Fazer COM
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Caitité, Amanda Muniz Logeto. Pistas para uma reinvenção da epistemologia: ser afetado, ciência no
feminino, pesquisarCOM e saberes localizados
Resumo
Em nossas pesquisas é comum encontrarmos, numa mesma instituição, diversos campos de
conhecimento. Neste ensaio, procuro refletir sobre a possibilidade de estudar esses diferentes saberes a
partir da epistemologia, de modo que a expertise e a autoridade de cada ator encontrado em campo sejam
preservadas. Viabilizar essa proposta requer que os enunciados sejam pensados em termos que passam ao
largo da oposição entre verdade e erro. Retomamos então textos que, ao menos de forma declarada,
defendem uma virada ontológica, legitimando as propostas de afastamento em relação à epistemologia
tradicional. Afirmamos, no entanto, a possibilidade de fazer a epistemologia existir como um projeto
irmanado à ontologia. Concluímos que um fazer epistemológico capaz de levar a sério a expertise do
outro é viável a partir de um fundamento pragmático e do privilégio da dimensão afetiva e do caráter
encarnado do ato de pesquisar.
Palavras-chave: pesquisarCOM, virada ontológica, epistemologia, pragmatismo, afeto.
Abstract
In our research we often find, in the same institution, several structured fields of knowledge. In this essay,
I try to reflect on the possibility of studying this different knowledge from the epistemological field, so
that the expertise and authority of each actor found in the field are preserved. Enabling this proposal
requires that the statements be thought in terms that go off the opposition between truth and error. Then
we resume texts that at least openly advocate an ontological turn legitimating proposals that scape from a
traditional epistemology. We affirm, however, the possibility to make epistemology to exist as a project
close to ontology. We conclude that an epistemology able to take seriously the expertise of the other is
viable starting with a pragmatic basis and favoring the affective dimension and embodied character of the
act of researching.
Keywords: researchWITH, ontological turn, epistemology, pragmatism, affect.
Resumen
1
Psicóloga e mestre pela Universidade Federal da Bahia, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em
Psicologia da Universidade Federal Fluminense. [email protected]
Pesquisas e Práticas Psicossociais 11 (1), São João del Rei, Janeiro a junho de 2016.
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textos que abogan al menos abiertamente un giro ontológico y legitiman propuestas que escapan de una
epistemología tradicional. Afirmamos, sin embargo, la posibilidad de hacer la epistemología existir como
un proyecto cercano a la ontología. Llegamos a la conclusión de que una epistemología capaz de tomar en
serio la experiencia del otro es viable desde una base pragmática y desde el privilegio de la dimensión
afectiva y del carácter encarnado de lo acto de investigación.
Palabras clave: pesquisarCOM, giro ontológico, epistemología, pragmatismo, afecto.
Pesquisas e Práticas Psicossociais 11 (1), São João del Rei, Janeiro a junho de 2016.
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que encontramos, não sobre elas de que ela era uma mulher a fazer
(Moraes, 2010). ciência.
A preposição “sobre” evoca uma Os modos do trabalho da
mirada que se dá por um distanciamento cientista pareciam estranhos e não
corporal e afetivo do sujeito e que tudo podiam ser compreendidos por seus
pode ver. Um olhar assim acaba por colegas. Bárbara não partia de uma
fazer a deficiência existir no mundo única questão elaborada
como uma entidade determinada, fixa, antecipadamente e não pretendia chegar
dada desde sempre. Não raro essa única a uma generalidade sobre o milho como
versão é a da falta, do fracasso, da totalidade. Sua atitude era permeada por
ineficiência. Nesse campo, a proposição uma curiosidade difusa em relação a
COM intervém de modo a criar no cada grão em sua singularidade. Difusa
pensamento uma abertura ao que a no sentido de que sua atenção se voltava
deficiência pode ser, às suas distintas para todos os problemas inesperados
versões. Uma vez que a produção de que cada grão de milho pudesse trazer.
conhecimento é partilhada com as Cada um deles participava ativamente
pessoas em campo, uma vez que elas de sua pesquisa e mostrava quais eram
são tomadas como experts, é possível as boas questões a serem formuladas.
aprender com elas a fazer arranjos que Bárbara formava parceria com o
produzam sua existência de formas material e imprimia em seu trabalho a
variadas (Moraes, 2010). Nesse sentido, lentidão e a sutileza necessárias para
pensarCOM é afirmar o caráter sempre permitir que ele contasse sua história,
interventivo da pesquisa. A reflexão em seu próprio ritmo. Ela criou meios
sobre que tipo de mundo pretendemos para que o material pudesse contar sua
construir deve ser parte do fazer história singular e, assim, expressar
científico que se enriquece na medida resistência ao consenso e ao
em que se afirma como politicamente dogmatismo dos modelos já prontos na
situado. Do mesmo modo, temos época.
responsabilidade por aquilo que É a esse modo de estar diante do
escolhemos incluir ou ocultar nos que encontramos em campo que
nossos textos e os termos que orientam Stengers (1989) denomina ciência no
essa decisão devem ser explicitados feminino. Não porque sua possibilidade
(Moraes, 2010). de existência esteja restrita ao fazer de
Acredito que também seja nesse mulheres, mas porque ela traz uma
sentido, de um fazer científico que marca de singularidade que não chega a
permita a agência do mundo, que ser delimitada num conjunto específico
Stengers (1989) apresenta uma ciência de métodos a serem seguidos, num
no feminino. Para ilustrar o que entende protocolo. É feminino porque não
por esse termo, a autora descreve o ambiciona se tornar hegemônico, uma
trabalho de Bárbara McClintock, vez que é em si mesmo aberto a
cientista que ousou quebrar protocolos invenções. É um modo de fazer sempre
de pesquisa comuns na sua época e, ao por fazer. De que maneira Barbara
estudar o milho, acabou fazendo chegou a estabelecer uma parceria com
descobertas que revolucionaram a cada grão de milho, qual foi o seu
compreensão do genoma. Stengers método? Nós não sabemos. Cada grão
(1989) encontra no trabalho de Bárbara, pediu um manejo distinto. O que
características muito peculiares e não Stengers (1989) chama de feminino é a
deixa de associar suas inovações ao fato disponibilidade para uma conexão que
deixe falar o material. Ela descreve a
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