Paredos e o Exu Pessoal
Paredos e o Exu Pessoal
Paredos e o Exu Pessoal
CIPRIANO O MAGO
Autor: Romario Romis
O desejo de se comunicar com os espíritos é mais antigo que a his-
tória; relacionado com princípios indeléveis da natureza humana
[...] e as tentativas de satisfazer esse desejo geralmente tomam
uma forma que traz um grande ultraje a razão. [...] A constância da
reiteração [da conjuração] feita com frequência aumenta sua au-
toridade e poder, e acomete o terror nos espíritos, submetendo-os
a obediência. [...] No Egito, na Índia e na Grécia, não se lidava com
diabos como no cristianismo; Typhon, Juggernaut e Hécate não
eram divindades inferiores, mas sim deuses absolutos, e o ofício
de Canídia era em sua maneira tão sagrado como os pacíficos mis-
térios de Ceres.1
1 Arthur Edward Waite, O LIVRO DA MAGIA NEGRA E DOS PACTOS. Via Sestra, 2018. Os colchetes são meus.
2 Danilo Coppini, QUIMBANDA: O CULTO DA CHAMA VERMELHA E PRETA. Via Sestra, 2019.
3 Maja D’Aoust, FAMILIARS IN WITCHCRAFT. Destiny Books, 2019.
4 Frater Acher, CYPRIAN OF ANTIOCH. Quereia Publishing, 2017. Os colchetes são meus.
[da magia]. Com essa consciência nós nos descobrimos em um
mundo vivo repleto de espíritos; espíritos que têm vivido podero-
samente, seres independentes que dão vida, dinamismo e poder a
magia.5
5 BJ Swain, LIVING SPIRITS: A GUIDE TO MAGIC IN A WORLD OF SPIRITS. Publicação do autor, 2018. Os colchetes são
meus.
6 Jonas Sufurino em O LIVRO DE SÃO CIPRIANO: O TESOURO DO FEITICEIRO; veja THESAURUS MAGICUS, Vol. II. Humberto
11 José Leitão, THE BOOK OF ST. CYPRIAN: THE SORCERER’S TREASURE. Hadean Press, 2014.
O PAREDROS & O EXU PESSOAL
A maioria dos métodos e técnicas usados pelas bruxas dos tempos antigos tem pouca
semelhança com aqueles usados pelas bruxas neopagãs de hoje. Muitas vezes o povo
astuto praticava a observância da fé dual e os encantos, amuletos, orações e encanta-
mentos que eles usavam invocavam Jesus, a Virgem Maria, a Trindade e a companhia
dos santos. Os salmos eram usados para propósitos mágicos como feitiços e ainda es-
tão em alguns círculos de feitiçaria tradicionais modernos. Com a chegada da nova fé
do cristianismo e a supressão das antigas religiões pagãs, objetos como crucifixos,
medalhões dos santos, a hóstia e a água benta foram amplamente usados pelos magos
populares porque acreditavam possuir «virtude» ou energia mágica e poder de cura
inerente. O simbolismo cristão era usado em rituais de magia popular envolvendo pro-
teção psíquica, contra-magia e cura. Muitos dos antigos encantos pagãos foram cristi-
anizados e alguns dos santos assumiram os atributos anteriores de deuses e deusas
pagãos. As nascentes sagradas, anteriormente dedicadas às deusas, por exemplo, eram
voltadas para a Virgem Maria ou para as mulheres, como Winefrede ou Bride. Os en-
cantos de cura substituíram os nomes das divindades pagãs, como Woden, Loki e
Thor, pelos de Deus, de Jesus e do Espírito Santo. Muitos dos grimórios [medievais]
usados pelas bruxas e praticantes da magia popular também continham inevitavel-
mente o simbolismo judaico-cristão.
Algumas bruxas tradicionais modernas ainda seguem a observância da fé dupla u-
sando os salmos para propósitos mágicos, trabalhando com a companhia de santos e
empregando imagens cristãs, simbolismo e liturgia, muitas vezes de maneira herética
e subversiva. A bruxa neo-pagã fala de maneira que não prejudique ninguém, enquan-
to que a bruxa tradicional moderna – em comum com as astúcias das bruxas do passa-
do – pode tanto curar quanto amaldiçoar quando surgir a necessidade. Aqui a magia,
enquanto cristã, é indubitavelmente autêntica, e não um renascimento romântico. Prá-
ticas semelhantes podem ser encontradas no Vodu, Hoodoo, Santeria, Macumba, Ju-ju
e Obeah nas Américas e na África. Um modelo católico do universo, incluindo o céu, o
purgatório e o submundo, influenciou a aceitação congolesa e o uso do catolicismo em
suas práticas mágicas, como Palo Mayombe. É tão útil na necromancia ocidental.12
12 Jake Stratton-Kent, THE TESTAMENT OF CYPRIAN THE MAGE. Scarlet Imprint, 2014. Os colchetes são meus.
profunda transformação espiritual. Para tal propósito o feiticeiro produz
uma alquimia em seu ochēma (corpo astral) de tal modo que ele se torna um
Ovo Negro. Essa alquimia quem opera é Exu com as vibrações emanadas do
Trono de V.S. Maioral e dos Sete Reinos Infernais da feitiçaria tradicional
brasileira: encruzilhadas, cruzeiros, almas, matas, cemitérios, lira e praias. O
Exu Pessoal do feiticeiro-kimbanda é o agente de comunicação e transmuta-
ção entre o ochēma do feiticeiro e as poderosas forças dos Sete Reinos de
Exus e Pombagiras. O glifo que representa essa alquimia negra da alma é a
imagem de Baphomet.
Essa alquimia negra sobre a alma desperta suas potências. Como temos es-
tudado, um genuíno praticante do Caminho da Mão Esquerda não depende
das virtudes dos deuses em planos de luz e perfeição para agregar a sua al-
ma uma quantidade considerável de luz para torná-la um augoeides, quer
dizer, um Ovo de Luz luminoso e resplandecente. Através do veneno da ser-
pente o feiticeiro arranca das covas de sua alma suas potências inatas. Ele
caminha, portanto, sobre suas próprias pernas. Por outro lado, Exu é puro
dinamismo. Se há algo que Exu é inimigo, é a estagnação. É este dinamismo
que o Exu Pessoal compartilha com feiticeiro-kimbanda. Para cavar as pro-
fundezas obscuras da própria alma o feiticeiro-kimbanda precisa de intenso
ímpeto dinâmico. Compartilhando do poder dinâmico de seu Exu Pessoal, o
feiticeiro-kimbanda cava mais fundo as profundezas da alma, buscando o
despertar de sua Chama Negra.
A feitiçaria tradicional brasileira é, portanto, uma medicina para alma.
Através do contato com Exus e Pombagiras é possível despertar as potências
inatas da alma através de um processo de cura espiritual. Diferente da igno-
rância generalizada, a feitiçaria tradicional brasileira é uma Arte Negra que
opera uma alquimia na alma através da feitiçaria. Exus e Pombagiras podem
ser convocados para aniquilação de medos e traumas, para organização da
mente e cultivo da vontade, para libertação de vícios e maus hábitos, além de
agentes de magia para todos os fins, ataque, defesa, energização ou purifica-
ção.
Assim, na busca pela sabedoria e poder de seu Exu Pessoal o feiticeiro-
kimbanda se coloca na mesma jornada do feiticeiro dos papiros gregos; uma
jornada, no entanto, universal, típica da tradição da magia em culturas di-
versas. E como temos estudado, o mito de São Cipriano expressa essa busca
genuína de todo mago. Ao avaliarmos as funções do paredros e sua relação
com o feiticeiro nos papiros (I.42-195), temos:
13 Neste caso, elevar no ar significa levar a alma do mago para longe do cativeiro do submundo após a morte.
1. Poder de causar invisibilidade. O Exu Pessoal (ou outros Exus Patro-
nois) protege o feiticeiro-kimbanda com sua capa e tridente, escon-
dendo-o e protegendo-o de seus inimigos e desafetos.
2. Poder de libertar uma pessoa de amarras na prisão e abrir portas. O
Exu Pessoal protege o feiticeiro-kimbanda de prisões físicas ou psico-
sociais, libertando-o. Há muitas rezas de Exu para esse tipo de pro-
blema.
3. Poder de mudar a forma do mago para animais que voam, quadrúpedes
e répteis. Exu pode se metamorfosear em muitas formas. Por exemplo,
Exu Panteira Negra é um caboclo da mata que às vezes se manifesta
como uma pantera. Esse é um poder licantrópico de Exus e Pombagi-
ras. Este poder pode ser transferido ao feiticeiro-kimbanda que pode
a partir disso metamorfosear seu ochēma, tomando a forma de seus
animais de poder.
4. Poder de elevar o mago aos céus. Era uma crença na Antiguidade que o
paredros poderia auxiliar o mago na deificação de sua alma. Exu auxi-
lia na deificação da alma do feiticeiro-kimbanda, quando ele passa a
fazer parte das legiões de V.S. Maioral.
5. Poder de conferir ao mago riquezas. Os Exus e Pombagiras do reino da
lira (ou qualquer reino) podem auxiliar o feiticeiro-kimbanda a obter
conforto financeiro.
6. Poder de ser adorado como um deus caso o mago tenha com esse deus
certa intimidade. Essa é uma crença baseada na ideia de que o pare-
dros compartilha de seus poderes com o mago. Na Antiguidade, feitos
taumatúrgicos conferiam notoriedade, daí ser adorado como um deus.
Exus e Pombagiras compartilham de suas virtudes com o feiticeiro-
kimbanda.
7. O paredros torna-se o companheiro do mago, vive, come e dorme com
ele. Ao assentar Exus e Pombagiras em casa ou no templo, o feiticeiro-
kimbanda traz o espírito da legião para morar com ele. O espírito tor-
na-se, portanto, um familiar.
8. O paredros revela com clareza tudo o que o mago precisa saber. O Exu
Pessoal trabalha diretamente com o feiticeiro-kimbanda através de
oráculos como búzios, ossos e cartas.
9. O paredros executa qualquer tarefa que o mago lhe apontar. O Exu Pes-
soal ou outros Exus e Pombagiras patronos auxiliam e socorrem o fei-
ticeiro-kimbanda quando este necessita, seja para fins de alquimia na
alma ou magia de ataque e defesa.
10. O paredros é capaz de se manifestar como um animal aéreo ou aquáti-
co, réptil ou quadrúpede. Novamente, o poder licantrópico do Exu. Veja
no. 3 acima.
11. O paredros se apresenta com daimones para auxiliar o mago. Exus e
Pombagiras se apresentam com uma legião de espíritos para auxilia-
rem as demandas do feiticeiro-kimbanda.
Soldo: O Exu Pessoal da feitiçaria tradicional brasileira é o típico paredoi,
espírito assistente ancestral dos PAPIROS MÁGICOS GREGOS. Muito bem! Agora,
como estreitar laços com o Exu Pessoal? Através do treinamento e da prepa-
ração mediúnica, que pode conter elementos diversos trazidos de iniciações
anteriores. Por exemplo:
Fernando de Ligório
Curso de Filosofia Oculta