03 Mês Do Sagrado Coração de Jesus A4
03 Mês Do Sagrado Coração de Jesus A4
03 Mês Do Sagrado Coração de Jesus A4
12ª Edição
1962
Mês do Sagrado Coração de Jesus 2
MÊS DO SAGRADO
CORAÇÃO DE JESUS
1962
EDITORA MENSAGEIRO DA FÉ LTDA. Caixa Postal,
708
Salvador – Bahia – Brasil
Mês do Sagrado Coração de Jesus 3
NIHIL OBSTAT:
Salvador, 15 de setembro de 1962
Frei Valdemiro Schneider O. F. M, (Censor diocesano)
REIMPRIMATUR:
Salvador, 15 de setembro de 1962
Mons. Pedro C. Guerreiro P. V. G.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 4
PRÓLOGO
A primeira ediçã o deste opú sculo veio a lume em 1888, e trazia entã o uma notícia
resumida mas bastante explicativa, sobre o Apostolado da Oraçã o.
Hoje ele é reeditado sem esta segunda parte, mas em seu lugar vêm duas coleçõ es de
exemplos para os dias do mês; alguns transcritos quase textualmente do perió dico
"Mensageiro do Coraçã o de Jesus" (Ediçã o francesa), e outros compostos sobre dados
que se encontram no dito perió dico religioso e noutros, ou em vidas de Santos e
biografias de cristã os de todas as classes, que foram fervorosos devotos do Sagrado
Coraçã o.
A primeira série de exemplos, que vem junto à s meditaçõ es, consta de fatos que se
deram em tempos e lugares diferentes, e demonstram a utilidade e o poder incalculá vel
da pia devoçã o; chamar-se-á bem esta série a das — "Graças do Coraçã o de Jesus". A
outra oferece, a largos traços, o esboço de vidas que se orientaram todas por este culto
especial; pode intitular-se a dos — "discípulos do Sagrado Coraçã o".
A segunda coleçã o de exemplos vai colocada no fim do opú sculo, proporcionando,
mesmo fora dos exercícios devotos, uma interessante e proveitosa leitura espiritual para
cada dia do mês consagrado ao Santíssimo Coraçã o de Jesus.
BAHIA, 29-3-1913.
Padre José Basílio Pereira
Mês do Sagrado Coração de Jesus 5
MEDITAÇÕES
-I-
Os terníssimos afetos do Coração de Jesus
PRIMEIRO DIA
Oremos para que em todo este mês nã o se cometa um só pecado mortal em nossa família. Pai
Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos
amemos cada dia mais”.
Jesus e as criancinhas
Jesus está assentado e, em redor dele, estã o os discípulos; lá adiante, por entre a
multidã o, seu olhar paternal descobre umas criancinhas que tímidas se aconchegam à s
mã es; Jesus estende-lhes os braços como a chamá -las.
Os pequenos compreendem esse convite afetuoso e logo correm a Jesus que os abraça,
abençoa, detém junto de si e lhes fala do céu. Os Apó stolos, temendo que eles
incomodassem o divino Mestre, queriam afastá -los... "Nã o, diz Jesus, deixai que as
criancinhas se cheguem a mim".
Que cena tocante! Ó Jesus, também eu sou criança e também, como elas, corro a vó s;
acariciai-me, abençoai-me, falai-me do céu.
Se me conservar simples, inocente, afá vel, me haveis de querer: nã o é assim meu Jesus?
Afastai-vos, pois, pensamentos, desejos, afeiçõ es que arrancareis do coraçã o o que
agrada a Jesus.
"Preparar-me-ei devotamente para a minha pró xima Comunhã o".
EXEMPLO
"Deixai os pequeninos virem a mim, porque deles é o reino dos céus. Foram certamente essas
palavras partidas do Coraçã o de Jesus que ditaram a seu Vigá rio na terra o decreto sobre a
Comunhã o dos meninos, mandando que se lha dê logo que neles se acenda o lume da razã o e
saibam distinguir entre o pã o da alma e o do corpo; e os fatos providencialmente se tem
encarregado de provar que, ao invés de retardar a primeira Comunhã o para além do primeiro
decênio da vida, é justo, muitas vezes, permiti-la até no primeiro lustro... Um desses casos é o de
Nellie, chamada "a pequena violeta do SS. Sacramento", morta aos 4 anos e meio de idade, a 2 de
fevereiro de 1908, no convento do Bom Pastor, em Cork na Irlanda, e cuja "vida" corre impressa
num volume de 225 pá ginas sob os auspícios e bênçã os de Pio X. Nellie, a primeira vez que viu a
Sagrada Hó stia exposta, exclamou radiante: "Ali está o Deus Santo!" E dizia depois muitas vezes:
"É preciso que vá hoje à casa de Deus Santo: eu quero conversar com Ele". Abraçando com
efusã o as pessoas que haviam comungado, sem que lho houvessem dito, lhes declarava: "Eu sei
que hoje recebeste o Deus Santo”. Quando, ferida de uma enfermidade mortal, lhe anunciaram
que faria a sua primeira Comunhã o, deu um grito de alegria, exclamando : "Terei entã o breve o
Deus Santo em meu coraçã o!" E, no curso de sua dolorosa enfermidade, recebeu muitas vezes a
Mês do Sagrado Coração de Jesus 9
Hó stia Sacrossanta, recolhendo-se em fervorosas açõ es de graças que duravam duas e três
horas, e suportando seus padecimentos até o fim, com uma resignaçã o admirá vel e edificante,
nunca, vista em criança de sua idade.
"A Revista do Coraçã o Eucarístico" de julho de 1911 menciona também o caso de certa aluna de
uma casa religiosa de Roma, onde se asilaram cerca de cem meninas escapas ao terremoto de
Messina. Admitidas à audiência pelo Papa, quando este falava, sentiu-se mais de uma vez puxado
pelas vestes, e perguntou: "Quem é que me sacode assim?" Uma voz argentina responde logo:
"Sou eu". Era uma pequena de 5 anos; as superioras quiseram repreendê-la, mas Pio X acudiu:
"Povera fanciulla, que queres de mim?'— "Eu tenho cinco anos ; queria fazer minha primeira
Comunhã o, e as Religiosas nã o querem!"— "Nã o sabes talvez bastante o catecismo", observou o
Papa sorrindo. — "Examinai, replicou ela, eu responderei". O Pontífice fez-lhe diversas
perguntas, e as respostas foram satisfató rias; admirado, voltou.se para as Irmã s, e disse: "Dai-lhe
a santa Comunhã o amanhã ".
SEGUNDO DIA
Oremos pelas almas que estã o em pecado e nã o pensam em se confessar. Pai Nosso, Ave Maria.
Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia
mais”.
Jesus e Lázaro
De pé, junto do tú mulo do amigo, Jesus está chorando... Ó Jesus, muito amor tendes vó s
aos vossos amigos! Quanto me enternecem as vossas lá grimas! como demonstram a
ternura do vosso piedosíssimo Coraçã o! Elas suscitam em mim uma recordaçã o que me
punge e ao mesmo tempo me comove: a daqueles dias em que, morta a minha alma à
graça, ainda corríeis a vê-la e chorá veis sua sorte...O meu Anjo da Guarda, testemunha de
vossas lá grimas, dizia, lembrando a observaçã o dos judeus: "Como Jesus ama esta alma!"
Agradeço-vos, meu Deus, a vossa imensa bondade! Lá zaro seguiu-vos...do mesmo modo
quero que todas as faculdades de minha alma, que todo o meu ser sejam empregados em
vosso serviço para começar já hoje.
"Serei fiel em cumprir os meus deveres para agradar a Deus".
EXEMPLO
Em Liã o, refere o Pe. Trouiller em 1893, um chefe de família, arredio das prá ticas religiosas
desde muitos anos, achava.se gravemente enfermo. Atacado como fora de uma apoplexia,
propô s-lhe um dos parentes que aceitasse a visita de um padre. Irritado, respondeu que nã o.
Repetindo-se o ataque, um amigo esforçou-se por trazê-lo a melhor resoluçã o: retorquiu,
vivamente, que nã o lhe falasse mais no assunto, sob pena de brigarem. Entretanto, os progressos
do mal eram rá pidos, e o perigo iminente. A família, entã o, angustiada, recorreu ao Coraçã o de
Jesus, refú gio dos pecadores e abismo de misericó rdia.
O enfermo acabava de sofrer terceiro ataque. Deram-lhe um escapulá rio do Sagrado Coraçã o,
que tocara em Paray uma das mais preciosas relíquias de S. Margarida Maria, e uma pessoa que
o doente prezava teve a inspiraçã o de trazer a vê-lo um sacerdote que ele conhecia e estimava.
Com surpresa de todos, a visita foi logo aceita; e, depois de longa conferência, o Padre retirava-
se, declarando que seu penitente podia receber os ú ltimos sacramentos.
No dia seguinte, (uma quinta-feira santa), a zelosa senhora que oferecera o precioso escapulá rio,
voltando a visitar o remisso, encontrou-o sentado numa poltrona, tendo nas mã os um livro de
oraçõ es que recitava devotamente. Uma. bem ornada mesa esperava a Sagrada Eucaristia que,
dentro de poucos instantes, viria encher de graças a alma do pobre pecador. E, com a saú de espi-
ritual, o Coraçã o de Jesus restituiu-lhe a saú de do corpo.
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TERCEIRO DIA
Oremos por aquelas pessoas a quem Deus reserva no presente dia alguma dolorosa provaçã o.
Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos
amemos cada dia mais”.
Jesus e a pobre viúva de Naim que chorava seu filho
Afigura-se-vos, na vossa primeira idade, que nunca sofrereis grandes dores... Mas ai!
também vos chegarã o essas penas, que dilaceram o coraçã o arrancando-lhe tudo o que
ele ama. Lembrai-vos entã o que há sobre a terra um Deus previdente, que vê todas as
dores: Jesus, —é quem vos consolará . É principalmente na comunhã o que ele nos diz:
"Nã o choreis... eu vos conduzirei aonde estã o aqueles que amais; vinde, nã o me deixeis".
—Dai-me, meu Deus, o amor da Eucaristia !.é aí que se acha a consolaçã o e a paz... sei que
aí nã o me enganam... aí ouço, confortado, essas palavras: "Nã o chores".
"Irei diligente fazer a minha visita ao SS. Sacramento".
EXEMPLO
"Há s de ter sabido o que sucedeu, ultimamente, ao nosso Jú lio, escrevia de Bretanha, em 1883,
uma boa mãe cristã a outra sua amiga. Ele comandava o “Alceste”, navio à vela, e já avariado;
tinha sob suas ordens cerca de 500 homens. Voltando para Brest, foi surpreendido por quatro
tempestades terríveis, redemoinhos e vagas de 30 pés de altura que cercavam o navio. Uma
rajada de vento despedaçou-lhe a vela grande; outra levou-lhe suas três chalupas; e assim é que
chegou à baía dos Mortos, que tem esse nome pelos muitos sinistros que nela ocorrem. Foi-lhe
preciso passar o Goulet para entrar na enseada; e sabes quanto ele é estreito e perigoso. Junte-se
a isto um mar medonho, um vento assustador, e noite escura, sem haver piloto e estando ocultos
os faró is pela altura das vagas; mas o nosso bom Jú lio tinha feito pregar na popa de seu navio
uma imagem do Sagrado Coraçã o e, cheio de confiança nessa proteçã o, prometeu uma missa em
açã o de graças, se chegasse ao porto de salvamento com toda a equipagem; e assim aconteceu.
Imagina o que minha pobre Cecília passou, mas ouve também o que me escreve: "Tive ontem um
desses momentos de felicidades que fazem esquecer todos os sofrimentos passados. Dizia-se a
missa, em açã o de graças, em S. Luís: e Jú lio, de uniforme, tinha ao pé o seu segundo oficial,
protestante convertido pelo prodígio que viu; depois todos os oficiais, acompanhados de suas
mulheres e parentes: e atrá s deles a equipagem, todos perfilados militarmente e numa atitude
respeitosa. Foi um ato de fé pú blico, que muito me comoveu e deixou em todos ó tima
impressã o".
QUARTO DIA
Oremos em uniã o com as pessoas que hoje comungaram. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a
jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus e a Samaritana
Lá vos estou vendo, Senhor, oprimido de fadiga, assentado à borda do poço de Jacó ,
aguardando os que passam, dizendo a todos: "Dai-me de beber; tenho sede do vosso
coraçã o, dai-mo; tenho sede da vossa inocência, conservai-ma..." Ah! Jesus meu, quantas
vezes nã o vos tenho eu recusado esta esmola, para dar à s leviandades, à s paixõ es, à s
vaidades...e vó s nã o desanimastes, continuá veis a pedi-la sempre... Sim, Jesus meu, vos
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quero dar este alívio que me pedis, e do qual pareceis carecer...Que quereis de mim no
dia de hoje? Fidelidade no cumprimento dos meus deveres, amor nas minhas oraçõ es?...
Eis-me aqui, Senhor... pedi o que quiserdes.
"Recitarei, com mais atençã o, as minhas breves oraçõ es, durante o dia".
EXEMPLO
O Pe. Ludovico de Casó ria, encontrando uma vez, absorta em profundo estudo, a ilustre
napolitana Catarina Volpicelli, disse-lhe : "Virá um tempo em que fechará s todos os livros. Jesus
te abrirá o livro de seu Coraçã o, que diz infinito amor a cada. pá gina, a cada palavra". E assim foi:
Catarina, meditando, junto ao sagrado taberná culo, inflamou-se de tanto fervor que, deixando
tudo, foi encerrar-se entre as perpétuas adoradoras do SS. Sacramento. O Senhor, porém,
dispunha a seu respeito maiores coisas, e quis que, obrigada a sair do convento por motivo de
saú de, fizesse no mundo ainda mais do que teria podido fazer no claustro. Ardendo em santo
zelo, empregou no serviço de Deus quanto era, tinha e podia: o talento, os estudos , os raros dons
da natureza e da graça, o rico patrimô nio, suas obras, a pró pria vida, tudo ofereceu e sacrificou
ao Sagrado Coraçã o, com um ato solene que assinou com o pró prio sangue, chamando-se vítima
e escrava do divino amor. Fundou o instituto das Servas do Sagrado Coraçã o e, em Ná poles, o
santuá rio do Coraçã o de Jesus, sede do Apostolado de que ela foi a primeira Zeladora. Criou a
"Voz do Coraçã o de Jesus", perió dico mensal da Santa Liga; instituiu a obra da Adoraçã o
Reparadora, e da assistência à s igrejas pobres, o Orfanato das meninas, vá rias congregaçõ es de
piedade para as jovens, a Biblioteca para a divulgaçã o dos bons livros: quem poderia enumerar
todas as obras que realizou sob o impulso onipotente da caridade divina? Era, todavia, tã o
humilde, que se tinha como a. ú ltima e ínfima entre as servas do Sagrado Coraçã o; e nunca a sua
devoçã o arrefeceu um instante; pois, ainda na hora extrema da vida, quando, placidamente e
com inefá vel sorriso nos lá bios, estava para voar à pá tria celeste, quis novamente oferecer-se
como vítima ao Divino Coraçã o com o ato solene que o Sumo Pontífice chamou "voto heroico".
QUINTO DIA
Oremos pelas almas fracas que estã o a ponto de se deixarem arrastar para o mal. Pai Nosso, Ave
Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada
dia mais”.
Jesus e o pai aflito que pede a cura de seu filho
O Coraçã o de Jesus nã o pô de resistir à s lá grimas, sobretudo à s que se derramam pelos
outros... "Vai, diz ele a este pai amante, vai, teu filho está salvo". Ah! quem é que nã o terá
em torno de si almas cujo estado seja bem mais perigoso, ainda que diferentemente, que
o desta criança?...para curá -las, ide a Jesus, orai, chorai e esperai com toda a confiança...
— Fazei-me ouvir depressa, meu Deus, em favor daqueles que amo e cuja santificaçã o
desejo, estas palavras: “Consola-te... todos eles vivem para o céu”.
“Eu me mortificarei hoje, abstendo-me de dizer qualquer palavra que desagrade a Jesus”.
EXEMPLO
O castelo de Villargoix, em Cô te d'Or, pertence a uma nobre família cristã , onde o cumprimento
dos deveres religiosos é tradicional e, de tempos imemoriais, se observa o costume de fazer em
comum a oraçã o da noite, recitando-a, em voz alta, o chefe da família, reunidos ao toque do sino
todos os parentes e os domésticos. Muito naturalmente, pois, entrou aí o culto ao Coraçã o de
Jesus; e com ele vieram bênçã os e graças particulares sobre a casa. Um dia, o proprietá rio,
marquês de Belathier Lantage, tendo a seu lado um filho, examinava a construçã o já adiantada
de uma abó bada que devia ligar duas partes do castelo, quando se ouviu um medonho estalo. O
marquês aterrado, tem, entretanto, a inspiraçã o de fazer um voto ao Sagrado Coraçã o: num
Mês do Sagrado Coração de Jesus 12
momento a abó bada se faz em pedaços e cai em terra, mas o piedoso cristã o se vê sã o e salvo
sobre uma barra de ferro solidamente encravada na parede, enquanto o filho, sem o sentir,
escorrega suavemente ao longo de uma grossa trave, que o depõ e sem um arranhã o sobre a
relva.
Em cumprimento do seu voto, o marquês dedicou sua capela ao Sagrado Coraçã o, gravando sob
a santa imagem a seguinte inscriçã o: "Eles me constituíram o guarda de sua casa"; e a devota
família dizia agradecida: "O Coraçã o de Jesus nos guarda, e nó s montamos guarda ao Coraçã o de
Jesus".
SEXTO DIA
Oremos em uniã o com as Religiosas que por voto guardam silêncio. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria
e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus e o paralítico da piscina
Há já 38 anos que este infeliz está ali, esperando a sua cura sem pensar em pedi-la
à quele que é só quem lha pode dar, ao Deus da imensa bondade.
Passa Jesus... o doente nem pensa nele, e contudo é este bom Mestre que lhe diz: "Queres
ser curado...?"— "Nã o tenho quem me valha", responde o doente... Ah! com certeza tu
nã o conheces Jesus, pobre desgraçado!... Pede-lhe que te cure. Ele nem sequer lho pede,
e Jesus cura-o... Como sois bom, ó meu Jesus! Fazei-nos bem, ainda quando vo-lo nã o
sabemos pedir... e eu que vo-lo peço; serei desatendido? Nã o, nã o! creio-o firmemente!
"Hoje praticarei algum ato particular de bondade a fim de agradar a Deus".
EXEMPLO
Em outubro de 1890, de uma cidade do sul de França, recebia o diretor do Apostolado a seguinte
comunicaçã o: "Aproveito a minha primeira hora livre, para vos noticiar que o Sagrado Coraçã o
ouviu as minhas sú plicas em favor do meu querido pai. De 22 para 23 anos minha alma nã o
cessava de recorrer a Deus; mas, obtendo aos poucos a liberdade de fazer as minhas devoçõ es,
eu vi esse coraçã o de pai sempre afastado da religiã o. Nã o porei na balança da misericó rdia
divina meus sacrifícios contínuos, minhas promessas de "vítima" pela salvaçã o dessa alma cara.
Mas uma enfermidade longa, inexorá vel, veio visitar meu pobre pai, e com ela o isolamento, a
reclusã o, a inaçã o forçada. Cerquei-o de cuidados e de afeiçã o: mas tinha sempre motivos de
chorar por sua alma. O caro enfermo tinha consigo o escapulá rio do Sagrado Coraçã o que eu lhe
cosera nas vestes... Um zeloso missioná rio renovava, mas em vã o, suas visitas, no intuito de
trazer a melhores sentimentos o velho advogado e político. O santo sacrifício da missa era
oferecido quase diariamente por ele. Afinal, uma noite em que o bom religioso velava ao seu
lado, ele chama de repente : "Padre, eu preciso que me ajudeis a cumprir um grande dever: eu
quero confessar-me". Quando terminou, eu me aproximei do leito e lancei-me em seus braços.
Disse-me entã o com lá grimas: "Fiz o que de há muito desejavas, e me sinto satisfeito".
O enfermo testemunhava com lá grimas sua fé e arrependimento. Alguns dias depois, uma crise
terrível quase o leva repentinamente. — "Meu Deus, dizia eu, vó s fizestes tanto: concedei-lhe
ainda uma absolviçã o e o sacramento dos moribundos". E o Senhor ouviu minha sú plica; a
morte, que parecia já arrancá-lo, mo restituiu: ele recebeu com alegria a santa unçã o. Enfim, no
dia 8 de junho, um mês depois de voltar a Deus, extinguia.se, docemente, com o crucifixo nas
mã os, a serenidade nos traços e a resignaçã o no coraçã o" .
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SÉTIMO DIA
Oremos a fim de colher bons frutos das instruçõ es que recebemos. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e
a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus e o leproso
Ouvi este grito d'alma, este grito cheio de confiança e de amor: "Senhor, se quiserdes,
podeis curar-me!" e ao mesmo tempo, acrescenta o Evangelho, lançava-se o leproso de
joelhos e suplicava com as mã os erguidas... Jesus para, estende-lhe as mã os e com elas
toca as chagas do doente. "Sim, quero-o, diz Jesus, sê curado..." — Oh! e por que já nã o
estarei eu curado do meu orgulho, da minha sensualidade, da minha indolência, eu que
tantas vezes vos hei tocado na santa comunhã o? Faltar-me-ia a confiança?...
Meu Jesus, eu creio e espero! Curai-me!...
"Recitarei as minhas oraçõ es na igreja, como se estivesse vendo realmente Jesus Cristo".
EXEMPLO
O Padre J. André, missioná rio de Callatupaty no Indostã o, em 1884, quando ali reinava a peste,
narra numa carta, o seguinte: Um dia, quando eu ia sair de casa, chegaram dois homens cobertos
de suor: "Padre, dois cristã os de Vayalogam". "De tã o longe! Alguma extrema unçã o, sem
dú vida". — "Sim, Padre, para toda a aldeia".—“Para toda a aldeia! Expliquem-se".— "Padre, leia".
E me apresentaram uma folha de palmeira em que leio: "Os cristã os de Vayalogam rogam ao
Souami que os venha socorrer. A có lera está a suas portas, e já as três aldeias pagã s e turcas que
cercam Vayalogam sã o dizimadas. Que o Padre nã o abandone seus filhos neste perigo; venha
dizer-lhes uma missa e purificar suas almas, e eles se salvarã o". — "Meus amigos, respondi eu,
desde que ninguém dentre vó s foi atacado, nã o vedes que nosso Senhor vos defende? Vossa
aldeia é tã o longe! É viagem de uma semana! Ora, vó s sabeis que cada hora do dia e da noite eu
posso ser chamado aqui para alguma vítima da có lera ou da varíola". — "Entã o, dizei o que
devemos fazer". — "Amigos, como eu mesmo nã o posso ir, vou fornecer-vos um substituto que,
sem dar a ninguém a extrema unçã o, fará o que eu nã o posso fazer. Aqui está uma imagem do
Sagrado Coraçã o de Jesus. Lembro-me de que numa grande cidade de minha pá tria, em
Marselha, a có lera chegou a fazer 120 vítimas por dia. No mais forte da epidemia, o bispo fez um
voto ao Coraçã o de Nosso Senhor; desde esse dia, ninguém mais foi atacado. Tomai sua imagem,
e no domingo pró ximo, levai-a em procissã o pela aldeia: Os poucos pagã os que há por lá nã o po-
derã o opor-se".— "Ao contrá rio; foram os mais empenhados em que viéssemos chamar-vos". —
"Mas nã o é tudo. Enquanto durar o flagelo, todos os dias pela manhã e à noite, reuni-vos no
maior nú mero possível na igreja, e recitai a ladainha do Sagrado Coraçã o. E que nenhum menino
falte, mesmo os que apenas principiam a caminhar". —“Mas, Padre, um grande nú mero desses
meninos ainda nã o sabem as oraçõ es”.—"Nã o importa. Dizei-lhes só que é preciso pedir a Deus
que preserve a aldeia de todo o mal: Nosso Senhor lhes inspirará a maneira de o exprimirem.
Além disto, a presença deles, por si, é ama oraçã o que sobe ao céu. Quanto aos adultos, que
tenham cuidado em nã o ofender ao Coraçã o Divino. Ide, fazei o que digo, e estareis salvos.
Dois meses depois, bate à minha porta o guarda da igreja de Vayalogam. — "E entã o, Aroupalen,
a có lera?' — "Desapareceu, padre". — "Quantas vítimas?" — "Nenhuma entre nó s. Porém fez
muitas entre nossos vizinhos pagã os e turcos".
OITAVO DIA
Mês do Sagrado Coração de Jesus 14
Oremos para que Deus nos conceda a graça de repelir as tentaçõ es, que durante o dia
experimentarmos. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos
amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus e os aflitos
Que impressã o deviam fazer nos coraçõ es estas palavras de Jesus: "Oh vó s, que estais
oprimidos de dores e sofrimentos, vinde a mim, que eu vos aliviarei!" Ainda ninguém
tinha falado assim; ninguém se havia mostrado tã o acessível a todos como Jesus... Assim,
vede: os pobres, os doentes, e os abandonados sã o os que o acompanham. — Quem os
queria anteriormente? Quem nã o os bania de sua convivência? Ó Jesus, ensinai-me a ter
um coraçã o compassivo, a amar aqueles a quem ninguém ama, a acudir aos que todos
repelem... Dai-me sempre muitos coraçõ es, a quem eu possa consolar durante a minha
vida.
"Hoje procurarei ser ú til a alguém da minha companhia".
EXEMPLO
O Dr. José Charazac, fundador da Policlínica de Toulouse, autor de vá rias obras científicas
elogiadas como de alto valor pela imprensa profissional, foi um verdadeiro cristã o, sem fraqueza
nem respeito humano. Começava, habitualmente, o seu dia por uma longa visita à igreja de
Beaulieu, onde, recolhido em fervorosa oraçã o, oferecia ao Coraçã o de Jesus as primícias de seus
trabalhos. Depois, todo entregue aos deveres da profissã o suportava-lhe as tarefas com uma
paciência heroica, viajando a toda a hora do dia e da noite para acudir aos enfermos, sem olhar a
tempo desfavorá vel nem a maus caminhos, e dirigindo-se primeiro e de preferência aos pobres:
"Os ricos, dizia ele, tem mais recursos; lhes é mais fá cil providenciar". Seu grande espírito de fé
lhe fazia ver no indigente a personificaçã o de Jesus Cristo sofrendo. Um dia, um amigo lhe disse:
"Meu caro, eu tenho muitos doentes para lhe mandar; devo, porém, prevenir que todos sã o
clientes pobres e para consultas gratuitas". — "Mas entã o, respondeu logo ele, nã o se há de
tratar aos infelizes que nã o podem pagar médico? Mandemos todos, e sempre". E todos os
enfermos que lhe enviei, informa esse amigo, voltavam penhorados: nã o só lhes dispensava
cuidados, mas fornecia-lhes remédios, dava-lhes até dinheiro, e com tanta bondade, que o modo
de socorrer duplicava o mérito e o valor do serviço prestado. Aos 34 anos de idade, caiu
gravemente enfermo, e preparou-se para a morte, comungando vá rias vezes na semana: no
Coraçã o de seu Deus é que o médico exemplar ia haurir a sua invencível coragem e perfeita
resignaçã o. Tinha filhos em tenra idade que a miú do o acarinhavam; com os olhos marejados de
lá grimas, ele dizia entã o aos que o cercavam: "Faça-se a vontade de Deus! eles nã o puderam
conhecer-me bem; vó s lhes direis quanto eu os amava!" Um pouco antes de expirar, exclamou:
"Eu morro! mas diviso lá no alto uma felicidade mais perfeita, vejo o céu, eis a eternidade bem
aventurada. Lá , eu vos tornarei a ver um dia". E, levando a mã o ao coraçã o, sorriu docemente à
família, traçou sobre si um grande sinal da cruz, e entregou a alma a Deus. Na sociedade médica
de Toulouse, em sessã o de 21 de novembro de 1892, o secretá rio geral, Dr. Bezy, fazendo o seu
necroló gio, dizia entre outras coisas: "Ao lado de numerosas coroas depostas sobre o seu féretro
pela piedade dos seus, via-se um "bouquet" de violetas trazido, timidamente, por um "pobre
menino" a quem Charazac salvara a vida por uma há bil traqueotomia... Pratiquemos as virtudes
de que nos deixa o mais belo exemplo, e que resumem sua vida privada e sua carreira científica:
Amor do trabalho, coragem na luta, bondade com os infelizes".
NONO DIA
Oremos pelas pessoas que mais estimamos. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o
de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus defende Madalena
Mês do Sagrado Coração de Jesus 15
Madalena tinha sido pecadora, estava, porém, arrependida e chorava aos pés de Jesus.
Nã o era preciso tanto para comover o coraçã o do bom Mestre; nã o só perdoa, mas vede
como ele toma a sua defesa contra os que, no fundo de seus coraçõ es, diziam: É uma
pecadora. — "É mais amante do que vó s, respondeu Jesus. Vim à vossa casa, nã o me
destes á gua para meus pés, e ela mos há banhado com as suas lá grimas; nã o me destes o
ó sculo de paz, e ela nã o cessou de beijar-me os pés... Por isso eu lhe digo: Tudo vos é
perdoado, ide em paz!"
Liçã o de misericó rdia que eu jamais esquecerei, ó meu Deus! Talvez que aqueles que eu
desprezo dentro do meu coraçã o, e os que acuso, sejam mais queridos de Deus, porque o
amem muito mais.
"Porei sumo cuidado em julgar o pró ximo, para nã o pensar mal de ninguém; e se fizer
juízo temerá rio, mortificar-me-ei à refeiçã o".
EXEMPLO
Em Amsterdam, a Liga do apostolado em 1892 propô s-se a trabalhar seriamente na obra da
conversã o dos pecadores. A Liga contra cerca de 500 jovens, que se reú nem todos os domingos:
no dia do Natal rogaram elas com instâ ncia ao Sagrado Coraçã o, que convertesse ao menos um
pecador cada semana, e em curto prazo já se haviam convertido vinte e um. Cada associada reza,
diariamente, uma "Ave Maria' nessa intençã o, e procuram, por toda a parte, os transviados;
quando os acham, dã o os nomes ao Diretor, que, sem os declinar, na reuniã o seguinte pede
oraçõ es por eles e, em seu favor, se faz uma comunhã o e o Padre anuncia que num dia
determinado dirá a missa nessa intençã o, convidando a comungarem nesse ato todas as que
puderem, Se o pecador é da paró quia, o Padre vai procurá -lo; se de outra, avisa ao respectivo
Pá roco, a fim de que o disponha. Estas piedosas diligências têm sido até agora coroadas de êxito.
Havia aqui uma mulher de 70 anos que nã o queria ouvir falar de Deus: estava em grande perigo
de morte, e nã o queria deixar-se levar para o hospital, dirigido pelas Irmã s de Caridade;
enfurecia-se, quando lhe falavam nisso. As associadas da Liga, querendo convertê-la, vã o ao
Diretor: "Padre, nada conseguimos; que se há de fazer?"— "Nó s triunfaremos, ficai certas —
respondeu ele— o Sagrado Coraçã o nos ajudará. “Trazei-me aqui nove de vossas companheiras”.
Chegadas estas, disse-lhes: "Começai uma novena com muito fervor; pedi a Nosso Senhor que a
doente perca os sentidos, a fim de que se possa entã o transportá -la ao hospital". A sú plica foi
ouvida e a pobre mulher veio para a companhia das irmã s. Mais tarde, volta a si e, vendo uma
das Religiosas aos pés de seu leito, reú ne todas as suas forças, salta ao chã o e quer atirar-se pela
janela; acode gente, conseguem contê-la e comunica-se o fato ao apostolado: este redobra as ora-
çõ es, e faz dizer uma missa na intençã o, comungando nela 400 associadas. Nã o tardou o triunfo
completo: quatorze dias depois, a pobre pecadora, transformada e recebendo os confortos
religiosos, morria, com todas as disposiçõ es da mais piedosa cristã .
DÉCIMO DIA
Oremos por aquelas pessoas dentre nó s que mais necessidade tem de oraçõ es. Pai Nosso, Ave
Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada
dia mais”.
Jesus e o povo falto de pão no deserto
Há palavras bem comovedoras; Jesus vê a multidã o que o segue esquecendo, em seu
fervor o necessá rio à vida, e diz: "Tenho compaixã o deste povo; há já três dias que me
segue e ainda nã o tomou alimento algum... Nã o o quero mandar embora neste estado,
pois temo que lhe faltem as forças no caminho..." Vó s pensais em tudo, bom Mestre, em
tudo!... Se eu vos servir, se vos acompanhar, ainda mesmo que algures descure a vida
Mês do Sagrado Coração de Jesus 16
UNDÉCIMO DIA
Oraçã o para alcançar de Deus um grande horror a todo pecado. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a
jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Jesus e os apóstolos pedindo a
punição dos samaritanos
Os habitantes de Samaria nã o quiseram receber a Jesus: expulsaram-no dentre os seus
muros... os apó stolos indignados, lhe dizem: "Senhor, quereis que digamos que desça o
fogo do céu e os consuma?"— "Nã o sabeis de que espírito sois! lhes diz Jesus. O filho de
Deus nã o veio perder as almas, mas salvá -las..."
Ah! quã o grande é a vossa bondade, ó meu Jesus! Agora sei porque, depois de tantos
pecados, já me nã o tem vindo surpreender a morte! O demô nio a enviava; vó s porém,
Senhor, a detínheis. Jesus, fazei-me agradecido.
"No dia de hoje procurarei dizer alguma coisa da bondade de Deus".
EXEMPLO
Quando, em 1881, os Padres Jesuítas se estabeleceram na aldeia de Onha, em Burgos, reinavam
ali, por diversas causas, costumes repreensíveis, e a mocidade tinha o há bito de blasfemar; nos
dias de festa, se entregava a danças indecorosas; nem o cura, com sua prédica, nem o alcaide,
com intimaçõ es e penas, tinham podido até aí pô r cobro ao escâ ndalo. Tentaram-no os recém-
chegados por este modo: encontrando-se um deles com um jovem em passeio, trava conversaçã o
e, depois de falar sobre vá rios assuntos, pergunta porque se nã o formam na aldeia coros
decanto, como há na Espanha. Respondendo o jovem que nã o faltam boas vozes, mas nã o têm
quem ensine e exercite, o Padre oferece-lhe o mestre e um local para aprenderem o canto e
quaisquer outras coisas de utilidade que pertençam à boa educaçã o.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 17
Uma semana depois, os moços na quase totalidade inauguram suas reuniõ es literá rias e musicais
numa sala dos Padres sob a sua direçã o, tomando a agremiaçã o o título de "Academia do
Sagrado Coraçã o de Jesus". O ensino religioso e moral nã o poderia, em tais circunstâ ncias, ficar
esquecido; e o Diretor, na primeira oportunidade, fez ver que era absolutamente preciso, dentro
de um mês, corrigirem-se do mau vezo da blasfêmia. Respondem ser impossível, porque estava
muito enraizado o há bito. O Padre replica sem se perturbar: "Confiando em vosso divino
patrono, fazei o que vos digo. Formai cada manhã , o propó sito de nã o blasfemar nem uma só vez
durante o dia, e quando, por acaso, o fizerdes, apanhai uma pedrinha e metei-a no vosso b olso,
renovando logo a resoluçã o tomada". Concordaram todos, e a reforma começou. À noite, à hora
da classe, chegavam todos os jovens com a sua coleçã o de pedras.
Mas, para abrandar o corretivo e poupar o amor pró prio, foi providenciado a que nã o pudessem
conhecer as faltas uns dos outros. O Padre percorria as fileiras, levando um saco no qual todos
metiam a mã o, depondo lá as pedrinhas os que as tinham, sem que se soubesse quais eram e em
que nú mero. Fazia-se depois a soma total e era entã o imposta uma penitência comum, por
exemplo, a recitaçã o de uma "Ave Maria". E só com isto as blasfêmias, sem muito tardar,
cessavam. Em relaçã o à s danças escandalosas, os jovens agremiados fizeram também entre si
um pacto de honra, e as substituíram resolutos por diversõ es honestas e agradá veis. Por esta
forma, quando em Onha celebrou-se em 1882 a festa do Sagrado Coraçã o, a aldeia se regenerara
já dos seus dois mais graves escâ ndalos, e por obras de sua piedosa Academia, cujo coro de
cantores nesse dia mesmo a abrilhantava.
DUODÉCIMO DIA
Oremos por todos os membros de nossa família. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria:
“Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
S. João repousando sobre o peito do Salvador
Que amá vel familiaridade! Apenas me parece compreensível e, contudo, meu Deus, nã o
tenho eu esta dita de S. Joã o cada vez que comungo? Se eu tivesse a pureza que ele tinha,
se eu amasse a Jesus como ele o amava, ah! que deliciosos momentos passaria ao pé do
altar, guardando Jesus comigo, e em mim! Agora explico estas palavras de uma
adolescente: "O céu é uma primeira comunhã o contínua". Pois nã o está em mim o céu
depois da comunhã o? O Evangelho nã o diz que S. Joã o falasse muito com Jesus, mas diz
que foi o ú nico Apó stolo que se achou no Calvá rio... oh! também aí me achareis, meu
Jesus! nada me separará de vó s, nada.
"Farei hoje um ato de reparaçã o a Jesus no SS. Sacramento".
EXEMPLO
Otá vio de Ravinel, noviço da Companhia de Jesus, revelara desde a infâ ncia um coraçã o angélico:
ainda criança, abraçando sua mãezinha, dizia, à s vezes, muito sério: "Eu quero ser um apó stolo";
e ao voltar da igreja, onde na bênçã o do SS. Sacramento segurava a naveta do incenso de que
ainda rescendia, notava contente: "Trago o perfume de Nosso Senhor!' Num dia da festa dos
Santos Inocentes, escrevia: "Tenho inveja desses milhares de meninos que se festejam hoje e que
derramaram o sangue para salvar o Menino Jesus". Na escola apostó lica de Amiens, acometido
de uma afecçã o que o prendeu por muito tempo ao leito ou a uma cadeira, sem nunca se
impacientar, dizia: "Se o bom Jesus padeceu tanto, um de seus filhos nã o pode sofrer um pouco?"
Entrando para o noviciado, ele se ofereceu ao Coraçã o de Jesus como vítima pela salvaçã o das
almas, propondo-se a trabalhar sempre em favor delas, e aplicando à s do Purgató rio, pelo voto
heroico, todos os méritos satisfató rios e indulgências que lucrasse durante a vida, e os sufrá gios
que tivesse por morte. Ficava-lhe por fazer só o sacrifício da vida; esse ofereceu-o ele também,
mais tarde. Uma alma em perigo de perder-se lhe foi recomendada: "Eu me considero par-
Mês do Sagrado Coração de Jesus 18
ticularmente encarregado por Nosso Senhor da salvaçã o desta alma. Peço a Jesus que me faça
sofrer o preciso para alcançar a sua conversã o completa". E o sofrimento veio, chegando ao
extremo. Porém na manhã mesma de sua morte, ao acabar a açã o de graças da Comunhã o,
recebia esta carta: "Oh !como te há s de sentir feliz de que teu ú ltimo sacrifício tenha sido para
reconduzir uma alma ao bom caminho! Que poderei eu fazer em retribuiçã o? pedira Deus a tua
saú de? Eu o fiz, mas parece que Deus nã o quer escutar as minhas sú plicas. Porém nã o partirá s
sem ter de mim uma consolaçã o; aquele por quem te ofereceste, vem, de joelhos, ante o teu leito
de sofrimentos, prometer-te ser um bom cristã o durante o resto da vida. Tu me enviará s as
forças, do alto do céu, para que eu mereça reunir-me a ti um dia".
Otá vio rendeu graças, comovido, e exclamou: "Agora, só me resta morrer". — "Por que? lhe
perguntaram". "Pois nã o ofereci eu minha vida por essa conversã o? Deus ma concedeu: cumpre-
me pagar", pouco depois, expirava, na flor da juventude, em transportes de fervor, como se
tivesse já o céu diante dos olhos.
“Farei hoje um ato de reparaçã o a Jesus no SS. Sacramento”.
igreja!' Todos responderam : "Senhor, nó s somos filhos da Igreja Cató lica, nã o vos podemos
acompanhar". E cumpriram a palavra: feita a paz, ao voltarem os missioná rios em 1886, o
rebanho os cercou de novo, fiel ao Sagrado Coraçã o de Jesus.
”Farei hoje um fervoroso ato de esperança”.
pedia perdã o a todos, dizendo: "Logo que estiver no céu, farei por vó s o que nã o pude na terra,
onde tudo me saiu mal". Os pró prios criados exclamavam admirados: "É um milagre! O amo a
pedir perdã o! Morre como um santo! Nã o foi em vã o que tanto se rezou por ele!" Falava da
morte com alegria, e fez suas disposiçõ es querendo um enterro pobre, e sepultura no cemitério
da aldeia, que era sagrado. E morreu, exclamando: "Eis o caminho do céu! como é belo!"
Confessar-me-ei com mais cuidado.
— II —
Desejos do Sagrado Coração
Amamos aos nossos pais como a nó s mesmos: queríamos que todos dissessem como
nó s, que nã o os há mais nobres, nem mais virtuosos, nem mais ilustres, nem melhores;
revolta-nos uma injú ria feita a eles. — Oh! Como estes sentimentos eram ardentes,
justos, no Coraçã o de Jesus! Nada mais quer do que a gló ria do seu Pai; o zelo de sua
honra devora-o, tem fome e sede de o fazer amar... Oh! ajudemos Jesus, falemos daquele
Deus de bondade, dirijam-se nossas açõ es para Deus, façamos recitar algumas vezes as
criancinhas alguns atos de amor de Deus.
“Hoje farei todas as minhas oraçõ es para que Deus seja conhecido e amado".
EXEMPLO
O relató rio do Apostolado da Oraçã o, apresentado no Congresso Eucarístico de Liège em 1883,
consigna o seguinte fato, referido por um dos zeladores: "Havia nessa cidade um homem que
desde muito nã o ia à Missa nem procurava os sacramentos; dera-se à embriaguez, blasfemava;
em suma, tinha uma péssima conduta. Em casa, eram contínuas as rixas com a família. A mulher,
encontrando-se um dia comigo fez-me chorosas queixas e eu, consolando-a como pude, acon-
selhei que com os filhos recitasse todos os dias um "Pai Nosso" e uma "Ave Maria" em honra do
Coraçã o de Jesus; e ela o prometeu. Tempos depois, uma zeladora da Liga fala ao marido
transviado para que se aliste no Apostolado, e ele anui, recebe o escapulá rio e obriga-se a recitar
as oraçõ es. Desde logo opera-se nele mudança total: começou a ir à Missa e, cada vez que lhe vai
escapar uma blasfêmia, refreia-se humilhado. Indo uma vez significar-lhe o meu prazer pela boa
transformaçã o, vi a seu lado um livre pensador que, oferecendo até dinheiro, procurava
persuadi-lo a deixar os filhos na escola municipal onde se nã o dava o ensino religioso. Em
oposiçã o, eu mostrei-lhe o que há de precá rio e falso nos gozos deste mundo e que só é feliz
quem serve a Deus. Ele me ouviu com atençã o, e mostrou-se resolutamente de acordo, o livre
pensador retirou-se desconcertado e nã o voltou. Encontrando, mais tarde, o convertido,
perguntei-lhe se era fiel ao seu compromisso com o Sagrado Coraçã o, e respondeu: "Sim, e me
sinto feliz; falta-me, porém, uma coisa; é fazer uma boa confissã o e comungar". Ajudei-o a
preparar-se, e fez com todo o recolhimento a sua Comunhã o pascoal. Esse homem hoje é um
modelo: colocou os filhos numa escola cató lica, leva a filha a comungar em cada lª sexta-feira do
mês, e, à força de exortaçõ es e conselhos, reconduziu também à vida cristã um de seus cunhados.
É ocioso dizer que a paz voltou a essa casa, e que toda a família vive tranquila e feliz, depois de
tal conversã o, operada toda pelo Coraçã o de Jesus, que mais uma vez realizou a sua promessa:
“Os pecadores se converterã o por esta devoçã o; eu estabelecerei a paz nas famílias”.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 21
exemplos, pelas palavras e, sobretudo, pelas oraçõ es".— Se salvarmos uma alma,
teremos salva a nossa.
"Ouvirei uma missa pela conversã o dos pecadores".
EXEMPLO
Havia em Forte de França, na Martinica, e era ali muito conhecido, um homem abastado que
nunca recebera o ensino religioso, e, tendo.se casado com uma boa senhora, porém tíbia e
tímida, contentava-se de ser probo. Aos sessenta anos de idade, em 1880, atacou-o uma fraqueza
geral, que aumentava dia a dia, inquietando a família que pensou em lembrar-lhe que se devia
aproximar de Deus. O doente, porém, respondia, a galhofar, que se havia de arranjar bem com
Deus, quando o visse face a face. Progredia, entretanto, a moléstia e mais se afligiam, cada dia, os
parentes, mormente considerando que nem a sua primeira Comunhã o ele fizera; conseguira, tã o
somente, um deles, que deixasse coser ao seu travesseiro um escapulá rio do Sagrado Coraçã o, e
a este recomendava todos os dias o doente. Apó s seis meses de sofrimento, perdeu um dos olhos,
redobram entã o as oraçõ es ao Sagrado Coraçã o, e um dia o rebelde pediu que lhe trouxessem
um Padre e, depois de vá rias visitas deste e longas conferências decidiu-se a confessar-se,
fazendo-o com boas disposiçõ es, mas sem querer ainda a Comunhã o, por lhe parecer
desnecessá ria. Passado um mês, trouxeram-lhe uma imagem do Sagrado Coraçã o, que foi
colocada em seu quarto. No dia imediato, veio-lhe um escarro de sangue, e, assustado, pediu a
Comunhã o. O sacerdote marcou-a para alguns dias depois, e durante esse tempo vinha exortá -lo,
de modo que fez uma excelente preparaçã o, e no ato mostrou uma fé e humildade
verdadeiramente edificantes. Viveu ainda três meses, mas suportando com a maior resignaçã o
os seus cruéis sofrimentos e, se acaso lhe escapava algum movimento de impaciência, logo o
corrigia com invocaçã o piedosa, ou beijando o Crucifixo. Comungou ainda outras vezes, sentindo
pelo seu estado de fraqueza nã o poder ajoelhar-se para receber o seu Deus com toda reverência;
e teve morte serena e consoladora. Tudo isto foi publicado em 1881, em honra do Coraçã o de
Jesus, por testemunhas dos fatos relatados.
consumaçã o dos séculos. É um artigo de fé, o temor a esse respeito seria uma falta.
Mas se a Igreja nã o pode perecer, pode sofrer, e sofre... Sofre na pessoa de seu “chefe”, o
Papa, cuja autoridade é desconhecida; sofre em seus "membros", os fiéis perseguidos;
em seus "mandamentos" desprezados... Oh! como Jesus me alegraria de vos ver algumas
vezes de joelhos, diante do SS. Sacramento, pedindo-lhe a paz da Igreja e impondo-vos,
nessa intençã o, algumas pequenas privaçõ es".
"Pedirei, com mais fervor, em minhas oraçõ es, o triunfo completo da Igreja".
EXEMPLO
O Pe. Romano Hinderer, alsaciano, que recebeu o batismo em 1668, o ano em que se erigiu em
Coutances, Normandia, a primeira igreja pú blica dedicada ao Coraçã o de Jesus, foi como escreve
um seu discípulo, senã o o primeiro, ao menos o mais feliz propagador desta devoçã o na China.
Enviado para a província de Tchékiang, dentro em pouco erigiu na capital (Hangtcheou) o
primeiro templo que a China possuiu sob a referida invocaçã o, e nã o tardou a ser testemunha de
uma proteçã o miraculosa obtida por ela: um incêndio voraz se ateara numa aldeia pró xima, e
devorara quarteirõ es inteiros. Os habitantes, infiéis na maior parte, corriam à s ruas
desorientados, clamando por seus ídolos: entre eles havia um cristã o muito pobre, cuja casa se
achava entre as dos infiéis, e ele pede a Deus que se compadeça de sua miséria. O incêndio
prossegue e arde já a casa vizinha à do cristã o; mas, de repente, as chamas passam sobre ela,
respeitando-a, e vã o queimar as dos outros, reduzindo-as a cinza. Um grande nú mero de pagã os
converteu-se logo diante do prodígio. Sucederam-se outros; na aldeia de Kin-kin-kias, estavam
reunidos os neó fitos e oravam sob um desses alpendres que sã o o orató rio dos camponeses
chins, quando apareceu no céu sobre o teto de colmo, uma cruz luminosa, cercada de uma
auréola de nuvens brilhantes, que deixava em torno um campo azul semeado de estrelas. Ao
clarã o, que parecia o de um incêndio, acudiram os pagã os: a cruz pairou, durante um quarto de
hora, em seu nimbo de fogo, e depois desapareceu, deixando infiéis e cristã os maravilhados. Em
1722, no dia 24 do mês consagrado ao Coraçã o de Jesus, sobre a sua igreja em Hangtcheou,
desenhou-se novamente no céu a cruz luminosa, futurando pelo tempo de meia hora; o povo
todo a viu, e se fizeram desenhos dela, que foram gravados e distribuídos no Império chinês e na
Europa. Pela invocaçã o do Sagrado Coraçã o, obteve o Pe. Romano a graça de curas miraculosas, e
escapou incó lume a vá rias perseguiçõ es que a Igreja sofreu na China, durante os 37 anos em que
aí missionou; e ao morrer, em seus 77 anos de idade, tendo arrancado ao paganismo mais de
cem mil almas a quem ensinava tã o santa devoçã o, dizia ele ainda cheio de confiança: "É pela
devoçã o ao Coraçã o de Jesus que a missã o na China nã o se conservará , mas há de se elevar
muito".
— III —
Os espinhos do Coração de Jesus
VIGÉSIMO DIA
Oremos pelas almas que resistem à graça. Pai Nosso, Ave Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o
de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
O 1º espinho do Coração de Jesus são as
almas que, voluntariamente, permanecem
em estado de pecado mortal
A alma inocente é morada de Deus, e pela sagrada Comunhã o torna-se a habitaçã o
particular de Jesus Cristo... aí Jesus Cristo está "em casa", e encontra suas delícias; aí
quer ficar... Ora cometer um pecado mortal, conservá -lo voluntariamente, é admitir o
Mês do Sagrado Coração de Jesus 25
demô nio dentro d'alma, constituí-lo Senhor no lugar de Jesus que sai entã o expulso,
ignominiosamente...
Pobre Jesus! Fica ele entã o à porta da alma pecadora; bate a essa porta que lhe cerraram,
pede para entrar e ouve um espantoso grito dos Judeus: "Nã o! nã o! nã o é a vó s que eu
quero, mas ao meu pecado!" — Oh! se vos julgais em estado de pecado mortal, ide, ide já
confessar-vos.
“Uma oraçã o pelos pecadores".
EXEMPLO
A piedade, como diz a Sagrada Escritura, é ú til a tudo. Isto se vê até no êxito admirá vel de tantas
pequenas indú strias que o amor de Deus sugere aos seus servos para fazerem o bem e lhe
ganharem as almas. Em 1891, na escola cató lica da Ilha de Tine, do arquipélago grego, foi
colocado sob a imagem de Nosso Senhor um coraçã o "cheio de espinhos", tendo o direito de cada
tarde, no mês de junho, tirar desse coraçã o um espinho o aluno que houvesse procedido melhor;
tal foi a porfia entre eles por uma conduta exemplar que tornou um espetá culo de edificaçã o à
escola, podendo dizer-se que o Sagrado Coraçã o era aí, todo o dia, coberto das mais belas flores
d'alma por aquela piedosa turba infantil.
O colégio congreganista de Negapatan, no Indostã o, em 1869, instituía a prá tica seguinte: no
começo do mês, cada aluno traçava numa folha de papel tantas linhas perpendiculares quantos
os dias do mês e à margem de uma série de linhas horizontais, registrava as espécies de boas
obras que se poderiam aplicar, escrevendo no fim de cada dia, na coluna e lugar corres-
pondentes, o nú mero dos atos de virtude que praticara. Ao fim de um mês, entregavam-se todas
as listas ao Diretor do Apostolado da Oraçã o, sem nenhuma indicaçã o nominal, para que só de
Deus fosse conhecido o esforço e mérito de cada um; e o Diretor, somando o resultado em
relaçã o a cada espécie de boas obras, na conferência mensal publicava o balanço do "Tesouro do
Coraçã o de Jesus".
O Pe. Eraud, noticiando o fato, considera-o a causa principal dos progressos que na instruçã o e
na vida cristã fazem os alunos dos estabelecimentos, alguns dos quais ainda recentemente se
haviam distinguido em difíceis provas a que se submeteram na universidade de Madras.
passado, ao partir eu para o novo posto que me fora designado, informavam-me que me teria de
haver com meninos indó ceis e sem nenhuma piedade, filhos de gente descuidada de seus
deveres religiosos e pouco zelosa dos bons costumes. Parti um tanto impressionada, porém
cheia de confiança em Deus; e, logo ao chegar, pus mã os à obra. Comecei por uma fervorosa
novena ao Coraçã o de Jesus; manifestei-lhe meus receios e minhas esperanças, e procurei depois
ganhar, pouco a pouco, o coraçã o dos meus novos discípulos. Alistei-os no Apostolado da Oraçã o,
instando a recitarem todos os dias, ao despertar, a pequena fó rmula: "Divino Coraçã o de Jesus,
eu vos ofereço o meu dia, pelo Coraçã o Imaculado de Maria, em todas as vossas intençõ es". No
começo da aula, recitá vamos em comum a dezena do Terço. Até aí tudo ia bem e os meninos se
mostravam muito dó ceis. Por fim, um dia lhes disse: "Meus amiguinhos, nã o é bastante o recitar
todas as manhã s a vossa curta oraçã o e a dezena da Terço; é preciso comungar todas as
primeiras sextas-feiras do mês em honra ao Sagrado Coraçã o. Assim é que estareis com-
pletamente no Apostolado da Oraçã o". A tal proposta, houve espanto e desassossego entre os
pequenos; nã o tinham o costume de comungar tantas vezes: desde a Pá scoa (sete meses
passados), nã o se tinham confessado! Todavia, passada a surpresa, consentiram e, em dezembro,
inaugurá vamos as nossas "Comunhõ es mensais". Entre os alunos, um, de 10 a 11 anos, resistia a
princípio, e dizia: "Eu nã o quero me confessar hoje, eu nã o tenho pecados". "Pois bem, lhe
respondia eu, rindo; confessará s as tuas virtudes, vem sempre conosco à Igreja". Na volta, ele
dizia aos companheiros: "Era o demô nio que me fazia gritar que nã o tinha pecados; estou bem
contente de minha confissã o". A dificuldade estava assim vencida, e no mês seguinte os alunos,
por si pró prios, apresentavam-se para. a Comunhã o. Em fevereiro caíra a neve e fazia muito frio;
quis dispensá -los, porque a igreja ficava a 5 quilô metros, mas acudiam todos: “Nã o cai mais neve,
e a gente que tem passado já abriu o caminho; nó s queremos comungar hoje em honra do
Sagrado Coraçã o”. Um deles percorreu a pé, em jejum, 10 quilô metros, e, de volta a casa, ainda
nã o quis comer imediatamente, dizendo: "Eu quero ter ainda por algum tempo só a Jesus em
meu coraçã o". Outro que teve de deixar a escola e de empregar.se para ganhar, nã o podendo
fazer a Comunhã o na 1ª sexta-feira, veio muito pesaroso dizer-mo, e, propondo-lhe eu que a
fizesse, ele só , no 1º domingo do mês, aceitou-o com alegria, e tem perseverado. Com isto, os
meninos, que à minha chegada eram revessos e turbulentos, se tornaram, pouco a pouco,
obedientes e piedosos; e os pais experimentaram também a boa influência da mudança,
melhorando os costumes em toda a aldeia, sobretudo no tocante à religiã o. Enfim, eu mesma que
viera cheia de apreensõ es, hoje estou contente, e rendo graças ao Sacratíssimo Coraçã o de Jesus.
consagrar aquelas regiõ es ao Coraçã o de Jesus e em sua honra disse uma novena de Missas.
Tínhamos ali só uma Capelinha e 8 a 9 famílias cristã s. Precisá vamos de um terreno e, perto da
capela, havia um, em que estava o pagode chinês, e que pertencia a Balekichnen, chefe da aldeia.
Convindo-nos possuí-lo para nos livrarmos da má vizinhança, e precisando o proprietá rio
vendê-lo para pagar dívidas, contratamos a compra, sob a condiçã o de ser demolido antes o
templo chinês. Os pagã os se enfureceram com a notícia e procuraram por todas as formas
tolher-nos a aquisiçã o. O proprietá rio, porém, atormentado pelo credor, vinha a miú do, pedir o
dinheiro, respondendo-lhe nó s, invariavelmente: "Derrubai o pagode, e o tereis". Conservando-
se as coisas neste pé, longo tempo, recorri ao Sagrado Coraçã o, a quem consagrara a aldeia, e
prometi erigir-lhe um templo no pró prio local do pagode, se a resistência cessasse. Poucos dias
depois, Balekichnen veio .comunicar-nos que estava a demolir o pagode, e por nossos pró prios
olhos o verificamos, rendendo graças ao céu. Dentro de poucos anos, tinha eu batizado ali cerca
de sete mil pagã os.
Oremos para que o Coraçã o de Jesus nos inspire gosto pela Comunhã o frequente. Pai Nosso, Ave
Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada
dia mais”.
O 6º espinho do Coração de Jesus são as almas que se afastam voluntariamente da
Sagrada Comunhão
Afastar-se voluntariamente da Sagrada Comunhã o, quando ela nos é permitida, é dizer a
Jesus Cristo: “Nã o quero estar convosco”. Nã o se pô r em estado de comungar
frequentemente, ao menos todos os oito dias, é dizer a Jesus Cristo: “Nã o me quero inco-
modar”. É , com efeito, para nã o se incomodarem que estas pessoas nã o comungam todos
os oito dias. Certamente nã o vos pertence regular as vossas Comunhõ es, mas pertence-
vos o preparar-vos para elas; cortai pelos sentimentos de vaidade, pelas amizades
excessivas, pelas maledicências, pelas perdas de tempo... vereis como se vos despertará
o gosto pela sagrada Comunhã o e como voluntariamente o vosso confessor vo-la per-
mitirá .
"Vou, desde já , preparar-me para comungar no pró ximo domingo”.
EXEMPLO
Uma zeladora do Apostolado comunicou ao "Mensageiro do Coraçã o de Jesus" o seguinte,
ocorrido em 1883:
"Uma de minhas antigas discípulas adoeceu gravemente e, a despeito das reiteradas preces e
promessas piorava e chegou a perigo extremo. Ao visitá-la nestas circunstâ ncias me disse: "A
Santíssima Virgem nã o me quer curar". — Nã o desanimeis, respondi, ela quer porventura que
invoqueis o seu Divino Filho; recorri ao Sagrado Coraçã o, prometendo-lhe três coisas : —1º
consagrar-lhe-eis toda a vossa casa; — 2º colocareis sua imagem ali em lugar de honra; — 3º
quando estiverdes curada, fareis nove Comunhõ es sucessivas de 1ª sexta-feira do mês. Desde
hoje começaremos uma novena ao Sagrado Coraçã o; uni vossas oraçõ es à s nossas, e do fundo
d'alma dizei a Jesus: "Jesus, outrora vó s curá veis na Judeia todos os enfermos que a vó s
recorriam; curai-me para gló ria do vosso Divino Coraçã o". Ela prometeu tudo. Pela minha parte,
eu comecei a orar com fervor, e fiz a oferenda de um sacrifício pessoal. A noite foi medonha para
a pobre enferma: crises repetidas e delíquios assustadores. Todavia, na manhã seguinte pô de
comungar; mas o dia foi todo de extremas dores. Eu a animei a confiar, mesmo quando se
sentisse agonizante; e redobrei de instâ ncias e de sú plicas ao Coraçã o de Jesus. Qual nã o foi a
minha alegria, quando, no dia seguinte, 16 de agosto, li este bilhete: "A moribunda renasce; a
noite foi muito calma; seu estô mago, que se recusava absolutamente a qualquer bebida, suporta-
a sem fadiga. A enferma sente-se voltar à vida". Em menos de oito dias, e antes do fim da novena,
achava-se ela já em plena convalescença, e antes mesmo de haver decorrido um mês tornava de
novo à s ocupaçõ es de antes e se dispunha a cumprir suas promessas. Dois magníficos quadros
ornam hoje o salã o de sua morada: um representa o Divino Coraçã o de Jesus, e outro, o
Imaculado Coraçã o de Maria, e todos os meses ela renova a esses Coraçõ es a consagraçã o de sua
pessoa e da família inteira .Quanto à novena de Comunhõ es mensais de 1ª sexta-feira, ela
começou-a, mas um dia viu-se forçada a interrompê-la. — "Que fareis ?" lhe perguntei eu.
Respondeu.me : “Vou recomeçar e, se ainda for obrigada a interrompê-la recomeçarei sempre
até cumprir a promessa. Os negó cios de minha casa de comércio me embaraçam muito nesse dia,
mas, custe o que custar, cumprirei o que prometi. Nisso tenho até muito prazer; nã o compreendo
mais, presentemente, como podia passar meses sem me aproximar da Santa Mesa. A Comunhã o
mensal é uma necessidade para a minha alma”.
e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada dia mais”.
Entre os consoladores do Coração de Jesus acham-se primeiramente os zelosos
Ministros de Deus e os santos Religiosos e Religiosas
É o exército visível de Jesus, sã o os seus Anjos sobre a terra.
O fim deles é a gló ria de Deus — a honra e gló ria de Maria, — a salvaçã o das almas, — o
triunfo da Igreja, — numa palavra, todos os interesses de Jesus Cristo. — Cada manhã ,
recebem as ordens do seu Deus e Senhor; cada noite dã o conta do seu dia... Oh! Pedi a
Jesus que este exército se aumente cada vez mais; oferecei-vos, algumas vezes, para que,
também vó s, sejais alistados no serviço de tã o bom Senhor. — Oh! Se soubésseis como
ali se está bem! Como se vive feliz! Como se morre cheio de confiança!
"Ora hoje pelos Padres e Religiosos; e lê alguma cousa sobre a vocaçã o".
EXEMPLO
No ano de 1884, um seminarista de uma diocese da Á ustria dirigia-se ao ó rgã o da Liga do
Apostolado, para fazer pú blica a sua açã o de graças por três mercês alcançadas do Sagrado
Coraçã o:
1ª — No meio de seus estudos teoló gicos foi atingido pela lei militar e logo considerado vá lido
para o serviço ativo. Com essa perspectiva de três anos de vida de quartel, recorre ao Coraçã o de
Jesus, e confia-lhe sua pessoa e sua vocaçã o. Alguns meses mais tarde, realiza-se a segunda
inspeçã o, cuja sentença é definitiva. Qual nã o foi entã o a sua alegria, ao ouvir essa decisã o:
Inapto para o serviço militar!
2ª — Uma demasiada aplicaçã o aos estudos lhe abalou a saú de, ao ponto de que o médico lhe
mandou interrompê-los, durante alguns anos talvez. Cheio de confiança na promessa do Divino
Mestre, invocou o seu Coraçã o compassivo e, contra as previsõ es humanas, recobra em pouco
tempo todas as suas forças.
3ª — Uma terceira provaçã o lhe sobrevém: sua família empobrece e nã o pode mais pagar a sua
pensã o; ele pede aos superiores um abatimento, ou, ao menos uma espera, que a princípio nã o
lhe é concedida. Nã o desanima, e redobra de oraçõ es, invocando o Sagrado Coraçã o com inteiro
abandono à sua providência paternal. Sua confiança perseverante nã o é frustrada: algum tempo
depois, sem nova diligência de sua parte, lhe anunciam que terá de pagar só uma pequena parte
da pensã o.
Nã o sabendo exprimir quanto se sente agradecido, o jovem espera o momento em que, revestido
do sacerdó cio, o possa mostrar, dedicando-se a servir e glorificar o Santíssimo Coraçã o de Jesus.
caridade, suportando os defeitos dos outros, muitas vezes o desdém, dedicando-se por
todos... e que, no fim de cada dia, sem mesmo terem consciência do seu mérito, oferecem
a Deus um coraçã o imolado e puro, que consola o Coraçã o de Jesus...
"Aplicar-me-ei, hoje, em falar pouco e em praticar ocultamente algumas açõ es boas".
EXEMPLO
O "Estandarte", jornal canadense de Montreal, em 1981 publicava: "O comandante da "Naiade", o
Sr. Almirante de Cuverville, passou muitos dias em Montreal, onde deixou a mais favorá vel
impressã o entre todos os que tiveram a honra de o conhecer. Cató lico fervoroso, ele fez
empenho em visitar os nossos estabelecimentos religiosos e, em vá rias casas, dirigiu a palavra à
comunidade. Terça-feira o Sr. Arcebispo o conduzia ao Grande Seminá rio para lhe apresentar
seu clero, que se achava em retiro: a recepçã o fez-se no salã o do colégio, e o ilustre marinheiro
pronunciou um discurso vibrante de patriotismo e amor à Igreja. A pedido do Prelado, o Snr.
Almirante referiu a histó ria da pacificaçã o do Pe. Dorgére; depois, terminou dizendo: "Quero
fazer-vos uma confidência: A devoçã o que me é cara sobre todas é a devoçã o do Sagrado Coraçã o
de Jesus; devo-lhe todos os triunfos de minha carreira. Uma imagem do Sagrado Coraçã o está
fixada na proa da "Naiade". Outra está em meu camarote, constantemente sob as minhas vistas.
Toda sexta-feira, o capelã o diz a Missa em minha câ mara. Eu tenho um jornal fiel de tudo o que
me sucede, e Já verifiquei que muitos acontecimentos, dos mais felizes, se deram na sexta-feira,
dia do Sagrado Coraçã o. Esse jornal eu envio regularmente a Montmartre, e foi também neste
santuá rio do Sagrado Coraçã o que fiz depositar, como "ex-voto', a riquíssima alabarda que foi
levada em triunfo através do Dahomey em sinal do restabelecimento da paz e da proteçã o
concedida pela França".
a pregaçã o dos ministros protestantes e a dos sacerdotes cató licos, a princípio vacilara, e dizia
pesaroso: "Vó s, europeus, estais nas fontes da verdade, devereis ser zelosos de conservá -la pura
e ardentes em propagá -la; mas vindes a nó s, semelhantes a colunas de nuvem do deserto, ora
dando a luz ora fazendo escuridã o; isto nos confunde". Inteligente, porém. sincero e refletido,
comparou bem as duas doutrinas, e um dia, tomando as vestes das ocasiõ es solenes, e
empunhando o bastã o hereditá rio, declarou : "Chefes do séquito de Mataafa, e vó s membros de
sua família e seus guerreiros, desde algum tempo eu abri minha alma ao sacerdote ; é chegado o
momento de manifestar-me diante de todos: Mataafa quer ser, e em breve será cató lico". E con-
vertido, ei-lo já feito um campeã o cató lico, e a rebater os ataques dos protestantes contra o culto
das imagens, dizendo-lhes na interessante linguagem dos cultos de seu país: "As imagens estã o
por toda a parte. Os nossos coqueiros balançam nas ondas a imagem dos seus grandes leques ; o
sol passeia, na flutuante superfície dos mares, a imagem de sua coroa de fogo. A natureza inteira
nã o é a imagem do grande actua (Espírito) que a criou? Os livros sã o a imagem da palavra, que é
a imagem do pensamento. A Bíblia, que vó s colocais acima de tudo, o que é senã o a imagem da
palavra, do pensamento de Deus? Deixai pois, de censurar aos cató licos que nos dã o, com as
imagens, o meio de conceber os mistérios de sua fé".
A vida de Mataafa e a de seus filhos atesta um escritor que historiou a propagaçã o do Evangelho
em Samoa, é a de verdadeiros chefes cristã os, servido a Deus sem fraqueza e sem respeito
humano. Mataafa, declarou numa ocasiã o solene o Cardeal Moran, arcebispo de Sidney, traz a
cruz sobre a sua pele bronzeada, e tem sob a cruz o coraçã o de um guerreiro; ele deu provas
disso, repelindo no campo de batalha, com heroísmo cristã o, os invasores de seu país. Por
ocasiã o da consagraçã o das famílias, que se efetuou solenemente em todo o vicariato apostó lico
dos Navegadores, Mataafa, que acabara de vencer o rei vizinho Matosse, fez uma longa estaçã o
na igreja em que se realizava a cerimô nia, e aí efetuou a consagraçã o de sua "pessoa", de sua
"família", e de seu "governo". Ao retirar-se, pediu que se celebrassem três Missas ao Sagrado
Coraçã o pela paz de Samoa.
TRIGÉSIMO DIA
Oremos na intençã o de saber agradecer a Deus as graças que nos há concedido. Pai Nosso, Ave
Maria. Gló ria e a jaculató ria: “Coraçã o de Jesus, que tanto nos amais, fazei que vos amemos cada
dia mais”.
Os consoladores do Sagrado Coração de Jesus somos nós que viemos, durante este
mês, meditar nos seus terníssimos afetos e estudar os seus desejos
Todos estes dias foi Jesus consolado, vendo que fomos constantes, que todas as manhã s
o procurá vamos fervorosos; mas, ainda quer de nó s alguma coisa. O mês consagrado ao
seu Coraçã o termina hoje; quantas almas devotas porã o de parte as suas prá ticas, as
suas costumadas oraçõ es e esquecerã o a consolaçã o que experimentam!... Jesus pede
que nã o nos esqueçamos do seu Sagrado Coraçã o, e quer que esta manhã lho
prometamos.
“Farei um ato de consagraçã o ao Coraçã o de Jesus”.
EXEMPLO
Lê-se no livro — O Sagrado Coraçã o de Jesus, — do Pe. Jú lio Chevalier, editado em 1886: "Miguel
dos Santos, Religioso Trinitá rio, desde a sua infâ ncia, dera-se tã o perfeitamente a Deus, que este
era tudo para ele, e ele era todo de seu muito Amado. Mas, como o amor nunca diz "basta " —
parecia-lhe que ele nã o amava bem a seu Deus, e todos os seus desejos eram amá-lo cada vez
mais. Um dia, fazendo oraçã o nesta habitual disposiçã o de espírito pouco satisfeito da medida do
seu amor a Deus, pediu a Nosso Senhor Jesus Cristo que lhe mudasse o coraçã o e lhe desse outro
"mais tenro e mais sensível" aos atrativos do amor divino. Esta sú plica amorosa foi tã o agradá vel
Mês do Sagrado Coração de Jesus 34
DIA 1
O amor ao Sagrado Coraçã o, pode dizer-se, nasceu com a Igreja, e quem primeiro o
praticou e ensinou, entre os homens, foi S. Joã o Evangelista. Por isso, com razã o chamou-
o Sta. Gertrudes "o porteiro do Coraçã o de Jesus". Na verdade, para lhe assegurar esse
título, basta o seguinte: na ú ltima Ceia pascal, era ele quem reclinava a cabeça no seio do
Divino Mestre, e das mã os deste veio à s suas antes de passar à s dos outros, o cá lice
eucarístico; a ele coube no Gó lgota receber o legado inefá vel que o Salvador fez de sua
divina Mã e, que foi como que o do pró prio Coraçã o; e, na hora em que, morto Jesus, o
soldado Longuinho rasgou-lhe com a lança o Lado Sacratíssimo fazendo correr dela a
á gua e o sangue que representavam os mananciais dos sacramentos da Igreja, foi ainda o
discípulo predileto quem o presenciou para atestá -lo. De sua pena inspirada saiu o mais
profundo e sublime dos Evangelhos, esse em que a um tempo se entrevê a Jesus em suas
grandezas inescrutá veis do Verbo Eterno e se o acompanha nas mais íntimas e mais
admirá veis manifestaçõ es de Deus Humanado: e além desse Evangelho, que S. Jerô nimo
disse proceder da uniã o do coraçã o do homem com o Coraçã o de Deus, e no qual é histo-
riado o amoroso advento do Salvador, traçou também S. Joã o o livro das visõ es de
Patmos que anuncia a vinda final e triunfante do Juiz dos vivos e dos mortos a coroar de
eterna gló ria aqueles que o seguiram. Poderia o Mestre Divino distinguir e favorecer
melhor o Apó stolo amado? E o influxo de tã o preciosas bênçã os se fez sentir poderoso. A
perseguiçã o dos Césares ao nome cristã o atingiu o santo Apó stolo, mergulhando-o numa
caldeira de ó leo a ferver; e ele saiu ileso, e como que refrigerado e fortalecido,
confessando intrépido a fé que professava. As chamas de zelo e de bondade que trans-
bordavam do Coraçã o do Mestre comunicaram-se ao coraçã o do Discípulo, e foram nele
um contínuo e fervoroso cuidar da salvaçã o das almas, que até a cruéis chefes de
bandidos, com instruçõ es, sú plicas e lá grimas, convertia em mansas ovelhas de Jesus; e,
chegando à avançada idade em que para ir ao templo o carregavam nos braços, quando
já nã o tinha forças para proferir discursos, contentava-se de clamar, repetidas vezes, em
ardentes transportes de caridade : "Filhinhos, amai-vos uns aos outros".
DIA 2
S. Francisco de Assis, o cavaleiro elegante que mesmo nos folguedos de sua mocidade
nunca se maculou e teve sempre sua bolsa desatada para o socorro dos pobres, depois
que de todo se converteu, nã o foi simplesmente, como ele anunciava aos bandidos que o
assaltaram na estrada, "o arauto do Grande Rei", nem tã o somente o amoroso trovador
que convidava toda a natureza a acompanhá -lo em seus hinos ao Criador; ele foi uma
có pia viva do Coraçã o de Jesus. "Num dia de Sã o Francisco refere Sta. Margarida Maria
— Nosso Senhor me fez ver este grande Santo revestido de uma luz e esplendor
incompreensíveis, elevado a um grau eminente de gló ria acima dos outros Santos, por
causa da conformidade que teve com a vida de sofrimento do Nosso Divino Salvador e o
amor que dedicara à sua santa Paixã o, pelo qual se levará a imprimir nele suas santas
chagas: isso o fizera um dos maiores favoritos do Sagrado Coraçã o, que lhe deu grande
poder para alcançar a aplicaçã o eficaz do seu precioso Sangue, constituindo-o como que
Mês do Sagrado Coração de Jesus 37
um distribuidor desse tesouro para apaziguar a divina justiça... Ele é como que uma
imagem sua, unida à de seu Filho crucificado... Em seu favor, o rigor da justiça abranda e
cede lugar a clemência da misericó rdia, particularmente em socorro dos Religiosos que
declinaram da sua regularidade. Depois de me ter feito ver estas coisas, o Divino Esposo
de minha alma deu-mo por condutor, para me guiar nas penas de sofrimentos que me
sobrevieram". Eis porque o Será fico Patriarca é tã o glorificado: por seus traços de
semelhança com o Salvador. Fr. Bartolomeu de Pisa escreveu um precioso livro sobre as
"Conformidades da vida do bem-aventurado Francisco com a de Jesus Cristo". Os
escritores ascéticos, todos eles as têm assinalado, e muitas delas sã o notó rias e como
que palpá veis. Jesus nasceu à meia-noite sobre as palhas de um está bulo, e Francisco
também veio ao mundo num está bulo onde sua mã e, prolongando-se-lhe as dores do
parto, recolheu-se a conselho de misterioso peregrino para dar a luz. Jesus renuncia ao
lar para sair à pregaçã o, podendo dizer nesses dias que nã o tem onde recline a cabeça:
Francisco abraça, pelo Evangelho, a mais austera pobreza e a vai pregar, descalço, de
grosseira tú nica e rude cordã o à cinta, esmolando o sustento. Como Jesus, ele cerca-se de
doze discípulos, dos quais um o trai e se enforca. Como Jesus. Francisco passa quarenta
dias num ermo sem se alimentar e ambos pregam de uma barca que de si pró pria se
afasta da costa e fica imó vel. Uma vez, falando sobre sua Paixã o, como Pedro soltasse
exclamaçã o a conjurá -la, o Cristo repreendeu-o severo como a um tentador; também
Francisco, um dia, torturado de dores, porque um de seus irmã os estranhasse nã o lhe
diminuir Deus o sofrimento, ele atirou-se do leito ao chã o para que mais doesse o corpo
e advertiu o companheiro que nã o fosse blasfemo. A semelhança entre os dois foi tal, que
até a incrédulos e ímpios, como Renan, impressionou e se fez sentir e notar; porém o que
mais os assemelhou e uniu foi a visã o inefá vel do Alverne, em que as chagas de Cristo, os
cravos que lhe transpassaram a Carne sacratíssima e o golpe da lança que lhe abriu o
Lado, como que passaram realmente para o corpo do santo Patriarca, e ele se
transfigurou num crucifixo vivo e ambulante, vivendo já , por assim dizer, e padecendo
em Francisco o pró prio Cristo, segundo a frase de S. Paulo.
DIA 3
"Vim trazer fogo à terra, e que hei de querer senã o que lavre?" Estas palavras, que se
leem no Evangelho, significam o fim para que o Filho de Deus se encarnou e o desejo que
arde em seu Coraçã o de que o fogo do amor divino e do zelo da salvaçã o das almas
inflame todo o mundo. Assim também as entendeu, tomando-se por luz e norma de sua
vida Santa Teresa de Jesus, a quem, pela beleza e sublimidade de seus escritos, na Igreja
e no século se chama "a Doutora da vida mística". Numa revelaçã o deste sentir e da sua
futura vocaçã o. Teresa de Á vila, aos sete anos de idade, acompanhada de um irmã o de
onze anos, saiu furtivamente de casa, e a passos apressados caminhou para fora da
cidade; na estrada encontraram um tio que, surpreendido de vê-los sozinhos tã o longe
de sua morada, perguntou-lhes aonde iam, e a menina respondeu com toda a candura
que iam para a Á frica, a pregar aos mouros o Evangelho.
Reconduzidos chorosos ao lar, pensaram os dois em se fazerem monges e construir uma
ermida no mais retirado canto de seu jardim, para o que foram conduzindo e assentando
pedras, que, por um instante em equilíbrio, logo vinham abaixo, com grande pesar dos
pequenos operá rios que desanimaram de acabar a obra. Teresa, porém, nã o desistiu do
seu intento de servir a Deus num claustro, e, na flor da mocidade, renunciando à s
grandezas e aos prazeres do mundo que sua condiçã o e riqueza lhe ofereciam atraentes,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 38
professou num convento de Carmelitas. Depois de uma luta dolorosa de longos anos com
as saudades da família e o terror de nã o corresponder a vocaçã o, Teresa um dia, apó s a
Comunhã o, teve de Deus o mandato de restabelecer em sua Ordem a primitiva
observâ ncia da Regra, e já nã o houve obstá culos e sacrifícios que a intimidassem no
levar a cabo essa missã o; o seu pensamento, a sua ambiçã o foi só , desde logo, contentar
plenamente o Coraçã o de Jesus, trabalhar e sofrer por sua gló ria, amá -lo, mais e mais,
por aqueles que o esquecem, expiar, a cada instante, pelos que o ofendem. As notícias
dos sacrilégios que em países vizinhos cometiam os huguenotes ou da corrupçã o de
costumes em que longe viviam povos inteiros do Novo Mundo, a faziam recolher-se em
pranto e entregar-se, por longo tempo, à oraçã o, implorando a graça de se converterem
todos eles, oferecendo-se fervorosa para "sofrer ou morrer" pela gló ria de Deus e
salvaçã o das almas. Nas grandes tribulaçõ es que a afligiam, o Salvador veio muitas vezes
animá -la, mostrando-lhe suas chagas ou a caminhar carregando a cruz; tinha também,
frequentemente, a visã o de um anjo que trazia nas mã os um dardo de ouro com ponta de
ferro e na sua extremidade uma chama, e que ele cravava através do seu coraçã o,
causando-lhe um misto de dor e delícia. Jesus assim a assemelhava consigo, e como que
lhe dilatava o coraçã o para mais amar e sofrer; e um dia, para a confortar na luta, lhe
disse : "Espera um pouco, filha, e verá s grandes coisas". Viu-se depois o que era: Teresa
fundou 32 mosteiros, que foram uma visível florescência de virtude e santificaçã o que se
estendeu pelo mundo. Ao termo dessa abençoada tarefa, a Santa expirou num doce
êxtase, e viu-se entã o uma pomba que parecia sair-lhe dos lá bios entreabertos a voar
para o céu. Conservava-se ainda no mosteiro das Carmelitas da Alba de Tormez o seu
corpo, e em separado o coraçã o que mostra a ferida feita pelo anjo, a qual o atravessa
horizontalmente e divide quase por inteiro; esta relíquia exala sempre odor celeste,
como o atesta o Pe. Marcel Bouix, que a tocou em 1849. A Igreja, além da festa pró pria a
15 de outubro, instituiu em 1726 a da Transverberaçã o do Coraçã o de Santa Teresa.
DIA 4
Iniciado por S. Joã o Evangelista, o culto ao Sagrado Coraçã o só muitos séculos depois
teve a sua propaganda formal por especiais revelaçõ es de Nosso Senhor, que declarou
tê-lo reservado para o fim dos tempos como um poderoso meio de reacender a fé e
despertar no mundo o fervor religioso. Como na execuçã o de suas obras as mais
grandiosas, também nesta escolheu Deus para seu instrumento uma fraca e pequena
criatura: a humilde Religiosa Margarida Maria. Era nela tanta a inclinaçã o e gosto pelas
coisas do céu que, desde menina, para a demover de qualquer propó sito, bastava dizer-
lhe que isso ofenderia a Deus; e Deus, por sua vez, recompensava a sua dedicaçã o
precoce, favorecendo-a já com visõ es maravilhosas em que se lhe mostrou a carregar a
cruz, para lhe dar a coragem de sofrer as contrariedades e provaçõ es do lar infortunado.
Houve em sua mocidade momentos em que os prazeres do mundo a atraíram e tentou-a
o pensamento de nã o os deixar; porém nã o tardava a reaçã o, e Margarida como que em
desagravo ocupava-se em instruir a multidõ es de meninos pobres, visitar as famílias
necessitadas e tratar dos enfermos, chegando a beijar chagas, para vencer a natural
repugnâ ncia que sentia ao olhá -las, ato de heroísmo com que mereceu que ao seu
contato elas subitamente sarassem. Um dia, finalmente, cerrando os ouvidos à s sú plicas
de sua mã e, a jovem decidiu abraçar a vida religiosa, e bateu à s portas do convento de
Paray: ia ataviada como para a mais brilhante festa do mundo, e nã o vestia assim por
vaidade, mas pelo contentamento de se ir dedicar ao seu soberano Bem; provava-o,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 39
dizendo, na hora de entrar, a seu irmã o que a acompanhara: "Esteja certo de que nã o
sairei mais daqui". No claustro, a sua piedade e fervor causaram admiraçã o desde os
primeiros dias, e foram sempre crescendo. Quando se achava só trabalhando, lendo ou
escrevendo, fazia-o de joelhos como tomada de respeito diante de um ser invisível.
Assim a surpreendiam as companheiras, comprazendo-se em contemplá -la absorta na
oraçã o, em que passava longas horas, noites inteiras, como arrebatada em êxtase, em
sua cela e no coro, ao ponto de que o povo que frequentava o santuá rio, o percebeu e
vinha observar pelas grades a "Santa" que se elevava aos céus quando orava. Com o
pró prio sangue escreveu um dia esta consagraçã o total de si a Nosso Senhor: "Tudo em
Deus, nada em mim ! Tudo para Deus, e nada para mim! Tudo por Deus, e nada por
mim!" No meio destas tã o vivas provas de fidelidade de sua serva, surpreendeu-a o
Senhor com as inefá veis revelaçõ es sobre o culto ao Sagrado Coraçã o: a primeira vez,
mostrando-lhe a imagem que deveria representá -lo a amar sempre e infinitamente aos
homens, apesar de esquecido e ultrajado por eles; a segunda, imprimindo ao culto a
forma de expiaçã o pelos pecadores, com as Comunhõ es das primeiras sextas- feiras do
mês e a hora de adoraçã o noturna; a terceira, recomendando a instituiçã o de uma festa
universal na Igreja em honra do Sagrado Coraçã o, na sexta-feira imediata à oitava do
Corpo de Deus. Confessando humildemente a Santa quanto era insuficiente para tã o
grande tarefa, Jesus lhes respondeu que supria ao que lhe faltasse, e comunicou-lhe uma
das chamas que abrasavam o seu Coraçã o divino. Sucederam-se entã o graças
extraordiná rias, verdadeiramente prodigiosas, que nã o deixaram dú vida sobre a origem
divina de tais revelaçõ es; vieram logo auxiliar a fervorosa Visitandina santos sacerdotes,
como os Padres Colombiére e Croiset, de quem ela predisse que escreveria um livro
sobre a insigne devoçã o, como em breve sucedeu. A primeira imagem do Sagrado Co-
raçã o, qual se lhe revelara, Margarida Maria gravou-a sobre seu peito, abrindo-a na
carne a golpes de canivete; a segunda ela esboçou a traços de tinta, e colocou-a no altar
do noviciado de Paray, onde recebeu a veneraçã o da comunidade na sexta-feira apó s a
oitava de Corpus-Christi em 1685. Pela propagaçã o desse culto, que tinha por fim, com a
gló ria de Deus, a conversã o dos pecadores, a Santa pediu ao Senhor a graça de sofrer a
tal ponto que se tornasse uma viva imagem do Sagrado Coraçã o, cingido da coroa de
espinhos e tendo sobre si a cruz. Estas foram as armas com que pelejou e venceu, e o seu
triunfo aí está patente e marcado com o selo das grandes obras divinas, em dois fatos: a
romaria incessante que de todo o mundo aflui ao pequeno santuá rio em que viveu a
humilde Religiosa, e o incremento que tem hoje, em toda a Igreja, o culto de que ela foi a
mensageira.
DIA 5
Meu Divino Salvador, por vossa onipotência e infinita misericó rdia, fazei que eu me
mude e transforme todo em vó s. Que as minhas mã os sejam as mã os de Jesus, e minha
língua seja a língua de Jesus; que todos os meus sentidos e meu corpo sirvam só para vos
glorificar; sobretudo transformai minha alma e todas as suas faculdades: que minha
memó ria, minha inteligência, meu coraçã o sejam a memó ria, a inteligência e o Coraçã o
de Jesus". Costumava dirigir a Nosso Senhor esta oraçã o o Bem-aventurado Joã o Gabriel
Perboyre. Piedoso desde a infâ ncia, já se fazia entã o notar pela bondade e zelo com que
afastava do mal e exortava ao bem, quer a seus irmã ozinhos no lar, quer aos pequenos
companheiros com quem trabalhava no campo. A modéstia de seu proceder em
qualquer parte e seu recolhimento fervoroso na igreja, mormente quando comungava,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 40
DIA 6
Mês do Sagrado Coração de Jesus 41
Leã o Rarpey d’Aurevilly, irmã o do ilustre escritor francês de igual nome, na flor de sua
mocidade conquistara já um nome brilhante no foro e nas letras, e dera à estampa
volumes de versos que tiveram os aplausos de Mistral e outras sumidades da poesia;
mas todas essas gló rias nã o o puderam prender no mundo e um dia sentiu fortes
impulsos de o deixar e ir servir a Deus. Para bem se esclarecer nesse passo e vencer todo
o respeito humano que o tentasse, empreendeu uma peregrinaçã o de cabeça descoberta
e pés descalços, de Caen ao santuá rio de Nossa Senhora do Livramento, distante 20
quilô metros. Aí, apó s um retiro espiritual, decidiu-se a abraçar o sacerdó cio. Foi dele que
o Pe. Dubois, autor do livro "Prá tica do zelo eclesiá stico", escreveu em seu "Guia do
seminarista piedoso": "Conhecemos um jovem que entrou para o Seminá rio sem se
deixar prender pela consideraçã o do brilhante futuro que o mundo lhe prometia.
Quando pô s o pé em seu humilde cubículo, tã o diferente de sua alcova do século, abriu a
janela, olhou o céu e, ajoelhando-se, exclamou: "Como sou feliz, Senhor! Sede bendito!
Dois meses depois, seu irmã o acadêmico visitava-o, e escrevia em seu "jornal": "Cheguei
hoje a Coutances para ver meu irmã o... Achei-o de boa saú de e feliz, feliz acima de toda a
expressã o, "renovado" em todos os pontos. — Durará isto? As dú vidas ou receios de
Jú lio de Aurevilly nunca se confirmaram; seu irmã o foi um seminarista exemplar e
depois um sacerdote zeloso. "Amar a Deus e orar, para amar cada vez mais": era a sua
divisa. Ele amava ardentemente as almas, porque as via no Coraçã o do Divino Mestre e
partilhava os sentimentos do Salvador segundo a recomendaçã o do Apó stolo: "Senti em
vó s aquilo que sente Jesus Cristo". "Nosso Senhor, dizia ele, é o amante, o Salvador, o
santificador das almas. Qual foi seu pensamento ú nico, a razã o de sua encarnaçã o e de
seus mistérios, senã o a glorificaçã o de seu Pai pela salvaçã o das almas? Ora, todo o
sacerdote é um coadjutor de Cristo; deve, portanto, ser um salvador das almas. Deve
participar desse duplo amor do Sagrado Coraçã o: o amor do Santo dos Santos pelas
almas santas e por tudo o que conduz à santidade; — o amor de Deus Salvador pelos
pecadores, e por todas as obras de zelo pró prias para ganhar suas almas e introduzi-las
nos caminhos da salvaçã o". Deu-se com ardor à pregaçã o, a princípio como auxiliar do
Pe. Dubois, que o chamava "seu filho mais velho, seu bravo Timó teo", e depois com o Pe.
Le Goupils, conseguindo inú meras e admirá veis conversõ es. Pela fama de sua eloquência
apostó lica o Arcebispo de Paris convidou-o para fazer as conferências de "Notre Dame",
porém Leã o d'Aurevilly escusou-se, preferindo continuar como o orador popular das
Missõ es, onde certamente converteria maior nú mero de almas do que entre a cética
sociedade parisiense. Desvanecidas todas as dú vidas que um dia tivera, dizia dele seu
irmã o em 1847: "Senti uma dessas emoçõ es que fazem crer na imortalidade de nossa
alma. Há nove anos nã o o via, nã o o vira desde que é padre. Achei-o mudado, oh! sim,
mas também transfigurado. É a pró pria perfeiçã o dos caminhos espirituais. Ouvi-o
pregar sobre a "felicidade de quem se confessa..." Nem um sopro de preocupaçõ es
literá rias, mas solidez, ternura, autoridade, e aqui e acolá movimentos de uma fé tã o sin-
cera, que sã o de uma prodigiosa eloquência, eis de que fui testemunha. Ele é o
"sacerdote" em tudo quanto de sã o exprime essa forte palavra". Aos 8 anos de idade,
quis fazer de si a Deus uma oblaçã o mais completa, e entrou para a Congregaçã o dos
Sagrados Coraçõ es, fundada pelo Pe. Eudes, observando nela, com a docilidade do mais
perfeito noviço, as exigências da Regra austera. Apesar de já enfraquecido pelos
trabalhos de um longo ministério, ainda continuou a pregar cada ano uma estaçã o
quaresmal, quatro a cinco missõ es de algumas semanas, e dezenas de retiros paroquiais
ou de comunidades religiosas. No que mais se comprazia, porém, era nos retiros de
primeira Comunhã o: "Nosso Senhor, exclamava ele, nã o tinha tanta satisfaçã o em
prodigalizar a sua graça e a sua verdade aos pequenos israelitas dos campos?" No
pú lpito ou no confessioná rio, o seu conselho e exortaçã o constantes eram estes:
"Unamo-nos todos numa fervorosa comunhã o de oraçõ es numa sociedade inflamada de
Comunhõ es cheias de fé, para reparar os crimes dos pecadores que se endurecem no
Mês do Sagrado Coração de Jesus 42
mal, quando deveria todo o mundo prostrar-se de joelhos, clamando: "Parce Domine,
parce populo tuo". Nesse labutar, o abateu um ataque de paralisia, ao melhorar do qual
ofereceu pela Igreja, pela pá tria e pela salvaçã o das almas o sacrifício de sua vida
intelectual, moral e física; um segundo ataque sobreveio mais tarde, e o extinguiu
lentamente como um círio que ardesse até o fim no altar do Senhor.
DIA 7
É conhecido e abençoado em todo o mundo o nome de Fr. Damiã o Veuster, o apó stolo
dos leprosos em Molokai. Um ministro protestante, o Sr. Chapman, enviando-lhe para
suas obras de beneficências um donativo de 25 mil libras esterlinas, dizia reconhecer
nele o imitador verdadeiro do Bom Pastor que dá a vida pelo rebanho. Ao saber a sua
morte, o herdeiro da coroa da Inglaterra abria com avultada quantia uma subscriçã o
para se lhe erigir um monumento e formava um "comitê" para a fundaçã o de um
hospital de leproso em Londres com seu nome.
Quem ignora o que é a lepra? Pode dizer-se que é a agonia com suas angú stias, a morte
por antecipaçã o, e a fazer cair, uma a uma, as pedras do mísero pardieiro do nosso
corpo; a morte com seu aspecto mais repulsivo, com as legiõ es de vermes que se
adiantam ao sepulcro, e se encarniçam á vidos sobre membros a que ainda anima um
sopro da vida. O Pe. Damiã o, Religioso da Congregaçã o dos Sagrados Coraçõ es de Jesus e
de Maria, ouvindo o Vigá rio Apostó lico de Havaí lastimar que nã o houvesse um
sacerdote no leprosá rio de Molokai, ofereceu-se e partiu. Contava ele entã o 33 anos; aí
ficou até os 49, idade em que morreu. Relatando suas primeiras impressõ es, Pe. Damiã o
escreveu: “Custei muito a habituar-me a essa atmosfera, e um dia, à Missa, me senti tã o
sufocado que estive quase a sair para respirar fora; reteve-me a lembrança de Nosso
Senhor, mandando abrir em sua presença o sepulcro de Lá zaro. Agora entro sem
dificuldade nos aposentos dos pobres leprosos”. A força para desempenhar o seu penoso
ministério, ele a pediu e teve sempre do amantíssimo Coraçã o de Jesus. Os que visitavam
alguma vez Molokai, voltavam edificados: fazia-se a adoraçã o perpétua na capela e os
cristã os lá se achavam, todos os dias, uns apó s outros, a fazer a via-sacra, a dirigir
invocaçõ es ao Sagrado Coraçã o, a recitar o terço, a pedir o conforto e a se oferecerem
como vítimas para reparar os ultrajes que Deus recebe de filhos ingratos aos quais
foram prodigalizados os benefícios da civilizaçã o. O Pe. Damiã o convertia os
protestantes e os pagã os, reconciliava os inimigos, trazia a paz aos revoltados, identifi-
cando-se tanto com os seus 800 filhos adotivos, que nas instruçõ es e no trato usava
sempre desta frase — "nó s leprosos". — Por seus esforços, o lugar veio a ter cabanas
alvas e asseadas, um orfanato, escolas, duas capelas, e um hospital para os mais desam-
parados; e seu exemplo atraiu mais tarde companheiros, e Religiosos que se consa-
graram a auxiliá -lo. Certo dia, um dos leprosos, que era médico, lhe disse: "Padre, já
estais afetado;" e ele respondeu: "Nã o me assusta o que dizeis; já o esperava". E depois
dizia a outros: "Estou contente, agora sou como vó s leprosos; nã o quereria a saú de, se a
troco dela tivesse de deixar a ilha e abandonar a tarefa que o Senhor me confiou".
Resistiu ao mal durante cinco anos, firme em seu posto, e quando soou a hora da morte,
rompeu nesta exclamaçã o: "Como Deus foi bom em conservar-me a vida até que eu
tivesse dois Padres para me assistirem nos ú ltimos momentos, e a alegria de saber que
as boas Irmã s aí estã o para socorrer os leprosos!" E expirou, louvando e agradecendo ao
Senhor de o deixar morrer como Religioso dos Sagrados Coraçõ es.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 43
DIA 8
Nã o houve em certa época em Paris nome mais abençoado e popular do que o de "Irmã
Rosá lia", a princípio simples professora e um pouco mais tarde superiora numa casa de
Irmã s de Caridade situada num quarteirã o da cidade em que a ignorâ ncia, a miséria e os
vícios mais dominavam. Fazendo desde o primeiro dia o reconhecimento doloroso do
campo em que deveria agir, Irmã Rosá lia deu combate por mais de 50 anos, sem parar
nem retroceder um instante, nunca desanimada nem vencida, repousando de um
trabalho com outro e só abandonando o seu posto e suas armas no dia em que Deus,
satisfeito de seus combates, lhe deu o descanso eterno. Realizando no meio de Paris as
maravilhas das missõ es nas terras de infiéis, muitas vezes nas pobríssimas casas dessas
ruas tortuosas e infectas ela conseguia encaminhar os pais ao batismo, à Comunhã o, ao
casamento, e ainda ensinava o catecismo aos pequenos e preparava para a morte um
velho tio ou avô . Os pobres e os infelizes se tornaram como que o seu sangue, a sua
família, e entraram a considerá -la sua mã e, levando-lhe, com toda a confiança, suas
queixas, sú plicas e segredos. Se uma oficina lhes recusava trabalho ou um padeiro o pã o,
se um proprietá rio os despedia ou penhorava os poucos mó veis, se um comissá rio os
multava, se um filho desobedecia, era a Irmã Rosá lia que procuravam para que desse
remédio; e ela se punha em movimento, e remediava de qualquer modo. Os seus
humildes clientes estavam certos de que lhe nã o bateriam à porta em vã o; e ela, por sua
vez, queria que eles a qualquer hora fossem recebidos. Um dia, estando com um forte
acesso de febre, a Irmã porteira nã o deu entrada a um homem que lhe vinha falar, e este
encolerizou-se, e gritou. Irmã Rosá lia, ouvindo o rumor, acudiu e informou-se,
bondosamente, do que ele queria, para o satisfazer; quando retirou-se, repreendeu a
porteira, e, como esta replicasse que o médico recomendara deixassem-na em completo
sossego, retorquiu: "Deixemos o médico fazer o seu oficio e façamos nó s o nosso". Os
jovens que precisavam de auxílio para os estudos ou queriam um emprego, valiam-se de
sua intervençã o e eram bem sucedidos; quando colocados, e em condiçõ es pró speras, ela
os invoca em favor de seus irmã os necessitados, e, pedindo a cada um aquilo que ele
fazia melhor e lhe custava menos, tinha para a sua caridade colaboradores inú meros e
preciosos. Ganhou assim entre todo o povo um prestígio sem igual, e que se manifestou
em vá rios fatos. Quando, em 1832, o có lera invadiu Paris, e as multidõ es desvairadas
investiam contra os médicos, acusando-os de importadores do flagelo, o dr. Royer-
Collard foi atacado, mas a fú ria da turba desarmou-se logo que ele gritou: "Eu sou um
amigo da Irmã Rosá lia". Nas revoluçõ es a santa Irmã pode abrigar em sua casa a
sacerdotes e bispos, e teve força para fazer desmanchar barricadas e restabelecer a
ordem; em junho de 1848, salvou a vida a um oficial da guarda mó vel ajoelhando-se ante
os insurgentes enfurecidos e dizendo-lhes: "Há 50 anos que vos consagrei minha vida;
por todo o bem que vos tenho feito, e a vossas mulheres e filhos, peço-vos a vida deste
homem". A estima em que a tinham manifestava-se por mil outros modos. Um dia, um
velho trapeiro que levava má vida, manda-a chamar para lhe entregar alguns mil francos
que juntara para a filha a qual aprendia na escola das Irmã s: "Isto é com o tabeliã o,
responde ela, eu mandarei aqui um". — "Nã o quero, só confio em vó s". — E ela teve de
receber o dinheiro, conseguindo entã o dele que se confessasse. As virtudes com que
Irmã Rosá lia pô de exercer tanto prestígio, dizem seus bió grafos, ela as aprendeu do
Sagrado Coraçã o e deste as alcançou pela oraçã o. Em menina, vira serem asilados em sua
casa sacerdotes perseguidos pela revoluçã o, lembrava-se de que num subterrâ neo é que
seu cura lhe. ensinara o catecismo e lhe dera a primeira Comunhã o. Desde esse tempo,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 44
DIA 9
Julieta de Cobert, de uma nobre família da Vendéa, da qual nos dias da revoluçã o
francesa muitos membros subiram valorosamente ao cadafalso para nã o traírem sua fé e
seu rei, foi um perfeito modelo de virtudes cristã s. Esposando, aos 22 anos, o marquês
de Barol, entre as suas visitas e recepçõ es de dever incluiu logo as dos pobres, indo
procurá -los com a esmola nos mais miserá veis tugú rios e ensinando-lhes o caminho de
seu palá cio, para que se valessem dela nos vexames imprevistos. Um dia, ao atravessar a
praça do Senado em Turim, quando passava o Sagrado Viá tico, desceu do carro e
ajoelhou-se, ouvindo entã o um grito estridente: "Nã o é de Viá tico que preciso, é de
sopa". Olhou para o lado donde saía a voz, e viu as janelas gradeadas da Cadeia. Acom-
panhada do criado, lá foi para dar algumas moedas ao preso que parecia sofrer fome, a
fim de que ele nã o mais blasfemasse. O mísero, porém, era um ímpio, que já estava a rir e
cantar com os companheiros; ao verem aquela dama jovem, de porte calmo e grave,
calaram-se e receberam com respeito o que lhes deu. Quis ver também o cá rcere das
mulheres, e mais triste foi aí sua impressã o. Havendo na cidade uma Confraria de
Misericó rdia, que tinha como um dos seus fins socorrer os presos, Julieta se inscreveu
nela e, nã o contente de levar-lhes víveres, empreendeu regenerá -los, particularmente as
mulheres, entre as quais se demorava, instruindo-as e exortando-as, participando à s
vezes de sua grosseira refeiçã o para lhes ganhar mais a confiança, de modo tal que ope-
rou uma admirá vel transformaçã o no cá rcere e conseguiu dos poderes pú blicos, além do
apoio à sua empresa, a remoçã o da penitenciá ria para casa mais salubre e apropriada.
Com o intuito de assegurar e ampliar o efeito deste seu trabalho regenerador, fundou
também uma casa de refú gio e um convento de Madalenas, para as infelizes que
voltavam à vida religiosa. "Que consolaçã o, dizia ela, ver essas pobres purificarem-se do
lodo e correrem como anjos que voltam para o céu!" Um dia, leu Julieta nos jornais que
um pai desesperado pelos gemidos da filha, doente havia muito tempo, a suspendera do
leito e lançara pela janela; foi o bastante para decidir-se a fundar um hospício para as
crianças deformes e doentes, e depois um asilo para os meninos desvalidos, que instalou
nas salas do seu pró prio palá cio. Em 1825, o có lera penetrou em Turim, e ainda ante
essa pavorosa calamidade Julieta mostrou o heroísmo cristã o. "O marido, narra o grande
escritor cató lico Sílvio Pellico, veio uma vez ao posto de inspeçã o em que eu estava, e me
disse consternado, que ela se expunha ao contá gio, socorrendo, por suas mã os, os
infelizes atacados. Logo que pude, saí a procurá -la, e a encontrei serena e incansá vel em
sua tarefa, levando de casa em casa o conforto de sua palavra ou de medicina e sustento
para combater o mal". Debelado o flagelo, o governo conferia uma medalha de ouro à
marquesa de Barol pelos serviços prestados. O seu prêmio, porém, ela queria de mais
alto, e mais alto se inspirava para fazer o bem: esta sua ardente caridade ela a aprendia e
alimentava no Coraçã o de Jesus, a quem dizia: "Eu nã o sou mais do que uma fraca
criatura, mas parece-me que vos amo com todas as minhas forças, e quero também que
os outros vos conheçam e vos amem. Eu espero e posso tudo naquele que me fortalece".
Como o Coraçã o do Divino Mestre, o da fiel serva se inclinava mais de pronto para os
fracos, os padecentes e os desvalidos, porém, com isso nã o esqueceu o bem espiritual
das classes elevadas, e lhes assegurou um esforço de sá bias educadoras, fazendo virem
Mês do Sagrado Coração de Jesus 45
DIA 10
Eu nã o posso ver um menino, dizia, ainda jovem, o Venerá vel Champagnat, que nã o me
venha logo a vontade de lhe dar uma liçã o de catecismo e de lhe fazer conhecer quanto
Jesus Cristo o amou e quanto deve amar o Divino Salvador. E realmente, passava
algumas vezes horas inteiras a ensinar a religiã o a pastorinhos que encontrava nos
campos ou a meninos que lhe apareciam nas casas em que ia acudir a enfermos; e
trabalhou por atrair auxiliares nessa tarefa, vindo a fundar para esse fim a Congregaçã o
dos Irmã os Maristas. A estreia do primeiro punhado de Irmã os foi muito feliz: havia nos
mestres dedicaçã o, bondade, zelo e saber, e entre os alunos gosto pelo estudo, emulaçã o
e disciplina, fazendo gosto ver a ordem e respeito que guardavam na escola ou nas ruas,
quando em silêncio as atravessavam. A obra progrediu tanto que, estabelecida a
princípio na modesta casa do Padre em Lavalle, foi mister construir para sua habitaçã o o
vasto edifício de Hermitage. "Nã o compreendo, dizia a Champagnat um amigo, o que
pretendeis vó s enchendo vossa casa de meninos indigentes e recebendo tantos pos-
tulantes que nada vos dã o: se nã o tiverdes um crédito sem limites sobre o tesouro do
Estado, haveis de abrir falência". — "Eu tenho mais do que isso, respondeu o Padre sor-
rindo, tenho o tesouro da Providência que fornece ao mundo inteiro sem nunca se es-
gotar". O Padre Champagnat era fervorosíssimo devoto do Sagrado Coraçã o, ao qual
pedia todas as graças de que precisava; quando encontrava uma alma dominada por
maus há bitos, exortava-a a que recitasse as ladainhas do Sagrado Coraçã o, acrescentan-
do depois de cada invocaçã o: "Eu me consagro a vó s". A seus Religiosos dizia: “Quanto
mais se pede ao Senhor, mais se obtém”.
Pedir muito aos homens, é o meio de nada alcançar; mas com Deus, é precisamente o
contrá rio. Davi, que conhecia o Coraçã o de Deus, lhe dizia: “Vó s perdoareis meu pecado,
porque é muito grande e patenteará vossa grande bondade”. Assim, o que de ordiná rio
desanima os homens, as grandes faltas ou grandes necessidades, eram para o santo o
principal motivo de sua confiança. É que ele tinha de Deus uma alta ideia. Para concluir,
digo: “Se quisermos agradar a Deus, peçamos muito, peçamos grandes coisas; quanto
mais longo o requerimento, melhor ele o receberá ”.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 46
Desde moço, compusera a seguinte oraçã o, que recitou até o ú ltimo dia de vida: "Divino
Coraçã o de Jesus, que por vossa profunda humildade combatestes e vencestes o orgulho
humano, é principalmente a vó s que dirijo as minhas oraçõ es; dai-me, eu vos rogo, a
humildade; destruí em mim o edifício do orgulho, nã o porque seja ele insuportá vel aos
homens, mas porque vos desagrada e ofende a vossa santidade. — Santa Virgem, minha
boa Mã e, pedi ao adorá vel Coraçã o de Jesus a graça de que eu me conheça, me combata e
me vença, e destrua o meu amor pró prio e o meu orgulho; tomo aos vossos pés a
resoluçã o de lhe fazer uma guerra sem trégua". Dizia dele o povo de
Lavalle, que nã o era tã o bom e tanto sabia arranjar bem as coisas, que se nã o podia
deixar de fazer o que ele aconselhava e queria. Em 1840, no sexto dia do mês consagrado
ao Coraçã o de Jesus, morria em odor de santidade o Padre Champagnat, deixando já
florescente o Instituto dos Maristas, com cerca de 400 membros e à frente de 48 escolas
na França. Hoje ele se acha propagado em vá rios países da Europa, Á frica, Oceania, e
América; vá rios Estados do Brasil o acolheram com grande proveito, e o governo francês
que expulsara as Congregaçõ es religiosas, reconhecendo as vantagens de seu serviços
nas colô nias, autorizou-o a abrir no país o noviciado.
DIA 11
É uma Santa: dizia, aos 11 de Abril de 1903, o povo Camigliano de Toscana, junto ao leito
mortuá rio de sua conterrâ nea Gema Galgani, cuja curta existência fora um assombro de
virtude e uma comunicaçã o quase contínua com o céu. Esta voz do povo, começaram
logo a confirmá -la as graças extraordiná rias que pela invocaçã o do nome da jovem
finada se foram alcançando, como entre outras, as curas instantâ neas de Filomena Bini
de Pisa, Maria Mencucci e Mariana Angelini, romanas, e Isolina Serafim, de Lucca; a
preservaçã o de um naufrá gio iminente nas á guas do Mediterrâ neo a dois Padres
Passionistas do México; um considerá vel socorro prestado em crise aflitiva a um
convento de freiras camaldulenses em Roma; a rá pida conversã o de um incrédulo e
blasfemo, enfermo num hospital de Lucca; e em Roma as de uma mã e e dois filhos que
desprezavam a religiã o. Um livro, de cerca de 400 pá ginas, estampado com a licença
pontifícia, da lavra de um ilustre e zeloso sacerdote que foi o guia espiritual de Gema
Galgani, relata a seu respeito coisas maravilhosas; e seu autor nã o hesita em compará -la
a Teresa, Maria Madalena e Verô nica Juliani, declarando que, como o Evangelista, narra o
que viu, ouviu e tocou. Desde pequenina, Gema experimentava já as primeiras
irradiaçõ es dessas luzes e mercês sobrenaturais que a inundariam em sua mocidade; sua
mã e, chamando-a junto de si, ensinava-lhe pequenas oraçõ es, e, mostrando-lhe o
Crucifixo, dizia: "Olha, este Jesus morreu na cruz por nó s;" e lhe explicava com singeleza
o mistério do amor de Deus, e como pode e deve o cristã o corresponder-lhe. Propensa à s
distraçõ es como é por natureza, a criança de ordiná rio nã o se prende por muito tempo a
oraçã o e ao ensino; Gema, porém, sentia prazer em ouvir essas instruçõ es e, de vez em
quando, agarrando-se à s vestes de sua mã e, pedia "que lhe falasse mais um pouco de
Jesus"; e, quando a boa senhora, prestes a morrer, lhe perguntou: — "Gema, se eu te
pudesse levar para onde Deus me chama, quererias ir?" — "Aonde?" — "Ao paraíso com
Jesus e com os anjos" — a menina concordou muito contente, e já nã o queria sair um
instante do quarto, empenhada em que sua cara mã e a levasse. Ansiosa de fazer sua
primeira Comunhã o, o conseguiu aos nove anos de idade, na festa do Sagrado Coraçã o
em 1887, e, referindo-se a esse ato, escrevia: "Nã o sei exprimir o que se passou entre
mim e Jesus nesse momento. Jesus se fez sentir muito à minha alma. Compreendi entã o
Mês do Sagrado Coração de Jesus 47
DIA 12
Mês do Sagrado Coração de Jesus 48
A virtude precoce de um menino de doze anos é o quadro que hoje o culto do Sagrado
Coraçã o dá a contemplar aos seus devotos. Fruto de uma uniã o abençoada, Paulo Bedin
já aos quatro anos distinguia-se por qualidades e açõ es que mesmo em idade mais
adiantada sã o admirá veis. Já sabia ler, e, tendo sido a Histó ria Sagrada o seu primeiro
livro, contava-a aos outros com animaçã o, cheio de simpatia e interesse pelos que
sofriam, como Abel e José vendido pelos irmã os, e condenava revoltado os maus que os
perseguiram. Na igreja edificava a todos a piedade e atençã o reverente com que assistia
à s cerimô nias, e em casa, se lhe acontecia alguma vez esquecer a oraçã o da noite,
levantava-se a qualquer hora e de joelhos supria a omissã o cometida. Num olhar de sua
mã e ele adivinhava a aprovaçã o ou a censura, e lhe servia para logo de estímulo ou de
freio ao que praticava. Entregando-se um dia por demais à leitura de um livro de
viagens, a boa mã e ordenou-lhe que o deixasse, mas ele por exceçã o nessa hora, fechou-
o lentamente, "filho, disse ela. parece-me que esqueces o teu catecismo. Que coisa é
obedecer?" Paulo respondeu: "É fazer prontamente e com alegria aquilo que se nos
manda". Um momento depois acrescentou: "Prontamente, eu compreendo; mas com
alegria, é diferente". Certo é que ele obedecia sempre alegre muitas vezes, e dominando-
se quando contrariado. Em seus estudos secundá rios, no colégio de Mongré, o bom
menino mostrou, mais firmes e acentuados, os mesmos sentimentos e disposiçõ es. “É o
modelo do trabalhador”, dizia um dos seus mestres. À s vezes ao fim de uma tarefa mais
pesada ou em prêmio de triunfos alcançados na classe, dispensavam-no de exercícios
impostos aos outros, mas ele preferia partilhá -los, pretextando que a ociosidade o
fatigava mais. Era o escolhido para fazer companhia aos alunos recém-chegados, e para
dar coragem aos desanimados ou aconselhar os indó ceis: de tudo se desempenhava com
bondade. Um dia, no inverno, puseram-no de porteiro à sala de estudo, perto do fogã o
que o incomodava, mas dizendo-lhe alguém que pedisse o dispensassem, respondeu:
"Nã o, porque teria de vir para o lugar algum companheiro, que sofreria tanto quanto eu".
Fazia esforço para corrigir-se, até de pequenos defeitos como o de voltar-se para um e
outro lado à hora do estudo: "Ó bom Jesus, escrevia ele, dai-me força de nã o me voltar
mais: todos os sacrifícios que puder hoje fazer para esse fim, eu vo-los ofereço". Em seu
livrinho de notas se encontram muitas como estas: "Sagrado Coraçã o, eu vos ofereço
todas as minhas oraçõ es. — Eu vos consagro, ó divino Coraçã o, o tempo dos estudos. —
Eu vos ofereço as minhas recreaçõ es. — Sagrado Coraçã o de Jesus, concedei-me a força
necessá ria para me corrigir, a fim de fazer bem minha primeira Comunhã o". Preparado
assim com o maior cuidado, sua primeira Comunhã o como as que lhe seguiram foi em
tudo frutuosa e edificante. Por sua vez, Deus o recompensa: nas provas finais dos cursos
e nas distribuiçõ es dos prêmios, ele colhia sempre copiosos louros, porém acanhado e
modesto, ao ponto de, felicitado, confessar que nã o desejaria ser constantemente o pri-
meiro e vexar-lhe o estar superior aos outros. Ou porque o desenvolvimento precoce do
espírito lhe consumisse rá pido as forças do corpo ou porque o fruto dessa curta vida tã o
pura valesse para colheita celeste e de longos anos cheios de boas obras, Paulo enfermou
gravemente, e a moléstia foi como um lento e doce voo para o céu; à s visitas e cartas dos
condiscípulos que faziam votos e preces para sua cura, respondia enviando-lhes finas
imagens ou cabazes de frutas escolhidas; aos mestres agradecia os cuidados e proteçã o
que lhe haviam dispensado; recomendava a sua mã e que bordasse dois frontais, um para
a grande capela do colégio em que fizera sua primeira Comunhã o, outro para a capela da
Congregaçã o; aos pais, a quem votava um amor extremoso, confortava, falando-lhes na
felicidade do céu, onde iria rogar a Deus por eles. Chegada a hora de se lhe ministrarem
os ú ltimos sacramentos, dispô s ele mesmo a ornamentaçã o do aposento, e fez colocar na
parede, sobre o leito, as lembranças de sua primeira Comunhã o; recebendo em seu peito
a Jesus Sacramentado, expirou suavemente num sorriso inefá vel que lhe imprimiu à s
feiçõ es a serenidade e beleza de um anjo que houvesse descido à terra.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 49
DIA 13
Sto. Antô nio de Pá dua, o grande Taumaturgo, invocado em todo o orbe cató lico, e
particularmente na Itá lia, em Portugal e no Brasil, foi um amantíssimo panegirista do
Sagrado Coraçã o. Nos sermõ es que dele ainda se conservam, leem-se conceitos e in-
dicaçõ es piedosas que o provam, como as seguintes: "A alma religiosa encontrará no
Coraçã o de Jesus um delicioso retiro, um asilo seguro contra todas as tentaçõ es do
mundo... — Quando a alma religiosa ouvir a voz do sangue divino, que se dirija à fonte de
onde ele deriva; ao mais íntimo do Coraçã o de Jesus; ali encontrará a luz, a consolaçã o, a
paz, e delícias inefá veis... — A pomba edifica o seu ninho com as arestas que recolhe aqui
e acolá . E nó s com que construiremos nossa morada no Coraçã o de Jesus? O Coraçã o de
Jesus é como que o princípio da vida sobrenatural, é como que o altar de ouro, onde, de
noite e de dia, se evola até aos céus, um incenso odorífero, e perfumes suavíssimos
embalsamam a terra... A meditaçã o dos sofrimentos exteriores de Jesus Cristo é santa e
meritó ria, sem dú vida; mas se queremos encontrar o melhor do ouro puro, preciso é ir
ao altar interior, mesmo ao Coraçã o de Jesus, e aí estudar as riquezas de seu amor".
Uma visã o da Venerá vel Joana Maria da Cruz veio como que atestar estes devotos
sentimentos do glorioso Taumaturgo e revelar a esplêndida renumeraçã o que ele teve
de Jesus. Assim a refere a Venerá vel: "Num dia de festa de Sto. Antô nio, estando eu em
oraçã o, vi a alma deste Bem aventurado conduzida pelos Anjos aos pés de Cristo. Nosso
Senhor abria amplamente a chaga de seu Coraçã o, e este Coraçã o, todo resplandecente
de luz, atraía e como que absorvia a alma de Sto. Antô nio, como a luz do sol excede e
absorve qualquer outra claridade. No Coraçã o de Jesus a alma do Santo assemelhava-se-
me a uma pedra preciosa, cujo brilho irradiava em redor. As mú ltiplas cambiantes deste
brilho representavam-me as virtudes do Santo: cintilavam com um fulgor maravilhoso
no oceano de luz do Coraçã o de Jesus em honra deste e para gló ria do Bem aventurado.
Jesus tomou depois esta pérola do seu Coraçã o e a ofereceu ao Pai Celeste, que a fez
admirar aos Anjos e aos Santos".
DIA 14
O propagador principal do culto ao Sagrado Coraçã o na Itá lia, foi o Pe. Xavier Calvi, e,
como ele mesmo revelou, o foi por inspiraçã o de S. Francisco Xavier, seu patrono, que,
porventura para esse fim, duas vezes lhe salvou miraculosamente a vida: uma, de um
naufrá gio em sua viagem para Malta, e a outra em Roma, quando ele já agonizante, o
Geral Pe. Ricci lhe ordenou que pedisse a cura ao Santo, a quem se fazia nessa intençã o
uma novena porque ele era entã o precioso para o serviço da Igreja. Desde noviço, Xavier
Calvi distinguiu-se pelo recolhimento e gosto da oraçã o e inteira obediência; recitava o
Ofício Divino de joelhos, e quase sempre diante do SS. Sacramento; visitava os presos
instruindo-os na fé e exortando-os à virtude; mortificava-se à mesa e na dormida,
tomando para leito o duro chã o. Em Malta começou por estampar e distribuir um
opú sculo sobre o culto do Sagrado Coraçã o, e instituiu na casa religiosa que habitava, a
adoraçã o do SS. Sacramento na dita festa, no ú ltimo dia do ano e nos do carnaval, assim
como a cerimô nia das três horas da Agonia na sexta-feira santa, pregando nesses atos
Mês do Sagrado Coração de Jesus 50
com um fervor que operava conversõ es. Chamado dentro de pouco tempo a Roma, onde
ao fim do primeiro mês de estada caiu gravemente enfermo, vindo a restabelecer-se por
intervençã o de S. Francisco Xavier, empenhou-se cada vez mais em propagar o culto do
Coraçã o de Jesus, sugerindo-o e recomendando-o vivamente a seus penitentes e nos
exercícios espirituais que pregava, num dos quais ganhou como auxiliar desta sua obra o
Cardeal Colonna. Oraçõ es, coroas, câ nticos, jaculató rias, tudo ele compunha e
acomodava com piedosa indú stria para alimentar a flama e dar mú ltiplas formas ao
culto do Rei dos coraçõ es. Nas quintas-feiras, associava-se, diante do Taberná culo, ao
Coraçã o de Jesus agonizante; nas sextas-feiras, seguia o Sagrado Coraçã o em todas as
circunstâ ncias da Paixã o, e fazia a "via sacra, meditando sobre todas as estaçõ es; e nas
grandes solenidades relativas à santa humanidade do Salvador, como à s do Natal,
Circuncisã o, Epifania, Pá scoa, considerava quais seriam os sentimentos do Coraçã o de
Jesus nesses mistérios de amor de Deus pelos homens. Em orató rio privado ao
recitarem-se as ladainhas de Nossa Senhora, em vez de responder simplesmente — "orai
por nó s" — dizia com viva fé : "Orai e amai por nó s ao Coraçã o de Jesus". Suas cartas
começavam assim: "Viva o divino Coraçã o! que Ele triunfe em tô da parte, "ubique
gentium!" — e acabavam invariavelmente: "Adeus. Orai por um mísero velho. Ó Jesus!
por vosso Coraçã o, sede para nó s Jesus!" Quando se tratou de se instituir a festa e o
oficio do Sagrado Coraçã o, o Pe. Calvi incumbido de colecionar tudo que se achasse de
mais frisante a respeito dos Padres da Igreja e escritores ascéticos, e foi com santo
jú bilo, e como buscando tesouros, que ele compilou os testemunhos da tradiçã o sobre o
assunto. Nada recusava do que se lhe pedisse para o Sagrado Coraçã o ou em nome dele,
e o Coraçã o Divino lhe retribuiu até com dons extraordiná rios, e o espirito de revelaçã o
e profecia. Um dia um padre, tendo visto em sonhos pá lido e triste, um seu irmã o
falecido há pouco, disse ao Pe. Calvi, encontrando-o: "Recomendo-vos uma alma do
Purgató rio". — "Quem ? volveu ele, — vosso irmã o? Confiança, está no céu". Anunciou ao
célebre Battoni que ele seria o pintor do Sagrado Coraçã o e executaria nesse gê nero uma
obra de grande valor, que daria gló ria a Deus e lucro a ele e à família; e, de fato, Battoni
foi o autor do painel encomendado pela rainha de Portugal para a nova igreja do
Sagrado Coraçã o em Lisboa. Predisse também que Pausi, discípulo de Battoni, iria para a
China e lá havia de pintar belas imagens do Coraçã o de Jesus para os Missioná rios e os
centros de catequese. Estendeu aos gravadores o seu apostolado e fez imprimir-se em
medalhas a apariçã o de S. Luís Gonzaga ao Irmã o Celestini, curando-o para que ele
propagasse o culto do Sagrado Coraçã o. A esta vida de apó stolo coroou a morte do justo,
morte rá pida e suave, em 1788, na primeira sexta-feira do mês, em dia do aniversá rio da
morte de S. Francisco Xavier, e cerca da hora em que a lança do soldado abriu o Coraçã o
de Jesus.
DIA 15
O "Apostolado da Oraçã o", que foi em sua origem apenas uma liga piedosa formada pelo
padre Gautrelet, entre os jovens religiosos de Vais, tomou a vasta organizaçã o e o
desenvolvimento que tem em todo o mundo cató lico, por obra do Padre Henrique
Ramière. Este sacerdote, dotado de grande talento e provido de variada e só lida ins-
truçã o, desde o inicio de sua carreira deu-se ao ensino e ao pú lpito, pregando de con-
tinuo e com muito fruto. Era igualmente um bravo polemista, e, em sendo atacada uma
verdade religiosa, saía a defendê-la, descarregando o golpe com a força precisa para
desarmar o adversá rio. Por esta sua vivacidade, e pelo zelo com que se dedicava à s boas
Mês do Sagrado Coração de Jesus 51
obras, como que arrastando todos a servi-las, foi taxado de excessivo ardor; mas a tal
censura respondeu de uma feita a certo Prelado: "Os carvõ es em brasa sã o os que
acendem os ouros". Intransigente quanto aos princípios e ao dever, ele era de uma
docilidade extrema, e estava sempre disposto a qualquer sacrifício quando se tratava de
fazer o bem. “Sois de um espírito admiravelmente conciliador”, escrevia-lhe um
cavalheiro que com ele travou rijo combate na imprensa. "É tã o humilde e simples, dizia
alguém que o conheceu de perto que aceitará observaçõ es de uma criança". Confiava
seus manuscritos a quem se queria instruir sobre assuntos de que ele tratava, e deu
todos os seus sermõ es ingleses a um Missioná rio que partira para a América. Tinha a
mesma dedicaçã o para as classes cultivadas e para as condiçõ es humildes; à s vezes,
recolhia-se a estudar numa casa de campo, a fim de que os habitantes do lugar tivessem
a Missa: visitava-os todos, cuidando particularmente dos enfermos, a quem ministrava
conforto espiritual e deixava a esmola para o remédio e o sustento, quando preciso.
Perdoava generosamente as ofensas; a alguém que o estimava muito e lhe perguntou
como deveria proceder para com uma pessoa que lhe era hostil, respondeu de pronto:
"Ajudai-o em tudo que puderdes", e como lhe observassem que esta pessoa o deprimia,
replicou: "Ele tem razã o de estar descontente comigo; eu nã o o quis molestar, mas as
aparências eram contra mim. O Coraçã o de Jesus nã o sofreu mais?" Desde sua primeira
Missa escolhera como roteiro de sua vida as palavras do Evangelho: “Quem se nutre de
mim deve viver para mim”. "Compreendi, dizia ele, que o meio mais poderoso para me
firmar em minhas resoluçõ es era ter os olhos sempre fixos em Jesus Cristo, e ver nele o
ideal dessa liberdade, dessa paz, dessa vida pela qual suspiro. Seu Coraçã o é a fonte dela;
cabe-me buscar aí quanto queira". E, com esta norma, organizou o "Apostolado da
Oraçã o" e para ele criou o "Mensageiro do Coraçã o de Jesus"; surgindo contra esta a ob-
jeçã o de que havia já muitas folhas e revistas religiosas, e que seria dificílimo sustentar
por muito tempo uma que se tivesse de ocupar sempre deste assunto, respondia
triunfante: "Quem é que teme vir a esgotar-se um assunto, como esse, ú nico, é verdade,
porém mais vasto que o oceano? Poderemos falar sempre e muito, e nunca faltará o que
dizer sobre aquele que "é tudo em todas as coisas". De fato o "Mensageiro" saiu e, há
mais de 501 anos, percorre o mundo, auxiliando todas as causas cató licas e pondo-as
sobre o amparo do Sagrado Coraçã o. Pio IX o aplaudiu logo assinalando que ele unia as
oraçõ es dos fiéis para os fins mais urgentes e os punha em comunicaçã o com o Coraçã o
de Jesus, fundindo-os cada vez mais no espírito de unidade. Entretanto, o padre Ramière,
quase ao termo de tã o laboriosa e fecunda carreira, lembrando-se do lema que adotara
ao subir pela primeira vez ao altar, dizia humilde: "Há 35 anos que me nutro todos os
dias de Jesus Cristo. Celebrei neste espaço de tempo 12900 missas; vivo constantemente
sob o mesmo teto que o Divino Salvador; e como estou ainda longe de viver Unicamente
d'Ele e para Ele!" Nas ligeiras notas sobre um retiro que pregou três dias antes de
morrer, lê-se: "É tempo de me preparar imediatamente para o ú ltimo sacrifício... O
Senhor bate já à porta. Resta-me talvez bem pouco tempo para me dispor à grande
prestaçã o de contas e santificar minha alma, e mais do que nunca devo fazê-lo pela uniã o
com o Coraçã o de Jesus". E na oitava de S. Joã o Evangelista, em janeiro de 1884, quando
se dispunha a celebrar o santo Sacrifício, o Padre Ramière cala ferido de morte nos
braços de seus irmã os. A "intençã o que no "Mensageiro" ele designaria aos fiéis nesse
mês, a sua primeira e ú ltima intençã o, fora o "estabelecimento do reino de Deus na
terra!"
1
O Mensageiro do Coração de Jesus completa, no Brasil, neste ano de 2011, 115 anos. Seu primeiro exemplar foi publicado
em 1896, criado pelo padre jesuíta Bartolomeu Taddei, considerado o fundador e o maior promotor do Apostolado da
Oração no Brasil.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 52
DIA 16
Maria André, a dedicada "Zeladora do Apostolado da Oraçã o", foi logo apó s o batismo
consagrada a Nossa Senhora, usando, por voto materno, só vestes brancas, até os três
anos de idade: era como um prenú ncio da angélica pureza com que em curta vida ela
edificaria o mundo. Aos cinco anos, já lia bem, tinha gosto pela oraçã o e mostrava um
coraçã o terno e compassivo, interessando-se, vivamente, pelos que sofriam e
revoltando-se contra quem os maltratava, até mesmo em relaçã o aos contos que ouvia:
desgostava-lhe a fá bula do Lobo e do Cordeiro, e afligia-lhe recitá -la, tanta era a sua pena
do inocente que a fera escarnecia e imolava! Pelo fervor com que orava na igreja,
pessoas havia que procuravam sua mã e para lhe dizerem com instâ ncia: "Peça a sua
menina que reze por mim". Maria desejava ardentemente comungar, e preparou-se com
o maior cuidado e zelo. Numa das liçõ es de catecismo, o Padre, falando sobre as faltas
que se cometem diariamente, sobretudo as desobediências, mandou que se levantassem
as crianças que disto se sentiam culpadas; ninguém se moveu, porém Maria, nã o se
julgando de todo inocente neste ponto, ergueu-se humilde, sem se confundir com o riso
malicioso de algumas das companheiras. Sua primeira Comunhã o, feita com as melhores
disposiçõ es, inflamou-a no amor à Sagrada Eucaristia: buscava-a frequentemente. Vendo
sua mã e voltar da Comunhã o, quando nã o pudera acompanhá -la, abraçava-a contente,
porque acabava de entrar aí no peito materno o Deus Sacramentado. As boas qualidades
de Maria André manifestavam-se igualmente no colégio em que se educou; as mestras
apontavam-na à s outras como o exemplo; as condiscípulas, ao contrá rio de se
melindrarem com isso e contestarem, reconheciam-no ainda em maior grau,
exclamando: "Nó s nã o podemos fazer o que Maria faz, ela é uma santa". E, sem se envai-
decer de que assim a julgassem, a jovem dispensava o mesmo carinho e dedicaçã o a
todos; mais tarde, na vida social ou no lar, empenhava-se por todas as formas em ser
ú til, em auxiliar a quem precisasse. Amando muito o desenho e a pintura, abandonava o
lá pis e o pincel para se dar a trabalhos manuais que nã o lhe agradavam, mas que parti-
lhava satisfeita para aliviar aos que via sobrecarregados: "Eu posso fazer isto, dizia,
dividamos".
O bem das almas, porém, era o que sobretudo procurava, lembrando, gentilmente, os
deveres religiosos, e a prá tica de boas obras e salutares devoçõ es; tinha sempre diversas
a propor, e quando suas companheiras riam disso, volvia: "É porque assim podem
escolher; se nã o quiserem uma, têm outra". Trabalhava, porém, mais especialmente pelo
Apostolado da Oraçã o, de que era zeladora: explicava seus dons, mostrava, com
eloquência e zelo, os frutos e vantagens que dele se podiam colher, notando suplicante:
"É tã o pouco que fazer, e tanto a lucrar!" Consegue assim reunir centenas de associados,
e, como o espírito da devoçã o ao Coraçã o de Jesus é fazer o bem por todas as formas e
zelar tudo o que interessa a gló ria de Deus, Maria André procura, a miú do, as operá rias e
vela em que nã o faltem à s Missas de preceito e frequentem a Comunhã o; visita e socorre
aos enfermos, ensina o catecismo à s crianças, fazendo profusa distribuiçã o de imagens,
etc. Além disto, executa por suas mã os belos trabalhos para a decoraçã o do altar, e, como
nã o houvesse organista para as cerimô nias da igreja, só por isso estudou a mú sica, e em
breve, toda a vez que era preciso, estava a tocar o harmô nio. Devotíssima do SS.
Sacramento, nã o prescindiu nunca de entrar nas igrejas por onde passava fosse embora
só para se ajoelhar um momento diante do Taberná culo; pelo fervor edificante com que
fazia a via-sacra, mais de uma vez a designaram assim: "Olhem a moça que faz tã o bem o
Mês do Sagrado Coração de Jesus 53
caminho da cruz!" Dos vivos o seu zelo se estendia aos mortos; um dia, ao entrar em
casa, sabe que morrera, subitamente, um velho quase abandonado. Maria, contristada,
vai a sua mã e, e lhe diz: "Ninguém se lembrará de mandar dizer uma Missa por este
pobre senhor que bem precisa; só me resta um franco; se me pudesse dar outro,
faríamos logo celebrar uma. Em seu desejo de mais servir a Deus, quis ser Religiosa; seus
velhos pais opuseram-se, dizendo que a separaçã o lhes causaria a morte e se esforçaram
por distraí-la de seu fervor devoto. Maria sofreu com a recusa e foi definhando;
disseram-lhe entã o que, se o contrariá -la a afligia muito, livre estava, fizesse o que
queria; mas com lá grimas nos olhos, respondeu: "O sacrifício está feito; nã o falemos
mais nisto". O abatimento das forças prosseguiu; numa procissã o que acompanhava,
impressionou a sua mã e o ardor e transporte com que entoava, como um hino de
libertaçã o, o câ ntico: "No céu, no céu, com minha Mã e estarei!" Pouco depois, a febre a
prostrara: "O bom Jesus me tem pregado em sua cruz, escrevia ela na sua ú ltima carta;
— desde ontem estou reclusa. Eis como as corriqueiras sã o punidas. Deo gratias,
sempre". Apó s um mês de atrozes sofrimentos, durante os quais recebeu por vá rias
vezes os socorros espirituais, a 28 de novembro de 1891, dizendo ternamente a seus
pais: — "Eu orarei por vó s", — exalou o ú ltimo alento; sob um impulso do alto, sua mã e
recitava nessa hora o "Magnificat, como para acompanhar com a açã o de graças da SS.
Virgem a entrada triunfante de sua filha no céu.
DIA 17
O Pe. Vítor Drevon, descendente de Bayard — o cavalheiro "sem medo e sem pecha", —
mostrou-se como sacerdote um digno continuador das tradiçõ es de seus maiores, na
firmeza com que guardou os postos que assumiu, sem jamais contar o nú mero dos
inimigos que tinha a bater e sem se poupar a nenhum sacrifício na defesa de sua santa
causa. Professando na Companhia de Jesus, exercitou-se primeiro na Algéria, em
Constantina, onde num quarteirã o á rabe transformou uma velha mesquita em igreja do
Coraçã o de Jesus, fundando aí um centro de fervorosa fé cristã . Chamado pouco depois à
França, indo pregar em Paray-le-Monial uma novena, falaram-lhe à alma os apelos do
Sagrado Coraçã o para que se lhe oferecessem desagravos pelos ultrajes e abandono que
sofria de tantos, e trouxe daí a inspiraçã o de criar a "Obra da Comunhã o Re- paradora".
Iniciou-a na sua casa religiosa em Lons-le-Saulnier, associando-se lhe o escol das almas
piedosas que ele dirigia. O espírito de sacrifício era a alavanca de que se servia para tã o
santo movimento, a Comunhã o fervorosa frequente é que o havia de incutir e fortalecer,
unindo o cristã o à vida mística de Nosso Senhor no taberná culo. "Vó s, dizia ele, deveis
morrer cada dia no Sagrado Coraçã o. Essa morte diá ria de todo o vosso ser e de suas
inclinaçõ es mundanas, é que vos pode fazer crescer na virtude e no amor de Deus. É na
Santa Mesa que achareis as forças para vos sacrificardes pelos ingratos e para
consolardes o Divino Coraçã o das ingratidõ es que sofre". Nã o se deve comungar só por
si e pela família, mas também pela Igreja, e nã o tã o somente para gozar de Deus neste
mundo, mais ainda e sobretudo para o desagravar e obter o perdã o dos pecadores". E foi
ensinando e exortando assim que, de um pequeno santuá rio, ele espalhou no mundo
inteiro a "Comunhã o Reparadora". Com esta grandiosa empresa tentava aqui e acolá
vá rios expedientes e modos de dar combate ao mal e salvar as almas. Quando a França
gemia sob o peso da invasã o estrangeira e entre os horrores da Comuna, ouvindo ele de
pessoa veneranda que tais males cessariam se os poderes do Estado e as classes sociais
se unissem em preces, correu a solicitá -lo dos representantes da naçã o, dirigindo-se a
Mês do Sagrado Coração de Jesus 54
um por um, e, a despeito de que intrépidos cristã os, como Luís Veuillot, tivessem como
perdidos tais esforços, a proposta foi votada no Parlamento quase unanimemente.
Promoveu também as peregrinaçõ es a Paray-le-Monial, percorrendo para isso a França e
a Bélgica, e sustentando ativa correspondência epistolar com muitos outros países, de
cuja campanha resultou, em junho de 1873, o concurso de milhares de peregrinos de
todas as procedências, e entre eles um cortejo de 200 deputados franceses que
ofereceram um estandarte ao santuá rio e fizeram nele a sua consagraçã o ao Sagrado
Coraçã o. Ao anunciarem os inimigos da Igreja a comemoraçã o do centená rio de Voltaire,
o Pe. Drevon promoveu um ato universal de desagravo e conseguiu nesse intuito mais de
dois milhõ es de "Comunhõ es Reparadoras". Realizou ainda, em Paray-le-Monial, duas
grandes obras em honra do Sagrado Coraçã o: o "Museu e a Biblioteca Eucarística", cole-
cionando todas as produçõ es da arte e todos os livros estampados em homenagem ao
inefá vel mistério do amor de Jesus. Ouviram-no algures exprimir o desejo de morrer em
Roma, e oferecer a sua vida pela paz da igreja e pela pá tria; indo à Cidade Eterna como
postulador da causa do Pe. Colombière, no dia do aniversá rio da morte deste caiu
enfermo, agravando-se rapidamente o mal, a que sucumbiu invocando de contínuo por
longas horas o nome de Jesus.
DIA 18
Armelle Nicolas foi uma pobre criada, mas tã o admiravelmente exerceu o seu humilde
ofício que deixou uma abençoada memó ria em Campenac, sua terra natal, e mereceu que
o chefe da família a que serviu durante sua vida inteira atestasse a seu respeito o
seguinte: Deus por uma especial providência no-la deu, logo que me casei, para governar
a nossa casa, pois que, sendo minha mulher inexperiente nisso e doente, Armelle a
servia, consolava e ajudava carinhosamente assim como a todos da casa, onde muitas
vezes havia enfermos e meu filho mais velho sofreu por muito tempo uma aborrecida
moléstia em que lhe dispensou ela inexcedíveis cuidados. Atendia a tudo em tempo, e
com tanta diligência fazia suas devoçõ es da igreja e suas compras, que mal se percebia
que saísse de casa; quando advertia de alguma falta aos companheiros de serviço, era
com bondade e paciência tais, que eles a ouviam dó ceis e se corrigiam, e em 35 anos que
esteve conosco nunca a vi irritada ou impaciente. Educava os meninos com zelo e amor,
ensinando-os desde que sabiam falar, a darem seu coraçã o a Deus e fazerem pequenas
oraçõ es. Até as pessoas de posiçã o que frequentavam o nosso lar, tinham-lhe estima e
respeito. Interessava-se por todos os nossos negó cios e os recomendava a Deus; num
grande processo que sustentei, ela muito me consolava e animava, e à s suas oraçõ es
atribuo em grande parte o triunfo que alcancei. Era enfim uma cristã , em quem nã o
conheci defeito". Por sua vez o cura de Campenac, apó s a morte de Armelle, dizia do
pú lpito: "Desde sua infâ ncia deu indícios de uma vida acima do comum. Caracterizava-a
uma perfeita caridade com o pró ximo: nã o dava lugar a que sua mã e ou os de sua casa
fizessem nada de penoso, antecipava-os em tudo quanto era de maior trabalho. Sua
devoçã o à Missa era tal, que desde a idade de 7 anos, enquanto morou em minha
paró quia, nunca falhou um só dia, embora morasse longe da igreja. Dava o seu almoço à s
companheiras para guardarem o seu rebanho, enquanto ela ia assistir ao Santo
Sacrifício". O povo de Campenac, a uma voz, o confirmava, chamando-a todos a boa
Armelle. Aos vinte anos, deixou as ocupaçõ es do campo e veio procurar trabalho na
cidade, para ter mais frequente o ensino e o conforto da religiã o. "Se meu sangue
pudesse valer alguma coisa para o bem das almas, dizia ela, eu o daria todo". E a seus
Mês do Sagrado Coração de Jesus 55
votos e oraçõ es pela conversã o dos pecadores juntava um empenho constante com os
ricos para que protegessem as obras apostó licas e auxiliassem as missõ es, sobretudo nas
freguesias rurais. Soube-se que muito concorreu para a conversã o de pessoas que de há
muito viviam escandalosamente no vício. Aplicava as Missas que ouvia e todas as suas
boas obras ao alívio das almas do purgató rio: "Se eu visse um de meus parentes num
braseiro, deixa-lo-ia arder, podendo salvá -lo? Que nã o devo, pois, fazer para socorrer a
meus irmã os no purgató rio!" Compadecia-se também vivamente dos pobres e dos
enfermos, distribuindo com eles o seu salá rio e visitando-os com a mais desvelada
caridade: a um operá rio de Vannes que vivia abandonado até da pró pria esposa, coberto
de ú lceras que repugnava olhar, ela ia ver todos os dias, levava-lhe o sustento, pensava-
lhe as chagas, exortava-o à paciência, e assim o tratou por muito tempo até que ele
morreu, bendizendo a Deus de que a houvesse enviado em seu socorro. Nã o lhe faltaram
tentaçõ es, e à s vezes violentas; porém corria a abrigar-se como uma criança nos braços
de seu Pai do céu rogando que lhe nã o consentisse ofendê-lo, e a tentaçã o cessava.
Perguntando-se-lhe, um dia, de que meios se servia para chegar a essa vida exemplar,
respondeu que durante vinte anos entregou seu coraçã o a Jesus, e ao cabo destes Jesus
lhe abrira o seu. “Eu quero te abrigar em minha casa, me disse Jesus, e, mostrando-me a
chaga do seu divino lado, fez-me entrar por aí em seu Coraçã o... E me achei aí encerrada
com tanta gló ria e liberdade que o nã o podia compreender. Sentia-me ali à vontade, nada
me oprimia. Via esse Divino Coraçã o tã o infinitamente grande, que mil mundos inteiros
nã o bastariam para enchê-lo. Eu agora, dia e noite, nã o saio do Coraçã o de Jesus; é um
asilo, é meu refú gio contra todos os meus inimigos”. Aconselhada a deixar o serviço
doméstico para praticar mais livremente suas devoçõ es, recusou-o, declarando que
nessa baixa condiçã o se exercitaria mais na humildade, e, servindo as criaturas,
aprenderia a servir a Deus. Num dia da oitava de "Corpus Christi" recebeu o coice de um
cavalo, que lhe fraturou a perna; durante mais de um ano, presa ao leito ou cadeira, nã o
ficava ociosa, fazia-se conduzir a um canto da cozinha, e daí dirigia o trabalho ou
executava qualquer coisa de ú til à casa; e quando lastimavam que se visse privada de
praticar como dantes a sua fé e dedicaçã o, acudia logo: "Jesus me ensinou que tudo o que
é feito ou suportado por seu amor, é uma verdadeira oraçã o. Por sua graça e sua grande
misericó rdia, eu estou numa perfeita uniã o com Ele". Nestes sentimentos e santas
disposiçõ es morreu aos 65 anos de idade; seu amo determinou que se lhe fizesse o
enterro como o de uma sua filha, e, mandando que se lhe nã o cobrissem os pés, foi de
joelhos beijá -los. Foi uma procissã o de todo o povo de Campenac o seu préstito fú nebre,
e sua sepultura, diz quem lhe historiou a vida, é visitada por muitos, a lhe pedirem
graças ou agradecê-las.
DIA 19
Quando desapareceu dentre os vivos o almirante Coubert, pranteou-o em França o
mundo literá rio pela pena de um dos mais notá veis escritores, Pierre Loti, e a sociedade
cristã pela palavra de um dos mais eloquentes oradores sacros, Mons. Freppel. E bem o
merecia, porque havia sido um heró i e um justo. No tempo em que vivemos, dizia o
almirante Julien de la Gravière, ele pode ser apontado aos nossos jovens oficiais como o
melhor e mais completo modelo no caminho do patriotismo e da honra. Coubert reunia
ao cabedal científico essa paciência operosa que atende à s coisas no seu conjunto e nos
detalhes, e possuía o sentimento de justiça que com a bondade d’alma granjeia ao chefe a
afeiçã o de seus subordinados. Ele deu sempre à s equipagens o exemplo de uma fé
Mês do Sagrado Coração de Jesus 56
DIA 20.
Garcia Moreno, o heroico presidente da Repú blica do Equador, desde menino revelou
um talento nã o comum e adquiriu uma vontade enérgica e firme. Cedo a pobreza se
assentou em seu lar, sendo preciso que sua pró pria mã e ministrasse ao ó rfã o o ensino
primá rio. Passou depois a estudar humanidades com um sá bio Religioso da Ordem de
Nossa Senhora das Mercês, que se afeiçoou vivamente ao discípulo, por sua constante
aplicaçã o e a facilidade e rapidez, com que tudo aprendia. Acabado este tirocínio, o
jovem resolveu, ainda através de todas as privaçõ es, ir cursar a Universidade, e também
nesta circunstâ ncia lhe valeu o Religioso, recomendando-o a duas irmã s suas residentes
em Quito, que, embora pobres, o acolheram. Aí entregou-se com ardor aos estudos, que
estendia até a noite alta e reatava, madrugando; mas em compensaçã o dos labores
conquistava o primeiro lugar nas aulas e se fazia querido e respeitado por mestres e
condiscípulos. Aos vinte anos, os salõ es de Quito abriam-se ao pobre que tanto se
distinguia, e ele se deixou seduzir um momento pelas festas do mundo, mas logo reagiu,
e, cortando rente os cabelos como se fora um monge, orou e disse, levantando-se: "A
vida é muito curta para se gastar sequer um dia em futilidades. Agora, serei mais fiel a
meus livros". Pensou entã o em abraçar o sacerdó cio, e chegou a receber a tonsura e
ordens menores, mas ou por sua sede insaciá vel de saber, que parece querer lançar-se a
tudo, ou por desígnios da Providência que traçavam outros combates, diplomou-se em
direito, dando-se primeiro à advocacia, que abandonou pelo desgosto de ter defendido
uma causa que conheceu mais tarde ser injusta. Com um sá bio estrangeiro, expondo por
vezes a vida, fez cuidadosas exploraçõ es do grande vulcã o de Quito, das quais
apresentou substanciosas memó rias que as revistas científicas publicaram. Assentou por
Mês do Sagrado Coração de Jesus 57
DIA 21
O dia 21 de junho evocará sempre à lembrança dos cató licos o vulto angélico de Luís
Gonzaga, o pobre e humilde de coraçã o que tanto amou e imitou o Coraçã o de Jesus.
Descendente de príncipes, ele mostrou, desde tenra idade, o maior desapego das gran-
dezas e honrarias do mundo e uma inclinaçã o afetuosa para os pequenos e pobres, a
quem falava com particular agrado e distribuía copiosas esmolas. Viam-no, ainda me-
nino, erguer-se do leito pelo meio da noite e pô r-se a orar de braços estendidos em cruz;
acudia a acomodar os criados quando contendiam, repreendendo sem aspereza os cul-
pados, e nas festas da corte, sempre que apareceu, foi com tanta modéstia e superio-
ridade que a todos impunha respeito. Refere-se na sua vida que diante de damas nã o
levantava os olhos, de modo que, vendo frequentemente a imperatriz Maria da Á ustria,
nunca lhe conheceu os traços da fisionomia, e de seu pudor se conta que, a despeito da
ordiná ria brandura, um dia fez corar a certo velho que proferiu um dito indecoroso.
Mesmo na vida secular praticava a mortificaçã o e por modo que ninguém o podia em-
baraçar, como nenhum esforço nem sú plica ou estratagema da família conseguiu demo-
vê-lo de abraçar a vida religiosa. Como noviço da Companhia de Jesus, pedia e prestava-
se com satisfaçã o aos ofícios mais humildes: carregava as cestas com provisã o destinada
aos pobres, limpava na cozinha os pratos e os talheres, sacudia as teias de aranha,
cuidava dos candeeiros do uso comum; o que suplicara lhe reservassem, era o mais
acanhado e desprovido, e suas vestes e panos de cama os mais grosseiros. Quando saía
pela cidade em Roma, era seu prazer explicar as verdades da fé nos lugares onde afluía o
povo, como o campo de Flora ou Montanara; e o fazia com tanta unçã o e clareza, que a
todos convencia e cativava: um dia o cardeal de Cusa, de passagem numa praça em que
ele ensinava o catecismo, parou a escutar atento e edificado a pregaçã o do jovem aos
camponeses, de pé sobre um tablado, ao modo por que os mercadores ambulantes
anunciam seus artigos, mas apregoando e expondo os artigos da salvaçã o. Dele dizia
também o sá bio cardeal S. Belarmino: "Dando ao Irmã o Luís os exercícios de Santo
Iná cio, nele descobriu tal có pia de luzes, que, eu velho, nascido e educado num meio de
conforto aprendi deste menino a arte de meditar". Em firmeza soube ele sempre do-
minar a natureza e o há bito, arriscando-se a todos os perigos, vencendo todas as
repugnâ ncias, e propondo-se a todos os sacrifícios que a salvaçã o das almas ou a
caridade com o pró ximo lhe pedissem. Provou-o à evidência quando em 1591 a fome e a
peste grassaram em Roma: o Santo percorria a cidade, com um alforje na mã o e pedindo
esmolas, que distribuía à s vitimas do flagelo; e, encontrando um pestoso caído na rua,
toma-o aos ombros e o conduz ao hospital da Consolaçã o. Neste santo lidar contraiu a
peste, e dela morreu, ouvindo-se entã o em sua câ mara suaves melodias de origem
misteriosa, que se atribuíram aos anjos, festejando a seu irmã o terrestre. A força e gló ria
de S. Luís estiveram em que ele foi um precursor do culto ao Sagrado Coraçã o,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 59
DIA 22
O General de Sonis, uma das mais brilhantes figuras do exército francês, nascido nas
Antilhas, era tã o bravo soldado quanto fervoroso cristã o. Descuidado de seus deveres
religiosos a princípio, muito influiu em sua resoluçã o de os praticar um simples fato: a
visita confortadora que lhe fez um sacerdote para ele desconhecido, o Pe. Ponce, quando
o jovem e suas irmã s choravam inconsolá veis e só s a morte de seu pai, ocorrida no curso
de uma viagem, longe da família e num lugar onde ninguém os conhecia.
“Cada palavra desse padre me calava na alma, escreveu depois Sonis, e quando ele nos
deixou, eu estava convertido; depois fui sempre avançando, porque, desde que se
começa a amar a Deus, nã o é possível mais achar que se o ame bastante”. Na escola
"Saint Cyr", foi na sua época um dos raros alunos que nã o hesitavam em se declarar
cristã os. Enviado para a guarniçã o de Limoges, mostrou-se aí um verdadeiro "miles
Christi": todos os dias à s 5 horas da manhã mesmo no maior rigor do inverno, via-se o
jovem oficial da cavalaria dirigir-se à catedral, ouvir atentamente a Missa e voltar ao
quartel. Num exercício militar o seu cavalo perdeu o freio e deu-lhe uma queda que
poderia ser mortal; seu primeiro ato, logo que ficou livre, foi ir à igreja, em grande
uniforme como estava, fazer a via-sacra em açã o de graças. Tinha em sua sala de re-
cepçõ es uma imagem do Sagrado Coraçã o, diante da qual ardia sempre uma lâ mpada.
Comungava todas as semanas, e fazia diariamente a visita ao SS. Sacramento, como que
montando guarda diante do trono do Rei do Céu. "Pois que aí está presente, é onde se
deve ir tomar suas ordens todos os dias". Magoava-o qualquer desrespeito à religiã o, e
seus inferiores, sabendo-o refreavam-se: um soldado, em certo exercício soltou uma
blasfêmia, porém olhando logo em redor e vendo que Sonis estava longe, disse como
arrependido: "Foi bom que o lugar-tenente nã o ouvisse; ele se vexaria". Outra vez,
encontrando numa praça o Santo Viá tico, ajoelhou-se ali mesmo e adorou: passava num
carro aberto uma jovem mundana, que pondo-se em pé sobre o coxim, deu uma
gargalhada. Ante o insulto ao seu Deus, Sonis levantou-se, e, medindo-a de alto a baixo,
disse revoltado: "Isto te faz rir a ti?" A mulher empalideceu e ocultou-se. Em sua devoçã o
ao SS. Sacramento, promoveu a adoraçã o noturna para consolar ao Coraçã o de Jesus nas
horas em que se o deixa quase solitá rio; e comunicava o fato a seu amigo Luís de Sèze
nestes termos: "Começamos nossa obra este ano, estando na terça-feira gorda.
Procuramos assim pô r na balança dos julgamentos de Deus um pouco de amor na
concha da misericó rdia, que está muito vazia de nossas reparaçõ es, a fim de fazer o
contrapeso à malícia dos homens". Nos dias de jejum tomava uma refeiçã o ao pô r do sol
e da quinta-feira ao sá bado santo fazia-o com tanto rigor que um Religioso lhe
aconselhou moderaçã o: "Se em consciência posso bem suportá -lo, replicou ele, podereis
vó s dispensar-me?" Tomou parte nas expediçõ es à Algéria e à Itá lia em 1895, vencendo
Mês do Sagrado Coração de Jesus 60
DIA 23
O Conde de Chambord, da velha dinastia dos Bourbons, que deu tã o gloriosos reis à
França e à Igreja fiéis defensores, foi reconhecidamente um cristã o de convicçã o e de
obras, um homem de oraçã o; sem com isto deixar de ser como nã o o desconheceram os
seus pró prios adversá rios políticos, um espírito notavelmente esclarecido e culto, um
coraçã o nobre e magnífico que no exílio honrou a pá tria. A educaçã o religiosa do Conde
foi desvelada e no dia 2 de fevereiro de 1823, em que fez a sua primeira Comunhã o,
Carlos X, seu avô , dizia: "Teus destinos podem ser muito grandes, e muito difíceis os teus
deveres. Se alguma vez sentires o peso das tribulaçõ es e trabalhos insepará veis da tua
condiçã o, a lembrança deste dia te dará forças". E o adolescente o compreendia assim,
recebendo a Sagrada Eucaristia como o pã o dos fortes e dos puros. Perguntando-se-lhe
entã o a qual dos seus dois antepassados, S. Luís ou Luís XIV, desejaria ele assemelhar-se,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 61
se com uma novena regular de Comunhõ es nas primeiras sextas-feiras daqueles meses e,
oferecendo a sua vida pelo incremento de fé cristã e pela paz da França, morreu a 22 de
agosto de 1882, véspera da festa de S. Luís, estreitando ao peito a cruz cheia de relíquias
que trouxera de sua peregrinaçã o a Jerusalém.
DIA 24
No dia 5 de junho de 1841 recebia a unçã o sacerdotal em Turim o jovem Joã o Bosco, que
por suas obras admirá veis foi depois chamado o Vicente de Paulo do século XIX. Aos dois
anos de idade ficou ó rfã o de pai, e o educara sua mã e de cujas virtudes cristã s se pode
ajuizar por dois fatos. Um dia, atravessando uma rua na ocasiã o em que um velho aí
proferia palavras escandalosas, voltou-se para o filho que a acompanhava e disse: "Meu
filho, se jamais tivesse de te assemelhar a este infeliz, eu pediria a Deus que te desse já a
morte". Outra vez, aconselhando alguém a S. Joã o Bosco que se fizesse padre secular,
porque lhe seria mais fá cil conseguir uma alta posiçã o, a mã e acudiu logo: "Filho, se
fazendo-te padre viesses a enriquecer, sabe que eu nã o poria mais os pés em tua casa;
pobre nasci, pobre quero ficar; uma só coisa me interessa; é a salvaçã o de tua alma". E
correspondendo ao sentir de sua mã e, D. Bosco só quis fazer o bem; a divisa que mais
tarde escolheu, e que se ligou a todas as suas obras, di-lo muito claro: "Dai-me almas e de
tudo o mais privai-me". Feito sacerdote, entrou para o Instituto de S. Francisco, no qual
se aperfeiçoavam os padres no conhecimento da moral prá tica e na pregaçã o, e se
exercitavam no sagrado ministério, visitando os pobres, os enfermos e os presos. Nessa
aprendizagem teve ele ocasiã o de ver muitos jovens e até meninos que se tornaram
presas do vício e do crime pelo abandono em que se achavam e maus exemplos dos que
os cercavam; contristado pensou logo o jovem em fazer alguma coisa para remediar a
tã o grande mal. Nessas disposiçõ es, poucos dias depois, preparando-se para celebrar a
Missa, ouviu gritos; indagada a causa, era que o sacristã o, à busca de quem ajudasse a
Missa, batera em um menino que a isto se recusava, aliá s por nã o o saber. D. Bosco
tranquilizou ao pequeno, pedindo- lhe só que assistisse ao ato, e, acabado que foi,
interrogou-o, verificando que ignorava de todo a religiã o. Tomou a si instruí-lo, e nessa
mesma tarde lhe ensinava a fazer o sinal da Cruz. O catecismo feito a Garelli atraiu
outros e outros, e ao fim de dois meses contava já uma centena de alunos; as reuniõ es
deles se chamaram desde entã o "orató rios", porque a base do ensino e o cabedal maior
da empresa era a oraçã o. Dando o ensino elementar e a instruçã o religiosa, a escola
formou também um grupo de cantores que amenizava algures o estudo. O rumor da
meninada, a aumentar cada dia mais chegou a incomodar a vizinhança, e D. Bosco por
algum tempo só os pô de reunir num descampado, ao ar livre: "Deus nã o tratará aos
meus meninos pior que as suas avezinhas", dizia ele. Aí se juntavam, ao toque de um
velho tambor e uma trombeta; faziam a oraçã o, e, aos domingos confessavam-se com seu
"pai", e iam ouvir a Missa numa igreja pró xima. Daí mesmo o proprietá rio do terreno
afinal despediu-os, alegando que eles com o bater dos pés destruíram a relva até a raiz.
Nesta conjuntura, os amigos de D. Bosco o aconselharam a ficar somente com os vinte
meninos menores e dispensar os outros. "A Providência enviou-me estes meninos
respondeu ele; eu nã o enjeitarei nenhum, ficai certos. Ela me fornecerá o que for
necessá rio, e, se nã o quiserem alugar-me uma casa, eu edificarei uma, com a proteçã o de
Maria Auxiliadora. Teremos vastos compartimentos, capazes de receber todos os
meninos que aparecerem, termos oficinas de toda a espécie, onde aprendam a profissã o
que escolherem; pá tios e jardins para as recreaçõ es; igrejas e Sacerdotes para os
Mês do Sagrado Coração de Jesus 63
educarem". Acreditaram que D. Bosco houvesse enlouquecido, e quiseram levá -lo para
um manicô mio, convidando-o a entrar num carro que o conduziria ele, insistindo em que
os seus guias subissem primeiro, fechou sobre eles a portinhola, e mandou que o
cocheiro seguisse para o destino, logrando assim os que lhe armavam a cilada. Em 1846,
o padre adquiriu um abrigo para sua obra: era uma espécie de telheiro tã o baixo, que o
Arcebispo de Turim, oficiando aí um dia, nã o podia estar de pé com a mitra; porém foi o
abençoado embriã o de que surgiu o atual santuá rio de Valdoco. O Padre vendeu umas
jeiras de terra que eram o velho patrimô nio da família, sua mã e dispô s até das joias
nupciais e preciosas recordaçõ es que ainda guardava, e tudo se empregou em acomodar
a seus destinos o casarã o tosco. A Providência veio também manifestamente em auxílio
dessa loucura da caridade: a casa chegou um dia a dever uma soma avultada e o credor
apresentou-se, exigindo pronto pagamento; na mesma ocasiã o um homem procura com
insistência a D. Bosco, e pedindo-lhe este que esperasse, ele entra bruscamente no
gabinete, depõ e sobre a mesa um pequeno embrulho, e sai dizendo: “Aceite isto, e reze
por mim”. Era precisamente a quantia que D. Bosco devia. Deus abençoava as obras do
seu servo, e fazia patente a sua santidade por meio de uma visível proteçã o até em
circunstâ ncias triviais: uma vez, devia celebrar-se numa de suas casas certa festa
literá ria e à ú ltima hora aquele a quem cabia o principal papel enrouquecera ao ponto de
nã o poder proferir uma palavra. D. Bosco chama-o, dá -lhe a bênçã o, e diz: "Deixa-me ver,
eu te vou dar a minha voz, e tu te sairá s muito bem". De fato, o menino recobrou a voz, e
o Padre ficou subitamente rouco e assim esteve muitos dias. O foco em que este santo
sacerdote buscava a inspiraçã o e a luz em todos os seus cometimentos, o tesouro de que
hauria forças e recursos para todas as suas obras, era o Sagrado Coraçã o; foi ele quem
erigiu em Roma o primeiro templo que aí existe sob tã o grata invocaçã o, e teve como
uma de suas maiores e ú ltimas consolaçõ es a de ir em pessoa inaugurá -lo em maio de
1887. Determinou também que esta fosse a devoçã o especial de todas as suas casas de
estudo e de noviciado; sob os auspícios do Coraçã o de Jesus colocou as suas missõ es da
América do Sul, a "Colô nia do Sagrado Coraçã o" se chamou a primeira que seus apos-
tó licos missioná rios fundaram no Brasil, chamando ao convívio da civilizaçã o e da fé os
silvícolas do Barreiro. "Eis, — escreve o bispo de Nice, referindo-se à vida de D. Bosco, —
eis como ele veio a ser pai de milhares de meninos desvalidos; eis como o S. Vicente de
Paulo de Turim fez tã o grandes coisas, tendo só , para o sustentar, sua fé e seu coraçã o:
eis como o pequeno grã o de mostarda se tornou em tã o pequeno tempo essa á rvore
frondosa que estende sobre a Europa e sobre o Novo Mundo seus ramos vigorosos,
cobertos de flores e de frutos".
DIA 25
Firmino Suc foi um cristã o que trilhou constante o caminho do dever e da virtude, na
quadra da vida em que o coraçã o mais se inclina à s ilusõ es e gozos do mundo, e numa
época de hostilidade aberta à s crenças, de indiferença e menosprezo por delicados
preceitos da moral. Quando seu pai, no pensamento de lhe assegurar mais fá cil acesso a
uma carreira pú blica, lhe propô s matriculá -lo numa das instituiçõ es oficiais de ensino
leigo, ele declarou logo que, a todo risco, preferia aprender com os irmã os da Doutrina
Cristã . O livro de suas notas mais íntimas registra as impressõ es que guardou da
primeira Comunhã o, quando, de mã o estendida sobre o Evangelho, diante do Crucifixo,
disse aná tema a Sataná s e protestou servir a Deus fielmente nos combates da vida. Anos
depois, referindo-se a esta jura, escrevia ele: "Renunciei eu deveras ao mal? Entre os 12
Mês do Sagrado Coração de Jesus 64
e os 20 anos há sempre alguma coisa para atirar na á gua. Há faltas que ainda me
sangram o coraçã o e me fazem chorar". Quais eram? Ei-las: "Sobretudo os meus ímpetos
de menino para com os meus, que eram tã o bons comigo, e a quem eu amava; com a
minha madrasta, que me fazia todas as vontades, e contra quem eu à s vezes gritava
como se fosse martirizado. Meu Deus, concedei-me para com todos um pouco dessa
doçura e bondade que transbordam de vosso Coraçã o". Completo o seu tirocínio fez um
concurso para as vagas nos correios e telégrafos; e foi nomeado telegrafista em Brest,
que era nesse tempo um foco de impiedade e corruçã o. Aí, continuam a relatar as suas
notas: "o pró prio excesso do perigo foi porventura a minha salvaguarda, porque vi claro
a minha situaçã o. Sem me importar do que resultasse, isto é, sem respeito humano, ia à
Missa; a princípio, fui escarnecido, mas continuei, deixando-os falar. Fazia minha oraçã o;
souberam e zombaram, mas eu continuei. Nã o saía a divagar pelas ruas e à busca de
folguedos, como outros; lançavam-me o ridículo, porém eu nã o recuava. Sou um tanto
susceptível, e ainda me admiro de que esses motejos nã o me incomodassem; era a mã o
da Providência que me amortecia a susceptibilidade, para que resistisse ao assalto.
Estou convencido de que os meus críticos dentro de si me aprovaram e me reconheciam
a coragem". Firmino tinha uma pequena imagem do Coraçã o de Jesus à cabeceira do
leito, e, ao deitar-se, a invocava e beijava: "É uma guarda, dizia, e o inimigo, o diabrete
negro, nã o ousa atacar-me ao pé dela". Era associado ao Apostolado da Oraçã o e o
praticava nos três graus, comungando frequentes vezes. Morando distante o seu diretor
espiritual, quando nã o o procurava pessoalmente, pedia-lhe conselho por carta, e era
isso a quase cada passo; deste é que se lê em seu livro íntimo: "Um amigo me explicava
os dogmas e fortalecia minha fé, quando minha razã o o interrogava com orgulho; e eu
sentia que me tornava bom e que uma força secreta e suave penetrava em mim, como o
calor a um corpo que se aproxima de um foco ardente". Transferido para o Havre, e
depois a Paris, manteve em toda a linha o seu procedimento exemplar. "Nã o se pode
abandonar os deveres religiosos sem destrilhar, notava ele, e entã o ai da honestidade!
sinto que cairia depressa, se nã o comungasse: é o taberná culo que faz os fortes. O
Coraçã o de Jesus é Deus inteiro num peito humano: mil vezes feliz quem o compreende.
Chamam "devoçã o nova" a do Sagrado Coraçã o. Nã o há nada de novo na Igreja. Ele é um
centro, é uma conjunçã o de forças divinas e de oraçõ es humanas sob um vocá bulo mais
vibrante. Sempre se procurou o Coraçã o de Jesus, o belo livro da "Imitaçã o" o prova, e a
humanidade cristã sempre bebeu nessa fonte e aí se saciou. Eu corro sempre a este san-
tuá rio, e dele trago um que de melhor, que lá renovo todas as vezes que me sinto
fraquear". Com a oraçã o ele tinha outro meio de combater as tentaçõ es: era o trabalho.
Fez estudos sérios sobre monumentos e antiguidades sacras, que mereceram os aplau-
sos dos eruditos e mestres que os leram. Suas pró prias distraçõ es eram boas e santas:
"Eu desenho um pequeno vitral que tem no meio um Sagrado Coraçã o respirando amor.
Tudo distrai; o espírito, a consciência, o corpo, tudo em nó s aspira ao repouso pela
liberdade; mas a verdadeira liberdade, o verdadeiro repouso é o dever". Mandam-no
para Nice, e aí se repetem logo as zombarias de seus companheiros de serviço contra o
"clerical"; à refeiçã o motejam porque guarda a abstinência, e ele delicadamente lhes
oferece o que tem; perguntam-lhe escarninhos se ele vai à Missa, e responde corajoso: "E
vó s por que também nã o ides?" Acabam afinal respeitando-lhe as convicçõ es e o
proceder. Impelido sempre a avançar no caminho da virtude, resolve-se um dia a
abraçar o sacerdó cio; mas o seu débil organismo estava já invadido pela tuberculose, e o
mal progrediu rá pido. Recolhendo-se ao seio da família, fez colocar bem perto do leito a
imagem do Sagrado Coraçã o que sempre o acompanhava, “a fim de poder vê-la bem e
ouvi-la, quando lhe quisesse ela falar”; e pediu também um novo escapulá rio. A uma
senhora que o visitou no dia em que recebera os ú ltimos sacramentos, disse tranquilo:
"Prepararam-me esta manhã com todo o preciso para a grande viagem... Se bem que seja
um erro falar assim, porque Deus nã o está longe. Dando até o ú ltimo instante o exemplo
Mês do Sagrado Coração de Jesus 65
da vida cristã , morreu em 1887, contando 23 anos de idade completos nesse mesmo dia,
a 17 de fevereiro. Seus funerais tiveram o concurso de todas as classes sociais; o escritor
cató lico Marques de Ségur publicou o "Jornal de Firmino Suc", e o Pe. Laurienne traçou-
lhe a biografia, consignando nela o seguinte depoimento do seu diretor espiritual: "Estou
convencido de que foi pela sua extraordiná ria devoçã o ao Sagrado Coraçã o que ele veio
a ser o consumado modelo de jovem cristã o, que todos conheceram".
DIA 26
Isabel Maria Cabral, de ilustre família que teve, em 1910, um digno representante entre
os Padres da Companhia que a fú ria carboná ria perseguiu e desterrou de Portugal, foi
também uma flor peregrina que vicejou ao calor do Sagrado Coraçã o. Quando ainda em
botã o no lar, lá o perfumava com o aroma de finas virtudes. Dó cil à s recomendaçõ es dos
pais, terna e desvelada com os irmã os, de quem atenuava as pequenas faltas, quando nã o
as podia prevenir, foi considerada e chamada o anjo da família; para vê-la recolhida e
como que a meditar, bastava dar-lhe uma pequena imagem. Desde que fez a sua
primeira Comunhã o, adotou como exercício cotidiano o exame de consciência, a oraçã o
mental, e as leituras de piedade, escolhendo livros como a "Imitaçã o de Cristo", os
escritos de S. Francisco de Sales e de Sta. Margarida Maria, os opú sculos de Mons. Ségur,
e outros como esses; por trabalho tomou o de fazer roupas para os meninos pobres e
preparar fios para o tratamento de feridos no hospital; e do que entrava em seu
bolsinho, dava quase tudo aos necessitados, e, tendo por mestra uma senhora cuja
família se arruinara, mais por isso a queria e respeitava, empenhando-se com os pais em
que a protegessem. Na estaçã o calmosa, a família Cabral ia para uma casa de campo na
freguesia de Real, perto de Braga, e Isabel aí organizava peregrinaçõ es de jovens do
lugar para um santuá rio vizinho, e com Luís Gonzaga, seu irmã o mais moço, fazia tam-
bém uma espécie de excursõ es apostó licas aos arredores, dando à s colinas, bosques e
rios que via, os nomes de Jesus, da SS. Virgem e dos Santos, como se fossem terras que
descobrissem para Cristo. O seu culto era o do Sagrado Coraçã o, e quis que em sua honra
se celebrasse anualmente uma festa na capela de Real, assim como, logo que pô de viajar,
foi em romaria ao santuá rio de Paray. Embora pertencendo à alta sociedade, Isabel tra-
java com a maior modéstia, quase sempre de branco, por ser a imagem da pureza, e um
dia, recebendo, em mimo, de um velho tio cô nego, um par de argolas de valor, mas de
mau gosto e fora do uso, a despeito de que os irmã os se pusessem a rir do presente, essa
foi a joia que ela preferiu para ir no mesmo dia a uma festa brilhante e muito concorrida.
Nã o surpreendeu, pois, a vocaçã o religiosa manifestada por Isabel, ao terminar os
exercícios espirituais feitos para conhecê-la; e as Irmã s Doroteias, cujo instituto ela
abraçou, desde o seu noviciado puderam atestar: "Ela amoldou-se tã o facilmente a todos
os nossos costumes, que parecia ter vivido sempre no exercício da Regra". Sob a
disciplina religiosa, as virtudes e o fervor de Isabel cresceram, e em suas cartas liam-se
trechos como este: “Pede para mim o desejo dos sofrimentos um grande amor a Cruz, a
completa renú ncia aos meus gostos e vontade para substituí-la pela do Coraçã o de
Jesus”. E seu culto ao Divino Coraçã o foi tã o ardente, que deixou na comunidade a
prá tica de se lhe cantarem estrofes na visita do SS. Sacramento, que precede a recreaçã o
das noviças, Isabel procurava sempre o ú ltimo lugar, escolhia, quanto possível, o que era
de menor valor, desfazia-se de todo o supérfluo, a trazia enquanto lho deixavam, roupas
e calçados usados que por suas mã os consertava. Um dia enviou a seu irmã o Luís
Gonzaga, professo na Companhia, um desenho seu à pena representando os coraçõ es
Mês do Sagrado Coração de Jesus 66
dos dois unidos ao pé da Cruz por uma corrente que os prendia ao Sagrado Coraçã o e
que se pregava na cruz por três cravos, emblema dos votos religiosos. Outra vez,
escrevia-lhe: "Sei que tem pregado, e me dá prazer isto: quantas almas se podem salvar
por este meio. Quanto a nó s que nã o dispomos desse e de outros recursos, tomamos
coragem meditando no que disse o Pe. Rodrigues de vossos Irmã os coadjutores, que sem
pregar nem confessar, podem obter a salvaçã o de tantas almas". Curta, mas assim toda
cheia de santas aspiraçõ es e exemplos edificantes, foi a vida de Irmã Isabel Cabral.
Quando transpusera de pouco só os 26 anos de idade, enfermou gravemente; a suas
companheiras que faziam uma novena impetrando a sua cura, dizia sorrindo: "Nosso
Senhor nã o quer ouvir o vosso pedido; na festa de Sta. Doroteia, estarei no céu". Já antes
disso, estando uma vez em suas funçõ es de mestra de desenho, uma irmã chegou-se e
pediu-lhe um objeto de que precisava: "Vede, lhe disse, a disposiçã o de todas estas
coisas; breve me substituireis". E assim foi. De outra vez anunciou que nã o tardaria a
vestir o há bito completo da sua Ordem o que só se fazia no leito de morte. No segundo
dia de moléstia, quis receber o Viá tico, e, perguntando-lhe a superiora se Nosso Senhor
nã o a deixaria ainda viver, como suas Irmã s desejavam, respondeu: "Ele me disse que eu
vá para o céu, de lá vos ajudarei muito; eu orarei por vó s, por esta casa, por todos". Mais
tarde recebeu ainda os sacramentos e a bênçã o papal, e dizendo em voz forte: "Como é
doce fazer a vontade de Deus!" expirou. Na Congregaçã o de Sta. Doroteia como noutras,
é costume tirar por sorte o ofício que se há de exercer cada mês, em hora determinada,
para com o Sagrado Coraçã o. Nesse mês coubera a Isabel o ofício de "vitima", e sua hora
de culto e uniã o era de onze à meia noite; e nesta hora morreu numa sexta-feira.
DIA 27
O Dr. Agostinho Fabre foi um médico ilustre pelo saber, por sua corajosa fé cristã e pela
extrema caridade com que exerceu sua profissã o. Filho de um rico negociante, ele teve a
fortuna como um bem secundá rio e do qual devia aplicar sempre à s boas obras o
supérfluo: indo fazer em Paris os estudos superiores, mobiliou tã o modestamente os
seus aposentos, que sua pró pria mã e, ao visitá -lo, o estranhou ; e empregava em esmolas
uma boa parte da pensã o que recebia. Ainda estudante, alistou-se nas Conferências de S.
Vicente de Paula, distinguindo-se entre os mais zelosos de seus membros, e numa prova
pú blica do tirocínio acadêmico sustentou a sua crença na Providência Divina, sem
nenhum temor dos ouvintes e juízes eivados do materialismo e que se lhe mostravam
hostis. Aos 28 anos era professor, e com o brilho e vigor de suas liçõ es prendia os
discípulos, como escreveu um deles, fazendo conhecido seu nome na Europa e citadas
com apreço as suas obras nas principais revistas médicas. Mas, ao contrá rio dos que
desprezam tudo o que nã o podem trazer para o campo de suas observaçõ es de modo a
analisá -lo e decompô -lo, Agostinho Fabre via a reger e presidir o universo uma causa
suprema que lhe explicava o equilíbrio e a harmonia dos seres, e queria "a ciência
esclarecida pela fé e Deus glorificado pela ciência". No exercício da medicina tanto o
caracterizava o desinteresse unido à generosidade, que vulgarmente o chamavam o
"médico dos pobres", tinha para todos estes um dia da semana, e era certo vê-los
apinhados na rua a esperarem a sua vez da consulta, na qual lhes dava com a receita o
dinheiro para a botica e o mais necessá rio. Acudia aos enfermos com verdadeiro carinho,
dirigindo-lhes palavras de conforto, lendo-lhes à s vezes uma pá gina da "Imitaçã o de
Cristo", e prestando-lhes qualquer serviço preciso na ocasiã o. "Eu tomarei os remédios
que indicais, disse-lhe um dia uma doente, porque sois um santo". O bom doutor sorriu,
Mês do Sagrado Coração de Jesus 67
e, voltando-se para o berço onde dormia uma criança, inclinou-se, beijou-a na fronte, e
respondeu: "Eis o santo, aquele que nunca ofendeu a Deus". Cató lico de ideias e obras,
Fabre foi quem promoveu em Marselha a organizaçã o da “Liga do Coraçã o de Jesus”, e
com tanto zelo e êxito, que em poucos meses, no ano de 1874, a diocese enviava a Paray-
le-Monial uma peregrinaçã o levando rica oferenda simbó lica em que iam inscritos os
nomes dos primeiros 50 mil associados da "Liga". Instituiu também a obra da "Adoraçã o
noturna" da quinta para a sexta-feira, sendo o primeiro a apresentar-se: foi proposto
que lhe coubesse a primeira hora para que pudesse repousar dos labores do dia, mas
recusou-o e quis que se fizesse por sorte a distribuiçã o das horas e qualquer que fosse a
sua, ficava até a hora da Missa que encerrava o exercício. Quando a perseguiçã o religiosa
quis fechar o santuá rio e hospício de Notre Dame de la Garde ele como administrador
invocou a lei contra o atentado e deitou-se de través, na porta do corredor: os dois
comissá rios passariam sobre seu corpo, mas os agentes da polícia recuaram.
Anunciando-se que seria punido, os alunos da escola mé dica, "sem distinçã o de
opiniõ es", protestaram na imprensa, e no primeiro dia de aula receberam-no com
brilhante ovaçã o. A um amigo que o aconselhava a poupar-se, respondeu: "Eu
descansarei no céu". Na lida, à cabeceira de um enfermo, sentiu os primeiros sintomas
da morte, e voltou pressuroso a casa, mandou chamar o cura para lhe administrar os
sacramentos, despediu-se da esposa, confortando-a, e teve ainda nessa hora extrema um
pensamento para os pobres, pedindo que mandassem levar a certa pessoa, que indicou,
uma quantia que lhe prometera. À hora em que morria, um agente policial batia à porta,
acompanhado de uma mulher que clamava: "Digam que é para um pobre, que é certo ele
vir". Ao ouvir que o Dr. Fabre estava à morte, o agente disse comovido: Só assim é que a
um pobre ele nã o acudiria". Nesse mesmo dia, celebrava-se na igreja de S. José a
assembleia anual do "Comitê cató lico", e o lugar do Dr. Fabre, um dos primeiros, estava
ali vazio; o Cardeal Perraud assinalava-o com lá grimas, dizendo: “Esta manhã , Marselha
foi fulminada por nova consternadora: o Dr. Fabre morreu; o amigo dos pobres, o
sustentá culo de todas as Obras que interessam a Igreja e as almas. A grande oraçã o
fú nebre desse cristã o será feita pelo pranto dos pobres, pela saudade de todos, e por
essa revelaçã o que segue a morte e que nos deixa entrever as eternas recompensas das
virtudes cristã s”.
DIA 28
Aos incrédulos e mundanos parece incrível que alguém queira viver peregrinando e a
mendigar por amor de Deus e do pró ximo; julgam-no desprezível e condená vel como
sinal de indolência e profissã o de ociosidade. S. Bento José Labre o quis e praticou, de
modo tal que foi para ele o mé rito e uma gló ria, e a Igreja, elevando-o a seus altares,
mostrou que também isto pode ser um meio de santificaçã o, e que os infelizes que as
vicissitudes da vida forçam a implorar a esmola tem no céu um patrono especial para
lhes ensinar a resignaçã o à s repulsas e à confiança na Providência. Bento Labre, educado
por um tio pá roco de Erin, manifestou desde cedo inclinaçõ es piedosas e capacidade
intelectual que deram esperanças de que viesse a abraçar o sacerdó cio. Reservava para
os pobres o melhor de suas refeiçõ es, lho ia distribuir à s ocultas; entre os companheiros,
a uns aconselhava, a outros repreendia amigá vel, e reconciliava os desavindos, fazendo
tudo isso tã o habilmente, que o povo o chamava o "pequeno Cura". Grassando uma peste
na freguesia, ele, embora avisado pelo tio de que se deve acautelar, o acompanha sempre
à visita dos enfermos, expondo-se de perto ao perigo; e toma sobre si a tarefa de alguns
Mês do Sagrado Coração de Jesus 68
dos atacados, indo cuidar dos rebanhos que eles guardavam, ou carregando à s costas
fardos de forragem que deveriam transportar. Morrendo de peste seu tio padre, Bento
Labre, logo que pô de, recolheu-se à Cartuxa de Neuville, e depois, em busca de um ins-
tituto mais rigoroso, a Trapa de Sept-Fons, onde os superiores, embora edificados pela
sua conduta, nã o o puderam conservar pela declaraçã o dos médicos de que era muito
débil para observar a Regra. Destinava-o Deus à singular funçã o de passar entre os
povos como um vivo exemplar do Divino Crucificado, lembrando aos ricos o "quid
prodest?" (que se lucra?) que tantas vezes lhes segreda o vá cuo d'alma, e fazendo ver
aos indigentes que a pobreza aceita e paciente é um tesouro que enriquece e alegra a
alma. Com uma pobre veste, um bastã o, o Crucifixo pendente ao peito e um rosá rio de
grossas contas passado ao pescoço atravessou a pé extensas regiõ es da França, Espanha,
Itá lia e Alemanha, visitando os santuá rios mais notá veis, onde ficava longas horas
embebido na oraçã o. Circunstantes, e quem era desconhecido, viram-no por vezes nos
templos, cercado de uma auréola que mal deixava perceber numa quase escuridã o os
que se achavam em redor, com os olho fitos no céu e suspenso do chã o. Seu peregrinar
nã o era nem um instante ocioso; caminhava, fazendo sempre o bem: aqui, a consolar um
aflito; ali, a dar um conselho de salvaçã o ou a pensar um enfermo; adiante, a obter do
céu uma graça para quem o beneficiara, e, a miú do, a repetir com seus irmã os indigentes
a esmola toda que recebera. Numa de suas viagens, recolheu-se atacado de febre ao
hospital de Paray-le-Monial, onde tanto impressionaram à s Irmã s o seu aspecto
penitente e atos de virtude, que elas guardaram com apreço as migalhas de pã o que
deixou de suas refeiçõ es; e as Religiosas da Visitaçã o por sua vez nã o esqueceram nunca
o êxtase fervoroso em que ele ficava longas horas no lugar das apariçõ es do Salvador.
Em Roma, ia frequentemente orar numa capela da igreja do Gesu, onde havia um painel
do Sagrado Coraçã o; e nas igrejas em que se fazia a adoraçã o das "Quarenta-Horas",
pedia que o deixassem passar a noite de guarda ao Santíssimo Sacramento. Antes de
dormir, todos os dias se consagrava ao Divino Coraçã o dizendo: "Eu quero de toda a
minha alma repousar em vossa santa graça. Este coraçã o que me destes onde melhor o
posso colocar do que no vosso? É aí que eu o deposito, é meu doce Jesus! É aí que eu
quero habitar e que desejo tomar o meu descanso". Sua vida foi "um ato contínuo de
adoraçã o", que veio a encerrar-se com a mais suave morte numa quarta-feira santa, em
que ouviu muitas Missas e à leitura da Paixã o se desfazia em lá grimas e caía em delíquio.
O corpo ficou insepulto até a Pá scoa e se conservou flexível como se estivera só
adormecido, sem a mais leve exalaçã o má . O povo afluiu em massa a contemplar e
bendizer o "Santo das Quarenta-Horas" e foi um verdadeiro cortejo triunfal, mais sincero
que o dos antigos Césares Romanos, o préstito para o enterramento desse mendigo que
comia um pã o esmolado e dormia ao relento!
DIA 29
A virtude perfeita de uma pequena operá ria é a joia que o Sagrado Coraçã o agora nos
expõ e em seu preciosíssimo escrínio. Maria Husson, desde criança, conheceu e suportou
paciente as privaçõ es que sã o como que a herança dos pobres. Quando os bandos de
meninas, passando aos saltos e carreiras para o vale ou a montanha, lhe gritavam: "Vem
brincar conosco, o dia está tã o bonito!" — ela que devia guardar a casa, porque-seus pais
tinham ido trabalhar no campo, respondia sem pesar e sem queixa: - "Eu tenho as pernas
fracas para correr, e meu coraçã o bate muito quando subo ao monte". Entrando para a
escola de Rignat ganhou depressa a estima da mestra pela sua conduta exemplar e vivo
Mês do Sagrado Coração de Jesus 69
desejo de aprender, que, favorecido por uma inteligência clara e penetrante, lhe
alcançou rá pidos progressos. Suas pró prias condiscípulas reconheciam que ela se
distinguia entre todas, e nã o lhe queriam mal por isso. Algumas delas uma vez
observaram entre si: "Que tem Maria que nó s também nã o tenhamos? Nó s fazemos o
que ela faz: ler, coser, estudar, ir à Missa, e o mais. Isto nã o é nada extraordiná rio;
entretanto..." Uma das mais atiladas e francas acudiu entã o: "Nã o há nada extraordiná rio
nisto; mas olha, o extraordiná rio é fazer todas essas coisas do melhor modo possível, e
sempre bem, como Maria o faz, ao passo que nó s, tu sabes...!" — Maria, porém, nã o pen-
sava em sobressair nem se julgava superior à s outras; o que ela queria, só era aprovei-
tar-se bem das liçõ es recebidas, e todos os dias ia pedi-la a Jesus na igrejinha da aldeia,
falando-lhe como se o visse com os seus olhos. Nas instruçõ es do padre sobre a primeira
Comunhã o, ela ouviu que deviam confessar todos os pecados, mas que só era pecado o
fazer voluntariamente alguma coisa proibida por Deus ou recusar-se ao que ele
mandava; Maria estava quase certa de nunca ter tido essa vontade contrá ria a Deus, e foi
o que com toda a candura acusou ao sacerdote, o qual, encantado da confissã o que
ouvira, encaminhou-a contente para os braços de Jesus como um anjo terrestre. Acabado
o tirocínio escolar, a fim de ganhar logo honradamente os meios de vida, por ser de
compleiçã o fraca, abraçou a profissã o de costureira que lhe proporcionava trabalho,
porém deficiente à s vezes e mal remunerado, dando-lhe, porém, ocasiã o de, no trato com
a freguesia ou nas diligências da tarefa, aconselhar ao bem ou desviar do mal, e nã o
poucas vezes socorrer outras ainda, mais necessitadas que ela. Para fazer tais prodígios,
vestia com simplicidade e modéstia, e em sua mesa havia só o necessá rio para que nã o
padecesse fome; em compensaçã o, o seu tesouro de virtude crescia, e o Cura de Rignat a
apontava como a melhor cristã de sua freguesia. As crianças amavam-na como a uma
verdadeira mã e, e os adultos a consultavam nas mais sérias dificuldades, e queriam-na à
sua cabeceira na hora da morte. Maria Husson começava e acabava o dia, pedindo
inspiraçõ es e Forças ao Coraçã o de Jesus, e sempre lhe parecia ouvir dele: "Avante! Sede
cada vez mais humilde e delicada por amor de mim". Mas, humilde embora, como Jesus,
a meiga operá ria teve um dia um grito de indignaçã o contra um insolente que em lugar
pú blico insultava uma pobre jovem: "Nã o mereceis a honra de ser homem, pois que
falais como se fô sseis um bruto!" E ele emudeceu e fugiu. Tendo-se fechado a escola
infantil, Maria, sem olhar a sacrifícios, decidiu-se a restabelecê-la, ensinando ela mesma;
e o fez de modo admirá vel e proveitoso durante seis anos, em que instruiu solidamente
suas discípulas para os trabalhos e deveres da vida, e formou com elas uma legiã o de
cristã s que, pelos seus cuidados e esforços, vestidas de branco, e em concertos angélicos,
solenizavam anualmente a festa da primeira Comunhã o e a procissã o de "Corpus
Christi". O abatimento das forças e as exigências que lhe fez o representante do ensino
oficial obrigaram-na a retirar-se da escola; porém, saindo logo a esmolar, colheu daqui e
dacolá uma quantia com que pô de fornecer a duas Religiosas de Chastei a casa e o estrito
necessá rio para que viessem ensinar em Rignat, adicionando ela a esse modesto cabedal
tudo quanto da pró pria mesa podia reservar. Por ú ltimo, ao voltar de uma detida visita
ao santo Cura d'Ars, veio a arder em um novo zelo e toda entregue à ideia de que se
devia dar a Jesus em Rignat uma habitaçã o digna, pois que a sua estava nua e arruinada,
tomou a agulha e, trabalhando dia e noite, condenando-se a privaçõ es pô de fornecer, ao
serviço do altar, paramentos, alfaias, ornatos, operando uma transformaçã o ante a qual o
povo dizia: "Como pode ela fazer tudo isto? Parece que Deus manda os anjos a ajudá -la;
há igrejas de grandes cidades que nã o se ornam como a nossa". Depois tratou da res-
tauraçã o do templo, e apelou para todos, aceitando o concurso em dinheiro, materiais ou
dias de trabalho; ninguém ficou ocioso: enquanto os homens trabalhavam na construçã o,
as mulheres iam ao vale buscar á gua para fazer cal e a argamassa. E assim ergueu-se
uma bela igreja gó tica, mais vasta que a primeira. Coroados assim todos os seus pios
desejos, chamou-a Deus a contemplá -lo em toda a sua grandeza e gozá -lo em todo o seu
Mês do Sagrado Coração de Jesus 70
DIA 30
O luminoso cortejo que no decurso deste mês temos visto desfilar em honra ao Sagrado
Coraçã o, fecha hoje com o vulto de um egrégio brasileiro: D. Vital, bispo de Olinda. Um
traço da sua infâ ncia revelava já , como que em gérmen, a vocaçã o religiosa que mais
tarde lhe encheria nobremente a vida: morando perto da igreja, seus pais vinham achá -
lo muitas vezes ali, a ouvir a Missa, ou rezando muito devotamente. No colégio de
Benfica onde fez os estudos secundá rios, como escreve o seu professor de latinidade,
captou depressa a estima e apreço de mestres e alunos, e ocupava sempre nas aulas o
primeiro lugar. Depois entrando para o Seminá rio, tanto se recomendou por seu talento
e piedade que o Prelado lhe facultou em prêmio o ir acabar seus estudos em Paris, no
seminá rio de S. Sulpício. Aí sustentou brilhantemente as teses finais de filosofia, e, como
informa um companheiro, superiores e iguais o viam sempre cingido ao regulamento, e,
se por acaso incorria na menor falta, a reparaçã o era pronta. Mas, na grande capital
francesa em que tantas vezes se desvaneceram aspiraçõ es piedosas, no afamado
instituto eclesiá stico em que se formavam os combates para os primeiros postos da
milícia cató lica, Vital só teve uma ambiçã o: professar numa Ordem religiosa, pobre e
humilde. Recolheu-se para isso em 1863 ao convento dos capuchinhos em Versailles,
onde fez o noviciado, indo depois para o de Toulouse, que era a sede dos estudos na
Ordem. “Parecia deliciar-se nas privaçõ es que o cercavam”, relata um visitante (o Pe. Dr.
Barroso). E, falando sobre a sua pró xima profissã o, dizia: “Ora muito por mim, a fim de
que Jesus faça deste seu indigno servo um perfeito religioso, um verdadeiro filho do
Serafim chagado de Assis”. Em 1868, ordenado presbítero, ele era logo chamado para o
seminá rio de S. Paulo no Brasil, que estava sob a direçã o dos Religiosos capuchinhos; e
lhe foi ali confiada a cá tedra de filosofia, que regeu com toda a proficiência. Porém a
muito mais alta missã o destinava a Providência o exemplar sacerdote que sob o rude
burel, quisera furtar-se à s honras e dignidade. Em 1871 surpreendeu-o, em seu retiro, a
nomeaçã o para bispo de Olinda, e nã o houve escusas que o livrassem. A 24 de maio de
1872, do só lio de sua catedral saudava o rebanho e desejava-lhe a paz, "nã o a paz
fementida e efêmera do mundo, compará vel à vaga do oceano que expira aos pés do
homem sem poder atingir a sua parte superior e divina, mas a paz de Deus, que se baseia
no cumprimento do dever, no testemunho da consciência pura, e que acompanha o
cristã o até a eternidade". Mas a paz que aí entã o reinava era, em grande parte, a da
confusã o e indiferença religiosa, a de um culto que se satisfazia de meras exterioridades
e bania o essencial; a paz de uma aliança enganadora e funesta em que as lojas
maçô nicas se enchiam com o seu pessoal, e com a sua ímpia orientaçã o desvirtuavam os
sodalícios cató licos. D. Vital viu, constrangido, o perigo crescente, nã o poupou meios
brandos e suasó rios para sustar o mal; o inimigo, porém, respondeu, atacando pela sua
imprensa os dogmas de fé e a pureza da SS. Virgem, pretendendo comemorar a fundaçã o
de lojas com solenidades na igreja, e fazendo-se eleger presidente de uma confraria que
tinha sua sede pró xima do palá cio do Bispo um chefe da seita que em seu jornal
blasfemava das coisas sagradas. Lançado entã o o interdito sobre as Irmandades
Mês do Sagrado Coração de Jesus 71
refratá rias, exasperou-se o ó dio sectá rio, e o Bispo foi preso e arrastado à barra do
Supremo Tribunal. Do Episcopado, das Câ maras, da imprensa jurídica, de todas as
classes sociais, levantavam-se protestos; mas ao leme da nau do Estado se achava o
Grã o-Mestre do Oriente, e a condenaçã o se fez, contra o voto de um só dos juízes. D.
Vital, quando lhe apresentaram o libelo para dizer em sua defesa, escreveu somente as
palavras do Evangelho sobre o interrogató rio de Cristo no tribunal de Caifá s: "Jesus se
calava: "Jesus autem tacebat". Devotíssimo do Sagrado Coraçã o, fora ele quem primeiro
havia divulgado no Brasil, por uma traduçã o sua no verná culo, um livro de exercícios do
mês dedicado a esse culto; ao Coraçã o de Jesus, por uma pastoral expedida aos 12 de
junho de 1874, da fortaleza em que o prenderam, antecipando-se a consagraçã o
universal decretada por Pio IX, consagrou ele a sua diocese dizendo: "Entremos por
aquela porta da vida, que no lado do nosso adorá vel Salvador foi aberta de par em par
dessa fonte perene de todas as graças; permaneçamos nesse paraíso de delícias inefá -
veis, até o nosso ú ltimo alento". Mudando a situaçã o política, o novo governo, em setem-
bro de 1875, anistiou os eclesiá sticos envolvidos no conflito religioso, e D. Vital, desde
que lhe foi restituída a liberdade, quis ver a Pedro, quis ouvir o Vigá rio de Jesus Cristo,
que o acolheu com toda a confiança e o cumulou de atençõ es; no aniversá rio da sua
prisã o em Olinda, ele celebrava o santo Sacrifício no Cá rcere Mamertino. A 6 de outubro
seguinte D. Vital voltava à sua diocese, e do pú lpito da igreja de Sã o Pedro, falava assim
ao amado rebanho: "Bendito seja Deus, desencadeando a procela; bendito seja Deus
trazendo-nos a bonança! Conseguiu a mã o da violência, arrancando o Pai do seio da
família, atirá -lo para bem longe; mas nã o logrou que ele a esquecesse um momento
sequer. Lá mesmo na solidã o do cá rcere fostes o objeto contínuo das nossas vigílias, a
imagem constante dos nossos sonhos. E quem, senã o essa mesma pastoral solicitude nos
impeliu a atravessar o Atlâ ntico, em demanda da Cadeira Apostó lica, centro da unidade?
Pela segurança do rebanho cometido à nossa vigilâ ncia, nã o cessaremos de propugnar
um só instante. Venha de novo o cá rcere com todas as suas provaçõ es: já o conhecemos.
Venha o desterro; empunhando o bastã o de peregrino, tomaremos o caminho do exílio.
Venha a pró pria morte violenta ou traiçoeira: nada de tudo isto, saiba a impiedade, nos
há de acobardar o â nimo. Sim, venha a morte por amor do rebanho estremecido; venha
essa morte tã o bela! A cruz no peito, Jesus nos lá bios, os olhos no céu, recebê-la-emos
radiante de prazer. Será s, ó morte gloriosa, o nosso maior triunfo". Em 1877 o ínclito
bispo veio ainda ao Rio de Janeiro, de onde partiu com uma romaria brasileira, para a
França, visitando nessa ocasiã o alguns dos grandes santuá rios desse país e da Itá lia. Em
todas as suas viagens hospedava-se nos conventos de sua Ordem, onde havia, e aí
desaparecia logo à entrada o bispo, ficando só o humilde capuchinho: de uma
testemunha ocular, digna de todo o crédito, soube-se que "à s sextas-feiras, e em algumas
semanas mais vezes, sobretudo se ocorria festa Solene de Nossa Senhora, servia à mesa,
ia à cozinha lavar a louça, varria o refeitó rio, e empregava-se nos misteres os mais
humildes" e "foi surpreendido muitas vezes sozinho, descalço, em tempo de intenso frio,
a praticar a devoçã o da "Via-crucis" no claustro do convento. E tã o contente se sentia
entã o, que muitas vezes disse a um sacerdote seu amigo: "Que boa e santa vida! Quem
me dera morrer por aqui entre meus irmã os!" Sofrimentos que lhe minavam o forte
organismo, e cuja origem real seus médicos nã o puderam conhecer bem, agravaram-se
em Roma no mês de janeiro de 1878, e, aconselhado a voltar para a França, recolheu-se
ao Convento dos Capuchinhos em Paris, onde morreu a 4 de julho. O Religioso que lhe
serviu de enfermeiro, em carta que foi publicada, escreveu: "Durante os três meses que
passei com ele sem jamais o deixar dia e noite, nunca notei nele a menor imperfeiçã o;
nunca se queixou, nunca murmurou, nunca deu demonstraçõ es de mau humor nem de
impaciência; sempre calmo, resignado, contente e reconhecido a tudo o que se lhe fazia;
pedindo a Deus sofrer ainda mais, se esta fosse a sua santa vontade, ter o seu purgató rio
neste mundo, perdoar seus inimigos e morrer pela Igreja do Brasil... Já desde quarta-
Mês do Sagrado Coração de Jesus 72
feira tinha pedido e recebido os ú ltimos sacramentos, assistindo a esta cerimô nia toda a
comunidade reunida. O Pe. Provincial dirigiu-lhe uma tocante alocuçã o; todo o mundo
chorava, somente S. Exa. estava calmo e resignado. A partir deste momento permaneceu
ele recolhido em Deus, nã o se ocupando mais o seu pensamento senã o da eternidade. O
dia de quinta-feira passou assaz calmo, mas à noite pelas dez horas entrou em uma
suave agonia, meia hora depois disse-me ainda algumas palavras que nã o pude
compreender e à s onze horas e quinze minutos extinguiu-se docemente e em pleno
conhecimento. Acabava em um ato de adoraçã o noturna, ao entrar da primeira sexta-
feira do mês, o dia especialmente consagrado ao Coraçã o do seu amantíssimo Jesus.
Mês do Sagrado Coração de Jesus 73
ÍNDICE GERAL
Pá ginas
Ordem do Exercício Cotidiano 4
Ladainha do S.C. de Jesus 5a6
MEDITAÇÕ ES
I---- Os terníssimos afetos do
Coraçã o de Jesus
Do dia 1.° ao 14.° dia 7 a 18
II---- Desejos do S. Coraçã o
Do 15.° dia ao 30.° dia 18 a 33
Consagraçã o ao S. C. de Jesus
Do dia l.° ao dia 30 34 a 68
Mês do Sagrado Coração de Jesus 74