Manual de Filosofia
Manual de Filosofia
Manual de Filosofia
esta unidade começaremos por formular e procurar resolver alguns problemas que se relacionam com
a natureza, a definição, o lugar e o saber da filosofia.
O que é a Filosofia?
É possível definir a filosofia?
Qual é a especificidade do saber filosófico?
“Vós vindes a estas aulas, e eu também, para fazermos algo juntos. Di-lo o tema: vamos fazer
filosofia”1.
A filosofia é, antes de mais, algo que o homem faz, que o homem tem feito. Com o tempo e a prática
do filosofar cada aprendiz de filósofo construirá também a sua própria definição.
A noção ou conceito de filosofia não é fácil, não é pacífica, nem é consensual. Muitos preferem falar
de filosofias, no plural. G. Simmel reconhece que é a própria definição de filosofia que se constitui em
todos os sistemas filosóficos como o primeiro dos seus problemas ao dizer que “a filosofia, só dentro
dela própria e só com os seus conceitos e meios pode realmente determinar-se: é ela mesma, digamos,
o primeiro dos seus problemas”2 . Só mesmo a filosofia pode dizer o que é a filosofia. Apesar da falta
de consenso e desconfiança quanto ao conceito ou noção da filosofia vamos defini-la em perspectivas
ou abordagens etimológicas e descritivas.
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MORENTE, M.G., Lecciones Preliminares de Filosofia, Buenos Aires, Ed. Losada, 1943, p.1
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SIMMEL, G., Problemas Fundamentais da Filosofia, Coimbra, Atlântida, 1970, p.7
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filósofo, isto é amigo da sabedoria, aquele que procura a sabedoria, que ama o saber, que indaga a
verdade das coisas.
Em Sócrates é atribuída a paternidade da atitude, que hoje como ontem, continua válido o sentido
etimológico do vocábulo “filosofia”, amor à sabedoria.
Naquele que se reclama de filó-sofo tem de estar presente a convicção de que não é tanto a posse, mas
a procura da verdade ou do saber o que caracteriza a filosofia e a actividade correspondente é um
homem cuja consciência apresenta-se sempre inquieta e insatisfeita.
2.2. Perspectiva Clássica (Filosofia como Contemplação e Investigação dos Primeiros Princípios e das
causas últimas)
Para toda filosofia clássica, a filosofia nascia da admiração e da estranheza do homem perante os
enigmas do universo, da natureza, da vida e da sociedade, como dizia Aristóteles (380-322 a. C) a
filosofia é um saber contemplativo e desinteressado que tinha como tarefa a investigação dos
princípios primeiros e das causas últimas das coisas; para Cícero, estudava as causas divina da coisas;
para Hegel filosofia era o saber absoluto.
Estas abordagens têm razão de existir. Elas são o resultado de diferentes formas de conceber e
perceber o mundo que fazem que cada filosofo dê uma definicao diferente dos outros; a época
diferencida dos filósofos dai existência de problemas diferentes; a formacao diferenciada é outra
justificacao de existir diferentes concepcoes de filosofia por fim o nível tecnológico do mundo.
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da razão, com vista à realização de uma humanidade mais livre o que implica a submissão da
racionalidade científica e tecnológica à racionalidade total regida por fins.
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“A filosofia deve tornar claros e delimitar rigorosamente os pensamentos, que de outro modo são
como que turvos e vagos”.
2.10. Conclusão
A multiplicidade e diversidade de perspectivas filosóficas mostram o carácter pluralista da definição
da filosofia e da sua prática, que resulta da impossibilidade de dar uma definição universalmente
válida, não se podendo dar uma única e acabada definição. Isso tudo não nos permite concluir que a
filosofia seja um reino de subjectividade e de arbitrariedade, onde se admite, sem critério ou crítica,
todas as ideias. O que acontece é que os filósofos que deram a definição de Filosofia viveram em
épocas e tecnologias diferentes, o nível de formação e problemas diferentes. Ainda associado a isso, a
natureza do objecto e a finalidade a que se propõe a Filosofia não admitem que Ela tenha única
definição aceite por todas as pessoas em épocas diferentes. O mundo é dinâmico, os problemas e as
pessoas são de acordo ao mundo. No nosso continente africano em geral e em Moçambique em
particular a situação da pluralidade da definição de Filosofia é evidente. No tempo de invasão pelas
pontencias colónias, o continente africano tinha filósofos de resistência desse fenomino. O caso
demonstrativo é dos reis marave, os imperadores de Gaza que resistiram e lutaram contra os invasores.
Depois da ocupação, surgiram os Filósofos da libertação do continente. Os demonstrativos são
evidentes, pois em todo o continente surgiram Filósofos nacionalistas que lideraram os movimentos
nacionalistas. No nosso país foi a Frente de Libertação de Moçambique ( FRELIMO). Depois da
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2.11. Exercícios
1. “Cada filosofia define-se a si própria pelo modo como se realiza. Para saber o que é a filosofia tem
de se fazer uma tentativa. Só então a filosofia será simultaneamente a marcha do pensamento vivo e a
consciência desse pensamento (reflexão, isto é, o acto e o respectivo comentário. Só a partir da
tentativa pessoal poderemos apercebermo-nos do que se nos depara no mundo com o nome de
filosofia. Muitas veses recorre-se a definição etimológica” (Jasper, 1972:15-16).
1. A definição etimológica da Filosofia é correcta, mas não é aconselhável. Justifique a afirmação com
três aspectos.
2“… não existe nenhuma forma possível de negar a filosofia, pois quem recusa a filosofar está
realizando um acto filosófico de que não tem consciência já que a Filosofia de não filosofia é o
filosofar mais forte” – Sartre
a) O que entendes por Filosofia.
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2.13. Exercícios
1. Das afirmações que se seguem indique quais as que considera corresponderem ao método, ao
objecto e ao objectivo da filosofia. Justifique a sua opinião
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.1. A filosofia só nasceu depois que os homens resolveram os problemas fundamentais da subsistência,
libertando-se das urgentes necessidades materiais.........................
2.“Nós não buscamos a filosofia por nenhuma vantagem estranha a ela. Aliás, é evidente que, como
consideramos homem livre aquele que é fim em si mesmo, sem estar submetido a outros, da mesma
forma, entre todas as outras ciências, só a esta consideramos livre, pois só a ela é fim em si mesma”
Aristóteles.....................
3. Não basta à filosofia constatar, determinar dados de facto ou reunir experiências: ela deve ir além
do facto e além das experiências, para encontrar a causa ou as causas precisamente através da
razão................
.4. O que é a existência? Qual é o valor da vida e do conhecimento humano, o da natureza do mal, o
da origem e do valor da lei moral?.............
a) O espanto – Aristóteles dizia que a filosofia nascia do espanto, da estranheza e perplexidade que os
homens sentem diante dos enigmas do universo, da natureza, da vida e da sociedade. É o espanto que
leva os homens a formularem perguntas e os conduz à procura das respectivas soluções. Como refere
Eugen Fink o espanto torna o evidente em algo incompreensível, o vulgar em extraordinário.
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b) A dúvida – Ao filósofo exige-se que duvide de tudo aquilo que é assumido como uma verdade
adquirida. Ao duvidar, o filósofo distancia-se das coisas, quebrando desta forma a sua relação de
familiaridade com as coisas. O que era natural torna-se problemático. O que então emerge é uma
dimensão inquietante de insatisfação e problematização. A reflexão começa exactamente e partir do
exame daquilo que se pensa ser verdadeiro. A dúvida exige, do filósofo, uma reflexão sobre as coisas.
Pois, pelo contrário, não poderá conhecer o fundamento último daquilo em que ele acredita. ao duvidar
procura-se um conhecimento verdadeiro.
c) O rigor – o questionamento radical que anima o verdadeiro filósofo, não é mais do que um acto
preparatório para fundar um novo saber sobre bases mais sólidas. A crítica filosófica é por isso radical,
não admite compromissos com as ambiguidades, as ideias contraditórias, os termos imprecisos. O
rigor tem a ver com a precisão e clareza no pensamento.
d) A insatisfação – a filosofia revela-se uma desilusão para quem quiser encontrar nela respostas para
as suas inquietações. O que o aprendiz de filósofo encontra na filosofia são perguntas, problemas e
incitamentos para que não confie em nenhuma autoridade exterior à sua razão, para que duvide das
aparências e do senso comum. A única “receita” que os filósofos lhe dão é que faça da procura do
saber um modo de vida. Não se satisfaça com nenhuma conclusão, queira saber sempre mais e mais.
um filósofo não se contenta com o que se sabe.
2.15. Exercício
1. “A atitude filosófica é uma de incessante procura de respostas para os problemas que nos assaltam
o espírito nas mais diversas circunstâncias que a existência se encarrega de nos trazer na vida”.
Das afirmações que se seguem assinala com V as verdadeiras e F as falsas.
a) A dúvida como atitude filosófica, inquieta-nos somente quando desperta a nossa curiosidade sobre
o porquê das coisas ______
b) Quem nunca se espantou e encontrou respostas satisfatórias sobre as suas inquietações jamais será
filósofo. ______
c) O questionamento radical que anima o verdadeiro filósofo radica na crítica que admite
compromissos com as ambiguidades, as ideias contraditórias e termos imprecisos. _____
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d) O que o aprendiz de filosofia encontra na filosofia são perguntas, problemas e incitamentos, sem
confiar na razão, duvidando do senso comum. _____
a) Espontaneidade
Resulta da necessidade de querer compreender as coisas. Pode-se dizer que essa atitude é uma atitude
natural que se forma espontaneamente no espírito da grande maioria dos homens e desde a mais tenra
idade.
Em toda a criança de três anos mora um filósofo em potência que a família e os educadores podem
atrofiar ou desenvolver. Veja-se a naturalidade, a insistência e a frequência das perguntas das crianças.
É até muito curioso observarmos que elas se põem e põem aos outros algumas das perguntas mais
radicais e mais de concertantes que deixam completamente desarmados os seus educadores, tais como:
b) Autonomia da Razão
Uma das características constitutivas da actividade e do saber filosófico é a autonomia ou liberdade da
razão relativamente a todas as coerções e constrangimentos exteriores, sejam elas a religião, a política,
as ideologias, a autoridade ou a tradição e positivamente significa que a razão e só a razão é o
princípio e o tribunal soberano a quem compete o julgamento do que é verdadeiro no âmbito do
conhecimento teórico, e do que é conveniente no âmbito da ética ou da política.
c) Radicalidade Filosófica
Ao afirmar-se que a filosofia se caracteriza-se pela radicalidade das suas posições ou explicações,
pretende-se, pois, dizer que o objecto da filosofia é dar conta dos fundamentos, das razões de ser
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últimas, dos princípios, das causas primeiras de qualquer realidade particular e até da realidade em
geral. Dito por outras palavras, a radicalidade da filosofia implica que, em circunstâncias
alguma, a filosofia pode admitir como certa, verdadeira ou inquestionável coisa alguma, antes de
criticamente a justificar ou fundamentar.
d) A Comunicação e intersubjectividade
Todo o discurso é uma partilha da palavra e do pensamento com outrem e perante outrem,
efectivamente presente ou pressuposto, numa relação que é sempre “dia-lógica” e em “inter-acção”
comunicativa. O que há antes mesmo de eu falar e eu pensar é a anterioridade de um nós falamos e de
um nós pensamos, ou seja, a anterioridade de uma comunidade linguística e pensante em que o meu
dizer e pensar se inscreve, actualiza e prolonga.
2.17. Exercício
1. O saber filosófico deve satisfazer uma série de exigências que se resumem em três.
Preenche os espaços em branco com as características adequadas ao saber filosófico.
- A Filosofia caracteriza-se pela........................................................, que não permite que se admita
como certo, verdadeiro ou inquestionável coisa alguma antes de criticamente a justificar e
fundamentar; pela...................................................... que resulta da necessidade de querer as coisas e
pela ...................................................... que requer um exercício regulado pela razão, princípio e
tribunal competente para julgar o verdadeiro e o conveniente.
2. “Poderíamos, pois, dizer que se toda a reflexão é um pensamento, nem todo o pensamento é
reflexão…”
a) O que é, em geram, a reflexão?
b) Que características fazem da reflexão uma reflexão filosófica?
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As questões básicas da filosofia variam menos que as filosofias. Durante séculos persistiram as
questões enunciadas por Platão: a Verdade, o Bem, a Beleza. Aspectos que reflectiam a natureza do
Ser (metafísica). No século XVIII, E. Kant formulava as seguintes: Que podemos saber (metafísica)?
Que podemos fazer (moral)? Que podemos esperar (religião)? Que é o homem (antropologia)? A
última questão incluía todas as anteriores. Nos nossos dias os filósofos, retomam sem cessar estas e
outras questões, assim como enunciam novos problemas que emergem da nossa sociedade,
nomeadamente no domínio da psicologia, da existência, da antropologia, da metafísica, da moral, da
ética, do ambiente, tais como: a liberdade, a autenticidade, a decisão, o pensamento, a recordação,
vontade, a dor, a possibilidade, o sofrimento, a morte, a angústia, o desejo o sentimento, a
afectividade, etc.
2.20. Exercícios
2. “Poderíamos, pois, dizer que se toda a reflexão é um pensamento, nem todo o pensamento é
reflexão…”
a) O que é, em geram, a reflexão?
b) Que características fazem da reflexão uma reflexão filosófica?
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AGORA
A filosofia merece, mais do que qualquer outra espécie de ciência, o título de ciência, pois ela ocupa-
se muito mais com a investigação das causas primeiras e finais de toda a realidade. Sendo assim, a
filosofia é ciência no sentido lato da palavra ciência. Difere-se a filosofia das ciências propriamente
ditas nos seguintes termos:
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c) Pelo grau de generalidade e de síntese: a ciência em geral limita o seu estudo à realidade
factológica e cada ciência em particular dá a conhecer a realidade e procura dar unidade total do saber;
a filosofia interessa-se por toda a realidade e procura dar unidade total ao saber; a ciência ocupa-se dos
fenómenos e a filosofia pretende penetrar na realidade.
estabelecer as leis gerais dos fenómenos, apoia-se no determinismo da natureza, que só o filósofo o
legitima através do princípio do determinismo: “as mesmas causas produzem sempre os mesmos
efeitos, quando postas em idênticas circunstâncias”. Além disso, toda a ciência se baseia nos
princípios de identidade, contradição, causalidade e finalidade, que só a filosofia investiga a sua
natureza, origem e valor.
Todas as ciências aceitam certas questões que não tratam, por transcenderem as possibilidades dos
seus processos de investigação, e que lhes servem de fundamento (problemas de origem,
possibilidades, condições, métodos, limite, valor...) as quais constituem aquilo que hoje,
correntemente, se chama a filosofia das ciências.
Por outro lado, as ciências recebem da filosofia certas ideias que usam com frequência e que só esta
estabelece; assim, as noções de matéria, substância, força, causa, lei para a física e química, ou as
ideias de vida, género, espécie para a biologia. A própria matemática, embora não sendo ciência
experimental, recebe as ideias de número, extensão, tempo, espaço, etc.
Todas as ciências supõem, ainda a capacidade de inteligência para a verdade, que só à filosofia
pertence investigar se podemos alcançá-la.
As ciências não podem considerar-se como um conjunto de conhecimentos isolados e autónomos, mas
estão intimamente relacionadas umas com as outras, em virtude de estudarem aspectos diferentes da
mesma realidade. Estas relações tornam necessário, como seu completo, um trabalho de relacionação e
coordenação, de modo a obter-se uma visão total da realidade. O filósofo aprofunda, assim, as
perspectivas do sábio, pois, por vezes, sugere-lhe hipóteses que lhe permitem unificar as suas
descobertas e orientar as suas investigações ulteriores.
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O saber totalmente unificado que a filosofia nos apresenta, depois de feita a relacionação de todos só
saberes parcialmente unificados, não é um saber sincrético, desordenado e confuso, como era o
primitivo, mas um conhecimento ordenado, no qual todas as ciências estão dispostas por certa ordem,
consoante o seu contributo para a explicação integral da realidade.
A filosofia é, por conseguinte, sob este ponto de vista, um sistema coordenador e unificador de todas
as leis científicas por princípios gerais.
As investigações biológicas tornam possível estudar a questão da origem e natureza da vida com maior
eficácia; o estudo da fisiologia é indispensável para bem compreender as relações do organismo com o
espírito; as recentes descobertas da física permitem um melhor conhecimento do problema metafísico
da constituição dos corpos; o progresso da psicologia experimental fornece elementos à lógica,
epistemologia, psicologia racional, etc.
Portanto, a filosofia e ciência, não podem confundir-se nem pôr-se. Basta observar que uma e outra
representam preocupações diferentes, sendo a sua colaboração deveras proveitosa e fecunda. Por
vezes, o desacordo entre cientistas e filósofos advém do facto de estes graus de conhecimento
exigirem dois tipos de espírito profundamente diferentes (científico e filosófico) e são raras as
inteligências que os possuem ao mesmo tempo.
2.21.8. Reflexão
Procura explicar porquê é que:
a) Compreende-se que ao sábio seja capaz de prosseguir na investigação que outro deixou incompleto
e ao filósofo não poder-se continuar a obra de outro? Ou seja, porque é que existe uma só física e há
vários sistemas filosóficos?
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b) Porquê é que nas ciências especiais há quase sempre acordo nas suas conclusões e na filosofia, há
desacordo entre os filósofos?
c) Porque é que o “sábio não é demasiado filósofo”
A cultura grega fundava-se no Mito, transmitido e ensinado pelos poetas, educadores do povo,
especialmente Homero e Hesíodo através das complexas narrações e doutrinas sobre os deuses e os
homens, sobre as forças que intervêm activamente nos acontecimentos cósmicos e humanos, o mito3
oferecia respostas orientadoras acerca da natureza e destino do ser humano, acerca da origem e das
normas da sociedade em que o indivíduo humano se encontrava inserido e acerca do surgimento e
estrutura do Cosmos. No dealbar do séc. VI a. C e em consonância com profundas transformações de
carácter cultural e social, as inteligências mais despertas sentiram a necessidade de substituir as
explicações míticas por outro tipo de explicação justificada de um modo racional.
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Mito é uma narrativa fabulosa de origem popular onde se relata proezas dos deuses ou de heróis, susceptível de dar do
real uma explicação satisfatória para um espírito primitivo.
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O surgimento da filosofia foi caracterizado por uma ruptura relativamente às anteriores formas de
consciência - mítica e religiosa. Contudo não se tratou de uma ruptura4 pura e simples. Por um lado,
fala-se de ruptura, por se tratar de uma nova atitude face à realidade, por outro, houve uma
continuidade, dado que a filosofia, nas suas origens, usou com frequência o material mítico-religioso
na explicação da realidade, da natureza, como também ela subsistiu o mito e a religião nas suas
funções ao assumir-se como a única explicação da realidade ajustada ao próprio homem.
b) A descoberta do mundo lógico e da estrutura do ser – vai desde as teorias pitagóricas sobre o
número (a geometria, a matemática) até à sistematização dos princípios do pensar e do ser na lógica
(organon) e Metafísica de Aristóteles;
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Ruptura: rompimento, quebra, cisão ou separação.
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A pergunta dos filósofos gregos é desde o primeiro momento (desde Tales de Mileto), uma pergunta
pela natureza, pela physis. Qual é o princípio (arché) ou princípios últimos explicativos de todas as
coisas? A água? O ar? O fogo? etc. O princípio é:
- Aquilo a partir do qual se geram (derivam) e ultimam todos os seres do Universo. O princípio assim
concebido é a origem;
- Aquilo em que consistem os seres do Universo (na hipótese de Tales, as coisas não só procedem da
água como são, em última análise, água). O princípio assim concebido é o permanente, a realidade que
permanece idêntica no transmutar-se das suas alterações, o substrato (a essência);
- Aquilo que é capaz de explicar as diferentes transformações do Universo. O princípio assim
concebido é a causa.
A interrogação dos filósofos gregos acerca do princípio ou princípios da totalidade do real apresenta
uma dupla característica: a sua radicalidade, na medida em que pretende alcançar o princípio ou
princípios últimos e originários e a sua universalidade na medida em que aspira a atingir o princípio
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ou princípios de todo o real. Trata-se, portanto, de uma interrogação filosófica ou, mais exactamente,
trata-se da interrogação com que se inicia a filosofia.
Para Anaximandro, o arkhé – o princípio – é um elemento não determinado que não é nem se
confunde com nenhuma das substâncias já determinadas, mas que contém em si todas as
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- no séc. V a. C., manifestaram-se fermentos sociais, económicos e culturais que, ao mesmo tempo,
favoreceram o desenvolvimento da sofística.
- a crise da aristocracia que implicou também na crise da antiga areté, os valores tradicionais, que
eram apreciados pela aristocracia;
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4.2. Objectivos
O seu propósito fundamental era formar bons cidadãos, desviando os atenienses da sua atenção aos
problemas da natureza impessoal, para os concentrar em torno de si mesmos. Assim, o Homem torna-
se o centro de toda a problemática filosófica.
Com o advento da democracia e numa sociedade em que as decisões são tomadas pela assembleia do
povo e onde a máxima aspiração é o triunfo, o poder politico exigia que o politico fosse um bom
orador para manipular as massas, ter ideias acerca da lei, do que é justo e conveniente, acerca da
administração e do Estado.
4.3. Método
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quanto os sofistas se empenharam na sua prática educativa privilegiavam dois métodos distintos, isto
é, 1) a transmissão de um saber enciclopédico e 2) a formação do espírito nos seus diversos campos,
eles colocavam a palavra para ensinar, como instrumento de persuasão e meio de convencer e arrastar
as massas. Assim, emergia um cidadão ateniense que se proclamava o mais néscio de todos os
atenienses “só sei que nada sei, mas nisso supero todos os outros que nem isso sabem” Sócrates. Ao
mesmo tempo, Sócrates alia à sua humildade intelectual o lema de toda vocação humana. “Homem
conhece-te a ti mesmo” Sócrates. Longe de persuadir as pessoas pela palavra, ele privilegia o diálogo
como via indagava para despertar o conhecimento nos néscios (maiêutica) ou para despertar a
consciência da ignorância nos sábios (Ironia).
4.4. Temas
Os Sofistas tinham como temas predominantes: a ética, a política, a retórica, a arte, a língua, a religião
e a educação, ou seja, aquilo que hoje chamamos a cultura do homem. Assim, é exacto afirmar que,
com os sofistas, inicia-se o período humanista da filosofia grega.
5. SOCRATES (469-399 a. C )
Nasceu em Atenas, filho de um escultor e uma obstetriz, morreu em virtude de uma condenação por
“impiedade” (foi acusado de não crer nos deuses da cidade e de corromper os jovens). Não fundou
uma escola, como os outros filósofos, realizando o seu ensinamento em locais públicos (ginásios,
praças públicas, etc.), como uma espécie de pregador leigo, exercendo um imenso fascínio aos jovens
e homens de todas as idades o que lhe custou inúmeras inimizades.
Este cidadão ateniense passa a educar a humanidade em ordem aos valores universais e eternos.
Torna-se o maior dos mestres da antiguidade pelo seu ironismo e paradoxalismo. Dizia ele: “homem
conhece-te a ti mesmo”. Privilegiava o diálogo, a comunicação interpessoal como o único método
válido da filosofia para despertar o conhecimento nos néscios 5 (método da maiêutica) ou para
despertar a consciência da ignorância dos sábios (método da ironia).
A sua ironia exprime-se frequentemente na atitude modesta do “só sei que nada sei”; a maiêutica (arte
que dizia ter herdade da sua mãe) consistia em fazer perguntas da maneira que fosse o interlocutor
quem acabasse por extrair de si mesmo as formulações correctas sobre o tema em questão.
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Néscio – Aquele que não sabe ou não compreende bem; ignorante; irresponsável.
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b) Moral: conferida pelos estóicos. No sentido moral o termo “pessoa” designava uma máscara que permitia ao actor de
teatro ampliar a sua voz 3 comunicar-se com a assembleia e ao mesmo tempo, por analogia como é evidente em Epíteto e
Marco Aurélio, denotava (indicava) a providência (precaução) de cada homem durante a sua vida, o que não existia nos
animais não racionais.
c) Tradição judaico-cristã: prescreve que pessoa é aquele que tem o amor por todos os homens (inclusive os estrangeiros),
socorre à viúva, ao órfão, ao próximo com o amor de Deus e prega o amor aos próprios inimigos. Pessoa é aquele que
afirma a igualdade das almas e todos os homens.
A substância é a essência, algo permanente na pessoa ao longo da sua vida, que não deixa de ser, é a identidade de cada
um, diferentemente do acidental, ou seja, a qualidade que um sujeito possui mas poderia não possuir como peso, cor da pele,
altura, o tamanho, a posição social, a riqueza, que são qualidades acidentais.
Individual, quer designar algo distinto e independente, o que quer dizer que a pessoa não pode se reduzida ao grupo a que
pertence à colectividade, como um número numa série de números. A pessoa é o ente enquanto ser humano, dotado de
consciência de si, de racionalidade e de vontade própria.
Natureza racional, quer dizer que o ser humano é um indivíduo dotado de razão, capacidade de raciocinar, de reflectir e
compreender.
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Para S. Tomás de Aquino (1225-1274) pessoa é um subsistente de natureza racional. Com Descartes o conceito de
pessoa é definido em relação com a autoconsciência. O homem tem uma garantia de ser si mesmo, de existir efectivamente,
de ser uma autêntica realidade, porque pensa a si mesmo “Cogito, ergo sum!” O eu consiste na autoconsciência.
A noção de pessoa torna-se propriamente filosófica com Kant, no séc. XVIII, quando diz que a pessoa é o homem enquanto
ser raciona, é os ser fim em si mesmo… “os seres racionais são chamados pessoas porque a sua natureza os distingue já
como fim em si… o homem em geral, cada ser racional, existe como fim em si e não como meio de que esta ou aquela
vontade pode servir-se ao seu bel – prazer”. Dai o imperativo prático kantiano: “age de tal maneira que uses a
humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca como
meio”.
Contemporaneamente Martin Buber, considera que pessoa é aquele que se interessa pelo outro (comunicação) de tal modo
que compreende e respeita completamente o seu eu: “Eu tenho origem na minha relação com o Tu: quando eu me torno Eu,
então digo Tu”. Segundo Brightman o conceito de pessoa está relacionado com um si (self/eu) que é capaz de reflectir
sobre si mesmo como um si, de raciocinar, de reconhecer fins ideais à luz dos quais está em condições de julgar as próprias
acções (autotranscendência).
Concluindo, podemos definir pessoa como um indivíduo dotado de autonomia quanto ao ser (Cícero, Boécio e Tomás de
Aquino), de autoconsciência (Descartes), de comunicação (Buber) e de autotranscendência (Brightman. Pessoa significa
um ser consciente de si mesmo e senhor dos seus actos, e por isso, responsável por eles.
A singularidade: faz com que a pessoa possua uma essência individual; que torna única, irrepetível e insubstituível,
original, autêntico, quer dizer ninguém é cópia de ninguém.
A unidade: é entendida no sentido de que a pessoa é no seu agir uma realidade psicorgânica e psicológica.
Interioridade, quer dizer cada ser humano tem um espaço de reserva e de intimidade, inacessível e inviolável que é a
consciência moral.
Autonomia é a propriedade que faz da pessoa o princípio das suas acções, reger-se pela própria lei. É a capacidade de se
governar a si mesmo, a capacidade de ser lei para si mesmo, capacidade do exercício da liberdade e autodeterminação.
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Abertura e comunicação, no sentido de que o ser humano torna-se pessoa na sua relação com os outros, no ser-um-com-
os-outros. Abertura ao mundo circundante, aos outros coexistentes e co-actuantes, abertura ao transcendente enquanto
possibilidade devida.
Projecto: ser pessoa é uma possibilidade que cada um deve realizar-se por si e não algo inato.
Racionalidade: a pessoa é pessoa enquanto um ser racional. A razão é uma das características essências da pessoa.
ETICA E MORAL
ÉticaÉtica é o nome geralmente dado ao ramo da filosofia dedicado aos assuntos morais. A palavra "ética" é
derivada do grego ἠθικός, e significa aquilo que pertence ao ἦθος, ao carácter.[1]
Diferencia-se da moral, pois, enquanto esta se fundamenta na obediência a normas, tabus, costumes ou
mandamentos culturais, hierárquicos ou religiosos recebidos, a ética, ao contrário, busca fundamentar o bom
modo de viver pelo pensamento humano.[2][3]Na filosofia clássica, a ética não se resumia à moral (entendida
como "costume", ou "hábito", do latim mos, mores), mas buscava a fundamentação teórica para encontrar o
melhor modo de viver e conviver, isto é, a busca do melhor estilo de vida, tanto na vida privada quanto em
público. A ética incluía a maioria dos campos de conhecimento que não eram abrangidos na física, metafísica,
estética, na lógica, na dialéctica e nem na retórica. Assim, a ética abrangia os campos que actualmente são
denominados antropologia, psicologia, sociologia, economia, pedagogia, às vezes política, e até mesmo
educação física e dietética, em suma, campos directos ou indirectamente ligados ao que influi na maneira de
viver ou estilo de vida. Um exemplo desta visão clássica da ética pode ser encontrado na obra Ética, de
Espinosa.Porém, com a crescente profissionalização e especialização do conhecimento que se seguiu à
revolução industrial, a maioria dos campos que eram objecto de estudo da filosofia, particularmente da ética,
foram estabelecidos como disciplinas científicas independentes. Assim, é comum que actualmente a ética seja
definida como "a área da filosofia que se ocupa do estudo das normas morais nas sociedades humanas" [4] e
busca explicar e justificar os costumes de um determinado agrupamento humano, bem como fornecer
subsídios para a solução de seus dilemas mais comuns. Neste sentido, ética pode ser definida como a ciência
que estuda a conduta humana e a moral é a qualidade desta conduta, quando julga-se do ponto de vista do
Bem e do Mal.
A ética também não deve ser confundida com a lei, embora com certa frequência a lei tenha como base
princípios éticos. Ao contrário do que ocorre com a lei, nenhum indivíduo pode ser compelido, pelo Estado ou
por outros indivíduos, a cumprir as normas éticas, nem sofrer qualquer sanção pela desobediência a estas; por
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outro lado, a lei pode ser omissa quanto a questões abrangidas no escopo da ética.
Termo
Em seu sentido mais abrangente, o termo "ética" implicaria um exame dos hábitos da espécie humana
e do seu carácter em geral, e envolveria até mesmo uma descrição ou história dos hábitos humanos em
sociedades específicas e em diferentes épocas. Um campo de estudos assim seria obviamente muito
vasto para poder ser investigado por qualquer ciência ou filosofia particular. Além disso, porções
desse campo já são ocupadas pela história, pela antropologia e por algumas ciências naturais
particulares (como, p. ex., a fisiologia, a anatomia e a biologia), uma vez que os hábitos e o carácter
dos homens dependem dos processos materiais que essas ciências examinam. Até mesmo áreas da
filosofia como a lógica e a estética seriam necessárias em tal investigação, se considerarmos que o
pensamento e a realização artística são hábitos humanos normais e elementos de seu carácter. No
entanto, a ética, propriamente dita, restringe-se ao campo particular do carácter e da conduta humana à
medida que esses estão relacionados a certos princípios – comummente chamados de "princípios
morais". As pessoas geralmente caracterizam a própria conduta e a de outras pessoas empregando
adjectivos como "bom", "mau", "certo" e "errado". A ética investiga justamente o significado e escopo
desses adjectivos tanto em relação à conduta humana como em seu sentido fundamental e absoluto.[1]
Outras definições
Já houve quem definisse a ética como a "ciência da conduta". Essa definição é imprecisa por várias
razões. As ciências são descritivas ou experimentais, mas uma descrição exaustiva de quais acções ou
quais finalidades são ou foram chamadas, no presente e no passado, de "boas" ou "más" encontra-se
obviamente além das capacidades humanas. E os experimentos em questões morais (sem considerar as
consequências práticas inconvenientes que provavelmente propiciariam) são inúteis para os propósitos
da ética, pois a consciência moral seria instantaneamente chamada para a elaboração do experimento e
para fornecer o tema de que trata o experimento. A ética é uma filosofia, não uma ciência. A filosofia
é um processo de reflexão sobre os pressupostos subjacentes ao pensamento irreflectido. Na lógica e
na metafísica ela investiga, respectivamente, os próprios processos de raciocínio e as concepções de
causa, substância, espaço e tempo que a consciência científica ordinária não tematiza nem critica. No
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campo da ética, a filosofia investiga a consciência moral, que desde sempre pronuncia juízos morais
sem hesitação, e reivindica autoridade para submeter a críticas contínuas as instituições e formas de
vida social que ela mesma ajudou a criar.[1]
Ela se ocupa dessas questões justamente porque cada indivíduo que deseja agir correctamente é
constantemente chamado a responder questões como, por exemplo, "Que acção particular atenderá os
critérios de justiça sob tais e tais circunstâncias?" ou "Que grau de ignorância permitirá que esta
pessoa particular, nesse caso particular, exima-se de responsabilidade?" A consciência moral tenta
obter um conhecimento tão completo quanto possível das circunstâncias em que a acção considerada
deverá ser executada, do carácter dos indivíduos que poderão ser afectados, e das consequências (à
medida que possam ser previstas) que a acção produzirá, para então, em virtude de sua própria
capacidade de discriminação moral, pronunciar um juízo.[1]
O problema recorrente da consciência moral, "O que devo fazer?", é um problema que recebe uma
resposta mais clara e definitiva à medida que os indivíduos se tornam mais aptos a aplicar, no curso de
suas experiências morais, aqueles princípios da consciência moral que, desde o princípio, já eram
aplicados naquelas experiências. Entretanto, há um sentido em que se pode dizer que a filosofia moral
tem origem em dificuldades inerentes à natureza da própria moralidade, embora permaneça verdade
que as questões que a ética procura responder não são questões com as quais a própria consciência
moral jamais tenha se confrontado.[1]
O fato de que os seres humanos dão respostas diferentes a problemas morais que pareçam semelhantes
ou mesmo o simples fato de que as pessoas desconsideram, quando agem imoralmente, os preceitos e
princípios implícitos da consciência moral produzirão certamente, cedo ou tarde, o desejo de, por um
lado, justificar a acção imoral e pôr em dúvida a autoridade da consciência moral e a validade de seus
princípios; ou de, por outro lado, justificar juízos morais particulares, seja por uma análise dos
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princípios morais envolvidos no juízo e por uma demonstração de sua aceitação universal, seja por
alguma tentativa de provar que se chega ao juízo moral particular por um processo de inferência a
partir de alguma concepção universal do Supremo Bem ou do Fim Último do qual se podem deduzir
todos os deveres ou virtudes particulares.[1]
Pode ser que a crítica da moralidade tenha início com uma argumentação contra as instituições morais
e os códigos de ética existentes; tal argumentação pode se originar da actividade espontânea da própria
consciência moral. Mas quando essa argumentação torna-se uma tentativa de encontrar um critério
universal de moralidade – sendo que essa tentativa começa a ser, com efeito, um esforço de tornar a
moralidade uma disciplina científica – e especialmente quando a tentativa é vista, tal como deve ser
vista afinal, como fadada ao fracasso (dado que a consciência moral supera todos os padrões de
moralidade e realiza-se inteiramente nos juízos particulares), pode-se dizer então que tem início a ética
como um processo de reflexão sobre a natureza da consciência moral.[1]
A ética, independente da dimensão em que se apresenta social ou individual, tem como objectivo,
servir à vida, sua razão é o ser humano, seu bem estar, de forma que provenha a felicidade.[1]
Evolução histórica
A especulação ética na Grécia não teve início abrupto e absoluto. Os preceitos de conduta, ingénuos e
fragmentários – que em todos os lugares são as mais antigas manifestações da nascente reflexão moral
–, são um elemento destacado na poesia gnómica dos séculos VII e VI a.C. Sua importância é revelada
pela tradicional enumeração dos Sete Sábios do século VI, e sua influência sobre o pensamento ético é
atestada pelas referências de Platão e Aristóteles. Mas, desde tais pronunciamentos não-científicos até
à filosofia da moral, foi um longo percurso. Na sabedoria prática de Tales, um dos sete, não
conseguimos discernir nenhuma teoria da moralidade. No caso de Pitágoras, que se destaca entre os
filósofos pré-socráticos por ser o fundador não apenas de uma escola, mas de uma seita ou ordem
comprometida com uma regra de vida que obrigava a todos os seus membros, há uma conexão mais
estreita entre as especulações moral e metafísica. A doutrina dos pitagóricos de que a essência da
justiça (concebida como retribuição equivalente) era um número quadrado indica uma tentativa séria
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de estender ao reino da conduta sua concepção matemática do universo; e o mesmo se pode dizer de
sua classificação do bem ao lado da unidade, da recta e semelhantes e do mal ao lado das qualidades
opostas. Ainda assim, o pronunciamento de preceitos morais por Pitágoras parece ter sido dogmático,
ou mesmo profético, em vez de filosófico, e ter sido aceito por seus discípulos, numa reverência não-
filosófica, como o ipse dixit do mestre. Portanto, qualquer que tenha sido a influência da mistura
pitagórica de noções éticas e matemáticas sobre Platão, e, por meio deste, sobre o pensamento
posterior, não podemos ver a escola como uma precursora de uma investigação socrática que buscasse
uma teoria da conduta completamente racional. O elemento ético do "obscuro" filosofar de Heráclito
(c. 530-470 a.C.) – embora antecipasse o estoicismo em sua concepção de uma lei do universo, com a
qual o sábio buscará se conformar, e de uma harmonia divina, no reconhecimento da qual encontrará
sua satisfação mais verdadeira – é mais profunda, mas ainda menos sistemática. Apenas quando
chegamos a Demócrito, um contemporâneo de Sócrates e último dos pensadores originais que
classificamos como pré-socráticos, encontramos algo que se pode chamar de sistema ético. Os
fragmentos que permaneceram dos tratados morais de Demócrito são talvez suficientes para nos
convencer de que reviravolta da filosofia grega em direcção à conduta, que se deveu de fato a
Sócrates, teria ocorrido mesmo sem ele, ainda que de uma forma menos decidida; mas, quando
comparamos a ética democriteana com o sistema pós-socrático com o qual tem mais afinidade – o
epicurismo – descobrimos que ela exibe uma apreensão bem rudimentar das condições formais que o
ensinamento moral deve atender antes que possa reivindicar o tratamento dedicado às ciências.
A verdade é que nenhum sistema de ética poderia ter sido construído até que se direccionasse a
atenção à vagueza e inconsistência das opiniões morais comuns da humanidade. Para esse propósito,
era necessário que um intelecto filosófico de primeira grandeza se concentrasse sobre os problemas da
prática. Em Sócrates, encontramos pela primeira vez a requerida combinação de um interesse
proeminente pela conduta com um desejo ardente por conhecimento. Os pensadores pré-socráticos
devotaram-se todos principalmente à pesquisa ontológica; mas, pela metade do século V a.C. o
conflito entre seus sistemas dogmáticos havia levado algumas das mentes mais afiadas a duvidar da
possibilidade de se penetrar no segredo do universo físico. Essa dúvida encontrou expressão no
cepticismo arrazoado de Górgias, e produziu a famosa proposição de Protágoras de que a apreensão
humana é o único padrão de existência. O mesmo sentimento levou Sócrates a abandonar as antigas
investigações físicas - metafísicas. Essa desistência foi incentivada, sobretudo, por uma piedade
ingénua que o proibia de procurar coisas de cujo conhecimento os deuses pareciam ter reservado
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apenas para si mesmos. Por outro lado, (excepto em ocasiões de especial dificuldade, nas quais se
poderia recorrer a presságios e oráculos) eles haviam deixado à razão humana a regulamentação da
acção humana. A essa investigação Sócrates dedicou seus esforços.[1]
Embora Sócrates tenha sido o primeiro a chegar a uma concepção adequada dos problemas da
conduta, a ideia geral não surgiu com ele. A reacção natural contra o dogmatismo metafísico e ético
dos antigos pensadores havia alcançado o seu clímax com os sofistas. Górgias e Protágoras são apenas
dois representantes do que, na verdade, foi uma tendência universal a abandonar a teorização
dogmática e a se refugiar nas questões práticas – especialmente, como era natural na cidade-estado
grega, nas relações cívicas do cidadão.
A educação oferecida pelos sofistas não tinha por objectivo nenhuma teoria geral da vida, mas
propunha-se ensinar a arte de lidar com os assuntos mundanos e administrar negócios públicos. Em
seu encómio às virtudes do cidadão, apontaram o carácter prudencial da justiça como meio de obter
prazer e evitar a dor. Na concepção grega de sociedade, a vida do cidadão livre consistia
principalmente em suas funções públicas, e, portanto, as declarações pseudo éticas dos sofistas
satisfaziam as expectativas da época. Não se considerava a ἀρετἠ (virtude ou excelência) como uma
qualidade única, dotada de valor intrínseco, mas como virtude do cidadão, assim como tocar bem a
flauta era a virtude do tocador de flauta. Vemos aqui, assim como em outras actividades da época, a
determinação de adquirir conhecimento técnico e de aplicá-lo directamente a assuntos práticos; assim
como a música estava sendo enriquecida por novos conhecimentos técnicos, a arquitectura por teorias
modernas de planeamento e réguas T (ver Hipódamo), o comando de soldados pelas novas técnicas da
"táctica" e dos "hoplitas", do mesmo modo a cidadania deve ser analisada como inovação,
sistematizada e adaptada conforme exigências modernas. Os sofistas estudaram esses temas
superficialmente, é certo, mas abordaram-nos de maneira abrangente, e não é de se estranhar que
tenham lançado mão dos métodos que se mostraram bem-sucedidos na retórica e tenham-nos aplicado
à "ciência e arte" das virtudes cívicas.
O Protágoras de Platão alega, não sem razão, que ao ensinar a virtude eles simplesmente faziam
sistematicamente o que todos os outros faziam de modo caótico. Mas no verdadeiro sentido da palavra,
os sofistas não dispunham de um sistema ético, nem fizeram contribuições substanciais, salvo por um
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Sócrates.
A essa arena de senso - comum e vagueza, Sócrates trouxe um novo espírito crítico, e mostrou que
esses conferencistas populares, a despeito de sua fértil eloquência, não podiam defender suas
suposições fundamentais nem sequer oferecer definições racionais do que alegavam explicar. Não só
eram assim "ignorantes" como também perenemente inconsistentes ao lidar com casos particulares.
Desse modo, com o auxílio de sua famosa "dialéctica", Sócrates primeiramente chegou ao resultado
negativo de que os pretensos mestres do povo eram tão ignorantes quanto ele mesmo afirmava ser, e,
em certa medida, justificou o encómio de Aristóteles de ter prestado o serviço de "introduzir a indução
e as definições" na filosofia. No entanto, essa descrição de sua obra é muito técnica e muito positiva se
podemos julgar com base nos primeiros diálogos de Platão em que o verdadeiro Sócrates encontra-se
menos alterado. Sócrates sustentava que a sabedoria preeminente que o oráculo de Delfos lhe atribuiu
consistia numa consciência única da ignorância. No entanto, é igualmente claro, com base em Platão,
que houve um elemento positivo muito importante no ensinamento de Sócrates, que justifica afirmar,
junto com Alexander Bain, que "o primeiro nome importante na filosofia ética antiga é Sócrates". A
união dos elementos positivo e negativo de sua obra tem causado não pouca perplexidade entre os
historiadores, e não podemos salvar a consistência do filósofo a menos que reconheçamos algumas
doutrinas a ele atribuídas por Xenofonte como meras tentativas provisórias. Ainda assim, as posições
de Sócrates mais importantes na história do pensamento ético são fáceis de harmonizar com sua
convicção de ignorância e tornam ainda mais fácil compreender sua infatigável inquirição da opinião
comum. Enquanto mostrava claramente a dificuldade de adquirir conhecimento, Sócrates estava
convencido de que somente o conhecimento poderia ser a fonte de um sistema coerente da virtude,
assim como o erro estava na origem do mal. Assim, Sócrates, pela primeira vez na história do
pensamento, propõe uma lei científica positiva de conduta: a virtude é conhecimento.[1]
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Na antiguidade, todos os filósofos entendiam a ética como o estudo dos meios de se alcançar a
felicidade (eudaimonia) e investigar o que significa felicidade. Porém, durante a idade média, a
filosofia foi dominada pelo cristianismo e pelo islamismo, e a ética se centralizou na moral
(interpretação dos mandamentos e preceitos religiosos). No renascimento e no século XVII, os
filósofos redescobriram os temas éticos da antiguidade, e a ética foi entendida novamente como o
estudo dos meios de se alcançar o bem estar e a felicidade.
Aristóteles, em sua obra Ética a Nicômaco, afirma que a felicidade (eudemonia) não consiste nem nos
prazeres, nem nas riquezas, nem nas honras, mas numa vida virtuosa. A virtude (areté), por sua vez, se
encontra num justo meio entre os extremos, que será encontrada por aquele dotado de prudência
(phronesis) e educado pelo hábito no seu exercício.
Para Epicuro a felicidade consiste na busca do prazer, que ele definia como um estado de
tranquilidade e de libertação da superstição e do medo (ataraxia), assim como a ausência de
sofrimento (aponia). Para ele, a felicidade não é a busca desenfreada de bens e prazeres corporais, mas
o prazer obtido pelo conhecimento, amizade e uma vida simples. Por exemplo, ele argumentava que ao
comermos, obtemos prazer não pelo excesso ou pelo luxo culinário (que leva a um prazer fortuito,
seguido pela insatisfação), mas pela moderação, que torna o prazer um estado de espírito constante,
mesmo se nos alimentarmos simplesmente de pão e água.[5]
Para os filósofos cínicos, a felicidade era identificada com o poder sobre si mesmo ou auto-suficiência
(em grego, autárkeia) e é alcançada eliminando-se da vontade todo o supérfluo, tudo aquilo que fosse
exterior. Defendiam um retorno à vida da natureza, errante e instintiva, como a dos cães.
Desacreditavam as conquistas da civilização, suas estruturas jurídicas, religiosas e sociais.
Para os estóicos, a felicidade consiste em viver de acordo com a lei racional da natureza e aconselha a
indiferença (apathea) em relação a tudo que é externo. O homem sábio obedece à lei natural
reconhecendo-se como uma peça na grande ordem e propósito do universo, devendo assim manter a
serenidade e indiferença perante as tragédias e alegrias.
Para os cépticos da antiguidade, nada podemos saber, pois sempre há razões igualmente fortes para
afirmar ou negar qualquer teoria, além do que toda teoria é indemonstrável (um dos argumentos é que
toda demonstração exige uma demonstração e assim ad infinitum). Defender qualquer teoria, então,
traz sofrimentos desnecessários e inúteis. Assim, os cépticos advogavam a "suspensão do juízo"
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(epokhé). Por exemplo, aquele que não imagina que a dor é um mal não sofre senão da dor presente,
enquanto que aquele que julga a dor um mal duplica seu sofrimento e mesmo sofre sem dor presente,
sendo a mera ideia do mal da dor as vezes mais dolorosa que a própria dor.[6]
Enquanto na antiguidade todos os filósofos entendiam a ética como o estudo dos meios de se alcançar
a felicidade (eudaimonia) e investigar o que significa felicidade, na idade média, a filosofia foi
dominada pelo cristianismo e pelo islamismo, e a ética se centralizou na moral como interpretação dos
mandamentos e preceitos religiosos.
Espinosa, em sua obra Ética, afirma que a felicidade consiste em compreender e criar as
circunstâncias que aumentem nossa potência de agir e de pensar, proporcionando o afecto de alegria e
libertando-nos das determinações alheias (paixões), isto é, afirmando a necessidade de nossa própria
natureza (conatus). Unicamente a alegria nos leva ao amor ("alegria que associamos a uma causa
exterior a nós") no quotidiano e na convivência com os outros, enquanto a tristeza jamais é boa,
intrinsecamente relacionada ao ódio ("tristeza que associamos a uma causa exterior a nós"), a tristeza
sempre é destrutiva.[7][8] Espinosa dizia, quanto aos dominados pelas paixões: "Não rir nem chorar, mas
compreender."[9]
CONLUSÃO
A palavra Moral vem do latim mores também chamada ética (do grego ethika, costumes), define-se etimologicamente como
a ciência dos costumes tendo como objectivos de regular, dirigir expor o modo como os homens devem viver.
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Assim, a Moral e Ética são palavras que aparecem na linguagem corrente como termos equivalentes ou sinónimos. No
âmbito filosófico diferem pelas seguintes razões:
A Moral é o conjunto de princípios, das normas, dos juízos ou dos valores de carácter ético-normativos vigentes numa
determinada sociedade e aceites pelos membros dessa mesma sociedade, antes mesmo de qualquer reflexão sobre o seu
significado, a sua importância e a sua necessidade.
A moral é da ordem dos factos. Está ai. Os seus princípios, as suas normas, os seus valores estão ai. Cada sociedade e cada
cultura têm os seus, ainda que muitos sejam comuns a diversas sociedades e culturas. Podem, mediante isso, ser objecto de
levantamento e de descrição pela Psicologia, sociologia e Antropologia.
A Moral caracteriza-se pelo facto de ser uma ciência normativa, prática, universal e absoluta ou categórica.
A Ética é a reflexão sobre a moral. A Ética é definida como ciência ou teoria que tem por objecto a moral, ou seja, a
experiência e o comportamento dos seres humanos considerados sob o prisma da bondade ou da maldade, da justiça ou da
injustiça, do recto, do obrigatório ou do proibido. A Ética responde a questão Kantiana: que devemos fazer? A Ética é a
ciência normativa, crítica, reflexiva e considera os valores.
Na Ética Kant é mais conhecido por causa do seu imperativo categórico que se enunciada seguinte maneira: “age como se a
máxima da tua acção se devesse tornar, pela tua vontade, em lei universal da natureza”.
Reflexão
1. Nos exemplos que se seguem procura distinguir aqueles que estão em conformidade com as noções da ética e da mora, tal
como foram definidos.
- Estou com a moral em baixo ______________ - Eticamente não posso fazer ______________
- Este homem é um imoral ________________ - Deixou-me desmoralizado _______________
- Roubar é imoral ________________________ - É uma questão de justiça _________________
2. Entre as muitas situações que envolvem dilemas morais de difícil solução estão a eutanásia, o aborto, o homicídio, o
suicídio, o roubo, a fecundação “in vitro”, etc
3. Define os seguintes conceitos: Código moral, lei mopral, lei eterna, lei natural, lei positiva, norma moral, moral social,
moral religiosa, moral civil, moral humanitária, moral cívica, moral politica, moral individual ou pessoal, moral cientifica,
moral racional ou kantiana.
4. A Consciência Moral
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4.1. Noção: Chateaubriand afirmou que “a consciência moral é um verdadeiro tribunal onde o homem se julga a si
mesmo, esperando que Deus confirme a sentença”. Dai que podemos definir a consciência moral como um juiz que
aprecia o valor moral dos nossos actos, pronunciando-se sobre eles, proclamando o que é necessário fazer e o que é
necessário evitar e atestando-nos que o que fizemos, fazemos ou vamos fazer é bom ou mau. Antes do acto, diz-nos se ele
será bom ou mau, guia-nos durante a sua execução, e depois louva-nos ou censura-nos.
Em todo o acto, a consciência moral pronuncia um juízo sobre o seu valor, indicando-nos se o devemos fazer ou evitar. A
consciência tem um carácter imperativo
Sócrates disse que deixou de se dedicar às coisas politica porque “uma voz interior, uma espécie de génio ou demónio, fala
em mim e me adverte do que devo ou não devo fazer”.
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Para S. Tomás, a consciência é uma voz interior que se pronuncia sobre os actos passados e que nos adverte sobre a sanção
dos actos futuros.
Rousseau dizia que a consciência moral está gravada no coração do homem em caracteres que não se apagam. Ela é um
princípio inato de justiça e de virtude graças ao qual julgamos as nossas acções.
A autonomia da consciência moral, para Kant, identifica-se com a predisposição inata dos indivíduos. Para ele, a
consciência é em geral aquela actividade do conhecimento pelo qual os homens tornam claras as suas representações e a voz
do juízo interior.
Stuart Mil afirma que a consciência é adquirida pelo individuo que nasceria sem qualquer noção de bem e de mal, por
conseguinte, a consciência moral não é mais do que a voz da sociedade manifestando-se pela pressão social.
Durkheim diz que “a sociedade é o fim eminente de toda a actividade moral. Ao mesmo tempo que ultrapassa as
consciências individuais, ela é lhes imanente (inerente, permanente), tem todas as características de uma autoridade moral
que impõe o respeito”. Lévy Bruhl e todos os pensadores sociais, consideram que os factos morais são como sociais. A
perspectiva de Freud quando dizia que o sujeito deve renunciar aos seus impulsos de carácter sexual relativamente a um
dos seus pais.
Por fim, para Engel e Marx, a conduta moral dos seres humanos só pode ser explicada em função da chamada consciência
de classe. Todos os seres humanos têm a sua tabela de valores, os quais lhe são ditados pelas condições económico-sociais
em que vivem. A consciência é acima de tudo um produto social e, consciente ou inconscientemente, os seres humanos
tiram em última instancia as suas ideias morais das condições materiais sobre que repousa a sua situação de classe.
A consciência moral para Vasquez começa a emergir propriamente, e a definir-se como um recinto interior, quando o
homem cumpre normas que regulamentam os seus actos não mais submetendo-se à tradição e ao costume ou ao temor dos
deuses, ou simplesmente para conformar-se com a opinião dos outros, mas porque corresponde o dever de cumpri-las.
A consciência moral conserva actualmente e conservará sempre este carácter social, porque na interioridade da sua
consciência o sujeito não escuta apenas a sua própria voz, mas também, através dela, a da sociedade que lhe proporciona os
princípios e as normas morais conforme as quais julga e avalia.
2ª Etapa: Moral de solidariedade entre iguais; período das operações concretas (entre os 7 e os 11 anos)
Há um respeito mútuo que supõe a reciprocidade e a noção de igualdade entre todos. As regras dos jogos são convenções,
produto de acordo mútuo. Há um sentimento de honestidade e de justiça. As normas respeitam-se por solidariedade para
com o grupo e para poder manter a ordem a ordem no grupo. As normas aplicam-se com rigidez e a justiça é entendida de
modo formalista e igualitário.
3ª Etapa: Moral de equidade – autonomia; período de operações formais (a partir dos 12 anos)
Aparece o altruísmo, o interesse pelo outro e a compaixão. A moral converte-se em autónoma e o adolescente é capaz de
conceber princípios morais gerais, criar o seu próprio código de conduta. O respeito pelas normas colectivas faz-se de um
modo pessoal.
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Para compreendermos melhor os três níveis de que fala Kohlberg importa esclarecer que o termo convencional significa que
o indivíduo deve submeter-se a regras, expectativas, convenções da sociedade ou da autoridade e defendê-las precisamente
porque são regras, expectativas da sociedade.
As regras sociais são algo exterior ao indivíduo. As normas sociais sobre o que é bom ou mau são respeitadas considerando
unicamente as consequências – premio ou castigo – ou o poder físico dos que as estabelecem. (“ Se não faço assim,
castigam-me”).
2º Nível: Convencional
É aquele em que se encontram a maioria dos adolescentes e adultos na sociedade e de outras sociedades. Neste nível o eu
identifica-se com as regras e expectativas dos outros, especialmente da autoridade, e interioriza essas regras e expectativas.
Vive-se identificado com o grupo e procura-se cumprir bem o próprio papel: responder às expectativas dos outros e manter
a ordem estabelecida, quer dizer, a ordem “convencional”. Há uma orientação para a concordância. Considera bom o que
agrada ou ajuda aos outros e é aprovado por eles. Há uma orientação para a lei e para a ordem. A conduta correcta consiste
em que cada um cumpra o seu dever, respeite a autoridade e mantenha a estabelecida.
3º Nível: Pós-convencional
Encontram-se todos aqueles que diferenciam o seu eu das regras e expectativas dos outros e definem os seus valores em
função dos princípios que escolheram. Este nível, só se atinge depois dos 20 anos e, segundo Kohlberg, só uma minoria de
adultos o atinge.
Há um esforço para definir valores e princípios de validade universal, quer dizer, acima das convenções sociais e das
pessoas que são autoridade nos grupos. O valor moral reside na conformidade com esses princípios, direitos e deveres que
pose ser universais.
Numa visão ética, o valor da pessoa emerge nas suas relações interpessoais, trata-se da dimensão ética do agir para com o
outro e mais exactamente a dimensão ética de sermos-uns-com-os-outros, e sermos com o ambiente.
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Não se pode se falar do homem sem um mundo – mundo natural, social, cultural, ambiental, etc. – nem estes mundos
separados do homem. O que existe é o homem no mundo e o mundo para o homem. Há, por isso, várias formas de
relacionamentos do homem. Trataremos de aspectos da ética individual, da ética social ou colectiva, da ética ambiental, da
bioética.
Os aspectos dos da ética individual resumem-se em sentimentos de indiferença, ódio e amor, havendo, no entanto outros
aspectos, que o ser humano tem manifestado ao se relacionar com os outros.
Os sentimentos são a grande fonte das nossas emoções e têm uma acção preponderante na nossa vida. Tudo o que nos
afecta, agita, perturba, exalta ou deprime, procede dos sentimentos.
O pensamento une-se ao objecto. Se este lhe agrada produz sentimento de prazer, amor; se lhe desagrada produz-se
sentimento de dor ou de pena. Sendo assim, tanto o prazer e a dor estão para o sentimento como o erro e a verdade também
estão para o sentimento.
Na pessoa normal o pensamento sente atracção para a verdade, experimenta atracção do prazer e repulsão para o erro, dor
ou para a pena; havendo casos em que o erro agrada e a verdade fere ou incomoda. É que nem sempre o sentimento
acompanha o pensamento de forma a harmonizar-se com ele. O sentimento varia com o estado do indivíduo, com a idade, o
sexo; o temperamento, as ocupações, o grau cultural, etc.
Os sentimentos exercem uma influência preponderante na formação de carácter; inclinação à acção, a prática repetida de
certos actos, criando hábitos que mantêm as disposições permanentes da inteligência e da vontade, das quais depende a
nossa boa ou má vontade. Por conseguinte devemos cuidar da formação dos sentimentos desenvolvendo aqueles que são
bons, fortificantes da vontade e procurando eliminar ou reprimir aqueles que são maus ou debilitantes da nossa energia
moral.
a) A Indiferença
Consiste na ignorância, ou seja, insensibilidade; estado mental que não provoca sentimento de dor nem de prazer, nem a
mistura de uma da outra. a indiferença é estranha a qualquer preocupação de ordem moral ou religiosa; é um tipo de
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relacionamento em que a pessoa eleva a sua subjectividade acima do outro, ignorando-o. É uma espécie de cegueira
involuntária, mediante a qual o sujeito escolhe ignorar a realidade. Na indiferença, o sujeito é como se estivesse só no
mundo, isto é, o outro é como se não existisse.
Como forma de relacionamento ou atitude, a indiferença está condenada ao fracasso visto tratar-se de má fé o não
reconhecimento do outro. Pois, por mais que eu queira ignorar o outro, ele está sempre presente como sujeito, como um ser
semelhante a mim, que também me olha, me observa e analisa. O outro não é um simples objecto.
O Ódio
Trata-se de rancor profundo e reservado que se sente por outrem; é a rejeição e negação do outro. É um tipo de sentimento
em que a pessoa se encontra marcada por diversas experiências de fracasso de tal modo que haja a pretensão de destruir e
reduzir o outro a uma insignificância. Ao contrario da indiferença, o ódio significa um reconhecimento do outro e da sua
liberdade dai o não ignorá-lo, mas um desejo de suprimir as liberdades alheias e, portanto, de realizar um mundo onde o
outro não existe.
Amor
Na esfera da afectividade humana, quase todos os filósofos estão de acordo em assinalar um papel fundamental ao amor. O
conceito platónico do amor é entendido como privação e desejo. É alma carente de felicidade e estabilidade que sente a
aspiração, o desejo (eros), e a atracção do Bem e do mundo ideal e imortal. Portanto a ascensão do amor inicia-se com o
acto irracional, que tem todos os caracteres de uma loucura (mania) que aliena o homem de si mesmo e lhe anuncia um
valor transcendente. O filósofo atinge a ciência do amor quando se liberta dos grilhões do mundo sensível e contempla em
ordem sucessiva e com justo método todas as coisas belas.
Para Aristóteles o amor fundamenta-se na amizade como valor moral. A amizade não é nada senão o amor desinteressado
de outra pessoa, enquanto que para Freud, o amor é degeneração ou sublimação do impulso sexual originário.
Concluindo, o amor constitui uma dimensão fundamental da natureza humana: é a mola de cada desejo e de cada acção. Do
ponto de vista espiritual o amor é “caritas”: amar o próximo como a si mesmo, fazer o bem, ser útil, benéfico,
misericordioso como o próprio Deus que fez surgir o sol para os bons e para os maus. Do modo carnal é a libido de que
trata Freud. Do modo egoísta ou altruísta é secundário se é voltado para si mesmo para os outros.
Em fim, o amor não constitui “ipso facto” um valor: a sua bondade ou malícia é determinada pelo objecto (pela pessoa) a
que é voltado e, outrossim pelos motivos para os quais é exercido. O amor é a força de interacção com os outros que se
caracteriza como promoção do outro.
A Pessoa como Ser de Relações: A Relação consigo própria; com os outros; com o trabalho
Para alcançar o governo de si mesmo, é preciso dispor de força e vontade que nos torna capazes de dominar as nossas
faculdades inferiores submetendo-as à razão e à consciência que nos faz conformar a nossa conduta com as nossas
convicções e nos leva a procurar possuir convicções firmes e bem definidas. Podemos resumir nos seguintes deveres
connosco mesmo.
1. Poder de prevenção ou de previdência, que nos faculta a prever e prevenir, por meio duma vigilância discreta e constante,
as nossas imaginações, impressões, impulsões e emoções perigosas.
2. Poder de inibição ou de moderação de movimentos violentos que surgem na nossa alma, para desviar os inconvenientes,
imagens malsãs, ira e vencer o mau humor.
3. Poder de estimulação, que nos faculta o excitar ou intensificar pelo nosso querer os movimentos passionais.
4. Poder de direcção, que nos permite desviar do mal os movimentos da nossa alma e dirigi-los para o bem.
É na experiência do acolhimento e da carícia, da sinceridade, do amor, da amizade duma mãe ou dum pai para com os seus
filho, experimentados como valores absolutos e intocáveis.
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Em todas as experiência se vislumbra um outro e bem diferente modo de ver o outro e de tematizar a dimensão ética de
sermo-uns-com-os-outros. Enquanto Sartre dizia que na correlação ético-moral “tenho necessidade de mediação do outro
para ser o que eu sou”, Sócrates dizia que a ideia de que a virtude é ciência e o vício é a ignorância que emerge na busca da
felicidade.
Por detrás desses gestos mora o reconhecimento (ainda não reflectido) de que o outro é um valor, de que o outro
tem uma dignidade própria, de que o outro é um imperativo ético, de que relativamente ao outro os seres humanos
são capazes afinal de assumir espontaneamente obrigações morais e de arcar com a responsabilidade ética de
valerem pelo seu bem e pela sua felicidade.
5.2. 1. A Liberdade
a) Noção: Etimologicamente a palavra “liberdade” significa isenção de qualquer coação ou negação da determinação para
uma só coisa, definindo-se em geral, como o poder de fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Neste sentido, ser livre é
poder fazer.
Sócrates foi primeiro pensador a dedicar-se sobre a liberdade e era da opinião que o homem é livre quando se verifica o
domínio da própria racionalidade em relação à própria animalidade. Para Descartes “A liberdade da vontade sente-se mais
do que demonstra; a sua existência é de evidência igual à do ‘cogito’: se penso é porque sou livre”. Segundo Kant, a
liberdade é a razão de ser da lei moral e simultaneamente a afirmação dum sujeito que age como pessoa, como boa vontade
e que, mesmo agindo por dever, age livremente pois obedece à sua própria lei. Recomendava ele: “age como se a máxima
da tua acção pudesse se tornar em uma lei universal da natureza”. Jean Paul Sartre, por sua vez identifica o homem
como a liberdade, como uma liberdade absoluta e total. Ou seja, o homem está condenado a ser livre, porque uma vez
lançado ao mundo, é responsável por tudo aquilo que faz.
b) Pressupostos da liberdade
A liberdade implica:
1. Autonomia do sujeito face as suas condicionantes. O homem tem de ter a capacidade de se governar a si mesmo, de
autodeterminar-se diante dos factores externos e internos, para que uma acção possa ser considerada livre é necessário.
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2. Consciência da acção. A acção humana é a manifestação de uma vontade livre e portanto consciente dos seus actos.
Estes pressupostos implica que o sujeito não ignore a intenção, os motivos e as circunstâncias, assim como as consequências
da própria acção.
3. Escolhas fundamentadas em valores. A acção implica sempre a manifestantes de certas preferências, implicando o
homem nessa escolha. Nem sempre contudo, esta dimensão da liberdade é consciente, embora seja sempre materializada na
acção própria acção.
b) Formas de liberdade
Liberdade interior: autonomia face a si mesmo (liberdade psicológica) e de agir segundo valores livremente escolhidos
(liberdade moral).
Liberdade externo autonomia face a sociedade (liberdade sociológico) e de exercer os direitos básicos de qualquer
cidadão (liberdade de execução).
c) Tipos de Liberdade
Há tantas espécies de liberdade quantas as formas de actividade. Assim teremos:
A liberdade física ou de locomoção que significa estar isento de toda a coação ou obstáculo que possa impedir o exercício
da actividade física. Neste sentido não é livre o indivíduo que está dominado por qualquer doença, ex. o paralítico.
Liberdade civil consiste no reconhecimento pelas leis da possibilidade de acção, dentro dos limites estabelecidos e exigidos
pela ordem social. O homem é livre enquanto pode fazer o que a lei não proíbe ou recusa fazer que a lei não obriga.
Liberdade psicológica ou de decisão é o poder de se determinar a si mesmo, em plena consciência e após reflexão, e
independentemente das forças interiores de ordem racional.
Liberdade de execução ou de acção (liberdade individual, poética, politica, de religião, de imprensa, de reunião, de
expressão, de pensamento, de ensino, etc.) é o poder ou direito de agir sem coação ou impedimentos externos.
5.2.2. A Responsabilidade
a) Noção: Etimologicamente a palavra responsabilidade deriva do latim respondere, que significa comprometer-se
(spondere) perante alguém em retorno (re). O uso do termo em filosofia é relativamente recente e foi sobretudo no séc. XX
que ganhou maior divulgação, substituindo em muitas situações o termo dever. Sumariamente, poderíamos definir a
responsabilidade, em termos individuais, como a qualidade ou a característica em virtude da qual a pessoa deve responder
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pelos seus actos, isto é, reconhecê-los como seus e suportar as suas consequências. Assim considerada a responsabilidade é
algo intransmissível.
b) Pressupostos da Responsabilidade
A responsabilidade exige as seguintes condições a imputabilidade, o conhecimento, a liberdade e a intenção do acto.
1º. Imputabilidade: é a condição fundamental que consiste na atribuição de um acto a uma pessoa como seu autor.
2º. O conhecimento: a responsabilidade depende da noção que o agente tem dos actos e das suas consequências e, por isso,
quanto maior for a sua cultura e melhor a sua educação, tanto maior será a sua responsabilidade. É por isso que, quando a
pessoa actua por ignorância inculpável ou com inadvertência ao bem e ao mal dos seus actos, a sua responsabilidade será
atenuada ou anulada, visto que só é responsável pelo bem ou pelo mal que a própria pessoa reconhece existir no acto e
também só pelas consequências que por esse homem foram previstas e desejadas.
º. A liberdade: somos responsáveis pelos actos que sejam nossos, em virtude da autodeterminação e isenção de factores
externos como a violência, o medo, a paixão e o hábito, pois enfraquecem a responsabilidade.
4. A intenção: a responsabilidade depende do objectivo com que se decide a realização do acto. Para Piaget só a partir dos
nove-dez anos, o grau de responsabilidade é fundamentalmente determinado pela intenção.
Daqui se conclui que a responsabilidade é nitidamente subjectiva e individual. Pois, só um ser livre é um ser responsável. Só
aquele que decide autonomamente, escolhendo entre duas ou mais possibilidades, está em condições de responder pelo que
faz.
b) Formas de Responsabilidade
1ª. Responsabilidade moral ou individual: é a obrigação de responder perante a nossa consciência e perante Deus pelos
actos livres, tanto internos como externos.
2ª. Responsabilidade social ou jurídica: consiste na obrigação de responder pela nossa conduta perante a sociedade ou
perante os tribunais. Esta responsabilidade pode revestir-se na forma de responsabilidade civil quando temos a obrigação
de reparar o dano causado a outrem; responsabilidade penal quando há obrigação de reparar a violação da ordem, nos
casos previstos na lei; podendo revestir-se também na forma administrativa, disciplinar, criminal, fiscal, etc.
c)Tipos de Responsabilidade
1. Responsabilidade fundamental ou transcendental é a responsabilidade moral ou individual.
2. Responsabilidade categorial é a responsabilidade social ou jurídica.
5.2.3. O Dever
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Noção e análise: Etimologicamente o vocábulo dever é um infinitivo substantivado (do latim, debere, por sua vez habere,
ter de) e significa de um modo geral um imperativo que se impõe à liberdade com carácter necessitante e/ou ‘categórico’,
exigindo-lhe que actue de modo determinado. A necessidade do dever não suprime a liberdade nem consequentemente a
responsabilidade, antes as pressupõe essencialmente. O que ela tira é a liberdade moral de proceder de outro modo.
Kant, entende que objectivamente o conceito de dever exige na acção a conformidade com a lei (legalidade: age-se com
dever), mas subjectivamente, na máxima desta mesma acção, o respeito pela lei enquanto modo único de determinação da
vontade mesma lei (moralidade: age-se por dever). Dai a máxima ou imperativo categórico kantiana “Age apenas segundo a
máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”.
Para Durkheim o dever é a sociedade enquanto nos impõe as suas regras e assinala limites à nossa natureza. É a sociedade
que, formando-nos moralmente, coloco sentimentos que nos ditam tão imperativamente a nossa conduta. Quando a nossa
consciência fala, é a sociedade que fala em nós e que nos diz: eis o teu dever.
12º A dualidade do ser humano (corpo e alma): consiste na orientação de tendências inferiores (ligadas às funções do
organismo e de cuja satisfação deriva uma afectividade sensível) às tendências superiores que inclinam o homem para o
bem moral, que é o próprio dever.
c) Fundamentos do Dever
O dever é a própria norma moral aplicada à vida. Sendo o dever absoluto e categórico, exigindo sacrifícios constantes, de
onde vem a sua força? São três os principais fundamentos: teísmo, positivismo e racionalismo.
1º fundamento teísta: diz que o verdadeiro fundamento do dever é Deus, criador e legislador supremo da natureza do
homem. Só Deus, ser absoluto, autoridade suprema, pode explicar o carácter absoluto, categórico e universal do dever.
2º fundamento positivista: considera o dever como resultante da pressão exercida pela sociedade sobre os indivíduos que,
com o tempo, se foi interiorizando e se transformou em obrigação da consciência.
ndamento racionalista: o racionalismo kantiano explica que o fundamento do dever é a própria razão humana, autora de
todas as leis e, por isso, também das leis morais. Estas, por procederem da razão, são dignas do máximo respeito e
veneração e impõem-se à vontade por um imperativo categórico de valor relativo. Todavia, é razão que cria o dever.
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5.2.4. A Sansão
A sanção é a consequência directa da responsabilidade e do dever e pode definir-se como o prémio ou o castigo impostos
pelo cumprimento ou violação da lei. Contra o pensamento usual, a sanção não se circunscreve ao castigo, mas pode
envolver também o prémio.
Sancionar um acto é sublinhar o seu valor, quer reconhecendo-o como bom, por meio de elogios ou recompensas, quer
tomando-o como mau, através de censuras ou castigos. As sanções subdividem-se em sanções terrenas e sobrenaturais ou
morais.
Entre as sanções terrenas temos a sanção da consciência que é alegria ou remorso pelo cumprimento ou violação de normas
morais; sanção de opinião pública que é o juízo que a sociedade pronuncia quanto ao procedimento de cada um dos seus
membros; sanção natural que resulta de certos actos contrários à verdadeira natureza, como a decadência física, a doença, a
miséria do esbanjador, etc; sanção civil que deriva da infracção das leis sociais e traduzida numa pena de restrição de
liberdade ou de natureza pecuniária. A sansãso sobrenatural ou moral é a que é dada por Deus. A sanção moral é a
recompensa da virtude e do vício. É a única sanção justa e eficaz, enquanto que todas as sanções terrenas são incompletas e,
por isso, injustas e ineficazes.
Exs. A caridade não consiste em dar esmola uma só vez, mas sim no hábito de fazer esse acto, assim como não se é
preguiçoso por deixar de trabalhar uma só vez.
5.2.7. A Justiça
A justiça consiste na vontade firme e constante de dar a cada um o que lhe é devido. A justiça supõe que uma pessoa tem
direito a um objecto que lhe pertence e outra tem o dever correlativo de o respeitar. A justiça pode ser comutativa,
distributiva e social.
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A justiça comutativa regula as relações dos indivíduos entre si; regula as trocas e os contratos e assenta na igualdade de
valor das coisas trocadas. Esta justiça impõe a obrigação de dar a cada um o que lhe é devido: um salário justo a quem
trabalha. É a justiça mais perfeita e a única que obriga à restituição.
A justiça distributiva regula as relações da sociedade para com os seus membros e consiste numa atribuição de honras,
obrigações e cargos conforme os merecimentos e o valor de cada um. Assenta no princípio de que devem tratar
desigualmente as pessoas desiguais.
A justiça social ordena que cada um recebe, não apenas de acordo com as suas capacidades, mas segundo as suas
necessidades sociais. Ex. o chefe de família de cinco pessoas recebe salário superior ao chefe de família de duas pessoas
embora executem o mesmo género de trabalho com mesmo formação técnico-profissional.
Reflexão:
1. A liberdade, a responsabilidade e a justiça são três aspectos da Ética Social. Explica como se manifestam estes aspectos
na sua escola e na comunidade onde vives.
2. Explique as circunstâncias da emergência do valor ético da pessoa.
2. A pessoa, por ser animal racional, torna-se superior em relação aos restantes animais. Identifique argumentando, dois
aspectos que fazem com que a pessoa seja superior aos outros animais.
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Mischa Titiev no seu livro introdução à Antropóloga Cultural, diz que “dois dos problemas mais interessantes, mais
difíceis, das ciências sociais consistem em determinar como é que os padrões de cultura se modificam, e descobrir onde o
comportamento humano das pessoas é baseado na vontade individual ou motivado pelos padrões de conduta que
prevalecem na sua sociedade”. Por isso, as acções humanas têm como condicionantes aspectos orgânicos, culturais e
determinismos da liberdade.
a) Condicionates Orgânicos
Toda a acção humana é, em geral, condicionada pelos mecanismos fisiológicos dos sistemas nervoso, glandular, etc. o nosso
organismo fornece-nos a energia psicossomática necessária para agirmos, mas também determina a forma como agimos e
reagimos aos estímulos do mundo exterior. Estes determinismos biológicos impõem certas predisposições para a acção,
nomeadamente quando se trata de acções decorrentes de motivações básicas: sobrevivência, autoconservação, procura do
prazer ou fuga à dor.
b) Condicionantes Culturais
Os padrões de cultura tradicionais desempenham as funções de identificação, integração e regulação social, onde se destaca
a capacidade humana de adaptação e assimilação ao ambiente e às diversas situações da vida, seja modificando o
comportamento, seja alterando o próprio meio, ou ainda integrando-se na mais variadas sociedades. Pois a socialização é
uma aprendizagem; graças a ela aprende-se adaptar-se aos grupos, normas, imagens e valores. É portanto um processo de
aprendizagem de conduta. A cultura modifica e molda o homem.
c) Determinantes da Liberdade
As nossas acções são sempre determinadas por causas que nos transcendem e sobre as quais não temos qualquer poder. A
liberdade é, pois, uma ilusão. Não sou eu que escolho, mas um conjunto de circunstancias que escolhem por mim.
Apesar de reconhecermos todas estas influências, temos igualmente que admitir que o homem possui sempre alguma
margem de liberdade nas suas acções. Não podemos pois falar de actos mecânicos de respostas e estímulos, mas de acções
livres. As suas decisões implicam quase sempre escolhas entre uma multiplicidade de opções possíveis. As decisões são,
pois, indissociáveis da nossa liberdade, assim como da responsabilidade moral ou jurídica das suas consequências.
fazemo-los sem pensar. Há outros actos que realizá-los de forma acidental devido a uma sucessão de causas que nos são
totalmente alheias e que não controlamos.
5.4. OS VALORES
5.4.1. Noção: O conceito de valor tem sido investigado e conceituado em diferentes áreas do conhecimento. A abordagem
filosófica descreve-o como nem totalmente subjectivo, nem totalmente objectivo, mas como algo determinado pela
interacção entre o sujeito e o objecto. O valor é definido como a propriedade que torna uma coisa susceptível de ser
considerada desejável ou digna de apreço.
Nas ciências económicas, a noção de valor tem uma interpretação predominantemente material. Smith propõe a análise de
valor como a habilidade intrínseca de um produto oferecer alguma utilidade funcional. Já no conceito moderno, dado pelo
marketing, isto é uma função dos atributos dados ao produto ou ao conjunto formado por ele e que o envolve, quando
necessitamos obtê-lo.
Na visão da sociologia, embora a sociologia não seja uma ciência valorativa, ela reconhece os valores como fatos sociais.
No campo de análise, os valores podem surgir como um estatuto fundamental na explicação da estabilidade e coerência das
sociedades ou das mudanças sociais ( Max Weber, T. Parsons ) ou podem surgir como “fenómenos reflexos” das infra-
estruturas da sociedade. O valor exprime uma relação entre as necessidades do indivíduo (respirar, comer, viver, posse,
reproduzir, prazer, domínio, relacionar, comparar) e a capacidade das coisas e de seus derivados, objectos ou serviços, em as
satisfazer. É na apreciação desta relação que se explica a existência de uma hierarquia de valores, segundo a
urgência/prioridade das necessidades e a capacidade dos mesmos objectos para as satisfazerem, diferenciadas no espaço e
no tempo.
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a) Valores úteis e vitais: os valores de natureza económica e vital, poderíamos falar de uma experiência de fruição e
predilecção por objectos e obras (capaz/incapaz; caro/barato; abundante escasso; necessário/supérfluo; são/doente;
forte/débil; enérgico/inerte).
b) Valores Espirituais
i) estéticos - podemos falar da experiência de estima e admiração por pessoas condutas (belo/feio; elegante deselegante;
harmonioso/desarmonioso).
ii) morais ou éticos – (bom/mau; bondoso/maldoso; justo/injusto; leal/desleal).
iii) intelectuais – (conhecimento/erro; exacto/aproximado; evidente/provável)
iv) valore religioso – sagrado/profano; divino/demoníaco; supremo/derivado; milagroso/mecânico).
Os valores morais constituem os valores supremos e consistem na realização do bem.
a) Para as teorias subjectivistas, os valores são sempre criações dos homens, não havendo assim valores absolutos, mas
tão-só apreciações subjectivas. Entre os defensores contam-se Ch. Von Ehrenfels que dizia “não desejamos as coisas
porque percebemos nelas um valor, mas antes lhes atribuímos valor porque as desejamos”. F. Nietzsche afirmou “a
natureza carece em si de valor, somos nós que lhos outorgamos (concedemos)”. E. Durkheim dizia que os valores são de
origem social; J.P. Sartre, por seu lado, proclamou que “é à nossa liberdade que cabe a tarefa de inventar valores”.
b) Para as teorias objectivistas dos valores entende-se que os valores existem como entidades independentes das coisas e
também dos homens, que não a cria, mas apenas os pode descobrir. Concebem os valores como algo objectivo supõem que,
por alguma razão – exigências da racionalidade, da natureza humana, de Deus, de outra autoridade ou necessidade - a
escolha possa ser orientada e corrigida a partir de um ponto de vista independente. Os valores fornecem o alicerce oculto
dos conhecimentos e das práticas que constantemente construímos nas nossas vidas. Os valores humanos são os
fundamentos éticos e espirituais que constituem a consciência humana. São os valores que tornam a vida algo digno de ser
vivido, definem princípios e propósitos valiosos e objectiva fins grandiosos. Foram defensores desta teoria: W. Windelband,
H. Rickert, Max Scheler e N. Hartmann.
Se analisarmos os diferentes periodos historicos vividos pelo ser humano, encontramos diferentes concepcoes
acerca da natureza e do ser humano, pois as maneiras de pensar e repensar as formas de vida e do mundo foram
modificadas com o passar dos tempos. Dentro desta espectativa, faz-se uma breve abordagem historica a fim de
resgatar momentos impotrantes que influenciaram nos rumos e caminhos seguidos pelo ser humano como modelo
certo a ser vivido em determinado periodo historico.
Falar de Meio Ambiente engloba simultaneamente: Meio ambiente natural (animais, plantas, recursos minerais, e meio
ambiente social (o homem e a sociedade). A ética ambiental é uma reflexão moral de como o homem deve-se comportar
perante o meio ambiente.
Porem, Os primeiros esforços de carácter racional foram tratados com os filósofos de Mileto como Tales, Anaximandro e
Anaxímenes que reflectiram filosoficamente sobre a origem da natureza, contemplando-a e admirando a diversidade das
coisas que se lhes apresentava. Hoje em dia a tomada de consciência dos problemas ambientais exige-se a responsabilidade.
A análise objectiva dos processos de transformação (ou de degradação) ambiental esbarra, actualmente, em uma
série de divergências conceituais, com frequência tendenciosas, a respeito, essencialmente, do que vem a ser
natureza e do comportamento ideal do homem com relação a essa mesma entidade.
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Muito provavelmente, os fundadores da ciência ecológica, seu conceito, sua abrangência e seus métodos de
estudo jamais incluíram em seus objectivos essa questão marginal da influência que o homem, com suas técnicas,
poderia exercer sobre a natureza, alterando as relações ecológicas fundamentais. Humboldt, um dos seus
fundadores, ao se defrontar com nascentes de petróleo na Venezuela, em 1799, pensou, apenas, no seu uso
medicinal, ("licor resinoso, aromático e medicinal..." (Humboldt, 1991)) não suspeitando, nem de longe, que essa
substância pudesse vir a ter, no futuro, um emprego tão amplo a ponto de alterar significativamente a composição
química da biosfera em todo o planeta e contribuindo para o que, já naquela época, era conhecido como efeito
estufa, graças aos interessantes estudos do suíço De Saussure com suas caixas de vidro. O impacto do homem
sobre o meio ambiente era caracterizado pela extracção de minérios em algumas regiões pontuais do mundo, pelo
excesso de fumaças incómodas derivadas das lareiras domésticas em algumas grandes cidades e pelo eventual
mau odor produzido por algum curtume ou matadouro. Nada que pudesse comprometer, de forma irreversível ou
muito ampla, qualquer dos ecossistemas do Planeta. Incómodos eventuais, sim; danos irreparáveis não!
Aliás, o homem não era, nessa época, considerado como elemento da natureza e sim como seu usuário. Inexistem,
aparentemente, referências à sua posição nas cadeias tróficas ou a qualquer função relevante ou marginal deste
com relação ao equilíbrio ecológico natural. Talvez os nativos americanos e alguns povos asiáticos tivessem uma
noção mais correcta embora intuitiva - sobre essa relação, pois consideraram indispensável certo grau de
reciprocidade nos benefícios auferidos da Terra. A filosofia grega, de que somos herdeiros, não fez esse tipo de
consideração. A própria mola impulsora da evolução dos hominídeos foi - segundo Darwin - a selecção sexual e
não a pressão generalizada do ambiente externo, dando a entender que a espécie humana não é tão dependente de
um equilíbrio dos ecossistemas como são as outras espécies. Embora Darwin tenha, pela primeira vez, apontado
de maneira consequente o homem como um ser animal, sujeito às mesmas características biológicas essenciais
dos outros mamíferos, manteve, em certa medida, a sua independência ecológica.
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Ora, se o homem não era, naquela época, considerado um componente interagente com a natureza, mas apenas
um usuário compatível, causador de impactos negligenciáveis aos ecossistemas, é evidente que aqueles
fundadores da ciência ecológica jamais teriam cogitado da futura existência de movimentos sociais ecológicos! E
pouco provável, mesmo, que tenham se preocupado com as consequências ecológicas do aumento da população
humana e os reflexos dessas consequências sobre a própria sociedade. O próprio reverendo Malthus, ao prever
que a Terra não poderia produzir alimentos para todos, vislumbrou uma limitação do crescimento populacional,
mas não cogitou dos estragos que esse crescimento iria provocar sobre a natureza e a qualidade do ambiente.
O método de estudo ecológico utilizado pelos primeiros profissionais que se dedicaram a essa ciência
denominado hoje auto ecológico dificilmente poderia levar a considerações mais abrangentes sobre maciços
impactos ambientais: os impactos atingem populações e só nessa dimensão podem tornar-se irreversíveis,
provocar desequilíbrios ambientais ou extinção de espécies. As leis que regem a actuação do homem sobre os
seres vivos são leis de grandes números, tal como as leis que regem a transmissão dos caracteres hereditários. E o
império da estatística (e não mais da biologia) actuando sobre os microcosmos da genética e os macrocosmos da
sinecologia. Foi, portanto, o estudo das populações (dinâmica populacional, um campo da estatística) e o advento
dos computadores que permitiram o aparecimento da sinecologia, com uma dimensão a mais no campo da
ecologia, dimensão esta representada pela integração dos inúmeros factores e circunstâncias ambientais em
equilíbrio dinâmico e responsável pelo comportamento e sobrevivência de número significativo de espécimes
vivos.
Esses conceitos e estudos aplicados ao conhecimento das relações homem/ natureza e à previsão e à sustentação
da sobrevivência humana constituem a abordagem mais recente, a qual, necessariamente, obrigou-se a incluir
informações e conceitos oriundos da filosofia (da ética em particular) e da sociologia, assumindo, naturalmente,
uma conotação política no sentido de procurar institucionalizar acções presenteadoras das condições ideais de
equilíbrio, uma vez que estas escapam à pura esfera de acção da natureza.
Tentaremos, neste pequeno ensaio, examinar brevemente cada um desses contextos conceituais, visando a
descobrir os principais pontos de conflito e sugerindo eventuais conciliações com o propósito de contribuir para a
maior objectividade das discussões em torno da questão ambiental.
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O primeiro periodo historico que neste estudo se considera fundamental, é o pré-socrático. Os filosofos pre-
socraticos foram os que antecederam Sócrates, ( 470/399 a.C), isto quer dizer, que antecederam a filosofia antiga.
Os filósofos desse tempo, não concebiam uma separacao entre homem e naturteza, e abordavam idéias acerca das
propriedades da natureza. Todos concordavam que as transformacoes e movimentos que constituem a natureza
( physis ) e a propria exstencia, poderiam ser deduzidas das propriedades de uma única substancia que forma
todo o cosmos. A denominacao " filósofos da natureza" foi dada aos primeiros pensadores gregos pelo facto de
terem um interesse pelos processos da natureza, tanto na astrologia como no espaco especulativo do problema
cosmologico, buscando o principio de todas as coisas. Os filosofos observavam as transformacoes que ocorriam
no meio ambiente, questionavam o porquê e como tudo era possivel na sua transformacao.
"A paalavra Grega physis, como explica Abrao, pode ser traduzida por natureza, mas seu significado é mais
amplo. refere-se tambem á realidade, não aquela pronta e acabada que se desenvolve. Nesse sentido a palavra
significa gênese, origem, manifestacao. Saber o que é a physis, assim levanta a questao da origem de todas as
coisas que constituem a realidade, que se manifesta no movimento e procura saber se há um principio único (arké)
que dirige todas as coisas do mundo. É sobre esses temas que vão se ocupar os filosofos da natureza".
(HERDT:2000, Pág. 67)
O escritor Rocco A. Di Mare, escreveu um livro intitulado como : A concepcao da Teoria Evolutiva desde os
gregos, no qual faz uma investigacao historica filosofica acerca do processo evolutivo do ser humano.
A filosofia da natureza é melhor entendida se retornarmos à Grecia antiga por volta do Seculo VI a.C; quando os
primeiros filosofos apresentaram os principios explicativos naturais como a água, fogo, ar e terra.
Segundo Di Mare (DI MARE:2000, pág.27), Tales de Mileto afirmou que a causa de todas asa coisas que existem
é o elemento água. Ele obteve suas constatacoes através de seus experimenmtos, onde na ausencia da água as
plantas e os animais morriam, bem como levaria o ser humano a morte da mesma forma. O raciocinio acerca das
observacoes e dos experimentos não faziam mais parte de uma mitologia grega, mas sim de uma fase de
principios baseados na observação por constatacoes.
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Di Mare enfatiza que para Anaximandro o principio universal de todas as coisas era uma "substancia indefinida",
chamado" apeiron", que significaria o ilimitado, indeterminado, como po exemplo , o planeta terra. O "apeiron " é
algo abstracto, que não se fixa directamente em nenhum elemento palpavel da natureza.
Hieráclito problematizou a questao do devir, da mudanca; seu pensamento vinha ao encontro da teoria de que o
fogo é o tempo físico, é a inquietude do desaparecer de outros, mas tambem de si mesmo.
"Heráclito atribuiu á mutabilidade a essencia da existencia. Ele concebia a realidade do mundo como algo
dinamico, em permanente transformacao."(DI MARE:2002, P. 27) Anaxímenes foi o filosofo, na qual teve como
caracteristica basica, explicar a origem do universo a partir de uma substancia única fundamental, chamada ar.
Todas as mudancas de pensamento nesse periodo, foram justamente surgidas pelo facto dos filosofos terem
contacto com outras formas de conhecimento e culturas, pois foram eles, os primeiros a considerar suas
aplicacoes práticas. Essas generalizacoes foram utilizadas tanto para responder às questoes mitologicas, quanto às
aplicacoes praticas da geometria, da fisica e da astronomia, pois foram os pensadores gregos os primeiros a
alcançar uma compreensao intuitiva da natureza das generalizacoes.
Actualmente, os elementos destacados pelos pré-socráticos, podem parecer arbitrários, mas foram constatadas
antes de Cristo, antes de Sócrates e antes de muita definicao cientifica e racional. As indacacoes acima feitas
sobre tais elementos e descobertas, tratam-se de uma discussao sobre as propriedades e elementos naturais que
formam a natureza. Quem nunca fez perguntas de genero: como surgiu o mundo, o ser humano, e a natureza? De
onde vem a chuva? Para onde vai o sol?. Os primeiros filosofos tambem fizeram questionamentos parecidos e
procuraram dar respostas satiisfatorias.
Os quatro elementtos alencados pelos pre-Socraticos, encontram-se presentes em nosso meio ambitavel, porem,
os questeonamentos são outros. O ar questionado por Anaximenes como forma de vida, está poluido e com força
em seu movimento. A agua constatada como forma de vida Tales, é a mesma agua que está causando enchentes e
inundacoes, além de estar poluida. O fogo, o tempo fisico, problematizado por Heraclito pode ser considerado o
tempo que o sol que aproxima da terra, causando o aquecimentp global. A terra (apeiron) defendida por
Aneximandro como principio univeral, enconcontra-se em colapso, em crise decorrenmte de todas as accoes
vividas.
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Outro periodo que marca a historia da humanidade é o periodo classico, que corresponde 470 á 322 a.C, tendo
como principais pensadores, Socrates, Platao e Aristoteles. Esses filosofos construiram uma base da estrutura de
nosso conhecimento e pensamento. Antes de Socrates, questionava-se a origem da natureza, depois de Socrates
questionave-se acerca de quem era o homem e de seus pretensos coustmes assumidos pela tradicao. Um dos
problemas atromentaram os filosofos gregod em geral e Platao em particular, foi o problema de fluxo da natureza.
Porem, até hoje temos pensamentos indagadores acerca da origem das coisas. Para Aristoteles, o universo não
tinha um comeco e um fim, simplesmente era eterno. As mudancas para ele eram ciclicas, a agua, por exemplo,
podia evaporar-se de um rio e voltava em forma de chuma novamente para terra.
Segundo Reale, (2001) para Platao, tudo o que p[odemos tocar e sentir na natureza tende afluir, tudo é formado
apartir de uma forma eterna e imutavel. Platao dividia a realidade em duas partes, a priumeira parte pertencia ao
mundo dos sentidos, a qual se chegaria a um conhecimento aproximado ou imperfeito. A outra parte pertencia ao
mundo das ideias, na qual podemos ter um conhecimento seguro pelo ouso da razao.
Aristoteles representou um avanco importante para a historia da ciencia. Alem de ter fundado varias disciplinas
cientificas, Aristoteles observou a natureza a partir de um ponto de vista sistematico, desenvolvendo teoria
aplidosas sobre muitas areias da ciencia e da filosofia. Para Grun (1996), a ideia aristotelica de natureza.
É como algo alegre e vivo, onde as especies procurarm realizar seus fins naturais, sendo substituida pela ideia de
uma natureza sem vida. Um desses tipos de causas e de explicacoes era de que todas as coisas tendiam
naturalmente para um fim e era esta concepcao teleologica da realidade da epoca, que explica a natureza de todos
os seres.
Outro periodo que marcou o processo historico acerca das concepcoes do homem com a natureza, foi o periodo
medieval. Até por volta do Seculo XV, a visao do mundo era marcada pelos poucos conflitos. Durante a Idade
Media as comunidades eram pequenas e com vida harmoniosa com a natureza, sendo que o tempo pertencia a
Deus, nesse periodo a visao do mundo dominante era o teocentrismo ( Deus como o centro de tudo). Esse periodo
foi marcado por fortes mundancas e revolucoes, trata-se da fisica e da astronomia, a da grande revelecao de
copernico, Galileu e Newton. Para Nicolau Copernico, a terra passou a ser um planeta, deixando assim de ser o
centro dao universo. Galileu fez uma abordagem empirica, e a experiencia tornou-se uma fonte de conhecimento
para explicar os fenomenos da natureza. Francis Bacon, atraves do seu metodo empirico, compreendeu na ciencia
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o dominio de controlar a natureza extraindo dela tudo que ela podesse ofercer, desta forma o conhecimento um
meio figoroso e seguro de conquistar o poder sobre a natureza.
A revolução científica do Século XVII marcou o dominio da ciencia pela tecnica, a partir do momento em que ela
busca seu proprio metodo, desvinculado da reflexao filosofica. Frequentemente os historiadores da filosofia,
designam como filosofia moderna aquele saber que se desenvolve na Europa durante o Seculo XVII, tendo como
referencias principais o surgimento do cartesianismo. Para outros, a filosofia moderna representa o comeco da
busca pelo o saber, pela tecnica. Considero importante ressaltar que esse periodo é caracterizado pelo
desenvolvimento do metodo cientifico, até entao, o conhecimento era dogmatico.
A idade Moderna foi um periodo que causou grandes mundancas até hoje sentidas. Foi Renee Descartes quem
enfatizou a oposicao entre: homem-natureza; sujeito-objecto, espirito-materia. O homem, senhor de todas as
coisas, senhor de seu destino estava no centro da antropocentrismo. Para o homem possuidor da natureza, todos
os conhecimentos deveriam ser uteis à vida, e a natureza passou a ser vista como recurso, como meio para se
atingir um fim. A decorrencia do pensamento é extramamente utilitaristica, pois a natureza foi exposta de forma a
ser utilizada por todos os meio e fins, e o ser humano era visto como não fazendo parte da natureza. Considero
essenciar abordar com clareza quem foi e o que fez Renee Descartes durante o periodo moderno.
René Descartes foi o fundador da Filosofia dos novos tempos e o primeiro grande construtor de um sistema
filosófico que foi seguido por Espinosa. O termo Cartesiano vem de René Descartes e significa não só o método
pelo qual buscava os conhecimentos, como também os seus seguidores.
A natureza desempenhou um papel importante na filosofia moderna. Descartes expressou a concepcao de mundo
fisico a partir das leis dos movimentos dos corpos, convencionado de mecanicismo Descartes estabelece que a
essencia do mundo fisico é geometrica e ao mesmo tempo em que o objecto da fisica é propriedade geometrica da
materia que constituiu o mundo. As solucoes propostas pelos pensadores da escolastica não rosolviam o
problema intimo do individuo, o Descartes rompe esse quadro e propoe o seu metodo. Descartes considerava
importante descartar primeiro todo o conhecimento constituido antes dele, para só entao, comecar a trabalhar em
seu projecto filosofico."Na verdade, os sentidos, por si mesmo, são algo debil e enganador, nem mesmo os
instrumentos destinados a amplia-los e alguçá-los são de grande valia. É toda a interpretacao da natureza se
cumpre com instancias e experimentos oportumnos e adequados, onde os sentidos julgam somente o experimento
e o exp[erimento julga a natureza e a propria coisa."(BACON: 2000, pág. 44)
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O pensamento de Descartes teve grandes consequencias para a historia do pensamento ocidental, foi atraves de
seu pensamento que foi cridas uma conviccao de um metodo cartesiano, que somento poderia ser compreendido
com as vias racionais do pensamento humano. A visao fraquementada e macanica das estruturas vivas perpasou a
modernidade e continuou imbregnada de forma oculta, na praxis humana actual.
"A divisao entre espirito e materia levou à concepcao do universo como um sistema mecanico que consiste em
objectos separados (…). Essa concepcao cartesiana da natureza foi, alem disso, estendida aos organismos vivos,
considerados maquinas constituidas de peças separadas. Veremos que tal concepacao mecanicista de mundo ainda
está na base da maioria das nossas ciencias e continua a exercer uma enorme influencia em muitos aspectos de
nossa vida. Levou à bem conhecida fragmeentacao em nossas disciplinas academicas e entidades governamentais
e serviu como fundo logico para o tratamento do meio ambiente naturtal como se ele fosse formado de peças
separadas a serem exploradas por diferentes grupos de interesses. "(CAPRA: 2003, P. 33)
A concepcao antropocentrica de Descartes coloca o homem numa posicao previlegiada, pois o saber e o
conhecimento tecnico são fundamentais para a razao instrumental, possibitando uma hegemonia sobre a natureza,
e o instrumento para dominar o mundo. Toda a concepcao de mundo e de homem para Deescartes basea-se na
divisao da natureza em: "mente "( res cogitans), e "materia" (res extensa). Segundo Capra (1986) Descartes foi
infuenciado pelos avancos da tecnica, deduzindo que o universo nada mais era que uma maquina; esse quadro
tornou-se um paradigma dominante na ciencias até nossos dias.
Descartes desenvolveu sua concepcao de mundo, na qual as plantas e os animais eram considerados como peças
de uma maquina. O corpo humano tambem era considerado uma maquina, mas diferenciado por ter uma alma
inteligivel. Segundo Capra (1986), Descartes tinha como objectivo principal, usar seu metodo para formar uma
definicao racional completa de tosdos os fenomenos naturais, em um único sistema regido por principios
mecanicos e matematico. O raciocionio e a teoria oferecidos como pensamento cientifico ocidental permaneceram
por tres Seculos como heranca cartesiana, e de certa forma ainda temos muitos resquicios da teoria cartesiana.
A visao de Desacartes despertou a crenca na certeza do conhecimento cientifico popr meio da matematica. Capra
afirma que, "a crenca na certeza do conhecimento cientifico está na propria base da filosofia cartesiana e na viaso
do mundo dela deriva, e foi aí, nessa premissa fundamental, que Desacartes errou. A fisica do Seculo XX mostra-
nos convincentemente que não existe verdade absoluta em ciencia, que todos os conceitos e teorias são limitados.
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A crenca cartesiana na verdade infalivel da ciencia ainda é, hoje, muito defuindida e reflete-se no cienticismo que
se tornou tipico de nossa cultura ocidenatal. O metodo do pensamento anlitico de Descartes e sua concepcao
mecanicista da natureza influenciram todos os ramos da ciencia moderna e podem ainda hoje ser muit uteis. Mas
só serao verdadeiramente uteis se suas limitacoes forem reconhecidas."(CAPRA: 1986. Pág.53)
No Século XIX, tivemos o triunfo do mundo pragmatico, ou seja, a natureza foi vista cada vez como um objecto a
ser possuido. O dominio da tecnica vem aumentando fortemente desde o inicio da Idade Moderna. Vivemos no
Seculo XXI, com duvidas e angustias, pois a busca pelo conhecimento que tanto buscamos, tambem fez com que
a tecmologia da informacao revolucionasse os processos industriais de forma acelerada e assustadora. O facto de
convivermos com a possibilidade de vivermos uma rotina constante de crises e desiquilibrios ecologicos
ambientais, existe. Precisamos pensar as possibilidades de viver com com senas catastroficas, buscando
possibilidade de mudancas para o presente e futuro. A educacao poderá contribuir positivamente no processo de
intercessao acerca da realidade globa, pois a sociedade requer individuos com compacidades de intervir acerca
dos problemas apresentados em determinado momento.
Nos últimos anos, os impactos sociais e ecologicos da globalizacao, têm sido um assunto emergente, pois envolve
todas as esferas de vida. As actividades economicas estao produzindo ao contrario do progresso, consequencias
desastrosas, como por exemplo a desigualdade social, a deteriorizacao do meio ambiente natural, bem como o
aumento da pobreza e de alienacao, desta forma; está evidente que o modelo economico vigente é insustentavel.
As sensibilidades voltadas para as questoes da natureza, nasceram na medida em que se evidenciavam os efeitos
da deteriorizacao do meio ambiente e da vida nas cidades, oriundos da Revolucao industrial.
Percebe-se melhor com Ngoenha quando escreve "na epoca tecnologica, a relacao entre o homem e a natureza
inverteu-se. De servo da natureza, o homem tornou-se se patrao, não um patrao sabio e prudente, mas um patrao
astuto. Armado de tecnicas e instrumentos sempre mais poderosos e refinados, de passivo consumidor de
produtos que a natureza punha à sua disposicao, o homem tornou-se um agressor prepotente e um explorador
exigente. Na epoca tecnologia o homem agride a natureza e esvazia-a de tudo: ferro, carvao, petroleo, minerais,
agua, ar. Em vez de cultivador sabio, o homemdo Seculo XX tornou-se um explorador selvagem da natureza"
(NGOENHA:1994, P.33) isso explica-se na medida em que segundo o paradigma da tecnica, tudo o que se deve
fazer deve ser feito. Daqui uma uma consequencia imdiata, a tecnica criando novos valores é responsavel pelas
solideriedades tecnicas, mas sobretudo pelas depebndencias intencionais. O homem homem tecnologico produz
não o suficiente para o seu consumo e da humanidade mas para testar a sua capacidade de super producao. A
destruicao macissa de flrestas em menos tempo para super producao é a autra consequencia imediata. A terceira
consequencia em nome da tecnica é o insaceavel descobrimneto de novas teconologias mais eficazes para destruir
a naturza com mais efica. A quarta é que no plano material, provocou uma crise energetica muito grave tornando
incerto e obsucuro o futuro da humanidade. Estas razoes fazem com que o problema problema primrdial, quer das
sociedades ditas primitivas, quer das sociedades desenvolvidas, seja o lugar do homem na natureza.
Nesta perspectiva, "a tecnica não é um instrumento neutro que o homem usa segundo o seu arbitrio. Ela resulta de
um processo atraves do qual, o homem, esquiecendo o «Ser», se agharra cada vez mais àa coisas. Por
conseguinte o homem assumiu perante a realidade uma atitude de dominio e de exploracao. Uma atitude que nem
se quer respeita as bases da vida, as suas condicoes biologicvas e geneticas, sobre as quais a tecnica tende impor o
seu dominio necessariamente totalitario." (NGOENHA:1994, p.32)
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Ao fazermos analises sobre os modelos para atingir o progresso, talves, não ao mesmo tempo esquecer as duas
escolas referenciadas por Ngoenha (1994). Seguindo Ngoenha, exitem duas escolas, uma que acelera a ciencia e o
progresso e a outra que defende um naturalismo reactivo. A primeira escola defende que a exploracao da natureza
faz parte da orden normal das coisas. É necessaria uma uma exploracao em nome do certo eguilibrio, da raridade
de recursos, da variedade, da diversificacao do culto dea beleza. Nesta optica o desenvolvimento cientifico e o
progresso humano são absolutos, valores fundamentais e ninguem pode impedir. En nquanto que a segunda,
defende a existencia de uma ascendencia da natureza sobre a sociedade. A natureza tem direitos primordiais, ela é
a nascente da vida. Por isso, ela tem valor em si mesma, reconhece-lhe, portanto, direitos inalienaveis e faz do
ecossisma, fenomeno complexo de interacacao, um sujeito moral.
Os defensores desta escola, pretendem que as obrigacoes humanas para com a natureza derivam exclusivamente
do valor da natureza enquanto tal, da sua dignidaded de sujeito maoral. Assim, a natureza no pode ser objecto de
exploracao, uma vez que a sobrevivencia da especie humana depende do seu futuro harmonioso.
A forma contraria do respeito sobre a natureza coloca a Etica e a responsabilidade longe do homem puxando ao
homem cosequencia graves provenientes da exploracao exagerada da natureza. Assim , sem outras possibilidades
devemos recorrer o Principio da Resposnsabilidade de Hans Jonas que trateremos no ponto 4 (quatro) deste
estudo.
ii) A energia: que é o motor de todas as formas de vida e de todos os processos de formação estrutural das plantas e dos
animais. Para o caso em apreço, em termos ambientais, referimo-nos na energia que precisamos para o consumo e que,
normalmente, se obtêm a partir da combustão de alguns produtos da natureza ou da sua exploração. O grande problema da
energia é também o seu esgotar.
iii) A poluição do ambiente: como resultado do fenómeno da industrialização que aumentou a partir do séc. XX.
iv) outros problemas: o clima; a desertificação; a extinção das espécies; a terra, a alimentação
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O filósofo e pensador moçambicano Severino Ngoenha diz que o problema das gerações vindouras é complexo. A
complexidade coloca-se na perspectiva africana de se saber até que ponto não há uma inversão de prioridades entre os
chamados direitos das gerações futuras e os direitos dos homens de hoje e uma vida sã e justa. Para ele a preocupação
fundamental actual no contexto africano é de resolver os problemas e os desafios político-sociais e económicos que se
colocam em África. Portanto, a preocupação do futuro passa pela obrigação de resolver os problemas de hoje.
A Bioética (“Bioética” Bio = vida; Ethos = Moral) é o tratado sobre a conduta humana visando a saúde e a vida,
examinados à luz dos valores éticos e morais.
Os principais aspectos da bioética são: aborto; Eutanásia; Transplante de órgãos; Suprimentos da infertilidade;
Diagnóstico pré natal; Terapia genética.
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TEORIA DO CONHECIMENTO
OBJECTIVOS:
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TEORIA DO CONHECIMENTO
OU GNOSIOLOGIA
O. Introdução (Noção, Objecto, História e Acto de Conhecer, Elementos, Etapas ou Momentos do Conhecimento)
i. Noção
Chama-se de Teoria6 do Conhecimento seja Gnosiologia ou Epistemologia ou ainda Crítica do Conhecimento a disciplina
reflexiva que o intelecto humano (sujeito) faz na busca de conhecimento das qualidades ou propriedades de um dado objecto.
A Teoria do Conhecimento versa sobre um conjunto de especulações que têm por fim determinar o valor e os limites dos nossos
conhecimentos. Trata-se de explicar e interpretar os problemas que decorrem de uma análise fenomenologia do conhecimento.
A Teoria do Conhecimento faz referência do pensamento aos objectos, da verdade no conhecimento e de como ocorre e evolui o
nosso conhecimento, ou seja, a explicação filosófica do conhecimento humano.
O fenómeno do conhecimento começa desde que o homem é homem, quando se conhecem simplesmente as coisas e julga-se
que se conhecem tais como são. Só numa fase adiantada da evolução humana é que se reflectiu sobre o próprio acto de
conhecer, quando o homem verificou que os sentidos e a própria inteligência erravam e, por isso, começou a desconfiar e a pôr
em dúvida o valor do seu conhecimento.
A história da filosofia mostra-nos que os problemas do conhecimento interessam mais ou menos a todos os filósofos desde a
velha Grécia.
Foi esta experiência do erro que obrigou o espírito a voltar-se das coisas para si próprio, a fim de analisar o próprio acto de
conhecimento, saber o que ele é, determinar a sua essência, descobrir o seu mecanismo e resolver o problema do seu valor. Esta
marcha crítica, quanto ao conhecimento, é obra essencialmente filosófica e só apareceu, quando o espírito humano atingiu um
certo desenvolvimento - foi destas reflexões que nasceu a teoria do conhecimento ou gnosiologia, que se designa geralmente por
problema crítico.
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Teoria, do grego θεωρία, é o conhecimento especulativo, puramente racional. O substantivo theoría significa acção de contemplar, olhar,
examinar, especular e também vista ou espectáculo. Também pode ser entendido como forma de pensar e entender algum fenómeno a partir
da observação.
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A teoria do conhecimento ou gnosiologia, como disciplina própria ó apareceu na Idade Moderna, a partir de Locke, que, no seu
livro «Ensaio sobre o Entendimento Humano», que tratou directamente da origem, natureza e valor do conhecimento. Kant, na
sua obra «Crítica da Razão Pura», considerou a gnosiologia o problema fundamental da filosofia, colocando-a acima de todas as
outras partes da filosofia.
Com Descartes o problema do conhecimento começa a ser relativo quando recorre à dúvida metódica que consiste em rejeitar,
como falso, tudo àquilo em que possa haver a menor dúvida, e não seja, absolutamente evidente.
A Teoria do Conhecimento é uma disciplina reflexiva do segundo grau que tem por objecto o estudo da possibilidade do
conhecimento, da sua origem, da sua natureza ou essência, do seu valor e limite e, ainda, do problema da verdade. 7
a) Possibilidade do Conhecimento: é possível conhecer a verdade e possuir a certeza? Ou, não podemos passar da dúvida? –
Dogmatismo e cepticismo
b) Origem do Conhecimento: o nosso conhecimento procede da apenas da experiência? Ou só da razão que usa certos dados
chamados apriorísticos para organizar a experiência? Ou ainda procederá o conhecimento da experiência e da razão? –
Empirismo, racionalismo e empírico-racionalismo.
c) Natureza ou essência do conhecimento: O conhecimento será uma representação ou modificação do sujeito, provocada pelos
objectos existentes, independentemente do sujeito conhecedor? Ou uma modificação puramente subjectiva criada pela
consciência? – Realismo e idealismo.
d) Valor e limite do conhecimento: terá o conhecimento um valor absoluto, de forma a atingir a essência da realidade? Ou terá
apenas um valor relativo, limitando-se ao conhecimento das aparências da realidade e não atingindo a realidade em si mesma?
Realismo e relativismo.
e) A verdade: o quê é a verdade? Quais as atitudes do espírito perante ela? Qual é o critério da certeza?
O acto de conhecer é a actividade do espírito pela qual se representa um objecto ou uma realidade. É um acto do espírito e não
uma simples reacção automática mais ou menos adaptada às circunstâncias; não é propriamente um acto de conhecimento o
sentar-me na cadeira, mas sim o saber porque me sento e como me sento. O resultado do acto de conhecer é uma representação
e, portanto, conhecer é representar alguma coisa distinta do sujeito que conhece.
v. Elementos do Conhecimento
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A teoria do conhecimento é uma disciplina do segundo grau porque não produz conhecimentos, mas reflecte sobre os conhecimentos de
primeira ordem, os produzidos por ciências como a Física, a Matemática a, a História, a Psicologia, etc.
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Este objecto pode ser exterior ao sujeito, como por exemplo, a caneta com que escrevo; pode ser interior, como a maior tristeza
ou o meu pensamento; e pode, ainda, identificar-se com o próprio sujeito, como ao procurar conhecer-me a mim próprio. Mas
mesmo no caso de identificação do sujeito com o objecto, não deixam de existir aí os três elementos referidos, pois, o “eu” que é
conhecido apresenta-se ao “eu” conhecedor como uma realidade distinta, mas em relação com ele.
º Percepção: é a consciência da sensação, é a apreensão (captação) da realidade, não como impressão sensorial isolado, mas um
conjunto organizado ou uma totalidade portadora de sentido.
3º Razão: elaboração de representações mentais abstractos, conceitos, discursos, relações lógicas e teorias interpretativas sobre
a realidade.
A palavra filogenética provém do grego e, literalmente significa origem da tribo ou da raça. No seu sentido lato, significa estudo
da história da evolução da espécie humana, nomeadamente, a constituição dos seres humanos como sujeitos cognitivos. A
explicação mais consensual é de que a evolução da nossa constituição morfológica e funcional foi feita em simultâneo com o
desenvolvimento das nossas realizações e capacidades cognitivas ou de conhecer (memória, linguagem e pensamento), de forma
articuladas com o desenvolvimento das nossas realizações e capacidades técnicas ou de fazer. Por isso, o que a espécie humana
é hoje é o resultado da interacção destes factores.
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De acordo com esta perspectiva, o conhecimento é visto como um processo de transformações e adaptações ao meio de um ser
desde a sua geração até ao completo desenvolvimento.
A adaptação é o resultado da acomodação e assimilação sendo que a adaptação é o processo pelo qual a inteligência modifica os
esquemas para os adaptar aos novos elementos da realidade. A assimilação é a incorporação dos estímulos do meio pela
inteligência, onde a criança apreende o mundo exterior. Sendo assim, vamos nos referirmos aos quatros estágios do
desenvolvimento cognitivo segundo Jean Piaget:
1.2.2. Estágio de Representação ou Pré-Operatório (18meses/2 anos – 5/6 anos): o primeiro acontecimento é a
aprendizagem da linguagem. A criança desenvolve o pensamento que permite interiorizar as noções que realiza com os objectos
e os efeitos dessas acções. Passa, assim, da experiência física para a experiência lógico-matemática. Emergem na criança dois
mundos: o mundo social e o mundo interior. Mas a criança é, ainda, egocêntrica, quer dizer que ela ainda assimila as
experiências do mundo exterior ao modelo do seu mundo interior.
1.2.3. Estágio das Operações Concretas (5/6 anos – 11/12 anos) além de manipular os objectos concretos, a criança aprende a
realizar operações mentais que progressivamente se desligam da manipulação e da presença dos objectos que passam a ser
evocados através de uma imagem, desenvolve o raciocínio que progressivamente se desliga do concreto e da situação presente,
coordenando e integrando o passado no presente; revela grande curiosidade intelectual e interesse pelos processos mecânicos. A
criança torna-se menos egocêntrica e mais socializáveis.
1.2.4. Estágio da Inteligência Operatória Formal (11/12 anos….): o adolescente/jovem é capaz de realizar operações
abstractas, operações a um nível absolutamente verbal ou conceptual. Os objectos são substituídos por proposições e formulação
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de hipóteses. A partir desse estágio, há grande interesse pelos problemas políticos, sociais e existenciais que preocupam a
humanidade. O egocentrismo é menor e manifesta-se a nível intelectual.
Com os quatros estádios de desenvolvimento de Piaget, conclui-se todo um processo de adaptação á realidade que se resume no
sujeito assimilar o objecto do meio á mente que permite acomodá-las ás novas experiências que realiza resultando daqui estados
de equilíbrio mental cada vez mais estáveis.
Entre o sujeito e objecto há uma relação e uma correlação. O sujeito é sujeito para um objecto. O objecto só é objecto para um
sujeito. Ambos só são o que são enquanto o são um para o outro. Mas esta relação é irreversível. Ser sujeito é algo
completamente distinto de ser objecto. Condicionam-se reciprocamente. A sua relação é uma correlação.
No processo do conhecimento o sujeito realiza três movimentos: o sujeito sai de si, está fora de si e regressa a si com as
determinações do objecto e ao apreende-las, introdu-las, fá-las entrar na sua própria esfera. O objecto não é modificado pelo
sujeito, permanece transcendente a ele. É no sujeito que se altera alguma coisa como resultado da função do conhecimento,
quando há transferência das propriedades do objecto para o sujeito.
O conhecimento pode definir-se como uma determinação do sujeito pelo objecto. Pois a função do sujeito é apreender o objecto;
a do objecto é deixar-se apreender. O determinado não é o sujeito pura e simplesmente; mas apenas a imagem do objecto nele.
Questões: é possível conhecer a verdade e possuir a certeza? Ou, não podemos passar da dúvida? – Dogmatismo e cepticismo
A estas questões os filósofos foram respondendo de modos diferentes, dando origem a diferentes concepções teóricas ou
correntes, das quais se destacam duas teorias opostas: uma afirmativa - o Dogmatismo -, e outra negativa - o Cepticismo.
2.1.1. O Dogmatismo
Representantes: Descartes, Leibniz, Espinisa e Claude Bernard
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O dogmatismo de "Dogmatikós em grego significa, "que se funda em princípios" ou, é relativo a um dogma 8. É a doutrina que
admite a possibilidade do conhecimento certo. Admite a possibilidade da mente humana conhecer com plena certeza as coisas.
Assim como o realismo é a atitude natural do homem face ao mundo, o mesmo é válido para o dogmatismo: a percepção de um
qualquer objecto leva-o a crer, naturalmente, na existência do mesmo não pondo sequer a dúvida de que o conhecimento desse
objecto possa ser posto em causa.
O dogmatismo corresponde, portanto, à atitude de todo aquele que crê que o homem tem meios para atingir a verdade, assim
como para ter a certeza de que a alcançou, pois considera que existem critérios que lhe permitem distinguir o verdadeiro do
falso, o certo do duvidoso.
O dogmático9 não se confronta com a dúvida, na medida em que não problematiza o conhecimento, ele parte simplesmente do
pressuposto da possibilidade do conhecimento, tomando este como um dado adquirido, como algo que nem sequer é posto em
questão.
A atitude habitual do homem comum (crença espontânea) é, de certo modo, próxima do dogmatismo que pressupõe
inadvertidamente que a realidade é como a vemos e que a podemos conhecer tal como ela é, a partir da intuição sensível.
Habitualmente, não nos questionamos acerca do valor do conhecimento, não pomos em causa a nossa capacidade para
estabelecer a verdade em determinadas áreas, não procuramos indagar da possibilidade da relação cognitiva sujeito-objecto e
dos fundamentos dessa relação cognitiva. Para o senso comum, aquele conhecimento vulgar e banal, superficial e acrítico, a
existência do objecto em si não é questionada, nem sequer a adequação ou inadequação do nosso conhecimento sensível a esse
objecto: "O senso comum responde logo que sim, que esse algo existe". O dogmatismo apresenta-se sob dois aspectos:
a) Dogmatismo espontâneo
Supõe que conhecemos os objectos tais quais são, que há um perfeito acordo entre o conhecimento e a realidade. É a primeira
atitude dos espírito humano, que deposita plena confiança nos dados dos sentidos, e é ainda hoje a atitude do vulgo (povo,
plebe), que julga conhecer as coisas como são; é uma atitude de crença em que não entra reflexão ou critica e em que se põe
ainda, qualquer problema quanto ao valor do conhecimento.
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Dogma em grego significa, o que se manifesta como bom, opinião, decreto, doutrina. (...) Dogma é um ponto fundamental e indiscutível de
uma doutrina religiosa. Na religião cristã, por exemplo, há o dogma da Santíssima Trindade (Pai, Filho e Espírito Santo), a qual não deve ser
confundida com a existência de três deuses, pois se trata apenas de um Deus é uno. Não importa se a razão não consegue entender, já que é
um princípio aceite pela fé e o seu fundamento é a revelação divina. Em filosofia, contudo, nunca a autoridade é, só por si, argumento
decisivo: a própria verdade necessita de uma fundamentação interna que satisfaça as exigências da razão. Por isso, o termo adquiriu,
frequentemente, sentido pejorativo. Disse Nietzsche filósofo alemão do século XIX, que "as convicções são prisões". Quando o dogmático
resolve agir, o fanatismo é inevitável. Em nome do dogma da raça ariana, Hitler cometeu o genocídio dos judeus nos campos de
concentração significando a adesão a alguma doutrina, sem prévia fundamentação crítica. O problema levantou-se. Sobretudo, a propósito do
problema gnosiológico.
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Afim de não se confundir dogmático com o fanático entenda-se por “dogmático” o filósofo que está firmemente convicto da possibilidade
de o ser humano atingir conhecimentos que resistem à dúvida.
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b) Dogmatismo critico10
Aparece com Sócrates (sec. V-IV a. C.). Este dogmatismo coloca o conhecimento intelectual acima do conhecimento sensível.
Admite que possuímos conhecimentos certos acerca da realidade, embora a não conheçamos total e perfeitamente. Além disso,
exige que se faça um exame crítico de todas as certezas naturais, ainda mesmo das verdades-bases.
Descartes e Claude Bernard são da opinião de que o investigador deve começar pela dúvida como método seguro em qualquer
investigação.
O cepticismo aparece esboçado com os sofistas (séc. V a. C) que chegaram á conclusão pessimista de que a verdade absoluta
era inacessível, embora aceitável as informações dos sentidos. Pitágoras dizia “o homem é a medida de todas as coisa” e assim,
todas as coisas eram conhecidas em função das possibilidades do homem e não como de facto são. Dizia ainda Protágoras “as
coisas são para mim como me parecem e são para ti como te parecem”.
Enquanto o dogmático se apega à certeza de uma doutrina, o céptico conclui pela impossibilidade de toda a certeza e, neste
sentido, considera inútil esta busca infrutífera que não leva a lugar nenhum.
Esta posição foi assumida, pela primeira vez, por volta de 365 – 270 a.C., por Pirro. Este pensava que nada pode ser
considerado verdadeiro ou falso, bom ou mau, belo ou feio, uma vez que o espírito é incapaz de afirmar ou negar seja o que for,
por falta de motivos sólidos para o fazer. É, pois, de evitar afirmar ou negar o que quer que seja, isto é, deve suspender-se o
juízo (epoché).
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O criticismo defende a possibilidade de se aceder à verdade, mas não aceita sem crítica as afirmações da razão.
O pragmatismo ao subordinar o conhecimento a uma finalidade prática, afirma que a verdade é tudo aquilo que é útil e eficaz para a vida
humana. Desta forma aproxima-se do cepticismo, na medida que relativiza o conhecimento. O pragmatismo surgiu nos EUA com Willian
James Charles Pierce e John Dewey
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Céptico de "Skepticós em grego significa "que observa", "que considera". O céptico tanto observa e tanto considera, que conclui pela
impossibilidade do conhecimento. Confrontando as diversas filosofias, percebe que são diferentes e ás vezes contraditórias, concluindo que é
impossível aderir a qualquer uma delas.
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Manda a sabedoria, dizia Pirro, não acreditar em nada, abster-se de julgar, desconfiar até das impressões sensíveis, viver numa
completa indiferença, numa ataraxia (tranquilidade, um ideal do nirvana budista). Pirro duvidava da própria dúvida 12, não
havendo nada de seguro, quer quanto aos problemas práticos, quer quanto aos problemas teóricos.
Santo Agostinho dizia “se a verdade não existe, é verdade que a verdade não existe, e por conseguinte, existe a verdade” pelo
menos a verdade de a verdade não existir.
O cepticismo moderno (moderado) teve em Montaigne (1533 – 1592) o seu imprescindível representante. Dizia ele “ A
presunção é a nossa doença mental e original. a mais calamitosa e frágil de todas as criaturas é o ser humano, e também a
mais orgulhosa”. “Quando eu brinco com a minha gata, quem sabe se ela se diverte mais à minha custa do que eu à custa
dela”.
Questões: o nosso conhecimento procede da apenas da experiência? Ou só da razão que usa certos dados chamados
apriorísticos para organizar a experiência? Ou ainda procederá o conhecimento da experiência e da razão? – Empirismo,
racionalismo e empírico-racionalismo.
2.2.1. O Empirismo:
Entre os filósofos que assumiram o empirista destacam-se John Locke (1632 -1704) e David Hume (1711-1776), Stusrt Mill,
A. Comte, R. Carnap H. Spencer e Berkeley.
O Empirismo diz-nos que o conhecimento provém fundamentalmente da experiência sensível e a esta se reduz, não podendo
elevar-se acima dos dados experimentais – por isso se diz que o conhecimento é "a posteriori". Os empiristas negam a existência
de ideias inatas, como defendiam Platão e Descartes. Para os empiristas a mente está vazia antes de receber qualquer tipo de
informação proveniente dos sentidos. Todo o conhecimento sobre as coisas, mesmo aquele em que se elabora leis universais,
provém da experiência, por isso mesmo, só é válido dentro dos limites do observável.
Dúvida Metódica vs Dúvida Céptica. Esta é definitiva, conclusiva e destrutiva, enquanto que àquela é provisória , um ponto de
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s empiristas reservam para a razão a função de uma mera organização de dados da experiência sensível, sendo as ideias ou
conceitos da razão simples cópias ou combinações de dados provenientes da experiência.
Locke, Berkeley e Hume adoptam as ciências experimentais como modelo de conhecimento. Daí que todo o conhecimento
comece pelos dados oriundos da experiência sensível, ao mesmo tempo que negam que a razão possua ideias inatas. Alguns
modelos do empirismo:
a) Espírito “tábua rasa” de Locke. Locke afirma que o conhecimento começa do particular para o geral, das impressões
sensoriais para a razão. O espírito humano é uma espécie de "tábua rasa", onde se irão gravar as impressões provenientes do
mundo exterior. Não há ideias nem princípios inatos. Nenhum ser humano por mais genial que seja é capaz de construir ou
inventar ideias, e nem sequer é capaz de destruir as que existem. As ideias, quer sejam provenientes das sensações, quer
provenham da reflexão, têm sempre na experiência a sua origem. As ideias complexas não são mais do que combinações
realizadas pelo entendimento de ideias simples formadas a partir da recepção dos dados empíricos. A experiência é não apenas
a origem de todas as ideias, mas também o seu limite.
b2) Stuart Mill segue na mesma senda ao afirmar “Quando vemos ou pensamos muitas vezes, duas coisas conjuntamente e
nunca as vimos ou pensamos isoladamente, há, em virtude das leis da associação, uma dificuldade crescente e que pode tornar-
se insuperável, de conceber estas coisas uma sem a outra”.
c) Evolucionismo de Herbert Spencer: propõe uma nova teoria que concilia o ineismo de Descarte e o empirismo.
Entende ele que o espírito do homem seria como uma tábua rasa e tudo lhe experiência (empirismo); mas o espírito do
homem actual não é já uma tábua rasa, porque possui muitas noções, resultantes de experiências acumuladas e
transmitidas pelas gerações passadas (ineismo). Desta forma os conhecimentos humanos são fruto de uma evolução
apoiada na experiência.
d) Positivismo de Augusto Comte: parte do principio de que o conhecimento humano não pode ir além da experiência
sensível e não pode conhecer mais do que aquilo que os sentidos permitem verificar. O homem, no estado positivo em
que vive, deve limitar-se a explicar os fenómenos por outros fenómenos. Embora para isso tenha necessidade de recorrer
à razão, as conclusões desta devem ser sempre submetidas à verificação experimental.
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2.2.2. O Racionalismo:
Platão, Santo Agostinho, Descartes (1596-1650), Leibniz, Espinosa e Kant são alguns dos representantes do racionalismo.
Partem do princípio que possuímos ideias inatas e que é a realidade é uma construção da razão.
O Racionalismo valoriza, mormente a razão, que organiza, unifica e dá sentido aos dados recebidos espontaneamente da
consciência. O Racionalismo, afirma que a razão recebe certas ideias gerais que lhe servem para conhecer a realidade, ou cria
certos dados chamados apriorísticos, com os quais organiza e interpreta a experiência - por isso se diz que o conhecimento é "a
priori".
Esta doutrina filosófica afirma que o conhecimento humano tem a sua origem na razão, que possui, ou representações inatas, ou
capacidade de criar representações (Ideias gerais) dos objectos, às quais a realidade se submete. Deste modo, é sobre as ideias
inatas. Só com base nestas ideias claras e distintas, segundo Descartes 13, se poderia construir por dedução um conhecimento
universal e necessário.e constitui um conhecimento que pode ser considerado verdadeiro porque logicamente necessário e
universalmente válido.
Os juízos determinados pela experiência não apresentam essas características, por isso, concluem os racionalistas, o verdadeiro
conhecimento não pode fundamentar-se na experiência, mas sim na razão.
A matemática, um conhecimento predominantemente conceptual e dedutivo, é o modelo de conhecimento que serviu de base à
interpretação racionalista, pois todos os conhecimentos matemáticos derivam de alguns conceitos gerais tomados como ponto de
partida dos quais se concluem todos os outros, de acordo com as leis do pensar correcto, que foram definidas, como sabemos,
pela ciência da lógica. Vejamos alguns modelos do racionalismo:
a) Platonismo: Platão (séc. V-IV a. C.) foi o primeiro filósofo a exibir-se racionalista ao tentar explicar as ideias, que considera
realidades perfeitas e absolutas, existentes num mundo ideal. Essas ideias seriam os arquétipos ou modelos das realidades deste
mundo e também as normas, graças às quais conhecemos essas realidades. Por isso para Platão conhecer é recordar. É a teoria
da reminiscência platónica ou teoria das ideias.
b) Cartesianismo: Descartes pensa que as principais ideias são inatas, pois, nascem connosco e não são adquiridas pela
experiência. Tal como Malangatna imprime as ideias que tem em suas obras, as nossas ideias provém de Deus.
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Descartes distingue as ideias em três espécies (Cartesianismo): ideias adventícias, as que nos vem directamente dos sentidos (a ideia que
se tem vulgarmente do Sol, as ideia de calor e de amargura); ideias fictícias são as elaboradas por nós com base na combinação das
adventícias e que permitem representar coisas nunca vistas (ideias que os astrónomos se formam do Sol em consequências dos raciocínios;
ou ainda as de hipogrifo – animal fabuloso metade cavalo - e metade abutre, sereia e outros semelhantes); e ideias inatas ou que nasceram
connosco, ou porque são produzidas por nós, sem intervenção dos sentidos (as ideias de Deus, Alma, Triangulo e, de modo geral, as que
representam as essências verdadeiras, imutáveis e eternas).
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Nem o racionalismo nem o empirismo são respostas totais aos problemas que pretendem resolver. A doutrina empírico-
racionalista representa uma tentativa de estabelecer a mediação entre estas duas, afirmando que o conhecimento se deve à com
O maior representante desta corrente é Kant I. Kant (1724-1804), um filósofo alemão do séc. XVIII, que abordou a questão da
origem do conhecimento procurando conciliar as duas doutrinas acima referidas. De facto, para Kant, o conhecimento resulta da
união de dois elementos – a matéria, fornecida pelos sentidos e pela consciência, e a forma, que é o trabalho do espírito que,
pela abstracção, considera o que nos dados sensíveis existe de universal e necessário.
No entanto, a forma do nosso conhecimento não é puramente “a prior” e não deriva simplesmente do espírito; mas é “a
posterior”, isto é, resultado da acção do espírito sobre a realidade. Nisto difere o empírico-racionalismo do criticismo.
a) Inatismo Virtual de Leibniz. Leibniz cogita no sentido de que o nosso espírito nasce com certos conhecimentos inatos ou
disposições virtuais que só se tornam actuais por meio da experiência. Para ele existe na inteligência em estado virtual como a
imagem na película já impressionada, antes de ser revelada. Diz ele: “Nada existe na inteligência sem que primeiro existisse nos
sentidos a não ser a própria inteligência”. Para ele a inteligência nasce com certas ideia virtuais, mas a experiência é
indispensável para as fazer passar da virtualidade à actualidade.
Kant idealizou o sei relativismo fazendo notar que o conhecimento seria a síntese de um elemento “a prior”, subjectivo,
universal e necessário – a forma –, criada pela sensibilidade e entendimento, e um elemento “a posterior”, singular e
contingente – a matéria -, que deriva da experiência. Todo o acto de conhecimento consiste em aplicar os dados “a prior”
aos a experiência forneceu
O esforço principal de Kant é dirigido á investigação dos elementos “ a prior”, existentes nas três funções cognitivas que
possuímos: sensibilidade, entendimento e razão.
"0 nosso conhecimento procede de duas fontes fundamentais do espírito: a primeira é o poder de receber as representações (a
receptividade das impressões), a segunda, o de conhecer o objecto por meio dessas representações (espontaneidade dos
conceitos). Pelo primeiro, um objecto é-nos dado; pelo segundo, ele é pensado em relação com esta representação (como
simples determinação do espírito). Intuição e conceitos constituem, portanto, os elementos de todo o nosso conhecimento; de
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maneira que nem os conceitos sem uma intuição que lhes corresponda de algum modo, nem uma intuição sem conceitos, podem
dar um conhecimento. (... )
Se chamamos sensibilidade à receptividade do nosso espírito, a capacidade que tem de receber representações na medida em
que é afectado de alguma maneira, deveremos, em contrapartida, chamar entendimento à capacidade de produzirmos nós
mesmos representações ou à espontaneidade do conhecimento. A nossa natureza implica que a intuição não pode nunca ser
senão sensível, quer dizer, que contém apenas a maneira como somos afectados pelos objectos, enquanto o poder de pensar o
objecto da intuição sensível é o entendimento. Nenhuma destas duas propriedades é preferível à outra." Kant, Crítica da Razão
Quer isto dizer que, se não pode haver conhecimento sem experiência, continuamos a não ter conhecimento, se nos limitarmos
exclusivamente a esta. O mesmo se passa em relação à razão. Como sabemos, o verdadeiro conhecimento é aquele que, para
além de permitir a sua adequação ao real que se quer conhecer, é também universalmente válido e necessário. O primeiro
aspecto pressupõe a experiência como modo do homem contactar com a realidade, o segundo aspecto advém-lhe do facto de
existirem conceitos e categorias que são a priori e, como tal, possuem as características de universalidade e de necessidade.
c) O Construtivismo de Piaget
Piaget desenvolveu uma concepção construtivista do conhecimento. O conhecimento é indissociável da acção do sujeito. Não é
pois um simples registo feito pelo sujeito dos dados do mundo exterior. O sujeito apreende e interpreta o mundo através das suas
estruturas cognitivas. Estas estruturas não são todavia inatas, mas são formadas pelo sujeito na sua acção. Permitem ao sujeito
apreender e interpretar a realidade.
Piaget considera que o conhecimento resulta dum processo de transformação de uma matéria-prima dada pelos sentidos e
elaborada pela capacidade organizacional do sujeito; pelo que a sua teoria se enquadra na corrente empírlco-racionalista de que
temos vindo a ocupar-nos.
Como já vimos, Piaget no nosso século, retoma a ideia do conhecimento como uma construção por parte do sujeito a partir dos
dados fornecidos pela experiência, procurando a sua justificação psicológica. Jean Piaget dá ao apriorismo de Kant uma versão
biologista. Segundo a teoria operatória, o organismo tem que possuir determinadas características que tornem possível a troca de
informação com o meio e a construção de conhecimento que, deste modo, não é dado nem é cópia do real. O conhecimento é,
assim, fruto de uma interacção entre o sujeito e o meio implicando, por um lado a experiência sensível e, por outro, as
estruturas cognitivas de que todo o sujeito é dotado e que lhe permitem construir o seu conhecimento com base nessa
mesma experiência.
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Questões: O que é que conhecemos? Os próprios objectos, ou as representações, em nós, dos mesmos? Ora, perguntar pela
natureza do conhecimento consiste precisamente em indagar qual dos dois pólos, sujeito ou objecto do conhecimento, é
determinante; ou seja, se o que se conhece directamente é a representação do real, poder-se-á considerar que se conhece
efectivamente o real ou apenas a sua representação, a sua imagem? Em resposta a esta pergunta temos duas teorias opostas: o
Realismo e o Idealismo.
2.3.1 O Realismo:
Os maiores filósofos realistas foram, sem dúvida, Aristóteles e S. Tomás de Aquino; depois defendido por Brentano, Hursserl,
Balmes, Cardeal Merciel, Maritain, etc.
A nossa atitude habitual é acreditar que existe um mundo de objectos físicos que existem independentemente do facto de
estarem a ser percebidos por um sujeito, que são causa das nossas percepções e que estas nos dão a conhecer o mundo tal
como ele é em si. Esta atitude é habitualmente designada por Realismo. Doutrina que afirma que por meio do conhecimento
atingimos uma realidade distinta da nossa representação e independente dela, mas que lhe corresponde. Por outras palavras, o
realismo admite a existência da realidade exterior (ou do mundo externo) como sendo coisa distinta do pensamento ou das
nossas representações, o que significa que, para o realismo, o nosso conhecimento atinge a própria realidade e não apenas as
representações subjectivas - atinge o que é, e não o que pensamos que seja.
"0 homem da rua, que não reflectiu muito sobre o problema da percepção e do mundo físico, é realista: crê que existe um
mundo físico que está aí, quer o percebamos ou não, e que podemos saber diversas coisas sobre ele. As cinco crenças
seguintes parecem ser partilhadas por todos os seres humanos, e o conjunto constituído pelas quatro primeiras fundamenta a
opinião que, às vezes, se denominou "realismo ingénuo".
As impressões que temos das coisas físicas nos sentidos, são causadas por essas mesmas coisas físicas. Por exemplo, a minha
consciência da mesa é causada pela própria mesa. Porém, não há uma única destas proposições que não tenho sido questionada
por pessoas que sobre elas pensaram de modo sistemático. Qual poderia ser a base da sua dúvida?
2.3.2. O Idealismo:
Os sumos filósofos idealistas foram Platão e S. Agostinho, defendido por Descartes, Berkeley, Kant, Fichte, Shelling Hegel,
Croce, Gentile e Heidegger.
Contrariamente ao realismo, o idealismo afirma que o objecto de conhecimento é produto do espírito, o que significa que o
conhecimento é produto do sujeito e que as coisas não são mais do que conteúdos de consciência. Berkeley , por exemplo,
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pensava que o mundo exterior que percepcionamos só existe na nossa percepção. Daí a expressão: “ esse = percipi”, isto é, há
uma identidade entre o ser de algo e o ser apercebido.
O idealismo não nega propriamente a existência do mundo externo, mas reduz este às representações, ou seja, ao pensamento, às
ideias. Como tal, o nosso conhecimento atinge apenas as modificações subjectivas e não a própria realidade – atinge o que
pensamos e não o que é.
"Chama-se idealismo a toda a doutrina - e às vezes a toda a atitude - segundo a qual o mais fundamental, e aquilo pelo qual se
supõe que se devem orientar as acções humanas, são ideais - realizáveis ou não, mas quase sempre imaginados como
realizáveis. Então, o idealismo contrapõe-se ao realismo, entendido como a doutrina - e às vezes a atitude - segundo a qual o
mais fundamental, e aquilo pelo qual se supõe que se devem orientar as acções humanas são as realidades - as duras
realidades (... ). Considerando, pois, o idealismo como idealismo moderno e tendo em conta que o ponto de partida do
pensamento idealista é o sujeito, pode dizer-se que este constitui um esforço para responder à pergunta: como podem, em
geral, conhecer-se as coisas? (...) Para o idealismo, 'ser' significa primariamente “ser dado na consciência, no sujeito, no
espírito”, “ser conteúdo da consciência, do sujeito, do espírito”, “estar contido na consciência, no sujeito e no espírito.” Mora,
J.F., Dicionário de Filosofia, tomo I
Questão: o nosso conhecimento intelectual terá valor objectivo e absoluto, ou apenas valor subjectivo e relativo?
Terá valor objectivo se atingir o real, a essência das coisas, os objectos, tendo também, assim, um valor absoluto, pois sendo
imutável a realidade essencial, também o respectivo conhecimento terá carácter absoluto - realismo. Terá carácter subjectivo, se
apenas atingir as modificações subjectivas, a maneira como pensamos a realidade, o que as coisas são para nós e não a própria
realidade em si e, por isto, também terá valor relativo, porque vale só para nós e para todos os seres constituídos como nós -
relativismo.
O valor e limites do conhecimento estão dependentes da atitude que se tomar quanto à sua origem e à sua natureza. Assim, o
empirismo, o racionalismo e o idealismo são teorias relativistas, enquanto que o empírico-racionalismo e o próprio
realismo conferem ao conhecimento valor absoluto.
Senão vejamos:
Para o Empirismo, o conhecimento tem um valor relativo; não só porque varia com a experiência (o que é verdadeiro para a
experiência deste mundo poderá não o ser para um mundo diverso), mas porque se limita a conhecer os fenómenos e, por isso,
vale só para o mundo constituído pelos fenómenos.
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Para o Racionalismo, a realidade é interpretada em função de certos dados da razão que traduzem as possibilidades do espírito
humano nesse sentido e, assim, o seu valor também é relativo, urna vez que é válido apenas para os seres que tenham uma
constituição psicológica como a nossa.
Para o Idealismo, o conhecimento tem valor puramente subjectivo e relativo, limitando-se o homem a conhecer apenas as suas
modificações subjectivas, às quais nada de material corresponde na realidade (Berkeley), ou a conhecer as aparências da
realidade - os fenómenos - e não a realidade em si - os númenos (Kant). Estas três doutrinas são, portanto relativistas.
Mas outras há que conferem ao conhecimento um valor objectivo e absoluto:
Para o Empírico - Racionalismo e para o realismo o conhecimento tem um valor objectivo e absoluto, porque atinge o
fundo da realidade ou a sua essência, não se limitando ao conhecimento das suas aparências ou das suas manifestações. De
facto, para estas duas doutrinas, o conhecimento, por ser fruto de elaboração intelectual a partir das realidades percepcionadas,
tem valor objectivo, porque as características gerais (ideias) que afirmamos dos indivíduos, ou das coisas, existem de facto
nelas. O mundo do conhecimento não é, portanto, uma cópia do mundo real, mas é uma construção intelectual e técnica, a partir
dessa mesma realidade.
É conveniente precisar em que sentido é que o conhecimento do homem tem valor absoluto . Quando falamos no
conhecimento como valor absoluto, não estamos a dizer que conhecemos a realidade total e perfeitamente, pois, sob este
aspecto, o conhecimento é relativo, por estar em contínua evolução e ser maior para uns do que para outros. A verdade total é
uma aspiração que se impõe tanto mais quanto maior for o número de conhecimentos que se possui. Isto significa que é o
conhecimento da verdade que varia, e não a própria verdade. A verdade de hoje será sempre verdade; se o é para um indivíduo,
sê-lo-á para todos, de todos os tempos e lugares - é neste sentido que afirmamos que o conhecimento tem um valor absoluto. O
que é realmente verdadeiro ficará sempre verdadeiro e será integrado em novos conhecimentos, uma vez que o homem, sempre
sedento de conhecer, vai descobrindo na realidade - novas propriedades e, assim, vai enriquecendo o seu conhecimento - é assim
que funciona o conhecimento científico que, nesse sentido, é dinâmico e está em perpétua renovação. O que varia não é a
verdade, mas o nosso conhecimento acerca dessa verdade.
Questões: o quê é a verdade? Quais as atitudes do espírito perante ela? Qual é o critério da certeza? Ou seja, quando, por que
meios e segundo que critérios é possível o espírito humano possuir uma representação objectiva da realidade?
A verdade é um valor que qualifica um juízo; consiste em julgar que os objectos são o que são, isto é, em afirmar ou negar de
um objecto (sujeito) certa qualidade (predicado). Este juízo será verdadeiro, se a qualidade afirmada ou negada se encontra ou
não no objecto e falso, em caso contrário. A verdade, segundo Aristóteles, é “dizer que é o que é, e que não é o que não é”.
Daqui podemos concluir que a verdade é a conformidade do pensamento com o objecto ou, o mesmo é dizer, o acordo do
conhecimento com a coisa. Este objecto ou coisa pode ser uma realidade exterior ao sujeito que pensa ou o próprio
pensamento. No primeiro caso, há o acordo do pensamento com o objecto exterior – é a chamada verdade material ou real14;
no segundo caso, há o acordo do pensamento com ele próprio é a verdade formal, que a lógica formal pretende assegurar e que
é o objectivo de certas ciências, como as matemáticas.
Nem sempre a verdade exige um objecto do pensamento, um juízo formulado a respeito desse objecto (pensamento acerca desse
objecto) e, finalmente relação entre este pensamento e o seu objecto ou conformidade entre o juízo formulado e o objecto.
5.2.2. Verdade lógica ou do juízo é a conformidade do pensamento com o objecto ou com as coisas; é neste sentido lógico que
vulgarmente se toma a palavra verdade. Esta conformidade, porém, não significa que a verdade lógica seja uma cópia fiel da
realidade, como supõe o senso comum, pois, se assim fosse, o conhecimento humano seria perfeito e nada mais de novo haveria
para conhecer.
Para haver verdade lógica, basta que a qualidade, que se atribui ás coisas, nelas se encontre e não é necessário enunciar todas as
qualidades que as coisas encerram. Dizer que “certo fruto está maduro” é verdade, desde que aquela qualidade pertença ao fruto,
mas não obriga a concretizar o fruto em todos os seus aspectos.
Na verdade lógica, a inteligência conforma-se com a realidade, pelo menos em parte; e, no caso da verdade ontológica, é a
realidade que se conforma com a inteligência que a concebe. Assim, a verdade tem por ponto de partida e de chegada a
inteligência, sendo a própria realidade o troço de união entre a inteligência criadora e a inteligência observadora.
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Quando se define verdade material como “o acordo do pensamento com o objecto exterior” não se pretende dizer que
esse objecto seja sempre material, pois também existem objectos de natureza espiritual (Deus, alma, etc.). A verdade
material toma o nome de verdade experimental, quando esse acordo é revelado pela observação e experimentação. Esta
verdade é a que as ciências experimentais procuram atingir
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5.2.3. Verdade moral ou sinceridade consiste na conformidade do que dizemos com o que pensamos.
5.3. Natureza da verdade lógica: podemos afirmar que a verdade está apenas no juízo.
As ideias, consideradas como simples representações da essência dos objectos, não são nem verdadeiras nem falsas, pois não
afirmam nem negam; podem, quando muito, ser uma representação adequada ou inadequada.
Só há verdade ou erro no juízo, isto é, nas asserções que fazemos acerca da realidade ou dos objectos. Essas asserções são
verdadeiras, quando estão de acordo (pelo menos parcial) com as coisas ou objectos do pensamento. Mas o objecto do
pensamento são as coisas existentes em si ou apenas as nossas representações?
Para o realismo que admite a existência das coisas em si e que o nosso conhecimento as pode atingir, a verdade será o acordo
do juízo com as próprias coisas, senão totalmente, pelo menos em parte. Segundo esta teoria, explica-se facilmente o erro, que
consiste na não conformidade do juízo com as coisas.
Para o idealismo absoluto, que não admite a existência da realidade material, mas só ideias ou representações, a verdade é o
acordo perfeito do juízo com essas representações; tudo o que se representa realmente é verdadeiro. O erro é difícil de explicar,
neste caso, porque o pensamento tem de estar sempre de acordo com o que ele próprio pensou. Croce e Gentile não admitiam o
erro.
Para o criticismo de Kant, que admite a existência das coisas em si (nómenos), mas se as podermos conhecer, pois só se
conhecem os fenómenos, ou seja, um objecto construído pelo espírito, a verdade consiste no acordo do juízo, não com as coisas
em si, mas com as nossas representações e, assim, a verdade terá apenas valor relativo – é uma verdade “para nós” e não a
verdade em si. O erro também não teria sentido.
Para o pragmatismo, a verdade é o que dá bons resultados, é o eficaz, o que é útil, que dá êxito: “ o verdadeiro é o que é
vantajoso, não importa de que forma”. A verdade não é um valor de carácter racional, mas um valor real, pratico, interesseiro.
Para esta teoria, a verdade é relativa e subjectiva, pois depende das circunstâncias, dos interesses, etc., e, nesta perspectiva,
poderia haver verdades contraditórias, porque os diferentes homens poderiam encontrar interesses em sistemas opostos. O erro
também seria relativo, porque, consoante a ocasião, poderia tornar-se verdade ou substituir esta. Pelo facto de uma afirmação ser
consoladora, reconfortante, animadora, não se segue que seja verdadeira; pelo contrário, devemo-nos precaver contra a verdade
de semelhantes afirmações. Diz Jean Rostand, “as verdades consoladoras devem ser demonstradas duas vezes”.
Conclusão: a verdade é o acordo do pensamento com os objectos; basta que haja uma conformidade parcial, isto é, que o
atributo que se afirma do sujeito de facto lhe convenha. Portanto, a verdade ou é o acordo do pensamento com um objecto
exterior (verdade material) ou o acordo do pensamento com ele mesmo (verdade formal).
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5.4.1. A Ignorância é a ausência de todo o conhecimento relativamente a um enunciado. Não se sabe se é verdadeiro ou falso.
A verdade de um enunciado, para o espírito em estado de ignorância, é como se não existisse; não há juízo.
A ignorância pode ser vencível ou invencível consoante está ou não em nosso poder de fazê-la desaparecer; culpável ou
inculpável, conforme tivermos ou não o dever de a dominar.
5.4.2. A Dúvida é um estado de equilíbrio entre a afirmação e a negação. O espírito não adere, ou porque os motivos para
afirmar e negar se equilibram (dívida positiva) ou não se equilibram, mas não são suficientes para excluir o medo de errar (ainda
dúvida positiva); ou não tem razão alguma nem para afirmar, nem para negar (dúvida negativa que equivale à ignorância). Não
se imite ainda juízo.
A dúvida céptica ou sistemática é o estado definitivo do espírito relativamente a toda a verdade; é impossível
legitimar as nossas verdades espontâneas que devemos ter sempre como incertas.
A dúvida metódica é provisória e é um meio de chegar à verdade; a céptica é definitiva e é um fim.
5.4.3. A Opinião é a adesão receosa do espírito à afirmação ou à negação de um enunciado. O espírito adere, porque razoes
mais graves pesam para uma parte; no entanto, não excluem o temor de o oposto ser verdadeiro; é um estado intermédio entre a
dúvida e a certeza em que já é emitido o juízo, mas inseguro. O motivo que se impõe ao espírito e determina nele o estado de
opinião tem o nome de probabilidade e, por isso, o enunciado a se dá a adesão é provavelmente certo. O valor da opinião
depende do grau de probabilidade e, portanto, dos motivos em que se baseia.
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5.4.4. A Certeza é a adesão firme e inabalável do espírito a uma verdade conhecida, sem receio de errar. A certeza supõe,
pois, a manifestação completa da verdade, isto é, da conformidade do enunciado com a realidade, emitindo um juízo seguro.
Esta manifestação faz-se mediante a evidência, que é o motivo e o fundamento da certeza.
Certeza natural é aquela que existe quando o conhecimento dos motivos é suficiente para aderir sem temer o
oposto, apesar de não ser explícito e distinto de maneira a poder resolver as dificuldades. Esta certeza constitui o conhecimento
vulgar.
Certeza científica é aquela que se possui quando o conhecimento dos motivos é explícito e claro de maneira a
poder debelar todas as dificuldades que se lhe oponham e a poder explicá-la. Esta é a certeza dos conhecimentos científicos e
filosóficos.
5.5. O ERRO
5.5.1. Noção: o erro consiste em dizer que é, o que não é, e que não é, o que é; é a não-conformidade do espírito com a realidade
ou com as coisas.
Erro é a adesão firme àquilo que objectivamente é falso, mas que subjectivamente nos parece verdadeiro.
O erro é o resultado do desacordo do pensamento ou, mais precisamente, do juízo com as coisas, só existe no espírito que julga.
As coisas são sempre verdadeiras no sentido ontológico e para errar é preciso julgar (afirmar ou negar alguma coisa a seu
respeito).
O erro distingue-se da ignorância, pois enquanto esta consiste em nada saber e nada afirmar, aquele consiste em não saber e
afirmar, julgando saber. A ignorância é uma limitação da verdade: o ignorante não sabe; o erro é a negação da verdade: quem
erra não sabe e julga saber; é uma ignorância reforçada que se não conhece.
5.5.2. Causas do erro: podem ser de duas espécies: lógicas e morais.
a) Causas lógicas: a falta de penetração do espírito que interpreta mal os dados dos sentidos, estendendo a adesão além daquilo
que foi apreendido. É o caso de um homem que vê num estranho o amigo esperado com impaciência. Ordinariamente isto
sucede por falta de atenção, por irreflexão e precipitação. A paixão que impede de raciocinar correctamente.
b) Causas morais: a vaidade proveniente da demasiada confiança na nossa pessoa; i interesse de qualquer natureza, tanto
económico e social como ideológico, pelo qual preferimos o que nos é favorável e se harmoniza com as nossas ideias; a
preguiça intelectual, que na deixa inquirir o valor dos motivos e, por isso, nos leva a aceitar sem reflexão certas asserções
ligeiramente formuladas.
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Para evitar o erro, é preciso combatê-lo nas suas causas. Assim o homem bem formado procede sempre com método e com
reflexão; acautela-se contra as sugestões da paixão e da imaginação; suspende o juízo e dúvida, quando o julga necessário, não
aceitando nada como verdadeiro senão o que conhece como tal, através dos meios legítimos que são a intuição e o raciocínio.
Além disso, desconfia um pouco de si mesmo e da perspicácia da sua razão; procura ser imparcial, não se subordinando a
exigências praticas; é circunspecto e opõe à negligência uma atenção mais enérgica possível.
5.6.1. A evidência é a clareza com que a verdade se impõe ao nosso espírito. É uma espécie de luz que ilumina a realidade e
nos permite ver que aquilo que temos no espírito está conforme a essa mesma realidade patenteada. Assim como a luz ilumina
os corpos a evidencia ilumina a verdade.
A evidência é uma característica da própria coisa e não uma marca exterior a ela; não vejo que uma coisa é evidente e dai
concluo que ela é verdadeira: é a sua verdade que vejo como evidente.
A verdadeira evidência leva-nos a uma adesão reflectida a uma questão que previamente submetemos a exame crítico e que
admitimos pelo facto de não encontrarmos qualquer razão legítima para duvidar e nos aparecer clara e distinta.
A evidência é um critério supremo da certeza. Tudo o que é evidente é necessariamente verdadeiro; e tudo o que é verdadeiro é
evidente, ou pelo menos devemos, através da demonstração, procurar atingir essa evidência.
Não devemos confundir “evidência” com “certeza”, porque a evidencia é objectiva e a certeza é subjectiva; é um estado do
espírito provocado pela evidência.
Não pode haver certeza sem evidência, nem evidência sem certeza; por conseguinte, estes termos são correlativos, como a
possibilidade é correlativa da dúvida e a probabilidade da opinião.
A evidência pode ser imediata e mediata. É imediata, quando a luz a da verdade é anterior a todas a demonstração; é mediata,
quando se atinge através da demonstração ou da observação e experiência. A evidência pode ainda ser intrínseca e extrínseca.
Intrínseca, quando a luz dimana imediata ou mediatamente da própria verdade; extrínseca, quando a luz deriva de alguma coisa
exterior à própria verdade, como seja a autoridade.
5.6.2.2. Senso comum entende que são verdadeiros os conhecimentos comuns a todos os homens.
5.6.2.3. Pragmatismo propõe como critério da verdade a acção. Para James, a verdade identifica-se com o êxito ou melhor com
a verificação: será verdade aquilo que se verificou; as hipóteses que saíram vencedoras das provas a que foram submetidas.
Estes e outros critérios, que não a evidencia, têm uma importância relativa e servem para determinar algumas espécies de
verdade. Não se distinguem da evidência que é o critério supremo de toda a verdade.
À ARGUMENTACAO LÓGICA
1. Definição
1.1. Definição etimológica da Lógica
O termo lógico vem do grego logos que significa razão. Enquanto ciência do logos, a Lógica pode ser definida como
ciência da razão ou do pensamento ou ainda ciência do discurso racional da razão ou do pensamento ou ainda ciência do
discurso racional ou simplesmente ciência que estuda a dimensão racional do discurso.
3. A Finalidade da Lógica
A lógica pertence por isto à filosofia normativa, porque não tem por fim definir o que é, mas o que deve ser, a saber, o
que devem ser as operações intelectuais para satisfazer às exigências de um pensamento correcto, estabelecer as
condições de legitimidade e não de existência.
A lógica é uma arte, arte de pensar, o método que permite bem-fazer uma obra segundo certas regras.
4. As grandes divisões da Lógica: formal ou menor (validade formal) e material ou maior (validade verdade)
4.1. Lógica formal ou menor (validade formal): apreensão, juízo e raciocínio
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É a parte da lógica que estabelece a forma correcta das percepções intelectuais ou melhor, que assegura o acordo do
pensamento consigo mesmo, de tal maneira que os princípios que descobre e as regras que formula se aplicam a todos os
objectos do pensamento, quaisquer que sejam. A lógica formal compreende três partes: a apreensão, o juízo e o
raciocínio.
- Aristóteles, aproveitando elementos dialécticos anteriores, deu-lhes uma sistematização rigorosa e criou a teoria do
silogismo15. Para ele, a lógica é um conjunto de leis, de valor universal e absoluto, reguladoras de todo o raciocínio. O
seu “Organon” que contém estas leis, é uma espécie de código do pensamento, ao qual toda a inteligência, para pensar
correctamente, tem de obedecer e nenhum conhecimento poderia escapar à sua aplicação. Era por conseguinte, uma
lógica dedutiva “ a priori” de carácter silogística. Esta lógica dedutiva – silogística foi retomada na Idade Média e
latinizada em alguns dos seus aspectos, mas sem alterar os princípios básicos estabelecidos por Aristóteles.
15
Silogismo é um raciocínio formado por três proposições de tal modo dispostas que, expressas as duas primeiras
premissas se segue a terceira chamada conclusão
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- Na Época moderna, era das ciências experimentais, os investigadores põem de parte a lógica dedutiva, empregam
novos processos de investigação. Aparece, assim, uma nova lógica fundada na observação e na experimentação, que
pode definir-se como um conjunto de processos ou métodos para atingir a verdade em cada ciência. É uma lógica
indutiva, a “ a posterior” de carácter experimental. A lógica formal de Aristóteles perde o predomínio em benefício da
metodológica.
Esta nova lógica foi desenvolvida por Francis Bacon que na sua obra “ Novum organon”, substitui a de dedução
silogística pela indução amplificante, que permite passar dos factos às leis.
Vinte anos depois Descartes no seu livro “ Discours de la Méthode” afirmou que a lógica aristotélica não permite fazer
quaisquer descoberta científica, e, por outro lado, não chegava as bases experimentais para o desenvolvimento das
ciências, era necessário usar a razão, esboçando um novo processo dedutivo, diferente dos silogístico a chamada
dedução matemática ou construtiva que, consiste em vez de proceder sempre do geral para o particular, pode passar do
geral para o mais geral. Este raciocínio foi mais tarde usado por Poincaré, que via nele uma espécie de “virtude
criadora” e precisado por Globot.
A lógica moderna é predominantemente uma lógica indutiva e emprega uma nova forma de dedução – a dedução
matemática. Ainda na Idade Moderna, Leibniz aplica à lógica o cálculo matemático e cria símbolos ou algoritmos que
evitassem as deficiências das expressões verbais usadas na lógica de Aristóteles e permitissem raciocinar à maneira
algébrica.
Na Idade Contemporânea Boole, Peano e Russell, dão origem à logística ou lógica matemática que hoje tem inúmeras
aplicações em diversos estudos.
É necessário não exagerar nem depreciar a importância da lógica empírica e lógica científica em função da lógica
filosófica.
A Lógica empírica ou lógica espontânea, é a ordem que a razão humana segue naturalmente nos seus processos de
conhecer as coisas. A ordem que primariamente brota da nossa própria natureza: trata-se de um modo de discorrer
adequado à nossa inteligência e à realidade das coisas, que se adquire espontaneamente, pelo uso natural da nossa razão.
É a lógica natural humana que, se não se segue, dá lugar a um pensamento confuso, ambíguo ou confuso.
A lógica espontânea é comum a todos os seres humanos. Nela se mesclam (incorporam) muitos elementos culturais,
que são resultado da nossa civilização e da educação recebida; todo o homem, naturalmente conhece, tem ideias e
raciocina de alguma maneira: existe um modo de pensar com – base da nossa comunicabilidade humana – que se
desprende da nossa natureza e que sem dúvida pode cultivar-se e desenvolver-se nas suas virtualidades.
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O fim da lógica espontânea como de qualquer lógica científica é o conhecimento da verdade. No dizer de Leibniz “as
leis da lógica não são mais do que as regras do bom senso colocadas em ordem e por escrito” . É a lógica do bom senso
em que se observa espontaneamente as regras de um pensamento correcto para conhecer a verdade.
A Lógica científica. Não se trata apenas unicamente de conhecer a verdade, é necessário afastar as dificuldades e
refutar os erros, e o bom senso, onde este, encalha muitas vezes, porque ignora as causas do erro, e os processos
sofísticos para tirar de uma verdade as consequências imediatas e elevá-los aos princípios universais.
Há certa correspondência entre as categorias lógicas e as categorias gramaticais. Assim, à categoria lógica substância
corresponde a categoria gramatical substantivo; à qualidade, o adjectivo; à quantidade o numeral; à acção e relação o
verbo; ao lugar e tempo o advérbio, etc.
No entanto a lógica é mais rica do que a gramática, pois as vezes não conseguimos exprimir convenientemente o nosso
pensamento. Foi isto que levou a procurar uma expressão mais rigorosa do pensamento por meio dos símbolos próprios
o que constitui o objecto da logística. Há uma só lógica para muitas línguas e muitas gramáticas.
Podemos concluir que a lógica perfeita deve utilizar uma linguagem correcta e a gramática deve apoiar-se nas leis da
razão.
A lógica estuda somente as operações intelectuais ou a inteligência, indicando como esta deve proceder para atingir a
verdade; é a ciência das operações da inteligência como devem ser, aprecia o seu valor em relação a uma norma, que é a
verdade.
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A psicologia estuda o pensamento concreto, para conhecer as suas leis e as condições da sua existência e
desenvolvimento; mostra-nos como de facto pensamos, descrevendo o mecanismo real do espírito. A lógica trata do
pensamento abstracto nas suas relações com a verdade, para determinar as regras e as condições da sua legitimidade.
Mostra-nos como devemos pensar.
A psicologia formula juízos de realidade sobre os fenómenos psíquicos, a lógica estabelece juízos de valor em relação à
verdade, rejeitando as que “não valem”.
A psicologia descreve, a lógica prescreve.
Concluindo: embora diferentes; a psicologia é bastante útil à lógica. Permite ao lógico conhecer os factores psicológicos
que podem falsear o exercício válido das actividades psíquicas tais como: os interesses, os complexos, os hábitos, as
paixões, etc. Só assim o homem poderá evitar os pensamentos falsos e procurar os verdadeiros. A psicologia é um
excelente auxiliar da lógica.
Há vários autores que se debruçaram sobre vários modelos do fenómeno da comunicação, dentre eles os de Shannon –
engenheiro de telecomunicações –, Lasswell – especialista em ciências políticas -, mas serão objecto de estudo para nós,
por razões metódicas, os modelos de Roman Jakobson – linguista – e Dell Hymes linguista, sociólogo e antropólogo,
pelo facto de serem os mais recentes e terem corrigido as falhas verificas nos modelos anteriores, tais como:
- Levam em consideração o contexto social em que se encontram os intervenientes da comunicação.
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- Reduzem a relação da comunicação a uma relação causa – efeito ou, na linguagem behaviorista, a uma relação
estímulo-resposta.
Contexto/ Referente
(F. referencial)
Emissor/destinador Destinatário/receptor
F. Expressiva/emotiva F. Conativa/apelativa
Canal/contacto
F. Fática
Código
F. Metalinguística
Roman Jakobson (1896-1982) linguista americano de origem russa, propõe esquema de comunicação, muito conhecido
e que até hoje se ensina nas escolas. Este linguista relativamente aos outros modelos, acrescenta três outros elementos: o
contexto, código e o contacto; atribuiu uma função de linguagem a cada um dos elementos de comunicação.
b) Função expressiva (ou emotiva) o discurso da mensagem é centrado no emissor ou destinador. Trata-se de
mensagens em que o emissor ou locutor recorre preferencialmente às interjeições e aos adjectivos, com expressões de
sentimentos, de emoções e julgamentos carregados de subjectividades. São exemplos a poesia lírica na primeira pessoa
e a carta de declaração de amor.
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c) Função apelativa (ou conativa ou ainda imperativa) é a função pelo qual o emissor actua sobre o receptor, dando-lhe
ordem, conselho, apelo, seduzindo-o, influenciando-lhe para que assuma um determinado comportamento. A marca
linguística é o vocativo e o modo imperativo na segunda pessoa. É exemplo a publicidade.
d) Função poética (ou estética) – neste tipo de discurso os interlocutores estão mais preocupados com a beleza e
estética da própria mensagem ou obra de arte. São exemplos as poesias, algumas publicidades, obras de arte, cujas
mensagens – objectos são portadoras da sua própria significação.
e) Fática os interlocutores com este discurso procuram assegurar, estabelecer prolongar ou interromper a comunicação
ou verificar se o meio usado funciona. São exemplos deste tipo os discursos ou sermões, os textos publicitários, as
conversas entre amigos, sobretudo ao telefone. A função fática centra-se no canal de comunicação.
f) Função metalinguística – com este discurso os interlocutores procuram definir ou clarificar o sentido dos signos para
que sejam compreendidos entre si. Visa evitar equívocidade, o mal-entendido ou a não inteligibilidade mútua. Pode-se
perguntar a um dos interlocutores: “ O que é que pretendes dizer com isso”.
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End (Finalidade) – são as intenções de quem comunica (ou diz algo a alguém) e os resultados dessa comunicação.
Acts (actos) – são a expressão do conteúdo da mensagem (a informação veiculada) e a forma como a comunicação é
feita (como um discurso, um poema, ou uma notificação).
Key (Tom) – é a tonalidade da voz que na comunicação sofre sucessivas alterações dependendo daquilo que
pretendemos exprimir. Na comunicação uma simples saudação (ex. Bom dia!) pode transformar-se num ataque frontal
ao nosso interlocutor, dependendo da tonalidade da nossa voz.
Instrumentalities (Instrumentos) – são os canais e a forma de palavra. Enquanto os canais são os meios de transmissão
da mensagem, a forma da palavra é o conjunto de sinais que na comunicação são comummente partilhados entre
intervenientes.
Norms (Normas) – são os auxiliadores da interacção e da interpretação. São as normas de interacção que permitem que
a comunicação ocorra normalmente. Permite-nos ainda saber quando devemos falar ou ouvir o que o outro fala. As
normas da interpretação estão estritamente ligadas aos hábitos culturais dos interlocutores. Por exemplo o saudar o
professor quando passa.
O modelo de comunicação sugerido por Dell Hymes enriquece o de Jakobson, ao introduzir novas e fundamentais
noções: as finalidades e as normas. De facto, estas novas noções ou factores tornam a comunicação menos mecânica.
Pois chamam a nossa atenção para os aspectos psicossociológicos e pragmáticos da compunção.
Gendre (Género) – é a categoria formal em que se enquadra uma comunicação (conversa, conferência, debate, etc.).
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● A linguagem é o suporte do pensamento. É na linguagem que o pensamento “corre” tal como um programa de
processamento de texto nos nossos computadores só pode “correr” sobre um sistema operativo de base.
● A linguagem desempenha a função de reguladora do próprio pensamento. É em sede da linguagem e de discurso que
se aprende a pensar, que se clarifica o pensamento e que se desenvolvem as competências lógico-discursivas. A
linguagem desempenha ainda, um papel importante na produção do conhecimento, ou seja, na apreensão cognoscitiva
da realidade.
● A linguagem determina modelos de pensamento, motivações sociais e padrões culturais, funcionando como filtro
cognitivo (intelectivo) que informa o modo como os indivíduos de uma comunidade adquirem experiências da
realidade.
O termo discurso, do latim “discursu”, quer dizer oração, fala oratória, dissertação, arrazoado, raciocínio no sentido
lógico-linguístico; é o acto de discorrer lógico-racional do pensamento na palavra ou em sede da linguagem acerca de
um determinado assunto ou realidade (física ou ideal).
De entre as várias dimensões do discurso que existem, destacam-se a três dimensões na óptica de Charles Morris
(1901-?), filósofo que estabeleceu uma teoria geral dos sinais ou semiótica a três níveis de análise dos processos de
comunicação: nível sintáctico, semântico e pragmático.
16
Apofântica: parte da lógica que trata do juízo; que enuncia uma relação susceptível de ser considerada verdadeira ou
falsa
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necessariamente um determinado significado, ou seja, tem um referente a que se reporta, carreia (leva) sempre um
determinado sentido, que tem conteúdo significativo.
As três dimensões do discurso não podem ser isoladas e são intrinsecamente indissociáveis pelas seguintes razões:
● a sintaxe preocupa-se com a forma gramatical da linguagem.
● a semântica coloca o problema das palavras e frases que constituem os nossos enunciados discursivos e remete-as
para a relação que a linguagem estabelece entre o mundo e os objectos, colocando assim o problema de referência.
● a pragmática preocupa-se com o uso que fazemos da linguagem num dado contexto. É a teoria da acção de falar ou da
actuação linguística que investiga o uso adequado e socialmente aceitável das expressões linguísticas bem como os seus
efeitos na comunidade falante.
8.5. Conclusão
Mediante a linguagem os seres humanos comunicam entre si os seus pensamentos através o uso da linguagem, em
forma de discurso. Neste caso, há uma estreita e indissociável relação entre as três realidades – linguagem, pensamento
e discurso. Pelos factos seguintes:
A linguagem regula o pensamento à medida em que, só na base dela podemos formular conceitos (ou ideias), juízos
e raciocínios.
Com a linguagem os homens podem expressar-se em forma de discurso os seus pensamentos, tendo em conta que
não podem ser considerados como discurso:
- aqueles enunciados que são constituídos apenas por uma única oração ou proposição. Ex. Josefina é solteira; Josefate
não está casado; Maria beijou o João na face.
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- a conexão sintáctica entre proposições ou enunciados protocolares embora constitua condição necessária.
Ex. Josefina é solteira, portanto compra muitos discos; Porque Josefate não estudou o suficiente, Maria beijou-o na face.
A relação entre linguagem, pensamento e discurso deve-se ao facto do discurso ser uma manifestação do pensamento e
um acontecimento da linguagem.
9.1. Cibernética
A palavra cibernética tem origem grega kybernetiké. É ciência e técnica do funcionamento e do controlo dos comandos
electromagnéticos e das transmissões electrónicas nas máquinas de calcular e nos autómatos modernos. Um dos ramos
mais importantes desta ciência tem sido a robótica, estudo e construção de máquinas inteligentes.
9.2. Informática
Disciplina que tem como objecto o estudo da informação. Ou seja, a ciência e a técnica do processamento automático da
informação que é fornecida a um máquina a partir do meio exterior.
A afirmação 1 é formalmente válida, correcta e legítima. Sintacticamente bem construída, não contém contradição em
si mesma. Entre os seus não se detecta qualquer incoerência. Do ponto de vista da lógica, nada há a opor-se. Bem
diferente é, no entanto, a questão da sua validade material, da sua conformação com a realidade que autorizaria a
reconhecê-la como verdadeira. Em 350 a. C. Platão já tinha falecido; nesse tempo não se sonhava sequer com faxes.
Do enunciado 2, apesar da sua correcta construção sintáctica, podemos dizer que ele contém uma impossibilidade
formal, porque a definição de rectângulo implica a existência de quatro e não três ângulos. Mais evidente é ainda a
incompatibilidade e a contradição interna dos termos “triângulo” e “quatro ângulos” no enunciado 3. Assim sendo, os
enunciados 2 e 3 não têm validade formal e não têm validade material: são falsos.
2º. Um pensamento (juízo ou raciocínio) tem validade formal, quando os elementos que constituem (conceitos no
juízo, juízos no raciocínio) formam um todo coerente, sem contradição interna e sem incompatibilidade. A forma refere-
se à estrutura do raciocínio ou do pensamento, sendo como tal sujeito à validade ou à não validade.
3º. Todo o pensamento verdadeiro implica a co-presença da validade formal e da validade formal.
4º. A Lógica ocupa-se da validade formal do pensamento, enquanto as outras ciências se ocupam da validade material.
5º. Mas, porque a verdade implica a co-presença da validade formal e material, as ciências não podem prescindir da
Lógica, ou seja, de proceder em conformidade com os princípios e as regras formais do pensamento.
6º. Assim sendo, a Lógica tem de ser tomada como uma ciência em si mesma e como um instrumento (organon) ao
serviço das demais ciências.
Exercícios
Determine se os seguintes argumentos são validos ou inválidos (têm validade formal ou material).
1. Todos os terroristas são perigosos. Ora, todos os imoralistas são perigosos. Logo, todos os imoralistas são terroristas.
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R/ Trata-se de um raciocínio válido, mas a sua conclusão não é materialmente válida ou verdadeira.
2. Todos os homens são mamíferos. Ora, os morcegos são mamíferos. Portanto, os morcegos são homens.
R/ Trata-se de um raciocínio que não tem validade formal nem material. Isto é, não válido nem verdadeiro.
4. O João Manuel Lopes, português, 44 anos, foi o primeiro a pisar o solo lunar -1969.
Analisa os seguintes argumentos, quanto à validade das suas premissas e da sua conclusão:
a) A filosofia é um saber. / A ciência é um saber. / Logo, a filosofia é uma ciência.
b) Os maniquenses são moçambicanos. / Os maniquenses são centristas. / Logo, os moçambicanos são centristas.
i) Princípio da Identidade
Enunciados do princípio de Identidade
I – Uma coisa é o que é.
II – O que é, é; e o que não é, não é.
III – A é A (A designando qualquer objecto de pensamento).
Em termos de proposições:
IV – Uma proposição é equivalente a si mesma
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III – Se encararmos uma proposição e a sua negação, uma é verdadeira e a outra é falsa, não meio-termo.
Em termos de proposições contraditórias temos:
IV – De duas proposições contraditórias, se uma é verdadeira a outra é falsa e se uma é falsa, a outra é verdadeira, não
há meio-termo.
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Elaborado em 12/2007.
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Desativar Realce A A
1. INTRODUÇÃO
Muito se discute se o Direito realmente é uma ciência. O conhecimento científico é aquele resultante do
aperfeiçoamento do conhecimento comum, do homem médio. Conforme Rizzatto Nunes, "o conhecimento científico
é uma espécie de otimização do conhecimento vulgar" [01].
A ciência busca atingir resultados, constatando efeitos a partir de causas, em estreita relação, que é o caminho a ser
percorrido pelo pensamento científico, ao pretender apontar os elementos futuros. Isso significa que é daquela relação
de causa e efeito que se atinge a comprovação de dados, que se tornarão as leis que irão ordenar o conhecimento
relativo ao campo de estudo [02].
Quando analisamos o Direito, temos de ter em conta que estamos diante de um fenômeno social, baseado
precipuamente nas necessidades humanas. Daí que torna-se impossível estudar o Direito sem considerar o elemento
humano, que com suas necessidades "provocam uma permanente atualização do sistema jurídico baseada na força
imanente e transcendente do princípio da Justiça" [03].
Desta forma, somente a partir da análise do sistema jurídico posto é que será possível atingir a meta de construção do
conhecimento jurídico, podendo-se afirmar, como fez o professor Rizzatto Nunes, que "o Direito é o fenômeno e o
sistema jurídico é a maneira de torna-lo inteligível, por intermédio da identificação do seu repertório e da sua
estrutura" [04].
E a dificuldade de se afirmar o Direito como uma ciência advém da própria complexidade desse sistema jurídico,
decorrente da realidade ínsita às relações pessoais, ou seja, do ser humano junto à sociedade. Desta forma, o sistema
jurídico se revela complexo, posto que
abriga o interior e o exterior do homem no concerto, no acerto e no desacerto, da sua existência social e natural, de
modo que sem a reflexão de cunho filosófico, que afasta o reducionismo dogmático, e consagra a dignidade da
pessoa humana, não se revela e não se desnuda o conhecimento da essência do Direito como Justiça [05].
De qualquer forma, e apesar de toda essa dificuldade que leva muitos autores a questionar a existência de uma ciência
do Direito, devemos entender que existe, sim, uma ciência do Direito, ainda que com diversas formas diferentes de
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pesquisa. Fábio Ulhoa Coelho, ao afirmar a existência da ciência do Direito, o faz com assentamento nas seguintes
premissas:
A doutrina reúne conhecimento de caráter tecnológico e científico. Ao afirmar que determinada norma jurídica deve
ser interpretada num sentido, o doutrinador constrói um saber tecnológico, insuscetível de verificação pelos valores
verdades/falsidades. Apenas ao examinar as razões pelas quais uma sociedade gerou determinadas normas jurídicas, e
não outras, ele desenvolve um conhecimento científico, cuja veracidade ou falsidade pode ser metodologicamente
verificada. [06]
Sobreleva notar, entrementes, que a ciência do Direito, no estágio atual em que se encontra, está voltada, na sua
quase totalidade, para o estudo da norma jurídica escrita, com método tipicamente dogmático.
Essa Ciência Dogmática do Direito cumpre as funções típicas de uma tecnologia, com pensamento vinculado ao
Direito positivo. O problema surge porque esse pensamento tecnológico cria um sistema fechado, onde cria
condições para solucionar conflitos juridicamente definidos, mas não acatando a problematização de seus próprios
pressupostos [07] (dogmas).
Não se pode olvidar, todavia, que a ciência do Direito, ainda que dogmática – e especialmente se dogmática –
necessita de uma interpretação, pois que se reveste de uma linguagem técnica e própria. É norma jurídica posta,
escrita, o objeto de estudo da Escola Dogmática do Direito, e cabe ao cientista a sua interpretação.
Se o objeto do estudo é a norma escrita, obviamente torna-se necessário entender a linguagem empregada na
construção dessa norma para a correta compreensão e interpretação de seu alcance.
Linguagem é um "sistema de signos articulados ou escritos, possibilitando a comunicação entre as pessoas" [08].
Desde remotas eras a necessidade de interação do ser humano com a sociedade (assim entendidas mesmo as mais
rudimentares formas de agrupamentos sociais). A linguagem é, pois, a formam de comunicação do homem com a
sociedade em que vive.
O estudo do Direito passa, necessariamente, pela compreensão dessa linguagem e da sua interpretação.
Linguagem é "um recurso que lingüístico empregado pelo elaborador da norma jurídica, com a finalidade de
transmitir seu conteúdo a quem cumpre obedecer-lhe" [09], ao passo que interpretação, nos dizeres de Rizzatto Nunes,
é o ato de "extrair do objeto tudo aquilo que ele tem de essencial" [10]. Ora, se é a norma jurídica escrita o substrato da
ciência dogmática do Direito é dela que se deve extrair o essencial. É a norma jurídica posta que será levada à
interpretação pelo cientista do Direito.
"A interpretação é um modo de conhecimento de objetos culturais", conforme entendimento manifestado pelo mestre
José Afonso da Silva, de forma que "quando esses objetos se compõem de palavras, tem-se a interpretação de um
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texto que é, ao mesmo tempo, um objeto de significação e um objeto de comunicação, cujo sentido se capta mediante
análise interna e análise externa" [11].
Na interpretação jurídica, o intérprete, além de analisar o seu sentido, deve ainda fixar o seu alcance, a fim de
delimitar as situações e pessoas a que a norma interpretada se aplica [12], por isso que "cabe verificar como o conteúdo
normativo alcança o seu destinatário, levando-nos a inquirir o modo de sua avaliação ao mundo exterior – sua
linguagem" [13].
A norma jurídica [14] é um comando dirigido à conduta dos cidadãos, individual ou coletivamente considerados,
autoridades e instituições em suas relações com a sociedade em que vivem, regulando comportamento e assegurando
a estabilidade de tais relações. Por tais razões, ou seja, em razão dessa interação das pessoas com a sociedade, as
normas jurídicas podem sofrer modificações, decorrentes da adaptação a novas situações surgidas da evolução
tecnológica, científica e/ou sócio-cultural, daí dizer-se que a ciência do Direito é dinâmica, aberta às modificações
sociais [15].
A interpretação da norma jurídica passa, necessariamente, pela sua linguagem. Segundo Rizzatto Nunes,
a linguagem é um componente importante de qualquer escola ou ciência. Quando se examina a linguagem utilizada pelas várias
ciências, percebe-se que existe uma tentativa de postular para cada ramo científico uma linguagem própria, técnica, construída
com o propósito de eliminar ambigüidades que tem a linguagem natural, de uso comum da sociedade. [16]
Sainz Moreno, citado por Márcia Dominguez Nigro Conceição, adverte para o fato de que existe entre o Direito e a
linguagem uma relação de vinculação essencial, demonstrando, inegavelmente, a valorização do enunciado
lingüístico como elemento revestidor da norma jurídica, por isso mesmo que a linguagem não é um instrumento do
Direito, mas sim o próprio pensamento jurídico, compondo uma unicidade [17].
Como lembra Márcia Dominguez Nigro Conceição, "o repertório lingüístico do enunciado normativo provém
primordialmente da linguagem natural ou comum, sendo-lhe acrescidos termos técnicos" [18]. Segundo essa mesma
autora, tal fenômeno ocorre em razão da "formação das Casas Legislativas nos países democráticos, cujas vagas são
ocupadas por pessoas de nível cultural heterogêneo, com representantes dos diversos segmentos sociais" [19].
A linguagem comum, ou natural, "nasce espontaneamente no seio da sociedade, e por isso traz todos os problemas de
ambigüidade, incerteza, vagueza, indeterminação etc. que ali estão presentes" [20]. E é exatamente para solucionar tais
problemas que os cientistas constroem, para suas ciências, linguagens técnicas, artificiais e com forte rigor na busca
por termos claros e precisos, de sorte a não darem margem a dúvidas.
Com a isso, a Ciência Dogmática do Direito enfrenta um sério problema. Para o estudo do Direito é essencial a
compreensão da norma jurídica. No entanto, essa mesma norma jurídica deve ser compreendida por toda sociedade,
pois é à sociedade em geral que ela é dirigida, e não apenas aos operadores do Direito.
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Utilizando mais uma vez a lição de Sainz Moreno, temos que as leis devem ter um sentido normativo a ser
imediatamente compreendido pelos cidadãos aos quais se dirigem e dessa compreensão resulta a proximidade
necessária que deve haver ente linguagem das normas e a linguagem comum ou natural que já lhes é familiar, por ser
utilizada pelos indivíduos de uma sociedade nas suas relações intersubjetivas [21].
De maneira contrária, a norma jurídica não cumpriria seu objetivo precípuo de obrigar a todos o seu cumprimento.
Uma vez que ninguém se escusa de cumprimento alegando desconhecimento da lei, a sua linguagem não pode ater-se
a termos exclusivamente técnicos, próprios dos cientistas do Direito, sob pena de impedir a comunicação necessária
do conteúdo de seus dispositivos por quem, efetivamente, deve ter acesso a ele. Decorre disso que a maior ou menor
agregação de vocábulos técnico-jurídicos não descaracteriza a linguagem do Direito [22].
Destarte, quando a norma jurídica é clara na sua essência, de fácil compreensão e entendimento, não há necessidade
de interpretação: in claris cessat interpretatio.
A atuação do intérprete vai se fazer necessária apenas quando essa clareza não estiver presente. Como diz Rizzatto
Nunes, "a função do intérprete é trazer para outra linguagem aquela linguagem da norma jurídica, que não está muito
clara" [23], porque "normas jurídicas claras são compreendidas como linguagem natural, que, pela evidência,
dispensam fixação de sentido e alcance" [24] e "as que não são claras naturalmente precisam do trabalho de
interpretação" [25].
A interpretação jurídica, que ocorre sempre que a norma jurídica objeto do estudo não for suficientemente clara, deve
buscar sempre o sentido pretendido pela própria lei (mens legis) e não o sentido pretendido pelo legislador (mens
legislatoris). É que, após editada uma lei, a opinião do legislador já não tem importância, pois a norma ganha vida
própria, submetendo o próprio legislador, que também estará obrigado a cumpri-la [26].
Por fim, para fixar o sentido e o alcance da norma, o intérprete deve observar algumas regras de interpretação, como
observa Rizzatto Nunes, no seu Manual de introdução ao estudo do direito:
Interpretação Gramatical: "É através das palavras da norma jurídica, nas suas funções sintática e semântica, que o
intérprete mantém o primeiro contato com o texto posto" (p. 262).
Interpretação Lógica: "A interpretação lógica leva em consideração os instrumentos fornecidos pela lógica para o
ato de intelecção, que, naturalmente, estão presentes no trabalho interpretativo" (p. 265). "A lógica comparece
também através dos raciocínios, como o indutivo e o dedutivo" (p. 266).
Interpretação Sistemática: "cabe ao intérprete levar em conta a norma jurídica inserida no contexto maior de
ordenamento jurídico. (...) . O intérprete, em função disso, deve dar atenção à estrutura do sistema, isto é, aos
comandos hierárquicos, à coerência das combinações entre as normas e à unidade enquanto conjunto normativo
global" (p. 267). "A interpretação sistemática leva em conta, também, a estrutura do sistema jurídico: a hierarquia, a
coesão e a unidade" (p. 269).
Interpretação Teleológica: "A interpretação é teleológica quando considera os fins aos quais a norma jurídica se
dirige" (p. 269).
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Interpretação Histórica: "é a que se preocupa em investigar os antecedentes da norma" (p. 272)
Declarativa ou especificadora: "aquela em que o intérprete se limita a ‘declarar’ o sentido da norma jurídica
interpretada, sem amplia-la nem restringi-la. (...). A declarativa, que pode ser chamada também de especificadora,
seria o resultado normal e rotineiro do trabalho do intérprete na fixação do sentido e alcance da norma jurídica" (p.
273).
Restritiva: "é a que restringe o sentido e alcance apresentado pela expressão literal da norma jurídica. (...). O
resultado, ainda que conhecido como restritivo, de fato, fixa o sentido e o alcance da norma jurídica, nos limites
exatos em que ela já deveria estar" (p. 274).
Extensiva: "amplia o sentido e o alcance apresentado pelo que dispõe literalmente o texto da norma jurídica" (p.
274).
Há, por fim, que se considerar o problema das lacunas nas normas jurídicas. Nem sempre o legislador consegue
abranger todas as situações possíveis de acontecer. Por isso, pode haver casos não estão previstos em lei, criando-se
verdadeiro vazio, ou lacunas, nas normas jurídicas. A superação dessas falhas se dará observando-se e interpretando-
se o sistema jurídico. De acordo com Rizzatto Nunes, "integração é o meio através do qual o intérprete colmata a
lacuna encontrada. (...). Constatada esta, parte para colmatá-la pela analogia ou pelos princípios gerais do Direito" [27].
Analogia é a passagem de um caso particular para outro particular, sem a necessidade da generalização [28]. Assim,
"se o intérprete não conseguir preencher a lacuna pelo uso da analogia, por ausência de casos semelhantes
normatizados, deve, então, servir-se dos ‘princípios gerais do Direito’ para a colmatação" [29].
A equidade, por sua vez, "implica um modo de avaliação do ato interpretativo mais amplo do que apenas o de ser a
última alternativa para a colmatação (...). Equidade é, assim, uma colmatação justa da falha do ordenamento jurídico"
[30]
.
Tivemos oportunidade de mencionar, alhures, que a norma jurídica está vinculada a um sistema jurídico e sua
interpretação deve ser feita sempre com base nesse mesmo sistema.
Segundo lição do professor Rizzatto Nunes, "sistema é uma construção científica composta por um conjunto de
elementos. Estes se inter-relacionam mediante regras. Tais regras, que determinam as relações entre os elementos do
sistema, forma sua estrutura" [31].
No caso do sistema jurídico, os elementos serão as normas jurídicas, e a sua estrutura é formada pela hierarquia, pela
coesão e pela unidade, assim definidos por Rizzatto Nunes:
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A hierarquia vai permitir que a norma jurídica fundamental (a Constituição Federal) determine a validade de todas as demais
normas de hierarquia inferior.
A coesão demonstra a união íntima dos elementos (normas jurídicas) com o todo (o sistema jurídico), apontando, por
conexão, para ampla harmonia e importando em coerência.
A unidade dá um fechamento no sistema jurídico como um todo que não pode ser dividido: qualquer elemento
interno (norma jurídica) é sempre conhecido por referência ao todo unitário (o sistema jurídico). [32]
As normas jurídicas estão não só vinculadas como inseridas num ordenamento jurídico que tem um formato que
permite o seu funcionamento e que dá sentido a si mesmo como um todo complexo de normas, que se inter-
relacionam e influem como comandos no meio social [33].
A referência a essa inter-relação das normas jurídicas pressupõe a existência de elementos que estabeleçam uma
ligação, obtendo assim o conceito de sistema. Tais elementos, que têm a função de amarra-las numa coerência lógica,
são os princípios, que tendo alto grau de abstração e generalidade, irão permear todo o sistema jurídico [34].
A noção de sistema jurídico é imprescindível para o sucesso da interpretação. Qualquer trabalho de interpretação
jurídica deve, necessariamente, observar o sistema jurídico vigente. Nos dizeres de Rizzatto Nunes, "a maneira pelo
qual o sistema jurídico é encarado, suas qualidades, suas características são fundamentais para a elaboração do
trabalho de interpretação" [35].
2. PRINCÍPIOS
Princípios são as bases fundamentais de qualquer ciência. São as diretrizes básicas que irão guiar o caminho a ser
trilhado por aquela ciência. Conforme definição de José Cretella Jr., "princípios de uma ciência são as proposições
básicas fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturações subseqüentes. Princípios, nesse sentido, são os
alicerces da ciência" [36].
Para Miguel Reale, "princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por
serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional,
isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da práxis" [37].
Celso Bandeira de Melo informa que princípio é o "mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,
disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para
sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativo, no que
lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico" [38].
Encontramos diversas acepções para o termo princípio, com significados diversos. Todavia, todas elas ressaltam um
aspecto seminal e organizativo. Com base nisso, pode-se dizer que o termo "princípio" designa uma entidade presente
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em qualquer objeto que se possa intencionar, que faz parte desse objeto como seu início, fundamento, idéia ou forma
[39]
.
É assim, o princípio, o primeiro passo na consecução de uma regulação, ao qual devem se seguir todos os demais. De
acordo com a lição de José Afonso da Silva, "os princípios são ordenações que se irradiam e imantam os sistemas de
normas, são (como observam Canotilho e Vital Moreira) ‘núcleos de condensações’ nos quais confluem valores e
bens constitucionais." [40].
Destarte, podemos afirmar que os princípios contêm um norte, uma direção a ser seguida, mais abrangente do que
uma simples regra e que embasa a ciência, visando sua correta compreensão e interpretação [41].
Os princípios informam, orientam e inspiram as normas jurídicas, além de sistematizarem e darem organicidade aos
institutos.
No caso das ciências jurídicas, os princípios são os fatores mais importantes a ser considerados por todos aqueles
que, de algum modo, a elas se dirijam, e que devem, primeiramente, considerar os princípios norteadores de todas as
demais normas jurídicas existentes [42]. Todas as normas jurídicas devem ser analisadas à luz dos princípios que as
informam.
Princípio é aqui utilizado como alicerce ou fundamento do Direito, como observa Paulo Affonso Leme Machado, que
cita a lição de Gomes Canotilho:
Os princípios são normas jurídicas impositivas de uma optmização, compatíveis com vários graus de concretização, consoante os
condicionalismos fácticos e jurídicos. Permitem o balanceamento de valores e interesses (não obedecem, como as regras, à
"lógica do tudo ou nada"), consoante o seu peso e ponderação de outros princípios eventualmente conflitantes. São "padrões
juridicamente vinculantes radicados nas exigências de justiça" (Dworkin) ou na "idéia de direito" (Larenz). [43]
Segundo esclarece o professor Rizzatto Nunes, "nenhuma interpretação será bem feita ser for desprezado um
princípio" [44]. Para Sérgio Sérvulo da Cunha, "princípio jurídico é uma prescrição que estabelece para o legislador
uma preferência, ou mediante a qual o legislador estabelece uma preferência" [45].
Conforme observa Robert Alexy [46], princípios seriam mandados de otimização, ou seja, normas que ordenam algo
que deve ser realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes; que podem ser
cumpridos em diferentes graus e que a medida devida de seu cumprimento depende não somente das possibilidades
reais, mas também das jurídicas.
Ainda segundo Rizzatto Nunes, princípio é "um axioma inexorável e que, do ponto de vista do Direito, faz parte do
próprio linguajar desse setor de conhecimento. Não é possível afastá-lo, portanto." [47]
É de ressaltar, todavia, que um princípio não dispõe sobre as condições que tornam sua aplicação necessária. Ao
contrário, ele vai estabelecer um motivo (razão ou fundamento) que servirá de guia para o intérprete, mas que não
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exige uma decisão única. Pode ocorrer de um princípio, em determinada situação fática, e em confronto com outro
princípio, não prevaleça. Mas isso não vai significar, de maneira nenhuma, que ele tenha pedido sua condição de
princípio, que não pertença mais ao sistema jurídico [48].
Princípios jurídicos são os princípios relacionados ao Direito. Roque Carraza, citado por Márcia Dominguez Nigro
Conceição, define princípio jurídico como sendo "um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grande
generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo
inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam" [49].
Os princípios jurídicos podem ser explícitos ou implícitos. São implícitos quando permanecem ocultos sob a
materialidade dos elementos, sob a literalidade do texto. Serão explícitos quando são expressamente formulados,
independentemente de sua natureza, manifestando-se como elementos do sistema [50].
Os princípios jurídicos constituem uma vertente particular da Ciência do Direito. R. Limongi França [51] anota a
existência de três correntes que procuram defini-los:
a) positivista, que afirma se tratar tão-só dos princípios esposados expressa ou implicitamente pelo legislador.
b) científica estrita, que reconhece além daqueles a possibilidade do recurso a princípios que "correspondem àquele
ordenamento imanente às relações da vida"
c) científica propriamente dita, que esclarece de modo iniludível que, juntamente com princípios do ordenamento, se
incluem os princípios do direito natural.
Somente o princípio que não é expresso reclama a atenção do intérprete. O princípio explícito, aquele que já está
expresso na norma jurídica, não carece de interpretação. Por outro lado, o princípio implícito, ou seja, aquele não
expresso em dispositivo legal, será revelado pelo intérprete, pelo cientista do Direito, com base na norma jurídica
posta. Conforme entendimento de Fábio Ulhoa Coelho,
os princípios do direito, quando não se expressam por um dispositivo, são revelados pela tecnologia jurídica.
Debruçam os tecnólogos sobre o ordenamento jurídico e procuram encontrar os valores fundamentais que o inspiram.
Sintetizam, então, esses valores em preceitos com a mesma estrutura das normas jurídicas. [52]
Dentro do sistema, os princípios estão situados na mais alta posição. São os princípios as estrelas máximas do
universo ético-jurídico [53]. Eles encontram-se "no ponto mais alto de qualquer sistema jurídico, de forma genérica e
abstrata, mas essa abstração não significa inincidência no plano da realidade." [54]. Tal afirmação decorre do fato de
que norma jurídica incide no plano real e, uma vez que elas devem respeitar os princípios, acabam por conduzi-los à
concretude [55].
Silvio de Salvo Venosa explica que, por conta dos princípios, "o intérprete investiga o pensamento mais alto da
cultura jurídica universal, buscando uma orientação geral do pensamento jurídico" [56].
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Assim, podemos afirmar que os princípios jurídicos são o ponto de partida do sistema jurídico, normas centrais das
quais se origina todo o ordenamento jurídico, correspondendo ao seu alicerce e atribuindo-lhe sustentação e unidade.
Os princípios jurídicos têm várias funções. Sérgio Sérvulo da Cunha anota seis [57]: a) gerar normas (função
nomogenética); b) orientar a interpretação (função hermenêutica); d) inibir a eficácia de norma que os contrarie
(função inibitória); d) suprir a falta de norma (função supletiva); e) regular o sistema (função de regulação do
sistema); f) projetar o texto sobre a sociedade (função de projeção). Observamos, todavia, que as funções mais
importantes são a informadora, a normativa e a interpretativa, na esteira do pensamento de Américo Plá Rodrigues,
citado por Arnaldo Süssekind, para quem os princípios são
linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções, pelo que
podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e
resolver casos não previstos [58].
A função informadora tem por objetivo servir de inspiração ao legislador. Ela serve de fundamento para as normas
jurídicas.
A função normativa age como uma fonte supletiva, em casos de lacuna ou de omissão da lei.
No Brasil, começamos a nos dar conta da existência dos princípios quando o Código Civil de 1916, no art. 7º de sua
introdução, incluiu os "princípios gerais de direito" entre as fontes de Direito: "Aplicam-se nos casos omissos as
disposições concernentes aos casos análogos, e, não as havendo, os princípios gerais de direito" [59].
A Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº 4.657) traz em seu art. 4º o comando de que "quando a lei for
omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito", idéia repetida
no art. 126 do Código de Processo Civil:
O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-
lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Hoje, porém, os princípios gerais do direito devem ser encarados como muito mais do que apenas fonte supletiva do
direito para serem aplicados na omissão ou imprecisão da lei. Na lição de Manoel Alonso Oléa, citada por Arnaldo
Süssekind [60], eles consistirão num critério geral de ordenação, que inspira todo o sistema, com múltiplos efeitos.
A melhor forma de se interpretar tais dispositivos legais, fazendo uso das anotações de Rizzatto Nunes, é de que "o
intérprete tem sempre de constatar que o sistema jurídico legal – escrito e não escrito (costumes) – está assentado em
princípios. Em última instância haverá sempre um princípio a ser invocado..." [61].
Necessário, então, fazer uma distinção entre princípio e norma, como forma de especificar a atuação de um ou de
outro dentro do sistema jurídico posto, vez que não mais se discute a existência de ambos em funcionamento
obrigatório [62].
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Normas jurídicas tem a função de regras, estando fundamentadas nos princípios, que no nosso sistema constitucional
agasalham os direitos fundamentais.
Os princípios, por sua vez, têm um nível mais alto de generalidade e abstração do que a mais geral e abstrata das
normas [63].
Da lição de José Afonso da Silva [64], extrai-se que "normas são preceitos que tutelam situações subjetivas de
vantagem ou de vínculo" ao passo que "princípios são ordenações que irradiam ou imantam os sistemas de normas".
normas jurídicas não consistem simplesmente em proposição de dever-ser: são proposições hipotéticas de dever-ser, que dispõem
abstratamente para o que pode vir a acontecer. Sua fórmula canônica é esta: se x, logo y; ou seja: acontecendo x, deve seguir-se y.
Distinguem-se portanto de determinações, por um lado, e de princípios, por outro [65].
Já os princípios "são opções valorativas implicadas, como fundamento, no enunciado das normas" [66].
Com isso, o autor acima citado cria uma interessante metáfora, na qual "toda norma deveria ser lida como se fosse o
parágrafo de um artigo cujo ‘caput’ compreende os princípios de que se irradia, e que justificam sua existência como
norma" [67].
Mas é importante lembrar, como o faz Sérgio Sérvulo da Cunha, de que é impossível construir um sistema jurídico
composto apenas por princípios, pois sua exigibilidade supõe a existência das normas. Para o referido autor, "a
mediatidade é característica do princípio jurídico, assim como a imediatidade é característica da norma" [68].
A doutrina é unânime em considerar que nenhum ramo jurídico é autônomo, porque sempre mantém relações com
outros ramos, valendo-se de institutos e conceitos destes, ou emprestando-lhes esses mesmos elementos. Portanto,
não há um ramo jurídico isolado ou que não recorra a institutos de outros ramos para regular o comportamento
humano. Entretanto, essa regulação pode ocorrer com maior ou menor rigor formal, segundo esquemas normativos,
que correlacionam uma dada classe de ações à classe de sanções que melhor se adequa, uma vez normatizada, à
espécie de conduta praticada, podendo corresponder ou não a uma violação penal.
Na lição de Miguel Reale [69], o Direito é uma das ciências que mais depende do elemento tipológico (forma
adaptável de categorização como momento essencial do saber científico). E que os tipos são formas de ordenação da
realidade em estruturas ou esquemas, representativos do que há de essencial entre os elementos de uma série de fatos
ou de entes que interessam. E que a razão dessa necessidade tipológica prende-se a elementos de certeza e de
segurança reclamados pela vida jurídica.
Importante observar, ainda, conforme o mesmo autor, que a Ciência Jurídica, como as demais ciências, processa-se
sempre segundo dupla ordenação, uma de natureza tipológica e outra de natureza legal.
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Além do elemento tipológico, as ciências também trabalham com leis. E, lei aqui deve ser entendida em sua acepção
mais geral, devendo abranger tanto as leis que se enunciam no saber físico-matemático, como as possíveis no plano
das chamadas ciências culturais, em cujo âmbito se situa a Ciência do Direito.
Desse modo, o Direito, como ciência, não pode deixar de considerar as leis que enunciam a estrutura e o
desenvolvimento da experiência jurídica, ou seja, aqueles nexos que com certa constância e uniformidade, ligam
entre si e governam os elementos da realidade jurídica, com o fato social.
Entre os juristas, porém, a palavra lei tem outro sentido mais usual, é uma espécie de regra ou de norma, e sobre as
leis desenvolvem doutrinas, ou seja, sobre as regras jurídicas formuladas pelos órgãos do Estado, diferençando-as das
regras elaboradas pela própria sociedade, através dos usos e costumes, aí não se tratando mais de juízos enunciativos
de realidade, mas de juízos normativos de conduta.
Tanto no Direito quanto nas demais ciências, o trabalho da inteligência se desenvolve através de três ordenações, que
são os tipos, as leis e os princípios, de cuja relação resulta a unidade de um sistema, no presente caso, o sistema
jurídico.
Logo, se percebe que não há ciência sem princípios, e que estes são verdades válidas para um determinado campo de
saber, ou para um sistema de enunciados lógicos. Daí, que o Direito, como ciência, também se funda em princípios,
uns de alcance universal nos domínios da Lógica Jurídica, outros que se situam no âmbito de seu campo de pesquisa.
Os princípios, no Direito, na definição de Miguel Reale, são
verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um
sistema de conceitos relativos a dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições que,
apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes de validez de um sistema particular de
conhecimentos, como seus pressupostos necessários [70].
é o mandamento nuclear de um determinado sistema; é o alicerce do sistema jurídico; é aquela disposição fundamental que, por
ser de hierarquia superior, influencia e repercute sobre todas as demais normas do sistema e sobre o modo de aplicá-las .
[71]
Para Geraldo Ataliba, citado por Rizzatto Nunes, "princípios são linhas-mestras, os grandes nortes, as diretrizes
magnas do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos por toda a sociedade e obrigatoriamente
perseguidos pelos órgãos do governo (poderes constituídos)." [72].
Reconhece-se, assim, a relevância dos princípios para a formação, desenvolvimento e interpretação do sistema
jurídico. Paulo Bonavides [73] reconhece que os princípios, ao saírem dos códigos para as constituições, do Direito
Privado para o Direito Público, da dogmática civilista para a dogmática constitucional, promoveram uma completa
revolução no modo de se compreender, interpretar e aplicar as normas integrantes do sistema jurídico.
Os princípios, portanto, são comandos genéricos dispostos em normas ou doutrinas com o intuito maior de servir de
fonte de inspiração ao legislador e determinar o modo de atuação do administrador. Não se trata unicamente de
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elemento genérico a ser apenas comentado em textos doutrinários e criados a parte de instrumentos normativos. São
bases estruturais que devem, necessariamente, ser observados pelos comandos normativos subseqüentes a sua
afirmação.
Justifica-se, assim, a necessidade de aprofundar o estudo dos princípios utilizados no Direito, enquanto ciência.
Um estudo mais atento das diversas abordagens a respeito dos princípios resulta na observação de que sempre os
princípios foram identificados por sua generalidade, indeterminação, caráter programático, elevada posição
hierárquica, assumindo função determinante no sistema jurídico e também por desempenhar função interpretativa.
Paulo Bonavides [74], ao tratar da juridicidade dos princípios, distingue três fases: a jusnaturalista, a positivista e a
pós-positivista.
A fase jusnaturalista vislumbra os princípios numa dimensão ético-valorativa, identificando-os com o direito ideal, com os
postulados de justiça, sempre baseados na justa razão e visto como "um conjunto de verdades objetivas derivadas da lei divina e
humana", onde é nula e duvidosa a normatividade dos princípios e onde a insuficiência do ordenamento jurídico deveria ser
suprida pelo recurso a uma lei natural, eterna e imutável, distinta do sistema normativo institucionalizado.
Existem princípios, segundo Miguel Reale, [75] que por serem comuns a todas as ciências são denominados universais
ou omnivalentes, outros regionais ou plurivalentes por serem comuns a um grupo de ciências, e outros monovalentes
por só servirem de fundamento a um único campo de enunciado científico.
Portanto são os princípios elementos básicos que sustentam as ciências existindo entre eles diferenças de delimitação
e de amplitude na estrutura geral do conhecimento humano.
Atualmente, o estudo dos princípios ocupa significativo espaço na teoria do Direito, com reflexos diretos na
compreensão do Direito como um todo, mormente o constitucional. Os princípios em termos constitucionais adotam
posição de norma de observância obrigatória e de proteção de uma classe de bens ou categoria de pessoas que a
norma, por bem, quis albergar.
Os princípios constitucionais são o ponto mais importante do sistema normativo, constituindo verdadeiras vigas
mestras, que alicerçam o sistema jurídico. O princípio jurídico constitucional irá influir na interpretação até mesmo
das próprias normas constitucionais [76].
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Ao falar-se em princípios, expressivo número de entendimentos e de variáveis pode ser levantado, o que permite
constatar a existência de várias categorias de princípios. Os aqui enfocados têm maior relevância por serem expressos
na Constituição.
Canotilho [77] ao classificar os princípios constitucionais apresenta a seguinte tipologia: Princípios jurídicos
fundamentais, que são "os princípios historicamente objetivados e progressivamente introduzidos na consciência
jurídica e que encontram uma recepção expressa ou implícita no texto constitucional". Princípios politicamente
conformadores, que condensam as opções políticas mais importantes e traduzem a ideologia que inspira a
constituição, compondo o "cerne político de uma constituição política", ou seja, são os princípios que definem a
forma e a estrutura de Estado e fixa as estruturas do regime político, da forma de governo e da organização política.
Princípios impositivos são considerados aqueles princípios que impõem aos órgãos do Estado e principalmente ao
legislador a realização de fins e a execução de tarefas, traçando linhas de atividade política e legislativa. Princípios–
garantia, aqueles que objetivam instituir de maneira direta e imediata uma garantia, possuindo menor grau de
vagueza e com maior força normativa, por isso se aproximam das regras, vinculando o legislador diretamente na sua
aplicação.
Os princípios constitucionais são de duas categorias: princípios políticos e princípios jurídicos. Os primeiros
constituem-se daquelas decisões políticas fundamentais concretizadas em normas conformadoras do sistema
constitucional positivo, também conhecidas como normas-princípio, das quais derivam as normas particulares que
regulam relações específicas da vida social. Por sua vez, os segundos são os princípios constitucionais gerais,
informadores da ordem jurídica nacional. Estes princípios decorrem de certas normas constitucionais e, são
desdobramentos ou princípios derivados dos princípios fundamentais.
[78]
Os princípios fundamentais da Constituição de 1988 foram identificados por José Afonso da Silva , que lhes
atribuiu a seguinte classificação:
a) princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania,
Estado Democrático de Direito (art. 1º);
b) princípios relativos à forma de governo e à organização dos poderes: República e separação dos poderes (arts. 1º
e 2º);
c) princípios relativos à organização da sociedade: principio da livre organização social, principio de convivência
justa e principio da solidariedade (art. 3º, I);
d) princípios relativos ao regime político: principio da cidadania, principio da dignidade da pessoa, principio do
pluralismo, principio da soberania popular, principio da representação política e principio da participação popular
direta (art. 1º, parágrafo único);
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f) princípios relativos à comunidade internacional: da independência nacional, do respeito aos direitos fundamentais
da pessoa humana, da autodeterminação dos povos, da não-intervenção, da igualdade dos Estados, da solução
pacifica dos conflitos e da defesa da paz, do repúdio ao terrorismo e ao racismo, da cooperação entre os povos e o da
integração da América Latina (art. 4º)"
O princípio da unidade da constituição estabelece que o ordenamento jurídico constitui uma unidade, tendo as
normas à mesma importância e sendo interdependentes, daí porque a classificação dos princípios constitucionais,
antes de implicar em uma hierarquia normativa, que não existe, implica numa análise em conjunto, devendo os
princípios ser examinados procurando-se harmonizar tensões e contradições existentes entre eles.
Assim, tendo abordado a classificação, que se apresenta como relevante, a questão dos princípios plurivalentes ou
onivalentes e aqueles monovalentes ou setoriais.
Os princípios de ordem constitucionais têm relevante papel no ordenamento jurídico nacional, eis que orientam,
informam, condicionam e iluminam o caminho da interpretação jurídica, servindo de guia mor ao cientista do Direito.
Sendo normas qualificadas, eles irão dar coesão ao sistema jurídico, exercendo importante fator de aglutinação [79].
Ao contrário dos ordenamentos hodiernos, que se deixa à doutrina e a lei infraconstitucional a tarefa de reconhecer os
princípios, nossa Magna Carta preferiu alberga-los de maneira a torná-los mais sólidos e expressivos em face dos
existentes em nível hierárquico inferior e é por tal razão que podemos classifica-los como "verdadeiras supranormas"
[80]
, porque, "uma vez identificados, agem como regras hierarquicamente superiores às próprias normas positivadas no
conjunto das proposições escritas ou mesmo às normas costumeiras." [
Concluindo:
Numa lógica bivalente em que todo o juízo é necessariamente verdadeiro ou falso, os três princípios fundamentais da
lógica são estreitamente solidários: não são verdadeiramente distintos, mas três formulações de uma mesma exigência.
Sinteticamente enunciam-se deste modo:
Duas proposições contraditórias, quer dizer, que são a negação uma da outra, não podem ser ambas verdadeiras nem
ambas falsas; se uma é verdadeira a outra é falsa, e, reciprocamente se uma é falsa, a outra é verdadeira.
Este princípio garante o funcionamento e a coerência do pensamento, o uso do verdadeiro e do falso e impede-o de se
contradizer.
113
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Exercício
6. Como se enuncia o princípio de identidade?
A. Uma coisa é o que não é; o que é, é e o que não é, não é.
B. Uma coisa é o que é; o que é, é e o que não é, é e não é.
C. Uma coisa é o que é; o que é, não é e o que não é, não é.
D. Uma coisa é o que é; o que é, é e o que não é, não é.
9. O enunciado: “uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo, segundo uma mesma
perspectiva ( em termos de proposições: uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao
mesmo tempo)”, chama-se princípio...
A. de identidade. B. do terceiro excluído. C. de contradição. D. de discrepância.
A Lógica Formal
A lógica formal estuda as leis a que devem obedecer as operações da inteligência para serem válidas e poderem
atingir a verdade. Ela compreende três partes: a apreensão (conceito ou ideia), o juízo e o raciocínio.
Na apreensão falamos da lógica do conceito, pela qual se obtém uma ideia ou conceito; no juízo trata-se da lógica
do juízo pelo qual se afirma ou nega uma relação entre duas ideias e no raciocínio (lógica do raciocínio) pelo
114
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qual, de dois ou mais juízos conhecidos, concluímos um outro juízo desconhecido que daqueles deriva
necessariamente.
1. LÓGICA DO CONCEITO
Tradicionalmente há três principais domínios da lógica: lógica do conceito, lógica do juízo e lógica do raciocínio.
Em rigor a lógica diz particularmente respeito ao raciocínio, ou seja ao discurso correcto do pensamento no
trânsito de umas proposições a outras.
Por vezes opõe-se o conceito ao termo. O termo é a simples expressão do conceito. O termo pode ser mental,
quando pensado e equivale ao conceito. O termo pode ser oral ou escrito quando a palavra é falada ou escrita que
exprime um conceito.
O conceito ou ideia chama-se também noção, quando se quer fazer conhecer a outrem coisas novas por
intermédio da linguagem.
1.1. Noção:
Conceito é o acto mental pelo qual se confere uma certa qualidade ou qualificação a uma certa classe de
objectos com características comuns; é a apreensão pela mente da essência, ou seja, das características
determinantes de um objecto.
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Segundo Sócrates, conceito, é a síntese das propriedades comuns aos seres que formam uma classe. Por consequência, o
conceito apresenta a soma dos conhecimentos que possuímos acerca de um determinado conjunto de seres.
Assim, por exemplo, quando digo cadeira, estou a falar de um conceito, isto é de uma representação, um desenho mental
que reúne as características comuns de uma classe de objectos singularmente diferentes pois há uma cadeira metálica, de
madeira, de palha, de rodas, com encosto de braços etc. Todas são cadeiras embora diferentes entre si, têm algo de comum
pelo qual são diferentes de objectos da classe de Mesa, carteira.
Termo — é a expressão verbal, a manifestação exterior do conceito por meio da palavra, tal como a linguagem é a
exteriorização do pensamento. Só através de uma palavra, e encarnada numa palavra a ideia pode ganhar vida e ser
conhecida quer por nós, quer outras pessoas. É a roupagem convencional e simbólica do conceito.
Todavia, é preciso dizer e frisar desde já que um termo não corresponde obrigatoriamente a uma palavra, pois um termo
pode ser formado por uma ou várias palavras. O exemplo abaixo confirma isso.
Os conceitos vão desde ideias sobre as coisas muito simples até as complexas que exigem abstracção de alto nível
dos objectos. O pensamento, o progresso e o desenvolvimento em todos os domínios da actividade humana
dependem da exactidão dos nossos conceitos. Não podemos pensar bem em qualquer campo de conhecimento
sem conhecermos os conceitos sistemáticos em que esse campo assenta. Os níveis avançados em qualquer
disciplina baseiam-se em conceitos complexos, especializados e muitas vezes difíceis de compreensão
116
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a) Noções:
A lógica considera nas noções e termos duas propriedades essenciais: a extensão e a compreensão.
A extensão (denotação) de um conceito ou termo é o conjunto de seres, indivíduos ou objectos aos quais a ideia
se aplica, ou que a ele abrange.
A ideia de homem convém a moçambicanos, portugueses, franceses brancos amarelos, Manuel, Rosa, etc.
A Compreensão (conotação ou intenção) de um conceito ou termo é o conteúdo que a análise descobre nessa
ideia, ou seja, o conjunto das suas qualidades ou características esse conceito designa.
A compreensão da ideia de homem implica os seguintes caracteres: ser, animal, vertebrado, mamífero, racional,
etc.
Denomino homem a João, Pedro, etc. Os seus avós tinham aquela mesma denominação; chamar-se-á assim
também aos seus descendentes. O conjunto dos objectos dos quais se pode dizer que são homens, eis a extensão
do termo. Mas para que João, Pedro, Paulo e outros indivíduos possam chamar-se homens, cumpre que possuam
todas certas qualidades: que sejam seres vivos, animais, vertebrados, bímanos entre os mamíferos. A soma destas
qualidades é a compreensão do termo homem.
Comparemos e ordenemos, por exemplo, os conceitos segundo a sua compreensão cresça e decresça: ser, animal,
homem, ser vivo, africano e moçambicano. O que observamos é que o conceito ser continua a ter menor
compreensão que os restantes, seguido pelos conceitos ser vivo, homem, africano até ao conceito moçambicano
que possui a maior compreensão de todos. A esta ordem de compreensão chamamos crescente. Ou seja:
Compreensão crescente ser, ser vivo, animal, homem, africano, moçambicano. Compreensão decrescente
O mesmo exercício pode ser feito tendo em conta a extensão dos mesmos conceitos. Ou seja, podemos ordenar os
mesmos conceitos em extensão quer crescente quer decrescente. A via mais rápida e segura de o fazermos, é
aplicar, sobre os conceitos já ordenados acima, a regra da relação inversa da compreensão e extensão.
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Ou seja, se o conceito ser tem menor compreensão, então terá, segundo a regra da relação inversa, maior extensão
de todos os conceitos. Igualmente, se o conceito moçambicano possui maior compreensão, também possui,
segundo a mesma regra, menor extensão de todos os restantes. Assim, seguir a ordem começando de ser (maior
extensão) até moçambicano (menor extensão) como está acima, corresponde à extensão decrescente. O inverso
dessa ordem, na extensão, será crescente.
Extensão decrescente ser, ser vivo, animal, homem, africano, moçambicano. Extensão crescente
Concl: A compreensão e a extensão de um ( ou uma lista de) conceito(s) variam na ordem inversa, como mostra
o exemplo anterior. Isto é, quanto maior compreensão possuir um conceito, menor extensão ele tem; se for maior
em extensão, menor será em compreensão, vice-versa:
Compreensão crescente é de menor compreensão para maior compreensão
Compreensão decrescente é de maior compreensão para menor compreensão
Extensão crescente é de menor extensão para maior extensão
Extensão decrescente é de maior extensão para menor extensão; isto é:
Se a compreensão está a crescer, a extensão está a decrescer; e se a compreensão esta a decrescer, a extensão esta
a crescer.
N.B: Do ponto de compreensão e a extensão, estabelecem entre si uma relação inversa, deduzem se
consequências importantes:
a). quando se pede para organizar vários conceitos por ordem crescente de compreensão (do menos compreensivo
para o de maior compreensão), isso corresponde a organizá-los de mais extenso para o menos extenso;
b). Quando se pede para organizar vários conceitos por ordem decrescente de compreensão (do mais
compreensivo para o de menor compreensão), isso corresponde a alinhá-los do menos extenso para o mais
extenso.
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Entre a extensão e a compreensão de um conceito estabelece-se uma relação qualitativa que varia na sua relação
inversa: quanto maior for a extensão, menor será a compreensão, quanto menor for a extensão, maior será a
compreensão.
O género diz-se próximo ou supremo, consoante o grau da sua generalidade. O género próximo é a ideia de
generalidade imediatamente superior à ideia que é espécie (animal em relação a homem); o género supremo
representa as grandes classes dos seres ou as grandes divisões do ser. Às ideias que constituem os géneros
supremos chamam-se categorias.
A diferença específica é a característica que se junta ao género próximo para constituir a espécie, aumentando-lhe
a compreensão (racional que se junta ao género animal para constituir a espécie homem). O género próximo e a
diferença especifica são os caracteres essenciais de qualquer ser.
Ex: o homem (espécie), é um animal (género próximo) racional (diferença específica).
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EXERCÍCIOS
1. Atendendo à sua compreensão e extensão, estabeleça a relação que existe entre os seguintes pares de
conceitos.
a) Animal – crocodilo
R/ O crocodilo é menos extenso do que animal, possui maior compreensão do que animal.
b) Inglês – britânico
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R/ O conceito britânico tem maior extensão que o conceito inglês. Este tem maior compreensão que aquele.
c) Racismo / nazismo
d) Catalão / espanhol
d) Golfinho / mamífero
2. Mostre como a extensão e compreensão dos conceitos romano e italiano; moçambicano e maputense estão
numa relação inversa.
3. Organize cada um dos grupos de conceitos por ordem decrescente de extensão (do + extenso para o –
extenso).
a) Animal, felino, lince, mamífero.
R/ Animal, mamífero, felino, lince.
b) Orquídea, flor, ser vivo, vegetal.
R/ Ser vivo, vegetal, flor, orquídea.
c) Meio de Transporte, comboio, transporte ferroviário, comboio de passageiro.
4. São apresentados três conceitos para que indiques qual deles é de maior extensão e qual deles é de maior
compreensão.
- Utensílio doméstico, garfo, talher.
c) Doce / amargo
1.5. A DEFINIÇÃO
1.5.1. Noção:
Etimologicamente a palavra definir provém do latim “definire”, vocábulo que inclui o termo “finis” que
significa limite e fronteira. Neste sentido definir significa demarcar, delimitar fronteiras de um conceito
relativamente a outros. A definição é uma operação lógica que consiste em delimitar com exactidão a
compreensão dum conceito, a fim de o distinguir dos outros, ou seja, explicitação e especificação do seu
significado.
Exemplo: definir o “gato” é evidenciar ou determinar de forma rigorosa as características que o identificam
(ser animal que mia) distinguindo-o deste modo de outros animais.
Por isso, a definicao assume uma importância determinante na sistematização do conhecimento em geral e na
produção do conhecimento científico e policial em particular. O rigor científico e qualquer trabalho de
investigação seja ele de publicação científica ou de carácter policial depende do rigor dos conceitos utilizados
e das definições que traduzem com precisão esses conceitos.
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(o que há de comum) do conceito que pretendemos definir e a sua diferença específica (o que lhe é próprio),
pelo qual se distingue uma dada espécie das outras do mesmo género.
Exemplo: O homem (definido ou espécie) é animal (género próximo) racional (diferença especifica).
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Nesta definição atribui-se ao sujeito “gato” dois predicados “animal” e “miar” que é uma característica que só
pertence aos gatos e só a eles. Ou ainda a característica “miar” só convém ao animal gato e nada mais. Assim,
cumpre-se a exigência da reciprocidade porque podemos converter o sujeito e o predicado sem alterarmos a
veracidade da definição. Na verdade dizer “o gato é animal que mia” é o mesmo que dizer “animal que mia é o
gato”. Se definíssemos o gato como animal mamífero de quatro patas a nossa definição estaria incorrecta, por ser
muito ampla, facto que não permite a reciprocidade.
2ª A definição não deve ser circular ou o termo a definir não deve entrar na definição (regra da não
circularidade)
Esta definição permite que a definição seja mais clara, ou seja, aquilo que atribuímos ao sujeito deve acrescentar
algo ao seu conceito. Isto é o predicado não deve repetir o sujeito por outras palavras.
Exemplo: Agradável é aquilo que agrada; Ex.2: O homem é um ser humano.
Dizer “O homem é um ser humano” é dizer “o homem é homem”. O definido entra na definição e assim não
definimos o homem.
Definir uma coisa pelo seu oposto é, muitas vezes, violar a regra da não circularidade.
Exemplo: Grande é o que não é pequeno. Ex. 2: Torto é o que não está direito.
Ex.: a) “O futebol é a alegria do povo” b) O amor é fogo que arde sem se ver”.
b) “ A beleza é uma promessa de felicidade c) A beleza é o espelho da eternidade”.
b). O género supremo devido ao excesso da sua extensão (Mundo, Humanidade, Deus), isto porque toda a
definição começa pela inclusão de um espécie e um género, e os géneros supremos não tem género que possa
incluir-se
c). Os dados imediatos da experiência (o prazer, o amor, a dor), não são possíveis de obter dos dados da
experiência uma definição que torne mais claros.
Finalmente, sublinhemos um facto importante: não é possível tudo definir, ou, por outras palavras, há termos
indefiníveis (...)
(...)Trata-se, por exemplo, do conceito indivíduo. Porque é que é indefinível? Porque, se bem que possui um
género próximo, a espécie última carece de diferença específica. O que equivale a dizer que a sua compreensão é
infinita e inesgotável no terreno dos conceitos.
Exercícios
1. Avalie e justifique se são correctas ou incorrectas as seguintes definições.
a) O homem é um animal
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R/ Definição inválida. Viola a regra que diz que tem de haver reciprocidade entre o conceito que quero definir e
os termos que uso para o fazer. Seria válida logicamente se na posição “ o homem é um animal se trocássemos o
lugar de sujeito e do predicado e ela se mantivesse verdadeira. Ex: o animal é um homem.
Porque será o homem um mortal? Quem criou o homem? De onde viemos e para onde vamos? Será a democracia
a melhor forma de governo? O que significa ser livre no mundo moderno? Estas e muitas outras perguntas,
constituem questões sobre as quais o Homem pensa e procura dar respostas. Ao responde-las, são construídos
argumentos que podem ser verdadeiro ou falsos, convincentes ou não e, por vezes, enganosos, uma vez que o ser
humano não apenas erra em relação à informação de que dispõe, como também no seu próprio pensamento. Daí a
importância da Lógica. Com base na Lógica, podemos distinguir não só os argumento válidos dos inválidos,
como também compreender por que razão os mesmos são correctos ou incorrectos.
A argumentação constitui um acto de comunicação onde o interlocutor procura, não só expor, como também
partilhar com o seu público-alvo, as suas ideias ou opiniões sobre determinados assuntos; é a arte de persuadir e
convencer um dado auditório. Enquanto tal, a argumentação é um acto comunicacional e utiliza um discurso
argumentativo e também a retórica (arte de bem falar e argumentar)
Argumentar é fornecer argumentos ou razões que sejam a favor ou contra uma determinada tese. Assim definida,
a argumentação constitui um acto, por um lado, de pensamento e de discurso, o que implica a produção de
proposições, ou seja, enunciados, teses e opiniões que requerem justificações, provas demonstrativas.
lógicos, o que nos permite aprender a argumentar de forma coerente e, consequentemente, de forma correcta. Por
isso, a Filosofia interessa-se pela argumentação uma vez que ela constitui matéria de investigação e reflexão e é
também a forma particular do seu discurso.
A demonstração é, por sua vez, um processo acima de tudo impessoal cuja validade depende
unicamente das deduções efectuadas; é um processo independente do sujeito e do orador e diz
respeito à verdade de uma conclusão que parte das premissas com que se relaciona.
Persuadir é convencer alguém a aceitar ou não uma determinada opinião utilizando argumentos de
ordem emocional. Na persuasão recrre-se a um discurso sedutivo em que se apela mais ao
sentimento, ao coração, ao inconsciente do que à razão, utilizando-se argumentos passionais
(susceptíveis de paixão) ou preferenciais, tendo-se como objectivo tornar algo apetecível, desejável,
agradável. Por isso, a sua função é, para além de impôr um desejo, uma necessidade de forma
fictícia. Vários são os exemplos de um discurso persuasivo, tais como o discurso político e o discurso
publicitário, que encontramos na rádio, televisão e mais: «Vive e ajuda a viver!», etc.
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O agente da PRM devido a natureza da sua missão nunca deve recorrer e perersuacao, porque esta
não ajuda na elaboracao de processo para exlarecimento de casos, nem deve admitir a persuasão dos
intervenientes porque a persucao conduz ao agento a uma conclusão dúbia. O agente deve sim, se
apoiar da argumentacao e demosntracao apresentadas pelos intervenientes. As ideias da
argumentacao e da demonstracao são racionais e levam á justa do juiz da instrucao de qualquer
processo.
Resumo: Este trabalho apresentará a evolução e a importância da lógica aplicada às questões jurídicas,
sem tentar exaurir o assunto, visto que o tema exige um estudo aprofundado das várias formas de
utilização da lógica na tomada de decisões judiciais, bem como das várias teorias existentes. Ao
decorrer do trabalho, será analisado o surgimento da lógica, sua evolução histórica e algumas das
concepções filosóficas predominantes ao longo de seu desenvolvimento. Será dada maior ênfase aos
pensadores contemporâneos como Chaïm Perelman, Robert Alexy e Luiz Recaséns Siches. O intuito
do presente trabalho será demonstrar que a lógica poderá ser utilizada como arma eficaz na busca do
ideal de justiça, fundamentando as decisões judiciais ou dando coerência às petições dos juristas,
contribuindo assim, para uma melhor aplicação das normas presentes no ordenamento jurídico. Para
um perfeito entendimento do tema proposto, faz-se necessária uma breve introdução ao surgimento da
lógica em Aristóteles, seguida pela contribuição oferecida pelos Sofistas à retórica e à argumentação.
Serão analisadas a lógica formal e a lógica dialética e sua utilização na seara do Direito, também serão
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1 Considerações Introdutórias
A aprendizagem da lógica não constitui um fim, mas, um meio. Ela só tem sentido enquanto meio para
garantir que nosso pensamento chegue a conhecimentos verdadeiros. Podemos dizer que a lógica trata
dos argumentos, ou seja, das conclusões a que chegamos por intermédio da apresentação de evidências
que as sustentam. Tradicionalmente os argumentos dividem-se em dois tipos, os dedutivos – são os
argumentos cuja conclusão é inferida de duas premissas e os indutivos – são os argumentos nos quais a
partir de dados singulares suficientemente numerados inferimos uma verdade universal. O principal
organizador da lógica clássica foi Aristóteles com sua obra chamada Organon. Aristóteles divide a
lógica em formal e material, o que exploraremos mais adiante neste trabalho.
Adentrando nosso tema de estudo, passaremos a tecer sucintos comentários sobre o conceito de lógica
jurídica, visto que o tema voltará a ser abordado mais à frente de forma mais ampla, analisando as
concepções filosóficas de autores contemporâneos.
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Ao analisarmos os conceitos de lógica jurídica é fácil percebermos que em sua constituição tem pouco
da lógica matemática ou formal, ou seja, não se pode conceber o raciocínio jurídico partindo de
premissas absolutas e incontestáveis, como ensina Chaïm Perelman:
“Em um sistema formal, uma vez enunciados os axiomas e formuladas as regras de dedução admitidas,
resta apenas aplicá-los corretamente para demonstrar os teoremas de uma forma impositiva. Se a
demonstração estiver correta, devemos inclinar-nos diante do resultado obtido e, se aceitarmos a
verdade dos axiomas, admitir a verdade do teorema, enquanto não tivermos dúvidas sobre a coerência
do sistema. O mesmo, porém, não acontece quando argumentamos”. (PERELMAN, 1999, p.170, apud
BITTAR, ALMEIDA, 2005, p.507)
Os juízos jurídicos são de valor, pois envolvem questões de ordem moral e cultural em sua formação.
As decisões e o raciocínio jurídico não obedecem a esquemas pré-determinados para sua formação, ou
seja, o raciocínio jurídico trabalha com o razoável visando à adequação da norma as questões
peculiares de cada caso, como ensina o renomado jusfilósofo Eduardo C. B. Bittar:
“O ato de aplicar o direito sempre envolve uma complexa abordagem da relação entre ser e dever-ser.
Há aplicação em que existe o tratamento conjugado do dever-se com o ser, de modo a que o dever-ser
torna-se ser. Em todo ato aplicativo interrompe-se a promessa de que algo venha a ser, para que
efetivamente o seja; na aplicação, o dever-ser deixa de ser potência e torna-se ato. A norma em sua
aplicação, passa de seu estado letárgico, estático, adentrando ao mundo do ser, no qual se insere com
todas as problemática a ele inerentes; sua natureza de dever ser, seu sentido neutro e impassível, sua
estrutura cristalina, sua perfeição apriorística, são apenas momentos do sentido antes de sua reificação.
Percebe-se que a temática da aplicação envolve necessariamente a abordagem da interpretação, pois
não há aplicação sem interpretação.” (BITTAR; ALMEIDA, 2005, p. 507)
2 O Surgimento da Lógica
A Grécia clássica aparece historicamente como o berço da Filosofia. Por volta do século VI a.C., os
primeiros filósofos pré-socráticos redigem em prosa um discurso que se opõe à atitude mítica
predominante nos poemas de Homero e Hesíodo. O novo modo de pensar é decomposto na sua
estrutura por Aristóteles na obra Analíticos. Como o próprio nome diz, trata-se de uma análise do
pensamento nas suas partes integrantes. Essa e outras obras sobre o assunto foram denominadas mais
tarde, em conjunto, Órganon, que significa “instrumento” – um instrumento para melhor organizar o
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modo de pensar. Embora alguns filósofos anteriores a Aristóteles, tais como o pré-socrático
Parmênides, os sofistas, Sócrates e Platão, tenham estabelecido algumas leis do pensamento, nenhum o
fez com tal amplitude e rigor. Por essa razão a lógica aristotélica permanece através dos séculos até os
nossos dias.
Para Aristóteles, a lógica subdivide-se em Lógica formal, que estabelece a forma correta das operações
do pensamento – se as regras forem aplicadas adequadamente, o raciocínio é considerado válido ou
correto, e a lógica material que é a parte da lógica que trata da aplicação das operações do pensamento,
segundo a matéria ou natureza dos objetos a conhecer. Enquanto a lógica formal se preocupa com a
estrutura do pensamento, a lógica material investiga a adequação do raciocínio à realidade. A lógica
Aristotélica não sofreu mudanças até o século XIX, mas teve inúmeros críticos até essa data. A
filosofia moderna procura outros métodos lógicos para determinar o raciocínio válido. Descartes
repudiava os procedimentos silogísticos da escolástica medieval e procurava um novo método para a
Filosofia que possibilita-se a invenção e a descoberta e não se restrinja-se á demonstração do já sabido.
Francis Bacon escreve o Novum Organum que se opunha ao Organon de Aristóteles e sua concepção
de lógica. Stuart Mill formulou os cinco cânones clássicos da inferência dedutiva que, na opinião de
Irving Copi, seria um instrumento para testar hipóteses - os seus enunciados descrevem o método da
experiência controlada, que é uma arma absolutamente indispensável no arsenal da ciência moderna
A palavra sofista deriva do grego sophistés, com o sentido original de habilidade específica em algum
setor ou homem que detém um determinado saber (do grego sóphos, «saber, sabedoria»). De início,
vários profissionais eram «sofistas»: carpinteiros, charreteiros, oleiros e poetas. Quando o domínio de
uma técnica era reconhecido por todos, o profissional era dito «sofista», desde as atividades artesanais
aos trabalhos de criação artística. O termo era, portanto, um elogio.
A partir do século V a.C., surgiram os professores itinerantes de gramática, eloqüência e retórica que
ofereciam seus conhecimentos para educar os jovens na prática do debate público. A educação
tradicional era insuficiente para preparar o cidadão para a discussão política. Era preciso o domínio da
linguagem e de flexibilidade e agudeza dialética para derrotar os adversários.
O êxito desses tutores foi extraordinário. Passaram a ser, então, designados de sofistas, sábios capazes
de elaborar discursos fascinantes, com intenso poder de persuasão. Por outro lado, foram recebidos
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com hostilidade e desconfiança pelos partidários do antigo regime aristocrático e conservador. Quando
Atenas se envolveu na Guerra do Peloponeso, os sofistas foram responsabilizados pela decadência
moral e política da cidade. O julgamento de Sócrates ocorreu nesse clima de acusação e ressentimento.
Nos séculos IV e III a.C., pensadores como Platão, Xenofonte e Aristóteles, dramaturgos como
Aristófanes em sua comédia As Nuvens, todos passaram a atacar sistematicamente os sofistas. O termo
adquire um sentido pejorativo e desfavorável, marcando para sempre o vocabulário filosófico:
argumento sofístico ou sofisma é o mesmo que falso argumento ou intencionalmente falacioso; de
sofista deriva sofisticado, no sentido depreciativo de algo muito elaborado ou excessivamente ornado,
embora vazio de conteúdo.
Na esfera jurídica atual, a contribuição dos sofistas estende-se por todo campo da argumentação e da
retórica, muito comum nos debates jurídicos em que as partes pretendem, por meio de seus
argumentos e discursos, alcançar a aceitação de suas teses.
Foi com Parmênides e Heráclito que surgiu o antagonismo entre lógica formal e lógica dialética.
Parmênides defendia o ponto de vista de que nada muda, tudo que existe sempre existiu, nada se
transforma e, por isso, tudo que conhecemos não é um conhecimento confiável, visto que, tudo que
vemos transformando-se não passa de ilusões de nossos sentidos como o sol que nasce no horizonte ou
o rio que corre para o mar. Parmênides acreditava apenas na razão, para ele tudo que vemos sempre
existiu.
A lógica formal é uma forma de organizar o raciocínio sem levar em consideração o conteúdo. O
raciocínio é feito com as premissas, e a conclusão que é chamada de inferência na lógica. Para um
raciocínio ser considerado lógico terá que obedecer a três regras básicas da lógica formal que são o
princípio da identidade, o princípio do terceiro excluído e o princípio da não-contradição. A lógica
formal, como o próprio nome diz, é pura forma não se preocupando com o conteúdo das afirmações
nem há compromisso com a realidade. Aristóteles, para melhor explicar sua teoria, criou símbolos,
utilizando o silogismo, em que qualquer que fosse a proposição colocada no lugar dos símbolos, o
argumento seria válido – Se todos os B são C e se todos os A são B, todos os A são C.
As proposições, por sua vez serão verdadeiras ou falsas. Mas para uma conclusão ser verdadeira, as
premissas têm de ser verdadeiras e as inferências válidas, sobre esse tema, ensina Fabio Ulhôa Coelho:
“Os lógicos não se ocupam da veracidade ou falsidade da proposição. Interessam-se apenas pela
validade ou invalidade do argumento. Estudam, em outros termos, as condições segundo as quais se
pode considerar lógico uma inferência, isto é, obediente aos princípios e regras do pensamento lógico.
Por essa razão, inclusive, e para propiciar maior agilidade no raciocínio, desenvolvem os lógicos uma
linguagem própria, uma notação específica. Como não se preocupam com a realidade do que está
sendo afirmado, os lógicos dispensam os mamíferos, asiáticos, Sócrates, ruminantes e tartarugas e
adotam uma idéia geral de “ser”, representado por letras (A, B, C...). O argumento lógico ganha, então,
a seguinte forma: Todo A é B; todo B é C; logo, todo A é C.” (COELHO, 1996, p.21)
A palavra dialética etimologicamente vem do grego dia que tem um sentido de dualidade, troca e
Lektikós que significa apto à palavra, capaz de falar, tem a mesma raiz de logos que significa razão.
O conceito característico da dialética é o diálogo, ou seja, a oposição de idéias e razões entre posições
inicialmente antagônicas ou não. Como vimos anteriormente, a lógica formal trabalha com conceitos
metafísicos, abstratos e absolutos em que a realidade é explicada por suas essências imutáveis. Já a
lógica dialética parte do princípio da contradição, ou seja, da oposição entre duas opiniões
contrapostas.
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A dialética é o movimento dos contraditórios, segundo a teoria de Hegel passa por três fases distintas
em sua formação: a tese, a antítese e a síntese, ou seja, o movimento da realidade se explica pelo
antagonismo entre momento da tese e o da antítese, cuja contradição deve ser superada pela síntese.
No Direito, a lógica dialética hegeliana tem importância fundamental, visto que o Direito se
desenvolve em um cenário de contradição, uma vez que, o direito de um se coloca em oposição ao
direito de outro em que o poder jurisdicional intervém para dizer o direito válido para todo o grupo
social. A tese que representa o direito de A, a antítese que representa o direito de B e, finalmente, a
síntese que é a decisão judicial, que não põe termo ao ciclo como à priori poderia parecer, mas
realimenta o ciclo transformando-se também em uma nova tese que poderá ser contraditada.
Chaïm Perelman (1912-1984), nascido em Varsóvia emigrou para Bélgica e lá construiu sua carreira,
lecionou na universidade de Bruxelas disciplinas como Lógica, Moral e Filosofia, tornou-se o maior
expoente dos estudos de retórica moderna.
Sua obra intitulada “Lógica Jurídica: nova retórica” tornou-se um clássico, configurando-se em
manual prático para o estudo de lógica e da argumentação jurídica.
Perelman foca seu trabalho na busca do entendimento do raciocínio jurídico perfeito e na identificação
de suas particularidades específicas, com vista a entender a real influência desses argumentos sobre as
decisões judiciais. Seus estudos tinham o intuito de responder a questionamentos do tipo, a) como se
raciocina juridicamente? b) qual a peculiaridade do raciocínio jurídico? c) quais as características
desse raciocínio? d) de onde o juiz extrai subsídios para a construção da decisão justa? e) Até onde
leva a argumentação das partes em um processo? f) qual a influência que a argumentação e a
persuasão possuem para definir as estruturas jurídicas? O intuito de tais questionamentos é dar
fundamento a reflexão a respeito do julgamento e do ato jurídico decisório.
Os estudos realizados por Chaïm Perelman sobre a nova retórica, a lógica e a argumentação são de
fundamental importância para a formação acadêmica dos juristas contemporâneos. Perelman tinha
como objetivo claro declarar sua discordância ao positivismo jurídico que colocava o raciocínio
jurídico como um raciocínio exato, mecanicista. O que Perelman queria era definir uma lógica
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específica que não se utilize somente do raciocínio dedutivo, mas que se utilize também de outras
formas de raciocínio como o indutivo.
Para esse autor, a aplicação do raciocínio jurídico pelo juiz é matéria complexa, visto que a lógica
judiciária não se resume a uma mera dedução de conclusões extraídas dos textos da lei, ou seja, a lei
posta pelo legislador, muitas vezes, tem um recurso lingüístico vago o que pode dar margem a várias
interpretações. Quando Perelman se refere ao raciocínio jurídico está falando do ato fundamentado e
expresso nas decisões do juiz que engloba também os demais profissionais que atuam com ele dentro
do processo como advogados, promotor etc. O estudo da obra de Chaïm Perelman deverá ser cercado
de cuidados com vista a não se ter uma conclusão equivocada, como adverte o Eduardo C Bittar
“No entanto, devem-se tomar alguns cuidados ao estudar a obra de Perelman, quis sejam: não se está
pensando que seja possível definir a priori o que seja a justiça feita pelo juiz, uma vez que a atividade
jurisprudencial do magistrado e exercida mediante a provocação das partes e a existência de um caso
concreto a ser analisado; não se está pensando em conceituar uma verdade judicial, por meio de qual o
juiz expressaria a vontade da lei, ou algo semelhante, mas no juízo do magistrado como iter racional
para alcance de um resultado socialmente institucionalizado”. (BITTAR; ALMEIDA, 2005, p.414)
O pensamento de Perelman volta-se mais para a prática do direito e menos para a estrutura lógica
formal do pensamento, isso se dá em função de sua intenção de conferir autonomia ao raciocínio
jurídico em relação à lógica formal, inserida pelos positivistas nas ciências humanas e jurídicas.
Perelman não trabalha com o conceito de verdade, mas sim, substitui esse termo por termos mais
apropriados como razoável, eqüitativo, aceitável, admissível..., termos mais apropriados para expressar
o raciocínio jurídico. Com isso, quer o autor demonstrar que o juiz não é simplesmente o porta voz da
lei, como ensina o próprio autor: “o juiz não é a ‘boca da lei’, aplicador neutro e desideologizado das
das normas jurídicas como se quis no pensamento derivado da Revolução Francesa.” (PERELMAN,
le champ de l’argumentation, 1970, p. 140 apud BITTAR; ALMEIDA 2005, P.416).
Para Perelman os estudos lógicos contemporâneos modernos, derivados de uma tradição cartesiana e
leibniziana, negligenciaram a própria lógica aristotélica. Para o autor é por intermédio do resgate da
lógica aristotélica aliada a influências ciceronianas, que haverá de nascer uma semente adequada ao
tratamento e a análise dos problemas jurídicos contemporâneos, na perspectiva perelmaniana. A
utilização da lógica aristotélica não formal, ou seja, a lógica aristotélica judiciária é um recurso que é
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utilizado por Perelman para reinventar as dimensões do sistema jurídico em seu funcionamento
dinâmico na prática. A influência de Aristóteles na obra de Chaïm Perelman e notória, demonstrando,
assim, em que o autor busca embasamento teórico para fundar sua teoria.
A lógica jurídica consiste em uma lógica argumentativa e por meio do discurso se constrói o saber
jurídico, a justiça, a eqüidade, a razoabilidade, e a aceitabilidade das decisões judiciais.
A lógica perelmaniana não obedece a esquemas rígidos de formação, elocução, dedução. Trata-se de
uma lógica material, prática com o firme propósito de produzir efeitos diante de um auditório.
O trabalho desenvolvido por Perelman tem foco sobre o raciocínio jurídico que é o raciocínio
decisório, ou seja, o poder de dizer que o direito está no poder do juiz. Com esse princípio
fundamental é que Perelman visa a afirmar que a lógica jurídica difere das demais formas de lógica,
por ser uma lógica dialética ou argumentativa. Sendo assim não é dedutiva, não é rígida nem abstrata
dos fatos que analisa. Todo o raciocínio jurídico e traçado em meio a fatos concretos do dia-a-dia
sejam fatos sociais, políticos dos quais surgem as decisões que regulam cada caso concreto em
particular.
Robert Alexy nasceu no dia 9 de setembro de 1945, em Oldenburg – Alemanha, é jurista e filósofo.
Estudou Direito e Filosofia em Götting, recebeu seu PhD em 1976 com a dissertação Uma Teoria da
Argumentação Jurídica e alcançou sua habilitação em 1984 com a teoria dos Direitos Fundamentais.
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Em sua obra Uma Teoria da Argumentação Jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
fundamentação jurídica, Alexy dá sua contribuição para a lógica jurídica de forma determinante e com
o intuito de formular sua teoria parte primeiramente de uma argumentação prática geral para depois
levar esse conhecimento para o campo do Direito, e formular sua própria teoria da argumentação
jurídica. Em busca de embasamento teórico, o jurista partiu para a análise de várias teorias da
argumentação propostas por jusfilósofos como Stevenson, Hare, Toulmim, Habermas, Baier e outros.
Alexy não pretende apenas formular uma teoria da argumentação que identifique os bons e os maus
argumentos, o que propõe em sua teoria é adotar estrutura dos argumentos de forma analítica e
descritiva. Alexy analisa os Princípios Gerais de Direito sua importância dentro do ordenamento
jurídico e sua aplicação para fundamentar decisões jurídicas, como ensina o autor:
“Os princípios permitem exceções e podem entrar em conflito ou contradição; eles não têm pretensão
de exclusividade; seu significado real só se desenvolve através de um processo tanto de
complementação quanto de limitação recíproca e eles precisam de princípios subordinados e
valorações particulares com conteúdo material independente para sua realização concreta”. (ALEXY,
2005, p. 36)
O tema central da teoria de Alexy repousa na seguinte pergunta: é possível uma fundamentação
racional das decisões jurídicas? Há a possibilidade de determinar critérios que possam determinar que
um discurso prático ou jurídico seja racional? Alexy demonstra em sua obra que tais critérios podem
ser formulados de forma prática mediante a observância de regras práticas a serem seguidas.
Regras básicas
- A validade do primeiro grupo de regras é condição prévia de toda comunicação lingüística:
1. Nenhum orador pode se contradizer
2. Todo orador só pode afirmar aquilo que ele próprio crê.
3. Todo falante que aplique um predicado F a um objeto A, tem de estar preparado para aplicar F a
todo outro objeto que seja semelhante a A em todos os aspectos importantes
4. Diferentes oradores não podem usar a mesma expressão com diferentes significados
Regras da razão
- Não é possível haver um discurso prático sem afirmações.
1. Todo falante deve, quando lhe é solicitado, fundamentar o que afirma, a não ser quando puder dar
razões que justifiquem a recusa a uma fundamentação
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3. Para qualquer falante e em qualquer momento, é possível passar para um discurso de teoria do
discurso.
Luís Recaséns Siches nasceu na Espanha em 1903, fez os seus estudos universitários no período
compreendido entre 1918 a 1925. Nos seus estudos de pós-graduação, foi discípulo de renomados
mestres, como Giorgio Del Vechio, em Roma, Rudolf Stanmmler, Rudolf Smend e Hermann Heller
em Berlim, Hans Kelsen, Felix Kaufmann e Fritz Schrgirer em Viena, que eram os maiores expoentes
do pensamento jurídico da época.
Durante o tempo em que foi professor da “Graduate Faculty” da “New School for Social Research”,
em Nova York, no período de 1949 a 1954, e da escola de Direito da “New York University”, entre
1953 e 1954, bem como de outras universidades norte-americanas, influenciado diretamente com o
pensamento jurídico anglo-saxão, desenvolveu algumas idéias sobre a interpretação do Direito, a dupla
dimensão circunstancial de todo Direito positivo, a lógica do humano e o caráter criador da função
judicial.
Segundo a intenção de emprego desse método, como único, poderia o intérprete deixar de lado, de
uma vez por todas, a referência à pluralidade de diferentes formas de interpretação, fosse literal,
subjetivo-objetivo, consuetudinário, histórico, analógico, por eqüidade, etc. Recaséns Siches defendia
que, assim como a Ciência Jurídica, a Filosofia do Direito não tinha condições de escolher um método
140
141
ou uma tábua de prioridades entre os vários métodos de interpretação. Decorre daí, que a única regra
que se poderia formular, com universal validade, era a de que o juiz sempre deveria interpretar a lei de
modo e segundo o método que o levasse à solução mais justa dentre todas as possíveis.
Defendia ele que essa atitude não se consubstanciaria em desrespeito à lei, porque, segundo seu
pensamento, ao legislador cabe emitir mandamentos, proibições, permissões, mas não lhe compete o
pronunciamento sobre matéria estranha à legislação, mas, sim, referente apenas à função jurisdicional.
Quando o legislador ordena um método de interpretação, quando invade o campo hermenêutico, esses
ensaios científicos colocam-se no mesmo plano das opiniões de qualquer teórico e não têm força de
mando.
Para Siches, ao contrário do que ocorre com a lógica da inferência, de caráter neutro e explicativo, a
lógica do razoável procura entender os sentidos os vínculos entre as significações dos problemas
humanos, e, portanto, dos políticos e jurídicos, assim como realiza operações de valoração e estabelece
finalidades ou propósitos.
No que tange à atividade do magistrado, especialmente a sentença, é essa também fruto de estimativa,
pois o juiz para chegar à intuição sobre a justiça do caso concreto, não separa sua opinião a respeito
dos fatos das dimensões jurídicas desses mesmos fatos. Pois “a intuição é um complexo integral e
unitário que engloba os dois aspectos: ‘fatos’ e ‘Direito’. A esse particular, o referido autor formula as
seguintes observações: primeiramente entende que a intuição do juiz acha-se embasada na lógica do
razoável e que, quando se fala que o juiz procura uma justificativa para o que pressentiu
intuitivamente, isso não significa que deva recorrer àquelas pseudo-motivações lógico-dedutivas, de
que se serviram os juristas no século XIX, bastando oferecer uma justificação objetivamente válida,
com embasamento na lógica do humano. Isso faz com que a função do juiz, embora mantendo-se
dentro da observância do Direito formalmente válido, seja sempre criadora, por alimentar-se de um
amplo complexo de valorações particulares sobre o caso concreto.
Não se trata, contudo, de Direito Alternativo, muito menos do uso alternativo do Direito, porquanto,
trata-se de que o julgador se valha, ao intuir a solução mais justa aplicável ao caso concreto, dos
métodos tradicionais de interpretação para justificar a sua tomada de decisão. Recaséns Siches explica
ainda que a estimativa jurídica informa ao intérprete sobre quais são os valores cujo cumprimento deve
ou não ser perseguido pelo Direito, tais como justiça, dignidade da pessoa humana, liberdades
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fundamentais do homem, segurança, ordem, bem-estar geral e paz. Mas há outros que podem ser
englobados no conceito que tradicionalmente se denomina prudência: sensatez, equilíbrio,
possibilidade de prever as conseqüências da aplicação da norma e de sopesar entre vários interesses
contrapostos, legitimidade dos meios empregados para atingir fins justos etc. No intuito de concluir,
Siches salientou que a Lógica do Razoável está sempre impregnada por valorações, ou seja, critérios
axiológicos. Essa característica valorativa é totalmente estranha à lógica formal ou a qualquer teoria da
inferência, constituindo um dos aspectos que, definitivamente, distingue a lógica do razoável da lógica
matemática.
Para o citado autor, a lógica formal não esgota a totalidade do “logos”, da razão, é apenas um setor
dela. Existem outros setores que pertencem igualmente à lógica, que possuem natureza completamente
diversa da lógica do racional, que é a lógica dos problemas humanos de conduta prática, a “lógica do
razoável”. Fica claro, então, que Luís Recaséns Siches é o dinamizador na ciência jurídica latino-
americana, das novas teorias em matéria de hermenêutica do Direito.
8 Considerações finais
O que se entende contemporaneamente por teoria da argumentação jurídica e lógica jurídica é que elas
têm origem nas teorias acima estudadas. Essas teorias compartilham e têm em comum a rejeição a
lógica formal aristotélica como único instrumento de raciocínio jurídico.
No século XX, mais precisamente após a Segunda Guerra Mundial, os juristas perceberam que não se
podia interpretar o Direito através de equações lógicas, sem considerar valores e aspectos particulares
de cada caso, não se admitindo o positivismo obcecado nem o jusnaturalismo exagerado. O
pensamento jurídico atual passa a se opor a lógica formal e a utilizar-se da dialética e da lógica do
razoável. O direito como fato gerado no ceio da sociedade e que está em constante evolução, exige do
operador do direito que analise os fatos com uma visão estrita de cada caso, aplicando a norma de
forma a amoldá-la a situações apresentadas e obtendo, assim, o maior grau de êxito em sua aplicação,
abandonando definitivamente o simples silogismo e partindo para a discussão dialética das questões
jurídicas. Os operadores do Direito, principalmente os magistrados, devem preocupar-se com a
razoabilidade das decisões e argumentações jurídicas, visando com isso a fundamentar suas ações e a
solidificar a evolução da lógica jurídica.O disposto no art. 5º da LICC prescreve que, na aplicação da
lei, deverá o juiz atender aos fins sociais a que ela se dirige e as exigências do bem comum.
142
143
Referências:
ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Trad. Zilda H. S. Silva. São Paulo: Landy Editora, 2005.
BITTAR, Eduardo C.B; ALMEIDA, Guilherme de Assis. Curso de Filosofia do Direito. 4ª ed., São
Paulo: Atlas, 2005.
COELHO, Fábio Ulhôa. Roteiro de Lógica Jurídica. , São Paulo: Max Limonad, 1996.
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia: ser, saber, fazer: elementos da história do
pensamento ocidental. 11ª ed., São Paulo: Saraiva, 1995.
FERRAZ JR, Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 4ª ed.,
São Paulo: Atlas, 2003.
PERELMAN, Chaim. Lógica jurídica: nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 2004. NS SICHES,
Luíz Recaséns Tratado General de Filosofia del Derecho, México, Ed. Porrua, 1959.
TOMASZEWSKI, Adauto de Almeida. A lógica do razoável e o negócio jurídico: reflexões sobre a
difícil arte de julgar. Disponível na Internet: em
http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?codigo=86 . Acesso em 25 de junho de 2007.
VENOSA, Silvio de Salvo. Introdução ao Estudo do Direito: Primeiras linhas. São Paulo: Atlas,
2004.
Actividades
1. O que é a argumentação?
2. Porquê que a Filosofia se interessa pelo estudo da argumentação?
3. Distingue argumentação de demonstração.
4. Constrói alguns argumentos de carácter persuasivo.
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144
Operar criticamente com a relação funcional entre o juízo e a proposição dos intervenientes do
processo;
Distinguir com clareza os raciocínios usados pelos iontervenientes quanto à sua natureza
(indutivos, dedutivos e analógicos);
Explicar a importância da aplicação dos princípios das operações lógicas na interpretação dos
factos;
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proposição;
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146
3. As grandes divisões da Lógica: formal ou menor (validade formal) e material ou maior (validade verdade)
3.1. Lógica formal ou menor (validade formal): apreensão, juízo e raciocínio
É a parte da lógica que estabelece a forma correcta das percepções intelectuais ou melhor, que assegura o acordo do
pensamento consigo mesmo, de tal maneira que os princípios que descobre e as regras que formula se aplicam a todos os
objectos do pensamento, quaisquer que sejam. A lógica formal compreende três partes: a apreensão (o conceitoj), o juízo e o
raciocínio.
Tradicionalmente há três principais domínios da lógica: lógica do conceito, lógica do juízo e lógica do raciocínio. Em rigor a
lógica diz particularmente respeito ao raciocínio, ou seja ao discurso correcto do pensamento no trânsito de umas proposições
a outras.
UNIDADE: IV
I. LÓGICA DO JUÍZO
1. Juízo e a Proposição
O juízo, designado tradicionalmente como a segunda operação da mente, para distingui-lo do conceito, a primeira operação,
foi definido por Aristóteles e ainda hoje é entendido em lógica, como uma operação racional que consiste em afirmar ou negar
alguma coisa de outra.
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Quando unimos os termos entre si, afirmando ou negando algo de alguma coisa, temos então o “juízo”. O juízo, portanto, o
acto com que afirmamos ou negamos um conceito em relação a outro conceito. E a expressão lógica do juízo é a “enunciação”
ou “proposição”.
Portanto, todo o juízo é uma proposição quando seja um enunciado verbal susceptível de ser declarado verdadeiro ou falso
(uma apreciação valorativa), consoante o seu acordo ou desacordo com a realidade.
A enunciação ou proposição que expressa o juízo, portanto, expressa sempre afirmação ou negação, sendo assim verdadeira
ou falsa. Dizer, por exemplo que “a mesa é redonda”, depende da realidade concreta a que nos referimos, esta afirmação será
verdadeira ou falsa quando está em causa uma tomada de posição face a essência de um objecto mesa – redonda.
Todavia, nem todas as proposições gramaticais são proposições lógicas, ou correspondem a juízos. Assim, as proposições que
expressam súplicas, invocações, exclamações, interrogações, tais como as imperativas: “ Larga a bomba, rapaz.”, “Saiam
daqui todos!”, “lutar, rapazes!”; as interrogativas: “Houve entre ti e o Dâmaso alguma pega?”, “ vieste fazer o quê? ; as
interjectivas: “ai de mim!”, “valha-me Deus!”, “Coragem!”, não exprimem juízos, rigorosamente porque não traduzem uma
afirmação ou negação, e como tal não podem ser consideradas nem verdadeiras nem falsas. Doutro modo, só os enunciados ou
frases que exprimem verdades ou falsidades recebem o nome de juízos, dado que expressam uma relação de conformidade ou
desconformidade entre dois conceitos ou termos considerados sujeitos e predicados.
Também todos os conceitos ou termos soltos como “ave”, “lápis de cor”, “João Paulo” não constituem proposições ou juízos
porque não são susceptíveis de serem verdadeiros nem falsos. Poderão ser juízos ou proposições quando forem relacionados
com algo. Qual sejam: “ A ave não é rastejante”; “ O lápis de cor é cinzento”; “João Paulo é professor”.
A expressão “ João moçambicano” não é evidentemente um juízo. Estaremos perante um juízo se introduzirmos o verbo ser na
expressão na forma negativa ou afirmativa. Por exemplo: “ João não é moçambicano” ou “João é moçambicano”.
Entretanto, é verdade que também existem alguns juízos constituídos apenas por dois elementos como: “ João estuda” e “
Deus existe”, também considerados juízos equivalentes a formulações do tipo: “João é estudante” ou “ Deus é um existente”.
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Cópula – elemento de ligação entre o sujeito e o predicado, que consiste na afirmação ou negação da atribuição da qualidade
ou característica ao sujeito. É representado pelo verbo ser.
Se o sujeito (S) e o predicado (P) representam o conteúdo ou matéria do juízo a copula representa a sua forma, podendo ser
afirmativa (é) ou negativa (não é).
Em síntese, podemos definir o juízo como a operação mental que permite estabelecer uma relação de afirmação ou negação
entre conceitos podendo tal relação ser considerada verdade ou falsa. Importa sublinhar que há juízos que, embora formados
apenas por dois elementos podem ser transformados na fórmula clássica (S é P)
É preciso ter em conta que expressões como “nem todos”, “muitos”, “certos”, “há”, “existem” em lógica empregam-se com o
significado de “alguns”. O que quer dizer que todas as proposições da nossa linguagem quotidiana podem ser reduzidas à
forma padrão.
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O juízo, num sentido distinto, merece atenção da Moral e do Direito por se tratar de um acto por meio do qual formulamos
uma apreciação em função de valores éticos ou legais. De resto, o significado primitivo de juízo parece ser o de julgamento:
sentença proferida pelo juiz em tribunal.
Exercícios
1. Distingue e justifica, nos seguintes enunciados, as proposições das não proposições.
a) Quem são hoje os homens íntegros?
b) O meu nome é ninguém.
c) Amanhã vai chover.
d) Que são mil contos de fortuna?!
e) Os astronautas são aves.
2. Apresenta os seguintes juízos na forma padrão do juízo categórico, ou seja, na forma “ Quantificador – sujeito – cópula –
predicado.
a) Só os licenciados em Medicina podem ser cirurgiões.
b) Existem mulheres bonitas.
c) O quadrado é um polígono.
d) É proibido proibir
e) Os ingleses não falam chinês.
4. Indique a disciplina que corresponde a cada uma das definições dadas e discuta a que tem natureza lógica.
a) Juízo é o acto mental por meio do qual nós formamos uma opinião.
b) Juízo é o processo mental por meio do qual decidimos conscientemente que algo de um modo ou de outro.
c) Juízo é a afirmação ou negação de algo (de um predicado) com respeito a algo (sujeito).
d) Juízo é o acto por meio do qual se une (ou sintetiza) afirmando, ou se separa negando.
e) Juízo é uma operação do nosso espírito na qual se contém uma proposição que é ou não é conforme à verdade e segundo a
qual se diz que o juízo é ou não correcto.
f) Juízo é um produto mental enunciativo.
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Negativos Aqueles que estabelecem uma relação negativa Os americanos não são europeus.
entre o sujeito e o predicado. Nenhum homem é imortal.
Relação ou Categóricos Quando a afirmação ou negação é absoluto e Vou passear.
Condição sem reservas, sem condições. O homem é mortal.
Hipotéticos Quando há afirmação ou negação sob condições Se estou atendo, aprendo melhor.
(condiciona) Se chover, não vou.
Disjuntivos Quando a afirmação de um predicado exclui Ou falo ou estou calado.
outros (incompatibilidade) João estuda ou vê televisão.
Problemáticos Quando a afirmação ou negação envolve Passarei ao exame.
Ou duvidosos simples possibilidade.
Assertórios ou Quando enunciam uma verdade de facto, mas A mesa é redonda.
Modalidade contingentes não necessariamente. Quando é acidental. António é médico.
Apodícticos ou Quando necessariamente verdadeiros. O Deus é perfeito.
necessário predicado convém ao sujeito ou é-lhe essencial O círculo é redondo.
(In) A prior Cuja verdade pode ser conhecida O todo é maior que a parte.
dependência independentemente da experiência. O círculo é redondo.
da A posterior Cuja verdade só pode ser conhecida através da O quinino cura a febre.
Experiencia experiência. Os coreanos são baixos.
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(Não) Analíticos Quando o predicado está compreendido no O triângulo tem três ângulos.
inclusão do sujeito (se acha na análise do sujeito) O todo é maior que a parte.
predicado no Sintéticos Quando o predicado não está contido na noção Os americanos são altos.
sujeito. do sujeito. Os italianos são românticos.
As proposições classificam-se da mesma forma que os juízos, visto que serem a sua expressão verbal. Mas à lógica interessa
principalmente fazê-lo harmonia com a sua quantidade e qualidade que ao todo são quatro tipos de proposições categóricas.
1.5.1. Quanto à Quantidade (universal ou particular) – esta depende da extensão do sujeito – pode ser:
a) Proposições universais – quando o sujeito é tomado em toda a sua extensão, isto é, em toda a sua extensão: Todo A é B.
Exemplo: Todos os homens são fortes; ou Os homens são fortes.
b) Proposições particulares17 – quando o sujeito é tomado apenas uma parte da sua extensão: Algum A é B.
Exemplo: Alguns homens são fortes; ou há homens fortes.
c) Proposição singulares18 – quando o sujeito é apenas um indivíduo. A é B.
Exemplo: Aristóteles é realista; esta caneta é preta.
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A particularidade é indicada pela palavra algum, ou expressões equivalentes, como: nem todo, a maioria, muitos, certos, poucos, há, etc.
18
As proposições singulares representam-se como as universais, por que o sujeito, apesar de singular ou porque é singular, é tomado em
toda a sua extensão, isto é, está incluído na extensão do predicado. É por isso que em lógica as proposições quanto à quantidade se dividem
apenas em universais e particulares.
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A e I são proposições afirmativas, como primeiras vogais da palavra “AfIrmo”; E e O designam as proposições negativas,
com vogais da palavra “nEgO”. A e E são proposições universais I e O são proposições particulares
Podemos resumir, na tabela seguinte, as regras que regem as relações de oposição entre
proposições.
- Na proposição E: tanto o sujeito como o predicado são tomados em toda a sua extensão;
- Na proposição I: tanto o sujeito como o predicado são considerados particularmente, isto é, apenas uma parte da sua
extensão e
- Na proposição O: o sujeito é tomado particularmente e o predicado em toda a sua extensão.
Regra Geral: O sujeito das proposições universais é universal, o sujeito das particulares é particular; o predicado das
proposições afirmativas é particular e o sujeito das negativas é universal.
Sujeito
Universal Particular
Particular
Predicados
Universal
Excepções: O predicado das proposições afirmativas, ordinariamente, é o de maior extensão que o sujeito, e, por isso, é que
nas proposições do tipo A o predicado é particular, porque só parte da sua extensão é abrangida por todo o sujeito. No entanto,
devemos exceptuar as proposições chamadas recíprocas ou equivalentes (definições), cujo predicado tem a mesma extensão
que o sujeito, isto é, é igualmente universal.
Ex: Todo o homem é animal racional ou só Maputo é capital de Moçambique.
Exercícios
Esclareça a quantidade do sujeito e do predicado das proposições seguintes:
1. Todos os homens são mamíferos
2. Os mamíferos não são todos homens.
3. Nenhum morcego é ave.
2. AS INFERÊNCIAS
Com o estudo das inferências, entramos, em rigor, no domínio da Lógica ou do “discurso” racional. Autores como W. Kneale
definem a Lógica exactamente como a ciência que trata dos princípios de inferência válida.
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Inferir consiste em extrair uma ou várias proposições novas, portanto não conhecidas antes, de uma ou várias proposições já
conhecidas. Às primeiras damos o nome de conclusões, às segundas o nome de premissas.
Entre os diversos tipos de inferências distinguem-se normalmente dois grupos maiores: Imediatas e Mediatas.
- Oposição
- Conversão
- Simples -Outras
(imediatas)
Inferências -Dedução ou raciocínio indutivo
- Indução ou raciocínio indutivo
Complexas ou mediatas - Sofismas
- (raciocínios) - Paralogismos
1. Inferências simples – aquelas que tem lugar a partir de uma única proposição, também ditas imediatas, por não haver
necessidade de intervenção de uma terceira.
Inferências complexas – aquelas que têm lugar a partir de duas ou mais proposições, também ditas mediatas, por nelas se
inferir por intermédio de outras proposições.
As proposições opostas são designadas por: Contraditórias, Contrárias, Subcontrárias e Subalternas. Ora vejamos o
seguinte quadro lógico.
O Quadro Lógico de Oposição
A Contrárias E
I Subcontrária O
1. Proposições Contraditórias (A/O) e (E/I) – são aqueles que diferem ao mesmo tempo pela qualidade e quantidade. Uma
nega o que se afirma na outra. São inconciliáveis. Há oposição total e completa.
Ex.1: (A/O) – Todos os homens são fortes / Alguns homens não são fortes.
2. (E/I) – Nenhum homem é forte. / Alguns homens são fortes.
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Leis das contraditórias (AO, EI) – duas proposições contraditórias não podem ser simultaneamente verdadeiros ou
simultaneamente. Se uma for verdadeira, a outra é falsa; se uma for falsa a outra é verdadeira.
2. Proposições Contrárias (A/E) – são as duas universais que diferem pela qualidade.
Exemplo: (A/E) – Todos os homens são fortes / Nenhum homem é forte.
Leis das contrárias – duas proposições contrárias não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Podem, contudo, ser ambas
falsas simultaneamente, se a(s) verdadeira(s) for(em) I ou O. Proposições 3. Subcontrária (I/O)– são particulares que
diferem pela qualidade.
Exemplo: (I/O) – Alguns homens são fortes / Alguns homens não são fortes.
As leis das proposições Subcontrárias (I/O)– duas proposições subcontrárias podem ser simultaneamente verdadeiras, mas
não podem ser simultaneamente falsas. Se uma é falsa a outra obrigatoriamente é verdadeira. Se uma é verdadeira a outra é
indefinida, isto é poder ser verdadeira ou falsa.
4. Proposições subalternas (A/I) e (E/O)– são aquelas que diferem pela quantidade.
Exemplo: (A/I) – Todos os homens são fortes. / Alguns homens são fortes.
(E/O) – Nenhum homem é forte. / Alguns homens não são fortes.
As leis das proposições subalternas (A/I) e (E/O) – duas proposições subalternas podem ser simultaneamente verdadeiras e
simultaneamente falsas, assim como pode ser verdadeira e a outra de uma proposição universal afirmativa implica a da
particular subordinada ser verdadeira, a falsidade da universalidade acarreta a sua particular. A verdade da particular não
determina a da universal, a falsidade exige a falsidade da universal.
Exemplificando, de Todo o homem é forte (verdadeira) inferimos por oposição: nenhum homem é forte (contrária e falsa,
algum homem é forte (subalterna e verdadeira), algum homem não é forte (contraditória e falsa).
Exercícios
1. Partindo do principio de que a proposição do tipo A “Todas as crianças são seres humanos” é Verdade. Apresente pela
ordem indicada, as proposições opostas e avalie o valor de verdade de cada uma:
a) Contraria................................................................................................................................................................
b) Subalterna..............................................................................................................................................................
c) Contraditória..........................................................................................................................................................
d) Subcontrária...........................................................................................................................................................
2. Dada a proposição original e o seu valor de verdade, no quadro abaixo, indique as proposições que se lhe
opõem e o respectivo valor de verdade.
Proposição inicial Alguns alunos são gordos V
Contraditória
Contrário
Subcontrária
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Subalterna
3. Altera a quantidade e a qualidade das proposições seguintes e indica a relação entre ambas, avaliando de verdade.
a) Nem todos os moçambicanos são hospitaleiros.
b) Muitos homens inteligentes são mal agradecidos.
c) Certos refugiados são terroristas.
d) Não existe aluna da Comunidade que não seja simpática.
a) Tipos de Conversão
i) Conversões Simples: consiste apenas em mudar a posição do sujeito e do predicado. O resto não muda. A nova proposição
conserva a forma e a quantidade e denomina-se recíproca da proposição originária.
Podemos operar uma conversão simples nas universais negativas (E) e nas proposições particulares afirmativas (I) porque os
seus sujeitos e predicados têm igual extensão.
Exemplos: Nenhum homem é forte, converte-se em Nenhum forte é homem.
Alguns homens são fortes, converte-se em Alguns fortes são homens.
Nota Bem: convertem-se também simplesmente as proposições chamadas recíprocas ou equivalentes (definições).
ii) Conversão por Acidente ou por Limitação: consiste na troca de lugar entre o sujeito e o predicado e na mudança de
quantidade da proposição: de universal passa a particular.
A conversão por limitação aplica-se às universais afirmativas (A) as quais são transformadas em proposições particulares
afirmativas (I).
Exemplo: Todos os homens são fortes (A) converte-se em Alguns fortes são homens (I).
N.B. Exceptua-se, contudo, o caso em que a proposição é recíproca ou definição que, embora do tipo A, se converte
simplesmente.
É preciso notar ainda que as proposições de ordenação inversa, embora do tipo I, não se convertem simplesmente. Se provêm
de uma proposição do tipo A, quando convertidas, voltarão a ser do mesmo tipo A.
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Ex: Alguns moçambicanos são beirenses (I), dará Todos os beirenses são moçambicanos (A)
iii) Conversão por Negação – este tipo de conversões são aplicáveis nas proposições do tipo (O). Estas não se pode converte
simplesmente, porque o sujeito, tomando o lugar do predicado, ficaria com uma extensão maior. Recorremos a um artificio
para as converter, por forma indirecta, a qual consiste em transformar primeiramente a proposição a converter numa
afirmativa particular que lhe seja equivalente (consegue-se isto, tirando a negação da cópula e passando-a para o predicado)
e depois converter simplesmente a proposição obtida.
Ex: Alguns homens não são fortes e, feita a conversão teremos Alguns não fortes são homens.
iv) Conversão por Contraposição – aplicam-se às universais afirmativas (A) e às particulares negativas (O). Obtém-se
juntando uma negativa ao predicado e outra ao sujeito da proposição que desejamos converter, e fazendo em seguida a
conversão simples.
Ex: Todos os homens são fortes (A) converte-se em Todos os não fortes são não homens.
Alguns homens não são fortes (O) converte-se em Alguns não fortes não são não homens.
Esquematizando:
Exercícios
1. Realize a conversão das seguintes proposições:
a) Todos matolenses são moçambicanos
b) Nenhum aluno da Manyanga é aluno da Josina.
c) Alguns moçambicanos são africanos.
d) Alguns homens não são médicos.
2. Converta as seguintes proposições e diga o tipo de conversão efectua:
a) Nenhum aluno é simpático
b) Todo os malucos são insuportáveis.
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b) O raciocínio foi definido por Jolivet como “operação que consiste em extrair de dois ou mais juízos um outro
juízo contido logicamente nos primeiros”. O raciocínio será, assim, a passagem do conhecido ao desconhecido.
O argumento é a expressão verbal do raciocínio e é, portanto, formado por proposições, como o raciocínio é
constituído por juízos.
O encadeamento lógico das proposições que constituem o argumento chama-se forma do argumento, enquanto que as
proposições em si próprias, constituem a matéria próxima (premissas) e os termos a matéria remota do mesmo
argumento. O argumento para ser certo deve ser válido quanto à forma (legitimo: sem violar as regras que lógica
formal aponta) e quanto à matéria.
Num raciocínio há proposições das quais partimos (o antecedente, ou premissas) e uma proposição final a que
chegamos como consequência das relações expressas nas premissas, a qual é chamada consequente ou conclusão.
Exemplo:
Toda a ciência normativa é prática → premissa.
A lógica é uma ciência normativa → premissa.
A lógica é prática → conclusão.
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Noção: é um raciocínio que, de certas semelhanças observadas, conclui para outras semelhanças não observadas. É
um raciocínio que passa do particular para o particular ou de um caso para outro caso.
É um raciocínio mais ou menos provável, mas não atinge uma conclusão tão certa quanto a dedução ou mesmo a
indução, porque concluindo por força das semelhanças, nada impede que existam diferenças que levem a resultado
diverso. É por isso que as conclusões por analogia têm sempre um carácter mais ou menos hipotético e problemático.
Ex: Quando um médico, em presença de dois doentes com os mesmos sintomas, conclui que eles sofrem da mesma
doença.
Exemplo: Manuel apresenta sintomas de doença semelhantes aos do João; logo, terá a mesma doença.
Exemplo2: João e José costumam ter a mesma reacção face à justiça e à injustiça.
João reagiu agressivamente às manifestações racistas de ontem.
Logo, José deve ter reagido agressivamente às manifestações racistas de ontem.
Regras:
1. Não basear as conclusões em semelhanças raras e secundárias;
2. Não desprezar as diferenças existentes;
3. Não confundir as conclusões prováveis da analogia com as conclusões da indução e da dedução.
b) Regras da Indução
1. Se as premissas são verdadeiras a conclusão é provavelmente verdadeira mas não necessariamente verdadeira.
2. A conclusão diz mais do que as premissas, isto é, a conclusão contém informação não presente, nem
implicitamente, nas premissas.
3. Quem aceita o que dizem as premissas (ou o que diz a premissa) não tem necessariamente de aceitar o que diz a
conclusão.
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O facto de a conclusão se estender a casos não verificados (de conter mais informação do que a dada nas premissas)
faz do argumento indutivo um precioso instrumento de previsão, mas, por outro lado, a conclusão é apenas provável.
Por isso, aceitar as premissas e negar a conclusão não implica contradição.
c) Tipos de indução
i) Indução formal ou aristotélica (completa ou totalizante)
Consiste em afirmar ou negar de uma totalidade de seres o que fora afirmado ou negado de todos e de cada um em
particular. Afirma-se ou nega-se de uma classe de objectos ou seres a qualidade que foi verificada em cada um deles.
Testos de Apoio
Exemplo: A, B, C, D são todos os seres de um grupo; mas A,B,C,D, têm a propriedade X; logo, a propriedade X pertence a
todos os seres do grupo.
Ex: O homem, o cavalo, o macho… vivem durante muito tempo.
Ora, o homem, o cavalo, o macho… não têm fel.
Logo, os animais sem fel vivem durante muito tempo.
O raciocínio é formalmente valido se o carácter vida longa pertence a todos os casos observados e se, por outro lado,
os casos observados recobrem a totalidade dos casos possíveis.
Assim sendo, trata-se de um raciocínio que: é formalmente correcto, completo e totalizante, autoriza uma conclusão
universal, não acrescenta conhecimentos novos aos já sabidos e é simplificante.
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2. Um argumento dedutivo não pode dizer mais na conclusão do que nas premissas (a informação contida na
conclusão já está, pelo menos implicitamente, contida nas premissas).
3. Quem aceita as premissas de um argumento dedutivo tem de aceitar a conclusão – a menos que seja incoerente.
Como o argumento dedutivo apenas explica uma conclusão que está contida nas premissas, quem afirmar que as
premissas são verdadeiras já está a afirmar que a conclusão é verdadeira – se não o fizer comete uma contradição.
c) Tipos da dedução
Na dedução as duas ou mais proposições iniciais são dita de antecedentes e a proposição inferida dita consequente.
Esta, ou está contida naquelas (dedução silogística19), ou é sua consequência lógica (dedução matemática).
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Trata-se de uma inferência puramente formal. Limita-se a apresentar, sob novas formas, verdades já conhecidas. Não
produz, portanto, novos conhecimentos. Foi considerada, por isso, como estéril. É, portanto, muito proveitosa para
expor e argumentar com rigor e clareza uma determinada tese. Tem inequívocas vantagens pedagógicas.
Nota: Modernamente, a única forma de raciocínio admitida é a dedução, pois permite alcançar conclusões
absolutamente certas. Com efeito, a analogia é considerada uma indução seguida de uma dedução. As conclusões de
uma analogia podem permitir formular uma hipótese, mas não a podem provar, porque uma semelhança não arrasta
necessariamente outra semelhança.
A indução não constitui um verdadeiro raciocínio, pois que, a regra essencial do raciocínio exige que a conclusão não
afirme mais do que as premissas, o que, na verdade, não se verifica na indução. Além disso, a indução concluindo de
alguns casos para todos, pode conduzir a uma probabilidade maior ou menor, mas não a uma certeza absoluta que é
própria de dedução; quando muito leva a uma certeza pratica, por se apoiar na verificação experimental. Não é mais
do que uma forma especial de intuição, pois é por intuição inventiva que o sábio, ao observar os casos individuais,
surpreende a relação essencial que constitui a lei geral. Sob ponto de vista lógico, raciocínio e dedução são a mesma
coisa.
EXERCÍCIOS
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1.2. Dado que a Ágata é a mãe de Raquel e a irmã de Toni, segue-se que Toni é o tio da Raquel.
R/ Argumento dedutivo porque a conclusão está contida nas premissas. A conclusão deriva necessariamente delas. Ágata é
mãe de Raquel. Ora, Toni é irmã da Ágata. Logo, Logo, é tio de Raquel
1.3. Platão e Sócrates viveram até uma idade avançada. Logo conclui-se que os antigos gregos, na sua maioria viveram muitos
anos.
1.4. A função que desempenha o número zero na adição é idêntica à função que cumpre o número um na multiplicação; a soma
de qualquer número com zero é igual ao próprio numero. Qual é o produto de um número qualquer multiplicado por um?
1.5. As estatísticas revelam que 80% das pessoas que se vacinam contra a gripe não a contraem. João vacinou-se contra a
gripe há dois meses. Logo, João ficará imune à gripe que agora atinge tanta gente.
1.6. Esta caixa registadora contém mais de 50 moedas. Dez moedas tiradas ao acaso tinham datas anteriores a 1945. Logo, as
moedas da caixa terão datas anteriores a 1945.
1.7. A próxima Anedota do Joaquim não terá graça porque até agora nenhuma das que contou a teve.
1.8. Conheces alguma mulher moçambicana que tenha sido Presidente da República? Não houve, nem haverá.
1.9. Os nossos clientes ficarão sempre satisfeitos. Você comprou o nosso produto. Por isso também vai ficar satisfeito.
3. LÓGICA DO SILOGISMO
3.1. Noção e análise
O silogismo é uma forma particular de inferência complexa ou mediata, ou ainda de raciocínio dedutivo, cuja
diferença específica reside na sua forma peculiar de extrair uma proposição, chamada conclusão, de duas e só duas
proposições, chamadas premissa. A teoria do silogismo foi exposta por Aristóteles em Analíticos anteriores.
Na visão aristotélica Silogismo é um raciocínio formado por três proposições, de tal modo que, sendo dadas as duas
primeiras (premissas), se segue necessariamente a terceira (a conclusão). Num silogismo, as premissas são um ou
dois juízos que precedem a conclusão e dos quais ela decorre como consequente necessário dos antecedentes, dos
quais se infere a consequência. Nas premissas, o termo maior (predicado da conclusão) e o termo menor (sujeito da
conclusão) são comparados com o termo médio, e assim temos a premissa maior e a premissa menor segundo a
extensão dos seus termos.
Um exemplo clássico de silogismo é o seguinte:
Todo homem é mortal.
Sócrates é homem.
Logo, Sócrates é mortal.
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Segundo o esquema acima, os silogismos podem dividir-se em categóricos e hipotéticos. Os categóricos são aqueles
cujas proposições afirmam ou negam pura e simplesmente (de modo absoluto ou sem reservas). Os hipotéticos são
aqueles cuja premissa maior não afirma, nem nega de uma maneira absoluta, mas em que se afirma ou nega sob
condição ou então, em que nessa premissa se estabelece uma alternativa.
A) SILOGISMOS CATEGÓRICOS
Os categóricos são aqueles cujas proposições afirmam ou negam pura e simplesmente. São regulares quando
possuem três termos e três proposições. São irregulares se possuírem mais ou menos de três proposições.
A premissa maior (P), possui o termo maior (moçambicano). A premissa menor (S), contém o termo menor
(gondolense). A conclusão articula o termo menor com o termo maior.
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Exercícios
Dados os seguintes silogismos:
1. A amizade é desejável. A amizade é virtude. Alguma virtude é desejável.
2. Nenhum sofista é credível. Algum sofista é advogado. Algum advogado não é credível.
a) Apresente a estrutura dos silogismos.
b) Indique a matéria e a forma destes silogismos.
1.2.1. Os princípios
O valor e a legitimidade do silogismo formalmente correcto assenta em três princípios fundamentais:
a) O principio da identidade
- Duas coisas iguais a uma terceira são iguais entre si.
Assim: se P é M e S é M, segue-se, necessariamente, que S é P.
b) O principio da discrepância ou da compreensão
- Duas coisas, uma das quais é idêntica a uma terceira e a outra não, são distintas entre si.
Assim: se P é M e S não é M, segue-se, necessariamente, que S não é P.
Assim, por exemplo, se os poetas são artistas e se os artistas são honestos, então os poetas são honestos.
Se uma delas convier e a outra não a uma terceira, então não convém entre si. Por exemplo, se os poetas
são extrovertidos e se nenhum filosofo é extrovertido, então nenhum filósofo é poeta.
c) O principio “Dictum de omni, dictum de nullo” (principio da extensão)
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- Tudo o que se diz do universal há que afirmá-lo de cada indivíduo; tudo o que se nega do universal há que negá-lo
também de cada indivíduo.
Assim: se o homem é mortal, Pedro (e cada um dos homens) será também mortal.
2ª Regra: Nenhum termo pode ter maior extensão na conclusão do que nas premissas.
Infringe a 2ª regra o raciocínio:
Todo o sábio procura o saber. Ora, todo o sábio é homem. Logo, todo o homem procura o saber.
4ª Regra: O termo médio deve ser tomado pelo uma vez em toda a sua extensão (isto é, universalmente)
Infringe a 4ª regra o raciocínio:
O chumbo é pesado. Ora, o ferro é pesado. Logo, o chumbo é ferro.
6ª Regra: De duas premissas afirmativas não se pode retirar uma conclusão negativa.
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Exercícios
1. Dos silogismos categóricos a seguir apresentados, diz se são ou não válidos. Para os inválidos, indica a (s) regra (s)
violada.
a) Tudo o que rasteja morre. Ora, Nenhum homem rasteja. Logo, nenhum homem morre.
b) Os moçambicanos são livres. Ora, os moçambicanos são crentes. Logo, Todos os crentes são livres.
c) O Hermínio é músico. Ora, Hermínio é grande. Logo, o Hermínio é grande músico.
d) As mesas têm pés. Ora, a Teresa tem pés. Logo a Teresa é mesa.
Os silogismos podem assumir múltiplas formas: 256 no total. No entanto, só um pequeno número goza de
legitimidade, 19 modos válidas. A maneira pela qual as proposições estão dispostas é chamada de modo do
silogismo. A posição que o termo médio assume no argumento (sujeito ou predicado), origina a figura do silogismo.
Cada forma particular resulta da combinação de uma figura com um modo. São 4 as figuras possíveis e 64 os modos
possíveis. Da combinação das figuras e modos resultam as hipotéticas 256 formas.
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1ª Figura: (Sub-prae) o termo médio (M) é sujeito na premissa maior e predicado na premissa menor.
Tem 4 modos válidos: AAA; EAE; AII e EIO.
2ª Figura: (Prae-Prae) ou (bis prae) o termo médio é predicado nas duas premissas (maior e menor).
Tem 4 modos válidos: EAE; AEE; EIO e AOO.
A = todos os comerciantes são ricos. SéM
0 = Alguns moçambicanos não são ricos. SéM
0 = alguns moçambicanos não são comerciantes. SéP
3ª Figura: (Sub-Sub) ou (bis sub) o termo médio é sujeito na premissa maior e na premissa menor.
Tem 6 modos válidos: AAI; IAI; AII; EAO; OAO e EIO.
E = Todo filósofo é simpático. MéP
A = todo o filósofo é sonhador. MéS
E = algum sonhador é simpático. SéP
4ª Figura: (Pré-Sub) o termo médio é predicado na premissa maior e sujeito na premissa menor.
Tem 5 modos válidos: AAI; AEE; IAI; EAO; e EIO.
E = nenhum gato é ave PéM
I = Alguma ave é mamífero MéS
O = Algum mamífero não é gato SéP
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Com as quatro figuras e com 64 modos do silogismo, obtemos 256 combinações possíveis (64x4). Todavia, apenas
destes modos 19 são válidos. Os 19 modos válidos são designados por palavras latinas de três sílabas. Deve-se a
Pedro Julião, médico nascido em Lisboa e que mais tarde foi Papa, com o nome de João XXI, a representação por
palavras latinas dos modos válidos do silogismo. A vogal da primeira sílaba indica a natureza da premissa maior, a
vogal da segunda é o símbolo da premissa menor; a terceira vogal representa a quantidade e qualidade da conclusão.
Exercícios
1. Classifica os silogismos seguintes quanto ao modo e figuras
a) Todo o homem é racional. Nenhum animal é racional. Nenhum animal é homem.
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3. Os silogismos seguintes são inválidos. Transforma-os em silogismos válidos e indica os respectivos modos e
figuras.
a) A prática do desporto é saudável. Ora, dormir é saudável. Logo, dormir é prática do desporto.
b) Alguns angolanos são pintores. Ora, alguns angolanos são futebolistas. logo, todos futebolistas são pintores.
2.1. Entimema
É silogismo incompleto, onde falta pelo menos uma premissa (está subentendida). Para sabermos qual das premissas
falta, examine-se na conclusão qual dos extremos não aparece no antecedente, se o maior ou o menor.
Exemplo: Eu penso, logo existo. Falta a premissa maior (todo aquele que pensa existe).
Exemplo: Todo metal é corpo, logo o chumbo é corpo.
Neste caso, fica subentendida a premissa "todo chumbo é metal". Passando para a forma silogística: Todo metal é
corpo. Todo chumbo é metal. Todo chumbo é corpo.
No dia-a-dia, usamos muitas formas como essa, pois as premissas que faltam são óbvias ou implícitas e repeti-las
pode cansar os ouvintes. Contudo, é comum haver confusão justamente por causa de premissas que faltam. A falta de
uma premissa no entimema não significa que ela falte no pensamento, pois se assim fosse, em vez de entimema
teríamos uma inferência imediata.
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2.2. Epiquerema
É o silogismo no qual uma ou duas premissas são acompanhadas das suas provas.
Exemplo: Todo o B é C porque é D
Todo o A é B porque é H
Logo, todo A é C.
Por exemplo:
O demente é irresponsável, porque não é livre.
Ora, Pedro é demente, porque o exame médico revelou ser portador de paralisia geral progressiva.
Logo, Pedro é irresponsável.
No epiquerema sempre existe, pelo menos, uma proposição composta, sendo que uma das proposições simples é
razão ou explicação da outra. O epiquerema é o “silogismo dos advogados”, porque estes fundamentam as suas
argumentações nos artigos da lei e nas provas testemunhais.
2.3. Polissilogismo
É a argumentação constituida por dois ou mais silogismos, dispostos de tal modo que a conclusão do primeiro serve
de premissa (maior ou menor) do seguinte e assim sucessivamente.
Se a conclusão se transformar em premissa maior, o polissilogismo é progressivo, se passar a ser a premissa menor,
o polissilogismo é regressivo
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2.4. Sorites
Trata-se de um argumento que tem pelo menos quatro proposições com os seus termos encadeados de forma correcta.
As conclusões intermediárias estão subentendidas. A ligação é obtida através dos vários médios. Também se
classifica em progressivo e regressivo.
2.4.1. Sorites progressivos – é aquele em o sujeito da primeira proposição é o predicado da segunda, o sujeito da
segunda é predicado da terceira, e assim sucessivamente, ate que se atinja a conclusão. Este une o sujeito da
penúltima proposição com o predicado da primeira.
2.4.2. Sorites regressivo – é aquele em que o predicado da primeira proposição é o sujeito da segunda, o predicado
da segunda é sujeito da terceira, assim sucessivamente até que se atinja a conclusão. Esta une o sujeito da primeira
com o predicado da penúltima.
Exercícios
Classifica os seguintes silogismos irregulares e tenta encontrar a (s) premissa (s) em falta.
1. O vertebrado tem sangue vermelho. O mamífero é vertebrado. O carnívoro é mamífero. O leão é carnívoro. Logo,
o leão tem sangue vermelho.
2. Quem é humilde é moderado. Quem é moderado vence as paixões. Quem vence as paixões vive em paz. Quem vive
em paz é feliz. Logo, quem é humilde é feliz.
3. Tudo o que favorece a saúde é útil. Uma vida regrada favorece a saúde. Uma vida regrada é útil. Não cometer
excessos é uma vida regrada. Não cometer excesso é útil.
4. As baleias não são peixes, porque não respiram por guelras.
5. Lembra-te que és mortal.
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B) SILOGISMOS HIPOTÉTICOS
Os hipotéticos são aqueles cuja premissa maior não afirma, nem nega de uma maneira absoluta, mas em que se
afirma ou nega sob condição ou então, em que nessa premissa se estabelece uma alternativa.
O silogismo hipotético apresenta três modalidades, conforme o conectivo utilizado na premissa maior:
1. O silogismo Condicional: quando a premissa maior é uma proposição condicional. A partícula de ligação das
proposições simples é se ... então.
Se a água tiver a temperatura de 100°C, a água ferve.
A temperatura da água é de 100°C.
Logo, a água ferve.
Esse silogismo apresenta duas figuras legítimas:
1.1. Ponendo Ponens (do latim afirmando o afirmado): ao afirmar a condição (antecedente), prova-se o
condicionado (consequência).
Se a água tiver a temperatura de 100°C, a água ferve.
A temperatura da água é de 100°C.
Logo, a água ferve.
1.2. Tollendo Tollens (do latim negando o negado): ao destruir o condicionado (consequência), destrói-se a condição
(antecedente).
Se a água tiver a temperatura de 100°C, a água ferve.
Ora, a água não ferve.
Logo, a água não atingiu a temperatura de 100°C.
Figuras legitimas Figuras ilegitimas
1ª Figura Se Pedro pensa, vive. 1ª Figura Se Pedro pensa, vive.
Modo Como Pedro pensa Modo Como Pedro não pensa.
Ponens Então, Pedro vive. Tollens Então, Pedro não vive.
2ª Figura Se Pedro pensa, vive. 2ª Figura Se Pedro pensa, vive.
Modo Como Pedro não vive Modo Como Pedro vive
Tollens Então, Pedro não pensa. Ponens Então, Pedro pensa.
2. Silogismo Conjuntivo: a partícula de ligação das proposições simples, na proposição composta, é e. Nesse
silogismo, a premissa maior deve ser composta por duas proposições simples que possuem o mesmo sujeito e não
podem ser verdadeiras ao mesmo tempo, ou seja, os predicados devem ser contraditórios. Possui somente uma figura
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legítima, o PONENDO TOLLENS, afirmando uma das proposições simples da premissa maior na premissa menor,
nega-se a outra proposição na conclusão.
Ninguém pode ser, simultaneamente, mestre e discípulo.
Ora, Pedro é mestre.
Logo, Pedro não é discípulo.
Modo legitima (ponendo-tollens) Modo ilegitima (tollendo-ponens)
A folha não pode ser simultaneamente branca e preta. A folha não pode ser simultaneamente branca e preta.
Como a folha é branca (ponendo). Como a folha não é branca (tollens).
Então, não é preta (tollens) Então, é preta (ponens)
3. Silogismo Disjuntivo: a premissa maior, do silogismo hipotético, possui a partícula de ligação ou.
Ou a sociedade tem um chefe ou tem desordem.
Ora, a sociedade não tem chefe.
Logo, a sociedade tem desordem.
Esse silogismo também apresenta duas figuras legítimas:
a) Ponendo Tollens: afirmando uma das proposições simples da premissa maior na premissa menor, nega-se a
conclusão.
Ou a sociedade tem um chefe ou tem desordem.
Ora, a sociedade tem um chefe.
Logo, a sociedade não tem desordem.
b) Tollendo Ponens: negando uma das proposições simples da premissa maior na premissa menor, afirma a
conclusão.
Ou a sociedade tem um chefe ou tem desordem.
Ora, a sociedade não tem um chefe.
Logo, a sociedade tem desordem.
Modo legitima (ponendo-tollens) Modo legitima (tollendo-ponens)
João ou está parado ou anda. João está parado ou anda.
Como João está parado (ponendo). Como não está parado (tollendo).
Então, não anda (tollens). Então, anda (ponens).
Dilema
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O dilema é um conjunto de proposições onde, a primeira, é uma disjunção tal que, afirmando qualquer uma das
proposições simples na premissa menor, resulta sempre a mesma conclusão. Por isso, este silogismo é também
chamado espada de dois gumes. Ou é um argumento em que a conclusão é sempre a mesma, quer a premissa menor
seja afirmativa quer negativa. É nisto que difere do silogismo disjuntivo vulgar.
Por exemplo:
Se dizes o que é justo, os homens te odiarão.
Se dizes o que é injusto, os deuses te odiarão.
Portanto, de qualquer modo, serás odiado.
Regras do dilema: 1) A disjunção deve ser completa para que o adversário não acrescente terceiro ou quarto
caminho; 2) A refutação de cada uma das hipóteses deve ser válida para que o adversário não negue a consequência;
3) As partes do dilema devem ser tais que não possam voltar-se contra o arguente, isto é, o dilema não deve ser
retorquível.
Exercícios
1. Diga se os seguintes silogismos são válidos ou inválidos:
a) Quando há um gato em casa, os ratos brincam. Ora, os ratos brincam. Logo, há gatos em casa.
b) Se a soma de um nº é zero, então os nºs são simétricos. Os dois números não são simétricos. Logo, a soma é zero.
c) Se a soma de dois nº é zero, então os nºs são simétricos. Os dois números não são simétricos. Logo, a soma não é zero.
d) Se tenho sida, então estou doente. ora, não tenho sida. logo, não estou doente.
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Estes argumentos por se destinarem (têm por objectivo) à persuasão podem parecer convincentes para grande parte do público,
não deixando de serem falsos por causa disso. Os argumentos falaciosos podem ter validade emocional, íntima, psicológica ou
emotiva, mas não validade lógica.
As falácias podem ser formais quando os raciocínios são inválidos quanto à sua forma ou estrutura: as premissas não sustentam
a conclusão em virtude de um erro na forma como se infere (inferências imediatas e mediatas) ou informais quando os
raciocínios são inválidos em virtude de deficiência no conteúdo.
Reconhecer as falácias é por vezes difícil. É importante conhecer os tipos de falácias para evitar armadilhas lógicas na própria
argumentação e para analisar a argumentação alheia. As falácias quando cometidas voluntariamente, com intenção de enganar,
ou confundir alguém numa discussão tomam o nome de sofismas; quando cometidas involuntariamente, de boa fé, sem intenção
de enganar chamam-se paralogismos.
Como a distinção entre a boa e má fé não é um critério lógico, mas antes moral, deve reconhecer-se que, do ponto de vista da
lógica, sofisma e paralogismo são uma só e mesma coisa, raciocínios mal conduzidos. A estes raciocínios ilegítimos dá-se
também o nome de falácias ou raciocínios (argumentos) falaciosos. Para o nosso estudo, interessa-nos os sofismas (falácias
informais).
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isto é, na má ou incorrecta expressão de ideias e sofismas lógicos ou do pensamento ou ainda de ideias cujo o erro de raciocínio
assenta antes no conhecimento imperfeito das coisas ou no mau uso das ideias sobre as coisas.
a) Equivocação é um raciocínio um ambiguidade em que se toma uma mesma e única palavra em dois ou mais sentidos
diferentes. O termo equívoco num silogismo equivale à existência de quatros termos.
Ex. Só o homem ri. Nenhuma mulher é homem. Logo, nenhuma mulher ri.
b) Anfibologia ocorre quando se procura sustentar uma conclusão utilizando uma interpretação errada de uma proposição
gramaticalmente ambígua. A ambiguidade sintáctica do argumento está numa proposição.
Ex. Todos os homens amam uma mulher. Ora Beng ama Lisa James. Logo, todos os homens amam a Lisa James.
c) Composição ocorre quando se toma quando se toma um todo indistinto e indiviso o que na realidade é distinto ou está
dividido. Ou seja, argumenta-se que o todo tem certas características porque cada uma das suas partes tem tais características. (a
parte para o todo).
Ex. Nem esta, nem aquela, nem outra falta às aulas me prejudicam. Logo, Nenhuma falta me prejudica.
d) Falácia da divisão consiste em tomar como parte o que na realidade é indivisível (ao contrário da composição). Argumenta-
se transferindo-se ilegitimamente (nem sempre) um atributo do todo (da classe) para as partes (para cada um dos membros da
classe)
Ex. Os números naturais são infinitos. Logo, o número um é infinito.
e) Metáfora consiste em tomar a figura pela realidade (comparações sem a partícula comparativa. Este sofisma é frequente ao
falar de coisas espirituais.
Ex. A vontade é como uma balança cujos pesos são os motivos. Logo, A balança pode deliberar, decidir e executar.
f) A Falsa dicotomia (bifurcação) consiste em repartir uma classe de objectos em dois pólos que se supõe serem os únicos
possíveis e incompatíveis – ignorando o facto de poder existir uma alternativa a ambos. É uma falácia que, normalmente,
confunde opostos e contraditórios. É a falácia do “ou tudo ou nada”, também conhecida como “falácia do branco e preto”.
Ex. 1. Ou continuo a fumar ou engordo. Não quero engordar. Logo, não posso deixar de fumar.
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2. Falácia de enumeração imperfeita consiste em tirar uma conclusão geral de uma enumeração insuficiente, atribuindo ao
todo o que só é verdadeiro de algumas partes.
Exemplo: Este e aquele professor ensinam filosofia. Logo, Todos os professores ensinam filosofia.
3. Falácia do acidental consiste em tomar por essencial o que é apenas acidental ou inversamente.
Exemplo: Eu como cada dia aquilo que comprei na véspera. Ontem comprei carne crua. Logo, hoje como carne crua.
Este sofisma também se pode dar na dedução, quando atribuímos ao sujeito um predicado acidental ou inversamente. Exemplo:
O homem corre. O coxo é homem. Logo, o coxo corre.
4. Falácia de ignorância de causa (falsa causa) – ocorre quando um argumento apresenta como causa de um facto algo que
não tem nenhuma relação directa com o facto que se pretende que explique. A tradição criou a expressão “ post hoc, ergo
propter hoc” a (seguir a isto, portanto, por causa disto) “correlation does not imply causation” (correlação não implica causa);
toma-se por uma causa um simples acontecimento ou qualquer circunstância acidental.
Esquema: Até agora ao acontecimento A tem sucedido o acontecimento B. por isso, A é causa de B.
Exemplo: Depois da aparição de um cometa houve uma epidemia. Logo, O cometa foi a causa de epidemia.
É indiscutível que as leis sobre o controlo de armas não visam acabar com a caça nem instaurar um estado policial que atrofie a
liberdade dos cidadãos. Há uma grande diferença entre controlar a proliferação de armas e oprimir os cidadãos.
Quem argumenta que a situação deslizará inevitavelmente para esse extremo, está a ser falacioso, como se não houvesse meio-
termo, como se a vida, nas suas diversas dimensões, fosse uma questão de ou tudo ou nada.
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Se seguíssemos a lógica deste pseudo-argumento quem bebe um copo não parará no segundo e embeber-se-á; quem come uma
batata frita comerá todo o pacote; quem começa a fumar será um fumador. Ora, na maior parte dos casos paramos a meio do
“declive ardiloso”, não descemos a encosta na sua totalidade.
Quanto aos sofismas lógicos ou de ideia, eles pecam, quer na sua matéria, quer na sua forma. No primeiro caso, ou só uma ou as
duas premissas podem ser falsas ou ambíguas. Se falsas, é preciso negá-las; se são ambíguas, é preciso tornar claro o seu
sentido. Se o raciocínio pecar quanto à forma, é necessário negar a sua consequência e verificar as leis que ele tenha violado.
Acontece quando, para provarmos a verdade de certa ideia ou conclusão, nos apoiamos numa tradição obsoleta, na reputação de
uma pessoa que não é uma autoridade nem um especialista no assunto em causa, ou na opinião da maioria. Cometemos a falácia
do apelo a autoridade não qualificada. É o caso quando estrelas de cinema, desportistas consagrados e músicos famosos são
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apresentados como autoridades em produtos como dentífricas, pastilhas elásticas e outros assuntos que, salvo raríssimas
excepções, estão fora do campo das suas competências. As razões prendem-se no facto de:
1º Recorrer-se a quem não é especialista no assunto em causa.
2º Recorrer-se a quem pode estar afectado por preconceitos e interesses pessoais.
3º As autoridades legítimas não estarem ao abrigo da dúvida (e inclusive acerca de um mesmo assunto os especialistas têm
posições opostas e divergentes).
Exemplos:
1. Friedrich Nietzsche grande filósofo alemão disse que o Cristianismo foi o acontecimento mais funesto da história europeia.
Logo, o Cristianismo foi uma desgraça histórica.
2. Pete Sampras, o maior tenistas do mundo, afirmou que as máquinas de barbear Bick são as melhores, logo, é verdade que não
há melhor máquina de barbear que ela.
O estratagema do argumento “ad hominem” é este: reprova-se ou desacredita-se alguma ou algumas características da pessoa
(o seu temperamento, o modo de ser, o comportamento moral, a profissão, a nacionalidade, a etnia, a ideologia, a religião ou a
ausência dela, etc.) utilizando-as como meio de refutação das suas opiniões.
Estrutura:
Tudo o que uma pessoa com as características A diz (ou acredita ou defende) é falso.
A pessoa X tem as características A e defende P (uma opinião).
Logo, P (essa opinião) é falso.
Exemplo: “Você diz que o futebol moçambicano está mal, mas eu digo-lhe que a sua opinião não merece crédito porque você
está é mal disposto e desiludido com os resultados do seu clube”.
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O princípio que orienta quem recorre ao “apelo ao povo” é o de que aquilo que a maioria das pessoas considera verdadeiro,
valioso, agradável é verdadeiro, valioso e agradável. A opinião da maioria toma o lugar da verdade. Exploram-se sentimentos
muito humanos como o “desejo de ser como os outros”, de ser estimado e aceite.
Com frequência, recorrem a este ardil os políticos demagogos e os publicitários.
Exemplo:
1. Querem a mudança ou a continuidade em segurança? “Eles vão aumentar os impostos! Votai em mim”; etc.
2. “ Quem quer poupar compra no continente”; “Toda a gente vão ao Totta e você por que está à espera?”; Com certeza que
você quer comprar o papel higiénico Dubom, 80% dos moçambicanos compram-no”, etc.
Os argumentos Ad populum não são, com propriedade, argumentos mas estratagemas para despertar e manipular as emoções,
desejos e paixões da maioria das pessoas. E, como se sabe, o apelo aos sentimentos é, em muitos casos, o caminho mais eficaz –
e curto – para persuadir um auditório.
Sempre que acerca de um determinado problema não temos nenhuma evidência – ou então muito escassas – a favor ou contra,
tirar uma conclusão afirmativa ou negativa é falacioso.
Exemplos: 1. Ninguém provou que Deus existe. Logo, Deus não existe.
2. Ninguém provou que Deus não existe. Logo, Deus existe.
Ora, “falar ao coração” não é um modo racional de argumento. Este tipo de argumento é com frequência utilizado por estudantes
para convencerem os seus professores a aprová-los. Em vários filmes americanos, as cenas de tribunal mostram-nos muitas
vezes os advogados de defesa a tentarem obter a ilibação do réu apelando, dentro do que as circunstâncias permitem, à piedade,
compreensão e altruísmo dos jurados.
Exemplo: Mereço uma nota melhor neste teste professor, porque obter notas baixas deixa-me deprimido e com uma azia
insuportável.
6. Argumento “ad terrorem”: leva a admitir uma opinião em virtude das consequências funestas que resultariam da sua não
admissão.
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7. Uso de interrogações múltiplas: é caracterizado por se fazerem muitas perguntas sucessivas, de modo que tornam impossível
uma só resposta.
Ex. O que faremos com esse criminoso? Matar ou Prender?
8. Argumentum ad Baculum – Apelo à Força (Pressão psicológica)
A falácia do apelo à força ou do “recurso ao cacete” verfica-se quando quem argumenta a favor de uma conclusão sugere ou
afirma que algum mal ou algum problema acontecerá a quem nao a aceitar. Portanto, este tipo de argumentação baseia-se em
ameaças explicitas ou implicitas ao bem-estar físico e inclusive psicológico do ouvinte ou do leitor seja ele um individuo ou um
grupo de individuo.
Propriamente falando, o argumento que se baseia no apelo à força não merece o nome de arguemento. Abandona-se o
raciocinio, a justificação e a prova de uma concluão ou ideia para recorrer a meios que nada têm a ver com a razão.
Ex: As minhas opiniões estão correctas porque mandarei prender quem discordar de mim.
2. PARADOXOS
Noção: por paradoxos entende-se o enunciado ou raciocínio que vai de encontro ao senso comum (para+doxa) ou ao bom senso
lógico, cuja absurdidade não parece, à primeira vista, superável.
O paradoxo apresenta-se sempre como um “non-sens”, como uma contradição, como um indecidível. Comporta ainda algo
maravilhoso, algo assombroso.
Qualquer que seja a resposta (sim ou não), conclui-se que a frase Todos os cretenses são mentirosos dá sempre lugar a uma
contradição, considerando verdadeira a afirmação Epiménides era cretense.
1. Epiménides mente se e só se não mente (isto é, diz verdade)
2. Epiménides não mente (isto é, diz a verdade) se e só se mente.
Exercícios
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1. O objecto
O objecto de estudo da lógica proposicional é, para além do estudo das proposições e suas relações, uma análise da validade
formal das inferências, raciocínios, levadas a cabo com proposições. Esta análise passa pelo denominado cálculo proposicional,
assente na realização de operações entre proposições.
As únicas proposições que podem ser estudadas em lógica proposicional são os enunciados constativos (notórios, que correm
como certas) _ ou apofânticos (susceptíveis de serem consideradas como verdadeiras ou falsas) – aqueles em que se descrevem
estados de coisas.
Ficam de fora as proposições ou enunciados interrogativos, imperativos e exclamativos, justamente por deles não se poder dizer
que são verdadeiros ou falsos.
4. As Tabelas de Verdade
A verdade das proposições compostas depende do nexo entre as proposições simples constituintes e da verdade destas. A lógica
proposicional, mediante as “tabelas de verdade”, determina mecanicamente a verdade ou falsidade das proposições compostas,
segundo a combinação dos valores de verdade ou falsidade das proposições atómicas. São possíveis diversos casos,
correspondendo a cada um diferente tabela de verdade.
Tabelas das diferentes conectivas ou conectores lógicos Negação – é uma conectiva unária porque opera sobre apenas uma
frase. Por ex., obtém-se o enunciado “Não está frio”, tomando como ponto de partida o enunciado “Está frio”. As restantes
conectivas são binárias porque operam sobre mais que uma frase.
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Nas tabelas o símbolo V pode ser substituído pelo número 1 (um) e o símbolo F pelo número 0 (zero)
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EXERCÍCIO
h) pq
i) p ~ q.
2. Representando por letras as proposições elementares, traduza em linguagem simbólica cada uma das
seguintes proposições compostas:
Seja, as proposições elementares: a: estudo; b: vejo televisão.
a) ou estudo ou vejo televisão;
b) se estudo, então vejo televisão;
c) vejo televisão e não estudo;
d) estudo se e só se não vejo televisão.
7. Escreva cada um dos argumentos seguintes na forma simbólica e verifique se se trata ou não de um silogismo válido
e justifica.
a) Não fiz o trabalho de casa ou não fui ao cinema. Não fiz o trabalho de casa. Logo, fui ao cinema.
b) Se não acordo a tempo, perco o autocarro. Não perdi o autocarro. Logo, acordei a tempo.
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8. Classifique cada uma das expressões em designação ou proposição e, no caso das proposições, indique o seu valor
lógico:
a) Michel Jackson;
b) “Os gorwanes” é um agrupamento musical zimbabueano;
c) Música clássica;
d) Michel Jackson foi um cantor americano;
e) Beethoven compôs música clássica.
a) p v r; b) p v q;
c) q v ~ p; d) ~ q v ( p v r);
e) ~ q v ~ r; f) ~ (p v r);
g) p Λ ~ q; h) ~ p Λ ~ r.
h) ~ r ( p v q).
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