História Local
História Local
História Local
HISTÓRIA LOCAL
1ª EDIÇÃO
Sobral/2016
INTA - Instituto Superior de Teologia Aplicada
PRODIPE - Pró-Diretoria de Inovação Pedagógica
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Sumário
Palavra do professor-autor ................................................................................... 09
Sobre o autor ......................................................................................................... 11
Ambientação à disciplina ...................................................................................... 12
Trocando ideias com os autores ........................................................................... 14
Problematizando .................................................................................................... 16
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Palavra do professor-autor
Caro estudante,
Boa Leitura!
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Sobre o autor
JOSÉ ITALO BEZERRA VIANA é Doutorando em História Social pelo
Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Ceará
(UFC), linha de pesquisa “Memória e Temporalidade”. Mestre em História
Social pelo Programa de Pós-Graduação em História da Universidade
Federal do Ceará (UFC), linha de pesquisa “Cultura e Poder”. Licenciado em
História pela Universidade Regional do Cariri (URCA). Membro do Grupo de
Estudo e Pesquisa em Patrimônio e Memória (GEPPM-UFC).
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AMBIENTAÇÃO À
DISCIPLINA
Este ícone indica que você deverá ler o texto para ter
uma visão panorâmica sobre o conteúdo da disciplina. a
Não faz muito tempo, as aulas de História eram resumidas à memorização de
episódios e à apreciação das figuras heroicas que estampavam os livros didáticos. O
conteúdo trabalhado em sala de aula seguia o calendário cívico, de feriados nacionais
e datas comemorativas, mantendo as aulas de História restritas a um passado
descontextualizado. Hoje, apesar de poucas escolas usarem essa abordagem, o
estudo da História ainda apresenta dificuldades em ligar os ideais de vida coletiva
e em sociedade ao seu papel cidadão, porque os estudantes não se sentem parte
desse processo histórico.
Para mudar esse quadro, o estudo da história local e do cotidiano faz com que
nos percebamos como parte integrante da História, por meio das nossas vivências
pessoais e também com a nossa comunidade. A reflexão sobre o processo histórico
do lugar em que vivemos, sua região e o estabelecimento de relações com outros
espaços e tempos nos tornará capazes de entender que a História que está nos
livros é construída pela ação de diversos sujeitos de diferentes classes sociais.
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ti
TROCANDO IDEIAS
COM OS AUTORES
A intenção é que seja feita a leitura das obras indicadas
pelos(as) professores(as) autores(as), numa tentativa de
dialogar com os teóricos sobre o assunto.
Agora é o momento de você trocar ideias com os autores!
GUIA DE ESTUDO
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PROBLEMATIZANDO
É apresentada uma situação problema onde será feito
um texto expondo uma solução para o problema
abordado, articulando a teoria e a prática profissional. PL
“O século da história erudita”, assim ficou conhecido o século XIX, marcado
pela perspectiva oficial da História, naquele momento preocupada em legitimar
os poderes instituídos a partir da busca das origens e do traçado da evolução da
nação. Dizia-se que a História era discurso científico capaz de suscitar no povo o
sentimento de identificação com a sociedade. Assim sendo, o referido século foi
o período da profissionalização do historiador e o ensino de História passou a ser
ministrado nas universidades, impulsionada pelos incentivos governamentais em
manter historiadores em grandes empreendimentos de pesquisas e de publicações.
Via-se na História a possibilidade de resgate da memória coletiva e a organização
da identidade nacional.
Essa concepção de história foi recorrente até início do século XX, quando uma
“Nova História” surgiu a partir do encontro interdisciplinar de historiadores, filósofos
e geógrafos. Desse encontro, passou-se ao questionamento de uma concepção
de História chamada de “positivista”, isto é, produzida para o enaltecimento dos
grandes acontecimentos e personagens políticos nacionais. Houve, então, um
esforço de revisão dos modelos historiográficos e a busca por novas abordagens
teórico-metodológicas em História.
E agora no século XXI, como opera a História? Quais são as fontes que informam
e ajudam a construir a narrativa histórica na contemporaneidade? Quem são os
sujeitos valorizados nessa narrativa?
GUIA DE ESTUDO
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APRENDENDO A PENSAR
O estudante deverá analisar o tema da disciplina
em estudo a partir das ideias organizadas pelo
professor-autor do material didático.
Ap
1
HISTÓRIA LOCAL,
HISTORIOGRAFIA E ENSINO
CONHECIMENTOS
Conhecer o conceito de História Local e seu processo de
ensino e aprendizagem.
HABILIDADES
Conceituar História Local e compreender seu processo de
ensino e aprendizagem.
ATITUDES
Aplicar o conceito de História Local e explicar seu processo
de ensino e aprendizagem.
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O conceito de História Local
Um dos princípios constitutivos da História Local é possibilitar um olhar
indagador sobre o mundo do qual fazemos parte, no intuito de sabermos mais
sobre o sentido das coisas. Tanto como conteúdo, quanto como recurso didático, a
temática da dimensão local na construção do conhecimento histórico contribui para
o desenvolvimento de uma postura investigativa que começa a ser construída no
espaço familiar e vai-se ampliando aos poucos. O ponto de partida desse tipo de
história são as próprias histórias que integram o nosso cotidiano.
Esses arquivos “da vida diária”, como chamou o historiador francês Philippe
Artières (1998), guardam experiências individuais e coletivas que constroem um
determinado tipo de conhecimento capaz de dar sentido às experiências individuais
e coletivas de uma dada comunidade, relacionando-as com histórias mais amplas.
Desse modo, os arquivos pessoais passam a ser entendidos como fontes documentais
relacionadas à memória social, política e cultural de uma dada localidade.
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[...] não se restringe ao conhecimento veiculado principalmente pelos
manuais didáticos, instrumento que tem imposto um conhecimento
histórico homogeneizador e sem sujeitos; que o conteúdo da História
pode ser encontrado em todos os lugares; e que o conhecimento histórico
está na experiência humana. (SCHMIDT, 2007, p.195).
[...] nem a história é ‘mestra da vida’ nem ela se repete. A rigor, cada
momento histórico é, em si, único [...]. Deve [então] ser afastada a visão
pedagógica da história, de que o exame da situação passada mostra o
exato caminho a seguir no presente ou de que os exemplos dos homens
do passado devem pautar a conduta dos homens contemporâneos.
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Mas, afinal, o que é a história local?
Ora, quando os historiadores elegem o local para refletir sobre diversos aspectos
da vida social, eles reduzem a escala de observação com a intenção de produzir
efeitos de conhecimento que visam, na forma narrativa, dizer algo sobre esses lugares
particulares e únicos, conforme afirmação do historiador francês (REVEL, 1998).
Desse modo, a história local serve para questionar a ideia de que somente
os grandes centros culturais, econômicos ou políticos são capazes de produzir os
acontecimentos da história. No entanto, isso não significa dizer que a história local
se explica de modo isolado, afinal, em tempos de globalização, as especificidades
locais devem ser compreendidas em suas relações de interseção com o global,
principalmente na era da informação instantânea como as redes sociais na internet,
por exemplo, que põem em contato as ideias, os valores, comportamentos e práticas
dos mais diversos e distintos lugares.
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Mas é preciso deixar claro que a problematização dessa hierarquia não situa o
local em oposição ao nacional, uma vez que a história local aborda o conhecimento
histórico a partir de outros prismas, apontando outros lugares de ação, informando
como diversos sujeitos e espaços sociais foram negligenciados por uma escrita
histórica comprometida durante muito tempo com a fundação de uma única grande
história que acabou por influenciar a produção tanto de obras históricas quanto de
livros didáticos que definiram e orientaram as investigações dos historiadores, o
ensino nas escolas e universidades assim como a regência dos professores em sala
de aula.
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individuais e coletivas. Conforme afirma Bittencourt (2004, p. 172):
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Essa variedade de observações acerca do ensino e da aprendizagem em História
Local serve para ilustrar os modos pelos quais o ensino dessa disciplina, na escola
ou na universidade, constantemente é alvo de disputas, uma vez que a preocupação
com os objetivos desse ensino diz respeito não somente à construção do senso de
pertencimento a um determinado lugar, que podemos chamar de identidade, mas
também às possibilidades de politização do currículo escolar.
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Durante as décadas de 1940 e 1950, a preocupação no campo da História voltou-
se para a reconstituição do passado a partir das fontes escritas, de preferência o maior
número possível delas. As reformulações na política educacional daquele período, que
ficaram conhecidas como reforma Gustavo Capanema, insistiram na necessidade de
fazer o aluno desenvolver um pensamento relacional e crítico, bem como enfatizaram
a autonomia didática do professor para desenvolver uma metodologia de ensino que
aliasse teoria e prática no estudo da história local.
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organização do que seria propriamente ensinado (SANTOS, 2014, p. 62-63).
Dessa forma, é preciso atentar para quais são os valores e as ideias produzidas
nas histórias locais. Isso porque não é raro que sejam narrativas históricas
apologéticas dos “grandes fatos” e seus respectivos “heróis”. Nesse caso, convém
observar como a identidade local é (re)afirmada e materializada nas praças, nas
ruas, nos discursos políticos e, principalmente, livros didáticos que tratam da
história de uma determinada localidade. Assim, é necessário que o historiador
lance um olhar crítico sobre suas fontes, no intuito de evidenciar as limitações que
se apresentam numa história preocupada tão somente em narrar fatos e defender
um modelo “definitivo” e/ou “verdadeiro” para o ensino e a aprendizagem em
História.
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O olhar questionador dessas histórias únicas permite detectar também os
modos pelos quais se opera a idealização da história local. Geralmente marcada
pela presença de personagens bravos e heroicos, essas histórias também costumam
apresentar o espaço como um lugar inalterado e de contornos perenes, dificultando
a compreensão do processo histórico enquanto movimento. Isto significa dizer que
o historiador precisa atentar para a própria dinâmica da vida, observando que os
lugares podem até ser o mesmo, mas eles nunca são iguais porque se organizam
e se transformam a partir de relações sociais que são também temporais. Em
outras palavras, o historiador deve reconhecer a importância de situar espacial e
historicamente os lugares sobre os quais escreve, entendendo que “[...] o lugar que
ocupamos não é só nosso e nem mesmo o é eternamente, ele é dividido com outras
pessoas” (ZAMBONI, 1984, p. 65).
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escrita ou recuperada pela oralidade, existem os “lugares da memória”,
expressos por monumentos, praças, edifícios públicos ou privados, mas
preservados como patrimônio histórico. Os vestígios do passado de
todo e qualquer lugar, de pessoas e de coisas, de paisagens naturais ou
construídas tornam-se objeto de estudo.
Na contramão desse tipo de produção, é preciso dar vez a uma história local
comprometida com reconhecimento da pluralidade cultural, entendendo que ela
não obedece apenas às elaborações teóricas propostas nas normativas educacionais
como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), pois também pode contribuir para
eliminar as visões distorcidas acerca dos diferentes grupos sociais que compõem
a localidade, considerando justamente essa diversidade como demarcadora das
particularidades locais.
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riscos de uma história pontuada por bairrismos e estereótipos persistam, ainda é
possível e necessário, investir num processo de ensino-aprendizagem da História
Local capaz de estimular o senso de preservação da memória, da construção da
cidadania e da definição de uma identidade plural. Assim, é salutar pensar que
o tema em questão suscita a definição de recortes curriculares e programas de
conteúdos que estejam em sintonia com o fazer do historiador e, sobretudo, com as
especificidades do trabalho do professor de história.
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O LOCAL, O NACIONAL E O
2
UNIVERSAL NA HISTÓRIA:
QUESTÕES DE IDENTIDADE E
CIDADANIA
CONHECIMENTOS
Conhecer o conceito de identidade local, nacional e universal e o processo de
construção da cidadania a partir da História Local.
HABILIDADES
Conceituar identidade local, nacional e universal e entender o processo de
construção da cidadania a partir da História Local.
ATITUDES
Aplicar o conceito de identidade local, nacional e universal e explicar o processo
de construção da cidadania a partir da História Local.
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Identidade X Identidades
O estudo da história local pode esclarecer muito mais do que se imagina sobre
as questões que envolvem acontecimentos políticos, crises econômicas e toda sorte
de relações socioculturais relativas a um espaço social mais abrangente, embora as
contradições da vida social costumem dar uma aparência de insignificantes aos
pequenos acontecimentos da vida cotidiana. Vale lembrar, todavia, que são eles que
possibilitam a inserção das pessoas comuns nos processos históricos e permitem uma
nova compreensão acerca do papel do indivíduo como sujeito da história, questionando
a legitimidade de um único sujeito ser capaz de construir a história local.
História Local | 35
Logo, a articulação dos conteúdos da História Local com as perspectivas
históricas: nacional e universal, apostando na percepção do movimento constante das
sociedades, nos permite o desenvolvimento de uma consciência histórica marcada
pelo entendimento de que não é possível falar em lugares isolados, dissociados e
imunes aos impactos do mundo.
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determinado lugar e nele nos reconhecemos, a alternativa contra a ameaça de perda
desse lugar é impulsionar a memória por meio da reconstrução de histórias. Trata-
se, pois, de uma luta pela memória e pela identidade que começa a ser travada
diante de questões perturbadoras lançadas pelo perigo do esquecimento: Que
importância tem esse lugar? O que faz este local ser o que é?
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espaço para a defesa do direito à diferença, mas também para demonstração que
elementos culturais próprios de uma determinada sociedade podem ser igualmente
importantes para a coletividade.
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A construção da cidadania a partir da História
Local
Na segunda metade do século XX, notadamente a partir dos anos 1970, situa-
se o significativo crescimento com a preocupação da construção da cidadania a
partir da produção historiográfica que questionava a manutenção de privilégios
das elites nacionais, por exemplo. A opção por uma história de recorte social, que
incorporou as lutas dos movimentos sociais e também uma história de cunho mais
cultural, que inseriu a perspectiva da história das mentalidades, preocupada não
apenas com o pensamento das elites, mas também das camadas populares, renovou
os temas e os métodos da investigação histórica, bem como introduziu novas fontes
de pesquisa que se tornaram de fundamental importância na articulação entre as
tendências micro e macro-histórica.
História Local | 39
nossos contemporâneos. Por isso, a historiadora Bittencourt (2004, p. 172) ressalta:
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Nesse sentido, pode-se conhecer a maneira como alguém ou algum grupo
vivenciou determinados acontecimentos resgatando sua subjetividade,
sem confundi-la com fatos objetivos. O emprego de outras fontes (além das
escritas) e a comparação de diferentes fontes orais, adotando a perspectiva
da interlocução entre as diversas fontes documentais, é fundamental no
trabalho com a história oral (SCHIMDT; CAINELLI, 2004, p. 127-128).
Assim compreendida, a História poderá ser percebida não somente como uma
ciência do passado, mas como a “ciência dos homens no tempo”, conforme a definiu
o historiador Marc Bloch (2001, p. 55). Logo, a História tem a ver com o presente e
suas questões são vivenciadas nele. É essa vivência que nos leva a olhar o passado
com o intuito de compreender nosso cotidiano e assumirmos uma postura crítica e
consciente ajustada à sociedade atual, cuja principal razão é conhecer e transformar
aquilo que é nosso.
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e culturais que fogem da lógica dos “acontecimentos heroicos”, os trabalhos com
enfoque na questão local trabalham também com noções e valores caros à formação
da diversidade cultural brasileira.
42 | História Local
[...] a primeira seria fruto da singularidade dos processos históricos de cada
grupo social. A segunda seria uma ‘diferença de outra natureza’, produzida
pela relação de dominação e exploração socioeconômica e política.
(GONTIJO, 2009, p. 68).
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Nas palavras do historiador Miceli (2006, p.34-35):
44 | História Local
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PATRIMÔNIO CULTURAL,
3
MEMÓRIA E EDUCAÇÃO
PATRIMONIAL
CONHECIMENTOS
Conhecer o conceito de identidade local, nacional e universal e o processo de
construção da cidadania a partir da História Local.
HABILIDADES
Conceituar identidade local, nacional e universal e entender o processo de
construção da cidadania a partir da História Local.
ATITUDES
Aplicar o conceito de identidade local, nacional e universal e explicar o processo
de construção da cidadania a partir da História Local.
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O patrimônio cultural na história local
Um dos importantes objetivos do ensino da História é que esse conhecimento
seja integrado às demais dimensões da vida cotidiana. Em outras palavras, ele deve
fazer sentido e ser percebido na vida prática das pessoas. Desse modo, o conhecimento
histórico pode estabelecer um feixe de relações com a vida social e simbólica das
pessoas fortalecendo os vínculos da comunidade com o seu patrimônio cultural.
No sentido de tornar esse saber histórico mais próximo dos interesses do dia
a dia, o patrimônio incentiva a participação social e cultural como ato essencial
ao processo educacional mais amplo que a escolarização, considerando que em
determinados contextos a instituição escolar não é o único agente educativo. Assim,
antes de cair em um “localismo esterilizante” (Brandão, 1996, p. 73), onde todos os
processos de aprendizagem se realizam em seus limites e com seus exemplos, o
patrimônio cultural dialoga com a História a partir das referências culturais locais
para compreender e refletir acerca de processos sociais e culturais mais amplos e
abrangentes.
Na segunda metade do século XIX, o termo patrimônio histórico, por sua vez,
passou a designar elementos de pertencimento coletiva da comunidade, do Estado
e da nação. Com isso, o conceito de patrimônio foi vinculado ao de monumento,
especialmente relacionado aos edifícios históricos, e se difundiu progressivamente
a partir do desafio de guardar, no presente, aspectos do passado que se esvaíam
(KERSTEN, 2000).
História Local | 49
Portanto, foi nos séculos XIX e XX que a “preocupação” de preservar o passado
se estendeu para o Estado, que passou a estimular a produção de leis de conservação
e restauração, transformando-se em uma problemática mundial. Nesta perspectiva,
as políticas de preservação patrimonial nos países ocidentais durante muito tempo
orientaram-se pelos conceitos de permanência e autenticidade, com base no modelo
francês, cuja legislação acompanhava a necessidade de formação da memória oficial
do Estado, e assim, de uma identidade nacional que sacralizava uma memória cujo
traço principal não correspondia à imensa variedade dos grupos sociais, sobretudo
no caso do Brasil (NOGUEIRA, 2013).
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e sobrados [...]. Na verdade, essa prática de preservação remontava aos
pressupostos que informavam as noções de memória e de patrimônio,
assentadas na ideia de que os monumentos históricos constituíam
basicamente objetos artístico-arquitetônicos e não signos da memória
social, capazes de catalisar noções de pertencimento do grupo. (2006,
p.65-6).
• Livro do Tombo das Belas Artes, onde são inscritos os bens culturais em
função do seu valor artístico;
A partir dos anos 1970, em decorrência dos trabalhos realizados pelo Centro
Nacional de Referência Cultural – CNRC (1975) e a Fundação Pró-Memória (1979),
que atuavam em consonância com a discussão proposta pela UNESCO, por meio
de recomendações aos estados-membros para a preservação e valorização do
patrimônio cultural, houve um alargamento da noção de patrimônio, que passou a
ser orientado pela concepção antropológica de cultura, em oposição a um sentido
História Local | 51
estrito que privilegiava tão-somente os bens de “valor excepcional”, considerados
como herança legada pela colonização portuguesa.
FIQUE POR DENTRO: O CNRC foi um órgão estatal que surgiu a partir das
discussões promovidas por um grupo de funcionários do alto escalão do
governo federal, aos quais se uniram alguns professores da Universidade de
Brasília. O CNRC iniciou suas atividades em junho de 1975, conduzido por
Aloísio Magalhaes. De modo geral, sua proposta era discutir os sentidos
da preservação do patrimônio, ampliando sua concepção para abranger
questões como a necessidade de promover modelos de desenvolvimento
econômico autônomos, a valorização da diversidade regional e os riscos da
homogeneização e perda da identidade cultural da nação.
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Ao longo dos anos, tal orientação foi se ajustando às normativas internacionais
como as da UNESCO, que em 1989, por exemplo, emitiu uma Recomendação para
a Salvaguarda da Cultura Tradicional e Popular ali definida como “um conjunto de
criações que emanam de uma comunidade cultural fundadas na tradição, expressas
por um grupo ou por indivíduos e que reconhecidamente respondem às expectativas
da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social” (CURY,
2000, p. 294-5).
História Local | 53
Além de instituir o registro de bens Culturais de natureza Imaterial, a publicação
do Decreto nº 3.551 criou o Programa Nacional de Patrimônio Imaterial, com objetivo
de implementar políticas públicas voltadas para o reconhecimento, a valorização e o
apoio sustentável aos chamados bens culturais de natureza imaterial. Desde então,
ofícios e modos de fazer tradicionais, formas de expressão (musicas, coreografias,
artes cênicas, literárias e lúdicas), lugares onde se concentram ou se reproduzem
práticas culturais e celebrações coletivas passaram a ser, de modo sistemático, objeto
de inventários, de proposições de registros e de ações ou projetos de salvaguarda.
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Cabe observar que as propostas de registros são demandas que partem
do movimento coletivo da própria sociedade. Isto é, qualquer pessoa física ou
jurídica pode encaminhar para o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional - IPHAN um pedido de registro. A partir daí o órgão julga a procedência
do encaminhamento para instrução dos processos de registro. Se a avaliação for
favorável ao pedido, o passo seguinte consta de descrição pormenorizada do bem
a ser registrado, acompanhada da documentação correspondente.
Esse trabalho pode ser feito por outro órgão do Ministério da Cultura, pelas
unidades regionais do IPHAN ou por entidade pública ou privada que detenha
conhecimentos específicos sobre a matéria. Realizada a instrução do processo, o
IPHAN emite parecer publicado no Diário Oficial da União. Após 30 dias, que acolhem
eventuais manifestações da sociedade sobre o registro, o processo é encaminhado
ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural para deliberação.
História Local | 55
manifestam a existência de lugares sociais diferentes que possuem a capacidade
de construir um processo de identificação com a experiência vivida por outros
sujeitos em outros tempos. Nesse sentido, a narrativa histórica com ênfase no
local é um importante elemento de constituição das identidades uma vez que
apresenta a vivacidade das memórias suprimidas ou incorporadas à história dita
oficial. É importante salientar, todavia, que a valorização do passado histórico e
das peculiaridades locais por intermédio da preservação do patrimônio cultural não
deve ser tomada como atitude puramente saudosista.
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sociedade, mas principalmente o efeito de uma escolha realizada pelos agentes
sociais envolvidos com a causa. E como adverte Magalhães (2009, p. 47):
No debate dessa temática outro ponto que merece ser discutido é aquele
relativo ao importante papel da Educação Patrimonial no ensino da história. A
definição dada pelo IPHAN, na sua página da internet, afirma que:
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Nessa perspectiva, o referido projeto tinha o interesse de proporcionar às
comunidades, os meios e as condições necessárias para produzir um processo
educacional com base no repertório regional e local, pautado na apreensão dos
conteúdos culturais e valores próprios das comunidades envolvidas. De modo mais
amplo, a ideia do projeto era superar a ineficácia de propostas pedagógicas que
deixavam de levar em conta as especificidades da dinâmica cultural local e não
correspondiam às necessidades de seu público-alvo. Por isso, os idealizadores
do Projeto Interação defendiam a participação da comunidade na construção de
alternativas pedagógicas, bem como seus respectivos métodos e materiais didáticos.
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sociedade civil. No ano de 2009, a GEDUC foi vinculada, por meio do Decreto nº 6.844,
Departamento de Articulação e Fomento (DAF), instância cujo objetivo era fortalecer,
promover, coordenar, integrar e avaliar a implementação de programas e projetos de
Educação Patrimonial no âmbito da Política Nacional do Patrimônio Cultural.
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os mais variados, será mesmo possível pensar numa perspectiva única e elitista em
relação ao patrimônio?
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História Local | 61
LEITURA OBRIGATÓRIA
Este ícone apresenta uma obra indicada pelos(as)
professores(as) autores(as) que será indispensável
para a formação profissional do estudante.
L
e
Caro estudante,
GUIA DE ESTUDO
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Rs
REVISANDO
É uma síntese dos temas abordados com a
intenção de possibilitar uma oportunidade
para rever os pontos fundamentais da
disciplina e avaliar a aprendizagem.
Na História Local, o adjetivo local está relacionado a lugares político-
administrativos (munícipio, bairro, distrito), uma aldeia indígena ou até mesmo uma
instituição (escola, hospital, fábrica). Assim, o local é um lugar de sociabilidade onde
o conjunto de experiências dos sujeitos individuais e coletivos se desenvolvem em
relação de complementaridade, favorecendo o diálogo entre o passado, presente e
futuro.
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artes; e das artes aplicadas. Já os bens culturais imateriais vinculam-se aos saberes,
às habilidades, às crenças, às práticas, enfim, ao modo de ser das pessoas, como aos
aspectos tangíveis dos bens culturais.
É, pois, uma concepção de educação patrimonial que vai além das noções
tradicionais de patrimônio e identidade, possuindo um caráter político que valoriza
a busca de novos saberes e conhecimentos a partir da atuação dos sujeitos e não
apenas de sua postura de espectador.
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AUTOAVALIAÇÃO
Momento de parar e fazer uma análise sobre o que o
estudante aprendeu durante a disciplina. Av
1) O que estuda a História Local?
História Local | 69
BIBLIOGRAFIA
Indicação de livros e sites que foram usados para a
construção do material didático da disciplina. Bb
AZEVEDO, Cecília. Identidades compartilhadas: a identidade nacional em questão.
IN: Martha Abreu e Rachel Soihet (orgs.). Ensino de história: conceitos, temáticas e
metodologia, Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2009;
BURKE, Peter (org.). A Escrita da História - Novas Perspectivas. São Paulo: UNESP,
1992.
CASTRO, Maria Laura Viveiros de; FONSECA, Maria Cecília Londres Fonseca.
Patrimônio imaterial no Brasil. Brasília: UNESCO, Educarte, 2008.
História Local | 71
CERTEAU, Michel de. A invenção do cotidiano. 14. ed. Petrópolis: Vozes, 2000.
CURY, Isabelle (org.) Cartas Patrimoniais. (2ª edição rev. e aum.) Rio de Janeiro:
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FONSECA, Maria Cecília Londres. Para além da pedra e cal: por uma concepção ampla
de patrimônio cultural. In: Abreu, Regina; Chagas, Mario. Memória e Patrimônio.
Ensaios Contemporâneos. RJ: Editora Lamparina, 2009. pp. 59-79.
HOBSBAWM, E. A Era dos extremos. O breve século XX. 1914-1991. São Paulo:
Companhia das Letras,1995.
SILVA, Marcos A. da. República em migalhas: história regional e local. São Paulo:
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74 | História Local
História Local | 75
Bibliografia Web
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Users/1-01675/Downloads/raphaelsamuel%20(1).pdf>.
História Local | 77