Algumas Melodias Modais No Coco
Algumas Melodias Modais No Coco
Algumas Melodias Modais No Coco
Resumo: Este artigo apresenta as transcrições de algumas melodias do gênero Coco, selecionadas
e transcritas pelo autor. Foram retiradas as melodias modais do registro intitulado Alegria e
devoção (1998), Zambê (1999) e, para comparação, das Missões de 1938 de Mário de Andrade.
Como resultado, há uma classificação de quais melodias são modais e em quais modos elas se
apresentam na obra Os Cocos de Mario de Andrade (2002).
Abstract: This article presents the transcripts of some of the coco genre melodies, selected and
transcribed by the author. Were taken modal melodies from the records titled "Alegria e Devoção"
(1998), "Zambê" (1999) and, for comparison, from the records titled “As Missões de Pesquisas
Folclóricas”, (1938) by Mário de Andrade. As resulted, there is a classification in which are modal
melodies and in which modes they appear in the book "Os Cocos" by Mario de Andrade (2002).
1. Introdução
Fig. 1 - Coco 1.
XXV Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música – Vitória – 2015
A próxima melodia se encontra em modo menor, sem a presença da 7ª, o que o torna
indefinido, entretanto mais próximo do 6º modo (eólio) em virtude da 6ª menor. Formado por
apenas duas frases, sendo a segunda derivada da primeira. O mesmo fenômeno da melodia
anterior acontece: o da impressão de resposta musical quando cantada pelo coro, apesar de
musicalmente se tratar da mesma melodia.
Fig. 2 - Coco 2.
Observa-se que nessa melodia as duas frases resolvem na tônica após o arpejo do
acorde correspondente. A letra tem estrofes de quatro versos em redondilha menor (cinco
sílabas poéticas) e, às vezes, tem seis silabas no primeiro verso, que altera ligeiramente a
melodia.
Outra melodia no 6º modo do gênero diatônico puro (eólio) com final 3-1. A frase a é
repetida literalmente pelo coro.
XXV Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música – Vitória – 2015
Fig. 3 - Coco 3.
Fig. 4 - Coco 4.
Fig. 5 - Coco 5.
O próximo exemplo apresenta um híbrido entre modos menor e maior. Ambos sem a
presença da sensível tonal nas frases b e d. As duas primeiras frases poderiam estar no 3º
modo do gênero diatônico (hipoeólio)1 sem o 2º grau com o final 6+1, cujo do# não pertence
ao modo. Nas duas últimas frases, nas quais há a resposta masculina, parece que o centro
modal converge para o 1º modo do gênero diatônico puro (jônio) sem 7ª e 5ª, mas com o
mesmo final cadencial: 6+1. A melodia completa possui 16 compassos com um antecedente
de oito compassos realizados pelas mulheres e o consequente de oito compassos com o solo
masculino, que é a resposta.2
Fig. 6 - Coco 6.
Fig. 7 - Coco 7.
2.8 Saudação
Fig. 8 - Coco 8.
frases são de quatro compassos cujos finais são 5+7, frase a interrogativa e 1+3+5, frase b
afirmativa. Os mesmos finais ocorrem na repetição alterada do coro.
em modo menor (6º - eólio) sem presença de sensível (sol#).3 Estrutura-se de maneira ternária
devido à repetição da primeira frase (a). Como no exemplo anterior, essa frase é interrogativa,
resolvendo na nota dominante (5) e a última é conclusiva, realiza o final 2-1. Ela consta na 43ª
faixa do 2º CD, gravada em Pombal, estado do Pará.
3. Considerações Finais
O que parece ocorrer como fenômeno é que, embora do ponto de vista quantitativo, a
maioria das melodias do gênero sejam tonais, são as exceções que irão se destacar para uma
futura estilização. Ou seja, trata-se de uma identidade que se dá através da alteridade quando
se pensa que o modalismo seja um dos fatores que caracteriza tal manifestação. Entretanto, há
que se notar a presença do 6º modo (eólio) em muitos exemplos, o que parece ter sido
XXV Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música – Vitória – 2015
aproveitado mais como gênero tonal (menor) quando da sua harmonização por instrumentos
harmônicos como o violão ou a sanfona.
No que tange outros parâmetros, nota-se a predominância do ritmo binário e a
presença daquilo que Mário de Andrade chamou de síncope característica. Outro ponto que
traz uma identidade ao gênero é o dos traços cadenciais que, associados ao modalismo,
corroboram com o que Piedade (2005) caracterizou como pertencente ao universo das tópicas
nordestinas, ou seja, não basta simplesmente a utilização do modo, mas também dos seus
contornos específicos.
Finalizando, o campo do aproveitamento pela cultura de massa do gênero há um
importante álbum do artista Gilberto Gil (1998) que, além de regravar o clássico “17 na
Corrente” (Edgard Ferreira e Manoel F. Alves) interpretado por Jackson do Pandeiro na
década de 50, gravou duas melodias retiradas da referida obra de Mario de Andrade: “Mana
Teus Cabelos” e “Tatá Engenho Novo” onde as proporções se invertem: duas melodias
modais e uma tonal.
Referências:
- Gravação em CD ou em vídeo
COCOS ALEGRIA e DEVOÇÂO. João Pessoa: Editora Universitária da UFRN, 2000. [CD]
SOL DE OSLO. Gilberto Gil. Biscoito Fino, 1998. [CD]
MISSÃO DE PESQUISAS FOLCLÓRICAS: MÚSICA TRADICIONAL DO NORDESTE
1938. São Paulo: Sesc-Prefeitura da Cidade de São Paulo-Centro Cultural São Paulo, 2006.
[CD]
RESPONDE A RODA OUTRA VEZ: Música Tradicional de Pernambuco e Paraíba no
Trajeto da Missão de 1938. Realização FadeUFPE, Departamento de Música – Núcleo de
Etnomusicologia UFPE, Laboratório de estudos da Oralidade UFPA e As. Respeita Januário,
2005. [CD]
ZAMBÊ - COCOS. Natal: Projeto Nação Potiguar, 1999. [CD]
Notas
1
Baseado no fato de a nota dominante na acepção gregoriana deste modo ser o 4º grau, o que corresponderia ao
modo menor natural com o salto 5-1 ascendente.
2
No antecedente, as mulheres dizem o seguinte: Eu me calei/ não disse nada/ mulher malvada/ não é assim que
se faz; e o solo diz: Mas ô mulher/ você foi embora/ fiquei pensando/ de você não mais voltar.
3
Outro exemplo dessa mesma letra aplicada à outra melodia encontra-se em Andrade, 2002, p. 83.