Conversando Sobre o Futuro

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PAR A CONVERSAR NA IGREJA

conversando sobre
O FUTURO
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO
SÉRIE PARA CONVERSAR NA IGREJA

Copyright © Editora Ultimato


Todos os direitos reservados

Primeira edição eletrônica: Fevereiro de 2021


Coordenação editorial: Reinaldo Percinoto Jr.
Preparação: Marcos Bontempo
Klênia Fassoni
Ariane Gomes
Capa: Ana Cláudia Nunes
Diagramação: Bruno Menezes

PUBLICADO NO BRASIL COM TODOS OS DIREITOS RESERVADOS POR:


EDITORA ULTIMATO LTDA
Caixa Postal 43
36570-970 Viçosa, MG
Telefone: 31 3611-8500
www.ultimato.com.br

facebook.com/editora.ultimato twitter.com/ultimato instagram.com/editoraultimato


SUMÁRIO

Introdução à série 5
Como usar 7
Introdução 8

1. Velhinhos gente boa 10


Rubem Amorese

2. Aprendendo a envelhecer 15
Joel Tibúrcio de Sousa

3. Um culto. Muitas gerações 21


Reinaldo Vieira Lima

4. Aposentar não é deixar de ser produtivo 26


Robert Liang Koo

5. Ame o idoso 30
Augusto Gotardelo

6. Cheguei aos 57 anos! 36


Cláudia Barbosa

Recursos 39
Frases 41
Livros sugeridos 44
PARA CONVERSAR NA IGREJA

INTRODUÇÃO À SÉRIE

PARA CONVERSAR NA IGREJA é o nome da série de e-books


da Editora Ultimato, pensada e organizada tendo em vista a
comunhão e o desenvolvimento integral da Igreja em dife-
rentes campos da cultura e da vida cristã em comunidade.
A série coloca à disposição do leitor uma cesta de
ferramentas e recursos para estudo em grupo ou individual,
para uso dominical e comunitário, bem como para desenvol-
vimento pessoal dos membros da igreja, possibilitando assim
o treinamento, a maturidade e o testemunho do Corpo de
Cristo (Efésios 4. 11-32).
Cada título da série oferece textos, estudos bíblicos e
outros recursos selecionados a partir do conteúdo online,
dos livros e da revista Ultimato, sempre com abordagem
cristocêntrica e bíblica de temas que a experiência milenar
da Igreja tem demonstrado ser o alicerce imprescindível, o
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

fundamento, de toda comunidade que pretenda seguir os


passos do seu Mestre e Senhor (1 João 2.5-6).
Que a graça de Deus nos dê raízes fortes, para que os frutos
sejam duradouros!

Marcos Bontempo
DIRETOR EDITORIAL

OUTROS TÍTULOS DA SÉRIE


Conversando Sobre a Oração
Conversando Sobre a Família e Seus Desafios
Conversando Sobre a Bíblia
Conversando Sobre o Racismo

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PARA CONVERSAR NA IGREJA

COMO USAR

EMBORA OS RECURSOS, TEXTOS E ESTUDOS BÍBLICOS sejam


independentes entre si e não tenham uma ordem sequen-
cial obrigatória, sugerimos a você, leitor, fazer uso de todo o
material, possibilitando o contato com aspectos diferentes e
igualmente edificantes sobre cada tema abordado.
O e-book pode ser utilizado individualmente ou em pequenos
grupos, em casa ou na igreja, em momentos especiais ou du-
rante as programações já agendadas. Por exemplo, você pode
convidar um pequeno grupo da sua igreja para estudarem
juntos este material; ou utilizar os e-books como subsídio para
seu grupo de discipulado ou classe de Escola Dominical. E tudo
isto pode funcionar online. As possibilidades são enormes e
nossa esperança é que esta “caixa de ferramentas” se torne,
de fato, uma rica oportunidade de reflexão, aprendizado e
celebração do conteúdo bíblico e da confiança do povo de
Deus no único Senhor da história.
Mãos à obra!
PARA CONVERSAR NA IGREJA
INTRODUÇÃO

CONTAR OS DIAS
PARA ALCANÇAR SABEDORIA
Christian Gillis

“Ensina-nos a contar os nossos dias para que nosso coração


alcance a sabedoria.” (Salmos 90.12)

COMO É QUE SE CONTA OS DIAS? Seria apenas a multiplicação


do número de dias de um ano (365) vezes a média da expec-
tativa de vida do brasileiro? Ou seria considerar as fases da
vida (infância, juventude etc.) e os acontecimentos próprios
de cada fase? Ou, ainda, seria analisar a história da busca
pessoal, isto é, como foram as diversas etapas da caminhada
e o cenário que se tem pela frente?
Talvez uma mistura de métodos conceda vislumbres mais
profundos a respeito do que significa uma vida, ainda que
breve e frágil. A Escritura ensina que os sábios “devem remir
o tempo, porque os dias são maus” (Ef 5.16). Ou seja, deixando
o tempo correr naturalmente sem intervenções redentoras,
num mundo marcado pelo pecado, o que acaba predominan-
do é o mal. Somos chamados a ser ativos e a aproveitar as
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

oportunidades que temos para agir de maneira redentora em


todas as ocasiões e circunstâncias.
A inspiração que temos para agir de modo redentor, apro-
veitando todas as oportunidades que nos são oferecidas vem
de nosso Salvador. Apesar de ingressar num mundo infecta-
do pelo pecado, Jesus aproveitou cada minuto aqui na Terra
para fazer o bem, transmitir ensinamentos cheios de graça,
transformar pessoas e dar a própria vida para resgatar os que
estavam separados de Deus. É a Jesus que seguimos; é a
Jesus que adoramos; ele é nosso modelo e referência. É com
alicerce na grande redenção consumada por Jesus, na atuação
do Espírito de Jesus em nós e na operação de sua graça por
meio de nós que a breve existência da vida humana ganha
dimensões eternas.
Aproveite bem a porção de tempo que Deus lhe conce-
de para viver a vida de modo singular e especial. Em vez de
existir para si mesmo, correndo atrás do acúmulo de bens
passageiros e corruptíveis, eleve os olhos ao céu e descubra
a possibilidade de transformar cada oportunidade em algo de
valor permanente.

Oração: Senhor Jesus, tenho consciência de minha má adminis-


tração do tempo e de minha falta de sabedoria. Concede-me a
graça de parecer contigo e, desse modo, desfrutar de cada porção
do tempo como uma oportunidade para te servir. Amém!

CHRISTIAN GILLIS, pastor da Igreja Batista da Redenção em Belo


Horizonte, MG.

Texto originalmente publicado em Refeições Diárias - Celebrando a


Reconciliação, Editora Ultimato.

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PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 1

VELHINHOS GENTE BOA


Rubem Amorese

TENHO OBSERVADO OS IDOSOS À MINHA VOLTA, com a


perspectiva do “eu sou você amanhã”. E percebo que já
apresentamos, hoje, sinais do que seremos quando nos fal-
tarem forças para sermos gente boa, e sobrar apenas o que
realmente somos.
Ao fazer essa avaliação, vejo grande vantagem nos velhi-
nhos sorridentes, alegres, bondosos, de fácil trato, que gostam
de gente, de criança, de parque, de viagens em cadeira de
rodas, de empregados, de arrumadeiras, de fisioterapeutas,
médicos, enfermeiras etc., enchem o peito com o ar da mon-
tanha dos balões de oxigênio e sentem carinho num banho de
toalha. Velhinhos gente boa. Mesmo quando são maltratados
e esquecidos, vivem melhor. E morrem melhor. Talvez porque
tenham vivido melhor.
O problema, a meu ver, é como chegar a ser gente boa, de
modo que, quando as forças faltarem, sejamos naturalmente
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

assim. Será uma condição que se adquira? Que se aprenda?


Que se cultive? Há alguma coisa que eu possa fazer, hoje, para
ser um “velhinho gente boa” amanhã?
Em minhas observações, percebo que a maioria dos idosos
alegres também são gratos. Sim, agradecem por tudo; e com
aquele sorriso enternecedor. Hum, eis meu fio-de-meada: a
gratidão traz contentamento; este puxa a alegria; e esta traz
felicidade. O coração alegre e feliz atrai companhia; o ingrato
afasta; o coração grato nos faz confortáveis no mundo; o ingrato
nos faz vítimas dele; o coração grato constrói para si e para os
outros; o ingrato é sabotador dos outros e até de si mesmo.
Passando da psicologia para a teologia, penso que não exista
gratidão sem alguma consciência de graça. Graça, aqui, é a
dádiva imerecida; o presente. Gratidão é o resultado misterioso,
em nosso coração, do reconhecimento de que recebemos algo a
que não tínhamos direito. Exemplo: se você pagou, não precisa
agradecer. Veja como o apóstolo Paulo toca no assunto, ao dizer
que Abraão foi justificado pela fé: Ora ao que trabalha, o salário
não é considerado como favor, e, sim, como dívida (Rm 4:4).
E a razão que apresenta para o cultivo de um coração grato:
E que tens tu que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por
que te vanglorias, como se o não tiveras recebido? (1 Co 4:7).
De volta aos velhinhos, penso no poder formador (e con-
formador) da gratidão. Talvez seja por isso que Paulo insista
conosco, em direção a Deus: Em tudo, dai graças, porque esta
é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco (1 Ts 5:18).
Já em direção às pessoas ele recomenda: seja a paz de Cristo
o árbitro em vosso coração, à qual, também, fostes chamados
em um só corpo; e sede agradecidos (Cl 3:15). Que verso inte-
ressante! O apóstolo insere a gratidão como “ingrediente” de
um convívio pacífico e harmônico no corpo de Cristo.

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CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

E como podemos cultivar, hoje, esse coração grato, de


modo a que venhamos a ser gente boa quando as forças nos
faltarem e só restar o que realmente somos? Deixando que a
gratidão conforme nossa personalidade. Talvez, num primeiro
momento, buscando perceber a graça que existe nas coisas que
nos acontecem. Ao reconhecer que coisas boas não vieram de
nós mesmos; ao perceber que muito pouco do que temos foi
de alguma forma comprado ou pago; ao distinguirmos dádivas
nas alegrias e também nas limitações e tristezas, começaremos
a percorrer o caminho da gratidão; começaremos a desenvolver
em nós uma crescente sensibilidade para “o que nos é dado”,
gratuitamente. O resultado é que começaremos a agradecer.
Desenvolveremos uma atitude agradecida.
Mas talvez ainda não seja gratidão. Acho que há um passo
seguinte; o fenômeno misterioso, que simplesmente acontece
em nosso coração: sentimo-nos alegremente gratos.
Claro, poderíamos nos sentir incomodados; revoltados por
depender tanto dos outros ou de Deus para ter nossas ne-
cessidades satisfeitas. Sim, alguns prefeririam poder adquirir
tudo o que precisam, de modo a não dever nada a ninguém.
Muito menos a Deus. Certamente, alguns até tentam. (e tendo
o conhecimento dele, não o reconhecem como Deus, nem lhe
dão graças. Achando-se muito espertos, tornam-se loucos” —
minha paráfrase de Rm 1:21,22). E, ao tentar, conscientemente
ou não, permitem que atue em seus corações o poder formador
da ingratidão. Serão velhinhos rabugentos. Morrerão sozinhos e
pedindo para não serem incomodados. Achando que o mundo
lhes deve muito, porque foram injustiçados pela vida.
Termino tentando propor (a mim mesmo) a ótica do ditado
popular, que sugere “fazer de um limão uma limonada”. Ou seja,
buscar dentro de si uma atitude, uma força capaz de transformar

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CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

o azedo do limão, em algo doce e gostoso. O ditado não nos


ensina como fazer isso. Também o popular não nos diz o
“como” do ditado: “para bom entendedor, meia palavra basta”,
ou sua versão mais divertida: “para bom entendedor til é
acento”. Então, se não é preciso explicar a bons entendedores
como fazer limonadas, aqui vão algumas frases para definir
um coração grato. Sem muitas explicações. Quero chegar a
ser velhinho, com um coração parecido. É por isso que estou
pensando nisso hoje.
Para um coração grato, refeição é banquete;
para um coração grato, barraco é um lar;
para um coração grato, bicicleta é condução;
para um coração grato, sorriso é dia de sol;
para um coração grato, bolinho de chocolate é petit gâteau;
para um coração grato, cobertor “parahiba” é edredon;
para um coração grato, atenção é carinho;
para um coração grato, lembrancinha é consideração;
para um coração grato, barraco limpo é aconchegante;
para um coração grato, fogueira é lareira;
para um coração grato, desconto é presente;
para um coração grato, manhã de chuva é dia lindo;
para um coração grato, manhã de sol é nova vida;
para um coração grato, crítica é aula.
Bem – você pode estar pensando –, para alguém que per-
deu o juízo, essas coisas fazem sentido. Mas não para uma
pessoa normal.
De fato, não estou falando de pessoas normais; estou
falando de gratidão; estou falando de um mistério da alma.

RUBEM AMORESE, presbítero na Igreja Presbiteriana do Planalto,


em Brasília. Foi professor na Faculdade Teológica Batista por vinte
anos e consultor legislativo no Senado Federal. É autor de, entre
outros, Fábrica de Missionários e Ponto Final.

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CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

ESTUDO BÍBLICO

Preparando-me para envelhecer


Texto básico: Eclesiastes 12.1-14

Do que trata o estudo?


Alguns dizem que a adolescência ou a juventude, e até mesmo
a infância, foi a melhor fase da vida. Mas, pensando numa vida
longa, é possível esperar muita coisa boa pela frente. Aliás, somos
responsáveis pelo que fazemos ou deixamos de fazer com o dom
da vida. É possível “aprender a envelhecer”?

Com a Bíblia na mão


1) De que forma o buscar a Deus na juventude pode influenciar
a velhice (Sl 37.17-18, Pv 4.18. Sl 1)?
2) Como o conselho de sabedoria, “lembra-te do seu Criador nos
dias da tua juventude”, é contrário ao conceito da religiosidade
popular?
3) Como você se sente ao pensar na velhice?

Leia e imprima o estudo bíblico na íntegra. Clique aqui.

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PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 2

APRENDENDO A ENVELHECER
Joel Tibúrcio de Sousa

TUDO TEM A SUA OCASIÃO PRÓPRIA, e há tempo para todo


propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo
de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se
plantou; eu disse no meu coração: Deus julgará o justo e o
ímpio; porque há um tempo para todo propósito e para toda
obra (Ec 3.1-2, 17).
Uma das manifestações de sabedoria é a compreensão
do tempo próprio para cada coisa. A condição humana faz
com que cada pessoa construa sua vida, em várias etapas,
da maneira que elege. E a passagem de cada um por este
mundo vai mostrar o que ele fez com as oportunidades, os
recursos, e os “talentos” que Deus distribuiu a todos, por sua
soberana determinação.
Paul Tournier, em sua obra “Apprende à veillir” (É Preciso
Saber Envelhecer), que eu leio em espanhol, examina o tema,
com seu estilo cativante, agradável e, ao mesmo tempo,
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

erudito e comprometido com a Palavra de Deus, em narrativa


recheada de exemplos de sua rica experiência profissional e
pessoal.
A idade madura é aquela em que florescem todas as capa-
cidades; aquela em que as pessoas em geral se sentem pode-
rosas, constroem pelo menos parte daquilo com que sonharam
durante longos anos. É o tempo da realização profissional,
com o reconhecimento natural, tanto internamente quanto do
ambiente em que se vive — líderes, liderados, colegas de traba-
lho, amigos — todos concordam em identificar a importância
da pessoa, como homo faber, como pai/mãe, como marido/
esposa. O ego infla, e o tempo é gasto, ou na contemplação
do próprio umbigo (como é belo!) ou na fruição dos prazeres
da vida social, inclusive na Igreja, nas viagens, nas badalações.
Tomás de Kempis, em Imitação de Cristo, citado por Augusto
Gotardelo em Ceifa tardia, escreveu: “Lembra-te sempre do
fim, e que o tempo perdido não volta.” É difícil estabelecer
exatamente o que significa usar o tempo com sabedoria, viver
cada momento de maneira ponderada e sábia. Mas certo cui-
dado com a próxima etapa certamente será útil para prevenir
sofrimentos insuportáveis.
O afastamento do trabalho, quando o outono da vida chegar,
pode ser brusco e difícil. Certo homem que, ao aposentar-se,
passou a beber imoderadamente, veio consultar-me, trazido
pela família. A expressão que ele usou foi dramática: “tiraram
o chão de debaixo dos meus pés”. Contou que acordava cedo,
no mesmo horário de sempre, mas não se levantava. Ouvia o
tropel e as conversas dos ex-colegas, que passavam em direção
ao trabalho. Ele não estava no meio dos amigos de ontem, e
à medida que o tempo passava, ia perdendo o ambiente, a
cultura do grupo a que pertenceu durante tanto tempo; já não

16
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

falava a mesma língua nem conseguia manter diálogo. Não


tinha histórias do trabalho para contar, e durante os dias de
atividade jamais se preocupara em preparar-se para o ócio.
E agora, José?
Ao viver a atividade plena, a ideia que temos é que o dia é
hoje. Hedonistas, vivemos o presente como se ele fosse eterno.
A verdade é que a vida é toda feita de momentos, cada
qual com seu encanto, sorrisos e lágrimas se alternando, a
experiência de cada instante formando todo um complexo
que, arquivado, em seguida será objeto de reflexão, análise,
aperfeiçoamento. Israel vive no deserto, do Egito a Canaã, tanto
o perigo dos exércitos do Faraó e a inclemência do sol escal-
dante quanto as delícias da providência de Deus, nem sempre
consciente de que a travessia, mesmo que dure quarenta anos,
é efêmera. Há que vivenciar o maná no deserto de Sim, a água
que brota da rocha em Meribá, sem esquecer que o melhor
virá depois, além do Jordão, na terra que “mana leite e mel”.
Ao contrário do que acontece no Oriente, nossa sociedade,
em geral, despreza os velhos. Talvez pelo aumento do número
de anciãos, por meio dos progressos da medicina, porém
mais provavelmente pela cultura materialista, que valoriza a
produção, a mais-valia verberada desde Marx, em que o capital
subordina o trabalho e o produto vale mais do que a pessoa
que produz. Uma vez diminuída a capacidade de produzir e até
mesmo de consumir, o indivíduo passa a ser considerado um
peso que a sociedade tem de suportar. Uma sociedade que
despreza os velhos é desumana e também imprevidente: o
velho já foi jovem, e este será velho amanhã, se tiver a felicidade
de não morrer antes.
Outra característica cultural ainda mais patente em nossos
dias é o culto da técnica. A tecnologia se multiplica e aperfeiçoa

17
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

a uma velocidade cada vez mais difícil de se acompanhar.


As aquisições incontáveis sem dúvida facilitam, aumentam o
conforto, encurtam distâncias, incrementam a expectativa de
vida. Mas quem não acompanha a tecnologia perde espaço,
não compete no mercado. A publicidade cobra, o deus Mamom
estabelece seu preço em ansiedade agora e em melancolia no
futuro, quando vier o afastamento da atividade. “Tiraram o
chão de debaixo de meus pés”.
Há que restabelecer o primado do ser sobre o ter. A prio-
ridade é das pessoas, nunca das coisas. O Senhor Jesus, no
Sermão da Montanha, ensinou que as pessoas valem mais do
que as aves do céu, mais do que os lírios do campo. “Se Deus
veste a erva do campo, quanto mais a vós...?”
Toda a obra de Tournier se insere dentro do que ele chamou
Medicina da Pessoa. E o livro de que tratamos aqui pretende
colocar o ancião no lugar que lhe pertence na sociedade. Cada
pessoa tem um espaço neste mundo, independentemente da
idade. “Há tempo para todo propósito debaixo do céu” (Ec 3-1).
E o autor do Eclesiastes (talvez o rei Salomão) acrescenta que
Deus “pôs a eternidade no coração do homem” (Ec 3.11).
A harmonia entre o vigor e a ousadia, de um lado, e a
experiência e a ponderação, de outro, estabelecem um ponto
de equilíbrio imprescindível, não só à convivência interpessoal,
mas à conquista de um nível de civilidade compatível com os
propósitos de Deus para a humanidade. De forma nostálgica,
o provérbio francês pondera: “Se a juventude soubesse, se a
velhice pudesse...”
Em síntese, nossa vida tem um fio condutor a ligar cada
etapa uma à outra; cada fase deriva das anteriores. “Homem
algum é uma ilha”, disse Thomas Merton. Assim, cada qual
precisa compreender o outro, encorajá-lo, amá-lo como a si

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CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

mesmo, perdoá-lo, refletindo sobre suas próprias imperfeições.


E quanto as rugas, os sinais dos anos, quanta beleza encerram!
Que os velhos se respeitem e sejam respeitados, e que os jovens
saibam viver hoje de maneira a construir um futuro digno e
belo, como uma antecipação, nesta vida, das bênçãos que nos
esperam na presença eterna de Deus.
Senhor: “Ensina-nos a contar os nossos dias, para que al-
cancemos corações sábios.” (Sl 90.12.)

BIBLIOGRAFIA
TOURNIER, Paul. Aprendiendo a envejecer. Buenos Aires; Ed. La
Aurora, 1973.
GOTARDELO, Augusto. Ceifa tardia. Juiz de Fora: Ed. Lar Católico, 1953.
TOURNIER, Paul. Médecine de Ia personne. 11. ed, Neuchatel: Ed.
Delachaux & Niestlé, 1963.

JOEL TIBÚRCIO DE SOUSA, médico psiquiatra e faz parte do Corpo


de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos (CPPC).

Artigo publicado originalmente na revista Ultimato, edição 297, no-


vembro/dezembro de 2005.

ESTUDO BÍBLICO

Foque no que é essencial


Texto Básico: Hebreus 12.1-2

Do que trata o estudo?


É muito bom saber que é Deus quem está no controle (Rm
8.16-28), e que ele cuida dos mínimos detalhes da nossa vida.

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CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

E, é verdade também que a vida está repleta de escolhas.


Que tipo de escolha precisamos fazer hoje? Para Paul Tournier, ter
uma boa velhice é começar a prepará-la cedo... Você consegue
listar os objetivos de sua vida?

Com a Bíblia na mão


1) Porque colocar nosso foco na obra de Jesus (Rm 3.21-28,
Rm 1-21)?
2) A vida está repleta de escolhas, no texto, qual foi a escolha de
Jesus (1Co 9.20-27, Rm 12.1-2)?
3) Você consegue listar os objetivos de sua vida? Seria possível
separá-los em objetivos específicos e genéricos, permanentes
e temporários?

Leia e imprima o estudo bíblico na íntegra. Clique aqui.

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PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 3

UM CULTO. MUITAS GERAÇÕES


Reinaldo Vieira Lima

UM DOS MAIORES DESAFIOS DA IGREJA contemporânea é


comunicar o evangelho de forma integrada, reunindo e en-
volvendo em um mesmo culto as diferentes gerações e suas
distintas formas de pensar, viver o cristianismo e adorar a
Deus. Mas será isso possível?
A beleza do culto cristão está especialmente relacionada à
unidade entre as pessoas. O salmista diz no Salmo 133.1: “Oh
quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união”.
Essa afirmação não restringe público, tampouco estabelece
faixa etária, ela diz “os irmãos” de forma geral. Esse é apenas
um dos muitos versículos que apontam para o estilo de vida,
ou seja, de culto que agrada a Deus, pois cremos que a cele-
bração comunitária é uma extensão do culto que prestamos
diariamente. No culto que agrada a Deus deve haver unidade.
Ainda no livro de Salmos, encontramos uma instrução
específica sobre como as diferentes gerações devem se
relacionar:
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

“Uma geração contará à outra a grandiosidade dos teus feitos;


eles anunciarão os teus atos poderosos” (Sl 145.4).

Esse trecho me faz lembrar um hino muito conhecido que


diz: “Conta-me a velha história”. É exatamente isso que se
espera dos anciãos: que contem do amor de Cristo, dos feitos
dele na história do mundo e de suas vidas aos mais novos. Isso
só será possível se estiverem unidos, reunidos.
Nos últimos anos, a reflexão sobre as diferentes gerações e
os conflitos entre elas aumentaram bastante, especialmente no
que diz respeito ao mundo do trabalho. Pesquisadores passaram
a elaborar o que podemos chamar de “teoria das gerações”,
classificando-as como: “baby boomer”, “geração x”, “geração
y”, “geração z”, e, mais recentemente, “geração alpha”. Cada
uma delas tem suas particularidades e diferenças, por vezes,
gritantes umas das outras. Não iremos nos aprofundar nelas,
no entanto, devemos considerar que, dadas as características
distintas de uma e outra geração, conflitos existem e sempre
existirão e a igreja terá que aprender a lidar com isso para que
a unidade, que tanto agrada a Deus, não se perca.
De forma geral e para atender as necessidades de cada
grupo etário, as igrejas criaram diferentes ministérios (crianças,
adolescentes, jovens, casais, adultos solteiros e terceira idade).
Essa divisão tem um fim didático e busca facilitar a aprendi-
zagem bíblico-cristã à medida que aborda os temas concer-
nentes ao público correspondente e na linguagem adequada
a cada um. No entanto, vejo que essa praticidade pedagógica,
embora necessária, tem criado um abismo ainda maior entre
as gerações. Tiramos os bebês do culto e colocamos em ber-
çários; criamos o culto infantil; em algumas igrejas até mesmo
os adolescentes e jovens foram segregados. Será que isso é
saudável? Ou será que ao invés de unir a igreja nós a estamos
fragmentando. Onde fica a unidade nesse caso?

22
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

De que forma faremos convergir os corações de uns aos


outros, praticar a tolerância com o que nos é diferente? Pre-
cisamos abandonar o egoísmo de querermos um culto que
“nos agrada”, que é o “nosso perfil”, que não tenha o ruído das
crianças ou que se utilize das músicas mais contemporâneas
para agradar aos jovens e estes por sua vez também devem
exercitar a paciência, que é um dos frutos do Espírito, e cele-
brar com hinos; junto ao coro. Enfim, precisamos lutar contra a
natureza egocêntrica do nosso velho homem e promovermos
a unidade. Não digo que devamos extinguir os ministérios e
seus momentos de ensino direcionado, mas devemos lutar
para que eles não sejam exclusividade; a busca é pelo equilí-
brio. Não podemos abrir mão de termos a igreja reunida. Creio
que tal unidade é fundamental para a permanência das novas
gerações na igreja, pois, quando houver a necessidade de
transição, elas já estarão inseridas; frequentar os cultos não
lhes será uma experiência nova. Mas, a pergunta permanece:
como conseguiremos tal unidade?
Acredito no diálogo entre as gerações como forma de unifica-
ção e fortalecimento da igreja, pois como diz Both (1999, p. 58):

“O diálogo entre gerações possui a propriedade de fortalecer


o sentido da conscientização intersubjetiva e o sentido do
respeito e do engajamento dos participantes do diálogo nas
mudanças necessárias”.

Já Moragas (1997) diz que as relações intergeracionais


podem ser solidárias, pois proporcionam ajuda em certos
momentos vitais. Segundo o autor:

“Quando se reconhece a necessidade da compreensão entre


gerações e os jovens são educados para praticá-la, fomenta-se
a integração entre as diferentes idades e consequentemente
reduz-se o conflito social”.

23
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Embora saiba que os conflitos geracionais continuarão a


existir, creio que o Espírito de Deus pode e quer nos dar um só
coração e uma só mente (At 4.32) e a nós, líderes dessa nova
geração, cabe incentivar o diálogo e trabalhar para que essa
união e integração se estabeleçam de forma plena e profunda
no seio de nossas comunidades, de forma a “conservar a uni-
dade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4.3).
Que o Deus que concede perseverança e ânimo dê a vocês
um espírito de unidade, segundo Cristo Jesus (Rm 15.5).

REINALDO VIEIRA LIMA JR., pastor na Primeira Igreja Batista


em São Paulo (SP). É Bacharel em Teologia pela Faculdade Teológica
Batista de São Paulo e dá aulas de ética e cidadania no Seminário
Betel Brasileiro.

ESTUDO BÍBLICO

Cultivando relacionamentos significativos


Texto Básico: Salmo 133.1-3

Do que trata o estudo?


A solitude faz parte do envelhecer por diversas razões, como
a mudança no estilo da vida, uma limitação física, a morte de
amigos ou até mesmo o simples desejo de ficar sozinho. Deus
se importa e valoriza a comunhão cristã. Como você tem desen-
volvido o seu relacionamento com os amigos, esposa, marido,
filhos, netos? Você consegue perceber a benção do relaciona-
mento cristão?

24
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Com a Bíblia na mão


1) Reflita sobre a importância da amizade (Ec 4.8-12, Rm 1.9-12;
2Tm 4.6-11, 16, Pv 18.24).
2) Se Deus valoriza tanto a comunhão cristã, o que dizer para os
“desigrejados”? (Hb 10.24-25)
3) A família é a base de nossos relacionamentos. Como você tem
cultivado seu relacionamento com sua esposa, seu marido,
filhos, netos e irmãos? Há algo que precisa ser resgatado?
Há algo a ser perdoado? Há algo a ser esquecido? Sempre há
tempo para reconstruir.

Leia e imprima o estudo bíblico na íntegra. Clique aqui.

25
PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 4

APOSENTAR NÃO É DEIXAR


DE SER PRODUTIVO
Robert Liang Koo

REVISITAR A SUA PRÓPRIA HISTÓRIA é sempre surpreen-


dente. Como cheguei aqui? Não foi por minha escolha nem
muito menos por mérito. Foi pela mão invisível de Deus, que
me guiou, abrindo as portas, fazendo-me entrar mesmo sem
entender. Pela graça de Deus, sou o que sou. E a graça não
foi em vão, mas tem seu propósito (1Co 15.10).
Tenho 74 anos, três filhos e nove netos. Sou a quarta
geração de uma família cristã da China. Meu avô nasceu na
Coreia por causa das perseguições aos cristãos em meados
do século 19. Chegamos ao Brasil em 1958, e me formei em
engenharia eletrônica no Instituto Tecnológico de Aeronáutica
(ITA) em 1971. Sou grato a Deus por ter conhecido a Aliança
Bíblica Universitária (ABU) durante o tempo de faculdade.
Ela me deu base bíblica para entender o embate ideológico,
influenciou minha formação espiritual e despertou em mim
compaixão pelas causas sociais que iriam direcionar toda a
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

minha vida. Já casado, vivi alguns anos nos Estados Unidos e


com isso pude entender e comparar três culturas diferentes:
a oriental, a americana e a de terceiro mundo (a brasileira);
a concepção de vida e o cristianismo tingido por cada cultura.
De volta ao Brasil, permaneci por um certo tempo na
academia, dando aula e fazendo pesquisa. No fim da década
de 80, comecei a minha própria empresa na área de automação
industrial. O interessante é que nunca foi meu sonho ser
um empresário, mas as circunstâncias me levaram por esse
caminho. Embora eu não tivesse formação nem experiência
empresarial, a graça de Deus foi mais do que suficiente.
Minha empresa conseguiu sobreviver em meio a várias crises
e decisões equivocadas, cresceu e permanece sólida, depois
de 35 anos.
Também nessa época, comecei a pastorear a igreja da
qual fui um dos fundadores. Como não havia feito seminário
teológico, dediquei-me à leitura de bons livros, não só de teo-
logia e de comentários bíblicos, mas principalmente de temas
relacionados a orientação da formação espiritual. As obras de
A. W. Tozer, John Stott, Eugene Peterson são as minhas leituras
preferidas. Eu acredito que a congregação precisa não somente
de exposição bíblica e ortodoxia, mas principalmente de saber
como aplicar esses conhecimentos na sua vida diária.
Ao me aproximar dos 70 anos, iniciei o processo de passar
a responsabilidade tanto da empresa como da igreja para
outras pessoas. Eu sabia que retardar esse processo traria
prejuízo, pois impediria o amadurecimento e a formação de
novos líderes, então passei um bom tempo caminhando junto
com eles.
Sempre alguém me pergunta: “Você já se aposentou?”. Fico
pensando o que isso significa. Ter idade para receber uma apo-

27
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

sentadoria não significa parar de trabalhar, ou que não temos


mais utilidade. Não encontro base bíblica para deixar de ser
produtivo mesmo que estivesse com idade avançada.
O trabalho vai mudando de acordo com a necessidade e a
oportunidade, mas a vocação permanece sempre a mesma.
Trabalho é o meio para cumprir a vocação. À medida que o
tempo passa, a vocação que antes estava abstrata, nebulosa,
fica mais concreta e clara, e o trabalho, mais objetivo.
Trabalho é uma bênção de Deus. Ele traz maturidade e
compreensão do mundo. O meu trabalho secular (academia,
governo e empresa) me deu ferramentas para cuidar da igreja
e das pessoas. Mais recentemente, em meio à pandemia,
montamos um projeto social para abençoar produtores rurais
e comunidades urbanas com a distribuição de alimentos vindos
do campo. Olhando para trás, vejo que minhas experiências
profissionais, pessoas com quem convivi, lugares que conheci,
foram divinamente escolhidos para que, mesmo “aposentado”,
eu pudesse ser usado por Deus para ser luz em meio à
escuridão.
Dom não é somente talentos que recebemos pela graça,
mas engloba toda experiência adquirida debaixo do desígnio
de Deus e deve ser usado para a sua glória até o último dia da
nossa vida.

ROBERT LIANG KOO, foi empresário e pastor em São Paulo por


mais de 30 anos. Atuou na ABUB nas décadas de 60 e 70. É enge-
nheiro pelo ITA e PhD pela Carnegie-Mellon University, nos Estados
Unidos.

Artigo publicado originalmente na revista Ultimato, edição 387,


janeiro/fevereiro de 2021.

28
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

ESTUDO BÍBLICO

Preciso parar de trabalhar?


Texto Básico: Números 8.23-26

Do que trata o estudo?


O que vem à sua mente quando você pensa em aposentadoria?
Como lidar com os conceitos de vocação, trabalho e velhice?
A Bíblia relata pessoas trabalhando até à morte. Também encon-
tramos nos textos bíblicos vários exemplos de sucessão. Estar
preparado para ser substituído é reconhecer nossa finitude e
limitação.

Com a Bíblia na mão


1) Porque será que somente para os levitas havia um limite pres-
crito para uma “aposentadoria” (Nm 1.50-53; 1Cr 23.24-32)?
2) Como entender a importância da atividade do levita após sua
“aposentadoria” (Nm 8.26)?
3) Quais os principais desafios que você imagina que terá que
vencer após se aposentar?

Leia e imprima o estudo bíblico na íntegra. Clique aqui.

29
PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 5

AME O IDOSO
Augusto Gotardelo

COMPLETO HOJE (2 de outubro de 1987) setenta e cinco anos.


Segundo Moisés, Salmo 90.10, estou no rol dos robustos.
Poucos atingem o cume a que chego. Fazem-me bem estes
versos de Alberto de Oliveira: “Poucos vingam o cimo em
que ora estamos:/ Árvores altas não nos tocam os ramos/
O sopro mau que aí embaixo os agita./ Bendita e rebendita/
A idade austera e nobre a que chegamos!” “Tudo aqui em cima
é paz, calma, infinita.../ Bendita e rebendita/ Seja a velhice,
de paixões isenta!”.
Vejo-me no alto de um monte, tenho os olhos perdidos na
campina percorrida, o coração banhado de luz para reconhecer
com ação de graças todos os favores de Deus.
Fala o autor do Salmo 126 da volta jubilosa daqueles que
traz em feixes nos braços depois de uma semeadura com
lágrimas. Parece-me ver alguém sob a luz suave do acaso,
em cânticos, feliz, abraçado a feixes de trigo, no retorno ao
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

lar, ansioso por encontrar-se dentro dele, no gozo da mansue-


tude que o envolve. Não tem o longevo a terna sensação de
volta ao lar de Deus, de segurar molhos imensos que colheu
no trigal da esperança, do sonho de realizações que o Senhor
o abençoou? Nesses instantes de luz frouxa, de cansaço, de
pressa pelo repouso da noite que se avizinha, todos gostam de
dirigir a Jesus o pedido que lhe fizeram o peregrino de Emaús
na hora meritória de um crepúsculo de perpetua recordação:
“Fica conosco, porque é tarde e o dia já declina” (Lucas, 24.29).
Vou sentindo o que experimentaram todos que chegam a
estas alturas. Diante do espelho, atentando para as marcas do
tempo nos cabelos, nos dentes, na pele, no brilho dos olhos,
esboça-se me no espírito certa autorrejeição em completa
desarmonia com a resignação cristã, com a humildade que deve
haver nos que têm a benção da ancienidade. Preciso refletir
que até a natureza apresenta contrastes, perdas desgastes
clamorosos. O sol tem majestade e gloria no zênite; depois no
poente, a suavidade do rosicler da aurora.
A longevidade tem alto preço. Digam-no os octogenários e
os nonagenários, principalmente os que vivem nos asilos, nas
clínicas geriátricas, longe do carinho doméstico, da ternura dos
parentes. Solidão, impressão de que são inúteis, deficiências
físicas e insegurança são alguns dos males que afligem os
anciãos. Felizes os velhos que têm fé abundante, que esperam
no Senhor, que podem dizer como Davi: “Ainda que eu ande
pelo vale da sombra da morte, não temerei mal nenhum, por-
que Tu estás comigo, a Tua vara e o Teu escudo me consolam”
(Salmo 23:4).
Não há solidão para o velho crente. Se é fonte rica de conselhos,
de experiências valiosas, nunca é inútil. Não realiza certas obras
de puerícia, da juventude, mas pode construir algo nobre no
coração e na mente daqueles que o cercam.

31
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Mais importante que o bastão em que se firma, do que as


mãos que o amparam, é o bordão da fé e da esperança em Cristo.
A velhice deve ser o coroamento da existência humana.
Gosto da palavra de Jacó a Faraó quando este lhe perguntou:
“Quantos são os dias dos anos de sua vida?” O aspecto físico
do patriarca por certo impressionou os olhos de Faraó. Ali
estava a coroa de uma vida de provações: fala morosa, olhos
embaciados, rugas, cabeça prateada.
Que de lições há na resposta de Jacó! Disse ele: “Os dias dos
anos da minha peregrinação são cento e trinta anos; poucos e
maus foram os dias dos anos de minha vida, e não chegaram
aos dias dos anos da vida de meus pais nos dias das suas
peregrinações” (Genesis, 47:8-9). Eram todos peregrinos neste
mundo. Quando o homem se julga peregrino na terra, revela
que crê na vida futura, que espera em Deus, que não vê na
sepultura o fim de tudo.
É na senectude o estágio da vida em que se colhem os
frutos da mocidade. Ensina Paulo que o homem ceifa o que
semeia (Gálatas, 6:7).
Aquele que deseja colher frutos abençoados nos últimos
dias, ou quer evitar as agressões da solidão e outros incômodos,
deve meditar nestas palavras de Jesus: “E Aquele que me
enviou está comigo, não me deixou só, porque eu faço tudo
que Lhe agrada” (João 8.29).
Agradar a Deus no alvorecer da vida, harmonizar-se com Ele,
aplicar ao viver os ensinos da Escritura, é garantir na velhice a
paz que a consciência pesada costuma obscurecer nos dias
derradeiros. Disse o Mestre que o Pai o pouparia a solidão,
nunca O deixara só, porque fazia sempre o que agradava a Ele.
Castiga-me a ideia de que agora produzo pouco com
maior esforço. Contudo consola-me a certeza de que ainda

32
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

estou sendo útil. Winston Churchill morreu aos noventa anos;


Konrad Andenauer partiu aos noventa e um. Foram cidadãos
úteis até os últimos dias. Escreve Austregésilo de Athayde:
“O que cumpre é mudar de ideia, em geral falsa, de que a idade
incapacita para o trabalho”. A poetisa Cora Coralina (pseudô-
nimo literário de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas) aos
noventa e três anos de idade, produzindo ou dando asas ao seu
estro, mereceu do brasileiro ilustre retrocitado esta apreciação
elogiosa: “Cora Coralina oferece-nos a todos a sua receita de
longevidade”. Para chegar a esta proximidade dos cem anos
ativa, lúcida e participante, recomenda muita pobreza e muito
trabalho. Quanto à pobreza não sei se é vitamina estimuladora.
O trabalho sim. “O trabalho é o sustento da velhice” (“Labor
senectutis obsonium”). O pintor Marc Chagall, aos noventa e
cinco anos, afirmava: “Parar de trabalhar é começar a morrer.”
Pedro Sampaio, em erudito artigo (O Envelhecer) lembra isto
que muitos leitores perseverantes já conhecem: “Verdi compôs
Otello aos 73 anos e deu a luz a Falstaff aos 79 anos”. Goethe já
era setuagenário quando escreveu a segunda parte do Fausto.
Humboldt produziu os cinco volumes do seu kosmos entre
76 e 89 anos. Galileu e Laplace, já entrados na década dos
80, continuaram a enriquecer o mundo com suas admiráveis
produções cientificas”.
Acabrunham-me também os claros que surgem no anfiteatro
secreto de minhas afeições. Há dentro de mim um anfiteatro.
Centenas de amigos ocupam seus lugares. De quando em
quando parte um para estar com o Senhor. Lá fica o claro, o
vazio que traz saudades e pesar. Esses companheiros da mes-
ma faixa etária que deixam lugares vagos fazem-me pensar
nesta declaração de Davi: “Eu vou pelo caminho de todos os
mortais” (1 Reis 2.2). Repetindo-a em ações de graças faço-lhe

33
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

este delicioso acréscimo: Mas nem todos os mortais vão pelo


caminho em que estou. A reta traçada por Jesus Cristo (João
14.16). Glória a Deus!
Sou o que sou pelo auxílio de Deus. Creio no seu amor sem
igual, na sua providência de todos os dias, no ensino segundo o
qual a paciência e a consolação das Escrituras geram em mim
incomparável esperança (Romanos 15:4).
E “os que esperam no Senhor renovam as suas forças,
sobem com as asas como águias, correm e não se cansam,
caminham e não se fatigam” (Isaías 40.31).
Está você no vigor dos anos? Ame o ancião que já foi como
você. Amanhã quando as cãs lhe branquearem a cabeça, será
alvo também deste afeto, dessa ternura tão necessária nesse
por do sol da vida.

AUGUSTO GOTARDELO (1911- 2005) foi escritor, pregador


presbiteriano e professor. Foi casado – durante 47 anos – com
Hilarina Vitral Gotardelo, com quem teve cinco filhos (Beatriz, Heloísa,
Lúcia, Augusto Júnior e Alice). E, depois, com Maria Matilde Mendes.
Colaborou com Ultimato entre os anos de 1968 a 1974, como articulista
da seção “Português pela Bíblia”.

Artigo publicado originalmente na revista Ultimato, edição, outubro


de 1987.

34
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

ESTUDO BÍBLICO

Discipulado: o desafio de transmitir


a fé para as novas gerações
Texto Básico: 2 Timóteo 3

Do que trata o estudo?


Podemos enxergar o desafio de transmitir a nossa fé para os
mais novos como um desafio de “formação”. Afinal, não se trata
apenas de compartilhar conceitos ou doutrinas, mas muito mais
de “educar” novos seguidores de Cristo. E, falar de formação é
falar de um processo, contínuo – intelectual, moral, espiritual.
Quem tem nos formado como seguidores de Cristo? A quem
temos “educado”?

Com a Bíblia na mão


1) Nos versículos 2-4, Paulo fornece uma lista geral (sem a pre-
tensão de ser definitiva) contendo as atitudes características
das pessoas neste período. Note a primeira e a última atitude
listada por Paulo (v. 1, 4). De que maneira elas podem resumir
bem toda as demais características?
2) Que evidência temos aqui de que essas pessoas também
eram religiosas (v. 5)?
3) Numa dinâmica saudável do discipulado cristão, nós sempre
estaremos cuidando de alguém e sendo cuidados por outros.
Em outras palavras, sempre estaremos influenciando e sendo
influenciados em nossa caminhada. Como tem sido esta di-
nâmica em sua vida? Quem tem acompanhado e influenciado
sua relação com Deus?

Leia e imprima o estudo bíblico na íntegra. Clique aqui.

35
PARA CONVERSAR NA IGREJA
CAPÍTULO 6

CHEGUEI AOS 57 ANOS!


Cláudia Barbosa

NUNCA PENSEI que chegar aos 57 anos de idade fosse mexer


tanto comigo. Tem mexido. Minha mãe tinha essa idade
quando morreu. Foi um infarto fulminante, sem aviso prévio.
Tempos difíceis. Foi a primeira grande perda da minha vida.
De certa maneira, nutri durante todos os anos seguintes
um certo mistério com os 57 anos, tal qual aquela profecia:
“A 2000 chegará, mas de 2000 não passará”. Pensei mesmo
que, se passasse dos 57, já estaria no lucro. Pronto, cheguei.
Não morri ainda, mas tenho pensado em tanta coisa! Depois
da morte da minha mãe, vivi muitas outras perdas, mortes,
dores, alegrias, frustrações, momentos bons e ruins, e percebi
que todas essas experiências ficam registradas na memória
e no coração, mas também no corpo.
É incrível como somos seres inteiros. Aquilo que acontece
conosco fica marcado na alma, no coração e no corpo e, se
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

não soubermos lidar com as muitas circunstâncias da vida,


este sofrerá as consequências.
Eu não soube prestar atenção nos sinais que meu corpo
mandava e isso foi se acumulando até que eles ficaram muito
claros e me vi cheia de dores difusas, constantes e cada
vez mais fortes. O diagnóstico foi fibromialgia. Desde então
tenho essa companhia constante, todos os dias – uns com
mais intensidade, outros com menos, mas todos os dias.
Já orei muito pedindo a cura, já oraram por mim, mas as dores
continuam. Houve um tempo em que fiquei realmente triste,
achando que Deus não estava sendo bom comigo. Além disso,
ouvi muita coisa que em nada me ajudou. Mas ouvi também
a doce voz de Jesus que dizia: “A minha graça te basta. O meu
poder se aperfeiçoa na fraqueza”.
Essa voz de Jesus me deu uma nova maneira de lidar com
a vida, com a dor, com os fatos que mexeram e ainda mexem
comigo, com meus sentimentos. A dor me coloca em contato
com a minha finitude, com a efemeridade da vida. Ela é como
a flor do campo, que hoje está linda, exuberante, e amanhã
não mais.
Minha dor me lembra a morte, o desgaste do meu ser. Isso
poderia causar desespero, revolta, mas Jesus venceu a grande
inimiga – a morte. Minha esperança não está neste corpo, mas
no corpo novo, no qual nem dor, nem morte terão vez.
Quero viver os próximos anos (58, 59, 60...) carregando no
coração, na memória e no corpo as marcas da vida que vivi,
dando graças a Deus por tudo, clamando sempre por cura,
porém aceitando com gratidão e humildade os meios que Deus
tem usado para formar em mim o caráter de Jesus.
Fácil? De jeito nenhum. Profundamente difícil. “Mas graças
a Deus, que nos dá a vitória por meio de nosso Senhor Jesus

37
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Cristo.” Só por Jesus, no poder do Espírito Santo, é possível


viver assim. É um exercício diário. Muitas dores poderiam ter
sido evitadas na minha história se eu soubesse reconhecer os
movimentos de Deus na minha vida. Espero ficar mais atenta,
ser mais sensível à voz de Deus e ao que ele está fazendo. Nem
sempre consigo, mas sigo tentando. Que ele nos ajude!

CLÁUDIA BARBOSA, cantora e flautista. Palestrante em igrejas


e eventos cristãos nas áreas de família, casais e espiritualidade, é
membro da Igreja Presbiteriana do Lago Norte, em Brasília, onde dirige
o ministério de casais. É casada com Carlinhos Veiga, mãe de Pedro,
Anna e Cézar, e avó de Maria, Clara, Francisco e Timóteo.

Artigo publicado originalmente na revista Ultimato, edição 379,


setembro/outubro de 2019.

38
PARA CONVERSAR NA IGREJA

RECURSOS

Vencer na vida
Rubem Amorese

Vencer na vida – conclusão


Rubem Amorese

Ser velho
Thomas Hahn

“Use e jogue fora”: conspiração contra o jovem e o velho


Derval Dasilio

A igreja e o cuidado da terceira idade


Edilson Ribeiro Gomes

A Bíblia e o idoso
Elben César

Envelhecimento e Alzheimer
Entrevista com Vera Pedrosa Caovilla
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

O que fazer quando os filhos partem


Estudo bíblico

Mente aberta versus cabeça dura


Estudo bíblico

Experiência e Esperança na Velhice


Revista Ultimato Edição 356

Intergeracionalidade – Jesus é o mesmo ontem,


hoje e sempre
Revista Ultimato Edição 379

Um Brasil mais grisalho


Infográfico

Experiência e Esperança na Velhice


E-book gratuito

Conversando Sobre o Futuro


Série de Estudos Bíblicos

40
PARA CONVERSAR NA IGREJA

FRASES

"
Para ter uma boa velhice é preciso começar a prepará-la cedo,
e não retardá-la o mais possível. Na metade da vida se terá de
começar a refletir e a organizar a existência com vistas a um
futuro ainda distante, em vez de se deixar levar integralmente

"
pelo torvelinho profissional e social.
- Paul Tournier (1898-1986), médico suíço que fundou o movimento
da “Medicina da Pessoa”

Viver bem a idade que se tem é uma arte, e quem consegue


fazer isso certamente goza bem a vida. Hoje a mídia ressalta
a saúde como algo imprescindível para o viver bem. A Orga-
nização Mundial de Saúde destaca que “saúde é um estado
de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas
ausência de doença”. Viver bem por muitos anos, passando
dos 60, portanto, requer não só arte, mas cuidado com corpo,
alma e espírito.
- Guilherme Falcão, psicólogo gerontólogo
"
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Quando a velhice chegar, aceita-a, ama-a. Ela é abundante em


prazeres se souberes amá-la. Os anos que vão gradualmente
declinando estão entre os mais doces da vida de um homem.

"
Mesmo quando tenhas alcançado o limite extremo dos anos,
estes ainda reservam prazeres.
- Sêneca (04 a.C.-65), filósofo e escritor romano

"
Os que amam profundamente, jamais envelhecem; podem
morrer de velhice, mas morrem jovens.
- Martinho Lutero (1483-1546), reformador alemão

Muitas vezes a juventude é repreendida por acreditar que o

"
mundo começa com ela. Mas a velhice acredita ainda mais
frequentemente que o mundo termina com ela. O que é pior?
- Christian Hebbel (1813-1863), poeta alemão

Vive cada dia para que tua velhice venha a ser a coroação de

"
tua juventude. A velhice de uma pessoa sábia, feliz e realizada,
que viveu tudo o que podia, é como a melhor das primaveras!
- Augusto Branco, poeta amazonense

Conservar a esperança equivale a não envelhecer. A velhice


é mais do que cabelos brancos e rugas. É sentimento de que
é tarde demais, é o sentimento de que o palco já pertence a
outra geração. A verdadeira doença da velhice não é o enfra-
quecimento do corpo: é a apatia da alma.
- Emile Salomon Wilhelm Herzog (1885-1967), romancista e ensaísta
francês

42
"
CONVERSANDO SOBRE O FUTURO

Agora que a velhice começa, preciso aprender com o vinho

"
a melhorar envelhecendo e, sobretudo, a escapar do terrível
perigo de, envelhecendo, virar vinagre.
- Dom Helder Câmara (1909 - 1999), bispo católico

Esta palavra, “velha”, bem, deveriam inventar outra porque ela


já vem contaminada de coisas como a decadência, a finitude.
Os velhos são produtivos, apesar de terem uma sociedade que
só cultua o novo.
- Fernanda Montenegro, atriz brasileira

43
PARA CONVERSAR NA IGREJA

LIVROS SUGERIDOS

É Preciso Saber Envelhecer

Livres da Tirania da Urgência

Teologia Para o Cotidiano

Fui Moço, Agora Sou Velho... E daí?

A Espiritualidade na Prática
PAR A CONVERSAR NA IGREJA

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