Clarice Lispector - Legião Estrangeira
Clarice Lispector - Legião Estrangeira
Clarice Lispector - Legião Estrangeira
“O vertiginoso romance”, Gilda de Melo e Souza. In: Exercícios de leitura. São Paulo:
Ed. 34 – Duas Cidades, 2009.
Ensaio de Gilda de Melo e Souza sobre “A maçã no escuro”, mas que aponta
para algumas das tensões centrais na prosa de Clarice Lispector. O texto começa com a
colocação da escrita da autora dentro da posição social da mulher, destacando os
motivos sócio-históricos para as mulheres se apegarem a minúcia, detalhe, ao sensível
para elaborar o real.
Depois disso, mostra como esse apego e uso do detalhe mudam também a
relação com o tempo nessa prosa, voltado ao passado, da memória, bem como o espaço:
privado, individual, doméstico, afinal, o universo feminino seria o da lembrança: aquilo
que se retem de uma ação que já passou:
Da mesma maneira, Clarice usaria sua miopia para deslocar a apreensão do real
para a apreensão das essências e do tempo, usando o que há de secreto, nas emoções,
relações e seres, e o tempo é fragmentado como gomos de uma fruta em pequenas
durações. De onde derivaria, para Gilda, a obsessão de Clarice Lispector com a questão
do “instante”, marcado pelo uso de advérbios e locuções adverbiais: “o que a romancista
visa é apreender o instante exemplar, aquela ínfima parcela de duração capaz de
iluminar com o seu sentido revelador toda uma sequencia de atos” (p. 98).
A crítica literária também reflete sobre a tensão presente nesse desejo de captar o
instante: como fazer isso se a nossa própria percepção de mundo está sempre atrasada?
“se o próprio ato de apreensão destrói magicamente o objeto percebido” (p. 101). A
resposta para essa pergunta vai estar presente na própria tensão narrativa de Clarice
Lispector, a tensão entre uma aspiração e a impossibilidade de realizá-la, representada
pelas imagens que vão se multiplicando ininterruptamente, em uma astúcia verbal.
Gilda aponta também que para Clarice Lispector há uma complexidade atrás de
toda aparência e por isso é preciso virar a aparência pelo avesso e buscar a costura da
trama, que poderia denunciar o jogo dos fios (p. 102). Essa sua suspeita em relação as
aparências também é o que leva a autora a realizar ousados jogos de linguagem, criando
novas combinações entre as palavras (não era ódio – era amor ao contrário). Esses jogos
e montagens com a linguagem denunciariam a “procura insaciável de ajustamento entre
a expressão e o conteúdo” (p. 102).
Essas deformações que sobre Ofélia escancara como ela estava longe das
pulsões, fantasias e desejos infantis. Yudith também discorre da aproximação entre a
Ofélia de Shakespeare e a de Clarice.