A Carta Dos 100
A Carta Dos 100
A Carta Dos 100
Militantes e Dirigentes do PC do B
Agosto de 1961
Primeira Edição: jornal A Classe Operária, em abril de 1962.
Com o fim de esclarecer os nossos leitores sobre o processo de luta interna que
vem se processando nas fileiras comunistas, a redação de A Classe Operária decidiu
publicar a carta que cerca de 100 conhecidos militantes e dirigentes comunistas
enviaram, em agosto do ano passado, ao antigo Comitê Central. Esse documento,
redigido em termos fraternais, como exigem as justas relações entre comunistas,
solicitava que a direção partidária tornasse sem efeito decisões por ela adotadas a
respeito da criação de um novo partido e que feriam resoluções do 5º Congresso.
A antiga direção do PCB respondeu a essa solicitação com arbitrárias medidas
administrativas. Tomando conhecimento dessa carta, os comunistas e os
trabalhadores poderão julgar da conduta dos seus signatários e dos dirigentes do
atual Partido Comunista Brasileiro. (A Classe Operária, abril de 1962)
Ao Comitê Central
do Partido Comunista do Brasil
Esses documentos constituem, a nosso ver, violação frontal dos princípios partidários,
aberta infração das decisões do 5º Congresso, ferem a disciplina e atingem a própria unidade
do Partido. O artigo 32 dos Estatutos diz: “(...) as decisões do Congresso são obrigatórias para
todo o Partido e não podem ser revogadas, no todo ou em parte, senão por outro Congresso
(...)”.
1
No entanto, o Comitê Central alterou o nome do Partido, modificou profundamente
os Estatutos e apresentou um novo programa, atribuições exclusivas do Congresso,
exorbitando, assim, as suas funções.
2
Justamente por essa razão, sempre manteve sólidos laços de amizade e solidariedade
com o Partido Comunista da União Soviética; destacamento mais experiente e provado do
movimento comunista internacional.
Não foi por esse motivo que o TSE pôs na ilegalidade o Partido. Serviu de pretexto a
acusação infundada de que o Partido não satisfazia às exigências do artigo 141, § 13 da
Constituição da República.
Neste caso, então, se existem as condições políticas para o registro do Partido, seria
suficiente reafirmar expressamente que o Partido defende a pluralidade dos partidos e respeita
os direitos fundamentais do homem.
Na realidade, essa alteração tem sentido mais grave – procura-se registrar um novo
partido, com programa e estatutos que nada têm a ver com o verdadeiro Partido Comunista.
A luta pela legalidade do Partido é uma luta política e não pode ser feita escondendo-se
seus objetivos, sua doutrina e suas tradições.
Assim pensando, não podemos concordar com a alteração do nome do nosso glorioso
Partido.
3
Outra questão de princípio diz respeito ao Programa, cuja aprovação é também de
competência exclusiva do Congresso. O documento dado à publicidade em Novos Rumos
como sendo o programa dos comunistas é a negação do Partido revolucionário do proletariado
em troca de uma hipotética legalidade.
Enquanto a Resolução diz que os comunistas têm o dever de lutar à frente das massas
camponesas por uma reforma agrária que liquidasse o monopólio da propriedade da terra pelos
latifundiários, o programa do Partido Comunista Brasileiro refere-se de maneira genérica à
“efetivação da reforma agrária em todo país” e apresenta medidas parciais menos avançadas
do que as propostas no projeto do deputado Joffily, o qual conta com o inteiro apoio do
governo federal.
4
Por que o comunismo foi excluído como objetivo? Procurando ganhar as boas graças
da Justiça Eleitoral, o Comitê Central fala vagamente em socialismo, palavra que, desprovida
de seu conteúdo, hoje qualquer burguês mais ou menos perspicaz acena demagogicamente
para iludir as massas que despertam para o verdadeiro socialismo vitorioso em países com uma
população de mais de um bilhão de pessoas.
Se na época em que Marx viveu o comunismo ainda era meta a alcançar, objetivo
remoto que o Partido operário incluía em seu programa, na atualidade, quando a sociedade
comunista está sendo construída na União Soviética, é um absurdo esconder esse objetivo.
O programa é para nós comunistas uma questão vital. A opinião pública brasileira
encontra-se completamente confundida sobre os verdadeiros fins e o modo de atuar do
Partido. Nestas condições, é necessário ter um programa claro e preciso.
Não cabem as omissões nem a dubiedade. Mais do que nunca precisamos ter em conta
os ensinamentos de Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista: “Os comunistas não
se rebaixam a dissimular suas opiniões e seus fins”.
5
define o caráter do Partido e o distingue dos demais partidos, não é questão secundária que
pode ou não figurar na nossa Lei interna.
Não há por que deixar de proclamar que o Partido se rege pelo internacionalismo
proletário, que une em um todo harmônico o verdadeiro patriotismo – à luta para emancipar
nossa Pátria da dominação imperialista e para libertá-la de qualquer espécie de opressão – à
luta comum dos trabalhadores de outros países pela paz, pela democracia e pelo socialismo.
Ao solicitar seu registro eleitoral, o Partido deve afirmar o princípio de que mantém
decididamente sua solidariedade com os trabalhadores do mundo inteiro. A eliminação do
6
princípio do internacionalismo proletário nos Estatutos revela o quanto o nacionalismo
burguês penetrou no Partido.
Assim pensando, não podemos concordar com as modificações de fundo levadas a cabo
nos Estatutos do Partido.
Diz seu artigo 141: “O diretório que se tornar responsável por violação do programa
ou dos estatutos do seu partido político, ou por desrespeito a qualquer de suas deliberações
regularmente tomadas, incorrerá em pena de dissolução”.
7
dos marcos da legalidade (isto é, da existência ‘pública’ legal), embora para isso seja preciso
renunciar de modo claro e aberto ao programa, à tática e às tradições (isto é, à experiência
passada) do partido”.
A legalidade do Partido não pode ser obtida com manipulações jurídicas, nem por
intermédio de concessões em matéria de princípios, e muito menos tentando enganar com
manobras a justiça das classes dominantes, pois, em última instância, os enganados serão os
trabalhadores e os próprios comunistas.
Se a solução para a conquista dessa legalidade fosse exclusivamente jurídica, então por
que, em passado recente, a Justiça Eleitoral não reconheceu o Partido Popular Progressista e a
Aliança Democrática Brasileira que satisfizeram todas as exigências da Lei Eleitoral, possuíam
nomes que em nada lembravam o comunismo, tinham estrutura e nomenclatura bem diversas
das do Partido Comunista do Brasil e direções em que não havia comunistas?
Somos favoráveis a uma campanha que possibilite o retorno do Partido à vida legal.
Acreditamos ser possível alcançar essa meta. Mas, queremos a legalidade do Partido
revolucionário da classe operária que tenha como doutrina o marxismo-leninismo e se guie
pelos princípios do internacionalismo proletário.
8
É de se estranhar, portanto, que justamente nesta conjuntura, o Comitê Central
apresente documentos que fogem da definição de um verdadeiro partido revolucionário
proletário.
A nossa atitude ao enviar essa carta ao Comitê Central é ditada pelo dever de combater
a violação das decisões do 5º Congresso, pelo desejo de assegurar a unidade partidária e
salvaguardar a existência do Partido como organização política revolucionária de vanguarda da
classe operária.
Diante da situação criada pelo Comitê Central a ele nos dirigimos, apelando para o
espírito de partido de seus membros, no sentido de que acatem as decisões do 5º Congresso,
substituindo os documentos publicados em Novos Rumos por outros que se coadunem com
as decisões do último Congresso, ou então convoquem um Congresso Extraordinário para
resolver sobre a mudança do nome do Partido e as modificações no Programa e nos Estatutos.
Ao adotar essa posição, confiamos que nas fileiras do próprio Partido existam forças
suficientes para derrotar as tendências errôneas e encontrar o acertado caminho para resolver
as dificuldades que o Partido enfrenta.