3a. TEXTO 2 - Aula 1

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OUTRAS FERRAMENTAS DE ABORDAGEM FAMILIAR

Diego Alexandre Rozendo da Silva1

As ferramentas de abordagem familiar devem ter por finalidade a representação gráfica da


estrutura familiar,tal como vimos no capítulo anterior ao aprendermos sobre o Genograma e sua
aplicação. Neste capítulo, iremos enfocar em instrumentos igualmente úteis à abordagem
diagnóstica, sendo aplicadas segundo as necessidades apresentadas pelas famílias, são eles:
ECOMAPA; F.I.R.O. (Fundamental Interpersonal Relations Orientations/ Orientações
Fundamentais nas Relações Interpessoais); P.R.A.C.T.I.C.E - (Problem, Roles, Affect,
Communication, Time, Illness, Copying, Ecology/ Problema, Papéis, Afeto, Comunicação,
Tempo, Doença, Lida, Ecologia); e A.P.G.A.R Familiar (Adaptation, Partnership, Growth,
Affection, Resolve/Adaptação, Participação, Crescimento, Afeição, Resolução).

ECOMAPA

Ecomapa é, por definição, arepresentação gráfica das ligações de uma família às estruturas
sociais no meioem que os seus integrantes habitam. Tal ferramenta representará a força das
ligações existentes, bem como o impacto destas ligações e a qualidade das ligações. Este
instrumento foi desenvolvido em 1975 por Ann Hartman para ajudar as Assistentes Sociais
do serviço público dos EUA no seu trabalho com famílias “problema” (HOLMAN, 1983).

Segundo Agostinho (2007), o Ecomapa, tal como o Genograma, faz partedos instrumentos de
avaliação familiar, mas, enquanto o Genograma identificaas relações e ligações dentro do
sistema multigeracional da família, o Ecomapa identifica as relações e ligações da famíliacom
o meio onde habita.

Segundo Barbosa (2012), Rocha, Nascimento e Lima (2006, p.5) propõem, com base nos
estudos de Pillitteri, que o ecomapa consiste:

[...] num diagrama das relações entre a família e a


comunidade e ajuda a avaliar os apoios e suportes
disponíveise sua utilização pela família. Uma família que

1
Doutor em Ciências Médicas – Área de Concentração: Saúde Mental, pela Universidade Estadual de Campinas
– UNICAMP; e Mestre em Psicologia – Área de Concentração: Psicologia da Saúde, pela Universidade Católica
Dom Bosco – UCDB
tem poucas conexões com a comunidade e entre seus
membros necessita maior investimento [...] para melhorar seu
bem-estar [...]

Segundo as autoras, a representaçãográfica do diagrama é feita por meio de círculos: um maior,


ao centro contendoos membros da família e suas idades. Noentorno estão dispostos outros
círculos, representando diversas organizações e instituições existentes e com as quais se
pressupõe que a família se relacione. A relação, ausência dela ou relação precáriada família com
essas organizações e instituições é indicada por meio delinhas: contínuas representam laços
fortes, pontilhadas representam laços frágeis e em barras representam relaçõesconflituosas ou
estressantes, setas indicamenergia e fluxo de recursos, ausência de linhas significa ausência de
conexão (BARBOSA, 2012).

As organizações ou instituições sociais podem ser: vizinhança, igreja, unidades de saúde, escola,
trabalho, conselho tutelar, grupos cívicos, amigos entre outros. Tal comopodemos evidenciar na
Figura 1.

Figura 1: Exemplo de Ecomapa


Fonte: Rocha, Nascimento e Lima (2006,
p.6)
Semelhante às conexões existentes no genograma, na elaboração do
Ecomapa. as relações são simbolizadas através das seguintes linhas, que
representam:

Vínculo extremamente forte

Vínculo forte

Fluxo de energia (bilateral)

Fluxo de energia (unilateral)

Relação Conflituosa

Ausência de Relação

F.I.R.O. (Fundamental Interpersonal Relations Orientations)2

O modelo F.I.R.O destina-se a compreender melhor o funcionamento das relações


familiares. Estas relações podem ser categorizadas em três dimensões (QUADRO
1), e constituem numa sequência lógica de prioridades para o tratamento e
desenvolvimentode mudanças na família.

2
Orientações Fundamentais nas Relações Interpessoais
Permite conhecer a dinâmica de relacionamento na família, como ela se organiza para
enfrentar as situações de estresse, o papel de cada membro e como são as interações
Inclusão e participação de cada um dos membros da família. Vamos voltar nossa reflexão para
nossa própria família − como nos organizamos ao enfrentar um problema, quem
apoia, quem se afasta, como nos comunicamos?
Mostra como é exercido o poder na família. Ele pode ser: dominante − um exerce o
poder sobre toda a família; reativo − ocorre reação contrária a alguém que deseja
Controle
exercer o papel de dominância; colaborativo – compartilhamento de poder entre os
membros da família.

Intimidade Como os membros da família se unem para compartilhar entre si os sentimentos.

Nesta medida, procura-se avaliar os sentimentos dos membros da família, na


vivênciadas relações do cotidiano.

Esta ferramenta deve ser utilizada, segundo Ditterich, Gabardo e Moysés


(2009):

Quando as interações Quando a família sofre


na família podem ser mudanças importantes ou
categorizadas nas ritos de passagem, tais como
dimensões inclusão, controle

família pode ser estudada padrões de inclusão, controle


quanto às suas relações de e intimidade ser estudada
poder, comunicação e afeto. quanto às suas relações de
poder, comunicação e afeto.

Quando a inclusão, o Quando as três


controle e a intimidade dimensões anteriores
constituem uma sequência constituem uma sequência
inerente ao desenvolvimento lógica de prioridades para
para o manejo de mudanças
controle e intimidade.

Essa ferramenta é útil quando, por qualquer motivo, houver mudança de


papéis na família. Por exemplo: quando o chefe da família perde seu
emprego e passa a ser sustentado pela esposa, deverá haver negociação dos
papéis de cada membro da família.Se tal fato não se verificar, pode gerar
sentimentos de inutilidade em um membro e sobrecarga de outro, levando
a algum tipo de disfunção na família ou até mesmo a umproblema orgânico
em qualquer membro dessa família (CHAPADEIRO, 2011).

P.R.A.C.T.I.C.E (Problem, Roles, Affect, Communication, Time,


Illness, Copying,Ecology)3

Segundo Chapadeiro (2011), o P.R.A.C.T.I.C.E (Quadro 2) é um instrumento


que permite a avaliação do funcionamento das famílias. Esse instrumento
facilita a coleta deinformações e entendimento do problema, seja ele de
ordem clínica, comportamental ou relacional, assim como a elaboração de
avaliação e construção de intervenção, comdados colhidos com a família,
facilitando o desenvolvimento da avaliação familiar.

Esta ferramenta que pode auxiliar na atenção ao indivíduo e sua família e


deve ser utilizado em situações mais complexas para resolver algum
problema que a famíliaapresenta. Deve ser aplicado em reuniões familiares,
sendo que o profissional tem que ter a clareza de que só uma entrevista
familiar será insuficiente para se construir com a família soluções para
resolução do problema apresentado.

ABREVIAÇÕES INGLÊS (Original) PORTUGUÊS (Tradução)


P Presenting problem Problema apresentado
R Roles and structure Papéis e estrutura
A Affect Afeto
C Communication Comunicação
T Time in life cycle Tempo no ciclo de vida
I Illness in Family Doenças na Família
C Coping with stress Enfrentando o estresse
E Ecology Ecologia
Quadro 2. P.R.A.C.T.I.C.E

3
Problema, Papéis, Afeto, Comunicação, Tempo, Doença, Lida, Ecologia
Esse modelo facilita o desenvolvimento da “avaliação familiar”, fornecendo
as informações sobre que intervenções podem ser utilizadas para manejar
aquele caso específico. Ele pode ser usado para itens da ordem médica,
comportamental e de relacionamentos (Walters, 1996).

O esquema P.R.A.C.T.I.C.E. foi desenvolvido para o manejo das situações


mais difíceis. É focado na resolução de problemas, o que permite uma
aproximação com várias interfaces que criam problemas para as famílias
analisadas. Deve ser aplicado sob a forma de uma conferência familiar e a
abordagem pode se dar em diversas aproximações(Moysés e Silveira Filho,
2002):

P - Problema apresentado (Problem)


Este momento auxilia o profissional a compreender o significado daquele
problema,muitas vezes o motivo da queixa, da autopercepção e da busca de
atendimento por parteda família. Permite compreender como aquela família
vê e enfrenta o problema (MOYSÉS& SILVEIRA FILHO, 2002).
Nem todas as informações podem ser obtidas nos primeiros minutos, mas
enunciaros problemas em algum ponto e observar como a família reage é
parte importante daentrevista. O clínico tem de evitar proteger e expor uma
“vítima” da família e tem de tertato, ser neutro e enfático com os membros da
família (WILSON et al., 1996).

R - Papéis e estrutura (Roles and structure)


O momento aprofunda aspectos do desempenho dos papéis de cada um dos
membros e como eles evoluem a partir dos seus posicionamentos (MOYSÉS
& SILVEIRAFILHO, 2002).

A - Afeto (Affect)
O momento reconhece como se estabelecem as demonstrações de afeto
entre osfamiliares e como essa troca afetiva pode interferir, positivamente
ou negativamente, no problema apresentado (MOYSÉS &SILVEIRA FILHO,
2002).
C - Comunicação (Communication)
O momento ajuda a observar como se dá a comunicação verbal e não verbal
dentro da família (MOYSÉS & SILVEIRA FILHO, 2002).

T - Tempo no ciclo de vida (Time in life)


O momento correlaciona o problemacom as tarefas esperadas dentro do
ciclo de vida a serem desempenhadas pelos membros daquela família,
tentando verificar onde pode estar situada a dificuldade (MOYSÉS &
SILVEIRA FILHO, 2002).

I - Doenças na família, passadas epresentes (Illness in family)


O momento resgata a morbidade familiar, valoriza as atitudes e os cuidados
frente às situações vividas e trabalha coma perspectiva de longitudinalidade
do cuidado, contando com o suporte familiar (MOYSÉS & SILVEIRA FILHO,
2002).

C - Lidando com o estresse (enfrentamento) (Coping with stress)


O momento parte das experiências descritas, buscando identificar fontes
de recursos internos à própria família,que possam ser mobilizados para o
enfrentamento do problema atual (MOYSÉS & SILVEIRA FILHO 2002).
Como a família lidou com as crises no passado? Como lida com a crise
presente?

Quão compreensivos e coesos eles foram esão agora? Quais são as forças e os
recursosda família? O papel do profissional é identificar as forças, explorar
alternativasde enfrentamento, se requeridas, e intervir se a crise estiver fora
do controle (WILSON et al., 1996).

E - Meio ambiente ou Ecologia (Environment or Ecology)


O momento identifica o tipo de sustentação familiar e como podem ser
mobilizados todos os recursos disponíveis para manejar o problema em
questão. Issoincluem as redes sociais e de vizinhança,bem como questões
mais estruturais, como coesão social e determinantes sociaisno trabalho, na
renda, no saneamento, naescolaridade dentre outros (MOYSÉS &SILVEIRA
FILHO, 2002).

O profissional pode ajudar a família explorando os recursos familiares


estendidos, suporte religioso, questõeslegais, recursos de saúde da família
e fatores culturais (WILSON et al., 1996).

Muitas das informações necessárias para essa ferramenta podem ser


extrapoladas de uma discussão geral coma família sobre a percepção do
problema presente. Sugere-se que entre uma e três linhas sejam
necessárias para cada um dos oito setores do modelo. Deve ser notado que
nem todas as áreas cobertas pelo P.R.A.C.T.I.C.E. serão necessariamente
vistas em uma intervenção específica (WALTERS, 1996).

A.P.G.A.R Familiar (Adaptation, Partnership, Growth, Affection,


Resolve)4

Tal como descrito por Rocha, Nascimento e Lima (2002), o APGAR da família
é um instrumento de avaliação destinado a refletir a satisfação de cada
membro, e os diferentes escores devem ser comparados para se avaliar o
estado funcional da família. O acrônimo APGAR. proveniente da língua
Inglesa, é de Adaptação (Adaptation), Participação (Partneship),
Crescimento (Growth), Afeição (Affection) e Resolução (Resolve).

A avaliação pode ser feita para cada membro da família, por questionário
decinco perguntas (Quadro 3) referentes aos aspectos abordados, que serão
pontuadas eanalisadas depois. Os diferentes índices de cada membro devem
ser comparados para seavaliar o estado funcional da família.
A partir da aplicação do questionário e da avaliação do quadro familiar,

4
Adaptação, Participação, Crescimento, Afeição, Resolução
pode-se desenhar um plano terapêutico que poderá ser desenvolvido pelo
próprio terapeuta defamília.

Quadro 3. Questionário APGAR Familiar


Quase
CONDIÇÃO ou ASPECTO As Vezes Raramente
Sempre
Estou satisfeito com a atenção que recebo da minha família
quando algo está me incomodando.
Estou satisfeito com a maneira com que minha família discute
as questões de interesse comum e compartilha comigo a
resolução de problemas.
Sinto que minha família aceita meus desejos de iniciar novas
atividades ou de realizar mudanças em meu estilo de vida.
Estou satisfeito com a maneira com que minha família expressa
afeição e reage em relação aos meus sentimentos de raiva,
tristeza e amor.
Estou satisfeito com a maneira com que eu e minha família
passamos o tempo juntos.

Fonte: Rocha, Nascimento e Lima (2006) (Baseado em Smilkstein)

O paciente assinala uma das três escolhas, as quais têm a seguinte


pontuação:
2 pontos para “Quase sempre”,
1 ponto para “Às vezes”, e,
0 para “Raramente”.
Os pontos para cada uma das cinco questões são totalizados.

O resultado de 7 a 10 sugere uma família altamente funcional (não precisa


de intervenção). O resultado de 4 a 6 sugere uma família moderadamente
disfuncional. O resultado de 0 a 3 sugere uma família severamente
disfuncional (intervenção específicade psicoterapeutas familiares).

O que é medido?
- Adaptação: Como os recursos são compartilhados ou qual o grau de
satisfação do membro familiar com a atenção recebida, quando recursos
familiares são necessários.
- Participação: Como as decisões são compartilhadas ou qual a satisfação do
membro da família com a reciprocidade da comunicação familiar e na
resolução de problemas.
- Crescimento: Como a promoção do crescimento é compartilhada ou qual
a satisfação do membro da família com a liberdade disponível no ambiente
familiar, para a mudançade papéis e para a concretização do crescimento
emocional ou amadurecimento.
- Afeição: Como as experiências emocionais são compartilhadas ou qual a
satisfação do membro da família com a intimidade e interação emocional no
contexto familiar.
- Resolução: Como o tempo é compartilhado ou qual a satisfação do
membro familiar com o compromisso que tem sido estabelecido pelos
seus próprios membros. Além de repartirem seu tempo, familiares
geralmente estabelecem um compromisso no compartilhamento de espaço
e dinheiro (ROCHA, NASCIMENTO & LIMA, 2002).

INSTRUMENTO ESPECIFICAÇÕES
A.P.G.A.R. Familiar: instrumento
de avaliação destinado a refletir
Adaptation (Adaptação)
a satisfação de cada membro da
Partneship (Participação)
família. A partir de um questionário
Growth (Crescimento)
pré-determinado, as famílias são
Affection (Afeição)
classificadas como funcionais,
Resolve (Resolução
e moderadamente/gravemente
disfuncionais.
Presenting problem (problema apresentado)
P.R.A.C.T.I.C.E.: funciona como
Roles and structure (papéis e estrutura)
uma diretriz para avaliação do
Affect (afeto)
funcionamento das famílias. O
Comunication (comunicação)
instrumento é focado no problema,
Time of life cycle (fase do ciclo de vida)
o que permite uma aproximação
Ilness in family (doença na família)
esquematizada para trabalhar com
Coping with stress (enfrentamento do estresse)
famílias
Ecology (meio ambiente, rede de apoio)
INCLUSÃO
CONTROLE INTIMIDADE
F.I.R.O.: sigla de Fundamental (interação,
(poder) (amor, afeto)
Interpersonal Relations Orientation associação)
ou, em português, Orientações
Ser aceito,
Fundamentais nas Relações DEMANDA Ser guiado Ser querido
convidado
Interpessoais, sendo categorizado
como uma teoria de necessidades Interesse, busca Ligação,
OFERECE Liderança
da aceitação Aproximação
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CHAPADEIRO, Cibele Alves. A família como foco da atenção primária em


saúde / Ci- bele Alves Chapadeiro, Helga Yuri Silva Okano Andrade e Maria
Rizoneide Negreiros deAraújo. --Belo Horizonte: Nescon/UFMG, 2011.

HOLMAN AM. Family assessement: tools for understanding and


intervention. BeverlyHills, California: Sage Publications; 1983.

MOYSÉS, S. J.; SILVEIRA FILHO, A. D. Os dizeres da boca em Curitiba: boca


maldita, bo- queirão, bocas saudáveis. Rio de Janeiro: CEBES, 2002. p. 155-
60.

ROCHA, Semiramis Melani Melo; NASCIMENTO, Lucila Castanheira; LIMA,


Regina Apa- recida Garcia de. Enfermagem pediátrica e abordagem da
família: subsídios para o ensino de graduação. Rev. Latino-Am.
Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 10, n. 5, p. 709- 714, Oct. 2002. Available
from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttex- t&pid=S0104-
11692002000500013&lng=en&nrm=iso>.

WALTERS, I. P.R.A.C.T.I.C.E.: Ferramenta de acesso à família. In: WILSON, L.


Trabalhando com famílias: livro de trabalho para residentes. Curitiba: SMS,
1996. p. 46-7.

WILSON, L.; BADER, E. Ciclo de vida da família. In: WILSON, L. Trabalhando


com famílias: livro de trabalho para residentes. Curitiba: SMS, 1996. p. 38-9.

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