Resumos Ética
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Resumos Ética
– Aula 1 – Origem, tendência e questões actuais na bioética. Factos, valores e deveres. Ensinar a
deliberar sobre os valores e a tomar decisões autónomas
A ÉTICA é um conjunto de valores que visa a excelência/ o óptimo (to ariston) e não a suficiência do que é Bem “a arte de
eleger a melhor conduta”. O objectivo da ética passa por ensinar a conhecer factos, deveres e sobretudo valores para que
tomemos decisões autónomas.
FACTOS
DEVERES ‐ A experiência do dever é primária e consubstancial a qualquer ser humano.
o Há deveres que geram direitos correlativos: deveres perfeitos (ou de justiça);
o Há deveres que não geram direitos: deveres imperfeitos (ou de beneficiência) – deixa‐se ao nosso arbítrio as
ocasiões particulares em que os realizamos: caridade, beneficência;
o O âmbito do dever é + amplo que o do direito, e só certos deveres geram direitos correlativos;
VALORES ‐ São subjectivos; Dependem das emoções, desejos, educação, tradição, crenças; Vão‐se construindo (e o
inverso); e são os motivos fundamentais das nossas decisões; Não podemos viver sem valores, sem valorizar;
o Conjunto de valores intrínsecos: valor intrínseco se e só se for valioso em si mesmo e não por referência a outra
coisa, dando sentido à nossa vida o conjunto de valores intrínsecos define a cultura de um indivíduo
exemplo: um ser humano, por ser uma pessoa e ter dignidade, é um fim em si, tem valor intrínseco
o Conjunto de valores instrumentais: Uma coisa, acção ou objecto, ou seja, produtos da técnica e da ciência que
são meios que servem para atingir certo fim; valem por referência a outra coisa o conjunto de valores
instrumentais define a civilização exemplo: O dinheiro, fármacos, automóveis têm claramente valor
instrumental.
Toda e qualquer pessoa dá mais importância a determinados valores em relação a outros, estabelecendo‐se
assim uma espécie de hierarquia de valores. Os valores a que cada pessoa confere mais importância vão
reflectir‐se nas suas acções e decisões, vão de certa forma organizar e orientar toda a sua conduta futura.
Muita civilização e pouca cultura: perversão axiológica ‐ pares dos valores opostos
A saúde depende de valores intrínsecos e instrumentais.
NOTA: O paradoxo da erosão ética reflecte‐se muito na Medicina: à medida que os estudantes de medicina se tornam
médicos com mais anos de trabalho têm tendência a diminuir a sua sensibilidade ética.
Ética e Deontologia Médica: aspectos históricos
Código de Hammurabi: 1750 AC (Babilónia)
Juramento de Hipócrates ‐ Triplo sentido para a história da Ética Médica ocidental
primado do princípio da beneficência
santidade da vida humana (proibição na indução do aborto e da eutanásia)
respeito pelos professores
Cristianismo
amor ao próximo;
considerar necessidades físicas e espirituais;
compaixão (sofrer com) e caridade para com os que sofrem;
os mosteiros enquanto hospícios‐hospitais e lugar de aceitação/depósito dos doentes e
desafortunados (“Misericórdias”);
S. Tomás de Aquino (sec. XIII): é pecado um médico pedir demasiado dinheiro ou recusar tratamento
gratuito a quem morrer se o não receber.
Thomas Percival (1803) ‐ Medical Ethics: a code for institutes and perceptors adapted to the professional conduct of
physicians and surgeons
deveres dos médicos entre si;
desempenho nas instituições de saúde;
áreas de competência dos médicos, cirurgiões e farmacêuticos.
relações entre os médicos mais novos e os mais velhos
conduta entre colegas
manter as divergências entre colegas fora do conhecimento de terceiros
American Medical Association (AMA) ‐ 1º Código de Ética Médica – 1847
Barahona Fernandes (1956)
antropoética , medicina humanizada “todo o médico digno deste
nome – e não só o psiquiatra – encara hoje os seus enfermos na
tripla perspectiva do orgânico, do psíquico e do cultural. Numa
síntese que nos é cara – a Vida, a Mente e o Espírito” .
Miller Guerra (1965)
aspectos deontológicos da contracepção ‐ defende que a Igreja Católica aprove o uso da “pílula”.
ANOS 60 ‐ avanços técnico (por exemplo, Diálise, Ventiladores, Transplante de órgãos (coração: 1967), Contracepção segura: sexualidade ≠
risco de gravidez involuntária) + Movimentos sócio‐culturais (direitos cívicos, direitos reprodutivos, feminismo, direitos dos doentes: crítica
das doentes e famílias à obsoleta e desfigurante mastectomia radical)
ANOS 70 ‐ Comissões de Ética hospitalares (1970): doentes terminais e técnicas de reanimação; Aborto seguro;
Eutanásia (em 1968 introduzira‐se o conceito de morte irreversível ‐ EEG); Escassez de recursos médicos; Direitos do
animal; Fertilização in Vitro (FIV): 1978
BIOÉTICA: Van Rensselaer Potter (1970) Inicialmente propôs a designação “science of survival” no sentido ecológico – ie, uma
disciplina interdisciplinar que visa a preservação da bioesfera/ regulação de todos os seres vivos “saber trans disciplinar que
planeia as atitudes que a humanidade deve tomar ao interferir com o nascer, o morrer, a qualidade de vida e a interdependência
de todos os seres vivos. É a expressão da consciência pública da humanidade”. Para Van Potter, a Bioética deve lidar com Toda a
Vida e Todas as Vidas:
1. Ética Médica.
2. Ética animal.
3. Ética do ambiente.
A Bioética não se limita às relações médico‐doente porque a técnica humana interfere na natureza e no mundo animal.
2013, Diego Grácia ‐ “A Bioética tem que sair dos hospitais; tem mesmo que sair do mundo sanitário, das mãos dos médicos e dos
profissionais de saúde, para se converter num tipo de mentalidade, numa cultura, numa nova cultura, a cultura da vida e da
qualidade da vida dos seres humanos. ”. “Os maiores problemas que hoje enfrenta a Bioética já não estão relacionados com o
poder da ciência e da tecnologia. Hoje em dia as questões bioéticas mais importantes têm a ver com o dinheiro e as condições
sócio‐económicas. Grande parte da população de um importante número de países não tem acesso aos benefícios do progresso
científico e tecnológico. ” “(...) Padecem de doenças tratáveis, mas sem acesso à medicação necessária. Necessitam submeter‐se a
intervenções cirúrgicas, mas não têm possibilidade de aceder a elas. Precisam de cuidados médicos que não podem pagar. Não
podem cuidar dos seus filhos doentes, porque trabalham em lugares longe das suas casas. Não podem alimentar‐se
adequadamente nem alimentar as famílias. Tudo isto fez com que o processo de globalização tenha posto em relevo a
necessidade de uma Bioética realmente global”
É importante reter que a evolução que se verifica na ética depende da evolução do contexto social, político e religioso.
Ética e Deontologia Médica: teorias e princípios éticos
Ética → Propõe (o óptimo!). É “a arte de eleger a melhor conduta” e procura valores permanentes, ou seja, com carácter
universal e intemporal = convicção individual
Em ética médica, por mais que queiramos justificar racionalmente as nossas decisões, por vezes tal não é possível.
Muitas das escolhas éticas não têm apenas a ver com a razão mas também com a emoção.
Moral → Norma va. Normas e costumes sociais actualmente aceites e seguidas por indivíduos ou grupos. São
influenciados pela relatividade cultural e histórica num momento. Por exemplo: hoje é moralmente aceite relações
sexuais antes do casamento mas há 50 anos não o era = convenção social
Lei → Impõe (Pune)
“A ética não pode prescindir da moral, tal como a moral somente se torna fera amansada se se desligar da ética”
PRINCIPAIS TEORIAS ÉTICAS:
1. Consequencialismo ‐ “The greatest good for the greatest
number”/ o maior bem para o maior número de pessoas. As
melhores consequências para o maior número possível / maximizar
o bem. O Utilitarismo é a teoria consequencialista actualmente mais
prevalente: As consequências de uma acção determinam a sua
bondade e correcção.
o melhor benefício para o maior número possível
avaliam‐se os efeitos previsíveis: os resultados
obtidos para o doente determinam se o acto foi correcto ou
incorrecto
2. Kant e a teoria deontológica (dos deveres) – o imperativo categórico da teoria de Kant passa por agir como se a máxima da tua
acção se pudesse tornar lei universal essencialmente pautando para que o dever (intenção) seja mais importante que a
consequência. Uma intervenção será correcta se corresponder à satisfação do dever, quaisquer que sejam as suas
consequências. Kant defende ainda neste contexto que devemos tratar as pessoas como fins em si mesmos, nunca apenas
como meios.
3. Principiologia (Beauchamp & Childress) ‐ reclamava brotar da charneira
entre o utilitarismo e a ética deontológica kantiana. Os princípios são
consequência dos VALORES, e nunca o inverso. Os princípios são conceitos que, se correctamente usados, servem como
“checkpoints” no exame de casos concretos. Cada um destes princípios é essencial à ética médica. Nenhum destes
princípios é único; tem primazia sobre os outros; ou se sobrepõe a priori a qualquer outro, ou seja, perante um problema
ético devemos considerar os quatro. Todavia a beneficência constitui a razão de ser e o objectivo primeiro da Medicina e
dos cuidados de saúde.
Beneficência: Obrigação de agir em benefício do doente e de forma a que sejam atendidos os seus interesses mais
importantes e legítimos. Todas as formas de acções com intuito de beneficiar outros. Bondade, generosidade,
caridade. Obrigação moral de actuar em benefício de/dos outros.
Por vezes é necessário estender o princípio da beneficência pois não é possível às vezes produzir benefícios ou
eliminar danos sem criar riscos ou incorrer em custos. A opção nestes casos passa por garantir que os benefícios
criados são suficientes para compensar os riscos e custos (Princípio da utilidade = proporcionalidade)
O Porquê da relatividade do PB:
Altruísmo extremo pode implicar sacrifício (por exemplo, doar um rim só porque somos HLA compatíveis) e
nós não somos moralmente obrigados a beneficiar as pessoas em todas as ocasiões, mesmo que o
possamos fazer Não é possível actuar com total beneficência em relação a todos!
Profissionalmente temos obrigações mas não necessariamente emulações (acto de uma pessoa se sacrificar
em extremo pelas outras, ou seja, agir para lá da sua obrigação) – obrigações correntes > obrigações morais
> emulação
Questiona‐se também se este principio da beneficência se aplica de igual forma às pessoas de quem
gostamos vs as de quem não gostamos.
Os profissionais de saúde são obrigados a aceitar riscos extraordinários ao cuidar de doentes difíceis ou
contagiosos ?
Quem ajuíza o que é o melhor para o doente?
Estamos moralmente proibidos de causar dano a quem quer que seja (principio da não maleficência é uma
obrigação perfeita); mas somos parciais na beneficência (obrigação imperfeita).
Autonomia: auto governo → escolha individual por
parte de cidadãos autónomos, críticos e responsáveis.
Permite que as pessoas sejam responsáveis pelas suas
escolhas e decisões. O respeito e exercício da autonomia
supõe: reconhecimento do direito dos doentes;
obrigação médica em revelar/informar com verdade;
protecção da confidencialidade; respeito pela
privacidade; consentimento do doente para o médico
poder intervir (consentimento informado = autorização
para realização de ato médico).
O respeito pela autonomia não implica sempre uma
visão: individualista (família e sociedade podem intervir
na escolha), exclusivamente racional nem legalista. Adicionalmente, o direito de autonomia é diferente de haver um
dever de autonomia (o doente pode exercer o seu direito de autonomia mas também pode escolher a ignorância,
não aceitação da informação ou desistência de ser informado).
Se o doente, ainda que competente, não compreende terapêuticas ou procedimentos implicados na sua situação
clínica; ou a situação de morte próxima pode condicionar a capacidade de decisão do doente pode ser necessário
um Paternalismo “Aceitável” – aquele em que o médico insiste para o doente o que é melhor para ele, ou então que
tenta encontrar um compromisso entre a vontade do doente e o que é melhor para ele || Paternalismo
“Inaceitável” – em que o médico ignora a recusa do doente, ou em que nem lhe explica as suas opções de
tratamento, e simplesmente faz o que assume ser melhor para o doente
Constituem excepções ao princípio da autonomia: Crianças < 14 anos; Doentes mentalmente incapacitados; Suicidas
irracionais; Toxicómanos; Prisioneiros; Doentes em coma / EVP. Além destas excepções devemos estar atentos aos
excessos: Subestimação do direito do embrião e do feto (= pessoa ?); Aceitação automática das “advance directives”
(testamentos vitais); Sobrevalorizar opiniões de doentes com capacidade mental limite.
Justiça distributiva: equidade na distribuição de bens e de benefícios, ou seja, doentes em condições semelhantes
devem ter acesso a semelhantes cuidados de saúde mas ao mesmo tempo, a escolha dos recursos de saúde
dispensados a um doente deve ter em atenção a disponibilidade dos recursos necessários a outros doentes.
Não maleficência: Primum non nocere. Não causar mal, dano aos doentes. Não submeter os doentes a riscos
desnecessários. Devem ser seguidas imparcialmente… quando não o são, constituem razões morais que justificam
punições legais de certas condutas. Há quem considere este princípio a outra face da moeda do PB, não sendo
muitas vezes fácil traçar a respectiva divisória.
4. Ética da virtudes (aristotélica) – Esta teoria surge por insatisfação face às teorias clássicas que são demasiado abstractas e
dão demasiado ênfase no que se deve fazer, em detrimento da análise de questões como que espécie de pessoa
devemos ser e que tipo de vida devemos levar. Esta teoria coloca a tónica na boa formação do carácter e personalidade
das pessoas ou profissionais. Ou seja, apoia que deve existir virtude moral, um traço de carácter moralmente valioso que
englobe compaixão, confiança, consciência, discernimento e integridade. Segundo esta teoria, uma acção é correcta se
corresponde ao que o virtuoso teria feito em todas as circunstâncias; A bondade precede a correcção; As virtudes são
bens intrínsecos e plurais; As virtudes são objectivamente boas; Algumas virtudes intrínsecas são relativas a quem age; A
acção correcta não exige que se maximize o bem.
As principais críticas passam pelas questões que ainda se levantam: As virtudes ensinam‐se ? treinam‐se ? herdam‐se ?
praticam‐se ? Pode ensinar‐se um estudante de medicina a ser virtuoso ? Ou este deveria ser um critério de escolha dos
futuros médicos?
NÃO ESQUECER QUE AS VÁRIAS TEORIAS ÉTICAS NÃO SE EXCLUEM NECESSÁRIAMENTE.
Ética ‐ Aula 2 – Questões Éticas no início da vida. IVG, objecção de consciência, princípio do
plano inclinado e de duplo efeito. Colaboração material e formal.
O início da vida humana levanta muitas questões:
Cerca de 70% das gravidezes acabam por desaparecer, ou
1. Será um embrião fecundado igual a um embrião implantado? seja, existem valores laboratoriais que comprovam a
gravidez contudo, por algum motivo, esta não chegará a ser
uma gravidez evolutiva, não havendo atraso menstrual e
portanto muitas vezes a mulher não sabe que esteve grávida
(CURIOSIDADE: qualquer mulher que tenha estado grávida,
mesmo que a gravidez não tenha evoluído, tem DNA fetal
em circulação até ao fim da sua vida.
Até ao 5º dia (blastocisto) não é seguro que haja Massa
Celular Interna: Embrioblasto. Se só trofoectoderme: Amnios
& placenta → ß HCG Ex: gravidez anembriónica (“ovo
cego”)
Até ao 8º‐12º dia pode:
1 → 2 (gravidez múl pla)
2 → 1 (quimera)
Individuação (só certa após 12º dia) leva ao início da
formação do Sistema Nervoso – Sensibilidade, Vida cerebral
e espiritual, Consciência, Comunicação
2. O que é a vida humana? Quando se inicia?
Pessoa humana é um conceito moral e filosófico mas não pode ignorar os dados científicos: há momentos cruciais no
desenvolvimento de um embrião e que podem ajudar na definição de determinadas questões éticas: por exemplo, existem leis no
RU e Holanda que permitem a interrupção voluntária da gravidez até às 24 semanas justificando que este é o limite da viabilidade
extra‐uterina; outros acham que o grande momento que divide a gestação é o aparecimento dos primeiros movimentos fetais;
outros pensam que o grande momento é o início da actividade cerebral (8ª‐10ª semana), facto que terá sido o argumento mais
utilizado para delimitar a lei da interrupção voluntária em Portugal.
Estatuto moral do embrião: Para alguns cientistas da área da embriologia humana, a vida humana começa com a fecundação, uma
vez que é a partir desse momento que surge um mecanismo novo, intrı ́nseco e autónomo que, na ausência de patologia, culmina
no desenvolvimento embrionário normal. Se a definição de vida humana, em termos biológicos, não é consensual, menos o é a
definição do seu estatuto moral:
Tese concepcionista ‐ O embrião deve ser tratado como se fosse uma pessoa humana desde a concepção. O embrião
tem sempre o mesmo estatuto à medida que evolui, rejeitando o uso do DIU, da pílula do dia seguinte ou do aborto
considerando que todas destroem da mesma forma a vida humana e que são iguais a um homicídio.
Tese gradual – Defende que a vida intra‐uterina viável é sempre merecedora de respeito pela sua dignidade (é vida
humana) e que vai‐se tornando pessoa humana ao longo da gestação (quando?). Apesar de não definir exactamente um
instante crucial deste desenvolvimento que marque a passagem a pessoa humana, esta tese realça a diferença existente
entre as várias fases do desenvolvimento, sobretudo a partir do momento em que surge a vida espiritual do embrião,
que se admite aparecer quando o SNC já é capaz de proporcionar um certo grau de consciência.
Ou seja, a posição que tomamos relativamente ao estatuto do embrião influencia a nossa posição relativamente a determinadas
questões: aceitar ou não a pílula do dia seguinte, o aborto e o DIU? Aceitar ou não a investigação em células estaminais
embrionárias descongeladas e sem projecto parental?
A tese gradual, por defender o carácter progressivo do desenvolvimento da pessoa humana, ressalva também a importância da
distinção entre embriões intra e extra uterinos e dentro destes, in vivo ou in vitro. Dá ainda particular interesse à mulher grávida,
apoiando a importância única e determinante da mulher grávida na identidade de cada pessoa humana:
regulação dos genes de embrião/feto (epigenética)
ambiente hormonal específico (unidade feto‐placentária)
diferente contexto imunológico
contexto bioquímico e metabólico
contexto emocional
Por todas estas questões a gravidez de substituição é contemplada na legislação Portuguesa mas ainda não é permitida (“seriamos
muito diferentes se fossemos gerados noutro útero”): Atualmente em Portugal a maternidade de substituição é ilegal. Segundo a
Lei da Procriação medicamente assistida (Lei nº 32/2006, de 26 de Julho): “São nulos os negócios jurídicos, gratuitos ou onerosos,
de maternidade de substituição” (Artigo 8.º). Existem vários argumentos a favor desta legalização: importância para o casal
infértil; permitir a uma mulher com ovários e óvulos que exerça o seu direito à maternidade, sem que este seja impedido pelo
facto de não ter útero/ ter patologia uterina; mas sobretudo existem vários factores contra: quais as consequências da
dissociação entre a maternidade genética e a maternidade gestacional no desenvolvimento da criança? Perder o vínculo que se
estabelece entre a mãe de substituição e a criança, durante os 9 meses de gravidez, terá repercussões no seu desenvolvimento? A
mãe de substituição terá de amar a criança o suficiente para não prejudicar o seu desenvolvimento intra‐uterino; mas em
simultâneo terá de se distanciar de laços afectivos para que esteja consciente de que terá de entregar o bebé? É possível antever
que uma mulher, que aceita ser mãe de substituição, não muda a sua atitude ao longo da gestação e parto? Esta prática deve ser
regulamentada mas em simultâneo questiona‐se se deve o ser humano ser considerado um valor instrumental, passível de ser
comprado ou negociado num contrato.
Novos desafios…
Reprodução medicamente assistida (FIV ou injecção citoplasmática intraovocitária de espermatozóides) – em Portugal ≈
100 crianças e ≈ 1% dos partos/ ano ocorrem por procriação medicamente assistida.
Clonagem por transferência nuclear de célula somática
Clonagem reprodutiva em mamíferos (1997 – Dolly)
Consenso bioético:
Total condenação da clonagem reprodutiva
Controvérsia ética no Apoio à clonagem para investigação (ex: compreensão de mecanismos de
doenças)
Investigação com células estaminais embrionárias
A Lei de PMA (2006) autoriza: descongelar embriões (D 3‐5) e sem projecto parental após 3 anos. Poderiam
estes embriões excedentários ter utilidade? Por exemplo, para compreensão de mecanismos de doenças,
eventual terapêutica futura? Não há consenso bioético.
Células estaminais do cordão umbilical
Estatal ou privado ? só para o próprio ? todos para todos?
Congelamento dos ovocitos para posterior utilização
Indicações médicas? Familiares? Profissionais? Estatal ou privado?
As respostas a estas questões éticas dividem‐se e dependem de questões morais, religiosas, filosóficas, emocionais e científicos.
Aspectos éticos na interrupção de gravidez
Antes de falarmos sobre interrupção da gravidez é necessário clarificar alguns conceitos (equivocidade conceptual):
Definição de início de gravidez: implantação. Só após a fecundação e a implantação se considera que há gravidez.
Definição de aborto (= interrupção de gravidez)
Consequências práticas: “pílula do dia seguinte”, DIU: abortivos ou anti‐nidatórios?
NOTA: A necessidade de contracepção de emergência tem vindo a aumentar bastante nos últimos anos.
A lei e suas interpretações: A actual lei regulamenta a interrupção voluntária da gravidez e foi em 2007 sujeita a referendo, que
conduziu à sua actualização.
Esta lei tem várias interpretações, o que permite que o mesmo texto possa dar origem a diferentes ideias do que é legal da
interrupção da gravidez SUBJECTIVA. Adicionalmente, a lei portuguesa, além de subjectiva, é sujeita à objecção de consciência
por parte dos médicos, o que lhes permite que, mesmo que esteja contemplada na lei, possam não realizar a interrupção da
gravidez. Assim, as diferentes interpretações à lei portuguesa por vezes necessitam que sejam consideradas:
Comissões Técnicas nos diferentes hospitais – ajuda a determinar se é legitimo ou não a interrupção voluntária da
gravidez caso a caso. A comissão é constituída por 5 a 6 pessoas (obstetras, ecografistas, neonatologistas e pediatras) e
avalia caso a caso, os pedidos de interrupção voluntária de gravidez. É por isso possível que, considerando o risco de
diferentes desfechos em casos análogos, um pedido semelhante e no mesmo enquadramento legal, tenha uma solução
diferente. A DECISÃO DE REALIZAR INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ NÃO É INDIVIDUAL, PASSANDO SEMPRE
PELA COMISSÃO TÉCNICA [EXCEPTO A ALINEA a) e e)]. Adicionalmente, para quase todas as situações, a IVG prevê um
período de reflexão de 3 dias e ao longo destes 3 dias havendo uma consulta de aconselhamento mas isto não ficou bem
claro na lei Portuguesa.
Referendo de Fevereiro de 2007: Questionou a população portuguesa se Concorda com a despenalização da
interrupção voluntária da gravidez, se realizada por opção da mulher nas primeiras 10 semanas, em
estabelecimento de saúde legalmente autorizado ?
Porquê 10 semanas? Admite‐se que antes disto não há actividade do SNC e é mais fácil admitir para
a maioria que nestas circunstâncias ainda não há pessoa humana. Mas cuidado com o princípio do
Plano inclinado !!! entramos num plano inclinado quando vamos admitindo excepções (por exemplo, 10
semanas + 2 dias; depois já admitimos 10 semanas + 4 dias; etc) facto que nos leva a “ir escorregando” por este plano inclinado.
Neste sentido, foi introduzido na legislação portuguesa:
O número de abortos está relativamente estável nos últimos anos em Portugal mas aumentou consideravelmente relativamente
aos dados obtidos antes da despenalização. Em Portugal realizam‐se 7,34 INTERRUPÇÕES GRAVIDEZ LEGAIS POR MIL MULHERES
EM IDADE FÉRTIL sendo dos países europeus com menor taxa de interrupções legais e estando abaixo da média da união europeia
(10,0).
Código Deontológico da Ordem dos Médicos (2008): Paralelamente à lei Portuguesa o código deontológico da Ordem dos
Médicos também regulamenta a interrupção da gravidez, não defendendo o aborto voluntário, excepto em condições
terapêuticas. Mesmo depois de aprovada a lei de despenalização do aborto, o código deontológico continua a condenar a prática.
Acentua assim a importância da reflexão ética do médico à luz das suas convicções, dos conhecimentos científicos mais actuais e
dos valores em presença, dando‐lhe a possibilidade de ser objector de consciência. Ou seja, neste momento existe um conflito
entre a lei e a deontologia.
Cerca de 70% dos médicos são objectores de consciência para a IVG. Tipos de Objecção de Consciência:
Selectiva : caso a caso… subjectividade pura ? (situação nacional para a prática do testamento vital)
Geral: objector em 1 caso → objector em todos os casos (situação nacional para a IVG), ou seja, em Portugal, o médico
não pode realizar aborto em alguns casos e recusar‐se a fazê‐lo por objecção de consciência noutros casos. Além disto é
formal, devendo o médico entrar um papel na ordem dos Médicos e na instituição clínica em que exerce, declarando‐se
objector.
Podemos ser objectores de consciência mas temos de actuar em situações de urgência se não existir mais nenhum profissional
que o possa fazer; e mostrar cumplicidade moral: por exemplo, indicando alternativas ou através de colaboração material (p.e.
fazer a ecografia que data a idade gestacional).
Outras situações previstas na lei que permitem a objecção de consciência: IVG e testamento vital.
Embriões Excedentários
As modernas técnicas de reprodução medicamente assistida produzem um número de embriões humanos mais elevado do que
aqueles que são implantados. Estes embriões são criopreservados para tentativas futuras de implantação e tornam‐se
excedentários quando, situação mais frequente, o casal consegue o número de filhos desejado ou se desfaz. O que fazer com
estes embriões excedentários criopreservados?
A forma como se encara a problemática dos embriões excedentários e as suas resoluções estão inevitavelmente relacionadas com
a definição biológica do embrião (quando aceitamos que começa a vida humana) e o seu estatuto moral de pessoa humana (tese
concepcionista? Tese gradual?). Os embriões criopreservados são considerados como sendo já uma pessoa, ou são apenas
potencialmente uma pessoa?... ou serão apenas um agregado de células? Para muitos esta é a reflexão ética que deve ser
realizada, e será com base nesta definição, que deverão ser estabelecidas as polı ́ticas institucionais de permitir ou não a
criopreservação de embriões, e decidir do seu destino.
O Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, adiante designado por CNPMA, ao qual compete,
genericamente, pronunciar‐se sobre as questões éticas, sociais e legais da PMA:
O destino dos embriões previsto no número anterior só pode verificar‐se mediante o consentimento dos beneficiários originários
ou do que seja sobrevivo (…):
Inicialmente, 60% a 80% pretende utilizar embriões em futuro projecto parental
Contudo, longo prazo a maioria opta por destruição e só uma minoria tem outros destinos: Doação a outros casais
inférteis (maioria não concretiza ) e ≈ 20% dispostos a doá‐los à ciência
Só poderão ser submetidos a investigação embriões criopreservados sem projecto parental; embrioes que não possam servir para
PMA; embrioes que possuam anomalias genéticas graves ou obtido sem recurso à fecundação por espermatozóide. O recurso a
embriões nas condições das alíneas a) e c) do número anterior depende da obtenção de prévio consentimento, expresso,
informado e consciente dos beneficiários aos quais se destinavam.
Ética ‐ Aula 3 – Questões éticas em fim de vida: testamento vital, procurador de cuidados de
Saúde, eutanásia e morte assistida. Situação Nacional
A Morte pode ser definida como a “Interrupção irreversível das Funções Vitais”. A Morte Cerebral pode ser definida pela “perda
total e irreversível das funções cerebrais”.
Estes temas têm particular relevo dado o Envelhecimento Social e Senilidade.
TOMADA DE DECISÃO EM CUIDADOS EM FIM DE VIDA
As decisões em final de vida devem‐se basear nestes 3 princípios:
Critério da autonomia ‐ apenas se aplica a doentes competentes ou, no caso de se tratar de doentes incompetentes,
devem‐se respeitar as decisões autónomas manifestadas no passado. Sempre que as decisões prévias sejam conhecidas
e estejam directamente relacionadas com uma situação de saúde específica, devem ser respeitadas
Critério do melhor interesse para o doente ‐ No caso de um doente não competente, e de não serem conhecidas as
preferências de tratamento face a uma determinada situação clínica, o mais adequado é utilizar o critério do melhor
interesse ou seja, a maximização a decisão de abordagem de forma a pretender o melhor para o doente.
O critério do juízo substitutivo ‐ O critério do juízo substitutivo só deverá ser aplicado em doentes não competentes em
que existam razões suficientes para acreditar que um substituto possa tomar uma decisão que a pessoa em causa
também tomaria. Neste caso, o substituto deveria ter uma relação íntima com a pessoa em causa, conhecendo as suas
opiniões e os seus valores, de modo a responder à pergunta: Que desejaria o doente nestas condições? 1º família; 2º
profissionais de saúde
Em algumas situações podem ser preteridos outros princípios éticos como a beneficência, não maleficência e a justiça.
Que “armas” podemos utilizar para esta tomada de decisão quando o
doente está capaz de exprimir as suas opiniões, desejos e objectivos?
Consentimento informado é um meio através do qual o doente
pode conhecer as terapêuticas que irá realizar, bem como os riscos
associados e benefícios, podendo ele escolher de acordo com os
seus valores se aceita ou não determinadas terapêuticas.
“…acto de decisão livre e voluntária realizado por uma
pessoa autónoma, após um processo no qual lhe foi
concedida informação por ela compreendida, no sentido
de aceitar ou recusar um tratamento proposto,
conhecendo a natureza do mesmo, as suas consequências
e os seus riscos”
Nestas condições, a recusa de tratamentos não pode ser
vista como uma tentativa de suicídio ou como eutanásia,
pois uma tal decisão apenas permitirá que a doença siga o seu curso natural.
Excepções ao consentimento informado: emergências
E quando o doente não está capaz de decidir?
Tendo em vista esta preocupação, foi elaborado o Artigo 9.° da Convenção para a protecção dos Direitos do Homem e da
Dignidade do ser humano face às aplicações da biologia e Medicina, apoiando que: "a vontade anteriormente manifestada no que
diz respeito a uma intervenção médica por um doente que, no momento da intervenção, não se encontre em condições de
expressar a sua vontade, será tomada em conta" (Conselho da Europa, 1997a, p.4) – autonomia prospectiva.
Este principio conduziu, anos mais tarde à introdução do conceito de directiva antecipada da vontade.
Quando se considerar que as decisões dos representantes legais ou dos familiares são contrárias aos melhores interesses do
doente, os médicos devem requerer o suprimento judicial de consentimento para salvaguardar os interesses e defender o doente.
DIRECTIVAS ANTECIPADAS DA VONTADE
Durante muitas décadas a medicina limitava a autonomia do doente
achando que o paternalismo médico era desejável, ou seja, os
profissionais de saúde consideravam saber o que é melhor para o
doente, respeitando mais o princípio da beneficência. No entanto,
nos anos 70, este panorama começou a alterar‐se e exaltou‐se a
importância do princípio da autonomia.
O conceito de directiva antecipada da vontade remonta a 1976, onde
no Estado Norte‐Americano da Califórnia "The Natural Dead Act" foi
legalmente reconhecido; mas só em 2012 foi reconhecido na lei
portuguesa como uma directiva com valor legal.
É uma instrução que informa o profissional de saúde sobre os tratamentos (ou outras intervenções) que a pessoa que a escreve
deseja ou não para si própria, ou seja, permite que a pessoa planeie os seus de cuidados de saúde para o futuro, perante a
eventualidade de se tornar incapaz de tomar as suas decisões, respeitando o principio da autonomia da pessoa doente. As DAV
são a expressão do princípio de autonomia aplicado enquanto a autodeterminação ainda está mantida.
Existem sob a forma de testamento vital (As nossas vontades escritas em respeito pela autonomia, para quando as não pudermos
expressar) e sob a forma de substituto legal (Delegar a nossa autonomia noutra pessoa). Delegar um representante legal pode ser
um complemento ou uma alternativa ao testamento vital. No caso de conflito entre as disposições no documento das DAV e a
vontade do procurador, prevalece a primeira.
Embora a legislação já conte com a utilização das DAV desde 2012, apenas em 2014 surgiu um modelo aprovado para a criação da
directiva antecipada da vontade; e o RENTEV (Registo Nacional de Testamentos Vitais) que permite a submissão, actualização e
consulta das DAV por parte do doente, do representante e dos profissionais de saúde
“Na ausência de DAV pode ser muito difícil determinar quem tem a autoridade para tomar decisões sobre um doente não
competente”. Estas constituem um importante instrumento no diálogo estruturado entre profissionais de saúde, o doente e
família. A implementação das DAV são um estímulo para universalizar bons cuidados em fim de vida.
Vários bioeticistas defendem que a história dos valores de um doente seja incluída na anamnese, sobretudo em doentes
terminais. Os melhores cuidados de saúde em fim de vida são conseguidos aprofundando a história dos valores de cada doente, e
conjugá‐la com o Testamento vital e com o Procurador dos cuidados de saúde.
Ainda assim, como estas questões são muito complexas definiu‐se que:
Uma das condições para a implementação das directivas antecipadas de vida é a transparência da informação medico‐
doente, necessária para que o exercício da autonomia seja informado
As DAV têm de respeitar a legislação Portuguesa: Podem ser consideradas juridicamente inexistentes se forem contrárias
à lei ou às boas práticas; caso o seu cumprimento possa provocar deliberadamente a morte não natural e evitável; e caso
o outorgante não tenha expressado, clara e inequivocamente, a sua vontade.
As DAV têm valor ético mas também valor legal e a lei é vinculativa para os profissionais de saúde, ou sejam a única
forma de não as aplicar é por objecção de consciência (contrariamente aquilo que acontecia se a lei fosse indicativa, pois
neste caso as DAV seriam apenas uma indicação daquilo que o doente gostaria que lhe fosse feito e não uma obrigação).
Em caso de dúvida, não aplicar
Válida durante 5 anos tendo de ser posteriormente revogada mas pode ser revogável sempre que o doente quiser,
enquanto o indivíduo estiver competente.
COMO REALIZAR UMA DAV?
O utente pode informar‐se junto do seu médico assistente durante o processo de preparação da DAV. São formalizadas através de
um documento escrito. É recomendável a utilização de um modelo disponibilizado em várias plataformas, como o portal do
Utente, ARS, DGS e Portal da Saúde (este documento é facultativo mas a sua utilização é fortemente recomendada). Este
documento contém identificação, nomeação do procurador de cuidados de saúde, situações clinicas em que as DAV têm efeito e
cuidados que quer/não quer receber. Deve ser posteriormente assinada presencialmente (ou reconhecida por notário) perante
um funcionário devidamente habilitado do RENTEV que se encontram em algumas ACES (agrupamentos de centros de saúde) ou
Unidade Local de Saúde da área de residência – consultar listagem dos locais disponíveis nos sites já referidos
Terminado o processo de registo e submissão, dá‐se início à fase de validação da informação clínica pelo presidente do conselho
clínico do ACES, que tem como objectivo garantir que não existem inconsistências clínicas nos documentos, que impeçam o
cumprimento das vontades descritas.
Se as DAV forem consideradas válidas é feito a introdução no RENTEV (este processo deve ter uma duração inferior a 10 dias úteis
desde a apresentação dos documentos à validação pelo presidente do conselho clínico) (caso esteja tudo bem o sistema informa
automaticamente o doente da conclusão do processo; caso seja rejeitada o doente tem 10 dias úteis para correcção das DAV)
O RENTEV é suportado por uma plataforma de dados de saúde que centraliza e mantém atualizados as DAV. Estes podem ser
consultados quer pelos cidadãos (e respetivo procurador de cuidados de saúdo, se existir) através do Portal do Utente, quer pelos
médicos responsáveis pela prestação de cuidados através do Portal do Profissional
AS DAV PODEM NÃO SER RESPEITADAS SE:
a) Se comprove que o outorgante não desejaria mantê‐las;
b) Se verifique evidente desatualização da vontade do outorgante face ao progresso dos meios terapêuticos;
c) Não correspondam às circunstâncias de facto que o outorgante previu no momento da sua assinatura;
d) Em caso de urgência ou de perigo imediato para a vida do paciente, a equipa responsável pela prestação de cuidados de saúde
não tem o dever de ter em consideração as diretivas antecipadas de vontade, no caso de o acesso às mesmas poder implicar uma
demora que agrave, previsivelmente, os riscos para a vida ou a saúde do outorgante. Perante situação urgente o médico tem de
seguir o protocolo normal. Só depois o médico deve consultar directiva.
Em todas as outras situações há obrigação legal de as cumprir. A lei aplicada em Portugal é vinculativa… a única maneira que o
médico e enfermeiro terão de não as aplicar é a objecção de consciência. A Objecção de consciência no testamento vital é relativa
e não é necessário dar decisão à ordem dos médicos (contrariamente à IVG onde é absoluta).
NOTA: Podemos ter problemas de moralidade intrínsecos (opinião face ao problema em sí) ou problemas de moralidade
extrínsecos (discordar acerca da forma como o problema em si é feito).
LIMITAÇÕES AO USO ROTINEIRO DAS DAV EM PORTUGAL:
A principal limitação das DAV é o facto de ainda ser uma realidade pouco fomentada em Portugal: só aproximadamente
500 pessoas preencheram as DAV e a maioria dos profissionais médicos ainda não sabe utilizar o RENTEV
Outra limitação é o facto de ser prevista na lei desde 2012 mas só em 2014 surgiu regulamentação e maior facilidade em
submeter o documento
Outra limitação é o facto de ser pró‐activo, ou seja, cada pessoa tem de procurar a sua realização (contrariamente aquilo
que acontece com o acto de ser dador de órgãos em que, se não queremos, temos de nos increver na RENNDA)
Outra limitação é a questão da transparência da informação ser ainda, em grande parte das vezes, utópica…e sem esta
transparência de informação o exercício de autonomia é uma ilusão
Serem confundidas com eutanásia ou pensar que servem como um plano inclinado para a eutanásia ? Historicamente
quem defende a eutanásia, começa por defender as directivas antecipadas Mais frequentes nos países em que a
eutanásia está despenalizada. MAS ATENÇÃO! Pode defender‐se as directivas antecipadas e recusar a eutanásia
A diferença entre o momento em que são redigidas e o momento em que são necessárias: os valores e as preferências são
mutáveis e nem sempre são actualizadas; a terapêutica pode evoluir; ausência de autoridade moral para exercer
controlo sobre o nosso eu futuro [se um doente perdeu a capacidade mental de perceber e reafirmar os seus interesses,
preferências ou valores expressos na DAV, estes interesses e valores já não podem ser atribuídos àquele doente e
portanto não temos nenhuma obrigação moral de os respeitar. Deveríamos, então, promover e respeitar os interesses
actuais do doente (que geralmente são vontades de bem‐estar, de evitar a dor e o sofrimento)]
Compreensão insuficiente de quem redige / assina ‐ a maioria das pessoas leigas não compreende a complexidade
técnica dos riscos e incertezas associados, no presente e futuro nem sempre os desejos expressos reflectem os
valores de cada um.
PRINCIPAIS DÚVIDAS ACERCA DAS DAV:
Qual o prazo de eficácia da DAV? tem eficácia durante 5 anos, depois da data de ativação. Se o utente pretender
continuar com a mesma DAV (ou desejar realizar um diferente) deverá repetir o processo completo.
Como é que se cancela uma DAV? A qualquer momento o utente poderá cancelar a sua DAV; para isso bastará uma
declaração assinada pelo utente a declarar a anulação da DAV e a validação dessa declaração nos mesmos moldes da
DAV inicial. O Funcionário RENTEV irá aceder à DAV ativa do utente e inativá‐lá.
O uso do Modelo de DAV publicado na Portaria n.º104/2014 é obrigatório? Não. A Lei n.º25/2012 não obriga ao uso do
modelo de DAV, mas o seu uso é altamente recomendado
Caso a DAV de um Utente identifique um conjunto de Cuidados de Saúde e um PCS com propostas contrárias qual é a
decisão que prevalece? A decisão que prevalece é sempre a do Utente, expressa anteriormente na DAV
A DAV produz efeitos apenas em território nacional? Sim. A DAV apenas é válida em território português; em casos de
emigração ou situações de estada temporária (turismo, por exemplo) noutros países, a legislação aplicável é a do país de
destino e não a do país de origem.
CUIDADOS CONTINUADOS:
Cuidados Continuados
Cuidados paliativos ‐ destinam‐se a doentes que cumulativamente:
não têm perspectiva de tratamento curativo; têm rápida progressão
da doença e com expectativa de vida limitada; têm intenso
sofrimento; têm problemas e necessidades de difícil resolução que
exigem apoio específico, organizado e interdisciplinar.
Cuidados Terminais
Cuidados Agónicos
CUIDADOS PALIATIVOS são uma “Abordagem que visa melhorar a qualidade
de vida dos doentes e seus familiares face aos problemas associados à
doença terminal, através da prevenção e alívio do sofrimento físico,
psicossocial e espiritual.” Procuram a Afirmação da vida e aceitação da morte
como processo natural da vida, podendo também influenciar positivamente
o curso da doença mas não têm como objectivo acelerar ou adiar a morte.
A doentes que:
não têm perspectiva de tratamento curativo;
têm rápida progressão da doença e com expectativa de vida limitada;
têm intenso sofrimento;
têm problemas e necessidades de difícil resolução, decorrentes da situação de doença avançada e/ou grave e que, pela
sua complexidade, exigem apoio específico, organizado e interdisciplinar.
NOTA: a Pirâmide de Maslow representa a hierarquia das necessidades humanas, começando pela fisiologia, seguida de
segurança, relacionamentos/amor, Auto‐estima e por ultimo, realização pessoal.
CUIDADOS ORDINÁRIOS VS CUIDADOS EXTRAORDINÁRIOS:
Cuidados ordinários de manutenção da vida são todas as intervenções imprescindíveis à
vida, que não causam despesa, sofrimento e outros incómodos ao doente e que lhe
apresentam uma esperança razoável de benefícios. Os meios extraordinários de
manutenção da vida são todos aqueles que não apresentam uma esperança razoável de
benefícios. Um tratamento ordinário pode passar a extraordinário, ou seja, os cuidados
não são ordinários (proporcionados) ou extraordinários (desproporcionados) em si
mesmos… Dependem da situação clínica, sua evolução e prognóstico. Há aqui uma margem de susceptibilidade. Os mesmos
cuidados, a mesma intervenção, a mesma atitude, a mesma medicação pode ser Ordinária ou Extraordinária, consoante o
contexto clínico e prognóstico. EXEMPLO: ventilação artificial num homem de 89 anos com pneumonia bilateral, carcinoma
metastático da próstata e demência de Alzheimer avançada Vs ventilação artificial num jovem de 25 anos com pneumonia
bilateral mas sem qualquer patologia subjacente.
Concluindo, a obstinação terapêutica é o recurso a formas de tratamento cujo efeito é mais nocivo do que o benefício. Associado
a este conceito temos o conceito de distanásia, o prolongar a fase final da vida tornando‐a num longo e doloroso processo de
morrer. Assim, em caso de doença comportando prognóstico seguramente infausto, o médico deve limitar a sua actuação aos
cuidados ordinários, capazes de poupar o doente a sofrimento inútil. Os médicos são sempre obrigados a prestar cuidados
ordinários porém, todos os cuidados extraordinários são má prática! Ainda assim, os tratamentos fúteis (cuidados extraordinários)
vão sempre existir porque há situações limite que levantam dúvidas e os médicos não são perfeitos. Ainda assim as directivas
antecipadas da vontade procuram, entre outras coisas, acabar com a realização de tratamentos fúteis.
OUTROS CONCEITOS:
EUTANÁSIA E SUICÍDIO MEDICAMENTE ASSISTIDO:
Nas directivas antecipadas da vontade o doente apenas diz quais é que para si são tratamentos e intervenções fúteis, que não
quer receber. Na eutanásia há antecipação da morte por vontade do doente. São coisas diferentes mas na prática, situações
muito tangenciais.
A eutanásia pode ser definida como o uso de procedimentos que permitem, sem sofrimento, pôr termo à vida de outra pessoa a
seu pedido.
Apesar disto, o conceito de eutanásia diz respeito sobretudo à forma activa e voluntária porque quando activa e involuntária é
considerada homicídio; e quando passiva confunde‐se com suspensão de tratamento de suporte de vida. No suicídio
medicamente assistido a morte é provocada pelo próprio doente, com meios fornecidos ou prescritos pelo médico, contrastando
com a eutanásia em que o procedimento é realizado pelo próprio médico.
ARGUMENTOS A FAVOR:
Forma de evitar a dor e o sofrimento provocados por doença terminal
Direito à escolha da própria morte
A sua legalização ou despenalização combateria excessos cometidos na clandestinidade
ARGUMENTOS CONTRA:
Causar a morte em situações de erros de diagnóstico e prognóstico
Argumentos religiosos, relacionados com a defesa do direito à vida
O médico “não pode ser o juiz da vida ou da morte”
O código penal condena qualquer acto antinatural de extinção de uma vida, inclusivamente o homicídio a pedido da
vítima
CÓDIGO DEONTOLÓGICO:
O médico deve guardar sempre o respeito pela vida humana, representando uma falha deontológica grave a prática de eutanásia.
A abstenção terapêutica não é considerada eutanásia se resultar de opção livre e consciente do doente ou do seu representante
legal… Aliás, o médico deve evitar obstinação terapêutica sem esperança.
PARECER DA COMISSÃO NACIONAL DE ÉTICA E CIÊNCIAS DA VIDA
não há nenhum argumento ético, social, moral, jurídico ou da deontologia das profissões de saúde que justifique em tese
vir a tornar possível por lei a morte intencional de doente por decisão médica, ainda que a título de "a pedido" e/ou de
"compaixão";
pelo respeito devido à pessoa humana e à vida, não há nenhum argumento que justifique os actos de eutanásia;
é ética a interrupção de tratamentos desproporcionados e ineficazes, mais ainda quando causam incómodo e sofrimento
ao doente, pelo que essa interrupção, ainda que vá encurtar o tempo de vida, não pode ser considerada eutanásia;
é ética a aplicação de medicamentos destinados a aliviar a dor do paciente, ainda que possa ter, como efeito secundário,
redução de tempo previsível de vida, atitude essa que não pode também ser considerada eutanásia;
que a aceitação da eutanásia pela sociedade civil, e pela lei, levaria à quebra da confiança que o doente tem no médico e
nas equipas de saúde e poderia levar a uma liberalização incontrolável de "licença para matar” e à barbárie;
CONCLUSÃO: A eutanásia activa e o suicídio medicamente assistidos são reprovados pela comissão nacional de ética e pelo código
deontológico em Portugal. No entanto, a abstenção terapêutica e a abstenção de outras medidas que, face a situação clínica e o
prognóstico em questão, podem ser consideradas fúteis/ extraordinárias são previstas e até mesmo desejadas nestes
documentos. Se tivermos em conta que estas medidas são formas de eutanásia passiva, até que ponto esta deve ser considerada
como uma forma de eutanásia?
Ética – Aula 4 – Conflitos de Interesses
Um conflito de interesse engloba um conjunto de condições em que um interesse primário (como o bem estar do doente ou os
resultados de determinada investigação científica) pode ser indevidamente influenciada por um interesse secundário (tal como o
ganho financeiro ou lucro) CONFRONTO de COMPROMISSOS ANTAGÓNICOS, isto é, há dois interesses contrários um ao outro:
um Interesse Primário e um Interesse Secundário que, de forma declarada ou oculta influencia o interesse primário, ou seja, se
sobrepõe ao interesse primário ou cria a aparência de que isso pode de facto acontecer.
O interesse primário é determinado por valores morais superiores: a ética profissional de um médico, de um investigador, de um
professor, ou de um outro profissional especializado. O interesse secundário pode:
não ser ilegítimo em si mesmo e ser até parte integrante da própria profissão sem que o peso relativo destes interesses
secundários na decisão final, coloque em causa o interesse primário em questão
censuráveis quando adquirem um peso maior do que o interesse principal na tomada de decisão profissional.
O interesse secundário relacionado com a componente financeira tem representado a componente mais visível desta
problemática. No entanto, existem outros interesses secundários: o favorecimento de familiares ou amigos, a vontade de
prestígio e poder, ambição, politica, rivalidades pessoais, segurança académica, prémios e recompensas, desejo de agradar a
colegas.
Concluindo, a existência de um conflito de interesses não é necessariamente sinónima de um comportamento censurável. Se o
indivíduo acha que, apesar do interesse secundário, está mesmo a agir pelo melhor então falamos em conflito de interesses; Se
por outro lado, o indivíduo sabe não estar a fazer o melhor mas continua, pelo interesse secundário, então falamos em conflito de
interesses com má prática.
Há vários tipos de conflitos de interesses:
Prática Clínica: A prática clínica é uma actividade em que o problema do conflito de interesse assume particular
delicadeza, porque é aí que se consubstancia a essência moral do acto médico e onde a primazia do interesse do doente
deve ser mais claramente afirmada. Exemplos: dádivas e compromissos financeiros, mesmo considerados “minor”,
influenciam o comportamento prescritivo e promovem enviesamentos || ensaios clínicos || indústria farmacêutica ||
referência (ex: análises, eco, ECG, etc.), isto é, por exemplo, um ginecologista tem uma grávida na consulta do hospital,
vê que não tem vaga para fazer a ecografia e diz‐lhe que se ela quiser poderá fazer ecografia no seu consultório
Ensino: Relações familiares, p.e. pode‐se dar aulas e fazer exame a um filho? Não há nenhuma lei que proíba mas seria
um conflito de interesses || Escolas concorrentes
Conflito de Obrigações: por exemplo, dar aula na mesma hora em que temos prática clínica.
Investigação: Aqui o primeiro interessado é a verdade científica. O problema é que diversas vezes a verdade científica é
enviesada devido a outros interesses dos cientistas. É o conflito da verdade científica versus interesses pessoais
Existem conflitos de interesses na investigação se o investigador tem interesses secundários, sobretudo financeiros, que
interfiram ou possam interferir com os resultados da investigação.
A Ciência não existe até ser publicada e, por conflitos de interesses, nem toda a verdade é sempre publicada e nem tudo
o que é publicado é verdade e há obviamente limitações da liberdade académica.
Exemplo de conflito de interesses em investigação: O “peer review”, pois o juiz (“referee”) pode estar associado de
forma mais ou menos indirecta aos autores do artigo (antigos alunos ou colaboradores) ou, pelo contrário, estar
envolvido em projectos de investigação semelhantes ou rivais. É hoje considerado indispensável a declaração expressa
dos conflitos de interesse quando se aceita rever um artigo científico.
A honestidade e a integridade são essenciais para protecção dos doentes e para
a validade da ciência. A responsabilidade é de todos: investigadores, comissões
de ética, editores e patrocinadores.
Declaração de Helsinque expõe no princípio 30 que ''fontes de fomento, afiliações
institucionais e conflitos de interesse devem ser declarados na publicação''
Declaração de conflito de interesses
Reconhecê‐los e declará‐los é uma das formas de diminuir suas consequências e manter a integridade da profissão
Espontânea, Obrigatória e Sistemática
Exemplo: obrigação de comunicação ao INFARMED de subsídios, patrocínios, subvenções ou quaisquer outros valores,
bens ou direitos avaliáveis em dinheiro no âmbito de actividades de promoção e publicidade de medicamentos: 25 euros
é o valor mínimo a partir do qual são obrigatórias as comunicações ao Infarmed.
Não esquecer os conflitos de interesse não monetários
A declaração de conflitos de interesses é insuficiente para aumentar a transparência e diminuir a corrupção mas é um
bom primeiro passo
Conflitos de Interesse históricos:
Condenação de um ex‐comissário da Food and Drug Administration por não ter revelado o facto de possuir acções de
companhias reguladas por aquela entidade
Jon Sudbø: dentista em 1985 e médico em 1994; era Professor na Universidade de Oslo com 38 artigos em revista com
peer‐reviewed e em 2006 descobriu‐se que tinha cometido uma grave fraude tendo‐lhe sido retirada a licença de
medicina e foi preso. Este homem tinha publicado vários artigos no NEJM e Lancet sobre neoplasia oral contudo, uma
colega de trabalho que suspeitava da veracidade das suas investigações descobriu que estas eram falsas.
Hwang, que publicou durante cerca de dois ou três anos numa revista muito conceituada (Nature), estudos sobre células
estaminais. Vários foram os investigadores que saíram dos Estados Unidos para ir trabalhar com ele mas, mais tarde
descobriu‐se que tudo o que ele publicava era falso.
HARUKO OBOKATA, Nature, 2014 ‐ – fraude com células estaminais
Conclusão: 4 exemplos de conflitos de interesses
1. dádivas e outros compromissos financeiros, mesmo considerados “minor”, possam influenciar o comportamento
prescritivo e promovem enviesamentos
2. um ginecologista tem uma grávida na consulta do hospital, vê que não tem vaga para fazer a ecografia e diz‐lhe que se
ela quiser poderá fazer ecografia no seu consultório
3. juiz de “peer‐review” (“referee”) pode estar associado de forma mais ou menos indirecta aos autores do artigo ou, pelo
contrário, estar envolvido em projectos de investigação semelhantes ou rivais
4. Investigador que não declara o facto de possuir acções de companhias relacionadas com os promotores do estudo
Confidencialidade e Sigilo Médico
O sigilo médico é o dever do médico de guardar segredo sobre
detalhes da vida pessoal e do estado de saúde dos seus doentes,
que é até hoje o cerne da relação médico‐doente e da relação de
confiança absolutamente necessária ao exercício das funções de
um médico. Escusado será dizer que também se aplica a qualquer
outro profissional de saúde.
Em Portugal, o sigilo médico está abrangido em vários artigos da Constituição da RP e existem outros documentos e diplomas em
saúde que, não sendo vinculativos (não sei leis), sintetizam de forma clara os direitos dos pacientes, entre eles o sigilo (Lei de
Bases da Saúde ‐ Cuidados de saúde primários ‐ Carta dos Direitos e Deveres dos Doentes ‐ Carta dos Direitos do Doente Internado
‐ Lei de Saúde Mental). Um desses documentos é o Código Deontológico da Ordem dos Médicos, que abrange todas as normas
recomendáveis de orientação nas diferentes circunstâncias da actividade profissional de um médico. Existe um capítulo deste
Código dedicado ao Segredo Médico:
O médico tem obrigação de não revelar as informações
cobertas pelo sigilo profissional a terceiros e de tomar
precauções para que outras pessoas não tenham acesso
a estas informações.
“O segredo médico impõe‐se em todas as circunstâncias
dado que resulta de um direito inalienável de todos os
doentes.”
E QUANDO EXISTEM DADOS REVELADOS SOB SIGILO MÉDICO QUE SÃO IMPORTANTES PARA TERCEIROS?
SIGILO MÉDICO E O CRIME SEXUAL:
A violação em Portugal é um crime semi‐público, pelo que é necessária uma queixa da vítima para que o Ministério Público possa
iniciar um inquérito. "Deverá ser à vítima que deve caber sempre a decisão sobre se pretende que a acção penal se inicie e
desenvolva, ponderando esta ‐ e não um terceiro por si (o Ministério Público) ‐ os prós e os contras de um processo e de um
julgamento por um crime sexual, com tudo o que de negativo nele se contém".
CONLUINDO, CASOS EM QUE O SIGILO PODE SER QUEBRADO:
Na esmagadora maioria das situações e mesmo em caso de dúvida ou situação insólita, o sigilo médico é a regra a aplicar. Mas
como vimos anteriormente, o sigilo médico não é absoluto. Em geral, existe um interesse social em que o segredo seja mantido,
mas existem algumas excepções. “O médico está dispensado de guardar segredo profissional (…):
em caso das doenças de declaração obrigatória
COM consentimento do doente (ou representante legal)
menores de 16 que estão a tomar decisões que implicam riscos para a sua saúde e para a de terceiros
Revelação de um nascimento ou óbito
Por Direito de Necessidade:
o administração de justiça penal ‐ Perigo fundamentado de repetição de prática de ilícitos penais graves; Quando
seja necessário para evitar a condenação de um inocente; em caso de suspeitar de crime público, a não ser que
o doente possa incorrer em processo penal.
o protecção de interesse de terceiros – por exemplo, Informação a um familiar que coabite com o paciente dos
perigos de infecção de uma doença grave || Médico que informa as autoridades de trânsito sobre a doença
grave e permanente de que alguém é portador, porque devido a ela o doente constitui um perigo real para a
segurança rodoviária
o defesa dos interesses do próprio médico ‐ salvaguarda dos legítimos interesses do médico também pode
justificar a quebra do sigilo. O médico poderá, após consulta ao Presidente da Ordem, quebrar o sigilo a que se
encontra vinculado nos casos em que isso seja absolutamente necessário à defesa da sua dignidade, da sua
honra e dos seus legítimos interesses. Um exemplo será no âmbito de um processo de responsabilidade médica
movido pelo paciente contra o médico, este vir a juízo defender‐se. Assim, a quebra do sigilo é legítima para
afastar a imputação desonrosa feita ao médico.
SE O SIGILO FOR QUEBRADO NOUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS:
Ética 5 – Aspectos Éticos da Experimentação Humana. Enhancement e os seus limites.
Enhancement é a utilização de técnicas para melhoramento humano, ou seja, em indivíduos saudáveis utilizam‐se técnicas
terapêuticas que neste contexto têm uma intenção diferente. Pode ser conseguido através de suplementos, Fármacos, Cirurgias
ou Intervenções Genéticas.
EXEMPLOS: nadadores com a utilização de fatos que diminuem o atrito na água; utilização de eritropoetina para aumentar a
capacidade de transporte de oxigénio e assim a performance; a cirurgia estética é um dos pontos onde o enhancement é mais
usado.
O tratamento constitui um restitutio ad integram (restituir até à integridade), enquanto o enhancement é um transformation ad
optimum (transformação para o óptimo) enhancement é aumentar a capacidade para além da normalidade
Vários são os argumentos usados em defesa do enhancement:
Incoerência – se não há base racional para distinguir entre meios de melhoramento aceitáveis e inaceitáveis porque é
que é permitido melhorar a condição de uma forma mas não se pode melhorar recorrendo a outra forma diferente?
o Críticas a este argumento: há outras questões para além da intenção que contribuem para a definição em
moralmente válida ou inválida – os fatos de atrito nulo não têm riscos para o indivíduo enquanto, que os
esteróides têm; nem todas as pessoas são nadadoras e, não estamos só a usar esteróides anabolizantes nestas
situações.
Liberdade – deve ver respeitada a autonomia do doente já que a liberdade é essencial à integridade, dignidade e justiça.
o Críticas a este argumento: liberdade não é um justificativo ético moral de uma decisão, isto é, não é por sermos
livres que as nossas acções são éticas ou morais; liberdade necessita de informação e capacidade de decisão;
Resistance is Futile ‐ lutar contra o progresso é um acto designado a falhar. Não vale a pena discutir porque “the show is
already on”
o Críticas a este argumento: não é um argumento moral, ou seja, este argumento não afirma que as formas de
enhancement são moralmente desejáveis ou defensáveis.
Direito ao corpo – esculpir as características humanas é um acto de criação humana adquirindo por isso valor moral;
“esculpir‐me pode ser o meu projecto de vida”.
o Críticas a este argumento: o corpo enquanto agente e objecto dos impulsos de criação pode levar a actos como
a anorexia .
Devemos considerar o que é moralmente válido o que é natural? Então e o uso de óculos? Usamos óculos para combater
o nosso défice de visão, e isso é uma técnica de enhancement moralmente válida.
Factores utilizados contra o enhancement
Perda da natureza humana ‐ Estaremos a ver as pessoas como pessoas ou como objecto que podem ser melhorados?
Perda da individualidade
Questões de segurança (por exemplo, efeitos adversos) (os fármacos estimulantes tornam‐nos mais produtivos, mas por
outro lado podem provocar taquicardia e tremor ligeiro, criar dependência física e emocional e alterações do
Como seria feito o controlo dos resultados? Risco de cair na tirania e coerção, ou seja, se estas técnicas demonstrassem
uma melhoria significativa da performance poderá haver pressão da sociedade para que todos se submetam ao
enhancement.
desperdício de recursos – uma pessoa começa por fazer algo para ser melhor que o resto. Se todos fizerem o mesmo
passam a ser todos iguais na mesma com a diferença de que a media se altera. Desta forma não há vantagem nenhuma,
apenas um gasto desnecessário de recursos
Não haver equidade e justiça na sua distribuição
NOTA: IGUALDADE, EQUIDADE E JUSTIÇA SOCIAL
A igualdade de direitos e deveres é atingida quando todos os indivíduos são
iguais perante a lei que, em princípio, deve ser igual para todos. Mas a
igualdade de direitos e deveres não assegura a igualdade de oportunidades.
Para que as sociedades assegurem aos cidadãos uma real igualdade de
oportunidades, é necessário que protejam aqueles cuja situação individual e
social reduziu essa “capacitação”. Equidade passa por tratar de forma
diferente indivíduos que são diferentes e este conceito está subordinado à
ideia de justiça social que encarada como um ideal a repartição equitativa
dos recursos. Assim, justiça social e equidade têm sentidos próximos.
Concluindo, a justiça social demonstra que certas desigualdades são
aceitáveis, justas, legítimas, se estiverem presentes respeitando o princípio
da equidade dando igual acesso às posições sociais através de estratégias que
beneficiam os mais desfavorecidos.
ENHANCEMENT NEUROCOGNITIVO
Procedimentos biotecnológicos que visam melhorar directamente a função cognitiva em indivíduos Tipos
cognitivamente saudáveis. Pode ser conseguido através de psicofármacos, exercícios cognitivos, • Potenciar memória;
• Apagar memórias;
neurocirurgia, manipulação cerebral não invasiva • Aumento funções executivas;
• Regular cansaço e
Verificou‐se que cerca de 8,9% dos cirurgiões admitiram já ter utilizado uma droga ilícita ou prescrita impulsividade.
exclusivamente para enhancement cognitivo, pelo menos uma vez na vida, sendo a idade média da primeira utilização 24 anos.
Fármacos como a ritalina (metilfenidato) e anfetaminas são os mais utilizados. Dentro das substâncias ilícitas a cocaína foi a mais
utilizada.
INVESTIGAÇÃO EM MEDICINA
A história da investigação em humanos mostra múltiplos exemplos de experiências em que não foram respeitados os direitos
mínimos e fundamentais dos indivíduos obrigando à formulação de imperativos éticos aplicáveis à investigação humana com o
objectivo de proteger os sujeitos e a garantir o respeito e autonomia:
Código de Nuremberga ‐ declaração contendo 10 pontos, que resumem aquilo que seria permitido em investigações
médicas com participantes humanos. Foi o primeiro de uma série de documentos que procuram regulamentar
eticamente as pesquisas clínicas, feito e promulgado em Nuremberga (1946), com vista a julgar experiências nazis em
seres humanos com critérios científicos mais que duvidosos, com resultados graves e fatais.
Determinou que as experiências tivessem que apresentar resultados vantajosos; exigia a realização da experimentação
em animais antes de ser feita em humanos; que os sujeitos da pesquisa tivessem as informações essenciais do
desenvolvimento desta; que houvesse consentimento
voluntário da participação na pesquisa; que o sofrimento
deveria ser evitado e o risco minimizado; e que na
possibilidade de morte, o projecto não deveria ser
realizado; investigação deve ser conduzido apenas por
pessoas cientificamente qualificadas; Durante o curso do
experimento, o participante deve ter plena liberdade de
se retirar, caso ele sinta que há possibilidade de algum
dano com a sua continuidade; Durante o curso do
experimento, o pesquisador deve estar preparado para
suspender os procedimentos em qualquer estágio, se ele
tiver razoáveis motivos para acreditar que a continuação
do experimento causará provável dano, invalidez ou
morte para o participante.
Declaração de Helsínquia
CONSENTIMENTO INFORMADO: “É absolutamente essencial obter o consentimento voluntário do paciente.” código de
Nuremberga. Parte da validade de um ensaio clínico em humanos deriva do facto dos doentes compreenderem os potenciais
riscos e benefícios do estudo, e decidirem participar de forma livre e autónoma. A maneira universalmente aceite para assegurar
isto é obter um consentimento informado de cada participante antes do início do estudo. Quando utilizado em investigação deve
ser escrito e deve conter Objectivo, Planeamento, Possíveis riscos, Possíveis benefícios e Opinião do comité de ética. Podem ser
estabelecidas exigências adicionais quando se trata de pessoas incapazes de consentir, de mulheres grávidas ou em período de
aleitamento, de situações de emergência clínica ou de pessoas privadas de liberdade.
O consentimento informado tem diversas limitações, sobretudo em pessoas fora da posse das suas capacidades; quando o estudo
implica informação que também depende de terceiros; em situações de emergência; e em situações de grupos facilmente sujeitos
a coação (por exemplo, prisioneiros). Mesmo fora destes casos, o consentimento informado é débil: apenas 62% responde
correctamente à questão "Está a participar num ensaio clínico?", indicando que quase 40% não estavam cientes de que estavam a
participar.
UTILIZAÇÃO DE PESSOAS VULNERÁVEIS: Vulnerable persons are those who are relatively (or absolutely) incapable of protecting
their own interests. More formally, they may have insufficient power, intelligence, education, resources, strength, or other
needed attributes to protect their own interests.” Muitas empresas foram aos países do Leste europeu, África e América latina
ensaiar os seus produtos na fase de voluntários sãos e pagaram aos responsáveis políticos desses Estados para poderem dispor de
“voluntários”, aos quais não era dada informação sobre o facto de estarem a ser usados num processo de investigação de novos
medicamentos. Isto preocupou a OMS, que elaborou uma lista de populações vulneráveis que inclui: mulheres grávidas, crianças,
adolescentes, idosos, refugiados, presos; inconscientes e pessoas com perturbações mentais/comportamentais. Manifestou‐se
ainda acerca dos ensaios em países em desenvolvimento exigindo um protocolo que respeite as exigências éticas de protecção
das pessoas nesses ensaios, e não apenas as leis do próprio país porque as leis destes países são vulneráveis e débeis. É ainda
necessário que sejam cumpridas as obrigações pós‐ensaio (durante pelo menos 10 anos o fármaco será gratuito e os aparelhos
permanecem no país em questão).
Exploração ‐ Quando indivíduos ou agencias ricas/poderosas tiram proveito da pobreza, ausência de poder ou dependência de
outros, usando‐os para servir ou seus próprios interesses, sem benefícios compensatórios adequados para os grupos/indivíduos
em desvantagem. São exemplos de exploração da investigação cientifica:
Ensaios levados a cabo sem o conhecimento e o consentimento informado dos sujeitos da investigação
Investigação básica conduzida num país industrializado sobre um problema clínico existente nos dois países, o ensaio
clínico é feito apenas no país em desenvolvimento simplesmente por ser mais barato. O produto torna‐se disponível
imediatamente no pais desenvolvido mas só apenas 15 ou mais anos depois no país em desenvolvimento.
O ensaio clínico é conduzido num país em desenvolvimento por não ser permitido, eticamente, no país desenvolvido
Os ensaios clínicos são conduzidos em ambos os tipos de países, com ambos os grupos de controlo a receber o melhor
tratamento disponível. O produto resultante, de sucesso, torna‐se disponível apenas no país industrializado porque nem
o governo nem a maioria das populações do país em desenvolvimento pode suportar o produto.
USO DE PLACEBO: EM QUE SITUAÇÕES É JUSTIFICÁVEL UTILIZAR PLACEBO EM ENSAIOS CLÍNICOS? Quando não existe nenhum
tratamento viável para a doença e nesse caso comparamos o fármaco novo com placebo; ou quando a doença não é grave nem
condiciona alterações significativas e queremos discernir sobre o efeito placebo.
EQUIPOISE – incerteza ou falácia: Estado de incerteza no qual se acredita que nenhum
braço do estudo tem vantagens ou desvantagens (em termos de benefícios ou malefícios)
em relação aos outros. Para que um determinado estudo seja moralmente ou eticamente
válido precisamos que exista equipoise, ou seja, Ninguém sabe à priori se é mais vantajoso
estar no grupo controlo ou no grupo experimental e nenhum paciente receberá
tratamento que se saiba ser menos eficaz ou mais perigoso que a alternativa disponível. A
equipoise é a incerteza que é a base para a investigação em medicina pois sem ela o
melhor tratamento deve ser realizado. É o motor das bases éticas para a investigação.
Existem três objecções principais contra à equipoise:
Objecções à Indeterminação – Afinal quem está incerto e do quê? Equipoise teórica ou clínica? Equipoise individual ou
comunitária? Qual o limiar espistemiologicamente relevante para a equipoise?
Objecções ao Fundamento Moral – A equipoise é uma condição necessária mas não suficiente para definir o fundamento
moral de um estudo clínico. O facto de estarmos incertos de alguma coisa não nos diz que o estudo é moralmente válido
ou inválido. Para isso há sete condições que têm que ser cumpridas para além da equipoise: Valor Social e Científico;
Validade científica; Critérios de inclusão e exclusão justos; Risco Benefício Favoráveis; Revisões Independentes;
Consentimento Informado; e Respeito Pelos Participantes
Objecções ao Utilitarismo – Dever do profissional de Saúde de salvaguardar os interesses do participante VS Necessidade
de Dados Fiáveis e Generalizáveis
INTERESSES FINANCEIROS: Muitas empresas farmacêuticas tendem a pagar aos médicos que realizam os ensaios e aos doentes ou
aos voluntários sãos usados nos ensaios clínicos. O Research Ethics Review Committee da WHO estabelece que os participantes
voluntários nos projectos de empresas farmacêuticas podem ser reembolsados de despesas resultantes da sua participação na
investigação e do tempo de trabalho perdido. Mas não aceita qualquer tipo de compensação que sirva para induzir a pessoa a
participar e que lhe retirará a capacidade de decidir livremente o pagamento aos investigadores clínicos envolvidos deve estar
expresso, de forma clara e quantificada, na proposta da entidade promotora para ser ponderado pela comissão de revisão ética.
CONFLITO MÉDICO‐INVESTIGADOR: Pode haver diferentes conflitos de interesses na investigação. É permanente e até desgastante
o conflito entre o médico e investigador dever de lealdade, protecção e ajuda a cada doente e o dever de estudar, aprender,
investigar, aprimorar o seu conhecimento para melhor servir o conjunto incógnito de futuras gerações de doentes. A
responsabilidade do clínico para com a sociedade não deve sobrepor‐se à relação clínica entre o médico e o doente.
Os conflitos de interesse podem contudo ser minimizados ou anulados da seguinte forma:
• estudos desenhados de forma aleatorizada e duplamente cega;
• avaliação por pares (análises intermediárias dos resultados);
• acesso irrestrito aos dados primários e análises estatística;
• liberdade de publicação dos dados, designadamente quando estes são inesperados;
• explicitação ou eliminação dos interesses em conflito
Ética – Aula 6 – Apresentações
Transmissão de Más Noticias em Medicina
Qualquer informação que altere de forma drástica e negativa a visão do doente sobre o seu futuro. Qualquer informação que
resulta num défice cognitivo, comportamental ou emocional na pessoa que recebe as noticias, que persiste por algum tempo
após estas terem sido dadas. “A comunicação de más noticias não é uma habilidade opcional, é uma parte essencial da prática
profissional”
Cohen e o plano de vida: existem vários pontos importantes ao longo da nossa vida, e que fazem parte do plano que cada
um de nós tem, no geral, para a sua vida: nascimento, estudar, ter uma profissão, constituir familia, progredir, viajar, ter
uma boa velhice e só depois morrer. Acontece que quando surge a doença a pessoa tem noção que todos os planos que
fez para a sua vida futura podem não mais existir O impacto da má noticia depende da diferença entre as expectativas
futuras do paciente (ambições e planos), de como ele se sente e do que ele suspeita ou já sabe sobre o seu estado de
saúde.
Aspectos da transmissão de más notícias (Médico)
Dizer a verdade: Nos anos 50‐60 a comunicação de um prognóstico reservado ao doente era considerada desumana e
lesiva, sendo que 90% dos medicos omitia a verdade aos doentes. A partir dos anos 70, 90% dos medicos afirmam
revelar o diagnóstico, apesar de acreditarem que a informação fornecida deve ser individualizada em função dos desejos
e necessidades do doente
Modelos de Comunicação: modelo mais consensual actualmente é o
compartilhado, em que é dada ao doente a opção de escolher qual o
tratamento que prefere de entre os que lhe são apresentados
Todos os doentes mentalmente competentes têm direitos absolutos
(éticos, morais e legais) a qualquer informação médica que solicitarem.
O segredo médico impõe‐se em todas as circunstâncias dado que
resulta de um direito inalienável de todos os doentes
PRINCÍPIO DE NÃO MALEFICÊNCIA: não causar mal e/ou danos a seu
paciente (primum non nocere) ou garantir que se há dano, o benefício
esperado com o resultado deve ser maior. Trata‐se, portanto, de um mínimo ético, um dever profissional, que, se não
cumprido, coloca o profissional de saúde numa situação de má‐prática ou prática negligente
PRINCÍPIO DE BENEFICÊNCIA: obrigação moral de agir para o benefício do outro. É usar todos os conhecimentos e
habilidades profissionais a serviço do paciente, considerando, na tomada de decisão, a minimização dos riscos e a
maximização dos benefícios.
Princípio da autonomia ‐ Capacitar o doente para decidir aquilo que ele julga ser o melhor para si mesmo.
Princípio da Justiça ‐ preocupa‐se com a equidade na distribuição de bens e recursos considerados comuns, numa
tentativa de obter igualdade de oportunidades
Receios do médico: Medo do desconhecido e do não‐aprendido; Medo da reacção emocional do doente e familiares;
Medo de retirar a esperança do doente; Medo de não saber todas as respostas; Medo pessoal de morte e doença; Medo
de expressar emoção; Medo de ser culpado (O acto de lhe imputar culpa é uma reacção comum e que não deve ser
levada pessoalmente. O médico deve ter presente que a responsabilidade do aparecimento da doença não é sua)
Transmissão de Esperança: Realista, Orientada para objectivos, Dirigida a objectivos alcançáveis
Aspectos da transmissão de más notícias (Doente)
Receios comuns acerca da doença terminal e morte
Factores relacionados com o descontentamento dos doentes: Uma comunicação apressada; Dificuldade em utilizar as
palavras apropriadas; Não lhes ser dado tempo para falar ou colocar questões; Pouca disponibilidade do médico para
ouvir
Preferências dos doentes
o A maioria dos doentes quer que os médicos sejam: honestos, directos, sensíveis e valorizem a esperança
o O tipo de informação privilegiada varia de doente para doente (uns querem informação extensa, outros querem
informação básica, outros não querem ser informados)
Aspectos Transculturais
O médico enfrenta o desafio de individualizar a maneira de dar más noticias consoante o doente que tem à frente
Existem protocolos que nos ajudam como abordar estas questões, apesar de não existirem evidencias cientificas dos mesmos:
1. Setting Up the Interview/ Preparação: Pensar antecipadamente no doente; Local privado e confortável; Garantir
privacidade; Garantir que há tempo necessário e que não há interrupções; Ficar disponível para o paciente; Estar
familiarizado com a informação clínica relevante; Doente pode fazer‐se acompanhar de pessoas importantes se assim o
pretender; contribuir para a conexão e relacionamento.
2. Perception / Percepção: Usar questões abertas para perceber o que o doente sabe; procurar saber se o paciente percebe
a sua situação; Ouvir/Compreender; Aceitar/Não confrontar
3. Invitation / Convidar o doente a saber mais: Quer ou não saber?
a. Aceitar se não quiser e Oferecer para responder noutra altura futuro ou prestar esclarecimentos a familiar
(Embora a maioria dos doentes expresse a vontade de saber toda a informação acerca do seu diagnóstico,
prognóstico e detalhes da doença, alguns doentes preferem não o saber.)
b. Determinar quanto o doente quer saber
4. Knowledge / Conhecimento: Alertar o doente para o facto de que serão dadas más notícias diminui o choque que se
segue à revelação dos dados e facilita o processamento da informação; Linguagem inteligível; considerando o nível
educacional, cultural e estado emocional actual; Evitar termos técnicos; informação gradual; Aspectos positivos primeiro;
verificar se entendeu; responder às reacções; Falar com franqueza, evitando no entanto ser exclusivamente factual e
sem afecto; Não recear o uso das palavras “cancro” ou “morte”; Permitir o silêncio e as lágrimas; Oferecer esperança
realista.
5. Emotions/ Emoções e empatia: Identificar as emoções; identificar a razão para aquela emoção; Tempo para expressar‐se;
oferecer apoio e solidariedade ao doente através de uma resposta empática
6. Strategy and Summary/ Estratégia e Sumário: Os doentes que têm um plano claro para o futuro apresentam níveis mais
baixos de ansiedade; Agendar consulta de seguimento; Sumário; Últimos esclarecimentos; Terminar;
Evidência que a atitude e a boa comunicação influencia positivamente o modo como o doente lida com as más noticias
Melhor treino clinico para dar más noticias beneficia tanto os médicos como os doentes
Limites da medicina implicam que nem sempre haja cura
É nestes momentos que o médico é mais essencial
As preferências do doente devem sempre ser tidas em conta
Doação de Gâmetas
Passámos de um panorama de clínicas privadas e importação de esperma para um panorama público: em 2011 surgiu o BANCO
PÚBLICO DE GÂMETAS no Centro Hospitalar do Porto que permitiu reduzir os custos deste procedimento, melhorar a
acessibilidade à técnica e torna‐la possível fora de entidades privadas.
PARA O DADOR:
A dádiva de células e tecidos é voluntária, altruísta e solidária, não podendo haver, em circunstância alguma, lugar a
qualquer compensação económica ou remuneração, quer para o dador quer para qualquer indivíduo ou entidade. Os
dadores vivos podem receber uma compensação estritamente limitada ao reembolso das despesas efetuadas ou dos
prejuízos imediatamente resultantes da dádiva [Ovócitos: 628,83 euros por ciclo; Esperma: 41,92 euros por recolha]
O dador não pode ser havido como pai/mãe da criança que vier a nascer, não lhe cabendo quaisquer poderes ou deveres
em relação a ela
O consentimento do dador deve ser livre, esclarecido, informado e inequívoco, prestado perante médico e por escrito.
Têm de ter determinadas características:
PARA OS BENEFICIÁRIOS:
Beneficiários:> 18 anos, sem anomalia psíquica e só as pessoas casadas ou as que, sendo de sexo diferente, vivam em
condições análogas às dos cônjuges há pelo menos dois anos. Exclui pessoas singulares e casais homossexuais
o Procriação medicamente assistida é permitida: Mediante diagnóstico de infertilidade ou ainda, para tratamento
de doença grave ou do risco de
transmissão de doenças de origem
genética. Não podem ser utilizados para
melhorar determinadas características
não médicas do nascituro,
designadamente a escolha do sexo.
Doação de gâmetas restrita aos
casos em que, face aos
conhecimentos médico‐
científicos objectivamente
disponíveis, não possa obter‐se
gravidez através do recurso a
qualquer outra técnica que
utilize os gâmetas dos
beneficiários
PARA TODOS:
É proibida a compra ou venda de óvulos, sémen ou embriões ou de qualquer material biológico decorrente da aplicação
de técnicas de PMA
Todos os intervenientes estão obrigados a manter sigilo sobre a identidade dos mesmos e sobre o próprio acto: Os
nascidos com recurso a dádiva de gâmetas podem, junto dos competentes serviços de saúde, obter as informações de
natureza genética que lhes digam respeito, mantendo‐se a confidencialidade acerca da identidade do dador (por
exemplo, podem procurar a eventual existência de impedimento legal a projectado casamento)
A identidade do dador só pode ser conhecida de duas formas:
o Por razões ponderosas reconhecidas por sentença judicial
o Se este expressamente o permitir
QUESTÕES ÉTICAS:
Deve existir anonimato?
Acerca desta questão a Sociedade Europeia de Reprodução Humana e Embriologia propôs o conceito de DOUBLE TRACK: O facto
de existirem teses a defender o anonimato e outras, a sua quebra levou ao aparecimento de um sistema de dupla via, em que
ficava ao critério dos beneficiários escolher os gâmetas de dadores que quisessem manter o anonimato ou dos que não o
quisessem manter:
No momento do processo de doação, os programas também devem deixar claro que a lei e as circunstâncias podem mudar e que
as promessas de anonimato ou contacto futuro não pode ser garantida.
A remoção da clausura do anonimato (como já acontece no Reino Unido) poderia levar à diminuição de dádivas.
A maioria dos dadores gostaria de ser informado se o processo foi concluído com sucesso.
Justifica‐se a questão da “infertilidade social” discriminação de acordo com orientação sexual e estado civil
Devemos impedir/ condenar quem, apesar de não cumprir as condições de acessibilidade previstas na lei, financia o
tratamento com os próprios recursos?
Gestão Sustentada em Saúde
Desde 1980 tem‐se verificado um aumento da despesa total em saúde, com importância crescente em termos do produto interno
bruto desde esta data. Percebendo que este crescimento não podia continuar indefinidamente foram introduzidas algumas
reformas na saúde e desde 2010 que se verifica uma ligeira inversão desta situação é necessária a existência de um modelo de
gestão sustentada, que diminua a despesa de forma a garantir o futuro do SNS mas mantendo a tendência de melhoria dos
indicadores de saúde Tal só é possível através da utilização da medicina baseada na evidência e atentando aos questões éticas
associados:
Dignidade da pessoa humana à qual nenhuma outra consideração pode sobrepor‐se
O princípio da participação, isto é, indivíduo tem um lugar central na gestão da própria saúde
O princípio da equidade afirma a igualdade de oportunidades a todos os seres humanos priorizando os mais
desprotegidos
Solidariedade, princípio ético fundamental da vida em sociedade
A responsabilidade financeira do médico está prevista no artigo 111º do código deontológico médico, da ordem dos médicos.
Destacamos a necessidade de atitude responsável perante a despesa e o dever de prestar os melhores cuidados no
condicionalismo financeiro que, como sabemos, é actualmente difícil.
Há relações importantes entre a saúde, economia e educação:
Uma população saudável prestam múltiplas e significativas contribuições à economia cujo crescimento aumenta
permitindo gastar mais na saúde.
Se promovermos a literacia das populações contribuímos para a prevenção de patologias relacionadas com o estilo de
vida
São muitos e diversos os factores que influem na saúde: desde a educação, o ambiente e a economia até à qualidade dos
serviços e às competências dos seus profissionais
Marketing Farmacêutico
Será ético falar com um Delegado de Informação Médica, sabendo que estes são funcionários de uma indústria cujo principal
objectivo é aumentar o número de fármacos vendidos, não tendo como principal objectivo a saúde do doente?
A indústria defende que é devido a esta interacção mediada pelos DIM que há uma maior consciência dos novos
fármacos e que esta prática acaba por influenciar os doentes. Apesar disso não há evidência desta assunção, antes pelo
contrário: estudos sugerem que quanto mais os médicos dependem da informação dada pelos DIM, menor é a
probabilidade de prescreverem fármacos de acordo com as verdadeiras necessidades do doente. As interacções entre
DIM de diferentes companhias farmacêuticas também têm impacto na prescrição em termos de custo, preferência pela
prescrição de novos fármacos e diminuição da prescrição de genéricos prescrição não racional!
o Por exemplo: Num evento de formação médica contínua, demonstrou‐se que os fármacos desse patrocinador
eram preferencialmente salientados durante o evento. || A participação em simpósios pagos por uma
farmacêutica está associada ao aumento da requisição do fármaco patrocinado nos formulários hospitalares ||
Em quantos mais almoços participavam, mais os médicos pediam essas requisições. || Mudança nas prescrições
a favor do medicamento patrocinado também foram demonstradas.
Devemos reparar no que nos indicam algumas das cadeiras que DIM têm na sua formação. O que vemos é que tem
formação sobre técnicas de vendas tendo como objectivo único mudar os padrões de prescrição dos médicos. Mesmo
sendo apenas um bloco de 35 horas, acontece que os médicos têm 0 horas sobre como lidar com estas técnicas.
A publicidade entra da vida do médico por várias formas: Formação Médica Contínua; Presentes/Amostras/Refeições;
Apoio à Investigação Médica. Os médicos também são influenciados pela publicidade e
qualquer indústria que se baseie em vendas e lucro, sabe disto e aposta na publicidade.
Há momentos em que os médicos estão mais susceptíveis
72% dos médicos acham que a informação dada pelos DIM é relativamente precisa
94% dos médicos já receberam benefícios da indústria farmacêutica. A maioria dos
médicos considera ético aceitar estes benefícios.
QUAIS AS SOLUÇÕES APRESENTADAS PARA COMBATER ESTA REALIDADE?
Manter uma postura ativa durante a visita;
Reconhecer os objetivos das visitas dos DIM;
Relevância da informação para a prática clínica (endpoints);
Atenção à análise dos comparadores estatísticos;
Prestar atenção à metodologia e aos resultados;
Reconhecer e desvalorizar técnicas de promoção;
Reduzir o número de visitas mensais dos DIM;
Sensibilização dos médicos e estudantes de medicina;
Regulamentação:
o (…) só podem organizar ou apoiar ações de divulgação de medicamentos e de formação científica, tais como
congressos e simpósios, que contribuam reconhecidamente para um aperfeiçoamento profissional dos médicos.
o (…) oferta gratuita de artigos de promoção de valor intrínseco insignificante (não ultrapasse os 60 euros), desde
que estejam relacionados com a atividade de cuidados de saúde, ou envolvam benefício para o doente.
o (…) oferta de textos, livros de referência, ou qualquer outra informação ou material com fins formativos.
Apostar na formação médica
Nunca nos devemos esquecer daquilo que juramos à saída da faculdade. Nós assumimos um compromisso para com os doentes,
dos quais somos os maiores advogados, não com as indústrias e as suas várias fontes de enviesamento.
Bebés‐medicamento
Ser humano concebido por procriação medicamente assistida e geneticamente seleccionado para ser capaz de doar tecidos ou
órgãos a um irmão com uma doença genética grave Após estimulação ovárica, os óvulos produzidos são unidos aos
espermatozóides através fertilização in vitro ou ICSI (Intracytoplasmic sperm injection). Através destes procedimentos são criados
em média 12 embriões. Três dias após a fecundação é retirada uma a duas células aos embriões para a análise genética –
Diagnóstico pré‐implantatório e tipagem HLA. Assim, são selecionados os embriões não portadores da patologia em causa e
compatíveis com o irmão. Um ou dois embriões são implantados no útero da mãe. Após o nascimento do “bébé medicamento” é
colhido o sangue do cordão umbilical e faz‐se o transplante para o irmão.
INDICAÇÕES TERAPÊUTICAS
Leucemias ( L. Linfoblástica aguda; L. Mieloblástica aguda; L. Mielóide Crónica, …)
Linfoma de Hodgkin
Síndrome Mielodisplásico
NÃO NEOPLÁSICAS: Aplasia medular, Hemoglobinúria paroxística nocturna, Imunodeficiência congénita combinada,
Anemia de Fanconi, Anemia de Blackfan Diamond; Talassémia major, Drepanocitose, Osteopetrose/Doença de
Albers‐Schonberg, Síndrome linfoproliferativo ligado ao Cromosoma X/Síndrome de Duncan
ARGUMENTOS A FAVOR DO BEBÉ‐MEDICAMENTO
o Salvar uma vida – princípio da beneficência
o Estabilidade familiar e aumento das relações afectivas entre a criança, o irmão doente e os pais
o Situação é controlada por legislação
o Não podemos argumentar perante a possibilidade de criação de uma nova vida
o Será uma pessoa com mesmos direitos que todas as outras
CONSEQUÊNCIAS PARA O BEBÉ MEDICAMENTO? ARGUMENTOS CONTRA
DGPI ‐ Reduz viabilidade do embrião; Desconhecidos os efeitos a longo prazo. SERÁ ÉTICO SUBMETER O EMBRIÃO A
TÉCNICAS QUE REDUZEM A VIABILIDADE, QUANDO ESTA MANIPULAÇÃO NEM É PARA SEU PRÓPRIO BEM?
FIV ‐ Alguns estudos indicam que bebés nascidos de FIV têm mais problemas físicos e psicológicos. SERÁ ÉTICO CORRER O
RISCO DE FAZER NASCER UMA CRIANÇA COM PROBLEMAS DE SAUDE EM PROL DA SAUDE DE OUTRA?
o Problemas congénitos cardíacos, fenda labial, atresia esofágica, alterações urogenitais e ano‐rectais
o Maior risco de prematuridade ou bebé com baixo peso
A criança poderá vir a sofrer danos psicológicos quando vier a saber a razão da sua geração.
Instrumentalização do Ser humano ‐ Bebé é produzido não pensando no seu próprio bem mas num bem diferente. Salvar
o outro filho não pode ser o único propósito da concepção.
Plano inclinado ‐ Abre precedentes perigosos para determinar outros tipos de características com fins menos nobres
Qual o futuro dos embriões excedentários?
ALTERNATIVA APRESENTADA: BIOBANCOS COM SANGUE DE CORDÃO UMBILICAL!!!
LEGISLAÇÃO PORTUGUESA:
As técnicas de PMA são um método subsidiário, e não alternativo, de procriação, ou seja, a utilização de técnicas de PMA
só pode verificar‐se mediante diagnóstico de infertilidade ou ainda, sendo caso disso, para tratamento de doença grave
ou do risco de transmissão de doenças de origem genética, infecciosa ou outras
É proibida a clonagem reprodutiva; não podem ser utilizadas para conseguir melhorar determinadas características não
médicas do nascituro, designadamente a escolha do sexo; não podem ser utilizadas com o objectivo de originarem
quimeras ou híbridos
Exceptuam‐se do disposto no número anterior os casos em que haja risco elevado de doença genética ligada ao sexo, e
para a qual não seja ainda possível a detecção directa por diagnóstico pré‐natal ou diagnóstico genético pré‐implantação,
ou quando seja ponderosa a necessidade de obter grupo HLA (human leukocyte antigen) compatível para efeitos de
tratamento de doença grave.
Uma das funções do Conselho Nacional de Procriação Medicamente assistida passa por “Deliberar caso a caso sobre a
utilização das técnicas de PMA para selecção de grupo HLA compatível para efeitos de tratamento de doença grave.”
CÓDIGO DEONTOLÓGICO:
Estas técnicas deverão ser utilizadas como auxiliares da concretização de um projecto parental, o que implica a
consideração não só do desejo dos candidatos a pais, mas sobretudo dos interesses do futuro ser humano que vier a ser
concebido através da procriação medicamente assistida.
Ética na Reanimação Cardiovascular
Reanimação Cardiovascular é uma intervenção para salvar a vida humana numa condição de paragem cardíaca que pode ter como
base várias causas. Como manobra de Emergência a RCP não requer consentimento informado e é executada segundo o princípio
da beneficência. Por defeito definida para ser utilizada sempre quando ocorre uma paragem cardíaca excepto se existir um
documento assinado pelo doente em que confirma que não deseja ser reanimado em caso de paragem cardíaca DNR (do not
ressucitate)
Artigo 59º “O uso de meios extraordinários de manutenção da vida não deve ser iniciado ou continuado contra a vontade do
doente.”” In código deontológico
A tomada de decisão é efectuada pelo médico assistente e restante
equipa médica. Em menor frequência, participação do doente
(quando se encontra competente) e sua família. Ou seja, esta
tomada de decisão dispensa consentimento do doente!
No caso de estarmos a falar de decisão de não reanimação em crianças a tomada de decisão é diferente: Pais/tutores legais
devem tomar a sua decisão de acordo com o interesse superior da criança; A tomada de decisão deve ser acordada entre a equipa
médica e os pais; À medida que os doentes tornam‐se mais velhos devem ser incluídos no processo de tomada de decisão.
ÉTICA: COMISSÃO DE ÉTICA PARA A SAÚDE
Comissão de Ética: órgão multidisciplinar de apoio ao conselho de administração que abrange os aspectos
fundamentais dos problemas éticos de um hospital
Composição (art.º 2.º DL97/95): “as CES têm uma composição multidisciplinar e são constituídas por 7 membros
designados de entre médicos, enfermeiros, farmacêuticos, juristas, teólogos, psicólogos, sociólogos ou profissionais
de outras ciências sociais e humanas”
Pode solicitar parecer: Doentes ou seus representantes, profissional de saúde, órgãos de gestão do hospital
Ética: (convicção individual proponente) dimensão da filosofia que se ocupa do facto da existência da moral. Está
relacionada com o conjunto de valores pessoais considerados universais, intemporais e permanentes.
Bioética: respeitante a todos os seres vivos, incluindo ética médica, ética animal e ética ambiental
Moral: (convicção social normativa) costumes, normas de comportamento actualmente aceites ou seguidas por
grupos. Centra-se na dimensão repetitiva dos actos habituais, está relacionada com a cultura e é relativa/mutável.
Slippery Slope: excepção que implica mudança de posição ideológica prévia para nova que se encontra no topo do
“plano inclinado”. Abrindo uma excepção, facilmente surgem outros casos que parecem reunir os mesmos critérios,
sendo na realidade cada vez mais afastados da posição inicial cimeira, e mais próximos do fundo do plano inclinado.
Estranhos Morais: teoria defendida por Engelhardt, questiona o modelo dos quatro princípios como forma de
justificar racionalmente escolhas morais. Ao argumentar a favor de uma "presunção politeísta", ou seja, o
reconhecimento de numerosas perspectivas morais igualmente legítimas, deixa em suspenso a possibilidade de
alcançar um entendimento ético ou uma moralidade comum entre as diversas comunidades morais, de modo que os
conflitos de interesse possam ser resolvidos através de argumentos racionais. Para Engelhardt não existe um “bem”
ou “mal” definido fora de um contexto moral particular em que coexistem “os amigos morais”. Todos os princípios
tais como: o da Beneficência, o da Propriedade Privada, o da Autoridade Política e o da Alocação de recursos à saúde
giram em torno da permissão.
Questões:
Embrião fecundado é igual a embrião implantado? Ovo fecundado pode originar gravidez evolutiva, bioquímica,
anembriónica ou tumor do trofoblasto.
Embrião in vivo é igual a embrião in vitro?
O que é e quando se inicia a vida humana?
Estatuto do Embrião:
Tese Concepcionista: embrião deve ser tratado como pessoa humana desde a concepção (recusa DIU)
Tese Gradual:
- Embrião vai-se tornando pessoa humana ao longo da gestação: formação do SNC (3.ª semana), actividade
neurosensorial (8.ª-10.ª semana), movimentos fetais, viabilidade extra-uterina.
- É sempre merecedor de respeito
- Embrião in vivo é diferente de embrião in vitro: importância da mulher grávida na identidade (influência
epigenética, ambiente hormonal, imunológico, bioquímico e metabólico)
Problemas Éticos:
Prolongamento do sofrimento
Quando deixar de tratar
Quando não reanimar
Obstinação terapêutica
Eutanásia
Pressão familiar
Ética Relacional: tem como objectivo reequilibrar a relação assimétrica, procurando mutualidade e máximo de
autonomia, plenitude e orgulho existencial ao doente.
Distanásia: transformação da fase final da vida num longo e doloroso processo de morrer.
Sedação paliativa (Eutanásia Activa): administração intencional de sedativos em doses, combinações de doses ou
em escalada, que são as necessárias para reduzir a consciência do doente terminal tanto quanto necessário para
controlar um ou mais sintomas refractários de forma adequada. A adequação e proporcionalidade dos
procedimentos devem ser claramente objectivadas por escrito para que não restem dúvidas sobre a
intencionalidade (limiar da intenção homicida)
Neglicência
Negligência Médica: erro médico praticado sem o cumprimento das normais regras da leges artis, ausência
intencional e consciente de cuidados adequados
Erro:
Evento Adverso: lesão causada por acto médico
Erro Médico: diagnóstico ou tratamento de patologias ou lesões que é incorrecto ou incompleto
Evento Adverso Evitável: evento adverso atribuível a erro médico
Consequências Legais:
Homicídio por negligência
Ofensa à integridade física por negligência
Intervenções e tratamentos médico-cirúrgicos violando a leges artis ou arbitrários
Propagação de doença, alteração de análise ou receituário por neglicência
Recusa de médico
Argumentos Favoráveis
Importância para o casal infértil
Solidariedade que une os casais e as mulheres que aceitam
Argumentos Contrários
Alteração da noção tradicional da família
Exploração e manipulação da mulher
Imprevisibilidade das atitudes da mãe de substituição
Consequências desconhecidas no equilíbrio da criança
Possibilidade de recusa de entrega (conflitos jurídicos)
Possibilidade de recusa de aceitação por malformação (interesse da criança)
General Medical Council: “Where it has been decided that a treatment is not in the best interests of the patient,
there is no ethical or legal obligation to provide it and therefore no need to make a distinction between not starting
the treatment and withdrawing it”. Thus, withholding and withdrawing of life support are entirely compatible with
the ethical principles of beneficence, nonmaleficence, and autonomy. In addition, many state courts have upheld
recently the legality of limiting care that provides no benefit or is not wanted by patients.
De acordo com Engelhardt, vivemos num mundo com poucos “amigos morais” (com quem partilhamos um fundo
comum que permita resolver problemas), e em que maioritariamente temos “estranhos morais”, com quem não
partilhamos valores e paradigmas de interpretação de casos, nem tão-pouco a mesma visão da utilização dos
princípios de autonomia, beneficência, não maleficência e justiça. Em virtude desse facto, resolvemos as discórdias
morais por vontade: um acordo consensual para optar pela solução x, não por crença ou fé nessa solução, mas
porque racionalmente é preferível para o grupo como um todo.
Para Engelhardt, apenas os princípios de Permissão e Beneficência permitem a coabitação num meio de estranhos
morais. A Permissão implica que a autoridade para as nossas acções depende da autorização do outro.
Consequentemente, sem Permissão não há Autoridade, e sem Autoridade a Actuação é punida com a exclusão da
comunidade moral estabelecida entre os ditos “estranhos”. A Beneficência dita que a Moral visa a realização do Bem
e a exclusão do Mal. Mas numa sociedade plural não é possível estabelecer este binómio de forma estanque.
Consequentemente, não existe figura de beneficência à qual se reportar, havendo liberdade para punição variável
consoante as Acções que sejam tomadas como resposta a novos Problemas.
Em conclusão, e armados com estes dois princípios, os “estranhos morais” podem construir regras mutuamente
benéficas desde que obedeçam ao critério primordial de Permissão, admitindo-se a existência de tantos modelos de
Medicinas quantos os grupos de “estranhos”. A Medicina praticada em grupos de “estranhos” será (por oposição à
praticada em grupos de “amigos morais”) menos guiada pela subjectividade e fé humana, e mais norteada pela
racionalidade do grupo. Na prática, será visível a adopção de diferentes acordos entre “estranhos morais”, como em
duas Comissões Éticas de Saúde de hospitais diferentes.