Responsabilidade Dos Administradores Sociedades
Responsabilidade Dos Administradores Sociedades
Responsabilidade Dos Administradores Sociedades
PUC/SP
SÃO PAULO
MARIA CLARA MAUDONNET
PUC/SP
SÃO PAULO
2006
2
Banca Examinadora
3
Resumo
4
administradores tem sido objeto de abuso, por parte do Poder Público, envolvendo-
se os administradores em demandas, visando à cobrança de tributos devidos pelas
empresas, em evidente equívoco, dado que a falta de capacidade pagadora da
empresa independe da boa gestão, muitas das vezes.
Palavras chave: 1. responsabilidade, 2. ato ilícito, 3. culpa, 4.
administrador, 5. diretor, 6. membro do conselho de administração.
5
Abstract
The subject matter of this work is the civil liability of managers of joint stock
companies (sociedades anônimas) according to the Brazilian laws. In order to broach
the theme, the author has first examined the unlawful act, which corresponds to
perform a committed or omissive act with intent, which violates the right and gives
rise to the responsibility of the agent to remedy the damage caused. One must never
forget the causation connection between the act performed and the damage caused,
which has given rise to the civil liability of the agent to remedy it. The liability may
come from an unlawful act performed with intent (strict liability) or from the risk
assumed by the entrepreneur, in his economic exploitation, represented by the
company’s capacity to allocate losses caused to those who benefit from the practice
of their duties (absolute liability). In general, the rule is the individual and absolute
liability of managers of joint stock companies (authorized officers and directors), and
the joint and absolute liability are the exception. Authorized officers represent the
company and their acts are performed individually and not collectively, such as
resolutions adopted by members of the Board of Directors. The managers’ duties, set
forth in the joint stock companies law, correspond to the duty of due diligence; to act
according to the social function of the company and to the dictates of public interest;
loyalty; to refrain from acting in case of conflict of interest and information. The
violation of such duties is considered an unlawful act by the managers, giving rise to
their personal liability towards the joint stock companies. The same treatment applies
to limited liability companies. The company assumes responsibility for the unlawful
acts performed by the defaulting manager, who has done harm to third parties, due to
the fact that the manager acts on its behalf, representing the company before third
parties. In this case, the company reserves the right to seek compensation from
losses caused by said manager, through the filing of a civil liability action against
such manager. The shareholders damaged by such manager are also entitled to file
an action against the defaulting manager. Civil liability is presented largely, not only
for its recovery function, but also for its preventive, educational and punitive function,
according to the Brazilian laws. Nevertheless, the managers’ civil liability has been
the object of abuse by the Government, causing the managers to be involved in
6
lawsuits, with the aim of collecting taxes payable by the companies, incurring on a
clear equivocation, since most of the times a company’s lack of ability to pay may still
occur, regardless of its efficient management.
Key words: 1. liability, 2. unlawful act, 3. fault, 4. manager, 5. executive officer,
6. director.
7
Sumário
1. Introdução ......................................................................................................................................................... 10
2. Os administradores........................................................................................................................................... 14
8
5.4.2 - A responsabilidade dos administradores das S.As. (de acordo com a Lei n. 6.404/76 –
Lei das S.As.) ............................................................................................................................... 67
5.5 - A responsabilidade objetiva dos administradores, como exceção - ......................................................... 79
5.6 - Responsabilidade subjetiva do administrador (aplicação na legislação vigente) -................................... 90
5.6.1 - Direito bancário – instituições financeiras – Conselho Monetário Nacional
– Lei n. 4.595/64 e Lei n. 6.024/74 -............................................................................................. 91
5.6.2 - Direito societário – companhias abertas – Comissão de Valores Mobiliários – CVM –
Lei n. 6.385/76 - ............................................................................................................................ 93
5.6.3 - Direito societário – Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial e de Falência da Sociedade
Empresária (Lei n. 11.101/05) - .................................................................................................... 94
5.6.4 - Direito tributário – Código Tributário Nacional – CTN - ............................................................. 96
5.6.5 - Direito tributário – Lei de Execuções Fiscais – Lei n. 6.830/80 -............................................... 104
5.6.6 - Direito tributário previdenciário – Leis da Previdência Social – Lei n. 8.212/91 e
Lei n. 8.620/93 - .......................................................................................................................... 108
5.6.7 - Direito tributário criminal - Lei de Sonegação Fiscal - Lei n. 4.729/65 - ................................... 111
5.6.8 - Direito tributário criminal – Lei dos Crimes do Colarinho Branco – Lei n. 7.492/86 -.............. 112
5.6.9 - Direito tributário criminal – Lei de Lavagem de Dinheiro – Lei n. 9.613/98 ............................. 113
5.6.10 - Lei dos Crimes Contra a Ordem Tributária, Econômica e Contra as Relações de Consumo –
Lei n. 8.137/90 - ........................................................................................................................ 115
5.6.11- Direito criminal – Código Penal -............................................................................................... 116
5.6.12 - Direito criminal – Lei da Economia Popular – Lei n. 1.521/5 - ................................................ 116
5.6.13 - Direitos do consumidor – Código de Defesa do Consumidor – CDC – Lei n. 8.078/90 - ........ 117
5.6.14 - Direito ambiental – Lei Ambiental – Lei n. 9.605/98 - ............................................................. 120
5.6.15 - Direito trabalhista – Consolidação das Leis do Trabalho – CLT -............................................ 123
5.6.16 - Direito de propriedade industrial – Lei n. 9.279/96 -................................................................. 124
5.7.1 - Responsabilidade do administrador das S.As. perante o CADE – Lei n. 8.884/94 - .................. 126
5.8.1 - Responsabilidade do administrador – obrigação de meio e de resultado - .................................. 132
5.8.2 - Distinção entre a responsabilidade dos diretores e a dos membros do Conselho de
Administração -............................................................................................................................ 133
5.8.3 - Responsabilidade solidária entre os administradores -................................................................ 135
5.8.4 - A responsabilidade dos membros do Conselho de Administração da sociedade - ...................... 136
5.8.5 - Exemplos de casos de responsabilidade solidária entre os administradores -............................. 137
5.8.6 - Responsabilidade solidária entre os administradores e terceiros -............................................... 138
5.8.7 - A responsabilidade dos administradores eleitos com base em acordo de acionistas -................. 138
7. A responsabilidade dos administradores das s.as. e dos administradores das sociedades limitadas –
análise comparativa ....................................................................................................................................... 147
8.1 - A responsabilidade da sociedade, perante terceiros, pelos atos praticados por seus administradores –
a teoria da aparência - ............................................................................................................................. 149
8.2 - A legitimidade ativa para propor a ação de responsabilidade civil -...................................................... 151
8.3 - Ação social de responsabilidade interposta pela companhia contra o administrador -........................... 152
9. Conclusão......................................................................................................................................................... 155
9
1. INTRODUÇÃO
1
Tullio ASCARELI, Problemas das sociedades anônimas e direito comparado. Campinas: Book
Seller, 2001. p.459-63.
2
Maria Rita FERRAGUT, Responsabilidade tributária e o código civil de 2002. São Paulo: Noeses,
2005, p.16.
3
Rubens REQUIÃO, Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1988. v. 2. p. 8-10.
10
autorizado etc. Apesar dessas inovações, ainda era necessário a total reforma da
lei, para que a sociedade anônima pudesse viabilizar a modernização da empresa
brasileira e o desenvolvimento nacional.
Com esse propósito, foi elaborada a Lei n. 6.404/76, prevendo a criação de
dois tipos de S.As.: a de capital aberto e a de capital fechado, exigindo-se, da
primeira, que os respectivos valores mobiliários de sua emissão estejam admitidos
à negociação no mercado de valores imobiliários, em bolsa ou mercado de balcão,
conforme o disposto no art. 4 da Lei das S.As. Por outro lado, Rubens Requião4
esclarece que, para as sociedades fechadas, com menos de 20 (vinte) acionistas,
são estabelecidas facilidades procedimentais para o seu funcionamento, conforme
o disposto no art. 294 da Lei das S.As.
As S.As. são regidas pela Lei n. 6.404/76 (Lei das S.As.), lei especial,
alterada pela Lei n. 10.303/2001, e, supletivamente, pelo disposto no Código Civil,
conforme o disposto no art. 1.089 do Código Civil.
O Código Civil considera a sociedade anônima como empresária e não
sociedade simples, dado o fato de que exerce atividade própria de empresário, ou
seja, atividade organizada de produção ou circulação e bens e serviços, com intuito
econômico, com esclarece Maria Rita Ferragut.5
A Lei das S.As. também aplica-se às sociedades limitadas, porém, de
forma supletiva, na lacuna do disposto no Código Civil de 2002, referente às
sociedades limitadas (arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil) e às sociedades simples
(arts. 997 a 1.038 do Código Civil), caso assim previsto no respectivo Contrato
Social, conforme o disposto no art. 1.053 e do respectivo parágrafo único do Código
Civil.
No que toca à responsabilidade do administrador, o art. 158 da Lei das
S.As. determina que, em regra geral, ele não é pessoalmente responsável pelas
obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de
gestão; respondendo, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar, quando
proceder: dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo; ou com
violação da lei ou do estatuto.6
4
Rubens REQUIÃO, Curso de direito comercial, v. 2, p. 26.
5
Maria Rita FERRAGUT, Responsabilidade tributária e o código civil de 2002, p. 2-3.
6
Art. 158 da Lei das S.as.:
11
O administrador é responsável pelos danos causados pelo seu
descumprimento dos deveres legais, que envolve a prática de ato ilícito culposo.
Essa responsabilização, como demonstraremos a seguir, é do tipo subjetiva, em
regra geral, dado que envolve a aferição de culpa do agente, o que pode ser
comprovado por várias legislações especiais em vigor, abaixo citadas. Essa regra
aplica-se, inclusive, à legislação estrangeira que, da mesma forma, considera, em
regra, subjetiva a responsabilidade do administrador, como mencionado abaixo. A
responsabilidade objetiva do administrador, exceção à regra, aplica-se, por
exemplo, no caso de infração, pela sociedade representada pelos administradores,
da Lei Antitruste, que trata das infrações à ordem econômica, Lei n. 8.884/94, como
adiante tratado.
O fundamento para a responsabilidade subjetiva dos administradores, de
acordo com Fábio Ulhoa Coelho,7 é o não cumprimento dos deveres legais de
diligência e lealdade, exigidos dos administradores das sociedades anônimas (arts.
153 a 157), que podem ser considerados como preceitos gerais, aplicáveis a
qualquer pessoa incumbida da administração dos bens ou interesses de terceiros,
tais como o síndico da massa falida, o mandatário e o liquidante de instituição
financeira.
A responsabilização objetiva dos administradores não nos parece ser uma
tendência da legislação brasileira, nem da estrangeira.
“(...) § 1º O administrador não é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo se
com eles for conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conhecimento, deixar
de agir para impedir a sua prática. Exime-se de responsabilidade o administrador dissidente que
faça consignar sua divergência em ata de reunião do órgão de administração ou, não sendo
possível, dela dê ciência imediata e por escrito ao órgão da administração, ao Conselho Fiscal, se
em funcionamento, ou à assembléia geral.
§ 2º Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do
não-cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da
companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles.
§ 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o § 2º ficará restrita ressalvado o
disposto no § 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto, tenham atribuição
específica de dar cumprimento àqueles deveres.
§ 4º O administrador que, tendo conhecimento do não-cumprimento desses deveres por seu
predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de comunicar o fato à
assembléia geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável.
§ 5º Responderá solidariamente com o administrador quem, com o fim de obter vantagem para si
ou para outrem, concorrer para a prática de ato com violação da lei ou do estatuto."
7
Fábio Ulhoa COELHO, A sociedade limitada no novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 51.
12
Por outro lado, no que toca ao empresário, o próprio Código Civil brasileiro
inovou, imputando-lhe responsabilidade objetiva: (a) em caso de condução de
atividade que, por sua natureza, envolva risco, quando a mesma causar dano à
coletividade ou a outrem, como determina o art. 927, parágrafo único, do Código
Civil; e, também, (b) na forma do art. 931 do referido Código, por força dos danos
causados pelos produtos postos em circulação.
A aplicação das regras da responsabilidade do administrador às infrações
cometidas, no exercício de suas funções, enseja a reparação, pela empresa que os
mesmos representam, dos danos causados aos acionistas ou a terceiros, cabendo
à empresa exigir, do administrador, o ressarcimento dos prejuízos causados-lhe,
diretamente ou a terceiros.
13
2. OS ADMINISTRADORES
14
Por essa razão, atos praticados pelos diretores que não chegam ao
conhecimento dos membros do Conselho de Administração não podem ser por eles
evitados e não os responsabilizam, nem de forma solidária, exceto caso sejam
coniventes ou negligentes por omissão, ou seja, por não terem evitado a prática de
atos ilícitos de seu conhecimento pelos diretores.
A exceção à regra da não responsabilização dos membros do Conselho de
Administração pelos atos praticados pelos diretores aplica-se nos casos de: (a)
conivência dos membros do Conselho de Administração; (b) negligência para a
verificação da ilicitude do ato de um diretor; (c) ou de omissão para impedir a
prática dos referidos atos.
15
2.2 - A Diretoria -
16
permite que pessoas jurídicas assumam a administração de empresas, por seus
representantes legais.
Nesse sentido, deve-se esclarecer que, diferentemente do que prevalece
com relação às S.As., admite-se, nas sociedades limitadas, que o cargo de
administrador seja ocupado por pessoas físicas ou jurídicas, dado que o art. 1.060
do Código Civil, a elas aplicável, refere-se apenas “às pessoas designadas no
Contrato Social ou em ato separado”, sem estabelecer qualquer distinção com
relação às pessoas físicas ou jurídicas destinadas a preencher o cargo de
administradores.
Nesse sentido, Attila Souza Leão8 esclarece que a lei não foi clara em
determinar quais pessoas poderiam ser administradoras das sociedades limitadas.
Segundo ele, apesar de aparentemente apenas pessoas físicas terem o direito de
assumir o cargo de administrador da sociedade, teoricamente, nada impede, e
admite-se, que pessoas jurídicas possam exercer a gestão da sociedade limitada
desde que indicando a pessoa física de seu representante legal.
Talvez a dúvida sobre a possibilidade de pessoa física assumir a gestão da
sociedade limitada tenha advindo do fato de que, na sociedade simples, isso é
vedado, pelo disposto no art. 997 do Código Civil que determina, no seu inciso VI,
que o respectivo Contrato Social mencionará dentre outros itens, as pessoas
naturais incumbidas da administração da sociedade, seus poderes e atribuições.
8
Attila Souza LEÃO, Direito das sociedades. In: Comentários ao novo Código Civil: Rio de Janeiro:
Forense, 2002. v. 4, p. 208-209.
17
Apesar de o procurador não ser considerado administrador, a empresa que
constituir procurador, para, de fato, atuar como se administrador fosse,
representando-a, com a finalidade de afastar-se a sua responsabilização por ato
ilícito praticado pelo procurador, tal como um estranho à sua organização, não
evitará sua responsabilização. Nesse caso, podemos considerar a aplicação
analógica, do disposto no art. 1.015 do Código Civil, que, no seu parágrafo único,
estabelece a regra geral da responsabilidade da sociedade e as exceções à
mesma, pelos atos praticados por quem a representa perante terceiros, como seu
administrador, sem apresentar suporte legal para tanto.
Assim, decidir-se-á se a culpa havida, na realização de operações da
companhia, representada por procurador da empresa, sem poderes para
representá-la, foi: (a) do terceiro, que sem zelo, não verificou o disposto nos atos
societários da sociedade, para tomar conhecimento de que o procurador que,
nessa qualidade se apresentou, não detinha poderes para tanto, ou (b) da própria
sociedade, dado o fato de ser impossível, para um terceiro, verificar que o referido
procurador não a representava, efetivamente, face à teoria da aparência, razão
pela qual a operação foi realizada entre o procurador, em nome da sociedade, e o
terceiro de boa fé. Além disso, o próprio art. 160 da Lei das S.As. determina que se
aplica a regra da responsabilização dos administradores aos não administradores,
com funções técnicas ou de aconselhamento dos administradores. Entendemos
que os procuradores incluem-se nessa regra, razão pela qual a companhia
responsabiliza-se pelos atos ilícitos praticados pelo mesmo, na qualidade de seu
representante.
18
pena de resolução do contrato de trabalho, como é sabido. Juntamente com a
subordinação hierárquica, o contrato de trabalho caracteriza-se pelo recebimento
de salário e pela não eventualidade da relação empregatícia, em que o empregado
obriga-se à regularidade da prestação dos serviços ao empregador e ao
cumprimento de horário de trabalho.
O gerente empregado não é considerado administrador, com
autonomia de gestão para responsabilizar-se pelos atos ilícitos praticados por
sua pessoa, porque se submete ao comando do respectivo superior hierárquico
ou empregador, este sim responsável pelos atos ilícitos praticados pelo
empregado, e de forma objetiva, independentemente de culpa, como abaixo
mencionado, com base no art. 932, inciso III, combinado com o disposto no art.
933 do Código Civil. A mesma regra aplica-se àqueles que exercem funções de
gestão, como os diretores que não representam a empresa autonomamente,
mantendo vínculo de emprego com a sociedade que representam.
Fábio Ulhoa Coelho9 lembra muito bem que, no tocante aos diretores
das empresas regidos pelas normas trabalhistas, aplica-se a mesma regra:
quando o vínculo entre o diretor e a empresa é de subordinação, não há que se
falar em responsabilidade do administrador. Nesse sentido, determina o
Enunciado 269 do TST: “o empregado eleito para ocupar cargo de diretor tem o
respectivo contrato de trabalho suspenso, não se computando o tempo de
serviço deste período, salvo se permanecer a subordinação jurídica inerente à
relação de emprego”.
A relação entre o diretor e a empresa contratante só será societária,
desde o início de sua contratação, se não prevalecer a subordinação
hierárquica trabalhista entre o diretor e outro membro da Diretoria, mas apenas
uma relação entre o diretor e o Conselho de Administração, se houver, e a
Assembléia Geral, caso em que a relação havida é de órgão para órgão, e não
uma relação pessoal.
9
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial.São Paulo: Saraiva, 2002, v. 2. p.240-241.
19
2.6 - Os membros do Conselho Fiscal da sociedade distinguem-se dos
administradores -
20
Considera-se acionista controlador, de acordo com Rubens Requião,10 e
com fundamento no disposto nos arts. 116, 265, parágrafo primeiro, e 243,
parágrafo segundo, da Lei das S.As., a pessoa natural ou jurídica, ou grupo de
pessoas, vinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, titulares de
direitos de sócio que lhes assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos
nas deliberações da Assembléia Geral e o poder de eleger a maioria dos
administradores da companhia, usando, efetivamente, seu poder para dirigir as
atividades sociais ou orientar o funcionamento dos órgãos da companhia. Em
resumo, o acionista controlador é aquele que detém a maioria de votos decisivos na
Assembléia Geral.
Waldirio Bulgarelli11 entende que a definição legal é imperfeita, dado que o
conceito é limitado (a) pela referência à titularidade de direitos de sócios (o poder
pode derivar de situações contratuais ou pessoais e de fato) e (b) pela referência
ao período de tempo do exercício do controle – a exigência de que seja
permanente, vez que, na prática, o controle pode ser exercido de forma eventual.
Além disso, o conceito acima é impreciso, porque ainda precisou ser
complementado pela Resolução n. 401 do Banco Central, de 1976, que regulou as
condições para alienação do controle da companhia aberta, acrescendo mais
alguns elementos ao conceito de controle, para que fosse melhor elucidada a
questão. O inciso III da referida resolução refere-se ao controle exercido por grupo
de pessoas vinculadas por acordo de acionistas, nos termos do art. 118 da Lei n.
6.404/76, ou sob controle comum.
O respectivo inciso IV refere-se ao controle exercido por pessoa ou grupo
de pessoas que não são titulares de ações que assegurem a maioria absoluta dos
votos do capital social, considerando como acionista controlador a pessoa ou o
grupo de pessoas vinculadas por acordo de acionistas ou sob controle comum que
são titulares de ações que lhes assegurem a maioria absoluta dos votos dos
acionistas presentes nas três últimas Assembléias Gerais da companhia.
A crítica de Waldirio Bulgarelli12 a essa conceituação é o fato de que a
referência às três últimas Assembléias Gerais da companhia poderia explicar o fato
10
Rubens REQUIÃO, Curso de direito comercial, p. 124-125.
11
Waldirio BULGARELLI, Manual das sociedades anônimas. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2000. p. 300-
301.
12
Waldirio BULGARELLI, Manual das sociedades anônimas, p. 301.
21
do controle ter sido exercido de forma permanente, mas não fundamenta o controle
exercido independentemente de acordo de acionista, quando o controlador não
tenha direitos de sócios que lhe assegurem a maioria dos votos.
O art. 116 da Lei das S.As. determina que o acionista controlador deve
usar o seu poder para que a companhia realize seu objeto social e cumpra sua
função social. Ele tem deveres de respeito e lealdade, além de responsabilidades
para com os acionistas minoritários, a empresa, os respectivos empregados e a
comunidade em que atua.
13
NEWTON DE LUCCA et al., Do direito de empresas. In: ALVIM, Arruda; ALVIM, Thereza,
Comentários ao Código Civil brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. 9., p. 335-336.
14
Waldirio BULGARELLI, Manual das sociedades anônimas, p. 171.
22
algumas modificações, sobretudo com relação ao Conselho de Administração,
considerado não só um órgão consultivo, mas também com atribuições e funções
antes privativas da Assembléia Geral.
Deve-se mencionar que, como afirmam os autores acima mencionados, a
administração da sociedade origina-se de dois poderes distintos, complementados
na manifestação de vontade das pessoas jurídicas: o poder de decisão (ou de
deliberação assemblear, mencionado no art. 1.010 do Código Civil) que cabe aos
sócios, e o poder de representação que consiste na execução, pelos
administradores, das deliberações dos sócios, envolvendo decisão acerca dos
negócios e das operações autorizadas pelos mesmos, conforme o disposto nos
arts. 1.022 e 1.064 do Código Civil.
Os administradores, no exercício da gestão da sociedade, devem respeitar
os deveres legais, mencionados nos arts 153 a 157 da Lei das S.As., considerando-
se os limites impostos aos representantes legais da empresa pelo próprio Estatuto
Social, que representa a vontade majoritária dos acionistas, de modo a evitar a
prática de atos ilícitos pelos administradores, dentre eles, os atos proibidos,
contrários à lei ou ao Estatuto Social, e os atos praticados com excesso ou abuso
de poderes.
23
3. OS DEVERES DOS ADMINISTRADORES
24
que se consubstanciam em princípios básicos para a administração de bens ou
interesses alheios, como assevera Fábio Ulhoa Coelho.15
O art. 1.011 do Código Civil, que trata das sociedades simples, referente
ao dever de cuidado e diligência, aplicável às limitadas, conforme o disposto no art.
1.053 do Código Civil, e que, na falta de legislação especial, como a lei das S.As,
também aplicar-se-ia às sociedades anônimas, na forma do art. 1.089 do Código
Civil, coaduna-se com os deveres dos administradores das S.As., disciplinados nos
arts. 153 a 157 da Lei das S.As..
Os administradores devem cumprir os deveres estabelecidos nos arts. 153
a 157 da Lei das S.As., sempre considerados no Estatuto Social da companhia,
ainda que implicitamente, quais sejam: o dever de diligência, o dever de não agir
com abuso de poder, dever de lealdade, dever de não agir de forma conflitante com
o interesse da companhia e dever de informar, sendo o mais importante deles o de
bem administrar a sociedade.
Segundo José Edwaldo Tavares Borba,16 o administrador deve atender, e
estar comprometido, com o interesse da empresa, compreendendo as
conveniências de acionistas, empregados e da comunidade, e priorizando as
exigências do bem comum e a função social da empresa.
A atuação dos administradores em desrespeito aos deveres aos quais se
sujeita poderá ensejar a responsabilidade civil dos mesmos, pelos prejuízos, por
essa razão, causados para a companhia ou para terceiros.
O art. 153 da Lei das S.As. determina que o administrador deve ser
diligente, empregando, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que
todo homem ativo e honesto costuma empregar quando administrando os seus
próprios negócios, servindo à própria companhia, e não aos interesses dos
respectivos acionistas em particular, sempre comprometido com a busca da maior
lucratividade para o acionista, do bem estar dos empregados e dos interesses
sociais da comunidade, assim considerada, para os fins do dispositivo legal de que
15
Fábio Ulhoa COELHO, A sociedade limitada no novo Código Civil, p. 51.
25
se trata, como os núcleos urbanos ou rurais onde a atividade da empresa é
desenvolvida.
O art. 154 da Lei das S.As. trata do dever do administrador de não agir
com abuso de poder, mas sim visando ao interesse da companhia, de acordo com
a respectiva função social e os ditamos do bem público, e não de parte dos
acionistas. É considerado abuso de poder do administrador:
(a) A prática de ato de liberalidade, às custas da companhia, exceto
quando os beneficiários forem os empregados ou a comunidade da qual a empresa
participa, e a liberalidade seja razoável, justificada na sua extensão e na sua
finalidade, não afetando o patrimônio da sociedade, caso em que o ato de que se
trata é autorizado pelo Conselho de Administração ou pela Diretoria. Isso significa
que o administrador deve atentar para a natureza mercantil da sociedade anônima,
sendo seu patrimônio utilizado para esse fim, não podendo ser desfalcado sem
uma compensação plausível, segundo Egberto Lacerda Teixeira e José Alexandre
Tavares Guerreiro.17
(b) a utilização de bens, inclusive por empréstimo, de serviços ou crédito
da empresa, bem como a captação de empréstimo de recursos, junto à companhia,
para o seu proveito próprio, de terceiros, ou de sociedade em que tenha interesse,
sem a prévia autorização da Assembléia Geral ou do Conselho de Administração.
Segundo Egberto Lacerda Teixeira e José Alexandre Tavares Guerreiro, não tem
cabimento o Conselho de Administração ser incumbido de autorizar empréstimo da
companhia em favor de membro do próprio órgão, o Conselho de Administração.
O mais conveniente seria, segundo os mencionados autores, que essa
competência autorizativa para a captação de empréstimo fosse restrita à
Assembléia Geral. Ressaltam, os autores supracitados, que as instituições
financeiras não podem conceder empréstimos ou adiantamento a seus
16
José Edwaldo Tavares BORBA, Direito societário. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 375.
17
Egberto Lacerda TEIXEIRA José Alexandre Tavares GUERREIRO, Das sociedades anônimas no
direito brasileiro. São Paulo: Jorge Bushatsky, 1979. p. 472.
26
administradores e respectivos cônjuges e parentes (Lei n. 4.595/64, art. 34, incisos
I e II);
(c) recebimento de vantagem pessoal, ainda que indireta, pelo exercício do
cargo, sem prévia autorização estatutária ou da Assembléia Geral, que enseja a
obrigação do administrador faltoso de transferir à companhia as importâncias
recebidas pelo administrador por liberalidade de terceiros.
27
em detrimento daquele que não tem conhecimento dela. A pessoa prejudicada tem
o direito de haver, do infrator, indenização por perdas e danos, se comprovar que,
ao contratar, desconhecia a informação.
18
José Edwaldo Tavares BORBA, Direito societário, p. 377.
19
Egberto Lacerda TEIXEIRA; José Alexandre Tavares GUERREIRO, Das sociedades anônimas no
direito brasileiro, p. 475.
28
dever de fornecer dados à Assembléia Geral Ordinária pelo administrador
compreende a divulgação de informações sobre as vantagens de que goza,
concedidas por empresas do mesmo grupo ou por coligadas, bem como as
condições da contratação, pela companhia, de diretores ou de empregados de alto
nível, bem como de qualquer ato ou fato considerados relevantes nas atividades da
companhia.
O pedido de revelação de dados pelos administradores deve ser
encaminhado por acionistas representando, no mínimo, 5% (cinco por cento) do
capital social, podendo o referido percentual ser reduzido pela CVM. Os
administradores podem recusar-se a prestar tais informações sobre atos ou fatos
relevantes envolvendo a atividade da companhia, se for considerado prejudicial à
sociedade, como, por exemplo, no caso de risco de divulgação de dados para a
concorrência. Em caso de conflito entre acionistas e administradores, poder-se-á
apresentar um pedido para o Conselho Fiscal, e a CVM poderá intervir e
responsabilizar os administradores pelo descumprimento de seu dever, se assim
entender correto.
Esse direito de minoria de penetrar na vida societária, buscando
informações, pode trazer efeitos danosos para a sociedade e, nesses casos, sob
essa justificativa, a CVM interferirá se não houver acordo prévio entre as partes.
O art. 157 da Lei das S.As. exige também que o administrador de
companhia aberta, por força do seu dever de informar, comunique, imediatamente,
à bolsa de valores e à CVM (art. 4, IV, da Lei n. 6.385/76), bem como divulgue pela
imprensa (disclosure), em benefício do legítimo interesse da companhia ou do
acionista, sob pena de responsabilidade, qualquer deliberação da Assembléia Geral
ou dos órgãos da administração, ou fatos relevantes ocorridos na companhia que
possam influir, de forma consistente, na cotação dos valores mobiliários de emissão
da companhia, e, assim, na decisão dos investidores do mercado, acerca da
compra ou da venda dos títulos mobiliários de emissão da mesma. A divulgação de
fato relevante da companhia pode ser requerida pelos acionistas representando
cinco por cento do capital da companhia, e é disciplinada pela Instrução CVM n.
31/84.
29
O disclosure, segundo José Edwaldo Tavares Borba,20 em certas situações
e excepcionalmente, poderá não prevalecer, e o administrador poderá justificar a
não revelação de certo fato, caso haja risco de que a referida divulgação venha a
ser maléfica para a companhia.
Pode ser mencionado, ainda, como dever de informar do administrador, o
de submeter à apreciação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(CADE), através da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE), conforme o
disposto no art. 54, caput e parágrafo quarto da Lei n. 8.884/94 (Lei Antitruste), os
atos que possam limitar ou, de qualquer forma, prejudicar a livre concorrência, ou
resultar na dominação de mercados relevantes de bens ou serviços. O referido ato
deve ser informado com antecedência de, no máximo, 15 (quinze) dias úteis de sua
realização, mediante encaminhamento da respectiva documentação à SDE.
Além desses deveres, podem ser encontrados, na Lei das S.As., de forma
esparsa, outros deveres dos administradores, como bem afirma P.R. Tavares
Paes,21 tais como:
- o dever de promover o depósito de parte do capital realizado em dinheiro,
quando da constituição da companhia, de acordo com o disposto nos arts. 80, III, e
81 da Lei das S.As.;
- o dever de assinar os certificados das ações, das partes beneficiárias,
das debêntures, e dos bônus de subscrição, de acordo com os arts. 21-XI, 49-VII,
64 - XII e 79-VIII da Lei das S.As., respectivamente;
- o dever de convocar a Assembléia Geral, uma vez encerrada a
subscrição de ações, na constituição da companhia, se for negado pelo Registro do
Comércio, o arquivamento dos respectivos atos constitutivos por irregularidade, a
ser sanada, conforme o disposto no parágrafo primeiro do art. 97 da Lei das S.As.;
20
José Edwaldo Tavares BORBA, Direito societário, p. 376.
21
P. R. Tavares PAES, Responsabilidade dos administradores de sociedades. São Paulo: RT, 1978.
p. 132.
30
- o dever de tratar das providências referentes às formalidades
complementares à constituição da companhia, sob pena de responsabilização dos
administradores perante a companhia, como determinam os arts. 98 e 99 da Lei
das S.As.;
- o dever de efetuar a chamada, pela imprensa, ao acionista em mora, para
a realização das ações subscritas, na omissão do Estatuto e do boletim, na forma
do art. 106 da Lei das S.As.;
- o dever de convocar os acionistas para as Assembléias Gerais, nos
casos previstos em lei e no Estatuto, como determina o art. 123 da Lei das S.As.;
- o dever de comunicar o fato de que se encontram à disposição dos
acionistas, antes da realização da Assembléia Ordinária, os seguintes documentos,
dentre outros relativos à ordem do dia, para análise: relatório da administração;
cópia das demonstrações financeiras; parecer dos auditores independentes, se
houver; parecer do Conselho Fiscal, inclusive os votos dissidentes, em havendo,
como determina o art. 133 da Lei das S.As.;
- o dever de comparecer às Assembléias Gerais ordinárias para prestar
esclarecimentos aos acionistas, quando solicitado, como previsto no art. 134,
parágrafo primeiro, da Lei das S.As.;
- o dever de prestar contas do seu mandato, anualmente, na Assembléia
Geral ordinária, como determina o art. 132, inciso I da Lei das S.As.;
- o dever de efetuar chamada do subscritor de capital não integralizado,
para efetuar o pagamento do valor devido, mediante avisos publicados na
imprensa, sob pena de constituição do acionista em mora, conforme o art. 106,
parágrafos primeiro e segundo, da Lei das S.As.
31
4. A RESPONSABILIDADE CIVIL
22
PEREIRA, Caio Mario da Silva, Teoria geral do direito civil. In: Instituições de direito civil. 7. ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1987. p. 560.
23
Marcus Elídius Michelli de ALMEIDA, Abuso do direito e concorrência desleal. São Paulo: Quartier
Latin, 2004, p. 78/79
32
imputabilidade que significa a atribuição do resultado antijurídico à consciência do
agente; (d) a penetração da conduta na esfera jurídica alheia, pois, enquanto
permanecer inócua, desmerece a atenção do direito. O ilícito civil corresponde a um
atentado contra o interesse privado de outrem, e o dano causado deve ser
reparado, para que se restaure o equilíbrio rompido.
A reparação do dano é devida quando se comete um ato ilícito, ou seja, um
erro de conduta, um agir contrário ao Direito que se enquadre nos extremos legais,
configurando uma infração de dever oriundo de contrato ou extracontratual (uma
obrigação imposta por preceito geral de Direito, ou pela própria lei, não
necessariamente a de ordem pública), ensejando a lesão do direito alheio, inclusive
da comunidade. A ilicitude consiste em uma contrariedade entre a conduta adotada
e a norma jurídica prescrita, e pode referir-se a qualquer ramo do Direito.
O ato ilícito, praticado por qualquer um, na esfera privada ou pelos
servidores públicos, pode envolver três categorias de infração: a civil, a penal e a
administrativa. Assim, o ato ilícito praticado pode ensejar, cumulativa ou
isoladamente, a reparação civil (por força da prática de ato ilícito civil, ou de ato
lícito, no caso da responsabilidade objetiva); a responsabilidade penal (pela prática
de crimes, ensejando a aplicação de pena, qual seja, o seqüestro e perdimento de
bens do condenado, e, inclusive, a pena restritiva da liberdade) e a
responsabilidade administrativa ou trabalhista (disciplinar, que pode envolver a
justa perda de função ou emprego), como afirma Hely Lopes Meirelles.24
Segundo Sergio Cavalieri Filho,25 as ilicitudes são classificadas de acordo
com critérios de conveniência e oportunidade, de acordo com o interesse da
sociedade e do Estado, variável no tempo e no espaço. Por essa razão, a mesma
ilicitude pode consistir em violação a diversos diplomas legais.
24
Hely Lopes MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p.
469.
25
Sergio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
p. 35-36.
33
4.1.2 - A responsabilidade civil, penal e administrativa -
26
José Edwaldo Tavares BORBA, Direito societário, p. 423.
27
Hely Lopes MEIRELLES, Direito administrativo brasileiro, p. 621-34.
28
Hely Lopes MEIRELLES , Direito administrativo brasileiro, p. 472.
34
demais, dado a gravidade que envolve. Entretanto, a absolvição penal, por falta de
provas e não aferição de sua culpa, não enseja, necessariamente, sua absolvição
do ilícito civil e do administrativo, este último, aplicável se o infrator for funcionário
público.
Como afirma Sergio Cavalieri Filho,29 a responsabilidade civil pode estar
prevista em qualquer ramo do Direito, e consubstancia-se no dever de indenizar, de
natureza reparatória, para fins de restabelecimento do equilíbrio jurídico-econômico
antes havido entre as partes (o agente e a vítima), e quebrado, por força do dano
causado. O equilíbrio havido, nesse caso, é restabelecido através de uma
indenização fixada ao agente ofensor, na proporção do dano causado à vítima.
29
Sergio CAVALIERI FILHO. Programa de responsabilidade civil, p. 35-36.
30
Vanessa Ramalhete Santos NEVES, Responsabilidade dos administradores de sociedades
anônimas, p. 102-103.
31
Hely Lopes MEIRELLES, Direito administrativo brasileiro, p. 472.
35
demais, dado a gravidade que envolve. Entretanto, a absolvição penal, por falta de
provas e não aferição de sua culpa, não enseja, necessariamente, sua absolvição
do ilícito civil e do administrativo, aplicável se o infrator for funcionário público.
A responsabilidade penal dos administradores de empresas está prevista
nas seguintes leis, dentre outras: (a) a Lei n. 7.492/86, que trata dos crimes contra
o sistema financeiro nacional, (b) a Lei n. 8.137/90, que trata dos crimes contra a
ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, (c) a Lei n.
10.303/2001, que alterou a Lei n. 6.385/76, referente ao mercado de capitais, e (d)
a Lei n. 1.521/51, referente à economia popular, que trata de fraude a qualquer
informação devida aos acionistas, visando à sonegação de lucros e dividendos ou à
promoção de desvio de fundos da sociedade.
32
Hely Lopes MEIRELLES, Direito administrativo brasileiro, p. 470.
36
sexto, da Constituição Federal. O mesmo aplica-se às pessoas jurídicas de direito
privado, prestadoras de serviço público, com relação aos danos causados por seus
agentes com relação às próprias vítimas.
Condenada a ressarcir terceiros pelos danos causados por funcionário
público, a Administração Pública poderá interpor ação regressiva contra seu
funcionário considerado culpado, para a restituição dos danos causados-lhe. Não
resta dúvida de que o servidor público poderá intervir, como assistente voluntário,
no processo judicial em curso, interposto, por terceiro lesado, contra a
Administração, de modo a evitar maior prejuízo à Administração Pública e
indiretamente a si próprio, de quem a Administração poderá exigir o ressarcimento
dos prejuízos sofridos.
A responsabilidade civil do funcionário público é subjetiva, e independe da
sua responsabilidade administrativa ou penal, sendo verificada perante a Justiça
Comum.
Deve-se ressaltar que é possível ser imputada responsabilidade
administrativa ao funcionário público, mas se o mesmo não causar qualquer dano
para a Administração Pública, no exercício de suas atividades, não lhe será
imputada responsabilidade civil. Por outro lado, o servidor que causa prejuízo para
a Administração obriga-se a indenizar a mesma do prejuízo sofrido, imputando-se a
ele responsabilidade civil, além da administrativa.
A sanção disciplinar, regulada pelo direito administrativo, enumerada nos
diversos estatutos dos funcionários públicos, como afirma José Cretella Júnior,33
corresponde ao conjunto de medidas tomadas pela Administração Pública contra
seus funcionários que infringem dispositivos legais ou regulamentares, e pode
corresponder a uma sanção moral, pecuniária ou mista, sendo a primeira uma
advertência ou repreensão, a segunda uma multa, incidindo sobre o patrimônio do
funcionário, e a última, a que envolve as duas antes mencionadas. Em regra geral,
a aplicação da sanção disciplinar está relacionada à esfera discricionária da
Administração Pública, no que tange à análise de oportunidade, conveniência e
razoabilidade.
33
José CRETELLA JÚNIOR, Sanção disciplinar. In: FRANÇA, R. Limongi (Coord.), Enciclopédia
Saraiva do Direito. São Paulo: Saraiva, 1977, v. 67. p. 17.
37
No entendimento de Eros Grau,34 ao lado da sanção jurídica administrativa
encontra-se a sanção econômica, aplicada pelo Estado, em caso de não
atendimento de certas normas, consubstanciando-se em um efeito econômico
negativo aos infratores, resultando, por exemplo, em um pior posicionamento dos
infratores, no mercado, em relação aos demais concorrentes. Essa sanção tem
como objetivo estimular o cumprimento das normas jurídicas que se servem,
atualmente, não só das sanções jurídicas, como também das econômicas.
Concluímos, assim, em face da análise dos doutrinadores acima
mencionados, que não se imputa responsabilidade administrativa aos
administradores das sociedades anônimas, mas apenas aos funcionários públicos.
Por força da condução da atividade econômica controlada e fiscalizada
pelo Poder Público que desenvolve, a empresa pode envolver-se com a prática de
ilícitos junto ao referido órgão fiscalizador, submetendo-se a processo
administrativo por infração à legislação aplicável a tais órgãos da Administração
pública. Isso não significa que é administrativa, a responsabilidade dos
administradores das empresas, apurada em qualquer processo, inclusive
administrativo. A responsabilidade administrativa é imputada especificamente aos
funcionários públicos.
Se a responsabilidade do administrador consubstancia-se na reparação do
dano causado, por infração de um dos seus deveres de administrador de
empresas, então, tratar-se-á de responsabilidade civil do administrador por infração
à norma legal.
34
Eros GRAU, Sanção econômica. In: FRANÇA, R. Limongi (Coord.), Enciclopédia Saraiva do Direito.
São Paulo: Saraiva, 1977, v. 67, p. 19-20.
38
conforme o disposto nos arts. 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil, os atos
lícitos praticados com relação a uma atividade de risco, que garante um benefício
ao seu responsável (responsabilidade objetiva). O dever de reparar o dano causado
advém, assim, do risco criado pelo interessado para a comunidade, muitas vezes,
com conseqüências imprevisíveis.
Desse modo, verificamos que a responsabilidade civil pode ser causada
por ato ilícito culposo ou pela assunção do risco que envolve a realização de certa
atividade econômica. A indenização devida ao responsável pelo dano causado
pode decorrer de disposição de contrato – responsabilidade contratual, ou da lei,
responsabilidade extracontratual, que pode, inclusive, ter os seus limites fixados em
lei, afastando-se a obrigação de pagamento de indenização integral.
A responsabilidade civil pode ser contratual ou extracontratual, baseando-
se a primeira na vontade dos indivíduos, celebrada em contrato, e a segunda, em
um dever jurídico imposto por lei ou pela ordem jurídica.
Trata-se de um instrumento de compensação das perdas sofridas pela
vítima, mas também uma forma de impedir ou desestimular, ao menos, a repetição
de condutas semelhantes no futuro, como afirma José Reinaldo de Lima Lopes.35
Assim, a responsabilização civil tem o objetivo reparatório, punitivo e educacional,
estabelecendo indiretamente regras de comportamento social.
A responsabilidade civil deve ser analisada de forma individual, quando
visa realizar a justiça meramente comutativa (envolvendo conflitos individuais de
direito privado), e sob o aspecto macro social, que envolve a justiça distributiva e o
mercado como um todo. Desse modo, verifica-se que a responsabilidade civil
contém uma função essencial de desestímulo e prevenção de ofensas às pessoas
e aos bens alheios, sendo diversas as suas origens.
É pela responsabilidade civil que se determina quem sofre as perdas, e,
assim, quem detém suficiente poder para impor a outrem as perdas socialmente
existentes.
As funções da responsabilidade civil, esclarece ainda o citado autor, visa,
então (a) ao ressarcimento para restabelecer o equilíbrio social original; (b) à
reafirmação do poder do Estado de impor sanções, e, finalmente; (c) à inibição ou a
impedimento das infrações às norma jurídica vigente.
35
José Reinaldo de Lima LOPES, Responsabilidade civil do fabricante e a defesa do consumidor.
São Paulo: RT, 1992. p. 17.
39
As funções preventiva e reparadora da responsabilidade civil devem estar
juntas, de modo que o infrator veja-se desestimulado a reiterar na prática de atos
ilícitos. É sabido que o empresário, por exemplo, calcula o valor de eventual
indenização devida pela prática de qualquer ato ilícito e não se desestimula a
praticá-lo se financeiramente lhe convier. Daí advém a fundamental importância da
função preventiva, aplicada em conjunto com a função punitiva da responsabilidade
civil, em um contexto mais amplo, que inclui a divulgação da imagem negativa do
empresário, e a atuação do poder de polícia exercido pelo Poder Executivo, através
do qual é determinada, por exemplo, a proibição de fabricação de um produto ou a
sua apreensão. Assim, não pode ser dissociada a disciplina da responsabilidade
civil no direito privado, da sua disciplina de controle público e estatal.
Assim, a proteção dos interesses da sociedade não se estabelece pela
mera cobrança dos prejuízos sofridos, mas pela disciplina pública da atividade
industrial submetida ao Poder de Polícia. Isso demonstra que a responsabilidade
civil é também considerada uma responsabilidade pública e social, exercida através
do controle estatal, que envolve um sistema de autorizações e vigilância, exercida
por amostragem. O empresário que descumpre as determinações públicas estatais
relativas à sua atividade assume responsabilidade civil objetiva.
O controle administrativo e estatal da atividade econômica antes era
apenas previsto em leis esparsas, e foi em seguida disciplinado, no que toca à
relação entre empresários e consumidores, por exemplo, pelo Código de Defesa
dos Consumidores, considerado uma polícia de consumo que não dispensa, de
forma concorrente, o controle das relações de consumo pelo próprio cidadão.
Assim, há, no mínimo, três facetas através das quais pode ser enfocada a questão
da responsabilidade do fornecedor: a da empresa, a do consumidor e a do Estado.
Da mesma forma, o controle estatal, como expressão da função social da
responsabilidade civil, também pode ser exercido para fins de organização do
mercado de produção, envolvendo a forma de concorrência entre os empresários, a
proibição da concorrência desleal, a definição de monopólio e oligopólio, a
estipulação de preços dos produtos e serviços, dentre outras. Sendo assim,
também nesse caso, o descumprimento de padrões de conduta fixados pelo poder
público enseja responsabilidade civil do infrator, dado que a responsabilidade civil
envolve questões de direito público, vez que os princípios que o norteiam (estrita
40
legalidade, moralidade, transparência dos negócios públicos, por exemplo) têm
contaminado a legislação relativa às organizações empresariais.
Nesse contexto, conclui o referido autor, José Reinaldo de Lima Lopes,36
estabelece que a disciplina da responsabilidade civil não é matéria de direito
comercial, no sentido estreito do termo, mas de direito empresarial e de
reorganização de mercado, do que depende o desenvolvimento da democracia,
fruto da dialética do capitalismo, visando à proteção dos interesses sociais, ora
representados pelos cidadãos, consumidores, empregados, ora pelos empresários.
Verifica-se, assim, que a responsabilidade civil apresenta-se de forma
ampla, não apenas com função reparatória, mas também preventiva, educativa e
punitiva, configurando-se pelo ressarcimento do dano causado, mas também
através de controles e punições determinados pelo Estado.
36
José Reinaldo de Lima LOPES, Responsabilidade civil do fabricante e a defesa do consumidor, p.
146-147.
37
Sergio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 36.
38
Arnaldo VASCONCELOS, Sanção. In: FRANÇA, R. Limongi (Coord.). Enciclopédia Saraiva do
Direito. São Paulo: Saraiva, 1977. v. 66, p. 519.
41
caráter punitivo, exigível por força da prática de atos ilícitos, respectivamente. A
sanção punitiva visa refazer a prestação inobservada, através do cumprimento
forçado, ou recompô-la, através da indenização. A sanção ainda pode ter como
objetivo recuperar o faltoso, com um castigo, com sentido mais educativo do que de
exemplaridade ou de satisfação social. Essas formas simples de sanção jurídica
podem apresentar-se de forma mista ou complexa, resultantes da combinação
entre elas.
A escolha da sanção, resultado da não prestação de uma obrigação e
pressuposto da coação, pertence à estrutura da norma jurídica, estabelecida pelo
poder institucionalizado, que compreende um ato executivo, judicial ou legislativo,
obtendo eficácia dessa maneira.
A coação, por outro lado, constitui ato político de uso do poder na
execução forçada da sanção, de modo a buscar-se a recomposição do direito
violado.
A sanção em si, é sabido, não pode significar a garantia de plena
restauração do direito violado, dado que, no plano humano, essa recomposição
absoluta é impossível.
Verifica-se que a sanção está prevista na lei que trata da responsabilização
do agente do ato. Toda lei, como é sabido, é dotada de sanção, elemento
característico da norma jurídica que a difere do preceito moral. A intensidade,
porém, da sanção varia, conforme se faça sentir o efeito danoso da transgressão
do preceito, na prática do ato jurídico. Quando se tratar de responsabilidade
objetiva, que não envolve o conceito de culpa, considera-se, para fins de definição
da intensidade da sanção, o efeito danoso do risco assumido perante a sociedade.
Há uma classificação das leis segundo a intensidade da sanção prevista:
(a) leis perfeitas, que cominam a pena de nulidade para os atos proibidos, e
impõem uma conduta específica como condição de eficácia de certos atos; (b) leis
menos que perfeitas, que estabelecem atos proibidos ou exigem certo
comportamento, determinando uma penalidade para o desrespeito deles; e (c) leis
imperfeitas, que não prevêem a nulidade do ato, nem outra punição ao
transgressor, procurando o legislador, por outros meios, obviar a sua contravenção,
como menciona Caio Mario da Silva Pereira.39
39
Caio Mario da Silva PEREIRA, Instituições de direito civil, p. 96-97.
42
É sabido que há normas denominadas imperfeitas, que servem para fechar
o ordenamento jurídico, garantindo-lhe a plenitude, como uma prescrição de caráter
político, com lugar adequado no texto constitucional, preferivelmente no capítulo
das declarações de direito, por exemplo. Trata-se de uma declaração política de
caráter ideológico. A norma jurídica, por outro lado, deve estar sempre
acompanhada da respectiva sanção. Toda norma de conduta, assim, deve estar
acompanhada da respectiva sanção para que tenha eficácia.
Entendido o sentido da sanção propriamente dito, passemos à análise de
cada tipo de sanção, para compreender a questão da responsabilidade que cada
uma enseja, e os limites e o alcance da responsabilidade civil, objeto do presente
estudo.
A sanção pode ter natureza civil, penal ou administrativa, como acima
mencionado.
A que interessa ao presente trabalho é a sanção civil, também denominada
patrimonial, correspondente à medida jurídica imposta em forma de sacrifício
econômico, por violação de preceito legal ou convencional, e como garantia de
direitos, forma assecuratória da eficácia de princípios considerados imprescindíveis
à ordem jurídica.
A sanção civil dirige-se ao patrimônio do autor (a) do ato ilícito que causou
lesão do direito a terceiro, ou (b) da assunção do risco de realização de certa
atividade econômica causadora de danos para a comunidade local.
As modalidades do instituto da sanção civil são várias, com regimes
próprios e funções diversificadas, como preventiva, assecuratória, corretiva,
repressora ou ressarcitória.
Aplica-se a sanção patrimonial, desde que reunidos os seguintes
requisitos: (a) a existência de uma norma cominatória com expressão pecuniária;
(b) o ato lesivo ou que põe em risco o direito alheio; e (c) a ação coativa do lesado
ou ameaçado de sofrer a lesão. Além desses requisitos, encontram-se elementos
que influem na estrutura dos tipos qualificados, conforme cada critério técnico de
aplicação: ilicitude, imputabilidade, culpa ou dolo e dano.
A cominação da sanção aplicável extrajudicialmente, por acordo entre as
partes envolvidas, ou por via judicial ou administrativa terá seu valor prefixado na
norma, ou ficará ao arbítrio e controle do julgador. Essa sanção pode ser exigida
em conjunto com outras, ou de forma alternativa ou exclusiva.
43
Como esclarece Moacyr de Oliveira,40 dado o caráter patrimonial da
sanção, a mesma encontra no direito civil, na parte das relações econômicas, o seu
campo natural. O respectivo sujeito infrator, ao qual se aplica a sanção patrimonial
pode ser o delinqüente, o infrator, o inadimplente ou o contribuinte, obrigado à
prestação em dinheiro ou em coisa.
A responsabilidade tem por elemento nuclear uma conduta voluntária que
viola um dever jurídico e classifica-se de acordo com esse dever violado e com o
elemento subjetivo dessa conduta.
Não resta dúvida de que a responsabilidade civil somente constitui uma
sanção eficaz se o autor do delito tem fundos suficientes, pois, caso contrário, o
temor da responsabilização civil não impede a prática de atos ilícitos, tendo em
vista que é o patrimônio do administrador que responde por tais atos. Assim, há de
aliar-se a responsabilidade civil à penal, que tem função repressiva e preventiva,
aplicando-se aos crimes cometidos, complementarmente, aplica-se em conjunto
com a sanção civil e a penal, a sanção advinda de processo administrativo, que
pode consistir em multa, apreensão de produtos, cessação do registro do produto,
perante o órgão competente, suspensão temporária da atividade do fornecedor,
intervenção administrativa, imposição de contrapropaganda, dentre outras,
estabelecidas no art. 61 do CDC e as definidas nas normas específicas.
Ressaltamos que, como estabelecido pela classificação doutrinária acima
mencionada, tem-se a sanção penal e a civil, aplicáveis aos agentes dos atos
puníveis, reunindo, a sanção civil, a sanção pecuniária estabelecida no bojo do
processo administrativo e do processo civil interposto contra os infratores da ordem
econômica.
40
Moacyr de OLIVEIRA, Sanção patrimonial. In: FRANÇA, R. Limongi (Coord.), Enciclopédia Saraiva
do Direito. São Paulo: Saraiva, 1977, v. 67, p. 22-25.
44
caso da responsabilidade subjetiva, ou ato ilícito (envolvendo o risco da atividade
econômica) no caso da responsabilidade objetiva aplicável.
Como acima mencionado, essa responsabilização do administrador para
fins indenizatórios pode estar prevista em qualquer diploma legal brasileiro, e é
absolutamente independente de eventual responsabilização de outra natureza,
imputada ao agente do ato, seja de caráter penal ou administrativo, neste último
caso, se, paralelamente, o administrador da empresa exercer outra função, junto à
Administração Pública, e por conta desse fato cometer um ilícito administrativo,
independentemente de sua atuação como administrador da S.A., porém, afetando-a.
Deve-se ressaltar que apesar da doutrina considerar três tipos de sanção,
como acima mencionado, quais sejam, a civil, a penal e a administrativa (quando
advinda de falta disciplinar no exercício da função junto à Administração Pública),
há quem entenda que a condenação oriunda de um processo administrativo
corresponde a uma sanção administrativa. Mas não é assim que tratamos a sanção
administrativa neste trabalho. Entendemos devido adotar a tese de que, sendo
pecuniária e reparatória de danos, a sanção é civil; sendo privativa da liberdade, a
sanção é penal; e sendo funcional e disciplinar, a sanção é administrativa. Por esta
razão, consideramos civil a sanção e, assim, da mesma forma, a responsabilidade
do administrador sempre que lhe for imputada sanção pecuniária reparatória,
qualquer que seja o órgão julgador, inclusive os órgãos da Administração Pública,
como o Cade. Por essa razão, este trabalho inclui nas responsabilidades civis do
administrador as mencionadas no item 5 abaixo.
Como acima demonstrado, a responsabilização civil também envolve o
controle estatal de forma preventiva, educadora e corretiva, de modo que sejam
efetivamente atendidos os interesses da sociedade não só da reparação dos
danos, como também na prevenção deles.
A reparação do dano causado pelo infrator ou pelo empresário que
assumiu os riscos da sua atividade econômica pode ser entendida como a resposta
necessária imposta pelo ordenamento jurídico, para que o sistema tenha eficiência
e que ela seja expressiva, servindo de exemplo e inibindo ou desestimulando ações
causadoras de danos eventuais.
Como acima mencionado, este trabalho tem por objeto a responsabilização
civil do administrador das S.As. pela prática de atos ilícitos culposos, como regra
geral, e pela prática de atos lícitos, como exceção (responsabilidade objetiva) que
45
enseja o dever do mesmo de reparar o dano causado, de forma ampla, através do
pagamento de indenização a quem quer que tenha sido lesado, no âmbito
individual e/ou social, quaisquer que sejam os órgãos encarregados e os
procedimentos para a apuração e verificação do agente do ato, ainda que no
ordenamento jurídico brasileiro, de forma conjunta e concorrente.
46
atos ilícitos, praticados culposamente, merecem reparação, pelo seu agente.
Qualquer tipo de dano deve ser reparado, inclusive o dano moral. Consta, ainda,
uma nova disposição no Código Civil, a do art. 187, no sentido de que também é
considerado ato ilícito o exercício de um direito, por seu titular, em desrespeito aos
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons
costumes.
Nesse sentido, podemos citar a jurisprudência41 abaixo:
41
ATO ILÍCITO – A condenação pela reparação de ato ilícito, art. 927, CC, pressupõe a existência do
dano. (TRT 5ª R. – RO 01500-2003-009-05-00-0 – (12.629/05) – Rela. Juíza Graça Laranjeira – J.
16.06.2005) JNCCB.927.
47
4.4 - Responsabilidade subjetiva contratual ou extracontratual -
42
Código Civil:
“art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II – o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do
trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV – os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro,
mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V – os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.
art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa
de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
(...)
art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa
da vítima ou força maior.
art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se
esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.
art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que
dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”
48
De acordo com Luiz Roldão de Freitas Gomes,43 o Código Civil de 1916
estabelecia que a responsabilidade por fato de terceiro era subjetiva. Entendia-se
que o sujeito passivo do ato ilícito devia comprovar a culpa do responsável indireto
pelo dano causado. Os Tribunais brasileiros e a doutrina, em seguida, passaram a
entender que a responsabilidade indireta do pai, pelo ato ilícito do filho, do patrão,
pelo ato ilícito do empregado, do hospedeiro, pelo ato ilícito do hóspede, por
exemplo, baseava-se da presunção de culpa. Tratava-se de inversão do ônus da
prova: cabia ao pai, por exemplo, no que toca ao ato praticado pelo filho, e não à
vítima, comprovar que não agiu com culpa.
Como afirma Carlos Roberto Gonçalves,44 a presunção de culpa dos pais
era considerada relativa pela doutrina e pelos Tribunais, pois admitia-se prova em
contrário, de modo que não se tratava de responsabilidade objetiva por parte dos
pais, por exemplo, com relação aos atos praticados pelos filhos:
43
Luiz Roldão de Freitas GOMES, Elementos da responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Renovar,
2000. p. 111.
44
Carlos Roberto GONÇALVES, Direito das obrigações. In: Comentários ao Código Civil: parte
especial. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 11. p. 424-425.
49
Por outro lado, com relação aos empregados, adotou-se teoria mais
benéfica, para fins de apuração da respectiva culpabilidade: a Súmula 341 do STF
passou a inadmitir a prova de que o patrão não agiu com culpa, com relação aos
atos de seus empregados, considerando-se a presunção de culpa dos patrões
como absoluta. Tornou-se predominante, assim, a decisão judicial que
responsabilizava o patrão pelos atos ilícitos praticados pelo empregados, como o
exemplo abaixo:
45
Luiz Roldão de Freitas GOMES, Elementos da responsabilidade civil, p. 114.
46
Sérgio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 194.
50
atual, não é possível se conhecer a índole do ser humano, nos grandes centros
urbanos, além do fato de que a figura do patrão se torna cada vez mais anônima,
em relação ao controle da atividade do preposto.
Em cada um desses casos, o responsável indireto – o pai ou o patrão –
assumiram correr o risco de que da atividade daqueles adviria um dano para
terceiros. Provada a responsabilidade do empregado, os Tribunais têm entendido
que não é afastável a culpa do patrão. Face ao exposto, foi afastada a aplicação da
Súmula 341 do STF e aplica-se a responsabilidade do patrão pelos atos do
empregado de forma objetiva, só afastando-se a responsabilidade do patrão se
afastada a culpa do empregado, se o dano ocorrer fora do estabelecimento do
patrão e sem conexão com o tipo de serviço prestado ao patrão. Assim, segundo
Carlos Roberto Gonçalves,47 o patrão é responsabilizado se a vítima comprovar
que: (a) o agente do ato ilícito era empregado do terceiro a quem deseja atribuir-se
a culpa; (b) o empregado agiu com culpa; (c) o ato lesivo foi praticado no exercício
da função do empregado; (d) o ato culposo foi realizado no local e no horário de
trabalho do agente.
Por essa razão, a responsabilidade do pai é solidária com a do filho, e a do
patrão é solidária com a do empregado, ou seja, há responsabilidade solidária entre
os causadores do dano com aqueles sob cuja dependência estes se acham, como
determina o art. 942 do CC: “são solidariamente responsáveis com os autores os
co-autores e as pessoas designadas.” Da mesma forma que o autor supracitado,
Carlos Roberto Gonçalves48 entende que incumbe ao ofendido provar a culpa do
incapaz, o empregado, dos hóspedes e educandos. A exigência da prova da culpa
destes coloca-se como antecedente indeclinável à configuração do dever de
indenizar das pessoas mencionadas no art. 932 do Código Civil.
Deve-se, nesse caso, excepcionar a hipótese do menor inimputável, cujo
ato ilícito é assumido pelo pai, por omissão de sua parte, conforme determina o art.
186 do Código Civil, independentemente de culpa do menor:
47
Carlos Roberto GONÇALVES, Direito das obrigações. In: Comentários ao Código Civil: parte
especial, p. 441.
48
Ibid., p. 425.
51
“O fato de o agente do ato ilícito ser menor inimputável não retira seu caráter de ilicitude.
Na órbita civil, havendo culpa dos pais por omissão, estes respondem solidariamente pela
reparação do dano causado pelo filho em detrimento de outrem.” ( RT, 641:132)
52
4.5.1 - Responsabilidade subjetiva presumida (arts. 936, 937 e 938 do Código
Civil de 2002) -
No que toca aos danos causados a terceiros, por animais, o art. 936 do
Código Civil determina que o ressarcimento deles é de responsabilidade do
respectivo dono ou detentor, se não for comprovada a culpa da vítima ou a
ocorrência de caso fortuito ou de força maior. Trata-se, assim, de presunção
vencível, suscetível de prova em contrário, como menciona Carlos Roberto
Gonçalves.49 Trata-se de responsabilidade presumida do dono ou detentor do
animal, caso em que se inverte o ônus da prova da culpabilidade do agente,
cabendo, de qualquer forma, à vítima, demonstrar o nexo de causalidade entre o
ato ilícito e o dano causado. Ao responsável indireto caberá, assim, comprovar uma
excludente de responsabilidade: a culpa da vítima, a força maior ou o caso fortuito,
como afirma o autor citado acima.50
49
Carlos Roberto GONÇALVES, Responsabilidade civil, de acordo com o novo Código Civil, p.268.
50
Ibid., p. 271.
53
O proprietário do imóvel ou de construção é responsável pelos danos
causados pela ruína deles, se comprovado que o respectivo reparo era
evidentemente indispensável, conforme versa o art. 937 do Código Civil.
No entendimento de José de Aguiar Dias,51 na realidade, a base dessa
espécie de responsabilidade não está na culpa. É resultante da presunção de
causalidade, da relação de causa e efeito entre a falta de conservação e a ruína do
prédio, pois, se essa relação não for observada, a responsabilidade não será do
proprietário do imóvel, mas do respectivo construtor, que desatendeu as normas de
segurança de construção do imóvel que vem a desabar.
O morador é responsável pelos danos causados por objetos lançados ou
deixados cair de um imóvel em local indevido, como determina o art. 938 do Código
Civil.
Não resta dúvida de que, em todos os casos em que o responsável pela
indenização não é o próprio agente do ato causador do dano (responsabilidade
indireta), o mesmo poderá ressarcir-se do valor despendido para o pagamento da
indenização devida, através do ajuizamento, contra o causador do dano, de medida
judicial regressiva de ressarcimento do dano sofrido.
Concluindo, de acordo com a teoria da responsabilidade subjetiva
presumida, por substituição ou indireta, para a proteção dos direitos da vítima do
dano causado, considera-se como responsável um terceiro sob cuja égide jurídica
encontra-se o elemento causador do dano: o animal, o edifício ou construção em
ruína, ou o objeto lançado ou caído de lugar indevido.
51
José de Aguiar DIAS. Da responsabilidade civil - ciclo de Conferências sobre o projeto de código
civil. Revista do Advogado, n. 19, p. 36.
54
Nos casos de responsabilidade objetiva, dispensa-se a prova da culpa por
completo, como afirma Miguel Kfouri Neto,52 de modo que a obrigação de indenizar
passa a depender apenas da existência de relação causal (nexo causal) entre o ato
praticado e o dano causado a uma vítima, desprezando-se a análise de
culpabilidade do respectivo agente.
Verifica-se a imputação da responsabilidade objetiva em caso de contratos
de adesão, em que se prejudica a autonomia da vontade das partes contratantes e
exige-se uma contratação de massa, standard, em que uma das partes determina a
forma contratual e a outra não tem outra opção senão aderi-la.
Trata-se de exceção à regra da responsabilidade subjetiva, e aplica-se, por
exemplo, na área de acidentes de trabalho, nas atividades de transportes, de
fornecimento de energia, em alguns casos de omissão de serviços públicos.
Nesse sentido, Adroaldo Leão53 esclarece que a teoria da responsabilidade
objetiva, ou do risco, veio a atender à necessidade de equilibrar-se os interesses
em jogo, nos casos em que se faz indispensável a reparação do dano causado,
independentemente da culpabilidade, com fundamento na moralidade, para atender
a demandas sociais.
O referido autor cita o entendimento de Miguel Reale, autor do dispositivo
do projeto de Código Civil, acerca da responsabilidade civil que deve ter como
norma a responsabilidade subjetiva, baseada na culpabilidade do agente, para fins
de indenização, sendo, excepcionalmente, aplicada a responsabilidade objetiva ao
empreendedor de atividade cuja estrutura de negócios envolve certos riscos, a ela
inerentes, e concede, de outra parte, exclusivamente ao próprio empreendedor,
certo proveito econômico.
A responsabilização objetiva pode ser fundamentada na possibilidade do
agente absorver, como bem esclarece Fábio Ulhoa Coelho,54 as repercussões
econômicas vinculadas ao evento danoso, dado que o mesmo, em sua atividade
econômica, repassa o custo de uma possível indenização a ser exigida de sua
pessoa, para as pessoas que, em conjunto, são beneficiadas pela atividade
econômica desenvolvida, razão pela qual elas estão, também, e por outro lado,
expostas ao risco e aos danos eventualmente causados pela referida atividade. Em
52
Miguel KFOURI NETO. Responsabilidade civil do médico. 5. ed. São Paulo: RT, 2003, p. 62.
53
Adroaldo LEÃO, A responsabilidade civil dos administradores das empresas, p. 76.
54
Fábio Ulhoa COELHO. Curso de direito comercial, p. 258.
55
resumo, o empresário tem condições, pela atividade que desenvolve, de distribuir o
valor de possível prejuízo, a ser ressarcido em favor daqueles expostos ao evento
danoso que eventualmente seja causado pelo exercício de sua atividade.
Na verdade, tendo em vista a socialização, pela sociedade empreendedora
da atividade, das conseqüências advindas do dano causado pela atividade
desenvolvida e, em especial, da indenização a ser paga às respectivas vítimas ou
aos seus parentes, o referido empreendedor arrisca-se a assumir,
independentemente de culpa, tal pagamento de indenização.
Não resta dúvida de que, distribuindo entre os beneficiados com a
atividade econômica desenvolvida os respectivos custos e, assim, as repercussões
danosas dela advindas, o agente dispõe de meios de realocar suas perdas. Desse
modo, justifica-se a assunção, pelo mesmo, de responsabilidade pelos danos
causados em função da atividade desenvolvida, independentemente da análise da
culpabilidade envolvida em sua conduta.
Verifica-se, desse modo, que na sociedade moderna há casos de
socialização do custo dos riscos e, assim, dos efeitos dos danos sofridos, entre
aqueles aos quais é proporcionado certo conforto, utilidade ou prazer pelo desfrute
de certa atividade econômica desenvolvida por terceiros. Socializado entre os
consumidores, por exemplo, o custo do risco assumido pelo empreendedor de certa
atividade econômica, deve o mesmo responder pelos danos causados pelo
exercício da mesma, independentemente de culpa.
É o que dispõe o art. 927, parágrafo único, do Código Civil:
56
A responsabilidade objetiva da sociedade empresária também está
prevista em outro dispositivo do Código Civil, qual seja, o art. 931, que determina
que, ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais
e as empresas respondem, independentemente de culpa, pelos danos causados
pelos produtos postos em circulação.
Nesse sentido, a obrigação do fornecedor de bens e serviços de reparar os
danos causados ao consumidor pelos defeitos havidos dos bens e serviços
fornecidos, independentemente de culpa, já constava do Código de Defesa do
55
Consumidor (CDC), no seus arts. 12, 14 e 18, na mesma linha de pensamento
55
“Código Defesa Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem,
independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos
consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas,
manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
§ 1º O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera,
levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – sua apresentação;
II – o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III – a época em que foi colocado em circulação.
§ 2º O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido
colocado no mercado.
§ 3º O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando
provar:
I – que não colocou o produto no mercado;
II – que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;
III – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
(...)
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços,
bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar,
levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – o modo de seu fornecimento;
II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III – a época em que foi fornecido.
§ 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas.
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I – que, tendo
prestado o serviço, o defeito inexiste; II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
§ 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de
culpa.
(...)
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem
solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados
ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da
57
apresentada pelo Código Civil, de modo a entender-se que a responsabilidade da
empresa perante o mercado consumidor é objetiva.
No mesmo sentido, é dever da sociedade empresária, que explora
indústria insalubre, indenizar os danos por ela causados, mesmo que não
decorrentes de ato ilícito, como determina o parágrafo único do art. 927, do Código
Civil, vez que o valor da indenização devida é constantemente repassado para o
preço dos produtos e serviços fornecidos pela mesma.
O Código Civil adotou o fundamento da responsabilidade objetiva com
relação às sociedades e aos empresários individuais, no sentido de que o risco
advindo do exercício de uma atividade econômica, assumido por uma sociedade ou
por um empresário individual, deve vincular-se, para fins de responsabilização, aos
danos materiais e/ou morais causados a terceiros, desde que comprovado o nexo
de causalidade entre a respectiva conduta e o dano causado, independentemente
da culpa do agente, atentando-se, entretanto, para o fato de que a culpa da vítima,
58
se exclusiva, afasta a responsabilidade da sociedade ou do empresário individual,
e, se concorrente, reduz o valor da indenização devida pelo causador do dano.
O Código Civil, nos arts. 927, parágrafo único, e 931, confirma a
responsabilidade objetiva do fornecedor do produto ou serviço pela reparação dos
danos causados aos consumidores, por defeitos do fornecimento do produto ou
serviço, como já previa o art. 12 do Código de Defesa do Consumidor, de acordo
com o qual cabe ao fornecedor comprovar, para eximir-se de responsabilidade,
que: (a) não colocou o produto no mercado; (b) embora haja colocado-o, o defeito
inexiste; ou (c) se trata de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Ressaltamos que, ao referir-se a responsabilidade objetiva, o art. 927,
parágrafo único, e o art. 931 do Código Civil fazem menção apenas à sociedade ou
ao empresário individual, e não aos administradores. Os referidos dispositivos
legais trazem a nova tendência do Código Civil, qual seja, a da imputação
excepcional da responsabilidade objetiva à sociedade ou ao empresário individual,
independentemente de culpa: (a) nos casos previstos em lei, (b) caso trate-se de
atividade que implica risco para os direitos de outrem, por sua natureza, e (c) no
que toca aos produtos fornecidos para o consumidor e postos em circulação.
À sociedade ou ao empresário individual aplicar-se-á a responsabilidade
objetiva, pelo fato da assunção do risco do negócio social do qual advém proveito.
Por outro lado, quando o empresário individual atuar no papel de administrador,
caber-lhe-á a condução da gestão da sociedade, assumindo tanto a
responsabilidade objetiva do empresário como a responsabilidade subjetiva,
aplicável ao administrador, pelos atos que praticar e pelos danos materiais e morais
que causar, de forma culposa, sendo distinta a natureza de cada uma: a
responsabilidade do empresário individual advém do risco do negócio e a do
administrador, do respectivo agir culposo.
Concluindo, a responsabilidade objetiva é presumida, não se cogitando de
culpa do agente, ao qual cabe afastar sua obrigação de indenizar a vítima do dano
causado, baseado nos seguintes fundamentos: culpa exclusiva da vítima, caso
fortuito ou força maior, e/ou inexistência de nexo causal entre o ato praticado e o
dano causado.
Com a aplicação da responsabilidade objetiva, ampliou-se a forma de tratar
a responsabilidade pelos danos causados, pois, através dela, penaliza-se o agente,
independentemente de seu agir culposo.
59
A própria teoria da responsabilidade objetiva foi ampliada e, assim, com a
denominação de teoria do risco, estendeu-se aos casos do exercício lícito de
atividades empresariais que envolvam risco, por sua própria natureza.
Como afirma Carlos Alberto Bittar,56 de uma conduta antijurídica chegou-se
à ação legítima, porém arriscada e perigosa, cujo fundamento para a sua aplicação é
simplesmente o fato de que a pessoa que retira proveito dos riscos criados deve
arcar com as respectivas conseqüências, liberando-se, assim, a vítima, normalmente
a comunidade local, efetivamente, da prova da subjetividade, facilitando-lhe a
percepção da indenização devida, desde que comprovado seu pressuposto
fundamental, a presença do nexo causal entre o ato praticado e o dano ocorrido, pelo
infortúnio dos acidentes de trabalho e das atividades de risco, causadoras de graves
danos a valores fundamentais da humanidade, à saúde e até à vida.
56
Carlos Alberto BITTAR, Responsabilidade civil: teoria e prática. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2001. p. 41.
57
Sérgio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 84-85.
60
culpa exclusiva do consumidor, no seu art. 12, parágrafo 3º, III, e no seu art 14,
parágrafo 3º, II.
No que toca ao ato exclusivo de terceiro, deve-se esclarecer que o mesmo
é considerado aquele que não tem qualquer relação com o agente do ato nem com
a vítima. Trata-se de causa estranha à conduta do suposto agente, e é considerada
inevitável e imprevisível. Da mesma forma que o ato exclusivo da vítima, o ato
exclusivo de terceiro encontra-se disciplinado no Código de Defesa do Consumidor
(CDC) como causa excludente de responsabilidade do agente, no seu art. 12,
parágrafo 3º, III, e 14, parágrafo 3º, II.
Por outro lado, de acordo com o disposto no art. 393 do Código Civil, o
devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, a
não ser na hipótese em que houver declarado, expressamente, que os assumiria. O
parágrafo único do mesmo dispositivo determina que o caso fortuito ou de força
maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos, não era possível evitar ou
impedir, dado que escapa a toda diligência e é absolutamente estranho à vontade
do devedor da obrigação. Segundo Sergio Cavalieri,58 o caso fortuito envolve
evento imprevisível, por isso, inevitável. Por outro lado, a força maior envolve
acontecimento previsível, mas inevitável, vez que, superior às forças do agente,
como o são as forças da natureza. O caso fortuito e a força maior excluem o nexo
causal por constituírem causas estranhas à conduta do agente causador do evento
danoso.
No que toca à responsabilidade objetiva, deve-se esclarecer que a mesma
depende da configuração de um nexo causal entre o ato do agente e o dano
causado.
O fato imprevisível, denominado fortuito interno, ocorrido no exercício da
atividade do empresário, não afasta a responsabilidade do empresário, dado que
vinculado ao risco do empreendimento. A responsabilidade objetiva do empresário
só é excluída quando comprovada a inexistência de defeitos no produto e quando o
dano for causado diretamente por ato exclusivo da vítima ou de terceiro, ou seja,
pela conduta inadequada de qualquer deles.
58
Sérgio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 82-83.
61
Sergio Cavalieri Filho59 ainda menciona outra excludente de
responsabilidade do empresário: é a que consiste no risco do desenvolvimento,
definido por Antonio Herman Vasconcellos e Benjamin como sendo o risco que não
pode ser cientificamente conhecido no momento do lançamento do produto no
mercado, verificado somente depois de certo tempo de uso do produto ou do
serviço. Na época do lançamento do produto ou do serviço, esse defeito era
desconhecido e imprevisível, dado o conhecimento tecnológico da época. Esse fato
tem ocorrido com medicamentos lançados no mercado e, depois, retirados, por
problemas causados aos usuários. Apesar da controvérsia envolvendo a
responsabilização por esses problemas, entende-se que se trata de fortuito interno,
envolvendo o risco da atividade do fornecedor e, assim, de responsabilidade do
empresário. Como afirma José Reinaldo de Lima Lopes,60 o risco da inovação corre
por conta do fabricante.
59
Sérgio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 183.
60
José Reinaldo de Lima LOPES, Responsabilidade civil do fabricante e a defesa do consumidor, p.
109.
62
5 . RESPONSABILIDADE DO ADMINISTRADOR DAS SOCIEDADES ANÔNIMAS
61
Egberto Lacerda TEIXEIRA, Sociedades por quotas. São Paulo: Max Limonad, 1956.
63
responde pelos atos ilícitos praticados pelos diretores ou em desacordo com a lei e
o Estatuto Social.
De acordo com a teoria da aparência, prevista no art. 1.015 do Código
Civil, e salvo exceções, todos os atos praticados pelos administradores são atos da
companhia, não havendo dualidade entre a vontade da companhia e a do
administrador, que corporifica a vontade social. Assim, a companhia, e não os
administradores, será obrigada a responder, perante terceiros, pelos atos ilícitos
praticados pelos respectivos administradores, restando-lhe, porém, o direito de agir
regressivamente contra o administrador, para ressarcir-se, reavendo as perdas e
danos sofridos pela mesma.
62
Paulo Fernando Campos Sales de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade anônima:
estrutura, funções e poderes, responsabilidades dos administradores. São Paulo: Atlas, 1999, p 67.
64
corporificando a vontade social. O administrador representa, então, a sociedade,
obrigando-a, quando pratica atos regulares de gestão, como afirma o referido
autor.63
Caberá, então, à companhia ressarcir-se, junto ao administrador
considerado pessoalmente responsável pelo ato ilícito praticado com culpa, dos
danos causados-lhe pelo mesmo.
Cometendo ato ilícito, e causando dano, material ou moral, o administrador
responsabiliza-se pela indenização do respectivo prejuízo para o lesado, qual seja,
a sociedade, os respectivos acionistas ou terceiros.
Presume-se que o descumprimento, pelo administrador, da lei ou dos
Estatutos Sociais, sempre causa prejuízo, mesmo que, de fato, não cause dano
material efetivo à sociedade.
Tais prejuízos podem afetar a estrutura organizacional da sociedade, não
sendo quantificável pela empresa, mas, ainda assim, não perderão sua
configuração, razão pela qual os administradores responsabilizar-se-ão pelos
mesmos, qualquer que seja a forma que tal responsabilidade venha a se
manifestar: pela perda do cargo, por sanção administrativa interna, dentre outras.
63
Paulo Fernando Campos Sales de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade anônima,
p. 67.
65
previsão específica no respectivo Contrato Social e de omissão, acerca da matéria,
nas disposições do Código Civil, referentes às sociedades limitadas às sociedades
simples, conforme o disposto no art. 1.053, parágrafo único, do Código Civil, ou,
ainda, de forma analógica, para suprir lacunas da legislação aplicável, como bem
esclarece Fábio Ulhoa Coelho.64
A sociedade de economia mista é integrante da Administração indireta do
Estado. Assim, a referida sociedade deve atender ao disposto no parágrafo sexto
do art. 37 da Constituição Federal,65 no sentido de que é responsável direta pelos
danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o
direito da sociedade de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa.
A responsabilidade da sociedade de economia mista, mas não do administrador,
nesse caso, é objetiva, pois o dever de indenizar terceiros pelo dano causado
independe de culpa da sociedade.
64
Fábio Ulhoa COELHO, A sociedade limitada no novo Código Civil, p. 21-22.
65
Constituição Federal:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada ao caput pela
Emenda Constitucional n. 19/98)
(...)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços
públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,
assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
66
Trajano de Miranda VALVERDE, Sociedade por ações. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1953, v. II,
p. 317.
66
obrigações contraídas em nome da sociedade e por atos regulares de gestão (art.
121 e seguintes do Decreto-lei n. 2.627/40) .
O art. 121 do referido diploma legal determinava, nesse sentido, a
irresponsabilidade pessoal dos diretores pelas obrigações contraídas em nome da
sociedade e em virtude de ato regular de gestão. A responsabilidade era da pessoa
jurídica que se obrigava ao relacionar-se com terceiros. No parágrafo primeiro,
determinava-se que os diretores seriam responsáveis pelos prejuízos causados,
quando procedessem com culpa ou dolo, dentro de suas atribuições ou poderes, ou
com violação da lei ou dos estatutos. Trajano de Miranda Valverde menciona em
sua magnífica obra67 que os diretores não poderiam escusar-se de não conhecer a
lei ou os estatutos da sociedade, razão pela qual tal infração parecia-lhe mais
grave, merecendo tratamento mais severo, cabendo, entretanto, ao juiz, o poder de
apreciar, sob todos os aspectos, a conduta do diretor, para decidir sobre a
respectiva obrigação de reparar os prejuízos causados para a empresa. Segundo o
referido autor, a responsabilidade civil do diretor dependia do nexo causal entre o
ato ilícito praticado e o prejuízo sofrido pela empresa, devendo a reparação deles
ser, tanto quanto possível, integral.
O Decreto-lei n. 2.627/40 determinava, ainda, no seu art. 122, a
responsabilidade solidária dos diretores pelos prejuízos causados, pelo não-
cumprimento das obrigações ou deveres impostos pela lei, a fim de assegurar o
funcionamento normal da sociedade, ainda que, pelos estatutos, tais deveres ou
obrigações não coubessem a todos os diretores. Trajano de Miranda Valverde
mencionava que a solidariedade deveria ser entendida como uma exceção à regra da
responsabilidade individual dos diretores. A solidariedade entre eles aplicava-se, no
entender do ilustre doutrinador,68 apenas quando eram atribuídas aos diretores,
indistintamente, as mesmas obrigações e deveres, pela lei ou pelo Estatuto.
O atual diploma legal acerca das S.As., Lei n. 6.404/76, com suas
alterações subseqüentes, manteve a estrutura básica da responsabilidade civil dos
67
Trajano de Miranda VALVERDE, Sociedades por ações, v. II, p. 317-327.
67
administradores das S.As., ao estabelecer, no seu art. 158 da lei das S.As., abaixo
transcrito, que o administrador das S.As. pode ser considerado responsável pelos
prejuízos que causar quando em decorrência da prática de ato ilícito, com culpa ou
dolo, ou pela violação da lei ou do Estatuto, tal como quando em desobediência aos
respectivos deveres, a que se referem os arts. 153 a 157 da Lei das S.As.:
"Art. 158. O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que contrair
em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém, civilmente,
pelos prejuízos que causar, quando proceder:
I - dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo;
II - com violação da lei ou do estatuto.”69
68
Trajano de Miranda VALVERDE, Sociedades por ações, v. II, p. 326-327.
69
Art. 158 da Lei das SAs:
“(...)
§ 1º O administrador não é responsável por atos ilícitos de outros administradores, salvo se com
eles for conivente, se negligenciar em descobri-los ou se, deles tendo conhecimento, deixar de
agir para impedir a sua prática. Exime-se de responsabilidade o administrador dissidente que faça
consignar sua divergência em ata de reunião do órgão de administração ou, não sendo possível,
dela dê ciência imediata e por escrito ao órgão da administração, ao Conselho Fiscal, se em
funcionamento, ou à assembléia geral.
§ 2º Os administradores são solidariamente responsáveis pelos prejuízos causados em virtude do
não-cumprimento dos deveres impostos por lei para assegurar o funcionamento normal da
companhia, ainda que, pelo estatuto, tais deveres não caibam a todos eles.
§ 3º Nas companhias abertas, a responsabilidade de que trata o § 2º ficará restrita, ressalvado o
disposto no § 4º, aos administradores que, por disposição do estatuto tenham atribuição específica
de dar cumprimento àqueles deveres.
§ 4º O administrador que, tendo conhecimento do não-cumprimento desses deveres por seu
predecessor, ou pelo administrador competente nos termos do § 3º, deixar de comunicar o fato à
assembléia geral, tornar-se-á por ele solidariamente responsável.
§ 5º Responderá solidariamente com o administrador quem, com o fim de obter vantagem para si
ou para outrem, concorrer para a prática de ato com violação da lei ou do estatuto."
Art. 158 da Lei das S.as.: O administrador não é pessoalmente responsável pelas obrigações que
contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular de gestão; responde, porém,
civilmente, pelos prejuízos que causar, quando proceder:
I – dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo;
II – com violação da lei ou do estatuto.
70
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, p. 260.
68
é subjetiva, pois não há exceção à regra geral da responsabilidade civil, prevista no
art. 927 do Código Civil, que seja aplicável aos administradores das sociedades:
“Art. 927 – Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único – Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos
casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do
dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
71
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, p. 249-250.
69
responsabilidade dos administradores com relação à violação da lei ou do Estatuto
também é do tipo subjetiva clássica.
O referido autor fundamenta a sua posição, através do estudo da teoria
geral da responsabilidade civil, que envolve quatro sistemas, no seu entendimento:
o da responsabilidade subjetiva clássica, considerado a regra geral, prevista no art.
927 do Código Civil, envolvendo o ato ilícito, o dano causado, e o nexo de
causalidade havido entre eles, excluindo-se a culpa do agente nas hipóteses de
caso fortuito ou de força maior. Deve-se mencionar, em seguida, o segundo
sistema de responsabilidade civil subjetiva: com presunção de culpa, em que a
distinção do sistema anterior baseia-se apenas na questão processual envolvendo
o ônus da prova, em que cabe ao demandado o dever de provar que não praticou
ato ilícito, com culpa. Ambos os sistemas de responsabilidade subjetiva têm a
culpa como fundamento. A conduta culposa é aquela que pode ser evitada pelo
agente, e causar um dano configura-se como uma opção dele.
O terceiro sistema de responsabilidade civil, como menciona o autor, é o
da responsabilidade objetiva, que, como o da responsabilidade subjetiva com
presunção de culpa, foi desenvolvido para abrigar valores de justiça que
determinavam a facilitação do ressarcimento dos prejuízos causados à vítima de
danos advindos da prática de atos ilícitos. A responsabilização do agente, nesse
caso, independe da ilicitude do ato praticado, dependendo, tão somente, do nexo
causal entre o ato e o dano. A responsabilidade objetiva fundamenta-se, segundo
o autor, não no risco incorrido pelo empresário para desenvolver uma atividade,
que é próprio dela, como um todo, não permitindo que se estabeleçam critérios
distintivos de responsabilidade objetiva ou subjetiva do empresário, mas, na
condição do responsável pela indenização de repartir o valor da mesma, e realocar
as perdas sofridas, entre aqueles que, apesar de estarem expostos ao evento
danoso, também se beneficiam da atividade econômica causadora do dano.
Exemplos disso são os consumidores, com relação aos fornecedores de produtos e
serviços, por acidentes de consumo; e os empregados, com relação ao INSS, por
acidentes de trabalho.
Essa fundamentação do citado autor com relação à responsabilidade
objetiva difere da fundamentação de outros autores acima mencionados,
consubstanciada na teoria do risco. Na verdade, podemos entender que a
justificativa da teoria da responsabilidade objetiva baseada no risco complementa-
70
se com a sua explicação baseada na condição do empresário de realocar, entre os
beneficiários de seus produtos ou serviços, as perdas causadas-lhes pelo
fornecimento desses produtos ou serviços quando causadores de danos. A
ocorrência de um dano é o risco assumido pelo empresário que, assim, estratégica
e previamente, reparte o prejuízo eventualmente advindo desse fato entre os
potenciais beneficiários deles, compondo o preço do fornecimento com um
complemento, como se constituindo um fundo de reserva, ou um seguro contra
acidentes ou danos causados, para suportar o pagamento de indenizações que
eventualmente sejam consideradas devidas. Assim, entendemos que se conciliam
as duas formas de justificar a teoria da responsabilidade objetiva.
O autor mencionado ainda considera a existência de um quarto sistema: o
da responsabilidade objetiva pura, desenvolvido para assegurar a indenização às
vítimas de eventos que envolvam danos de maior repercussão, afetando aspectos
econômicos e sociais relevantes, através de contratação obrigatória de seguro.
Nesse sistema, a relação de nexo causal entre o ato causador do dano e o próprio
dano ocorrido perde a relevância. Por força dessa relação securitária, a
indenização é paga para a vítima pelo simples fato dela ser beneficiária de um
seguro e, assim, mesmo nas hipóteses de exclusão de culpa aplicável a outros
sistemas de responsabilidade civil: culpa exclusiva da vítima ou caso fortuito ou
força maior.
Voltando à análise específica da responsabilidade civil dos
administradores, Fábio Ulhoa Coelho72 menciona que considera sua natureza
subjetiva, do tipo clássico, dado que o art. 158 da Lei das S.As. não prevê a
exceção à respectiva regra geral da responsabilidade subjetiva para qualquer das
duas hipóteses de procedimento do administrador previstas nos seus incisos I (agir
dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo) e II (agir com violação
da lei ou do Estatuto).
O fato de constar apenas no inciso I do art. 158 da Lei das S.As., a
expressão “por culpa ou dolo” não significa que se despreza essa condição na
hipótese do inciso II do mesmo dispositivo legal. Prevista a culpa, e não
estabelecida expressamente, por outro lado, a responsabilidade presumida ou a
responsabilidade objetiva, como determina o art. 927, parágrafo único, da Lei das
72
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, p. 259.
71
S.As., não há que se afastar a responsabilidade subjetiva, do tipo clássica, dos
administradores, como regra geral, como mencionado no art. 158 da lei das S.As..
Como há condutas dos administradores que podem ser enquadradas,
simultaneamente, em ambos os dispositivos do art. 158 da Lei das S.As., como:(a)
a prática de ato de violação da lei ou do Estatuto Social e (b) esse ato ser culposo,
por negligência, por exemplo, não há que se falar em sistemas diversos de
responsabilidade dos administradores, relacionados em cada um dos dispositivos
legais mencionados: há uma unicidade entre as duas hipóteses previstas na lei, e,
assim, ambos os dispositivos devem merecer a mesma interpretação, ou seja, de
que se referem ao sistema de responsabilidade subjetiva do tipo clássico.
Conclui-se, assim, que os administradores que causarem danos para a
sociedade, pela prática de ato ilícito, como o descumprimento do seu dever legal,
ou do dever de obedecer ao Estatuto Social, que não deixa de ser um dever legal,
de forma culposa, deverão indenizar a sociedade do prejuízo causado.
Nesse sentido, podemos citar a seguinte jurisprudência:
Não seria razoável estabelecer que para dois atos da mesma natureza –
infração do dever legal, a lei previsse dois sistemas de responsabilização diferentes
para os administradores: um baseado na responsabilidade subjetiva e outro na
responsabilidade objetiva. E mais: não seria possível aplicar a responsabilidade
objetiva para o administrador, se a própria Lei das S.As., no seu art. 158, não
previu essa exceção à regra geral da responsabilidade subjetiva, como o exige o
disposto no art. 927, parágrafo único, do Código Civil.
72
Deve-se ressaltar, ainda, o fato de que, como acima mencionado, a
responsabilidade objetiva decorre da capacidade do empresário, dada a posição
econômica que ocupa, de socializar as perdas advindas de eventual indenização
que seja obrigado a pagar para vítimas de danos causados pelo exercício de sua
atividade econômica, realocando-as para os beneficiários últimos da sua produção
ou prestação de serviços.
O administrador, de outra parte, não tem essa capacidade de distribuir,
entre as pessoas expostas ao evento danoso, o valor do ressarcimento do prejuízo
causado à sociedade, razão pela qual não se tem como justificar qualquer
responsabilização de sua parte, independentemente de culpa. O administrador não
tem como destinar parcela de seu ganho para assegurar-se de tais eventuais
perdas, vez que o seu ganho não se confunde com o da sociedade: consiste
apenas na sua remuneração.
Fran Martins73 também considera a responsabilidade dos administradores
como subjetiva: ela é aplicável quando o administrador, na gestão da empresa,
pratica atos que ultrapassem os limites fixados pelo objeto social da empresa,
delineado no respectivo Contrato Social, em prejuízo ao interesse da sociedade.
Por outro lado, mesmo os atos praticados dentro dos limites fixados pela lei e pelo
Estatuto Social, porém com culpa ou dolo, ou com violação da lei ou do Estatuto
Social, desvirtuando o interesse social, e beneficiando o administrador ou terceiros,
e causando prejuízos para a sociedade, são puníveis.
A responsabilidade do administrador é pessoal quando ele age além dos
poderes e atribuições de representação da sociedade que a lei e/ou o Estatuto
Social lhe conferem, razão pela qual deve reparar os danos causados por seus
atos, perante a sociedade e perante os terceiros prejudicados.
O ato ilícito praticado pelo administrador pode ser do tipo ação ou omissão,
como determina o art. 186 do Código Civil, razão pela qual o mesmo deve agir
sempre de forma pró ativa para afastar qualquer dúvida acerca de sua negligência
em tentar evitar a prática de ato ilícito praticado por outro gestor da empresa, o que
seria considerado um ato de conivência e solidariedade, com relação ao infrator.
O referido autor entende que a lei presume a responsabilidade do
administrador pela prática de atos ilícitos omissivos, sendo o administrador
73
Fran MARTINS, Comentários à lei das sociedades anônimas. Rio de Janeiro: Forense, 1978,
p. 404.
73
obrigado a demonstrar, para afastar a sua responsabilidade, que não foi conivente
com o ato ilícito alheio. Essa comprovação pode ser obtida através da ata de
reunião da Diretoria ou do Conselho de Administração, em que se configure a
dissidência do administrador à deliberação tomada pelo órgão. Na falta dessa ata, o
que não é a regra, a lei permite ao administrador comunicar sua dissidência à
deliberação tomada, de imediato, por escrito, ao órgão de administração, ao
Conselho Fiscal, se em funcionamento, ou à Assembléia Geral.
No nosso entendimento, a responsabilidade dos administradores não é
presumida, pois os atos de gestão praticados pelos diretores, na qualidade de
representantes legais da empresa, são individuais, e não coletivos, dado que a
Diretoria é um órgão da administração da empresa não colegiado. As decisões
tomadas pela Diretoria dependem de quorum deliberativo, de modo que não se
pode presumir que um diretor tenha concordado com certa deliberação, quando seu
voto é vencido.
Assim, não se pode admitir que a responsabilidade dos administradores
seja presumidamente solidária, assumindo cada um deles a responsabilidade pelos
atos ilícitos praticados por qualquer outro.
O próprio art. 158, parágrafo primeiro, da Lei das S.As. determina que a
responsabilidade dos administradores é individual, sendo a culpa de cada
administrador incomunicável aos demais, salvo excepcionalmente em caso de
conivência ou de negligência em verificar a prática de atos ilícitos ou de omissão
para impedir a sua prática.
O ato omissivo, da mesma forma que o ato comissivo, reveste-se de culpa
do administrador, como determina o art. 186 do Código Civil, acima mencionado,
razão pela qual se impõe a responsabilidade subjetiva do administrador também
quando da prática de atos omissivos.
Se a regra da lei é a responsabilidade individual do administrador, sendo a
solidariedade tratada como exceção pelo art 158, parágrafo único, da Lei das S.As.,
não há que se falar, no nosso entendimento, em responsabilidade presumida do
administrador.
Mesmo no caso dos membros do Conselho de Administração, órgão de
deliberação colegiada, cuja eficácia da manifestação de vontade dos respectivos
membros fundamenta-se no fato da responsabilidade pelas deliberações tomadas
ser coletiva, não é presumidamente solidária, para fins de reparação dos danos
74
causados em virtude da atuação coletiva do órgão, dado que também se aplica aos
membros do Conselho de Administração, na qualidade de administradores, o
disposto no art. 158, parágrafo primeiro, da Lei das S.As., acima mencionado, que
trata a responsabilidade solidária dos administradores como exceção à regra da
respectiva responsabilidade individual.
Nesse sentido, Vanessa Ramalhete Santos Neves74 afirma que a
responsabilidade dos membros do Conselho de Administração não é solidária,
dado que a solidariedade não se presume, mas decorre apenas da vontade das
partes ou de disposição de lei, conforme o disposto no art. 265 do Código Civil.
Assim, não cabe à sociedade exigir de todo e qualquer um dos membros do
Conselho de Administração o ressarcimento pelos danos causados pela prática de
atos ilícitos por um deles.
O membro do Conselho de Administração dissidente da deliberação
tomada pelo órgão tem como evidenciar sua discordância com a mesma e sua
opinião contrária à dos demais membros que tenha prevalecido como deliberação
do órgão. Isso pode ser formalizado através da ata de reunião do órgão, e, se isso
não for possível, como determina a própria Lei das S.As., no seu art. 158, parágrafo
primeiro, através de ciência ao órgão de administração, ao Conselho Fiscal, se em
funcionamento, ou à Assembléia Geral.
Como determina o art. 158, parágrafos primeiro e segundo da Lei das
S.As., a solidariedade dos administradores advém da omissão do cumprimento, por
qualquer deles, de seus deveres de lealdade, de diligência e de informar. Assim, a
solidariedade de um administrador pelos atos ilícitos praticados por outro deles
pode ser considerada uma forma de punição do administrador pela infração, por si
próprio praticada, por conta, inclusive, de sua omissão, de seu dever de lealdade,
de diligência e de informar.
Isso significa que o administrador que não praticou o ato ilícito não está
sendo responsabilizado por solidariedade ao outro que o praticou, mas por infração
de seu próprio dever legal de administrador de ser leal, diligente e de informar à
companhia os atos ilícitos praticados pelos demais administradores.
Por essa razão, entendemos que a responsabilidade do administrador
depende da efetiva prática de ato culposo, omissivo ou comissivo, razão pela qual
74
Vanessa Ramalhete Santos NEVES, Responsabilidade dos administradores de sociedades
anônimas, p. 94.
75
não consiste em presunção, mas em uma realidade. A infração dos deveres legais
dos administradores é um fato e não uma presunção, e é no não cumprimento
deles que está baseada a responsabilização do administrador.
Sendo assim, qualquer que seja o administrador, diretor ou membro do
Conselho de Administração, sua responsabilidade pelos atos ilícitos praticados
deverá ser considerada, no nosso entendimento, como regra geral, subjetiva, e não
subjetiva presumida ou objetiva.
Nessa linha de raciocínio, deve-se ressaltar que os administradores que
violam a lei ou o Estatuto Social (ou o Contrato Social, quando se tratar de
sociedade limitada) e que, no cumprimento do seu mandato, atuam com excesso
de poderes, de forma culposa, assumem responsabilidade subjetiva pelo
ressarcimento do prejuízo causado para a sociedade ou terceiros, a despeito da
respectiva boa-fé, como bem menciona Attila de Souza Leão Andrade Jr. 75
Assim, exemplificativamente, o administrador que não efetua o pagamento
dos tributos devidos pela sociedade, apesar da sociedade deter ativos suficientes
para tanto, deixou de cumprir um dever que a sociedade lhe confiou e, assim, é
responsável pelos prejuízos causados à mesma, porque agiu culposamente.
Por outro lado, se a sociedade não tem condições financeiras para tanto, e
o administrador, por essa razão, deixa de efetuar o pagamento dos impostos
devidos, o administrador não é responsabilizado, dado que não agiu com culpa, vez
que não se pode esperar que o administrador efetue o pagamento dos impostos
devidos pela sociedade com os seus próprios recursos. Nesse caso, o
administrador, para eximir-se de responsabilidade por omissão, acerca do problema
havido, deve levá-lo ao conhecimento do Conselho de Administração da mesma ou
da Assembléia Geral dos acionistas (ou quotistas, se for o caso de uma sociedade
limitada) que deliberará sobre o tema e orientará o administrador a como proceder.
A pessoa jurídica da companhia não se confunde com a pessoa física de
seus administradores, de modo que cada um mantém a sua independência,
inclusive patrimonial, ressalvado o caso mencionado no art. 158 da Lei das S.As.,
que determina que, apesar do administrador não ser pessoalmente responsável
pelas obrigações que contrair em nome da sociedade e em virtude de ato regular
75
Attila de Souza Leão ANDRADE JUNIOR, Direito das sociedades. In: ALVIM, Arruda; ALVIM,
Thereza (Coords.), Comentários ao novo Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. 6. p. 108.
76
de gestão, responde, porém, civilmente, pelos prejuízos que causar quando
proceder, culposamente, em descumprimento do dever legal.76
Nesse sentido, transcrevemos abaixo77 decisão do Superior Tribunal de
Justiça que tem sido confirmada em todos os casos, envolvendo a responsabilidade
civil e tributária dos administradores, que não respondem pessoalmente pelas
dívidas e demais obrigações contraídas pela sociedade, mas apenas em caso da
prática de atos ilícitos, culposos, com excesso de poderes, em violação à lei e ao
Estatuto Social (art. 158, incisos I e II, da Lei n. 6.404/76).
Como afirma Adroaldo Leão,78 a responsabilidade civil do administrador
para com terceiros é de natureza subjetiva. Essa é a orientação doutrinária
predominante e embasada na Lei das S.As. vigente no Brasil, que entende como
cabível a responsabilização do administrador, em regra geral, por culpa, em caso
de prática de ato ilícito causador de dano material e/ou moral para terceiros.
76
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, p. 260.
77
"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE DEU
PROVIMENTO A RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO FISCAL – RESPONSABILIDADE DE SÓCIO
GERENTE – LIMITES – ART. 135, III – DO CTN – PRECEDENTES.
1. Agravo regimental interposto contra decisão que, com base na jurisprudência remansosa desta
Casa, deu provimento ao recurso especial intentado pela parte ora agravada.
2. Cuida o presente caso de se buscar definição acerca da possibilidade de se cobrar
integralmente de ex-sócio de uma empresa tributo por ela não recolhido, quando o mesmo já não
exercia mais atos de administração da mesma, reclamando-se ofensa ao art. 135, do CTN.
3. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica comercial não respondem, em caráter solidário, por
dívidas fiscais assumidas pela sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente,
administrador, diretor ou equivalente só se caracteriza quando há dissolução irregular da
sociedade ou se comprova infração à Lei praticada pelo dirigente.
4. Em qualquer espécie de sociedade comercial, é o patrimônio social que responde sempre e
integralmente pelas dívidas sociais. Os diretores não respondem pessoalmente pelas obrigações
contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidária e
ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do estatuto ou Lei
(art. 158, I e II, da Lei n. 6.404/76). (grifado)
5. De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os sócios (diretores, gerentes ou
representantes da pessoa jurídica) são responsáveis, por substituição, pelos créditos
correspondentes a obrigação tributárias resultantes da prática de ato ou fato eivado de excesso de
poderes ou com infração de Lei, Contrato Social ou estatutos, nos termos do art. 135, III, do CTN.
6. O simples inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha
agido com excesso de poderes, ou infração de Contrato Social ou estatutos, não há falar-se em
responsabilidade tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal. Inexistência de
responsabilidade tributária do ex-sócio.
7. Precedentes desta Corte Superior.
8. Agravo regimental improvido."
STJ – Primeira Turma – AGRESP – 247862/SP – Registro: 200000122173 – DJ – 19/06/2000 –
Relator: Min. José Delgado.
78
Adroaldo LEÃO, A responsabilidade civil dos administradores de empresas. Rio de Janeiro:
Forense, 1988, p. 34.
77
O referido autor entende que a responsabilidade subjetiva do administrador
deve ser excepcionada na hipótese de lesão à comunidade.79 Nesse sentido,
estabelece que o direito brasileiro admite a existência de três categorias de
responsabilidade: (a) teoria subjetiva ou contratual, baseada na culpa; (b) teoria da
culpa extracontratual, presumida, que envolve a inversão do ônus da prova; e (c)
teoria objetiva, como exceção, de caráter coletivo. Segundo o autor,80 o
denominador comum entre a teoria da culpa presumida e a teoria objetiva é o fato
de que caberá à vítima demonstrar apenas o nexo causal havido entre o ato ilícito
praticado e o dano causado-lhe, mas não a culpabilidade do agente. A teoria
objetiva aplica-se às empresas públicas e à sociedade de economia mista que
prestem serviço público,81 e é especialmente aplicável nos casos de contratação
em massa, quando a autonomia da vontade é prejudicada. O autor sustenta,82 para
finalizar, que o ressarcimento dos danos causados, nesse caso, pode ser garantido
através da contratação de seguro obrigatório pelas empresas, originalmente
utilizado nos países avançados, em favor de seus empregados e de terceiros
expostos aos riscos criados pelo exercício da atividade empresarial.
Considera-se ato ilícito aquele praticado pelo administrador das S.As.
dentro de suas atribuições e poderes, porém, com culpa ou dolo, ou seja, com
abuso ou desvio de poder. O ato ilícito praticado pelo administrador poderá causar
dano material e/ou moral para a companhia, para o acionista, e/ou para terceiros.
Para o perfeito entendimento dos casos em que os administradores
passam a ser civilmente responsáveis pelos atos praticados em nome da sociedade
que representam, torna-se necessário esclarecer: a) quais as condutas ilícitas
(culposas) dos administradores; e b) quais os casos de violação da lei e do Estatuto
Social.
As condutas ilícitas (culposas) praticadas pelos administradores são as
causadas por negligência, imperícia ou imprudência. Nesse caso, o administrador
da companhia causador do dano, material e/ou moral, é obrigado a ressarcir os
prejuízos causados à companhia.
79
Ibid., p.36.
80
Ibid., p. 74.
81
Ibid., p. 106.
82
Ibid., p. 84.
78
Para considerar-se que certo administrador agiu com culpa, faz-se
necessário verificar se agiu dentro dos padrões de conduta de gestores, geralmente
aceitos na condução das companhias: a) do mesmo tipo: aberta ou fechada; b) do
mesmo ramo de atividade; e c) da mesma dimensão e grau de profissionalização.
Também são analisadas, nesse caso, as funções dos diretores e dos membros do
Conselho de Administração da sociedade. Se a conclusão for no sentido de que o
administrador agiu com desídia, deslealdade, abuso ou desvio de poder, faltando
com seus deveres para com a companhia, ou em violação da lei ou do Estatuto
Social, o administrador será considerado culpado pelos atos ilícitos praticados.
A responsabilidade do administrador, em regra, subjetiva, configura-se
quando é possível estabelecer um nexo causal entre o ato ilícito por ele praticado
com culpa, por ação ou omissão, e o dano causado para a sociedade ou para
terceiros.
O não cumprimento do dever legal pelo administrador, de forma culposa,
deverá ser punido, dado que corresponde à prática de ato ilícito, como mencionam
Modesto Carvalhosa e Nilton Latorraca,83 independentemente do prejuízo causado
à companhia.
Entretanto, a responsabilização do administrador está assentada, como
afirma Fábio Ulhoa Coelho,84 em dois pressupostos: descumprimento do dever
legal e prejuízo para a sociedade, acionistas ou terceiros.
Veja-se que se trata de duas hipóteses distintas: a mera infração de um
dever legal, que, por si só, deve ser punida, e a conseqüência da prática do ato
ilícito para a empresa, que, se consistir em prejuízo para a companhia ou para
terceiros, este deve ser ressarcido.
Verifica-se que o Código Civil brasileiro, nos seus arts. 927, parágrafo
único, e 931, prevê a aplicação da responsabilidade objetiva para as empresas e
83
Modesto CARVALHOSA; Ney LATORRACA, Comentários à lei das sociedades anônimas. São
Paulo: Saraiva, 1997, v. 3, p. 309.
84
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, v. 2, p. 258.
79
empresários, nos casos estabelecidos em lei, e para a prática de atividades lícitas,
porém perigosas ou de risco.
A responsabilidade individual e objetiva do empresário, acionista
controlador da sociedade, por abuso de poderes, distingue-se da responsabilidade
da companhia.
O empresário, acionista controlador da companhia, diferentemente dos
respectivos administradores, estabelece as regras e a forma de condução do seu
negócio e, assim, aplica-se ao mesmo responsabilidade objetiva, de acordo com o
disposto no art. 927 e no art. 931 do Novo Código Civil,85 Lei n. 10.406/02 (que
inovou o disposto no art. 159 do Código Civil de 1916), pelos danos causados a
outrem, quando a atividade que desenvolve envolver risco para terceiros, por sua
própria natureza.
Diferentemente dos administradores, aos acionistas cabe, em princípio, a
fixação do objeto social e as deliberações que envolvem a orientação da
companhia, segundo a função social da empresa, e o respeito aos direitos dos que
nela trabalham e da comunidade em que atua, conforme o disposto no art. 116,
parágrafo único, da Lei n. 6.404/76.
Segundo o art. 117 da Lei n. 6.404/76, o acionista controlador também
responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder, inclusive,
se praticados em conluio com os administradores, conforme o disposto no citado
dispositivo legal, no seu parágrafo primeiro, na alínea (e), caso em que a
responsabilidade civil será solidária entre o acionista controlador e o administrador
faltoso.
Além disso, se referido acionista exercer o cargo de administrador ou se for
membro do Conselho Fiscal, também assumirá os deveres e responsabilidades
85
Código Civil :
“art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos
especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as
empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos
em circulação.”
80
próprios do cargo, como dispõe o parágrafo terceiro do art. 11786 da Lei n.
6.404/76.
Nesses casos de prática de ato ilícito pelo acionista controlador da
companhia, a mesma poderá acioná-lo para ressarcir-se dos danos causados pelo
mesmo.
Segundo Paulo Sergio Gomes Alonso,87 a responsabilidade objetiva difere
da subjetiva, porque aquela independe da prática de ato ilícito, mas advém da
prática de ato lícito que envolve risco e perigo. A responsabilidade subjetiva, por
outro lado, tem o ato ilícito e a culpa como elementos essenciais. A
responsabilidade objetiva advém do perigo que a atividade traz para o homem e a
sociedade, cujo risco constitui fonte de obrigação em decorrência de imposição
legal.
86
Art. 117 – Lei das S.As. – :
Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso
de poder.
§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:
a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-
la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos
acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional;
b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou
cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo
dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários
emitidos pela companhia;
c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou
decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas
minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos
pela companhia;
d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente;
e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus
deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua
ratificação pela assembléia geral;
f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha
interesse, em condições de favorecimento ou não eqüitativas.
g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou
deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada
suspeita de irregularidade.
h) subscrever ações, para os fins do disposto no artigo 170, com a realização em bens estranhos
ao objeto social da companhia. (Alínea acrescentada pela Lei n. 9.457, de 05.05.1997)
§ 2º No caso da alínea e do § 1º, o administrador ou fiscal que praticar o ato ilegal responde
solidariamente com o acionista controlador.
§ 3º O acionista controlador que exerce cargo de administrador ou fiscal tem também os deveres e
responsabilidades próprios do cargo.
87
Paulo Sergio Gomes ALONSO, Pressupostos da responsabilidade civil objetiva. São Paulo:
Saraiva, 2000. p. 67.
81
Não resta dúvida de que o perigo existe em qualquer atividade, porém, em
algumas delas, está ínsita essa característica, quer pela sua natureza, como as
fábricas de explosivos, as que utilizam substâncias venenosas, as produtoras de
energia elétrica e as transportadoras de gases, dentre outras, quer pelos meios que
utilizam para o desenvolvimento de sua atividade: as que se servem de máquinas e
aparatos complexos, por exemplo.
Carlos Alberto Bittar,88 da mesma forma, menciona que a responsabilidade
objetiva não envolve necessariamente a prática de ato ilícito, e prescinde da análise
de culpabilidade do agente, mas consubstancia-se pelo mero exercício de
atividades perigosas, tais como a exploração de minas, o uso de energia,
especialmente a nuclear, a utilização de veículos automotores, a industrialização de
bens com o uso de materiais tóxicos, inflamáveis, explosivos, o acionamento de
máquinas e aparatos que envolvem perigo, dentre outras atividades.
Trata-se da responsabilidade das empresas exploradoras de atividades
consideradas lícitas, porém, perigosas, introduzidas na sociedade a partir da
Revolução Industrial, e confirmada com a Revolução Atômica (advinda da
exploração das atividades nucleares e da exploração industrial do átomo), com
base no risco a elas inerente, que afeta a comunidade e que aproveita ao
respectivo empresário.
Por essa razão, a empresa que explora atividade de risco ou perigosa
torna-se responsável pelo simples exercício legítimo da atividade, e, em virtude do
nexo causal havido entre a ação e o resultado danoso, obriga-se a reparar os
danos previsíveis e relacionados com a natureza da atividade desenvolvida,
causados pela mesma, indenizando o lesado, independentemente de qualquer
análise de sua culpabilidade. Nesses casos, responde o patrimônio da sociedade
envolvida que poderá reaver o valor da indenização do causador do dano, desde
que culpado pelo evento.
Há atividades, assim, que envolvem risco acentuado ao homem, à saúde,
e à própria vida, o que já se encontra definido na legislação, com base na doutrina,
nas constatações de fatos e pela análise científica, determinadoras do elemento
perigoso. Há leis especiais, no Brasil, apartadas dos Códigos, acerca das
atividades perigosas. Atualmente, a tendência é exigir da empresa que desenvolve
88
Carlos Alberto BITTAR, Responsabilidade civil: teoria e prática, p. 33.
82
atividades perigosas a obrigatoriedade de garantia prévia para o exercício da
atividade, mediante a contratação de seguro especial.
Além disso, leis especiais sobre responsabilidade civil, em particular
quanto a responsabilidades perigosas, têm tratado da fixação da indenização pelos
danos causados, como, por exemplo, o Código Brasileiro de Aeronáutica (Decreto
n. 32/66), a Lei de Atividades Nucleares (Lei n. 6.453/77), e o Código de Minas
(Decreto-lei n. 1.985/40 alterado pelo Decreto-lei n. 318/67), cabendo sempre ao
Poder Judiciário a fixação do valor da indenização cabível em cada caso.
A jurisprudência, neste particular, é unânime em considerar responsável a
sociedade exploradora de atividade perigosa, causadora do risco e não o
respectivo administrador:
Queda de fio de alta tensão durante temporal – Eletropressão de transeunte que nele tocou
– Inexistência de caso fortuito – Obrigação direta da concessionária do serviço de energia
elétrica pela indenização do dano – (TJSP) (RT 571/101);
Há atividades que não envolvem tanto risco ou, ao menos, envolvem risco
quase que insignificante, tais como: as empresas de prestação de serviços técnicos
ou administrativos, as revendedoras de produtos não perigosos.
A responsabilidade objetiva está baseada no fato de que o empresário
precisa ser alertado para a missão social a ele reservada, sendo apenado em caso
de menosprezo ao princípio constitucional de que a propriedade da empresa, como
a imobiliária, deve atentar para a função social da propriedade, que, junto com
outros princípios, fundamenta a ordem econômica, conforme o art. 170, III, da
Constituição Federal, e que orienta a prevenção e a repressão às infrações contra a
ordem econômica, entre pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado,
como estabelecem os arts. 1 e 15 da Lei n. 8.884/94.
83
Na mesma linha que a legislação brasileira, tem se manifestado a
legislação estrangeira acerca da responsabilidade objetiva do empresário.
A responsabilidade objetiva na Itália está prevista no respectivo Código
Civil, no seu art. 2.050, segundo informa Paulo Sergio Gomes Alonso.89:
“(...) aquele que ocasionar prejuízo a outrem no exercício de uma atividade perigosa, pela
sua natureza ou pela natureza dos meios adotados, ficará obrigado a indenização, se não
provar ter adotado todas as medidas idôneas para evitar o prejuízo.”
Verifica-se, assim, que o Código Civil italiano foi menos rigoroso do que o
brasileiro, tendo admitido a prova liberatória, caso o empresário, responsável pela
atividade perigosa, comprove ter adotado medidas suficientes para evitar e excluir,
de forma razoável e dentro do limite da previsão humana, qualquer possibilidade de
dano, considerando-se, nesse caso, que o mesmo foi causado por força maior, por
fato de terceiros ou por culpa da própria vítima.
De acordo com o Código Civil português, a responsabilização decorre da
prática de atos ilícitos, prevista no art. 483 do respectivo Código Civil, e da prática
de atividade empresarial que envolva risco, prevista no art. 499 e seguintes do
mesmo.
Assim dispõe o art. 483, que admite a responsabilidade subjetiva, baseada
na culpa do agente:
“(...) aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer
disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indenizar o lesado
pelos danos resultantes da violação. Só existe obrigação de indenizar, independentemente
de culpa, nos casos especificados na lei".
89
Paulo Sergio Gomes ALONSO, Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p. 71.
84
de indenizar advindo do exercício de atividade perigosa, e não de ato ilícito do
agente. Como no Brasil, a legislação portuguesa não proíbe a prática de atividade
perigosa, socialmente útil, mas responsabiliza o seu empreendedor pelos danos
eventualmente causados, embora sem culpa, dado que os mesmos obtêm
vantagens e proveitos da sua exploração.
Constituem fonte de responsabilidade objetiva, de acordo com o Código
Civil português, as seguintes atividades: de produção, armazenagem, transporte e
distribuição de energia e de gás; utilização e colisão de veículos; exercício da caça;
atividade industrial, por exemplo, no que toca ao acidente de trabalho etc.
Verifica-se, assim, o entendimento mais corrente, no sentido de que a
responsabilidade do empresário ou do acionista controlador é objetiva em caso de
dano causado à comunidade em que atua a empresa, co-responsável para este
fim, dado que é o empresário que aufere proveito da atividade que decidiu
desenvolver, apesar do risco inerente nela envolvido.
Por outro lado, não se pode afirmar que a responsabilidade do
administrador é comparável à do empresário, cujo papel a desempenhar na
sociedade é bastante distinto.
Desse modo, reiteramos o nosso entendimento de que a responsabilidade
objetiva aplica-se ao empresário, mas, via de regra, não ao administrador,
ressalvadas opiniões contrárias, como a de Modesto Carvalhosa,90 que entende
que a responsabilidade do administrador é presumida, no que toca a prática de atos
dentro de suas atribuições ou poderes, com culpa ou dolo (art. 158, inciso I, da Lei
das S.As.), mas na hipótese de violação da lei ou do Estatuto Social (art. 158,
inciso II, da Lei das S.As.) é objetiva. Na verdade, o autor menciona, inicialmente,
que em ambos os casos previstos no art. 158 da Lei das S.As. a responsabilidade
do administrador é presumida e, mais adiante, em sua análise, estabelece que, no
caso do inciso II do art. 158 da Lei das S.As., a responsabilidade do administrador é
objetiva, o que parece envolver uma contradição.
Como acima mencionado, Modesto Carvalhosa91 entende que a
responsabilidade dos administradores por infração à lei ou ao Estatuto Social,
hipótese prevista no art. 158, inciso II, da Lei das S.As., no que diz respeito ao
funcionamento normal da companhia, é objetiva.
90
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p. 311-317.
85
Nas sociedades fechadas, não tendo os diretores funções distintas, a
responsabilidade do administrador que descumpriu a lei, segundo o referido autor,92
é objetiva e solidária, envolvendo todos e cabendo a cada um comprovar a sua
não-participação na prática do ato ilícito, de modo a requerer o ressarcimento do
valor da indenização devida.
Nas companhias abertas, em que há funções específicas de cada
administrador da companhia, a responsabilidade daquele que praticou o ato ilícito,
segundo o mencionado autor,93 é objetiva, e a dos demais administradores é
subjetiva, dependendo da comprovação da culpa do administrador omisso, caso em
que o administrador omisso é considerado solidariamente responsável pelo ato
ilícito praticado pelo outro. A solidariedade de um administrador ao agente do ato
ilícito deve ser comprovada pela companhia e depende da configuração da conduta
omissiva do administrador solidário, envolvendo conivência ou negligência.
O referido autor explica a responsabilidade objetiva dos administradores
com fundamento no poder que assumem na companhia que representam,
conforme abaixo disposto.
A companhia apresenta-se em situação favorecida, em desigualdade
perante as vítimas dos danos causados. Assim, entende o referido autor, que o
desempenho dos administradores confunde-se com o da própria empresa, segundo
o autor, dado que a assembléia de acionistas não tem acesso aos atos dos
administradores que detêm todos os meios e dados necessários para o exercício
das funções de representação e gestão da companhia, cabendo a eles a função de
operá-los de acordo com os deveres de lealdade, diligência e competência, sem
abuso ou desvio de poderes, na defesa do interesse social, para a realização do
objeto estabelecido no Estatuto Social. Assim, os administradores devem atentar
para a missão social da sociedade e para o seu papel institucional, perante a
comunidade e os respectivos empregados e dependentes.
Sendo assim, o autor mencionado entende que, por força da relação de
poder que o administrador revela perante a companhia e na representação dela, o
mesmo assume a responsabilidade, perante a companhia, pelo descumprimento da
lei e pela negligência na defesa dos interesses sociais e institucionais da
91
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p. 317.
92
Ibid., p. 317.
93
Ibid., p. 317.
86
companhia, bastando demonstrar-se a relação de causalidade entre a ação ou
omissão do administrador e o dano causado para exigir-se do administrador o
ressarcimento dos respectivos prejuízos.
Os atos do administrador que ensejam sua responsabilidade, previstos nos
incisos I e II do art. 158 da Lei das S.As., não se distinguem e envolvem atos de
administração ordinária ou extraordinária, como afirma Modesto Carvalhosa.94
Os atos ditos de acordo com as atribuições e poderes dos administradores,
considerados atos ordinários de administração, praticados de forma culposa,
ensejam a responsabilidade do administrador, como menciona o autor citado
acima. Os atos ordinários de administração são celebrados pelos diretores,
independentemente de deliberação do Conselho de Administração ou da
Assembléia Geral. Por outro lado, os atos ordinários de administração praticados
pelo Conselho de Administração são aqueles cuja eficácia independe de aprovação
da Assembléia Geral.
Segundo Modesto Carvalhosa,95 os atos ordinários da administração
responsabilizam o administrador quando configuram abuso ou o desvio de poder.
Considera-se ato com o abuso de poder aquele praticado pelo
administrador de forma a causar dano à empresa, a seus acionistas e a terceiros,
ultrapassando o limite dos poderes que lhe foram conferidos e as prerrogativas
atribuídas à sua gestão, pela lei ou pelo Estatuto Social.
Por outro lado, o administrador age com desvio de poderes quando exerce
o seu poder, visando a finalidade diversa do objeto social, ainda que não colidente.
Sergio Cavalieri Filho96 afirma que o fundamento principal da conceituação
e vedação do abuso de poder é impedir que um direito legítimo seja exercido de
forma indevida, sem base legal, de forma opressiva, e com desvio de seu objetivo,
que o transforma em ato ilícito, afastado da ética, da boa-fé, dos bons costumes e
da sua finalidade social e econômica. Esse ato ilícito causa dano a terceiro, em
proveito próprio do administrador faltoso.
A aferição da responsabilidade do administrador por ato ilícito culposo,
segundo Modesto Carvalhosa,97 envolve a análise dos padrões de cautela
94
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p.311.
95
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas , p.310.
96
Sergio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 159, 163-164.
97
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p. 313.
87
normalmente aceitos para a deliberação, gestão e representação da companhia,
conforme os costumes da atividade empresarial e a administração de companhias
assemelhadas, no que toca ao ramo de atividade, o objeto social, a dimensão da
empresa e o tipo de administrador – diretor ou membro do Conselho de
Administração da empresa. Se evidenciada a desídia ou deslealdade, abuso ou
desvio de poder, presume-se que o administrador agiu em desacordo com o padrão
geral de cautela e, assim, com culpa, sendo responsável perante a companhia.
Modesto Carvalhosa98 esclarece que não há distinção entre os atos
mencionados nos incisos I e II do art. 158 da Lei das S.As. e esclarece que se
aplica, em ambos os casos, a responsabilidade presumida dos administradores,
“em que se conciliam o elemento moral subjetivo – a imputabilidade moral – com a
teoria objetiva da conduta”. Adiante, no estudo do mesmo tema, Modesto
Carvalhosa99 determina que se aplica a responsabilidade objetiva aos
administradores para os casos de descumprimento da lei, no que toca ao
funcionamento normal da companhia.
Discordamos desse entendimento de que a responsabilidade do
administrador é objetiva, quando envolve o descumprimento da lei, no que toca ao
funcionamento normal da companhia. Os atos a que se refere o funcionamento
normal da companhia correspondem às obrigações de fazer, ou seja, aos deveres
legais abrangidos pela competência dos administradores, como afirma o autor
mencionado.100 Sendo assim, nessa linha de raciocínio, as atribuições dos
administradores correspondem aos respectivos deveres legais, advindos, esses
deveres, da lei ou do Estatuto Social, razão pela qual o descumprimento deles
significa uma violação à lei ou ao Estatuto da companhia.
Ressalta-se que, como o próprio Modesto Carvalhosa101 afirma, o
conteúdo dos incisos I e II do art. 158 da Lei das S.As. não se distinguem, dado que
a violação das atribuições legais ou dos poderes do administrador correspondem,
em última análise, a um descumprimento do previsto em lei ou no Estatuto Social
acerca da matéria referente às funções dos administradores. Desse modo, não
parece lógico tratar a responsabilidade do administrador com relação a cada inciso
98
Modesto CARVALHOSA, Comentários à Lei das sociedades anônimas, p. 311.
99
Ibid., p. 317
100
Ibid., p. 316.
101
Ibid., p. 311.
88
do art. 158 da Lei das S.As. de forma distinta. E mais do que isso, se a
responsabilidade do administrador fundamenta-se no descumprimento de seus
deveres legais, e não na assunção do risco do empreendimento pelo mesmo,
assumido exclusivamente pelo empresário, ou na capacidade do empresário de
alocar as perdas causadas pelo seu empreendimento para os beneficiados pelo
exercício de tal atividade, como acima demonstrado, não entendemos ser possível
nos afastar da responsabilidade subjetiva do administrador que, salvo as exceções
previstas em lei, só deve responder pelos danos causados por seus atos culposos,
envolvendo o descumprimento de seus deveres legais.
Sendo assim, formulamos as seguintes considerações que sustentam o
nosso entendimento no sentido de que a responsabilidade do administrador é
subjetiva, em regra geral, e não objetiva: (a) o administrador, apesar de representar
a companhia, não assume o papel de empresário, o qual assume a decisão de
realizar um empreendimento, respeitada uma comunidade e a respectiva missão
social, e essa responsabilidade, inclusive social, do empresário, empreendedor,
não se transfere para o administrador; (b) o administrador não assumiu o risco do
empreendimento e não polariza com as vítimas dos danos causados pela empresa,
como hipossuficientes em uma sociedade de massas, em situação de desigualdade
em relação ao poderio econômico do empresário e da empresa. Tanto quanto a
comunidade local, o administrador não sócio ou não acionista também depende do
empresário, dada a geração de emprego que o mesmo propicia e o
desenvolvimento local que o mesmo garante; (c) se a responsabilidade do
administrador é objetiva, não há que se falar em critérios de aferição de culpa,102
para a averiguação da atuação do administrador dentro dos padrões de cautela
normalmente aceitos para deliberação, gestão e representação da companhia com
relação às empresas assemelhadas. Não há que se tratar da caracterização da
culpa do agente, porque não se discute a culpa quando a responsabilidade do
administrador é objetiva, como defende Modesto Carvalhosa;103 e (d) se a
responsabilidade do administrador é objetiva, não é presumida, como menciona
Modesto Carvalhosa.104
102
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p. 313.
103
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei das sociedades anônimas, p. 317.
104
Ibid., p. 311 e 317.
89
Podemos concluir a análise crítica da responsabilidade do tipo objetiva do
administrador com a serena afirmação de Fábio Ulhoa Coelho,105 que só nos leva a
admitir como inafastável a subjetividade da referida responsabilidade, baseada na
culpa:
105
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, p. 260.
106
Sergio CAVALIERI FILHO, Programa de responsabilidade civil, p. 182-183.
90
seus atos podem ser julgados pelos órgãos da Administração Pública ou pelo
Judiciário, como já mencionado acima e demonstrado a seguir.
107
“Lei n. 4.595/1964 – art. 42. O art. 2º da Lei n. 1.808, de 7 de janeiro de 1953, terá a seguinte
redação:
Art. 2º Os diretores e gerentes das instituições financeiras respondem solidariamente pelas
obrigações assumidas pelas mesmas durante sua gestão, até que se cumpram.
Parágrafo único. Havendo prejuízos, a responsabilidade solidária se circunscreverá ao respectivo
montante.”
108
“Lei n. 6.024/1974:
Art. 39. Os administradores e membros do Conselho Fiscal de instituições financeiras
responderão, a qualquer tempo, salvo prescrição extintiva, pelos atos que tiverem praticado ou
omissões em que houverem incorrido.
Art. 40. Os administradores de instituições financeiras respondem solidariamente pelas obrigações
por elas assumidas durante sua gestão, até que se cumpram.
Parágrafo único. A responsabilidade solidária se circunscreverá ao montante dos prejuízos
causados.”
91
Aplica-se, assim, aos administradores das instituições financeiras a mesma
legislação relativa às S.As. em geral, no que toca à respectiva responsabilização
pela prática de atos ilícitos, considerando-a subjetiva.
A distinção havida entre o regime jurídico referente aos administradores
das S.As. em geral e os administradores das instituições financeiras reside na
apuração e efetivação da responsabilidade dos mesmos.
Nas S.As. em geral, a responsabilização dos administradores é apurada
pela Assembléia Geral, mas nas instituições financeiras falidas, em liquidação
extrajudicial, sob intervenção ou em regime de administração especial temporária, a
apuração da responsabilidade dos administradores, e dos danos causados pelos
mesmos, é realizada pelo Banco Central do Brasil, através de inquérito
administrativo, conforme o disposto no art. 41 da Lei n. 6.024/74.109
Complementarmente, pode ser citado como distinção entre os dois
processos de apuração de responsabilidade dos administradores o fato de a
efetivação da responsabilidade, segundo os princípios societários gerais, ser
realizada através de ação de responsabilidade, para fins de indenização, ajuizada
pela empresa ou pelos acionistas substitutos processuais, após a qual os bens do
administrador faltoso são afetados, enquanto no caso de instituições financeiras os
bens do administrador responsabilizado pela prática de atos ilícitos são, desde
109
Art. 41. Decretada a intervenção da liquidação extrajudicial ou a falência de instituição financeira, o
Banco Central do Brasil procederá a inquérito, a fim de apurar as causas que levaram a sociedade
àquela situação e a responsabilidade de seu administradores e membros do Conselho Fiscal.
§ 1º Para os efeitos deste artigo, decretada a falência, o escrivão do feito a comunicará, dentro em
vinte e quatro horas, ao Banco Central do Brasil.
§ 2º O inquérito será aberto imediatamente à decretação da intervenção ou da liquidação
extrajudicial, ou ao recebimento da comunicação da falência, e concluído dentro em cento e vinte
dias, prorrogáveis, se absolutamente necessário, por igual prazo.
§ 3º No inquérito, o Banco Central do Brasil poderá:
a) examinar, quando quantas vezes julgar necessário, a contabilidade, os arquivos, os
documentos, os valores e mais elementos das instituições;
b) tomar depoimentos solicitando para isso, se necessário, o auxílio da polícia;
c) solicitar informações a qualquer autoridade ou repartição pública, ao juiz da falência, ao órgão
do Ministério Público, ao síndico, ao liquidante ou ao interventor;
d) examinar, por pessoa que designar, os autos da falência e obter, mediante solicitação escrita,
cópias ou certidões de peças desses autos;
e) examinar a contabilidade e os arquivos de terceiros com os quais a instituição financeira tiver
negociado e no que entender com esses negócios, bem como a contabilidade e os arquivos dos
ex-administradores, se comerciantes ou industriais sob firma individual, e as respectivas contas
junto a outras instituições financeiras.
§ 4º os ex-administradores poderão acompanhar o inquérito, oferecer documentos e indicar
diligências.
92
logo, por medida acautelatória, para a garantia dos direitos dos prejudicados,
tornados indisponíveis, arrestados, e seqüestrados.
Declarada a responsabilidade dos ex-administradores por sentença, o
arresto e a indisponibilidade de bens se convolarão em penhora, seguindo-se o
processo de execução, como dispõe o art. 49 da Lei n. 6.024/74.110
Se a falência da instituição financeira for decretada depois de proposta a
ação de responsabilidade dos ex-administradores, o síndico passará a ser
competente para o cumprimento do disposto na Lei n. 6.024/74.
110
Art. 49. Passada em sentença que declarar a responsabilidade dos ex-administradores, o arresto e
a indisponibilidade de bens se convolarão em penhora, seguindo-se o processo de execução.
§ 1º Apurados os bens penhorados e pagas as custas judiciais, o líquido será entregue ao
interventor, ao liquidante ou ao síndico, conforme o caso, para rateio entre os credores da
instituição.
§ 2º Se, no curso da ação ou da execução, encerrar-se a intervenção ou a liquidação extrajudicial,
o interventor ou o liquidante, por ofício, dará conhecimento da ocorrência ao juiz, solicitando sua
substituição como depositário dos bens arrestados ou penhorados, e fornecendo a relação
nominal e respectivos saldos dos credores a serem, nesta hipótese diretamente contemplados
com o rateio previsto no parágrafo anterior.
111
INSTRUÇÃO CVM N. 08, DE 08 DE OUTUBRO DE 1979.
O Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários – CVM torna público que, em sessão realizada
nesta data, e de acordo com o disposto nos artigos 4º, V e VII e 18, II c da LEI N. 6.385; de 7 de
dezembro de 1976, resolveu: É vedada aos administradores e acionistas de companhias abertas,
aos intermediários e aos demais participantes do mercado de valores mobiliários, a criação de
condições artificiais de demanda, oferta ou preço de valores mobiliários, a manipulação de preço,
a realização de operações fraudulentas e o uso de práticas não eqüitativas.
93
coloquem em posição de desequilíbrio as partes envolvidas em transações com
valores mobiliários emitidos pela companhia, dentre outras.
Também é responsável perante a CVM, com base no art. 4, inciso IV, da
Lei n. 6.385/76,112 o administrador de companhia aberta que não comunicar à CVM
os fatos e atos ilícitos relacionados com a administração da sociedade.113
Conclui-se, assim, que a responsabilização dos administradores das S.As.,
nesses casos, depende da prática de ato ilícito culposo, razão pela qual é subjetiva
a responsabilidade dos mesmos perante a CVM.
112
Art. 4º O Conselho Monetário Nacional e a Comissão de Valores Mobiliários exercerão as
atribuições previstas na lei para o fim de:
(...)
IV – proteger os titulares de valores mobiliários e os investidores do mercado contra:
a) emissões irregulares de valores mobiliários;
b) atos ilegais de administradores e acionistas controladores das companhias abertas, ou de
administradores de carteira de valores mobiliários.
c) o uso de informação relevante não divulgada no mercado de valores mobiliários. (Alínea
incluída pela Lei n. 10.303, de 31.10.2001)
113
Modesto CARVALHOSA, Comentários à lei de sociedades anônimas, v. 3, p. 321.
114
Art. 82. A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e
dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio
juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para
cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil. § 1º
Prescreverá em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da sentença de encerramento da
falência, a ação de responsabilização prevista no caput deste artigo. § 2º O juiz poderá, de ofício ou
mediante requerimento das partes interessadas, ordenar a indisponibilidade de bens particulares dos
réus, em quantidade compatível com o dano provocado, até o julgamento da ação de
responsabilização.
94
O art. 190 da Lei de Falências115 equipara os administradores das
sociedades falidas ao devedor ou falido, na medida de sua culpabilidade, inclusive
para os efeitos penais previstos na referida lei, inclusive no que toca à prática de
atos fraudulentos de que resulte ou possa resultar prejuízo aos credores, com o fim
de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para terceiros, conforme o
disposto no art. 168 da Lei n. 11.101/05.116 Conclui-se, também no caso de falência
das empresas, que a responsabilização dos administradores é subjetiva, porque
depende de apuração da prática de ato ilícito culposo.
Para o fim de responsabilização dos administradores das S.As., não deve
ser considerado o disposto no art. 18 da Lei n. 8.884/90,117 Lei Antitruste, que trata
da responsabilidade nos casos de falência. Esse dispositivo determina inicialmente
que a personalidade jurídica do responsável por infração à ordem econômica
poderá ser desconsiderada quando houver, da parte deste, abuso de direito,
excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação do Estatuto Social
ou do Contrato Social da sociedade.
115
Art. 190. Todas as vezes que esta Lei se referir a devedor ou falido, compreender-se-á que a
disposição também se aplica aos sócios ilimitadamente responsáveis.
116
Art. 168. Praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação
judicial ou homologar a recuperação extrajudicial, ato fraudulento de que resulte ou possa resultar
prejuízo aos credores, com o fim de obter ou assegurar vantagem indevida para si ou para outrem.
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
Aumento da pena § 1º A pena aumenta-se de 1/6 (um sexto) a 1/3 (um terço), se o agente: I –
elabora escrituração contábil ou balanço com dados inexatos; II – omite, na escrituração contábil
ou no balanço, lançamento que deles deveria constar, ou altera escrituração ou balanço
verdadeiros; III – destrói, apaga ou corrompe dados contábeis ou negociais armazenados em
computador ou sistema informatizado; IV – simula a composição do capital social; V – destrói,
oculta ou inutiliza, total ou parcialmente, os documentos de escrituração contábil obrigatórios.
Contabilidade paralela § 2º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até metade se o devedor
manteve ou movimentou recursos ou valores paralelamente à contabilidade exigida pela
legislação.
Concurso de pessoas § 3º Nas mesmas penas incidem os contadores, técnicos contábeis,
auditores e outros profissionais que, de qualquer modo, concorrerem para as condutas criminosas
descritas neste artigo, na medida de sua culpabilidade.
Redução ou substituição da pena § 4º Tratando-se de falência de microempresa ou de empresa
de pequeno porte, e não se constatando prática habitual de condutas fraudulentas por parte do
falido, poderá o juiz reduzir a pena de reclusão de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) ou substituí-la
pelas penas restritivas de direitos, pelas de perda de bens e valores ou pelas de prestação de
serviços à comunidade ou a entidades públicas.
117
Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser
desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei,
fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou Contrato Social. A desconsideração também será
efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa
jurídica provocados por má administração.
95
A desconsideração de que se trata, segundo o mesmo dispositivo legal,
será aplicada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou
inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. Para afastar
qualquer dúvida sobre a aplicação do dispositivo mencionado aos administradores
das SAs, deve-se ressaltar, expressamente, que a teoria da desconsideração da
personalidade jurídica tem como sujeito a empresa e não seus representantes, pois
é ela que detém personalidade jurídica. A referida teoria é aplicada em caso de
fraude, para evitar que os sócios da empresa usem sua pessoa para mascarar
ilicitudes cometidas. Por essa razão, afasta-se, nessas hipóteses, o princípio da
separação entre a pessoa jurídica e seus integrantes, de modo a desconsiderar-se
a autonomia patrimonial havida entre a sociedade e os respectivos sócios. Verifica-
se, assim, que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica não afeta os
administradores, mas os sócios da sociedade vinculada à infração à ordem
econômica.
Não há necessidade de desconsideração da personalidade jurídica da
empresa para que seja imputada responsabilidade ao administrador por ato de má
gestão: a personalização da sociedade, como afirma Fábio Ulhoa Coelho, não
impede o ressarcimento dos danos pelo administrador.118
118
Fábio Ulhoa Coelho, Curso de direito comercial, p.50.
119
Maria Rita FERRAGUT, Responsabilidade tributária e o código civil de 2002, p. 33
120
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias
resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, Contrato Social ou
estatutos:
(...)
96
correspondentes a obrigações tributárias, resultantes de atos praticados com
excesso de poderes ou infração de lei, Contrato Social ou Estatuto Social da
companhia. Verifica-se, assim, pela simples literalidade do referido dispositivo
legal,que a responsabilidade tributária dos administradores é subjetiva.
Trata-se de responsabilidade tributária por substituição, não como
contribuinte direto e originário, justificada, a substituição, pelo ato doloso, de má fé,
praticado pelo administrador, o qual deve ser comprovado, obedecido o devido
processo legal, para que o seu agente seja apenado. A responsabilidade objeto do
referido dispositivo legal mencionado não se aplica aos empregados sujeitos ao
poder hierárquico dos gestores da empresa, mas aos administradores, ainda que
empregados, com poderes de gestão.
Nas hipóteses do art. 135, Inciso III, do CTN, a pessoa jurídica fica
excluída da responsabilidade, pelos atos que o administrador praticar em seu nome
com excesso de poderes, infração à lei, Contrato Social ou Estatuto, à época do
fato gerador do tributo e do vencimento dos débitos tributários.
Já há farta jurisprudência no sentido de que o mero não recolhimento do
tributo por uma sociedade, apesar de constituir uma ilicitude, não enseja
responsabilidade pessoal do administrador. O não pagar tributo, para os fins dos
princípios da responsabilidade, pode configurar ou não uma violação da lei ou do
Estatuto Social ou Contrato Social.
Deixar a empresa-contribuinte de recolher o tributo dela exigido não
importa, por si só, automaticamente, na responsabilização dos sócios-quotistas,
dos sócios-gerentes ou dos administradores, empregados da companhia, com
poderes de gestão.
Podemos citar, nesse sentido, a opinião de Hugo de Brito Machado:
“(...) se o pagamento do tributo fosse infração à lei capaz de ensejar a responsabilidade dos
diretores de uma sociedade por cotas, ou de uma sociedade anônima, simplesmente
inexistiria qualquer limitação da responsabilidade destes em relação ao fisco.”121
97
“(...) a falta de pagamento de tributos, quando resulta da álea natural aos negócios, não
pode ser assimilada à infração prevista no Art. 13, inciso III, do Código Tributário Nacional.
Esta é modalidade restrita de infração à lei, aquela em que o sócio-gerente da pessoa
jurídica, através de procedimentos ilícitos, visa a encobrir a própria obrigação tributária (v.g.
falta de escrituração regular) ou a diminuir as garantias do crédito tributário (v.g. dissolução
irregular da sociedade)".
122
“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DE SÓCIO-
GERENTE. LIMITES. ART. 135, III, do CTN.
Precedentes.
1. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica comercial não respondem, em caráter solidário, por
dívidas fiscais assumidas pela sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente,
98
solidária) e substituta, tendo como fundamento a prática de atos pelos
administradores, com excesso de mandato e com violação do Estatuto ou da lei,
conforme dispõe o art. 158, incisos I e II, da Lei n. 6.404/76.
Ressalte-se que é pacífico o entendimento do E. Superior Tribunal de
Justiça, exemplificado nas ementas recentes,123 no sentido de que só se houver
99
comprovação do ato doloso, eivado de excesso de poderes do administrador
fraudulento, em infração à lei ou ao Estatuto Social, praticado pelo dirigente, o
mesmo será considerado responsável pelos débitos da empresa, a rigor do art.
135, inciso III, do CTN.
Não resta dúvida de que as infrações cometidas pelos administradores da
sociedade devem ser devidamente comprovadas, pelo Fisco, quando da execução
fiscal interposta contra o administrador, para cobrança do crédito tributário, de
modo a justificar a responsabilidade pessoal e substituta do mesmo, pelas dívidas
tributárias da companhia.
Essa regra comporta exceções. Trata-se do caso de não recolhimento do
ICMS,124 ou de não recolhimento, aos cofres do INSS, das contribuições
votos-vencedores, mas sem que tal implicasse em acolhimento das teses recursais, que bateram
pela completa inexistência de obrigação imputável aos agravados.
4. Os bens do sócio de uma pessoa jurídica comercial não respondem, em caráter solidário, por
dívidas fiscais assumidas pela sociedade. A responsabilidade tributária imposta por sócio-gerente,
administrador, diretor ou equivalente só se caracteriza quando há dissolução irregular da
sociedade ou se comprova infração à Lei praticada pelo dirigente (grifado).
Em qualquer espécie de sociedade comercial, é o patrimônio social que responde sempre e
integralmente pelas dívidas sociais. Os diretores não respondem pessoalmente pelas obrigações
contraídas em nome da sociedade, mas sim para com esta e para com terceiros solidária e
ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do estatuto ou Lei
(art. 158, I e II, da Lei n. 6.404/76).
De acordo com o nosso ordenamento jurídico-tributário, os sócios (diretores, gerentes ou
representantes da pessoa jurídica) são responsáveis, por substituição, pelos créditos
correspondentes a obrigações tributárias resultantes da prática de ato ou fato eivado de excesso
de poderes ou com infração de Lei, Contrato Social ou estatutos, nos termos do art. 135, III, do
CTN.
O simples inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido
com excesso de poderes, ou infração de Contrato Social ou estatutos, não há falar-se em
responsabilidade tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal. Inexistência de
responsabilidade tributária do ex-sócio. Precedentes desta Corte Superior (grifado).
Não incidência da Súmula n. 7/STJ, por tratar a matéria, unicamente, de aplicação de legislação
federal.
9. Agravo regimental não provido.”
STJ – Primeira Turma – AGA – 428886/MG (2000101627708) – 430413 – Agravo Regimental no
Agravo de Instrumento – Data da decisão: 09/04/2002 – Relator: Ministro José Delgado.
124
"TRIBUTÁRIO. EXTINÇÃO DA EMPRESA. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DOS SÓCIOS
GERENTES. NO SISTEMA JURÍDICO-TRIBUTÁRIO VIGENTE, O SÓCIO GERENTE É
RESPONSÁVEL – POR SUBSTITUIÇÃO – PELAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS RESULTANTES
DE ATOS PRATICADOS COM INFRAÇÃO A LEI OU CLÁUSULAS DO CONTRATO SOCIAL (CTN,
ART. 135)
Obrigação essencial a todo administrador é a observância do pagamento dos tributos, no prazo
consignado na legislação pertinente. Em se cuidando, no caso, de débito relativo a ICMS, é de
presumir que os gerentes da empresa, embora tenham recebido dos consumidores finais esse
imposto, nas operações realizadas, retardaram o recolhimento aos cofres da Fazenda, com
evidente infração a Lei, porquanto a sonegação de tributo constitui crime tipificado em legislação
específica. E jurisprudência assente da Corte que as pessoas enumeradas no art. 135, III, do
100
previdenciárias descontadas dos salários dos empregados,125 pelos
administradores, considerado apropriação indébita, tendo em vista que, no caso do
CTN, são sujeitos passivos da obrigação tributária (por substituição), podendo ser citados, com a
penhora de seus bens, ainda que os seus nomes não constem no respectivo título extrajudicial.
Recurso provido. Decisão unânime."
STJ – Primeira Turma – RESP 0068408/RS – DJ: 24/06/96 – Min. Demócrito Reinaldo.
125
Acordão
Origem:STJ-SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Classe: HC – HABEAS CORPUS – 35823.
Processo: 200400758444 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA. Data da decisão: 16/11/2004
Documento: STJ000587175
Fonte: DJ data:17/12/2004 página: 586 RSDPPP vol.:00030 página:86
Relator(a): GILSON DIPP – Decisão: Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as
acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça. "A
Turma, por unanimidade, concedeu a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator." Os Srs.
Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima, José Arnaldo da Fonseca e Felix Fischer votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Sustentou oralmente: Dr. Carlos Alberto Pires Mendes (p/ pacte)
Ementa: CRIMINAL. HC. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.
TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. CRIME SOCIETÁRIO.
NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MÍNIMA DA RELAÇÃO DO PACIENTE COM OS FATOS
DELITUOSOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. ORDEM CONCEDIDA.
I. Hipótese em que o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime de apropriação
indébita de contribuições previdenciárias, pois, na qualidade de um dos responsáveis pela
administração de determinada empresa, teria deixado de recolher ao cofres do INSS as
contribuições descontadas dos salários dos empregados em certos períodos.
II. O entendimento desta Corte – no sentido de que, nos crimes societários, em que a autoria nem
sempre se mostra claramente comprovada, a fumaça do bom direito deve ser abrandada, não se
exigindo a descrição pormenorizada da conduta de cada agente – não significa que o órgão
acusatório possa deixar de estabelecer qualquer vínculo entre os denunciados e a empreitada
criminosa a eles imputada.
III. O simples fato de ser sócio de empresa não autoriza a instauração de processo criminal por
crimes praticados no âmbito da sociedade, se não restar comprovado, ainda que com elementos a
serem aprofundados no decorrer da ação penal, a mínima relação de causa e efeito entre as
imputações e a condição de dirigente da empresa, sob pena de se reconhecer a responsabilidade
penal objetiva.
IV. A inexistência absoluta de elementos hábeis a descrever a relação entre os fatos delituosos e a
autoria ofende o princípio constitucional da ampla defesa, tornando inepta a denúncia.
V. Precedentes do STF.
VI. Deve ser cassado o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, para
restabelecer a decisão monocrática que rejeitou a denúncia ofertada contra o paciente.
VII. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.
Indexação
CABIMENTO, TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL, ACUSADO, CRIME, OMISSÃO,
RECOLHIMENTO, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, POSTERIORIDADE, DESCONTO,
SALARIO, EMPREGADO, MOTIVO, IMPOSSIBILIDADE, PRESUNÇÃO, PARTICIPAÇÃO,
PACIENTE, DELITO, FUNDAMENTAÇÃO, EXCLUSIVIDADE, QUALIDADE, SOCIO,
ADMINISTRADOR, EMPRESA COMERCIAL, CARACTERIZAÇÃO, INEPCIA, DENUNCIA,
NECESSIDADE, AFASTAMENTO, RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA, OCORRENCIA,
VIOLAÇÃO, PRINCIPIO CONSTITUCIONAL, AMPLA DEFESA.
Data Publicação: 17/12/2004
101
Referência Legislativa: CPP-41 CODIGO DE PROCESSO PENAL LEG_FED DEL_3689
ANO_1941 ART_43 INC_3 LOSS-91 LEI ORGANICA DA SEGURIDADE SOCIAL LEG_FED
LEI_8212 ANO_1991 ART_95 LET_D
102
ICMS, o imposto agrega o produto e, assim, é pago ao vendedor pelos
consumidores, sendo obrigação do administrador da empresa vendedora de
produtos recolhê-los aos cofres públicos, sob pena da referida prática ser
considerada crime de sonegação de tributo. No que toca à contribuição
previdenciária descontada do salário dos empregados, o entendimento é
coincidente: o referido numerário retido pela empresa é objeto de crime de
apropriação indébita. Há entendimento, nesses casos, de que o ato ilícito praticado
pelos acionistas e/ou administradores das empresas é doloso, eivado de má fé, e,
assim, fraudulento, razão pela qual há quem entenda que a responsabilidade é
presumida.
Complementarmente, os arts. 137 e 138 do CTN tratam do direito tributário
criminal e da responsabilidade do administrador, por infrações da legislação
tributária.
Nesse sentido, podemos mencionar que o art. 137 do CTN126 dispõe que a
responsabilidade é pessoal do agente: (a) quanto às infrações conceituadas por lei
como crimes ou contravenções, salvo quando praticados no exercício regular de
administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem
expressa, emitida por quem de direito; (b) quanto às infrações em cuja definição o
dolo específico do agente seja elementar; (c) quanto às infrações que decorram
direta e exclusivamente de dolo específico: (i) das pessoas referidas no art. 134 do
CTN, contra aquelas por quem respondem; (ii) dos mandatários, prepostos ou
empregados, contra seus mandantes, preponentes ou empregadores; (iii) dos
Referência Legislativa: LEG-FED LEI-8212 ANO-1991 ART-95 LET-D PAR-1 PAR-3 CPP-41
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL LEG-FED DEL-3689 ANO-1941 ART-234 ART-41 CP-40
CÓDIGO PENAL LEG-FED DEL-2848 ANO-1940 ART-71 LEG-FED LEI-7492 ANO-1986 ART-5
LEG-FED LEI-9714 ANO -1998, ART.43, ART-44 ART-45 ART-46 ART-47 ART-55 ART-77 LEP-
84 LEI DE EXECUÇÃO PENAL LEG-FED LEI-7210 ANO-1984 ART-149 PAR-2.
126
Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:
I – quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, salvo quando
praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no
cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;
II – quanto às infrações em cuja definição o dolo específico do agente seja elementar;
III – quanto às infrações que decorram direta e exclusivamente de dolo específico:
a) das pessoas referidas no artigo 134, contra aquelas por quem respondem;
b) dos mandatários, prepostos ou empregados, contra seus mandantes, preponentes ou
empregadores;
c) dos diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra estas.
103
diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, contra
estas.
Através desse dispositivo, visa-se apenas responsabilizar pessoalmente,
de forma subjetiva, quem age dolosamente, em prejuízo de seus clientes,
representantes ou sociedades das quais são administradores.
Nesse caso, de acordo com o disposto no art. 138 do CTN, a
responsabilidade é afastada pela denúncia espontânea da infração, realizada antes
de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados
com a infração. A denúncia deve ser acompanhada do pagamento do tributo ou do
depósito do valor devido.
127
Lei n. 6.830/1980
art. 4º A execução fiscal poderá ser promovida contra:
(.)
VI – os sucessores a qualquer título
(.)
§ 2º À Dívida Ativa da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à
responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial.
128
Lei n. 6.830/80
art. 4º A execução fiscal poderá ser promovida contra:
(.)
104
fiscal poderá ser promovida contra o responsável, nos termos da lei, por dívidas,
tributárias ou não, de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado.
Analisando o termo “responsável por dívida tributária”, verifica-se que sua
conceituação encontra-se no disposto no art. 121, do CTN, com status de lei
complementar, que determina que o sujeito passivo da obrigação principal é (a) o
contribuinte, quando tiver relação pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador, ou (b) o responsável, quando sua obrigação decorrer de
disposição expressa da lei.
Além disso, de acordo com os arts. 130 a 135 do CTN,129 os responsáveis
tributários podem ser assim considerados: (a) por substituição, quando a lei assim o
V – o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de pessoas físicas ou
pessoas jurídicas de direito privado; e
129
CTN – art. 130. Os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o
domínio útil ou a posse de bens imóveis, e bem assim os relativos a taxas pela prestação de serviços
referentes a tais bens, ou a contribuições de melhoria, sub-rogam-se na pessoa dos respectivos
adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação.
Parágrafo único. No caso de arrematação em hasta pública, a sub-rogação ocorre sobre o
respectivo preço.
art. 131. São pessoalmente responsáveis:
I – o adquirente ou remitente, pelos tributos relativos aos bens adquiridos ou remidos;
II – o sucessor a qualquer título e o cônjuge meeiro, pelos tributos devidos pelo de cujus até a data
da partilha ou adjudicação, limitada esta responsabilidade ao montante do quinhão, do legado ou
da meação;
III – o espólio, pelos tributos devidos pelo de cujus até data da abertura da sucessão.
art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação
de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até a data do ato pelas pessoas
jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas jurídicas de
direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja continuada por qualquer sócio
remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra razão social, ou sob firma individual.
art. 133. A pessoa natural ou jurídica de direito privado que adquirir de outra, por qualquer título,
fundo de comércio ou estabelecimento comercial, industrial ou profissional, e continuar a
respectiva exploração, sob a mesma ou outra razão social ou sob firma ou nome individual,
responde pelos tributos, relativos ao fundo ou estabelecimento adquirido, devidos até a data do
ato:
I – integralmente, se o alienante cessar a exploração do comércio, indústria ou atividade;
II – subsidiariamente com o alienante, se este prosseguir na exploração ou iniciar dentro de 6
(seis) meses, a contar da data da alienação, nova atividade no mesmo ou em outro ramo de
comércio, indústria ou profissão
§ 1º O disposto no caput deste artigo não se aplica na hipótese de alienação judicial:
I – em processo de falência;
II – de filial ou unidade produtiva isolada, em processo de recuperação judicial. (Parágrafo
acrescentado pela Lei Complementar n. 118, de 09.02.2005, DOU 09.02.2005 – Ed. Extra, com
efeitos a partir de 120 dias após a data da publicação)
§ 2º Não se aplica o disposto no § 1º deste artigo quando o adquirente for:
105
dispuser, ou, (b) por transferência da obrigação tributária, quando houver sucessão,
solidariedade ou subsidiariedade da obrigação tributária em relação ao contribuinte.
O responsável por dívidas tributárias, mencionado na lei de execuções
fiscais, é aquele assim determinado pelo art. 121 do CTN,130 qual seja, o assim
106
considerado por lei. O art. 135, inciso III, do CTN vem a indicar o responsável pelo
pagamento das dívidas tributárias, estabelecendo que o é o administrador faltoso,
se praticar atos com excesso de poderes ou com infração da lei, Estatuto Social ou
Contrato Social.
O parágrafo primeiro do art. 4o da Lei n. 6.830/80 trata da responsabilidade
do administrador, dentre outros, que, se no caso de falência, concordata,
liquidação, inventário, insolvência ou concurso de credores, antes de garantidos os
créditos da Fazenda Pública, alienarem ou derem em garantia quaisquer dos bens
da empresa por ele administrada, em ato considerado fraudulento, responderão,
solidariamente, pelo valor deles. Verifica-se que o acima mencionado reflete o
disposto no art. 135, inciso III, do CTN, responsabilizando o administrador faltoso
de forma subjetiva (não objetiva) e pelo pagamento da dívida da sociedade, objeto
da execução fiscal.
O parágrafo terceiro do art. 4o da lei de execuções fiscais determina que os
responsáveis pelas dívidas executadas poderão ter seus bens pessoais sujeitos à
execução, caso os do devedor sejam insuficientes para o pagamento da dívida.
Deve-se ressaltar que a responsabilidade do administrador, de acordo com
a Lei de Execuções Fiscais, é subsidiária, distinguindo nitidamente a
responsabilidade dele e a do devedor, sujeitando os bens do administrador à
execução, tão somente se os do devedor não forem suficientes para a satisfação
da dívida. Devemos mencionar, porém, que essa subsidiariedade deve ser aplicada
em conjunto com o disposto na legislação tributária, como acima mencionado,
considerando-se, assim, o disposto no art. 135, inciso III, do CTN que condiciona a
responsabilidade do administrador aos atos de gestão dolosos, com excesso de
poderes, contra a lei ou o Estatuto Social.
Não resta dúvida de que a regra consiste na não-responsabilização
pessoal dos administradores pelas dívidas da sociedade.
A responsabilidade tributária dos administradores não é solidária ou
subsidiária com relação à sociedade, mas plena e exclusiva dos administradores da
sociedade que atuem com manifestada malícia contra a empresa que representam.
Nesse sentido, Sacha Calmon Navarro assevera:
“(...) em suma, o art. 135 retira a ‘solidariedade’ do art. 134. Aqui a responsabilidade se
transfere inteiramente para os terceiros, liberando os seus dependentes e representados. A
107
responsabilidade passa a ser pessoal, plena e exclusiva desses terceiros. Isso ocorrerá
quando eles procederem com manifesta malícia (mala fides) contra aqueles que
representam, toda vez que for constada a prática de ato ou fato eivado de excesso de
poderes ou com infração de Lei, o Estatuto Social ou o Contrato Social.”131
“(...) dá-se que a infração a que se refere o art. 135 evidentemente não é objetiva e sim
subjetiva, ou seja, dolosa. (...) No art. 135, o dolo é elementar. Nem se olvide que a
responsabilidade aqui é pessoal (não há solidariedade); o dolo, a má-fé hão de ser
cumpridamente provados.”132
131
Carlos Valverde do NASCIMENTO, Comentários ao Código Tributário Nacional, p. 319.
132
Carlos Valverde do NASCIMENTO, Comentários ao Código Tributário Nacional, p. 320.
133
"Lei n. 8.620/1993 – (...)
Art. 13. O titular da firma individual e os sócios das empresas por cotas de responsabilidade
limitada respondem solidariamente, com seus bens pessoais, pelos débitos junto à Seguridade
Social.
Parágrafo único. Os acionistas controladores, os administradores, os gerentes respondem
solidariamente e subsidiariamente, com seus bens pessoais, quanto ao inadimplemento das
obrigações para com a Seguridade Social, por dolo ou culpa.”
108
interpretação sistemática da lei ordinária, em conjunto com o CTN. Sendo assim, a
responsabilização do administrador, nos casos de execução fiscal interposta contra
a empresa, apesar de considerada subjetiva, pode não ser tida como solidária, nem
subsidiária à dos acionistas controladores. A responsabilidade pessoal dos
administradores, como determina o art. 135, inciso III, do CTN depende da prática
de ato com excesso de poderes ou com infração da lei, Estatuto Social ou Contrato
Social.
A superioridade hierárquica da lei complementar é evidenciada pelo
disposto no art. 59 da Constituição Federal, que determina que a lei complementar
disporá sobre a elaboração, redação, alteração, e consolidação das leis. Da mesma
forma, o art. 146, inciso III, da Constituição Federal determina que compete à lei
complementar, e não à lei ordinária, lei delegada, medida provisória ou decreto,
estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, conferindo-se,
assim, maior estabilidade para o contribuinte, dado que o respectivo processo
legislativo é mais complexo, por exigir quórum qualificado para a sua aprovação.
Nesse sentido, podemos transcrever abaixo134 jurisprudência do Supremo
Tribunal de Justiça que consagra a aplicação do art. 135, inciso III, do CTN, lei
complementar, em detrimento do disposto no art. 13 da Lei n. 8.620/93, que deve
134
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO QUE DEU
PARCIAL PROVIMENTO A RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ART. 3º, I,
DA LEI N. 7.787/89, E ART. 22, I, DA LEI N. 8.212/91. AUTÔNOMOS, EMPREGADORES E
AVULSOS. COMPENSAÇÃO. PRESCRIÇÃO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL DO PRAZO.
IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO (LEIS Nºs 8.212/91, 9.032/95 E 9.129/95). TRANSFERÊNCIA
DE ENCARGO FINANCEIRO. ART. 166, DO CTN. JUROS DE MORA. TAXA SELIC.
(...)
7. A contribuição previdenciária examinada é de natureza direta. Apresenta-se com essa
característica porque a sua exigência se concentra, unicamente, na pessoa de quem a recolhe, no
caso, uma empresa que assume a condição de contribuinte de fato e de direito. A primeira
condição é assumida porque arca com o ônus financeiro imposto pelo tributo; a
segunda,caracteriza-se porque é a responsável pelo cumprimento de todas as obrigações, quer as
principais, quer as acessórias. (...)
9. Em conseqüência, o fenômeno da substituição legal no cumprimento da obrigação, do
contribuinte de fato pelo contribuinte de direito, não ocorre na exigência do pagamento das
contribuições previdenciárias quanto à parte da responsabilidade das empresas. (.)
11. In casu, tem-se Leis ordinárias hierarquicamente inferiores ao comando de uma Lei
complementar. E, sendo a contribuição para a Seguridade Social uma espécie do gênero tributo,
deve a mesma seguir o preceituado no CTN, recepcionado como Lei Complementar, salvo norma
posterior de mesma hierarquia, que não é o caso das Leis Ordinárias supracitadas, a fim de que
não se fira o princípio da hierarquia da Lei.
(..) 16. Agravo regimental e recurso especial do INSS improvidos”.
109
submeter-se àquela, vez que a contribuição previdenciária é uma espécie do
gênero tributo.
Fica claro, pela leitura da ementa de acórdão abaixo transcrita,135 que os
administradores não podem ser responsabilizados, ainda que subsidiariamente ou
solidariamente, pelo simples não pagamento, pela empresa, do tributo devido ao
INSS, o que não pode constituir infração legal, devendo ser, por outro lado,
aplicado o art. 135, inciso III, do CTN que vincula a responsabilidade do
administrador à prática de ato com excesso de poderes ou infração estatutária.
Transcrevemos abaixo136 parte do texto do voto do relator referente ao
acórdão supracitado, para ilustrar a questão.
135
“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ARTIGO 135 DO CÓDIGO
TRIBUTÁRIO NACIONAL. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO-GERENTE. LIMITES. EXCESSO DE
PODER. INFRAÇÃO A CONTRATO SOCIAL OU ESTATUTO. MATÉRIA PACIFICADA NESTA
CORTE SUPERIOR EM SENTIDO CONTRÁRIO À TESE DEFENDIDA PELO INSS.”
136
(..).Dessa forma, a tese defendida pelo Instituto Nacional do Seguro Social se encontra obsoleta,
uma vez que o não recolhimento do tributo, por si só, não pode constituir infração legal. É preciso que
tenha agido o representante da sociedade com excesso de poderes ou infração de Contrato Social ou
Estatuto.(...)
Devemos entender por atos ilegais ou por atos em violação do Contrato Social aqueles
dolosamente praticados e dirigidos para deliberadamente prejudicar terceiros. Assim, não pagar
um fornecedor é ato ilegal e constitui uma falta. Mas, para os fins dos princípios da
responsabilidade o não pagar pode configurar ou não uma violação da Lei ou do Contrato Social.
Se a sociedade não paga por estar impossibilitada, por motivo justo, o credor pode cobrar da
empresa, mas não há infração dolosa, nem responsabilidade contingente. Se a sociedade devia
numerário e não paga ou se em estado pré falimentar sai por aí comprando sem lastro, evidencia-
se o dolo, e consequentemente, haveria responsabilidade (“Responsabilidade dos Sócios pelas
Dívidas da Sociedade”, Revista de Direito Mercantil, Industrial, Econômico e Financeiro/56, Ed.
Revista dos Tribunais, p.64/75).(.)
Apenas quem pratica o ato gerencial fraudulento, ilegal, pode validamente ser responsabilizado.
Interessa à organização social como um todo, que a responsabilidade dos negócios seja, como o
nome indica, “limitada”. (...)
Em conclusão, a questão em exame pode ser assim resumida: (a) os sócios-gerentes, diretores, e
administradores de sociedades por quotas de responsabilidade limitada ou anônimas, em princípio
não são pessoalmente responsáveis pelas dívidas tributárias destas; (b) omissis; (c) relativamente
aos demais tributos, a responsabilidade em questão só existirá quando a pessoa jurídica tenha
ficado sem condições econômicas para responder pela dívida, em decorrência de atos praticados
com excesso de poderes, ou violação da Lei, do contrato ou do Estatuto; (d) a liquidação irregular
da sociedade gera a presunção da prática desses atos abusivos ou ilegais. (...)
É de concluir, pois, que não pode o fato de figurar determinado sócio como gerente da empresa,
tão somente, determinar sua responsabilidade pelo pagamento de tributos não recolhidos. Há,
sim, que responder pelos débitos fiscais do período em que exerceu a administração da
sociedade, se ficar provado que agiu com dolo ou fraude e existia prova de que a sociedade, em
virtude de dificuldade econômica decorrente desse ato, não pode cumprir a obrigação tributária
(...)”.
Agravo regimental a que se nega provimento. Decisão por unanimidade de votos.
STJ – 2a. T. – AGA 329248/SC – DJ 25/03/2002 – Relator Ministro Franciulli Neto.
110
Paralela e complementarmente, podemos citar o disposto no art. 42 da Lei
n. 8.212/91, que determina o seguinte:
111
beneficiário da paga, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida
do Imposto sobre a Renda como incentivo fiscal (Item V acrescentado pela Lei n.
5.569/69).
A pena aplicada aos casos de crime de sonegação fiscal corresponderá à
detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa de 2 (duas) a 5 (cinco) vezes o
valor do tributo.
À responsabilidade civil tributária dos administradores, envolvendo a
reparação dos prejuízos causados, cumula-se a responsabilidade criminal, de
acordo com o disposto no art. 6 da referida lei, que determina que, quando se tratar
de pessoa jurídica, a responsabilidade penal pelas infrações previstas nesta lei será
de todos os que, direta ou indiretamente ligados à mesma, de modo permanente ou
eventual, tenham praticado ou concorrido para a prática da sonegação fiscal, o que
envolve a prática de ato doloso, razão pela qual a responsabilização dos
administradores será subjetiva.
5.6.8 - Direito Tributário Criminal – Lei dos Crimes do Colarinho Branco – Lei
n. 7.492/86 -
137
Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de
instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes (Vetado).
§ 1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o liqüidante
ou o síndico.
§ 2º Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe
que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama
delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços. ( Art. 25. São penalmente responsáveis,
nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim
considerados os diretores, gerentes (Vetado).
§ 1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o liqüidante
ou o síndico.
§ 2º Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe
que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama
delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços. (Incluído pela Lei n. 9.080, de 19.7.1995)
112
divulguem informações falsas ou enganosas; gerenciem fraudulentamente
instituição financeira; apropriem-se de dinheiro, título, valor ou qualquer outro bem
móvel de que tem posse, ou negociem direito, título ou qualquer outro bem móvel
ou imóvel de que tem a posse, sem a autorização de quem de direito; desviem-no
em proveito próprio ou alheio; emitam, ofereçam ou negociem títulos ou valores
mobiliários falsos ou falsificados; sem registro prévio de emissão junto à autoridade
competente, em condições divergentes das constantes do registro ou
irregularmente registrados, sem lastro ou garantias suficientes ou sem autorização
prévia da autoridade competente quando exigida; exigir, em desacordo com a
legislação, juro, comissão ou qualquer tipo de remuneração sobre operações
envolvendo o sistema financeiro; atribuam a si ou a terceiros falsa identidade para
a realização de operação de câmbio; efetuem operação de câmbio não autorizada,
com o fim de promover evasão de divisas do país; ou promovam, sem autorização
legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior ou lá mantenham depósitos não
declarados à repartição federal competente.
Verifica-se, pelo acima exposto, que a Lei n. 7.492/86 responsabiliza os
administradores, de forma subjetiva, pela prática pelos mesmos de ilícitos de forma
culposa.
113
produção; de extorsão mediante seqüestro; contra a Administração Pública,
inclusive a exigência, para si ou para outrem, de qualquer vantagem, direta ou
indireta, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
contra o sistema financeiro nacional; praticado por organização criminosa; praticado
por particular, contra a administração pública estrangeira, dentre outros, fixados nos
parágrafos primeiro e segundo do art. 1o da referida lei.
O art. 9o combinado com os arts. 10 e 11 da referida lei considera
obrigadas a identificação dos clientes, manutenção de registros e a comunicação
de operações financeiras: as pessoas jurídicas que tenham, em caráter permanente
ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a
captação, intermediação e aplicação de recursos financeiros de terceiros, em
moeda nacional ou estrangeira; a compra e venda de moeda estrangeira ou ouro
como ativo financeiro ou instrumento cambial; a custódia, emissão, distribuição,
liquidação, negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores
mobiliários.
Sujeitam-se, ainda, à lei mencionada: as bolsas de valores e bolsas de
mercadorias ou futuros; as seguradoras, as corretoras de seguros e as entidades
de previdência complementar ou de capitalização.
O art. 12 da Lei 9.613/98138 determina as seguintes penalidades para o
respectivo infrator: advertência; multa pecuniária; inabilitação temporária para o
138
Art. 12. Às pessoas referidas no art. 9º, bem como aos administradores das pessoas jurídicas, que
deixem de cumprir as obrigações previstas nos arts. 10 e 11 serão aplicadas, cumulativamente ou
não, pelas autoridades competentes, as seguintes sanções:
I – advertência;
II – multa pecuniária variável, de um por cento até o dobro do valor da operação, ou até duzentos
por cento do lucro obtido ou que presumivelmente seria obtido pela realização da operação, ou,
ainda, multa de até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais);
III – inabilitação temporária, pelo prazo de até dez anos, para o exercício do cargo de
administrador das pessoas jurídicas referidas no art. 9º;
IV – cassação da autorização para operação ou funcionamento.
§ 1º A pena de advertência será aplicada por irregularidade no cumprimento das instruções
referidas nos incisos I e II do art. 10.
§ 2º A multa será aplicada sempre que as pessoas referidas no art. 9º, por negligência ou dolo:
I – deixarem de sanar as irregularidades objeto de advertência, no prazo assinalado pela
autoridade competente;
II – não realizarem a identificação ou o registro previstos nos incisos I e II do art. 10;
III – deixarem de atender, no prazo, a requisição formulada nos termos do inciso III do art. 10;
IV – descumprirem a vedação ou deixarem de fazer a comunicação a que se refere o art. 11.
114
exercício do cargo de administrador das pessoas jurídicas acima referidas; ou
cassação da autorização para operação ou funcionamento.
O descumprimento das obrigações supra enseja a responsabilização das
pessoas jurídicas citadas, bem como dos respectivos administradores, aos quais
aplicam-se as sanções mencionadas.
Nota-se, assim, que o administrador das pessoas jurídicas pode ser
penalizado pelas suas ações ou omissões que permitirem a prática de crime de
“lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores, bem como a utilização do
sistema financeiro para os ilícitos previstos na referida lei. Trata-se, assim, de mais
um caso de responsabilidade subjetiva dos administradores das S.As.
§ 3º A inabilitação temporária será aplicada quando forem verificadas infrações graves quanto ao
cumprimento das obrigações constantes desta Lei ou quando ocorrer reincidência específica,
devidamente caracterizada em transgressões anteriormente punidas com multa.
§ 4º A cassação da autorização será aplicada nos casos de reincidência específica de infrações
anteriormente punidas com a pena prevista no inciso III do caput deste artigo.
115
5.6.11- Direito Criminal – Código Penal -
116
referida lei); (b) gerir, fraudulentamente ou temerariamente, bancos ou
estabelecimentos bancários, ou de capitalização, sociedades de seguros, pecúlios
ou pensões vitalícias, sociedades para empréstimo ou financiamento de
construções e de vendas de imóveis a prestações (com ou sem sorteio, ou
preferência por meio de pontos ou quotas), caixas econômicas, caixas Raiffeisen,
caixas mútuas, de beneficência, socorros ou empréstimos, caixas de pecúlios,
pensão e aposentadoria, caixas construtoras, cooperativas, sociedades de
economia coletiva, levando-as à falência ou à insolvência, ou não cumprindo
qualquer das cláusulas contratuais com prejuízo dos interessados (art. 3o, inciso
IX); (c) fraudar, de qualquer modo, escriturações, lançamentos, registros, relatórios,
pareceres e outras informações devidas a sócios de sociedades civis ou
comerciais, em que o capital seja fracionado em ações ou quotas de valor
nominativo igual ou inferior a um mil cruzeiros, com o fim de sonegar lucros,
dividendos, percentagens, rateios ou bonificações, ou de desfalcar ou de desviar
fundos de reserva ou reservas técnicas (art. 3o, inciso X).
A pena aplicada nos casos mencionados no art. 2o corresponde à detenção
de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, de dois mil a cinqüenta mil cruzeiros.
Por outro lado, a penalidade aplicada nos casos do art. 3o consiste em detenção de
2 (dois) anos a 10 (dez) anos, e multa, de vinte mil a cem mil cruzeiros.
Deve-se ressaltar que o crime estabelecido no art. 3o, inciso IX , acima
transcrito, aplica-se, especialmente, aos administradores de instituições financeiras
de que já mencionamos.
Não resta dúvida de que a imputação de responsabilidade criminal
depende do devido processo legal, envolvendo averiguação e análise dos atos
ilícitos praticados pelos administradores das S.As., o que demonstra que a
respectiva responsabilização é subjetiva.
117
serviços ofertados ao mercado, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua utilização e riscos, pelo que se depreende do art. 12 do
CDC. Como pode-se perceber, não há qualquer referência aos administradores
nesse dispositivo legal, não sendo eles responsáveis pela prática dos atos ilícitos
mencionados. O CDC trata apenas dos empresários, fornecedores de bens ou
serviços.
Deve-se ressaltar que, sabiamente, foi excluída da redação anterior o
parágrafo primeiro do art 28 do CDC, vetado, que determinava que o administrador
da empresa seria responsabilizado em conjunto com o empresário. Assim, nesse
caso, o administrador não é responsável pelas infrações cometidas pelo
empresário, no que toca às regras do CDC, nem de forma subjetiva.
Nesse sentido, o CDC submeteu a responsabilidade civil do fornecedor a
um tratamento unitário, considerando-se que o fundamento dessa responsabilidade
é a violação do dever de segurança – o defeito do produto ou do serviço que, em
uma relação de consumo, contratual ou não, dá causa a um acidente de consumo,
indenizável, independentemente de culpa do seu agente causador. Daí a
responsabilidade objetiva do fornecedor, conforme estabelece a jurisprudência
dominante, abaixo transcrita:
118
responsabilidade da instituição bancária pelo dano experimentado pela correntista. (TRF 2ª
R. – AC 2002.51.01.004544-8 – 7ª T. – Relª Juíza Fed. Conv. Fátima Maria Novelino
Sequeira – DJU 03.10.2005 – p. 232).
139
Fábio Ulhoa COELHO, O empresário e os direitos do consumidor, p. 278-290.
140
José Carlos de OLIVEIRA, Código de proteção e defesa do consumidor. 2. ed. São Paulo: Led
Editora de Direito, 1999, p. 230.
119
Além da sanção pecuniária, advinda de procedimento administrativo
(multa; apreensão do produto; cessação do registro do produto perante o órgão
competente; suspensão temporária da atividade do fornecedor; intervenção
administrativa; imposição de contrapropaganda, dentre outras estabelecidas no art.
56 do CDC), poderão ser aplicadas ao fornecedor (a) as sanções de natureza civil
privada, advinda de ação de responsabilidade civil interposta pelo consumidor
lesado contra o fornecedor do produto ou serviço, conforme o disposto nos arts. 12,
14 e 18 do CDC, (b) as de natureza penal, estabelecidas no art. 61 do CDC e (c) as
definidas nas normas específicas.
Como acima mencionado, na classificação doutrinária referente às
sanções, a sanção aplicada ao fornecedor de produtos e serviços não deve ser
considerada, no nosso entendimento, sanção administrativa, dado que não é
estabelecida em relação funcional havida entre a Administração pública e um de
seus funcionários. A referência havia no art. 56 do CDC às sanções administrativas,
diz respeito às sanções impostas em processo administrativo, mas não às sanções
decorrentes de relação funcional, que não são objeto do CDC, como sabemos.
141
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...)
§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação
de reparar os danos causados.
142
Art. 225 (...)
§ 2º Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de
acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.
120
recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo
órgão público competente, na forma da lei.
A responsabilidade criminal e administrativa do agente da infração ao meio
ambiente, com base no art. 2o143 da Lei n. 9.605/98, é subjetiva, dado que prevê a
aplicação das penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade.
A responsabilidade do agente da infração ao meio ambiente, com base nos
arts. 2o e 3o da Lei n. 9.605/98, é subjetiva, dado que o art. 2 acima citado prevê
a aplicação das penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade.
Considera-se também responsável pelo ilícito aquele que concorrer para a prática
dos crimes previstos na lei, bem como o diretor, o administrador, o membro do
conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto, ou o mandatário de
pessoa jurídica, que, consciente da conduta criminosa do agente do ato, por
omissão, deixar de impedir a sua prática, quando podia agir para evitá-la.
De acordo com o art. 3o144 da Lei n. 9.605/98, as pessoas jurídicas serão
responsabilizadas administrativa, civil e penalmente, por força e no bojo de
processos específicos e concorrentes, nos casos em que a infração seja cometida
por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado,
no interesse ou no benefício da sua entidade.
O parágrafo único do art. 3o145 da Lei n. 9.605/98 determina que a
responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras,
co-autoras ou partícipes do mesmo fato.
O art. 6o da Lei n. 9.605/98, que trata da aplicação da pena, estabelece
como critérios para imposição e gradação da penalidade, os seguintes: a gravidade
do fato; os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o
meio ambiente; os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação
de interesse ambiental; e a situação econômica do infrator, no caso de aplicação de
multa.
143
Art. 2º. Quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta lei, incide nas
penas a estes cominadas, na medida da sua culpabilidade, bem como o diretor, o administrador, o
membro de conselho e de órgão técnico, o auditor, o gerente, o preposto ou mandatário de pessoa
jurídica, que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixar de impedir a sua prática, quando podia
agir para evitá-la.
144
Art. 3º. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente, conforme
o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante
legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
145
Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas,
autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.
121
A subjetividade da responsabilidade criminal e administrativa dos
condenados por infrações ao meio ambiente, nos quais o administrador de
empresas pode ser incluído, como acima mencionado, fica confirmada por força do
disposto no art. 7o146 da citada lei, que considera a culpa um critério para a fixação
das penas restritivas de direito, que são autônomas e substituem as privativas de
liberdade quando: (a) tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de
liberdade inferior a quatro anos; e (b) a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias
do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos de reprovação e
prevenção do crime.
Nesse sentido, dispõe o art. 70 da referida lei, no sentido de que a infração
administrativa é apurada em processo administrativo específico:
“Art. 70. Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as
regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente.
§ 4º As infrações ambientais são apuradas em processo administrativo próprio, assegurado
o direito de ampla defesa e o contraditório, observadas as disposições desta Lei.”
146
Art. 7º. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade
quando:
I - tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos;
II - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como
os motivos e as circunstâncias do crime indicarem que a substituição seja suficiente para efeitos
de reprovação e prevenção do crime.
147
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto
no art. 6º:
I - advertência;
122
Para finalizar, ressaltamos que o Art. 14 da Lei 6938/81, lei ambiental
anterior à atual (Lei 9605/98) e ainda em vigor, em parte, determina que, sem
prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o
não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos
inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitando, os transgressores, às penalidades legais.
O parágrafo primeiro do Art. 14 da Lei 6938/81 determina que a
responsabilidade civil dos infratores da legislação ambiental é objetiva: "sem obstar
a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado,
independentemente de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio
ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e
dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal,
por danos causados ao meio ambiente."
Face ao acima exposto, na nossa opinião, o parágrafo primeiro do art. 14
da Lei 6938/81 que trata da responsabilidade civil objetiva por danos causados ao
meio ambiente foi revogado pela nova lei de meio ambiente que determina que tal
responsabilidade é subjetiva, porque depende da culpabilidade do agente.
II - multa simples;
III - multa diária;
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos,
equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
V - destruição ou inutilização do produto;
VI - suspensão de venda e fabricação do produto;
VII - embargo de obra ou atividade;
VIII - demolição de obra;
IX - suspensão parcial ou total de atividades;
X – (VETADO)
XI - restritiva de direitos.
123
mas não os acionistas de S.As., devem responsabilizar-se pessoal, ilimitada e
subsidiariamente em relação à companhia, para satisfazer as referidas dívidas,
quando o patrimônio da empresa não for suficiente para fazê-lo. Essas decisões
fundamentam-se na hipossuficiência do empregado, carecedor da intervenção e
proteção do Estado, e, equivocadamente, na nossa opinião, na desconsideração da
personalidade jurídica da sociedade, independentemente de fraude ou de abuso de
direito, e na presunção de violação da lei pelos sócios o que é considerado
fundamento para a responsabilização deles, e o era especialmente quando da
vigência do Decreto n. 3.708/19.
Nesse sentido, podemos citar a jurisprudência abaixo, que, apesar de
sustentar que o sócio deve responder pelas dívidas da sociedade, entende que o
mesmo não é solidária nem subsidiariamente responsável pelas mesmas:
“(...) as sociedades e seus sócios são pessoas absolutamente distintas. Não fosse assim,
seria totalmente dispensável a constituição de pessoas jurídicas. Ao firmar o contrato de
trabalho, o autor o fez com a empresa e para ela prestou serviços, sendo apenas essa
pessoa jurídica a responsável pelas obrigações trabalhistas decorrentes da relação de
emprego. Deve o sócio responder nos termos da legislação vigente pelas dívidas da
sociedade, após esgotadas as diligências para satisfação do crédito pela empresa, mas
não figurar solidária ou subsidiariamente no pólo passivo da demanda, principalmente se
não restou comprovada a presença dos fatos previstos nos Arts. 10 e 16 do Decreto
3708/19". (TRT/DF, RO 5187/98, Ac. 3 Turma , Relator: Lucas Kontoyanis, DJE –
09/07/1999).
124
explorar ou usar, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados
confidenciais, utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, obtidos
por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude, excluindo-se, assim,
aqueles que sejam de conhecimento público ou que sejam evidentes para um
técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou
empregatícia, mesmo após o término do contrato.
Também é crime, e contra as patentes, como determinam os arts. 183 e
184 da referida lei, dentre outros, a fabricação, a venda, ou outra operação
comercial de produtos ou a utilização de meio ou processo objeto de patente de
invenção ou de modelo de utilidade, sem autorização do titular.
É inválida a patente requerida por quem não seja seu inventor, nem
autorizado por ele, como menciona Jacques Labrunie,148 com fundamento nos arts
6, 42, 49 e 50 da Lei n. 9.279/96. O administrador que, na qualidade de
representante legal de uma empresa, usurpa patente alheia, inclusive de
empregado, e requer seu registro, perante o INPI, pode ser responsabilizado
criminal e civilmente, se não comprovar que deve ser afastada sua
responsabilidade pela infração aos direitos de inventor, na forma prevista na lei das
S.As.. Deve-se ressaltar que, por outro lado, se o administrador de uma empresa,
empregado da mesma, requer o registro de patente de titularidade da empresa
empregadora, enseja uma patente inválida, como bem esclarece o citado autor.
148
Jacques LABRUNIE. Direito de Patentes: condições legais de obtenção e nulidades. São Paulo:
Manole, 2006, p.100.
125
a prática de um ato ilícito, qual seja a infração da ordem econômica, e não um ato
lícito, fundamentado na teoria do risco ou na possibilidade de socialização dos
prejuízos sofridos pela comunidade que se beneficia com a referida atividade
econômica.
149
Art. 16. As diversas formas de infração da ordem econômica implicam a responsabilidade da
empresa e a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores, solidariamente.
Art. 20. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob
qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos,
ainda que não sejam alcançados: (grifos nossos)
I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;
II - dominar mercado relevante de bens ou serviços;
III - aumentar arbitrariamente os lucros;
IV - exercer de forma abusiva posição dominante.
150
Fábio Ulhoa Coelho, Direito antitruste brasileiro, p. 54.
126
são: (a) a responsabilidade do Estado; (b) a do INSS, por acidente de trabalho; ou
(c) a do fornecedor de produtos ou serviços, pelos respectivos defeitos e pelos
acidentes de consumo.
Desse modo, segundo o referido autor, a responsabilidade objetiva dos
agentes de infração contra a ordem econômica, tipificada no art. 20 da Lei
Antitruste, deve ser vista com cautela. A rigor, não há responsabilidade do agente
ativo da infração. A responsabilidade do empresário ou do administrador pelas
infrações contra a ordem econômica envolve, assim, a prática de um ato ilícito,
objeto de averiguação e constatação pelo Cade, porém, a aplicação da sanção
cabível, estabelecida no art. 23151 da Lei Antitruste, independe de culpa,
151
Art. 23. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas:
I - no caso de empresa, multa de um a trinta por cento do valor do faturamento bruto no seu último
exercício, excluídos os impostos, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando
quantificável;
II - no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável pela infração cometida por
empresa, multa de dez a cinqüenta por cento do valor daquela aplicável à empresa, de
responsabilidade pessoal e exclusiva ao administrador.
III - No caso das demais pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como
quaisquer associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito, ainda que
temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não
sendo possível utilizar-se o critério do valor do faturamento bruto, a multa será de 6.000 (seis mil)
a 6.000.000 (seis milhões) de Unidades Fiscais de Referência (Ufir), ou padrão
superveniente.(Incluído pela Lei nº 9.069, de 29.6.95)
Parágrafo único. Em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas em dobro.
Art. 24. Sem prejuízo das penas cominadas no artigo anterior, quando assim o exigir a gravidade
dos fatos ou o interesse público geral, poderão ser impostas as seguintes penas, isolada ou
cumulativamente:
I - a publicação, em meia página e às expensas do infrator, em jornal indicado na decisão, de
extrato da decisão condenatória, por dois dias seguidos, de uma a três semanas consecutivas;
II - a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitação tendo por
objeto aquisições, alienações, realização de obras e serviços, concessão de serviços públicos,
junto à Administração Pública Federal, Estadual, Municipal e do Distrito Federal, bem como
entidades da administração indireta, por prazo não inferior a cinco anos;
III - a inscrição do infrator no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor;
IV - a recomendação aos órgãos públicos competentes para que:
a) seja concedida licença compulsória de patentes de titularidade do infrator;
b) não seja concedido ao infrator parcelamento de tributos federais por ele devidos ou para que
sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos fiscais ou subsídios públicos;
V - a cisão de sociedade, transferência de controle societário, venda de ativos, cessação parcial
de atividade, ou qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos
nocivos à ordem econômica.
Art. 25. Pela continuidade de atos ou situações que configurem infração da ordem econômica,
após decisão do Plenário do Cade determinando sua cessação, ou pelo descumprimento de
medida preventiva ou compromisso de cessação previstos nesta lei, o responsável fica sujeito a
multa diária de valor não inferior a 5.000 (cinco mil) Unidades Fiscais de Referência (Ufir), ou
padrão superveniente, podendo ser aumentada em até vinte vezes se assim o recomendar sua
situação econômica e a gravidade da infração.
127
considerada irrelevante. Considera-se os efeitos potenciais e efetivos da conduta
empresarial ilícita, fundamento para a aplicação da sanção em processo
administrativo instaurado pelo Cade.
Nesse mesmo sentido, Paulo Sergio Gomes Alonso152 critica a lei, dado
que a mesma menciona a prática de ato ilícito, mas estabelece responsabilidade
objetiva para os respectivos agentes, a qual, no entendimento do autor, aplica-se
apenas aos casos de prática de atividade ou ato lícito.
O art. 20 da Lei Antitruste estabelece que é considerado ilícito não só o ato
praticado e causador de dano a ordem econômica, como também o ato que não
tenha produzido o efeito maléfico almejado, no sentido de: limitar, falsear ou, de
qualquer forma, prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa; dominar
mercado relevante de bens ou serviços; aumentar arbitrariamente os lucros; ou
exercer de forma abusiva posição dominante.
Não resta dúvida de que essa imposição legal estabelecida pelo art. 20 na
Lei n. 8.884/94, não se coaduna com o conceito de responsabilidade que tem como
fundamento a prática de um ato, e o nexo de causalidade entre esse ato e o dano
causado. Se a prática de ato contra a lei não causar qualquer dano, não há que se
falar em responsabilidade. Segundo afirma Paulo Sergio Gomes Alonso,153 essa
figura da responsabilização, desvinculada do dano causado, parece anacrônica em
sede de responsabilidade civil, uma vez que, não produzindo o resultado almejado,
e, assim, como é sabido, o dano à concorrência, não há que se falar de
responsabilidade.
Além da responsabilização prevista nos arts. 20 e 23 da Lei n. 8.884/90, o
art. 29 da mesma prevê a responsabilização da empresa pela indenização das
perdas e danos sofridas pelo prejudicado que vier a processá-la, simultânea e
independentemente do processo administrativo em curso. Nesse caso, a
responsabilização da empresa pode ser configurada através da interposição de três
processos distintos: penal, administrativo e civil.
A Lei n. 8.884/94 visa à defesa da concorrência, estabelecendo ação
governamental normativa e reguladora da atividade econômica, envolvendo as
funções de fiscalização, incentivo e planejamento, em garantia de um ambiente
competitivo no mercado, levando as empresas a operarem com eficiência,
152
Paulo Sergio Gomes ALONSO, Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p.124.
128
reduzindo custos e repassando estes ganhos para o consumidor. Dessa forma,
garante-se a livre iniciativa, fundamento da ordem econômica (art. 170 da
Constituição Federal), por intermédio da livre concorrência, princípio geral da
atividade econômica, bem como o bem-estar da coletividade, segundo José Inácio
Franceschini e Edgard Antonio Pereira.154
As decisões do Cade também ressaltam que a imputação de
responsabilidade ao agente infrator depende do fundado receio de que a conduta
perpetrada e investigada pelo Cade venha a produzir efeitos lesivos ao mercado,
irreparáveis ou de difícil reparação, ou torne ineficaz o resultado final do processo,
como determina o Art. 52 da lei mencionada.155
A Lei n. 8.884/94, que trata das práticas anticoncorrenciais, e disciplina as
relações de mercado entre os agentes econômicos e os consumidores, tutelando-
lhes, através da aplicação de sanção, visa prevenir e punir a prática de atos ilícitos
contra a ordem econômica, ou seja, ao mercado produtor de bens e serviços, e ao
consumidor, em prol da livre iniciativa e da coletividade, sendo que os danos
causados devem ser reparados, preservando-se o princípio da responsabilidade
civil, como afirma Paulo Sergio Gomes Alonso.156
O art. 16 da Lei n. 8.884/94 estabelece que a empresa e os respectivos
administradores, individualmente, são responsáveis, solidariamente, pelos atos
ilícitos praticados, correspondentes às infrações cometidas contra a ordem
econômica, causando prejuízos para o mercado, tanto para os demais
fornecedores de bens e serviços, como para os consumidores, cujo poder de
escolha torna-se limitado ou reduzido, dada a eliminação da concorrência causada
pelo infrator.
153
Paulo Sergio Gomes ALONSO, Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p.124.
154
Edgard Antonio PEREIRA, As eficiências econômicas sob o prisma jurídico. In: José Inácio
Gonzaga FRANCESCHINI, Lei da concorrência conforme interpretada pelo Cade, São Paulo:
Singular, 1998. p. 817.
155
Lei n. 8.884/94 – Art. 52. Em qualquer fase do processo administrativo poderá o Secretário da
SDE ou o Conselheiro-Relator, por iniciativa própria ou mediante provocação do Procurador-Geral do
Cade, adotar medida preventiva, quando houver indício ou fundado receio de que o representado,
direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado lesão irreparável ou de difícil reparação,
ou torne ineficaz o resultado final do processo.
§ 1º Na medida preventiva, o Secretário da SDE ou o Conselheiro-Relator determinará a imediata
cessação da prática e ordenará, quando materialmente possível, a reversão à situação anterior,
fixando multa diária nos termos do art. 25.
156
Paulo Sergio Gomes ALONSO, Pressupostos da responsabilidade civil objetiva, p.124.
129
O Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) é competente
para zelar pela observância da Lei n. 8.884/90, decidir, de forma vinculada, e não
discricionária, sobre a efetiva ou potencial infração à ordem econômica, e, de forma
discricionária, acerca da aplicação das penalidades cabíveis. A decisão sobre
infração à ordem econômica deve estar sempre adstrita ao disposto na Lei n.
8.884/90, mas a sanção legal prevista pode deixar de ser aplicada ou graduada
com base nos critérios estabelecidos no art. 27 da Lei n. 8.884/90, analisados no
bojo do processo administrativo instaurado pelo Cade, se o mesmo perceber que a
conduta do empresário trouxe benefícios à economia ou à determinada região,
conforme a política econômica adotada pelo Governo.
Por força do disposto no art. 23, inciso II, da Lei n. 8.884/94, o
administrador também é considerado pessoalmente responsável, direta ou
indiretamente, pela prática de atos com infração à Lei n. 8.884/94, cometidos pela
empresa. Nesse caso, o administrador é punido com a aplicação de multa de 10%
(dez por cento) até 50% (cinqüenta por cento) do valor daquela aplicável à
empresa, qual seja, de 1% (um por cento) a 30% (trinta por cento) do valor do
faturamento bruto no seu último exercício, excluídos os impostos, a qual nunca será
inferior à vantagem auferida, quando quantificável.
Sendo assim, fica claro que, não por força dos arts 18 ou 20 da Lei n.
8.884/94, mas com base no art. 23, inciso II, da mesma, os administradores
poderão ser responsabilizados por atos de infração à ordem econômica. A punição,
como previsto em lei, dependerá do porte da empresa que o administrador
representa.
Verifica-se, assim, que a lei antitruste imputa responsabilidade objetiva ao
administrador para que o mesmo repare os dados causados para a coletividade,
pela prática de seu ato.
Os arts. 24, 25, 26 da mesma lei, também fixam penas a serem impostas
ao responsável pela infração, consistindo em obrigações de fazer ou em
pagamento de multa diária, aplicável sem prejuízo das penas cominadas no art. 23
da Lei n. 8.884/90.
O art. 60 da mesma lei estabelece que a decisão do Plenário do Cade,
cominando multa ou impondo obrigação de fazer ou de não fazer aos infratores,
constitui título executivo extrajudicial.
130
O art. 35 - C da Lei n. 8.884/90 estabelece que os crimes contra a ordem
econômica são os tipificados na Lei n. 8.137/90, extintos em caso de celebração de
acordo entre o responsável pela infração e o Cade.
O art. 35 - B da Lei n. 8.884/90 prevê a celebração de acordo entre o
responsável pela infração à ordem econômica e o Cade, extinguindo-se o processo
administrativo instaurado.
O art. 18 da lei mencionada trata da responsabilidade dos empresários
(titulares de participação acionária em sociedades anônimas. Ele estabelece que a
personalidade jurídica da empresa responsável por infração à ordem econômica
poderá ser desconsiderada, em caso de prática de abuso de poder econômico,
excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos Estatutos
Sociais ou do Contrato Social.
Deve-se ressaltar que o disposto no art. 18 da Lei n. 8.884/94 não se
destina aos administradores, mas aos acionistas das empresas vinculadas à prática
de atos ilícitos, tendo em vista que a teoria da desconsideração da personalidade
jurídica de que se trata no referido dispositivo legal estabelece que deve ser
imputada responsabilidade aos titulares de participação societária das sociedades
(não aos administradores) que agem com fraude e abuso de poder, indevidamente
praticados, desprezando-se, assim, a autonomia patrimonial entre a sociedade e
seus acionistas ou sócios.
Por outro lado, os administradores que agem com excesso de poderes, e
contra a lei ou aos Estatutos Sociais responderão pessoalmente pelos atos
praticados, conforme bem afirma Fábio Ulhoa Coelho.157
Como bem observa Fábio Ulhoa Coelho,158 o administrador poderá,
estabelecer com a empresa, através do respectivo Estatuto Social, limitação de sua
responsabilização perante o Cade, e o ressarcimento, pela empresa, da multa
imputada ao mesmo em processo administrativo instaurado pelo Cade. Se não
prevista essa condição em contrato celebrado entre as partes mencionadas, a
Assembléia Geral da empresa poderá assim deliberar, em favor do administrador
condenado pelo Cade ao pagamento de multa por infração à ordem econômica.
Isso parece razoável porque, a sociedade, assim, evitará que seu administrador
mantenha agressividade na competição entre os concorrentes havidos no
157
Fábio Ulhoa COELHO, Direito antitruste brasileiro, p. 47.
158
Fábio Ulhoa COELHO, Direito antitruste brasileiro, p. 89.
131
respectivo mercado de atuação, e porque, diferente do administrador, poderá, a
empresa, a médio prazo, repassar o valor da indenização paga aos preços de seus
produtos e serviços.
Para finalizar, no que toca a infração da ordem econômica, regulada pela
Lei n. 8.884/90, que envolve a tutela das estruturas do livre mercado, mediante a
atribuição de responsabilidade às empresas pode configurar-se através de três
procedimentos distintos, resultando o processo civil (art. 29 da Lei n. 8.884/90) e o
administrativo (art. 23 e 24 da Lei n. 8.884/90), em sanção civil, reparatória dos
danos causados, e o processo penal (art. 35 - C da Lei n. 8.884/90, art. 15 da Lei
n. 8.137/90, e art. 100 do Código Penal), em sanção penal, caracterizada pela
segregação do agente, pela respectiva diminuição patrimonial ou pela privação de
uma faculdade do infrator.
Em conclusão, não podemos concordar que o administrador seja
responsabilizado de forma objetiva perante o Cade, dado que a tipificação do crime
contra a ordem econômica corresponde a um ilícito, averiguado pelo Cade antes da
aplicação da condenação cabível ao infrator, que pode ser inclusive, graduada,
conforme a boa fé do agente; a consumação ou não da infração; o grau de lesão ou
perigo de lesão à livre concorrência, aos consumidores, à economia nacional, ou a
terceiros; a situação econômica do infrator; e a reincidência; dentre outros critérios.
132
responsável, pelo prejuízo havido, se não atuar de acordo com a conduta
preestabelecida pela empresa, envidando todos os esforços para o cumprimento do
fim social e para o alcance do resultado previsto. Exige-se do administrador uma
conduta de acordo com os deveres de administrador, mas não se vincula o
administrador a certo resultado a ser obtido pela companhia, que, muitas vezes,
independe da sua conduta.
Diferentemente da obrigação de meio, tem-se a obrigação de resultado,
caso em que o agente é obrigado a produzir o resultado final esperado da sua
atividade, e, assim, é considerada objetiva a sua responsabilização pelos atos
ilícitos praticados. A obrigação de resultado pode ser aplicada a certas tarefas
exercidas pelo mesmo profissional que assume, em outros casos, obrigação de
meio. Os médicos, por exemplo, assumem obrigação de resultado no exercício de
certa atividade profissional que não envolve complexidade, de modo a não lhe
requisitar exercício reflexivo da ciência médica, mas apenas que esteja aparelhado
de equipamentos especialmente precisos, como os que funcionam à base de lazer,
por exemplo.
159
Paulo Fernando Campos Salles de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade
anônima, p. 67-68.
133
administração. Ao referir-se a órgão da administração, pressupõe-se que a lei das
S.As. em vigor incluiu os membros do Conselho de Administração no dispositivo
legal referente à responsabilização dos administradores. Mais uma prova
inequívoca disso é o fato de que o art. 160 da referida lei determina a aplicação da
Lei das S.As. aos membros de qualquer órgão criado pelo Estatuto Social da
empresa, com funções técnicas ou destinadas a aconselhar os administradores.
A conclusão advinda desse fato é a de que se até os órgãos técnicos ou de
aconselhamento da empresa podem estar sujeitos à responsabilização pela prática
de atos culposos, quanto mais o próprio Conselho de Administração que reúne
função administrativa. Depreende-se, assim, como afirma o autor160 mencionado,
que a intenção do legislador foi estabelecer responsabilidade civil idêntica para
todos os órgãos de administração da companhia, ou seja, para os diretores e
membros do Conselho de Administração.
Reiteramos que a Lei das S.As. carece de distinção de tratamento, no que
toca à responsabilidade civil dos diretores e dos membros do Conselho de
Administração. Na verdade, a responsabilidade dos administradores, membros da
Diretoria é individual, só havendo responsabilidade solidária entre os diretores que
atuam na mesma área ou na mesma função. Por outro lado, a responsabilidade dos
membros do Conselho de Administração é coletiva e solidária. Para evitar
responsabilidade solidária de um administrador para com outro, exige-se que o
administrador não culpado denuncie os agentes do ato ilícito, inclusive seus
predecessores.
Como esclarece o autor supra citado,161 apesar da regra geral da
responsabilidade individual dos diretores, se descumprirem, todos eles, o dever ao
qual todos, indistintamente, incumbiram-se, responsabilizar-se-ão, todos eles, pelos
danos causados. Por outro lado, os membros do Conselho de Administração
poderão ter sua responsabilidade individual afastada, se manifestarem,
expressamente, sua discordância com a prática de certo ato, determinado por
deliberação coletiva do Conselho de Administração.
160
Paulo Fernando Campos Salles de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade
anônima, p. 68.
161
Paulo Fernando Campos Salles de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade
anônima, p. 75-76.
134
5.8.3 - Responsabilidade solidária entre os administradores -
135
Evidencia-se, em face do exposto, que o administrador não é
responsabilizado pelos atos cometidos por outros, quando adota as cautelas
necessárias à ressalva de sua responsabilidade, através do controle das ações dos
demais administradores, o que consiste em mais um dever dos administradores,
imposto indiretamente pela lei, evidenciando-se, assim, que não há
responsabilidade civil sem culpa, por ato comissivo ou omissivo, do administrador.
A responsabilidade solidária entre os administradores ensejará o
pagamento, pelos mesmos, da indenização devida à companhia, conforme o
disposto no parágrafo quinto do art. 158 da Lei das S.As. Em ação de regresso de
um contra os demais administradores faltosos, discutir-se-á a repartição dos
encargos de cada administrador com relação à indenização devida, por força do
evento danoso.
A solidariedade entre os administradores, membros da Diretoria da
empresa, não se aplica quando as respectivas funções são distintas, havendo
divisão de trabalho por áreas de atuação específicas, previstas no próprio Estatuto
Social da empresa, de modo que cada diretor executa suas funções com
independência e autonomia, tendo pouco contacto com os demais, no exercício da
respectiva gestão. Nesses casos, apenas o diretor que cometeu o ato ilícito, sem
qualquer interferência ou conhecimento dos demais, é o responsável pelo dano
causado à empresa, aos acionistas ou a terceiros.
Conclui-se, assim, que o administrador que não praticou o ato ilícito é
solidário com o que o fez, caso a gestão da empresa seja compartilhada, haja
conivência de um diretor com o ato ilícito praticado pelo outro, negligência na sua
constatação, ou omissão na revelação do ato quando dele tenha conhecimento.
136
Nesse caso, para um membro dissidente manifestar sua vontade contrária
à do próprio órgão, com base nos documentos e nos informes disponibilizados,
pelos próprios diretores ou pelos membros do Conselho Fiscal da companhia,
deverá consignar em ata seu voto contrário ao deliberado pelo referido órgão.
Os membros do Conselho de Administração não são responsáveis pelos
atos ilícitos cometidos pelos diretores, mas respondem solidariamente pela prática
deles, em caso de comprovada conivência, negligência ou omissão: na fiscalização
da gestão deles (art. 142, inciso III, da Lei das S.As.), na denúncia de atos ilícitos
por eles praticados, ou na tentativa de impedir tal prática, resultando, enfim, na
destituição de qualquer diretor ( art. 143 da Lei das S.As.). O Conselho de
Administração deve, ainda, convocar a Assembléia Geral quando julgar
conveniente (art. 142, inciso IV, da Lei das S.As.). Entretanto, deve-se ressaltar que
o não cumprimento dos deveres do Conselho de Administração também não enseja
responsabilidade solidária para os diretores, que não são responsáveis pelas
omissões dos outros administradores, membros do Conselho de Administração,
com relação ao exercício da gestão da empresa.
137
5.8.6 - Responsabilidade Solidária entre os Administradores e Terceiros -
162
Modesto Carvalhosa. Comentários à lei das sociedades anônimas, p.473-474.
138
interesse social. A função do referido acordo é a de harmonizar os interesses
individuais dos acionistas com os da companhia, não se admitindo que acolham
interesses dos pactuantes que conflitem ou que se sobreponham aos da própria
companhia e à sua função social.
Nesse sentido, estabelece o art. 115, caput, da Lei das S.As., com relação
ao dever do acionista de exercer o direito de voto, no interesse da companhia, para
fins de consecução do objeto social. O acordo de acionistas em nada deve ser
incompatível com os deveres dos administradores, os quais não podem deixar de
observá-los. De acordo com o disposto no art. 154, parágrafo primeiro, da Lei das
S.As., o administrador eleito por grupo ou classe de acionistas tem, para com a
companhia, os mesmos deveres que os demais, não podendo, ainda que para a
defesa do interesse dos que o elegeram, faltar a esses deveres.
O referido pacto é acessório ao Estatuto Social, vez que depende de
cláusulas estatutárias e mantém interdependência com o mesmo.
Os acordos de acionistas podem ter como objeto a compra e venda de
ações, a preferência para adquiri-las, o exercício do direito de voto, ou do poder de
controle.
Distinguiam-se as modalidades de acordo de acionistas, em (a) acordo de
voto, para fins de organizar ou previamente estabelecer as regras de exercício do
direito de voto (acordo de mando) ou ainda proteger a minoria (acordo de defesa,
incluindo-se a fiscalização dos atos praticados pelos acionistas controladores), e (b)
acordo de bloqueio, que versa sobre negociação e transmissibilidade de ações da
companhia, tais como a compra, venda e estabelecimento de preferências, de
acordo com Geraldo de Camargo Vidigal e Ives Gandra da Silva Martins.163
Conforme a alteração introduzida no caput do art.118 da Lei das S.As.,
pela Lei n. 10.303/01, atualmente, consta expressamente na lei que os acordos de
acionistas também podem versar sobre o exercício do poder de controle.
Segundo Fabio Konder Comparato,164 o acordo de acionistas, no que toca
aos seus efeitos, pode ser classificado em unilaterais, bilaterais e plurilaterais,
conforme o número de partes vinculadas ao mesmo. Nos acordos plurilaterais não
163
Geraldo de Camargo VIDIGAL e Ives Gandra da Silva MARTINS (Coord.). Comentários à lei das
sociedades por ações. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999. p. 358.
164
Fábio Konder COMPARATO, Novos ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro:
Forense, 1981. p. 55-56.
139
há intercambialidade das prestações, mas colaboração em vista de um objetivo
comum.
Para terem eficácia perante a companhia, obrigando-a, os acordos de
acionistas não podem ser invocados contra prescrições legais. Também não podem
servir de lastro para eximir o acionista de responsabilidade no exercício do direito
de voto (art.115 da Lei das S.As.), ou, em se tratando do acionista controlador, do
poder de controle ( arts 116 e 117 da Lei das S.As.), como o disposto no art. 118,
parágrafo segundo da Lei das S.As.
Além disso, devem ser elaborados e arquivados na sede da empresa e
averbados nos livros de registro de ações, para serem oponíveis a terceiros,
inclusive interessados na compra de ações da companhia, como determina o art.
118 da Lei das S.As., e como mencionam Geraldo de Camargo Vidigal e Ives
Gandra da Silva Martins.165
Assim, como afirma Marcio Luis Maia,166 o acordo de acionistas aplica-se
aos acionistas signatários do mesmo e também os órgãos de administração da
sociedade, através dos quais a companhia atua, os membros do Conselho de
Administração e os diretores.
Sendo assim, entende-se que o acordo de acionistas, atendidos os
requisitos supra, devem ser obedecidos pela companhia.
A Lei n. 10.303/01 incluiu disposição, no parágrafo oitavo do art. 118 da Lei
das S.As., no sentido de que o acordo oponível à sociedade passa a vincular não
apenas os acionistas em Assembléia Geral ou especial, mas também os
administradores indicados pelos acionistas, no que respeita as deliberações do
órgão de que participem, razão pela qual, como afirmam Modesto Carvalhosa e
Nelson Eizirik,167 os referidos pactos vinculam não apenas os membros do
Conselho de Administração eleitos pelo acordo de acionistas, mas também os
diretores com as mesmas características, nas reuniões de Diretoria, quando a
sociedade não tiver Conselho de Administração constituído, e a Diretoria exercer a
função de órgão deliberativo, além de representativo da companhia.
165
Geraldo de Camargo VIDIGAL e Ives Gandra da Silva MARTINS, Comentários à Lei das
sociedades por ações, p. 358-359.
166
Márcio Luís MAIA, A responsabilidade do administrador e o acordo de acionistas, p. 59.
167
Modesto CARVALHOSA e Nelson EIZIRIK, A nova lei das sociedades anônimas. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 211-213.
140
Desse modo, como determina o dispositivo legal supra citado, embora a
Diretoria não seja um órgão colegiado, assume a função deliberativa, com base no
art. 143, parágrafo segundo, da Lei das S.As., em reunião regular, em paralelo à
função de representação da companhia, tratada no art. 144 da Lei das S.As., nos
casos em que a empresa não tenha constituído Conselho de Administração.
Verifica-se que a Diretoria só assume a dupla função de órgão deliberativo e
representativo, nos casos de inexistência de Conselho de Administração na
companhia, órgão colegiado próprio e autônomo.
Conclui-se, assim, que o acordo de acionistas, com a nova redação do art.
118 da Lei das S.As., pode ter por objeto também o poder de controle, além do
exercício do direito de voto. Como afirmam Modesto Carvalhosa e Nelson Eizirik,168
como o poder de controle é exercido, na maioria das vezes, primeiro nos órgãos de
administração da companhia e depois na Assembléia Geral, estão vinculados ao
acordo, com relação aos votos, os membros do Conselho de Administração eleitos
pelo acordo, ou os diretores, como determina o art. 143 da Lei das S.As., na
mesma condição, quanto às respectivas deliberações tomadas em reunião de
Diretoria, na ausência do Conselho de Administração, ressalvado o disposto no
parágrafo primeiro do art. 154 da Lei das S.As., supracitado.
168
Modesto Carvalhosa e Nelson Eizirik, A nova lei das sociedades anônimas, p. 212.
141
6. A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ADMINISTRADORES NO DIREITO
COMPARADO
169
Antonio Menezes CORDEIRO, Da responsabilidade civil dos administradores das sociedades
comerciais, p. 106-113.
142
sociedades anônimas, seja pelas violações aos estatutos, seja pelas faltas
cometidas na sua gestão.
Nesses casos, cabe aos acionistas, seja individualmente, seja agrupando-
se, nas condições fixadas na legislação aplicável, intentar a ação social de
responsabilidade contra os administradores ou a ação de reparação de prejuízo
sofrido pessoalmente.
Giovanna Visintini,170 comentando o Código Civil francês, afirma que a
responsabilidade contratual e a extracontratual francesa são, em geral, subjetivas,
e que o parâmetro é a conduta adotada por um bom pai de família.
Estabelece, ainda, que o art. 1.383171 do Código Civil francês que cada um
é responsável pelo dano causado, não apenas pelos atos praticados, mas também
pela sua negligência ou pela sua imprudência.172
Na Alemanha, a lei de 1937 (AktG 1937), que trata das sociedades e que,
inclusive, influenciou a lei societária brasileira, qual seja, o Decreto n. 2.627/40,
adotou a responsabilidade dos administradores pelos danos causados à sociedade
como um princípio. Essa lei, como bem menciona Antonio Menezes Cordeiro,173
codificou os diversos deveres dos administradores, além do já conhecido dever de
gestão. Os administradores que violarem os seus deveres responsabilizam-se,
solidariamente, perante a sociedade, à indenização do dano daí resultante, sendo
sua obrigação demonstrar que aplicou, no exercício do seu cargo, o cuidado de um
diretor ordenado e consciencioso.
O diretor não é responsabilizado quando o seu ato tenha amparo em
deliberação assemblear com base na lei. Salvo os casos em que a
responsabilidade do administrador pode ser afastada, os credores podem exigir dos
170
Giovanna VISINTINI, Tratado de la responsabilidad civil, p.16.
171
Art. 1.383 – Code Civil – “Chacun est responsable du dommage qu’il a causé non seulement par
son fait, mais encore par sa négligence ou par son imprudence”.
172
Giovanna VISINTINI, Tratado de la responsabilidad civil, p.9.
173
Antonio Menezes CORDEIRO, Da responsabilidade dos administradores das sociedades
comerciais, p.122-123.
143
administradores da companhia reparação dos danos que lhe foram causados,
depois de ter tentado, sem sucesso, obter satisfação junto à companhia.
174
Waldirio Bulgarelli, Manual das sociedades anônimas, p. 26.
175
Giovanna Visintini, Tratado de la responsabilidad civil, p. 342-343.
176
Giovanna Visintini, Tratado de la responsabilidad civil, p. 342-350.
144
pelo prejudicado, de ação individual de responsabilidade contra o administrador
faltoso.177
177
Giovanna Visintini, Tratado de la responsabilidad civil, p. 344.
178
Waldirio Bulgarelli, Manual das sociedades anônimas, p. 27.
179
Carlos Alberto Ghersi, Daños por gestión empresaria, p.54.
180
Carlos Alberto Ghersi, Daños por gestión empresaria, p.38-87.
181
Carlos Alberto Ghersi, Daños por gestión empresaria, p.88.
145
não exercício de seus deveres na condução dos negócios da empresa, como
poderia esperar-se em circunstâncias similares, que o administrador agisse, se
estivesse conduzindo negócio de seu próprio interesse (RMBCA $ 8.30), conforme
tem se manifestado a jurisprudência americana.183 Isso demonstra que os Tribunais
americanos tem prestigiado a boa fé do administrador na condução de seus
negócios, independentemente do erro causado na sua administração.
O administrador é, ainda, responsabilizado, de acordo com a legislação
americana, como esclarece Robert W. Hamilton,184 pela sua conduta culposa,
consubstanciada na prática de ato ilícito ou na sua omissão com relação à conduta
ilícita de outrem, desde que tenha tido condições de verificar a ilicitude de tal
conduta, como esclarece Robert W. Hamilton.185
182
Robert W. Hamilton, Corporations , p. 304-306.
183
Shlensky v. Manganese corp. of America, 224 A2d 634 (Pa. 1966).
184
Robert W. Hamilton, Corporations, p. 305-308.
185
Robert W. Hamilton, Corporations, p. 307.
146
7 . A RESPONSABILIDADE DOS ADMINISTRADORES DAS S.AS. E DOS
ADMINISTRADORES DAS SOCIEDADES LIMITADAS – ANÁLISE
COMPARATIVA
147
Entretanto, não resta dúvida de que o art. 158 da Lei das S.As., mais
específico sobre o assunto, aplica-se, supletivamente, às sociedades limitadas,
conforme o disposto no art. 1.053 do Código Civil, se prevista, nos respectivos
contratos sociais, a aplicação supletiva da Lei das S.As.
Deve-se ressaltar, porém, que o art. 158 da Lei das S.As., prescrevendo a
responsabilidade subjetiva dos administradores, também aplica-se às sociedades
limitadas por analogia, para fins de suprir e preencher as lacunas da lei, conforme
previsto (a) no art. 2.037 do Código Civil, que determina que, salvo disposição em
contrário, aplicam-se aos empresários e sociedades empresárias as disposições de lei
não revogadas pelo mesmo, referentes a comerciantes, ou a sociedades comerciais,
bem como a atividades mercantis, bem como, (b) nos arts. 4o e 5o186 da Lei de
Introdução ao Código Civil e no art. 126 do Código de Processo Civil (CPC) .187
Verifica-se, pelos dispostos legais supracitados, que a responsabilidade
civil do administrador é tratada de forma analógica com relação às sociedades
limitadas, e às sociedades anônimas. Desse modo, o disposto na lei das
sociedades anônimas, aplicado às sociedades limitadas, vem a especificar a
disciplina da responsabilidade civil dos respectivos administradores.
186
Lei introdução ao Código Civil:
“Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e
os princípios gerais de direito.
Art. 5º Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do
bem comum.”
187
Código Processo Civil:
Art. 126. O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei.
No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia,
aos costumes e aos princípios gerais de direito. (Redação dada ao artigo pela Lei n. 5.925, de
01.10.1973)
148
8. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRA OS ADMINISTRADORES
DAS S.AS.
149
terceiros; (b) se a limitação dos poderes dos administradores era evidente para o
terceiro prejudicado pelo ato praticado com excesso de poderes pelo administrador;
(c) ou se a operação ou ato praticado foi, indubitavelmente, contrário ao objeto
social. Nesses casos, a sociedade poderá opor-se ao terceiro lesado que vier a lhe
exigir indenização pelos danos causados, por ato praticado por representante legal
da mesma, com excesso de poderes.
A regra da consulta aos atos societários da empresa contratante,
averbados no órgão competente, aplica-se para os empresários em geral, mas não
para os consumidores, como afirma Fábio Ulhoa Coelho,188 dado a hipossuficiência
desses.
A presunção de que o administrador age em nome da sociedade, nos
limites fixados pelos poderes que lhes foram conferidos e de acordo com o objeto
social da empresa é a regra geral. Daí entender-se que o ato praticado pelo
administrador, salvo exceções, vincula a sociedade.
Por força da teoria da aparência, a sociedade deve atentar para o controle
dos atos de gestão dos administradores, apesar das dificuldades para tanto,
impostas pelo dinamismo da vida negocial. Assim, compete à sociedade zelar e
estar atenta para os atos praticados por seus dirigentes, não lhe sendo lícito alegar
desconhecimento dos atos praticados pelos mesmos, em prejuízo de terceiros,
como sustentou Egberto Lacerda Teixeira e José Alexandre Tavares Guerreiro.189
Sobre esse tema, já houve controvérsia, pois ao lado os defensores da
tese acima, havia os que sustentavam a absoluta validade dos atos societários
praticados pelos respectivos administradores. Essa presunção de validade absoluta
dos atos praticados em nome da sociedade, certamente, criaria entraves aos
negócios sociais, sendo o mais correto conciliar a teoria da aparência jurídica com
a proteção dos interesses legítimos dos sócios e de terceiros de boa fé, como
consta das decisões publicadas na Revista dos Tribunais190 abaixo transcritos.
188
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, v. 2, p. 448.
189
Egberto Lacerda TEIXEIRA; José Alexandre Tavares GUERREIRO, Das sociedades anônimas no
direito brasileiro, p. 481-482.
190
RT 443/345: Sociedade comercial – Anônima – Título de crédito – Aval de um dos diretores em
desatenção ao Contrato Social, em prol de terceiro de boa fé – Validade – Motivação – Embargos não
conhecidos. Ainda que o desvio da finalidade da firma, ou a infração do seu Contrato Social resulte
de ato de uma única pessoa dirigente da mesma, o abuso por si cometido não exonera a sociedade
da responsabilidade em face de terceiro de boa fé. Compete à empresa selar e observar os atos
praticados por seus sócios dirigentes, não lhe sendo lícito alegar ignorância de tais atos, em prejuízo
de terceiros. (Supremo Tribunal Federal – Recurso Ordinário n. 69.028 – RS – Tribunal Pleno)
150
Nos casos de excesso de poderes praticados pelos administradores de
certa sociedade, que não justificam a responsabilização pela mesma, dado o
disposto no parágrafo único do art. 1.015 do Código Civil, o prejudicado deverá
demandar a pessoa física do administrador da sociedade ou do terceiro que atuou
como se fosse representante legal da sociedade. Se o sujeito lesado for uma outra
sociedade, esta poderá também ressarcir-se, junto aos seus representantes legais
que atuaram sem zelo, não verificando o Contrato Social daquela com a qual
decidiram celebrar contrato, como menciona Fábio Ulhoa Coelho.191
A ação indenizatória poderá ser proposta por aquele que foi lesado, para o
ressarcimento do prejuízo sofrido, em conseqüência do ato praticado pelo
administrador. Sendo assim, a ação de responsabilidade poderá ser proposta
contra o administrador, pela sociedade, pelo acionista da mesma sociedade, ou por
qualquer terceiro lesado, conforme prevê o art. 159,192 parágrafos primeiro e sétimo
da Lei da S.As.
191
Fábio Ulhoa COELHO, Curso de direito comercial, v. 2, p. 449.
192
Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/76):
“Art. 159. Compete à companhia, mediante prévia deliberação da assembléia geral, a ação de
responsabilidade civil contra o administrador, pelos prejuízos causados ao seu patrimônio.
§ 1º A deliberação poderá ser tomada em assembléia geral ordinária e, se prevista na ordem do
dia, ou for conseqüência direta de assunto nela incluído, em assembléia geral extraordinária.
§ 2º O administrador ou administradores contra os quais deva ser proposta a ação ficarão
impedidos e deverão ser substituídos na mesma assembléia.
§ 3º Qualquer acionista poderá promover a ação, se não for proposta no prazo de 3 (três) meses
da deliberação da assembléia geral.
§ 4º Se a assembléia deliberar não promover a ação, poderá ela ser proposta por acionistas que
representem 5% (cinco por cento), pelo menos, do capital social.
§ 5º Os resultados da ação promovida por acionista deferem-se à companhia, mas esta deverá
indenizá-lo, até o limite daqueles resultados, de todas as despesas em que tiver incorrido,
inclusive correção monetária e juros dos dispêndios realizados.
§ 6º O juiz poderá reconhecer a exclusão da responsabilidade do administrador, se convencido de
que este agiu de boa fé e visando ao interesse da companhia.
§ 7º A ação prevista neste artigo não exclui a que couber ao acionista ou terceiro diretamente
prejudicado por ato de administrador.”
151
Qualquer acionista poderá promover a referida medida judicial, se não
promovida pela companhia nos três meses subseqüentes à deliberação assemblear
no sentido de fazê-lo, como determina o parágrafo terceiro do art. 159 da Lei das
S.As.
Entretanto, o prazo de 3 (três) meses mencionado não é decadencial:
conforme o disposto no art. 287, II, b, 2, prescreve em 3 (três) anos a ação da
sociedade, acionista ou terceiros contra os administradores, para deles haver
reparação civil por atos culposos ou dolosos, contra a lei ou o Estatutos Social da
companhia. O referido prazo é contado da data da publicação da ata que aprovar o
balanço referente ao exercício em que a violação tenha ocorrido.
Por outro lado, se a Assembléia decidir não ajuizar a referida medida
contra o administrador, os acionistas só poderão fazê-lo se representarem ao
menos 5% do capital social, como previsto no parágrafo quarto do art. 159 da lei
das S.As.. Esse percentual mínimo poderá ser reduzido pela CVM, em função do
valor do capital social, quando se tratar de companhia aberta.
De acordo com o caput e parágrafo primeiro do art. 159 da Lei das S.As., a
sociedade poderá ajuizar ação social de responsabilidade contra o administrador,
ao qual for imputada responsabilidade pessoal civil, pelos atos ilícitos praticados
culposa ou dolosamente ou contra a lei ou o Estatuto Social, visando ao
ressarcimento dos prejuízos sofridos, no prazo de 3 (três) meses, a contar da
respectiva deliberação da Assembléia Geral Ordinária, ou da Assembléia Geral
Extraordinária, se prevista a matéria na ordem do dia ou se a discussão advir de
matéria nela tratada.
A medida judicial interposta pela sociedade contra o administrador é
denominada de ação social, e por um acionista ou um terceiro, é considerada ação
individual.
A ação de responsabilidade é denominada de social por referir-se à
companhia e por destinar-se a beneficiá-la. Essa ação também pode ser
152
denominada de ação regressiva da sociedade para responsabilização dos
administradores
Para evitar que o administrador, representante da sociedade influencie a
Assembléia Geral a deliberar contra processá-lo, a lei estabeleceu
complementarmente, a possibilidade de qualquer acionista de interpor ação
individual ou singular contra o administrador, se a própria sociedade não o fizer no
prazo de 3 (três) meses da deliberação assemblear .
Se, por outro lado, a Assembléia Geral decidir não processar o
administrador, acionistas representando 5% do capital social poderão fazê-lo.
Nesses casos de ação singular, o acionista age em seu nome, mas na
defesa dos interesses da sociedade, em substituição processual.
A ação social e a individual podem ser ajuizadas paralelamente, cabendo a
ação singular aos acionistas ou a terceiros prejudicados pela prática de ato ilícito
pelo administrador.
O administrador, contra o qual for decidido ajuizar-se ação social de
responsabilidade civil pela Assembléia Geral da companhia, ficará impedido de
continuar exercendo seu cargo e deverá ser afastado e substituído, na mesma
Assembléia Geral, conforme o disposto no art. 159, parágrafo segundo da Lei das
S.As. Isso porque, como afirma Paulo Fernando Campos Salles de Toledo,193 a
deliberação assemblear produz efeitos desde logo. A sociedade, ao decidir
processar o administrador, já manifestou efetivamente a desaprovação da conduta
e da gestão do administrador, condenando-o e impondo-lhe a sanção do
impedimento.
Interposta a medida judicial contra o administrador, de acordo com o art.
159, parágrafo sexto da Lei das S.As., o juiz poderá decidir pela não
responsabilização do administrador, se entender que o mesmo agiu de boa fé e de
acordo com o interesse da sociedade.
Os resultados da ação proposta por acionistas contra o administrador,
ainda quando a deliberação da Assembléia Geral sobre a matéria tiver sido
negativa, reverterão para a sociedade. De qualquer forma, a sociedade deverá
indenizar os acionistas das despesas incorridas para o ajuizamento da referida
medida judicial, acrescidas, inclusive, da correção monetária e dos juros incidentes.
193
Paulo Fernando Campos Salles de TOLEDO, O conselho de administração na sociedade
anônima, p.76.
153
O valor máximo da indenização corresponderá ao resultado auferido com a
propositura da medida judicial, como prevê o art. 159, parágrafo quinto, da Lei das
S.As.
Em resumo, deve-se ressaltar que, apesar de admitida a interposição de
medida judicial indenizatória, pela sociedade contra os seus administradores, para
a mesma ressarcir-se dos prejuízos sofridos, nos casos em que os gestores sejam
considerados pessoalmente responsáveis pelos atos ilícitos praticados e pela
conseqüente obrigação de ressarcimento dos danos causados, é importante
observar que essa medida adotada pela empresa pode trazer, entretanto,
malefícios para a própria companhia, tornando públicos os problemas internos, de
gestão e de organização da estrutura da mesma, ou divulgando dados
confidenciais dela para o mercado, o que, certamente, afeta a imagem da mesma,
causando-lhe dano de difícil reparação.
Não será responsabilizado o administrador que tiver agido de acordo com
a deliberação dos acionistas havida em Assembléia Geral de Acionistas, e de
acordo com a lei e os Estatutos Sociais. Não cabe ao administrador descumprir as
deliberações dos sócios da sociedade, cuja gestão é de sua responsabilidade.
Assim, se o administrador gerir a sociedade de forma lícita e de acordo com as
deliberações assembleares, a lei e o Estatuto Social, as vantagens e prejuízos
decorrentes de sua gestão serão absorvidos pela própria sociedade.
154
9. CONCLUSÃO
155
prática de atos considerados ilícitos, de forma comissiva ou omissiva, conhecer, em
detalhes, a legislação societária, de modo a exercer uma gestão consciente de sua
função social e de seus direitos e deveres perante a companhia e a comunidade
em geral.
156
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