Cap - Medida Projetiva - Cunha & Nunes (2010)

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MEDIDA PROJETIVA I
Jurema AlcidesCunha
Maria Lucia Tiellet Nunes

INTRODUÇÃO métricos" (Anzieu, 1981, p. 16). Mas aqui,


novamente, pisa-se em terreno movediço.
O título proposto para este capítulo Por um lado, projetivo é um adjetivo que
envolveaparentemente uma inconsistên- é utilizado, no campo do psicodiagnóstico,
cia lógica, porque, embora o manejo de para qualificar técnicas cujos estímulos e
testes projetivos possa ser intentado em instruções potencialmente pretendem
termos quantitativos, a maioria dos auto- eliciar no sujeito o processo de projeção,
res que defende o seu uso o faz visando à ainda que possam também facilitar res-
exploração de aspectos dinâmicos da per- postas que representam simplesmente
sonalidade que adquirem significado sob o produto do manejo lógico do material
a ótica de um referencial teórico ao qual estímulo. Assim,há autores que preferem
há difícil acesso por via psicométrica. denominar as técnicas projetivas de indi-
A questão subentendida pode ser ca- retas (Vane e Guarnaccia, 1989). Por ou-
racterizada como polêmica. E verdade tro lado, o termo se aplica a determinadas
que o termo "medida" pode ser tomado respostas que de forma alguma são exclu-
sob várias acepções, e, se o considerar- sivas a testes projetivos, podendo emergir
mos mais literalmente como mensuração, no contexto estruturado da testagem com
0 tema pode ser abordado, demonstran- instrumentos psicométricos. Como escre-
do que, mesmo nas chamadas técnicas ve Shneidman (1965, p. 498), em seu tex-
este
projetivas, o material identificado como to clássico sobre técnicas projetivas,
projetivo só pode ser interpretado com é um assunto complexo cujo "conceito e
cautela e dentro de "limites realísticos", a própria denominação colocam algumas
autorizadospor alguma forma de quan- questões fundamentais que demandam
tificaçãoque proporcione um grau ra- reflexão" em grande parte, a seu ver, a
zoável de certeza (Exner, 1989, p. 534). partir de uma confusão entre o conceito
Já em um sentido figurado, o vocábulo de projeção e técnicas projetivas, que en-
"medida"pode ser entendido como "meio volvem palavras "que soam similarmen-
de comparaçãoe julgamento" (Ferreira, te, mas que têm significaçõesdiferentes"
1986p. 1109) e, então, pode-se enfatizar (Shneidman, 1965, p. 501).
0 métodode enfoque projetivo "diferente Portanto, neste capítulo, procurare-
daquele que fundamenta os testes psico- mos examinar alguns pontos discutíveis

Esteq)ítulo foi escrito quando a professora Jurema Alcides Cunha ainda exercia sua atividade académica na PUCRS.
358 Luiz Pasquali & cols.

implícitosnas questões em foco e suben- de "defender o eu de uma ideia insuportá-


tendidos por uma expressão pouco espe- vel, que é projetada no exterior" (Masson,
cífica-- medida projetiva —,que parece ter 1986, p. 108-109), definindo suas diferen-
potencial para encontrar sentido próprio ças em relação a outras defesas. Também
no contexto da avaliação psicológica, discorreu brevemente sobre o que consti-
comouma outra dimensão para o enten- tuiria uma projeção normal e como seria
dimento da personalidade, se considerar- o uso inadequado desse mecanismo psí-
mos o uso clínico extensivo das técnicas quico. Em 1911, chegou a uma explicação
projetivas hoje em dia. mais clara da projeção, como a substitui-
ção de percepçõesinternas por externas,
mediante uma tática de atribuição dos
CONCEITO DE PROJEÇÃO próprios sentimentos e impulsos a pesso-
ETÉCNICAS PROJETIVAS as e objetos externos (Freud, 1969b). No
ano seguinte, em Toteme tabu, ampliou
Ainda que não imune a outras cor- o conceito, ao admitir que projeção é um
rentes de pensamento, a maioria dos au- processo que nem sempre emerge como
tores, associada a técnicas projetivas du- defesa ante um conflito, considerando-o
rante os séculos e XXI,esteve, de uma um mecanismo primitivo, que pode in-
forma ou de outra, empenhada em refle- fluenciar "nossas percepções sensoriais,
xóes sobre pressupostos psicanalíticos e, e que, normalmente, desempenha um
particularmente, preocupada com as pos- papel muito grande na
determinação da
síveis relações entre uma psicologia proje- forma que toma nosso mundo exterior"
tiva e o conceito de projeção freudiano. de modo que "as nossas percepções inter-
Podemos situar as raízes desses mo- nas de processos
emocionais e de pensa-
vimentos em 1894, quando Freud come- mento podem ser projetadas para o exte-
çou timidamente a esboçar o conceito de rior da mesma maneira que as percepções
projeçño ao tentar explicar uma estratégia sensoriais" (Freud, 1974b, p. 86). E, mais
do psiquismo para lidar com a angústia adiante,
fez
frente a uma excitação interna não con- retomada uma afirmação muitas vezes
trolável, ao comportar-se "como se esti- psicologia como pressuposto teórico da
vesse projetando tal excitação para fora" projetiva, ao dizer que, assim,
(Freud, 1987b, p. 109), apesar de que, estamos reconhecendo a existência
provavelmente,só tenha chegadoa usar de dois estados: um em que algo é
o termo "projeção" em obra publicada diretamente fornecido aos sentidos
em
1896, conforme comentário de Stachey (ou seja, está presente neles) e, ao
(Freud, 1987c). Nos anos subsequentes lado deste, outro, em que a mesma
a 1894, Freud continuou a examinar coisa é latente, mas acaba de reapa-
os
processosutilizadospara evitar a incur- recer -- ou, essencialmente, estamos
são na consciência de representações reconhecendo a coexistência da per-
in- cepçáo e da memória ou, em termos
conscientes, em dois artigos sobre meca-
nismos de defesa (Freud, 1987c; 1987d) mais gerais, a existência de processos
e no ManuscritoH, enviado a Fliess internos inconscientes, ao lado dos
com conscientes (Freud, 1974b, p. 117).
carta de 24 de janeiro de 1895 (Masson,
1986, p. 105-112). Especialmente
neste Como chamam a atenção Laplan-
último, discutiu em minúcia o mecanismo
típico da paranoia, cujo objetivo seria che e Pontalis (1968),
o tema em uma série Freud retomou O
de outros pontos de
Instrumentaçãopsicológica 359

sua obra. Não obstante, segundo Exner idiossincrásica da percepção humana".


(1989), é em Toteme tabu (1974b) que Mas, como suas ideias assumiram a li-
ele explicou a projeção de forma mais derança na psicologia projetíva, sua po-
aplicável ao conceito implícito em testes e sição constituiu o ponto de partida para
respostas, que se qualificam por seu sen- as crescentes dificuldades, nesse campo,
tido projetivo, adotado por Murray,para de harmonizar os pressupostos freudianos
esclarecero fenômeno observado na in- com o conceito implícito nas técnicas pro-
terpretação que o sujeito faz no TAT,ao jetivas. Todavia, observa-se que a maioria
integrar "experiências passadas e necessi- dos adeptos do enfoque projetivo tem se
dades presentes", expressando conteúdos notabilizadopor seus esforços para de-
de nível consciente e inconsciente (Mur- finir um embasamentoteórico de cunho
ray, 1951, p. 38). psicanalítico, sofrendo, entretanto, outras
Murray,conforme Bernstein (1951), influências de correntes de pensamento.
admitiu que o conceito de projeção em- Abt, por exemplo, procurou conciliar
prestava peculiaridade à sua técnica, es- o referencial teórico da psicologia da Ges-
tabelecendo uma diferenciação tríplice no talt com pressupostos psicanalíticos, ao
processo, como projeção externalizadora, analisar a natureza e a função da percep-
defensiva e expressiva. No entanto, o sen- ção. Da ação da percepção dependeriam
tido que deu à projeção, referido anterior- todos os métodos projetivos, sustentando
mente, fez com que Exner (1989) reca- o autor que mecanismosde defesa, dos
pitulasse o ponto de vista de Shneidman quais o mais importante seria a projeção,
(1965), ao concordar com Lindzey (1961) atuariam sobre a percepção, permitindo
em sua afirmação de que Murray foi o res- que ela "desempenhe um papel signifi-
ponsável, em 1938, pelo estabelecimento cativo no processo de homeostase psico-
do elo entre o conceito de projeção e as lógica" (Abt, 1967, p. 46), ao possibilitar
técnicas projetivas. Esse vínculo tem sido o manejo adequado da ansiedade. Como
atribuído, inclusive por Bernstein (1951), comenta Exner (1989), Abt é o exemplo
à posiçãodefendida por Franck, em sua de um autor que, ao lado de outros nesse
obra publicada em 1939. Não obstante, século, centrou sua fundamentação teóri-
como Lindzey (1961) salientou, a popula-
ca no caráter defensivo da projeção freu-
rizaçáo das expressões "técnica projetiva"
diana, ainda que lhe emprestando nova
e "método projetivo", sem dúvida,
ocor- roupageme enfatizando seu sentido ho-
reu pela influência do trabalho de
Franck, meostático.
ainda que, paradoxalmente, este
autor te- Bellak (1967) inicialmente adotou
nha demonstrado conlpleto
pelo referencial freudiano.
desinteresse um ponto de vista praticamente idêntico
Ele simplesmente aproveitou ao de Abt. Mais tarde, com base em resul-
termo, numa rudimentar "o tados de investigações,rejeitou a conota-
ciai", para designar "a analogia espa-
indivíduo para revelar tendência geral do de projeção. Retomou a obra de Freud,
tivas de sua porções significa- mais especificamente sua discussão refe-
personalidade, quando está
estruturando, de forma rente à projeçãoem Toteme tabu (Freud,
mundo exterior" livre, objetos do
(Lindzey, 1961, p. 37).
1974b), detendo-se em sua pressuposição
Ao explicar tal da coexistência de processos conscientes
man (1965, p. conceito, segundo Shneid-
holísticoda 501), enfatizou o caráter
personalidadee a "natureza de percepções passadas sobre a percepção
atual dos estímulos. Julgando
que a de-
360 Luiz Pasquali & cols.

signação de percepção, na época, podia viçta dc seu "fácil acesso à consciên-


estar comprometidacom unnamncepçâo cia" (Bcllak, 1979, p. 25).
não holística da personalidade, optou
pelo temo apercepção (antes já utilizado Conforrnc Bcllak (1979), enquanto
por Murray), para se referir a "urna inter- Murray diqtingtlia subtipos dc projeção,
pretação (dinanlicatncnte) significativa analisando seu conteúdo específico, ele se
que o organisnnofaz de uma percepção" preocupou em definir "o grau de severi-
(Bellak. 1967, p. 27). Caracterizou, então, dadc ou complexidade" ou, ainda, "o grau
a apelcepção pela carga subjetiva de con- da inconsciência relativa da deformação".
teúdosda e»eriência passada do indiví- Porém, não se deteve apenas no compor-
duo, que impregnam sua percepção atual, tamento projetivo —que é o que envolve a
provocando um fenómeno chamado de deformação aperccptiva mas examinou
deformação aperceptiva. Assim, a partir o papel do comportamento adaptativo--
de uma hipótese de trabalho, subentendi- que tem um caráter perceptivo, porque
da pelo conceito de apercepção, diferen- depende fundamentalmente dos elemen-
ciou "grausde deformação aperceptiva" tos reais e objetivos do estímulo —e, tam-
(Bellak,1979, p. 21), que seriam: bém, do comportamento expressivo -- que
reflete as diferenças individuais que deter-
a) projeçñoinvertida, em que a defor- minam não o conteúdo da resposta,mas
mação aperceptiva encontrada em suas características (Bellak, 1979) e o seu
respostas ao teste é mais severa, por estilo (Wolff e Precker, 1976), afirman-
um processo de defesa, tal como Freud do que esses comportamentos "sempre
descreveu no caso Schreber (Freud, coexistem" (Bellak, 1979, p. 26). Além
1969b); disso, também se diferenciou da
b) projeçño simples, em que a deformação de Murray,quando, sob a influênciadas
aperceptiva se baseia em conteúdos ideias de Hartmann (1968), sugeriu que o
mnêmicos anteriores, que podem se ego constitui uma variável interveniente
transferir à nova situação, não tendo
entre o conteúdolatente e o manifestoy
necessariamente significado clínico;
chegando a abordar a questão da regres-
c) sensibilização,em que a deformação são a setviço do ego na produção
aperceptiva se justifica, porque a si- nativa, tema retomado mais tarde em ou-
tuaçáo atuai mobiliza um modelo de tro contexto (Bellak.tlutvich e Gediman,
resposta aprendido anteriormente em 1973) e melhor explorado. em relasáo
outra situação com conotaçóes seme- técnicas projetivas,
lhantes, mas que é inadequuio no mo-
Schafer (1954;
1978) e (1970).
mento;
d) peru•pção autística, em Cattell (1976, p. 89) considerou et-
que a defor, rónea a ênfase dada pelos pioneirosda
maçü) aperceptjva acontexr a partir
de iemi*anças Frceptuais psicologia projetiva conceito psicana-
associadas lítico de projesáo, salientando que outas
com impulsos básicos
Himiuvos, even- ilEcanismos de defesa poderia"i coacte
tuahnente ujnsiderada conu) um
de projes•áosunJAes;e
pro- buir para que aspectos diibinucos»roiu-
e) externalização, as barreiras da coiL$ciéncta",pelo
que, ao cmHJáaiodos que propôs que os iostcuguentospara
udos
quais o individuo co- inve»gigaçáose chamassem testes de
náo está coti*ie1Ae" (Beilak,
1967, p. 29), é um namica de defesas do ego ou, simples-
ser processo que Bide testes de dinálnica ou testes de
considerado
em defesa. Esses testes deveriam apresentar
Instrumentaçãopsicológica 361

tinha o
a qualidade metodológica dos chamados pessoas do mundo externo nem
"testes objetivos", uma vez que avaliam caráter de mecanismo de defesa. Admitiu
diferenças individuais em uma atividade que a projeção pode ocorrer em técnicas
cognitiva. diretas e indiretas de avaliação psicológi-
Uma série de fatores poderiam ser ca, porque as manifestações do comporta-
de sua
responsáveis pela percepção diferenciada mento do indivíduo são reveladoras
opinião, os
individualmente, enquanto comparada personalidade. Porém, em sua
ser considerados
com uma "percepção normal". O estudo instrumentos que podem
projetivos são
de tais diferenças poderia ser feito por mais especificamente como
ativa e espon-
meio de testes de apercepção ou de per- aqueles "em que o sujeito,
não estru-
cepção errônea, que permitem a investi- taneamente, estrutura material
princípios
gação "de distorções ocasionadas por ne- turado e, ao fazê-lo, revela seus
cessidades dinâmicas" e, portanto, não se estruturadores, que são
os princípios de
(Rapaport, Gill
referem apenas "às suscitadas por efeitos sua estrutura psicológica"
cognitivos, associados à inteligência ou à e Schafer, 1972, p. 225).
memória", por exemplo (Cattell, 1976, p. Rapaport (1978) aceita o que chama
psicanálise por-
131-132). Essas distorções podem resul- de modelo psicológico da
respostas dadas
tar de "estados emocionais transitórios", que o entendimento das
de desejos ou, ainda, de "traços dinâmicos a uma técnica
projetiva —que refletem a
sujeito —"impli-
permanentes" (Cattell, 1976, p. 96), que estrutura psicológica do
personalidade que pres-
hoje seriam caracterizados como egossin- ca uma teoria de
tónicos ou não. Quanto à percepção errô- suponha que grande
parte da estrutura
conscientemente expe-
nea, esta é explicada a partir de um con- psicológica não é
ele", de forma que estão em
ceito amplo de projeção. Cattell (1976, p. rienciada por
inconscientes; assim, é
99) discute as diferentes modalidadesde jogo motivações
atuação e operacionalização da percepção necessária "uma teoria de personalidade
existência dessas mo-
errônea e aplica essa classificaçãotanto que pressuponha a
as explique" (Rapaport, Gill e
para uma "inferência ingênua", para uma tivações e
228). Não obstante, uti-
distorção, em que o sujeito transforma as Schafer, 1972, p.
percepções "em algo semelhante ao obje- liza conceitos
freudianos de forma críti-
personalidade se manifesta
to de seus desejos", como para o reflexo ca, porque "a
projetivos) mediante um pro-
de uma necessidade de tornar a realida- (nos testes
pensamento ou um produto des-
de externa compatível e consistente com cesso de
e, portanto, "a exploração
aspectos subjetivos interiores ou, ainda, se processo", testes projetivos é uma
dos
para um mecanismo defensivo, caracteri- consistente
dos processos de pensamento"
zado pela atribuição de aspectos interio- exploração
é "parte da psicologia do
res inaceitáveis a objetos do mundo ex- e sua psicologia
e Schafer, p. 229). A
terior. Possivelmente seja em razão desse ego" (Rapaport, Gill
pois, lida fundamen-
sentido amplo que Exner (1989, p. 521) psicologia projetiva,
que ocorrem no
afirma que Cattell considerou a projeção talmente com processos
simplesmente "como um processo que for- ego, supondo-se, entretanto, a possibili-
nece informações sobre a personalidade". dade da emergência de material oriun-
processos, em
Rapaport (1965) aceitou a hipótese do do inconsciente nesses carece de
projetiva como embasamento dos testes especial quando o pensamentoé necessá-
consequência,
projetivos, mas deixou claro que o concei- organização. Em para o enten-
to de projeção adotado não pressupunha rio o referencial freudiano são básicos
a atribuição de sentimentos e impulsos a dimento desse material,
mas
362 Luiz Pasquali & cols.

os conceitosda psicologiado ego para a Pryer, 1959, p. 358), suas críticas, em ge-
compreensão dos processos de pensamen- ral, se centraram na definição operacional
to e dos mecanismosde defesa do ego. de projeção, afirmando que é necessário
Neste ponto, parece oportuno repetir que esta "não se afaste da significação
a pergunta levantada por Murstein e Pryer, psicológicaaceita do conceito" (Murstcin
em 1959: "Quantos tipos de projeção exis- e Pryer, p. 368). Por outro lado, a partir
tem?". Em sua ótima revisão, para a épo- da revisãoda literatura efetuada, propu-
ca, da literatura existente, concluíram que seram que a definição de projeção se limi-
há cerca de "quatro categorizações possí- tasse "à manifestação de comportamento
veis do conceitode projeção: 'clássica', do indivíduo, que indique algum valor ou
'atributiva', 'autística' e 'racionalizada"' necessidade emocional do mesmo", por-
(Murstein e Pryer, 1959, p. 353). A pri- tanto, excluindo "componentes fisiológi-
meira corresponderia ao conceito inicial cos ou cognitivos" e acrescentando que
de Freud (1987b), admitindo, porém, que "tal comportamento pode variar no grau
também traços favoráveis pudessem ser de defensividade, dependendo do con-
projetados no mundo exterior. A projeção texto situacional e da personalidade do
atributiva seria a mais amplamente utili- que percebe" (Murstein e Pryer, 1959, p.
zada no campoda personalidade,como 370).
tática de atribuição, nos termos descritos Exner (1989) também desenvolveu
por Freud (1974b) em Toteme tabu. Já a pesquisas sobre a projeção, afirmando
projeção autística ocorre quando a percep- que esta não é uma questão simples, em
ção sofre forte influênciadas necessidades vista da própria complexidade das opera-
do indivíduo, no sentido de que "os aspec- ções psicológicas que ocorrem durante o
tos formais do objeto percebido são modi- processo de resposta a estímulos, como os
ficados de modo a se tornarem consisten- do Rorschach. Por outro lado, salienta que
tes com a necessidade" (Freud, 1974b, p. não é possível partir da pressuposição de
354). A projeção racionalizada envolveria que o sujeito, frente a um campo de estí-
um processo que se mantém inconsciente, mulos não estruturado, impregna de ele-
como no caso da projeção clássica, mas o mentos subjetivos a sua percepção atual,
comportamento é consciente no indivíduo, pois, se isto fosse verdadeiro como todas
que o justifica por meio de uma raciona- as manchas de tinta do Rorschach envol-
lização. Conforme esses autores, esse tipo vem características de escassa estrutura e
de projeção foi considerado uma projeção ambiguidade, todas as suas respostas de-
complementar por Allport, uma projeção veriam conter material projetivo.
do recíproco por Piaget, e Van Lennep a de- Exner faz uma análise das operações
finiu não exatamente como projeção,mas percepto-cognitivas que se sucedem no
como seu correlato. processo de resposta, demonstrando que,
Após a discussão dessas categoriza- embora o processamentode informações
ções possíveis de projeção, conforme a seja muito rápido (1983), é possível iden-
utilização do conceito por autores varia- tificar três fases, ainda que não totalmente
dos, Murstein e Pryer passaram a exami- distintas entre si (1989), como são apre-
nar pesquisas desenvolvidas sobre o tema, sentadas no Quadro 16.1.
no período entre 1936 e 1957, analisan- A complexidade das operações psico-
do um total de 45 trabalhos. Deixando lógicas envolvidas no processo de resposta
de lado alguns em que foi difícil chegar leva a certas considerações.Por exemplo,
a conclusões em face dos "métodos varia- não se pode ingenuamenteafirmar que,
dos de mensurar o conceito" (Mursteine como se tratam de meras manchas de tinta,

4.
A.
Instrumentação psicológica 363

QUADRO 16.1
Fases e operações do processo de resposta
Fase 11 Fase III
Fase I
1

3. Reexploraçãodo campo 5. Seleçáo final das respostas


1. Codificação do campo potenciais restantes
de estímulos para refinar respostas potenciais
4. ' Rejeiçãd de respostas potenciais 6. Articulação da respostas
2. Classificação da imagem
codificada e de suaspartes selecionada
em respostas não usáveis ou
indesejáveis, por ordenação
ou censura, na comparação
entre si

Fonte aner, 1989, p, 522.

o fato de o sujeito dar a resposta de morce- (Exner, 1989, p. 524). Por outro lado, ou-
go à Lâmina I implicaria um afrouxamento tras características da mancha, além da
do juízo crítico, em uma aplicação estrita forma, podem influenciar na escolha das
do conceito de regressão a serviço do ego, respostas potenciais alternativas. Então,
que será discutido mais adiante. Além das na Lâmina I, o sujeito "mais convencional,
próprias instruções serem suficientemente preciso e conservadorem suas operações
flexíveis,o número de sujeitos que dá essa decisórias"valorizará o determinante cor
resposta, com base no contorno da man- e responderá que se trata de um morcego,
cha, torna claro que "o exemplo mais óbvio rejeitando a resposta borboleta, que impli-
da realidade da mancha e de seu impac- caria a desconsideração "da incongruência
to sobre o processode resposta é o escore do colorido" (Exner, 1989, p. 522). Assim,
do determinante F' (Peterson e Schilling, embora não se possa negar a possibilidade
1983, p. 268). Reconhece-se, portanto, de o sujeito incluir material projetado em
que elementos do estímulo tendem a com- sua tradução do estímulo, estudos de teste
pejir cenas respostas,"limitando ou inibin- e reteste realizados pela equipe de Fxner
do outras classificaçóesa (Exner, 1989, p. revelaram que a seleçáo final das respos-
522), como se evidencia claramente nas tas verbalizadas dependia basicamente de
respostas populares. Asim, resultados de dois fatores: a organizaçãopsicológicado
pesquisa de Exner e Martin, citados pelo sujeito e o seu estado psicológico.
vimeiro, demonstraramque, com a ex• Já as projeçóesque, segundo Exner,
dusáo das Od 34 da mancha se verificam conforme os processos des-
da umina j, nenhum sujeito forneceu a critos por Freud e Murray podem ocorrer
Uadu-ionajrespoga de morcego e ape. em qualquer das três fases do processo de
nas produzirama gesl»sta de aniinai resposta.
alado. Iún face disso, é Fassível concluir Na fase l, os elementos de realidade
que característicasoíticas do estúnulo assumem enorme importância, diminuin-
criam limitasOe•sna amplitude de respos- do as l»sslbllidades de projeçáo. Entre-
tas que pdem ser geradas, sem restringir tanto, eles podem "ser violados ou igno-
as propriedadesou realidades do campo» rados» na percepção. Se o fato não resulta
364 Luiz Pasquali & cols.

de distorções de ordem neurofisiológica, é cáveis, em diferentes graus, à questão das


possível pressupor que decorra "de algu- respostas a outras técnicas. Por exemplo,
ma forma de mediação cognitiva", em que o CATé considerado uma técnica projetV
aspectos psicológicos internos modificam va utilizávela partir dos 3 anos de idade
"uma tradução do campo orientada para a (Bellak e Bellak, 1981; Hirsch, Verthelyi e
realidade" (Exner, 1989, p. 528). Rodríguez, 1979; Anzieu, 1981). No en-
Nas fases II e III, em que "cada res- tanto, investigações feitas com crianças de
posta potencial é revisada, julgada e refi- idade pré-escolar, utilizando um sistema
nada", há condições favoráveis, "em que de escore (Cunha, Nunes e Werlang, 1990;
o sujeito pode embelezar a resposta" (Ex- Cunha e Werlang, 1991), demonstraram
ner, 1989, p. 529). Mesmo assim, se admi- que, até os 5 anos, predominam respostas
te que ela possa representar uma supere- de caráter não aperceptivo —descrições ou
laboração de atributos do estímulo. Para enumerações—,porque a grande maioria
testar essa pressuposição, foram realiza- desses pré-escolares não consegue ultra-
dos estudos com sujeitos que apresenta- passar a simples percepção dos elementos
vam escores altos em escalas que mediam de realidade do estímulo, portanto, sem
certos traços de personalidade, como coo- evidências de projeção. Já com
o aumento
peração, agressão ou morbidez. Foi verifi- gradual da idade, verifica-se que
surgem,
cado que eles tendiam a dar, no Rorschach, aos poucos, tentativas de interpretação
respostas que envolviam conteúdo idênti- que, segundo Hoar e Faust (1962, p. 245),
co, em número apreciável, embora não de existem, quando "sentimentos dos sujeitos
modo exclusivo. Em outro estudo, foram são descritos, estados psicológicos são infe-
propostas respostas alternativas para de- ridos, atividades não representadas nas fi-
terminadas localizações nas dez manchas. guras têm lugar". Ora, é lógico pensar que
Os sujeitos, diferenciados por certos traços somente quando as respostas são de cunho
de personalidade, tendiam a selecionar, interpretativo existe alguma probabilidade
entre tais respostas alternativas,a mais de ocorrência de projeções, sempre ressal-
compatível com suas disposições internas. vada a possibilidade de constituírem so-
Outra pesquisa demonstrou que, mesmo bre-elaborações de atributos do estímulo,
que as respostas do sujeito possam refletir principalmente quando são elegidos temas
influências sobre a expectativa de determi- frequentemente eliciados.
nados conteúdos, ainda é possível registrar Antes, parece ser possível pressupor
a importância dos efeitos de "disposições que, não só no Rorschach, mas em outras
internas, criadas por características poten- técnicas ditas projetivas, se verifique uma
tes da personalidade(por exemplo, ne- série de operações psicológicas no proces-
cessidades, interesses, aptidões, conflitos, so de resposta, com a ocorrência, em uma
etc.)" (Exner, 1989, p. 534). primeira fase, de um escrutínio do campo
Em resumo, fica evidente que, embo- de estímulos e uma classificação dos seus
ra cada resposta constitua "uma represen- elementos de realidade. Estudos realiza-
tação indireta das operações psicológicas dos e a revisão da literatura possibilitam
do sujeito", de forma alguma isso "signi- que se afirme que o processo que se de;
fica que cada resposta ou partes de cada senvolvee até a elaboraçãoda resposta
resposta sejam produtos de projeção" (Ex- final (seja esta uma história, um desenho
ner, 1989, p. 520). Esta é apenas possível, ou, mesmo, uma resposta à apresentação
não obrigatória. de uma mancha de tinta) -- parece de; „
Tais considerações, feitas a partir de pender fundamentalmente da "maturida;
estudos com o teste de Rorschach, são apli- de para cumprir a tarefa" (Cunhaet al.,
Instrumentação psicológica 365

1993,p. 264) e de condições de integrida- tagem, é importante, de um ponto de vis-


de das funções do ego (Montagna, 1989), ta teórico, a consideração do conceito de
que podem levar ao embelezamento (Ex- regressão a serviço do ego, "baseado na
ner, 1989) ou, eventualmente, à deterio- possibilidade de, com o afrouxamento de
ração do produto final, julgados esses em controles, haver um movimento regressi-
termos de parâmetros da realidade. vo ao longo de um continuum entre o pro-
Portanto, de forma subjacente ao cesso secundário e o processo primário"
desempenho observável na testagem e (Werlang e Cunha, 1993, p. 125).
de acordo com as expectativas implícitas Freud, principalmente em duas de
nas instruções propostas pelas diferentes suas obras (1974a; 1977), mencionou a
técnicas, pode-se afirmar, com Rapaport possibilidadede um tipo de pensamento
(1978, p. 134), que "está o processo do característico do inconsciente aparecer ao
pensamento" naturalmente consubstan- nível da consciência nos chistes, nos so-
ciado por outros processos cognitivos. O nhos e na psicose. Seria o caso da regres•
conjunto de operações psicológicas que são formal, em que "métodos primitivos
se estabelece explica o manejo lógico do de expressãoe de representaçãotomam
materiai estímulo, que ancora o desempe- o lugar dos métodos habituais" (Freud,
nho aos elementos de realidade, cm uma 1987a, p. 501), fenómeno que, poste-
tarefa que envolve sempre a solução de riormente, foi denominado por Kris como
problema, que exige "urna adaptação a regressão a serviço do ego, conforme re-
estímulos extenores estabelecidos, quer ferem vários autores. üata-se de uma mu.
diz,er,(que) póe em jogo a funçáo de rea- dança no processo do pensamento (Holt,
lidade" (Rorsdüich, 1948, p. 120). 1970).
Nessas circunstâncias, a emergência Na realidade, Rapaport (1962) su-
de matenal projetivo, erntk)ra possível, gere que Freud associou os conceitos de
náo é obrigatória, nem táo provável ou processo primário e secundário, respec-
frequente como originalmentese supu- tivamente, aos dois princípios de funcio-
namento mental. fato, encontra-se em
nha. hão obgante, o foco dessa discus-
sao envolve uma tentativa de deslindar o sua obra que fantasia é uma atividade
que há de projenvo nas t&nwas projeti• *que foi liberada do teste de realidade
vas. outro lado, há faus observáveis e pelmaneceu subordinada ao princípio
que nau podem ser deg•anujos e exigem de prazer, ao passo que o pensamento é
reflexáo. As»m, em de indiví. explicado como uma funsào do aparelho
duos obsessivoaunpulsiy•, constataE mental, coabala de descarga motoca, de-
uma aderénc•a Ji8ida aos eienwntos de senvoivida peia "apresentasáo das ideias%
ganonalidadee o conuole esuuo na for- dingida 'para as relas•óesentre unpcessóes
Itiula%ao
do para se uiequar à de objeco.» e que, geneticamente, *tido
adquuiu outras petcepcívecs
realidade.Já em matenai pa«xjucido
indniduos u.gn penawiidade até se 118ddoa resíduos
ou em muitos de vetb'l$" (Egeud, 1969a, p. '281),
esquizofrénicos, podeao doaac.dos Assuneo prunáno, observa-
excertoscoanpativeiscun arca. do em Itu)dosde pensamento primitivo ou
cos, prunit»os, mágwos de ra(úínw, dewC8anizado,desconsidera a realidade,
que contrastam extraorduuna•uente coan regido pelo princípio do prazer, mas tem
as regras comuns da b;ica. pcopriedades formais que permitem o seu
Para o entendinrnto dessa variabili- entendimento.Já o processo secundário
dade que se insinua em Ftxlutos de tes• apresenta todas as características do pen-
66 Luiz Pasquali & cols.

samento consciente de uma pessoa nor- tativos, é possibilitadapor determinadas


mal e civilizada (Holt, 1970). condições do ego.
Tais construtos, criados por Freud, Como as regressões normais do de-
são úteis em seu sentido conceitual, mas senvolvimentoinfantil, que são temporá-
representam uma abstração que realmen- rias e reversíveis,são processos que cons-
te não se apresenta por si. Antes, pode- tituem —como afirma Anna Freud (1971,
-se imaginá-los como polaridades, entre p. 5), concordando com Spitz —"respostas
as quais pressupõe-se um continuum, ao úteis à tensão de um determinado mo-
longo do qual o pensamento flui, com "to- mento", da mesma maneira se pressupõe
dos os graus de tradição" (Schafer, 1978, que, numa situação de testagem, o pro-
p. 89), podendo a regressãoque ocorre cesso ocorre quando os estímulos pro-
adquirir um caráter adaptativo, se está a vocam uma mobilização afetiva muito
serviço do ego, ou não. intensa. Sendo o movimento regressivo
No interesse do ego, há uma redu- a serviço do ego, há fatores facilitadores
çáo de controle que possibilita que o pen- da reversão do processo, principalmente
samento se libere das regras rígidas do a existência de um sentido primário de
processo secundário, abastecendo-se de identidade do ego, consubstanciado pelo
recursos e fenômenos mais comumente estabelecimento de um vínculo de apego
utilizados nos sonhos. Há afrouxamento, em relações mais precoces positivas. Essas
mas não perda de controles, de modo que circunstâncias possibilitam "a tolerância
é facilmente reversível, culminando "em de conteúdos mais arcaicos e a percepção
fases progressivas,em que os produtos de condições pessoais para reordená-los,
do movimento regressivo são elaborados emergindo da situação com uma respos-
ou sintetizados" de uma forma "orientada ta de melhor nível". Não obstante, se tais
para a realidade objetiva" (Schafer, 1978, requisitos não são satisfeitos, "observa-se
p. 87), resultando em uma criação artísti- a fluência de conteúdos do processo pri-
ca ou em uma resposta bem organizada e mário, com presença ou não de ansiedade
embelezada a técnicasprojetivas. e de recursos defensivos,mas não se veri-
Mesmo a serviço do ego, o movimen- fica a reversibilidade do processo" (Cunha
to regressivo pode se mostrar vulnerável e Nunes, 1993, p. 103). Consequentemen-
a conflitos anteriores, não completamen- te, o caráter patológico do processo "não
determinado pela profundidadeda re-
te elaborados, havendo indíciosque faci- égressão, mas antes por sua natureza irre-
litam seu entendimento psicodinâmico. versível, pelo conflitoque engendra e por
Mas, quando as fantasias são muito per- interferência no processo de adapta-
sua
turbadoras, costumeiramente são mobili-
dimi- ção" (Arlow e Brenner, 1964, p. 82).
zados sinais afetivos de alerta que Além de um afrouxamentode con-
êxito da
nuem os perigos que ameaçam o troles suscitado pela mobilização
afetiva,
esses são
reversão do processo, sendo que Holt (1970) sugeriu outros motivos
para
do ego são
mais sérios quando as funções emergên-
os testes projetivos facilitarem
a
para neu-
mais frágeis, menos autônomas cia da fantasia do sujeito.
Fazendo referên-
tralizar impulsos mais primitivos. se cia mais específica ao teste
de Rorschach,
Portanto, se a possibilidadede salientou que as próprias
instruções fa-
visuais,
ego, que permite vorecem a produção de imagens
de cena flexibilidade do
regras mais rígidas do proces-
um afrouxamento das a rever- abstratas, que são "exclusivas 272). Ern
também 1970, p.
do processo secundário,propósitos adap- so secundário" (Holt,
são do processo, para
Instrumentaçãopsicológica 367
s.

segundo lugar, considerou que a ambi- p. 1147), além de ser criticada por sua as-
guidade dos estímulos não familiares e a sociação com pressupostos psicanalíticos
abertura proporcionada pela natureza das e vista ceticamente por grupos de profis-
instruções incentivam uma abordagem sionaisadeptos de uma posição científica
mais imaginativa e, em terceiro lugar, a mais rigidamente sofisticada (Goldstein e
suposta reputação do teste, como um ins- Elersen, 1990).
trumento de exploração de aspectos mais Ora, considerando questões metodo-
profundos da personalidade, desencadea- lógicas, o enfoque projetivo está realmen-
ria um estado de ansiedade que eliciaria te em desvantagem na atualidade. Ainda
conteúdos do processo primário. que uma interpretação desse tipo deva ser
Esse tipo de regressão constitui, feita dentro de "limites realísticos" (Exner,
pois, uma função do ego. Se este é mui- 1989, p. 534), com base em evidências
to rígido, a capacidade de regressão pode quantificáveis e não simplesmente bus-
ser obstaculizada ou limitada; quando é cando a significaçãoisolada de indícios,
flexível, não só tolera modos de funciona- como a proposta por "livros de receita",
mento mais primitivos como é capaz de do tipo apresentado por Jolles (1992),
controlar ou de interromper a regressão, muitas pesquisas devem ser desenvolvi-
promovendo o movimento inverso, reor- das para esclarecermelhor a questão da
denando, elaborando ou sintetizando o projeção e equacioná-la mais cientifica-
material da fantasia, de acordo com os mente, antes que as técnicas projetivas
requisitosdo processo secundário e com mereçam o status que lhes foi atribuído
as exigências implícitas na tarefa. Por ou- em meados do século XXe que se possa
tro lado, a perda do controle da regres- falar em medida projetiva sem pruridos
são proporciona indícios patológicos, polêmicos.
eventualmente emergentes mesmo em
um contexto de testagem neutro. Estes
podem permitir identificar transtornos de FORÇAS E FRAQUEZAS
pensamento, de valor diagnóstico em cer- DAS TÉCNICAS PROJETIVAS
tos quadros nosológicos (Carr e Goldstein,
1981; Berg, 1983; Edell, 1987; Rosenberg Pesquisasde opinião sobre técnicas
e Miller, 1989; Gartner, Hurt e Gartner, projetivas e coletas de informações sobre
1989). Por outro lado, há muito vêm sen- o seu uso, ainda que nem sempre concor-
do feitas tentativas para criar um sistema dantes, ressaltam a sua importância.
de escore para a mensuração do material Uma investigação entre 500 psicó-
do processo primário (Klopfer et al., 1954; logos da American Psychological Associa-
Holt e Havel, 1961; Holt, 1970), Já as vi- tion (APA),cujos resultados foram divul-
cissitudes do processo fornecem subsídios gados em 1977, sugeriu que o status das
para o entendimento psicodinâmico, técnicas projetivas não sofreu modifica-
ad-
quirindo significado em uma perspectiva çáo desde um levantamento realizado em
teórica.
1960. A grande maioria dos psicólogos
Esta última
$$t. ) fase no modelo alternativa, com sua ên- utilizava técnicas projetivas, em baterias
clínico, coloca o psicólo- que incluíam também testes objetivos,
80, "mais do que o teste, no centro
cessode avaliação", criando
do pro- embora reconhecesse suas limitações psi-
.Com controvérsias cométricas (Wade e Baker, 1977). Não
profissionais mais definidamente obstante, um estudo comparativo entre as
comprometidoscom uma orientação
cométrica (Korchin e Schuldberg,
psi- opiniões de psicólogos clínicos de 103 de-
partamentos acadêmicos .com programas
368 Luiz Pasquali& cols-

aprovados pela APA),de 1968 e 1983, en- outro lado, os resultados de uma pesqui-
fatizou o desenvolvimento de uma atitude sa internacionalmais recente sobre o uso
negativa em relação às técnicas projetivas, de testes destacaram o TAT,o Rorschach
especialmente entre os profissionais mais e o MMPIcomo os instrumentos de per-
jovens. Estranhamente,embora desvalo- sonalidade mais populares (Flu, Oakland,
rizando tais instrumentos, ficou evidente 1991). Isso sugere que agora como há 50
a opinião concomitante de que deveriam anos, conforme ponto de vista de trabalho
ser oferecidos cursos sobre eles. Por ou- anterior citado por Sargent (1945, p. 282),
tro lado, os autores (Pruitt et al., 1985) "os clínicos não estão dispostos ou não são
atribuíram a posição assumida pelos psi- capazes de se basear somente em critérios
cólogos mais jovens à sua falta de treina- objetivos", o que significa que "continuam
mento, porque as opiniões negativas se a suplementar métodos ideográficos de
referiam inclusive a testes mais bem con- análise da personalidade com métodos
siderados na comunidade científica, como nomotéticos", podendo-se concluir que,
o Rorschach que, conforme Blatt (1986, p. se são usados, é "porque preenchem uma
344), tem se caracterizadopor "seu alto função" (Mundy, 1972, p. 795).
grau de refinamento e consolidação" Entretanto, em se tratando de "medi-
Outros levantamentos, revisados da projetiva", críticos poderiam afirmar,
por Weiner (1986), feitos nas décadas de com Klein (1988, p. 460), que "infelizmen-
1970 e início de 1980, sempre registra- te, a popularidade dos testes não é um ín-
ram o uso e o ensino de técnicasprojeti- dice de excelência". Na verdade, se a refe-
vas. Todavia, esse autor analisa dados de rência a teste psicológico subentende uma
1983, de Lubin, Matarazzo e Larsen, que definição tradicional mais estrita, poucos
assinalaram uma modificaçãona ordem instrumentos preencheriam critérios mais
de preferência dessas técnicas,junto com aceitáveis (Berger, 1977), e a qualidade
instrumentos objetivos,que aparentemen- das técnicas projetivas seria fortemente
te parece sugerir uma diminuição de sua questionada pela dificuldade de integrar
utilização. Porém, se forem considerados seu tipo de abordagem com outras tradi-
os percentuais, na realidade, tal diferença ções científicas da psicologia (Macfarlane
não é apreciável e há variação quanto aos e Tuddenham, 1976). Aliás, já em 1965,
"padrões de uso de testes em distintos am- Zubin, Eron e Schumer salientavam 0
bientes clínicos" (Weiner, 1986, p. 455). contraste entre "o método, o vocabulá-
De qualquer modo e por várias ra- rio e, mesmo, os requisitos dessa área"
zões, a literatura específica chega a men- das técnicas projetivas com os da psico-
cionar um declínio no interesse pela tes- metria (Zubin, Elon e Schumer, 1965, p.
tagem clínica e na utilização de técnicas 2). Deste modo, é uma tarefa complexa
projetivasnos últimosanos, tanto como tentar avaliar tais técnicas de acordo com
instrumentos de avaliação como na pes- as condições que, segundo Lanyon e Goo-
quisa, apesar de sua popularidade (Kor- dstein (1982), deveriam ser satisfeitas
Chin, Schuldberg, 1981). Já um levan- para que pudessem se caracterizar como
tamento divulgado em 1985 chegou à instrumentos padronizados de avaliação.
conclusão de que "as principais técnicas A primeira condição seria a presença
projetivas do pasado continuam sendo de estrutura da resposta. De forma muito
populares",não só entre os membros da diversa dos testes objetivos,os próprios
Society for Personality Assessment, mas estímulos envolvidos em técnicas projeti-
entre os psicólogos clínicos em geral (Pio- vas são, em maior ou menor grau, caren-
trowski, Sherry e Keller, 1985, p. 117). Por tes de estrutura,o que favorece"a liber-
Instrumentaçãopsicológica 369

dade de resposta" (Phares, 1984, p. 283) de escore existentes (Vanee Guarnaccia,


e o encorajamento à fantasia, suscitando 1989). O teste de Rorschach, por exem-
uma multiplicidade variegada de respos- PIO,se caracterizou, durante muito tem-
tas, todas elas percebidas como material po, pela convivência de cinco sistemas
importante. Similarmente, a escassez de de escores, muitas vezes alterados indi-
estrutura subentende algum grau de am- vidualmente pelos psicólogos, surgindo,
biguidade. Por outro lado, mesmo quando ainda, sistemas "personalizados" (Exner e
eventualmente os estímulos se apresentam Exner, 1972, p. 403). Tal situação, afortu-
com um pouco mais de estrutura e menos nadamente, tende a se normalizar,com o
ambiguidade, como em algumas lâminas desenvolvimentodo sistema compreensi-
do TAT,são "as instruções que criam uma vo (Exner, 1978; 1980; 1983) que, em um
tarefa que é ambígua", de modo que o enfoque percepto-cognitivo, se concentra
examinando desconhece os propósitos do exatamente na estrutura da resposta (Erd-
examinador —aliás, característica "consi- berg, 1990).
derada como uma das forças mais impor- Já no que se refere ao TAT,essa
tantes da técnica" (Martin, 1988, p. 262) questão pode ser considerada mais séria
—,mas, assim, não é possível esperar que em vista da diversidade das abordagens
a resposta se caracterize por seu grau de existentes, embora haja quem saliente a
estrutura, de qualquer maneira quantifi- necessidade de "uma síntese dos vários
cável. métodos de escore e de interpretação"
Na realidade, conforme ponto de (Pollyson,Norris e Ott, 1985, p. 28), em
vista de Cronbach, de sua edição de 1970, especial como instrumento de pesqui-
citado por Berger (1977, p. 207), um teste sa. Todavia, seu uso clínico "permanece
"é um procedimento sistemático" que per- mais informal e idiossincrásico"(Lanyon
mite descrever o comportamento do sujei- e Goodstein, 1982, p. 60), coerente com
to, "seja através de uma escala numérica sua tradição, que "é orientada para a in-
ou de um sistema de categorias".Então, terpretaçãoimpressionistae não para o
a questão da falta de estrutura da respos- escore formal" (Cronbach, 1990, p. 622).
ta em técnicas projetivas tem procurado Outros autores já acham que, se não exis-
ser equacionada com o desenvolvimento te um sistema padronizado de escore ou
de sistemas de escore ou de categorização de categorização das respostas, não há
das respostas. Não obstante, a partir de garantia de que estas sejam analisadas
uma definição mais tradicionalde teste, com propriedade, porque a interpretação
tais esforços têm sido criticados por terem passaria a depender "da experiência, do
"mais o propósito de sumariar as respos- talento e do julgamento do clínico, carac-
tas do que de quantificá-las" (Maloney e terísticasque não podem ser ensinadas"
Ward, 1976, p. 347). Por outro lado, mes- (Vane e Guarnaccia, 1989, p.ll). Além dis-
mo alguns adeptos de técnicas projetivas so, há outras restrições a essa abordagem,
têm certas restrições a esses recursos, por- porque favoreceria a subjetividade, dando
que tais sistemas não conseguem, a priori, lugar a que "a mesma resposta possa ser
[4, ser suficientemente abrangentes, deixan- interpretada de várias maneiras" (Martin,
do de fora variáveis que poderiam levar a 1988, p. 263) ou sob a ótica de diferentes
maior refinamento da análise do material referenciais teóricos.
clínico (Blatt e Berman, 1984). Entretan- Em relação a outras técnicas, são
to, uma das críticas mais frequentes é de feitas críticas bastante semelhantes. No
que dificilmente há unanimidade entre os campo das técnicas projetivas gráficas, es-
clínicosem relação ao uso dos sistemas pecialmente, exceto alguns instrumentos
370 Luiz Pasquati & cols.

para os quais foram desenvolvidos siste- a coleta de dados normativos em gran-


mas de escore, a interpretação frequen- des amostras (Vane e Guarnaccia, 1989).
temente é feita recorrendo a exemplos Apesar disso, o grupo de Exner vem su-
fornecidosem manuais ou em catálogos prindo o mercado com informações rele-
de respostas qualitativas, como o de Jol- vantes (Erdberg,1990), além de enfati-
les (1992). Mas o principal problema em zar a importânciade uma base empírica
relação à utilização desses recursos é que para as inferências clínicas (Exner, 1989).
geralmente não são fornecidos dados de Todavia,no que se refere à maioria das
pesquisa para subsidiar a interpretação, técnicas projetivas, "os dados normativos
notando-se que, às vezes, a hipótese inter- ou inexistem completamente, são ina-
pretativa se baseia na observação de casos dequadosou se baseiam em populações
clínicos isolados (Cunha, 1993b) ou em vagamente descritas" (Di Lorenzo, 1987,
indícios pesquisados apenas em pacientes p. 75). Por outro lado, embora Mundy
psiquiátricos (Hilt e Genshaft, 1976). (1972) acredite que o caráter ambíguo
Além desses aspectos discutidos, pa- dos estímulos favoreça a individualização
rece importante chamar a atenção para a das respostas sem reflexos culturais, des-
quantidade de variáveis, muitas vezes de de 1965, Zubin, Eron e Schumer (1965)
difícil controle ou pouco pesquisadas, que salientaram a influência das variações
podem influenciar as respostas de crian- culturais sobre a situação e os produtos
ças a técnicas projetivas, tornando ainda da testagem. Assim, mesmo quando exis-
mais difícil o intento de quantificá-las, tem normas, é necessário previamente
como nível socioeconómico, sexo e, na- verificar a validade da técnica, quando
turalmente, idade, no desenho da figura utilizada em outras condições culturais
humana (Cunha, 1992) ou, ainda, idade, (Lanyon e Goodstein, 1982). As restrições
QI e habilidade para a leitura, no Rors- feitas ao uso de testes intelectuais, quan-
chach infantil (Klein, 1988). Desta manei- do há diferenças culturais e subculturais,
ra, se não existem subsídios adequados, o também repercutiram na área de técnicas
uso de técnicas projetivas com crianças é projetivas (Cunha, 1993a). As várias ver-
considerado com restrições (Di Lorenzo, sóes do TAT,que vêm sendo desenvolvidas
1987) ou é definidamente contraindicado para "melhor entender as interaçóes per-
(Klein, 1988). sonalidade-cultura" (Jacquemin, 1982,
Em face de tais considerações, difícil p. 141), bem sugerem a necessidade de
é a classificaçãode alguma técnica proje- normas locais, assunto que vem sendo ex-
tiva como um teste padronizado, se este plorado por Constantino e seu grupo com
for definido como aquele "em que os mé- a técnica TEMAS (Constantino, Malgady
todos de administração e escore são claros e Rogler, 1988), principalmente em seus
e objetivos" (Hamsher, 1990, p. 256). esforços para padronizá-la para grupos
Outra condição seria a existência de minoritários (Constantino, Malgady e Ro-
normas. Mas a própria variabilidade e o gler, 1988; Constantino et al., 1992).
número de respostas eliciadas, caracterís- Além dos aspectos citados, Ianyon
ticas das técnicas projetivas, que favore- e Goodstein (1982, p. 45) lembram que,
cem a projeção "de aspectos singulares e embora seja possível registrar uma série
individuais da personalidade" (Maloney e de tentativas para o desenvolvimento de
Ward, 1976, p. 346), dificultam o desen- normas para técnicas projetivas, não se
volvimento de normas. Também a neces- pode afirmar que elas "tenham sido ge-
sidade de administração individual, em ralmente aceitas ou integradas na prática
muitos desses instrumentos, não facilita clínica", de modo que a interpretação "se
Instrumentaçãopsicológica
371

torna complexa e demorada". Entretanto, Mais recentemente, registra-se o


empenho
há exceçõese, indubitavelmente,o teste de Weiner (1986), que vem trabalhando
de Rorschaché uma delas, se levarmos em uma abordagem conceitual para esta-
em conta a acumulação de "dados nor- belecer a validade de construto,embora
mativos sobre uma variedade de grupos salientando a importância também de um
clinicamente relevantes" (Erdberg, 1990, enfoque empírico, para documentar a base
p. 397). psicométrica das inferências de Rorschach
Já no que se refere à terceira con- sobre psicopatologia. Outros estudos vêm
dição —utilidade do instrumento —,con- sendo desenvolvidos,mas não é possível
forme Lanyon e Goodstein (1982, p. 46), tentar uma revisão mais completa dentro
ela é determinada pelo "número de vali- das dimensões deste capítulo.
dades ou de relações válidas que um teste Da mesma forma que o Rorschach,
possui e pela importância ou significação o TATtem se mantido como uma técnica
dessas relações". Então, considerando, popularmente utilizada, dando origema
por exemplo, o teste de Rorschach,que uma grande série de instrumentoscon-
é uma das técnicasque mais vêm sendo gêneres, apesar da existência de forte
estudadas em termos da validação de hi- controvérsia a respeito de sua validade,
póteses, Cronbach (1990) observa que os conforme revisões da literatura especí-
resultados de pesquisasora se mostram fica de Lanyon e Goodstein (1982)e de
marcantemente favoráveis, ora não. Não Lundy (1988). Aliás, este último autor
obstante, Erdberg (1990, p. 389) chama a demonstrou a complexidade do proble-
atenção para o fato de que certas diferen- ma, ao tentar examinar as variáveisque
ças entre os resultados se associam com o podem estar em jogo quando "doiscon-
foco de conceitualizaçãoda natureza do juntos de pesquisadores parecem obter
teste. O foco percepto-cognitivose con- diferentes resultados a partir do mesmo
centra na estrutura das respostas do su- método" (Lundy, 1988, p. 310), chegando
jeito e, com este prisma, existe um grande à conclusão de que variações na situação
acervo de "estudos de validade que vincu- de testagem, em especial quanto às ins-
Iam variáveis estruturais do Rorschach ao truções, estariam afetando as respostas
comportamento alheio ao teste". Porém, ao instrumento. Cronbach (1990) ana-
quando o instrumento é utilizado como lisa, em seu livro, este e outrosestudos,
um estímulo à fantasia, o foco se dirige chamandoa atenção para a importância
não para a estrutura das respostas, mas de influências situacionais transitórias,
para as próprias verbalizações, sendo que, que têm comprometido os resultadosde
a partir de seu conteúdo, são levantadas pesquisas sobre validade. Aliás, Masling
hipóteses sobre a dinâmica interna. Nes- (1992) corrobora esses achados, mostran-
te caso, a questão da validade torna-se do o reflexo de variáveis situacionaise
delicada e complexa. Assim, levando em interpessoais, que acabam por ocasionar
conta as possíveis abordagens do teste, diferenças metodológicas, interferindo
situação
sua validade "é objeto de contínua con- nos resultados de pesquisa e na
trovérsia" (Lanyon e Goodstein, 1982, p. de avaliação psicológica. de
54). No entanto, esforços nesse sentido Ora, considerando a quantidade
TAT,bem
há muito vêm sendo feitos, destacando- pesquisas sobre o Rorschach e o de seus
se o trabalho de Zubin, Eron e Schumer como os aspectos controvertidos problema
(1965), que também pretenderam concei- resultados, tudo indica que o não
tualizar a técnica sob um referenclal teóri- da validade das técnicas projetivasà vista,
co diverso do enfoque junguiano original. simplese parece não ter solução
372 Luiz Pasquali & cols.

pelo menos em termos que possam ser de abordagem descritos por Cronbach, vi.
satisfatórios para a tradição psicométri- sando obter melhor consistência interna
ca mais ortodoxa. Não obstante, parecem na seleçãodos dados úteis e na integra.
estar emergindo novas tendências. Assim, ção dos resultados. Também não é imposs
na edição de 1956, Cronbach,citado por sível que, com o incremento de pesquisas,
Masling (1992, p. 616), salientava a po- seja viável emprestar melhores qualida-
sição galtoniana na pesquisa com testes, des psicométricas a técnicas projetivas,
definindo teste como "uma amostra das especialmente pelo desenvolvimento de
respostas do sujeito a um estímulo padro- estudos de fidedignidade, validade e pelo
nizado impessoal". Já na edição de 1990, estabelecimento de normas que permitam
Cronbach (p. 4) escreve que, embora seu aumentar o grau de certeza nas inferên-
texto se concentre mais em testes "padro- cias clínicas. Por outro lado, além de uma
nizados", inclui, também, testes não pa- perspectiva empírica, já vêm sendo feitos
dronizados, aos quais "se aplica a maioria esforços no sentido de definir melhor a
dos conceitos usados para analisar" os formulação teórica que associa as res-
primeiros. Discute variações nos méto- postas ao teste com o comportamento na
dos de colher informações, chamando a situação de vida para a qual são necessá-
atenção, também, para diferençasna in- rias predições. Da mesma forma, também
terpretação entre os aplicadoresde testes, o referencial teórico que embasa a inter-
notando que "alguns têm como propósito pretação projetiva tem de se constituir em
'medir' o indivíduo; outros, caracterizá- um foco de novos estudos. Se não é possí-
-Io" (Cronbach, 1990, p. 34). Tais propó- vel testar uma teoria, construtosteóricos
sitos definem estilos de testagem, em uma podem ser investigados, desde que opera-
abordagem psicométrica ou impressionis- cionalmente definidos (Cunha e Werlang,
ta. Já chegando à questão da validação, 1991a), dando renovado suporte a técni-
salienta que os psicometristasconfiam em cas projetivas que provavelmente conti-
interpretações com base quantificávela nuarão a ser utilizadas, sobreviventesque
partir de normas estatísticas derivadas de são de grandes controvérsias. Aliás, nota-
estudos prévios, e não em "interpretações se, também, que mesmo instrumentos
ob-
mais subjetivas, individualizadas". Ao vistos como medidas mais diretas e
contrário, "o impressionista está menos jetivas da personalidade,comoo MMPI,
preocupado com validação formal", por- vêm sendo interpretados em seus aspec-
sínteses
que "validar 'retratos' é muito mais difícil tos configuracionais, chegando a
da per-
do que validar predições numéricas. Com clínicas inspiradas na visão global
efeito, requer a validaçãodo intérprete". sonalidade, uma das fortes características
Deste modo, "as abordagens psicométrica das técnicas projetivas. viável a
e impressionista diferem mais nitidamen- Em vista de tudo isto, parece de um
454)
te na questão da confiança no psicólogo" previsão de Millon (1984, p.avaliaçãoda
(Cronbach, 1990, p. 36). renascimento no campo da de algtv
Em resumo, no estado atual da arte, personalidade, com integração
advogando uma
não parece possível transformar técnicas mas formulações teóricas,
em que condiçõesenv
união instrumental se vinculem .com
tante, "os psicólogos,hoje em dia, não píricas e quantitativas
clinicamente dinâmicas e
apenas administram testes; eles realizam as qualidades
téc-
avaliações" (Goldstein e Hersen, 1990, p. integrativas, que caracterizam muitas
3). Nessa perspectiva, em um plano de nicas intuitivas". Se essa é a perspectiva,
avaliação, é possível utilizar os dois tipos só o futuro dirá.
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