Nicolaísmo
Nicolaísmo
Nicolaísmo
Prefácio
(por Roger P. Daniel)
A maioria dos cristã os está tã o acostumada a um sistema de clérigos e leigos em suas “igrejas”, que
se assombram ou até se enfurecem quando este sistema é questionado. Parece-lhes muito correto
que haja um pastor ou ministro que se encarregue de uma igreja; e o fato de que tudo pareça
funcionar muito bem sob este regime, é usado como argumento ou como prova de sua validez.
Neste tratado, Grant examina e refuta abertamente o sistema clérigo-laicista. Demonstra com
clareza, à luz das Escrituras, que esta estrutura humana é um mal que têm causado grande dano ao
povo de Deus. Mesmo que tenha sido escrito há mais de 100 anos atrá s, as coisas nã o estã o
melhores hoje. Animo aos irmã os a lerem esta obra com uma mente livre de preconceitos e com a
Bíblia aberta. Nã o queremos a opiniã o de Grant nem a minha nem a de ninguém, senã o o que Deus
pensa a respeito. Rogo, pois, que se faça uso do princípio bíblico que diz: “julgai todas as coisas,
retende o que é bom” (1.ª Tessalonicenses 5:21).
Quero mencionar um ponto ao qual Grant nã o havia mencionado, talvez porque em seus dias nã o
era tã o comum como hoje. Refiro-me ao uso do título de Reverendo em relaçã o a um pregador. Uma
definiçã o dicionarizada apresenta Reverendo como um “epíteto de respeito aplicado ou anteposto
ao nome de um clérigo. Digno de ser reverenciado; que merece reverencia” (Dicioná rio Webster;). O
termo aparece assim vertido em algumas versõ es da Bíblia (e. g. King James e Reina Valera) no
Salmo 111:9: “Santo e reverendo é seu nome”, aplicado ao nome de Deus, pelo que ninguém deveria
aplicá -lo a si mesmo.
À medida em que ler este escrito, se dará conta, sem requerer muita imaginaçã o, do porquê
ocorreram estas coisas. Quando os homens começaram a ocupar os postos de clérigos (isto é, uma
classe dirigente que estava por cima do resto das pessoas, dos laicos), almejaram um título que
mostrava o respeito que supunham que lhes era devido. Um desses títulos foi o de “reverendo”, que
soava muito respeitoso. Seguindo esta mesma direçã o, muitos “ministros” se sentem orgulhosos de
exibir as iniciais que indiquem algum grau acadêmico, tal como “Doutor em Teologia”, etc. à
continuaçã o de seus nomes, para assinalar assim que sã o algo especial, que têm alguma capacidade
especial transmitida por escolas ou instituiçõ es religiosas humanas, ao invés de estarem
plenamente capacitados pelo chamado e o ensinamento de Deus.
Com as observaçõ es precedentes, recomendo esta revisã o da obra do Sr. Grant a cada leitor,
rogando que ajude a mostrar a cada verdadeiro filho de Deus seu grande privilégio de ter acesso
direto a Deus, e pedindo também que exponha à nudez o perverso sistema que tem chegado a ser
tã o comum no cristianismo atual.
“Tens, contudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaítas, as quais eu também
odeio (…) Outrossim, também tu tens os que da mesma forma sustentam a doutrina
dos nicolaítas.” (Apocalipse 2:6, 15, nas epístolas do Senhor dirigidas às igrejas de
Éfeso e de Pérgamo).
NICOLAISMO
Nas cartas proféticas dirigidas à s sete igrejas da Á sia, em Apocalipse 2 e 3 (as quais nos dã o a
histó ria espiritual da Igreja desde o tempo dos apó stolos até a vinda do Senhor), a carta à igreja de
Pérgamo segue apó s as cartas à igreja de É feso e a igreja de Esmirna. Pérgamo marca a terceira
etapa do desvio da verdade por parte da Igreja e é historicamente fá cil de reconhecer. Aplica-se ao
tempo no qual, logo apó s haver atravessado as perseguiçõ es pagã s (Esmirna), a Igreja foi
publicamente reconhecida e estabelecida no mundo. O tema principal da carta a Pérgamo é “a Igreja
que mora onde está o trono de Sataná s”. A palavra correta é ‘trono’, e nã o ‘assento’ (como traz a
versã o RV). Sataná s tem seu trono no mundo, nã o no inferno, o qual será sua prisã o e no qual nunca
reinará . Ele é chamado “o príncipe deste mundo” em Joã o 12:31, 14:30 e 16:11.
Portanto, morar onde está o trono de Sataná s é estabelecer-se no mundo, sob o governo e a
proteçã o de Sataná s. Isto é o que as pessoas chamam a instituiçã o da Igreja! Teve lugar sob o
imperador romano Constantino, por volta do ano 320 d.C. Mesmo quando a tendência da Igreja em
unir-se com o mundo vinha aumentando por algum tempo, foi entã o quando ela saiu fora do lugar
que lhe era pró prio e ingressou nos lugares da antiga idolatria pagã . As pessoas chamam isto de
“triunfo do cristianismo”, mas o resultado foi que a Igreja se posicionou com tal firmeza nas coisas
do mundo como nunca antes. O lugar de liderança no mundo foi dela e os princípios do mundo a
invadiram rapidamente.
O nome Pérgamo indica isto. É uma palavra grega que significa casamento. O casamento da Igreja
com qualquer coisa antes que Cristo venha a levá -la consigo (no arrebatamento), é infidelidade a
Ele, com quem ela está desposada. Mas aqui está o matrimô nio da Igreja com o mundo, o final de
um relacionamento que havia começado muito tempo antes.
Antes do tempo deste ‘casamento’, uma coisa importante se menciona na primeira carta, à igreja de
É feso, ainda que só de maneira incidental, pois nã o caracteriza a condiçã o espiritual da assembléia
de É feso. O Senhor lhes diz: “Tens, contudo, a teu favor que odeias as obras dos nicolaítas, as quais
eu também odeio” (Ap 2:6). Entretanto, em Pérgamo temos mais que as obras dos nicolaítas; temos
uma doutrina, e a Igreja, ao invés de recusá -la, a sustentava. Em seu tempo, os santos de É feso
odiavam as obras dos nicolaítas, mas em Pérgamo a permitiram e nã o condenaram aqueles que
sustentavam a doutrina.
Como temos de interpretar esses versículos? Diria que o termo ‘nicolaítas’ é a ú nica ferramenta que
temos para nos ajudar. Muitos têm realizado grandes esforços para tentar demonstrar que existiu
uma seita dos nicolaítas —um grupo religioso específico assim denominado— mas a maioria dos
autores concordam que essa hipó tese é muito imprová vel. Mesmo se existiu tal seita, é difícil
entender por que deveria haver nestas epístolas proféticas semelhante mençã o repetida e enfá tica
a uma seita obscura, acerca da qual a histó ria nos possa dizer muito pouco ou nada. O Senhor
denuncia solene e poderosamente: “a qual eu também odeio”. Ela deve ser especialmente
importante para Ele, e também deve ser significativa na historia da Igreja, por pouco compreendida
que possa ser. Além disso, a Escritura nã o nos encaminha à histó ria da Igreja nem a nenhuma
histó ria para que interpretemos seus significados. A Palavra de Deus é sua pró pria intérprete,
através do Espírito Santo, e nã o temos que buscar outras fontes para descobrir o que está ali. Do
contrá rio, a interpretaçã o da Escritura dependeria de homens eruditos que buscam respostas em
favor daqueles que nã o têm os mesmos recursos ou atributos. Tais ‘respostas’ haveriam de ser,
portanto, forçosamente aceitas tã o somente sobre a base da autoridade desses ‘eruditos’.
Por toda a Escritura, o significado dos nomes é importante. E o significado de nicolaíta é chamativo
e instrutivo. Note-se, entretanto, que para aqueles que falavam grego (língua em que a carta foi
originalmente escrita), o significado lhes era muito claro. Significa subjugador do povo. A ú ltima
parte da palavra – laos – é a palavra grega que designa o ‘povo’ e da qual deriva nosso termo de uso
comum ‘leigos’, ou ‘laicos’. Assim, pois, os nicolaítas foram pessoas que estiveram submetendo ou
reprimindo aos laicos —a massa do povo cristã o— para assenhorearem-se indevidamente sobre
eles.
O que faz com que isto seja mais claro ainda é que em Pérgamo temos também aqueles que
sustentavam a doutrina de Balaã o: um nome cuja semelhança, no tocante a significado, tem sido
observada com freqü ência. Balaã o é uma palavra hebraica que significa ‘destruidor do povo’, um
significado muito importante em vista de sua histó ria. Balaã o “ensinava a Balaque a armar ciladas
diante dos filhos de Israel para comerem coisas sacrificadas aos ídolos e praticarem a prostituiçã o”
(Ap 2:14). Com esse propó sito instigou Israel a misturar-se com as naçõ es, das quais Deus os havia
separado com tanto cuidado.
A perda dessa separaçã o, tã o necessá ria, significou a destruiçã o de Israel, que até entã o
prevalecera. De igual modo, a Igreja é chamada a sair para fora do mundo, e é sumamente fá cil
aplicar o tipo divino neste caso. Assim, a estreita relaçã o destes dois nomes (Balaã o e nicolaíta),
ajuda a confirmar o significado anterior apresentada para ‘nicolaítas’.
O que se passou entre ‘as obras dos nicolaítas’, odiadas em É feso, e ‘a doutrina dos nicolaítas’,
sustentada em Pérgamo? Surgiu um partido, em Esmirna, ao qual o Senhor se refere como daqueles
que diziam que eram judeus e nã o o eram, mas que eram a “sinagoga de Sataná s”. Representavam o
esforço muito bem sucedido de Sataná s de judaizar a Igreja, de fazer com que a Igreja fosse como o
judaísmo do Antigo Testamento.
O judaísmo foi um sistema probató rio: um sistema de prova, para averiguar se o homem podia
produzir uma justiça tal que agradasse a Deus. O resultado da prova foi que Deus disse “Nã o há
justo, nem um sequer” (Rm 3:10). Só entã o Deus pô de mostrar sua graça. Enquanto estivesse
submetendo o homem à prova, Deus nã o podia abrir o caminho à Sua pró pria presença, e justificar,
assim, ao pecador. Ele teve que manter afastado o homem, enquanto perdurava aquela prova, para
que sobre aquele fundamento (as obras dos homens) ninguém pudesse ver a Deus e viver.
Entretanto, a natureza essencial do cristianismo é que todos sã o bem vindos. Há uma porta aberta e
um acesso direto a Deus. O sangue de Cristo habilita a cada pecador a aproximar-se de Deus, e a
encontrar justificaçã o por Ele. Ver a Deus em Cristo é viver, nã o morrer. Por isso, aqueles que O têm
encontrado pelo caminho do sangue que fala de paz, sã o considerados aptos e ordenados para
tomar um lugar distinto de todos os demais. Porque agora eles sã o Seus, sã o filhos do Pai e
membros de Cristo, de Seu corpo. Essa é a verdadeira Igreja, um corpo chamado a sair para fora,
separado do mundo. Leia 1.ª Coríntios 12 e Efésios 1:22-23.
O judaísmo, por outro lado, incluiu apenas aos judeus. E, mesmo entre eles, ninguém podia tomar
um lugar com Deus. Por conseguinte, a separaçã o entre judeus piedosos e nã o piedosos, era
impossível. O judaísmo foi uma necessidade prevista por Deus. Mas instaurar novamente o
judaísmo, depois que Deus lhe houvesse posto fim, nã o fazia sentido. Pelo contrá rio, era o exitoso
trabalho de Sataná s contra o evangelho de Deus e Sua Igreja. Deus denominou a estes judaizantes
como a “sinagoga de Sataná s”.
Agora podemos entender de que forma a sinagoga judaica foi, na prá tica, estabelecida novamente:
quando o verdadeiro cará ter da Igreja se perdeu de vista; quando o significado de ‘membro da
Igreja’ foi reduzido a pessoas batizadas com á gua (no lugar de com o Espírito Santo); quando o
batismo com á gua e com o Espírito Santo foram considerados a mesma coisa (e isto chegou a ser
aceito como doutrina prematuramente na histó ria da igreja). Foi cada vez mais se tornando difícil
falar de cristã os que tivessem se reconciliado, ou feito paz com Deus ou ainda que fossem salvos.
Aqueles ‘cristã os’ esperavam, e os sacramentos e ordenanças chegaram a ser entrepostos como
meios de graça para assegurar, no má ximo, uma salvaçã o muito distante.
Vejamos como isto contribuiu à doutrina dos nicolaítas. À medida que a Igreja se tornou uma
‘sinagoga’, os cristã os se tornaram, na prática, o que foram os judeus da antigü idade, quando nã o
havia, de forma alguma, qualquer aproximaçã o real a Deus. Mesmo o Sumo Sacerdote, quem (como
tipo de Cristo) entrava no Lugar Santíssimo uma vez ao ano, tinha que cobrir o propiciató rio com
uma nuvem de incenso para nã o morrer. Os sacerdotes comuns só podiam entrar no Lugar Santo, e
as pessoas nem sequer podiam entrar ali. Tudo isso estava expressamente designado como um
testemunho de sua condiçã o espiritual. Era a conseqü ência de seu fracasso espiritual, porquanto o
pacto oferecido por Deus a eles em Ê xodo 19 foi este: “Agora, pois, se diligentemente ouvirdes a
minha voz e guardardes a minha aliança, entã o, sereis a minha propriedade peculiar dentre todos
os povos; porque toda a terra é minha; vó s me sereis reino de sacerdotes e naçã o santa” (v. 5, 6).
Assim, pois, a Israel se ofereceu, condicionalmente, uma possibilidade de acesso íntimo a Deus.
Todos eles seriam sacerdotes. Mas isto foi revogado porquanto quebraram o pacto. Entã o, os
membros de uma família especial (Levi) foram postos como sacerdotes, e o resto do povo foi
colocado em um segundo plano.
Assim, um sacerdó cio separado e intermediá rio caracterizou ao judaísmo. Nã o havia nenhum labor
missioná rio; nenhuma saída ao mundo; nenhuma provisã o, nenhuma ordem para pregar a Lei em
absoluto. Com efeito – que podiam dizer? Que Deus estava em uma densa obscuridade e que
ninguém podia ver-lhe e viver. Essas nã o eram boas novas. Assim, a ausência do evangelista e a
presença do sacerdó cio intermediá rio contavam a mesma triste histó ria.
Tal era o judaísmo. Quã o diferente é o cristianismo! Uma vez que a morte de Cristo rasgou o véu
(entre o lugar santo e o lugar santíssimo, indicando um acesso a Deus para todos os sacerdotes) (Mt
27:51), foi aberto o caminho até a presença de Deus. Entã o, de imediato, houve um Evangelho, e a
nova ordem foi: “Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc 16:15). Deus
agora está fazendo-se conhecer ao mundo inteiro.
A intermediaçã o sacerdotal terminou, dado que todos os cristã os agora sã o sacerdotes para Deus. O
que foi oferecido a Israel condicionalmente, é agora um ato incondicional e consumado no
cristianismo. Nó s somos um reino de sacerdotes; e é Pedro (ordenado pelos homens como o cabeça
do ritualismo) quem anuncia as duas coisas que destroem por completo o ritualismo. Primeiro, nos
diz que somos “nascidos de novo”, nã o por batismo, senã o “pela Palavra de Deus que vive e
permanece para sempre”. Segundo, em lugar de uma casta de sacerdotes, ele diz a todos os cristã os:
“ambém vó s mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual para serdes
sacerdó cio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais agradá veis a Deus por intermédio de
Jesus Cristo” (1.ª Pe 1:23; 2:5). Hoje, nosso louvor e açã o de graças, e ainda nossas vidas e nossos
corpos, tudo deve ser sacrifício espiritual para Deus (Hb 13:15, 16; Rm 12:1). Esta deve ser a
verdadeira obra sacerdotal de nossa parte, e só deste modo se conseguirá que nossas vidas
adquiram seu pró prio cará ter. Estes sacrifícios sã o o serviço de oferendas de gratidã o daqueles
capacitados para aproximarem-se a Deus.
No judaísmo —permita-me repetir— ninguém se aproximava de Deus. Assim, pois, sempre que se
encontra uma casta sacerdotal, isto significa a mesma coisa, ou seja, para a grande massa de
pessoas, Deus está fora, distante e obscuro.
O SIGNIFICADO DE UM CLERO
Vamos ver agora o que significa um clero. É a palavra que distingue uma classe especial de pessoas,
distinta dos ‘laicos’ por haver se entregado a coisas espirituais e por ter um lugar de privilégio em
relaçã o a estas coisas sagradas, que os laicos nã o têm. Atualmente, esta classe especial está sendo
atacada por duas razõ es, ainda que esteja longe de desaparecer. Primeiro Deus está projetando luz
com respeito a este assunto. A segunda razã o é puramente humana: a época é democrá tica, e os
privilégios de classes estã o desaparecendo.
Mas, que significado tem esta classe especial? Visto que é distinta dos laicos, e goza de privilégios
que estes nã o têm, significa um aberto e real nicolaísmo, a menos que a Escritura avalize suas
pretensõ es, visto que os laicos têm sido submetidos a eles. Mas a Escritura nã o utiliza tais termos e
distinçõ es de classe, nem os aplica a nossos tempos do Novo Testamento. Estes termos, ‘clérigo’ e
‘leigo’, sã o pura invençã o humana e surgiram depois que o Novo Testamento fora completado,
ainda que em realidade o conceito que está por trá s destes termos foi de fato herdado do judaísmo
do Antigo Testamento.
Devemos ver o importante principio que está em jogo para entender por que o Senhor diz que odeia
as obras dos nicolaítas. Nó s também, se estamos em comunhã o com nosso Senhor, devemos odiar o
que Ele odeia.
Eu nã o estou falando de pessoas (que Deus nã o me permita esse mal!), senã o de uma coisa. Hoje
estamos ao final de uma longa série de afastamentos de Deus. Como consequência, há
uma exacerbaçã o de muitas coisas que têm chegado até nó s como “tradiçõ es dos anciã os”,
vinculadas com homens a quem honramos e amamos, e, admitindo sua autoridade, temos aceitado
estas tradiçõ es sem sequer jamais haver analisado a questã o por nossa pró pria conta e à luz da
Palavra de Deus.
Reconhecemos sinceramente a muitos destes homens como verdadeiros servos de Deus, mas
ocupando uma posiçã o errô nea. Eu me refiro à posiçã o: à coisa que o Senhor odeia. Deus nã o diz:
“as pessoas que eu odeio”. Mesmo naqueles dias, esta classe de mal nã o era hereditá rio como o é
agora, e aqueles que espalhavam o mal tinham sua pró pria responsabilidade. Nó s, nã o obstante, nã o
deveríamos envergonhar-nos nem temer estar onde o Senhor está. De fato, nã o podemos estar com
Ele neste assunto, a menos que nó s também odiemos as obras dos nicolaítas.
Devemos odiar esta coisa porque significa uma casta ou classe espiritual —um grupo de pessoas
que oficialmente tem o direito à direçã o em coisas espirituais, uma proximidade a Deus derivada de
uma posiçã o oficial, e nã o de poder espiritual. Isto é realmente um ressurgimento, sob outros
nomes, e com modificaçõ es, do sacerdó cio intermediá rio do judaísmo. Este é o significado do clero.
Portanto, o resto dos cristã os sã o só laicos, os leigos, pagantes, em maior ou menor medida, à antiga
distancia de Deus, à qual a cruz pô s fim.
Agora podemos ver a razã o pela qual a Igreja tinha que ser judaizada antes que as obras dos
nicolaítas pudessem amadurecer em uma doutrina. Sob o judaísmo, o Senhor até havia autorizado a
obediência a escribas e fariseus que se sentavam na cadeira de Moisés (Mt 23:2-3); e para que este
texto se aplique agora, a cadeira de Moisés tinha que ser estabelecida na Igreja cristã. Uma vez que
isso aconteceu, e que a massa de cristã os fora degradada do sacerdó cio do qual falou Pedro, a
meros ‘membros laicos’, a doutrina dos nicolaítas foi estabelecida.
O MINISTÉRIO CRISTÃO
Nã o me interpretem mal. Eu nã o ponho em dú vida a instituiçã o divina do ministério cristã o, visto
que o ‘ministério’ é característico do cristianismo. Apesar de eu crer que todos os verdadeiros
cristã os sã o ministros, eu nã o questiono um ministério especial e distintivo da Palavra, como dado
por Deus a alguns e nã o a todos, apesar de ser para o uso de todos. Ninguém que seja
verdadeiramente ensinado por Deus pode negar que alguns cristã os tenham o ministério de
evangelista, pastor ou mestre. A Escritura ensina que todo verdadeiro ministro é um dom de Cristo,
que o é por Seu cuidado como Cabeça da Igreja, e que é para Seu povo, que é algum irmã o que tem
seu lugar dado por Deus somente e que é responsá vel, em seu cará ter de ministro, ante Deus
somente. O miserá vel sistema clérigo-laicista degrada o ministro de Deus desse bendito lugar e faz
dele pouco mais que a manufatura e o servidor dos homens. Ao mesmo tempo em que outorga um
lugar de senhorio sobre pessoas que comprazem à mente carnal (a velha natureza), este sistema
restringe o homem espiritual gerando nele uma consciência artificial para com os homens (o
conselho da igreja, etc.), como também obstaculiza a sua consciência para estar corretamente
diante de Deus.
Há um lugar diferente para cada membro do corpo pelo ú nico fato de que ele ou ela é um membro.
Nem todos podem ser o olho, ou ouvido, etc., mas todos eles sã o necessá rios, e todos sã o ministros
em alguma forma, uns dos outros. Assim, pois, cada membro tem seu lugar, nã o só em uma
determinada localidade e para o benefício de uns poucos, senã o para o benefício do corpo inteiro.
Cada membro tem um dom “Porque assim como num só corpo temos muitos membros, mas nem
todos os membros têm a mesma funçã o,5 assim também nó s, conquanto muitos, somos um só
corpo em Cristo e membros uns dos outros,6 tendo, porém, diferentes dons segundo a graça que
nos foi dada: se profecia, seja segundo a proporçã o da fé” (Rm 12:4-6). Leia também 1.ª Coríntios
12:7.11; Efésios 4:7 e 1.ª Pedro 4:10, que demonstram que cada cristã o possui um dom.
Em 1 Coríntios 12, Paulo fala em detalhe destes dons e os chama por um nome significativo no
versículo 7: “manifestaçõ es do Espírito”. Eles sã o dons do Espírito e, também, manifestaçõ es do
Espírito. Eles se manifestam, exibem a si mesmos ali onde se encontram, onde há discernimento
espiritual por parte de pessoas que estã o muito pró ximas a Deus, em comunhã o íntima com Ele. Por
exemplo, tomemos o Evangelho. De onde obtém seu poder e autoridade? É de alguma aprovaçã o do
homem, ou o poder lhe é pró prio e inerente? Desafortunadamente, a tentativa comum de creditar
poder ao mensageiro, dilui, em vez de agregar, poder à Palavra. A Palavra de Deus deve ser recebida
simplesmente por ser Sua Palavra. Ela tem a capacidade de satisfazer à s necessidades do coraçã o e
da consciência pelo simples fato de ser a boa nova de Deus – o Deus que conhece perfeitamente
qual é a necessidade do homem e que, em conseqü ência, tem feito provisã o para ele. Todo aquele
que tem sentido o poder do Evangelho sabe de Quem tem vindo o poder. A obra e o testemunho do
Espírito Santo na alma nã o necessitam nenhum testemunho do homem que os suplementem.
Mesmo a apelaçã o do Senhor em seu pró prio caso foi à verdade. Ele expressou: “Se vos digo a
verdade, por que razã o nã o me credes?” (Jo 8:46). Quando Ele falava na sinagoga judaica ou em
qualquer outro lugar, era, aos olhos dos homens, só um pobre filho de carpinteiro, nã o acreditado
por escola ou grupo de homens algum. Todo o peso da autoridade humana esteve contra Ele. Ele
inclusive repudiou “o receber testemunho dos homens”. Só a Palavra de Deus deve falar por conta
de Deus. “Respondeu-lhes Jesus: O meu ensino nã o é meu, e sim daquele que me enviou” (7:16). E,
como se aprovou a si mesma? Pelo fato de ser verdade! A verdade se fez conhecer àqueles que a
buscavam. Aquele que “quiser fazer a vontade dele, conhecerá a respeito da doutrina, se ela é de
Deus ou se eu falo por mim mesmo” (v. 17). Em Joã o 7 e 8, o Senhor lhes está dizendo: “Eu digo a
verdade. A tenho trazido de Deus; e se esta é a verdade, e se procurais fazer a vontade de Deus,
aprendereis a reconhecê-la como a verdade”.
Deus nã o manteria as pessoas na ignorâ ncia e na obscuridade se procuravam fazer Sua vontade.
Deus permitiria que os coraçõ es sinceros fossem defraudados pelos muitos enganos que havia ao
redor? É claro que nã o! Ele faz conhecer a Sua voz a todos os que lhe buscam. Assim, o Senhor diz a
Pilatos: “Todo aquele que é da verdade, ouve a minha voz” (Jo 18:37). “As minhas ovelhas ouvem a
minha voz; eu as conheço, e elas me seguem”, e de novo: “mas de modo nenhum seguirã o o
estranho; antes, fugirã o dele, porque nã o conhecem a voz dos estranhos” (10:27, 5).
A verdade é de uma natureza tal que a desonramos se tratamos de convalidá -la para aqueles que
sã o verdadeiros, como se ela nã o fosse capaz de evidenciar a si mesma. Inclusive o pró prio Deus é
desonrado, como se Ele nã o pudesse ser suficiente para as almas, ou para o que ele mesmo tem
dado.
Nã o, o apó stolo fala “nos recomendamos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela
manifestaçã o da verdade” (2 Co 4:2). O Senhor diz que o mundo está condenado porque “a luz veio
ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz; porque as suas obras eram má s” (Jo
3:19). Nã o havia nenhuma falta de evidência. A luz estava ali, e os homens reconheceram o seu
poder para sua pró pria condenaçã o, quando procuraram se afastar dela.
Da mesma maneira, no dom está a “manifestaçã o do Espírito”, e é “concedida a cada visando um fim
proveitoso” (1 Co 12:7). Pelo simples fato de que um homem o tenha, ele é responsá vel por usá -lo.
Responsá vel perante Ele, que nã o o deu em vã o. A capacidade e o título para ‘ministrar’ estã o no
dom, porque eu sou responsá vel por ajudar e servir com aquilo que tenho. Se os demais recebem
ajuda, eles nã o necessitam perguntar se tenho autorizaçã o para ajudá -los.
Este é o cará ter sensível do ministério, o serviço de amor conforme a capacidade que Deus dá :
serviço mú tuo de uns aos outros e para todos, sem acepçã o ou a exclusã o de uns a outros. Cada dom
é adicionado ao tesouro comum, e todos sã o feitos mais ricos. A bençã o de Deus e a manifestaçã o do
Espírito sã o toda a autorizaçã o requerida. Nem todos sã o mestres, mas se aplica exatamente o
mesmo princípio. O ensinamento é, entretanto, uma das muitas divisõ es do serviço para Deus,
serviço que é rendido por uns a outros, de acordo com a esfera de seu ministério.
Nã o havia acaso nenhuma classe ordenada (designada) na Igreja primitiva? Isso é uma coisa
totalmente distinta. Havia duas classes de oficiais que eram regularmente designados ou
ordenados. Os diá conos ou servidores tinham a seu cargo os fundos para os pobres e outros
propó sitos, e eram eleitos, primeiro pelos santos para este posto de confiança, e logo nomeados
pelos apó stolos, fosse diretamente ou por aqueles autorizados pelos apó stolos para fazê-lo. Os
presbíteros foram uma segunda classe —homens de idade, como o indica a palavra— que foram
nomeados nas assembléias locais unicamente pelos apó stolos ou seus cooperadores (At 14:23; Tt
1:5) como bispos ou supervisores para estarem atentos ao estado espiritual da assembléia. Os
presbíteros eram o mesmo que os bispos, como deduzimos claramente das palavras de Paulo aos
presbíteros de É feso (At 20:17,28), quando ele lhes exorta dizendo: “Atendei por vó s e por todo o
rebanho sobre o qual o Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a
qual ele comprou com o seu pró prio sangue.” Aqui muitos tradutores tem deixado sem traduzir a
palavra grega episcopos «latinizada para bispo» que significa supervisor, e o mesmo podemos
observar em Tito 1:5, 7: “Por esta causa, te deixei em Creta, para que pusesses em ordem as coisas
restantes, bem como, em cada cidade, constituísses presbíteros, conforme te prescrevi: (…) Porque
é indispensá vel que o bispo (supervisor) seja irrepreensível…”.
O ofício de um presbítero era vigiar ou supervisionar, e mesmo que ser “apto para ensinar” (1 Tm
3:2) fosse uma qualidade muito necessá ria em vista de que os erros eram já rampantes, o fato de
ensinar certamente nã o era algo limitado àqueles que eram “maridos de uma só mulher”, “criando
os filhos sob disciplina, com todo o respeito”, etc. (Tt 1:6-9; 1 Tm 3:2-7). Esta foi uma prova
necessá ria para alguém que seria presbítero (ou bispo), “pois, se alguém nã o sabe governar a
pró pria casa, como cuidará da igreja de Deus?” (1Tm3:1-7).
Qualquer que tenha sido os dom que os presbíteros receberam, eles o utilizavam da mesma
maneira que todos faziam. O apó stolo Paulo ordena o seguinte: “Devem ser considerados
merecedores de dobrados honorá rios os presbíteros que presidem bem, com especialidade os que
se afadigam na palavra e no ensino” (1 Tm 5:17). Daí desprende-se claramente que eles podiam
governar bem, mesmo sem ocupar-se na Palavra e no ensino.
O significado de sua nomeaçã o era apenas este: aqui se tratava de uma questã o de autoridade, nã o
de dom. Foi uma questã o de intitular ou encarregar alguém para examinar, com freqü ência,
assuntos difíceis e delicados entre pessoas que nã o estavam dificilmente dispostas a submeterem-
se a algo ‘meramente’ espiritual. A ministraçã o do ‘dom’, nã o obstante, era uma questã o totalmente
diferente, livre, e para todos.
Isso posto, de forma breve, é a doutrina bíblica. Nosso penoso dever, agora, é contrastar esta
doutrina da Escritura com o sistema que estou desarticulando, no qual uma classe específica está
formalmente ‘consagrada’ à s coisas espirituais, enquanto o povo, os leigos, está, em contrapartida,
excluídos desta ocupaçã o. Este é o verdadeiro nicolaísmo: a sujeiçã o do povo.
Novamente, nã o apenas digo que o ministério da Palavra de Deus é completamente legítimo, mas
também que existem aqueles que possuem dons e responsabilidades específicas (mas nã o
exclusivamente) para ministrá -la. Mas o ‘sacerdó cio’, no sentido judaísta, nicolaíta, é outra coisa e é
suficientemente distinto do ‘ministério’ para ser reconhecido facilmente onde quer que seja
reivindicada ou exista de fato. Os protestantes em geral negam a atribuiçã o de poder sacerdotal a
seus ministros. Nã o tenho nenhum desejo ou intençã o de desacreditar sua honestidade nesta
negaçã o. Eles querem dizer que nã o acreditam que seus ministros têm qualquer poder autoritá rio
de absolviçã o, e que eles nã o fazem da mesa do Senhor um altar no que se renove, dia apó s dia
(como na missa cató lica romana), a perfeiçã o do oferecimento ú nico e suficiente de Cristo, negada
por inumerá veis repetiçõ es. Eles têm razã o com respeito a ambas às coisas, mas esta nã o é a
histó ria completa. Se analisarmos mais profundamente, encontraremos que existe um cará ter
sacerdotal de muitas outras maneiras.
Podemos distinguir sacerdó cio e ministério como segue: o ministério é para os homens, enquanto
que o sacerdó cio é para Deus. O que ministra traz a mensagem de Deus ao povo, falando, da parte
de Deus, a eles. O sacerdote se dirige a Deus da parte do povo, falando no sentido inverso: da parte
do povo, a Deus.
O louvor e as açõ es de graças sã o sacrifícios espirituais. Eles sã o parte de nossas oferendas como
sacerdotes. Agora, ponha uma classe especial em um lugar onde eles só , de forma regular e oficial,
atuem dando louvores e açõ es de graças, e virã o a ser um sacerdó cio intermediá rio, mediadores
entre Deus e aqueles que nã o estã o tã o perto Dele.
A Ceia do Senhor é a mais completa e proeminente expressã o pú blica da adoraçã o e açã o de graças
cristã ; mas, que ministro protestante ou pastor denominacional nã o o considera como seu direito e
dever oficiais de administrá -la? A maioria dos «laicos» se abstém de administrá -la. Este é um dos
terríveis males do sistema, pelo qual as massas cristã s sã o deste modo secularizadas (feitas
mundanas). Ocupadas com coisas mundanas, pensam que nã o podem esperar ser espiritualmente
como os clérigos. Deste modo, as massas sã o exoneradas das ocupaçõ es espirituais, para as quais
crêem nã o reunir as mesmas condiçõ es que o clero.
Mas isto vai muito mais além. “Porque os lábios do sacerdote têm de guardar a sabedoria”
(Malaquias 2:7). Mas como pode o laico (que tem chegado a ser tal por haver abandonado seu
sacerdó cio voluntariamente) ter a sabedoria pertencente a uma classe sacerdotal? A falta de
espiritualidade à qual se tem desprezado a si mesmos nã o lhes permite conhecer as coisas
espirituais. Assim, só a classe ocupada nas coisas espirituais vem a ser intérprete autorizada da
Palavra de Deus. Deste modo, o clero vem a ser os olhos, ouvidos e boca espirituais dos laicos.
De qualquer maneira, esta organizaçã o convém à maioria das pessoas. O «clericalismo» nã o tem
começado simplesmente porque uma classe de homens que quiseram dirigir assumiu o lugar de
liderança. Esta miserá vel e anti-bíblica distinçã o entre clero e laicos nunca poderia ter ocorrido de
maneira tã o rá pida e universal se nã o estivesse tã o bem adaptada ao gosto daqueles a quem
substituiu e degradou. No cristianismo, como em Israel, a profecia tem sido cumprida, “os profetas
profetizam falsamente, e os sacerdotes dominam de mã os dadas com eles; e é o que deseja o meu
povo.” (Jeremias 5:31). Ao sobrevir uma decadência espiritual, um que esta voltando ao mundo
troca de boa vontade, como Esaú , sua primogenitura espiritual por uma mistura da sopa do mundo.
Concede com gratidã o sua necessidade de cuidar das coisas espirituais àqueles que aceitem esta
responsabilidade.
Uma vez que a Igreja perdeu seu primeiro amor e o mundo começou a introduzir-se através das
portas pobremente protegidas, se torna mais difícil para os cristã os tomar o bendito e maravilhoso
lugar que lhes pertencia. Cada passo descendente só torna mais fá cil os passos subseqü entes, até
que, em menos de 300 anos desde o começo da Igreja, um sacerdó cio judaico e uma religiã o
ritualista foram praticados em quase todas as partes. Só os nomes das coisas preciosas do
cristianismo foram deixados. A realidade dos privilégios especiais e cada cristã o individual haviam
desaparecido.
ORDENAÇÃO
Observemos com maior detalhe um traço característico desta clerezia ou clericalismo. Notamos a
confusã o entre o ministério e o sacerdó cio; a atribuiçã o de um título oficial nã o escriturá rio, para as
coisas espirituais, para administrar a Ceia do Senhor e para batizar, etc. Agora tratarei sobre ênfase
posta por este perverso sistema sobre a ordenaçã o (isto é, nomeaçã o ou reconhecimento oficial).
Quero que vejas o que significa ordenaçã o. Primeiro, se consultarmos o Novo Testamento, nã o
encontraremos nada acerca de uma ordem para ensinar ou pregar. Encontraremos pessoas que as
fazem livremente, usando um dom que tenham. A Igreja inteira foi dispersa fora de Jerusalém
(exceto os apó stolos) e estas pessoas foram por todas as partes pregando a Palavra. As
perseguiçõ es nã o as ordenaram. Nã o há rastro de outra coisa. Timó teo recebeu um dom de profecia
pela imposiçã o das mã os de Paulo, em companhia dos anciã os (2.ª Timó teo 1:6; 1.ª Timó teo 4:14);
mas aquela era a comunicaçã o de um dom, nã o uma autorizaçã o para usá -lo! A Timó teo, entã o, se
lhe ordena que comunique seu pró prio conhecimento a homens de fé, que foram capazes também
de ensinar a outros (2.ª Timó teo 2:2), mas nã o há nenhuma palavra acerca de ordená -los. O caso de
Paulo e Barnabé em Antioquia (Atos 13:1-4) fracassa como sustento do propó sito com que alguns o
querem usar, porque (da maneira como se pretende usar) profetas e mestres estariam obrigados a
ordenar ao pró prio apó stolo Paulo, que recusa totalmente ser um apó stolo “dos homens ou por
homem” (Gá latas 1:1). Ao contrá rio o Espírito Santo diz: “Apartai-me a Barnabé e a Saulo para a
obra a que (Eu) os tenho chamado” (Atos 13:2). Trata-se aqui simplesmente de uma missã o especial
que eles cumpriram (Atos 14:26).
O que significa ordenaçã o nos círculos religiosos da atualidade? Pode você estar seguro de que
significa muito; do contrario, os homens nã o contenderiam com tanto zelo por ele. Há duas formas
de ordenaçã o. Na forma mais extrema —como no caso dos cató licos romanos e os ritualistas— à
ordenaçã o se refere a atribuiçã o de conceder tanto autoridade como poder espiritual. Os líderes da
igreja se adotam, com todo o poder dos apó stolos, a faculdade de subministrar o Espírito Santo
mediante a imposiçã o de suas mã os. Deste modo, as massas do povo de Deus sã o descartadas do
sacerdó cio que Ele mesmo lhes tem outorgado, e uma classe especial é colocada em seu lugar para
intermediar por eles de uma maneira que anula o fruto da obra de Cristo e os ata à «igreja» como o
ú nico meio de achar graça.
Aqueles que aceitam uma forma mais moderada de ordenaçã o, recusam reta e consistentemente
essas pretensõ es anti-cristã s. Eles nã o pretendem conferir nenhum dom na ordenaçã o, senã o que
só «reconhecem» o dom que Deus tem dado. Mas este «reconhecimento» é considerado necessá rio
antes de que a pessoa possa batizar ou administrar a ceia do Senhor, coisas que nã o requerem
nenhum dom especial em absoluto! Entã o, quanto ao ministério, o dom de Deus estaria obrigado a
requerer a aprovaçã o humana, e é «reconhecido» em nome de Seu povo por aqueles a quem se
considera que tem um «discernimento» que os cristã os laicos nã o tem.
Cegos ou nã o, estes homens ordenados —o clero— vêm a ser os “guias dos cegos”, à vez que seus
pró prios coraçõ es sã o tirados do lugar de responsabilidade direta ante Deus e feitos indevidamente
responsá veis ante o homem. Uma consciência artificial é feita para eles da parte daqueles que os
ordenaram, e lhes sã o constantemente impostas condiçõ es as quais se tem que ajustar a fim de
obter o reconhecimento requerido. Inclusive estes pastores ou ministros freqü entemente estã o sob
o controle de seus «ordenadores» no que respeita a sua senda de serviço.
Em princípio, tudo isto é infidelidade a Deus, porque se Deus me tem dado um dom a fim de que o
use para Ele, eu seria certamente infiel se comparecer a algum homem ou a um grupo de homens
com o fim de solicitar a sua permissã o para usá -lo. O pró prio dom acarreta a responsabilidade de
usá -lo, como o temos visto. Se eles dizem que as pessoas podem cometer erros, eu estou de acordo,
mas quem tem de assumir minha responsabilidade se estou equivocado? Além do mais, os erros
cometidos por um «corpo ordenante» (ou «presbitério») sã o muito mais sérios que os de um
indivíduo que meramente marcha sem haver sido enviado pelos homens, porque os erros do corpo
ordenante sã o declarados sagrados e se prolongam no tempo pela ordenaçã o que conferiu. Se a
pessoa «ordenada» simplesmente se sustentasse por seus pró prios méritos, encontraria
rapidamente seu verdadeiro nível; mas o corpo ordenante tem investido sobre ele um cará ter que
deve ser mantido.
Equivocaçã o por si mesmo ou nã o, ele é agora nada menos que um novo membro do corpo clerical,
um ministro, mesmo quando nã o tenha realmente nada que ministrar. Ele deve ser mantido —deve
ter sua «igreja»— por mais que esta se encontre em uma localidade pouco ilustre, onde as pessoas
—tã o amadas por Deus como qualquer uma— é posta sob seu cuidado e deve ficar sem se
alimentar se ele nã o for capaz de alimentá -las.
Nã o me acuse de sarcá stico. O que disse anteriormente é um fiel retrato do sistema do qual estou
falando, sistema que envolve ao corpo de Cristo com vendas que impedem a livre circulaçã o do
sangue vivificante do ministério, que deveria estar fluindo de forma irrestrita através de todo o
corpo. Aqueles que ordenam na atualidade devem provar que sã o ou apó stolos ou homens
designados pelos apó stolos porque, segundo as Escrituras, nenhum outro tinha autoridade para
ordenar (Atos 14:23; Tito 1:5). Aliá s, devem provar que o «anciã o» segundo as Escrituras pode nã o
ser anciã o de todo, senã o um jovem, uma pessoa solteira, apenas saída de sua adolescência e que
fora evangelista, pastor e mestre —todos dons de Deus envoltos em uma só pessoa—. Este é o
ministro segundo o sistema: o tudo em todos para 50 ou 500 almas confiadas a ele como seu
rebanho, no qual nenhum outro tem o direito de interferir. Seguramente a marca de «nicolaísmo»,
está posta sobre um sistema como este!
Mesmo quando o ministro esteja espiritualmente dotado (e muitos estã o, como outros muitos nã o
estã o), é imprová vel que tenha todos os dons espirituais. Suponha-se que seja um verdadeiro
evangelista e que as almas se salvem; ele pode nã o ser um mestre, e ver-se assim incapacitado para
edificá -las na verdade. Ou talvez tenha o verdadeiro dom de Deus de mestre, mas é enviado a um
lugar onde há tã o somente uns poucos cristã os e muitos de sua congregaçã o sã o nã o convertidos.
Nã o há conversõ es, mas sua presença ali, por causa do sistema sob o qual está trabalhando, mantém
afastado (em diversos graus) ao evangelista que se necessitaria ali. Damos graças a Deus que Ele
sempre esteja desbaratando estes sistemas, e que as necessidades possam ser supridas de algum
modo irregular. Entretanto, esta provisã o humana nã o é conforme o plano de Deus e por ele divide
ao invés de unir. O sistema é o responsá vel de tudo isto. O ministério exclusivo de um só homem, ou
de um nú mero específico de homens em uma congregaçã o, nã o tem nas Escrituras o que o sustente.
A ordenaçã o é o esforço para limitar todo ministério a certa classe e faz descansar a este na
autorizaçã o humana e nã o no dom divino. E assim se nega aos demais membros do corpo —o
rebanho de Cristo— a capacidade aprovisionada por Deus para ouvir Sua voz e em seguida
comunicá -la. O resultado é que se dá ao homem a atençã o que deveria ser dada à Palavra que ele
traz. A pergunta prevalecente é: Está autorizado? Relativo à verdade do que fala, com freqü ência é
secundaria se ele está ordenado; ou talvez, diria eu, sua ortodoxia (sua retidã o doutrinal) está
estabelecida já de antemã o para eles pelo fato de ser ordenado.
O apó stolo Paulo nã o fora autorizado para ministrar conforme este plano. Houve apó stolos antes
dele, mas ele nã o subiu a eles nem recebeu nada deles. Se houvesse uma «sucessã o», ele a cortaria.
Paulo fez o que fez, de propó sito, para mostrar que seu evangelho nã o era segundo os homens, nem
derivado deles (Gá latas 1:1) e que nã o descansava sobre a autoridade humana. Se ele mesmo ou um
anjo do céu (cuja autoridade pareceria concludente) anunciasse um evangelho diferente do que
havia pregado, a sentença solene de Paulo é: “seja aná tema” (Gá latas 1:8-9).
Autoridade, entã o, nã o é nada, a menos que seja autoridade da Palavra de Deus. Esta é a prova: É
isto conforme as Escrituras? “Acaso pode um cego guiar a outro cego? Nã o cairã o ambos no
buraco?” (Lucas 6:39). Dizer: «Eu nã o pude conhecer: confiei no outro», nã o o salvará do poço (o
inferno para os nã o conversos, a pobreza espiritual e a perda da comunhã o para os salvos),
independentemente de quanta «autoridade» pretendeu ter o ministro que lhe guiou ao erro.
Mas, como pode pretender o nã o espiritual e nã o instruído «laico» ter um conhecimento igual ao do
educado e acreditado ministro, dedicado à s coisas espirituais? Em geral, nã o pode. Ao invés de
segurar por si e para si a Palavra de Deus, usando o poder do Espírito Santo que mora Nele para
aprender as coisas espirituais (Joã o 14:26), ele se submete à quele que, segundo supõ e, deve saber
mais e melhor. Assim, pois, na prá tica, o ensinamento do ministro ou pastor substitui
principalmente a autoridade da Palavra. Entretanto, ele mesmo nã o tem certeza quanto à verdade
ministrada. O laico nã o pode ocultar-se a si mesmo o fato de que os ministros nã o estejam de
acordo entre si por mais doutos, bons e acreditados que sejam.
Mas aqui o diabo intervém e sugere à pessoa incauta que a confusã o é o resultado da imprecisã o
das Escrituras, quando na realidade é o resultado de fazer caso omisso das Escrituras. Opiniã o, nã o
fé, há em todas as partes. Você tem direito a dar a sua opiniã o, mas deve conceder a outros o direito
a ter a pró pria. Você pode dizer «eu creio» enquanto nã o quer dizer «eu sei». Reclamar
«conhecimento» seria reclamar que você é mais sá bio e melhor que as geraçõ es precedentes, as que
creram de forma diferente.
Deus tem ocultado dos sá bios e entendidos o que revela à s criaturas. A escola de Deus é mais
efetiva que todos os seminá rios juntos, e nessa divina escola, laicos e clérigos podem ser iguais: “o
espiritual julga (discerne) todas as coisas (1.ª Coríntios 2:15), pois tudo depende da condiçã o
espiritual individual. Nã o há substituto para a espiritualidade. O homem nã o pode gerar
espiritualidade em outra pessoa mediante a ordenaçã o nem mediante nenhum outro meio.
Ordenaçã o, em sua forma mais moderada, é o esforço do homem para realizar a manifestaçã o do
Espírito Santo. Mas se aqueles que ordenam cometem um erro (ou eles mesmos nã o sã o espirituais
e, por ele, incapazes de julgar) e seu «ministro» nã o tem nada que ver com a obra de Deus, eles
simplesmente provêem guias cegos para os cegos.
DISCUSÃO E SUMÁRIO
Deste modo, a santa Palavra de Deus sempre encomenda a si mesma ao coraçã o e à consciência. O
esforço de querer dar a Sua aprovaçã o ao sacerdó cio romano ou à hierarquia protestante, fracassa
em ambos os casos por estar sobre o mesmo terreno do nicolaísmo. Nã o, o nicolaísmo nã o é coisa
do passado, nã o é doutrina obscura de épocas passadas, senã o um gigantesco e difundido sistema
de erro, frutífero em resultados malignos. O erro, ainda que mortal, pode perdurar por muito
tempo. Nã o vá atrá s dele por causa de sua antigü idade ou porque todo o mundo o segue. O Senhor
aborrece este perverso sistema clerical. Se Ele o aborrece. Deveríamos sentir medo de ter
comunhã o com Ele neste assunto? Todos nó s devemos reconhecer que há bons homens envolvidos
neste sistema: homens piedosos e verdadeiros ministros, que levam sem saber o emblema dos
homens. Que Deus os livre! Que possam deixar de lado suas ataduras e serem livres! Que possam
elevar-se à verdadeira dignidade de seu chamamento e serem responsá veis perante Deus,
caminhando diante Dele somente!
Por outro lado, amados irmã os, é de grande importâ ncia que todos os integrantes de Seu povo, por
diferente que seja seu lugar no Corpo de Cristo, estejam conscientes de que todos eles sã o
ministros, assim como sacerdotes, sem exceçã o. Cada cristã o tem deveres espirituais que emanam
de suas relaçõ es espirituais com todos os demais cristã os. É o privilégio de cada cristã o contribuir
com sua participaçã o ao tesouro comum dos dons espirituais com os quais Cristo tem dotado a seu
Igreja. Um que nã o contribui com seu ministério, está retendo de fato o que é sua obrigaçã o para
com toda a família de Deus. Ninguém que possua sequer aparentemente um pequeno «talento», tem
direito a enterrá -lo e nã o dobrá -lo. Tal açã o é infidelidade e incredulidade.
“Mais bem-aventurado é dar que receber” (Atos 20:35). Irmã os, quando despertaremos à realidade
destas palavras? Temos uma inesgotá vel fonte de regozijo, a qual é para bençã o, e se viermos a ela
quando temos sede, rios de á gua viva correrã o de nó s. A fonte de á guas vivas (a Palavra) nã o está
limitada, para aquele que a recebe, pela quantidade que recebe dela. Ela é divina e, além disso,
completamente nossa. Oh, conhecer mais desta plenitude e de toda a responsabilidade de sua
possessã o em um mundo espiritualmente seco e cansado! Oh, conhecer melhor a infinita graça que
nos utiliza como o meio de transmitir aos homens! Quando estaremos em condiçõ es de entender
nossa comum posiçã o e doce realidade da comunhã o verdadeira com Ele, aquele que “nã o veio para
ser servido, mas para servir”? (Mateus 20:28). Oh, por um ministério nã o oficial! Que coraçõ es
cheios transbordem dentro dos vazios para que muitos outros possam também estar cheios. Como
deveria regozijar-nos —em um mundo de necessidade, miséria e pecado― o fato de encontrar
constantes oportunidades para mostrar a capacidade da plenitude de Cristo para combater e
ministrar a cada um das necessidades do mundo.
Para resumir, pois, podemos afirmar que o ministério oficial é independência prá tica do Espírito de
Deus. Diz que um homem deve transbordar, mesmo quando estiver vazio; e, por outro lado, que
outro nã o deve transbordar, mesmo se estiver cheio. Propõ e, ante a presença do Espírito Santo —
que veio na ausência de Cristo para ser o Guardiã o de seu povo— assegurar a ordem e o
fortalecimento mediante legislaçã o ao invés de fazê-lo mediante poder espiritual. Provoca que o
rebanho de Cristo deixe de escutar Sua voz, fazendo algo nã o necessá rio para eles. Deste modo
sanciona e perpetua a nã o-espiritualidade individual, em lugar de condená -la e de evitá -la.
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