Aplicacao de Medidas de Coacao
Aplicacao de Medidas de Coacao
Aplicacao de Medidas de Coacao
Q&A
APLICAÇÃO
DE MEDIDAS
DE COAÇÃO:
audição do arguido e
interrogatório judicial
ORADOR
Nuno Brandão
Professor Auxiliar na Faculdade de
Direito da Universidade de Coimbra
conferência on-line
Aplicação de
Medidas de
Coação
Audição do
arguido e
interrogatório
judicial
Veja no
Youtube
2
diplomas*
DECRETO DE APROVAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO
Diário da República n.º 86/1976, Série I de 1976-04-10
* A presente compilação resulta de uma seleção concebida pelo CRL, a qual não pretende ser
exaustiva e não prescinde a consulta destes e de outros textos legais publicados em Diário da República,
disponíveis em https://dre.pt/.
3
Q&A | Aplicação de Medidas de Coação
4
R P
C
ANO 28 ● N. º 2 ● maio-agosto 2018 ●
C : JORGE DE FIGUEIREDO DIAS
Periodicidade quadrimestral • Preço desta edição: Euros 20,00 (IVA incluído)
SEPARATA
APLICAÇÃO DE MEDIDAS DE COACÇÃO:
AUDIÇÃO DO ARGUIDO E INTERROGATÓRIO JUDICIAL
ANOTAÇÃO AO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE
LISBOA DE 19 DE OUTUBRO DE 2017
ACÓRDÃO (*)
*
Disponível em www.dgsi.pt. Processo n.º 3110/13.OJFLSB-B.L1-9.
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pág. 576, anotação 12, como sendo os casos em que, quanto ao(à)
arguido(a), é desconhecido o seu paradeiro ou sofre de doença gra-
ve, ou de anomalia psíquica, ou de gravidez ou puerpério, e ainda
se “não for conveniente” ouvi-lo(a).
Por sua vez, durante o inquérito o n.º 5 estabelece ao juiz um
prazo (bem curto, diga-se de passagem) de 5 dias para aplicação
de medida de coacção ou de garantia patrimonial pedida pelo MP.
Aqui é que importa responder à questão: o arguido deve ou não ser
ouvido previamente, e ainda à questão de saber se tal audição deve
ou não ser presencial.
Parece-nos evidente que nessa norma o legislador quis indu-
bitavelmente impor ao juiz de instrução que decida rapidamente
sobre medidas de coacção e de garantia patrimonial promovidas
pelo MP (qualquer que seja a medida de coacção, mesmo as não
privativas da liberdade, ela é urgente para impedir a concretiza-
ção dos perigos referidos no art.° 204.° do CPP — pois, qualquer
medida de coacção, com excepção do TIR, tem de se basear na
verificação de qualquer daqueles perigos –, bem como a garantia
patrimonial para impedir a dissipação de bens), sem, porém, deixar
de exigir a satisfação do contraditório. Dito de outro modo: ainda
que o juiz de instrução tenha de decidir no prazo dos 5 dias (só não o
fará se estiver impossibilitado de o fazer em tempo — “salvo impos-
sibilidade devidamente fundamentada”), tem sempre de satisfazer o
contraditório. Pode-se argumentar que 5 dias é um prazo demasia-
do curto para se ouvir o arguido, mas, não sendo caso de “não ser
conveniente” a audição prévia do arguido (que obviamente tem de
ser fundamentada), como é o caso dos autos, esta não é prescindível
em obediência ao princípio do contraditório, pelo que o juiz deve
mandar notificar o arguido para ser ouvido sobre a promoção do MP,
tudo nos termos do n.º 4 do mesmo art. 194.º do CPP.
A questão que se suscita de seguida é a de se saber se a audi-
ção deve ou não ser presencial. Entendemos que sim.
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*
É pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o âm-
bito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai
da respectiva motivação (1), sem prejuízo, contudo, das questões do
conhecimento oficioso.
Da leitura dessas conclusões, tendo em conta as de conheci-
mento oficioso, afigura-se-nos que as únicas questões fundamen-
tais a apreciar no presente recurso são as seguintes:
I. Nulidade do despacho recorrido por falta de audição prévia
dos arguidos;
II. Falta de fundamentação do despacho recorrido;
III. Falta de indícios relativos ao arguido M.O.;
IV. Legalidade, adequação e proporcionalidade das medidas
de coacção aplicadas.
*
Cumpre decidir.
I — Nulidade do despacho recorrido por falta de audição prévia
dos arguidos
No presente caso e no que diz respeito aos arguidos/recorren-
tes, o MP promoveu a aplicação daquelas medidas de coacção (fls.
49/57, de 30/11/2016), o Exm.º JIC mandou notificar essa promo-
ção aos arguidos (fls. 136, de 30/11/2016), o arguido M.A. pronun-
ciou-se contra a aplicação de tais medidas, pelo requerimento de
fls. 67/79, e o arguido M.O. pronunciou-se contra a aplicação de
tais medidas, pelo requerimento de fls. 108/109.
De seguida, o Exm.º JIC, sem que tenha ouvido presencial-
mente estes arguidos, prolatou o despacho de fls. 110/111, de
28/12/2016, que aplicou as referidas medidas.
(1)
Cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 05.12.2007, proferido
no proc. n.º 1378/07, disponível in Sumários do Supremo Tribunal de Justiça;
www.stj.pt (...).
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pt, do qual citamos: “… 3.2. O artigo 194.º, n.º 2, do CPP, na redacção anterior à
revisão de 2007, dispunha que a aplicação das medidas de coacção e de garantia
patrimonial era precedida, sempre que possível e conveniente, da audição do ar-
guido e podia ter lugar no acto do primeiro interrogatório judicial.
A lei determinava a audição, sempre que possível e conveniente.
A regra, no sistema processual penal português, era já, então, a do exercício
do contraditório, no que toca à aplicação das medidas de coacção, no inquérito ou
depois do inquérito.
Constituindo o exercício do contraditório a regra que se impunha obser-
var, a impossibilidade ou inconveniência da audição do arguido deveria constar,
fundamentadamente, do despacho que decidisse a aplicação de uma medida sem
precedência da audiência prévia.
Era objecto de controvérsia a questão relativa às consequências da falta de
audição sem que o juiz fundamentasse a sua impossibilidade ou inconveniência,
com as soluções mais diversas na jurisprudência portuguesa (irregularidade, nu-
lidade, nulidade insanável).
Essas soluções dependiam, assinale-se, do entendimento que se perfilhasse
quanto ao modo de realizar a “audição”.
Alguns defendiam que a dita prévia “audição” implicava um acto presen-
cial, ou seja, que o arguido estivesse presente e prestasse declarações. A prete-
rição dessa “audição” constituiria a nulidade insanável prevista no artigo 119.º,
alínea c), do C.P.P.
Já outros entendiam que a falta de audição se bastava com a notificação do
arguido para se pronunciar.
Aqui chegados, sempre entendemos que se o juiz não declarasse e fun-
damentasse a impossibilidade ou inconveniência da prévia audição, preterindo
o princípio geral de fundamentação dos actos decisórios, constante dos artigos
205.º, n.º 1, da Constituição e 97.º, n.º 4, do CPP, a referida omissão constituía
irregularidade processual, submetida ao regime do artigo 123.º do CPP.
Como tal, não se apoiava a tese segundo a qual a não audição do arguido, a
quem se aplicasse uma medida de coacção (ou de garantia patrimonial), consubs-
tanciava uma nulidade insanável, pelas seguintes razões, sumariamente indicadas:
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audição se basta com a notificação do arguido ou do seu defensor para
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não tem que se realizar sempre da mesma forma. Ainda que na maior parte dos
casos deva conduzir a um interrogatório nos termos do art. 141.º, mormente quan-
do se trate de arguido detido, noutras situações bastar-se-á com o exercício do
contraditório realizado mediante a notificação do defensor, como será o caso da
aplicação de medidas de coacção requeridas após a acusação ou a pronúncia (ou
mesmo requeridas na própria acusação).
3.4. Há, porém, um elemento que pode inculcar a necessidade de interroga-
tório judicial de arguido, ainda que não detido, durante o inquérito.
Trata-se do novo artigo 385.º, n.º 3, al. b), do C.P.P.
A lei expressamente refere-se a um arguido que está em liberdade e que é
submetido a primeiro interrogatório judicial para eventual aplicação de medida
de coacção.
Contudo, não vemos que esta nova disposição legal — diversa do n.º 3 do
artigo 382.º, parte final, que se reporta à apresentação ao juiz de arguido que está
detido (essa apresentação surge como alternativa à libertação imediata com TIR)
— tenha despertado grande atenção nos nossos tribunais.
E daí que se explique que o tribunal «a quo» insista com o velho argumento
de que a realização de interrogatório de arguido em liberdade compete sempre ao
M.P., sem atentar que o artigo 385.º, n.º 3, al. b), prevê um interrogatório judicial
de arguido previamente libertado, em ordem à eventual aplicação de medida de
coacção.
Esta disposição veio baralhar os dados, podendo inculcar a necessidade da
tal “audição” pessoal — aliás, a revisão de 2007 veio, noutras disposições, impor
actos de audição pessoal, como é o caso da audição do condenado, no quadro do
incidente por falta de cumprimento das condições da suspensão da execução da
pena, que, nos termos do novo n.º 2 do artigo 495.º, deve ser ouvido «na presença
do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão.»
Todavia:
1.º - tal artigo 385.º apenas se aplica no âmbito do processo sumário, não
tendo potencialidades para ser aplicado fora do âmbito de um processo tão célere
que deve sempre ser o «sumário» (o que não é o nosso caso);
2.º - quando a lei exige presença física do arguido, em sede do exercício do
contraditório, di-lo expressamente como o faz no citado artigo 495.º, não o tendo
feito, de facto, na letra do artigo 194.º, n.º 3.
Assim sendo, fora dos casos de interrogatório judicial de arguido detido e da
previsão do citado artigo 385.º, n.º 3, al. b), o direito de audição não pressupõe,
sempre, a existência de um acto de interrogatório.
Audição quer significar aqui auscultação não necessariamente oral.
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Contudo, tal não significa que a audição do arguido tivesse de ser pessoal e
física. Já que havia sido previamente constituído como arguido nos autos (fls. 16),
e não sendo aplicável a alínea b) precisamente pelo facto de estarmos perante um
arguido não detido, não haveria também que cumprir a alínea a) do citado n.º 4.
Restariam as comunicações das alíneas c) e d) do n.º 4 do artigo 141.º
E tais elementos estão já plasmados e devidamente descritos na promoção
do MP a fls 42 a 45, ficando assim tacitamente cumprido o artigo 141.º, n.º 4,
com a notificação ao arguido (ou ao seu defensor oficioso — cfr. artigo 113.º, n.º
9, do CPP) do dito requerimento/promoção — contudo, nada impede o juiz de,
no despacho a ordenar a feitura do contraditório do n.º 3 do artigo 194.º do CPP,
colocar ali expressamente as referências do artigo 141.º/4, caso não constem de
forma muito explícita da promoção do MP.
Diga-se ainda que sempre poderá o arguido — residindo aqui uma cláusula
de salvaguarda — pedir para ser ouvido presencialmente pelo JIC, podendo o JIC
fazer tal “outro interrogatório”, se o achar conveniente e necessário (tal como se
prevê para a instrução — cfr. artigo 292.º, n.º 2 do CPP), convocando-o. Repeti-
mos: pode fazê-lo mas não é obrigado a fazê-lo…
Como tal, basta-se aqui a lei com a simples garantia de contraditório, não
exigindo um acto pessoal de audição — na realidade, a audição do arguido neste
sede e com este móbil pode ser feito em 1.º interrogatório judicial de arguido
detido (justificando-se então a audição presencial perante o «o juiz das garantias
e das liberdades» pela efectiva situação de privação da liberdade em que ele se
encontra), não tendo de ser ouvido presencialmente, em situação de não detenção,
em diligência “avulsa” visando unicamente tal audição pelo JIC (nada impedin-
do, não obstante, como se viu, que o juiz o decida fazer dessa forma mas apenas
guiado por critérios de oportunidade e conveniência)”.
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(3)
Estes normativos correspondem hoje, respectivamente os n.ºs 4, 6 e 7
do art. 194.º do CPP.
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“Dispõe o art. 227.º, n.º 2 do C. P. Penal que, havendo fundado receio de que fal-
tem ou diminuam substancialmente as garantias de pagamento da indemnização
ou de outras obrigações civis derivadas do crime, o lesado pode requerer que o
arguido ou o civilmente responsável prestem caução económica em termos e sob
a modalidade a determinar pelo juiz.
O art. 194.º, n.º 1 do C. P. Penal dispõe que “as medidas de garantia patrimo-
nial são aplicadas por despacho do juiz, durante o inquérito a requerimento do Mº
Pº e depois do inquérito mesmo oficiosamente, ouvido o MºPº”.
Da literalidade deste último preceito parece resultar que, durante o inqué-
rito, o M.° P.° pode requerer a prestação de garantia patrimonial e o juiz pode
oficiosamente, depois do inquérito, ordenar a prestação de garantia patrimonial
do pagamento da indemnização ao lesado, já que a norma não diz expressamente
que apenas se refere às garantias do pagamento da pena pecuniária, do imposto
de justiça, das custas do processo ou de qualquer outra dívida para com o Estado
relacionada com o crime (às quais se refere o n.º 1 do art. 227.º do C. P. Penal).
O preceito não deve porém ser interpretado literalmente, antes deve fazer-se uma
interpretação que atenda à finalidade do mesmo.
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(5)
Disponível em trg.pt/info/estudos.html, do qual citamos: “… A segun-
da nota para acentuar que a lei continua a não resolver o problema de saber se a
audição do arguido tem necessariamente de revestir a forma de audiência pessoal
como parece depreender-se da remissão para o disposto no n.º 4 do artigo 141.º
constante da parte final do n.º 3 do citado artigo 194.º e bem assim da parte final
do n.º 7 do mesmo artigo 194.º, ou se o contraditório poderá ser exercido de outra
forma, nomeadamente por escrito.
(Nota: No parecer da ASMJ sugeria-se uma solução diferenciada: audição
presencial do arguido nos casos em que fosse requerida a aplicação de uma me-
dida de coacção mais gravosa (v.g. as medidas para as quais a lei exige fortes
indícios) prevendo forma mais expedita (resposta por escrito em face da notifi-
cação do requerimento do MP) nas demais medidas de coacção e garantia patri-
monial, podendo prever-se que o arguido fosse ouvido presencialmente, mesmos
nestes casos, quando expressamente o requeresse (“Proposta de Lei n.º 94/2010
— Alterações ao Código de Processo Penal”, cit., págs. 13-14). Esta proposta não
mereceu acolhimento no texto legal. Não vislumbrávamos qualquer vantagem
naquela proposta uma vez que iria problematizar, ainda mais, ao nível do arguido
não detido, toda a temática da aplicação das medidas de coacção, que a Reforma
de 2007 já tornara extremamente complexa).
Refira-se, por último, que o n.º 7 do artigo 194.º [“Sem prejuízo do dispos-
to na alínea b) do n.º 5, o arguido e o seu defensor podem consultar os elementos
do processo determinantes da aplicação da medida de coacção ou de garantia
patrimonial, à excepção do termo de identidade e residência, durante o interro-
gatório judicial e no prazo previsto para a interposição do recurso”] limita-se
a reproduzir o anterior n.º 6, substituindo a referência à alínea b) do n.º 4 pela
menção da alínea b) do n.º 5.…”.
(6)
A pág. 558, donde citamos: “… Parece que o arguido deve ser sempre
ouvido, a não ser no caso de impossibilidade (v. g. em caso de doença) devida-
mente fundamentada…”.
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Sem custas.
*
Lisboa, 19-10-2017
Abrunhosa de Carvalho
Maria do Carmo Ferreira
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ANOTAÇÃO (*)
(*)
Agradecemos ao Dr. Pedro Soares de Albergaria, juiz de direito com
larga experiência como juiz de instrução, a leitura atenta desta anotação e as
pertinentes observações e sugestões críticas que nos transmitiu.
Por opção do autor, o presente texto é escrito segundo o antigo Acordo Or-
tográfico da Língua Portuguesa.
(1)
Nesta conclusão, igualmente, além de AA. citados pelo acórdão —
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(4)
Caso o processo conte com vários co-arguidos detidos, assistidos por
diferentes defensores, o hábito é ouvir, em interrogatório, cada um dos arguidos,
sequencialmente. Concluídos os interrogatórios, na diligência referida em texto
participarão o juiz de instrução, o agente do Ministério Público e os defensores
dos diversos arguidos, mas já não, por regra, os próprios arguidos.
(5)
A afirmação não abrange, naturalmente, o termo de identidade e residên-
cia (artigo 196.º do CPP), que ficará à margem da exposição que se segue em texto.
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(6)
Maia Costa, in: Código de Processo Penal Comentado, (n. 1), Art.
194.º, 2., p. 861.
(7)
Paulo Dá Mesquita, Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciá-
ria, Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p. 181 e ss.
(8)
Diferentemente, admitindo a aplicação de medidas de coacção a reque-
rimento do assistente, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de
Processo Penal, 4.ª ed., Lisboa: Univ. Católica Editora, 2011, Art. 194.º/2. Como
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(10)
Paulo Dá Mesquita, Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judi-
ciária, (n. 7), p. 186 e s.
(11)
No caso das medidas de coacção previstas nos artigos 200.º, 201.º e
202.º do CPP.
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(12)
Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CPP4, (n. 8), Art.
194.º/12.
(13)
Por todos, na doutrina, Maria João Antunes, “O segredo de justiça
e o direito de defesa do arguido sujeito a medida de coacção”, in: Costa Andra-
de et. al. (orgs.), Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo Dias, Coimbra:
Coimbra Editora, 2003, p. 1261 e passim, e na jurisprudência constitucional os
acórdãos do TC n.os 416/2003 (12. e 13.) e 607/2003 (20.).
(14)
Nuno Brandão, “Medidas de coacção: o procedimento de aplica-
ção…”, (n. 1), p. 77, e Ac. TC 391/2015 (AcsTC 93.º, p. 499).
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diciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser gravemente
em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo
para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes pro-
cessuais ou das vítimas do crime (artigo 194.º, n.os 6, al. b), e 7 do CPP).
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(16)
Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CPP4, (n. 8), Art.
141.º/2.
Na verdade, no processo comum, encontrando-se o arguido detido,
(17)
em regra não haverá razão para mantê-lo privado da liberdade senão no caso de
se afigurar necessário aplicar-lhe uma medida de coacção e houver motivo que
justifique que a detenção se mantenha até que seja tomada decisão judicial sobre
a questão. Se o Ministério Público entender que não se justifica a aplicação de
uma medida de coacção ao arguido detido, deverá determinar a sua libertação,
sem prejuízo, naturalmente, de começar ou continuar a investigação criminal que
deverá ser realizada no inquérito em curso (cf. artigos 261.º-1 e 143.º-2 do CPP).
Se, pelo contrário, considerar que lhe deverá ser aplicada uma medida de coacção,
mas não há motivo para que continue detido, deverá ordenar a sua libertação (vd.,
novamente, os artigos 261.º-1 e 143.º-2 do CPP). De modo similar, já Germano
Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, (n. 1), p. 270, e Paulo Dá
Mesquita, Direcção do Inquérito Penal e Garantia Judiciária, (n. 7), p. 179 e s.
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(18)
José António Barreiros, “O arguido detido e o seu interrogatório”,
in: Costa Andrade et. al. (orgs.), Liber Discipulorum para Jorge de Figueiredo
Dias, Coimbra: Coimbra Editora, 2003, p. 1280.
(19)
Para uma compreensão do processo penal à luz da teoria dos jogos,
Alexandre Morais da Rosa, A Teoria dos Jogos Aplicada ao Processo Penal,
Lisboa: Rei dos Livros, 2014.
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(20)
Como bem nota José António Barreiros, “O arguido detido e o seu
interrogatório”, (n. 18), p. 1280, o arguido “sentirá então, por mais que a Cons-
tituição o desminta, que o silêncio o pode prejudicar nessa luta pela liberdade de
que o interrogatório oferece o local de verdadeiro «torneio»”.
(21)
Na síntese do Ac. do TC n.º 416/2003, “embora inserido na fase pro-
cessual do inquérito − cujo dominus é o Ministério Público −, o interrogatório
judicial de arguido detido é um acto jurisdicional que tem funções eminentemente
garantísticas e não de investigação ou de recolha de prova” (12.).
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(22)
Maria João Antunes, Direito Processual Penal2, (n. 8), p. 149.
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(23)
“Ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus”.
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ro, “A pretexto das alterações operadas pela Lei n.º 26/2010…”, (n. 1), p. 329 e ss.
(25)
Assim, também Sónia Fidalgo, “Medidas de coacção: aplicação e
impugnação”, (n. 1), p. 251 e s., e Francisco Mota Ribeiro, “A pretexto das
alterações operadas pela Lei n.º 26/2010…”, (n. 1), p. 329 e ss.
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das alterações operadas pela Lei n.º 26/2010…”, (n. 1), p. 334 e ss.
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(29)
Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, (n. 28), p. 160.
(30)
Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, (n. 28), p. 160.
(31)
De acordo com a ressalva prevista no n.º 7 do artigo 194.º, por remis-
são para a alínea b) do n.º 6 do mesmo preceito, a consulta pode ser recusada se
puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade
ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos
participantes processuais ou das vítimas do crime — cf. Nuno Brandão, “Me-
didas de coacção: o procedimento de aplicação…”, (n. 1), p. 82 e ss., e Sandra
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392 NUNO BRANDÃO
(33)
Nesta direcção, embora a propósito (de deficiente e genérica descri-
ção) dos factos respeitantes à imputação do crime pressuposto da prisão preventi-
va, o fundamental Ac. do TC n.º 416/2003. E ainda, tanto quanto parece, o já re-
ferido Ac. do TC n.º 391/2015, como poderá inferir-se do cuidado em estabelecer
esta ressalva: “Pressupondo, pois, a interpretação normativa em análise, que ao
arguido, por força do disposto no artigo 141.º do Código de Processo Penal, lhe
é dada a oportunidade de pessoalmente se pronunciar durante o interrogatório
sobre todos os factos que integram os requisitos da aplicação da medida de prisão
preventiva que se encontram enunciados nos artigos 193.º, 202.º e 204.º do Có-
digo de Processo Penal — pressuposto da norma que é um dado que não cabe ao
Tribunal Constitucional sindicar, assim como não tem competência para controlar
se ele se verificou no interrogatório do recorrente neste processo — apenas fica
subtraída a obrigatoriedade da audição pessoal, nos termos daquela interpretação,
a valoração jurídica dos factos que fundamentam a aplicação da prisão preventi-
va” (AcsTC 93.º, p. 500; it. nosso).
(34)
Como resulta da nota anterior, foi por ter partido da premissa de que
não estaria em causa a aplicação de normas que admitissem a aplicação da pri-
são preventiva sem prévia comunicação pessoal ao arguido de “todos os factos
que integram os requisitos da aplicação da medida de prisão preventiva que se
encontram enunciados nos artigos 193.º, 202.º e 204.º do Código de Processo
Penal”, subsistindo em aberto somente matéria mais vocacionada para ser objecto
da defesa técnica que está a cargo do defensor, que o TC, no mencionado Ac. n.º
391/2015, acabou por concluir pela não inconstitucionalidade das normas aplica-
das na perspectiva dos direitos de defesa do arguido e do princípio do contraditó-
rio, consagrados nos n.os 1 e 5 do artigo 32.º da Constituição (AcsTC 93.º, p. 500).
RPCC 28 (2018)
APLICAÇÃO DE MEDIDAS DE COACÇÃO: AUDIÇÃO DO ARGUIDO ... 393
lução de não audição pessoal do arguido seria melhor do ponto de vista da prática
processual. Ponto em que, tendo em conta o que sustentamos em texto, já não
podemos acompanhar a Relação.
RPCC 28 (2018)
394 NUNO BRANDÃO
(36)
Noutro sentido, considerando que, neste domínio da violação do direi-
to de audição do arguido, se verificará a nulidade sanável prevista no artigo 120.º,
n.º 2, al. d), do CPP, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do CPP4, (n. 8),
Art. 194.º/15, Maia Costa, in: Código de Processo Penal Comentado, (n. 1), Art.
194.º, 7. e 14., pp. 862 e 865 (referindo-se expressamente à audição pessoal), e
Maria João Antunes, Direito Processual Penal2, (n. 8), p. 149, nota 189. É duvi-
doso, porém, atento o carácter incidental do procedimento de aplicação de medida
de coacção, que possa considerar-se esta audição prévia do arguido como um acto
do inquérito e que estará aqui, assim, em causa uma insuficiência do inquérito,
o tipo de nulidade que se prevê nessa alínea b) do n.º 2 do artigo 120.º do CPP.
RPCC 28 (2018)
APLICAÇÃO DE MEDIDAS DE COACÇÃO: AUDIÇÃO DO ARGUIDO ... 395
RPCC 28 (2018)
396 NUNO BRANDÃO
certo modo por maioria de razão, naquelas outras em que não lhe
chega a ser dada a oportunidade de uma audição pessoal.
Em conclusão, andou bem a Relação de Lisboa quando con-
cluiu que a aplicação, pelo Tribunal Central de Instrução Criminal,
de medidas de coacção de proibição do exercício de função (art.
199.º, n.º 1, al. a), do CPP) e de proibição de contactos (art. 200.º,
n.º 1, al. d), do CPP) sem que os visados tivessem sido prévia
e pessoalmente ouvidos implicou nulidade insanável do procedi-
mento de aplicação dessas medidas de coacção e consequentemen-
te do próprio despacho que as decretou (art. 122.º, n.º 1, do CPP).
Nuno Brandão
Professor Auxiliar da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
RPCC 28 (2018)
Q&A | Aplicação de Medidas de Coação
Questões*
https://www.youtube.com/watch?v=GQTtWu04X4M
Questão 1
“Considera que o sistema de medidas de coação do ordenamento jurídico
português é um sistema equilibrado? Se não, que alterações propunha
tendo em conta a sua experiência e conhecimentos?”
Resposta
1:11:52 a 1:14:31
https://www.youtube.com/
watch?v=GQTtWu04X4M#t=1h11m52s
Questão 2
“Gostava solicitar, embora tarde, que o formador falasse também no
âmbito do direito comparado, ou que na sua abordagem se debruçasse
da questão da aplicação da medida de coação no novo Código do
Processo Penal angolano.”
Resposta
1:14:34 a 1:15:57
https://www.youtube.com/
watch?v=GQTtWu04X4M#t=1h14m34s
Questão 3
“Num caso de Violência Doméstica (do filho sobre os pais), foi possível a
Suspensão Provisória do Processo, mediante o cumprimento de injunções.
Pergunto:
As medidas de coacção que foram determinadas e aplicadas em 1.º
interrogatório de Arguido detido, devem ser mantidas durante a SPP e
em conjunto com cumprimento das injunções?”
Resposta
1:15:59 a 1:18:15
https://www.youtube.com/
watch?v=GQTtWu04X4M#t=1h15m59s
* A presente compilação transcreve, sem revisão, as questões colocadas pelos advogados aos
oradores relativamente a cada temática.
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Questão 4
“As minhas questões são:
- o MP requer a aplicação da medida de coação antes ou depois do
primeiro interrogatório judicial?
- o requerimento de recurso da medida de coação aplicada sobe para a
relação ou é decidido em 1.ª instância?
- o MP pode opor-se ao indeferimento do requerimento das medidas de
coação aplicadas que foi requerida ao juiz de instrução?”
Resposta
1:18:15 a 1:22:36
https://www.youtube.com/
watch?v=GQTtWu04X4M#t=1h18m15s
Questão 5
“Gostaria de perguntar ao professor como compatibilizar a aplicação das
medidas de coação na fase de inquérito, e os deveres de informação para
o arguido e o segredo de justiça interno do processo, que impede o acesso
a elementos fulcrais do processo.”
Resposta
1:22:58 a 1:26:29
https://www.youtube.com/
watch?v=GQTtWu04X4M#t=1h22m58s
53
Q&A | Aplicação de Medidas de Coação
Ficha Técnica
Título
Aplicação de Medidas de Coação: Audição
do arguido e interrogatório judicial
Edição
Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos
Advogados
Rua dos Anjos, 79
1050-035 Lisboa
T. 21 312 98 50 E. [email protected]
www.oa.pt/lisboa
Coordenação
João Massano
Centro de Publicações
Ana Dias
Marlene Teixeira de Carvalho
Colaboradores
Isabel Carmo
Susana Rebelo
Sofia Galvão
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