Psicodrama

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PSICODRAMA:

A MATRIZ DE IDENTIDADE E OS GRUPOS1

Altivir João Volpe

INTRODUÇÃO
O Psicodrama é um método de pesquisa e intervenção nas relações
interpessoais, nos grupos, entre grupos ou de uma pessoa consigo mesma. A partir do
reconhecimento das diferenças e dos conflitos, apresenta outros significados ao que é
revelado no cenário dramático, expandindo os recursos disponíveis. Esse método é
bastante utilizado na educação, nas empresas, nos hospitais, na clínica e nas
comunidades. Ver a respeito, o site da FEBRAP (Federação Brasileira de Psicodrama) –
www.febrap.org.br (cursos, escolas de formação em psicodrama e outros links). Existem
perto de 4000 psicodramatistas no Brasil.

O Psicodrama é parte de uma construção muito mais ampla, criada por Jacob Levy
Moreno, a Socionomia. Na verdade, a denominação da parte foi estendida para o todo e,
quando as pessoas usam o termo Psicodrama, estão geralmente se referindo à
Socionomia. Ciência das leis sociais e das relações, a socionomia é caracterizada
fundamentalmente por seu foco na intersecção do mundo subjetivo, psicológico e do
mundo objetivo, social, contextualizando o indivíduo em relação às suas circunstâncias.
Divide-se em três ramos: a Sociometria, a Sociodinâmica e a Sociatria, que guardam em
comum a ação dramática – pensar, agir e sentir um acontecimento-experiência -- como
recurso para facilitar a expressão da realidade implícita nas relações interpessoais ou
para a investigação e reflexão sobre determinado tema.

A Sociometria, através do teste sociométrico, mensura as escolhas dos indivíduos e


as expressa através de gráficos representativos das relações interpessoais, possibilitando
a compreensão da estrutura grupal. A Sociodinâmica investiga a dinâmica do grupo, as
redes de vínculos entre os componentes dos grupos. Por sua vez, a Sociatria propõe-se à
transformação social, à terapia da sociedade.

A Sociodinâmica e a Sociatria têm objetivos complementares e se utilizam dos


mesmos recursos metodológicos: o Psicodrama, o Sociodrama, o Role Playing, o Teatro
Espontâneo e a Psicoterapia de Grupo. A diferença entre o Psicodrama e o Sociodrama
consiste em que no primeiro o trabalho dramático focaliza o indivíduo -- embora sempre
visto como um ser-em-relação -- e no segundo focaliza-se o próprio grupo. Neste diz-se
que “o protagonista é o grupo”.

A transformação social e o trabalho com a comunidade sempre foram o grande


sonho de Moreno. No começo do século XX, ele ia às praças e ruas de Viena e
relacionava-se com crianças e adultos, estimulando-os a descobrirem novas formas de
estar no mundo. A filosofia do momento, que embasa a teoria e a prática psicodramática,
foi sendo configurada através de sua observação do potencial criativo do ser humano.
Nesse sentido, pode-se dizer que o método psicodramático se baseia essencialmente na
fenomenologia existencial.

1
Texto introdutório com objetivos didáticos Teorias e Processos Grupais -- Prof. Altivir João Volpe, 2009.

1
Assim, o homem, a partir do impulso da espontaneidade, poderá desenvolver a
"centelha divina criadora" que traz em si mesmo. "É um gênio em potencial, que lutando
contra as conservas culturais, através da espontaneidade criadora, chegará a
assemelhar-se a Deus e encontrar sua liberdade". E se o homem não desenvolver essa
espontaneidade, ele adoece, continua Moreno.

A concepção fenomenológico-existencial entende que o existir humano é um viver


em coletividade, em interação compartilhada. Parte-se do princípio de que cada ser
humano desempenha uma variedade de papéis (na verdade, cachos de papéis) em
diferentes contextos e situações. Cada cultura se caracterizaria por uma variedade de
papéis que, em maior ou menor grau, são designados ou impostos aos membros de uma
determinada sociedade.

Encontra-se, assim, na concepção moreniana de homem como gênio que se


desenvolve a partir da espontaneidade, a dimensão do indivíduo, e na concepção de
homem como membro de um grupo inserido numa coletividade, a sua dimensão social
(como SUJEITO). O ponto de união entre ambas, para Moreno, encontra-se no conceito
de papel: "Todo papel é uma fusão de elementos particulares e coletivos, é composto de
duas partes: seus denominadores coletivos e seus diferenciais individuais."

Dessa maneira, como síntese unificadora, o papel - conceito social - conecta com a
espontaneidade, de conteúdo individual. Papel e espontaneidade caminharam juntos
desde os primeiros trabalhos de Moreno com seu teatro de improviso: "O desempenho de
papéis foi a técnica fundamental do teatro espontâneo vienense. Dada a predominância
da espontaneidade e da criatividade no desempenho de papéis, este foi chamado
"desempenho espontâneo-criativo", completa Moreno.

O principal objetivo da ação dramática é favorecer aos membros do grupo a


descoberta da riqueza inerente em vivenciar plenamente o statu nascendi da experiência
grupal, participando com a maior honestidade possível no momento. Desta maneira, os
participantes recriarão no grupo outros modelos de relacionamento, confrontando e sendo
confrontados com as diferenças individuais, condição necessária para apreenderem a
distinção entre sua experiência emocional e a dos outros, sendo cada um deles agente
transformador dos demais. A espontaneidade/criatividade pode ser aprofundada com o
conceito de matriz de identidade, base da teoria de desenvolvimento do Psicodrama –
apresentado mais adiante.

Nas últimas décadas, testemunhamos um resgate das origens do Psicodrama no


teatro e no social, com inúmeras contribuições para a metodologia psicodramática. Novas
modalidades do teatro espontâneo foram apresentadas para trabalhar questões humanas
mantendo a privacidade das pessoas, condição necessária para o trabalho educacional.

Resumidamente os objetivos do sociopsicodrama são:


• -- Resgatar a espontaneidade/criatividade;

• -- “A verdadeira segunda vez libera a primeira” (Moreno);

• -- Viver e ressignificar o já vivido. Ou... viver o não-vivido, experimentar no espaço


protegido do psicodrama (realidade suplementar)

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MATRIZ DE IDENTIDADE

A matriz de identidade é um dos eixos teóricos do Psicodrama, uma “teoria do


desenvolvimento”: fala de um processo de aprendizagem emocional com base em um
modelo relacional.
- O homem é um ser de relações: nós somos as relações que estabelecemos. Ou
seja, só há um EU em função do outro, o que implica interdependência,
complementaridade e reciprocidade.
- Quando nos relacionamos, damos ênfase à qualidade (como) nos relacionamos,
como se dá a comunicação.
- Princípio básico da fenomenologia existencial: o homem é compelido a se
relacionar – ele só existe enquanto confirma e é confirmado pelo outro.
- O NASCIMENTO define o primeiro ato espontâneo da criança (fazer-se abertura
ao mundo): não é um ato “traumático” (Otto Rank e a psicanálise). Antes, ocorre após um
grande “aquecimento” no decorrer de 9 meses.
- A matriz de identidade é, pois, um conjunto de processos relacionais que
ocorrem no nascimento e após este. Tais processos vão se sucedendo à medida que a
criança vai se desenvolvendo. Em suas obras, Moreno divide a matriz de identidade ora
em 3 fases, ora em 5. Um psicodramatista brasileiro, José de Souza Fonseca Filho em
sua obra Psicodrama da Loucura (1980), trabalha didaticamente com 10 fases, mostrando
tratar-se de um processo bem mais abrangente e complexo.
- Diz Moreno: “A matriz de identidade é a placenta social da qual o indivíduo se
nutre, interagindo com elementos seus e com os do meio”.

TRÊS FASES DA MATRIZ DE IDENTIDADE

1ª fase – Completa identidade – Indiferenciação – Fusão


- Mãe e filho estão envolvidos intensamente num mesmo ato.
- Nesse momento não existem pessoas nem objetos: existe leite, cuidados,
sensações, vivências cenestésicas...
- O filho vive “misturado” à mãe (não existe delimitação do si mesmo). Este
momento corresponderia ao que René Spitz chama “vivência oceânica”; “estado pré-
objetal”.
- A vivência é sentida como co-existência, co-ação e co-experiência.
- O mundo, o outro (a mãe, como um ego-auxiliar) encarrega-se de cuidar da
criança (esta não sobreviveria por si só).
- A criança é falada pela mãe (ego-auxiliar fundante): “ouvi o que você disse e
entendi que você quis dizer que...”. “isso eu interpreto, percebo como...”.
- O outro é uma parte da criança e o mundo tem a mesma identidade. Nesse
sentido, “a mãe é um caso particular de sua vida inconsciente” (Moreno).
- O mundo é sentido como descontínuo, momentâneo: sensações de prazer ou
desprazer...
- No decorrer de outras etapas do desenvolvimento humano, tais experiências
podem se repetir em outros contextos,. Assim, podemos pensar um grupo com as
características da 1ª. fase da Matriz de Identidade: predominam aspectos
fusionais/indiferenciados ou com dissociação do pensar, agir e sentir.
- Assim, podemos dizer que o início de um grupo é marcado muitas vezes pela não-
diferenciação eu-outro, havendo necessidade de o Diretor/Psicodramatista nomear,

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possibilitar certa integração e organização que vão aos poucos constituindo a rede de
sustentação grupal.

Técnica psicodramática apropriada a esse momento da Matriz:

- Moreno afirma que o método do duplo aparece descrito em O outro/O duplo, de


Dostoievski.
- No método do DUPLO, o outro (mãe, família, psicodramatista...) é um ego-auxiliar
do mundo relacional da criança. Forma-se como que um mundo auxiliar para uma criança
ou para um adulto. Existe aproximação corporal, gestual do universo inconsciente da
criança, do protagonista, do grupo...

Temos diante de nós dois indivíduos que, psicologicamente, parecem ser


uma e mesma pessoa. O duplo psicodramático é uma imitação do duplo
verdadeiro. Um dos indivíduos será o nosso terapeuta auxiliar, que
procura imitar o paciente como se fosse uno com ele. Se o paciente
estica o braço, o ego-auxiliar faz o mesmo; se abaixa a cabeça, o mesmo
faz o ego-auxiliar. (...) É uma pessoa auxiliar que está em condições de
se sentir na situação do paciente, inclusive através da mesma
manifestação corporal que ele mostra (MORENO, 1974: 115).

- A função dessa técnica é expressar sentimentos, idéias e emoções que a criança,


paciente ou grupo desconhece, não consegue expressar. Nessa ação estão presentes
mecanismos como imitação, identificação, transferência, projeção... Continua Moreno
(1974: 131):

O duplo é utilizado para se penetrar, com a ajuda de um ego-auxiliar, as


questões mais íntimas, profundas ou desconhecidas do protagonista. O
ego-auxiliar constitui-se como um segundo eu: atua como se fosse a
mesma pessoa e imita cada gesto e cada movimento do protagonista.
(...) Ele como que duplica o protagonista e com isso o ajuda a sentir-se a
si mesmo, a ver e a cuidar de suas questões.

- O duplo é utilizado com pessoas mais fechadas, solitárias, com um átomo social
empobrecido ou que se mostram confusas e misturadas a um outro (Por exemplo, no
início de um grupo; ou num grupo que se mostra desorganizado, bastante regredido).
Talvez essas pessoas (ou integrantes de um grupo) não estejam em condições de realizar
inversão de papéis, mas aceitarão um duplo. Segue um exemplo de duplo.
- Um adolescente inibido não consegue soltar sua agressividade em seguida a uma
cena em que se sentiu humilhado por seu pai. Um duplo (representado por um ego-
auxiliar ou pelo próprio Diretor), em contato com a agressividade reprimida, é chamado a
ficar ao lado do adolescente na cena dramática. À medida que o duplo desempenha seu
papel, o protagonista, aquecido em sua irritação, adere à situação, tornando-se
desnecessária a partir daí a atuação do duplo.

Conseqüências:

- Nessa fase, o cuidado e o reconhecimento maternos são fundamentais.


- A criança (ou adulto com tais características; ou um grupo em seus inícios)
depende em grande parte da abertura e acolhimento (holding) de um outro que
o ancore e sustente.

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- A criança desconhece seu corpo e sua inscrição na cultura e na sociometria
familiar.
- O corpo é vivido como disperso, parcial, sem unidade no tempo e no espaço.
- A maior parte das vivências são interoceptivas: predominam os mecanismos
incorporativos (ser acolhido, dependente, reconhecido, aceito -- acolher, conter, ter
disponibilidade para o outro).
- A persistência nessa fase pode resultar em vivências com características
psicóticas: chegar ao cosmos pela solidão, pelo vazio e não pelo encontro. Nessas
vivências, o indivíduo é o desejo do desejo do Outro (prolongamento e encerramento no
imaginário).
-
2ª fase – Reconhecimento do eu

- Existe uma aquisição de uma gestalt corporal e início do jogo lúdico (imitação).
- Com o amadurecimento neurológico, vai se formando uma identidade parcialmente
reconhecida (a criança -- e os membros de um grupo mais tarde -- começam a se
separar, a se diferenciar do outro, do mundo...).
- A criança (o adolescente, os membros de um grupo) concentra sua atenção no
outro e estranha parte dela mesma: começa a existir um não-eu (movimento centrípeto).
- Reconhecimento de “polaridades” (amor/ódio; carinho/agressão; pode/não pode...
- A criança começa a distinguir fome, dor, proximidade/distância; apego/desapego;
relação/solidão; interior/exterior; Eu/Não-eu...
- Vivência (embrionária ainda, é verdade) de ser uma unidade, de ter uma
identidade: o corpo se mantém único, apesar das variações internas e externas.

Técnicas apropriadas:

- O reconhecimento da própria imagem no espelho (“ele está aí”... “olha lá o


nenê!”... “sou eu!”) constitui a base da técnica do espelho – que corresponderia à 2ª. fase
da Matriz de Identidade.
- Tira-se o protagonista do cenário para poder VER-SE a certa distância, como em
espelho. O protagonista é um espectador, um observador de si mesmo. Ele é “retratado”
por um outro:

Um ego-auxiliar que o observou cuidadosamente representa-o no


cenário. O protagonista senta-se no lugar dos espectadores e vê uma
cópia de si mesmo, como se comporta quando levanta pela manhã, como
briga com sua mãe, como toma seu café e como se conduz nas
situações típicas de sua vida. Ele vê e talvez se ache estranho. A técnica
lhe dá a possibilidade de se ver como no espelho, de perceber seu
comportamento e daí retirar proveito terapêutico. (...) Esse método é
utilizado quando o protagonista não é capaz de se apresentar em
palavras e atos. Um ego-auxiliar fica no cenário, enquanto o protagonista
fica à distância, na platéia, junto ao grupo. O ego-auxiliar inicia então a
representação do protagonista. Imita sua maneira de se comportar, o que
diz, como diz; e ainda lhe mostra, como num espelho, como os outros o
percebem (MORENO, 1974: 117; 131).

- Outra técnica característica apropriada a essa fase é a do solilóquio (o sujeito


separa parte de si, para se ver em relação): “pense em voz alta, deixe virem os
pensamentos deste momento...”

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- O método do solilóquio foi muitas vezes empregado por dramaturgos, como
Shakespeare, com fins artísticos. No psicodrama, seu valor reside no (re)conhecimento
de si mesmo. Trata-se de um alargamento do Eu!
- Corresponde ao falar em off, próprio da linguagem teatral... Mantém o
aquecimento e o compromisso do protagonista com a ação; aprofunda seus sentimentos.
Existe um resgate dos pensamentos (o que é pensado e imaginado – MAS NÃO DITO),
os sentimentos e emoções...
- Nesse momento, a criança (e o adulto) é capaz de se ouvir, de ficar consigo
própria, de re-fletir (voltar-se para dentro, como um bumerangue...).
- O protagonista assume seus próprios sentimentos. Pode apropriar-se de suas
relações e escolhas.
- O solilóquio “é a reprodução de pensamentos e sentimentos escondidos através
de diálogos ou atuações colaterais, paralelos às cenas e idéias da ação principal. O
protagonista permanece em cena. O método permite ver reações pessoais do paciente a
seu papel principal” (MORENO, 1999: 123).

Conseqüências ou desdobramentos dessa fase:

- A aquisição e construção (com idas-e-vindas) em processo – nessa fase do


desenvolvimento – apontaria para características como “boa auto-estima”; “apropriação e
nomeação de si-mesmo”; “sou diferente dos outros”; “o meu mundo... meus espaços”...
- A vivência exacerbada ou reiterada nessa fase traria uma perspectiva euista de
vida: exaltação narcísica de si mesmo, megalomanias, onipotências várias (“julgo-me
capaz de tudo”; “sinto-me impotente se não consigo tudo”).
- Pintar-se em excesso, masturbar-se compulsivamentge, extravagâncias no modo
de ser ou de se apresentar... formas (exageradas) de dizer “EU EXISTO”, “OLHEM PARA
MIM...”. São como que tentativas de recuperar o próprio Eu que sente ameaçado,
desarticulado.

3ª fase – Reconhecimento do tu

- Dá-se um movimento centrífugo (voltar-se para fora, para o outro). É possível,


então, uma inversão de papel, método que Moreno retira dos diálogos socráticos.
- Descobrir o corpo do outro: examinar, explorar um objeto, perguntar sobre as
diferenças (o outro reage às iniciativas)
- A criança vive, segundo Moreno, “uma fome de atos”.
- Incluir-se do outro lado: capacidade da vivência de mutualidade e reciprocidade.
- Início da capacidade de simbolização, descoberta da dimensão intersubjetiva
(como ser em relação): incorporar o mundo que o rodeia.
- Expressa nível de maturidade e de saúde: índice diagnóstico.
- Fala da apropriada introjeção dos modelos relacionais.
- Maior ou menor facilidade para inverter papéis depende de maior ou menor
capacidade do fator tele.
- Revela que a Matriz de Identidade está se dissolvendo e sendo substituída pela
Matriz Social. Diz Moreno (1999: 109):

Admitimos, simbolicamente, que a criança se torna capaz de sair de si


mesma e se colocar no papel de sua mãe. Admitimos que esta se sinta
no papel de seu filho. O que é vivenciado intuitivamente, neste período
do desenvolvimento infantil, é pesquisado, concretamente, em problemas
semelhantes, pelo método da troca de papéis na cena psicodramática.

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Ao inverter os papéis com eles, o sujeito já está aprendendo muito a
respeito dessas pessoas, coisas que a vida, apenas, não lhe ensinou.
Quando ele pode ser as pessoas que alucina, não só elas perdem seus
poderes e feitiço sobre ele, mas ele ganha, para si, estes poderes. Seu
próprio eu tem a oportunidade de encontrar-se, reorganizar-se e juntar os
elementos que podem ter ficado separados por forças insidiosas, de
modo a integrá-los e conseguir a sensação de poder e de alívio, uma
catarse de integração (MORENO, 1992: 186).

Técnica apropriada a essa fase:

- O método correspondente por analogia a essa fase é a inversão de papéis. O


protagonista assume o papel de seu parceiro, daquele ou daqueles com os quais está
contracenando. A vivência interior simultânea dos dois papéis (por exemplo, pai e filho),
possibilita que o protagonista perceba diferentes perspectivas, tenha diferentes olhares
sobre aquela relação especifica. Ele pode ver-se tanto “através dos olhos do outro como
dos próprios olhos” (MORENO, 1974: 131).

Um exemplo: O protagonista, um funcionário de uma empresa, numa situação de


trabalho, contracena com um colega ou chefe (representados por um ego-auxiliar). Na
inversão de papéis, o funcionário representa agora seu chefe e este seu papel (de
funcionário). Podem vir à tona distorções nas percepções interpessoais e serem assim
exploradas e corrigidas na dramatização. O funcionário deve agora aquecer-se para ser
como seu chefe o sente e o percebe. O chefe, por sua vez, passa pelo mesmo processo.
Moreno chega a dizer que com a técnica de inversão de papéis dá-se o verdadeiro
ENCONTRO, o resgate da espontaneidade e criatividade – objetivos últimos do
psicodrama. Significa que duas ou mais pessoas se encontram não só para se
defrontarem entre si mas também para viver e experimentar-se mutuamente, como atores
cada um por seu direito próprio, não como um encontro “profissional” mas um encontro de
duas pessoas.
Diz Moreno (1999: 71-72):

Encontro significa estar junto, reunir-se, contato de dois corpos, ver


e observar, tocar, sentir, participar e amar, compreender, conhecer
através do silêncio ou do movimento, a palavra ou o gesto, beijo ou
abraço, tornar-se um só. A palavra encontro contém como raiz a palavra
contra. Abrange não apenas as relações amáveis, mas também as
relações hostis e ameaçadoras: opor-se a alguém, contrariar, brigar.
Encontro é um conceito em si, único e insubstituível.
(...) No começo era o ENCONTRO. E tu estás comigo, por isso
quero arrancar-te os olhos das órbitas, e colocar no lugar dos meus;
e tu arrancarás os meus olhos e os colocarás no lugar dos teus. E
então quero olhar-te com teus olhos e tu me olharás com os meus.
Assim nosso silêncio se serve até das coisas mis comuns e nosso
encontro é meta livre: um lugar indeterminado, em um momento
indefinido, a palavra ilimitada para o homem não cerceado.

Conseqüências:

- Diz Moreno (1999: 238-239): “A inversão de papéis aumenta a força e a


estabilidade do ´eu´ de alguém. Eu significa aqui tomada de consciência da identidade
consigo mesmo”.

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- Inversão de papéis leva a uma diminuição da dependência da criança dos pais.
Por outro lado, pode aumentar a capacidade da criança de dominar os pais.
- Freqüentes inversões de papéis da criança com indivíduos mais velhos (ou de
colegas de um grupo com outros integrantes) fortalecem sua sensibilidade para uma vida
interior que é mais rica que a sua. Moreno denomina tal percepção de tele. Ou seja:
percepção interna mútua entre duas pessoas.
- O método da inversão de papéis é mais eficaz quanto mais próximas, do ponto de
vista psicológico e social, duas pessoas estão: mãe-filho; marido-mulher; professor-aluno;
pai-filho...
- A inversão de papéis é um método eficaz para aproximar socialmente grupos
culturalmente estranhos. Quanto maior a “distância social” entre dois grupos sociais, mais
difícil se torna a utilização da inversão de papéis. Nessa perspectiva, seria mais difícil um
brasileiro inverter o papel com alguém de um país do Oriente Médio...
- A inversão de papéis é indispensável para a investigação de relações
interpessoais e para a investigação dos pequenos grupos.
- Interessado em resgatar a percepção télica do outro, Moreno deteve-se em
fenômenos que ocorriam em ligações profundas entre pessoas e grupos. Para ele, os
estados co-inconscientes e co-conscientes são aqueles que os participantes
experimentam e produzem conjuntamente e que, portanto, são podem ser reproduzidos e
representados conjuntamente. Portanto, sentimentos, vivências e fantasias comuns a
duas ou mais pessoas (pai-filho; mãe-filho; terapeuta-paciente; professor-aluno; marido-
mulher...), e que se dão em estado inconsciente.
- A inversão de papéis é perigosa e, eventualmente, contraindicada quando o eu de
uma pessoa é diminuto e o da outra é altamente estruturado. Um exemplo disso é o que
acontece com pacientes psicóticos. Moreno afirma que eles gostam de desempenhar
papéis de pessoas autoritárias, policiais, enfermeiros, chefes, médicos ou de pessoas
ideais. Dramatizam com prazer, por exemplo, Deus. Quando estão, entretanto, em
contato com a pessoa real que corporifica a autoridade, recusam o contato íntimo e a
inversão de papel.
- Dificuldade de inverter papéis: checar em qual ou em quais papéis.
- Quanto maior o nível ou depositação transferencial, maior dificuldade de inverter
papéis.
- Essa dificuldade indicaria maior comprometimento em fases anteriores: evidencia
a própria estrutura das relações sociais; forma como essa estrutura se particulariza no
interior das relações familiares.
- A diferença entre saúde e doença é uma questão de caminho, de direção. O que
adoece é a relação, a dimensão inter.

Desdobramentos: Internalização do modelo relacional

- As primeiras relações são básicas para as posteriores. Não só pai/mãe, família


mas o mundo em volta também.
- No psicodrama, o corpo encontra seu fundamento existencial, núcleo da
espontaneidade e criatividade.
- As experiências vão sendo inscritas, registradas.
- Mais importantes que o fato é a repercussão, o registro, o significado do mesmo.
- Como conseqüência, vão ficando marcas mnêmicas (como memória).
- Nos primeiros anos de vida, maior sensibilização. Daí a importância de conhecer o
locus: em relação a quem, a qual vínculo uma conduta se instala. Conhecer sua matriz:
para quê foi inscrita essa conduta, quais os mandatos delegados. Conhecer o statu
nascendi: o processo de evolução dessa conduta.

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- Conforme as vivências, teremos em cada fase da Matriz de Identidade um tipo de
moldagem, de inscrição, de registros.
- A Matriz de Identidade é a matriz afetiva primária. Esta vai se dissolvendo,
favorecendo maior autonomia à criança.
- O trabalho psicodramático pode se tornar a matriz afetiva substitutiva
secundária: outras possibilidades de viver o não-vivido; repetir “diferenciando”.
- Diz Moreno (1974: 120):

Cada verdadeira segunda vez é uma liberação da primeira. (...) Assume-


se o aspecto de criador da própria vida, de tudo o que se fez e se faz;
chega-se à sensação da verdadeira liberdade... (...) No palco, a segunda
vez é aparentemente falada, comida, bebida, procriada, dormida, lavada,
escrita, discutida, disputada, ganha, perdida, morrida. Mas a mesma dor
não mais age sobre os atores e espectadores com dor, o mesmo desejo
como desejo, o mesmo pensamento como pensamento, mas tudo é sem
dor, sem consciência, sem pensamento, sem morte (GRIFOS NOSSOS).

- Nesse sentido, a experiência psicodramática pode ser uma nova reinscrição, uma
nova rematrização.
É possível observar e compreender todos esses movimentos que ocorrem no
decorrer do desenvolvimento humano e, analogamente, nos diferentes percursos do
processo de um grupo.

A seguir, também de forma didática (e bastante esquemática), é apresentada


a configuração metodológica de uma sessão de psicodrama.

A SESSÃO DE PSICODRAMA
Uma sessão de psicodrama compõe-se de 5 instrumentos, 3 etapas e 3
contextos, descritos na seqüência. Comecemos pelos contextos.
Estes são encadeamentos de vivências pessoais e coletivas, de pessoas que interagem
numa situação ou contingência espaço-temporal.

1. Contexto social:
- Realidade social “tal qual é”;
- Tempo cronológico como o conhecemos: “isso ocorre às 9:40 da manhã!”
- Espaço das leis, normas e valores
- É a matriz social. Corresponde ao átomo social de alguém: pai; mãe, irmãos,
colegas de faculdade; vizinhos... “Estou em São Paulo, moro na rua tal... “

2. Contexto grupal:
- É a realidade de um grupo tal como é;
- Tempo cronológico é definido em um espaço (“setting”): “toda 2ª. feira pela
manhã nos reunimos com essas pessoas para realizar um determinado projeto ou tarefa”.
- Corresponde ao enquadre de uma sessão, por exemplo: situações definidas e
objetivos específicos: “uma miniatura da família, da sociedade, dos grupos sociais...”, diz
Moreno.
- Estrutura desvinculada de modelos controladores, coercitivos e destrutivos (na
verdade, os costumes, normas e leis são aqueles definidos para aquele grupo ou relação
terapêutica).

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- O contexto grupal é constituído pelo psicodramatista, protagonista, membros do
grupo e egos-auxiliares (quando houver)
- Estudado pela sociodinâmica e pela sociometria: nova matriz de identidade.
- Espaço do co-inconsciente.
- Aqui o compromisso é total: existem conseqüências mas com maior liberdade,
tolerância e compreensão (do que no contexto social).
- A partir do aquecimento específico e das escolhas sociométricas dos integrantes
o grupo, é neste contexto que surge o protagonista.

3. Contexto dramático:
- É a realidade dramática no “como se” do imaginário, da fantasia.
- O tempo é fenomenológico, virtual... o campo é relaxado, devido ao
aquecimento experimentado.
- O espaço é aberto, delimitado, “protegido”; espaço da espontaneidade, da
criatividade, do “homem cósmico”.
- Criam-se e recriam-se papéis.
- Trabalha-se a um só tempo o passado, presente e futuro.
- No “como se” o protagonista tem uma idade, sexo, aparência, roupa, maneira de
se comportar, voz, gestos definidos, definidos pelo protagonista...

E os instrumentos? São o meio, a forma empregada na execução do método e das


técnicas psicodramáticas – cenário, protagonista, auditório/platéia, diretor e ego-auxiliar.

1. Cenário:
- espaço multidimensional e móvel onde ocorre a ação dramática, projetado de
acordo com as necessidades terapêuticas.
- Pode ser um tablado, um tapete, um espaço delimitado por giz, o espaço central
da sala... Ou uma praça, a sala de estar de uma casa, uma sala de reuniões da
empresa...
- A decoração do ambiente é constituída antes por convenções estabelecidas
entre o diretor e o protagonista do que por um arsenal de objetos materiais “fiéis” à
realidade social. Pode haver luzes, música, recursos cênicos do teatro, como máscaras,
panos, roupas... Uma almofada pode representar a mesa da sala de jantar; um lenço
pode ser uma pintura situada na parede e...
- Visa criar um clima afetivo para as cenas. A ação se dá num lugar, num tempo e
entre sujeitos que têm um corpo total e maneiras de agir em conjunto.
- Constitui o campo da ação dramática. Diz Moreno (1974: 107):
É uma ampliação da vida, além da vida real. Realidade e fantasia não
estão em contradição, mas ambas são funções dentro de uma esfera
mais vasta, o mundo psicodramático de objetos, pessoas e
acontecimentos. Aqui o pai de Hamlet é exatamente tão real e tem tanto
direito a existir quanto o próprio Hamlet. Ilusões e alucinações ganham
forma através da corporificação no cenário e são colocadas em igualdade
de condições com percepções normais... permitem descontração,
movimento e plasticidade à ação.

2. Protagonista:
- Surge no contexto grupal, a partir das escolhas sociométricas feitas pelos
integrantes do grupo no decorrer do aquecimento.

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- Etimologicamente, é o principal, o que “primeiro combate” (= em grego, agon
significa combate); aquele membro do grupo que emerge para a ação dramática,
simbolizando os sentimentos comuns que permeiam o grupo, recebendo por parte dele o
consentimento, o compromisso afetivo para representá-lo, a partir de escolhas
sociométricas.
- É o autor e ator do Drama, aquele em quem a “zona de problemas” (cenas
temáticas) for a mais intensa, aquele cuja cena “latejar” e ressoar mais naquela sessão.
Diz Moreno (1974: 107):

Exige-se dele que se represente a si mesmo no cenário, que esboce o


seu próprio mundo. Diz-se-lhe que seja ele mesmo e não um ator de
teatro, enquanto se exige do ator de teatro que sacrifique seu próprio eu
para o papel que o dramaturgo prescreve. (...) Deve atuar livremente,
como lhe vier à cabeça, por isso lhe é necessária liberdade de expressão
– ou seja, espontaneidade. A palavra é introduzida com toda sua
extensão, na dramatização. (Grifos nossos)

- Um exemplo do que é um protagonista é a fala de Édipo-rei, logo no início da


tragédia de Sófocles de mesmo nome. Diz ele: “vocês sacerdotes, como representantes
do povo, combatem e lutam por vocês e pelo povo. Eu, como rei de Tebas, luto, combato
por vocês, pela cidade e por mim. Eu vou descobrir o assassino do rei Laio”.

3. Diretor, Terapeuta, Psicodramatista:


- Cabe ao diretor manejar as técnicas psicodramáticas, como recursos de ação,
para garantir o envolvimento do grupo e a escolha da cena protagônica, que refletirá a
experiência dos presentes. Ele vai convidando todos para participarem na criação
conjunta do enredo, favorecendo a emergência da realidade grupal.
- O Diretor coordena a sessão, é o “delineador”, o organizador das cenas a serem
dramatizadas pelo protagonista. O psicodramatista desempenha três funções:
- a) diretor de cena propriamente dita: promove o aquecimento buscando a
melhor direção para a realização do Drama;
- b) terapeuta do protagonista (e do grupo, se houver): atento à interação com o
protagonista e aos sentimentos, emoções e pensamentos que ocorrem nessa interação.
- c) analista social: juntamente com os egos-auxiliares (quando houver) comenta
com o protagonista, na fase de compartilhamento, ou nos momentos que lhe parecerem
oportunos, o que compreendeu da situação vivida em cena.

4. Ego-auxiliar:
- “Cada pessoa é um auxiliar terapêutico para o outro. Um grupo é um agente
terapêutico para outros grupos” (MORENO, 1974: 31)
- É um terapeuta auxiliar que interage em cena com o protagonista.
- É um “prolongamento” do ego do paciente; também um “prolongamento” do
Diretor ou Terapeuta.
- O ego-auxiliar desempenha três funções:
- a) ator: é um co-ator, representa papéis, estando pois habituado a utilizar seus
iniciadores (físicos, verbais, mentais) e a colaborar na manutenção do aquecimento
específico.
- b) auxiliar do protagonista: facilita o compromisso dramático do protagonista na
medida em que participa diretamente do trabalho no cenário. Ajuda a criar o clima e
intensidade afetiva requerida para a cena, para aquele papel, etc.

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- c) observador social: observa as inter-relações da microssociedade reproduzida
em cena (observador participante). Diz Moreno (1983: 212):

Os agentes terapêuticos cruciais são os ego-auxiliares. São assistentes


do terapeuta principal mas, ao mesmo tempo, estão intimamente
relacionados ao mundo do paciente. (...) assumem deliberadamente o
papel que o paciente precisa ou deseja que ele assuma. O êxito da
intervenção depende de quão bem o terapeuta auxiliar seja capaz de
encarnar a pessoa com a qual o paciente deseja encontrar-se.

5. Público,auditório, platéia:
- Conjunto de participantes da sessão psicodramática (se se tratar de um grupo)
- É a caixa de ressonância, o protagonista coletivo. Assemelha-se ao coro que
aparece nas tragédias gregas. Diz Moreno (1975: 19):

O público se reveste de uma dupla finalidade. Pode servir para ajudar o


paciente ou, sendo ele próprio ajudado pelo sujeito no palco, converte-se,
então, em paciente. Quando ajuda o paciente, é um sólido painel de
opinião pública. Suas respostas e comentários são tão extemporâneos
quanto os do paciente e podem variar desde o riso ao violento protesto.
Quando mais isolado estiver o protagonista, por exemplo, porque o seu
drama no palco é formado por delírios e alucinações, mais importante se
torna para ele a presença de um público disposto a aceitá-lo e
compreendê-lo. Quando o público é ajudado pelo sujeito, assim se
tornando o próprio sujeito, a situação se inverte. O público vê-se a si
mesmo, isto é, um de seus síndromes coletivos é retratado no palco.

Por fim, a sessão psicodramática ocorre em três etapas: aquecimento,


dramatização e compartilhamento (em inglês, sharing). Falemos da cada uma delas.

1. Aquecimento (em inglês, warm up):


- A prática psicodramática, em suas inúmeras modalidades, começa pelo
envolvimento das pessoas com o tema ou com a experiência a ser vivenciada, através de
lembranças ou histórias do cotidiano dos indivíduos e/ou das organizações.
- O aquecimento é o momento em que se dá a escolha do tema, do protagonista
e a preparação para a dramatização. Ele favorece a participação de todos os integrantes
do grupo: favorece a interação e a centralização da atenção; diminui a tensão.
- No aquecimento utilizam-se “iniciadores” (alguns livros chamam de “arranques”).
Por exemplo, iniciadores físicos (andar na sala, movimentar-se, tocar-se, dançar, correr,
entrar em contato com os cheiros, sons, etc.), verbais (falar – no contexto grupal ou no
contexto dramático propriamente dito); mentais (imaginar, “viajar”, “navegar” em outros
tempos, cidades, países, situações...)
- O aquecimento tem dois momentos: um mais inespecífico (coincide com o início
da sessão, ou até antes se quisermos, desde que as pessoas se mobilizaram para vir à
sessão; ou, desde a última sessão, como uma ressonância, prolongamento daquela:
“durante a semana pensei algumas vezes naquele comentário, naquela sua fala...”
- O aquecimento inespecífico termina com a escolha do protagonista e de uma cena
ou situação a ser dramatizada (contexto grupal). E o aquecimento específico, voltado
imediatamente à preparação do protagonista para a ação dramática ou para o
desempenho de um papel característico, bem definido.

2. Dramatização:

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- É o núcleo da ação dramática.
- O protagonista começa a representar no contexto dramático as “figuras” de seu
mundo interno, presentificando seu conflito no cenário (é o passado no presente).
- O ego-auxiliar ajuda o protagonista a perceber vários aspectos dos elementos
presentes na ação dramática. Daí a importância da proximidade física e, sobretudo, do
compromisso afetivo do ego-auxiliar.
- Termina com a elucidação, encaminhamento ou resolução do conflito trazido.

3. Compartilhamento:
- Fase em que existe participação terapêutica do grupo: momento da “catarse do
grupo”: “me identifico com você em tais e tais aspectos!”. “Minha vida é muito parecida
com a sua”... Existe uma responsabilização conjunta.
- Cada participante expressa aquilo que o tocou, mobilizou, com quais aspectos
ele se identifica com o protagonista, sentimentos nele despertados.
- É como se fosse uma “caixa de ressonância” afetiva, um compartilhamento,
“dividir” com o protagonista as lutas, tristezas, perspectivas, fatos, acontecimentos...
- Não deve se confundir com um momento em que se diz o que o protagonista
deveria fazer, “seria melhor....”, “se fosse...” (como quem fica na arquibancada assistindo,
“voyeur exibicionista”, sem se comprometer afetivamente...).

Alguns autores falam uma 4ª etapa da sessão de psicodrama: elaboração e


processamento.
- A elaboração pode se dar após o compartilhar ou no início da sessão seguinte. O
psicodramatista rememora com o protagonista o ocorrido na dramatização, auxiliando a
entender os conteúdos expressos, relacionando-os ao processo terapêutico.
- O processamento só ocorre em psicoterapias ligadas ao ensino de Psicodrama.
Seria uma espécie de elaboração “técnica” da sessão e dos processos individuais ou
grupais.

LEMBRETE:
A seguir, algumas das muitas idéias que Moreno criou, desenvolveu ou enfatizou
(apud GERSHONI, Jacob. Psicodrama no século 21: Aplicações clínicas e educacionais. São
Paulo: Summus, 2008):

1. O homem como ator, autor e produtor, que desempenha papéis.


2. O eu emerge dos papéis que vão se constituindo aos poucos, formando cachos de
papé3. O eu como construto interpessoal, mais do que pessoal (“nós somos as relações
que estabelecemos”).
4. A espontaneidade, e a decorrente criatividade, como força impulsionadora do
desenvolvimento humano.
5. O fator “tele”, que opera nas relações sociais como força existencial (em contraposição
ao modelo transferencial).
6. A estrutura grupal co-determina o comportamento no papel e pode ser avaliada pelos
participantes (sociometria).
7. O trabalho psicodramático utiliza tanto a ação quanto à verbalização: “mostrar e contar”
é mais completo do que simplesmente contar.
8. O diretor é um produtor ativo da cena em um processo de co-criação com o
protagonista.
9. A metodologia psicodramática se aplica a casais, famílias, grupos naturais e artificiais e
organizações... tanto quanto a indivíduos.

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10. O trabalho psicodramático é essencialmente trabalho de grupo: o indivíduo não pode
ser compreendido sem que se leve em conta seu átomo social.
11. A alegria, a criatividade e o riso são vitais para a existência humana e, como tal,
devem integrar as diferentes práticas psicodramáticas.

PARA CONHECER MAIS

ALMEIDA, Wilson C. de (org). Grupos: a proposta do psicodama. São Paulo: Agora, 1999.

_____. Psicoterapia aberta – O método do psicodrama, a fenomenologia e a psicanálise.


São Paulo: Agora, 2006.

BARBOSA, Isabel R.B. “Sociodrama multifamiliar tematizado: humanizando o


atendimento aos indivíduos portadores de transtorno psíquico”. Revista Brasileira de
Psicodrama, 2004.

BUSTOS, Dalmiro M. O psicodrama. São Paulo: Summus, 1980.

_____. Psicoterapia psicodramática. São Paulo: Brasiliense, 1979.

CUKIER, Rosa. Psicodrama bipessoal – sua técnica, seu terapeuta e seu paciente. São
Paulo: Ágora, 1992.

_____. Palavras de Jacob Levy Moreno: vocabulário de citações do psicodrama, da


psicoterapia de grupo, do sociodrama e da sociometria. São Paulo: Agora, 2002.

DIAS, Victor R. G. S. Psicodrama – teoria e prática. São Paulo: Ágora, 1987.

DURIC, Zoran; Velijkovic, Jasna; Tomic, Miomir. Psicodrama em HQ: iniciação à teoria e à
técnica. São Paulo: Daimon, 2005.

FLEURY, Heloisa J. e MARRA, Marlene M. (orgs.). Grupos – intervenção socioeducativa


e método sociopsicodramático. São Paulo: Ágora, 2008.

_____. Práticas grupais contemporâneas – A brasilidade do psicodrama e de outras


abordagens. São Paulo: Agora, 2006.

_____. Intervenções grupais na saúde. São Paulo: Agora, 2005.

_____. Intervenções grupais na educação. São Paulo: Agora, 2005.

_____. Intervenções grupais nas organizações. São Paulo: Agora, 2005.

FLIT, Eduardo. “Psicologia comunitária e psicodrama – uma experiência em uma


instituição de moradores de rua”. Trabalho de conclusão de curso – Faculdade de
Psicologia da PUCSP, 2001.

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FONSECA Fº, José de S. Psicoterapia da relação. São Paulo: Ágora, 2000.

_____. Psicodrama da Loucura. São Paulo: Ágora, 1980.

MARINO, Marília “Ética, cidadania e educação”. In VÁRIOS AUTORES. A ética nos


grupos: contribuição do psicodrama. São Paulo: Agora, 2000. Texto tb disponível on line.

MASCARENHAS, Pedro. “El Psicodrama de Adolf Hitler, un paradigma de grupo em la


perspectiva psicodramatica y su relación con la multiplicación dramática”. Disponível no
site www.campogrupal.com/pedro.html

MIYAHARA, Rosemary P. “Oficinas com crianças e adolescentes: uma experiênia


psicodramática na prevenção à violência intrafamiliar”. In: FERRARI, Dalka (org). O fim do
silêncio na violência familiar. São Paulo: Agora, 2002.

MORENO, Jacob Levy. Psicoterapia de grupo e psicodrama. São Paulo: Mestre Jou,
1974.
______. Psicodrama. São Paulo: Cultrix, 1975.

______. Psicoterapia de grupo e psicodrama. Campinas: Livro Pleno, 1999.

______. Fundamentos do psicodrama. São Paulo: Summus, 1983.

______. Quem sobreviverá? Fundamentos da sociometria, psicoterapia de grupo e


sociodrama. Goiânia: Dimensão, 1992, v. 1.

MOTTA, Júlia M.C. O jogo no psicodrama. São Paulo: Agora, 1995.

SANTANA, Ronaldo P. de. “Creche: local singular para o desenvolvimento de trabalhos


voltados ao combate à violência intrafamiliar contra crianças”. In: FERRARI, Dalka (org.) o
fim do silêncio na violência familiar. São Paulo: Agora, 2002.

SEMINOTTI, Nédio. “Psicodrama”. In ZIMERMAN, David. Como trabalhamos com grupos.


Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

VIEIRA, Leila M.P. “Processo grupal psicodramático – Teoria e prática no contexto


educacional”. Mestrado em Psicologia da Educação. São Paulo: PUCSP, 1992.

VOLPE, Altivir J. Édipo: psicodrama do destino. São Paulo: Ágora, 1990.

Ver também o site www.febrap.org.br (abrir “aplicabilidade”). Existe um resumo de


diferentes aplicações ou situações práticas do Psicodrama (psicoterapia, educação,
saúde, comunidade, instituições, organizações...).
ajvolpe/ago. 2009.

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