Oliveira Viana e A Crítica Ao Marginalismo Politico Das Elites
Oliveira Viana e A Crítica Ao Marginalismo Politico Das Elites
Oliveira Viana e A Crítica Ao Marginalismo Politico Das Elites
Oliveira Viana
ea
crítica ao “marginalismo” político das elites
Introdução
Este trabalho tem por objetivo o estudo das críticas de Oliveira Viana ao que ele
intitula “marginalismo” político das elites, assim como da solução apresentada pelo
autor para superar esta visão simplificadora dos problemas políticos brasileiros. O
estudo será realizado tendo por base as idéias apresentadas no livro Instituições
Políticas Brasileiras (1949), do mesmo autor.
O “marginalismo” político das elites se constitui no total desconhecimento e
indiferença das elites políticas e intelectuais brasileiras em relação à importância
que a realidade do “povo-massa” tem sobre os projetos políticos voltados para o
progresso da nação.
Para Oliveira Viana, é o “povo-massa” brasileiro, com seu “direito público
costumeiro”, suas instituições, tipos sociais, usos e costumes constituídos ao longo de
uma história de quatro séculos e meio, que influencia de forma direta qualquer proposta
política e que vai decretar a viabilidade ou não das idéias e propostas políticas
implementadas pelas elites dirigentes do país.
Esta influência deformadora do “povo-massa” sobre os projetos políticos é vista
pela elite como um problema dos indivíduos, como se estes não valorizassem a
nobreza dos princípios destes projetos quando, na verdade, são os projetos políticos
propostos por esta elite, que costumam estar inadequados à realidade brasileira,
exatamente por terem-na desprezado.
Esta indiferença em relação à realidade brasileira resulta numa total dessintonia
entre as propostas feitas pelas elites para a evolução das instituições políticas e do
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direito público e os resultados práticos dessas propostas, gerando, muitas vezes,
resultados contrários aos pretendidos.
Segundo Oliveira Viana, a forma como nossas constituições vinham sendo
elaboradas são um grande exemplo deste “marginalismo”. Neste processo, nossas
elites copiavam as “Chartas” estrangeiras, como se a simples existência de novas leis
pudesse trazer modificações ao comportamento do povo.
As constituições de 1824 e 1891 são dois grandes exemplos. A primeira
inspirada na Constituição inglesa, e a segunda na dos Estados Unidos da América.
Através dessas “Chartas” esperava-se implementar um regime liberal no Brasil,
esquecendo-se que, para estabelecer um sistema liberal de governo, é necessário uma
sociedade com uma mentalidade liberal anteriormente estabelecida, o que não existia
aqui.
Um bom sistema de leis, para que se torne efetivo, necessita, para Oliveira
Viana, fazer o costume preceder e inspirar a feitura da lei. O autor mostra a diferença
entre direito-lei e direito-costume, ressaltando que nos países desenvolvidos, como os
de origem anglo-saxônica, o direito-costume já existente nos costumes e tradições do
povo é incorporado às leis, havendo, portanto, correspondência entre o comportamento
real dos indivíduos e o que suas leis estabelecem enquanto comportamento ideal.
Oliveira Viana mostra que esta “cegueira” das elites em relação à realidade do
“povo-massa” está diretamente relacionada com a corrente metodológica de
interpretação das questões políticas e de direito público, denominada clássica ou
dialética, da qual Rui Barbosa era o representante maior.
No processo de superação desta limitação do pensamento “marginalista”,
Oliveira Viana relata o surgimento de outras duas correntes metodológicas: a objetiva
ou realista, defendida por Alberto Torres, e a sociológica, da qual diz ser ele mesmo o
primeiro a aplicar ao exame da sociedade brasileira e sua instituições políticas e de
direito público.
Estas novas correntes surgem como uma reação à metodologia clássica e ao
“marginalismo” político das elites. No entanto, o autor enfatiza a existência de
diferenças fundamentais entre as duas, estando a sociológica num estágio explicativo
mais avançado, em relação aos problemas brasileiros de ordem política.
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Para entender a crítica ao “marginalismo” político das elites elaborada por
Oliveira Viana e a solução proposta pelo autor para superar esta condição, iremos
estudar as análises do autor acerca das metodologias clássica e objetiva e,
posteriormente, sua proposta de uma nova metodologia explicativa dos problemas
políticos da nação, a metodologia sociológica.
Oliveira Viana aludindo à metodologia clássica, diz: “Os que tomam o caminho
exclusivo da norma e praticam a metodologia dialética, a que alude Rogher Pinto. Estes
desdenham a sociedade – e acreditam na existência de tipos universais de Estado. É o
caso de Rui” (IPB, v. II, p.28)
Rui Barbosa foi considerado por Oliveira Viana como o grande divulgador desta
metodologia no Brasil, sendo “o responsável supremo pela cultura política das gerações
republicanas e também por esta metodologia formalista ou dialética, que ainda persiste,
tenaz, nas gerações de agora...” (IPB, v.II, p.38).
Os defensores da metodologia clássica são os principais responsáveis, segundo
o autor, pelo já citado idealismo utópico e “marginalismo” político das elites.
Normalmente partidários do liberalismo e da democracia, acreditam poder copiar os
modelos de governo de países desenvolvidos e transformar a sociedade brasileira,
como num passe de mágica, numa sociedade liberal e avançada.
Oliveira Viana considera que os defensores desta metodologia esquecem-se de
nossa realidade, caracterizada pelo facciosismo e pela política de clã, e que, entre nós,
a descentralização e a defesa do self-government local, nos moldes liberais,
normalmente ocasiona a “anarquia rural”, e faz surgir a figura do caudilho, do coronel, e
de toda uma política contrária aos ideais democráticos, apesar de terem estes como
objetivo.
Julgam que é possível transpor instituições políticas características de outros
povos, com formação cultural e política totalmente diferentes da nossa, como os anglo-
saxões. Esquecem-se que “cada povo é uma entidade inconfundível; que cada um tem
a sua fórmula sociológica própria, o seu modo de vida privativo, que deriva das
peculiaridades da sua formação histórica e social; que, em cada povo, há uma
subestrutura de modos de ser, que não permitem a sua transformação nos modos de
ser de nenhum outro: - e que esta irreversibilidade estrutural se verifica principalmente
no campo das instituições políticas” (IPB, v.II, p.40).
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Oliveira Viana faz críticas contundentes à metodologia utilizada por Rui Barbosa
e seus contemporâneos, mas ressalta a existência de três motivos que justificam os
erros e fragilidade desta doutrina política.
Primeiramente, “O estado ainda embrionário das ciências sociais e da ciência
política na sua época” (IPB, v.II, p.50), pois estas sofreram grande evolução após a 1a
Guerra Mundial, momento de grandes transformações sociais e políticas. Destaca-se
ainda que, na década de 1920, as ciências sociais desprendem-se da filosofia social e
adquirem status de ciência objetiva, tornando-se menos especulativas e dedutivistas e
mais científicas.
O segundo motivo indicado é “O estado ainda rudimentar , em sua época, do
conhecimento do nosso povo”, que só após 1920 começou a ser pesquisado de forma
científica, e Rui Barbosa, tendo falecido em 1923, não chegou a conhecer o Brasil real,
concreto, objetivo. (IPB, v.II, p.52)
O terceiro motivo relatado é o fato de que “Como todos os seus contemporâneos,
Rui – nestes assuntos de ciência política e direito público – identificava os meios da sua
tecnologia com os fins da sua ideologia”, de forma que não via outros meios de
alcançar seus “fins (governo do povo, liberdades civis e políticas, administração local,
ordem pública, paz social, progresso, grandeza nacional)”, a não ser pelos meios já
constituídos na democracia inglesa ou norte-americana, desconhecendo a
possibilidade, que sobreveio depois de sua morte, quando a “ciência política mostrou
ser possível atingirem-se estes mesmos ideais adotando meios diferente dos
consagrados pelo Estado Liberal. Como, por exemplo, os que substituem o sufrágio
universal pelo sufrágio corporativo. Ou os partidos políticos pelos grupos corporativos.
Ou que reduzem o primado do Poder Legislativo, assegurando-lhe apenas uma
competência limitada...Sem que nada disso, entretanto, significasse deixar de manter
fidelidade aos ideais da Democracia...” (IPB, v.II, p. 52 e 53)
Um dos erros mais relevantes dos defensores da metodologia clássica é a
crença de que uma técnica ou instituição aplicada a um determinado povo terá os
mesmos resultados se aplicados a qualquer outro povo, mesmo que este tenha se
desenvolvido em condições sociais e ecológicas totalmente diferentes. Oliveira Viana
ressalta que a ciência social e a experiência histórica de “hoje” (refere-se a 1948, data
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de elaboração do livro) mostram exatamente o contrário, e que, na verdade, os
resultados deste transplante podem ser totalmente diferentes e possivelmente
contrários ao esperado.
E o Brasil, durante muito tempo sob a influência da metodologia clássica, que
“ainda persiste, tenaz, nas gerações de agora – já meio contagiada das ciências sociais
e suas lições” (IPB, v.II, p.38), termina por sofrer os inconvenientes e as inadaptações
de muitas Constituições e estruturas políticas transplantadas, “estranhas” ao
comportamento político do “povo-massa”, o verdadeiro Soberano da nação.
Capítulo V – Conclusão