Formação Continuada No Brasil

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Universidade Estadual de Maringá

26 e 27/05/2011

A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES NO BRASIL

ALFERES, Marcia Aparecida (UEPG)


MAINARDES, Jefferson (Orientador/UEPG)

Aspectos históricos da formação continuada de professores no Brasil

No âmbito do presente trabalho, é relevante destacar que a formação continuada


de professores é uma preocupação antiga, como demonstra GATTI et al. (1972),
ANDALÓ (1995) e CANDAU (1997).
Segundo Andaló (1995), as experiências mais antigas de que se tem notícia
datam do início dos anos 60, sendo que foi nesta época que o Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP promoveu, em colaboração com a direção dos
Cursos de Aperfeiçoamento do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, um estudo
sobre o tema do aperfeiçoamento docente, realizando questionamentos junto aos
professores, com o objetivo de verificar o que pensavam dos cursos. Verificou-se que
os docentes consideravam os cursos de aperfeiçoamento pouco satisfatórios, visto que
não atendiam às necessidades da escola. Os resultados da pesquisa demonstraram que
80% dos docentes propunham uma reforma no sentido de se tratar de assuntos práticos
de interesse do professor primário; 69% sugeriram que as aulas deveriam partir de
problemas reais do cotidiano escolar; 42% opinaram que tais aperfeiçoamentos
deveriam ser planejados levando em consideração as sugestões dos docentes; 43%
recomendaram mais ênfase nas questões práticas.
No contexto histórico relatado no presente trabalho é importante citar que de
acordo com Silva e Frade (1997), nas últimas três décadas, no Brasil, podem ser
evidenciados três momentos políticos: a ditadura militar, o movimento de
democratização da sociedade e os movimentos de globalização da cultura e da
economia. Segundo as autoras, esses momentos políticos influenciaram os processos de
formação continuada de professores.

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Na década de 70, como consequência do fechamento das instituições


democráticas nas propostas de formação docente, observou-se a “valorização de
princípios de racionalidade técnica, da hierarquização de funções, da burocratização da
escola, com repercussões diretas nas alterações das funções de planejamento e
execução”. (p. 33) Assim, na década de 70, a formação continuada no Brasil teve uma
significativa expansão devido ao advento da modernização social, o que exigiu recursos
humanos mais qualificados para atender às demandas do governo militar, que enfatizou
a necessidade de formar trabalhadores, tornando-se este o principal objetivo da
educação na época (PEDROSO, 1998).
Ferreira (2007) considera que, no início dos anos 80, com a abertura política, os
movimentos em prol da educação, da pesquisa, do avanço científico e tecnológico se
intensificaram. Da mesma forma, Pedroso (1998) afirma que nessa década, com a
conquista dos direitos políticos, iniciou-se uma etapa na história da educação brasileira
marcada por uma participação mais efetiva dos professores nas questões da educação.
Com isso, as análises realizadas não se restringiam apenas às questões técnicas, mas
passaram a abordar o contexto sócio-histórico onde a formação do professor estava
inserida. Naquele contexto, entendia-se a importância dos programas de formação
continuada de professores como forma de responder às demandas mais específicas do
professorado e garantir um aprendizado permanente, em que o perfil desejado do
professor estivesse mais voltado para a dimensão política da prática docente (SILVA;
FRADE, 1997).
Apesar de algumas mudanças positivas, Ribas (2000) indica que, desde a década
de 80, as pesquisas demonstram que a formação continuada oferecida pelos órgãos do
Estado aos professores da rede pública quase não tem surtido efeito, pois falta uma
política séria de capacitação, visto que as propostas implementadas pelos governos são
descontínuas e não atendem às necessidades da escola e dos professores.
Segundo Silva e Frade (1997), a década de 90 vem trazer questões como a
globalização da cultura e da economia, assim como o desenvolvimento tecnológico,
exigindo dos professores respostas e posicionamentos, o que demanda novos
procedimentos de estudo e trabalho por parte dos docentes. Nesse contexto, vale

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destacar a influência de associações acadêmicas e profissionais1 e dos professores das


universidades brasileiras, que reivindicaram que a formação inicial e continuada dos
professores acontecesse na universidade. Apesar da importância da Universidade na
formação de professores, Silva e Frade (1997) alertam que, muitas vezes, as práticas de
formação acontecem desvinculadas de uma reflexão continuada sobre os problemas
enfrentados nas escolas e até mesmo nas Secretarias de Educação. E acrescentam que
nem sempre o que a Universidade julga relevante oferecer constitui uma necessidade
sentida pelas escolas no processo de formação e reflexão.
No final da década de 80 e início da década de 90, enfatizou-se bastante a
formação do professor em serviço (KRAMER, 1989; MEDIANO, 1992, 1998; SILVA
E FRADE, 1997), argumentando-se que os “pacotes de treinamento” ou “encontros”
dos quais os professores participavam não eram suficientes para a melhoria da qualidade
do ensino, sendo necessário que os professores participassem de forma ativa da
construção coletiva do saber, ou seja, que a formação continuada fosse realizada no seu
local de trabalho, através da reflexão contínua sobre sua prática.
Para Soares (2008), as políticas educacionais desenvolvidas a partir da década de
90 perceberam o professor como destaque, ou seja, se por um lado este profissional é
inserido no centro do debate educacional, contraditoriamente, sua formação sofre um
processo de aligeiramento, fragmentação e esvaziamento de conteúdo. Isso ocorre,
segundo a autora, devido à associação da reflexão sobre a prática às competências,
visando a formação de um profissional tecnicamente competente, mas politicamente
inoperante, disciplinado e adaptado. E por fim, a autora destaca que:

[...] na medida em que são fragilizados, precarizados, aligeirados e


esvaziados de conteúdo os processos de trabalho e formação dos
professores, em especial daqueles que atuam ou irão atuar na escola
pública, há uma crescente e gradativa desqualificação desses
profissionais e, por sua vez, o enfraquecimento da possibilidade da
escola estar, de alguma forma, contribuindo para o fortalecimento de
um projeto contra-hegêmonico de sociedade (ibid., p. 140)

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Deve-se destacar o papel da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
(ANFOPE) na luta pela formação unitária do pedagogo e pela constituição de uma base comum nacional
para a formação dos profissionais da educação.

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Para Freitas (2007) a configuração da formação de professores no Brasil


respondeu ao modelo de expansão do ensino superior implementado na década de 1990,
no âmbito das reformas do Estado e subordinado às recomendações dos organismos
internacionais. No âmbito da formação, caracterizou-se pela criação dos Institutos
Superiores de Educação e pela diversificação e flexibilização da oferta dos cursos de
formação – normais superiores, pedagogia, licenciaturas, cursos especiais e cursos à
distância –, de modo a atender a crescente demanda pela formação superior.

Aspectos conceituais da formação continuada de professores no Brasil

O processo histórico brevemente indicado acima mostra que a concepção e as


finalidades da formação continuada de professores no Brasil foram mudando ao longo
do tempo, de forma bastante ligada ao contexto econômico, político e social do país.
Percebe-se, por exemplo, que a concepção de treino de destrezas e técnicas foi sendo
superada pelo entendimento de que a aprendizagem contínua é importante para o
desenvolvimento profissional docente e da sociedade como um todo.
Na medida em que a concepção e finalidades se modificavam, novos termos
foram empregados. Andaló (1995) destaca que em um artigo de 1972, Gatti, Mello e
Bernardes apontavam os termos “treinamento” e “reciclagem” para designar a aquisição
de novas habilidades e conhecimentos. Enquanto a palavra “treinamento” era mais
voltada à ideia de formação para a aquisição de habilidades específicas, o termo
“reciclagem” referia-se à preparação num sentido mais amplo para o exercício de uma
nova função. (ANDALÓ, 1995). Segundo as autoras (GATTI, et al., 1972), qualquer
um dos termos apresentados envolvia a promoção de mudanças nos conhecimentos e
nas atividades dos profissionais. Além disso, apontavam que, em geral, os docentes
esperavam soluções claras e definitivas para as dificuldades encontradas no contexto
escolar.
Andaló (ibid.) destaca também um artigo de Gatti, Mello e Rovai, de 1973, no
qual as autoras avaliaram um treinamento oferecido pela Secretaria de São Paulo para
docentes da primeira série do 1º grau. O artigo evidenciou que um programa que

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naquela época tivesse a pretensão de reciclar professores deveria, antes de mais nada,
levar em consideração que esses profissionais apresentam um conjunto de atitudes e
expectativas que nem sempre são as mais adequadas para acelerar um real processo de
mudanças. Porém, segundo Andaló (1995), as autoras não explicam como deveria
acontecer um processo que conduzisse a prática do professor alfabetizador.
Marin (1995) fez uma análise de termos e concepções utilizados na temática da
educação continuada de profissionais da educação. A autora identificou o uso dos
seguintes termos: reciclagem, treinamento, aperfeiçoamento, capacitação, educação
permanente, formação contínua, educação continuada. Enquanto “reciclagem” referia-
se a mudanças mais radicais para o exercício de uma nova função, ocasionando a
implementação de cursos de formação continuada rápidos e esporádicos, “treinamento”
tinha o foco voltado para a capacidade de o indivíduo realizar uma determinada tarefa
através da modelagem de comportamento. O termo “aperfeiçoamento” significava
tornar perfeito ou mais perfeito, ou ainda completar ou acabar o que estava incompleto,
enquanto “capacitação” tinha uma conotação de tornar capaz e habilitar. A educação
permanente, a formação contínua e a educação continuada foram descritas pela autora
no mesmo bloco, visto que elas tratavam de colocar como eixo da formação continuada
o conhecimento dos profissionais da educação e tudo aquilo que eles podiam auxiliar a
construir.
É interessante destacar que esses termos foram sendo substituídos por outros de
significados mais abrangentes na medida em que a concepção de formação continuada
foi adquirindo funções e papéis diferenciados. A partir dos anos 90, por exemplo, a
formação continuada de professores foi bastante influenciada pelas discussões sobre
desenvolvimento profissional (NÓVOA, 1991), professor reflexivo (SCHÖN, 1987,
1992, 1995), professor-pesquisador (ZEICHNER, 1998). Dessa forma, a formação
continuada é uma questão complexa e multifacetada, e um intenso debate tem sido
travado em torno das concepções existentes.
De acordo com Ribas (2000), as diferentes formas de concepção de formação
continuada podem acarretar diversas tendências. Uma das tendências descritas pela
autora é de que os sistemas de ensino adotam uma formação elaborada pelos órgãos
públicos, sem diagnosticar interesses do professor e sim de acordo com as políticas

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governamentais vigentes e com o que as equipes técnicas julgam ser a necessidade de


professores e escolas. Esta concepção centralizadora, não dá condições de reflexão e
discussão sobre questões pertinentes aos problemas enfrentados nas escolas.

O desvio torna-se evidente diante da falta de uma política de formação


de professores e de práticas não ajustadas à preparação necessária nos
vários momentos em que ela ocorre. Tais práticas refletem um
desconhecimento da situação do trabalho docente e uma interferência
orientada para fins outros que não os definidos pelas necessidades dos
profissionais e/ou do ensino. (ibid., p. 40)

Ainda segundo Ribas (2000), as orientações assumidas na formação de


professores, ao longo da história, resultam das concepções de mundo, de homem, de
educação, de escola e de ensino presentes nos currículos dominantes em cada época, e a
tendência da aplicação da racionalidade técnica na formação do professor, na década de
70, eliminou a complexidade do real, da vida dos sujeitos em determinado contexto, dos
processos culturais e da consciência, transformando-se em uma teoria espontaneísta e
empirista. Ao defender a formação do professor em uma abordagem do ensino
reflexivo, a autora se opõe à racionalidade técnica, que enfatizava a aprendizagem de
técnicas, concepção esta que, segundo Facci (2004), evidencia que a atividade do
professor é apenas instrumental, com a finalidade de solucionar os problemas por meio
da aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas.
Duarte (2003) demonstra que a desvalorização do saber teórico está presente nas
ideias de diversos autores que se tornaram referência no campo dos estudos sobre a
formação de professores (por exemplo, Schön, Tardif, Perrenoud, Nóvoa, Popkewitz,
entre outros) 2. O autor indica que Schön supervaloriza o conhecimento tácito, o
conhecimento adquirido por meio das experiências e secundariza o conhecimento
escolar, tanto no que se refere ao processo de ensino-aprendizagem dos alunos, quanto

2
Duarte (2003) faz referência a trabalhos desses autores publicados (no Brasil ou em Portugal) e que
foram bastante utilizados como referência no Brasil, como por exemplo, o texto de Popkewitz (1997). No
entanto, é fundamental indicar que os autores citados por Duarte podem trazer contribuições relevantes
para outros aspectos, tais como reforma educacional, sociologia das reformas e das políticas, etc. A crítica
de Duarte refere-se particularmente à questão da valorização do saber teórico, em uma perspectiva
marxista. Além disso, é possível que, a partir de outros pontos de vista, os autores citados por Duarte,
valorizem o saber teórico.

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na formação de professores. Soares (2008) considera que a reflexão na ação - proposta


por Schön, nas suas formulações sobre o professor-reflexivo nada mais é do que a
proposta de que o professor preste atenção aos fatos que ocorrem em sua aula, ao
comportamento dos alunos, fatos esses que impulsionam o professor a uma resposta
imediata.
Facci (2004) destaca que uma faceta importante a ser considerada no debate
sobre a noção de professor-reflexivo é a supervalorização da subjetividade no trabalho
docente. A autora defende que a ampla bibliografia sobre essa temática teria suas bases
teórico-epistemológicas baseadas na pedagogia escolanovista. Segundo ela, embora os
estudos sobre professor reflexivo tenham sido importantes por se contraporem à
racionalidade técnica, apresentam algumas limitações, tais como:
a) não fica claro, nos estudos sobre o tema, em que momento, na formação dos
professores, estes se apropriam dos conhecimentos teóricos e quais seriam esses
conhecimentos que nortearão a sua prática;
b) não é suficiente dar “vozes aos professores”, é preciso que eles reflitam em
que condições econômicas, políticas e sociais desenvolvem a profissão e que
necessidades postas pelo capital exigem dos professores esta ou aquela postura;
c) as teorias que ressaltaram o trabalho do professor no processo educativo,
valorizando suas experiências e a reflexão sobre a prática, correm o risco de apenas
analisar a subjetividade do professor como se esta fosse produzida na particularidade,
desconectada da realidade social.
Outro conceito que merece algumas considerações é a questão do professor-
pesquisador. Na compreensão de Soares (2008), os termos professor-reflexivo e
professor-pesquisador são diferentes, porém explicitam a mesma coisa, ou seja, “a idéia
de que a formação e o trabalho docente devem basear-se nas elucubrações sobre sua
própria prática”. (p. 163) De acordo com a autora, a pesquisa realizada a respeito do
denominado “professor-pesquisador” é uma pesquisa esvaziada de conteúdo teórico-
científico–acadêmico. Constitui-se em uma pesquisa baseada nos saberes tácitos que,
contraditoriamente, furtam-se à sistematização, servindo apenas para dar conta de
demandas cotidianas. Sendo assim, segundo a autora, os professores são vistos como

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profissionais capazes de refletir (professor reflexivo) e, sobretudo, capazes de produzir


conhecimentos sobre o seu trabalho (professor-pesquisador).
A perspectiva do professor-pesquisador não deixa de ser uma idéia promissora,
desde que não fique condicionada apenas à análise da própria prática pedagógica, visto
que é fundamental que os professores tenham uma visão mais ampla da ação educativa e
oportunidades de ampliação do domínio do saber teórico e, desde que, os professores
desejem pensar sobre as dimensões sociais e políticas da educação e do contexto em que
sua prática se insere (DICKEL, 1998).
Em síntese, as ideias de professor reflexivo e professor pesquisador
supervalorizam a subjetividade no trabalho docente, enfatizando a individualidade do
professor e sua prática, em detrimento dos aspectos objetivos e coletivos. A partir
destas discussões, é necessário conceber uma concepção de formação continuada que
valorize o conhecimento científico, destacando o caráter sócio-histórico dessa formação,
assim como a necessidade de um profissional de caráter amplo, com pleno domínio e
compreensão da realidade de seu tempo, com desenvolvimento da consciência crítica
que lhe permita interferir e transformar as condições da escola, da educação e da
sociedade.
Embora os estudos e debates sobre o tema “formação continuada” não sejam
recentes, acredita-se que ainda existem lacunas a serem preenchidas, principalmente
pelo motivo de que diferentes estratégias de formação continuada, de forma recorrente,
têm sido foco de políticas governamentais nas diferentes esferas, bem como fonte de
verbas tanto para programas presenciais quanto a distância.

Questões e dilemas atuais sobre a formação continuada

Gatti (2008), ao questionar os motivos que têm provocado o surgimento de


tantos projetos de formação continuada de professores, considera que tal ocorrência tem
base histórica em condições que emergem na sociedade, como os desafios colocados
aos currículos e ao ensino, ou nos desafios postos aos sistemas de ensino através da

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universalização 3, ou pelas inúmeras dificuldades enfrentadas por gestores e professores


no cotidiano escolar. Porém, a insistência em relação à questão da formação continuada
deve-se ao fato de que a qualidade do ensino, bem como a eliminação do fracasso
escolar4, ainda não foram alcançadas, apesar de toda a luta persistente dos educadores e
das políticas e programas educacionais implementados.
Soares (2008) demonstra que a formação continuada tem sido bastante
considerada na pesquisa educacional e levanta a hipótese de que as políticas de
profissionalização docente são desenvolvidas de uma forma específica no campo da
formação continuada dos professores, calcadas em uma compreensão determinada de
trabalho docente, pragmática e praticista, provocando uma reduzida efetividade dos
cursos ofertados, o que demanda uma maior abordagem pela pesquisa educacional.
Ferreira (2007) e Gatti (2008) apontam que o motivo pelo qual as ações de
formação continuada não têm atingido os resultados esperados, estaria na definição do
conceito de formação continuada, sendo esta uma tarefa complexa, se forem
consideradas as várias possibilidades existentes.
Em uma perspectiva de totalidade, pode-se afirmar que a formação continuada,
isoladamente, dificilmente poderia levar a mudanças significativas. A construção de um
sistema educacional democrático, não seletivo e não excludente depende de uma série
de outras medidas e ações, tais como: a explicitação de uma concepção de educação,
homem e sociedade; uma revisão de toda a concepção de conteúdos, metodologias,
avaliação e gestão da escola; a criação de políticas de democratização do sistema
educacional (MAINARDES, 2008); a melhoria das condições de trabalho, de salário e
de jornada dos professores; entre outras. Dessa forma, pode-se considerar que a
formação continuada de professores é uma questão necessária, mas não suficiente para a
construção da qualidade da educação5.
De acordo com Polimeno (2001), as dificuldades encontradas na formação
continuada são as seguintes:

3
Por universalização entende-se o acolhimento cada vez maior de crianças e jovens na escola.
4
Ao analisar fatores que levam ao fracasso escolar e constatar que a escola produz não leitores, Kramer
(2004) observa que um dos motivos foi que a escola perdeu ao longo do tempo seu sentido cultural, sua
função social e seu papel humano.
5
Autores como Kramer (1989), Andaló (1995) e Ribas (2000) consideram a formação continuada um
requisito imprescindível para que a qualidade aconteça.

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a) cada nova política, projeto ou programa parte da estaca zero, desconsiderando


a experiência e o conhecimento acumulados;
b) a formação é tomada isoladamente, sem se considerar outras dimensões do
exercício profissional (condições de trabalho, recursos disponíveis, carreira e salário);
c) privilegia os aspectos individuais da formação;
d) não integra um sistema de formação permanente.

Para a autora (ibid.), a formação, enquanto entendida como um processo


contínuo e permanente de desenvolvimento exige que o professor esteja disponível para
continuar aprendendo. Ao mesmo tempo, deve permitir que ele aprenda a refletir sobre
suas próprias ações.
Moreira (2002) alerta para o fato de que a formação continuada pode tornar-se
um “negócio lucrativo”, principalmente quando são propostos cursos superiores
aligeirados, que melhoram estatísticas com pouco investimento, satisfazendo exigências
que não têm nenhum fundamento em teorias pedagógicas e parecem reduzir o
profissional da educação a um “produtivo ensinador”, ou melhor, “são verdadeiros
pacotes comerciais, idealizados por improvisados formadores que se encontram
distantes da realidade escolar e estão mais interessados na Formação Continuada como
um negócio lucrativo”. (p.19 - grifo do autor).
Para que tal situação seja transformada, é necessário que se estabeleçam
programas de formação continuada de professores, como meio de fomentar a produção
de intelectuais críticos, de aprimorar seus conhecimentos teóricos e estimular sua
reflexão crítica a partir de seu contexto da prática.
Segundo Ferreira (2008), no campo da formação continuada espera-se que os
professores aprimorem seus referenciais e práticas pedagógicas, visto a necessidade de
se ter uma formação aprimorada, alicerçada em uma concepção crítica, para o alcance
de melhores resultados em sua ação, além do reconhecimento de sua profissionalidade.
O autor descreve que, em uma perspectiva crítica, a formação continuada deve ocorrer
em um ambiente de comprometimento com o desenvolvimento da profissionalidade
docente, de forma a articular as questões políticas e sociais à prática pedagógica e
atuação junto aos alunos.

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Para isto, a formação continuada precisaria valorizar o saber teórico, bem como
instrumentalizar os professores para implementarem práticas pedagógicas que pudessem
garantir a apropriação do conhecimento por todos os alunos. A formação de professores
para o emprego de práticas sistemáticas, pedagogias diferenciadas e avaliação formativa
são alguns exemplos que poderiam ser indicados como necessários no contexto atual.

Considerações finais

Em virtude da complexidade do tema, é pertinente afirmar que as políticas


educacionais voltadas à formação continuada de professores, especialmente os
professores alfabetizadores, são fundamentais e possuem um potencial significativo para
a promoção da melhoria da qualidade da aprendizagem dos alunos com um impacto
relevante na prática social, na medida em que pode instrumentalizar os professores com
o domínio teórico-prático necessário para uma ação pedagógica mais eficiente e eficaz.
Porém, as políticas de formação continuada precisam estar articuladas a outras políticas
uma vez que a problemática da aprendizagem e da construção da qualidade na educação
pública exige uma multiplicidade de ações e intervenções para além da formação
continuada de professores.

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