A Zona Oeste Como
A Zona Oeste Como
A Zona Oeste Como
Social
ISSN: 1983-5922
ISSN: 2178-2792
[email protected]
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Brasil
Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.
Resumo:
Este artigo pretende construir uma entrada metodológica aos estudos urbanos sobre a Zona Oeste do Rio de Janeiro. Ele parte
da centralidade que as categorias de tranquilidade e progresso assumem na sociabilidade urbana local. Explorando seus múltiplos
sentidos, procuramos traçar diferenciações e aproximações com outras temporalidades e espacialidades que atravessam o Rio de
Janeiro. Revisitamos então a produção acadêmica sobre a região e organizamos dois grandes campos de discussão: um sobre política
e violência; e outro sobre produção da cidade. Por fim, propomos uma questão de pesquisa: a análise da Zona Oeste como uma
fronteira urbana.
Palavras-chave: Zona Oeste, fronteira urbana, temporalidades, espacialidades, sociabilidade urbana.
Abstract:
e West Zone of Rio de Janeiro, Frontier of Urban Studies? intends to build a methodological approach for socio-
anthropological studies about the West Zone of Rio de Janeiro. e paper departs from two native categories framing the urban
sociability in the West Zone: tranquility and progress. Exploring their multiple social meanings, the authors trace the differences
and convergences with other temporalities and spacialities found in Rio de Janeiro. In this sense, the paper revisits the scholarship
dedicated to understanding urban dynamics in the West Zone and organize them in two main research fields: one over politics
and violence; and the other over the production of the city. Finally, we propose a research question: the analysis of the West Zone
as an urban frontier.
Keywords: West Zone, urban frontier, temporalities, spacialities, urban sociability.
Este artigo é um esforço a quatro mãos de propor uma agenda de pesquisa sobre a Zona Oeste do Rio de
Janeiro. Como não há consenso sobre a extensão exata de cada zona da cidade, optamos aqui por um recorte
que condiz tanto com o senso comum quanto com a prática administrativa: o território formado pela Área
de Planejamento 4 (AP 4), que abrange as regiões administrativas (RA) de Jacarepaguá, Cidade de Deus e
Barra da Tijuca, e pela AP 5, equivalente às RA de Realengo, Bangu, Campo Grande, Guaratiba e Santa
Cruz (Figura 1). Com uma população de aproximadamente 2,6 milhões de moradores – correspondente a
41% do total da população carioca – espalhada por 40 bairros, que representam 70% da área territorial do
município, será que a Zona Oeste do Rio de Janeiro tem recebido da academia atenção proporcional ao seu
peso demográfico e geográfico[1]? Sem pretender fazer uma revisão bibliográfica exaustiva da literatura sobre
a região, destacamos neste texto algumas questões que sobressaem nas pesquisas já realizadas nas muitas zonas
oestes do Rio de Janeiro e apontamos para outras ainda pouco exploradas[2].
FIGURA
As divisões administrativas da cidade do Rio de Janeiro (2012)
Instituto Pereira Passos (IPP)
A percepção do potencial da categoria “Zona Oeste” veio da reflexão conjunta sobre dinâmicas, atores
e questões que sobressaíam em nossas pesquisas. Marcella Araujo começou a trabalhar na região em 2012,
como integrante da equipe social do Escritório Corcovado, um dos vencedores do concurso do Morar
Carioca – um programa de urbanização de favelas realizado por uma parceria entre a Prefeitura do Rio e o
Instituto de Arquitetos do Brasil. Por seis meses, Marcella trabalhou no Agrupamento 26, um conjunto de
oito comunidades no bairro de Curicica. Se de início a pesquisa era aplicada, logo uma série de achados se
transformou em projeto acadêmico. As migrações intra e intermunicipal, além de interestadual, para a região
de Curicica, nos anos imediatamente anteriores à Copa do Mundo 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016,
renderam uma primeira investigação sobre mercados imobiliários e mercados de trabalho ( CAVALCANTI,
ARAUJO e MEDEIROS, no prelo).
Em seguida, a autora realizou um ano de trabalho de campo no conjunto habitacional Cesar Maia, em
Vargem Pequena, o único construído pelo programa de urbanização Favela-Bairro, que resultou em sua
tese de doutorado ( ARAUJO, 2017a). Fez ainda uma quarta pesquisa como integrante de uma equipe
responsável por diagnosticar os impactos das obras da Via Transolímpica ao longo do seu trajeto, que vai de
Deodoro à Barra da Tijuca. Com Paulo Magalhães e Samantha Gifalli, a autora descreveu as redes sociais e
os circuitos políticos e econômicos que articulam diversas comunidades vizinhas da via aos seus entornos,
mostrando como o traçado operou cortes nas dinâmicas urbanas dessas localidades. Atualmente, Marcella
coordena, ao lado de Julia O’Donnell, o projeto “Para Ver a Barra de Outro Ângulo: Um projeto de pesquisa
sobre mercados imobiliários, mercados de serviços e sociabilidades na Barra Olímpica”, que conta com
financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). O projeto pretende
analisar as vidas sociais de apartamentos de três condomínios da região do Autódromo de Jacarepaguá –
um de luxo, um de classe média e outro de baixa renda –, desde a aquisição no mercado imobiliário até a
construção de estilos de vida.
Oriundo da antropologia, omas Cortado, depois de pesquisar a favela do Vidigal, na zona sul do Rio,
fez dois anos de trabalho de campo no Jardim Maravilha, o maior “loteamento irregular” da cidade, situado
no bairro de Guaratiba. Em comparação com as favelas, chamou atenção do autor a ausência de estudos
Antes ausentes das discussões sobre violência no Rio de Janeiro, vistas até mesmo como uma solução ao
problema da violência por certos políticos e comentaristas, as milícias ganharam destaque em 2008, com
o sequestro de uma equipe de jornalistas na favela do Batan, em Realengo. O episódio levou à abertura de
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), presidida pelo então deputado estadual Marcelo Freixo. O
trabalho da CPI não só revelou o tamanho desses grupos, como apontou suas ramificações no Estado, levando
ao indiciamento de 225 políticos, policiais, agentes penitenciários, bombeiros e civis[3]. Dois políticos
muito influentes na Zona Oeste acabaram presos: o vereador Jerônimo Guimarães Filho, o Jerominho, e
o ex-deputado estadual Natalino José Guimarães, irmão do vereador, ambos com base eleitoral em Campo
Grande. A comissão suspeitava que Natalino, ex-policial civil, chefiava a maior milícia do Rio, a Liga da
Justiça, com sede na Zona Oeste.
A partir da CPI, a milícia se tornou parte do imaginário da e sobre a Zona Oeste. Hoje, a imprensa estima
que mais de 2 milhões de pessoas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro vivem sob o domínio de grupos
milicianos, sem que se saiba ao certo quantos são e como eles se articulam. Em bairros inteiros da Zona Oeste,
eles cobrariam taxas de segurança, categoria nativa para os valores extorquidos, e organizariam a venda de
gás, internet e TV a cabo pirata, estando ainda envolvidos na venda de terrenos e na construção de prédios
(GRANDIN et al., 14/03/2018).
Importantes sociólogos da criminalidade e da violência urbana têm produzido reflexões sobre o
surgimento, as dinâmicas e as singularidades dos grupos milicianos, em comparação com outros grupos
incrimináveis, especialmente o tráfico de drogas ( DUARTE, 2019). Antes mesmo de o debate público sobre
as milícias emergir com força, Ignácio Cano e sua equipe analisaram as ligações feitas ao Disque Denúncia e
matérias de jornal, bem como entrevistaram moradores da Zona Oeste fora dos seus locais de moradia ( CANO
e IOOT, 2008) – pesquisar as milícias é um exercício perigoso, que traz inúmeros problemas metodológicos
e éticos, sobre os quais ainda precisamos nos debruçar. Os autores interpretaram a relação entre milícias e
moradores como uma relação de “extorsão”, já que as primeiras cobram taxas de segurança dos segundos por
meio do constrangimento e do uso direto da força.
Logo após a criação da CPI, Cano e Duarte (2012) deram continuidade ao estudo, procurando
compreender os efeitos da repressão estatal sobre a evolução do fenômeno. Em particular, analisaram o
discurso de legitimação das milícias como protetora dos moradores das áreas, levantando um importante
desafio para as ciências sociais: entender as justificações de práticas incrimináveis. Já Alexandre Werneck
aproveitou o material da CPI para percorrer o caminho inverso: como o miliciano havia se tornado uma figura
“incriminada”. Entre as figuras do “matador”, que executa seus inimigos e promove uma “limpeza social”, do
“policial corrupto”, que cobra arrego para fazer vista grossa a atos ilícitos, e do “traficante”, que está no centro
das políticas de segurança pública das últimas quatro décadas, o “miliciano” emergiria como uma mistura das
três, um verdadeiro “ornitorrinco da criminalidade” (WERNECK, 2016).
Procurando entender como os moradores que vivem em áreas de milícia chegam a justificar as práticas de
extorsão, os dois autores do presente artigo se depararam com a categoria de tranquilidade. Nas análises de
ambos, a tranquilidade expressa a ausência de certa violência, não de toda ela. Segundo Araujo (2017b, 2019),
para esses moradores, “estar longe da violência” significa viver longe do tráfico, o que só é possível graças às
taxas de segurança usadas para financiar a milícia, que assume então um caráter de mal menor. Para Cortado
(2018a), a tranquilidade remete à ausência da violência que irrompe no cotidiano, dos assaltos e dos tiroteios
que matam indistintamente. Os moradores não percebem a morte de quem fez coisas erradas como violenta
– essa seria a morte de quem estava devendo.
A tranquilidade nos parece uma categoria com forte potencial heurístico, se considerarmos ainda sua
potência cognitiva e sua recorrência em contextos muitos diferentes de violência. Aqui vale recuperar o
trabalho de Lia Rocha (2008) em uma favela tranquila: neste caso, a tranquilidade não remete à ausência
do ou à distância em relação ao tráfico de drogas, mas à inexistência da guerra. Deslocando o olhar para
um condomínio de classe média na Zona Oeste, Jussara Freire (2014), por sua vez, sugere que nos enclaves
fortificados também emerge uma “ordem da tranquilidade”, baseada em fronteiras sociais e físicas com os
espaços considerados violentos. Paz e tranquilidade, ao que os referidos trabalhos indicam, são categorias
nativas que remetem a experiências diferentes da violência e da segurança na cidade.
Quais são os padrões de interação social e as culturas urbanas construídas dentro dos muros, grades e
aparatos de segurança nos tantos condomínios fechados, loteamentos e conjuntos habitacionais da Zona
Oeste? Por quais formas de controle social essas sociabilidades são mantidas? Podemos falar em modos de
dominação política, centrados em certos valores compartilhados, que orientam as condutas dos moradores?
Seria a tranquilidade um desses valores? Os trabalhos de Simone Gomes (2020) e Marcella Araujo (2017a)
parecem indicar que sim. Associações de moradores se formam com o intuito de manter certa distribuição
do poder, calcada em uma ideologia do medo de ter medo ( ARAUJO, 2017b), que justifica o uso ostensivo
da força. Entretanto, precisamos entender melhor como o senso de continuidade da vida cotidiana nas
localidades tranquilas do Rio se relaciona com os modos pelos quais as milícias e outros atores do mercado
de segurança exercem seu poder.
Há outro campo de pesquisa promissor para a análise do fenômeno miliciano: a economia política do
crime, particularmente a participação das polícias nessa economia. De mediadora de práticas criminais,
José Claudio Alves (2008) mostrou como as polícias ganharam expertise suficiente sobre as dinâmicas dos
mercados ilícitos e passaram a atuar como atores criminais, por meio da venda de segurança. Esse, que é seu
serviço distintivo, é analisado por Michel Misse (2011) como nova “mercadoria política”. A privatização da
segurança pública e sua valoração monetária por parte daqueles que a deveriam prover como direito teriam
criado um mercado centrado nas extorsões. Continuando essa análise, Araujo (2017b) diferencia os modos
de provisão de segurança por parte de traficantes, empresas de segurança privada e milicianos, destacando
as justificações morais para o uso da força em áreas de milícia. A partir de uma entrevista realizada com um
miliciano, a autora relaciona o mercado de segurança (e suas múltiplas formas de adesão, que vão da extorsão
à crença na legitimidade da cobrança pelo serviço) com outros mercados, especialmente o imobiliário. Este,
segundo Araujo, atuaria como um fator de consolidação e expansão da dominação exercida pelas milícias. A
tragédia recente na Muzema (uma localidade que fica no bairro de Itanhangá, RA de Jacarepaguá), com o
desabamento de dois prédios residenciais construídos clandestinamente, chamou atenção para a sofisticação
e diversificação das operações econômicas conduzidas pela milícia, baseadas em montagens que ignoram as
fronteiras entre o legal e o ilegal. De modo geral, acreditamos que essa ambivalência das milícias constitui
um objeto privilegiado para pensar os novos “arranjos” do direito, da economia e da política contemporânea
(SASSEN, 2006).
Outros pesquisadores vêm analisando o problema da violência urbana a partir da implementação de
políticas de segurança. As dissertações de Ariley Dias (2016) e Tássia Mendonça (2014) investigam os
desdobramentos da “pacificação” na única área de milícia visada pelo programa das Unidades de Polícia
Pacificadora (UPPs). Esse fato nos sugere uma pergunta: até que ponto podemos considerar a expansão do
mercado legal e ilegal de segurança uma política de segurança? Acreditamos que o uso frequente do singular
para falar do fenômeno miliciano – a milícia – oculta variações na atuação dos grupos milicianos e suas
aproximações com o mercado legal da segurança privada. Em particular, precisamos saber se entre a favela, o
conjunto habitacional e o loteamento periférico há variações significativas, correlacionadas às características
urbanísticas do local e à sua história política. Também, até que ponto e de que forma os condomínios de classes
médias e altas estão sendo afetados pelo fenômeno miliciano? Quais são as diferenças entre empresas privadas
e grupos milicianos? Pesquisas sobre o mercado privado de segurança em São Paulo indicam a participação
massiva de policiais militares como donos e pessoal de empresas privadas ( CUBAS, 2002; ZANETIC, 2005).
Como, na Zona Oeste, empresas que fazem a segurança de condomínios fechados e milicianos estabelecem
fronteiras? Como ambos os atores negociam e se ajustam ao trabalho da polícia militar? Fronteira dos estudos
sobre segurança e violência, a Zona Oeste se revela um lugar estratégico para pensar as relações entre violência,
mercado e democracia (ARIAS e GOLDSTEIN, 2010).
Justamente nessa perspectiva, Alba Zaluar e Isabel Conceição (2007) inscreveram o exercício do poder
pelas milícias, que “vendem segurança”, na continuidade das práticas às quais recorriam (e ainda recorrem) os
grupos de extermínio na cidade do Rio e na Baixada Fluminense. Os assassinatos por encomenda, praticados,
há décadas, por polícias mineiras, ganhariam em amplidão e consolidação: disseminada por territórios cada
vez mais extensos, essa prática teria adentrado o Poder Legislativo da cidade, em um movimento que, na
visão das autoras, aproximaria as milícias às máfias italiana e americana. Contudo, a chave da continuidade
com os grupos de extermínio não é a única possível. De modo geral, precisamos entender melhor as relações
de continuidade e ruptura que existem entre milícias e outras categorias de agentes violentos, como os
“matadores”, os “justiceiros” e os “grileiros”, que atuaram de forma violenta por muitos anos na Zona Oeste
(PECHMAN, 1988; SANTOS, 2013).
Há que se destacar ainda as imbricações entre política local e milícias, exemplificadas pela família de
Jerominho, um assunto que as mídias documentam constantemente, mas que a antropologia e a sociologia
pouco conseguiram pesquisar até o momento: como e com qual grau de sucesso as milícias interferem na
vida política local? Como se dão as relações entre lideranças tradicionais e milicianos? Qual é o impacto das
milícias sobre o associativismo popular e a participação política? O artigo de Simone Gomes (2020) que
compõe este dossiê explora sociabilidades militantes em diversas localidades da Zona Oeste e destaca a cultura
como alternativa. Mais do que em outras disciplinas, a sociologia e a antropologia ganharão por trabalhar
conjuntamente com a história social, resgatando também a tradição dos estudos sobre “movimentos sociais
urbanos” (JACOBI, 1987).
De modo geral, a Zona Oeste possui uma vida política intensa. Sabemos que, quando ainda se chamava
Zona Rural, tinha a fama de ser um reduto de práticas clientelistas no Rio de Janeiro, seja nos tempos
da Velha República ou do chaguismo (LOPES, 2007). A partir dos anos 1970, com a mobilização dos
moradores, a situação mudou: lideranças populares chegaram a ocupar cargos na política, como Jô Antônio
Rezende, presidente da Federação de Associações de Moradores do Estado do Rio de Janeiro (Famerj) entre
1980 e 1984, vice-prefeito de Saturnino Braga entre 1985 e 1988 e prefeito entre 1988 e 1989. De fato,
a Famerj se tornou o palco do associativismo popular na Zona Oeste por vários anos, até decair no final
dos anos 1980. Confundia-se então com o Movimento de Loteamentos, grupos de moradores da região que
buscavam resolver a situação dos loteamentos irregulares no Rio de Janeiro (LAGO, 1990). Porém, desde
os anos 1990, carecemos de pesquisas sobre associativismo popular urbano na Zona Oeste, salvo algumas
exceções, que apontam para a complexidade das mediações políticas e dos conflitos internos (OLIVEIRA,
2004; SIQUEIRA, 2013; CORTADO, 2018a). Os votos que os candidatos da nova direita, como o atual
presidente Jair Bolsonaro e o governador Wilson Witzel, conseguiram nas últimas eleições, nesse antigo
reduto do chaguismo, chamam atenção para uma possível reconfiguração da política na Zona Oeste[4]. De
modo geral, temos aqui um campo fértil para os estudos sociais da política, em particular do “populismo” de
direita, assunto hoje muito discutido na literatura internacional (MAZZARELA, 2019).
Por fim, há uma última categoria de atores na vida dos moradores da Zona Oeste que merece maiores
investigações: as igrejas. Enquanto houve nos últimos anos um crescimento significativo de pesquisas sobre
a presença das igrejas nas favelas, principalmente das evangélicas (BIRMAN e MACHADO, 2012; VITAL
DA CUNHA, 2014), muito pouco se sabe sobre o universo religioso da Zona Oeste, a não ser pelas
estatísticas do Censo. Estas apontam a AP de Santa Cruz (AP 5.2) como a que tem a maior proporção
de evangélicos no município (36,9%), sendo inclusive a única AP onde essa proporção supera a população
católica (36,7%). Em seguida, vem a AP 5.2 de Campo Grande (36,4%) e, em quarto e quinto lugar, as AP
5.1 e 5.4 de Bangu e Guaratiba (30%).
Por outro lado, temos a AP 4.2 da Barra da Tijuca, com a segunda maior proporção de católicos na cidade
(62,1%). Sobre a presença católica na Zona Oeste, sabe-se que ela é considerada estratégica pela própria
Igreja (GONZALES e MARIZ, 2017), que escolheu inicialmente o bairro de Guaratiba para sediar a Jornada
Mundial da Juventude em 2013. Campo Grande e Guaratiba, a despeito da influência evangélica, concentram
vários centros da Renovação Carismática. Como interpretar essa configuração do universo religioso na Zona
Oeste? Quais são as estratégias específicas das igrejas para a região? Como os atores religiosos interagem
com os outros atores que já mencionamos: milícias, associações de moradores, militantes e políticos? Seria
o processo de urbanização responsável pela presença evangélica mais marcante na Zona Oeste, conforme
acreditavam os teóricos clássicos do avanço neopentecostal na América Latina (MARIANO, 2011)? Isso nos
leva ao segundo eixo da nossa agenda: a temática da expansão urbana.
Quando se fala da Zona Oeste, se está lidando com a área do Rio de Janeiro que mais cresceu nos últimos
anos. Enquanto entre 2000 e 2010 a população da cidade aumentou 7,9%, a da Zona Oeste cresceu 16,8%,
respondendo por mais de 80% do crescimento total do Rio. A RA da Barra foi aquela cuja população
mais aumentou (+72,5%), sendo o bairro de Vargem Pequena o que mais cresceu (+136%). Faltam,
porém, pesquisas sobre migrações. O exemplo do Jardim Maravilha, onde as áreas favelizadas ou sujeitas a
alagamentos estão sendo ocupadas em muitos casos por migrantes oriundos da Bahia e do Maranhão, nos
faz pensar que esse fenômeno migratório tem sua importância nas sociabilidades locais e na produção do
espaço. Outro ponto importante diz respeito ao lugar da Zona Oeste nas migrações internas ao Rio de Janeiro.
O survey realizado por Mariana Cavalcanti, Marcella Araujo e Jimmy Medeiros (no prelo) indica que na
região de Curicica muitos moradores recentes das favelas são oriundos de bairros da Zona Norte. Entre os
interlocutores de Cortado no Jardim Maravilha, muitos tinham fugido da violência, ou seja, se mudaram
para o Jardim Maravilha com o intuito de escapar da presença do tráfico ou da frequência dos assaltos
(CORTADO, 2018a). Essas duas pesquisas convergem no sentido de fazer da busca pela tranquilidade um
importante fator de push-pull.
Ao mesmo tempo, a Zona Oeste sofre de sérias carências em matéria de equipamentos urbanos (Tabela
1). Em 2008, possuía um terço das bibliotecas e dos centros culturas que a Zona Sul tinha, mesmo com
uma população quatro vezes maior. Em Guaratiba, somente 51,3% dos domicílios tinham acesso à rede
geral de esgoto em 2010, contra 93,5% no conjunto da cidade. À falta de infraestrutura se somam graves
problemas socioambientais: em março de 2019, o Jardim Maravilha virou notícia nacional, após uma série
de chuvas que deixou o loteamento alagado. Esse quadro aproxima a Zona Oeste daquilo que Torres (2004)
chamou de “fronteira urbana”, território caracterizado pelo crescimento demográfico acelerado, pela falta de
infraestrutura, por conflitos fundiários e problemas socioambientais (TORRES, 2004).
TABELA 1
Crescimento populacional e falta de equipamentos coletivos na Zona Oeste
Elaborada pelos autores.
A expansão urbana da Zona Oeste é um campo já bem documentado. Quando ainda se chamava Zona
Rural, a Zona Oeste foi objeto de um livro escrito por Armando Magalhães Corrêa, funcionário do Museu
Nacional, sugestivamente intitulado O sertão carioca (1936), centrado na Baixada de Jacarepaguá. A expressão
vingou e, por muitos anos, a imprensa se referiu à Zona Oeste como o “sertão” do Rio, um espaço ainda
dominado por formidáveis ecossistemas, onde só viveriam pequenos camponeses.
Já nos anos 1970, em uma conjuntura local e nacional marcada pelo fortalecimento das associações
de moradores e pela consequente publicização da questão dos loteamentos, a Zona Oeste se tornou
objeto de estudos urbanos, por parte dos autores interessados no fenômeno das periferias. Destacam-
se em particular as contribuições de Carlos Nelson Ferreira dos Santos, que tratou a Zona Oeste, ao
lado da Baixada Fluminense, como “periferia intermediária”, e a Baixada de Jacarepaguá como “periferia
imediata” (SANTOS, 1977, 1980). O perfil da Zona Oeste se aproximava então da periferia paulista
(MARICATO, 1979; KOWARICK, 1979), com seus loteamentos abertos em áreas agrícolas, sua falta de
infraestrutura e suas casas autoconstruídas.
Contudo, o tema da “periferia” no caso do Rio de Janeiro nunca despertou tanto interesse como em
São Paulo – aqui as pesquisas concentraram-se nas favelas (VALLADARES e FREIRE-MEDEIROS,
2002). Estudos conduzidos por pesquisadores do Instituto de Pesquisas e Planejamento Urbano (Ippur) da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) revisitaram esse tema nos anos 1990 e 2000, apontando para
o surgimento de novos atores no mercado imobiliário das periferias, como as incorporadoras responsáveis
pelo lançamento de condomínios fechados em Campo Grande (BRITTO, 1990; MACEDO, 2002). Outros
estudaram a favelização da Zona Oeste a partir dos anos 1980 e como ela alterou o clássico modelo
centro-periferia (FARIA, 2004). Congruente com o diagnóstico feito por Lago, há vinte anos, de um
enfraquecimento da distinção entre favela e loteamento (LAGO, 2003), a pesquisa de Dias (2020) mostra
como hoje as lutas pela posse atravessam tanto as áreas favelizadas quanto as áreas loteadas. Por um lado,
assistimos na Zona Oeste ao surgimento de “favelas” mais ou menos planejadas; por outro, novos ilegalismos
ganharam espaço nos loteamentos. Seja no caso destes, dos condomínios fechados ou das favelas recém-
criadas, temos na Zona Oeste um campo muito rico para pensar a construção dos mercados imobiliários
na cidade, tema que interessa em particular aos estudos sociais da economia. Lembremos que Ferreira dos
Santos (1980) já mencionava a necessidade de prestar mais atenção, no caso dos loteamentos periféricos, às
complexas mediações mercadológicas, desde os adquirentes de lotes até as grandes firmas loteadoras, passando
por agentes políticos e estatais – e, no contexto atual, paraestatais.
A regularização de loteamentos é outro objeto de uma importância crucial para a região, tendo recebido
atenção de alguns juristas e urbanistas (ANDRADE, 1998; BUENO, 2004; VERÍSSIMO, 2005). Ao lado
das favelas, existem outros dois tipos de “assentamentos precários” reconhecidos legalmente pelo poder
municipal desde o início dos anos 1990: os conjuntos habitacionais degradados e os “loteamentos irregulares”.
Chamam-se “loteamentos irregulares” aqueles “legalmente aprovados e não executados, ou executados em
discordância com o projeto aprovado” (art. 243 da lei complementar nº 111, de 1º de fevereiro de 2011). O
Jardim Maravilha, por exemplo, resultou de um projeto de loteamento aprovado pela Prefeitura do Rio em
1951, mas que nunca foi implantado: a sociedade anônima responsável pelo loteamento se limitou a vender
os lotes, sem jamais realizar qualquer obra de infraestrutura. Como a lei sobre o parcelamento do solo não
previa multa nesse caso, e como a própria Prefeitura se exonerava de qualquer responsabilidade quanto à
urbanização dos loteamentos, esses passavam anos abandonados. Só quando os moradores começaram a se
mobilizar nos anos 1970, a prefeitura começou a se encarregar de urbanizar os loteamentos.
Ainda hoje, estima-se que mais de 600.000 pessoas (10% da população) no Rio moram em mais de
800 loteamentos irregulares ou parcialmente regularizados, como é o caso do Jardim Maravilha, sendo a
maioria localizada na Zona Oeste da cidade (Figura 2). Conforme mostrou Cortado (2018a), os loteamentos
irregulares oferecem um campo muito rico para estudar as relações entre a lei urbana, o governo das
populações e a produção do espaço, de modo a desconstruir a ideia de “informalidade urbana”: a situação
dos loteamentos irregulares aponta para uma verdadeira “produção legal da ilegalidade” (BUENO, 2004),
para a própria responsabilidade da lei no surgimento da ilegalidade urbana. Vale destacar que o fenômeno
dos loteamentos irregulares não se reduz aos de baixa renda: existem loteamentos irregulares voltado para um
público de alto poder aquisitivo (SOUZA, 1995).
Essas montagens complexas, que envolvem mudanças ou manipulações da lei, intervenções do governo
e construções do mercado imobiliário, não se encontram apenas nos loteamentos. Assim, a criação do
Plano de Estruturação Urbana (PEU) das Vargens, em 2009, alterou regras de ocupação do solo e de
construções de edifícios na Baixada de Jacarepaguá, transformando significativamente a paisagem da região
(NAME e CARDEMAN, 2014). Mais recentemente, novas mudanças na legislação urbanística procuraram
viabilizar a expansão imobiliária na região do Autódromo de Jacarepaguá. Segundo a Associação dos
Dirigentes do Mercado Imobiliário, a Zona Oeste, especialmente a região de Curicica, foi responsável pela
ampliação do estoque de imóveis da cidade, entre 2009 e 2013 (SAMPAIO, 2014). Essas novas dinâmicas
acompanharam a construção de equipamentos para as Olimpíadas de 2016, como o Parque Olímpico, a
Vila dos Atletas (vendida no mercado imobiliário como Ilha Pura) e a Vila da Mídia, que fez proliferar
os pontos de tensão entre aqueles que já residiam na Região do Autódromo, no Camorim e em Curicica
e os novos empreendimentos imobiliários e equipamentos urbanos. Como amplamente noticiado, para
que essa expansão e especulação imobiliária tivessem espaço, comunidades da região foram ameaçadas de
remoção, entre as quais a Vila Autódromo, cuja resistência se tornou caso paradigmático das lutas urbanas
contemporâneas no Rio de Janeiro (FAULHABER e AZEVEDO, 2017).
FIGURA 2
Loteamentos irregulares ou clandestinos no Rio de Janeiro (2004)
Instituto Pereira Passos (IPP)
De fato, a Zona Oeste se impõe como um lócus de conflitos urbanos no Rio de Janeiro, devido às operações
de renovação urbana e às disputas fundiárias. Obras urbanas tão diversas como a produção de condomínios
populares pelo programa Minha Casa Minha Vida e a abertura de três longas vias (Transoeste, Transolímpica
e Transcarioca) conectando diferentes pontos da Zona Oeste entre si e à Zona Norte da cidade tiveram
como efeito a eclosão de inúmeras tensões sociais. Samantha Gifalli (2015) estudou os desdobramentos da
complexa combinação de políticas – PAC Favelas, Minha Casa Minha Vida, Morar Carioca e Transolímpica
– sobre o território da Colônia Juliano Moreira, hospital psiquiátrico criado em meados do século XX que
virou bairro. Os trabalhos de Alexandre Magalhães (2019) e de Frank Davies (2018) se debruçaram sobre
os conflitos gerados, respectivamente, pela construção da Via Transoeste em uma comunidade no Recreio
dos Bandeirantes e pela abertura da Via Transolímpica em Magalhães Bastos. Se o primeiro autor discutiu
a “lógica da intervenção” e as práticas de remoção, o segundo prestou particular atenção às estratégias e
gramáticas, entre as quais se destacaram as religiosas, mobilizadas pelos moradores nos seus “encontros com
o Estado” ( DAVIES, 2017).
As disputas fundiárias são antigas na Zona Oeste, mas se intensificaram nos anos 1930, quando lavradores
e pescadores que atuavam na região se depararam com as intervenções às vezes violentas dos proprietários e
dos grileiros que queriam lotear suas terras (FRIDMAN, 1999; SANTOS, 2007, 2013). Pechman chamou
atenção, nos anos 1980, para a complexidade da estrutura fundiária na Zona Oeste, tanto do lado da Barra
da Tijuca quanto de Campo Grande, e para os conflitos entre posseiros e donos da terra (PECHMAN,
1988). O artigo de Julia O’Donnell, Lilian Sampaio e Mariana Cavalcanti (2020) sobre a Barra da Tijuca,
publicado neste dossiê, sugere que os grandes empreiteiros se aproveitaram da confusão fundiária prevalente
nos primórdios da ocupação para tomar conta de imensos terrenos. Quanto aos loteamentos, ainda faltam
pesquisas sobre as ocupações clandestinas de lotes que se multiplicaram nos anos 1980, levando justamente
à sua favelização. Como se dão as relações entre os moradores que compraram seus lotes e os invasores
ou posseiros, para retomar categorias locais? O que isso diz sobre o significado que as pessoas atribuem à
propriedade? Como se dão os processos de regularização fundiária na Zona Oeste? Temos aqui mais um
campo muito rico, desta vez para uma sociologia e uma antropologia das “relações de propriedade” (HANN,
1998).
Acreditamos que essa reflexão sobre a “política” da urbanização tem muito a ganhar com uma aproximação
com o campo hoje muito dinâmico dos estudos sobre infraestruturas (LARKIN, 2013), ainda pouco
discutido no Brasil. Os artigos de Nikhil Anand ou de Stephen Graham sobre o abastecimento de água
nas favelas de Mumbai (ANAND, 2011; GRAHAM, DESAI e MCFARLANE, 2013), por exemplo,
apresentam muitos pontos em comum e algumas diferenças notáveis com aquilo que observamos na Zona
Oeste, onde as materialidades que compõem o cotidiano na cidade também são objetos recorrentes de
mobilizações e disputas. Assim como em Johanesburgo (SIMONE, 2004), os problemas de infraestruturas
na Zona Oeste têm a capacidade de produzir novos coletivos, à semelhança dos vizinhos que se juntam para
aterrar uma rua, construir um quebra-molas e consertar a rede elétrica. Assim como no caso de Managuá, os
moradores da Zona Oeste muitas vezes se tornam vítimas de uma “violência infraestrutural” (RODGERS,
2012), de uma violência que passa pela abertura de novas vias, como a Transolímpica, ou pelo péssimo estado
de alguns equipamentos indispensáveis à vida cotidiana, como os ônibus, as pistas e as estações que compõem
o famigerado sistema BRT da Transoeste. Essa reflexão sobre a “política” da urbanização dialoga com a
questão da segurança: o caso da Muzema, por exemplo, revelou que a milícia não apenas pratica extorsão, mas
urbaniza, produz o espaço urbano – caso que também tem muito em comum com formas de “urbanização
mafiosa” observadas em outros lugares no mundo (DINES, 2012).
Ao lado dessa “política” da urbanização, temos também uma “poética da urbanização”, para retomar
a dupla dimensão dos estudos das infraestruturas, sugerida por Larkin (2013): obras de urbanização
apresentam qualidades estéticas que induzem determinados discursos entre os moradores. Em particular, o
progresso como categoria existencial permite compreender a percepção que os moradores têm da urbanização.
Tanto no trabalho de Araujo (2017a, 2017b) como no de Cortado (2018a, 2020), o progresso encerra uma
perspectiva de melhoria de vida por parte dos moradores. Para Araujo (2017a), o progresso se relaciona com
a possibilidade de ter acesso à casa pelo mercado imobiliário e construir planos de futuro, longe da violência.
Para Cortado (2018a, 2020), o progresso relaciona-se à transformação de uma forma de vida próxima da roça
em outra, mais próxima da cidade.
Assim, o progresso não deixa de encerrar um conflito com a vida no mato ou na roça, outras duas categorias
nativas que permitem apreender a percepção peculiar do espaço na Zona Oeste. Analisando os conflitos
urbanos a partir de quilombolas e sitiantes do Parque Estadual da Pedra Branca, Luz Stella Cáceres (2019)
identificou a recuperação do imaginário do “sertão carioca” como ferramenta de luta política. Como mostra
Stella, no livro de Magalhães Corrêa o autor dialoga com Os sertões de Euclides da Cunha, mas, ao contrário
deste, positiva as representações sertanejas. Ainda entendido como espaço da autenticidade, o sertão de
Magalhães Corrêa apresenta uma fauna e flora deslumbrante e uma vida social e cultural prolífera. É
esse discurso em defesa de uma forma de vida particular, roceira, próxima da natureza e longe da cidade,
que é retomado por alguns moradores da Zona Oeste quando enfrentam as transformações ameaçadoras
do progresso. Também no caso do Jardim Maravilha, Cortado observou que os moradores associavam
a “distância” em relação ao restante da cidade e o “inacabamento” da urbanização com a tranquilidade,
entendida como proximidade desejada com a natureza e com o estilo de vida na roça (CORTADO, 2018a).
Por exemplo, na época em que só havia algumas casas no loteamento, “todo mundo conhecia todo mundo”,
uma característica considerada típica da vida na roça. Existe, portanto, uma tensão no modo como as pessoas
apreendem o mundo, entre a valorização do progresso e o medo de perder a tranquilidade.
A roça, porém, não existe apenas no plano das categorias. Com base no trabalho de Souza (1992), Cortado
(2018a) mostrou como os moradores do loteamento, muitos oriundos do interior do Rio de Janeiro ou
de outros estados, reatualizavam uma memória camponesa nas suas práticas espaciais, cultivando legumes,
criando animais, usando as ruas como pasto, construindo equipamentos semelhantes aos que tinham na roça.
Segundo Cortado, o loteamento não se opõe frontalmente ao mundo rural, ele pode muito bem servir de
suporte para a reprodução de um estilo de vida roceiro, daí a ideia de uma “ruralização da urbanização” nesses
loteamentos. Ainda existem inúmeros sítios, pequenos produtores ou comunidades de pescadores na Zona
Oeste. Como eles percebem a cidade? Como escoam seus produtos? Quais são suas relações com os outros
moradores da Zona Oeste? Como estão sendo afetados pela expansão urbana? De fato, acreditamos que a
Zona Oeste possibilita repensar as relações entre o rural e o urbano, um caso que exige superar as fronteiras
entre estudos urbanos e estudos rurais.
Voltando ao progresso, não poderíamos deixar de mencionar o quão essa ideia está intrinsecamente
atrelada à Barra da Tijuca: a suas formas arquitetônicas, urbanísticas e aos estilos de vida de seus
moradores. Não é fortuito que a pluralidade de transformações legislativas, urbanísticas, econômicas e
políticas que vêm se sobrepondo na região do Autódromo procure transformar Curicica e Camorim em
“Barra Olímpica” (O'DONNEL, SAMPAIO e CAVALCANTI, 2020). Como Balthazar (2020) procura
demonstrar em seu artigo neste dossiê, a Barra da Tijuca nasce, nas matérias jornalísticas, como a antítese
de Copacabana. Se este bairro havia sido o vetor da expansão urbana da cidade, nos anos 1920, encerrando
uma construção identitária e um estilo de vida praiano (O’DONNELL, 2013), quatro décadas mais tarde
ele já se tornara um sinônimo do caos urbano (VELHO, 2002). Alternativa ao excesso de gente, ao trânsito
barulhento e às calçadas tumultuadas de pedestres e ambulantes, a Barra da Tijuca surge como a nova fronteira
urbana do Rio nos anos 1970: o lugar do novo, onde o moderno encontra a natureza do sertão carioca. Foi
nada menos que o Plano de Urbanização da Barra da Tijuca e Baixada de Jacarepaguá, proposto por Lucio
Costa (1969), que colocou o modernismo brasileiro no coração do crescimento da cidade em direção à Zona
Oeste. A funcionalidade da arquitetura modernista e sua divisão racional do espaço foi apropriada por parte
de atores do mercado imobiliário para a criação de uma cidade nova. Como mostra Paterman (2020) em seu
artigo neste dossiê, para a produção de uma paisagem moderna, a natureza do sertão foi domada e encenada
pela racionalidade técnica dos arquitetos.
Sem a pretensão de esgotar as categorias que dão sentido à vida nas várias localidades da Zona Oeste,
tranquilidade e progresso apontam para uma sociabilidade particular, que atravessa loteamentos, favelas,
conjuntos habitacionais e condomínios fechados, e para experiências socialmente construídas do tempo e do
espaço. Sobretudo, a potência analítica dessas categorias permite pensar conjuntamente localidades que se
constroem por oposição, como a Barra da Tijuca e os loteamentos que cresceram nas suas franjas, as favelas
e os conjuntos habitacionais. Assim, temos uma porta de entrada etnográfica para uma série de conflitos que
atravessam a cidade do Rio de Janeiro. Como categorias relacionais que os encerram, sugerimos então refletir
sobre a Zona Oeste enquanto “fronteira” urbana, no duplo sentido do termo, tal como destacado por Feltran
(2011): uma divisão e uma forma de regulação de fluxos. Como demarcações de limites, as fronteiras operam
separações entre pessoas, territórios e formas de vida e, para tanto, operam mediações. As fronteiras são zonas
de conflito, em que a comunicação é tensa e as posições (separadas) só existem em diálogo umas com as outras.
Explorando essa particularidade das fronteiras que conectam para separar, encontramos uma pluralidade de
conflitos – entre formas urbanas, entre estilos de vida, entre grupos políticos, entre atividades econômicas –,
cuja análise permite compreender padrões de sociabilidade urbana e modos de produzir a cidade.
A segunda dimensão que associamos à noção de fronteira vem dos estudos rurais. A “fronteira” agrícola
brasileira foi o objeto de inúmeras pesquisas nos anos 1970 e 1980, destacando-se, entre muitos outros, o
trabalho de José de Souza Martins (1972, 1996). O autor sugeriu distinguir entre a “frente de expansão”, que
“corresponde ao processo histórico mais geral em que, pelo contato interétnico, a sociedade se expande”, e
a “frente pioneira”, onde o capitalismo “perde seu caráter “exterior” e passa a permear as relações sociais e a
cultura” (MARTINS, 1972, p. 112). A essas duas frentes estariam associados, segundo o sociólogo rural, dois
tempos históricos diferentes: um determinado pela racionalidade econômica e pelas instituições formais da
sociedade, outro impregnado por valores sociais, crenças e imaginários de cunho místico ( Idem, 1996). O
que caracteriza, afinal de contas, uma “situação de fronteira”, segundo Martins, é o conflito, mas um conflito
que não se restringe a um enfrentamento entre grupos diferentes, remetendo também ao “desencontro de
temporalidades históricas, pois cada um desses grupos está situado diversamente no tempo da História” (
Ibid., p. 27). Sem entrar no mérito da tese de Martins, o que nos interessa aqui é sua caracterização da
fronteira como o espaço das temporalidades divergentes, sendo que essas divergências se expressam tanto na
organização do espaço como na percepção das pessoas.
Conflitos de temporalidades históricas, no caso da Zona Oeste, se manifestam de duas formas. Em primeiro
lugar, naquilo que Cortado, no contexto dos loteamentos, chamou de “urbanização diferida”: a dissonância
entre as temporalidades do acesso ao solo urbano e às infraestruturas urbanas (CORTADO, 2018a). Entre
o tempo das pessoas que vêm morar nos loteamentos periféricos e o tempo de sua integração às redes de
infraestruturas que definem a cidade, há uma discrepância sistemática. Inicialmente, não têm acesso a luz ou
água encanada. Estas chegam, mas faltam creches e postos de saúde. Chegam a creche e o posto de saúde, mas
como ocupam os terrenos onde os moradores costumavam se divertir, faltam praças. A pressão da água, boa no
início, começa a diminuir devido ao aumento da população, que deve voltar às soluções de antigamente, como
o poço. Há uma tensão sistemática aqui, que faz com que as pessoas estejam sempre vivendo na esperança de
alguma nova melhoria. A contribuição de Dias neste dossiê aponta para a centralidade das expectativas no
modo como os moradores da Zona Oeste percebem o lugar onde moram. Se as categorias de roça e progresso
são tão importantes no discurso desses moradores, é justamente porque eles sempre se projetam em um tempo
que ainda não é o deles, o tempo da “cidade que está chegando”. O contraste entre a tranquilidade e o progresso
também é um contraste entre duas temporalidades, a da roça, a da cidade.
Essas divergências de temporalidade se manifestam também nas múltiplas utopias das quais a Zona Oeste
se tornou o palco. O trabalho de Balthazar (neste dossiê) deixa clara a importância do pioneirismo nas
narrativas publicitárias sobre a Barra da Tijuca, presente em expressões como “chegar primeiro”, “futuro”
ou “progresso”. A Barra da Tijuca pintava então uma nova utopia urbana, bucólica e ordeira. Já para os
arquitetos e urbanistas, a Barra da Tijuca representava uma utopia modernista em uma cidade “caótica”. Os
arquitetos estudados por Rachel Paterman (neste dossiê) já parecem considerar a Zona Oeste como ponto de
partida de uma nova utopia paisagística, que opõe uma Zona Oeste autêntica, ainda pouco povoada, refúgio
do imaginário sertanejo, à Zona Oeste americanizada que a Barra da Tijuca exemplifica. Esses são apenas
exemplos mais contemporâneos. A pesquisa de Gifalli (2015) sobre a Colônia Juliano Moreira mostra, por
meio de seu hospital psiquiátrico, uma Zona Oeste como utopia sanitarista. Antes de se tornar um dos mais
populosos do Rio de Janeiro, o bairro de Bangu, com sua fábrica e suas vilas operárias, indicou no início do
século XX uma verdadeira utopia proletária, que deixou várias marcas na paisagem, como seu famoso Estádio
Proletário Guilherme da Silveira (BRITO, 2012). Como muitas utopias, estas nem sempre se realizam como
se esperava. A contribuição de O’Donnell, Sampaio e Cavalcanti (neste dossiê) aponta para uma utopia
olímpica malsucedida, a do condomínio Ilha Pura, que, em vez de estimular a ocupação, deixou apenas uma
paisagem de ruínas (Figura 3.1, Figura 3.2).
FIGURA 3.1
As ruinas da Zona Oeste: Jardim Maravilha
Cortado (2013)
FIGURA 3.2
As ruinas da Zona Oeste: Ilha Pura
Cavalcanti (2017)
Propomos então que pensar a Zona Oeste como fronteira permite abarcar o cotidiano, os projetos e as
imaginações, as formas, as localidades e suas identidades, bem como os estilos de vida, as culturas urbanas,
o controle social e a dominação. Sem tomar de antemão limites geográficos, bairros e formas de moradia
como pontos de partida, adentrar as muitas zonas oestes por suas fronteiras e como fronteira talvez seja o
caminho mais potente analiticamente. Esse é certamente aquele que vimos empregando e esperamos que sirva
de estratégia a outras pesquisas.
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Notas
[1] Os dados demográficos são do Censo de 2010 e os dados sobre áreas territoriais do Instituto Pereira Passos (IPP).
[2] Tanto no discurso acadêmico como nas representações coletivas, é comum opor uma “Zona Oeste dos ricos”,
representada pela região da Barra da Tijuca, à “Zona Oeste dos pobres”, que leva em consideração as outras. Sem querer
negar as enormes diferenças existentes entre a Barra da Tijuca e o resto da Zona Oeste, o presente artigo pretende oferecer
um quadro de trabalho comum aos estudos que tratam das duas “zonas Oeste”.
[3] O relatório está disponível on-line, no site do deputado Freixo. Disponível on-line em: https://www.marcelofreixo.co
m.br/cpi-das-milicias
[4] Foi na Zona Oeste que Bolsonaro conseguiu, de longe, o maior número de votos no segundo turno da eleição
de 2018: 1.060.873, ou seja, 72,1% do eleitorado da Zona Oeste. Em comparação, conseguiu 55,6% dos votos
da Zona Sul e 64,5% dos votos da Zona Norte. Foi na região de Campo Grande que Bolsonaro teve a vitória
mais esmagadora, com 75% dos votos. São, portanto, diferenças bastante significativas, que transparecem também
quando selecionamos bairros com perfis socioeconômicos parecidos. Enquanto Bolsonaro recebeu 73,5% dos votos
na região da Barra da Tijuca, obteve “apenas” 51,7% na região de Botafogo. Esses dados foram obtidos agregando os
resultados das eleições para presidente por zonas eleitorais. Os resultados e os mapas eleitorais estão disponíveis on-line
em: https://www1.folha.uol.com.br/poder/eleicoes/2018/veja-o-mapa-de-apuracao-de-todas-as-cidades-do-brasil/#/c
argo/presidente/local/rio-de-janeiro/turno/2/mapa/zona-eleitoral/municipio/rio-de-janeiro/3304557/zona/192