Vidas Secas
Vidas Secas
Vidas Secas
● Faz uma crítica regionalista, pois a obra trata da seca e fome vivida por
pessoas da região nordeste do Brasil.
● É uma obra regionalista por se tratar da fome e condições precárias vividas
no sertão. Denuncia a vida sofrida dos nordestinos.
● Artista do segundo movimento modernista, Graciliano Ramos denunciou
fortemente as mazelas do povo brasileiro, principalmente a situação de
miséria do sertão nordestino.
Em sua obra, o escritor Graciliano Ramos, aborda com frequência questões sociais
que envolvem um homem brasileiro, analisando os dramas existenciais
representados nas figuras humanas marcadas pela miséria. O trecho que apresenta
essas características com maior clareza é:
" Num cotovelo do caminho avistou um canto de cerca, encheu-o a esperança de
achar comida, sentiu o desejo de cantar. A voz saiu-lhe rouca, medonha. Calou-se
para não estragar força".
“Vidas Secas“, romance publicado em 1938, retrata a vida miserável de uma família
de retirantes sertanejos obrigada a se deslocar de tempos em tempos para áreas
menos castigadas pela seca. A obra pertence à segunda fase modernista,
conhecida como regionalista.
O estilo seco de Graciliano Ramos, que se expressa principalmente por meio do uso
econômico dos adjetivos, parece transmitir a aridez do ambiente e seus efeitos
sobre as pessoas que ali estão.
Informações extras:
➔ O romance pode ser chamado de "romance desmontável", pois os capítulos
podem ser lidos em qualquer ordem.
➔ Discurso indireto livre: o autor utiliza uma técnica narrativa que consiste em
inserir as falas ou pensamentos das personagens diretamente no discurso do
narrador. (Livre: daquelas expressões que sugerem a iniciação da fala do
personagem). (Esse discurso substitui a ausência de fala dos personagens
do livro, são praticamente mudos ou pouco falam).
➔ Monólogo interior livre fluxo da consciência: narrador procura expor os
pensamentos dos personagens da forma natural e confusa como eles se
formam, sem organizá-los para uma compreensão lógica.
Temáticas
O sertão nordestino retratado por Graciliano Ramos, a partir de um regionalismo
que trata de temas universais, conversa sobre a
● Condição de miséria perante a seca
● O abuso de autoridade
● A exploração do trabalho
● Inócua perspectiva de vida de seus personagens
● Injustiças socias
● Jugo explorador e escravagista do latifúndio, pelo autoritarismo do
Estado, representado pelo soldado amarelo, e pela indiferença das
instituições em geral, como governos, igrejas e sociedade
Conclusão
Em Vidas Secas, Graciliano Ramos sugere que o pobre está jogado à sua
própria sorte, sem saída, sem chance de alguma melhoria social e econômica,
por isso a família de retirantes anda em círculo, pois, cada vez que é dispensada de
uma fazenda, “retoma o caminho de sempre”. Essa tese é aprofundada pelo jugo
explorador e escravagista do latifúndio, pelo autoritarismo do Estado,
representado pelo soldado amarelo, e pela indiferença das instituições em
geral, como governos, igrejas e sociedade.
Personagens
O grau de semelhança na caracterização de Fabiano e de sua família é muito
grande. A brutalidade da seca faz com que os personagens também se
embruteçam, é ai que o autor os compara com animais. As personagens não falam,
mas grunhem, rosnam, gesticulam e falam palavras soltas. Cabe ao narrador
interpretar e expor os seus desejos.
Fabiano:
Fabiano é um homem rude, típico vaqueiro do sertão nordestino. Sem ter
frequentado a escola, não é um homem com o dom das palavras, e chega a ver a si
próprio como um animal às vezes.
Empregado em uma fazenda, pensa na brutalidade com que seu patrão o trata.
Fabiano admira o dom que algumas pessoas possuem com a palavra, mas assim
como as palavras e as ideias o seduziam, também cansavam-no.
Fabiano quer se revoltar contra as injustiças que sofre por parte do patrão e do
soldado amarelo, porém, como um animal domesticado, aceita os maus-tratos.
Fabiano tem uma enorme dificuldade de raciocinar e se expressar de maneira lógica
e organizada. Comunica-se com gestos e grunhidos, o que o aproxima muito
de um bicho, como ele mesmo reconhece. Quando vão para a cidade (capítulo
“festa”), sentem-se deslocados e assustados. Fabiano é preso e surrado como um
animal por capricho de um “soldado amarelo”
Sinhá Vitória:
Sinha Vitória é a esposa de Fabiano. Mulher cheia de fé e muito trabalhadora. Além
de cuidar dos filhos e da casa, ajudava o marido em seu trabalho também. Esperta,
sabia fazer contas e sempre avisava ao marido sobre os trapaceiros que tentavam
tirar vantagem da falta de conhecimento de Fabiano.
Sonhava com um futuro melhor para seus filhos e não se conformava com a miséria
em que viviam. Seu sonho era ter uma cama de fita de couro para dormir (metáfora
para o desejo de ter um lugar definitivo e seu para viver).
Seu inconformismo faz com que ela se transforme em uma pessoa queixosa,
sendo impaciente com os filhos e um tanto quanto amargurada.
● Inconformada com sua situação, sonha com uma vida mais digna,
representada pelo desejo de possuir uma cama de lastro.
● A cama representa ter um "lugar definitivo para viver".
Filhos:
Nesse cenário de miséria e sem se darem muita conta do que acontecia a seu
redor, viviam os dois meninos. O mais novo via na figura do pai um exemplo.
Já o mais velho queria aprender sobre as palavras. Um dia ouviu a palavra “inferno”
de alguém e ficou intrigado com seu significado. Perguntou a Sinhá Vitória o que
significava, mas recebeu uma resposta vaga. Vai então perguntar a Fabiano, mas
esse o ignora. Volta a questionar sua mãe, mas ela fica brava com a insistência e
lhe dá um cascudo. Sem ter ninguém que o entenda e sacie sua dúvida, só
consegue buscar consolo na cadela Baleia.
O mais novo admira a figura do pai vaqueiro, integrado à terra em que vivem. Já o
mais velho não tem interesse nessa vida sofrida do sertão e quer descobrir o o
sentido das palavras, recorrendo mais à mãe.
Baleia:
A cadela que é tratada como membro da família. Pensa, sonha e age como se fosse
gente. A cachorra Baleia tem sonhos, se comunica com o seu corpo de forma mais
eficaz e salva a família da fome no começo do livro.
Quando nos apresentam os homens vistos pelos olhos dos animais, como a
cachorra Baleia (Vidas secas) produzem um efeito de estranhamento, pois nos
fazem enxergar de um ponto de vista inusitado o que antes parecia natural e
familiar.
● Cachorrinha da família que se humaniza pelas atitudes de solidariedade
com o drama físico e social dos humanos.
Papagaio:
Por curto período a família também contou com um mascote papagaio, que
precisou ter sua vida abatida para saciar a fome que todos sacrificavam, logo
no início do livro.
Patrão:
Fazendeiro desonesto que explorava seus empregados, contrata Fabiano para
trabalhar.
O dono da fazenda abandonada em que Fabiano trabalha como vaqueiro também
pode ser considerado uma representação da mediocridade, injustiça e opressão.
Sua busca pela produtividade o deixa cego para qualquer valor humano. Em
contrapartida, a família caminha num triste movimento cíclico de solidão, abandono
das autoridades e desesperança. A única alternativa é a melancólica fuga, tanto
de si mesmos como do sertão abrasador.
Soldado Amarelo:
Seu Tomás também é um homem rústico e pobre do interior. Mesmo assim, serve
de referência ao casal, tanto no aspecto cultural quanto social. Fabiano deseja ter
a capacidade de “falar” como o seu Tomás da Bolandeira. Sinhá Vitória deseja
ter a sua estabilidade financeira (simbolizada na cama de lastro) para largar
aquela vida nômade de ter de se mudar a cada período de seca.
Capítulos
Um dia a chuva chega (o “inverno”) e ficam todos em casa ouvindo as histórias de
Fabiano. Histórias essas que ele nunca tinha vivido, feitos que ele nunca havia
realizado. Em meio a suas histórias inventadas, Fabiano pensava se as coisas iriam
melhorar dali então. Para o filho mais novo, as sombras projetadas pela fogueira no
escuro deixava o pai com um ar grotesco. Já o mais velho ouvia as histórórias de
Fabiano com muita desconfiança.
O Natal chegou e a família inteira foi à festa da cidade. Fabiano ficou embriagado e
se sentiu muito valente, só pensando em se vingar do soldado que lhe colocou atrás
das grades. Uma hora, cansado de seu próprio teatro, faz de suas roupas um
travesseiro e dorme no chão.
Sinha Vitória estava cansada de cuidar do marido embriagado e ter que olhar as
crianças também. Em um dado momento, ela toma coragem para fazer o que mais
estava com vontade: encontra um cantinho e se abaixa para urinar. Satisfeita,
acende uma piteira de barro e fica a sonhar com a cama de fitas de couro e um
futuro melhor.
No que talvez seja o momento mais famoso do livro, Fabiano vê o estado em que se
encontrava Baleia, com pelos caídos e feridas na boca e achou que ela pudesse
estar doente. O vaqueiro resolve, então, sacrificar a cadela.
Sinhá Vitória recolhe os filhos, que protestavam contra o sacrifício do pobre animal,
mas não havia outra escolha. O primeiro tiro acerta o traseiro de Baleia e a deixa
com as patas inutilizadas. A cadela sentia o fim próximo e chega a querer morder
Fabiano. Apesar da raiva que sentia de Fabiano, o via como um comum
companheiro de muito tempo. Em meio ao nevoeiro e da visão de uma espécie de
paraíso dos cachorros, onde ela poderia caçar preás à vontade, Baleia morre
sentindo dor e arrepios.
E assim a vida vai passando para essa família sofredora do sertão nordestino. Até
que um dia, com o céu extremamente azul e nenhuma nuvem à vista, vendo os
animais em estado de miséria, Fabiano decide que a hora de partir novamente havia
chegado. Partiram de madrugada largando tudo como haviam encontrado. A cadela
Baleia era uma imagem constante nos pensamentos confusos de Fabiano. Sinhá
Vitória tentava puxar conversa com o marido durante a caminhada e os dois
seguiam fazendo planos para o futuro e pensando se existiria um destino melhor
para seus filhos.
A estética da seca
“Vidas Secas” é um dos maiores expoentes da segunda fase modernista, a do
regionalismo. O diferencial desse livro para os demais da época é o apuro técnico
do autor.
Narrador
A escolha do foco narrativo em terceira pessoa é emblemática, uma vez que esse é
o único livro em que Graciliano Ramos utilizou tal recurso. Trata-se, na verdade, de
uma necessidade da narrativa, para que fosse mantida a verossimilhança da obra.
Por causa da paupérrima articulação verbal dos personagens, reflexo das
adversidades naturais e sociais que os afligem, nenhum parece capacitado a
assumir o posto de narrador.
O autor utilizou também o discurso indireto livre, forma híbrida em que as falas
dos personagens se mesclam ao discurso do narrador em terceira pessoa (trata-se
de uma forma de mostrar a fala ou pensamento das personagens inseridos
diretamente no discurso do narrador).
Essa foi a solução para que a voz dos marginalizados pudesse participar da
narração sem que tivessem de arcar com a responsabilidade de conduzir de forma
integral a narrativa.
Espaço
A narrativa é ambientada no sertão, região marcada pelas chuvas escassas e
irregulares. Essa falta de chuva – somada a uma política de descaso do governo
com os investimentos sociais – transforma a paisagem em ambiente inóspito e
hostil.
O retorno à visão marcada pela falta de perspectivas recomeça com o fim das
chuvas, com o fim da esperança. Na obra, pode-se apontar, também, para dois
recortes espaciais: o ambiente rural e o urbano. A relevância desse recorte se deve
às sensações de adequação ou inadequação dos personagens em um ou outro
espaço.
Tempo
Além da falta de linearidade do tempo, em “Vidas Secas” há nítida valorização do
tempo psicológico, em detrimento do cronológico. Essa opção do narrador de
ocultar os marcadores temporais tem como principal consequência o distanciamento
dos personagens da ordenação civilizada do tempo.
Dessa forma, nota-se que a ausência de uma marcação cronológica temporal serve,
enquanto elemento estrutural, como mais uma forma de evidenciar a exclusão
dos personagens. Por outro lado, a valorização do tempo psicológico na narrativa
faz com que as angústias dos personagens fiquem mais próximas do leitor, que as
percebe com muito mais intensidade.
O tempo de narrativa medeia duas secas. A primeira que traz a família para a
fazenda e a segunda que a leva para o Sul. Mesmo possuindo algumas referências
cronológicas na obra, o tempo é psicológico e circular.
"... Sinhá Vitória é saudosista. Lembra-se de acontecimentos antigos, até ser
despertada pelo grito da ave e ter a idéia de transformá-la em alimento".(Cap. 01 –
Mudança).
Comentário do Professor
“Vidas Secas” é um romance cíclico. São 13 capítulos independentes que contam a
retirada de uma família. Inicia-se com uma mudança e termina com a fuga. Eles são
quase como contos com as suas narrativas próprias.
A família é composta pelo pai – Fabiano – que quase não fala, não sabe que é
branco e não sabe ler nem escrever. Sinhá Vitória, mulata esperta que sabia fazer
contas com os grãos, Menino mais velho que queria saber ler e queria o significado
da palavra Inferno. Menino mais novo, queria ser um vaqueiro como o pai. Cadela
Baleia, a mais humana das personagens e um papagaio que não falava, só latia
porque era o único som que escutava.
Além disso, pode ser perguntado sobre o grau de miserabilidade dessa família: a
cadela chegando ao nível humano e o humano descendo à condição de
animal. Esta família vaga pela caatinga tentando chegar em algum lugar, mas
podem estar perdidos, andando em círculo.Assim, o escritor, entre os mais
importantes da segunda fase modernista, desenha a vida do sertanejo em um
círculo. Ou uma espiral. Como uma roda viva.
“Por isso não se trata de um romance típico sobre a seca, mas sobre vidas
secas. Vidas apresentadas em toda sua complexidade enquanto partes de um
processo sistemático de exploração, humilhação e alienação. Em resumo,
dessa mescla entre artesania da palavra e problematização de feridas tão vivas da
realidade brasileira, o artista extrai sua força, que o engrandece e o coloca como um
dos principais artistas de nossa literatura.”
"Por outro lado, ao optar por Vidas Secas, seu único título adjetivado, elegeu um
nome capaz de englobar todas as narrativas e conferir unidade ao todo, realçando a
arquitetura precisa e bem estruturada do conjunto."
Análise da obra
Em Vidas Secas, Graciliano enfatiza a exploração do trabalhador, mostrando como
Fabiano é enganado pelo dono da fazenda: seu patrão o rouba nas contas, cobra
preços abusivos pelos mantimentos e juros altíssimos.No final, Fabiano foge da
seca e da dívida que tem com o seu patrão. Mesmo após trabalhar mais de um ano,
ele continua sem nenhuma posse.
Graciliano retrata a miséria que toma o homem bruto e ele mesmo se vê mais como
um bicho do que como um ser humano.
A condição de homem bruto faz com que o protagonista seja explorado pelo seu
patrão e oprimido pelo governo. Mesmo que a miséria venha pelas condições da
natureza (a seca), os homens se aproveitam dela em vez de ajudar aqueles que
mais precisam.
O livro é cheio de termos regionais e a escrita se aproxima mais da fala. Assim
como em outros romances da segunda fase do modernismo, essa obra aborda
temas sociais com o propósito de denúncia e questionamento.
Corrente literária
Vidas Secas é um romance regionalista que faz parte da segunda geração do
modernismo, também conhecida como geração de 30.
Seus livros denunciam as injustiças sociais sem deixar de explorar também o drama
psicológico de seus personagens.
Ausência de comunicação
A estiagem que corrói a terra, levando à fome e à necessidade de migrar
também domina a alma de cada um dos personagens. Eles não passam de
marionetes de um grande sistema econômico do qual não conseguem
escapulir e que os massacra sob diversos aspectos, da falta de dinheiro ao da
carência total de perspectivas.
Mesmo na tarefa de matar Baleia, Fabiano fracassa. Apenas fere o animal, que vem
a morrer no dia seguinte. O talento de Graciliano está em estruturar a narrativa
de modo que, perante pessoas sem sonhos, apenas Baleia tem o poder de
imaginar. Pouco antes de morrer, ela vê a si mesma num campo repleto de preás,
onde poderia saciar a sua fome.
A estrutura cíclica
No último capítulo (“fuga”), ocorre um novo período de seca e a família é obrigada
novamente a fugir em direção ao sul para sobreviver. Dessa forma, temos a
estrutura cíclica desta narrativa. O livro começa e termina com a família na mesma
situação de retirantes, como se tivessem voltado ao mesmo ponto de partida.
Aqui vale ressaltar que esta estrutura cíclica da narrativa tem um forte aspecto
simbólico. Graciliano Ramos está chamando a atenção do leitor para o drama dos
retirantes nordestinos, que se repete ciclicamente, não apenas na questão da
seca, mas das misérias e injustiças sociais que vão passando de geração para
geração. O drama vivido por Fabiano já foi vivido por seu pai, seu avô e será
repetido pelos seus filhos.
A animalização do humano
A hostilidade da natureza e os vários níveis de opressão do sistema rural arcaico
parecem eliminar do vaqueiro e de sua família vários traços de humanidade,
impelindo principalmente Fabiano a desconfiar de sua própria condição.
Inúmeras vezes, no transcurso da narrativa, ele se contempla como um bicho:
Por seu turno, é verdade que Baleia se humaniza, sobremodo no capítulo que leva o
seu nome e no qual ela acaba eliminada. Em toda a prosa áspera de G.R. é o único
momento de alta poesia.
"E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade
homens fortes, brutos, como Fabiano, sinhá Vitória e os dois meninos."
O termo “homem” certamente não designa gênero. Homens como sinhá Vitória?
Homens como os dois meninos? Homem aqui tem outro sentido, o mesmo que
Euclides da Cunha aplicou ao sertanejo. Representa força, capacidade de
resistência, disposição voluntária para mudar a vida, vitória sobre as mais
terríveis circunstâncias. Fabiano e seus familiares são homens e não bichos.
Título da obra
Vidas Secas: o título afronta duas formas de narrar (tendências narrativas) que
pendem mais para se excluir do que para se unir. A primeira linha é a sociológica
"secas" onde tenta fazer um romance realista regionalista; a segunda linha a
psicológica "vidas", a do realismo psicológico. Impondo-se com o romance
psicológico onde a análise se sobrepõe o documentário sociológico.
A energia vital física que lhe permite resistir aos obstáculos e que é indispensável
preservar cautelosamente, sem esbanjamentos inúteis, como aparece em
"Mudança", em que Fabiano ao avistar o pátio "cerca" de uma fazenda sentiu
vontade de cantar a sua alegria, mas logo se conteve: "Calou-se para não estragar
força"pág.12
Deus, Nossa Senhora, os santos e sinhá Terta com as suas rezas. Deus podia
afastar alguns males, a reza da Ave-Maria reza forte "podiam esconjurar a seca e
curar a novilha raposa que andava tresmalhada". Fabiano e a família vão a igreja
pelo Natal "Festa" rezam para esconjurar os malefícios e doenças do gado, mas não
reconhecem Deus como origem das situações más, por isso esperam dele as boas,
como se ele "Deus" fosse um intercessor junto do Destino.
“Por isso não se trata de um romance típico sobre a seca, mas sobre vidas secas.
Vidas apresentadas em toda sua complexidade enquanto partes de um
processo sistemático de exploração, humilhação e alienação. Em resumo,
dessa mescla entre artesania da palavra e problematização de feridas tão vivas da
realidade brasileira, o artista extrai sua força, que o engrandece e o coloca como um
dos principais artistas de nossa literatura.”
"Por outro lado, ao optar por Vidas Secas, seu único título adjetivado, elegeu um
nome capaz de englobar todas as narrativas e conferir unidade ao todo,
realçando a arquitetura precisa e bem estruturada do conjunto."
Capítulo 1: Mudanças
No início desta resenha de Vidas Secas somos apresentados a Fabiano, Sinhá
Vitória, o filho mais velho, o filho mais novo, uma cachorra chamada Baleia e um
papagaio. Eles são os seis viventes que estão caminhando na seca. Trata-se de
uma família de retirantes perambulando na caatinga por um dia inteiro, sem nem
mesmo encontrar sombra para descansar.
O filho mais velho de Fabiano já não dá mais conta de andar, para e se deita, fica
imóvel, pois está sem forças. O pai xinga, tenta cutucá-lo e forçá-lo, mas ele
permanece como está. Não houve jeito e Fabiano o coloca no cangote (pescoço) e
todos prosseguem silenciosamente.
Todos tinham muita fome, e era tanta que comeram o papagaio que estava com eles
e que tinha morrido. Com mais um pouco de caminhada, acharam uma fazenda
abandonada. Por lá, a cachorra Baleia até conseguiu caçar um preá (um tipo de
roedor), do qual comeu tão somente os ossinhos.
Fabiano olhando o céu percebeu que a chuva estava por vir e que a caatinga
ressuscitaria. Pensou que tudo ficaria bem, pois ele seria o novo fazendeiro do lugar
e todos teriam saúde.
"Estavam no pátio de uma fazenda sem vida. O curral deserto, o chiqueiro das
cabras arruinado e também deserto, a casa do vaqueiro fechada, tudo anunciava
abandono. Certamente o gado se finara e os moradores tinham fugido".
● Fazenda estava abandonada.
● Os moradores provavelmente fugiram da seca e abandonaram suas fazendas
e seus pertences naquele local.
"Fabiano seguiu-a com a vista e espantou-se: uma sombra passava por cima do
monte. Tocou o braço da mulher, apontou o céu, ficaram os dois algum tempo
aguentando a claridade do sol. Enxugaram as lágrimas, foram agachar-se perto
dos filhos, suspirando, conservaram-se encolhidos, temendo que a nuvem se
tivesse desfeito, vencida pelo azul terrível, aquele azul que deslumbrava e
endoidecia a gente".
"Entrava dia e saía dia. As noites cobriam a terra de chofre. A tampa anilada
baixava, escurecia, quebrada apenas pelas vermelhidões do poente".
● Os dias iam passando e eles estavam sem rumo e com muita fome. Ficaram
à margem dos juazeiros, todos encolhidos e cansados.
"Iam-se amodorrando e foram despertados por Baleia, que trazia nos dentes um
preá. Levantaram-se todos gritando. O menino mais velho esfregou as pálpebras,
afastando pedaços de sonho. Sinha Vitória beijava o focinho de Baleia, e como o
focinho estava ensanguentado, lambia o sangue e tirava proveito do beijo".
● Ficaram eufóricos com o alimento trazido por Baleia.
● Sinhá ficou tão grata que começou a beijar seu focinho ensanguentado.
"Aquilo era caça bem mesquinha, mas adiaria a morte do grupo. E Fabiano
queria viver. Olhou o céu com resolução. A nuvem tinha crescido, agora cobria o
morro inteiro. Fabiano pisou com segurança, esquecendo as rachaduras que
lhe estragavam os dedos e os calcanhares".
● Mesmo sendo significante aquela comida a família ficou alegre, porque
assim adiaria sua morte.
● Fabiano sentia e desejava do fundo da sua alma viver, por isso que ao pisar
com segurança no chão, ele esqueceu que seus pés estavam com marcas
profundas de tanto andar pelo sertão e se comprometeu a procurar água.
"Fabiano tomou a cuia, desceu a ladeira, encaminhou-se ao rio seco, achou no
bebedouro dos animais um pouco de lama. Cavou a areia com as unhas,
esperou que a água marejasse e, debruçando-se no chão, bebeu muito.
Saciado, caiu de papo para cima, olhando as estrelas, que vinham nascendo. Uma,
duas, três, quatro, havia muitas estrelas, havia mais de cinco estrelas no
céu. O poente cobria-se de cirros — e uma alegria doida enchia o coração de
Fabiano".
● Fabiano se sentiu tão motivado que foi à procura de água e aí se debruçou
no chão cavando um buraco e bebeu com muita felicidade.
"Agora, deitado, apertava a barriga e batia os dentes. Que fim teria levado a
bolandeira de seu Tomás?"
● Questionamento sobre o paradeiro de Seu Tomás
Capítulo 2: Fabiano
Neste capítulo de Vidas Secas de Graciliano Ramos, o pai da família é apresentado
com mais detalhes. Trata-se de um homem ignorante, um bruto. Ele se considera
vaqueiro, mas também é como um bicho. Tem habilidade com os animais e se sente
como um.
Com o retorno da chuva, o verdadeiro dono da fazenda na qual Fabiano estava com
sua família retorna e os expulsa. Porém, Fabiano consegue tê-lo como seu patrão
(que o trata muito mal, por sinal) e se torna o capataz do lugar.
Ele e Sinhá Vitória conversam sobre seu Tomás da Bolandeira, que era um
fazendeiro poderoso que falava muito bem, lia bastante e era cortez. Mas que
também morreu na seca, e disso tiram a conclusão de que primeiro o importante é
sobreviver e pensar vem em segundo lugar.
"Chegou-se à beira do rio. A areia fofa cansava-o, mas ali, na lama seca, as
alpercatas dele faziam chape-chape, os badalos dos chocalhos que lhe pesavam
no ombro, pendurados em correias, batiam surdos. A cabeça inclinada, o espinhaço
curvo, agitava os braços para a direita e para a esquerda. Esses movimentos
eram inúteis, mas o vaqueiro, o pai do vaqueiro, o avô e outros antepassados
mais antigos haviam-se acostumado a percorrer veredas, afastando o mato
com as mãos. E os filhos já começavam a reproduzir o gesto hereditário".
"Deu estalos com os dedos. A cachorra Baleia, aos saltos, veio lamber-lhe as mãos
grossas e cabeludas. Fabiano recebeu a carícia, enterneceu-se:
— Você é um bicho, Baleia.
Vivia longe dos homens, só se dava bem com animais. Os seus pés duros
quebravam espinhos e não sentiam a quentura daterra. Montado, confundia-se
com o cavalo, grudava-se a ele. E falava uma linguagem cantada,
monossilábica e gutural, que o companheiro entendia. A pé, não se aguentava
bem. Pendia para um lado, para o outro lado, cambaio, torto e feio. Às vezes
utilizava nas relações com as pessoas a mesma língua com que se dirigia aos
brutos — exclamações, onomatopeias. Na verdade falava pouco. Admirava as
palavras compridas e difíceis da gente da cidade, tentava reproduzir algumas, em
vão, mas sabia que elas eram inúteis e talvez perigosas".
"...Tudo seco em redor. E o patrão era seco também, arreliado, exigente e ladrão,
espinhoso como um pé de mandacaru. Indispensável os meninos entrarem no bom
caminho, saberem cortar mandacaru para o gado, consertar cercas, amansar
brabos. Precisavam ser duros, virar tatus. Se não calejassem, teriam o fim de
seu Tomás da bolandeira. Coitado. Para que lhe servira tanto livro, tanto
jornal? Morrera por causa do estômago doente e das pernas fracas".
"Um dia... Sim, quando as secas desaparecessem e tudo andasse direito... Seria
que as secas iriam desaparecer e tudo andar certo? Não sabia. Seu Tomás da
bolandeira é que devia ter lido isso. Livres daquele perigo, os meninos
poderiam falar, perguntar, encher-se de caprichos. Agora tinham obrigação de
comportar-se como gente da laia deles".
" A cachorra Baleia trotava arquejando, a boca aberta. Àquela hora sinha Vitória
devia estar na cozinha, acocorada junto à trempe, a saia de ramagens entalada
entre as coxas, preparando a janta. Fabiano sentiu vontade de comer. Depois da
comida, falaria com sinha Vitória a respeito da educação dos meninos".
Capítulo 3: Cadeia
Fabiano vai à feira fazer compras. Ele precisa comprar mantimentos (sal, farinha,
feijão e rapadura), além de uma garrafa de querosene e de um corte de chita
vermelha que foram pedidos de Sinhá Vitória.
Lá ele resolveu beber pinga, o que gerou até irritação, pois seu Inácio, o dono do
bar, o vendeu pinga batizada com água para render mais. Neste estado, Fabiano
resolve jogar 31 com o soldado amarelo e acaba perdendo. E agora? O que dizer a
Sinhá Vitória? Afinal de contas perdeu o dinheiro no jogo.
Irritado, vai saindo sem se despedir e essa atitude irrita o soldado amarelo, que o
empurra. Já não se contendo e sentindo-se humilhado, Fabiano xinga. Resultado?
Ele apanhou e foi preso. Na cadeia ele reflete, pensa na família e em como são um
peso, um fardo…
…..
"Os meninos eram uns brutos, como o pai. Quando crescessem, guardariam
as reses de um patrão invisível, seriam pisados,maltratados, machucados por
um soldado amarelo".