Texto - JOÃOZINHO DA MARÉ

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ATO DE FÉ OU CONQUIST A DO CONHECIMENTO?

Um episódio na vida de Joãozinho da Maré


Era uma vez um moleque chamado Joãozinho que irmãos fossem, todos os dias, acordados com o sol entrando
morava na favela da Maré, no Rio de Janeiro. Essa favela de pelo barraco, iluminando suas caras logo de manhãzinha.
casebres que se equilibram sobre palafitas espetadas no lodo Para o nosso herói estava na cara que o sol, ao longo do ano,
das margens da baía de Guanabara. Do fundo da miséria em vai mudando o lugar em que aparece no' horizonte.
que vivia, Joãozinho podia ver, não muito distantes, algumas Joãozinho também já tinha percebido que essa diferença é
das conquistas de nossa civilização "em vias de enorme. Essa grande diferença era ainda mais fácil de ser
desenvolvimento" (para uma minoria). Dali de sua favela ele percebida devido às montanhas detrás das quais o sol parecia
podia ver uma das grandes Universidades onde, segundo lhe sair. Por volta do fim do ano o sol aparecia mais para as
contavam, existiam uns verdadeiros "crânios" e onde se fazia bandas do Pão de Açúcar. No meio do ano o sol nascia mais
Ciência. Naturalmente essa Ciência nada tinha a ver com os para as bandas do Dedo de Deus (Serra dos Órgãos). Era uma
muitos milhões de Joãozinhos que perambulam pelas ruas, diferença bem grande (quase 50 graus). A diferença dos
caminhos e estradas do Brasil. pontos em que nasce o Sol, vistos de seu barraco, era
Além de perambular por toda a cidade, Joãozinho, evidente e familiar.
de sua favela, podia ver o aeroporto internacional do Rio de –– Fessora!?
Janeiro. Isso oferecia ao menino a oportunidade de ver –– Que é, Joãozinho?
imensos aviões chegando e saindo. Era o que mais fascinava
os olhos do moleque. Aqueles monstros metálicos que –– Qual é o ponto Leste que a gente devemos usar?
subiam rugindo pareciam rachar os céus. Joãozinho, com –– Ponto Leste só tem um, Joãozinho.
olhar curioso, acompanhava aqueles pássaros barulhentos
até que, diminuindo de tamanho, eles desapareciam no céu. –– A Sinhora num falô qui é o lugar onde o sol sai?
Talvez por freqüentar pouco a escola, por observar –– Falei, e daí, Joãozinho?
aviões e o mundo que o rodeia, Joãozinho seja um
–– É que a gente vemos o sol nascê sempre em lugar diferente.
sobrevivente de nosso sistema educacional. Ele ainda não
perdera aquela curiosidade de todas as crianças; aquela –– Se ponto Leste é onde sai o sol, então ele (ponto Leste) tá
vontade de saber os “como” e os “porquês”, especialmente mudando, num tá Fessora?
em relação às coisas da Natureza. O moleque ainda tinha e –– Joãozinho, você está atrapalhando minha aula. Desse jeito
sentia aquele gosto de descobrir e de saber, que se vão não posso dar o meu programa. É assim como já ensinei.
extinguindo, quase sempre, à medida que se vai Trate de estudar mais e atrapalhar menos.
freqüentando a escola. Também, não há curiosidade que
agüente aquela decoreba sobre corpo humano, por exemplo; Joãozinho, moleque esperto e observador, ficou
e apresentada como CIÊNCIA. meio frustrado com o episódio, mas não lhe deu maior
Além da chatice da aula sobre “cabeça, tronco e importância. Num outro dia, depois de pensar com seus
membros”, Joãozinho andava meio arisco com sua botões e num papo com seus amigos sobre o assunto,
professora e com as aulas de Ciências. chegou à seguinte conclusão:
Conforme “manda o programa”, a professora havia "...ou o ponto Leste não é o ponto em que o sol
ensinado coisas como a Terra, o Sol, Pontos Cardeais, etc. Ela nasce... ou então o ponto Leste não serve pra nada ..."
havia dito que era importante que eles soubessem os Pontos Na mesma série de aulas sobre esses temas
Cardeais: “...se um dia vocês se perderem na floresta, como obrigatórios do programa, a professora havia "ensinado"
escoteiros, vocês podem se orientar pelos Pontos Cardeais, outro assunto: os dias e as noites (fusos horários).
que são quatro: Norte, Sul, Leste e Oeste. Em seguida, a –– Meio-dia é quando o sol passa a pino.
professora ditara o "ponto" com as definições e ca-
–– Fessora, quié sol a pino?
racterísticas de cada um dos pontos, acrescentando:
–– É quando o sol passa bem em cima das nossas cabeças. É
–– A gente acha esses pontos fazendo assim: estende-se bem os
quando a sombra da gente fica embaixo dos nossos próprios
dois braços, horizontalmente para o lado. Depois a gente
pés.
vira o braço direito para o ponto em que o Sol nasce no
horizonte. Esse ponto é o ponto Leste. O braço esquerdo
Joãozinho achara interessante o assunto. Até lhe
estará apontando para o ponto Oeste. Bem em frente fica o
ocorrera a idéia de acertar o relógio quando o sol passasse a
ponto Norte e atrás de nós estará o ponto Sul.
pino. Ao sair da sala, no fim da aula, como já era quase meio-
De assuntos como esse, até que o Joãozinho gostava. dia, valia a pena observar o que a professora acabara de
Ele morava num barraco sem janelas, ou melhor, "ensinar".
com aberturas que só eram tapadas provisoriamente quando Joãozinho e os amigos se postaram ao sol para vê-lo
chovia. Quando não chovia, todas as "janelas" do barraco passar a pino, mesmo com a escola já fechada e abandonada
permaneciam abertas. Isso fazia com que Joãozinho e os por quase todos.

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A sombra ainda estava grande. Também, ainda não Ela então se dispunha a falar sobre coisas como o Sol, a Terra,
era meio-dia. Era preciso esperar a sombra encurtar. Chega seus movimentos e as Estações.
meio-dia. Os guris conferem com os relógios das pessoas que A aula começa com as definições ditadas para
passam. Já era meio-dia. A sombra ainda estava grande. A "ponto".
turma percebe que, em lugar de encurtar, a sombra começa
–– o VERÃO é o tempo do? ... Calor.
a aumentar de comprimento e mudar de direção...
No dia seguinte, Joãozinho e seus amigos resolvem –– o INVERNO é o tempo do? ... Frio.
acompanhar a sombra desde cedo para não perder o –– a PRIMAVERA é o tempo das? ... Flores.
momento em que ela deveria passar por baixo de seus pés.
Era preciso faltar à aula. Sempre um dos amigos ficaria de –– o OUTONO é o tempo das? ... Frutas.
plantão para não perder o momento do sol a pino. Eles
haviam combinado observar também a sombra de um gran- Em sua favela, no Rio de Janeiro, Joãozinho conhece
de poste próximo à favela. duas estações: época de calor e época de mais calor ainda;
...as sombras não deixaram de existir...??? um verdadeiro sufoco de calor, às vezes. Graças a isso o
...então o sol não passou a pino...??? moleque sobrevivia com uns trapos que um dia devem ter
(... e isso ... ??? ... em pleno Rio de Janeiro ... ???) sido de algum garoto da zona Sul. Flores, Joãozinho via
Depois de vários dias de tentativas frustradas de ver durante todo o ano em cortejos fúnebres e casamentos. E
o sol a pino ou, o que é a mesma coisa, ver as sombras não havia mais enterros em determinada época do ano.
desaparecerem sob os próprios pés, os guris desistem. Casamentos havia mais em maio, mês das rosas (?), mês das
Alguns dias depois, Joãozinho e seus amigos voltam noivas (?).
à escola. Desta vez não era por causa da merenda. Eles Joãozinho também ajudava no mísero orçamento de
haviam ficado intrigados com o caso do sol a pino ou sem sua família de mais seis irmãos e a mãe. Ele ajudava seu irmão
pino. mais velho a vender frutas na zona Sul da cidade: figos de
Valinhos, uvas de Jundiaí, mangas do Rio, cajus e abacaxis do
–– Fessora. Nordeste. Felizmente esse negócio era maior depois do fim
–– Que é, Joãozinho? de suas aulas até o Carnaval.
... Então outono deve ser nessa época? ...
–– A gente não conseguimos ver o sol a pino não. Joãozinho, observador e curioso, queria saber
–– Vai ver que vocês não olharam bem. porque acontecem essas coisas. Por que existem VERÃO,
INVERNO, etc?
–– Fessora, mostra pra gente esse negócio. A gente queria vê.
–– Eu já disse a vocês, numa aula anterior, que a Terra é uma
–– Eu não tenho tempo pra isso, meninos. Tenho que sair
grande bola solta no espaço e que essa bola está rodando
correndo pra dar outra aula na escola de Irajá. E tem outra
sobre si mesma.
coisa. Faz 15 anos que eu dou essa aula e nunca ninguém
me amolou tanto quanto você e seus amigos, Joãozinho.
É sua rotação que provoca os dias e as noites.
–– Num tem nada não, Fessora, a gente só' queríamos intendê. Acontece que, enquanto a Terra está girando, ela também
está fazendo uma grande volta ao redor do Sol. Essa volta se
Alguns meses depois. Já se aproximava o fim do ano. faz em um ano. O caminho é uma órbita alonga da chamada
Eram as últimas aulas. Joãozinho e seus amigos já haviam elipse. Além dessa curva ser assim achatada ou alongada, o
esquecido o episódio do sol a pino. A aula terminara. Faltava Sol não está no centro. Isso quer dizer que em seu
pouco para o meio-dia. Os garotos saem e de repente, movimento a Terra às vezes passa perto, às vezes passa longe
Joãozinho, que dera uma topada, numa pedra, olha para seus do Sol.
pés...
–– Quando passa mais perto do Sol é mais quente: É VERÃO.
–– Ei, turma, vem vê! –– A sombra tá quase sumindo embaixo
–– Quando passa mais longe do Sol recebe menos calor: É
da gente! –– O sol tá quase a pino! – Vamo esperá mais um
INVERNO.
pouco! –– Vamo vê o sol a pino!

Dentro de mais alguns instantes, os moleques Os olhos do Joãozinho brilhavam de curiosidade


irrompem num grito de entusiasmo. A sombra desaparecera. diante de um assunto novo e tão interessante.
O sol estava bem a pino, no meio do céu. Todos olharam
–– Fessora, a senhora não disse antes que a Terra é uma bola
pressurosos para o relógio da professora, que também
e que tá girando enquanto faz a volta em volta do Sol?
acorrera ...
–– Sim, eu disse, responde a professora com segurança.
. . . Não era meio-dia ... Que decepção.
–– Mas, se a Terra é uma bola e está girando todo dia perto do
Num outro dia, sabendo por seus colegas que Sol, não deve ser verão em toda a Terra?
haveria merenda, quase único atrativo da escola para o
menino, ele resolve ir à aula. Nesse dia sua professora iria dar –– É, Joãozinho, é isso mesmo.
uma aula de Ciências, coisa de que o menino ainda gostava.

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–– Então é mesmo verão em todo lugar e inverno em todo –– Sabe, Fessora, eu achei que tem. A gente sabe que um avião
lugar, ao mesmo tempo, Fessora? tá chegando perto quando ele vai ficando maior. Quando ele
vai ficando pequeno é porque ele tá ficando mais longe.
––– Acho que é, Joãozinho, mas vamos mudar de assunto.
–– E o que isso tem a ver com a órbita da Terra, Joãozinho? E
A essa altura a professora já não se sentia tão segura
que eu achei que se a Terra chegasse mais perto do Sol, a
do que havia dito. A insistência, natural para o Joãozinho, já
gente devia ver ele maior. Quando a Terra tivesse mais
começava a provocar uma certa insegurança na professora. longe do Sol, ele devia aparecê menor. Não é, Fessora?
–– Mas, Fessora, insiste o garoto, enquanto a gente está –– E daí, menino?
ensaiando a escola de samba, na época do Natal, a gente
sente o maior calor, não é mesmo? –– A gente vê o Sol sempre do mesmo tamanho. Isso não quer
dizer que ele tá sempre na mesma distância? Então verão e
–– É mesmo, Joãozinho. inverno não pode sê por causa da distância.
–– Então nesse tempo é verão aqui, Fessora. É, Joãozinho. –– Como você se atreve a contradizer sua professora? Quem
–– E o Papai Noel no meio da neve com roupa de frio e botas. anda pondo essas "minhocas" na sua cabeça? Faz 15 anos
que eu sou professora. É a primeira vez que alguém quer
–– A gente vê nas vitrinas até as árvores de Natal com algodão. mostrar que a professora está errada.
Não é para imitar neve (a 40° C no Rio), Fessora?
–– É, Joãozinho, na terra do Papai Noel faz frio. A essa altura, já a classe se havia tumultuado. Um
grupo de outros garotos já havia percebido a lógica
–– Então na terra do Papai Noel, no Natal, faz frio, Fessora?
arrasadora do que o Joãozinho dissera. Alguns continuaram
Faz, Joãozinho.
indiferentes. A maioria achou mais prudente ficar do lado da
–– Mas então tem frio e calor ao mesmo tempo? Quer dizer "autoridade". Outros aproveitaram a confusão para
que existe verão e inverno ao mesmo tempo? aumentá-la. A professora havia perdido o controle da classe
–– E, Joãozinho, mas vamos mudar de assunto. Você já está e já não conseguia reprimir a bagunça nem com ameaças de
atrapalhando a aula e eu tenho um programa a cumprir. castigo e de dar "zero" para os mais rebeldes.
Em meio àquela confusão tocou o sinal para o fim da
Mas Joãozinho ainda não havia sido “domado” pela aula, "salvando" a professora de um caos maior. Não houve
escola. Ele ainda não havia perdido o hábito e a iniciativa de aparentemente nenhuma definição de vencedores e
fazer perguntas, e querer entender as coisas. Por isso, apesar vencidos nesse confronto.
do jeito visivelmente contrariado da professora, ele insiste. Indo para casa, a professora ainda agitada e
contrariada se lembrava do Joãozinho que lhe estragara a
–– Fessora, como é que pode ser verão e inverno ao mesmo
aula e também o dia. Além de pôr em dúvida o que ela
tempo em lugares diferentes, se a Terra, que é uma bola,
afirmara, ele dera um "mau exemplo". Joãozinho, com seus
deve estar perto ou longe do Sol? Uma das duas coisas não
argumentos ingênuos, mas lógicos, despertara muitos para o
tá errada?
seu lado.
–– Como você se atreve, Joãozinho, a dizer que a professora
está errada? Quem andou pondo essas idéias em sua –– Imagine se a moda pega, pensa a professora. O pior é que
cabeça? não me ocorreu qualquer argumento que pudesse
'enfrentar' o questionamento do garoto. Mas foi assim que
–– Ninguém não, Fessora. Eu só tava pensando. Se tem verão e me ensinaram. É assim mesmo que eu também ensino,
inverno ao mesmo tempo, então isso não pode acontecer pensa a professora. Faz tantos anos que dou essa aula,
porque a Terra tá perto ou tá longe do Sol. Não é mesmo, sobre esse mesmo assunto...
Fessora?
À noite, já mais calma, ela pensa com seus botões:
A professora, já irritada com a insistência atrevida do
–– Os argumentos do Joãozinho foram tão claros e ingênuos. Se
menino, assume uma postura de autoridade científica e
o inverno e o verão fossem provocados pelo maior ou menor
pontifica:
afastamento da Terra em relação ao Sol, deveria ser inverno
–– Está nos livros que a Terra descreve uma curva que se chama ou verão em toda a Terra. Eu sempre soube que enquanto é
elipse ao redor do Sol, que este ocupa um dos focos e inverno em um hemisfério, é verão no outro. Então tem
portanto ela se aproxima e se afasta do Sol. Logo, deve ser mesmo razão o Joãozinho. Não pode ser essa a causa de
por isso que existe verão e inverno. calor ou frio na Terra. Também é absolutamente claro e
Sem se dar conta da irritação da professora, nosso lógico que se a Terra se aproxima e se afasta do Sol, este
Joãozinho lembra-se da sua experiência diária e acrescenta: deveria mudar de tamanho aparente. Deveria ser maior
quando mais próximo e menor quando mais distante.
–– Fessora, a melhor coisa que a gente tem aqui na favela é
poder ver avião o dia inteiro. –– Como eu não havia pensado nisso antes? Como posso eu
estar durante tantos anos 'ensinando' uma coisa e nunca me
–– E daí, Joãozinho? O que isso tem a ver com o verão e o
ocorreu, sequer, alguma dúvida sobre isso? Como posso eu
inverno?
estar durante tantos anos 'ensinando' uma coisa que eu
julgava Ciência, e que, de repente, pôde ser totalmente
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demolida pelo raciocínio ingênuo de um garoto, sem poderiam sofrer com uma posição de contestação ao que a
nenhum outro conhecimento científico? professora havia dito.
–– E eu que ia me ofendendo com a atitude lógica e ingenua-
Remoendo essas idéias, a professora se põe a pensar
mente destemida do Joãozinho, pensa a professora.
em outras muitas coisas que poderiam ser tão falsas e
inconsistentes como as “causas” para o verão e o inverno. Talvez a maioria dos alunos já esteja "domada" pela
Por que tantas outras crianças aceitaram sem escola.
resistência o que eu disse? Sem perceber, a professora pode estar fazendo
Por que apenas o Joãozinho resistiu e não ‘engoliu’ exatamente o contrário do que ela pensa ou deseja fazer.
o que eu disse? No caso do verão e do inverno a Talvez o papel da escola tenha muito a ver com a nossa
inconsistência foi facilmente verificada. Era só pensar. passividade e com os problemas do mundo que nos rodeia.
Se ‘engolimos’ coisas tão evidentemente erradas, Não terá isso a ver também com outros problemas do nosso
como devemos estar ‘engolindo’ outras mais erradas, mais dia-a-dia?
sérias e menos evidentes! Podemos estar tão habituados a
–– Todas as crianças têm uma natural curiosidade para saber
repetir as mesmas coisas que já nem nos damos conta de que os “comos” e os “porquês” das coisas, especialmente da
muitas delas podem ter sido simplesmente acreditadas. natureza.
Muitas dessas coisas podem ser simples “atos de fé” ou
crendices que nós passamos adiante como verdades À medida que a escola vai "ensinando", o gosto e a
científicas ou históricas: curiosidade vão se extinguindo, chegando freqüentemente à
aversão.
"ATOS DE FÉ EM NOME DA CIÊNCIA" Quantas vezes nossas escolas, não só a do Joãozinho,
pensam estar tratando da Ciência por falar em coisas como
É evidente que não pretendemos nem podemos átomos, órbitas, núcleos, elétrons, etc... Não são palavras
provar tudo que dizemos ou tudo que nos dizem. No entanto, difíceis que conferem à nossa fala o caráter ou o "status" de
o episódio do Joãozinho levantara um problema sério para a coisa científica. Podemos falar das coisas mais rebuscadas e
professora. complicadas e, sem querer, estamos impingindo a nossos
Que bom que houve um Joãozinho. alunos grosseiros "atos de fé", que não são mais que uma
Haverá sempre um Joãozinho para levantar dúvidas? crendice, como tantas outras. Não é à toa que se diz da escola
Talvez alguns outros também tenham percebido e (ou "ex-cola"?): um lugar onde as cabecinhas entram
tenham calado sabendo da reprovação ou da repressão que "redondinhas", e saem quase todas "quadradinhas".
Extraído do livro: Com Ciência na Educação – Ideário e Prática de uma alternativa brasileira para o Ensino de Ciências, páginas 27-36.
Escrito por Rodolpho Caniato
Boletim da Sociedade Astronômica Brasileira, ano 6, número 2, 31-37, 1983
Disponível em: http://www.fisica.ufmg.br/~dsoares

OFICINA DE ANÁLISE DE TEXTO - JOÃOZINHO DA MARÉ


QUESTÕES PARA REFLEXÃO EM GRUPOS
1. Quem é Joãozinho da Maré e a professora de 6. Podemos pensar o caso do Joãozinho sob várias
Joãozinho para você? perspectivas e pontos de vista teóricos. Como você
vê as perguntas e argumentações para o processo
2. Elenque quais são os problemas do ensino de
de aprendizagem de Joãozinho? O que isso significa
ciências que você identifica no texto e em suas
para sua prática em sala de aula?
narrativas. Como os problemas do ensino de
ciências reverberam na narrativa e diálogos do 7. Como você intervém ou interviria em situações
texto? semelhantes?
3. Qual é a natureza destes problemas? (Qual a visão 8. Você acha que a formação que temos ou tivemos
de ciência ou conhecimento científico que a nas disciplinas na universidade foram ou serão
professora revela com seu discurso? Qual a visão suficientes pra lidar com situações semelhantes a
de professor de ciências que a professora estas citadas no texto? Explique como você percebe
demonstra em suas posturas?) essa relação
4. O texto retrata uma preocupação da professora em 9. Existe uma tendência de repetirmos modelos
torno do cumprimento do programa curricular de metodológicos que eram utilizados pelos nossos
ciências. Qual a sua opinião sobre esta questão? antigos professores de ciências. Por que isso
ocorre? O que você acha disso na perspectiva do
5. A reflexão por parte da professora de Joãozinho em
processo de aprendizagem dos estudantes?
torno da necessidade de mudanças em função das
demandas que ela tem enfrentado reflete uma 10. Em sua opinião, quais seriam os caminhos para
realidade. Como você poderia correlacionar a uma mudança efetiva e necessária no ensino de
realidade da professora com as nossas ciências, como base nos problemas identificados
realidades?? Como lidar com ela? na reflexão sobre o texto?

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