2011, p. 61) para melhor
fundamentar nossas ideias:
A nós, ao contrário, cumpre entender que o mundo da mercadoria se
desenvolve sob novas formas (a reprodução do espaço como mercadoria),
produz uma contradição (que vai aparecer de forma definitiva e dramática na
prática socioespacial) entre valor de troca e valor de uso, como consequência
do movimento da história que transformou o espaço em mercadoria. Esse
movimento é necessário para compreender os novos conteúdos da produção
do espaço bem como os novos sujeitos que interferem em sua produção
Pode-se dizer que desde a construção do estádio de futebol na década de 1970 o agente
Estado teve um papel importante. Nesse período, coube aos incorporadores imobiliários a
especulação e os ganhos futuros com o investimento maciço do Estado.
No atual momento, em que se expectam um grande evento mundial e a visibilidade do
Estado de Mato Grosso de sua Capital Cuiabá deverão ser transmitidas para mais de dois
bilhões de habitantes da Terra, as ações do Estado e seus agentes tornam-se muito mais
visíveis.
O primeiro passo, a fase de projetos e candidatura para sediar os jogos, já foi superada.
Agora estamos na fase de operacionalização das estruturas a serem criadas e o reordenamento
do espaço urbano. O processo requer um “discurso competente” junto à população local de
que os transtornos são momentâneos para seus cidadãos, mas os benefícios serão para
“sempre” na cidade. Isso tem culminando com a grande valorização do espaço, condição que
agrega ainda mais valor à localização. Isso culminou por subjugar a terra urbana ainda mais
aos ditames das incorporações imobiliárias.
O crescimento populacional da grande Cuiabá, além do seu processo de
metropolização, induziu a cidade em uma expansão segregada e, consequentemente, à
necessidade do Estado em garantir e subsidiar essas transformações que se faziam e se fazem
necessárias no perímetro urbano.
Sob a “imperiosa” necessidade de progredir, reestruturar a cidade e prepará-la para o
Megaevento, os terrenos são vendidos a preço muito acima do valor de mercado.
Desta forma, a especulação pode ocorreu de forma plena e, aliada aos interesses do
Estado, garantiu a possibilidade de estruturar uma área com crescente valorização imobiliária,
principalmente nos últimos anos. Toda essa mudança ocorre em uma época que a cidade sofre
com graves problemas habitacionais, proporcionado uma corrida ao sonho da casa própria. É
uma época em que os proprietários e empreendedores imobiliários que adquiriram terrenos a
preço vil para a especulação futura têm conseguido, com a infraestrutura que está sendo
criada, agregar valor com o passar do tempo, possibilitando se construir um padrão de
habitação só conseguido com um investimento de grandes incorporadores. Ao mesmo tempo,
uma expressiva parcela da população local está se deslocando para outras áreas da cidade.
Como foi dito, a forma como as esferas pública e privada tornam-se híbridas e
convergem para o mesmo caminho está explicitado através da construção da “Arena
105
A tendência é que a “bolha imobiliária” cresça ainda mais, ante as características dos
novos empreendimentos que estão surgindo. Pois, dominantemente, surgem empreendimentos
comerciais em um bairro residencial, o que poderá proporcionar para o futuro uma nova
centralidade da cidade.
Casos, como os que foram registrados acima, geram o que chamamos de “segregação
urbana” - que significa desenvolvimento separado - imposto pelo Estado e capital imobiliário
e acaba por segregar mais e mais a sociedade, favorecendo a emergência de conflitos
imanentes à própria produção do espaço. A periferização é a consequência mais comum.
107
CONSIDERAÇÕES FINAIS
chama de “crítica radical do existente”. Só assim será possível fomentar a realização plena do
cidadão como homem-natureza.
A valorização do espaço pressupõe em sua evolução a ampliação crescente da mais-
valia. Isso porque a apropriação privada dos meios de produção implica na “privatização do
espaço”, um processo histórico onde porções da superfície da Terra e tudo que ela contém são
privatizadas (MORAES; COSTA 1999, p.159-160). As paisagens são únicas, dotadas de
universalidade e singularidade, permitindo uma valorização também singular e constante
quando avaliamos o espaço como objeto e mercadoria, a partir de seus atributos.
O marketing imobiliário termina por induzir setores da população a se deslocar para
áreas não ocupadas da cidade, forçando o Poder Público a investir na sua infraestrutura
básica. Cria e recria espaços, alterando a paisagem e incorporando-a à lógica capitalista,
agravando a crise da escassez artificial do solo.
No caso de Cuiabá, o déficit habitacional faz com que o imóvel seja produto ainda
mais valorizado. O espaço como bem finito é condição para existência e produção da vida.
Em oposição as suas limitações a população cresce e junto com ela vêm as necessidades de
abrigá-la para dar sustento às condições imanentes ao homem.
Somente o desenvolvimento tecnológico permite o acesso, a apropriação, o domínio e
a perenização da produção do espaço (MORAES; COSTA, 1999, p.178).
Mas, até o momento, a racionalização técnica do espaço tem sido utilizada em massa
para segregar, trazendo como consequência o antagonismo de classes, a agregação seletiva de
valor à terra, a criação das localizações, as apropriações e o consumo pelo capital. A
valorização imobiliária, da forma com que se realiza, termina por segregar ainda mais a
sociedade.
As soluções para evitar os efeitos nocivos da especulação imobiliária estão em
mudanças efetivas nas relações urbanas. Nesse sentido, uma ampla reforma urbana se faz
necessária. E os instrumentos para realizá-la estão contidos no Estatuto da Cidade
(lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001), que em seu corpo tenta promover a inclusão
territorial e social nas cidades do país.
O Estatuto contém as diretrizes gerais de uma política urbana, como o direito as
cidades sustentáveis, à gestão democrática, à ordenação e controle do uso do solo para evitar a
retenção especulativa do imóvel, além da regularização fundiária e a urbanização de áreas de
ocupação de baixa renda.
Especificamente com relação à valorização e à segregação provocada pelo “boom
imobiliário” da última década, existem instrumentos na legislação que asseguram a função
109
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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