BAGNO, Marcos. Nada Na Língua É Por Acaso - Por Uma Pedagogia Da Variação Linguística - Compressed
BAGNO, Marcos. Nada Na Língua É Por Acaso - Por Uma Pedagogia Da Variação Linguística - Compressed
BAGNO, Marcos. Nada Na Língua É Por Acaso - Por Uma Pedagogia Da Variação Linguística - Compressed
riedade
Outro) conceito muito importante na Sociolinguística é o de variedade lingiiísti-
ca Uma variedade linguística é um dos muitos "modos de falar" uma língua ,
Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da varia ção linguí stica
Emtodas essas palavras está presente o elemento -LETO tamb
( ém escrito às
vezes -LECTO), derivado do grego LéKSIS, palavra, ação
" de falar", de onde tam-
bém provém a palavra LéXICO.
fc
Nem tudo na língua varia
Ao falar da variação, dissemos que ela pode se verificar em todos
os níveis da
ístico-
língua : fonético-fonológico, morfológico, sintático, semântico, lexical, estil
pragmático. A essa altura, pode surgir uma dúvida: tudo o que existe numa
I
íngua pode estar em variação? A resposta é não.
á culo
rmos procurar a palavra vernáculo num bom dicionário, como o Houalss ,
nte vai encontrar o seguinte:
adjetivo
pró prio de um pa ís, naçã o, regiã o
Ex.: <língua v.> <costumes v. >
Derivação: sentido figurado.
diz-se de linguagem correta, sem estrangeirismos na pron ú ncia , vocabu-
lá rio ou constru ções sint á ticas; castiço
substantivo masculino
3 a l íngua própria de um país ou de uma região; l í ngua nacional , idioma
vernáculo
Ex.: o ensino do v.
O vernáculo parece ser, portanto, a fonte mais segura para a investigação dos
fenõmenos de mudança linguística que afetam determinada língua num dado
fe
momento histórico. Cada grupo social tem o seu vernáculo, isto é, o estilo que, na
variedade linguística própria dessa comunidade, representa a fala mais espontâ-
nea, menos monitorada, que emerge sobretudo nas interações verbais com menor
grau de formalidade e/ou com maior carga de emotividade. Labov, por exemplo,
Mas o que é mesmo variaçã o linguí stica ?
-
sugere, como estratégia para fazer emergir o estilo menos monitorado, que o
pesquisador pergunte a seu informante: "Você já esteve numa situação em que
se viu próximo de morrer?" As narrativas resultantes dessa pergunta trazem as
marcas mais características do vernáculo, uma vez que o falante, tomado pela
excitação da narrativa, presta menos atenção à forma como está falando e muito
mais atenção ao conteúdo do que está contando.
Por meio do estudo do vernáculo podemos identificar, por exemplo, quais são
as regras gramaticais que realmente pertencem ao português brasileiro con-
temporâneo, aquelas que são as mais usualmente empregadas pelas pessoas
em suas interações cotidianas. Ao mesmo tempo, podemos identificar quais
são as regras que estão deixando de ser usadas, caindo em obsolescência,
com probabilidade de desaparecer da língua num futuro pr óximo.
O vernáculo e o ensino
O conceito de vernáculo, tal como definido na Sociolinguística, pode ser
contribuição muito importante para a elaboração de estratégias de ens
Se já sabemos que determinadas regras gramaticais desapareceram da
normal, cotidiano, como fazer para que elas sejam aprendidas e apreend
por nossos alunos e alunas? Vale a pena insistir em ensinar coisas que qu
ninguém mais usa no dia-a-dia da língua?
Nada na lí ngua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguí stica
jmilLIE Q Gemo a gente vai ver no capítulo 8 sobre a mudança linguística, os gêneros
r xe scritos mais monitorados são o último refúgio dos usos linguísticos mais con-
Kr 35 Eivadores. É nos textos monitorados que esses usos sobrevivem por mais
p peta itemoo, antes de desaparecerem por completo. Ora, uma das funções
mais
importantes do ensino é precisamente dotar os alunos e alunas de recursos
pte lhes permitam produzir textos (orais e escritos) mais monitorados
stilisticamente, textos que ocupam os níveis mais altos na escala do prestígio
ui: locial. Daí a importância de reconhecer as formas linguísticas já desapareci-
as da fala espontânea, mas ainda exigidas socialmente na fala/escrita formal,
seoas | pera ensiná-las, no sentido mais literal do verbo ensinar , isto é, transmitir a uma
(DLci S pessoa um conhecimento que ela de fato não possui nem tem outro modo de
rrcie dqu rir a não ser pela educação formal, sistemática, programada.
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ter dinâ mico e mutante das situa ções de intera çã o verbal. Diante de uma
pi
amostra de língua em uso, os analistas costumavam (e ainda costumam)
atribuir a ela um rótulo único e fechado: " Esse é um exemplar de lí ngua
coloquial " ou de "língua culta " etc. Todos esses adjetivos sã o problemá ti-
cos, e vamos tratar deles nos próximos capítulos. Ser á entã o que existe
um modo diferente de analisar as situa ções de uso da língua, sem cair
nessas oposições extremadas? Existe, sim.
Uma das soluções para superar esse problema é a adoção do conceito de
continuum (uma palavra latina que podemos traduzir, para os nossos obje-
tivos, como "linha contínua ", "sequência que nã o se interrompe", e cujo
plural é continua , com sílaba tônica no TI). Em vez de imaginar a realidade
linguí stica dividida em duas ou mais variedades estanques, que n ã o
interagem umas com as outras, alguns sociolinguistas que trabalham na
vertente chamada interacional preferem investigar a situa ção de uso, o
momento em que ocorre a intera ção: quem está dizendo o quê, a querw
Rlis
onde, quando, dentro de que relações da hierarquia social, com que inten -
ção etc. ? Esses investigadores se concentram entã o muito menos nas ques
tões propriamente linguísticas, estruturais (fonético-fonológicas, morfossin
tá ticas etc.) e muito mais no modo como os atores sociais em cena a
valem desses recursos da língua para levar adiante sua tarefa comunica»
va. E onde é que entra a noção de continuum aqui?
A linguista e educadora Stella Maris Bortoni-Ricardo foi uma das primeiras pe
soas no Brasil a aplicar os postulados teóricos e metodológicos da Socioiij ^
guística (variacionista e interacional) às questões da educação em língua rn
terna. Depois de muitos anos de reflexão e intensa pr ática como professa
universitária, orientadora de pesquisas e formadora de docentes, Bortoni-Rican
construiu um modelo extremamente simples e ao mesmo tempo muito 4
para o estudo da variação linguística nas interações verbais, com ênfase n
interações em sala de aula. Neste modelo, a autora rejeita a análise polarizai
BE 111 '
+rural +urbano
+oral +letrado
- monitorado +monitorado
Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguí stica
!!
IE uma inuum rural-urbano diz respeito aos ante- É isso que explica , por exemplo, por
piram) ites sociais e culturais do falante: ter que tantos jovens nascidos e criados
~ gua na periferia de São Paulo, uma das
ido e vivido na zona rural (ou numa cidade
maiores aglomerações urbanas do
á ti- uiena ) ou ter sido criada numa grande mundo, usam o chamado “R caipi-
ste Slropole são fatores que influenciam muito a vi- ra” , antigamente restrito às cidades
cair do interior do estado e à zona rural
Sc oe mundo da pessoa, suas crenças e valores,
íE relação com o meio ambiente e, é claro, seu
— é provável que seus familiares te-
nham vindo do interior para a capi-
tzsde Bodo de falar a língua. Sabemos que há todo um tal mas n ão tenham podido se incor-
porar totalmente à cultura urbana e,
I obje - Bcaóulário e toda uma série de regras fonético- por conseguinte, incor- _
cujo Bioógicas e morfossintáticas que caracterizam porar plena -
etc.).
ti
IE :es -
.icontinuum oralidade-letramento nos indica se
a atividade verbal naquele
Bc :n- Lior-ento da interação está mais próxima das práticas orais ou mais próxi-
Ué na- irra das práticas letradas, ou seja, práticas que de algum modo se apoiam na
fcssora ieiTjra e na escrita. Durante uma mesma aula, por exemplo, a professora
ICE'do pode alternar entre esses dois tipos de práticas: quando se dirige aos alunos
Sr: útil P5'5 chamar sua atenção, para pedir alguma mudança de atitude deles, para
BE ~as cc r- :ar a eles alguma história ou comentar algum relato de experiência pes-
jrzada scal feito por eles, a professora está no universo da oralidade, e seu modo de
k :om Ifelar certamente vai trazer as marcas disso. Se, logo em seguida, ela começa
(a explicar algum conceito que está sendo estudado, usando a terminologia
própria da disciplina, ou se escreve algo na lousa e comenta, ou se lê em voz
alta um texto escrito, sua fala decerto apresentará características diferentes
|da que apresentava ainda há pouco. Por exemplo, na conversa com os alu-
nos ela pode dizer coisas como "pêxe", "bêjo", "falá", "as coisa ", "ocês",
Ttaemo", enquanto na atividade mais marcada pelas práticas de letramento Hl p ||
+ rural + urbano
+ oral
-O + letrado
- monit.
-Q> + monit.
( 2 ) [leitura] "O vento fo[r]te fez bate[r] a po[r]ta ve[r]de da casa de Má[r]cia ”
+ rural Q) + urbano
+ oral Q
( ) + letrado
- monit. 0 + monit.
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vai he ser muito útil para o trabalho e para a vida ! educação em
língua materna
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- Toda língua humana é heterogénea por sua própria natureza.
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í «er \ A heterogeneidade linguística está vinculada à hetero-
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geneidade social
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«h11/ Os elementos que determinam a variação podem ser de or-
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