Memória Escoteira Nº 88 5 9

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ANO XV – nº 88 setembro a dezembro de 2019 www.ccme.org.

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A Missão do Cruzador José


Bonifácio – 100 anos.
Por Andre Torricelli F. da Rosa
No início do século XX o governo praianos, descendentes de índios e
brasileiro iniciou efetivamente um portugueses, que habitavam a
trabalho que duraria trinta anos, voltado imensa costa brasileira.
aos pescadores do litoral brasileiro. Eles Os objetivos da campanha, em
eram uma camada da população, linhas gerais, foram estudos
naquela época, que vivia por muitas científicos sobre o espaço marítimo
vezes isolada, em praias distantes, e até brasileiro, a organização dos
em condições precárias. A partir de 1919 pescadores em colônias, o
a Marinha desenvolveu o trabalho que foi saneamento, a nacionalização da
nomeado, e é conhecido entre nós e até pesca e o direcionamento dos
hoje, por “Missão do Cruzador José homens para a reserva militar,
Bonifácio”. Desde o dia 13 de outubro tendo em vista a previsão de um
daquele ano, quando o navio largou do período de conflitos mundiais que
Rio de Janeiro rumo ao norte, atuou até poderiam atingir o Brasil, como de
o ano de 1922 concluindo, em 1923, o fato acabou acontecendo no século
trabalho de organizar as Colônias de XX. O capitão de fragata Frederico
Pescadores pela costa brasileira, do Villar, comandante do Cruzador,
extremo norte ao sul do país. Como esteve envolvido desde 1909 com
relata o Comandante Frederico Villar em os estudos e planejamentos
seu livro, lançado em 1945, estava necessários para concretizar o
incluído na missão criar escolas e plano do governo brasileiro. Ele
Grupos de Escoteiros do Mar. A realizou viagens à Europa para
finalidade, desta ação, como explica o estudar as indústrias da pesca e
mestre em história da UFRN, Giovanni elaborou relatórios para serem
Bentes Filho, foi educar os filhos dos aplicados na construção das
pescadores, os caboclos indústrias similares no Brasil.

Na Foto: Comandante Frederico Villar e o Cruzador José Bonifácio.


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Em todo esse contexto, no ano de 1920
a competência administrativa sobre a
pesca sai do Ministério da Agricultura e
passa de vez para a Marinha, que
proporciona linhas de crédito para os
pescadores modernizarem suas
atuações profissionais.
A ideia da criação dos Grupos de
Escoteiros do Mar nas Colônias de
Pescadores, surgiu quando o
Cruzador estava em Belém do Pará, e
o tenente Gumercindo Loreti
encontrou com o amigo de farda, o
então tenente Benjamin Sodré, que
naquela ocasião estava fundando o 1º
Grupo Escoteiro do Pará, no Clube
Tenente Gumercindo Loretti. Foi
Paysandu. Sodré, acabou por levar
um dos idealizadores e maiores
seus escoteiros para visitar o navio, e
incentivadores da organização do
foram colocados para remar nos
Escotismo do Mar brasileiro.
pequenos barcos auxiliares. Assistindo
a atividade, conversavam e
organização da Confederação
resolveram que deviam ser organizado
Brasileira dos Escoteiros do Mar em
no Brasil, um escotismo voltado
1921, em solenidade realizada na
exclusivamente para a mentalidade e
Colônia Z4 (Jurujuba), como noticiou
atividades marítimas. O tenente
a revista oficial dos pescadores. No
Benjamin Sodré estudava
Saco de São Francisco aconteceu
um acampamento do
dia 5 ao dia 7 de
setembro de 1921, que
reuniu grupos de
Escoteiros Municipais
do Distrito Federal e da
Associação dos
Escoteiros Católicos do
Brasil além dos
pescadores da Colônia
Z4. A tropa liderada por
Gelmirez de Mello,
fundada pelo Almirante
Amphiloquio Reis em
Foto: Tripulação do Cruzador. 1915, pertencia aos Escoteiros
Municipais, da capital, tendo
profundamente as bases do escotismo comparecido ao acampamento em
desde 1913, quando adquiriu o primeiro Jurujuba, recebendo a 10ª
livro em um cebo, no centro do Rio, e numeração da FBEM quando da sua
soube apresentar seu valor aos colegas, incorporação em 1922, ocasião em
tanto que alguns anos depois esteve que transformou-se em um grupo.
lotado na Diretoria de Portos e Costas, Quatro Grupos foram os fundadores
atuando na abertura de Grupos em da CBEM, como relata Benjamin
Colônias e no treinamento dos Chefes Sodré em seus escritos na revista
Escoteiros do Mar. Escoteiro do Mar, sendo eles o
Resultado deste trabalho inicial, realizado Santos, o Jequiá, o Cabo Frio e o 10º
pela costa do Brasil foi a Grupo, este último liderado pelo
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famoso sargento da marinha Gelmirez de da Lagoa de Maricá, e em Rio
Mello. O acampamento teve por finalidade Grande, RS, (13 de dezembro),
saudar o Sr Dr Veiga Miranda, ministro da quando o Ten. Gumercindo Loretti
Marinha, que era um admirador do fundou a Associação Regional de
escotismo porque teve contato com o Escoteiros do Mar já com mais de
trabalho da ABE em São Paulo. O 500 jovens participando das
ministro, acompanhado de diversas atividades. Em seguida, na primeira
autoridades, discursou no palanque metade de 1922, foram criadas
Comissões Regionais e núcleos
como Saquarema, São João da
Barra, Angra dos Reis, Ilha do
Governador, Jurujuba, Niterói e na
própria Capital Federal (RJ), Rio
Grande (RS), Santos e Ubatuba
(SP), São Francisco do Sul (SC),
Soure, Belém do Pará (PA) e
Aracaju (SE). Os Grupos se
multiplicaram por toda a costa
brasileira com o passar dos anos,
com uma impressionante
organização que funcionou bem
estruturada até a década de 60
quando houve a fusão
administrativa completa da União
dos Escoteiros do Brasil.

O Ministro da Marinha, Dr. Veiga


Miranda, presidiu pessoalmente a
fundação da CBEM em Niterói, 1921.
montado em Jurujuba. Deu a posse à
primeira diretoria nacional dos Escoteiros
do Mar, que tinha como presidente o Sr
Paulo da Rocha Vianna - que também era
o presidente da Confederação Nacional de
Pescadores - mais os senhores Antonio
1922 – Gabriel Skinner presente a
Freire de Vasconcellos, Peixoto Fortuna,
fundação em São João da Barra (RJ).
Gumercino Loreti, Benjamin Sodré, Bruno
Nunes e Gabriel Skinner. A solenidade foi Os Estatutos da CBEM,
encerrada com uma apresentação teatral demonstravam como a organização
da Escola Dramática Brasileira e um
dos Escoteiros do Mar esteve
musical do Corpo de Marinheiros
atrelada, às Colônias de Pescadores.
Nacionais.
Esse trabalho de organização e criação de Com o passar do tempo a FBEM
novos Grupos de Escoteiros do Mar, desvinculou-se dos Pescadores
através da missão do Cruzador José ampliando a abrangência na
Bonifácio, gerou muitos resultados. sociedade. Porém, não deixando de
A CBEM (que apenas um ano após abrir novos GEMARes nas Colônias
mudaria sua razão social para e proceder sua ação social
“Federação”), logo no mês seguinte se especialmente para as parcelas mais
expandiu ao criar grupos nas Colônias de carentes da sociedade. O saldo da
Pescadores de Maricá (20 de novembro), missão do Cruzador José Bonifácio,
com 180 jovens que tinham como chefe foi um grande trabalho cívico que
Guilhermino Rocha, que se dedicava um criou as bases fortes do Escotismo
dia por semana a cada tropa ao redor do Mar brasileiro.
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CENTENÁRIO DO ESCOTISMO NO PARÁ
O Tico-Tico, 10 de outubro de 1923 - NOTICIÁRIO - O ESCOTISMO NO PARÁ

Nesse grande Estado do extremo norte, depois da organização da Associação de


Escoteiros Cathólicos do Pará, o movimento revive com grande animação. Nada
menos de oito grupos cathólicos foram organizados. O Instituto “Lauro Sodré”,
uma admirável escola profissional, que honra o Estado, com matricula para perto
de 200 alunos, reiniciou a instrução escoteira que já adotara há alguns anos
atrás. O “1º Grupo de Escoteiros de Belém”, fundado em 1919 por oficiais da
nossa Marinha de Guerra, com excelente organização, com modelares oficinas
de carpinteiros, ferreiros, serralheiros, mecânicos, eletricistas e instrução de
horta e jardinagem, criou novo alento, graças ao exemplo dos escoteiros
católicos. E por todo o Estado se nota um entusiasmo intenso que se manifesta
pelos raids e por atos meritórios, realizados pelos jovens escoteiros paraenses.

A notícia que abaixo transcrevemos, da “A Folha do Norte”, trás-nos a boa nova


da fundação de mais três grupos:

“Escoteiros católicos – A utilitária Associação de Escoteiros Catholicos do Pará,


fundada sob as mais animadoras perspectivas, e que teve animador e franco
acolhimento de nossa sociedade, vai distendendo o efeito de sua ação pelo
interior do Estado, graças aos seus nobres fins e dedicação de seus dirigentes.

Assim é que, devido aos esforços do padre Jose´Maria do Lago, Vigário da Sé,
esta Paróquia foi aumentada com mais três grupos, sendo um em Iguarapé-assú,
com sede na Escola D. Macedo Costa; outro no rio Guamá, com sede na escola
D. Bosco, e o terceiro , também no Guamá, com sede na Escola Santa Thereza.
Estas escolas são mantidas pela paróquia da Sé. É o instrutor destes grupos o
Sr. Raymundo da Silva Monteiro.

Dez escoteiros do grupo da Escola D. Macedo Costa realizaram, em


comemoração do aniversário da adesão do Pará à Independência, num raid, pela
mata, até Belém, em marcha de escoteiro.

À chegada, os valorosos rapazes foram recebidos festivamente.

O Presidente da Associação, Dr. José Augusto de pinho, convida todos os


diretores-presidentes de grupos, diretores técnicos e auxiliares, para uma
reunião, em seu palacete, á rua Dr. Assis, hoje, às 8 horas da noite.”

Benjamin Sodré,
fundador do
escotismo no Pará.

Foto da Promessa em 1919.

Cerimonia de Juramento da retomada


do primeiro grupo escoteiro do Pará, no
Instituto Lauro Sodré – 1923.

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CENTENÁRIO DO ESCOTISMO NO PARÁ

O PRIMEIRO HERÓI SACRIFICADO NO CUMPRIMENTO DO DEVER


O TICO-TICO, 12 de dezembro de 1923 - Velho Lobo

Coube ao Pará escrever nas páginas do escotismo brasileiro o nome do


primeiro herói sacrificado no cumprimento do dever. Eis como o “Jornal do
Comércio” o descreveu num suscinto telegrama:

“Belém, 16 – Na vila do Mosqueiro foi fazer um passeio uma turma de 28


escoteiros. Saindo desta capital ontem, depois de várias manobras e passeios,
foram a praia tomar banho. Seriam 16 horas, no mesmo local já estava n’água um
menor de nome Expedito Ferreira, que era arrastado pela maré; o escoteiro Manoel
Gonçalves Branco Filho atirou-se para salvá-lo, sendo o seu heroísmo fatal. Ao
aproximar-se de Expedito uma volumosa onda atirou-o para longe, desaparecendo
no seio das aguas, não se encontrando sequer seu cadáver.

Expedito foi salvo por outro escoteiro Claudomiro Maués Tocantins, que se atirou
em auxilio de ambos”.

O espirito fica suspenso ao ler essa notícia, em toda a sua grandiosa simplicidade.

Heróis! Heróis aos treze, aos quinze anos !

E tu, Gonçalves Branco! O teu corpo robusto, o teu espírito animoso foi tragado pelo
mar, cobriu-te para sempre o frio sudário da espuma branca, mas morando vivo e
sagrado no coração de todos os escoteiros do Brasil, o teu nome ficará eterno:

• MANOEL GONÇALVES BRANCO FILHO !

Foste o primeiro sacrificado pelo heroísmo! Ficarás para sempre como um exemplo!
Nas sedes das Tropas o teu nome será gravado em letras de ouro, sobre escudos de
honra.

A tua lembrança nunca perecerá.

Ave !

O escotismo paraense também é repleto de


aventuras heroicas. Como noticiou a revista O
Tico-Tico em 1924, a embarcação vigilenga ‘15
de agosto’, fez o cruzeiro Pará-Rio. Foi doada a
Confederação Brasileira de Escoteiros do Mar,
e fez a viagem em excursão de instrução
pratica, com uma turma de alunos da Escola
de Instrutores.

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