001125666
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FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS PENAIS
PORTO ALEGRE
2019
EUDER DE BRITO DIAS
PORTO ALEGRE
2019
AGRADECIMENTOS
Agradeço a minha família por tudo que me proporcionou e por todos os instrumentos
que me foram dados para que esse dia se tornasse possível. Hoje, vejo-me como uma pessoa
feliz em mais um sonho que realizo em terminar este trabalho. Minha mãe, Eva Teresinha de
Brito, a qual cumpriu e cumpre um papel fundamental em minha vida, pois, de fato, carrega um
sentimento valoroso e um ímpeto inacreditável, que poucos detêm. Eu, meus irmãos e minha
irmã fomos forjados para superar as dificuldades, embora, às vezes, dê vontade de desistir. Sei
o quanto precisamos desse descanso, mas seguir em frente é necessário. Que toda busca se
concentre em fazer o melhor para si e para o todo.
Não posso aqui me furtar o dever de homenagear o exemplo que tive na pessoa do
meu irmão mais velho Clemilson Luiz de Brito Dias, que desde sempre me mostrou os
caminhos certos a seguir e exemplo de dedicação tanto no trabalho quanto nos estudos, obrigado
meu irmão por ser esse exemplo de homem, no sentido mais amplo da palavra.
No início dessa longa caminhada de formação na graduação, tive uma equipe de
serviço a qual me proporcionou por diversos momentos focar nos estudos, segurando o serviço
para que eu pudesse principalmente passar no vestibular e adentrar na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul. Essa equipe comandada pelo então capitão Rodrigo Shoenfeldt, hoje major
da Brigada Militar ainda contava com outro exemplo de homem e profissional que tive o prazer
de conviver nessa vida, o então 1º Sargento Carlos Alberto Nogueira Insaurrauld, hoje no
descanso merecido da reserva remunerada, espero que em breve o senhor possa sentir essa
felicidade formando agora suas filhas meu amigo. O soldado Rogerio Caetano Fernandes o qual
por diversos dias e noites me repassou a sabedoria da sua experiencia profissional escutando
por muitas vezes minhas lamurias e angustias e sempre me incentivando e por fim e não menos
importante o Soldado Joao Antônio Santos da Silva o qual é exemplo de profissional, homem
e pai, quem me dera chegar um dia a ser perto do que você é meu amigo, colega meu irmão. Eu
não estaria aqui realizando esses agradecimentos em um trabalho de conclusão de curso de
graduação em Ciências Jurídicas e Sociais na Universidade federal sem vocês terem feito parte
da minha vida, talvez na época mais complicada da minha vida. Essa equipe de inteligência do
Batalhão de Operações Especiais ficará para sempre na minha memória e faço aqui essa
homenagem e agradecimento a todos vocês.
Agradeço também ao meu grande amigo, colega de profissão estudos e irmão que a
vida me deu, Bruno Zanini Rodrigues, o qual por diversas noites e dias de trabalho sempre me
incentivou com diversas conversas e conselhos, obrigado meu amigo você é um exemplo de
homem, profissional e pai.
Agradeço a minha orientadora, Prof.ª. Dra. Vanessa Chiari Gonçalves, aos professores
Pablo Rodrigo Alflen da Silva, pelas suas excelentes aulas e dedicação que sempre manteve
para com todos, aliado a um grande conhecimento. Agradeço a Prof. Dra. Ana Paula Motta
Costa, que nos mostrou o Direito Penal com uma outra face e possibilidade, sendo uma pessoa
dotada de uma grande firmeza e humildade. Agradeço, também a Prof. Dra. Roberta Camineiro
Baggio e ao Prof. Dr. Daniel Mitidiero por suas aulas empolgantes e repletas de ensinamentos,
não só didáticos, mas de ensinamentos para nossa evolução como seres humanos. Sou grato por
esses professores que são verdadeiros protagonistas do ensino e possuem um grande grau de
empatia com aqueles que buscam o conhecimento e são interrompidos por causas adversas.
Por fim, agradeço aqui e agora de forma especial ao meu falecido tio Pedro Pereira de
Brito o qual mais que meu tio foi um pai, grande amigo e a pessoa com certeza que mais apostou
na minha vitória nessa vida! Obrigado meu tio. E claro a pessoa que faz eu ter foça para seguir
sempre confiante e não esmorecer nas dificuldades, todas minhas conquistas são para você meu
filho Matheus Oliveira Dias, o pai TE AMA!
Agradeço a Deus por fazer todo esse progresso possível.
RESUMO
A Lei Maria da Penha veio com o intuito de resguardar e amparar as mulheres de todos os tipos
de violência, buscando ações e mecanismos que visam coibir a violência de gênero. Desta
forma, a partir da necessidade de cessar os delitos dessa natureza, tornando-a realmente eficaz,
implantaram-se políticas públicas no combate à violência doméstica contra a mulher, as quais
ampliaram e introduziram serviços especializados, bem como articularam serviços em prol das
mulheres vítimas de violência. Objetivou-se com o presente trabalho monográfico, analisar no
contexto acadêmico a discussão acerca da referida lei diante da realidade social no cotidiano da
sociedade contemporânea, visto que a Lei Maria da Penha além da punição do agressor, visa à
adoção de políticas públicas de prevenção à violência doméstica, além de dar a assistência
necessária para a vítima, para o agressor e seus dependentes. A técnica utilizada foi a pesquisa
bibliográfica, sendo assim, foram realizadas leituras e análises críticas em doutrinas, artigos e
jurisprudências que se manifestam sobre o tema. Não obstante esta ser uma questão histórica e
cultural, é indiscutível a necessidade de erradicar a violência doméstica contra a mulher. Desta
forma, apesar do avanço após a implantação da Lei Maria da Penha, ainda se fez necessária a
adoção de medidas que a tornassem realmente eficaz, para tanto, através de políticas públicas,
adotaram mecanismos de criminalização do agressor e medidas integradas visando à prevenção,
proteção e assistência às mulheres em situação de violência.
Palavras-chave: violência doméstica; políticas públicas; efetividade.
ABSTRACT
Maria da Penha Law has been created in order to support and protect women from all kinds of
violence, seeking actions and mechanisms that aim to stop gender-based violence. This way,
from the need to stop this type of crime and in order to make it really effective, public policies
to combat domestic violence against women have been set up, which expanded and introduced
specialized services for women victims of violence. This work aims to analyze in the academic
context, the discussion of this law toward the social reality in the daily life of the contemporary
society. Maria da Penha Law, besides the punishment for the aggressor, aims for the adoption
of public policies for the prevention of domestic violence, giving the necessary assistance to
the victim, to the offender and their dependents. The technique used is the bibliographical
research, thus, critical reading and critical analysis have been carried out based on doctrines,
articles and jurisprudence which are related to the subject. Although this is a historical and
cultural issue, the need to eradicate domestic violence against women is unquestionable. This
way, despite some progress after the implementation of Maria da Penha Law, it was still
necessary to adopt measures to make it really effective. Therefore, through public policies,
criminalization mechanisms for the aggressor and integrated measures have been adopted,
aiming for the prevention, protection and assistance to women in situations of violence.
Keywords: domestic violence, public policies, effectiveness.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CE – ESTADO DO CEARÁ
OEA – ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS
CEJIL - CENTRO PELA JUSTIÇA E O DIREITO INTERNACIONAL
CLADEM - CÔMITE LATINO-AMERICANO E DO CARIBE PARA DEFESA DOS
DIREITOS DA MULHER
COPEVID - A COMISSÃO PERMANENTE DE COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
E FAMILIAR CONTRA A MULHER
STF – SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
ADI – AÇÃO DECLARATORIA DE INCONSTITUCIONALIDADE
STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
DEAMs - DELEGACIAS ESPECIALIZADAS DE ATENDIMENTO À MULHER
CNDM - CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA MULHER
SEDIM - SECRETARIA DE ESTADO DOS DIREITOS DA MULHER
SPM-PR - SECRETARIA ESPECIAL DE POLÍTICAS PARA MULHERES DA
PRESIDENCIA DA REPUBLICA
CDH - COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS E LEGISLAÇÃO PARTICIPATIVA
CSPCCO - COMISSÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA E COMBATE AO CRIME
ORGANIZADO
PCdoB – PARTUDO COMUNISTA DO BRASIL
POP - PROCEDIMENTO OPERACIONAL PADRÃO
CNJ - CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
TJ-RS – TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
COMAG - CONSELHO DA MAGISTRATURA
JECRIMs - JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS
JVDFM - JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS
MULHERES
SINAN - SISTEMA DE INFORMAÇÃO DE AGRAVOS DE NOTIFICAÇÃO
IGP - INSTITUTO GERAL DE PERÍCIAS
CNMP - CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO
1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 8
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DA MULHER E SUA PROTEÇÃO....... 10
2.1. A LEI MARIA DA PENHA E AS MEDIDAS PROTETIVAS NELA PREVISTAS . 15
2.2. DAS MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO CÓDIGO DE PROCESSO
PENAL ................................................................................................................................ 17
2.3. MEDIDAS PROTETIVAS PARA VÍTIMAS NÃO MULHERES............................. 21
2.4. MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA ............................................................. 22
2.4.1. CRIMES DE DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE
URGÊNCIA ........................................................................................................................ 26
3. MEDIDAS POSITIVAS IMPLEMENTADAS PELO PODER PÚBLICO .................... 27
3.1. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA AS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ..... 28
4. PATRULHA MARIA DA PENHA ............................................................................... 30
4.1. CAPACITAÇÃO DO EFETIVO DA PATRULHA MARIA DA PENHA ................. 33
5. JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS MULHERES
(JVDFM). ............................................................................................................................ 35
5.1. OS JULGAMENTOS DOS CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NOS
JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS MULHERES
(JVDFM). ............................................................................................................................ 39
5.2. A ESTRUTURA DE PROFISSIONAIS NOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA AS MULHERES (JVDFM)................................... 42
6. DELEGACIA ESPECIALIZADA DE ATENDIMENTO À MULHER ........................ 44
6.1. FORMULÁRIO DE AVALIAÇÃO DE RISCO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ..... 49
6.2. ÍNDICES DE REGISTROS NAS DELEGACIAS ESPECIALIZADAS DE
ATENDIMENTO Á MULHER ........................................................................................... 50
7. CONCLUSÃO .............................................................................................................. 52
ANEXOS ......................................................................................................................... 55
1. ANEXO “B” DA NOTA DE INSTRUÇÃO Nº 2.23/EMBM/2018 ............................ 55
(MODELO DE CERTIDÃO DE VÍTIMA EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE) 55
1.2. ANEXO “C” DA NOTA DE INSTRUÇÃO Nº 2.23/EMBM/2018 ........................ 56
(MODELO DE CERTIDÃO DE RECUSA DE ATENDIMENTO) .................................. 56
1.3. ANEXO “D” DA NOTA DE INSTRUÇÃO Nº 2.23/EMBM/2018 ........................ 57
(MODELO DE CERTIDÃO DE NÃO LOCALIZAÇÃO DE VÍTIMA) ........................... 57
1.4. ANEXO “E” DA NOTA DE INSTRUÇÃO Nº 2.23/EMBM/2018 ......................... 58
(MODELO DE CERTIDÃO DE FISCALIZAÇÃO DE MPU COM RETORNO DE
COMPANHEIRO (A) AO LAR) ...................................................................................... 58
1.5. ANEXO “F” DA NOTA DE INSTRUÇÃO Nº 2.23/EMBM/2018 ......................... 59
(MODELO DE CERTIDÃO DE TÉRMINO DE ACOMPANHAMENTO À VÍTIMA) ... 59
2. PROCEDIMENTO OPERACIONAL PADRÃO ....................................................... 60
2.1. VISITA DA PATRULHA MARIA DA PENHA.................................................... 60
2.2 ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIA DE FEMINICÍDIO ................................... 61
2.3. ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E
FAMILIAR CONTRA A MULHER ................................................................................ 62
2.4. ATENDIMENTO DE OCORRÊNCIA DE AMEAÇA/INJÚRIA/DIFAMAÇÃO .. 63
3. FORMULÁRIO NACIONAL DE AVALIAÇÃO DE RISCO VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER ...................................................... 64
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 69
8
1. INTRODUÇÃO
A Constituição Federal Brasileira foi promulgada no ano de 1988, sendo esta a norma
suprema de todo o Ordenamento Jurídico Brasileiro. Nela determina-se que todos os cidadãos
devem ser tratados sem distinções e de forma igualitária. Entretanto, devido à cultura patriarcal
intrínseca na Sociedade Brasileira, está ainda cultiva um sentimento de inferioridade da mulher
em relação ao homem.
Isso porque ao longo dos séculos foi repassada à mulher a ideia que ela precisa ser
protegida, não obstante, ao homem foi transmitido que ele deve ser o protetor. Esta ideia
proliferou-se e vem perdurando ao longo dos anos. Da mesma forma que transmitiram à mulher
que ela deve ater-se ao lar, à família e às atividades domésticas, tornando-a refém da realidade
social em que está inserida, ao homem remanesceu a função de executar o trabalho externo
voltado ao sustendo da família.
Desta forma, a partir dos papéis impostos pela sociedade, foi criada a identidade social
dos homens e das mulheres. A mulher tornou-se submissa ao homem e esse sentimento de
submissão, juntamente com o de inferioridade, fez com que originasse a violência doméstica.
Essa violência, constitui uma problemática que atinge toda a população independente da classe
social, da raça ou etnia.
Dessa forma, a violência doméstica e familiar contra a mulher deve ser analisada em
diversos segmentos, não apenas suas consequências, mas também nas causas que levam à
ocorrência de tantos casos no Brasil. Assim, o presente trabalho tem por escopo analisar a
eficácia da Lei 11.340/06, analisando os órgãos públicos que tratam e atendem diretamente as
vítimas de violência doméstica, sendo eles: A Brigada Militar, Polícia Civil e Poder Judiciário.
10
A mulher era considerada um ser sem voz e sem vez, pois sequer podia votar ou
estudar, o que a impedia de ser atuante na sociedade, estando sempre subordinada ao marido
ou ao pai, o chefe da família. Marco Aurélio Marsiglia Treviso (apud FERNANDES, 2010, p.
01) sustenta que:
isto demonstra que havia um perfeito paradoxo enraizado junto à sociedade, uma vez
que a presença da mulher era, na verdade, a história de sua ausência, já que sempre
foi tratada como uma pessoa subordinada ao marido, ao pai, sem direito de voz e,
ainda, marcada pelo regime de incapacidade jurídica.
No período Colonial de 1500 até 1822 ,e ainda hoje, o sistema que reinava no país era
o patriarcal. Naquele tempo,enquanto os homens dominavam a leitura, a escrita e o poder da
tomada de decisões, as mulheres eram destinadas aos afazeres domésticos, ao casamento,
totalmente submissas e obedientes aos pais, maridos ou irmãos.
Neste período, as mulheres não eram tratadas como pessoas plenamente capazes,
porque necessitavam permanentemente de proteção, em virtude da sua fraqueza de
entendimento, fraqueza esta, que era gerada em razão da total subordinação a que eram
submetidas.
Os tipos penais que protegiam a mulher, na época, eram relacionados a sua
religiosidade, posição social, castidade e sexualidade, sendo que a pena era elevada em razão
da classe social dos envolvidos. No entanto, ao mesmo tempo em que a mulher era protegida
em razão da sexualidade, era autorizado o seu homicídio caso cometesse adultério, nos termos
do Código Filipino1, sendo o homem casado licitamente autorizado a matar a mulher e adúltero,
salvo se o marido fosse peão e o adúltero de maior qualidade (FERNANDES, 2010).
1
As Ordenações Filipinas, ou Código Filipino, é uma compilação jurídica que resultou da reforma do código
manuelino, por Filipe II de Espanha (Felipe I de Portugal), durante o domínio castelhano. Ao fim da União Ibérica
(1580-1640), o Código Filipino foi confirmado para continuar vigendo em Portugal por D. João IV.
11
Já o período do Brasil Imperio que foi de 1822 até 1889, foi marcado como início do
reconhecimento dos direitos das mulheres, com o direito ao acesso dos estudos, apenas para
então chamado 1º grau e com disciplinas diferentes das ensinadas aos homens. O ensinamento
destinado às mulheres era baseado em atividades voltadas para o lar, como corte e costura em
vez de instrução de leitura, escrita ou matemática. (CABRAL, 2008).
No tocante ao Direito Penal, foi publicado o Código Criminal do Império do Brasil,
no ano de 1830, no qual passou a ser considerado como agravante da pena o impedimento da
defesa em razão da superioridade de sexo. Também não podia ser executada a pena de morte
em gestantes, nos termos do artigo 43 do referido código: “Na mulher prenhe não se executará
a pena de morte, nem mesmo ela será julgada, em caso de merecer, se não quarenta dias depois
do parto” (BRASIL,1830).
Em relação à sexualidade da mulher, foi mantida a proteção à reputação da vítima,
estando presente, tal preocupação, nos tipos de crime de estupro, havendo referência às
mulheres virgens, às mulheres honestas e às prostitutas. Dessa forma, percebe-se que o
importante era realmente, naquela época, a desonra que a mulher havia praticado e não a
violência que ela havia sofrido. Segundo Lavorenti (2007, p. 190):
o Código Civil de 1916 para as mulheres em quase nada revolucionou, pois acabou
confirmando a tendência conservadora do Estado e da Igreja, e consagrou a
superioridade do homem, dando o comando unido da família ao marido, e delegando
a mulher casada a incapacidade jurídica relativa, equiparada aos índios, aos pródigos
e aos menores de idade. [...] Devido ao Código Civil o marido se constituiu o chefe
da sociedade conjugal e o administrador exclusivo dos bens do casal, tendo somente
ele o direito de fixar o domicílio da família, do qual se a mulher dele se afastasse por
qualquer motivo poderia ser acusada de abandono de lar, com perda do direito à
alimentos e à guarda dos filhos.
Outra importante conquista deste período foi o direito das mulheres de votar, embora
este direito somente fosse obrigatório para as mulheres que exercessem função pública
remunerada, conforme pode ser observado nos artigos 108 e 109 da Constituição da República
dos Estados Unidos doBrasil:
Art. 142 - São eleitores os brasileiros maiores de dezoito anos, alistados na forma da
lei.
§ 1º - o alistamento e o voto são obrigatórios para os brasileiros de ambos os sexos,
salvo as exceções previstas em lei. (BRASIL, 1967).
vejamos: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos
Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e
tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana; [...]” (BRASIL,1988).
Ainda, a Constituição de 1988 dispôs de modo enfático sobre o pricípio da igualdade
entre homens e mulheres em direitos e obrigações, explicitandoe ressalvando no (CR, art. 5.º,
I), não deixando de fora as relações no âmbito familiar (CR, art. 226, §5.º). Do mesmo modo impõe
ao poder público que crie mecanismos para coibir a viôlência doméstica nas relações familiares e
assegurar assistencia à familia (CR, art 226,§8.º):
Art.5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à
vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
Constituição; [...] (BRASIL, 1988).
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado:
§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente
pelo homem e pela mulher.
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
Art. 1 - Para os efeitos desta Convenção, entender-se-á por violência contra a mulher
qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento
físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada
(BRASIL, 1994).
Outra definição foi trazida por Cabral (2008, p. 134), que afirma que “a violência
doméstica contra a mulher é toda aquela que tenha ocorrido dentro da família ou unidade
domestica ou em qualquer outra relação interpessoal, em que o agressor conviva ou haja
convivido no mesmo domicílio, na comunidade e perpetrada por qualquer pessoa, na
comunidade, local de trabalho, estabelecimentos educacionais de saúde ou qualquer outro
lugar, e mesmo aquela perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes onde quer que
ocorra”.
14
ordenamento jurídico como forma não apenas de punir o agressor, mas também para
acompanhar a vítima durante o processo, protegendo-a e também buscando a recuperação do
agressor. Dessa forma:
Assim, a Lei Maria da Penha surgiu com o intuito não de punir o agressor, mas de
proteger a mulher vítima de violência no âmbito doméstico e familiar, buscando também
recuperar o agressor a fim de que possa retornar ao núcleo familiar e conviver harmonicamente
com sua família.
A Lei Maria da Penha2 traz algumas medidas protetivas que visam proteger a vítima e
salvaguardar o agressor, determinando a prática ou não de determinados comportamentos,
como por exemplo não se aproximar da mulher agredida, mantendo um limite mínimo de
distância entre eles.
A violência doméstica e familiar contra a mulher é tratada pela Lei Maria da Penha,
lei nº 11.340/06, sendo sancionada no dia 07 de agosto de 2006, a qual tem este nome em
homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, que lutou por 20 anos, para ver seu agressor,
que era seu ex-marido, professor universitário e economista, na cadeia. O casal residia em
Fortaleza (CE), possuindo três filhas oriundas da união. Maria da Penha sofreu diversas
agressões durante o tempo em que estiveram juntos, chegando a ser vítima de duas tentativas
de homicídio, na qual em uma delas restou paraplégica, por um disparo de arma de fogo
efetuado pelo seu companheiro, já na segunda tentativa, foi vítma de uma descarga elétrica
também provocada pelo seu companheiro enquanto Maria da Pena tomava banho. Seu
companheiro era um homem muito violento e possuía uma relação tumultuada com Maria da
Penha e as filhas, em razão de temer represálias ainda maiores ela nunca reagiu. Segundo Dias
2
Maria da Penha Maia Fernandes é uma farmacêutica brasileira que lutou para que seu agressor viesse a ser
condenado. Maria da Penha tem três filhas e hoje é líder de movimentos de defesa dos direitos das mulheres, vítima
emblemática da violência doméstica.
16
(2015, p. 21):
como nenhuma providência foi tomada, chegou a ficar com vergonha e a pensar: se
não aconteceu nada até agora, é porque ele, o agressor, tinha razão de ter feito aquilo.
Ainda assim, não se calou. Em face da inércia da Justiça, escreveu um livro, uniu-se
ao movimento de mulheres e, como ela mesma diz, não perdeu nenhuma oportunidade
de manifestar sua indignação.
Mesmo tendo sido condenado pela Justiça local, em 1998 o réu ainda não havia sido
preso, desfrutando de todos os recursos cabíveis contra a decisão prolatada contra ele. Assim,
em razão da falta de efetividade do sistema em relação à violência doméstica e familiar contra
as mulheres, foi motivada a apresentação de denúncia à Comissão Interamericana de Direitos
Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), tendo sido a primeira vez que tal
organização acatou uma denúncia desta natureza.
Apesar de, por quatro vezes, a Comissão ter solicitado informações ao governo
brasileiro, nunca recebeu nenhuma resposta. [...] O relatório nº 54 da OEA, além de impor o
pagamento de indenização no valor de 20 mil dólares, em favor de Maria da Penha,
responsabilizou o Estado Brasileiro por negligência e omissão frente à violência doméstica,
recomendando a adoção de várias medidas, entre elas, simplificar os procedimentos judiciais
penais a fim de que possa ser reduzido o tempo processual.
3
CLADEM/Brasil – Comitê Latino-Americano e do Caribe para defesa dos Direitos da Mulher; CEPIA –
Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação; CFEMEA – Centro Feminista de Estudos e Assessoria; IPE –
Instituto para a Promoção de Equidade e THEMIS – Assessoria Jurídica e Estudos de Gênero
17
Mesmo perante a injustiça e ineficácia do poder público, Maria da Penha tirou forças
para escrever um livro4, contanto com detalhes as diversas agressões sofridas e a inercia do
Poder Judiciário do Brasil perante a violência doméstica por ela sofrida.
observando-se a: [...] § 6o A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua
substituição por outra medida cautelar (art. 319)” (BRASIL,2011).
Há casos, geralmente nos crimes com previsão de pena menor, para os quais não é
necessária a decretação de prisão, enquanto durar o processo. Nestes casos podem ser aplicadas
medidas cautelares diversas da prisão, que servem para controlar e vigiar o acusado. Conforme
Avena (2015, p. 940) que:
de acordo com o art. 282, § 2º, do Código de Processo Penal, as medidas cautelares
serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a requerimento das partes ou, quando no
curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante
requerimento do Ministério Público. Já o § 4º, do mesmo dispositivo, tratando da
desobediência a estas cautelares, preceitua que, no caso de descumprimento de
qualquer das obrigações impostas, o juiz de ofício
A Lei 12.403/11 alterou o artigo 319 do Código de Processo Penal, nele incluindo nove
medidas, elencadas em seus incisos, ficando sua redação da seguinte forma:
4
Maria da Penha Maia Fernandes, Sobrevivi... posso contar.
18
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos
termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou
separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: I -
suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão
competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - afastamento
do lar,
domicílio ou local de convivência com a ofendida; III - proibição de determinadas
condutas, entre as quais: a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das
testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato
com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c)
frequentação de determinados lugares afim de preservar a integridade física e
psicológica da ofendida; IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes
menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar; V -
prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§1ºAs medidas referidas neste artigo não impede a aplicação de outras previstas na
legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o
exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.
§2ºNa hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições
mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de
2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas
protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando
o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação
19
As medidas cautelares são, providências urgentes, com as quais se busca evitar que a
decisão da causa, ao ser obtida, não mais satisfaça o direito da parte e não realize, assim, a
finalidade instrumental do processo, consistente em uma prestação jurisdicional justa,
pressupondo o periculum in mora e o fumus boni iuris.
5
Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (COPEVID) foi criada
pelo Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH), do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG).
20
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão
preventiva:
I - Nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4
(quatro)anos;
II - Se tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em
julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Decreto – Lei no
2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal;
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança,
adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das
medidas protetivas de urgência;
Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida
sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes
para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a
identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida. (BRASIL,
2011).
Uma crítica muito forte que é feita contra a Lei Maria da Penha é em relação ao
princípio da igualdade. Muitos afirmam que o homem ficou vulnerável e desprotegido na
hipótese de ser vítima de violência doméstica.
Contudo, essas avaliações não levam em consideração que além de tratar iguais os
iguais, devem ser tratados desiguais os desiguais, de acordo com suas desigualdades.
Ademais, o homem não teve sua proteção excluída, nem sua dignidade perdida, pelo
contrário, continua sendo protegida no âmbito penal. A proteção do homem que for vítima de
violência doméstica reside no direito de solicitar o afastamento do agressor do lar, medida
prevista no artigo 69, parágrafo único, da Lei dos Juizados Especiais Criminais; possui direito
a uma audiência que possibilite a realização de acordo com o agressor, pedindo a reparação; o
agressor poderá usufruir dos benefícios da transação penal e da suspensão condicional do
processo.
Todas estas medidas podem ser tomadas, conforme a Lei 9.099/95, sendo que, caso a
violência sofrida for de médio ou de maior potencial ofensivo, o procedimento é o mesmo
previsto para a mulher e podem ser aplicadas as medidas cautelares elencadas no artigo 319 do
Código de Processo Penal. Ainda, o homem possui os mesmos direitos constitucionais e no
âmbito do Direito Civil e penal do que a mulher.
Pode se afirmar que as normas foram criadas apenas para as mulheres vítimas porque
jamais se julgou necessário aprimorá-las para a vítima homem. Se necessário fosse, já se teria
buscado alterar o sistema, inclusive pelos mesmos grupos de juristas e instituições que alegaram
a inconstitucionalidade da Lei Maria da Penha.
6
Implica em tratar de igual forma e com os mesmos direitos, todos que estejam em igualdade de condições e
situações.
22
[...] De forma equilibrada, a Lei estabeleceu mecanismos por demais óbvios para o
enfrentamento da violência contra a mulher. Inconstitucional era o sistema anterior,
sabidamente discriminatório e prejudicial ao gênero feminino porque desconsiderava
as peculiaridades desse tipo de violência, bem como os tratados internacionais que
regiam a matéria. Somente uma cultura patriarcal arraigada pode sustentar críticas a
uma Lei que, por tão lógica, parece já ter nascido tardiamente (DE LIMA, 2011, p.
288).
Pode-se entender por medidas protetivas àquelas garantias dadas pelo Estado, em
especial a jurisdicional, para que a mulher possa agir livremente, sem temer o seu agressor.
Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
familiar contra a mulher, nos termos do§ 8do art.226daConstituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do
Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar (BRASIL,2006).
7
O STF, ao julgar o HC 106.212/MS, em 24/03/11 declarou a constitucionalidade do Art.41 da Lei 11.340/06.
23
A violência doméstica e familiar é a ação (fazer algo) ou omissão (não fazer alguma
coisa) baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e
dano moral ou patrimonial, o que também está descrito no artigo 5º da Lei Maria da Penha.
Deve ser levado em consideração que a violência contra a mulher não ocorre somente em
ambiente familiar, ela também pode ocorrer no ambiente da unidade doméstica ou em qualquer
relação íntima de afeto na qual o agressor conviva com a vítima, conforme especificam os
incisos I e III do artigo 5º da Lei11.340/06:
A Lei Maria da Penha traz uma série de medidas que se destinam a proteção dos
interesses pessoais ou patrimoniais da vítima, sendo possível o afastamento do agressor do lar
em que convive com ela, fixação de limite mínimo de distância, restrição à posse de armas, etc.,
medidas estas que tornam possível a prisão do agressor, mesmo em casos de pouca gravidade,
assim como, permite que ele seja preso em caso de descumprimento de qualquer das medidas
que lhe for imposta. Assim, considerando os efeitos trazidos pela lei, visto que ela se refere tão
somente à mulher, é importante frisar quem pode ser tratado como sujeito passivo nos casos de
violência doméstica e familiar contra a mulher.
expressa que esta é destinada a coibir a violência que ocorre no âmbito doméstico, contra a
mulher.
No julgamento, pontuou-se que o sexo da pessoa não deve ser usado como fator de
desigualação jurídica e que a expressão “família”, utilizada pela Constituição Federal
não se limita a formação de casais heteroafetivos, devendo-se reconhecer a união
homoafetiva como família segundo as mesmas regras e consequências da união
heteroafetiva (BRASIL. STF, 2011).
8
STF, ADI 4.277 e ADPF 132, Rel. Min. Ayres Brito, j. 05/05/2011.
9
CNJ, Resolução 175/2013
25
Assim, pode-se afirmar que o conceito de família não se refere apenas aos casais
heterossexuais, sendo que a partir do reconhecimento da união estável de pessoas do mesmo
sexo, as uniões homoafetivas passaram a ser tratadas como unidade familiar. Considerando esta
nova definição, os conflitos envolvendo uniões entre pessoas que possuem a mesma orientação
sexual, onde a vítima é um travesti, transexual, gay ou uma mulher, passaram a ser tratados
como violência doméstica.
Buscando garantir efetivamente o direito à vida da mulher sem violência, a Lei Maria
da Penha lista algumas medidas protetivas de urgência, que poderão ser concedidas pelo Juiz,
a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, de acordo com o artigo 19 da
referida Lei:
Para que possa agir o Juiz precisa ser provocado e após a provocação ele poderá
acrescentar outras medidas àquelas requeridas, a fim de proteger da melhor forma a vítima.
a agressão, e, ainda, várias outras não especificadas que o Estado Juiz poderá deferir de ofício,
dentro do seu poder, observada a interpretação das normas.
Será necessário que o intérprete esteja atento aos casos que evidenciem a necessidade
da aplicação dos princípios e métodos que regem a interpretação das normas, com
ênfase para o princípio da proporcionalidade e a ponderação de bens e valores,
buscando aplicar a dose certa do remédio cautelar no caso concreto, para que não
ocorram desnecessários excessos (DE SOUZA, 2009, p.125).
Acontece que, com a entrada em vigor da lei 13.641/18, a qual incorporou o Art. 24 –
A, na lei Maria da Penha, ficou agora tipificado a conduta criminosa ao descumprir as medidas
protetivas de urgência, do Art. 22 da lei Maria da Penha. Com pena prevista de 03 (três) meses
a 02 (dois) anos de detenção, ficando claro aqui que a norma veio com o preceito primário e
com o preceito secundário, ou seja, tipificando a conduta no Art. 22 e dando a pena no Art. 24-
a da lei 11.340/06.
Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência
previstas nesta Lei:
A inclusão do Art. 24-A, pela Lei 13.641/18, foi a última atualização realizada na lei
Maria da penha, até a data atual. Todas as atualizações realizadas desde sua sanção, 13 anos
atrás, vieram com o intuito de efetivar as medidas de proteção as vítimas de violência doméstica
e desta forma tutelar alguns direitos historicamente renunciados as mulheres, conforme a
evolução relatada anteriormente dos direitos das mulheres. A lei Maria da Penha trouxe algumas
medidas afirmativas e orientações que o poder público deve seguir visando a melhoria do
atendimento as vítimas de violência doméstica, visando a não revitimização da mulher e
proporcionalmente não só um atendimento adequado a vítima, mas também um
acompanhamento, tanto psicológico como estrutural.
sofrida, passando pelo atendimento policial militar via 190, chegando à Delegacia de Polícia
Civil especializada, Ministério Público até chegar ao Poder judiciário.
Nesse sentido, a comunidade internacional, ali reunida, foi mobilizada para que os
esforços dedicados para combater a condição desigual de vida entre homens e mulheres
ocorressem de maneira transversal entre os diversos organismos institucionais e da sociedade
civil. Em outras palavras, a transversalidade asseguraria que a perspectiva de gênero estivesse
presente em todas as atividades governamentais, como nas políticas de desenvolvimento, nas
pesquisas, na legislação, na alocação de recursos e, finalmente, no planejamento,
implementação e monitoramento de todos os programas e políticas públicas do Estado (ONU,
2001).
Além de lançar um plano nacional com diretrizes a serem seguidas por todos os entes
federativos, o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (2004; 2008; 2013), a Secretaria
Especial de Políticas Para Mulheres (SPM-PR) criou a Política Nacional de Enfrentamento à
Violência contra as Mulheres (2007) e o Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra
a Mulher (2007), compreendendo a ação conjunta dos diversos setores envolvidos no combate,
na prevenção, na assistência e a na garantia de direitos das mulheres. Salienta-se que o Rio
30
Grande do Sul foi o último Estado da Federação a assinar o Pacto, o que ocorreu somente em
201110.
“No Rio Grande do Sul, uma viatura decorada de lilás circula pelas ruas há um ano.
É a “Patrulha Maria da Penha”, projeto apoiado pelo Banco Mundial que une a
Brigada Militar, a Polícia Civil, o Instituto Geral de Perícias e a Superintendência de
Serviços Penitenciários para levar mais proteção às mulheres. Os policiais (homens e
mulheres) que circulam nela foram treinados para cumprir um dos principais
elementos da Lei Maria da Penha as medidas protetivas de urgência, que têm de se
dar em até 48 horas após a agressão. O trabalho dos policiais é mostrar às mulheres
as alternativas à agressão. Nas visitas, as mulheres também ficam sabendo como obter
a separação e a guarda dos filhos. [...] Os policiais também visitam o agressor para
orientá-lo em relação às medidas e suas consequências. No final de cada encontro, a
Patrulha elabora um relatório que, nos casos mais graves, pode dar mais subsídios ao
inquérito policial. (ONU, 2013)” (Textos e Contextos, p. 404,2014).
10
O Governo do Estado do Rio Grande do Sul contou com uma Secretaria Estadual de Políticas Para as Mulheres
(SPM-RS) de 2011 até o início de 2015. A extinção da SPM-RS foi uma das primeiras medidas tomadas pelo
governador eleito em 2014, José Ivo Sartori – Lei n.º 14.672 de 1.º de janeiro de 2015, para fins de corte de gastos.
Desde então, a manutenção e articulação entre os serviços não tem sido incentivada, conforme demonstrou o estudo
de Conteratto, Martins e Leal (2017).
11
Programa de cooperação entre o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Senado Federal,
a Câmara dos Deputados e o Governo Federal, por meio da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência
da República e o Ministério da Justiça, visando compromisso e atitude de todos com a lei Maria da Penha.
31
Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do
Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar.
(...)
§ 1º O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos
das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-
las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
Saliento aqui que ainda não existem Juizados de Violência Doméstica e Familiar
Contra a Mulher em todos os Municípios do Estado do Rio Grande do Sul, o que, de forma
alguma, impossibilita a existência e atuação da Patrulha Maria da Penha naquele Municipio,
ficando a competência para as Varas Criminais, conforme prevê no Art. 33. lei 11.340/06:
12
Integra a doutrina institucional, com o escopo de consignar a normatização das ordens do comando sobre
determinado tema, de maneira particularizada, tanto na esfera administrativa como operacional.
32
13
As certidões estão nas páginas de nº 55 a 59.
14
é a característica de quem ou do que é vulnerável, ou seja, frágil, delicado e fraco. A vulnerabilidade é uma
particularidade que indica um estado de fraqueza do ser humano, nesse caso citado a vítima de violência doméstica.
33
órgãos de Segurança Pública e Poder Judiciário havendo redução dos casos de violação às
medidas protetivas (BRASIL, 2019).
Além das disciplinas ministradas no curso, a Brigada Militar disponibiliza também aos
integrantes da Patrulha Maria da Penha o caderno de diretrizes no atendimento e procedimento
a serem executados nas mais diversas situações com nome de Procedimento Operacional Padrão
(POP, nº4.2)15, respeitando, desta forma, a solicitada capacitação prevista na Lei Maria da
Penha. A Brigada Militar, desde o ano de 2012, com o início do programa no Estado do Rio
Grande do Sul, já realizou vinte e cinco cursos e possui a previsão de mais cinco turmas no mês
de Dezembro do corrente ano, chegando ao número de mil e dezoito Policiais Militares já
formados, estando todos aptos a executar o serviço diário na Patrulha Maria da Penha.
(BRIGADA MILITAR. 2019).
15
O procedimento operacional padrão, nº 4.2 está na página de nº 60.
16
A Nota de Instrução integra a doutrina institucional, com o escopo de consignar a normatização das ordens do
comando sobre determinado tema, de maneira particularizada, tanto na esfera administrativa como operacional.
35
foram repassadas pela Adjuntoria de Polícia Comunitária do Estado Maior da Brigada Militar17.
(BRIGADA MILITAR. 2019).
Não são em todas as unidades da Brigada Militar que são formadas as guarnições de
Patrulha Maria da Penha, como por exemplo as unidades com atividade específica, como por
exemplo: Batalhão de Operações Especiais, Batalhão Ambiental e Batalhão de Aviação, sendo
sim previstas nos quadros de efetivo de todas as unidades chamadas operacionais, as que
possuem efetivo que atendem ao chamado da população via canal 190, atualmente 41 unidades
da Brigada Militar possuem a Patrulha Maria da Penha atendendo as vítimas de violência
doméstica.
Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e
familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da
Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a
Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do
Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra
a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de
violência doméstica e familiar.
17
A Coordenação de Polícia Comunitária está estabelecida na 3ª Seção do Estado Maior da Brigada Militar sendo
formada por uma equipe de Adjuntoria de Polícia Comunitária, onde ocorrem as atividades de Coordenação,
Normatização, Avaliação, Ensino e Treinamento de Programas, sob responsabilidade do Estado-Maior.
36
Art. 29. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem
a ser criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser
integrada por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde.
Além das políticas públicas criadas pelo Poder Executivo, o Poder Judiciário também
se mostra engajado no combate a violência doméstica criando encontros para debater o assunto,
gerando, assim, uma reflexão mais ampla sobre o tema. Atualmente, temos eventos anuais para
a discussão da Lei, como a Jornada Lei Maria da Penha e o Fórum Nacional de Violência
Doméstica (Fonavid), com capacidade de criar enunciados que permitam uma implementação
mais efetiva e eficaz dos Juizados de Violência doméstica e Familiar contra as mulheres,
encontros organizados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Veja, nesses casos, como a
violência doméstica é algo que necessita de uma rede de proteção na qual não é só de encargo
do Poder Executivo, e sim, de todos os poderes. Recentemente, foi criada a Política Nacional
Judiciária do Enfrentamento à Violência contra as Mulheres (BRASIL, 2017).
Nesse viés, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), fazendo jus a sua
competência, criou nove Juizados Especializados, conforme prevê a Lei Maria da Penha, e as
distribuiu em oito comarcas com sede nos seguintes Municípios: Rio Grande, Pelotas, Porto
Alegre (2), Canoas, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Caxias do Sul e Santa Maria. Destas nove
Varas, apenas a primeira de Porto Alegre, inaugurada em 28/03/2008, através da Resolução
663/08, e somente seis anos depois criou a 2ª vara na capital em 24/03/2014, conta com uma
equipe multidisciplinar especializada, isto é, uma equipe que atenda exclusivamente à Vara de
violência doméstica ao invés de ser responsável por atender às demandas de outras Varas do
Fórum Municipal. A criação da 2ª Vara na Capital foi uma decisão que partiu do Conselho da
Magistratura (COMAG) do TJ-RS, tendo em vista o grande volume de demandas que
tramitavam na 1ª Vara de Porto Alegre (cerca de 23 mil processos, dos quais aproximadamente
37
17 mil aguardavam julgamento)18. Todos os Juizados acima citados realizam suas atividades
conforme o previsto no “Manual de rotinas e estruturação dos Juizados de Violência Doméstica
e Familiar Contra a Mulher” (CNJ, 2011). Mais uma das iniciativas do Conselho Nacional de
Justiça afim de uniformizar os procedimentos e atendimento dos Juizados Especiais criados
com a Lei 11.340/06. Os Juizados que não contam com a equipe multidisciplinar especializada,
usam das articulações dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar Contra as Mulheres com
as Redes de Enfrentamento à Violência Doméstica 19 de seus respectivos Municípios, sendo de
primordial importância os Centros de Referência para Mulheres15, que existem em todos os
municípios do Estado do Rio Grande do Sul dentre outros centros de ajuda, muito mais
divulgados e participativos após a institucionalização das Redes de Atendimento e
Enfrentamento às violências contra as mulheres (BRASIL, 2011).
Com a ideia de que para implementar a Política Nacional de Enfrentamento a
Violência Doméstica seria necessário um engajamento de todos os poderes e, ainda assim, a
ajuda de outras entidades, em 2010, foi criado o conceito das “Redes de Atendimento e
Enfrentamento as Violências Contra as Mulheres” a qual destaca claramente a importância do
papel de cada entidade em sua área de atuação, sendo ela no combate à violência ou na
prevenção e garantia de direitos das mulheres. A Rede de Enfrentamento é composta por
formuladores, fiscalizadores e executores de políticas voltadas para as mulheres, centros de
educação e reabilitação aos agressores, Universidades, Órgãos Federais, Estaduais e Municipais
responsáveis pela garantia de direitos, serviços de Segurança e Defesa Civil, rede de
atendimento e serviços especializados e não especializados para as mulheres (BRASIL, 2011).
Em consonância à Rede de Enfrentamento, a SPM-PR lançou, em 2013, o programa ―Mulher,
Viver sem Violência, objetivando integrar e ampliar os serviços públicos existentes voltados às
mulheres em situação de violência (CONTERATTO, 2016).
O Governo do Estado do Rio Grande do Sul contou com uma Secretaria Estadual de
Políticas Para as Mulheres (SPM-RS) de 2011 até o início de 2015. A extinção da SPM-RS foi
uma das primeiras medidas tomadas pelo Governador eleito em 2014, José Ivo Sartori – Lei n.º
14.672 de 1.º de janeiro de 2015, para fins de corte de gastos. Desde então, a manutenção e
18
A Coordenação CAPITAL TERÁ 2º JUIZADO DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER. Agência de Notícias
da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Disponível em:
http://www2.al.rs.gov.br/noticias/ExibeNoticia/tabid/5374/Default.aspx?IdMateria=291446 Acesso em 14 ago
2019.
19
diz respeito à atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não-governamentais e a
comunidade, visando ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção e de políticas que garantam o
empoderamento das mulheres e seus direitos humanos
38
articulação entre os serviços não tem sido incentivada. Um dos aspectos abordados pela Lei
Maria da Penha, assim como pelos Planos Nacionais de Políticas para as Mulheres elaborados
pelas Secretarias de proteção as mulheres dos Estados da Federação é a necessidade da gestão
e atuação interdisciplinar inspirada pela temática, que consistem em propostas, as quais deram
fundamentação as políticas de proteção as mulheres. (CONTERATTO, 2016). O conceito de
gestão intersetorial/interdisciplinar é difundido como ―transversalidade, que é a elaboração de
uma matriz estratégica que oriente uma nova visão de competências políticas, institucionais e
administrativas que garantam a responsabilização dos diversos Agentes Públicos sobre as
assimetrias de gênero (BANDEIRA, 2004).
Assim sendo, a transversalidade une na responsabilidade os órgãos do governo federal
e dos entes federativos e, para que isso ocorra, faz-se necessário que a agenda contra a
desigualdade de gênero esteja presente institucionalmente na rotina desses Órgãos. Portanto,
seja por meio de diretorias, secretarias ou áreas técnicas, deve haver em cada órgão a
consciência de ―que homens e mulheres não possuem os mesmos problemas e necessidades,
mas devem possuir os mesmos direitos (BRASIL, 2011, p. 6).
A atuação das equipes multidisciplinares nos serviços dos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar Contra as Mulheres permite abordar os problemas de maneira intersetorial
e combinada, pois além de realizar um exame físico e psicológico da vítima de violência,
proporciona além de um atendimento humanizado e qualificado, o encaminhamento das
mulheres vítimas à programas de atendimento psicológico, de saúde, de trabalho ou de
assistência social, conforme cada situação demandar e o desejo e vontade de cada mulher. Essa
é a importância do encaminhamento das mulheres vítimas de violência doméstica que estão em
processo judicial buscando uma medida protetiva para a Rede de Atendimento. Nessa
perspectiva, a multidisciplinaridade possibilita uma interação entre as disciplinas de atenção à
violência doméstica, não anulando a especificidade de cada uma, e sim refletindo os limites e
possibilidades de cada área (GOMES, 2009).
A institucionalização da multidisciplinaridade e intersetorialidade na atuação e gestão
dos serviços de atendimento à violência doméstica, por meio da criação das Redes de
Atendimento e Enfrentamento às mulheres em situação de violência, representa uma inovação
institucional governamental. A inovação institucional está relacionada, nesse caso, ao
envolvimento de organismos do Poder Executivo, Judiciário e Legislativo no combate a esse
tipo de violência, potencializando a articulação de parcerias, a formulação de políticas públicas
e programas em conjunto, e o monitoramento destas políticas e programas através de um
39
Protocolo de Fluxos.
A Lei Maria da Penha atribuiu aos Tribunais de Justiça Estaduais e do Distrito Federal
a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra as Mulheres e a esses a
responsabilidade para que as mulheres em situação de violência doméstica e familiar tenham
acesso a seus direitos, conforme consta no Art. 14 da lei 11.340/06.
o qual visa a conciliação entre o agressor e a vítima, em forma de acordo o qual na maioria das
vezes acaba em prestação de serviços comunitários ou pagamento de cestas básicas.
(AZEVEDO, 2011).
Enquanto Azevedo (2011) acredita que não há um consenso sobre o significado das
implantações dos JECRIMs para o combate à violência de gênero, PASINATO (2011)
considera que a atuação dos JECRIMs quanto à desigualdade de gênero é:
Os Juizados Especializados são a etapa mais importante para efetivação da Lei Maria
da Penha de fato. Com o advento da Lei 11.340/2006, os assuntos referentes à violência contra
a mulher passaram por três etapas jurídicas distintas, que são as seguintes: 1ª) da publicação da
41
Lei (07.08.06) até 21.09.06 ainda aplicava-se a legislação anterior; 2ª) a partir de 22.09.06, data
de vigência da Lei Maria da Penha; 3ª) depois da criação dos JVDFM (em cada Estado, por lei
estadual, e no Distrito Federal e Territórios pela União – art.14). Gomes e Bianchini (2006).
Do viés jurídico, a grande inovação trazida pelos Juizados Especializados foi a união,
em um só Juizado, da competência ―cível e criminal para conhecer e julgar ―as causas
decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher. De acordo com o
artigo 33 da Lei 11.340/2006, enquanto não estruturados os Juizados específicos, as varas
criminais podem acumular as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas
decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, sendo que será
garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das
causas referidas.
A Lei Maria da Penha deixa uma margem reduzida para a conciliação entre agressor e
vítima, pois exige que a mulher vítima de agressão doméstica oficialize sua queixa por meio de
inquérito policial e processo judicial (AZEVEDO, 2011).
Por muitas veses, a falta de capacitação dos profissionais que participam, desde o
registro da ocorrência policial até o processo nos Juizados Especializados, acabam fazendo com
o que muitas mulheres desistam de seguir no processo, vindo tudo isso a implicar, conforme
explica Azevedo (2011), na recusa à concessão de medidas protetivas de urgência e prisões
preventivas, que dependem da discricionariedade do/a Juiz/a – valendo-se das relações
domésticas e familiares da vítima – para decidir sobre a necessidade da segregação cautelar do
indivíduo acusado. a contribuição do Sistema Jurídico para a perpetuação da desigualdade de
gênero. Existem alguns limites, dentro da doutrina jurídica, que dificultam o enfrentamento à
42
violência contra a mulher. Alguns desses limites relacionam-se a escassa eficácia secundária
das normas que combatem apenas no papel a violência doméstica, já que muitos feminicídios
ocorrem com as vítimas já estando com uma medida protetiva expedida pelo Estado, e também
pelo fato que a punição ao agressor quase nunca resolve o problema de forma satisfatória para
a vítima. Em relação aos casos que envolvem conflitos de gênero, os papeis sociais são sempre
referenciados às instituições família e casamento e aos aspectos definidores desses papeis
sociais nessas instâncias: sexualidade feminina e trabalho masculino. (2008 apud AZEVEDO,
2011).
Muitas vezes, os/as Juízes/as se valem desses papéis definidores para compreender as
narrativas de réu e acusado, ou agressor, e vítima, como sugere Fachinetto (2012). Para esta
última autora, as narrativas sobre um fato ou sobre determinada pessoa são variadas, múltiplas,
não coerentes e não lineares. A multiplicidade de versões para a mesma história, que partem
dos agentes, dos réus, das testemunhas e das vítimas, são histórias em disputa, e não há como
dissociar tais histórias sobre a vida social das suas práticas e dos seus significados sociais, tão
complexos (FACHINETTO, 2012). A violência de gênero e a violência contra a mulher podem
passar por um processo de ressignificação nos momentos de julgamentos, onde ocorrem a
banalização da violência, a valorização das instituições da família e do casamento em
detrimento aos direitos das mulheres, invisibilizando o problema da violência (SANTOS,
2010).
Para as instituições que se enquadram dentro do segundo grupo, com mais processos,
sugere-se que as varas possuam: 1 Juiz, 1 assessor de Juiz, 1 diretor de secretaria/escrivão, 4
43
Outro ponto relevante são as salas de acolhimento, as quais são espaços preparados
para o acolhimento da vítima já na primeira audiência no Juizado Especializado, depois do
trâmite do Inquérito Policial. O primeiro contato da vítima com o Poder Judiciário será na
chamada “Audiência de Acolhimento” e, enquanto a vítima espera a audiência, ou após, na sala
de acolhimento já lhe é prestado a assitência psicológica e da Assistente Social. A Audiência
de Acolhimento não é a Audiência Preliminar. A Audiência Preliminar imposta pela Lei Maria
da Penha, no seu Art. 16:
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que
trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência
especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e
ouvido o Ministério Público.
44
As vítimas procuram por resultados dos mais variados possíveis quando chegam aos
Juizados especializados, algumas querem organizar seus relacionamentos, buscando ajuda de
um terceiro, uma autoridade (patriarcal) para legitimar os limites impostos na prática, pelas
mulheres, as próprias demandantes, em suas vidas privadas e no lar (ALIMENA, 2010, p. 131).
Outras mulheres, contudo, buscam respostas como o afastamento do lar e separação de seu(a)
parceiro (a) íntimo(a) (ALIMENA, 2010).
Com o passar dos anos e a violência doméstica tomando uma proporção gigantesca no
contexto da Sociedade Brasileira, se acrescenta a esse aumento a complexidade do fato devido
ao envolvimento entre as partes envolvidas nos crimes, foi ficando cada vez mais óbvio que
seria necessário uma atitude, uma mudança na visão sobre esses fatos que por muitas vezes
acabavam ficando invisíveis as autoridades Policiais e Judiciárias do Brasil. Apesar de todas as
políticas visando erradicar a violência doméstica, a Sociedade Brasileira ainda cultiva valores
que estimulam a violência doméstica. Uma das principais razões que ocorre a inferiorização da
mulher, principalmente no ambiente doméstico é em decorrência da desigualdade sociocultural
existentente no Brasil. O patriarquismo ainda muito existente na Sociedade Brasileira estimula
ao homem ver a si mesmo como sendo mais forte e superior a mulher:
45
Já na década de 80, era visível que para tentar conter o aumento da violência contra a
mulher era necessário uma mudança no trajeto da Segurança Pública. Sendo assim, em 06 de
agosto de 1985, no Estado de São Paulo, foi criado o primeiro Órgão Público, voltado
diretamente a defesa dos direitos e garantias individuais das mulheres no Brasil, o pioneiro
Estado de São Paulo serviu de exemplo e acabou por extimular a espalhar pelo Brasil inteiro as
Delegacias Especializadas de Atendimento as Mulheres. Entretanto, a aceitação nesse período
de uma delegacia com intuito de ajudar não era algo fácil de incutir na Sociedade Brasileira que
vivia um momento de transição na política do País, saindo de uma Ditadura Militar, em que os
Órgãos Policias eram muitas vezes usados como local de tortura, e caminhando para uma
democracia, a qual tinha por base a Constituição Federal, promulgada 03 anos depois da
primeira Delegacia da Mulher ser instituída no Brasil, a qual teria como principal fundamento
a garantia dos direitos individuais do cidadão:
Desde então, a conjuntura brasileira detectou uma nova prática, sendo irrefutável o
respeito aos Direitos Humano, onde o poder despótico foi abortado até preponderar a
prevenção e a democracia. Diante dessa nova concepção de Estado, a própria policia
46
inicia um ciclo de transição, onde busca seu aperfeiçoamento, qualificando seu efetivo
a fim de trabalhar com ações proativas e preventivas, respeitando os princípios
fundamentais e os Direitos Humanos, com o objetivo de deixar de ser percebida como
uma polícia truculenta e de prevalecimento, mas como uma policia cidadã e de
proximidade. (GERHARD, 2014, p. 45).
A autoridade policial deve tomar as providências legais cabíveis (art. 10) no momento
em que tiver conhecimento de episódio que configura violência doméstica. Igual
compromisso tem o Ministério Público de requerer a aplicação de medidas protetivas
ou a revisão das que já foram concedidas, para assegurar proteção à vítima (art. 18,
III, art. 19 e §3.º). Para agir o juiz necessita ser provocado. A adoção de providências
de natureza cautelar está condicionada à vontade da vítima. Ainda que a mulher
proceda ao registro da ocorrência, é dela a iniciativa de pedir proteção em sede de
tutela antecipada. (DIAS, 2007, p. 79). A autoridade policial tem o prazo de 48 horas
para encaminhar ao juizado de violencia domestica, ou vara criminal com
competencia para atender estas ocorrencias, a solicitação de medidas protetivas de
urgencia formulada pela vitima (Lei Maria da Penha, Art 12, §1º). (DIAS, 2019, p.
218).
48
§2º, I - a inquirição será feita em recinto especialmente projetado para esse fim, o qual
conterá os equipamentos próprios e adequados à idade da mulher em situação de
violência doméstica e familiar ou testemunha e ao tipo e à gravidade da violência
sofrida;
própria heroína”. Na mesma sala de espera existe também um playground destinado aos filhos
das vítimas que por muitas vezes acompanham elas a Delegacia Especializada. Todos esses
detalhes estão voltados a atender a saúde física, psíquica e principalmente emocional da vítima
que tomou coragem de ir até a Delegacia Especializada, conforme consta no Art. 10-A, §1º, I
da Lei Maria da Penha:
20
O formulário Nacional de avaliação de Risco de Violência doméstica segue na pag. 65.
50
A avaliação de risco deverá ser realizada no primeiro contato que a mulher estabeleça
com um serviço – seja uma Delegacia de Polícia, Centro de Referência, Serviço de Saúde ou
através das equipes multidisciplinares de Promotorias, Defensorias ou Juizados/Varas
Especializadas, a aplicação deve ser realizada durante o atendimento e a mulher deverá ser
informada sobre o uso do instrumento, sua finalidade e a importância em registrar as respostas
para cada pergunta. (CNMP, 2019).
7. CONCLUSÃO
Entretanto, apesar das inovações trazidas pela Lei Maria da Penha, e passados agora
13 anos da homologação, é notório através dos estudos e números demonstrados, que a estrutura
dos Órgãos Públicos ainda é precária em muitos aspectos o que faz, apesar de 13 anos passados,
com que a Lei não seja efetiva como deveria, no combate à violência a mulher. No entanto, para
a Lei ficar cada vez mais efetiva, percebe-se que é necessário que todos os integrantes do Poder
Público e em especial os Órgãos da Segurança Pública e Poder judiciário ajam de forma
integrada e conjunta, com o objetivo de atingir a qualidade de vida e a segurança que é
necessária a todos, em especial nesse caso as vítimas de violência doméstica.
Note a quantidade de ações desenvolvidas apenas pelos Órgãos Públicos sem nem
citarmos aqui os desenvolvidos por Organizações Não Governamentais, Fundações, Entidades
Filantrópicas sem fins lucrativos e diversas Instituições e Empresas Privadas que apoiam e
combatem a violência doméstica com políticas de educação e conscientização.
Todavia, apesar de todo o avanço legislativo citado e das diversas ações aderidas pelo
Estado e Entidades Privadas, visando à garantia dos direitos das mulheres vítimas de violência
doméstica, os números de violência doméstica não param de aumentar no Rio Grande do Sul e
no Brasil, demostrando que mesmo com todo o empenho é necessário cada vez mais
engajamento de toda a sociedade visando erradicar a violência doméstica no Brasil efetivando
de vez a Lei Maria da Penha.
55
ANEXOS
Certifico que aos ___ dias do mês de ______________ do ano de ______, compareci
juntamente com o (a) ________________ no logradouro________________, nº ___________,
bairro ______________, telefone________________ e constatei que a mesma encontra-se em
situação de vulnerabilidade pelas seguintes situações:_____ ___________________________
_________________________________
Assinatura da Vítima
__________________________________ _________________________________
Nome do Militar Estadual Fiscalizador Nome do Militar Estadual Testemunha
Certifico que aos ___ dias do mês de __________ do ano de ______, compareci
juntamente com o (a) ME _____________________________ no logradouro
________________________________________________________________, nº _______,
bairro ________________, telefone________________ endereço residencial da Senhora
_______________________________________________________________, informando
que a mesma se RECUSA a receber atendimento por parte da Patrulha da Maria da Penha
pelos seguintes motivos:
___________________________________________________________________________
Imprescindível relatar o motivo da vítima e colher sua assinatura
_________________________________
Assinatura da Vítima
__________________________________ _________________________________
Nome do Militar Estadual Fiscalizador Nome do Militar Estadual Testemunha
Certifico que aos ____ dias do mês de _____________, do ano de ______, compareci
juntamente com o (a) ME ______________________________________, no logradouro
___________________________________, nº ______, bairro ______________________,
endereço residencial da Srª ______________________________________________ que
havia solicitado Medida Protetiva de Urgência conforme ocorrência nº _________________ e
ao chegar ao local foi constatado que:
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
________________________________ ________________________________
Nome do Militar Estadual Fiscalizador Nome do Militar Estadual Testemunha
Certifico que aos ____ dias do mês de ____________ do ano de ______, compareci
juntamente com o (a) ME _________________________________, no logradouro
_______________________________________________________________, nº _____,
bairro _____________, telefone ________________ endereço residencial da Srª
______________________________________________________________, que havia
solicitado Medida Protetiva de Urgência, conforme ocorrência nº
_______/_______/________ e ao chegar ao local foi constatada na sua residência a presença
de seu companheiro (a), Sr (ª) __________________________________________________.
_________________________________ _______________________________
Assinatura da Vítima Assinatura do Companheiro (a)
________________________________ ________________________________
Nome do Militar Estadual Fiscalizador Nome do Militar Estadual Testemunha
Certifico que aos ___ dias do mês de ______________ do ano de ______, compareci
juntamente com o (a) _____________________________ no
logradouro_______________________________________________________________, nº
___________, bairro ____________, telefone________________ endereço residencial da
Senhora ______________________________________________________________ e foi
relatado que a mesma NÃO necessita mais do atendimento da Patrulha da Maria da Penha
pelos seguintes motivos:
___________________________________________________________________________
_________________________________
Assinatura da Vítima
_________________________________ _______________________________
Nome do Militar Estadual Fiscalizador Nome do Militar Estadual Testemunha
3- O(A) agressor(a) já praticou alguma(s) destas outras agressões físicas contra você?
( ) Socos
( ) Chutes
( ) Tapas
( ) Empurrões
( ) Puxões de Cabelo
( ) Nenhuma das agressões acima
4- O(A) agressor(a) já obrigou você a fazer sexo ou a praticar atos sexuais contra sua
vontade?
( ) Sim
( ) Não
65
9- O(A) agressor(a) tem alguma doença mental comprovada por avaliação médica?
( ) Sim e faz uso de medicação
( ) Sim e não faz uso de medicação
( ) Não
( ) Não sei
14- O(A) agressor(a) já ameaçou ou agrediu seus filhos, outros familiares, amigos, colegas
de trabalho, pessoas desconhecidas ou animais de estimação?
( ) Sim. Especifique: ( ) filhos ( ) outros familiares ( ) outras pessoas ( ) animais
( ) Não
( ) Não sei
16.1. Se sim, assinale a faixa etária de seus filhos. Se tiver mais de um filho, pode assinalar
mais de uma opção:
( ) 0 a 11 anos
( ) 12 a 17 anos
( ) A partir de 18 anos
( ) Sim, Quantos?
( ) Não
17- Você está vivendo algum conflito com o(a) agressor(a) em relação à guarda do(s)
filho(s), visitas ou pagamento de pensão?
( ) Sim
( ) Não
( ) Não tenho filhos com o(a) agressor(a)
18- Seu(s) filho(s) já presenciaram ato(s) de violência do(a) agressor(a) contra você?
( ) Sim
( ) Não
19- Você sofreu algum tipo de violência durante a gravidez ou nos três meses posteriores
ao parto?
( ) Sim
( ) Não
23- Você considera que mora em bairro, comunidade, área rural ou local de risco de
violência?
( ) Sim
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( ) Não
( ) Não sei
Declaro, para os fins de direito, que as informações supra são verídicas e foram prestadas por
mim, ______________________________________________________________________
Assinatura da Vítima/terceiro comunicante:
______________________________________________
REFERÊNCIAS
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