Roteiro Educativo Historias Af
Roteiro Educativo Historias Af
Roteiro Educativo Historias Af
Narrativas e aprendizagens
ROTEIRO EDUCATIVO PARA USO DO ACERVO
Uma história pode mudar
seu jeito de ver o mundo
Narrativas e Aprendizagens é um roteiro educativo elaborado pelo Instituto Museu da Pessoa
para orientar, sugerir, trocar e também aprender a como utilizar o acervo de histórias de vida
pertencentes à instituição.
O Museu da Pessoa é um museu virtual e colaborativo fundado em São Paulo no ano de 1991. Desde
sua origem, tem como missão registrar, preservar e transformar em informação, histórias de vida de
toda e qualquer pessoa da sociedade. Trata-se de um museu em constante movimento e câmbio com
a sociedade, onde a colaboração de internautas, escolas, participantes de projetos, são fundamentais na
construção de uma rede internacional de narrativas, de exposições de singularidades, significações, de pontos
de vista da história.
Acesse e entenda
E por que trabalhar com memórias, biografias? Pierre Nora (1993)1 lembra que a História é a reconstrução sempre problemática
e incompleta do que não existe mais. A memória é um fenômeno sempre atual, um elo vivido no eterno presente. Afinado
ao posicionamento do autor, compreende-se aqui que as memórias são constituídas entre os atos de lembrar e esquecer,
e as histórias de vida são experiências decodificadas pelos próprios indivíduos resultantes destes “embates” e continuas
sintetizações, não necessariamente conscientes, ocorridos no tempo presente. O resultado é a empatia, a construção de
sentido pessoal e a compreensão de seu entorno. E, justamente por estas decorrências, as narrativas se tornam fontes
importantes para a análise e problematização da coletividade em que se vive. Trata-se de olhares sobre o cotidiano, sobre
a micro história. As histórias de vida são percepções singulares sobre uma realidade, assimilações contextualizadas que
dizem muito sobre uma conjuntura, e que democratizam e problematizam informações dadas como certas e absolutas.
E nesse universo plural e híbrido trazido por milhares de pessoas que orbitam o portal do Museu da Pessoa, fica a
questão: Como as histórias de vida podem contribuir para uma ação educativa, uma reflexão, uma mobilização?
O Roteiro é uma ação do projeto: “Difusão de Acervos e Metodologia de registro de história de vida do Museu da Pessoa,
contemplado no ProAC edital 18/2015 – Difusão de acervos museológicos, da Secretaria de Estado da Cultura, contando com
a parceria do SISEM-SP e Museu do Futebol. O roteiro proposto se desenvolve como norte, longe da pretensão de modelo, e
tem como base a concepção de que todo indivíduo possui sua experiência, atua em determinado contexto, e que é, pode, deve
também ser um pesquisador.
1
NORA, Pierre. Entre memória e História: a problemática dos lugares. Projeto História, São Paulo, n. 10, dez. 1993, p.9.
Para quem é este roteiro?
Narrativas e Aprendizagens é um roteiro educativo elaborado pelo Instituto
Museu da Pessoa destinado ao uso de seu acervo. Ele pode ser utilizado
por qualquer pessoa, em contextos escolares ou não.
De acordo com essa premissa, as histórias podem ser encaradas como instantâneos da realidade vivida, que trazem
inspiração, como discursos de autoajuda, ou para o engenho ficcional. Elas podem ser usadas para oficinas de criação
literária, roteiros de filmes. As narrativas podem ser empregadas para se discutir conceitos e métodos de pesquisa, como
história, memória e história oral. Elas também têm o poder de trazer aos leitores/ouvintes a reflexão e o sentimento
de pertencimento em relação a grupos e localidades. As biografias permitem ainda buscar traços de uma época,
mentalidades, personagens. Abrem um leque de possibilidades para se problematizar versões da história ao trazer
informações não presentes em fontes oficiais, como em materiais didáticos, livros e jornais. As narrativas propiciam a
participação democrática de uma comunidade na elaboração de sua própria história.
E qual é o foco
deste roteiro?
Diante de tantas possibilidades de usos
das histórias de vida, este roteiro promove
um recorte e centraliza sua orientação na
elaboração de coleções virtuais a partir
das narrativas (entre outros componentes,
como fotos e documentos) presentes no
acervo da instituição.
Por onde
eu começo?
O primeiro passo é conhecer
o portal do Museu da Pessoa
www.museudapessoa.net.
Assista entrevistas, leia depoimentos,
observe fotos e documentos.
Navegue, investigue, conheça!
Mergulhe nesse universo!
Entre o encanto
e a atenção
Histórias tão diferentes, não? E cada relato traz uma questão, uma
situação, um contexto, uma relação, um tempo, e mostram uma
pequena parcela do que é essa admirável “coisa” chamada vida.
A reflexão sobre as biografias, seu sentido, o porquê de respirar
é a primeira ponderação ocasionada pelas narrativas. Depois
vêm à mente seus temas, a crítica, o julgamento e a curiosidade
de conhecer a fundo essas trajetórias, algo possível por meio
de entrevistas disponíveis na íntegra. Em seguida, a surpresa da
consciência de que, apesar da aparente distância de um e de outro,
não é que em muito elas se cruzam?
Percebe-se que são vários temas já elencados, a cidade de São Paulo e sua clique e acesse o vídeo
história, o próprio bairro do Cambuci, a imigração, a legislação ambiental,
os padrões de consumo e acesso da época retratada... O depoimento de
Gilberto Amatuzzi ainda pode ser lido na íntegra, o que traz novos assuntos,
como o ensino marista, os “bailinhos”, sua experiência na Amazônia, os
garimpos, suas andanças pelo interior do país...
De uma história de vida é possível disparar pesquisas sobre
vários temas e promover debates sobre eles. Como era o bairro
do Cambuci no passado? Como é hoje? O que aconteceu com o
bairro que a partir dos anos 1970 viveu a desinstalação de suas
indústrias? O perfil imigrante se manteve? E o que significa isso?
E como foi a especulação imobiliária depois desses anos?
clique e acesse
Maria Eliza Linhares Borges (2008) corrobora as colocações feitas acrescentando que:
Várias histórias de
vida para discorrer
sobre um tema
Escolha qualquer tema e reflita: quantas trajetórias de vida, com
pontos de vista diferentes ou não, podem discorrer sobre ele? E o que
essa pesquisa qualitativa pode acrescentar sobre tal mote?
Um bom exemplo para este tipo de uso das histórias de vida são as
coleções virtuais disponíveis no portal do Museu da Pessoa, foco
deste roteiro, e que serão aprofundadas gradativamente.
Golpe de 64
(Ditadura Militar)
A coleção virtual “Golpe de 64” traz 15 depoimentos de diferentes
personagens com dessemelhantes envolvimentos com o
período. Entre o escopo da coleção, encontram-se profissionais
de diversas áreas, inclusive algumas celebridades, as idades se
assemelham, e por meio dos excertos de suas histórias é possível
destacar diferentes formas de militância, com ênfase em política,
ou reivindicações sociais ou ainda manifestações culturais. Os
entrevistados fazem referência a pessoas, programas, lugares, e
fatos históricos relevantes, como Romeu Tuma (1931-2010), diretor
geral do Departamento de Ordem Política Social (DOPS) entre os
anos de 1977 e 1982; Operação Bandeirante (OBAN), Destacamento
de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa
Interna (DOI-CODI (SP)), e a morte de Vladimir Herzog (1937-1975),
jornalista assassinado sob tortura nos porões da ditadura.
Yaman Yaguare
A primeira leitura indica apenas uma passagem ordinária na vida de uma pessoa; em uma segunda leitura,
um pouco mais atenta, já se observam temas como preconceito, bullying, a “inocência” da criança e o
papel da leitura para a transformação do aluno. Ao adentrar ainda mais a narrativa, também se destacam
as estratégias formativas por parte da bibliotecária e também do pai, apresentadas de maneira graciosa
por um adulto ao se relembrar criança. E quando sabemos que Luiz tornou-se escritor profissional, autor
de romances, vencedor de prêmios literários, a passagem narrada torna-se ainda mais complexa e cheia
de significados. Toda essa explanação, claro, tem base em apenas um trecho de uma entrevista de história
de vida, datada, contextualizada.
A reflexão sobre a vida de Luiz poderia se tornar mais completa ao abordar sua entrevista na totalidade.
A partir dela, seria possível discutir sobre ele e suas raízes, suas crenças, sua relação com familiares, os
caminhos que o levaram à literatura, algumas reflexões sobre o mercado editorial, a profissão de escritor,
entre outros assuntos que sua narrativa traz.
A história de Luiz, isolada, já traz muitos elementos para o debate e pesquisa. Todavia, como citado
anteriormente, um caminho enriquecedor é acrescentar e cruzar informações com outros personagens
também correlatos ao universo da literatura, tendo assim, o foco da pesquisa sob um eixo temático:
literatura. Exatamente o que a coleção proporciona.
Os vídeos trazem outros personagens que possuem suas vidas ligadas, de
alguma maneira, ao universo literário. A história de Luiz Ruffato deixou de ser o
centro da investigação e passou a ser mais um recorte dentro deste campo da
literatura. E afinal, o que estas histórias acrescentam ao tema? Ao assistir os
pequenos contos, despontaram algumas reflexões? Foi possível reconhecer e
refletir sobre motivações pessoais para adentrar ao universo da literatura e da
arte de narrar, assim como vislumbrar, por meio das narrativas selecionadas,
traços culturais da sociedade brasileira?
Muitos dos entrevistados selecionados são famosos por suas publicações, mas
como eles mesmos evidenciam, por trás de uma grande obra, há sempre uma
grande história de vida. Suas trajetórias deixam claro que nenhum deles se
tornou escritor por um simples dom, pelo contrário, pessoas para adentrar ao
mundo das narrativas foram imprescindíveis, e o esforço e a perseverança com
a escrita igualmente.
Uma provocação, de fato, mas que conta muito sobre a sociedade e seus Sebastião Marinho
valores. Se não fosse a persistência de muitos “Marcelinos Freire”, talvez
o que chegasse às mãos de ávidos leitores seria apenas reproduções de
reproduções de reproduções de reproduções.
Tula Pilar
As histórias apresentadas também trazem a existência do entorno, um Casa onde o depoente nasceu e morou
até os 9 anos. De acordo com Luiz
Brasil que se vê nas entrelinhas, e que a muito custo pula da vida para Ruffato, a foto foi tirada “muitos e
a ficção, como na história de Luiz Ruffato, que descreve sua infância no muitos” anos depois que ele morou no
local, e hoje a casa não existe mais.
cortiço de Vila Teresa, o chamado beco do Zé Linco, onde moravam famílias
operárias, pobres, com muitas discussões, problemas de álcool e violências
domésticas. Não raramente, as experiências de vida se tornaram passagens
e personagens de seus livros. Vale um olhar atento então para essas
trajetórias de vida, não? Seja para saber o que inspirou esses escritores, seja
para aprender um pouco sobre o Brasil pela abrangência e ponto de vista de
suas memórias.
Diante desse desafio, como a coleção virtual proposta poderia ser utilizada?
Por outro lado, que tal desmistificar a relação da infância como resultante na
criação literária posterior? Veja o contraste entre as histórias de Daniel Michoni e
Ruth Rocha.
Daniel Minchoni
Os autores também discorrem sobre o “fazer”, e afinal, quais são seus métodos?
E no que eles se apoiam para começar uma nova obra? Pelas histórias de vida,
nota-se a importância de suas experiências, seus constantes trabalhos de clique e acesse
Daniel Minchoni
observação do entorno e dos outros, sua abertura ao sensível, aos sentimentos, e
claro, muita atenção à vida que passa imperiosamente.
Bartolomeu Queirós
clique e acesse
A coleção também apresenta autores de diferentes gêneros
literários, que tal ouvir suas narrativas para discuti-los? Que tal a
criação de Marcelino Freire?
Marcelino Freire
Bartolomeu Queirós
Coleção virtual – mãos à obra!
As histórias de vida trazem um universo cultural repleto de assuntos, conteúdos e significações. clique e acesse
A primeira etapa é pensar sobre um tema que seja relevante e que desperte seu interesse.
Tendo definido a motivação para o uso do acervo do Museu da Pessoa, segue-se a parte mais fantástica
desse trabalho: ouvir e garimpar histórias.
Realize a busca no Portal do Museu da Pessoa seguindo as recomendações anteriores. Leia as histórias,
se possível na íntegra, teça relações entre as biografias, reflita sobre suas conexões ou contradições.
Destaca-se que há um padrão a ser seguido para a confecção da coleção virtual – Título, Sinopse,
Tags. Cada sessão tem sua importância, e quanto mais completa a coleção estiver, maior visibilidade e
facilidade de acesso ela terá. Sugere-se que se escreva também um texto sobre a seleção realizada: pode
ser uma análise crítica, um artigo ou uma consideração para dialogar com a coleção criada, explicitando
o projeto realizado. Trata-se de um texto livre, onde pode ser evidenciada a motivação da pesquisa, o
processo de trabalho e, claro, as histórias de vida e suas análises. Assim, o realizador poderá explicitar
suas ideias e dialogar com o acervo do Museu da Pessoa e os demais internautas.
Não há um número exato de depoentes para compor uma coleção, o importante é ter a ciência de que
as histórias de vida são únicas, e que cada sujeito carrega suas experiências consigo, como partes
constitutivas de si mesmos. Uma questão comum aos internautas pesquisadores de histórias de vida é
a dúvida entre a busca do “ser comum” ou do “ser extraordinário”. Afinal, o que é mais representativo
sobre um tema, uma sociedade? Uma pessoa cuja história se assemelha a muitos outros de seu contexto,
ou o contrário, uma narrativa que não se encaixa dentro de sua conjuntura?
O importante é a coerência das escolhas das narrativas com a coleção imaginada, sem perder de vista
que a elaboração e reelaboração da mesma podem ser constantes de acordo com as pesquisas dentro do
acervo. A coleção não é uma amarra! E as histórias de vida, justamente por suas singularidades, sempre
transparecem novas situações e reflexões. Mais do que procurar histórias ordinárias ou excepcionais, de
dez ou de vinte pessoas, é fundamental ter a clareza de que se trata de trajetórias de vida de indivíduos,
registradas em determinados momentos e contextos, e que suas memórias trazem informações de quem
viu, viveu ou pensou ter vivido. Memórias que são subjetivas mas carregadas de informações e sentidos.
Passo a passo
1. Navegar pelo portal do Museu da Pessoa
2. Escolher um tema (localidade, época, marco histórico,
um sentimento...).
3. Pesquisar sobre o assunto dentro do acervo
4. Escolher os depoentes para compor a coleção
5. Analisar as histórias; criar categorias de análise; refletir
sobre seus conteúdos; tecer conexões...
6. Selecionar outras fontes documentais como fotos e
documentos que dialoguem com o tema
7. Escrever um texto que dialogue com as escolhas
feitas (Afinal, por que escolheu tais histórias, tais
depoentes?)
8. Montar a coleção virtual
Avise ao mundo
sobre sua criação!
O Museu da Pessoa acredita que valorizar a diversidade
cultural e a história de cada pessoa como patrimônio da
humanidade é contribuir para a construção de uma cultura
de paz. Agora, você faz parte desse coletivo, então, após
criar e publicar uma coleção, avise ao mundo sobre sua
criação! Envie um e-mail para [email protected]
advertindo sobre seu trabalho, e divulgue sua coleção virtual
em suas redes sociais!
Para saber mais
O roteiro educativo é um guia, e quem faz o caminho com autonomia é o internauta. A melhor forma
de explorar o acervo e conhecer suas biografias é soltar a imaginação, é gostar de ouvir e, por que não,
também contar e compartilhar suas narrativas. Vale lembrar que os trabalhos com memória permitem
liberdade em relação a temas e oportuniza problematizar versões dominantes da história.
Faça parte dessa rede. Defina temas, organize depoimentos, monte coleções, examine experiências
individuais, de grupos ou nações.
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