18 A Ética e Seus Atributos
18 A Ética e Seus Atributos
18 A Ética e Seus Atributos
1ª Edição
VITÓRIA - ES
2016
3
A Ética e Seus Atributos: Uma Abordagem Psicoanalítica
SM16cs
SOUZA, Sérgio Rodrigues de; MÁRIO, Júlio Cézar
Merij
A Ética e Seus Atributos: Uma Abordagem
Psicoanalítica / Sérgio Rodrigues de Souza; Júlio
Cézar Merij Mário. Vitória (ES) - 2016 - 305p.
ISBN: 978-85-920352-2-8
CDD - 170
CDU - 17
4
Sobre os autores
5
Agradecimentos
6
Dedicatória
7
“Siendo la naturaleza humana como es, no cabe es-
perar que el detentador o los detentadores del poder
sean capaces, por autolimitación voluntaria, de liber-
tar a los destinatarios del poder e a sí mismos del trá-
gico abuso del poder. Instituciones para controlar el
poder no nacen ni operan por si solos, sino que debe-
rían ser creadas ordenadamente e incorporadas
conscientemente en el proceso del poder. Han pasa-
dos muchos siglos hasta que el hombre político ha
aprendido que la sociedad justa, que le otorga y ga-
rantiza sus derechos individuales, depende de la exis-
tencia de límites impuestos a los detentores del poder
en el ejercicio del poder, independientemente de si la
legitimación de su dominio tiene fundamentos fácti-
cos, religiosos o jurídicos” (LOEWENSTEIN, 1986,
p.54).
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................11
9
9 A ÉTICA E O LIBERALISMO....................229
10 ÉTICA E CIDADANIA..............................242
CONCLUSÃO…...........................................288
REFERÊNCIAS............................................294
10
INTRODUÇÃO
12
valores, o que geralmente é impulsionado pelo acúmulo de
conhecimento e pelo avanço científico e tecnológico.” 1
1
BORÉM, Aluízio; SANTOS, Fabrício Rodrigues dos. Biotecnologia Simplificada.
2ª ed. Viçosa: Editora UFV, 2002. Cap. 15: Bioética, p.209.
13
o que é torto”] e fornece as diretrizes diante dos aconteci-
mentos e fatos que vivenciam em suas vidas pessoais, fami-
liares, sociais e, principalmente, profissionais.
2
Procusto era um ladrão que vivia de roubar quem passasse pela estrada que
ligava Mégara a Atenas, só poderia cruzar seu caminho quem passasse por um
terrível julgamento: o bandido possuía uma cama de ferro de seu tamanho exato,
nenhum centímetro a mais ou a menos, onde ele fazia sua vítima deitar-se. Se a
pessoa fosse maior que a cama amputava-lhe as pernas, se fosse menor era
esticada até atingir o tamanho desejado. Esse horror só teve fim quando o herói
Teseu fez a ele o mesmo que ele sempre fazia às suas vítimas, colocou-o na ca-
ma, mas um pouco para o lado, sobrando assim a cabeça e os pés que foram
amputados pelo herói. Ladrão, na época de Teseu era a denominação de quem era
caçador.
14
lembrar, esse não é um fator único e exclusivo. Quando ra-
dicalizada, a retórica da participação pode, perversamente,
derivar numa ideologia de responsabilização subordinada a
lógicas contrárias ao ideal que anunciam. Por esse motivo
também, o grande desafio ético que é colocado, concreta-
mente, na atualidade, passa por saber equilibrar o respeito
pela singularidade dos contextos e pela irredutibilidade pró-
pria do enigma humano com a salvaguarda das leis sociais
comuns requeridas pelos imperativos de justiça e de solida-
riedade.
3
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. A Genealogia da Moral. São Paulo: Editora
Escala, 2007.
16
vê-se obrigado a respeitar as sanções sociais impostas pela
cultura, esta criada a partir da presença do outro. Sendo
assim, o Id cria uma situação de conforto para si próprio, ou
seja, mascara seus próprios desejos de forma a satisfazê-
los sem [maiores] danos para sua imagem egóica.
4
FREUD, Sigmund (1927-1931). O Mal Estar na Civilização. In: Edição Standard
das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago,
2006. Vol. XXI.
5
Ibid.
17
zação é manter sob rigoroso controle o desejo insano de
agredir, matar e devorar da besta peluda que habita sob a
pele lisa e delicada do ser humano. Este foi um preço muito
alto que a espécie pagou por sua tranqüilidade. Sem este
elemento artificial já teria sucumbido e dado vazão a seus
impulsos de maneira mais desmedida ainda do que tem feito
ao longo dos séculos.
6
ARISTÓTELES. Política. São Paulo: Escala, 2007, p.241.
18
Entendendo desta fala que cabe àqueles que cuidam da
formação moral e ética das crianças o desenvolvimento e a
perpetuação de hábitos bons e saudáveis por meio do
exemplo prático para que, quando os pequenos chegarem
às condições de viver em sociedade e responderem por
seus modos o faça de modo sano e não ajam insensata-
mente obedecendo aos seus desejos mais primitivos o que
levaria à necessidade de intervenção das forças represso-
ras.
7
ARISTÓTELES. Política. São Paulo: Escala, 2007, p.241.
8
Ibid.
19
Não justifica-se haver um único peso e uma única medida
nos julgamentos de valores e ações sociais. Poucos com-
preendem quando fala-se na existência de juízo baseado
em dois pesos e duas medidas porque vem uma idéia de
que o membro da classe baixa [sempre] foi, é e continuará a
ser condenado e o da classe abastada [sempre] foi, é e con-
tinuará a ser absolvido.
21
I
OS CONCEITOS DE ÉTICA E MORAL E SUAS
IMPLICAÇÕES NA VIDA COTIDIANA SOCIAL
9
Cf. Dicionário Aurélio Eletrônico, 2004.
22
hábitos culturais diversos dos mais diferentes povos colo-
cam o estudo da ética como uma tarefa árdua e toda a cons-
trução e desconstrução da tábua de valores como uma nova
profissão impossível.
10
ARISTÓTELES. Arte Poética. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.25.
24
Le Bon afirmou que os humanos são seres gregários, soci-
ais por natureza. Assim sendo, por que há necessidade de
normas de convivência?
11
PEREIRA DA SILVA, Gastão. Psicologia da Vida Moderna. vol. IV. São Paulo:
Tese, 1983, p.87. 6 vol.
12
Ibid.
25
A cultura cuidou de criar um modelo de homem em que toda
a sua maldade original foi suprimida pelo processo civilizató-
rio. Isto é mais uma crença em contos de fadas científicos
porque as reações de agressão e agressividade são ine-
rentes aos seres humanos garantindo sua sobrevivência em
um meio hostil. Mas, com o advento da socialização tais
sentimentos tiveram que ser amansados, domados, sur-
gindo em seu lugar outros tipos de normas de convivências
sociais. Com a mudança nos valores administrativos, a força
bruta, a rapinagem, a violência, os raptos foram cedendo
espaço para novas formas de negociações mais amplas e
diplomáticas, mas, ainda assim, a primitiva força selvagem
continuava rangendo dentro de sua jaula porque mesmo
tendo se tornado um ser da moral, ainda é um ser da natu-
reza, preparado para sobreviver.
13
Immanuel Kant citado por CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo:
Ática, 1999, p.171.
26
outra postura bastante distinta, de igual forma é alguém em
seu espaço de vivência e este mesmo alguém fora dele.
Não é tão somente ser o que se é em qualquer espaço vi-
vencial para admitir que possua uma autonomia ética. E
ademais, tal condição somente é alcançada com a maturi-
dade porque a condição psicológica humana é também re-
gida pela condição biológica. Certos valores são internaliza-
dos à medida que o corpo envelhece, jamais antes disto.
14
Immanuel Kant citado por CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo:
Ática, 1999, p.171.
27
ser muito mais fortes do que a razão, a razão prática e a
verdadeira liberdade precisam dobrar nossa parte natural e
impor-nos nosso ser moral.”15
15
Immanuel Kant citado por CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo:
Ática, 1999, p.171.
16
Ibid.
28
Neste mesmo sentido Aristóteles de Estagira reforça o pen-
samento de Sócrates ressaltando que “[...] em relação a
todas as faculdades que nos vêm por natureza recebemos
primeiro a potencialidade, e, somente mais tarde exibimos a
atividade (isto é claro no caso dos sentidos, pois não foi por
ver repetidamente ou repetidamente ouvir que adquirimos
estes sentidos; ao contrário, já os tínhamos antes de come-
çar a usufruí-los, e não passamos a tê-los por usufruí-los);
quanto às várias formas de excelência moral, todavia, adqui-
rimo-las por havê-las efetivamente praticado, tal como fa-
zemos com as artes.”17
17
ARISTÓTELES. Arte Poética. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.35-36.
29
que não a põem corretamente em prática falham em seu
objetivo.”18
18
ARISTÓTELES. Arte Poética. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.35-36.
30
todos. Não julgo que as culturas tenham tentado, sistemá-
tica ou metodicamente, diferenciarem-se umas das outras.”19
19
LEVI-SATRUSS, Claude. Mito e Significado. São Paulo: Brasiliense, 1978, p.22-
23.
20
Ibid.
21
Ibid.
31
“O progresso só se verificou a partir das diferenças [e o que
assistimos é a escola tentando estandardizar os alunos co-
mo produtos em série produzidos nas fábricas]. Atualmente,
o desafio reside naquilo que poderíamos chamar a super-
comunicação - ou seja, a tendência para saber exatamente,
num determinado ponto do mundo, o que se passa nas res-
tantes partes do Globo.”22
22
LEVI-SATRUSS, Claude. Mito e Significado. São Paulo: Brasiliense, 1978, p.22-
23.
32
dade”23 correndo-se um amplo risco de ter produtos piratea-
dos, adulterados e para demonstrar que não são um plágio
original batizam-no com um nome diferente de qualquer coi-
sa que alguém [supostamente] desconheça. A originalidade
tem seu custo que é bastante alto para um mundo que mede
seu valor pelo relógio.
23
LEVI-SATRUSS, Claude. Mito e Significado. São Paulo: Brasiliense, 1978, p.22-
23.
24
Ibid.
33
“Esta é uma crença pessoal, e não tenho provas claras que
assegurem o funcionamento desta dialética. Mas, na reali-
dade, não consigo entender como é que a Humanidade po-
derá viver sem algum tipo de diversidade interna [orgâ-
nica].”25
25
LEVI-SATRUSS, Claude. Mito e Significado. São Paulo: Brasiliense, 1978, p.22-
23.
34
caminham para a igualdade, para uma situação a-histórica
[aliás, condição inevitável para a perda de identidade]. E
esta definhação do papel e da condição humana caracte-
riza-se, in strictu, pelo discurso vazio de que não pode haver
fronteiras entre os homens. Esquecem-se de que são estas
fronteiras que permitem ao ser humano auto-analisar-se e
na tentativa de superá-las, acaba por descobrir que interme-
diando todo este [complexo] processo está o outro que pos-
sui uma identidade; é um ser [...] dotado de razão e vontade
próprias [que devem ser respeitadas e preservadas].
26
Cf. VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes,
2000.
36
agressões a direitos humanos, ofensas ao meio ambiente e
qualquer outra transgressão a valores não acontecem por-
que valores não estão presentes, mas porque as condições
objetivas em que se dá a atividade humana (institucional ou
empresarial) propiciam a oportunidade para que ocorram.
Da mesma forma estes fatos nos mostram que o homem
não tem se tornado [ou melhor, não tem sido educado para
ser] um ser autônomo, senhor de seu tempo e de seu eu,
afinal, a ocasião faz o furto..., o ladrão já estava pronto...
27
EINSTEIN, Albert. Escritos da Maturidade. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1994, p.74.
28
Cf. MAQUIAVEL, Nicolas. O Príncipe. São Paulo; Martin Claret, 2006.
40
Mas, como bem afirmou Nietzsche (1844 - 1900) todo ho-
mem esconde dentro de si uma criança que deseja brincar e
ao cientista é dado esta liberdade de brincar com suas fór-
mulas e reagentes químicos, tal qual um poeta brinca com
as palavras e ao fim tem-se ora doces e românticas palavras
ora outras ácidas e ferinas. Como tais serão utilizadas vai
depender da criatividade e do desejo de cada um que dela
tiver posse, o mesmo dando-se com os instrumentos bélicos
criados pela engenharia.
29
Cf. LE BON, Gustave. As Opiniões e as Crenças. São Paulo: Ícone, 2002.
41
um ser humano? Na verdade, nada! Mas o que o impede é o
seu senso religioso arraigado no seu senso cultural, o medo
de que Deus o castigue, nada mais. Pura superstição. E tal
foi imputada ao seu espírito pela convivência social, não é
um sentimento nato, assim como a própria ética.
30
QUEIROZ, Eça de. O Mandarim. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
42
Em resposta Freud concebe a formação da mente humana
semelhante à formação geológica da Terra: uma camada de
detritos veio sobrepondo ao que já existia e assim foi for-
mando a camada terrestre fértil e útil ao ser humano; porém,
as camadas primitivas sobreviveram e mantém-se em fervi-
lhante pressão, ocorrendo vez ou outra uma erupção destes
elementos que encontram-se suprimidos.31
31
Cf. EINSTEIN, Albert. ¿Po que La Guerra? Correspondencia Entre Einstein Y
Freud. Potsdam, 30 de Julio de1932.
32
Cf. SOUZA, Sérgio Rodrigues de. A Ética e Suas Implicações na Formação da
Condição Humana. Mutum: Expresso Gráfica, 2012.
43
intensidade a maldade desta época” porque “a guerra, em
que não queríamos acreditar, estalou e trouxe consigo a
decepção. Não só é mais sangrenta e mais mortífera do que
todas as guerras passadas, por causa do aperfeiçoamento
das armas de ataque e de defesa, mas, pelo menos, tão
cruel, exasperada e brutal como qualquer uma delas.”33
33
FREUD, Sigmund (1915). Escritos Sobre a Guerra e a Morte. In: Edição Stan-
dard das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 2006, pp.05-
8.
34
Ibid., p.09.
44
rém, em caminho contrário tem-se mortes, violência, estu-
pros em massa, alejados, mutilados, neuroses e toda a sorte
de miséria que a guerra sangrenta consegue deixar como
herança para uma nação, antes pacífica e bem estruturada,
psicologicamente.
35
FREUD, Sigmund (1915). Escritos Sobre a Guerra e a Morte. In: Edição Stan-
dard das Obras Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 2006, p.15-
16.
45
elevados de aprimoramento cultural termina por confirmar as
palavras de Gramsci de que o ser humano possui tão so-
mente uma fina camada de verniz sobre sua pele que, mal
arranhada, já mostra a pele do lobo.36
36
RUIZ, Erasmo Miessa. Freud no Divã do Cárcere – Gramsci Analisa a Psicanáli-
se. Campinas: Editora Autores Associados, 1998.
46
e conflitos. Não foi diferente com o Japão. Demonstrou não
somente a eles, mas ao resto do mundo quão poderosa era
sua força e, paradoxalmente, quão pequena sua ética quan-
do seus interesses falam mais alto.
Com tal atitude fez o mundo todo prostrar a seus pés e im-
pôs uma diplomacia de cima para baixo que até mesmo ho-
je, com a ajuda de Hollywood, faz as pessoas do mundo
temerem deixá-los irados. Com isto garantiram um poderio
hegemônico que somente foi abalado com os ataques de 11
de Setembro ao World Trade Center.
37
QUEIROZ, Eça de. O Crime do Padre Amaro. São Paulo: Escala, 2007, p.359-
360.
49
ando professores preconceituosos contra os avanços cientí-
ficos eruditos e péssimos formadores de novas mentes. No
máximo, criam Pégasus para viverem, eternamente, atrela-
dos ao arado da ignorância.
38
QUEIROZ, Eça de. O Crime do Padre Amaro. São Paulo: Escala, 2007, p.359-
360.
50
cognitivo infantil então o valor está na ignorância e no re-
sultado de sua contínua prática: a obediência cega.
39
QUEIROZ, Eça de. O Crime do Padre Amaro. São Paulo: Escala, 2007, p.359-
360.
40
QUEIROZ, Eça de. O Crime do Padre Amaro. São Paulo: Escala, 2007, p.359-
360.
51
capaz de ampliar os horizontes deste. Torna-se parte de um
processo mecânico, uma função social que permite o in-
gresso ao mercado formal de trabalho e de consumo, nada
mais.
52
Quando é aceitável que os líderes usem os seus poderes
para cruzar a linha invisível que os pode transformar em
déspotas sobre os seus companheiros? A resposta é: “Nun-
ca!” porque a coisa mais plausível é que “é parte do amor o
conjunto de atitudes que denominamos civilidade ou educa-
ção: se gostamos de morar onde moramos (ou sim-
plesmente não temos outro aonde ir), não vamos brigar com
os vizinhos; vamos ao contrário, tentar ser amáveis com
eles. A mesma coisa no trânsito. Se gostamos de chegar
vivos em casa, tentaremos ser amáveis com os demais mo-
toristas e não arriscar acidentes imprevisíveis.”41
41
IZQUIERDO, Ivan. Córtex Cerebral, Amor e Equilíbrio. [Apostila ofertada pela
professora Luiza Helena Pio Caselli durante o curso de Pós-graduação em Psico-
pedagogia, Supervisão e Orientação Escolar, em Mutum – MG], 2007.
53
Um discípulo de Sócrates, Glauco, diz que ao dar a ambos
[ao homem de bem e ao iníquo] poderes infinitos “surpreen-
deremos o homem de bem tomando o mesmo caminho que
o iníquo, levado pelo desejo de ter sempre mais, desejo que
toda natureza persegue como um bem, mas que a lei su-
jeita, à força, ao respeito e à igualdade. O melhor meio de
lhes dar o poder de que falo é lhes emprestar o privilégio
que, dizem, Giges, o antepassado do Rei da Lídia, possuiu
outrora. Giges era um pastor a serviço do rei que reinava
então na Lídia. (...) tendo-se reunido os pastores como de
costume para fazer ao rei o seu relatório mensal sobre o
estado dos rebanhos, Giges veio à assembléia, trazendo no
dedo o seu anel. Tendo tomado o lugar entre os pastores,
girou, por acaso, o anel de tal modo que a pedra ficou do
lado de dentro de sua mão e, imediatamente, ele se tornou
invisível para os seus vizinhos, e falava-se dele como se
tivesse partido, o que o encheu de espanto. Girando de no-
vo o seu anel, virou a pedra para fora e imediatamente tor-
nou a ficar visível. Atônito com o efeito, ele repetiu a ex-
periência para ver se o anel realmente tinha esse poder, e
constatou que, virando a pedra para dentro, tornava-se invi-
sível; para fora, visível. Tendo essa certeza, fez-se incluir
entre os pastores que seriam enviados até o rei como repre-
sentantes. Foi ao palácio, seqüestrou a rainha e atacou e
matou o rei; em seguida, apoderou-se do trono. Suponha-
mos, agora, dois anéis como esse; coloquemos um no dedo
do homem justo e outro no do injusto. Segundo o que tudo
indica, não encontraremos em nenhum dos dois uma força
de caráter suficientemente forte para permanecerem fiéis à
justiça e resistirem à tentação de se apoderar do bem que
quisessem, já que poderiam, impunemente, pegar no mer-
cado o que quisessem, e fazer o que bem entendessem em
qualquer lugar, como se fossem deuses entre os homens,
pois não seriam punidos por nada que viessem a fazer.
54
Penso que, quanto a isso, nada distinguiria o homem justo
do injusto, e os dois tenderiam para o mesmo fim, e poderí-
amos ver nisso uma grande prova de que não se é justo por
escolha, mas por imposição, e não é a justiça como um bem
individual, pois sempre que julgamos poder ser injustos, não
o deixamos de ser.Todos os homens, com efeito, crêem que
a injustiça lhes é muito mais vantajosa individualmente do
que a justiça, e têm razão para acreditar nisso, se nos refe-
rimos àquele que é partidário da doutrina que exponho. De
fato, se um homem que tivesse tal poder não consentisse
nunca em praticar uma injustiça e em apoderar-se de um
bem de outrem, seria considerado por aqueles que estives-
sem a par do segredo como o mais infeliz e o mais insen-
sato [louco] dos homens. Nem por isso deixariam de elogiar,
em público, a sua virtude, mas como intento de se engana-
rem mutuamente, no temor de sofrerem, eles mesmos, al-
guma injustiça.”42 [grifo nosso]
42
PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 1997, p.42-43.
55
de presépio, pessoa que concorda com tudo o que os ou-
tros, uma pessoa sem personalidade, sem opinião própria.
Fica-se ali, parado, sem nem ao menos saber o motivo do
porquê de estar ali. A experiência de Stanley Milgram pro-
vou que, quando sob o comando de um líder antiético o ser
humano é capaz de coisas que jamais faria em condições
de não-pressão. Mas existe o outro lado da experiência, o
da passividade incondicional, o não questionamento, sim-
plesmente porque um superior ordenou.
43
MILGRAM, Stanley. Los peligros de la obediencia, 1974. [S.n.t.]
44
MILGRAM, Stanley. Obediência à Autoridade. São Paulo: Francisco Alves, 1983.
56
quaisquer que os punissem; ali, Deus existia, porém, ele se
imiscuiu de sua autoridade; ou se quiser melhor situar no
tempo, ele a delegou para seus anjos. Estes cientistas, sim-
plesmente ‘obedeceram’ a seus instintos.
45
Cf. O Experimento da Prisão de Stanford, 1971.
57
insanidade. A dúvida se deus-pai o amasse ainda pertur-
bava o homem agora liberto do seu paraíso. A solução en-
contrada pela Igreja na Idade Média para acalmar os ânimos
foi a de dar qualidades sobre-humanas a um Deus e entre
elas foi o da ética e do compromisso inalienável de estar
sempre à disposição da vontade volúvel dos humores hu-
manos. Houve aqui uma inversão dos valores pregados pe-
las religiões anteriores ao cristianismo romano. Não está
escrito em nenhum auto que “fidelidade tenha qualquer liga-
ção “direta” com ética”.
60
II
UMA VISÃO ANTROPOLÓGICA DA ÉTICA
46
KATZENSTEIN, Úrsula. A Origem do Livro da idade da pedra ao advento da
impressão tipográfica no Ocidente. São Paulo: Hucitec, 1986, p.42-43.
61
Imbuído desta ambição “a invenção da ferramenta foi a pri-
meira realização intelectual do homem. Colocou-lhe às
mãos dispositivos ativos e agressivos para enfrentar os de-
safios da vida cotidiana. Ferramenta, técnica e linguagem
foram o ‘equipamento espiritual’ com que partiu para con-
quistar o mundo. As ferramentas concebidas por seu cére-
bro, capacitaram-no a dominar e transformar seu ambiente
natural, e se tornaram um requisito básico para todo desen-
volvimento cultural futuro. Inclusive seu desejo insano de
dominação!”47
47
KATZENSTEIN, Úrsula. A Origem do Livro da idade da pedra ao advento da
impressão tipográfica no Ocidente. São Paulo: Hucitec, 1986, p.42-43.
62
“Cheio de dúvidas continuo’’, reflete Adão;
“Se eu me arrependesse agora do pecado
Por mim feito e ocasionado, e tanto mais me alegrasse,
Quão maior não seria o bem que disto me viria.”48
48
MILTON, J. Paraíso Perdido. São Paulo: Martin Claret, 2005.
49
Cf. BETELHEIM, Bruno. A Psicanálise dos Contos de Fadas. 21ª ed. São Paulo:
Paz e Terra, 2007.
63
Quando um membro do clã era abandonado isto significava
sua pena de morte. Assim era o que se fazia [mais comu-
mente] com as crianças que eram destinadas a servirem de
comida. Abandonavam-nas em algum ponto remoto da selva
para que fossem caçadas e mortas com o intuito de saciar a
fome das tribos vizinhas e estas, por sua vez faziam o mes-
mo com suas meninas. As famílias, mesmo com suas condi-
ções de parentalidade obedeciam a tais preceitos sem ques-
tionar porque de tal costume dependia a sobrevivência de
todo o clã.
50
COELHO, Paulo. O Diário de Um Mago. São Paulo: Gold Editora Ltda., 2006.
64
família e a desobediência de sua esposa, como causa de tê-
la transformado em uma estátua.
➢ A imposta; e,
➢ A natural.
E, um povo sem memória não pode ter ética. Uma vez que
esta se baseia em valores históricos, culturais e sociais
acumulados e desenvolvidos ao longo de décadas e às ve-
zes milênios; cada vez mais se assiste a sociedade se la-
gartear feliz como se estivesse possuída pelo nada... É co-
mo se ela se deslindasse de suas obrigações com a exis-
tência, com o mundo externo, onde existe o outro. Negando
a vida, nega-se a dor. Negando-se à causa nega-se o efei-
to... E isto assusta, porque expressa a idéia de que “o ho-
mem prefere ainda querer o nada antes que nada querer!”51
51
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. A Genealogia da Moral. São Paulo: Editora
Escala, 2007, p.154.
66
Aldous Huxley, em 1932, não possuem ética porque suas
histórias de vida são meras lendas contadas indefinida-
mente por uma vitrola; não são nada mais que pessoas
condenadas a excessos sem fim, tanto consumistas quanto
libertinos. A lei é se promiscuir e se, em 1984, de Orwel,
escrito em 1949, a felicidade é controlada pelo Estado, em
Admirável Mundo Novo, a tristeza é que é. No primeiro o
amor é proibido, no segundo ele é banalizado. Em ambos os
Estados a ética faz-se inexiste.
52
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006. Livro Primeiro;
af. 9: Conceito da Moralidade dos Costumes, p.131.
67
que ocorrem. Sem a interpretação fina dos sentimentos,
coisa não tão fácil de conseguir, porque estes traem o senso
humano na maioria das vezes, tudo não passa de elementos
fluidos e voláteis. Aliás, esta tem sido a conquista dos hu-
manos nos últimos tempos, vivendo à margem do entendi-
mento científico preferindo crer que tudo que é mostrado
pela única janela aberta ao público: A TV constitui a verdade
suprema, absoluta e indiscutível.
54
RAIMON, Eric. O Mito do Homem Assassino. São Paulo: Edusp, 2006.
69
gam por motivos fúteis, o que provoca a idéia de que todas
as pessoas que vão aos estádios são vândalos e criaturas
insanas sedentas de sangue.
55
RAIMON, Eric. O Mito do Homem Assassino. São Paulo: Edusp, 2006.
70
não compete-lhe, delegando a terceiros como o Estado, por
exemplo, a função de vigiar e punir arruaceiros e ainda clas-
sifica dois brigões vadios que desconhece de delinqüentes.
56
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.119.
71
do terror existe meios de justificar sua inércia e sua cruel-
dade. Tudo em nome da segurança civil. Porém, o que es-
conde-se sob esta pretensa máscara de altruísmo é um de-
sejo de obter vantagens em tudo às expensas do bem pú-
blico.
57
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.119.
72
melhor, mais conhecimento dos fatos particulares do que
conhecimento dos universais.”58
58
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.119.
59
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.119.
73
mente é o comando da cidade onde além da coragem há a
necessidade da disposição para compreender o que ne-
nhum outro seria capaz de fazê-lo mesmo em meio a situa-
ções de alta complexidade e riscos. O jovem, por sua pró-
pria natureza, é mais voltado ao impulso, ao calor da emo-
ção provocada pela ação direta e a batalha aberta não sen-
do costume desta idade a reflexão mais profunda acerca
dos elementos que compõem todo o conjunto de coisas que,
inevitavelmente, levam a concretização dos fatos, das situa-
ções e dos significados em si. Não se pode culpá-los por
isto, uma vez que a estrutura psicológica obedece aos pro-
cessos de maturação da estrutura biológica humana não
dando espaço ao desenvolvimento pleno da razão se não no
tempo estipulado para a realização de complexíssimas elu-
cubrações mentais, a grande maioria delas ignoradas pelo
próprio indivíduo. Neste campo ter-se-ia que a gestão do
Estado exige que tenha firmeza de caráter, estratégia ao
agir, ao falar, ao ouvir, atuando como um cientista nato na
análise e interpretação dos fatos coletados e observados,
bem como resistência, persistência, integridade e uma preo-
cupação com as outras pessoas. Isto requer paciência e
dedicação, coisas raras no espírito de um jovem. Portanto,
“não correspondendo ao conhecimento científico dos univer-
sais, o discernimento estaria atado ao fato particular – para
o qual a argúcia da percepção seria um predicado impres-
cindível. Capacidade de conjeturar, cálculo, rapidez de ra-
ciocínio para o estabelecimento de inferências pertinentes,
e, sobretudo, correção na decisão”60 considerando que em
nenhuma hipótese um líder está impedido de cometer falhas
ou de agir de acordo com a situação e descobrir que equi-
vocou em sua tomada de decisão. O que não pode haver é
deixar ser levado pela soberba e não agir para corrigir as
60
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2006, p.119.
74
incongruências nascidas da sua intrépida capacidade para
enfrentar as situações adversas. Chama a atenção para isto
o fato de que Aristóteles deixava bastante explícito que, em
matéria de ética, há de lembrar que existem formas variadas
de errar; uma só de acertar da mesma forma que “só existe
um método para inventar: é imitar. Só há um método para
bem pensar: é continuar algum pensamento antigo e expe-
rimentado. Essa idéia é seu próprio exemplo, circunstância
favorável à reflexão. Porque parece inicialmente muito co-
mum e bastante fraca. Mas também só é totalmente familiar
a quem tem o costume de olhar muitas vezes atrás de si.”61
61
ALAIN (Émile Chartier). Reflexões sobre a educação. São Paulo: Saraiva, 1978,
p.133.
75
recer enfim o mundo insensível das pedras, dos metais e
dos ventos.”62
62
ALAIN (Émile Chartier). Reflexões sobre a educação. São Paulo: Saraiva, 1978,
p.133.
76
pelo princípio da realidade, em seu inconsciente, sua alma
anseia mesmo é pelo princípio do prazer.
63
CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo: Ática, 1999, p.340.
64
CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo: Ática, 1999, p.340.
77
ser, o que deixa muitas dúvidas, porém, continuam a existir.
Continuam a serem praticados e ensinados às novas gera-
ções para serem utilizados como ferramentas de domina-
ção, exclusão e ostracismo. “Dessa maneira, valores e de-
veres parecem existir por si e em si mesmos, parecem ser
naturais e intemporais, fatos ou dados com os quais nos
relacionamos desde nosso nascimento: somos recompen-
sados quando os seguimos, punidos quando os transgredi-
mos.”65
65
CHAUÍ, Marilena de Souza. Filosofia. São Paulo: Ática, 1999, p.340.
78
todos, sem excessão. Logo, para atingir tal nível de
aceitação geral deve ser flexível ao ponto de que todos a
obedeçam e ser, suficientemente, rígida ao ponto de que
não permita e nem fomente a libertinagem. E alcançar este
equilibrio é o grande desafio que propõe-se às escolas, à
educação e à cultura em geral.
III
PRECEITOS E REFLEXÕES ACERCA DO
BINÔMIO EDUCAÇÃO E ÉTICA
79
cesso pedagógico, incluindo entre estas as que se referem
aos aspectos organizacionais e administrativos.
80
mostram a quem na atualidade pretender adentrar às inves-
tigações éticas.
66
Wilde, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. São Paulo: Martin Claret, 2004.
81
soluto de suas vidas. E este é o preço pago pela inércia dei-
xando uma sutil impressão de que “a coragem desapareceu
da nossa raça. Ou talvez nunca a tivéssemos tido. O temor
da sociedade, que é a base da moral, o temor de Deus, que
é o segredo da religião - eis as duas coisas que nos gover-
nam. E, contudo... (...) se um homem devesse viver a sua
vida em toda a plenitude, dar forma a todos os sentimentos,
expressão a todos os pensamentos, realidade a todos os
sonhos, creio que o mundo ganharia um novo impulso de
alegria que nos levaria a esquecer todos os males do medi-
evalismo e a regressar ao ideal helênico. Talvez mesmo a
algo mais refinado e mais rico que o ideal helênico.”67
67
Wilde, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. São Paulo: Martin Claret, 2004.
82
vive tragicamente na auto-rejeição que frustra as nossas
vidas. Somos punidos pelas nossas rejeições.”68
68
Wilde, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. São Paulo: Martin Claret, 2004.
83
ção daquilo que se é tem sido o muro das lamentações do
homem moderno.
69
Wilde, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. São Paulo: Martin Claret, 2004.
84
o que a si mesma proíbe, e de desejo por tudo o que as su-
as leis monstruosas converteram em monstruosidade e ile-
galidade. Diz-se que as grandes realizações deste mundo
ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e só aí, que
ocorrem os grandes erros do mundo.”70
70
Wilde, Oscar. O Retrato de Dorian Gray. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.25-
27.
85
Sem conflitos não há avanços em qualquer campo. Por este
motivo que procura-se educar os humanos. A educação visa
a formação do homem, ou seja, trabalhá-lo de dentro para
fora, construindo um ser que será orgulho para os pais e
para o Estado. Na Antiguidade, a palavra educação queria
dizer disciplina, logo ser educado equivaleria a ter postura,
ter equilíbrio emocional, ter domínio sobre as forças ctônicas
da alma, sobre os dáimons. Hércules, depois de adulto teve
a oportunidade de fazer a sua escolha sobre qual caminho
seguir. Na sua adolescência após matar seu professor de
lira, como se encontrava sob a tutela de seu pai, este o en-
viou para o campo, a fim de ser educado pelo Centauro Quí-
ron. E porque por um ser que era metade animal metade
homem? Exatamente para que aprendesse a dominar am-
bas as partes que coexistem no ser. Porém, assim como o
homem está acima do cavalo, a razão deve estar acima das
emoções e dos instintos selvagens.
71
No original: El hombre es la única criatura que ha de ser educada. Entendiendo
por educación los cuidados (sustento, manutención), la disciplina y la instrucción,
juntamente con la educación. Según esto, el hombre es niño pequeño, educando y
estudiante. (KANT, I. Pedagogía. 1803, p.01)
86
formado distintas culturas todas com costumes muito diver-
sos entre si e a comunicação entre os povos tanto foi bom
por outro lado como gerou este tipo de entendimento, uma
troca simbólica de valores bens tangíveis e intangíveis.
72
Ibid.
73
No original: La disciplina convierte la animalidad en humanidad. Un animal lo es
ya todo por su instinto; una razón extraña le ha provisto de todo. Pero el hombre
necesita una razón propia; no tiene ningún instinto, y ha de construirse él mismo el
plan de su conducta. Pero como no está en disposición de hacérselo inmediata-
mente, sino que viene inculto al mundo, se lo tienen que construir los demás.
(KANT, I. Pedagogía. 1803, p.01)
87
se processo de construção social o indivíduo vai formando,
moldando e consolidando seu caráter.
74
SHAKESPEARE, William. Henry VI. London: The Folio Society, 1967, p.76.
88
guns e assombraram outros nos fins do século XX o mesmo
ocorreu com os povos da era vitoriana.
75
CHAPPELL, Warren. A Short History of the Printed Word. Boston: Nonparell,
1970, p.139.
89
absurdas e estapafúrdias que pode-se [sequer] imaginar. E,
por meios de atitudes, extremamente, arbitrárias, covardes,
sub-repticiamente colocadas em ação, tendo como suporte
legal (sic) a preservação e manutenção da ética e da moral
muitos intelectuais tiveram seus direitos legalmente adquiri-
dos cassados e muitas vezes suas vidas ceifadas pelo po-
der hegemônico. Gramsci foi condenado à prisão. E quem
ficou célebre foi a frase do Juiz que o condenou: “temos que
parar este cérebro por pelo menos vinte anos!” Durante o
auto de fé em Berlim as obras de Freud foram queimadas
em Praça pública. O Emílio de Rousseau foi condenado à
fogueira e este à prisão [“Em 9 de julho de 1762, uma sen-
tença do Parlamento de Paris condenava o Emílio a ser ras-
gado e queimado e ordenava: “O chamado J.-J. Rousseau...
será detido e levado às prisões da portaria do Palácio”]. Só-
crates foi condenado à morte por instruir os jovens de Ate-
nas contra as doutrinas da religião municipal e a não respei-
tar os seus preceitos. Na Holanda, Baruch de Spinoza teve
que fugir por causa de seu livro Tratado Teológico-Político.
Na Inglaterra, logo após sua morte a casa e todos os livros
de John Milton foram queimados, em protesto às suas idéias
liberais [a intenção do governo britânico era fazer com que
suas idéias liberais se extinguissem junto com ele]; na Itália,
a obra O Príncipe, de Maquiavel seria impedido de ser pu-
blicada naquele país e de ser lida, isto porque ele faz de
Cesare Borja, o filho do papa Alexandre VI, seu saco de
pancadas. E a obra A Monarquia, de Dante Alighieri, seria
proibida de ser lida até 1908 (início do Século XX).
76
MAJOR, René; TALAGRAND, Chantal. Freud. Porto Alegre: L&PM, 2007, p.10.
91
ser verdade ou mesmo suas inquietudes acerca do mundo
que o cerca e das coisas à sua volta, algo como a essência
mais pura do que o incomoda. Em 24 de agosto de 1644, o
poeta inglês John Milton escreveu que “é quase tão crimi-
noso destruir um bom livro quanto matar um homem.” Se-
gundo ele “aquele que mata um homem mata uma criatura
que raciocina e que é a imagem de Deus; mas aquele que
destrói um livro mata a própria razão, mata a imagem de
Deus, por assim dizer. Muitos homens não passam de um
fardo para a Terra, mas um bom livro é o sangue vital, pre-
cioso de um espírito de mestre, embalsamado e guardado
propositadamente como um tesouro para uma vida além da
vida.”77
77
THOMAS & THOMAS, 1952. In: MILTON, John. Paraíso Perdido. São Paulo:
Martin Claret, 2005.
92
obviamente!] e ainda se criou a Universidade Departamen-
tista com a finalidade de evitar o contato mais próximo entre
os estudantes e a formação de vínculos. Criou-se, ainda, a
ala da direita e da esquerda, nos centros de ensino. A ala da
direita era formada pelos professores e alunos dos cursos
de Ciências Exatas e a ala da esquerda pelos professores e
alunos das áreas de Ciências Humanas. Sem contar na on-
da de cassações de direitos políticos, delações fraudulentas,
perseguições, exílios, prisões, torturas e extermínios em
massa de estudantes e ‘intelectuais’ que assolou o país, na
década de 1970, após a implantação do Ato Institucional
nº.5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968.
78
D´ARAÚJO, Maria Celina. O ai-5. São Paulo/Rio de Janeiro: FGV - centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, 2015, p.01.
93
dia qualquer do mais incerto futuro, permitir brotar o germe
da desordem. Os ditadores e seu séquito de seguidores são
tão esquizofrênicos e paranóicos que tudo que for contra
seus ideais vêem como ameaça iminente ao seu comando.
Sofrem de uma doença terrível que tem assolado a América
Latina [quase] inteira nos últimos anos que é a psicose mes-
siânica. Líderes que dizem-se escolhidos para salvar o povo
da opressão e não medem esforços ou meios para atingir
seus objetivos agindo mesmo com mais opressão do que
seus antecessores com a finalidade de atingir seus ideais.
São, radicalmente, contra o diálogo aberto, sempre que fa-
zem uma pergunta de retórica já possuem uma resposta
definitiva e única. Em nome do bem-estar da população des-
trói tudo o que foi conquistado a duras penas por meio da
razão social. Suas armas de terror são utilizadas tendo co-
mo bandeiras a justiça social, a manutenção da ordem e da
moral, a promoção da justiça e da paz. Utilizam termos no-
bres a fim de justificar atos de total injustiça contra inocentes
e, em especial, contra os potenciais adversários.
79
RAMOS-DE-OLIVEIRA, N. Reflexões Sobre a Educação Danificada. In: A Edu-
cação Danificada: Contribuições à teoria crítica da educação/ organizadores _
Antônio Álvaro Soares Zuin, Bruno Pucci, Newton Ramos-de-Oliveira. Petrópolis,
Rio de Janeiro: Vozes, São Carlos, São Paulo: Universidade Federal de São Car-
los, 1997, p.31
95
cita sentimentos hostis entre a classe dominante [que nunca
se permite ver este processo com bons olhos] e, muitas das
vezes até mesmo por parte do próprio sujeito.
80
Cf. PLATÃO. Mênon. São Paulo: Edipro, 2006.
96
Adimanto, outro interlocutor diz a Sócrates que “ninguém
seria capaz de opor-se aos teus argumentos. Mas vê o que
acontece, via de regra, às pessoas que conversam contigo.
Imaginam que, por não terem experiência na arte de interro-
gar e responder, deixaram-se desorientar pouco a pouco em
cada questão, e esses pequenos desvios, acumulando-se,
surgem no final da discussão sob a forma de um grande
erro, totalmente contrário ao que se tinha decidido inicial-
mente.”81
81
PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 2000.
97
confrontar aqueles que possuem e que consideram-nos co-
mo fatos verdadeiros, entendendo que “a educação não é o
que alguns proclamam que é, porquanto pretendem introdu-
zi-la na alma onde ela não está, como quem tentasse dar
vista a olhos cegos. A educação é, pois, a arte que se pro-
põe este objetivo, a conversão da alma, e que procura os
meios mais fáceis e mais eficazes de o conseguir. Não con-
siste em dar visão ao órgão da alma, visto que já a tem;
mas, como ele está mal Orientado e não olha para onde
deveria, ela esforça-se por educá-lo na boa direção.”82
82
Sócrates citado por PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 2000,
p.302.
83
PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 2000.
98
Adimanto continua: “Falo isto tendo em conta a discussão
presente: com efeito, poderíamos agora dizer-te que não
temos nada a opor a cada um dos teus argumentos, mas se
percebe perfeitamente que aqueles que se consagram à
filosofia e que, depois de a terem estudado na juventude,
para se instruírem, não a abandonam, antes ficam presos a
ela, se tomam, em grande número, personagens extrava-
gantes, para não dizer perversas, ao passo que os que pa-
recem os melhores, embora viciados por esse estudo que tu
exaltas, são inúteis às cidades.”84
84
PLATÃO. A República. São Paulo: Nova Cultural, 2000, 257-258.
99
sem talentos; enfim, esta idéia acaba por se tornar uma ode,
um convite à vida... assim como faz o homem de Assim Fa-
lou Zaratustra: “Eis a vida! Vamos à vida!”
102
coisas que pode fitar e não acreditará que estas são real-
mente mais distintas do que as que se lhe mostram?
104
Sócrates - E se tiver de entrar de nova em competição com
os prisioneiros que não se libertaram de suas correntes,
para julgar essas sombras, estando ainda sua vista confusa
e antes que os seus olhos se tenham recomposto, pois habi-
tuar-se à escuridão exigirá um tempo bastante longo, não
fará que os outros se riam à sua custa e digam que, tendo
ido lá acima, voltou com a vista estragada, pelo que não
vale a pena tentar subir até lá? E se a alguém tentar libertar
e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, se pu-
desse fazê-lo?
105
Sócrates - Pois bem! Compartilha-a também neste ponto e
não te admires se aqueles que se elevaram a tais alturas
desistem de se ocupar das coisas humanas e as suas almas
aspiram sem cessar a instalar-se nas alturas. Isto é muito
natural, se a nossa alegoria for exata.
Glauco - É.
85
PLATÃO. A República. Nova Cultural, 1997, p.164-167.
107
escuridão colocada pela sociedade e sustentada pelo nosso
medo de ser verdade. O homem teme confrontar o seu des-
tino e ter como recompensa o mais iminente fracasso como
resultado de sua hybris, porque é isto o que todos dizem às
crianças desde que nascem. Porém, todos esquecem que a
garantia mais exata em nossa vida é o fracasso; o êxito é
que é produto do esforço advindo da tentativa de negação
de uma verdade incontestável. E é desta luta [a priori] perdi-
da que ocorrem as grandes revoluções, os grandes feitos e
as grandes realizações pessoais.
109
assim como também todas as mulheres que gostam de ho-
mens e são adúlteras, é deste tipo que provêm.”86
86
PLATÃO. O Banquete. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.22-23.
110
gem e masculinidade, porque acolhem o que lhes é seme-
lhante.”87
87
PLATÃO. O Banquete. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.22-23.
88
PLATÃO. O Banquete. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.22-23.
111
que não falasse mal das mulheres em Atenas era mal visto
pelos seus concidadãos. Mesmo amando suas esposas eles
eram, por tradição, obrigados a denegri-las.
89
PLATÃO. Apologia de Sócrates. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.17. Segunda
Parte: Sócrates é condenado e sugere a sua sentença.
112
massa se unida em prol de algo ou contra ele torna-se por
demais perigosa. Não foi o velho filósofo quem corrompeu a
juventude ateniense, estes, simplesmente buscavam um
porto aonde ancorar porque o regime municipal já não dava
mostras de poder e coesão suficientes para servir de base
para estes. Sócrates sendo um cidadão que tinha idéias
contrárias ao estilo de governo foi o escolhido para ser o
guru espiritual de uma geração sem mestre. A tradição ate-
niense já estava em decadência, portanto, não foi necessá-
rio fazer muita força para destruir um regime já condenado
ao fracasso. A perda do arcontado-rei foi um duro golpe na
religião que estava diretamente ligada ao regime político. O
resto foi obra das circunstâncias. Por fim, tem-se que ele foi
uma luz para os desolados e perdidos jovens atenienses
criando e ampliando inúmeros conceitos antes não discuti-
dos de maneira aberta. Até aquele momento todos conten-
tavam-se com o que era dito.
90
Charles Chaplin citado por GOMES, M. A Vida e a Obra de Charles Chaplin.
São Paulo: Minuano, 2007.
113
ao estado embrionário, ao estado larval, ao estágio maca-
cóide; no máximo, antropóide. Como tal regresso não é pos-
sível contenta-se em servir ao sistema como indivíduo de
boa fé tendo como pano de fundo o fato de a cultura prepa-
rar todo ser humano normal, que por azar tenha nascido
vivo, para ser uma coisa, não um indivíduo, no sentido estri-
to da palavra. Como Gramsci lembra, “já nascemos velhos
crianças. [Pois] um círculo de tradições pesa sobre nossas
costas fazendo-nos envergar sob os desígnios da cultura
dominante.”91
91
Gramsci citado por RUIZ, Erasmo Miessa. Freud No Divã Do Cárcere. Campi-
nas: Editora Autores Associados, 1998.
114
mais é que uma transmutação do medo original. Tem-se,
por fim, que o amor dos filhos aos pais é uma questão de
sobrevivência, um jogo maquiavélico a fim de manterem-se
vivos.
92
ROUSSEAU, Jean Jacques. Emile et Sophie ou os Solitários. São Paulo: Hedra,
2011, [s.p.].
115
Sempre tais ações terminam em tragédia porque aquele que
busca conhecimento incorre em hybris, sendo por isto, na
Antiguidade Clássica castigado pelos deuses; na atualidade
a pena é a exclusão social, o alijamento dos meios cultos
(sic).
93
Sampaio Dória citado por PEREIRA DA SILVA, Gastão. Enciclopédia de Psico-
logia e Psicanálise. Vol. 2: Novos aspectos da Psicanálise. Belo Horizonte: Editora
Itatiaia Ltda., 1968, p.223. 6 vol.
117
sam suas formas de maneira diferente da maioria das pes-
soas.
94
MARZAGÃO, Luis Roberto. Labirintos da Alma. Belo Horizonte: O Estado de
Minas, 22 de maio de 2006, p.06.
119
ser mantida sob o peso de ferros, armas e o medo infantil
dos subordinados.
120
sendo a última edição [de número 32] publicada em 1948,
sendo, definitivamente, abolido em 1966.
121
mar em uma rebelião de verdade. Junto com o herege ardia
seus manuscritos...
IV
OS PRECEITOS DA ÉTICA ATRAVÉS DOS
TEMPOS
124
O termo ética refere-se aos padrões de conduta moral, i.e.,
padrões de comportamentos relativos aos cidadãos. O con-
ceito de Ética não é unívoco. Resulta da cultura dos povos,
porém sabemos que nem tudo que é tradicional é moral.
Mas o que é jurídico e político pertencem ao significado do
termo ético. Isso não implica dizer que normas morais, nor-
mas de tratos sociais, normas religiosas, normas jurídicas
ou políticas não se distinguem, mas confirmam sua origem
comum.
125
“No hinduísmo o lingam (pênis) é o símbolo de Shiva. Na
Antiga Grécia, as hermai eram pilares sagrados ao deus
Hermes com uma cabeça humana e um ‘phallos’ ou pênis
ereto, que existia diante de toda casa em Atenas. Ficou fa-
moso o processo dos Hermokopidai em 415 a.C., quando
todas as ‘hermai’ amanheceram cortadas e profanadas, o
que levou à condenação do popularíssimo general Alcibía-
des. Isso mostra como o órgão masculino fazia parte do cul-
to e era reverenciado.”95
95
MORAIS, Vamberto. A Volta da Deusa - Feminismo e Religião. São Paulo:
Ibrasa, 2001, p.16.
126
imagem de Hermes consistiam numa coluna de forma qua-
drangular, adornada com um grande falo ao centro e com a
figuração da cabeça do deus, no topo. É sobre estes pilares
que um grupo de desconhecidos irá exercer a sua violência,
para espanto e escândalo dos seus contemporâneos.
127
O grande general Alcebíades foi acusado de ser o mentor
intelectual do ato de profanação pública, mas tudo não pas-
sou de um ardil político para banir um concorrente de peso
pelo poder em Atenas. Tudo, ao final, não passou de trapa-
ça política organizada pelos donos do poder para manterem-
se em seus postos.
96
Eisangelia era uma forma de acusação pública em Atenas. Estava disponível
para uso contra qualquer agente público.
97
Transcripción del término griego ασέβεια (compuesto de alfa privativa y
σέβας, sébas = cosa sagrada) que se traduce por impiedad. La asebeia, en la
Atenas de Sócrates, era un delito castigado con el destierro o con la muerte.
Muchos ilustres filósofos griegos fueron acusados de asebeia. No hay que
confundir la asebeia o impiedad con el ateísmo: éste no se refiere a la negación
(o privación) de la piedad, sino a la privación o negación de Dios (o de los dio-
ses). Pero la asebeia no es necesariamente ateísmo; el deísta puede ser impío
pero no es ateo, y el ateísmo no implica la asebeia (un ateo ontológico que
niega al Dios monoteísta puede ser piadoso con los dioses del panteón politeís-
ta). La impiedad entendida en un sentido amplio, esto es, como irreligiosidad,
caracteriza al racionalismo filosófico por ser éste incompatible con la aceptación
de verdades alcanzadas desde fuentes praeterracionales como la fe o
la revelación.
128
adas pelo Estado. Alcibíades é chamado, mas, iludindo a
escolta enviada para o trazer a Atenas, foge para Esparta.
Ainda assim, foi julgado in absentia e condenado à morte,
juntamente com os companheiros.
98
BROWN, Dan. Anjos e Demônios. São Paulo: Sextante, 2004.
129
símbolo sagrado, pois era ele quem trazia a semente sagra-
da que permitiria dar continuidade à espécie. E, muito, além
disto, há um fator de que a fertilidade na Antigüidade era
extremamente baixa. Os antigos acreditavam que adorando
determinado Deus se apossaria de suas qualidades místi-
cas. Como o phallus era o símbolo da fertilidade, cria-se que
idolatrando-o as mulheres adquiririam a sua tão sonhada
fertilidade.
99
PEREIRA DA SILVA, Gastão. Enciclopédia de Psicologia e Psicanálise. Vol. 2:
Novos aspectos da Psicanálise. Belo Horizonte: Editor Itatiaia Ltda., 1968, p.30-31,
6 vol.
130
pescoço, tal qual hoje conduzem um rosário ou um santo.
No Oriente, à porta suntuosa das mesquitas e pagodes, via-
se um imenso pênis perfumado com sagrados óleos, para o
culto dos fiéis.”100
100
PEREIRA DA SILVA, Gastão. Enciclopédia de Psicologia e Psicanálise. Vol. 2:
Novos aspectos da Psicanálise. Belo Horizonte: Editor Itatiaia Ltda., 1968, p.30-31.
6 vol.
101
PEREIRA DA SILVA, Gastão. Enciclopédia de Psicologia e Psicanálise. Vol. 2:
Novos aspectos da Psicanálise. Belo Horizonte: Editor Itatiaia Ltda., 1968, p.30-31.
6 vol.
131
Mesmo a despeito de toda a coação por parte da Igreja di-
versos cultos mantiveram-se vivos, mesmo em países de
tradição fortemente católica-judaico-cristã. Fato este é que
“no século passado ainda se celebrava, na Itália, uma festa
fálica em honra a São Cosme e Damião. Sabe-se que o lin-
gham e onahman índicos - diz um entendido - que se apro-
priam à conjunção indispensável às funções de reprodução,
repetem-se no priapo da Grécia e no falus de Roma, reve-
renciados mitos que, em seu tempo foram alvos de pompo-
sos e memoráveis festejos.”102
102
PEREIRA DA SILVA, Gastão. Enciclopédia de Psicologia e Psicanálise. Vol. 2:
Novos aspectos da Psicanálise. Belo Horizonte: Editor Itatiaia Ltda., 1968, p.30-31.
6 vol.
132
Na Antigüidade, podemos falar da ética em duas das princi-
pais cidades da Grécia: Esparta e Atenas. Em Esparta como
em Atena as crianças ficavam aos cuidados dos pais até os
sete anos. A partir daí o Estado assumia a formação do sol-
dado, em Esparta, e a formação do cidadão, em Atena.
133
Até mesmo a educação na Antigüidade, olhando de hoje
para lá era totalmente contrária aos padrões éticos atuais.
Não se admite, na atualidade, o contato físico íntimo entre
mestres e educandos, coisa que naqueles tempos se dava
de forma genésica entre os envolvidos. A pederastia mesmo
foi um destes processos; o jovem só podia ter acesso à mu-
lheres após ter sido possuído por seu mestre e este o consi-
derar apto a tal. Naquela época se acreditava que toda a
sabedoria humana só era repassada ao discípulo através do
esperma; logo, o mestre ao ejacular dentro do seu discípulo
estava a transmitir sua sabedoria a este.
103
SAFO de Lesbos. À Átis [Fragments].Safo foi uma poetisa grega que viveu
na cidade lesbian de Mitilene, ativo centro cultural no século VII a.C.Foi muito
respeitada e apreciada durante a Antiguidade, sendo considerada, por Platão,
como "a décima musa". No entanto, sua poesia, devido ao conteúdo erótico, sofreu
censura na Idade Média por parte dos monges copistas, e o que restou de sua obra
foram escassos fragmentos. Sua poesia era considerada das mais sublimes. Den-
tre os gregos que lhe foram contemporâneos e pósteros, Safo era considerada uma
dos chamados "Nove Poetas Líricos" (os outros eram: Álcman, Al-
ceu, Estesícoro, Íbico, Anacreonte, Simônides, Píndaro e Baquílides). Estrabão
escrevera que "Safo era maravilhosa, pois em todos os tempos que temos conhe-
cimento não sei de outra mulher que a ela se tenha comparado, ainda que de leve,
em matéria de talento poético."
Assim como Homero era conhecido como "o Poeta", Safo era conhecida como "a
Poetisa". Narram, ainda, os historiadores, que tendo Excetides declamado um
canto de louvor a Safo para Sólon, seu tio, este pediu que o moço o ensinasse
todo, de tanto que o agradou. Alguém então perguntou-lhe para quê queria tal
coisa, ao que o célebre jurista respondeu: "Quero aprendê-lo, e depois morrer!"
Mas nenhum epigrama foi mais próximo ao êxtase que seus versos provocavam do
que este:
135
O amor homossexual era proibido e negado na Grécia por-
que feria o princípio da reprodução. Safo era conhecida por
suas paixões ardentes com suas alunas adolescentes sendo
a que mais despertou seu ímero foi a jovem Átis para a qual
escreve o fragmento de poema acima. Ainda que a jovem
amasse sua mentora, a lei estava acima dela e condenava
com severa pena quem se entregasse ao celibato.
136
Na Idade Média, o pai foi elevado à condição de um deus,
carrasco e tudo o mais que ele quisesse aprouver sobre os
seus descendentes. É como se o deus todo poderoso habi-
tasse no céu e o pai fosse um sucedâneo dele na Terra.
Este tinha direito de matar a própria esposa em caso de
adultério. Até mesmo de beber vinho a mulher foi proibida
sob pena de morte. Aconteceu que ao ter o culto de Dioniso
introduzido em Roma, os senadores tiveram que cuidar para
que ele fosse mantido fora da alçada das mulheres roma-
nas. Segundo eles o vinho era sangue e também era aborti-
vo. Sendo sangue se a mulher bebesse sangue de outro
homem estaria cometendo adultério; sendo abortivo, era
crime porque estaria matando um filho em tempos tão difí-
ceis para uma mulher engravidar. Porém, como descobrir se
ela consumiu vinho ou não. A solução era beijá-la na boca
para saber se havia consumido o vinho ou não.
137
entre o fantástico e o real”104 destruindo as regras sociais
que regem a ordem pessoal permitindo ao indivíduo voltar a
ser indivíduo. E a ausência da postura ética encontrava-se,
na Antiguidade, bem aí, nesta negação do mundo do outro e
sacralização do ilusório e do fantástico, da libertação das
amarras do que pode ser negado como sacro. Já na
atualidade é o contrário, o indivíduo que introspecta-se é
considerado como estranho socialmente e condenado a um
ostracismo social. Dioniso teria o poder de devolver tais
indivíduos aos dias de glória da aceitação deste pelo social,
porque une o útil ao agradável, coloca-o em movimento, em
ação coletiva.
104
VERNANT, Jean-Pierre. Mito e Religião na Grécia Antiga. São Paulo: Martins
Fontes, 2009, p.77.
138
podiam comparecer perante a justiça do Estado, pois só a
família tinha o direito de julgá-las.”105
105
COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. São Paulo: Martins Fontes, 2006,
p.101.
106
COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga. São Paulo: Martins Fontes, 2006,
p.101.
139
chegavam em casa. Assim, podiam descobrir, pelo hálito, se
ela havia sucumbido à tentação de beber vinho.
107
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, 87.
141
frágil que o é na atualidade; também o eram as leis e assim
o era porque os povos estavam em constantes conflitos;
sendo assim, todo forasteiro era um inimigo em potencial,
logo, sobrevivia quem atirasse a flecha primeiro e não tendo
quem o protegesse nem uma lei que o guardasse toda a
violência imposta a ele era algo furtivo, como que aplicado a
um nada, a um animal de expiação. A humanidade teve que
passar por duas guerras de proporções assustadoras para
compreender e fazer valer o direito individual de qualquer
pessoa em qualquer parte do planeta [ao menos, no plano
teórico].
142
seu sogro havia lhe dado a melhor mulher do mundo, e ele
não quer brigar com o pai de sua esposa.”108
108
Cf. MARINS FILHO, Luiz Almeida. Socorram-me dos Meus Parentes. Harbra
Business, 2001.
143
ta bancária permitisse. Mas, Constantino estava em guerra
com um poderoso vizinho do Império e este sistema dava
muitas brigas internas e mortes por causa de mulheres. Os
que possuíam muitas não abria mão para os que não possu-
íam nenhuma, afinal, ele havia comprado-as de seus pais;
logo a solução para quem estava sem nenhuma era roubar
ou tomar à força e quem as possuía deveria, de igual forma,
defender seus pertences usando a força; a solução encon-
trada pelo Imperador foi o de abolir este sistema, inserir nos
evangelhos que a poligamia era um pecado mortal e, sujeito
a fazer arder o transgressor nas santas fogueiras da Imacu-
lada (sic) Inquisição. Com isto distribuiu mulheres para todos
os seus soldados. Foi uma verdadeira desapropriação e
distribuição de mulheres na Baixa Idade Média.
144
portugueses de diferentes condições sociais, os ricos se
casariam com as primeiras e os outros com as segundas.”109
109
Padre Manuel da Nóbrega, em carta a El Rey, datada de 6 de janeiro de 1550.
145
“as categorias ‘homem e mulher’ são transmutadas de acor-
do com as necessidades históricas do momento.”110
110
Cf. BIDEGAN, 1996, p.28 citado por TORRES, I. C. O Patrionalismo e as Mu-
lheres da Amazônia de Ontem. Manaus: UFAM, 2006, p.03.
146
A ideologia do governo foi que se mandassem mulheres
junto aos homens estes não trabalhariam, só que o tiro saiu
pela culatra duas vezes. A falta de ética ou o excesso de
crença e zelo por valores morais caóticos e infundados re-
sultam em situações como as expostas.
111
Darwin, Charles (1809 - 1882).
149
mentar a criação de ovelhas, conforme crescia a indústria
lanífera nos países baixos, e com isto, aumentar a exporta-
ção de lã. Desta forma, criou um sistema de neofeudalismo
onde os colonos tinham uma condição de vida pior que a do
escravo negro brasileiro.
112
GOMES, Morgana. A Vida e a Obra de Shakespeare. São Paulo: Minuano,
2007, p.10.
113
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 23ª ed. São Paulo: Brasili-
ense, 1975, p.21.
150
Este excedente de pessoas no nosso entendimento pode
ser considerada como descartável, logo, ao invés de matá-
los tiveram uma idéia mais brilhante: ela serviria para ser
enviada para povoar a América recém tomada, assim, resol-
vendo dois problemas domésticos. Celso Furtado continua
explanando que “essa população sobrante, que abandonava
os campos na medida em que o velho sistema de agricultura
coletiva ia sendo eliminado, e em que as terras agrícolas
eram desviadas para a criação de gado lanígero, vivia em
condições suficientemente precárias para submeter-se a um
regime de servidão por tempo limitado, com o fim de acumu-
lar um pequeno patrimônio.”114
114
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 23ª ed. São Paulo: Brasili-
ense, 1975, p.21.
115
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 23ª ed. São Paulo: Brasili-
ense, 1975, p.23.
151
por sua vida pelo fato de representar um investimento eco-
nômico por parte do seu patrão. Já o branco livre na Améri-
ca do Norte era material descartável da Europa, logo estava
entregue à sua própria miserável sorte e esquecido pelo seu
contratante e também pelos deuses. Em uma terra onde não
havia quase nada de produção alimentícia, a sorte era con-
tar com a caça e a pesca até enquanto durassem os frutos
das águas e os animais disponíveis.
116
Entenda rapto aqui como seqüestro.
117
FURTADO, Celso. Formação Econômica do Brasil. 23ª ed. São Paulo: Brasili-
ense, 1975, p.23.
152
ao apresentar sua tese de doutoramento comparando a si-
tuação de vida do negro escravo brasileiro com a do euro-
peu livre. O primeiro tinha, pelo menos mandioca com tor-
resmo para saciar sua fome. Já o europeu estava às beiras
de voltar a praticar a antropofagia, para poder sobreviver.118
118
Cf. FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 50ª Ed. São Paulo: Civilização
Brasileira, 2010.
119
BADINTER, Elisabeth. Um Amor Conquistado: O Mito do Amor Materno. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1985, p.29.
153
Todo tipo de gozo conjugal era considerado como extrava-
gância e deveria ser punido. A mulher na Grécia que fosse
acusada de adultério não poderia participar dos festejos
públicos nem adentrar os templos sagrados ou realizar ofe-
rendas e se por acaso fosse vista poderia ser agredida por
qualquer cidadão, porque estava a profanar um espaço sa-
grado. Mas todo este tipo de estultícia não estava somente
agregada à Atenas Clássica. Também, na França, o decreto
de 20 de abril de 1684 estabelecia que os filhos (de menos
de 25 anos) e as filhas (de qualquer idade) de artesãos e
trabalhadores que maltratassem os pais, ou que fossem
preguiçosos, libertinos ou corressem o risco de vir a sê-lo
(previdência que abria a porta a todas as arbitrariedades)
poderiam ser presos, os rapazes em Bicêtre [hospício mas-
culino], as mulheres na Salpêtrière [hospício feminino]. Uma
vez obtida, a prisão era definitiva. O condenado passava o
resto de sua miserável e cretina vida acorrentado pelo pé
esquerdo ao braço direito e ambos fixados ao chão em meio
a seus excrementos. Não se casar, também, significava agir
contra a ética.
154
“Nasci sem ter passado por ventre materno; meu ânimo
sempre foi a favor dos homens, à exceção do casamento;
apóio o pai. Logo, não tenho preocupação maior com uma
esposa que matou o seu marido, o guardião do lar; para que
Orestes vença, basta que os votos se dividam igualmente.”
(DEUSA PALAS ATHENÁ).
120
HOMERO. Odisseia. São Paulo: Nova Cultural, 2003, p.23.
155
Alceste, filha de Pélias, dá aos gregos uma prova cabal em
favor de sua ética “ao consentir em morrer pelo marido, em-
bora tivesse este pai e mãe, os quais ela tanto excedeu na
afeição do seu amor que os fez aparecer como estranhos ao
filho, e parentes apenas de nome.”121
121
PLATÃO. Apologia de Sócrates. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.10-11.
Primeira Parte: Sócrates apresenta a sua defesa.
156
povos inteiros manteve-se virgem, num pudor avassalador
que chegou a causar não poucas desgraças.
122
FREUD, Sigmund. [1939] Moisés e o Monoteísmo. Edição Standard das Obras
Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 2006, p.58.
157
concidadãos olimpianos, pois era a razão personificada,
logo, seu julgamento era extremamente justo e perfeito.
123
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005,
p.185.
124
Ibid.
158
ao outro o que levou Aristóteles de Estagira chegar á con-
clusão de que “o homem fez os deuses à sua imagem; tam-
bém lhes deu seus costumes”125 e, além disto seus senti-
mentos mais profundos, aqueles que tentavam esconder de
todos à sua volta.
125
ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Escala, 2007, p.15.
159
que profanarás o leito de tua mãe te aflige; mas tem havido
quem tal faça em sonhos [...].”126
126
SÓFOCLES. Édipo Rei. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.46.
160
A fim de resolver este espinhoso conflito, pregam que o
amor fala mais alto, mas mesmo tal pensamento é fruto de
tempos muito modernos porque na Antiguidade irmãos po-
diam casar-se, somente as relações entre pais e filhos que
eram, terminantemente, proibidas. Há países, como Alema-
nha, p.e., em que o incesto é punível com pena privativa da
liberdade.
161
V
DOSTOIEVSKI E A [SUA SUPOSTA]
NEGAÇÃO DE DEUS
127
DOSTOIEVSKI, Feódor Mikhailóvitch. Os Irmãos Karamázovi. Vol. 3. Rio de
janeiro: Livraria José Olympio editora, 1955. (3 vol.), p.1118-1119.
162
Deus foi criada com o fim de controlar a besta selvagem,
assassina, sanguinolenta e sedenta de êxtase que habitava
no âmago do homem primitivo, não foi a modernidade quem
deu tal polimento ao individuo atual. Crer que, da mesma
forma que as era geológicas da Terra a transformaram em
um lugar habitável permitindo que fosse possível a vida hu-
mana com menos agressividade, o espírito humano, tam-
bém vai sendo moldado é de uma ingenuidade sem medidas
porque tal como diz Antônio Gramsci os instintos são so-
mente amansados e não destruídos. Por fim, os instintos
humanos são como o magma ardente no centro da Terra:
quando explode é que demonstra sua verdadeira força bru-
ta.
128
DOSTOIEVSKI, Feódor Mikhailóvitch. Os Irmãos Karamázovi. Vol. 3. Rio de
janeiro: Livraria José Olympio editora, 1955. (3 vol.), p.1118-1119.
163
idéia de que aceitando sua condição de passageiro neste
trem chamado vida faria o homem viver com plenitude e
muito mais é esta certeza que o faz entrar numa terrível de-
pressão. Toda vez que um conhecido é ceifado sua tristeza
não encontra-se na perda em si, mas na certeza desta bre-
vidade. A máscara da ilusão é derriçada e ele encontra-se
frente ao mais terrível paradoxo de ter que viver intensa-
mente porque a vida pode acabar a qualquer instante e ao
mesmo tempo pergunta-se a si mesmo que sentido tem se
ela poderá acabar a qualquer instante. Passado e futuro
chocando-se na linha imaginária que divide o presente. Tu-
do isto é demais para um ser limitado, mas que sonha com a
possível vantagem de viver para além de si e dos outros
sem ter consciência de que esta seria a maior maldição que
estaria condenado a carregar sobre seus ombros.
129
DOSTOIEVSKI, Feódor Mikhailóvitch. Os Irmãos Karamázovi. Vol. 3. Rio de
janeiro: Livraria José Olympio editora, 1955. (3 vol.), p.1118-1119.
164
o que está ao seu alcance desde que não prejudique o seu
companheiro.
130
DOSTOIEVSKI, Feódor Mikhailóvitch. Os Irmãos Karamázovi. Vol. 3. Rio de
janeiro: Livraria José Olympio editora, 1955. (3 vol.), p.1118-1119.
165
posta e sem o véu da hipocrisia a vida tornar-se-ia o mais
árduo fardo, pesado ao extremo, chegando mesmo a tornar
impossível a vida sob sua tutela. Assim, a inexistência de
Deus e da crença na imortalidade provocaria uma condição
de vida inviável para o gênero humano.
131
SARTRE, Jean Paul. O Existencialismo é um Humanismo. São Paulo: Abril
cultural, 1973, p.15.
132
Ibid.
167
Assim como a criança pequena teme ser descoberta em
suas travessuras pelos pais e ser castigada, quando adultos
possuímos o mesmo sentimento com relação a Deus. Se
perdemos este vínculo pueril “não temos nem atrás de nós
nem, diante de nós, no domínio luminoso dos valores, justifi-
cações ou desculpas. É o que traduzirei dizendo que o ho-
mem está condenado a ser livre. Condenado porque não se
criou a si próprio, e, no entanto, livre porque, uma vez lan-
çado ao mundo, é responsável por tudo quanto fizer.”133
133
SARTRE, Jean Paul. O Existencialismo é um Humanismo. São Paulo: Abril
cultural, 1973, p.15.
168
mente dele, muitos outros filósofos desta corrente de pen-
samento exclui qualquer ação que envolva a fé em um ente
sobrenatural deixando ao homem a obrigação de viver sob
suas próprias leis. Desta forma, “o Existencialismo coloca da
maneira mais crua a questão da imanência, isto é, nada
existe acima do humano com que o homem possa contar
para ordenar o seu mundo e para orientar as suas ações”134
o que é um risco iminente de criar um louco desordenado e
uma projeção negativa de valores, porque um ser humano
entregue a si próprio é um ser sem qualquer direção e segu-
ridade em sua vivência. Esta é uma carga por demais pesa-
da que é dada a um ser humano em que fica condicionado a
responder por seus atos de maneira solitária, ou seja, “é
apenas diante de si mesmo que ele deverá construir seus
critérios e suas justificações. A liberdade não é uma forma
de Deus testar o homem, é a forma de o homem existir, é o
dado primeiro, não há critérios anteriores de como utilizá-la,
ela se faz na continuidade dos atos que a exprimem, cada
vez que o homem se projeta na construção de si mesmo.”135
134
LEOPOLDO e SILVA, F. Da ética filosófica à ética em saúde. In: COSTA, S. I.
F.; GARRAFA, V.; OSELKA, G., coord. Iniciação à bioética. Brasília: Conselho
Federal de Medicina, 1998, p.30.
135
Ibid.
169
deste tem-se que “a liberdade é um fardo, como foi o destino
para o homem antigo. É isto o que significa dizer que a exis-
tência vem antes da essência e que o homem está conde-
nado a ser livre.”136
136
LEOPOLDO e SILVA, F. Da ética filosófica à ética em saúde. In: COSTA, S. I.
F.; GARRAFA, V.; OSELKA, G., coord. Iniciação à bioética. Brasília: Conselho
Federal de Medicina, 1998, p.30.
170
ser mais exato. Deus, para ele, representava o sistema,
simbolizando as leis, os costumes, a moral, a ética. Logo,
não havendo-os não haveria opressão, o homem seria livre;
a inexistência de Deus representava a possibilidade do
mundo anárquico pregado pelos hippies.
137
NIETZSCHE, F. Para Além do Bem e do Mal. São Paulo: Martin Claret, 2006,
p.84.
172
repressão. Logo, se esta força repressora é banida ou se for
transformada em um símbolo de permissão ou de motivação
[para o Bem e/ou para o Mal, e assim voltamos à infinita
questão da liberdade individual como ‘conditio sinequa non’]
então tudo se torna valor, tudo passa a ser permitido. A se-
dução de poder realizar o que se bem quer sem nenhum
empecilho é por demais aliciadora para uma criatura que
veio dos prados, acostumado à vida nas vastas savanas.
138
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.124.
173
sua alma não repousaria em paz. “Durante o período mais
longo da humanidade, não houve nada mais terrível que
sentir-se isolado. Ser só, sentir como isolado, não obedecer,
não dominar, ser um indivíduo – não era então um prazer,
mas uma punição: estava-se condenado a ser “indivíduo”. A
liberdade de pensar era considerada como o desprazer por
excelência. Enquanto nós sentimos a lei e a ordem como
uma coação e um prejuízo, outrora se considerava o egoís-
mo como uma coisa penosa, como um verdadeiro mal. Ser
si mesmo, avaliar-se a si mesmo de acordo com suas pró-
prias medidas e pesos – era coisa que passava por incon-
veniente.”139
139
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.124.
140
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.124.
174
Isto porque o deus protetor cuidava de manter a polis segu-
ra, logo, se alguém incorresse em hybris poderia trazer a ira
do guardião contra todos. Daí que a ofensa pessoal era in-
terpretada como um agravo social. O pai quando morria era
transformado em um deus protetor do lar, tamanho era o
seu poder. E, o que sempre conferiu poder ao pai é o dis-
curso da mãe que afirma aos filhos por meio do qual ele é
‘senhor’, o soberano da família. A lei é um fantasma; ela
está contida no discurso, mas o poder está naquele que
profere o discurso, porque ele recebeu este poder de um
ente superior dotado de autoridade para tal. Logo, o filho só
se torna poderoso em seu discurso, ou melhor, este só al-
cança poder, quando se emancipa, ou seja, quando o dis-
curso do pai confere-lhe tal poder.
175
Freud também afirmou que a verdadeira Psicanálise começa
após a morte do pai. Mas, o escritor russo só quis afirmar
que um mundo sem leis, regras, tradições, sem mores dei-
xaria o homem em plena liberdade, pois poderia fazer tudo o
que quisesse e não seria massacrado pelo pior de todos os
males que assola a alma humana: a esperança.
141
SARTRE, Jean Paul. O Existencialismo é um Humanismo. São Paulo: Abril
cultural, 1973.
176
cessária, a idéia de sua existência é um elemento que cola-
bora na ordem e manutenção social. É um risco muito gran-
de querer destruir um totem criando um vácuo e não ofer-
tando nada que possa ocupar o espaço vazio deixado. “Por
outras palavras, a inexistência de Deus não mudará nada;
reencontramos as mesmas normas de honestidade, de pro-
gresso, de humanismo; é extremamente incômodo que
Deus não exista, pois, junto com ele, desaparece toda e
qualquer possibilidade de encontrar valores num céu inteli-
gível; não pode mais existir nenhum bem a priori, já que não
existe uma consciência infinita e perfeita para pensá-lo; não
está escrito em nenhum lugar que o bem existe, que deve-
mos ser honestos, que não devemos mentir, já que nos co-
locamos precisamente num plano em que só existem ho-
mens.”142
142
Cf. SARTRE, Jean Paul. O Existencialismo é um Humanismo. São Paulo: Abril
cultural, 1973.
177
em uma fera que somente conhece o ódio e a força bruta
como formas de sobrevivência. O resultado é um mundo
caótico e sem esperança.
143
Fechner, G. citado por BENEVIDES, Walter. Conversas de Médico. São Paulo:
Cátedra/MEC, 1976, p.35-36.
178
mundo que é povoado por outras pessoas e parte desta
crença é capaz de sustentá-lo na sua luta pela busca da
felicidade e do amor de seus pares, algo muito importante
[para não dizer essencial] à manutenção de sua sanidade. O
desenvolvimento humano dá-se de tal maneira que “na pri-
meira etapa o corpo se desenvolve a partir do embrião e cria
os instrumentos para a segunda; na segunda o espírito se
desenvolve a partir do embrião e cria os instrumentos para a
terceira; na terceira desenvolve a divina semente que jaz no
íntimo de todo homem e desabrocha então, mercê de pres-
sentimentos, da fé, da sensibilidade e do instinto da espécie,
num Além que para nós é sombrio, mas é claríssimo para
esses espíritos da terceira fase.”144
144
Fechner citado por BENEVIDES, Walter. Conversas de Médico. São Paulo:
Cátedra/MEC, 1976, p.35-36.
145
Ibid.
179
que continuemos a batalhar dia e noite para fazer acontecer
nosso desejo [supostamente] consciente de vida.
146
Ibid.
180
mos razões suficientes para crer que podemos cumprir essa
tarefa melhor ou tão bem quanto elas. É necessário que
tenhamos motivos para acreditar que somos capazes de
prestar os mesmos serviços e, por conseguinte, nossa pri-
meira preocupação deve ser buscar quais são os serviços
que as religiões têm prestado, de modo que possamos per-
ceber se estamos em condições de satisfazer às mesmas
necessidades, mesmo que de outra maneira”147, o que pode
ser considerado um Trabalho de Sísifo que em muito pouco
tempo passa a ser considerado enfadonho e infrutífero dada
o terrível estado de ansiedade em que vive os mortais.
147
DURKHEIM, Emilé. O Ensino da Moral na Escola Primária. In: Revista Novos
Estudos, n. 78. [s.l.], Julho de 2007, p.62-63.
148
ibid.
181
longo hiato e uma porta aberta para explorações de bufões
que apenas mudaram a máscara.
149
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005,
p.143.
150
Ibid.
183
graças a estas forças que jazem no inconsciente humano as
quais é dada uma aceitação sobrenatural que a humanidade
sobreviveu até os dias atuais.
184
VI
O SENTIDO EPISTEMOLÓGICO DA FRASE
DE NIETZSCHE: DEUS ESTÁ MORTO
151
Cf. COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005.
185
cresce num ritmo exponencial. Foi por causa deste senti-
mento incontrolável pelo próprio indivíduo que criou-se leis e
costumes tão severos. E os seres humanos da Antiguidade
os respeitavam à risca mesmo em um tempo em que os
preceitos legais não eram tão evoluídos quanto o são na
atualidade. Daí partir para a compreensão do pensamento
nietzschiano de que “se compararmos nossa maneira de
viver com aquela da humanidade durante milhares de anos,
constataremos que nós, homens de hoje, vivemos numa
época muito imoral: o poder dos costumes enfraqueceu de
uma forma espantosa e muito perigosa! - Qual é o homem
mais moral? Em primeiro lugar, aquele que cumpre a lei com
mais freqüência: por conseguinte, aquele que, semelhante
ao brâmane, em toda a parte e em cada instante conserva a
surpreendente e o sentido moral sutilizou e se elevou de tal
modo que podemos muito bem dizer que se volatilizou.”152
152
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
186
principal: a moralidade não é outra coisa (portanto, antes de
tudo, nada mais) senão a obediência aos costumes, sejam
eles quais forem; ora, os costumes são a maneira tradicional
de agir e de avaliar.”153
153
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
187
palhaços, o circo continua mostrando o mesmo espetáculo
ridículo e sem graça.
154
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
155
ibid.
188
Estas figuras passam a ser chamadas de livres pensadores
utilizando uma expressão mais fina e de um modo pejorativo
são chamados de liberais que transmutam para libertinos,
uma vez que confundem o pensamento intelectual livre com
opiniões de cunho sexual indo em confronto com a moral
libidinosa que rege a cultura judaico-cristã.
156
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
189
na, de um poder incompreensível e indefinido, de alguma
coisa que é mais que pessoal - há superstição nesse te-
mor.”157
157
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
158
ibid.
190
deveria criar costumes - coisa de seu ato - as nuvens divi-
nas e as explosões da cólera divina se acumularam sobre a
comunidade - mas ela considera, no entanto, acima de tudo,
a culpabilidade do indivíduo como culpabilidade própria dela
e suporta lei presente no espírito de tal maneira que inventa
constantemente ocasiões de obedecer a essa lei. Em segui-
da, aquele que cumpre a lei também nos casos mais difí-
ceis.”159
159
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
160
Vide Coulanges, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo: Martin Claret, 2005.
191
sendo aquela que separa a moralidade do cumprimento
mais freqüente da moralidade do cumprimento mais difí-
cil.”161
161
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
162
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
192
“Em compensação, esses moralistas que, semelhantes aos
sucessores de Sócrates, recomendam ao indivíduo o domí-
nio de si e a sobriedade, como suas vantagens mais especí-
ficas, como a chave mais pessoal de sua felicidade, esses
moralistas constituem a exceção - e se vemos as coisas de
outro modo é porque simplesmente fomos criados sob a
influência deles: todos seguem uma via nova que lhes vale a
mais severa reprovação dos representantes da moralidade
dos costumes - eles se excluem da comunidade, uma vez
que são imorais, e são, na acepção mais profunda do termo,
maus. Da mesma forma que um romano virtuoso de velha
escola considerava como mau todo cristão que “aspirava,
acima de tudo, à sua própria salvação.”163
163
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
193
Perdeu-se, em grande parte, a consistência entre o pessoal
e o social. Mesmo assim, “em toda a parte onde existe co-
munidade e, por conseguinte, moralidade dos costumes,
reina a idéia de que a punição pela violação dos costumes
recai em primeiro lugar sobre a própria comunidade: esta
pena é uma punição sobrenatural, cuja manifestação e limi-
tes são tão difíceis de captar para o espírito, que os analisa
com um medo supersticioso.”164
164
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
194
espécie de vingança sobre o indivíduo porque, por causa
dele - como uma pretensa conseqüência sua punição como
sua própria punição: “Os costumes estão relaxados”, assim
geme a alma de cada um, “uma vez que tais atos se torna-
ram possíveis.”165
165
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
195
o deicídio havia sido praticado pelos próprios fiéis. Quando
diz que haviam matado o Sol, se refere à fumaça das cha-
minés que provocava mudanças na visão do horizonte, pri-
vando o céu do brilho, sempre ofuscado pela fumaça cinzen-
ta e este se tornando, também, cada vez mais cinzento.
166
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Aurora. São Paulo: Escala, 2006, p.23-26.
167
HEIDEGGER, Martin. La Frase de Nietzsche ‘Dios Ha Muerto’. Caminos de
Bosque (Madrid), 1996, p.12.
197
quadrinhadora se orienta desde a fonte da nova instauração
de valores, sem que o mundo recupere, assim, seu valor.”168
Mas, quando não se tem nada para sentir, ver ou aspirar, tal
espaço é preenchido com o nada, com o vazio do vácuo que
preenche a vida de cada um. Um alienado olhando para o
vazio na tentativa de enxergar sabe-se lá o que. Tornou-se
nada mais que um insensato. E quem diz “Deus está morto”,
é este homem insensato, que não encontra-se preso à ra-
zão, à metafísica e sim a um sistema de valores moral que
coloca o mundo em oposições dualistas entre o “certo” e o
“errado”, a “verdade” e a “mentira”, entre outras que, inge-
nuamente, o homem até então, acredita que são marcas
inerentes à vida. O insensato, ou seja, aquele que não é
sensível, que não se abduz ante à magia da vida, que a vê
tal e qual se lhe apresenta... Só um sujeito assim seria ca-
168
HEIDEGGER, Martin. La Frase de Nietzsche ‘Dios Ha Muerto’. Caminos de
Bosque (Madrid), 1996, p.12.
169
Ibid.
198
paz de ver a destruição de tudo e não ser corrompido pela
propaganda ideológica do progresso.
170
NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Escala, 2006, p.129.
201
barulho dos coveiros que enterram Deus, significando o ba-
rulho das máquinas que ‘traziam o progresso’; mas que,
para ele, aquilo era uma marcha fúnebre, pois via o homem
de seu tempo cada vez mais se alienando.
171
NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Escala, 2006, p.190.
202
entreguem à prostituição como “opção” [única e última] de
sobrevivência; quando este pensamento o aterroriza de ver-
dade, adentrar o caminho do mal é uma alternativa [tão]
plausível que não haverá jamais remorso algum em seu ato,
pois estará fazendo isto em prol dos seus dependentes; está
lutando com o que lhe resta de forças para preservar a dig-
nidade e a integridade dos seus. Com os recursos adquiri-
dos ele agora pode até sonhar em ver seus filhos criados e
vivendo com dignidade. O medo da morte ou do perigo não
existe mais para este novo ser. E se morrer, terá morrido por
uma causa nobre... [ainda que os meios não sejam nobres,
os fins a que se destinam o justificam...]
172
HEIDEGGER, Martin. La Frase de Nietzsche ‘Dios Ha Muerto’. Caminos de
Bosque (Madrid), 1996, p.26.
205
logo necessita conhecer o todo em todas as suas partes
intrínsecas e extrínsecas. Sem o conhecimento como supor-
te ela deixaria de ser um processo de busca e passaria a ser
uma ciência dogmática, cristalizada em si mesma e sem
chances de crescimento. Cabe, ao filosofo, uma análise
completamente fria do que se faz mister e não se envolver
na projeção.
173
HEIDEGGER, Martin. La Frase de Nietzsche ‘Dios Ha Muerto’. Caminos de
Bosque (Madrid), 1996, p.06.
207
cia poderia presumir o contrário, a interiorização do homem,
a sua volta para dentro; mas não é assim que funciona. A
existência humana é uma equação de função quadrática;
logo, a inexistência não é uma interiorização em busca do
eu interior; é um processo de apatia, depressivo, o enclau-
suramento de si próprio dentro de um eu esmagado pelo
sistema.
174
RAIMON, Eric. O Mito do Homem Assassino. São Paulo: Edusp, 2006.
208
vêm [ou que lhe põem] à mão; nada lhe é proposto, é sem-
pre imposto; sobrevive recolhido a um papel insignificante
que lhe foi prescrito e segue pegando o repuxo das idéias
dos que se salvaram do naufrágio [intelectual]. O seu paraí-
so é a inconseqüência [o não se incomodar e o não agir], o
que pressupõe o não pensar.
175
Cf. PLATÃO. Apologia de Sócrates. São Paulo: Martin Claret, 2004, p.26.
176
HEIDEGGER, Martin. La Frase de Nietzsche ‘Dios Ha Muerto’. Caminos de
Bosque (Madrid), 1996, p.07.
209
re à fumaça das chaminés que provocava mudanças na vi-
são do horizonte, privando o céu do seu brilho azulado,
sempre ofuscado pela fumaça cinzenta e este se tornando,
também, cada vez mais plúmbeo. Ele não via nem o estran-
geiro nem o forasteiro sendo bem recebido e bem tratado na
cidade, até pelo contrário; as negociações sempre baseadas
na fraudulência; o meio ambiente sendo degradado a uma
velocidade absurda, o mar, o ar, o Sol, o Céu, também, e
em maior grau, a pessoa humana, sendo a cada dia mais
desprovida de sua condição de imagem e semelhança de
Deus e relegada à condição de coisa, recurso, simples res
cogitans.
177
NIETZSCHE, F. Para Além do Bem e do Mal. São Paulo: Martin Claret, 2004,
p.124.
210
ou àqueles que respeitassem as novas regras impostas co-
mo verdadeiras e inquestionáveis.
178
Ibid.
179
Ibid.
211
mem, dotado de poder para ser livre. Mas Spinoza ressalva
que a noção de livre arbítrio dos seres humanos provêm do
fato de ignorarem as forças secretas que os regem. Na mi-
serável cultura ocidental judaico-cristã, baseada em valores
medíocres, vazios de sentido, Deus é símbolo de repressão.
Logo, se esta força repressora é banida ou se for transfor-
mada em um símbolo de permissão ou de motivação [para o
Bem e/ou para o Mal, e assim voltamos à infinita questão da
liberdade individual como ‘conditio sinequa non’] então tudo
se torna valor, tudo passa a ser permitido.
180
LORENZ, Konrad. Civilização e Pecado: Os Oito Erros Capitais do Homem.
1991, p.12.
212
para os seus protegidos. “Desde certo ponto de vista, pode
dizer-se que o ‘deus otiosus’ é o primeiro exemplo da «mor-
te de Deus» freneticamente proclamada por Nietzsche. Um
Deus Criador que se distancia do culto acaba por ser es-
quecido.”181
181
En lo original: Desde cierto punto de vista, puede decirse que el deus otiosus
es el primer ejemplo de la «muerte de Dios» frenéticamente proclamada por
Nietzsche. Un Dios Creador que se aleja del culto acaba por ser olvidado. (MIR-
CEA, Eliade. Mito y Realidad. Nova York: Ediciones Harper, 1962).
182
En lo original: El olvido de Dios, como su trascendencia absoluta, es una ex-
presión plástica de su inactualidad religiosa o, lo que viene a ser lo mismo, de su
«muerte». La desaparición del Ser Supremo no se traduce por un empobrecimiento
de la vida religiosa. Por el contrario, podría decirse que las verdaderas «religiones»
aparecen después de su desaparición: los mitos más ricos y más dramáticos, los
213
Esta é uma possibilidade muito forte porque nada para o
homem existe no vácuo. Um deus não morre, no máximo é
suprimido por algum outro mais poderoso que utiliza as ve-
lhas fórmulas para cultuá-lo e no inconsciente dos fiéis con-
tinua tão vivo quanto antes. Isto é o que Martin Buber (1878
- 1965) chamou de obscurecimento de deus. E este “‘eclipse
de Deus’ de que fala Martin Buber, o afastamento e o silên-
cio de Deus que obsessiona a alguns teólogos contemporâ-
neos não são fenômenos modernos. A ‘transcendência’ do
Ser Supremo tem servido sempre de desculpa para a indife-
rença do homem a seu respeito. Mesmo quando se guarda
dele uma recordação, o fato de que Deus de tão longe justi-
fica toda classe de negligências, se não a total indiferen-
ça.”183
rituales más extravagantes, los dioses y diosas de toda especie, los Antepasados,
las máscaras y las sociedades secretas, los templos, los sacerdocios, etc., todo
esto se encuentra en las culturas que han superado el estadio de la recogida y la
caza menor, y en las que el Ser Supremo está o bien ausente (¿olvidado?), o bien
profundamente amalgamado con otras figuras divinas, hasta el punto de hacerse
irreconocible. (MIRCEA, Eliade. Mito y Realidad. Nova York: Ediciones Harper,
1962).
183
En lo original: El «eclipse de Dios» de que habla Martin Buber, el alejamiento y
el silencio de Dios que obsesiona a algunos teólogos contemporáneos no son
fenómenos modernos. La «trascendencia» del Ser Supremo ha servido siempre de
excusa para la indiferencia del hombre a su respecto. Incluso cuando se le guarda
un recuerdo, el hecho de que Dios esté tan lejano justifica toda clase de negligen-
cias, si no la total indiferencia (MIRCEA, Eliade. Mito y Realidad. Nova York: Edi-
ciones Harper, 1962, p.42-43).
214
o homem não é senhor nem em seu próprio mundo e mais,
é um ignorante de si mesmo; logo, não tem como conhecer
o sublime. Para Freud este conhecimento é uma profunda
ilusão narcísica.
184
JAFFÉ, Aniela. O Simbolismo nas artes plásticas. In: JUNG, Carl Gustav. O
Homem e Seus Símbolos. 2ª Ed. Rio de Janeiro, 2008.
215
VII
A DECEPÇÃO PUERIL DE GAGÁRIN
EXPRESSA POR MEIO DA FRASE: FUI AO
CÉU E NÃO VI DEUS LÁ
216
uma aparência de decepção típica de uma criança que foi
ao parque e suas expectativas não foram atendidas da ma-
neira como ele sonhava.
185
Gagárin, Yuri (1934 – 1968). Astronauta russo. A frase foi dita por ele, em
1961.
186
En lo original: Afortunadamente, pues, están los dioses tan alto que
dejan libres al hombre las manos, y el pensamiento. (HERÓDOTO,
2006, p.06)
220
VIII
A CONCLUSÃO DE MARX: A RELIGIÃO É O
ÓPIO DO POVO
187
Cf. MORRIS, Desmond. O Macaco Nu. São Paulo: Círculo do Livro, 1969.
221
A religião constitui-se como um mal necessário; é um mal
porque cerceia todo o pensamento científico e evolucionista,
deixando a todos presos em uma cadeia de retrocesso inte-
lectivo da qual a saída e/ou a negação dos mesmos é fator
de exclusão para o que insurgir na idéia. Ao mesmo tempo é
necessária porque os seres humanos, volúveis como são
não podem conviver sem a pressão de olhos invisíveis a
vigiá-los e a dominá-los e muito menos sem representantes
celestiais, os sucedâneos de Deus a determinar os rumos
da vida cotidiana e dos pensamentos.
Porque toda vez que ocorria algo que fugia à sua compre-
ensão entendia como uma revolta dos deuses como se de
188
Cf. SALOMÉ, Lou-Andreas. Minha Vida. São Paulo: Brasiliense, 1985, p.10.
222
alguma forma estivessem desligado dos seus protetores ou
estes se afastado deles. Logo, como os ciclos da natureza
não duram para sempre, acreditava que as tormentas havi-
am se passado por causa de suas orações e sacrifícios e
mais que estas podiam religá-los aos seus deuses. Daí nas-
cer a religião com seus dogmas e cânones tal e qual conhe-
cemos na atualidade.
189
SILVA, Eliane Moura da. Religião, Diversidade e Valores Culturais: conceitos
teóricos e a educação para a Cidadania. Campinas: Revista de Estudos da Religião
Nº 2, 2004.
190
Cf. MARX, Karl. Crítica da filosofia do direito de Hegel. São Paulo: Boitempo
Editorial, 2005.
224
apropriação suprarreal, porque caracteriza-se como “a reali-
zação fantástica da essência humana, porque a essência
humana não possui verdadeira realidade. Por conseguinte, a
luta contra a religião é, indiretamente, a luta contra aquele
mundo cujo aroma espiritual é a religião. A miséria religiosa
constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e o
protesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da cria-
tura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma
de situações sem alma. A religião é o ópio do povo.”191
191
Cf. MARX, Karl. Crítica da filosofia do direito de Hegel; São Paulo: Boitempo
Editorial, 2005.
225
nervos insanos, provocando uma anestesia no espírito beli-
gerante das massas. Logo à frente defende que “a abolição
da religião enquanto felicidade ilusória dos homens é a exi-
gência da sua felicidade real. O apelo para que abandonem
as ilusões a respeito da sua condição é o apelo para aban-
donarem uma condição que precisa de ilusões. A crítica da
religião é, pois, o germe da crítica do vale de lágrimas, do
qual a religião é a auréola. A crítica arrancou as flores ima-
ginárias dos grilhões, não para que o homem os suporte
sem fantasias ou consolo, mas para que lance fora os gri-
lhões e a flor viva brote."192
192
Cf. MARX, Karl. Crítica da filosofia do direito de Hegel; São Paulo: Boitempo
Editorial, 2005, páginas 146/147.
226
religião, ideologia ou qualquer tipo de organização, conside-
rada um ponto fundamental e indiscutível de uma crença. O
termo deriva do grego δόγμα, que significa "aquilo que apa-
renta; opinião ou crença", por sua vez derivada do ver-
bo δοκέω (dokeo), que significa "pensar, supor, imaginar. Ou
seja, é uma doutrina ou crença que significa literalmente “o
que se pensa é verdade”.
227
crença religiosa. As religiões são então um fenômeno ine-
rente a cultura humana, assim como as artes e técnicas.
228
IX
A ÉTICA E O LIBERALISMO
193
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Humano Demasiado Humano. São Paulo:
Escala, 2006, p.190.
194
BURGUESS, Anthony. A Laranja Mecânica. São Paulo: Artenova, 1972, p.72.
232
A era capitalista pós-moderna valoriza aquele que gera mais
bens para o sistema, não se importando que meios são
utilizados; o que vale é o fim em si a que destina tal ação: o
lucro. Assim, incentivam, por meio da propaganda violenta e
agressiva, na população, o consumo obsessivo, o não-
questionamento, ou seja, a ordem é consumir para, assim,
favorecer o progresso... Este que jamais chega [pelo menos
para os pobres miseráveis consumidores!]
195
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Humano Demasiado Humano. São Paulo:
Escala, 2006, p.44-45.
196
Ibid.
234
próprio homem, dos conflitos ideológicos, de pura ação
mecânica, da mesma forma que o exercício físico produz
energia que transforma-se em calor passou-se a acreditar
que o mero exercício mental produz ideias que transformam-
se em teorias; portanto, como a vida corre e o tempo
acelera-a, ainda mais, parar para degustar uma ideia implica
em preguiça, em moleza e, consequentemente, em perda de
espaço. E Konrad Lorenz corrobora esta fala acrescentando
que “sob a pressão dessa concorrência entre homens, àqui-
lo que é bom para toda a humanidade, e mesmo que é útil e
bom para cada um, perdeu-se completamente de vista. A
esmagadora maioria de nossos contemporâneos só dá im-
portância ao sucesso, àquilo que permite vencer os outros,
na dolorosa obrigação de exceder. Todos os meios para
fingir essa finalidade aparecem, falsamente, como um valor
em si.”197
197
LORENZ, Konrad. Civilização e Pecado: Os oito Erros Capitais do Homem.
1973, p.14-15.
235
de suas vidas. “Podemos dizer que o erro desastroso do
“utilitarismo” consiste em confundir o meio com o fim. A prin-
cípio, o dinheiro era um meio, como prova a expressão cor-
rente: “Ele tem meios”. Mas hoje em dia quantos são capa-
zes de entender que o dinheiro em si não é um valor? O
mesmo acontece com o tempo; Time is Money significa que
aqueles que dão valor ao dinheiro, prezam da mesma forma,
cada segundo de tempo economizado.”198
198
LORENZ, Konrad. Civilização e Pecado: Os oito Erros Capitais do Homem.
1973, p.14-15.
236
aprovado] e indicado por pedagogos renomados e experi-
mentados [não se sabe em quê nem por quem], para que a
criança desenvolva sua inteligência e interesse por uma
determinada área.
237
Uma empresa ou entidade tem que ser percebida com um
elemento ativo do contexto social (cultural, político, econô-
mico, etc.) e esse fato remete a compromissos e/ou respon-
sabilidades que elas (empresa ou entidade) devam ter com
a sociedade como um todo. O conceito de ética empresarial
ou organizacional (ou ainda de ética nos negócios) tem a ver
com este processo de inserção. A empresa ou entidade de-
vem estar presentes de forma transparente e buscando
sempre contribuir para o desenvol-vimento comunitário, pra-
ticando a cidadania e a responsa-bilidade social. Atentam-se
contra a cidadania, ferem a ética empresarial. A ética social
se pratica internamente, recru-tando e formando profissio-
nais e executivos que comparti-lham desta filosofia, privile-
giando a diversidade e o pluralismo, relacionando-se de ma-
neira democrática com os diversos públicos, adotando o
consumo responsável, respei-tando as diferenças, cultivan-
do a liberdade de expressão e a lisura nas relações comer-
ciais. A ética social é um atributo indispensável para as or-
ganizações que querem manter-se vivas no mercado e a
sociedade está cada vez mais alerta para os desvios de
conduta das organizações.
238
de conflitos de consciência. Ser ético não significa conduzir-
se eticamente quando for conveniente, mas o tempo todo.
241
X
ÉTICA E CIDADANIA
242
peitado à risca. Os acordos de paz eram feitos tendo como
ato de selamento a invocação de um deus que servia como
testemunha.
244
dão moderna (onde o indivíduo vivia no engodo de que era
livre).
Para garantir sua sobrevivência nesta nova ordem, o ho-
mem criou leis e regras que mantinham as pessoas unidas.
Com isto, ele que era um caçador solitário passa a sentir
falta de companhia. O Culto aos Antepassados era o laço
que mantinha as famílias unidas, bem como as reuniões
maiores (clãs, tribos, fratrias). Na cidade era a sua condição
de “cidadão”.199
199
A este respeito ver COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. São Paulo:
Martin Claret, 2005.
245
O homem quando se separa de seu grupo se animaliza, se
bestializa. A exclusão bestializa o ser humano porque o ho-
mem tem ânsia de ser aceito socialmente, não é simples-
mente um desejo, chega mesmo a ser ansiedade. Por isto o
homem respeita a coerção social, sem questionamentos, e é
por isto que o homem respeitava as leis da cidade. Ele que-
ria ser alguém, queria ser visto como tal, mesmo que isto
tivesse-lhe um alto custo.
200
ROUSSEAU, Jean Jacques. O Contrato Social. São Paulo: Escala, 2005, p.14.
246
aceito e de ser reconhecido. Ele tem necessidade de ser
aceito no grupo, por parte dos companheiros, troca de ami-
zade, de afeto e de amor. A sensação de não-pertencimento
e isolamento provoca no indivíduo uma forte queda de sua
auto-estima.
201
DANIEL, 1976, p.210-211 citado por TORRES, I. C. O Patrionalismo e as Mu-
lheres da Amazônia de Ontem. Manaus: UFAM, 2006, p.04-5.
202
DANIEL, 1976, p.210-211 citado por TORRES, I. C. O Patrionalismo e as Mu-
lheres da Amazônia de Ontem. Manaus: UFAM, 2006, p.04-5.
247
um fim. Segundo Homero, o homem perde metade de sua
razão quando se torna escravo. Isto porque suas vontades
não são postas em evidência, seus valores são suprimidos
em prol da autoridade e vontade do conquistador. Um dos
grandes méritos de Napoleão Bonaparte foi respeitar as leis
e os costumes dos povos vencidos. Esta era sua ética. Se o
costume em tempos de guerra era o de dominar o povo sub-
jugado pela violência, o estupro, o assalto e a morte, as leis
napoleônicas iam de confronto a esta ideologia. Aqui no
Brasil, ao invés de usarem da violência usaram um “jeitinho”
para domarem os nativos: a fé como meio para angariar
presentes dos invasores. Fica-se sem saber quem abusou
de quem nesta ciranda. Um fato é definitivo: os nativos bra-
sileiros perderam sua identidade. Antes eram filhos da terra,
com o domínio português passaram a ser posse da Coroa
Portuguesa e utilizando outro jeitinho, foram chamados de
brasileiros, como se tivessem uma cidadania.
203
SANTANA, Edilson. Filosofar é Preciso – As grandes indagações filosóficas e
os enigmas da Humanidade. São Paulo: DPL Editora, 2007.
249
surgiu na tela de meu computador uma fotografia de meus
filhos. _ Que crianças fofas! – exclamou. Parabenizei-a pela
gravidez, dizendo que deveria estar extremamente feliz! _
não exatamente _ reagiu ela_ foi um acidente! Enquanto ela
se afastava, não pude deixar de me surpreender com sua
franqueza. Sua observação espontânea lembrou-me dos
elementos acidentais que estão em jogo tanto em nossa
chegada à vida... quanto em nossa partida para a morte.
Aquela mulher, por acidente, ia ter um filho, que com certeza
viria a amar. Quanto a mim, por causa do câncer, deixaria
três crianças que cresceriam sem meu amor.”204
204
PAUSCH, Randhal; ZASLOW, J. A Lição Final. Rio de Janeiro: Editora AGIR,
2008. Cap. 2: Minha Vida Em um Laptop, p.24.
250
ração social irão definir os padrões de comportamento do
indivíduo. Muitas das vezes, como nos mostra os relatos de
cientistas do quilate de Freud e Elizabeth Badinter, que as
crianças corriam mais riscos junto a seus familiares (pais e
mães) que com estranhos.
205
SIMMEL, Johanes Mario. Ainda Resta Uma Esperança. [1950] São Paulo:
Círculo do Livro, 1983.
251
ger a paz e zelar pela harmonia social. Se a educação não
tem atingido seus objetivos em plenitude é porque os pro-
fessores, como seres humanos que são, também já encon-
tram-se desmotivados e sem perspectivas quanto a um futu-
ro. Mas este professor criado por Simmel parece ignorar a
realidade social de seu país, Alemanha, esmagado pela
guerra e continua sua preleção alegando que as diferenças,
os preconceitos, as desavenças que poderão surgir são
produtos de seus ambientes e não de suas próprias deci-
sões autônomas, pois, “seus filhos, isso nós sabemos tão
bem quanto vocês, vêm de famílias de níveis bem diferen-
tes. Alguns estão bem de vida, outros não. Os filhos que
vocês nos confiam já são hoje tão distintos quanto à perso-
nalidade como vocês que aqui estão. Só que eles são muito
mais jovens e, por isso, aprendem com mais facilidade. Em
pouco tempo vão se conhecer melhor e muitos ficarão ami-
gos. (...) Seus filhos ficarão juntos quatro anos. É muito
tempo, especialmente na vida de uma criança. Eles não vão
ligar para o fato de os pais serem pobres ou ricos, feios ou
bonitos... a não ser que para vocês isto faça grande diferen-
ça.”206
206
SIMMEL, Johanes Mario. Ainda Resta Uma Esperança. [1950] São Paulo:
Círculo do Livro, 1983.
252
se de uma coisa: nem sempre é por mérito próprio que as
pessoas têm muito dinheiro, e não é vergonha alguma ser
pobre. Também não é sinal de mau caráter ser rico, nem
tampouco, por não possuir dinheiro, pode-se concluir que
uma pessoa seja boa.”207
207
SIMMEL, Johanes Mario. Ainda Resta Uma Esperança. [1950] São Paulo:
Círculo do Livro, 1983.
208
Ibid.
253
São exageros, cultivados como valores éticos nacionais,
como ocorrido no governo de Hitler que se deve atentar para
que não volte mais. Coisas como os valores de um povo
colocado acima de tudo e de todos. Acusar um grupo minori-
tário de ser o causador de todo o mal de uma nação como a
alemã é o cúmulo do absurdo e mais absurdo é o povo se
satisfazer com este carnaval, aceitando de bom grado desde
que seja o outro a padecer e não “eu”. E depois se acusa
um único homem de ser o único responsável por todo o ca-
os provocado.
209
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. A Genealogia da Moral. São Paulo: Editora
Escala, 2007, p.13.
254
admitir, mas esta era a ética, os princípios daquele tempo,
criados por eles mesmos. Mais tarde, o ex-seminarista Josef
Stálin, literalmente, “O Homem de Aço”, declarava caça aos
intelectuais, num expurgo que durou não mais nem menos
que três anos. A política era a seguinte: ‘quem não delatava
ninguém era considerado suspeito de ser inimigo do povo.’
210
STÁLIN. In: OS 100 DIAS que mudaram o mundo. Aventuras Na História. São
Paulo: Editora Abril, 2005, p.66.
255
damentação racional só aparece no interior da especulação
filosófica a partir da Grécia antiga.
Inicialmente, o problema moral, na tradição helênica, surge
formulado por poetas, na medida em que propõem sobretu-
do duas questões estreitamente vinculadas: o que é a virtu-
de?; é possível transmiti-la, e, como ensiná-la? Na fase an-
tropocêntrica da filosofia grega, aquelas questões tornaram-
se fundamentais, em grande parte devido à importância que
assumiu, num regime democrático como o de Atenas, a de-
terminação de objetivos para a ação humana. A Virtude é
algo de bom que compõe a personalidade humana. Só será
transmitida através da exteriorização de atos.
Mas como saber quais valores são éticos e quais não são?
Como saber a linha que divisa a razão da loucura, o certo do
errado. Quando alguém alcança muito poder o uso bom ou
mal dele depende da decisão de cada um. Um poderoso
argumento, já que o homem é tão livre que possui até mes-
mo a liberdade para errar.
260
O homem é um ser moral e as comunidades humanas sem-
pre necessitaram criar sistemas de valor e normas morais
para possibilitar a convivência social porque os humanos
são seres não determinados pela natureza ou pelo destino.
É no processo de conquista da liberdade e do nosso ser,
que descobrimos a diferença entre o ser e o dever ser, a
vontade de construir um futuro diferente e melhor do que o
presente.
261
Nem sempre é possível e fácil atingir-se o conceito do bem
e principalmente, muito mais difícil é vivenciá-lo de maneira
coerente. Por mais rígidas que sejam as convicções morais,
não conseguem permear a consciência sensível e a insegu-
rança quanto à fixação dos padrões e o balizamento concre-
to das atitudes humanas; daí, a necessidade de leis cada
vez mais rígidas e dirigidas a cada situação específica. É
sempre suscetível de aferição o apreço conferido a cada
valor, no momento determinado de toda historia individual
ou coletiva. O apreciar individual propicia nortear adequa-
damente a procura de felicidade própria, que não será inte-
gral se não se harmonizar com a daqueles que nos estão
próximos, i. e., a prática do bem promove a felicidade e ela
deve ser praticada como ideal maior e como ato consciente.
262
não só aceitamos modelos para conduta, como efetivamos
julgamentos próprios.”211
211
SÁ, Antônio Lopes. Ética profissional. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, p.89.
263
seu jardim. De outra forma, tudo seria pior, uma vez que
nossa espécie não deseja ser formada por médias.”212
212
Rousseau, Jean-Jacques. Emílio ou da Educação. São Paulo: Martins Fontes,
2009, p.04.
213
Ibid.
264
sobre ele que a razão... Todos os homens ‘desejam’ o do-
mínio e nenhum renunciará à opressão se puder exercê-la.
Todos ou quase todos estão dispostos a sacrificar os direi-
tos dos demais em prol de seus próprios interesses. Quem
são os que se sujeitam a estas bestas devoradoras que
chamamos homens? Na gênese das sociedades está a for-
ça brutal e desenfreada [...]”214, o espírito de Áries.
214
JOLY, MAURICE. Diálogo Em El Infierno Entre Maquiavelo y Montesquieu
(1864). In: LIBROdot.com, p.06.
265
Tomando este raciocínio como fundamento pode-se deduzir
que a existência da ética e a obrigação de cumpri-la é causa
de infelicidade para os mortais e não o inverso, pois a fera
enjaulada em seu ser deseja sair para ferir, matar, dar vazão
a seus instintos mais primitivos... uma vez que tais ações
despertam um tipo primitivo [e não estranho ao homem mo-
derno] de prazer.
215
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Humano Demasiado Humano. São Paulo:
Escala, 2006.
267
mente que o criminoso e sua vítima pensam e sentem da
mesma maneira e se passa a medir a culpa de um pela dor
do outro.”216
216
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Humano Demasiado Humano. São Paulo:
Escala, 2006. Cap. II: Para a História dos Sentimentos Morais. Af. 81: Erros da
Vítima e do Criminoso, p.78.
268
(dezenove) anos de prisão. O faxineiro que bate na mulher
passa nove meses preso sem processo. O deputado que
admite ter recebido “dinheiro não contabilizado” é inocenta-
do por seus pares. A mãe que furta uma lata de manteiga de
menos de quatro reais fica presa e tem cinco vezes o pedido
de relaxamento da prisão negado.
217
MARCONI, Marina de Andrade e PRESSUTTO, Zélia Maria Neus. Antropologia
da Ética. São Paulo: Atlas, 2003, p.193.
269
amealhar mais riquezas geram distorções e estas, por sua
vez, produz mais e mais injustiças sociais, que têm como
vítimas os mais vulneráveis. Uma sociedade somente será
justa e pluralista a partir do momento em que combater a
excludência, diminuir a distância entre as pessoas e propici-
ar a todos a seus membros os direitos básicos mínimos ca-
pazes de garantir-lhes uma vida digna.
270
e tantos outros que se baseiam numa nova ética social, a
ética solidária.”218
O homem, com seu livre arbítrio vai formando seu meio am-
biente ou o destruindo, ou ele apóia a natureza e suas cria-
turas ou ele subjuga tudo que pode dominar, e assim ele
218
MO SUNG, Jung; SILVA, Josué Cândido. Conversando sobre ética e socieda-
de, 5ª Ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1997, p.115.
271
mesmo se torna no bem ou no mal deste planeta. Deste
modo, a Ética e a Moral coexistem numa mesma realidade.
219
En lo original: “(…) los niños con vivencias afectivas, surgidas sobre la base de
un conflicto entre su autovaloración y sus aspiraciones, al mismo tiempo poseen
formas afectivas de conducta correspondientes. Estos niños se inclinan a reaccio-
nes inadecuadas y exageradas, son susceptibles, agresivos, desconfiados, recelo-
sos, obstinados, etc. Esto dificulta sus relaciones con los que los rodean, los hacen
intratables y difíciles de soportar en el colectivo. (…) los rasgos negativos surgen
en el niño reactivamente, como una forma de defenderse de vivencias penosas.” 219
(BOZHOVICH, L. I. La Personalidad y Su Formación en la Edad Infantil. La Haba-
na: Editorial Pueblos y Educación, 1981, pp.301-302).
272
A negação da vivência de certas atitudes na infância leva,
objetivamente, a um descontentamento com a vida, produ-
zindo no futuro, pessoas amargas e, possivelmente, pais
deficientes, ou seja, entre os danos visíveis estão aqueles
que escondem-se sob as camadas sinuosas da sua perso-
nalidade e que manifestarão em momentos imprevisíveis,
sempre causando danos à saúde psicofísica dos indivíduos
porque é-lhes, de uma maneira sutil, privado também um
possível futuro melhor e mesmo a oportunidade de escolher
livremente e que o daria prazer em desenvolvê-lo. Mesmo
com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescen-
te (LEI 8069/90), onde cria-se uma legislação que garante a
proteção legal da infância contra vários abusos como o tra-
balho escravo infantil, as diversas modalidades de tortura e
exploração, sua abrangência no campo prático não é efeti-
vada por diversos motivos, destacando a omissão social e a
justificação pelo preceito econômico e mesmo com o esforço
do governo em desenvolver projetos sociais de proteção
psicológica e física para os pequenos ainda é corriqueiro o
fato de encontrar casos que nos inquietam ao perceber que
esta triste realidade prática ainda existe e que persiste.
220
Gramsci [s.d.] citado por RUIZ, Erasmo Miessa. Freud No Divã Do Cárcere.
Campinas: Editora Autores Associados, 1998, p.89.
221
Ibid.
274
adaptar-se ao novo menu, a capacidade de razão humana
supera e ignora tais procedimentos naturais.
277
mesmo a capacidade de entender, compreender e respeitar
as emoções humanas...
222
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Obras Incompletas. São Paulo: Abril Cultural,
1983.
278
homem selvagem, livre, errante se voltassem para trás, con-
tra o homem mesmo.”223
223
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Obras Incompletas. São Paulo: Abril Cultural,
1983.
224
Ibid.
279
que deveria ser recriminado e punível. A sua punição era
sentir-se envergonhado de si mesmo por permitir que tais
pensamentos viessem à sua consciência como se pudesse
deter tal força por meio do desejo consciente.
225
NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Obras Incompletas. São Paulo: Abril Cultural,
1983.
280
As suas palavras ainda vêm corroborar tudo o que foi dito
acima, de que viver em sociedade é trair os valores pesso-
ais e se resignar aos comunitários. E, se para o homem civi-
lizado isto já é muito sacrificante; muito mais o deve ter sido
para um ser que jamais sequer imaginou que levaria uma
vida sob ferros.
226
Gramsci [s.d.] citado por RUIZ, Erasmo Miessa. Freud No Divã Do Cárcere.
Campinas: Editora Autores Associados, 1998, p.43.
281
lizar um dever sacro. Por trás e junto com a selvageria está
a insanidade e a justificação por meio do sagrado.
227
Gramsci [s.d.] citado por RUIZ, Erasmo Miessa. Freud No Divã Do Cárcere.
Campinas: Editora Autores Associados, 1998, p.43.
282
ja, estar-se-ia privando o homem do seu direito ao livre-
arbítrio.
283
A característica essencial da organização política é o exer-
cício do poder e da organização democrática é a alternância
de poder. "O bem público não é uma coisa estática e imutá-
vel, é muito difícil de ser percebido por um grupo isolado do
que pelo conjunto de todos os cidadãos através de seus
representantes."228
228
Cf. Platão, s.n.t.
284
O Estado moderno ganha a função de salva-guardar (modi-
ficar) a instituição do poder, e a ética moral dão lugar a ética
política. Nicolau Maquiavel foi um dos primeiros filósofos a
perceber a especificidade da política moderna. Para ele a
diferença entre a ética moral e a ética política é que a pri-
meira está preocupada com os meios, enquanto que a ética
política não esta interessada em quais os propósitos e as
intenções dos governantes, mas sim em como fazer para
ascender e permanecer no poder. Todavia para que a políti-
ca seja um caminho amplo e acessível para a democracia,
no sentido de construirmos uma sociedade justa, humana e
igualitária, é preciso que a Política se paute pelos princípios
da ética.
287
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
293
ALAIN (Émile Chartier). Reflexões sobre a educação. São
Paulo: Saraiva, 1978.
295
DIAS, José Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Rio de Janei-
ro, [s.e.], 1965.
297
LOEWENSTEIN, Karl. La teoría de la constituición. Barcelo-
na: Editorial Ariel, 1986.
298
MIRCEA, Eliade. Mito y Realidad. Nova York: Ediciones
Harper, 1962.
300
PLATÃO. O Banquete. São Paulo: Martin Claret, 2004.
301
RUIZ, Erasmo Miessa. Freud No Divã Do Cárcere. Campi-
nas: Editora Autores Associados, 1998. Cap. 3: O Instinto
Como Categoria Histórica.
302
SIGNIER, Jean-François; THOMAZO, Renaud. SOCIEDA-
DES SECRETAS. Vol. I: Sociedades Secretas Religiosas.
São Paulo: Larousse, 2008.
304
305