A Proposta Multirrede-Discursiva

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

A PROPOSTA MULTIRREDE-DISCURSIVA:
ANTECEDENTES, DESCRIÇÃO GERAL E EXEMPLOS

Silvana Serrani
(UNICAMP/CNPq)

Introdução

A Proposta Multirrede-Discursiva (MR-D) é a sistematização de


um conjunto de parâmetros relativos aos domínios cultural, linguístico-
discursivo e didático, que orienta a seleção, complementação e abor-
dagem de conteúdos, para a formação na área de língua(s) pela via da
discursividade. Essa relação direta com uma perspectiva discursiva da
linguagem1 não estava na rica Proposta Multidimensional do pesquisador
canadense H. H. Stern2, na qual originalmente me apoiei para desenvolver
a Multirrede-Discursiva. Para tanto, contei também com o estimulante
trabalho do linguista aplicado francês Daniel Coste3. Neste capítulo,

1 Considero a perspectiva discursiva a partir do que se denominou a terceira época da Análise


do Discurso, na qual começaram a ser fundamentais as alternâncias de análises linguísticas
(sistema da língua) e da heterogeneidade enunciativa na abordagem dos funcionamentos
discursivos das formulações, consideradas a contextualização sociocultural e as posições
argumentativas dos enunciadores, defendidas na enunciação (PÊCHEUX, 2014, p. 311-314).
2 O currículo multidimensional de H. H. Stern (1993) introduziu um grande avanço, principal-
mente no que se refere à pluralidade de dimensões nos planejamentos, mas cabe apontar que
um de seus pressupostos teóricos era o comunicativismo, perspectiva teórico-aplicada distante
do enfoque conceitual discursivo, que será desenvolvido e especificado ao longo deste volume.
3 Daniel Coste, que, em 1998, discutiu a abordagem multidimensional em função dos estudos
e práticas do plurilinguismo, veio como professor visitante à Unicamp, a convite meu e da
colega Maria José Coracini. Eu partilhei com ele, anos depois, atividades acadêmicas na École
Normale Supérieure de Lyon, França. Resultados desse trabalho, no qual eu introduzi conceitos
da Análise do Discurso, foram publicados em Serrani, 2005.

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especifico em quais pontos continuo seguindo a base original dos men-


cionados autores e em quais me afasto, propondo novas perspectivas4.
Quanto ao trabalho plural de dimensões ou componentes sigo Stern,
pois continuo achando, como ele, que os enfoques do ensino de língua
pautados em uma única dimensão – seja linguística, seja cultural e na
concepção teórica predominante que for – são insatisfatórios5. Mas, como
será explicado a seguir, o enfoque interdependente e dialógico-discursivo
desses componentes é singular nesta MR-D, que se propõe como um guia
de contribuição para realizar sistemática e gradativamente:

a) análises de materiais didáticos;

b) seleções de recursos textuais ou multimodais diversos, para comple-


mentações organizadas em suportes diferentes;

c) planejamentos de aulas ou de cursos completos e

d) atividades práticas em sala de aula e fora dela, em cursos de língua-


discurso/cultura.
Os três componentes da Proposta Multirrede-Discursiva (MR-D)

I. Componente intercultural multirrede-discursivo


Ele corresponde aos conteúdos de contextualização territorial,
social e histórico-cultural de enunciados e textos (orais ou escritos, em
qualquer suporte), mobilizados no ensino de língua(s), com consideração
da diversidade cultural, tanto no caso de línguas diferentes como no de
uma mesma língua. Para este componente proponho desenvolvimentos,

4 Tenho apresentado esses desenvolvimentos à comunidade acadêmica em diversos congressos


científicos nacionais e internacionais. Assim, antecedentes da Proposta Multirrede-Discursiva
foram publicados, por exemplo, em Serrani, 2008, 2010, 2014 e, recentemente, no INPLA
2018 - congresso Intercâmbio de Pesquisas em Linguística Aplicada, na PUC-São Paulo, onde
apresentei uma versão preliminar do trabalho que se encontra, aprimorado, no último capítulo
deste livro.
5 Uma discussão detalhada sobre as limitações dos enfoques unidimensionais encontra-se em
Serrani, 2010, p. 30.

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a partir dos avanços dos Estudos Culturais, da Teoria do Discurso e da


Linguística Aplicada em perspectiva transdisciplinar, que serão detalha-
dos ao especificar os seus elementos constituintes6.

II. Componente de língua-discurso e gêneros discursivos7


Ele refere-se aos conteúdos do sistema da língua a ser ensinada/
aprendida e de sua enunciação, considerando seu pertencimento a gêneros
discursivos e a esferas sociais específicas8.

III. Componente de práticas de linguagem(ns) em oficinas multirrede-


discursivas
Ele diz respeito ao planejamento, elaboração e realização de práticas
de ensino-aprendizagem de língua-discurso, principalmente na forma
de oficinas9, dando-se atenção a articular os conteúdos previstos nos
dois componentes anteriores a este, com práticas de compreensão e de
produção linguístico-discursiva.

6 Realizei essa pesquisa aplicada transdisciplinar (sobre esse enfoque que articula discipli-
nas, ver Serrani, 1990; Kleiman, 1992), mobilizando conceitos e procedimentos da terceira
época da Análise do Discurso de linha francesa, da teoria cultural inglesa e dos estudos de
subjetividade-linguagem que operam com a hipótese do inconsciente. Uma exposição sintética
dos principais conceitos propostos em estudos clássicos da Análise do Discurso, que, no meu
entender, continuam sendo válidos hoje, consta na primeira parte do artigo que publiquei on
line, na revista Eutômia da UFPe (SERRANI, 2012, p. 360-364). Quanto à discussão teórica
sobre subjetividade e tomada da palavra em língua estrangeira, com um exemplo sobre leitura
de texto em inglês, pode ser consultado Serrani, 2003 (atualmente on line). Dentre as refe-
rências clássicas nas três áreas do conhecimento referidas acima, consultar: Pêcheux, 2014,
2015 [1983, 1984]; Orlandi, 2006, 2012 [1983, 1988]; Authier-Revuz, 1990; Eagleton, 2005a
[2000], 2005b [2003]; Brait, 2006.
7 Embora possa parecer redundante repetir a palavra “discursivos”, preferi insistir para remeter
claramente à visão processual bakhtiniana da noção de gênero, que, como se sabe, não con-
sidera apenas a distinção segundo características formais dos textos, mas também em função
das esferas sociais e as posições defendidas pelos enunciadores nos processos de produção e
compreensão de sentidos.
8 Para as bases da concepção dialógica dos gêneros discursivos, ver Bakhtin, 2000 [1979] e
também a ponte que Authier-Revuz (1995) fez entre o dialogismo e a terceira época da Análise
do Discurso e os estudos em Brait 2005 e 2006. Para uma interessante discussão sobre um
caso de hibridez genérica, ver Palma, 2015.
9 A pesquisa teórica e aplicada de Angela Kleiman - especialmente, no tocante à leitura e a
diferentes letramentos na escola considerando esta instituição enquanto principal agência de
letramento de uma sociedade - tem mostrado a relevância das atividades de oficina no ensino
da linguagem (KLEIMAN, 15. ed, 2017 [1993]; KLEIMAN, 1995; KLEIMAN; SEPÚLVEDA,
2012).

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Constituintes internos de cada um dos componentes da MR-D: descrição


e exemplos

A rigor, os “componentes” da Multirrede-Discursiva funcionam como


verdadeiros parâmetros para a realização das atividades mencionadas no
final da Introdução e a articulação organizada entre objetivos e resultados
das mesmas. A proposta propicia que seja dada atenção cuidadosa aos
conteúdos de cultura, com consideração especial da literatura (sem ex-
cluir, obviamente, outras expressões artísticas, mas procurando dar foco
à linguagem verbal). A grade de constituintes detalhada a seguir, além da
sua vantagem para organizar os conteúdos em planejamentos e práticas,
pode facilitar a avaliação de resultados, pois esta última costuma ser um
desafio para o docente, especialmente no tocante aos conteúdos de cultura.

I. O componente intercultural multirrede-discursivo


Em um planejamento MR-D é preciso que os enunciados, textos,
imagens ou outras expressões estejam adequada e explicitamente situados
quanto a algo que pode parecer óbvio, mas que nem sempre está com o
relevo que merece:

I.a – Prioridade no planejamento de territórios, espaços e momentos


histórico-culturais nos materiais didáticos e paradidáticos
Este constituinte assinala a pertinência de que o professor de língua
enfoque e organize os territórios aos quais correspondem os textos e
outros recursos a serem utilizados. Isso é desejável, inclusive, antes de
realizar-se o conhecido planejamento dos temas linguístico-discursivos a
serem ensinados (tais como “expressão do tempo passado em diferentes
gêneros discursivos”, “enunciado e funcionamento de períodos hipoté-
ticos”, etc.). Isso pode referir-se tanto ao território de origem do autor,
ao território correspondente ao tratado no corpo do texto, ao lugar de
sua publicação, de sua formulação e incluso de sua leitura/escuta. O que
importa aqui é que o(s) enunciado(s) considerado(s) no ensino estejam
perfeitamente contextualizados territorialmente.

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Esse “território” não se entende apenas como físico, mas também


como socioeconômico, histórico e cultural10. Assim, além de situar o
hemisfério, continente, país, estado, província, cidade ou bairro, etc. a
que corresponde uma dada enunciação, texto, imagem, etc., é preciso
observar o espaço (público ou privado em relação às instituições – famí-
lia, escola, igreja, lugar de espetáculo, comércio, etc. a que pertençam).
Também, é preciso dar atenção à dimensão situacional da interação
linguístico-discursiva, pois, obviamente, em um mesmo espaço territorial/
institucional pode haver variadas situações de interlocução. Em muitos
materiais didáticos há, obviamente, indicações de contextualização, mas
é preciso observar minuciosamente a adequação das mesmas11. E por que
isto é importante? Porque sem um esclarecimento nítido dos territórios
envolvidos, ficam muito reduzidas as possibilidades de aprofundamento
de temáticas socioculturais.
Assim, a implementação da MR-D chama a atenção para que o
planejamento do professor ou de um outro agente pedagógico comece
com um destaque especial para o tópico territorial. Um tipo de pergunta
deflagradora seria: a quais territórios estão relacionados os conteúdos
culturais da aula/da(s) unidade(s) didática(s)/do curso? Essa pergunta é
pertinente tanto em relação aos conteúdos presentes em materiais didáti-
cos do mercado editorial/institucional, quanto aos materiais complemen-
tares a serem incluídos, em função dos objetivos do ensino e resultados
esperados na aprendizagem.
Exemplos relativos a I.a: em materiais didáticos para cursos de
língua espanhola até muito recentemente era frequente12 encontrar di-
álogos, textos ou imagens, sem indicação de procedência ou com uma
contextualização vaga a territórios “da Espanha” ou “da América”, de
10 Para a noção de território, na Proposta Multirrede-Discursiva, segue-se a concepção do geógrafo
brasileiro Milton Santos (2014), para quem o território nunca é entendido apenas enquanto
um espaço físico, mas sempre enquanto espaço social, econômico, cultural e, inclusive, com
consideração das subjetividades construídas ou envolvidas em um dado lócus. (Milton Santos
foi internacionalmente reconhecido por ser o único latino-americano que obteve o Prêmio
Vautrin Lud, considerado o “Prêmio Nobel da Geografia”).
11 Tenho realizado numerosas análises de materiais didáticos que confirmam que a contextua-
lização territorial é insatisfatória. Ver, por exemplo, Serrani, 2007 e o último capítulo deste
volume.
12 Infelizmente, pode acontecer também em materiais didáticos produzidos na atualidade.

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modo indiferenciado ou não suficientemente situado. Algo semelhante


pode acontecer em materiais para o ensino de inglês, nos quais mesmo
havendo muitas vezes menção a variedades diferentes (americana, bri-
tânica, australiana ou outra), estas nem sempre estão satisfatoriamente
contextualizadas do ponto de vista histórico-cultural. No caso de língua
materna, é pertinente observar se nos materiais didáticos, juntamente aos
textos relativos à variedade padrão – indispensável para os estudantes
atingirem diferentes objetivos na sociedade –, há consideração respeitosa
de variedades não padrão ou de eventual plurilinguismo. Assim, um cui-
dado atento à contextualização territorial das expressões permitirá desen-
volver consciência quanto à pluralidade linguística e à problematização
de estereótipos. Estes, muitas vezes, estão materializados no domínio
linguístico, mas repercutem também no âmbito do preconceito social.
Recentemente realizei uma análise de livro para o ensino de inglês
(High Up13), com foco na primeira parte da unidade 2, que se encontra
detalhada no último capítulo deste volume e à qual me referirei aqui para
exemplificar. Nesse livro didático, além de muitas características meri-
tórias, pormenorizadas no referido trabalho, é possível observar pontos
nos quais os parâmetros da Multirrede-Discursiva podem contribuir para
avanços ainda necessários.
Quanto a territórios, espaços e momentos, ao longo da unidade, são
apresentados, sem especificações precisas, diferentes espaços privados e
públicos do território brasileiro. Por exemplo, a referida unidade começa
com duas páginas cobertas por três grandes imagens: de senhoras baianas
com os característicos vestidos volumosos e turbantes tradicionais (de
origem africana, mas sem menção de territórios), da seleção brasileira
de futebol em campo (com jogadores acompanhados de crianças, o que
costuma acontecer antes do início de um jogo) e de um belo e grande
pássaro, talvez da região do Pantanal brasileiro (sem menção do mesmo).
Claro que isso pode ser fornecido posteriormente pelo professor. E, do
ponto de vista da Proposta MR-D, para que o domínio cultural esteja
sempre imbricado no trabalho com a língua, isso não é apenas desejável,
mas indispensável.
13 DIAS; JUCÁ; FARIA, 2013.

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Assim, situar explicitamente a origem de imagens permite incluir


elementos efetivos da vida sociocultural nos lugares específicos em
que uma língua é falada. Nas páginas iniciais dessa unidade, junto com
as imagens descritas, encontram-se explicitados também os objetivos
didáticos: “refletir sobre alguns estereótipos a respeito dos brasileiros;
estudar palavras relacionadas a comidas e hábitos brasileiros; trabalhar
com os gêneros lista e entrevista oral; usar o Simple Present; identificar
e utilizar adverbs of frequency” (DIAS et al., 2013, p. 27).
Também constam na unidade perguntas em língua portuguesa14.
Uma delas é “Qual dessas imagens representa melhor a cultura da região
onde você vive? Por quê?”. Neste caso, caberia pensar que um estudante
(ou professor) que more em alguma grande cidade brasileira (por exem-
plo, São Paulo ou outras capitais de Estados) ou não ame especialmente
o futebol poderá não se sentir representado em absoluto nessas imagens.
Provavelmente, os autores do material quiseram apresentar imagens
que remetessem a exotismos ou a representações redutoras como a da
expressão “Brasil, país do futebol”, relacionável à imagem da seleção,
para propiciar debates e questionamentos. De todas as formas, cabe a
interrogação sobre o reforço das visões estereotipadas de exotismo sobre
o Brasil que essas imagens podem veicular.
Portanto, um professor que mobilize os parâmetros da MR-D, que
dá atenção cuidadosa à questão dos territórios, espaços e momentos
histórico-culturais, poderá levar para a sua aula, por exemplo, imagens
da Av. Paulista, de um bairro central ou periférico de outras capitais de
Estados no Brasil ou também da cidade e região onde estiver acontecendo
o curso. A pluralidade de imagens sobre o Brasil poderá enriquecer a
discussão do tema-objetivo da unidade: a estereotipia cultural. Também,
de modo geral, ao longo dessa unidade não há especificações precisas
sobre os territórios ou espaços onde foram enunciadas as formulações
propostas para leitura ou que são pivôs de exercícios e atividades. Reto-
marei isto sobre a procedência de enunciados e enunciadores, ao abordar
os próximos constituintes da proposta.
14 Em se tratando de livro de nível 1, considero adequada a inclusão da língua materna dos
estudantes.

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Em todos os capítulos deste volume, as ilustrações ou discus-


sões mostram a importância de situar territórios, espaços e momentos
histórico-culturais. Farei, a seguir, referências simplificadas a elas, pois
os autores fazem em seus trabalhos aprofundamento de representações
discursivo-subjetivas dos territórios, espaços e momentos dos materiais
que analisam ou discutem.
Assim, rapidamente, posso mencionar que, no capítulo de Tainá
Lopes, os materiais discursivos correspondem a diferentes cidades e
territórios de Minas Gerais, Brasil (e a outros contextos ligados ao tema
da preservação ambiental, como a Floresta Amazônica); no trabalho de
Patricia H. Franzoni e Germán Correa, a espaços pernambucanos (em
interculturalidade com São Paulo e Portugal, em função do trabalho
com diversas biografias de Gilberto Freyre); no texto de Silvânia Sie-
bert, as crônicas discutidas representam territórios e espaços brasileiros
na visão e contexto do conquistador português e da crônica atual na
Internet (e as vivências da interculturalidade nesse espaço virtual da
contemporaneidade); no capítulo de Yamilka Rabasa, após espaços
aludidos de México e República Dominicana (mas não devidamen-
te especificados no livro didático considerado), a complementação
apresentada mobiliza o território da cidade de Havana e o contexto
sócio-histórico do denominado Período Especial em Cuba; no traba-
lho de David Bueno são apresentados e discutidos textos relativos a
diferentes espaços da cidade de Bogotá e a relações que os estudantes
fazem com cidades brasileiras que conhecem ou habitam; no texto de
Ana Emília Fajardo Turbin, os espaços são escolares de Brasília (com
relações interculturais a produções culturais dos Estados Unidos) e,
no capítulo 8 – da minha autoria –, a unidade didática analisada trata
do contexto brasileiro de modo indiferenciado, mas na complemen-
tação discuto materiais relativos a espaços brasileiros em contextos
adequadamente descritos.
Passemos ao segundo constituinte intercultural MR-D.

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I.b – Pessoa, grupos sociais e discurso


Os desenvolvimentos que propiciei neste constituinte dizem respeito
ao reforço no tratamento de questões identitárias e de subjetividade. Por
isso, a palavra “pessoa” está no singular, pois aponta aos componentes
singulares do enunciador, manifestos ou implícitos na enunciação.
Consequentemente, além de situar-se os enunciadores conforme classe,
gênero e outros traços de localização na pirâmide social, é relevante aqui
aprofundar o lugar enunciativo das posições sustentadas na argumenta-
ção. Quanto a este tópico, interessa ir além da consideração dos grupos
sociais (bem enfocados, por exemplo, nos trabalhos sobre plurilinguismo
de Daniel Coste15). A explicitação de pressupostos nos enunciados e seus
efeitos de sentidos são cruciais em uma visão discursiva da linguagem.
Ao questionar-se claramente sobre: quem fala e a partir de qual posição
sobre qual tema, esse “quem” não se refere, obviamente, a saber apenas
o nome do falante, como veremos no exemplo seguinte. Trata-se de
saber o lugar territorial, social e de posição argumentativo-subjetiva do
enunciador16.
Exemplos relativos a I.b: muitos dos exercícios propostos na uni-
dade didática do livro de ensino de inglês que estou comentando giram
em torno da reprodução do texto de um blog da página eletrônica New
York City Brazilians, de cujo autor só sabemos que se chama Hilton. O
texto parte da afirmação: “Você sabe que é brasileiro quando…”17 e é
seguida por doze afirmações categóricas sobre hábitos alimentares, ca-
racterísticas pessoais e costumes na sociabilidade dos brasileiros18. Em
um dos exercícios propostos aos estudantes na unidade, o foco está nas
considerações categóricas sobre alimentação, moradia, festejos, atividade
15 Ver, por exemplo, Coste, 2010.
16 Discuto detalhadamente essas representações discursivas em Serrani, 2010, capítulo 1. Também,
Fanjul (2017) apresenta uma discussão sólida sobre as configurações enunciativas da noção
de pessoa na análise do discurso. Seus exemplos correspondem a resultados de pesquisas
comparativas de espanhol e português por ele realizadas e, também, em dois capítulos, Fanjul
dialoga produtivamente com pesquisas realizadas anteriormente por mim e pelo grupo que
coordeno na Unicamp, trazendo, por sua vez, contribuições expressivas para o estudo da relação
pessoa-enunciado-discurso.
17 No texto em inglês: “You know you´re Brazilian when...” (DIAS; JUCÁ; FARIA, 2013, p. 29).
18 Todas as afirmações do blog incluído nessa unidade didática estão reproduzidas no estudo
apresentado detalhadamente no último capítulo deste livro.

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de entretenimento/cultural e esporte no Brasil. No tocante a este cons-


tituinte: pessoa, grupos sociais e discurso, algo que interessa salientar
é que nessa unidade fala-se sempre “do brasileiro”, sem distinções de
classe social, grupo regional ou alguma outra diferenciação sociocultural.
Isso, conforme a perspectiva Multirrede-Discursiva, justamente em uma
unidade destinada a abordar estereótipos, precisa ser aprofundado, pois
eles se caracterizam, precisamente, pelas generalizações homogeneiza-
doras. Assim, a MR-D propicia a inclusão de redes textual-discursivas,
nas quais um mesmo tema cultural seja abordado conforme diferentes
perspectivas. Retomarei a ilustração sobre essas redes ao tratar do com-
ponente de práticas de linguagem(ns).
Um outro exemplo pode ser observado no capítulo de Yamilka
Rabasa neste livro, no qual são enfocadas representações discursivas da
mulher e do trabalho feminino. A partir de uma análise pré-pedagógica
de livro didático utilizado em cursos de formação de professores de
espanhol, a autora discute a complementação com um texto do gênero
literário (no caso, conto). Ela observa a construção discursiva de represen-
tações de universos femininos, com problematizações e contradições das
enunciadoras em relação a representações, autorrepresentações e visões
estereotipadas sobre a mulher e seu trabalho, nos discursos cotidiano e
literário. Seguindo um enfoque enunciativo-discursivo da linguagem, é
proposta a elaboração de exercícios em que o linguístico (no caso, os
recursos indeterminadores de sujeito) esteja diretamente vinculado aos
efeitos de sentidos na discursividade.
O terceiro e último constituinte do componente Intercultural
Multirrede-Discursivo é:

I.c – A importância dos legados culturais


Este constituinte se refere à inclusão, no planejamento e na realização
de aulas, de conteúdos sobre realizações e contribuições, individuais ou
grupais, próprias de uma cultura dada. Farei um comentário a partir de
uma observação de aulas que fiz quando realizava meu pós-doutorado nos
Estados Unidos. Em uma ocasião visitei uma escola em Long Island, Nova

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Iorque, de nível próximo do Fundamental II do Brasil, onde a grande maioria


dos alunos era filho de imigrantes da República Dominicana. Nessa escola
havia ensino de espanhol, e em uma visita perguntei aos estudantes se eles
sabiam, por exemplo, quem era Pedro Henríquez Ureña (grande intelectual
dominicano, reconhecido pela qualidade de seus trabalhos, citado numero-
sas vezes por Jorge Luis Borges e outros escritores de renome), mas esses
dominicanos desconheciam totalmente sua existência.
Na perspectiva da MR-D, os legados culturais não são considerados
um “detalhe curioso”. São um fator muito relevante para a construção
das representações identitário-culturais. Para sistematizar este tópico
tenho me apoiado na teoria cultural de Terry Eagleton. Dentre a extensa
reflexão sobre a teoria cultural desse autor, citarei aqui dois sintéticos
fragmentos definidores: “a cultura pode ser aproximadamente resumida
como o conjunto de valores, costumes, crenças e práticas que constituem
o modo de vida de um grupo específico”. E “a cultura é o conhecimento
implícito do mundo pelo qual as pessoas negociam maneiras adequadas
de atuar em contextos específicos” (EAGLETON, 2005a, p. 54-55). A
partir dessas conceituações amplas, Eagleton apresenta quatro acepções
da noção de cultura, que eu retomo, acrescentando eventualmente algu-
mas nuances:

• cultura como produção artística, científica e de outros saberes: quanto a esta


acepção, corresponde observar nos conteúdos de ensino a presença de mani-
festações artísticas – eruditas ou populares – e também a discursos do campo
científico ou dos saberes tradicionais. Esse último tipo de saber não estava
explicitamente apontado por Eagleton, mas considero que é pertinente incluí-lo
como eventual conteúdo (por exemplo, se se consideram elementos provindos da
tradição de culturas (ágrafas) originárias do território americano ou de outros);

• cultura como um modo de vida característico: trata-se da inclusão de falas


ou textos próprios de regiões, províncias, cidades ou diferentes espaços so-
cioculturais (rurais ou urbanos);

• cultura como civilidade: aqui está considerada a previsão de materiais e


práticas sobre registros de formalidade, informalidade e maneiras de compor-

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

tamento, em contextos determinados da sociabilidade em uma dada cultura;


• cultura como reivindicação de identidade específica, minoritária ou mar-
ginalizada: trata-se aqui de eventuais singularidades enunciativas de grupos
étnicos ou de minorias diversas, relevantes para estudos identitários19.

Essas distinções são porosas, mas, mesmo assim, é importante


que o docente ou o agente pedagógico leve em conta esses diferentes
ângulos de abordagem da noção de cultura em seus planejamentos e
práticas.
Exemplos relativos a I.c: voltando ao caso do livro de inglês,
quanto a legados culturais, constam doze fotos de pessoas famosas
de diversas partes do mundo (cantores, esportistas, atores, atrizes,
autora de best seller infantil, etc.), combinadas com exercícios para
que o aluno indique o país de origem ou o âmbito de atuação delas.
Entretanto, ao mobilizar a Proposta Multirrede-Discursiva, cujos
componentes solicitam a atenção sobre territórios, espaços, sujeitos e
legados culturais, observei que, paradoxalmente, na unidade Brasil:
nossa gente, nosso país não consta personalidade brasileira alguma.
Assim, a MR-D contribui para o estabelecimento de lacunas e a orga-
nização de complementações pertinentes. As mesmas são relevantes,
por exemplo neste caso, para propiciar que o aluno aprenda a falar em
inglês sobre personalidades que deixaram um legado cultural relevante
no país ou região de origem dos estudantes. Mais adiante, ao ilustrar
sobre as práticas de linguagem em relação a este constituinte de lega-
dos culturais, detalharei outros exemplos de complementações com
materiais em vídeo, que permitem incluir legados de compositores de
música brasileira de projeção internacional.
Passo agora a descrever o segundo componente da Proposta MR-D.

II. O componente de língua-discurso e gêneros discursivos


Seus constituintes são dois (interligados):

19 Sobre essas distinções, ver Eagleton, 2005a, p. 11-15.

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II.a – Conteúdos fono-morfo-sintáticos da língua e seus funcionamen-


tos enunciativos
Este constituinte aponta a enfocar os elementos do sistema da língua
no planejamento e nas aulas, mas sempre em função dos sentidos que
eles permitem construir na enunciação. Trata-se dos temas de fonética,
fonologia, morfologia e sintaxe, mas considerados em sua articulação à
dimensão semântica. Assim, para examinar e ensinar adequadamente os
funcionamentos enunciativos de uma expressão, ou seja, considerada em
contexto discursivo – situacional e sócio-histórico –, é preciso realizar a
observação detalhada da relação explícito-implícito dessa expressão no
seu contexto de enunciação discursiva.
Sei que essa não é uma questão simples e muitos professores ficam
preocupados com a abordagem dessa dimensão enunciativa. Isto será
discutido introdutoriamente neste capítulo e tratado com maior detalhe
e exemplificado ao longo do volume todo. Em relação ao capítulo 8, que
é também da minha autoria, gostaria de mencionar aqui que no exemplo
do post sobre os brasileiros, incluído na unidade didática utilizada para
ilustrar a discussão, há uma série de afirmações, que é preciso enfocar
observando a estrutura das afirmações (dimensão explícita), mas sempre
em relação à construção de sentidos propiciada por seus pressupostos
(dimensão implícita) dos enunciados desse post. Dessa forma, é possível
abordar com maior aprofundamento o importante tema dos estereótipos
culturais, em pauta nos objetivos da referida unidade didática.
e
II.b – Gêneros discursivos em foco em uma aula, unidade didática ou
curso
A concepção do gênero discursivo, no escopo da MR-D, é proces-
sual e dialógica. Como se sabe, o dialogismo de cunho bakhtiniano diz
respeito ao processo enunciativo pelo qual toda expressão corresponde
a um discurso entendido como resposta a perguntas, geralmente implí-
citas, sobre um tema, em esferas determinadas da sociedade. Isto último
significa que a concepção de gênero textual-discursivo não está baseada
de modo primordial em suas características formais.

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

Trata-se principalmente de considerar as posições de sentido sus-


tentadas ou contrapostas em expressões próprias para um dado contexto
enunciativo. Obviamente, as características formais dos gêneros precisam
ser consideradas, mas em relação ao processo sociocultural enunciativo.
Quanto à política educacional, a MR-D defende a pluralidade de
visões semânticas, em função de desenvolver a leitura crítica e o enri-
quecimento expressivo e cultural dos estudantes. Assim, é preciso dar-
se atenção à relação estreita entre os gêneros discursivos apresentados
e os gêneros nos quais, posteriormente, será solicitada a produção do
estudante.
Também, como veremos ao longo dos capítulos deste volume, a
distinção basilar de Bakhtin entre gêneros primários (espontâneos, como
as variedades do discurso cotidiano) e secundários (mais elaborados,
como o filosófico, o jurídico, o literário, etc.)20 pode ser mobilizada de
modo profícuo ao considerar a inclusão do gênero literário em imple-
mentações da Proposta Multirrede-Discursiva. Uma das características
do gênero literário é a frequente inclusão de exemplares singulares de
gêneros primários, para produzir os seus efeitos de sentido.
Um docente consciente das distinções acima apontadas poderá
aproveitar a mobilização de materiais do gênero literário para exercitar
diferentes tipos discursivos, com maior ou menor grau de formalidade,
levando-se em conta os processos de interrogação da subjetividade na
formação do leitor21.
A língua é, obviamente, matéria fundamental do discurso, isto é,
dos efeitos de sentidos que se produzem ou compreendem nas interações
verbo-sociais, orais ou escritas. Mas é bom lembrar que a língua não é
preexistente ao discurso. Língua e discurso são concomitantes nos eventos
de enunciação/compreensão e a Proposta Multirrede-Discursiva propicia
que essa imbricação não seja descuidada no ensino-aprendizagem.
20 Para aprofundamentos sobre a distinção entre gêneros primários e secundários, ver Bakhtin,
2000, p. 281.
21 Para uma discussão da relevância da presença da literatura nas aulas de língua portuguesa,
também à luz de uma perspectiva enunciativo-discursiva na escola brasileira, ver Neves e
Simões, 2017.

42
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

De fato, uma criança muito pequena, quando aprende a falar, apren-


de língua em discursos culturalmente situados. Assim, nas situações de
ensino-aprendizagem, mesmo com as especificidades de tratar-se de lín-
gua materna, estrangeira, em contextos singulares (cursos instrumentais,
gerais, presenciais, a distância, etc.), é bom considerar que o estudante,
desde o início, tem as condições de mergulhar no mundo da discursividade
e da cultura. Ele não precisa ficar exposto a sentenças isoladas, cultural-
mente descontextualizadas ou banais, nas aulas do começo de um curso,
para somente ser exposto explicitamente ao tratamento de temas culturais
nas aulas ou nos cursos mais avançados. Não quero significar com isso
que não haja gradações nos níveis de dificuldade, estou defendendo que
a dimensão discursivo-cultural esteja presente desde a primeira aula,
porque é assim que o ser humano aprende sua língua22.
Também, algo a levar-se em conta é que, na Proposta MR-D, o
foco não está tanto na quantidade de gêneros incluídos nos conteúdos de
ensino-aprendizagem, como na atenção à qualidade do trabalho com os
gêneros discursivos, nas oficinas. Evidentemente, quanto maior o número
de gêneros discursivos que um estudante praticar, mais rica poderá ser
sua produção enunciativa. Mas é preciso lembrar que um estudante que
compreende e produz bem em alguns gêneros (e realiza com sucesso
transposições entre variedades linguísticas e gêneros discursivos formais
e informais), posteriormente, estando em uma situação de expressão fora
do âmbito educacional, poderá aplicar esses conhecimentos para derivá-
los a mais gêneros e contextos.
Exemplos relativos a II.a-b: na unidade 2 do livro High Up 1 que
estou comentando, os conteúdos do sistema da língua, como vimos, são:
o uso do tempo verbal presente simples e dos advérbios de frequência
temporal (never, seldom, sometimes, often, usually, always23) (op. cit.,
p. 27). Quanto aos gêneros, na primeira parte dessa unidade, o foco está
no gênero lista. Por um lado, é meritório que esse material didático não
fique restrito ao nível da sentença e inclua objetivos e conteúdos relativos
à dimensão genérica. Mas, por outro lado, observa-se também que o en-
22 Sobre a progressão nos cursos de línguas, ver, por exemplo, Coste e Véronique, 2000.
23 Nunca, raras vezes, algumas vezes, com frequência, habitualmente, sempre.

43
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

foque está concentrado nas características formais de uma lista, definida


como “itens separados, com pontos ou números que os destacam, sem
uso de conectivos”24. Também, sendo o livro destinado a estudantes do
Ensino Médio, caberia a pergunta: será que um estudante desse nível não
sabe o que é uma lista? Portanto, nota-se uma ambiguidade do material
em relação à consideração dos conhecimentos prévios que o estudante
já tem da sua língua materna.
Ao implementar-se a Multirrede-Discursiva, algo fundamental é
superar o predomínio da dimensão formal de gênero. Para tanto, ajuda
começar enfocando as esferas e instituições sociais em que uma formu-
lação verbal é produzida. Por exemplo, se corresponder à instituição
jornalismo, é preciso explicitar a qual órgão de comunicação pertence,
quem é/são o/s jornalista/s autor/es e quais são as marcas textuais da
espécie correspondente: editorial, entrevista, reportagem, texto analítico
de jornalismo investigativo, etc.
E, além de observar-se as características estruturais de um texto,
é necessário considerar os seus implícitos e as suas direções argumen-
tativas. Como sabemos, um texto pode remeter a textos produzidos
antes (mesmo muito tempo antes) e também relacionar-se com outros
produzidos contemporaneamente, no mesmo tipo de discurso ou em
outros, na mesma esfera social ou em uma outra25. Na unidade didática
que estou comentando, temáticas abordadas na lista do blog do Hilton
são retomadas em exercícios, para que os estudantes indiquem se as
afirmações são verdadeiras ou falsas. Pedem-se também produções
com posicionamentos dos estudantes em relação a essas afirmações e,
nessas produções, o estudante mobilizaria os temas de língua em pauta
na unidade. Evidentemente, a solicitação de posicionamentos é algo
relevante para o desenvolvimento da leitura crítica. Mas, conforme a
Multirrede-Discursiva, neste caso, seria preciso que houvesse um passo
24 DIAS; JUCÁ; FARIA, 2013, p. 32.
25 Para a base teórica da perspectiva processual dos gêneros discursivos, na teoria do discurso, é
fundamental a distinção intradiscurso – interdiscurso, inicialmente estabelecida por Michel
Pêcheux. No artículo on line que publiquei na já mencionada revista Eutomia (SERRANI,
2012), consta uma abordagem mais detalhada desses conceitos com abundantes referências
bibliográficas, além das que também constam neste livro, para quem se interessar em um maior
aprofundamento teórico (dentre outros, cf. PÊCHEUX, 2014, 2015, 2018; ORLANDI, 2012).

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

prévio: apresentar uma rede textual e/ou sonora/imagética (mesmo


que mínima), com discursos que mobilizem outros sentidos sobre os
temas explícitos ou implícitos nas afirmações (preconceituosas) do
blog. Assim, pode ser propiciada a inclusão de diferentes respostas
dialógicas, para as perguntas implícitas nessas afirmações sobre a
sociabilidade brasileira.
As redes de complementação textual-discursiva que a MR-D es-
timula podem ser constituídas tanto com textos de diferentes gêneros
ou diferentes variações de um mesmo gênero. Por exemplo, Patricia H.
Franzoni e Germán Correa, neste volume, abordam a relevância da análise
pré-pedagógica de materiais didáticos, em função do estabelecimento de
focos nas complementações textual-discursivas, ilustrando com textos
biográficos. Eles mostram como a dispersão de numerosos fragmentos
de um gênero sobre muitas personalidades pode não ser produtiva. Dife-
rentemente, eles fundamentam a opção de discutir biografias sobre uma
personalidade da esfera cultural brasileira (no exemplo, Gilberto Freyre),
dentre as numerosas que o material didático introduzia. Os autores põem
em evidência critérios ao selecionar diferentes realizações do gênero
biográfico, assinalando características específicas do mesmo e diferentes
perspectivas de enunciação.
Em alguns casos, dar atenção a um gênero determinado pode estar
diretamente vinculado ao tratamento de questões de territorialidade e de
subjetividade, em exemplos do gênero discursivo que estiver em pauta.
Por exemplo, Silvânia Siebert, neste livro, enfoca o gênero crônica em
exemplos que remetem a territorialidades e temporalidades muito dife-
rentes. Analisando e complementando uma unidade de livro didático de
português-língua materna, mobiliza duas crônicas, cujos tempos e espaços
de produção são muito distantes entre si. Assim, discute a construção dis-
cursiva de sentidos e de sujeitos, em uma realização historicamente antiga
do gênero crônica e em uma produzida atualmente, no espaço virtual da
internet. A implementação da proposta multirrede-discursiva é realizada
em uma experiência com estudantes do Ensino Médio, concentrando a
discussão nas noções de público e de privado. A autora faz propositada-
mente essa escolha de exemplos do gênero em contextos distantes, para

45
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

mostrar a importância de o estudante reconhecer as representações de


territorialidades e cosmovisões no próprio discurso.
A seguir, ao tratar do componente de práticas de linguagem(ns), re-
tomarei novamente a questão da materialidade linguística e dos gêneros
discursivos.

III. O componente de práticas de linguagem(ns) em oficinas multirrede-


discursivas
Inicialmente, lembremos que é de singular importância a interde-
pendência deste componente da MR-D com os dois anteriores. Também,
embora as práticas de linguagem estejam sempre inter-relacionadas nas
oficinas, por motivos de organização me ocuparei dos constituintes con-
forme correspondam a III.a práticas predominantemente de compreensão
e III.b práticas predominantemente de produção26:

III.a – a.1) Leitura, a.2) Escuta e a.3) Apreciação auditivo-visual

III.b – b.1) Produção escrita, b.2) Produção oral e b.3) Tradução entre
línguas ou transposição entre variedades ou discursos de uma mesma língua

Tarefa é o trabalho prescrito, o que se orienta para ser realizado.


Atividade é o trabalho efetivo. A atividade pode mudar em função das
singularidades dos participantes em uma oficina e acrescentar coisas que
não estavam previstas na tarefa27. Nas práticas de oficina, sejam tarefas
orientadas ou atividades, de fato, realizadas, os estudantes não produzem
textos para entregar ao professor, mas trabalham com o professor e com
os colegas.
Assim, é melhor realizar práticas com consistência semântica, re-
lativas a um número limitado de gêneros discursivos, do que propiciar
uma volumosa apresentação dispersa e superficial de muitos textos e
26 Conceitualmente, embora distintas, essas práticas não são compartimentalizadas, pois, por
exemplo, quando lemos estamos também produzindo sentidos e quando escrevemos estamos
realizando simultaneamente práticas de compreensão ao ler aquilo que está sendo escrito.
27 Agradeço a Angela Kleiman seu comentário sobre a necessidade dessa distinção.

46
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

discursos28. Uma consideração que parece óbvia, mas que nem sempre
corresponde à realidade nas práticas em sala de aula, pois muitas vezes
é o livro que “comanda” e o professor o “segue”, quando deveria ser o
contrário. Assim, em consonância com os princípios da MR-D, um do-
cente bem formado precisa fazer recortes seletivos na eventual profusão
de textos e assuntos que possa encontrar em um livro didático.
Antes de referir-me às práticas, gostaria de lembrar que não se trata
aqui de receitar técnicas de ensino, nem de indicar as que seriam as mais
“novas” ou as “melhores”29. Como se sabe, as técnicas e recursos de
ensino-aprendizagem são inúmeras e os leitores deste texto, especialmente
se forem professores, lerão aqui sobre algumas técnicas ou práticas que
certamente já realizam. Obviamente, eles também devem conhecer outras,
mais adequadas para o contexto em que atuam. O meu propósito aqui é
mostrar fundamentos, finalidades e contribuições que podem ser obtidas
a partir da sistematização da MR-D, mediante uma discussão teórico-
prática de algumas técnicas que selecionei para destacar características
que definem a perspectiva multirrede-discursiva para o ensino de línguas.

III.a – a.1) Leitura, a.2) Escuta e a.3) Apreciação auditivo-visual


Sobre a dimensão empírica da leitura e a relevância de uma rede
planejada de complementação: as práticas de leitura quanto à sua dimen-
são física, como se sabe, podem ser silenciosas, em voz alta, individuais,
em duplas, em grupo, etc.30. Empiricamente, podem ser realizadas em
etapas, podendo ser a primeira: global, sem deter-se em léxico ou expres-
sões não conhecidas; a segunda: minuciosa, para a qual pode ser neces-
sário o uso de dicionário e/ou esclarecimentos do professor e a terceira
e outras leituras, mais aprofundadas, para estabelecer tópicos centrais
28 Isso último costuma acontecer em muitos materiais didáticos de diferentes línguas que temos
analisado. Alguns deles serão comentados nos outros capítulos deste livro.
29 Enfocando a utilização de recursos tecnológicos, à luz de uma perspectiva crítica, Rocha,
Claudia Hilsdorf (2014, p. 13) diz: “nada é totalmente novo ou velho, para todas as pessoas,
da mesma maneira, ao mesmo tempo, pelas mesmas razões”. Nesse sentido, o que segue nas
páginas seguintes é uma reflexão sobre alguns exemplos de práticas conhecidas de ensino-
aprendizagem, visando à discussão de seus fundamentos e efeitos.
30 Sobre leitura silenciosa e práticas em sala de aula, em função de um ensino processual de
gramática, ver Kleiman e Sepúlveda, 2012.

47
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

da argumentação e dos sentidos explícitos, implícitos e interpretações


pessoais dos estudantes31. Conforme a Proposta Multirrede-Discursiva, ao
planejar-se o trabalho com os modos empíricos de leitura, é adequado que
haja já a previsão de uma rede textual-discursiva (não precisa ser grande)
que mobilize diferentes perspectivas semânticas, para aprofundar-se a
compreensão crítica e plural de um tema de cultura previsto nos objetivos.
Exemplos relativos a III.a – a1, a2 e a3: a apresentação plural de
textos é algo que todo professor preocupado com o enriquecimento de
suas aulas normalmente faz. A contribuição dos parâmetros da MR-D
consiste em organizar e fundamentar a complementação com redes
textual-discursivas sistemáticas. Para ilustrar, continuarei retomando
exemplos do trabalho já mencionado sobre a unidade do livro de inglês
e fazendo referência a outros capítulos deste livro.
Como já dito, na unidade referida do livro High Up, um dos princi-
pais objetivos é a abordagem dos estereótipos sobre os brasileiros. O texto
do blog com afirmações categóricas sobre o Brasil deve ter sido escolhido
pelos autores como um contraexemplo, provavelmente para gerar debate
e polêmica. Assim, a problematização de afirmações estereotipadas po-
derá ser feita a partir de um necessário enriquecimento anterior. Ele pode
ser proporcionado por dados concretos que questionem as afirmações
estereotipadas (como os presentes nos textos, imagens e vídeos da rede
complementar exemplificada no último capítulo deste volume).
Essa rede de leituras complementares diz respeito também a di-
ferentes territórios, espaços e momentos sócio-históricos brasileiros
especificamente situados, o que efetivará a necessária inter-relação entre
o componente de práticas e os constituintes do intercultural da MR-D.
Por exemplo, dentre os diversos textos com que ilustro uma rede de
complementações possíveis a partir de um vídeo sobre prática esportiva
no Brasil, é possível trabalhar com discurso descritivo sobre um gênero
musical (no caso, o chorinho, um legado cultural brasileiro). E também
não é difícil associar pesquisa na internet com materiais sobre biogra-
31 Para análise de exemplos de interpretações subjetivas de estudantes, a partir de estudos com-
parativos em instituições brasileiras e francesas, ver Neves, 2016.

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

fias de seus criadores ou intérpretes (há livros sobre isso – em diversas


línguas – que podem fornecer conhecimentos novos, inclusive para os
professores, o que é estimulante também para o docente).
Um outro exemplo de problematização das afirmações do referido
blog diz respeito à alimentação no Brasil. Na rede de complementação
proposta no referido trabalho, incluí textos em inglês, achados rapi-
damente na Internet, sobre alimentos e funcionamento dos difundidos
restaurantes “por quilo” no Brasil. Nos textos da rede complementar
verificou-se também a presença de verbos no presente simples e de
advérbios de tempo, efetivando, assim, a relação com o componente de
língua-discurso da MR-D.
A escuta, dimensões na consideração do som e três observações
introdutórias sobre a literatura na aula de língua: no nível empírico,
ao considerar a escuta, corresponde observar as características físicas do
som, isto é, a entoação, a cadência, o ritmo, o timbre e o volume. Uma
coisa em que a MR-D insiste é que essas marcas físicas da sonoridade
estejam abordadas em função dos sentidos para cuja construção elas con-
tribuem. No exemplo do blog no High Up, um professor poderá ironizar,
mediante sua entoação, ao ler as afirmações categóricas (estereotipadas)
sobre os brasileiros. Uma escuta de textos com diferentes entoações do
professor pode ser destinada a desenvolver a sensibilidade consciente dos
alunos sobre a relação entre som e posições defendidas ou questionadas32.
No tocante à escuta de música, nos cursos de línguas, ela costuma
estar presente mediante canções e não é raro observar que tenha finali-
dade exclusiva de exercício de inteligibilidade léxica (por exemplo, o
preenchimento de lacunas de palavras faltantes na letra de uma música
é uma técnica muito conhecida). Entretanto, o trabalho com a inteli-
gibilidade é necessário, mas não é suficiente. A língua, em uma visão
discursiva, não se concebe como algo similar a “um saco de palavras”,
pois ela só acontece na produção enunciativa de sujeitos em situações
contextualizadas. O que interessa é a inteligibilidade mais a compre-
32 O estudante pode realizar isso de modo inconsciente na sua língua materna, mas os cursos de
formação em língua(s) são justamente para desenvolver consciência sobre esses recursos, para
um melhor domínio expressivo e compreensivo do funcionamento da linguagem.

49
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

ensão e produção discursiva que um estudante possa fazer a partir de


uma escuta sonora. E isso pode ser propiciado inclusive a partir de uma
escuta de música instrumental, como mostro no último capítulo deste
volume. Nesse exemplo, a partir dos sons de Tico-Tico no Fubá sugiro
a inclusão de textos sobre a biografia do seu compositor, Zequinha de
Abreu, e sobre o gênero musical brasileiro choro. Isso permite relacionar
o componente de práticas ao intercultural – legados culturais, territórios
e pessoas da MR-D (nos textos se fala da região de origem do gênero e
de nascimento do autor desse chorinho específico, do legado cultural que
esse gênero musical representa, etc.). A partir de uma complementação
como essa, inicial do docente, podem ser propiciadas outras realizadas
pelos estudantes (lembremos que o que caracteriza as atividades de ofi-
cina é justamente o trabalho em equipe). Dessa forma, eventualmente,
os gêneros musicais podem ser ampliados, assim como os compositores
e territórios considerados da cultura de partida ou da cultura alvo ou, no
caso de língua materna, sobre gêneros musicais provindos ou escutados
em diferentes regiões de um país.
Ainda no tocante à dimensão auditiva em uma aula, pode tratar-se
também de tematizar aquilo que se escuta no ambiente. Por exemplo, o
trabalho de Ana Emília Fajardo neste volume inclui a consideração de
sentidos do barulho, por ser ele recorrente nos relatos do corpus de sua
pesquisa com narrativas de estagiários em escolas da Rede Pública de
Ensino. Ela o faz no contexto de observar a problemática da concepção de
língua subjacente em planejamentos de aulas, elaborados por estagiários
em cursos de Práticas de Ensino, em sua fase final de formação como pro-
fessores de inglês. Para tanto, além de discutir diferenças epistemológicas
nesses planejamentos dos futuros professores, ela considera relevante
que não seja ignorado esse fator auditivo e que se trabalhem formas de
neutralizá-lo, apostando, para tanto, na inclusão de textos literários.
Gostaria aqui de insistir em questões aparentemente óbvias sobre
a relevância da literatura na aula de língua, mas que muitas vezes são
consciente ou inconscientemente negligenciadas, obstaculizando-se
desse modo a realização da leitura literária produtiva na aula de língua.
Uma observação inicial diz respeito ao uso do tempo. Todos sabemos

50
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

que nesta época as mídias sociais, principalmente as de mensagens ins-


tantâneas, consomem muito do nosso tempo. Acontece que esse tempo
irrecuperável é necessário para a leitura de textos elaborados, dos gêneros
discursivos secundários33, que obviamente também pode ser realizada
em suportes digitais. Assim, algo aparentemente banal, mas sobre o que
é preciso insistir na formação é que um dos requisitos indispensáveis da
boa leitura literária é que não seja realizada “às pressas”. A previsão do
tempo de leitura no planejamento é crucial porque permitirá desenvolver
o que menciono na segunda observação, a seguir.
Como sabemos, a experiência subjetiva que a leitura literária pos-
sibilita o enriquecimento cultural pelo conhecimento sobre seus autores,
movimentos artístico-literários, etc. (aqui é mobilizada a acepção de
cultura enquanto produção artística, no constituinte de legados culturais
da MR-D). Mas a leitura literária, mesmo sem ser um “documento”34,
ativa diferentes percepções e compreensões sobre temas socioculturais
(acepção de cultura enquanto modo de vida característico).
Essa relevância está tratada, a partir de diferentes ângulos, em todos
os capítulos deste livro, com fundamentos e ilustrações no âmbito educa-
cional em geral e no ensino de língua(s) em particular. Por exemplo, no
trabalho de David Bueno neste volume é apresentada uma experiência, na
qual a complementação do livro didático é realizada com poemas. Estes,
além de enriquecer conhecimentos sobre poesia e poetas colombianos
na aula de espanhol (cultura como produção artística), propiciam apro-
fundar a compreensão sobre a temática das cidades latino-americanas.
O autor mostra também que o foco na dimensão cultural não diminui a
atenção dada pela perspectiva da MR-D aos temas de língua-discurso,
nesse caso, as construções com tener, haber e existir. E o confronto com
outros gêneros discursivos, como o turístico e o acadêmico, permite
também sensibilizar os alunos sobre diferenças enunciativas em relação
à temática cultural: a vida nas metrópoles latino-americanas (acepção
de cultura enquanto modo de vida característico).
33 Ver acima observações sobre a distinção bakhtiniana entre gêneros primários e secundários.
34 Como bem afirmou a grande poeta brasileira Ana Cristina César no título de sua dissertação
de mestrado.

51
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

Uma terceira observação introdutória sobre a literatura na aula


de língua é sobre algo que “todos sabemos”, mas ao que nem sempre
se dá a devida atenção em planejamentos e realizações de aulas de
língua-discurso: é que a inclusão sistemática de textos literários, traz
conjuntamente a notória relevância da noção de autoria. Muitas vezes
essa função do processo enunciativo costuma aparecer diluída em mui-
tos materiais didáticos do mercado editorial. Mas, embora vivamos em
uma época em que essa noção está sendo interrogada e transformações
em sua concepção certamente virão, é preciso que na formação haja um
espaço para a reflexão cuidadosa sobre a autoria, tanto dos autores de
todos os textos lidos, como a que precisa ser desenvolvida na produção
dos estudantes e que enfocaremos em seguida, ao tratar sobre as práticas
de escrita, produção oral e tradução entre línguas/transposição genérica
ou de registros expressivos em diferentes textos de uma mesma língua.
Nas atividades de oficina é considerado, como típico delas, que as
práticas de leitura, escuta ou apreciação visual estejam relacionadas ao
preparo de práticas de produção conjunta para terminalidades diversas,
como apresentações em grupo, elaboração de painéis ou outros resulta-
dos práticos de produção linguístico-discursiva, sobre a que tratarei na
seção seguinte.

III.b – b.1) Produção escrita, b.2) Produção oral e b.3) Tradução entre
línguas ou transposição entre variedades ou discursos de uma mesma
língua
A escrita não é transcrição da oralidade e sobre práticas de re-
formulação para desenvolvimento da autoria: uma premissa básica do
ponto de vista discursivo, que pode parecer óbvia, mas é conveniente
lembrar, é justamente essa, que ao escrever não se está transcrevendo o
dito oralmente.
Por que convém lembrar disto? Em observações de aulas de línguas
estrangeiras tenho presenciado, com relativa frequência, solicitações
de uma produção escrita dizendo-se aos alunos enunciados como este:
“escrevam um diálogo sobre (tal coisa)”, sem outras especificações. Do

52
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

ponto de vista multirrede-discursivo, uma solicitação desse tipo é passível


de questionamentos. Ela pode ser válida, se pensarmos, por exemplo,
na escrita de um diálogo de uma espécie de roteiro para o contexto de
algum tipo de representação dramática. Isso pode ser muito enriquecedor,
especialmente se antes foram lidos textos do gênero em questão. Mas
em se tratando de diálogos previstos para a oralidade, corresponde que
o estudante os pratique na sua produção oral, considerando-se o gênero
discursivo determinado, o contexto do diálogo e as especificidades do
som e da voz.
Quanto à produção escrita, os princípios e metodologia da MR-D
nos lembram que ela tem suas especificidades, porque a escrita é uma
outra forma de relação do sujeito com a linguagem, com a reflexão e
com o conhecimento. Vejamos a seguir alguns exemplos sobre práticas
que dão atenção a essa especificidade.
Exemplos relativos a III.b – b.1, b.2 e b.3: um recurso frequente
relativo à escrita em implementações da Multirrede-Discursiva é a prática
da reformulação. Ela permite uma maior reflexão sobre a especificidade
do que se está escrevendo. Para o trabalho com reformulações que con-
tribuam para a dimensão expressivo-enunciativa da escrita há, como se
sabe, técnicas diversas.
Pessoalmente, tenho trabalhado e orientado pessoas da minha equipe
a implementarem os lineamentos propostos por Fabre e Cappeau (1996)35.
Esses autores propõem exercitar a ampliação de enunciados mediante
acréscimos de dois tipos, a) aqueles que parafraseiam os sentidos ex-
postos na formulação inicial e b) aqueles que introduzem tópicos novos,
enriquecendo a argumentação mediante hipóteses, exemplos, contrae-
xemplos ou outras derivações de sentidos, para melhor fundamentar o
que se está expressando.
E, volto a insistir, o que interessa na implementação da Proposta
Multirrede-Discursiva é a relação estreita entre a construção fono-morfo-
sintática e a dimensão semântica.
35 Seguindo o trabalho desses autores, em Serrani, 2005 e 2010, p. 114-117, discuti também outros
exemplos com práticas de reformulação para o ensino-aprendizagem de língua espanhola no
Brasil.

53
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

A MR-D enfatiza, como seu nome indica, a dimensão discursiva,


mas isso não significa que haja diminuição de importância na considera-
ção das gramáticas pedagógicas e do estudo do sistema linguístico. Mas o
conhecimento, obviamente muito necessário deste, é sempre insuficiente
para a expressão de sentidos. Para esta última o que funciona é a dimensão
discursiva da situação enunciativa e do contexto social.
Assim, voltando à questão da prática de reformulações com acrés-
cimos, a distinção dos referidos autores, como já antecipado, é entre:

a) acréscimos esperados – os precedidos por expressões como “ou seja”,


“isto é”, “melhor dizendo” (ou assemelhados, na língua que for) e

b) acréscimos não esperados – que correspondem à inclusão de frag-


mentos com considerações ulteriores, que reforçam, esclarecem ou
problematizam aquilo que se deseja afirmar, mediante enumeração de
exemplos, hipóteses, contraexemplos e outras derivações.

De todas as formas, para qualquer outra técnica de reformulação que


o professor utilize – por exemplo, reformular mediante nominalizações
de expressões verbais inicialmente formuladas com verbos conjugados
(passar de uma forma como “ele escolheu x” para “a escolha de x”) ou
mudar uma diretiva com infinitivo ao modo imperativo (de “preencher
o formulário” a “preencha o formulário”) - qualquer que seja o tipo de
reformulação, é preciso lembrar a primazia da dimensão semântica.
Pois é preciso insistir que, ainda que uma oficina seja destinada a
práticas com diferentes construções verbais, conforme os fundamentos
discursivos da MR-D, o foco estará nas nuances de sentidos, explícitos
e implícitos, nos textos, e estes sempre situados em seus respectivos
gêneros discursivos, devidamente contextualizados.
Sobre escritas a partir de um texto literário e sobre tradução e
transposição de registros ou gêneros: algo muito frequente é que depois
de leituras literárias, sejam solicitados aos alunos “comentários” sobre um
poema, conto ou fragmento de texto literário de maior dimensão. Toda

54
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

escrita pode ser válida no caminho de aprimoramentos da enunciação dos


estudantes. De todas as formas, o que a MR-D propicia é a articulação
de seus parâmetros, para enfocar diferentes tópicos que correspondam
aos conteúdos previstos em uma dada unidade de ensino.
Por exemplo, no capítulo de Tainá Lopes neste volume há um relato
de implementação da MR-D, na qual, a partir de um poema de Carlos
Drummond de Andrade, foram realizadas práticas de escrita com acrés-
cimos esperados. A autora apresenta a complementação de uma unidade
de livro didático que já apresenta textos de discurso poético, em torno
da temática da preservação ambiental. No contexto de aulas de língua
portuguesa no Ensino Fundamental II, em uma escola da rede particular
de ensino no Estado de São Paulo, na experiência foram articulados po-
emas do Carlos Drummond de Andrade ao discurso cotidiano. A autora
mostra, assim, a relevância de práticas de reformulação (parâmetro de prá-
ticas de linguagem) ao abordar o tema do parâmetro de língua-discurso:
adjetivação e enunciação metafórica em diferentes gêneros e registros
expressivos, considerando cultura como produção artística: Drummond
e sua obra (parâmetro de legados culturais) e o tema cultural do meio
ambiente (parâmetros de territórios, espaços e pessoas).
Um outro exemplo ao que gostaria de retornar é da referida unida-
de do livro High Up, também neste caso da relação entre as práticas de
produção e a articulação de temas de cultura, gêneros discursivos e temas
de língua. Na análise que exponho com maior detalhe no último capítulo,
uma prática de produção que sugeri – depois da complementação relativa
à problematização de estereótipos sobre alimentação no Brasil, uma vez
que dentre os objetivos explícitos da unidade é mencionado o gênero “lis-
ta” –, é a de realizar oficinas de produção de textos descritivos dos passos
que um usuário precisa seguir em um restaurante do tipo “por quilo” ou
outro. Nesse caso, seria conveniente situar a cidade brasileira específica
(territórios) e os textos poderão exercitar o uso do presente simples (tema
gramatical em foco na unidade).
Também, a partir da complementação sobre esporte, que permitiu
acrescentar os já referidos textos descritivos do gênero musical chorinho

55
Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

e do gênero biográfico de compositores e intérpretes, pode pensar-se


na produção de textos descritivos de outros gêneros musicais e de seus
intérpretes ou compositores mais conhecidos.
Dessa forma, poderão ficar atendidos os requisitos de contextua-
lização sociocultural, de consideração de legados e de especificação de
temas de língua e de gêneros discursivos.
Passarei agora a referir-me a um outro tipo de produção escrita
que é o da tradução. Nas últimas décadas, na área de língua estrangeira,
a tradução não tem sido muito bem recebida. Tem sido considerada
como atividade excessivamente vinculada ao modo tradicional (antigo)
de aprender línguas. No escopo da MR-D, pelo contrário, a prática de
tradução é incentivada, pois ela permite muita articulação de questões
metalinguísticas, metadiscursivas e interculturais, certamente relevantes
na formação.
A prática de traduções ou transposições de registros ou gêneros
discursivos apresentará ao estudante interrogações em relação a todos
os parâmetros da MR-D. E ele poderá dar resposta a essas interroga-
ções de modo concreto, em suas opções tradutórias (no caso de língua
estrangeira) ou de mudança de registro ou gênero (no caso de línguas
materna e estrangeira).
Como já dito, no tocante à relação produção oral-escrita, a MR-D
estimula a prática de oficinas. Elas incluem apresentações ou seminários
expositivos sobre temas de cultura-literatura previstos no planejamento.
Obviamente, isso não é novidade alguma! O que pode ser inovador em
implementações da MR-D é a atenção aos dois requisitos já mencionados,
mas sobre os que convém insistir. Um deles é a articulação necessária
entre os três componentes do planejamento em todas as etapas do preparo
(escrito e oral) e da realização das apresentações (utilização de materiais
didáticos, de recursos complementares, realização de oficinas de debate
e de elaboração de produções textuais contextualizadas, etc.).
Por exemplo, os conhecidos exercícios de planejar apresentações
ou produção de textos “a favor” ou “contra” um tema determinado não
seriam completamente satisfatórios, se não se articularem a um planeja-

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

mento específico de consideração de legados culturais, de consideração


planejada de territórios, espaços, tipos humanos e grupos sociais, e ao
uso de expressões linguísticas e de gêneros discursivos claramente esta-
belecidos no planejamento. Ou seja, este último passa a ser um requisito
fundamental para a reconfiguração de conhecidas práticas expressivas,
em função dos requisitos conceituais e epistemológicos da MR-D. O
outro requisito é a visão dialógica e plural do ponto de vista semântico.
Assim, em um caso como o da comentada unidade didática sobre
estereotipia cultural, pode pensar-se em práticas nas quais tanto o profes-
sor como pares ou grupos de estudantes se dediquem, respectivamente,
a pesquisar sobre uma das afirmações retomadas no exercício do livro
didático a partir do blog do Hilton36, isto é: sobre alimentação ou ati-
vidades culturais, diversão e festas ou esporte ou moradia ou relações
familiares (sendo o “ou” entre cada tópico do tipo excludente). E nessas
pesquisas o foco estará na semântica discursiva, mediante a observação
de diferentes respostas dialógicas e legados a elas relacionados37.
Para finalizar estas observações sobre oficinas de produção oral, me
referirei a um tópico sobre o qual os professores me perguntam sempre:
a correção. Sei que para não inibir os estudantes, muitas vezes a correção
tem sido diminuída – e em alguns casos, desatendida ou até eliminada!
Na visão da Proposta Multirrede-Discursiva, ela deve existir sempre,
mas dando-se atenção à técnica utilizada.
Nas décadas recentes, em um tipo de discurso pedagógico eufe-
místico, a palavra “erro” passou a ser banida. É fato que muitas vezes,
pode tratar-se de inadequações estilísticas ou de registro, mas também
pode haver erros de sistema da língua. As regras do sistema de uma dada
língua fazem com que uma expressão corresponda a essa língua e não
a uma outra.

36 A imagem desse exercício consta reproduzida no último capítulo deste volume (DIAS; JUCÁ;
FARIA, 2013, p. 29).
37 No último capítulo deste volume apresento e discuto exemplos de complementações possíveis
para essas oficinas e comento diferentes posições dialógicas em relação aos temas culturais
em pauta na unidade.

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

Portanto, as regras do sistema de uma dada língua devem ser co-


nhecidas, estudadas e, sem medo de que seja um palavrão: memorizadas.
A memória é uma função preciosa do nosso cérebro, que não significa
necessariamente “decoreba”.
Voltando à correção, de fato, é muito válido dar-se atenção a não
inibir a expressão dos estudantes em suas produções orais. Dentre as
técnicas que permitem diminuir o fator inibidor posso descrever uma
como a seguinte: enquanto o estudante fala, o professor faz anotações.
É preciso que fique claro para todos que o professor estará escrevendo
também sobre formulações corretas que escute e não somente sobre
questões que precisem ser corrigidas ou ajustadas.
É importante que, quando o professor se manifestar, depois que o
estudante (ou grupo) finalize uma apresentação, inclua sempre obser-
vações sobre formulações bem-sucedidas e sobre as que precisam ser
aprimoradas. Mas durante a fala do aluno, o docente não interrompe,
mas escreve, sobre acertos e problemas.
Depois, ele chamará a atenção, para todos, assim as observações
e correções serão sem “estigmatizar” falas individuais. Obviamente, é
necessário que haja sempre exercitação posterior para fixar os aprimo-
ramentos necessários. Isto último é óbvio, mas tenho comprovado que
nem sempre acontece. Mas, se é desejado obter os resultados positivos
previstos, há etapas e procedimentos que não podem ser ignorados.
Finalmente, gostaria de registrar que em todas as implementações
da Multirrede-Discursiva que, ao longo dos últimos anos temos feito com
membros do meu grupo de pesquisa que, por sua vez, são professores
em diferentes contextos de ensino, os docentes têm mencionado sempre
que também aprenderam coisas novas junto com seus estudantes. Essas
manifestações são relevantes para superar um eventual componente
de rotina que o ensino de um mesmo curso durante vários anos possa
causar. A MR-D, necessariamente, propicia a inclusão de complementa-
ções renovadas e singulares, que funcionam como elemento motivador
e estimulante não só para os estudantes, mas também para os agentes
pedagógicos envolvidos.

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

Considerações finais: a MR-D como uma bússola para estabelecer rumos


e horizontes nos planejamentos e práticas no ensino de língua-discurso

Como já apontei em páginas anteriores, não se trata aqui de uma


“reinvenção da roda”. O que a Proposta Multirrede-Discursiva modesta-
mente sustenta é que, seguindo ordenadamente os seus parâmetros, podem
realizar-se planejamentos sistemáticos com a previsão de conteúdos, práti-
cas e aferição de resultados gradativamente organizados, dando-se atenção
cuidadosa à dimensão semântico-cultural, algumas vezes negligenciada nos
cursos de língua-discurso. Embora se chamem tradicionalmente “cursos
de língua”, nesta visão o foco está na relação estreita entre formulações
verbais e o domínio discursivo-cultural. Para tanto, a perspectiva da análise
de materiais didáticos bem como as complementações criteriosas – com
atenção à mobilização constante de textos literários e de outras produções
artísticas, em função dos parâmetros da MR-D – têm sido referidas neste
capítulo e serão ampliadas nos seguintes. Quanto a isso último, gostaria de
salientar que, embora haja aqui análises críticas de diferentes livros didáti-
cos, em todos os casos são apontadas características positivas dos materiais
em análise. Esses manuais fazem parte das condições de produção do dis-
curso pedagógico e a MR-D se propõe como um recurso para enriquecer o
seu uso, mediante redes textual-discursivas fundamentadas em cada caso.
Na formação docente, tenho reiteradamente defendido a relevância
das práticas de análise pré-pedagógica sistemática de matérias, pois
um professor que as realize de modo fundamentado poderá dar aulas
excelentes com materiais que deixem a desejar, com uma boa previsão
no planejamento.
Os parâmetros da MR-D poderão contribuir para que o professor
ou outro agente pedagógico detecte as lacunas a serem preenchidas ou
os conteúdos a serem aprimorados.
Quanto à complementação sistemática com redes textual-discur-
sivas, não estou sugerindo aqui que sejam necessários inúmeros textos
ou materiais audiovisuais. Justamente, algo que a MR-D propicia é a
superação da dispersão discursiva.

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Cultura e literatura no ensino de língua-disCurso

Assim, é preciso que o professor detecte os excessos estéreis e não os


reproduza. Cada situação específica de ensino levará a que se priorizem
temas e focos de conteúdos e de materiais, conforme seus planejamentos
correspondentes.
Mas, para todos os casos, a Proposta MR-D chama a atenção para
dar-se à cultura e à literatura (e também a outras expressões artísticas)
o lugar que merecem, em função de uma formação verdadeiramente
educacional e não meramente instrumentalista.
Para tanto, na atualidade contamos com o auxílio da Internet, mas ao
pensarmos na enorme quantidade de recursos à disposição na atualidade,
é bom insistirmos na lembrança de palavras de Daniel Coste. Ele dizia:
todo navegador precisa de bússola. Assim, em conclusão: a Proposta
Multirrede-Discursiva funciona como uma bússola que contribui para o
estabelecimento de rumos e horizontes na educação linguístico-discursiva
e cultural.

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